RENASCIMENTO - A Lenda do Judeu Errante - Martins Fontes · 2007-11-30 · Quando acordou, ligou a...

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Todos os direitos desta edição reservados a editora.

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E-mail: [email protected]: www.gizeditorial.com.br

São Paulo, 2007.

Sérgio Pereira Couto

© 2007 de Sérgio Pereira Couto

Título Original em Português: Renascimento: A Lenda do Judeu Errante

Coordenação editorial: Ednei ProcópioComercial: Simone MateusPreparação de texto: Marcelo BarbãoRevisão: Jonathan BusatoEditoração eletrônica: V2Capa: Rafael VictorImpressão: Gráfi ca e Editora Vida & Consciência

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Couto, Sérgio Pereira.Renascimento : a lenda do judeu errante / Sérgio Pereira Couto.

– São Paulo ; Giz Editorial, 2007.

ISBN: 978-85-99822-53-1

1.Ficção Brasileira I. Título.

07-3661 CDD-869.93

Índice para Catálogo Sistemático1.Ficção : Literatura Brasileira 869.93

É PROIBIDA A REPRODUÇÃO

Nenhuma parte desta obra poderá ser reproduzida, copiada, transcrita ou mesmo trans-mitida por meios eletrônicos ou gravações, assim como traduzida, sem a permissão, por escrito, do autor. Os infratores serão punidos pela Lei nº 9.610/98

Impresso no Brasil / Printed in Brazil

Agradecimentos

Todo trabalho, seja ele de fi cção ou pesquisa, necessita de uma grande quantidade de entrevistas com várias pessoas que for-necem o material necessário para a construção dos persona-gens e do ambiente onde eles estão. Nesse sentido agradeço a paciência que os orientadores da Federação Espírita do Es-tado de São Paulo e do Centro Espírita Irmão X (Humberto de Campos) tiveram ao me passar todas as referências do tra-balho de Allan Kardec. Pela inspiração agradeço ao próprio Allan Kardec. Desde que vi seu túmulo no Cemitério do Pére Lachaise, em Paris, fi quei tão impressionado que decidi que, um dia, escreveria uma história com fundo espírita.

O visual incrível deste livro é uma cortesia de meu talentoso amigo, Rafael Victor, ingrediente importante para ter dado vida a Ahasver e os outros personagens. Finalmente, por ter acreditado neste projeto, agradeço ao editor da Giz Editorial, Ednei Procópio, e aos diretores da empresa, Simone Mateus e Newton Carrara. Sem seu apoio este livro jamais teria conhe-cido a luz do dia. A todos, muito obrigado por terem confi ado.

Lembremos sempre dos ensinamentos transmitidos por Allan Kardec: “O estado das almas depois da morte não é mais um sistema, porém o resultado da observação. Ergueu-se o véu; o mundo espiritual aparece-nos na plenitude de sua realidade prática; não foram os homens que o desco-briram pelo esforço de uma concepção engenhosa, são os próprios habitantes desse mundo que nos vêm descrever a sua situação.” (O Céu e o Inferno, Primeira Parte, Capítulo 2)

Sérgio Pereira Couto

Ahasverus e o Gênio

Sabes quem foi Ahasverus?... - o precito,O mísero Judeu, que tinha escrito Na fronte o selo atroz!Eterno viajor de enterna senda...Espantado a fugir de tenda em tendaFugindo embalde à vingadora voz! Misérrimo! Correu o mundo inteiro,E no mundo tão grande... o forasteiro Não teve onde... pousar.Co´a mão vazia - viu a terra cheia.O deserto negou-lhe - o grão de areia,A gota d´água - rejeitou-lhe o mar. D´Ásia as fl orestas - lhe negaram sombra,A savana sem fi m - negou-lhe afombra. O chão negou-lhe o pó!...Tabas, serralhos, tendas solares...Ninguém lhe abriu a porta de seus lares E o triste seguiu só. Viu povos de mil climas, viu mil raças,E não pôde entre tantas populaças Beijar uma só mão...Desde a virgem do norte à de Sevilhas,Desde a inglesa à crioula das Antilhas, Não teve um coração!...

E caminhou!... E as tribos se afastavamE as mulheres tremendo murmuravam Com respeito e pavor.Ai! Fazia tremer do vale à serra...Ele que só pedia sobre a terra - Silêncio, paz e amor! - No entanto à noite, se o Hebreu passava,Um murmúrio de inveja se elevava,Desde a fl or da campina ao colibri,“Ele não morre” a multidão diziaE o precito consigo respondia: - “Ai! mas nunca vivi” - O Gênio é como Ahasverus... solitárioA marchar, a marchar no itinário Sem termo do existir.Invejado! a invejar os invejosos.Vendo a sombra dos álamos frondosos...E sempre a caminhar... sempre a seguir... Pede u´a mão de amigo - dão-lhe palmas:Pede um beijo de amor - e as outras almas Fogem pasmas de si.E o mísero de glória em glória corre...Mas quando a terra diz: - “Ele não morre”Responde o desgraçado: - “Eu não vivi!...”

Poesia de Castro Alves (1847-1871) escrita em outubro de 1868

e publicada na obra Espumas Flutuantes, em 1870.

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IRoger Briggs (cujo nome verdadeiro é Rogério Brigstein) an-dava de um lado para o outro em seu escritório localizado na zona oeste de São Paulo. Tinha trinta anos, 1,80 de altura e seus oitenta quilos eram bem distribuídos, fazendo-o parecer mais jovem do que realmente era. Vestia calça jeans e camisa estampada, além de usar mocassins novos. Seu tempo como proprietário do site multimarket.com havia rendido não só fama como também o havia colocado numa posição de des-taque como um dos empresários de Internet mais promissores do Brasil. Os altos e baixos de uma empresa que opera na In-ternet conseguem minar as atenções de qualquer um, mas Roger foi capaz de manter braço fi rme na direção. Assim, o multimarket.com conseguiu se fi rmar como a maior e melhor loja de departamentos na rede mundial, atendendo a todo o país.

Roger estava tenso. Sabia que, apesar de tudo, era hora de ter um sócio. Mas os tempos eram difíceis. Muitos impostos levavam a muitas preocupações. Ainda assim, quando parava para pensar, chegava à conclusão de que não havia se saído tão mal. Principalmente depois que veio para o Brasil, onde passou cinco anos construindo a empresa com o dinheiro que havia recebido como indenização pela morte de seus pais.

Roger sentou-se em sua mesa com um copo de uísque na mão. Tinha orgulho do que havia construído em tão pouco tempo. Mas também trauma sobre como havia chegado ali.

A vida não foi nunca fácil para esse fi lho de israelenses. Os confl itos em seu país natal não cessavam, e seus pais to-maram a difícil decisão de emigrar para onde acreditavam ser a

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terra da oportunidade: a América do Norte, mais precisamente os Estados Unidos. Ele nunca havia confi ado no governo de George W. Bush. Naquela época, com apenas 25 anos e muita vontade de aprender, Roger quis ver na terra do Tio Sam a oportunidade de começar uma nova vida. Seu pai, um cientista ligado à Universidade de Yale, aceitou a bolsa de estudos que permitiu levar sua esposa e fi lho para o novo país.

Até o fatídico 11 de setembro de 2001.Naquele dia, Roger havia fi cado em casa dormindo.

Pretendia procurar emprego. Quando acordou, ligou a TV como era seu hábito. Viu as cenas que passavam sem parar, mostrando os aviões seqüestrados por terroristas da Al Qaeda baterem no World Trade Center.

Até o narrador da CNN anunciar que havia outros dois aviões.

Roger correu para procurar, entre seus pertences, ano-tações sobre o vôo que seus pais iriam tomar naquele dia para São Francisco. A verdade caiu sobre sua cabeça como uma pa-rede de tijolos. O vôo 93 da United Airlines, o mesmo em que seus pais estavam, era um dos seqüestrados.

Roger acompanhou trêmulo o desenrolar dos fatos até a notícia fi nal de que o avião havia caído num trecho próximo à Pensilvânia. Ninguém havia sobrevivido.

Roger tentou se recuperar da avalanche de emoções que lhe vinham à mente. “Agora não é hora para isso”, pensou. “O investidor deve chegar a qualquer momento”. Olhou para seu relógio de parede. Precisamente às onze da manhã a porta de sua sala se abriu e sua secretária anunciou a chegada do Dr. Varshae, o misterioso investidor que Roger conhecera via MSN. Ele pediu que ela trouxesse o visitante em sua sala dentro de uns cinco minutos. Roger procurou se recompor.

A história de Varshae era mais estranha ainda. Roger

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havia posto um anúncio num fórum confi ável procurando al-guém interessado em investir em sua empresa, fundada três meses depois do 11 de setembro, quando decidira vir para o Brasil. “A terra mais afastada da presença do Islã”, era o que pensava. No começo tudo foi muito bem, mas os impostos, exigências tributárias e a concorrência no encalço começaram a fazê-lo mudar de idéia. Um sócio seria excelente para dividir responsabilidades.

A secretária voltou com o candidato a sócio depois dos cinco minutos. Roger observou seu estranho interlocutor. Um homem de aspecto peculiar, magro, de cabelos compridos, rosto esquelético, olhos fundos e penetrantes. Usava um bi-gode no estilo Salvador Dali, um estranho cachecol no pes-coço e um casaco mais estranho ainda, que parecia um sobre-tudo. Segurava uma bengala de madeira com o cabo em forma de cabeça de chacal.

— Muito prazer, meu caro – disse o estranho, esten-dendo um cartão. Nele se via escrito: “Dr. Varshae – Pesqui-sador do Sono”.

— Sente-se, doutor. Aceita algo para beber?— Água, por favor. Este país é muito quente, às vezes.A secretária saiu para providenciar a bebida. Os dois

sentaram-se. Roger pensou que havia algo de sinistro na fi gura do doutor, mas achou de bom tom disfarçar.

— O senhor se interessa então em investir?— Mas é claro! Tudo para mim é motivo de pesquisa e,

como pode ver, já passei um pouco da idade de me aposentar.— Interessante. Gostaria de conhecer a empresa? Não

é muito grande, mas...— Não é necessário, meu bom rapaz. Vim apenas dizer

que quero não só investir em você como também em seu futuro.Roger franziu as sobrancelhas. Não parecia estar enten-

dendo onde Varshae queria chegar.

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— Vamos começar falando um pouco de mim. – disse o doutor. – Como pode ver, sou pesquisador e autor de vários livros. De fato, trouxe-lhe uma cópia de meu mais recente tra-balho.

Roger apanhou o livro. Chamava-se Terapia de Vidas Passadas, de autoria do Dr. Varshae (sem primeiro nome especifi cado), PhD no assunto pela Universidade de Oxford, Inglaterra.

— Vidas passadas, não é? Parece coisa de auto-ajuda. Nunca consegui acreditar muito nisso.

Varshae sorriu de maneira sarcástica.— Você e mais a metade da população deste planeta.

Mas a verdade é que esta é uma crença tão antiga quanto a humanidade.

— A reencarnação?— Claro. Ou você é um daqueles que acredita no Juízo

Final?— Não sei bem no que acredito. Fui criado como judeu,

mas a verdade é que nem sei bem se quero continuar a seguir minha sina religiosa. Não com toda essa morte e destruição que vem acontecendo no Oriente Médio e em Israel. Ainda mais depois do 11 de Setembro.

— Palavras interessantes. Ainda mais vindas de alguém que parece ter herdado a capacidade de comercialização dos seus antepassados...

— Minha história pessoal é bem complicada...Varshae sorriu.— Você quer dizer o infortúnio de seus pais terem mor-

rido na queda do United 93?Roger o encarou nos olhos. Havia algo dentro de Var-

shae que o colocava em alerta.— O senhor, pelo jeito, se interessou mesmo pela minha

empresa. Vejo que fez uma grande pesquisa para saber quem sou eu.

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— Nada que não se encontre na Internet. A história de todos os que se envolveram nos ataques de 11 de setembro está documentada em várias páginas. Inclusive junto às histórias de conspiração...

Roger fi cou tenso.— Nada que seja provado – acrescentou ele. – Afi nal,

quem gostaria de saber que seus entes queridos trabalhavam para a CIA ou para o FBI e que forjaram suas mortes nos aviões seqüestrados? Isso é conversa de quem não tem o que fazer. Mas o fato é que, em apenas cinco anos, você recebeu uma quantia em dinheiro razoável, mudou de país de novo e agora é um empresário respeitável. Isso poderia ser conside-rado o começo de mais uma teoria, não acha?

Roger começava a se sentir ainda mais nervoso. “Acalme-se”, dizia sua consciência. “Você precisa de uma ajuda fi nan-ceira. Não ponha tudo a perder.”

— Especulações, apenas. – disse ele, disfarçando seus sentimentos. – Teorias da conspiração são interessantes de se ler, mas gostaria de me concentrar em nossa negociação, se não se importa.

Varshae brincava com sua bengala. Olhava fi rmemente para a cabeça de chacal.

— Tudo que eu queria saber sobre a sua empresa, eu já sei. Acredito que poderemos fechar a sociedade em breve. Isto é, se você não se incomodar em satisfazer um capricho de um velho tolo como eu.

— Mas nem mesmo falamos sobre como seria nossa so-ciedade...

— Pois eu tenho absoluta confi ança. As coisas continu-arão como estão, com você me prestando contas a cada três meses. E em troca investirei todas as minhas economias, ava-liadas num total de vinte milhões de dólares.

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Roger fi cou extasiado. Vinte milhões de dólares? Era quase dez vezes mais do que precisava.

— Mas... É muito dinheiro...— Não seja tolo. Nada é muito para uma empresa desse

porte. Mas em troca você deverá ir comigo para uma pequena festa de comemoração. E traga sua adorável noiva...

A sensação de desconfi ança voltou como um véu negro.— Minha... noiva?Varshae sorriu.— A doce Elizabeth Klinger está começando a fi car

conhecida no mundo todo por seus trabalhos acadêmicos. Acredito que, como boa pesquisadora de história, adorará esta chance de conhecer a Itália renascentista.

— Itália... Mas por que a Itália?Varshae sorriu enigmático.— Não se preocupe, Sr. Briggs. Em breve todas as suas

perguntas serão respondidas. Digamos que o senhor tem as-suntos inacabados e que devem ser resolvidos. No momento temos um acordo entre nós, algo entre cavalheiros e empre-sários. Amanhã mesmo meus advogados trarão os papéis para acertarmos os detalhes. E prepare-se para passar um fi m de semana inesquecível em Roma. Há algo por lá que gostaria que tanto você como Elizabeth vejam por si mesmos.

— Em Roma?— Oh, perdão, esqueci-me de dizer. Em Roma e em

Florença. Afi nal, uma sem a outra fi ca meio vazio. Tenho cer-teza de que Elizabeth concordaria comigo sobre isto.

Varshae levantou-se e estendeu a mão para Roger. Ainda sem saber o que pensar, ele a apertou.

— Não se preocupe, sei onde fi ca a saída. Logo nos ve-remos de novo, Sr. Briggs.

Quando a porta se fechou, Roger ainda parecia em transe. A proposta parecia ser boa demais para ser verdade.

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Vinte milhões de dólares davam para contratar as pessoas qua-lifi cadas de que precisava, ampliar os estoques e transformar o multimarket na maior loja virtual da Internet.

Mas algo parecia estar tremendamente errado. Uma viagem para a Itália era algo excêntrico demais. Pegou o tele-fone e discou para Benson, seu advogado.

— Benson, é Roger.— Ah, oi, Roger. Ia mesmo te ligar para avisar sobre

algo. Você tem um novo sócio bastante efi ciente. Os advo-gados dele já entraram em contato e anunciaram a transfe-rência dos fundos para a conta da empresa.

— Mas já? O Dr. Varshae acabou de sair daqui!— Dê graças a Deus. Essas coisas costumam ser demo-

radas.— Benson, isso é sério. Está tudo de acordo? E se for

algum tipo de lavagem de dinheiro, ou algo assim?— Fique frio, Roger. Está tudo dentro da lei. Não há

absolutamente nada de suspeito. Eu mesmo confi rmei. Estará tudo concluído em uns dois dias no máximo.

— O tempo em que estarei fora.— E para onde você vai?— O Dr. Varshae me convidou para uma viagem à

Itália! Com a Elizabeth!— Uau! Bela maneira de fechar um negócio. Bem, boa

viagem. Na segunda entrarei em contato para confi rmar a transação.

Roger desligou o telefone pensativo. De fato, seu novo sócio parecia saber bem quem ele era e de onde tinha vindo. Toda a história da morte de seus pais, a maneira como ganhou seu dinheiro e sua partida para o Brasil, tudo parecia ser um livro aberto para o estranho. Ele odiava se sentir assim inva-dido, e queria saber mais sobre aquele homem.

Ligou para um amigo repórter que trabalhava num dos

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maiores jornais de São Paulo. Sua surpresa foi ainda maior: não só conheciam o doutor como ele era realmente uma das maiores autoridades do sono do planeta, com conhecimento para diagnosticar e ajudar pacientes com distúrbios de sono. Foi o fundador e era responsável por uma instituição no Kansas, Estados Unidos, para tratamento de mulheres em de-pressão, e já tinha sido indicado ao Prêmio Nobel de Medi-cina.

Roger saiu de sua sala sentindo-se afl ito. Pensava nas afi rmações de Varshae e achava estranho alguém desconhe-cido saber detalhes de sua vida pessoal. Mas eram empresários. Isso era parte da vida e da profi ssão dessas pessoas, terminou por concluir.

Sem saber para onde ia, dirigiu-se ao shopping center próximo da sede da empresa. Andou a esmo pelos corredores até parar numa livraria e apanhar um livro de Varshae, que estava entre os dez mais vendidos de não-fi cção.

Roger folheava o livro sem nem se preocupar com seu conteúdo. Toda essa situação era péssima, pensou, pois sempre gostou de ter controle sobre as coisas. Mas nesse caso ele se sentia simplesmente fl utuando num rio, à mercê da cor-redeira.

— A terapia de vidas passadas nada mais é do que um processo terapêutico que tem por objetivo apresentar a so-lução para problemas que angustiam o ser humano.

Roger sentiu um arrepio correr pela espinha ao mesmo tempo em que o ar ao redor parecia gelar. A voz parecia vir de trás dele e falar diretamente em sua mente. Virou-se e encon-trou o que pensou ser um religioso. Parecia uma fi gura saída diretamente do romance de Umberto Eco, O Nome da Rosa. Nem mesmo seu rosto podia ser visto, por causa do capuz sobre a cabeça.

— É bem interessante, na verdade. Sabe, uma pessoa

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pode fi car presa a esta vida por uma dívida do passado. Aí entra toda uma concepção de reparação, algo parecido com karma ou algo assim...

— Sim, claro...Roger não queria ser indelicado, ainda mais por ter um

frade que nunca vira antes conversando sobre reencarnação, um assunto de que uma pessoa assim jamais falaria, ainda mais com desconhecidos.

— O senhor acredita em reencarnação, não é? Vejo que escolheu um livro do Dr. Varshae. Já li alguns trabalhos ex-celentes dele. Foi ele, inclusive, que me ajudou, à distância, a saldar alguns débitos de minha vida anterior...

— Desculpe-me, mas o senhor é frade, não é?— Sim, meu fi lho. Franciscano.— O senhor pode acreditar nessas coisas?— Mas claro! Onde você pensa que está, na época da

Inquisição?Roger sorriu sem graça. “Bem, ele é um religioso. Se não

puder confi ar na opinião de um, então de que adianta lançar mão do que o destino coloca no meu caminho?”

— Obrigado pela dica, irmão. O senhor me ajudou muito...

— Não há de quê, fi lho...Roger saiu da livraria sentindo-se mais leve. Precisava

de mais tempo para digerir toda aquela situação, mas já sabia por onde começar. Dirigiu-se para a praça de alimentação a fi m de almoçar e pensar mais sobre a oportunidade.

Na pressa não percebeu que o religioso o observava de longe. “Este já está preparado”, pensou o frade franciscano, assumindo a forma de Varshae. “A moça será um pouco mais difícil, mesmo assim tenho que tentar. Redenção... Tão pró-xima e, ao mesmo tempo, tão distante... Desta vez não poderá falhar.”