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1 1 FACULDADE DE ENGENHARIA E ARQUITETURA CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO Disciplina: História da Arte Profª Laile Almeria de Miranda Texto Sonia Leni Chamon RENASCIMENTO E MANEIRISMO A Idade Moderna se inicia, no Quadro Cronológico (Texto 1) em 1453, com a Queda do Império Romano do Oriente, através da tomada de Constantinopla pelos Turcos Otomanos. O Renascimento como um fenômeno artístico se inicia, porém, em 1401 com o concurso para as portas do Batistério de Florença introduzindo desde então os fundamentos renascentistas de busca pela proporção, equilíbrio e harmonia; o retorno à estética clássica da antiguidade e a consciência do poder da razão como fundamento do antropocentrismo. Toda a arte dos séc. XV (Il Quattrocento) e parte do séc. XVI (Il Cinquecento) tem seus alicerces nestes princípios. Mas a arte acompanha as modificações de seu tempo, fatores históricos importantes alteraram a mentalidade do Homem. Proporção, equilíbrio e harmonia já não traduziam os anseios e a complexidade humana trazidas por transformações religiosas e políticas, distorções e ambigüidades começam a surgir na arte, rompendo cânones estéticos é o Maneirismo que se impõe. Il Quattocento – Protorenascimento As nomenclaturas e classificações que usamos ainda hoje na História da Arte são, muitas vezes, frutos de preconceitos e mal entendidos. O termo Renascimento começou a ser usado já no séc. XIV, quando Giotto instituiu sua forma de representação: consideraram-na digna dos antigos, isto é, da arte clássica romana. Era a cultura que renascia, sendo que o milênio que os separava era vista como um período intermediário, daí Idade Média. De forma pejorativa chamaram a arte anterior de gótica como sendo própria dos godos, tribo bárbara que teria provocado a queda do Império Romano (Gombrich, 1983).Vimos a riqueza artística de todo o período medieval e como o Renascimento foi fruto de um processo lento de transformações contextuais e estéticas. Vamos usar estes termos, portanto, conscientes de suas origens e significados. Por volta de 1400, a Itália estava praticamente dominada pelos milaneses e o Estado florentino via-se ameaçado em sua independência (Janson, 1977). Os humanistas de Florença iniciaram uma campanha contra os tiranos através de intensas realizações culturais. Primeiramente houve o concurso para as portas de bronze do Batistério de Florença (fig.1 ), tendo ganhado o escultor Lorenzo Ghiberti os delicados relevos das almofadas das portas (divisão retangular proeminente) já indicavam o preciosismo da representação renascentista, com os planos espaciais determinados pelas sutilezas dos relevos. Michelangelo sabiamente as chamou de “Portas do Paraíso”.

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FACULDADE DE ENGENHARIA E ARQUITETURA CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO

Disciplina: História da Arte Profª Laile Almeria de Miranda Texto Sonia Leni Chamon

RENASCIMENTO E MANEIRISMO

A Idade Moderna se inicia, no Quadro Cronológico (Texto 1) em 1453, com a Queda

do Império Romano do Oriente, através da tomada de Constantinopla pelos Turcos

Otomanos. O Renascimento como um fenômeno artístico se inicia, porém, em 1401

com o concurso para as portas do Batistério de Florença – introduzindo desde então

os fundamentos renascentistas de busca pela proporção, equilíbrio e harmonia; o

retorno à estética clássica da antiguidade e a consciência do poder da razão

como fundamento do antropocentrismo. Toda a arte dos séc. XV (Il Quattrocento)

e parte do séc. XVI (Il Cinquecento) tem seus alicerces nestes princípios. Mas a arte

acompanha as modificações de seu tempo, fatores históricos importantes alteraram a

mentalidade do Homem. Proporção, equilíbrio e harmonia já não traduziam os

anseios e a complexidade humana trazidas por transformações religiosas e políticas,

distorções e ambigüidades começam a surgir na arte, rompendo cânones estéticos – é

o Maneirismo que se impõe.

Il Quattocento – Protorenascimento As nomenclaturas e classificações que usamos ainda hoje na História da Arte são,

muitas vezes, frutos de preconceitos e mal entendidos. O termo Renascimento

começou a ser usado já no séc. XIV, quando Giotto instituiu sua forma de

representação: consideraram-na digna dos antigos, isto é, da arte clássica romana. Era

a cultura que renascia, sendo que o milênio que os separava era vista como um

período intermediário, daí Idade Média. De forma pejorativa chamaram a arte

anterior de gótica como sendo própria dos godos, tribo bárbara que teria provocado a

queda do Império Romano (Gombrich, 1983).Vimos a riqueza artística de todo o

período medieval e como o Renascimento foi fruto de um processo lento de

transformações contextuais e estéticas. Vamos usar estes termos, portanto,

conscientes de suas origens e significados.

Por volta de 1400, a Itália estava praticamente dominada pelos milaneses e o Estado

florentino via-se ameaçado em sua independência (Janson, 1977). Os humanistas de

Florença iniciaram uma campanha contra os tiranos através de intensas realizações

culturais. Primeiramente houve o concurso para as portas de bronze do Batistério de

Florença (fig.1 ), tendo ganhado o escultor Lorenzo Ghiberti – os delicados relevos

das almofadas das portas (divisão retangular proeminente) já indicavam o

preciosismo da representação renascentista, com os planos espaciais determinados

pelas sutilezas dos relevos. Michelangelo sabiamente as chamou de “Portas do

Paraíso”.

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Mas é um novo concurso, agora para criar o zimbório da catedral gótica de Florença,

que faz surgir a figura de Brunellechi – o grande defensor das idéias humanistas de

Florença. Usando conhecimentos góticos e clássicos de construção de abóbadas, ele

criou uma nova forma construtiva que revolucionou a arquitetura, a possibilidade de

criar imensas cúpulas alongadas (fig. 2). O orgulho causado pela pelo maravilhoso

zimbório e toda a sua superioridade artística foi determinante para a manutenção da

liberdade política de Florença (Janson, 1977 ).

Figura 1. Lorenzo Ghiberti: “Portas do Paraíso” ( c. 1435). Bronze dourado, Batistério

de Florença (réplica). Detalhe: Painel - A História de Jacob e de Esaú

Figura 1 Brunelleschi: Zimbório da catedral

de Florença, Santa Maria dell Fiore – (1420-

36), Florença

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A grande inovação da pintura renascentista, sem dúvida, foi a perspectiva matemática.

Brunelleschi contribuiu de forma decisiva, também nesta arte, mas foi com Masaccio

e seu afresco da Santíssima Trindade (fig.3), novamente em Florença, que a

perspectiva abriu-se em possibilidades infinitas: sobre um plano bidimensional a

simulação de ambiente além da superfície.

Fora da Itália o pintor Jan van Eyck, de Flandres (atual Bélgica) atingiu igualmente o

esplendor da representação, porem não usando a matemática e a perspectiva de ponto

de fuga, como Masaccio, mas a tradição gótica de observação da natureza pelos

detalhes. Seu quadro mais famoso retrata as bodas do casal Arnolfini (fig. 4 ) e no

fundo temos um espelho convexo que reflete as costas do casal e no meio uma figura,

provavelmente o próprio artista, tido como testemunha. Essa ideia é reforçada pela

frase da parede: Johannes de eyck fruit hic (Jan van Eyck esteve presente).

Figura 2 Masaccio: A Santíssima Trindade, a

Virgem, S. João e os doadores (c. 1427).

Afresco em Santa Maria Novella, Florença

Figura 3 Jan van Eyck: O Casal Arnolfini

(1434).. National Gallery, Londres

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Todo o período subseqüente apresentou inovações nas técnicas de perspectiva e

escorço (distorções na proporção da figura humana para a ilusão de perspectiva)

sempre em busca de uma representação mais próxima da realidade. Artistas como

Ucello e Mantegna chegaram às vias da obsessão com as possibilidades geométricas

da perspectiva (fig. 5 ).

A maior aproximação com os ideais clássicos foi atingida por Sandro Botticelli.

Discípulo de Fellipo Lippi , adquiriu deste as linhas leves e sinuosas da representação

humana; tendo Lourenço de Medice como mecenas, foi orientado nas narrativas

mitológicas clássicas para que estas não se tornassem apenas temas, mas revelações

misteriosas dos antigos. O célebre Nascimento de Vênus (fig.6),não só relata em

detalhes o mito mas manifesta o surgimento do paradigma da beleza ocidental.

O mesmo salto realístico que ocorreu na pintura do séc. XV proporcionou à escultura

o status de arte autônoma que não existia desde a antiguidade. O grande reformulador

foi florentino (que dúvida, não?) Donatello. As esculturas não apenas passaram a ser

independentes da arquitetura, mas também apresentavam peculiaridades humanas

Figura 4 Mantegna: S. Tiago a caminho de sua

execução (1455). Afresco da igreja dos Ermitões

(já destruída), Pádua.

Figura 5 Botticelli: O nascimento de Vênus (1485). Uffizi, Florença.

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requintadas, dadas pela arguta observação do artista. Ao longo desta Unidade, veremos

diversas obras com o tema bíblico de Davi – aquele que enfrentou e matou o gigante

Golias: observe o Davi (fig.7) de Donatello. Primeiro nu em bronze dos tempos

modernos apresenta uma postura jovial e palaciana, apoiado sobre a cabeça de seu

inimigo.

Outro grande escultor do período foi Andrea Del Verrocchio. Suas oficinas eram

célebres pelas esculturas e pinturas grandiosas e perfeitas e pelos discípulos que dali

saíram mestres, como Leonardo da Vinci. O grande monumento eqüestre a Colleoni

exala vigor e observação minuciosa da natureza, retomando a tradição romana de

representação de cavalos. Mas também podemos observar o seu Davi (fig. 8 ), agora

um irônico e ágil adolescente.

A arquitetura do séc. XV, após todos os empreendimentos de Brunelleschi do começo

do século, trouxe novamente o interesse pela antiguidade, agora com o arquiteto Leone

Battista Alberti. Interessado em arqueologia e profundo conhecedor do classicismo,

Figura 6 Donatello: Davi. (1430). Bronze, alt.

1,58m.Museu Nacional Bargello, Florença.

Figura 7 . Verrocchio: Davi. (1475).Bronze, alt.

1,25cm.Museu Nacional Bargello, Florença.

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traduziu e divulgou a obra de Vitrúvio1. Utilizou seus conhecimentos clássicos para a

concepção da arquitetura citadina típica do Quattrocento: a fachada em superfície

única, esquema de ordem sobre ordem, como o antigo Coliseu, ritmo contínuo dado

pelas janelas em arco e as sutis colunas levemente em destaque. O Palazzo Rucellai

(fig. 9 )é o modelo neste período.

Il Cinquecento – O Renascimento Pleno

O final dos séc. XV e as primeiras décadas do séc. XVI são normalmente chamados de

Renascimento Pleno. É o período em que os princípios renascentistas (proporção,

equilíbrio e harmonia; o retorno à estética clássica da antiguidade e a consciência

do poder da razão como fundamento do antropocentrismo) são amplamente

atingidos. Grandes gênios como a tríade Leonardo, Michelangelo e Rafael; seus

sucessores Bellini,Giorgione,Ticiano e Veronese, o alemão Dürer e o holandês

Hieronimus Bosch coexistem produzindo uma arte superlativa.

Leonardo da Vinci teve uma origem humilde, filho ilegítimo de um tabelião de

Florença que custeou seus estudos com Verrochio. Sua genialidade encontra-se na

diversidade de interesses e primazia em cada um, o que o tornou célebre pintor,

escultor, arquiteto, engenheiro, físico, inventor, botânico, anatomista, cenógrafo, poeta,

músico e outras especialidades sobre as quais discorre em seus escritos – compêndios

conservados e reunidos por alunos e admiradores, chamados Códices.

Desde suas primeiras pinturas já eram visíveis suas preocupações pictóricas, como a

volumetria dos corpos dada pela modelagem do claro-escuro e não pelo contorno; as

sombras diáfanas que ocultam seus limites, dando sempre uma impressão de mistério,

chamadas sfumato; a contínua observação e análise da natureza – desde registros de

paisagens, plantas e pessoas, até dissecação de cadáveres – utilizadas posteriormente

em obras de arte. Observe nas figs.11, 12, 13 e 14 estas características de Leonardo:

1 Arquiteto Romano do séc. I d.C. que escreveu o primeiro tratado “Da Arquitetura”, amplamente

divulgado durante o Renascimento.

Figura 8 Alberti, Palazzo Rucellai (c1450). , Florença

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Michelangelo considerava-se essencialmente um escultor. Antevia a forma oculta no

bloco de mármore e retirava o excedente - essa forma de criação possibilitou, talvez, as

mais expressivas esculturas do Renascimento. Ainda jovem esculpiu obras primas

como a Pietá e o Davi (fig.15), este uma figura colossal representando um jovem

Figura 10 Leonardo da Vinci : Cabeças Grotescas

(1485-90). Royal Library, Windsor Castlel, Londres

Figura 9 Leonardo da Vinci : Estudos de um feto

(1510-1513). Royal Library, Windsor Castlel, Londres

Figura 11 Leonardo da Vinci :

Paisagem (1473).Galeria Uffizi,

Florença

Figura 12 Leonardo da Vinci: Mona Lisa ( c.

1503). Museu do Louvre, Paris.

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Figura. 13. Michelangelo: Davi ( 1501).

Mármore, alt. do corpo 4,089m . Museu

da Academia, Florença

determinado a matar seu oponente, segurando ainda a funda ( espécie de estilingue).

Sua notoriedade o fez ser chamado em Roma, pelo Papa Júlio II para a criação de um

complexo escultórico para seu túmulo – que nunca foi terminado, mas originou obras

como o majestoso Moisés (fig.16).

O Papa interrompeu a criação do túmulo, ordenando a pintura em afresco do teto da

Capela Sistina (fig.17). A pintura foi feita, mesmo com relutância do artista, em quatro

anos. É, com certeza, uma das obras primas da humanidade (isso porque Michelangelo

considerava-se um escultor e não um pintor!) – compreende nove cenas do Gênesis,

representações de profetas, sibilas e toda a sorte de figuras atléticas nas mais diversas

posições. O Juízo Final foi pintado posteriormente na parede do altar.

Figura 14 . Michelangelo: Moisés. (c. 1513).

Mármore, alt. 2,35. Igreja S. Pietro in

Vincoli, Roma.

Figura 15 Michelangelo: Teto da Capela

Sistina (1508 – 1512). Vaticano

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Michelangelo também foi exímio arquiteto. Entre piazzas e palazzos surpreendentes

vamos comentar, aqui, apenas o projeto da catedral de São Pedro, em Roma. Júlio II

havia decidido construir uma nova sede da Igreja Católica, mas desejava uma obra que

ofuscasse todas as outras já construídas. Primeiramente convidou Donato Bramante

que havia projetado o elegante e inovador Tempietto, em Roma - do projeto da nova

sede sobraram apenas esboços. O projeto foi passado para Michelangelo que utilizou a

ordem colossal, que havia desenvolvido anteriormente, em uma gigantesca catedral de

planta centrada e a magnífica cúpula (que só foi terminada após a morte de

Michelangelo por Giacomo della Porta). É a extraordinária Catedral de São Pedro

(fig.18) cujos gastos foram um dos motivos da cisão da Igreja, com Martinho Lutero.

Rafael Sanzio, gênio mais novo da trindade do Renascimento Pleno e, de certa

maneira, a tradução do período. Algumas de suas obras tornaram-se modelo de

perfeição (Gombrich, 1983), como é o caso da Madona del Granduca (fig.19)

insistentemente copiado posteriormente. A sua grande obra prima é o afresco A Escola de Atenas (fig. 20) pintado na Stanza

della Segnatura, um escritório papal no Palácio do Vaticano. Rafael retrata um grande

Figura 18 Michelangelo.Catedral de São Pedro

(1546-64). Roma

Figura 19. Rafael: Madona del Granduca, (c. 1505).

Palacio Pitti, Florença

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grupo de filósofos gregos, dando a alguns feições de personalidades da sua época,

como o filósofo Heráclito que é retratado com as feições de Michelangelo.

Surpreendente é o colossal edifício representado como fundo, talvez uma alusão ao

projeto de Bramante para a Catedral de São Pedro.

O Maneirismo

O termo Maneirismo, mais uma vez, não responde de forma clara aos estilos que se

seguiram ao Renascimento Pleno. Alusão à palavra “amaneirada”, apresenta uma

conotação de artificialismos que precisa ser evitada. Novamente, vamos procurar

usar o termo livre de sua carga pejorativa.

Talvez o Renascimento Pleno tivesse esgotado uma fórmula; talvez o contexto

histórico – a reforma Protestante de Martinho Lutero e os novos descobrimentos

marítimos – não permitissem mais uma representação artística baseada no equilíbrio

e na harmonia; talvez apenas um momento artístico intermediário, onde a

permanência de elementos do estilo anterior briga com o surgimento de prenúncios

do posterior: o Maneirismo rompeu com os princípios renascentistas de proporção,

equilíbrio e harmonia e, sem abandonar recursos do estilo passado, propõe uma

arte expressiva, distorcida e individualizada.

É fácil perceber a proporção exageradamente alongada e o equilíbrio assimétrico da

Madona de Pescoço Longo (fig.21) de Parmigianino; ou ainda o clima de

irrealidade, a movimentada composição em diagonal d’A Última Ceia (fig.22 ), de

Tintoretto; ou o êxtase vertiginoso do Enterro do Conde de Orgaz (fig 23 ), do

cretense Domenicus Teothokopoulus conhecido por El Greco.

Figura 20 Rafael: A Escola de Atenas. (1510). Afresco. Stanza della

Segnatura, Palácio do Vaticano, Roma

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Giorgio Vasari, foi a grande personalidade deste período. Pintor e cenógrafo,

organizou e ornamentou memoráveis festas em Florença e decorou palácios e

igrejas. Porém entrou para a história como o autor do Le Vite (fig. 24 ), célebre

livro de biografias dos principais pintores, escultores e arquitetos de seu tempo .

Apesar de bastante parcial, inaugurou a moderna História da Arte.

Figura 21 Parmigianino: A

Madona de pescoço longo (1540,

inacabado). Uffizi, Florença

Figura 22Tintoretto: A Última Ceia. (1594). San Giorgio

Maggiore, Veneza.

Figura 23 El Greco: O Enterro do

Conde de Orgaz,( 1586) S. Tomé,

Toledo

Figura 24 Vasari, capa do Le Vite. (1550)

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Como arquiteto, Vasari projetou o edifício Uffizi (fig.25), um dos símbolos do

maneirismo na arquitetura. Construído inicialmente para abrigar repartições

públicas, é hoje um dos principais museus do mundo. Gigantesco em proporções,

apresenta duas alas paralelas unidas por uma loggia – espécie de corredor

avarandado, com vista para o rio Arno.

Outra importante construção do período é a Villa Rotonda (fig.26), de Andrea

Palladio. Acreditando que as moradias da antiguidade tinham este aspecto (Janson,

1977), o que foi contestado posteriormente com as escavações arqueológicas,

Palladio, que escreveu suas ideias em um tratado de arquitetura, inaugurou um estilo

que utilizava secularmente elementos de templos da antiguidade. Esse estilo foi

largamente usado posteriormente, a partir do séc. XVIII, com o nome de palladiano.

Para saber mais... Veja as dicas no próximo texto (Barroco e Rococó), englobando toda a Idade

Moderna.

Figura 25 Vasari: Uffizi- loggia

ao fundo ( 1560). Florença

Figura 26 Palladio: Villa Rotonda,

(1570), Vicenza