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7/18/2019 Relacoes Perigosas Choderlos de Laclos http://slidepdf.com/reader/full/relacoes-perigosas-choderlos-de-laclos 1/291 LIGAÇÕES PERIGOSAS CHODERLOS DE LACLOS TÍTULO ORIGINAL: LES LIAISONS DANGEREUSES TEXTO INTEGRAL: EDITORES ASSOCIADOS TRADUÇÃO: JOÃO PEDRO DE ANDRADE E ALFREDO AMORIM http:// groups.google.com/group/digitalsource

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LIGAÇÕES PERIGOSAS

CHODERLOS DE LACLOS

TÍTULO ORIGINAL: LES LIAISONS DANGEREUSESTEXTO INTEGRAL: EDITORES ASSOCIADOSTRADUÇÃO: JOÃO PEDRO DE ANDRADE E ALFREDO AMORIM

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PREFÁCIO DO REDATOR

Esta obra, ou antes, esta coleção, que o público achará talvez

ainda volumosa em demasia, não contém, todavia mais do que umpequeno número das cartas que compunham a totalidade dacorrespond!ncia de onde "oi e#tra$da. Encarregado de p%&la emordem pelas pessoas a cu'as mãos chegou, e que eu sabia terem aintenção de publicá&la, pedi apenas, como pr!mio dos meuscuidados, a permissão de suprimir tudo o que me parecesse inútil( ede "ato conservei apenas as cartas que me pareceram necessárias,quer para a compreensão dos acontecimentos, quer para odesenvolvimento dos caracteres. )e acrescentarmos a este ligeirotrabalho o de repor por ordem as cartas que dei#ei "icar, ordem paraa qual eu pr*prio quase sempre segui a das datas, e, en"im, algumas

notas curtas e raras, e que, na sua maior parte não t!m outroob'etivo senão o de indicar a origem de algumas citaç+es ou demotivar alguns cortes que me permiti "azer, ter&se&á inteiramenteidéia da parte que tive nesta obra. minha missão não ia maislonge.

Eu tinha proposto alteraç+es mais consideráveis, quase todasrelativas - pureza de dicção ou de estilo, contra a qual seencontrarão muitas "altas. ese'ei também ser autorizado a cortardiversas cartas demasiado longas, e das quais algumas tratamseparadamente, e quase sem transição, assuntos absolutamenteestranhos uns aos outros. Este trabalho, que não "oi aceito, não seriabastante sem dúvida para dar mérito - obra, mas ter&lhe&ia pelomenos tirado parte dos de"eitos.

oi&me ob'etado que eram as pr*prias cartas que sepretendia....dar a conhecer, e não apenas uma obra "eita segundo as cartas(que seria tanto contra a verossimilhança como contra a verdade que,de oito á dez pessoas que colaboraram nesta correspond!ncia, todasescrevessem com igual pureza. E - minha réplica de que, longedisso, não havia, pelo contrário, nenhuma que não tivesse cometidoerros graves, "oi&me respondido que todo o leitor razoável esperaria

seguramente encontrar erros numa coleção de cartas de algunsparticulares, visto que em todas as que se t!m publicado dedi"erentes autores estimados, e mesmo de alguns acad!micos, nãose encontrava nenhuma totalmente ao abrigo desta censura. Estasraz+es não me persuadiram e achei&as, como as acho ainda, mais"áceis de dar que de receber( mas não me competia mandar, esubmeti&me. )omente me reservei o direito de protestar e dedeclarar que não era essa a minha opinião( o que "aço nestemomento.

0uanto ao mérito que esta obra possa ter, talvez me nãocaiba e#plicá&lo, pois a minha opinião não deve nem pode ter

in"lu!ncia sobre

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*Devo prevenir também que suprimi ou mudei todos os nomes das pessoas queintervêm nestas cartas; e que, se no número daqueles que lhes substituí, seencontrarem nomes que pertençam a alguém, terá sido unicamente por erro daminha parte, e do qual não se deverá tirar qualquer conclusão !" do #1a de ninguém. Entretanto, todos os que, antes de começar umaleitura, "icam satis"eitos por saber apro#imadamente com o quepodem contar, esses, dizia eu que continuem, os outros "arão melhorem passar imediatamente para a obra em si( sabem 'á o que lhesbasta.

2 que posso dizer antes do mais é que se a minha intenção"oi, como reconheço, der a conhecer estas cartas, estou, todaviamuito longe de esperar da$ um !#ito: e que não se tome estasinceridade da minha parte pela modéstia "ingida de um autor( poisdeclaro com a mesma "ranqueza que, se esta coleção não me tivesseparecido digna de ser o"erecida ao público, eu não me teria ocupadodela. 3ratemos de conciliar esta aparente contradição.

2 mérito de uma obra comp+e&se da sua utilidade ou doagrado que desperta, e mesmo duma coisa e doutra, quando disso ésuscet$vel( mas o !#ito, que não prova sempre o mérito, deve&se"requentemente mais - escolha do assunto que - sua e#ecução, aocon'unto dos motivos que apresenta do que - maneira como eles sãotratados. 2ra contendo esta coleção, como o seu t$tulo anuncia, ascartas de toda uma sociedade, reina nela uma diversidade deinteresse que en"raquece o do leitor.

lém disso, sendo quase todos os sentimentos que a$ see#primem "ingidos ou dissimulados, dei#am de poder mesmo e#citarum interesse que não se'a o de curiosidade sempre muito abai#o do

de sentimento, e que, sobretudo, conduz menos - indulg!ncia edei#a tanto mais a perceber as "altas que se encontram nospormenores, quanto estes se op+em constantemente ao dese'o queunicamente se quer satis"azer.

Estes de"eitos são talvez resgatados, em parte, por umaqualidade que do mesmo modo tem origem na natureza da obra( é avariedade dos estilos( mérito que um autor atinge di"icilmente, masque se apresentava aqui por si pr*prio, e que ao menos e#clui oaborrecimento da uni"ormidade.

lgumas pessoas poderão ainda esperar encontrar para seuproveito um número assaz grande de observaç+es, ou novas ou

pouco conhecidas, e que se encontram dispersas nestas cartas. Enisso se resume, segundo creio, tudo que se pode esperar comomotivos de agrado, usando, aliás, de um 'u$zo e#tremamente"avorável.

utilidade da obra, que porventura será ainda maiscontestada, parece&me, todavia "ácil de estabelecer. 4ulgo pelomenos que é prestar um serviço aos costumes divulgar os meios queempregam os que os t!m maus para corromper os que os t!m bons,e creio que estas cartas poderão concorrer e"icazmente para esse"im. Encontrar&se&á também nelas a prova e o e#emplo de duas

verdades importantes que dir&se&ia serem desconhecidas, tão poucoelas são praticadas: a primeira, que toda a mulher que consente em

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receber no seu meio um homem sem moral acaba por se tornar asua v$tima( a outra, que é pelo menos imprudente toda a mãe queadmita que outra pessoa além dela tenha a con"iança de sua "ilha. 2s

 'ovens de um e de outro se#o poderiam também aprender aqui que aamizade que as pessoas de maus costumes parecem dedicar&lhes tão

"acilmente não é mais que uma perigosa cilada, tão "atal - sua"elicidade como - sua virtude. 5arece&me, no entanto, muito detemer aqui o abuso, que anda sempre tão perto da medida 'usta( e,longe de aconselhar esta leitura - mocidade, parece&me maisimportante a"astar dela todas as deste g!nero. época em que talleitura pode dei#ar de ser perigosa e tornar&se útil parece&me ter sidobem escolhida, para o seu se#o, por uma boa mãe não apenasinteligente, mas de intelig!ncia bem guiada. 64ulgo6, me dizia ela,depois de ter lido o manuscrito desta correspond!ncia, 6que prestareium bom serviço a minha "ilha, dando&lhe este livro no dia do seucasamento.6 )e todas as mães de "am$lia pensarem isto da obra,

"elicitar&me&ei eternamente por t!&la publicado.7as, partindo ainda desta suposição "avorável, a"igura&se&me

sempre que esta coleção deve agradar a pouca gente. 2s homens eas mulheres de costumes depravados terão interesse em denegriruma obra que pode ser&lhes pre'udicial( e como não lhes "altaastúcia, talvez se lembrem de p%r do seu lado os rigoristas,alarmados pelo quadro de maus costumes que não houve receio deapresentar&lhes. 2s que se 'ulgam esp$ritos "ortes não terão qualquerinteresse por uma mulher devota, que por isso mesmo será para elesuma mulher sem import8ncia, enquanto que os devotos "icarão

descontentes por verem sucumbir a virtude, quei#ando&se do "racopoder com que é mostrada a religião.5or sua vez, as pessoas de gosto delicado hão&de en"astiar&se

com o estilo demasiado simples e de"eituoso de algumas destascartas, enquanto que o comum dos leitores, seduzido pela idéia deque tudo o que é impresso é o "ruto de um trabalho, 'ulgará ver emalgumas outras a maneira di"icilmente conseguida de um autor quese mostra por detrás da personagem que "ala a seu mandado.

En"im, talvez venha a dizer&se, na generalidade, que cadacoisa não vale senão no lugar onde está colocada( e que, seordinariamente o estilo demasiado castigado dos autores tira de "ato

toda a graça -s cartas de sociedade, as neglig!ncias destas setornam verdadeiros erros e as tornam insuportáveis, uma vezentregues - publicação.

9on"esso com sinceridade que todas estas censuras podemter "undamento( creio também que me seria imposs$vel responder&lhes, e mesmo sem ir além da e#tensão de um pre"ácio. 7as devecompreender&se que, se me "osse necessário responder a tudo, seriaisso sinal de que a obra não responderia a nada( e que, se eu assim opensasse, teria suprimido ao mesmo tempo o pre"ácio e o livro.

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PRIMEIRA PARTE

CARTA I

CECÍLIA VOLANGES A SOFIA CARNAY*

o convento das ;sulinas de...

<em v!s, minha boa amiga, que cumpro a minha palavra, eque as toucas e laços não ocupam todo o meu tempo( sempre me háde "icar algum para ti. 7as olha que s* ho'e vi mais adereços do quenos quatro anos que passamos 'untas( e creio que a orgulhosa

 3anvillel terá maior aborrecimento com a minha primeira visita, emque eu conto perguntar por ela, do que ela pensou que nos causariatodas as vezes que vinha ver&nos em iorch.

7amã consultou&me sobre todos os pormenores( trata&memuito menos como pensionista do que noutro tempo.

 3enho uma criada de que disponho, e escrevo&te em umasecretária muito bonita, de que possuo a chave, e onde posso "echartudo o que quiser. 7amã disse&me que a verei todos os dias logoque ela se levante( que bastará que eu este'a penteada para 'antar,porque estaremos sempre s*s, e que então ela me dirá a hora emque devemos 'untar&nos - tarde. 2 resto do tempo está - minhadisposição, e tenho a minha harpa, o meu desenho e livros como no

convento( s* não estará a madre 5erpétua para ralhar comigo, edependerá apenas de mim estar sempre sem "azer nada: mas comonão tenho a minha )o"ia para conversar e para rir, pre"iro entãoocupar&me dela.

inda não são cinco horas( não devo estar com a 7amã senão-s sete: ora aqui está um grande intervalo, para o caso em quetivesse alguma coisa a dizer&te= 7as ainda não me "alaram de nada(e sem os preparativos que ve'o "azer, e a quantidade de costureirasque v!m por minha causa, 'ulgaria que ninguém pensa em casar&me,e que é mais um disparate da boa 4ose"ina.

7as a verdade é que a 7amã me disse tantas vezes que uma

menina deve "icar no convento até casar, que 'ulgo que 4ose"ina temrazão, visto que ela me "ez sair de lá.

caba de parar uma carruagem - porta, e a 7amã mandou&me que "osse ter com ela imediatamente. )e "osse o senhor>

inda não estou vestida, a minha mão treme e o meu coraçãobate.

5erguntei - criada de quarto se sabia quem estava com minhamãe: 62ra6, disse ela, 6é o senhor 9...6 e ria. 2h= 9reio que é ele.?oltarei com certeza a contar&te o que se passou. 2 nome 'á eu sei.ão devo *$ensionista do mesmo convento"azer esperar. deus, até daqui a um momento.

9omo te vais rir da pobre 9ec$lia= 2h= 9omo "iqueienvergonhada=

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7as tu terias ca$do como eu. 0uando entrei nos aposentos da7amã, vi um senhor vestido de preto, de pé, por detrás dela.9umprimentei&o o melhor que pude e "iquei sem me poder me#er domeu lugar. 5odes imaginar como eu o e#aminava=

6)enhora6, disse ele a minha mãe, saudando&me, 6trata&se na

verdade de uma menina encantadora, e sinto melhor do que nunca ovalor dos vossos obséquios6. estas palavras tão positivas tomou&me um tal tremor que não me podia suster( deparei com umapoltrona e sentei&me nela, toda vermelha e con"usa.

7al eu me tinha sentado, eis que o homem se lança a meuspés. Então a tua pobre 9ec$lia perdeu a cabeça( eu estava, comodisse a 7amã, verdadeiramente espavorida. @evantei&me lançandoum grito agud$ssimo(... 2lha, como naquele dia do trovão.

7amã soltou uma gargalhada e disse&me: 6Então, que tem>)ente&se e d! o seu pé a esse senhor.6 a verdade, minha queridaamiga, o senhor era um sapateiro. ão posso dizer&te como "iquei

envergonhada( por "elicidade s* ali estava a 7amã. 4ulgo que, quando "or casada, não voltarei a servir&me daquele

sapateiro.Aás&de convir que 'á sei muitas coisas= deus. )ão perto de

seis horas, e a minha criada de quarto disse&me que tenho de mevestir. deus, minha querida )o"ia( gosto tanto de ti como quandoestava no convento.

5. ). & ão sei por quem enviar esta carta( por isso espero que 4ose"ina venha.

5aris, B de gosto de CD .

CARTA II

A MARQUESA DE MERTEUIL AO VISCONDE DE VALMONT

o castelo de...

?olte meu caro ?isconde, volte( que "az o senhor, que pode osenhor "azer em casa de uma velha tia cu'os bens lhe estãogarantidos> 5arta imediatamente( é&me preciso aqui. 3ive umae#celente idéia, e dese'o con"iar&lhe a e#ecução. Estas palavrasdeveriam bastar&lhe( e, muito honrado pela minha escolha, devia vir,com solicitude, receber de 'oelhos as minhas ordens.

7as o senhor abusa das minhas bondades, mesmo depois quedei#ou de aproveitá&las( e na alternativa de um *dio eterno ou deuma e#cessiva indulg!ncia, a sua "elicidade quer que a minhabondade a conduza. ese'o pois instru$&lo sobre os meus pro'etos:mas 'ure&me que como "iel cavaleiro não correrá nenhuma aventura

sem que esta se'a levada ao "im. Ela é digna de um her*i: o senhorservirá o amor e a vingança( será en"im uma astúcia a mais a p%r nas

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suas mem*rias: sim, nas suas mem*rias, pois eu quero que elasse'am publicadas um dia, encarrego&me de escrev!&las. 7asdei#emos isso, e voltemos ao que me preocupa.

7adame de ?olanges vai casar a "ilha: é ainda um segredo(mas desde ontem que estou na posse dele. E quem 'ulga que ela

escolheu para genro> 2 9onde de ercourt. 0uem diria que eu viria aser prima de ercourt> )into&me possu$da de tal "uror=...5ois bem= ão adivinhou ainda> 2h, intelig!ncia lenta= 4á lhe

perdoou, pois, a aventura da Fntendente> E eu, não tenho raz+espara me quei#ar dele mais ainda, seu monstro> 7as vou&me acalmar,e a esperança de me vingar lança a serenidade na minha alma.

ecerto 'á se tem aborrecido cem vezes, tal como eu, com aimport8ncia que ercourt atribui - sua pr*#ima conquista, e com atola presunção que o disp+e a crer que evitará a sorte inevitável.

9onhece as suas rid$culas prevenç+es a "avor das educaç+esclaustrais, e o seu preconceito, ainda mais rid$culo, em relação -

modéstia das louras. Eu apostaria, de "ato, que, apesar das sessentamil libras de renda da pequena ?olanges, ele nunca "aria essecasamento se ela "osse morena, ou se não tivesse estado noconvento. 5rovemos&lhe, pois que é apenas um tolo( com certeza háde s!&lo um dia, não é isso que me preocupa: mas o agradável seriaque ele começasse por a$. 9omo n*s nos divertir$amos no diaseguinte ouvindo&o gabar&se, pois ele há de gabar&se( e depois, se o?isconde chegar a instruir essa rapariguinha, será preciso muitopouca sorte se o ercourt não se tornar como qualquer outro, a"ábula de 5aris.

liás, a hero$na deste novo romance merece todos os seuscuidados: é na verdade bonita( tem apenas quinze anos, é um botãode rosa( acanhada, de "ato, como 'á se não usa, e de modo nenhuma"etada: mas v*s, os homens, não temeis isso( além do mais, ésenhora de certo olhar langoroso que na verdade promete muito.crescente a tudo isto que sou eu que a recomendo: não tem maisque agradecer&me e obedecer.

Geceberá esta carta amanhã de manhã. E#i'o que amanhã -ssete horas da tarde este'a em minha casa. ão receberei ninguém*$ara entender esta passagem, deve saber%se que o &onde de 'ercourt tinhadei(ado a )arquesa de )erteuil pela ntendente de, que lhe tinha sacri+icado oisconde de almont, e que +oi então que a )arquesa e o isconde se ligaram umao outro &omo esta aventura é muito anterior aos acontecimentos de que tratamestas cartas -ulgou%se dever suprimir toda a correspondência que com ela se liga!" do #1senão as oito, nem mesmo o 9avaleiro reinante: esse não temcabeça para tamanha empresa. <em v! que o amor não me cega. Hsoito horas outorgo&lhe a liberdade, e as dez voltará para cear com obelo ob'eto, pois a mãe e a "ilha ceiam sempre em minha casa.deus( passa do meio&dia, em breve dei#arei de me ocupar do?isconde.

5aris, I de gosto de CD .

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CARTA III

CECÍLIA VOLANGES A SOFIA CARNAY 

inda não sei nada, minha boa amiga. 7amã tinha ontemmuita gente a cear. pesar do interesse que tinha em e#aminar, oshomens principalmente, aborreci&me muito. 3oda a gente, homens emulheres, olhava muito para mim, e depois punham&se a "alar aoouvido( e eu bem via que era de mim que "alavam.

Fsto "azia&me corar( era coisa em que eu não tinha mão.<em queria impedi&lo, pois reparei que, quando olhavam para

as outras mulheres, elas não coravam( ou talvez "osse a pintura quenão me dei#ava ver o seu embaraço, pois deve ser muito di"$cildei#ar de corar quando um homem nos olha "i#amente.

2 que mais me inquietava era não saber o que pensavam a

meu respeito. 9reio, no entanto ter ouvido duas ou tr!s vezes apalavra bonita( mas ouvi muito distintamente dizer acanhada. E issodeve ser verdade, pois a senhora que pronunciava essa palavra éparente e amiga de minha mãe.

5areceu&me mesmo que de repente tinha sentido amizade pormim.

oi a única pessoa que "alou comigo um pouco durante toda anoite.

manhã ceamos em casa dela.2uvi ainda, depois da ceia, um homem que estou certa que

"alava de mim, e que dizia a outro: 6J preciso dei#ar amadurecer,veremos este Fnverno.6 3alvez se'a esse que deve casar comigo( massendo assim, não será antes de quatro meses= <em dese'aria saberde que se trata.

9hegou agora 4ose"ina, e diz&me que está com pressa. 7asquero contar&te ainda uma das minhas acanhezas. 2h, creio que essasenhora tem razão=

epois da ceia puseram&se a 'ogar. Eu "iquei perto da 7amã(não sei como isso aconteceu, mas adormeci quase a seguir.

cordou&me uma estrepitosa gargalhada. ão sei se riam demim, mas assim o creio. 7amã permitiu que me retirasse, e com

isso deu&me grande prazer. Fmagina que passava das onze horas.deus, minha querida )o"ia( ama sempre muito a tua 9ec$lia. 5odesestar certa de que a sociedade não é tão divertida como aimaginávamos.

5aris, I de gosto de CD .

CARTA IV

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

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Em 5aris

s suas ordens são encantadoras( e a sua maneira de dá&las émais amável ainda. minha amiga poderia "azer amar o despotismo.

ão é a primeira vez, como sabe, que eu lamento não ser 'á o

seu escravo( e por muito monstro que diga que eu sou, não recordonunca sem prazer o tempo em que me honrava com ep$tetos maisdoces. 7uitas vezes mesmo dese'o voltar a merec!&los, e acabar pordar, a seu lado, um e#emplo de const8ncia ao mundo. 7as outrosinteresses mais altos nos chamam: conquistar é o nosso destino. Jpreciso segui&lo. 3alvez ao "im do caminho voltemos a encontrar&nos(pois, se'a dito sem que se zangue, minha bela 7arquesa, a verdade éque a senhora me segue com um passo pelo menos igual. E vistoque, separando&nos para a "elicidade do mundo, cada um de n*sprega por seu lado a sua "é, parece&me que, nesta missão de amor, aminha amiga "az mais prosélitos do que eu. 9onheço o seu zelo, o

seu ardente "ervor. E se eus nos 'ulgasse segundo as nossas obras,a senhora seria um dia a padroeira de alguma grande cidade,enquanto que o seu amigo seria quando muito um santo de aldeia.

dmira&se desta linguagem, não é verdade> 7as há oito diasque eu não ouço nem "alo outra( e é para me aper"eiçoar nela queme ve'o "orçado a desobedecer&lhe.

ão se zangue e ouça&me. epositária de todos os segredosdo meu coração, vou con"iar&lhe o maior pro'eto que 'amais "ormei.0ue me prop+e a minha amiga> )eduzir uma 'ovem que não viunada, que não conhece nada( que, por assim dizer, me seria

entregue sem de"esa( que com certeza se embriagará com umaprimeira homenagem, e que será levada mais pela curiosidade doque pelo amor. Aá vinte homens que nessa empresa seriam tão bemsucedidos como eu. 4á não acontece o mesmo com a empresa queme preocupa( o seu !#ito valer&me&á tanto prazer como gl*ria. 2amor que prepara a minha coroa hesita ele pr*prio entre a mirta e oloureiro, ou antes os reunirá para honrar o meu triun"o. té a minhaboa amiga será tomada de um santo respeito, e dirá comentusiasmo: 6J este o homem segundo o meu coração.6

minha amiga conhece a mulher do 5residente 3ourvel, a suadevoção, o seu amor con'ugal, os seus princ$pios austeros.

Eis o alvo do meu ataque( eis o inimigo digno de mim( eis o"im que eu pretendo atingir:Et si de lKobtenir ce nKemporte le pri#,

 4Kaurais du moins =honneur de lKavoir entrepris.J permitido citar maus versos, quando são de um grande

poeta.9omo deve saber, o 5residente de 3ourvel está em <orgonha,

seguindo um grande processo Lespero "azer&lhe perder outro maisimportante1. sua inconsolável metade deve passar aqui todo otempo desta a"litiva viuvez. ;ma missa por dia, algumas visitas aospobres da região, oraç+es de manhã e - noite, passeios solitários,

piedosas conversas com a minha velha tia, e uma vez por outra um

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triste 'ogo de Mhist, deviam ser as suas únicas distraç+es. Estou&lhepreparando outras mais e"icazes.

2 meu an'o bom conduziu&me aqui para a sua "elicidade epara minha. Fnsensato= Eu lamentava as vinte e quatro horas que iasacri"icar em consideração aos respeitos "amiliares que são de uso.

9omo eu seria castigado se me obrigassem a voltar a 5aris=elizmente são precisas quatro pessoas para 'ogar o Mhist( ecomo não há aqui mais ninguém além do prior do lugar, a minhaeterna tia instou muito comigo para que eu lhe sacri"icasse algunsdias. 4á adivinhou que acedi. ão imagina os mimos que ela meprodigaliza desde esse instante, e principalmente como ela estáimpressionada por me ver assistir regularmente -s suas oraç+es e -missa. em por sombras lhe passa pela cabeça qual a divindade queeu ali vou adorar.

E aqui estou eu, há quatro dias, entregue a uma pai#ão "orte: minha amiga sabe com que "orça eu sei dese'ar, e como os

obstáculos pesam pouco para mim( mas o que ignora é quanto asolidão vem re"orçar o ardor dos dese'os. penas uma idéia meocupa( penso nela de dia, sonho com ela de noite. J&meabsolutamente necessário possuir essa mulher, para me salvar dorid$culo de estar apai#onado por ela( pois aonde não conduz umdese'o contrariado> N delicioso prazer= Eu te imploro para a minha"elicidade, mas principalmente para o meu descanso.

9omo n*s os homens somos "elizes por as mulheres sede"enderem tão mal= )em isso, ser$amos 'unto delas apenas t$midosescravos.

este momento sinto&me possu$do de reconhecimento pelasmulheres "áceis, o que, naturalmente, me conduz a seus pés. nteeles me a'oelho para obter o meu perdão, e nessa postura terminoesta longa carta.*. se eu não conseguir o prémio obter, /erei ao menos a honra de o havertentado 0a 1ontaine !" do #2

deus, minha amiga: longe de mim qualquer reserva.

o castelo de..., O de gosto de CD .

CARTA V

A MARQUESA DE MERTEUIL AO VISCONDE DE VALMONT

)abe, ?isconde, que a sua carta é de uma insol!ncia rara, eque eu poderia ter&me zangado> 9ontudo, ela provou&me claramenteque o ?isconde perdeu a cabeça e s* isso o salvou da minhaindignação. miga generosa e sens$vel, esqueço a in'úria que medirige para me ocupar apenas do perigo que corre( e embora se'a

muito aborrecido raciocinar, cedo - necessidade que tem nestemomento dos meus racioc$nios.

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2 ?isconde, possuir a 5residente de 3ourvel= 7as que rid$culocapricho= Geconheço bem a sua má cabeça que não sabe dese'arsenão o que cr! não poder obter. 0ue tem pois essa mulher> 3raçosregulares, se quiser, mas nenhuma e#pressão( so"r$vel de corpo, massem graça( vestida sempre de modo que "az rir= 9om os seus molhos

de lacinhos no pescoço e o corpete que lhe chega ao quei#o= igo&lho como amiga, não lhe seria preciso ter duas mulheres comoaquela para perder toda a minha consideração. @embre&se do dia da"esta de caridade em )aint&Goch, em que o ?isconde tanto meagradeceu por eu lhe ter proporcionado tal espetáculo. 5arece queainda a estou vendo, dando a mão -quele trangalhadanças decabelos compridos, pronta a cair a cada passo, tendo sempre o cestode quatro varas em cima da cabeça de alguém, e corando cada vezque a cumprimentavam. 0uem lhe diria então que chegaria a dese'aressa mulher> ?amos, ?isconde, tenha a bondade de corar e voltar asi. 5rometo&lhe guardar segredo.

E depois, ve'a a série de coisas desagradáveis que o esperam=0ue rival terá a combater> ;m marido= ão se sente

humilhado s* ante esta palavra> 0ue vergonha se "or mal sucedido=E mesmo no caso de triun"ar, que pequena gl*ria o espera= igo&lhemais: não conte tirar dali nenhum prazer. J isso poss$vel com asmulheres recatadas> 0uero dizer com as que o são de, boa "é:reservadas até no meio do prazer, não podem o"erecer senão meiosgozos. 2 abandono inteiro de si mesma, o del$rio da volúpia em que oprazer se depura pelo seu e#cesso, estas vantagens do amor não sãoconhecidas por tais mulheres. qui lho pro"etizo: na mais "eliz das

suposiç+es, a sua 5residente 'ulgará ter "eito tudo pelo ?iscondetratando&o como seu marido, e na intimidade con'ugal, mesmo amais terna, há sempre dois.

este caso é muito pior ainda( essa virtuosa senhora édevota, e a sua devoção é das que condenam a uma eterna in"8ncia.J poss$vel que o ?isconde venha a saltar o obstáculo, mas não segabe de vir a destru$&lo: vencedor do amor de eus, não o será domedo do iabo( e quando, tendo a sua amante nos braços, tivesseconhecido mais cedo essa mulher, é poss$vel que "izesse delaqualquer coisa( mas tem 'á vinte e dois anos e há cerca de dois que écasada. 9reia&me, ?isconde, quando uma mulher se encondeu a tal

ponto, é preciso abandoná&la - sua sorte( nunca há de passar de umaespécie.o entanto, é por esse belo ob'eto que o ?isconde recusa

obedecer&me( que se enterra no túmulo de sua tia, e que renuncia -aventura mais deliciosa e mais de molde a proporcionar&lhehonrarias. 5or que "atalidade será que ercourt tem sempre qualquervantagem sobre o ?isconde> alo&lhe sem má disposição, acredite:mas,neste momento,estou tentada a crer que o senhor não merece asua reputação( estou tentada principalmente a retirar&lhe a minhacon"iança. unca poderei acostumar&me a dizer os meus segredos aoamante de 7adame de 3ourvel.

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)aiba no entanto que a pequena ?olanges 'á "ez andar umacabeça - roda.2 'ovem ancenP está louco por ela( e na verdade elacanta melhor do que é dado a uma pensionista de convento.

J quase certo que ensaiam muitos duetos e ia 'urar que debom grado ela se prestaria ao un$ssono( mas este ancenP é uma

criança que perderá o seu tempo em galanteios sem chegar a nadade positivo. 5elo seu lado a pequenota é bastante arisca( e, se'a oque "or que aconteça, sempre há de ser menos divertido do que se o?isconde se resolvesse a intervir. 5or isso estou aborrecida e comcerteza o 9avaleiro ouvirá ralhar - sua chegada.

Eu aconselho&o a ser submisso, pois neste momento não mecustaria nada romper com ele. Estou certa de que, se eu tivesse aboa lembrança de o dei#ar neste momento, ele "icaria cheio dedesespero( e nada me diverte tanto como um desespero amoroso.

9hamar&me&ia pér"ida, e essa palavra sempre me deu prazer(depois da palavra 6cruel6, é a mais doce para os ouvidos de uma

mulher, e a que dá mais trabalho a merecer. alando sério vouocupar&me deste rompimento. qui está um acontecimento de que o?isconde será o causador= 5onho&o sobre a sua consci!ncia.

deus. Gecomende&me -s oraç+es da sua 5residente.

5aris, D de gosto de CD .

CARTA VI

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

J pois certo não e#istir mulher alguma que não abuse doascendente que conquistou= E mesmo a senhora, a quem tantasvezes chamei indulgente amiga, dei#ou en"im de o ser, e não receiaatacar&me no ob'eto das minhas a"eiç+es= 9om que traços ousoupintar 7adame de 3ourvel=...

0ue homem não teria pagado com a vida essa insolenteaudácia> 0ue outra mulher que não "osse a 7arquesa teria podidoenunciá&la sem suscitar da minha parte uma pequena vingança> 5or

"avor, não me submeta a tão rudes provas( não garanto que as possasuportar. Em nome da amizade, espere que eu possua essa mulher,se quiser dizer mal dela. ão sabe que s* a volúpia tem o direito dedissipar a cegueira do amor>

7as que digo eu> caso 7adame de 3ourvel tem necessidadede ilusão> ão( para ser adorável basta&lhe ser ela pr*pria.

9ensura&a a 7arquesa por se vestir mal( estou de acordo:todos os vestuários a pre'udicam( tudo o que a esconde a des"eia. Jno abandono do tra'o caseiro que ela é verdadeiramenteencantadora.

raças aos calores opressivos que so"remos, um simples

roupão de pano dei#a&me ver as suas "ormas redondas e "le#$veis.

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;ma ligeira musselina cobre&lhe a garganta( e os meusolhares "urtivos, mas penetrantes, descobriram&lhe 'á as linhassedutoras. 2 seu rosto, diz a 7arquesa, não tem nenhumae#pressão.

E que poderia e#primir, nos momentos em que nada lhe "ala

ao coração> ão, sem dúvida, ela não tem, como as presumidasmulheres do nosso meio, aquele olhar mentiroso que nos seduzalgumas vezes e nos engana sempre. ão sabe cobrir o vazio de uma"rase com um sorriso estudado( e embora tenha os mais belos dentesdo mundo, não costuma rir senão do que a diverte. o entanto épreciso ver como, nos 'ogos engraçados, ela o"erece a imagem deuma alegria ing!nua e "ranca=

9omo, 'unto de um in"eliz que ela se apressa a socorrer, o seuolhar anuncia o contentamento puro e a bondade compadecida=

J preciso ver, principalmente - menor palavra de elogio ou dea"ago, desenhar&se, no seu rosto celeste, o comovente embaraço de

uma modéstia que não é "ingida. 7odesta e devota, é&o sem dúvida,mas da$ a 'ulgá&la "ria e inanimada=... 2 que penso dela é bemdi"erente. 0ue e#traordinária sensibilidade não deve ter parabene"iciar com ela o marido, e para amar sempre um ser sempreausente= 0ue prova mais "orte se pode dese'ar> 3odavia, conseguidescobrir mais uma.

0uando há dias sa$mos a passear, arran'ei as coisas demaneira que nos "oi necessário transpor um barranco( e, emboramuito lesta, 7adame de 3ourvel é ainda mais t$mida. J "ácil de verque uma mulher virtuosa tem sempre receio de saltar o barranco.

oi&lhe necessário con"iar&se - minha pessoa. 3ive nos meusbraços essa mulher modesta. 2s nossos preparativos e a passagemda minha velha tia tinham "eito rir -s gargalhadas a 'ovial devota:mas, no momento em que a agarrei, por um movimentopropositadamente desastrado, os nossos braços enlaçaram&semutuamente. pertei o seu seio contra o meu( e, nesse curtointervalo, senti o seu coração bater mais rápido. 2 rosto coloriu&se&lhe de uma adorável vermelhidão, e no seu pudibundo embaraçopude ver que o seu coração tinha palpitado de amor e não de receio.Entretanto minha tia enganou&se Q como a minha amiga & e disse: 6criança teve medo6( mas a encantadora ingenuidade da criança não

lhe permitiu a mentira, e "ez que ela respondesse singelamente: 2h=ão, mas.... Esta simples palavra esclareceu&me. esde aquelemomento, a doce esperança substitui a cruel inquietação. 5ossuireiesta mulher( hei&de arrebatá&la ao marido, que a pro"ana: ousareiroubá&la ao pr*prio eus que ela adora. 0ue del$cia seralternadamente o ob'eto e o vingador dos seus remorsos= @onge demim a idéia de destruir os preconceitos que a rodeiam= )ervirão paraaumentar a minha "elicidade e a minha gl*ria. 0ue creia na virtude,mas que a sacri"ique por mim( que as suas "altas a aterrem sempoder evitá&las( e que, agitada de mil terrores, ela não possaesquec!&los, venc!&los senão nos meus braços.

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9onsentirei então que ela me diga: 6doro&te6 ( ela s*, entretodas as mulheres, será digna de pronunciar essa palavra. Eu serei,verdadeiramente, o eus que ela pre"ere.

alemos de boa "é: nas nossas combinaç+es tão "rias como"áceis, aquilo a que chamamos "elicidade é apenas prazer. 5oderei

con"essar&lho>5ensava eu que o meu coração estava gasto, e, encontrandoem mim apenas os sentidos, lastimava a minha velhice prematura.7adame de 3ourvel restituiu&me as encantadoras ilus+es da

 'uventude. 4unto dela, não tenho necessidade de prazer para ser"eliz. única coisa que me mete medo é o tempo que me vai tomaresta aventura( pois não ouso dei#ar nada ao acaso. 7uito embora melembrem as minhas audácias bem sucedidas, não posso resolver&mea p%&las em prática.

5ara que eu se'a verdadeiramente "eliz( é preciso que ela sed!( e não é pequena empresa.

Estou certo de que a 7arquesa admiraria a minha prud!ncia.inda não pronunciei a palavra amor( mas 'á chegamos -s

palavras con"iança e interesse. 5ara a enganar o menos poss$vel, eprincipalmente para prevenir o e"eito das murmuraç+es quepoderiam chegar aos seus ouvidos, descrevi&lhe eu pr*prio, comoacusando&me, alguns dos meus de"eitos mais conhecidos.

7arquesa havia de rir se visse a candura com que ela me"az serm+es. iz ela que quer converter&me. em ela imagina aindao que lhe virá a custar tal tentativa. Está longe de pensar quede"endendo, como ela diz, as in"ortunadas que eu levei - perdição,

advoga de antemão a sua pr*pria causa. Esta idéia veio&me ontemno meio de uma das suas prédicas, e eu não pude recusar&me aoprazer de a interromper, para lhe a"irmar que "alava como umpro"eta. deus, minha bela amiga. <em v! que não estou perdidosem recurso.

5. ) . & prop*sito, esse pobre 9avaleiro, matou&se de desespero>Em boa verdade, a 7arquesa é uma pessoa cem vezes pior do queeu, e sentir&me&ia humilhado se tivesse amor&pr*prio.

o 9astelo de..., R de gosto de CD .

CARTA VII

CECÍLIA VOLANGES A SOFIA CARNAY 

)e nada te disse do meu casamento, é porque não estou maisadiantada do que no primeiro dia. costumo&me a não pensar nisso esinto&me muito bem no meu g!nero de vida. Estudo muito canto eharpa( parece&me que gosto mais desses estudos desde que não

tenho pro"essor, ou antes, desde que tenho um pro"essor melhor. 29avaleiro ancenP, aquele senhor de que "alei, e com quem cantei

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em casa de 7adame de 7erteuil, tem a bondade de vir aqui todos osdias, e de cantar comigo horas inteiras.

J e#tremamente amável. 9anta como um an'o, e comp+elindas músicas para as quais escreve também as palavras. J penaque ele se'a 9avaleiro de 7alta= credito que, se ele se casasse, a

mulher seria muito "eliz... J cativante a doçura do seu trato. izcoisas sem ar de galanteio, e no entanto tudo o que ele diz agrada.9onversa muito comigo, sobre a música e sobre outras coisas( massabe insinuar nas suas cr$ticas tanto interesse e animação, que éimposs$vel não lhe agradecer. )implesmente, quando olha para n*s,tem o ar de dizer qualquer coisa que nos prende. lém de tudo isto, émuito paciente. 2ntem, por e#emplo, tinha sido convidado para umgrande concerto( pre"eriu "icar todo o serão comigo e com a 7amã.Fsto deu&me muito prazer, pois, quando ele não está, ninguém "alacomigo e aborreço&me( ao passo que quando ele está presente,cantamos em con'unto e conversamos. 3em sempre alguma coisa

para me dizer. Ele e 7adame de 7erteuil são as duas únicas pessoasamáveis que encontrei. 7as tenho de dizer&te adeus, minha queridaamiga: prometi que teria ho'e estudada uma arieta deacompanhamento muito di"$cil, e não quero "altar - minha palavra.

?ou lançar&me ao estudo até que ele venha.

D de gosto de CD .

CARTA VIIIA PRESIDENTE DE TOURVEL A MADAME DE VOLANGES

inguém pode ser mais sens$vel do que eu, senhora, -con"iança que me testemunhais, nem ter maior interesse do que eupelo "uturo casamento de 7ademoiselle de ?olanges. e toda aminha alma lhe dese'o uma "elicidade da qual não duvido que elase'a digna, e para a qual contribuirá sem dúvida a prud!ncia de quetendes dado prova. ão conheço o senhor 9onde de ercourt( mas,honrado com a vossa escolha, s* posso ter dele uma idéia muito

lison'eira. @imito&me, senhora, a dese'ar para esse casamento umresultado tão "eliz como o do meu, que é igualmente obra vossa, epela qual cada vez sinto maior reconhecimento.

0ue a "elicidade de vossa "ilha se'a a recompensa da queconseguistes para mim( e possa a melhor das amigas ser também amais "eliz das mães=

)into&me verdadeiramente penalizada por não poder o"erecer&vos de viva voz a homenagem deste voto sincero, nem travarconhecimento com 7ademoiselle de ?olanges tão cedo comodese'ais. epois de ter bene"iciado das vossas bondadesverdadeiramente maternais, tenho o direito de esperar dela a

amizade terna de uma irmã. Gogo&vos, senhora, que lhe "açais estepedido da minha parte, esperando estar - altura de merec!&la.

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9onto "icar no campo durante todo o tempo da aus!ncia do)enhor de 3ourvel. )erve&me esse tempo para gozar e aproveitar dacompanhia de 7adame de Gosemonde. Esta senhora mantémsempre o seu encanto( a idade nada lhe "ez perder. 9onserva toda asua mem*ria e animação. )* o seu corpo tem oitenta e quatro anos(

o esp$rito tem apenas vinte.2 nosso isolamento é alegrado por seu sobrinho, o ?iscondede ?almont, que teve a bondade de nos sacri"icar alguns dias.

9onhecia&o apenas pela sua reputação, a qual me não "aziadese'ar conhec!&lo melhor( mas parece&me que vale mais do que ela.qui, onde turbilhão do mundo não o pre'udica, diz coisas razoáveiscom uma espantosa "acilidade e acusa&se do mal que tem praticadocom uma candura rara. ala&me sempre com muita con"iança e euprego&lhe os meus serm+es com muita severidade.

?*s, que o conheceis, devereis convir que seria uma belaconversão a "azer: mas eu não tenho dúvidas de que, apesar das

suas promessas, oito dias de 5aris lhe "açam esquecer todas asminhas prédicas. sua estada aqui será pelo menos um intervalo nasua conduta habitual: e eu creio que, atendendo - sua maneira deviver, o que ele pode "azer de melhor é não "azer nada. )abendo queestou ocupada a escrevermos, encarregou&me de vos apresentar assuas homenagens respeitosas. ceitai também as minhas com abondade que vos conheço, e não duvideis nunca dos sentimentossinceros com que tenho a honra de ser, etc.

o castelo de..., R de gosto de CD .

CARTA IX

MADAME DE VOLANGES A PRESIDENTE DE TOURVEL

unca duvidei nunca, minha 'ovem e bela amiga, nem daamizade que tendes por mim, nem do interesse sincero que tomaisem tudo que me diz respeito. ão é para esclarecer esse ponto, queespero este'a assente para sempre entre n*s, que respondo - vossa

resposta: mas 'ulgo que não poderei dispensar&me de conversarconvosco a respeito do ?isconde de ?almont.9on"esso que não esperava vir a encontrar o nome desse

senhor nas vossas cartas. e "ato, que pode haver de comum entrev*s e ele> ?!&se bem que não conheceis esse homem( pois ondepoder$eis ter aprendido a "azer idéia do que é a alma dum libertino>alais&me da sua rara candura.

h, sim: a candura de ?almont deve ser de "ato muito rara.Ele é ainda mais "also e perigoso do que amável e sedutor, e nunca,desde que atingiu a idade viril, nunca deu um passo ou disse umapalavra sem ter um pro'eto, e nunca teve um pro'eto que não "osse

criminoso ou desonesto.

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7inha amiga, conheceis&me bem( bem sabeis que, entre asvirtudes que me empenho em adquirir, a indulg!ncia não é daquelasque mais prezo. 5or isso, se ?almont "osse arrastado por pai#+esardentes( se, como tantos outros, ele tivesse sido seduzido peloserros da 'uventude, embora censurasse a sua conduta, eu lamentaria

a sua pessoa, e esperaria, em sil!ncio, a hora em que um regresso"eliz o "izesse reconquistar a estima das pessoas honestas. 7as?almont não é capaz de tal: o seu comportamento é o resultado dosseus princ$pios. )abe "azer o cálculo do que um homem podepermitir&se de horrores sem se comprometer( e para ser cruel e mausem perigo, escolheu por v$timas as mulheres. ão perderei tempo acontar as que ele seduziu( mas quantas delas lançou na perdição>

Essas escandalosas aventuras não chegaram ao vossoconhecimento, na vida recatada e simples que tendes levado.5oderia contar&vos coisas que vos "ariam estremecer( mas os vossosolhos, puros como a vossa alma, seriam conspurcados por

semelhantes quadros. Estou certa de que ?almont não será para v*sum perigo, e por isso não tendes necessidade de semelhantes armaspara vos de"enderdes. única coisa que tenho a dizer&vos é que, detodas as mulheres que ele distinguiu, com !#ito ou não, nenhumadei#ou de ter motivo de quei#a. )* a 7arquesa de 7erteuil "aze#ceção a esta regra geral( s* ela soube resistir&lhe e desarmar a suamaldade. 9on"esso que esse momento da vida da 7arquesa é o quemais a honra a meus olhos: chega para 'usti"icar plenamente aosolhos de todos de algumas inconseqS!ncias que haveria a censurar&lhe quando do princ$pio da sua viuvez.

)e'a como "or, minha boa amiga, o que a idade, a e#peri!nciae principalmente a amizade me autorizam a dizer&vos, é que nasociedade se começa a notar a aus!ncia de ?almont( e que, caso sevenha a saber que ele "icou algum tempo como terceiro entre sua tiae v*s, a vossa reputação "icará entre as mãos dele.

E esta será a maior desgraça que pode acontecer a umamulher.

conselho&vos pois a conseguir da tia que o não retenha pormais tempo( e, se ele teimar em "icar, creio que não deveis hesitarem ceder&lhe o lugar. 7as por que há de ele "icar a$>

0ue "az ele no campo> )e tivésseis alguém a espiar os seus

passos, estou certa de que descobrir$eis que ele apenas escolheu umasilo mais c%modo, para algumas negras aç+es que pensa praticarpor esses lugares. 7as, na impossibilidade de remediar o mal,contentamo&nos em preservar&nos dele.

deus, minha boa amiga. 2 casamento de minha "ilha está umpouco retardado. 2 9onde de ercourt, que esperávamos de um diapara o outro, mandou&me dizer que o seu regimento vai para a9*rsega( e, como há ainda alguma agitação devido - guerra, ser&lhe&á imposs$vel ausentar&se antes do Fnverno. Fsso contraria&me( masautoriza&me a esperar que teremos o prazer de vos ver na boda, eaborrecia&me que tal acontecimento não tivesse a vossa presença.

deus( estou, para além das convenç+es e sem reserva, inteiramenteao vosso dispor.

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5. ) . & @embranças minhas para 7adame de Gosemonde, a quemaprecio tanto como ela merece.

C de gosto de CD .

CARTA X

A MARQUESA DE MERTEUIL AO VISCONDE DE VALMONT

Está amuado comigo, ?isconde> 2u dar&se&á o caso que tenhamorrido> 2u, o que se pareceria muito com isso, não vive senão paraa sua 5residente> Essa mulher, que o "az reviver as ilus+es da

 'uventude, dentro em pouco o "ará reviver também os rid$culos

preconceitos dessa idade. Eis o ?isconde t$mido e escravo( o que valetanto como estar apai#onado. Genunciou -s suas "elizestemeridades. Ei&lo pois a conduzir&se sem princ$pios, dei#ando tudoao acaso, ou antes, ao capricho. ão lhe ocorreu que o amor é, comoa medicina, somente a arte de a'udar a atureza> <em v! que estoua bat!&lo com as suas armas( mas não me sinto orgulhosa por isso,pois é bater num homem ca$do.

J preciso que ela se d!, diz&me o ?isconde( oh =, sem dúvida,é preciso. Ela há de entregar&se como as outras, com a di"erença deque o "ará de má vontade. 7as, para que ela acabe por se entregar,

o verdadeiro meio é começar por obrigá&la. que ponto esta rid$culadistinção é um verdadeiro desprop*sito do amor= Eu digo do amor:porque o ?isconde está apai#onado.

alar&lhe de maneira di"erente seria tra$&lo( seria esconder&lhea sua doença. iga&me, pois, * langoroso amante, 'ulga ter violado asmulheres que possuiu> 7as, por muito dese'o que uma mulher tenhade se entregar, por muito apressada que este'a, ainda lhe é precisoum prete#to( e haverá algum mais c%modo para n*s do que aqueleque nos dá a apar!ncia de ceder - "orça>

5or mim, con"esso&o, uma das coisas que mais me lison'eiamé um ataque vivo e bem "eito, no qual tudo se sucede com ordem

embora com rapidez( que não nos p+e nunca naquela penosacon"usão de termos n*s pr*prias um desacerto de que ao contráriodev$amos aproveitar( que sabe manter o ar de viol!ncia até nascoisas que concedemos, e lison'ear com habilidade as nossas duaspai#+es "avoritas, a gl*ria da de"esa e o prazer da derrota. 9onvenhoque esse talento, mais raro do que se sup+e, me deu sempre prazer,mesmo quando não chegou a seduzir&me, e que algumas vezes meaconteceu render&me unicamente como recompensa. 3al como nosnossos antigos torneios, a <eleza dava o prémio do valor e dadestreza.

7as o senhor, o senhor que 'á não é o mesmo, conduz&se

como se tivesse medo de vencer. 2h= esde quando é que via'a por

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pequenas 'ornadas e por amigo, quando se quer chegar, empregam&se cavalos de posta e toma&se a estrada principal=

7as dei#emos esse assunto, que me aborrece tanto maisquanto me priva do prazer de o ver. 5elo menos escreva&me maisvezes do que o "az, e ponha&me ao corrente dos seus progressos. 4á

reparou que há mais de quinze dias que esta rid$cula aventura opreocupa, e que abandonou todo o conv$vio> prop*sito, o ?isconde parece&se com aquelas pessoas que

mandam regularmente saber not$cias dos seus amigos doentes, masque nunca esperam pela resposta. o "inal da sua última carta,perguntava&me se o 9avaleiro tinha morrido. ão respondi, e o?isconde não se inquietou mais por isso. Esqueceu porventura que oamante é seu amigo nato> 7as tranquilize&se, não morre( ou, setivesse morrido, seria por e#cesso de alegria.

quele pobre 9avaleiro, como ele é terno= como ele é "eitopara o amor= como ele sabe sentir vivamente= Fsto p+e&me a cabeça

- roda.alando sério, a "elicidade per"eita que ele encontra em ser

amado por mim liga&me verdadeiramente a ele.o mesmo dia em que lhe escrevi dizendo que ia provocar o

rompimento, a que ponto o tornei "eliz= o entanto, estava&meocupando dos melhores meios de o "azer desesperar, quando moanunciaram. osse capricho ou racioc$nio, nunca ele me pareceu tãobem. Gecebi&o entretanto de mau humor. Ele esperava passar duashoras comigo, antes que a minha porta se abrisse para toda a gente.isse&lhe que ia sair( perguntou&me aonde ia( recusei&me a dizer&lho.

Ele insistiu. 2nde o senhor nãoestiver, repliquei&lhe eu, com azedume. elizmente para ele, "icoupetri"icado com esta resposta( pois, se ele tivesse dito uma palavra,seguir&se&ia in"alivelmente uma cena que teria precisamente orompimento que eu pro'etava.

dmirada com o seu sil!ncio, lancei os olhos sobre ele semoutro pro'eto, 'uro&lhe, que o de ver a e#pressão com que "icara.

 3ornei a ver naquele rosto encantador uma tristeza, ao mesmotempo pro"unda e terna, - qual o pr*prio ?isconde tem de concordarque é di"$cil resistir. mesma causa produziu o mesmo e"eito( "uivencida pela segunda vez. esde esse momento, s* me ocupei da

maneira de evitar que ele pudesse achar nas minhas palavrasqualquer agravo. 6)aio para tratar de um assunto6, disse&lhe eu comum ar um pouco mais doce, 6e esse assunto diz&lhe respeito( masnão me interrogue. 9eio em minha casa( volte, e saberá de que setrata.6 oi então que ele recuperou a palavra: mas não lhe permitique "izesse uso dela.6Estou com muita pressa6, continuei. 6ei#e&me( até logo - noite.6<ei'ou&me a mão e saiu.

esse momento, para o recompensar, ou talvez para merecompensar a mim pr*pria, resolvi dar&lhe a conhecer a minhacasinha, de cu'a e#ist!ncia ele não suspeita. 9hamo a minha "iel

?it*ria. ?eio&me a en#aqueca( deito&me para todos os meus criados(e, "icando en"im s* com a verdadeira, enquanto ela se vestia de

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lacaio, dis"arcei&me de criada de quarto. Em seguida ela mandou virum "iacre - porta do 'ardim, e partimos 'untas.

9hegada -quele templo de amor, escolhi o roupão maisgalante.

J um vestuário delicioso, de minha invenção: não dei#a ver

nada, e "az adivinhar tudo. 5rometo dar&lhe o modelo para a sua5residente, quando o ?isconde a tiver tornado digna de o usar.epois destes preparativos, enquanto ?it*ria se ocupava de

outros pormenores, li um cap$tulo do )o"á, uma carta de Aeloisa edois contos de @a ontaine, para recordar os di"erentes tons que euqueria tomar. Entretanto o 9avaleiro chega - minha porta, com apressa que tem sempre. 2 porteiro não o dei#a entrar, e diz&lhe queadoeci: primeiro incidente. Entrega&lhe ao mesmo tempo um bilhetemeu, mas não com a minha letra, segundo a minha regra deprud!ncia. Ele abre&o, e encontra escrito pela mão de ?it*ria: 6Hsnove em ponto, no <oulevard, em "rente dos ca"és.6 irige&se para

lá( e, ali, um pequeno lacaio que ele não conhece, que ele 'ulga pelomenos não conhecer, pois é sempre ?it*ria, vem&lhe anunciar que épreciso mandar embora a carruagem e segui&lo. 3odas estasperipécias romanescas lhe esquentavam a cabeça, e uma cabeçaesquentada nada pre'udica.

5or "im chega, e a surpresa e o amor causam nele umverdadeiro encantamento. 5ara lhe dar tempo a recompor&sepasseamos um momento no parque( depois encaminho&o para casa.

Ele v! primeiro dois talheres postos( depois uma cama "eita.5assamos ao quarto de vestir, que estava em todo o seu

esplendor.li, metade por re"le#ão, metade por sentimento, passei osmeus braços em volta dele e dei#ei&me cair a seus pés: 6N meuamigo=6, disse&lhe eu, 6para poder preparar&te a surpresa destemomento, censuro&me por te ter a"ligido com a apar!ncia do meumau humor( por ter um instante velado o meu coração aos teusolhares. 5erdoa&me os agravos( quero e#piá&los - "orça de amor.6 2?isconde 'ulgará do e"eito deste discurso sentimental.

2 "eliz 9avaleiro levantou&me, e o meu perdão "oi seladosobre aquela otomana onde o ?isconde e eu selamos tãoalegremente e da mesma maneira a nossa eterna separação.

9omo t$nhamos seis horas para passarmos 'untos e eu tinharesolvido que todo esse tempo "osse para ele igualmente delicioso,moderei os seus transportes, e a amável coqueteria veio substituir aternura. 4ulgo que nunca pus tanto empenho em agradar, e quenunca estive tão satis"eita de mim pr*pria. epois da ceia,alternadamente criança e razoável, "olgazã e sens$vel, por vezesmesmo libertina, aprouve&me considerá&lo como um sultão em meiodo serralho, do qual eu era de cada vez uma "avorita di"erente. averdade, ao passo que ele repetia as suas homenagens, se elas eramsempre dirigidas - mesma mulher, era sempre uma nova amanteque as recebia.

En"im, ao raiar do dia "oi preciso separarmo&nos( e o que eleme disse, o que ele "ez mesmo para me provar o contrário, tudo

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mostrava que a necessidade era maior que o dese'o. o momentoem que sa$amos e por último adeus, tomei a chave daquele "elizre"úgio, e pondo&lha entre as mãos, disse: 6J s* para si que a tenho.J 'usto que se'a o seu dono. 2 sacri"icador deve dispor do templo.69om esta habilidade preveni as re"le#+es que ele poderia "azer sobre

a propriedade, sempre suspeita, duma casa pequena. 9onheço&obastante para estar certa de que não se servirá dela senão paramim( e se eu tivesse a "antasia de lá ir sem ele, sempre me restavaoutra chave. Ele queria - viva "orça marcar data para lá voltarmos(mas eu amo&o ainda demasiado para querer gastá&lo tão depressa.)* devemos permitir&nos e#cessos com as pessoas que cedoqueremos dei#ar.

Ele não o sabe( mas, "elizmente para ele, eu sei&o por dois.Geparo agora que são tr!s da manhã, e que escrevi um

volume, quando "ormara o pro'eto de escrever apenas uma palavra. 3al é o encanto da amizade con"iante: é ela que "az que se'a o

?isconde quem amo mais( mas, na verdade, o 9avaleiro é quem maisme agrada.

CT de gosto de CD .

CARTA XI

A PRESIDENTE DE TOURVEL A MADAME DE VOLANGES

vossa severa carta ter&me&ia assustado, senhora, se, por"elicidade, eu não encontrasse aqui mais motivos de tranqSilidade doque os de temor que me o"ereceis. Esse tem$vel senhor de ?almont,que deve ser o terror de todas as mulheres, parece ter deposto assuas armas mort$"eras antes de entrar neste castelo.

@onge de vir aqui "ormar os seus pro'etos, nem mesmo trou#equaisquer pretens+es( e a qualidade de homem amável, que até osseus inimigos lhe concedem, quase desaparece aqui, para não dei#arsenão a de bom rapaz. oi aparentemente o ar do campo queproduziu este milagre.

2 que posso assegurar&vos é que, estando constantemente aopé de mim, parecendo mesmo que isso lhe agrada, não lhe escapouainda uma palavra que se pareça com o amor, nem uma dessas"rases que todos os homens se permitem, sem ter, como ele, o que énecessário para as 'usti"icar.

unca ele obriga -quela reserva na qual ho'e é obrigada amanter&se toda a mulher que se respeita, para conter os homens quea rodeiam. )abe não abusar da animação que inspira. J talvez umpouco pr*digo em louvores( mas é com tanta delicadeza que o "az,que obrigaria a pr*pria modéstia a habituar&se ao elogio. En"im, seeu tivesse um irmão, dese'aria que ele "osse tal como o senhor de

?almont se mostra aqui. 3alvez muitas mulheres dese'assem da suaparte uma galanteria mais marcada( e con"esso que lhe estou

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in"initamente grata por ele me 'ulgar de uma "orma que lhe permitenão me con"undir com elas.

Este retrato di"ere muito sem dúvida do que me "izestes( e,apesar disso, ambos podem estar parecidos, se "i#armos as épocas.

Ele pr*prio concorda ter cometido muitos erros, e com certeza

lhe terão atribu$do alguns outros. 7as até agora encontrei poucoshomens que "alassem de mulheres honestas com mais respeito, direiquase entusiasmo. )ob esse aspecto, v*s mesma me "izeste saberque ele não engana. sua conduta em relação a 7adame de7erteuil é disso prova. ala&nos muito dela( e é sempre com tantoselogios e dando mostras de uma dedicação tão verdadeira, quecheguei a crer, antes da recepção da vossa carta, que aquilo que elechamava amizade entre os dois "osse realmente amor. cuso&medesse 'ulgamento temerário, o qual "oi tanto mais err%neo quanto écerto que ele mesmo tomou a seu cargo, por várias vezes, o cuidadode a 'usti"icar. 9on"esso que tomei por delicadeza o que da sua parte

era sinceridade aut!ntica.ão sei( mas parece&me que aquele que é capaz de uma

amizade tão cont$nua por uma mulher tão estimável, não é umlibertino sem resgate. Fgnoro, no entanto, se o comportamento retoque ele mantém aqui se deve a alguns pro'etos por estes lugares,con"orme a vossa suposição. J certo que por estas cercanias háalgumas mulheres interessantes( mas ele sai pouco, e#ceto demanhã, e então diz que vai caçar. J verdade que raramente trazcaça( mas assegura que é desastrado nesse e#erc$cio.

emais, o que ele "az lá por "ora inquieta&me pouco( e se eu

dese'asse sab!&lo, seria apenas para ter mais um motivo que meapro#imasse da vossa opinião ou que vos conduzisse - minha.cerca da vossa proposta de trabalhar no sentido de abreviar

o tempo que o senhor de ?almont conta aqui estar, parece&me muitodi"$cil ousar pedir a sua tia que não tenha o sobrinho 'unto dela, tantomais que gosta muito dele. 5rometo&vos, todavia, mas somente porde"er!ncia e não por necessidade, aproveitar a primeira ocasião para"azer esse pedido, quer a 7adame de Gosemonde, quer a ele pr*prio.0uanto a mim, o senhor de 3ourvel é conhecedor do meu pro'eto de"icar aqui até ao seu regresso, e havia de admirar&se, com razão, daligeireza que me "izesse mudar de pro'eto.

)ão bem longos, senhora, estes esclarecimentos( mas 'ulgueidever - verdade um testemunho "avorável para o senhor de?almont, e do qual ele me parece ter grande necessidade 'unto dev*s. em por isso sou menos sens$vel - amizade que ditou os vossosconselhos. J a ela que "ico devendo também as vossas penhorantesin"ormaç+es sobre a demora do casamento de vossa "ilha. gradeço&vos muito sinceramente: mas, embora me d! prazer a idéia depassar esses momentos convosco, sacri"icá&los&ia de bom grado aodese'o de saber 7ademoiselle de ?olanges mais cedo "eliz, se é queela pode vir a s!&lo mais do que 'unto de uma mãe tão digna de todaa sua ternura e do seu respeito.

5artilho com ela os doces sentimentos que me prendem a v*s,e peço&vos que aceiteis a e#pressão deles com bondade.

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 3enho a honra de ser, etc.

CB de gosto de CD .

CARTA XII

CECÍLIA VOLANGES A MARQUESA DE MERTEUIL

7amã está incomodada, minha senhora( não pode sair ho'e,e eu tenho de "azer&lhe companhia. 5or esse motivo não terei ahonra de vos acompanhar - Npera. sseguro&vos que lamento bemmais não estar convosco do que o espetáculo.

5eço&vos que acrediteis. 3enho por v*s tanta amizade= 3ereisa bondade de dizer ao 9avaleiro ancenP que não tenho a coleção

de que ele me "alou, e que se ma puder trazer amanhã me darágrande prazer. )e ele vier ho'e, dir&lhe&ão que não estamos( mas é a7amã que não quer receber ninguém. Espero que ela amanhã este'amelhor.

 3enho a honra de ser, etc.

CB de gosto de CD .

CARTA XIIIA MARQUESA DE MERTEUIL A CECÍLIA DE VOLANGES

iquei muito aborrecida, minha linda, por ser privada doprazer de a ver, bem como pelo motivo dessa privação. Espero queoutra ocasião se encontrará. esempenhar&me&ei da sua comissão

 'unto do 9avaleiro ancenP, que certamente "icará muito aborrecidopor saber sua 7amã doente. )e ela amanhã me quiser receber, irei"azer&lhe companhia. aremos um ataque, ela e eu, ao 9avaleiro de<elleroche ao piquet, e, além de lhe ganharmos o seu dinheiro,

teremos, por acréscimo de prazer, o de a ouvirmos cantar com o seuamável mestre( encarrego&me de lhe "azer o pedido. )e isso conviera sua 7amã e a si, respondo por mim e pelos meus dois 9avaleiros.deus, minha linda( os meus cumprimentos - minha querida 7adamede ?olanges.

<ei'o&a muito ternamente.

CB de gosto de CD .

CARTA XIV

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CECÍLIA VOLANGES A SOFIA CARNAY 

2ntem não te escrevi, minha querida )o"ia( mas não "oi oprazer o motivo, posso 'urar&te. 7amã esteve doente, e não adei#ei em todo o dia.

H noite, quando me retirei, não tive cabeça para nada( edeitei&me muito depressa, para ter a certeza de que o dia tinhaacabado. unca tinha passado nenhum tão comprido. ão é que eunão goste da 7amã, mas não sei o que era. evia ir - Npera com7adame de 7erteuil( o 9avaleiro ancenP devia lá estar. <em sabesque são as duas de quem eu mais gosto. 0uando chegou a hora emque devia ir ter com eles, senti o coração apertado, contra minhavontade. 3udo me aborrecia, e chorei, chorei, sem conseguir impedi&lo. elizmente a 7amã estava deitada, e não podia ver&me. Estoubem certa de que o 9avaleiro ancenP também "icou aborrecido(mas deve ter&se distra$do com o espetáculo e com toda agente que o

rodeava.oi muito di"erente.5or "elicidade, a 7amã está ho'e melhor, e 7adame de

7erteuil virá com outra pessoa e com o 9avaleiro ancenP( maschega sempre muito tarde, 7adame de 7erteuil( e quando se estevetanto tempo sozinha, é muito aborrecido. )ão apenas onze horas. Jverdade que tenho de tocar harpa( e depois levarei algum tempo avestir&me e a arran'ar&me, pois ho'e quero estar muito bempenteada. 5arece&me que madre 5erpétua tem razão e que umapessoa se torna garrida quando vive em sociedade.

unca tive tanto dese'o de ser bonita como de há alguns diaspara cá, e acho que não o sou tanto como pensava( e depois, 'untode mulheres que se pintam, "ica&se a perder muito. 7adame de7erteuil, por e#emplo: ve'o bem que todos os homens a acham maisbonita do que eu. ão me importo muito, porque ela é minha amiga.E além disso ela a"irma&me que o 9avaleiro ancenP me acha maisbonita do que ela. J muito honesto da sua parte ter&mo dito= téparece que estava contente em mo dizer. $ está uma coisa que eunão compreendo. J porque ela gosta muito de mim= E ele=...

2h=, "oi uma coisa que me deu muito prazer= 5or isso, até,meparece que s* de olhar para ele uma pessoa "ica bonita. Eu estaria a

olhar sempre para ele, se não tivesse receio de encontrar os seusolhos: pois, todas as vezes que tal me acontece, "ico con"usa, eparece que me dá pena( mas isto nada quer dizer.

deus, minha querida amiga. ?ou&me p%r diante do espelho.9ontinuo a gostar de ti como sempre.

5aris, CI de gosto de CD .

CARTA XV

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

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J muito honesto da sua parte não me abandonar - minhatriste sorte.

vida que levo aqui é realmente "atigante, pelo e#cesso derepouso que me proporciona e pela sua ins$pida uni"ormidade.

@endo a sua carta e os pormenores do seu dia encantador,estive vinte vezes tentado a prete#tar um neg*cio, voar a seus pés epedir&lhe, em meu "avor, uma in"idelidade ao seu 9avaleiro, que, no"im de tudo, não merece a "elicidade de que des"ruta. )abe a7arquesa que me p%s ciumento dele> 5or que me "ala da eternaseparação> Genego esse 'uramento, pronunciado em del$rio: nãoser$amos dignos de o "azer, se "%ssemos obrigados a mant!&lo. h=0ue eu possa um dia vingar&me nos seus braços do ciúmeinvoluntário que me causou a "elicidade do 9avaleiro=

Estou indignado, con"esso, s* de pensar que esse homem,sem raciocinar, sem se dar ao menor trabalho, limitando&se a seguir

totalmente o instinto do seu coração, encontra uma "elicidade que eunão atingirei nunca. 2h= Aei&de perturbá&la...

5rometa&me que serei eu a perturbá&la. 7arquesa mesmonão se sente humilhada> 3em trabalho para o enganar, e ele é dosdois o mais "eliz.

 4ulga que o tem preso nas suas malhas=J a 7arquesa que o está nas dele. Enquanto vela pelos seus

prazeres, ele dorme tranquilamente. 0ue "aria de mais se "osse suaescrava>

)aiba&o, minha bela amiga, enquanto se divide entre vários,

não sinto o m$nimo ciúme: não ve'o então nos seus amantes senãoos sucessores de le#andre, incapazes de conservar, todos 'untos,aquele império onde eu reinei s*. 7as que se entregue inteiramentea um deles= 0ue e#ista outro homem tão "eliz como eu= ão possoso"r!&lo( não espere que eu o so"ra. 2u readmita&me, ou pelo menosarran'e outro( e não queira trair, por um capricho e#clusivo, aamizade inviolável que nos 'uramos mutuamente.

J o momento, sem dúvida, de lhe con"essar as minhasquei#as amorosas. <em v! que me presto -s suas idéias, e quecon"esso os meus erros: a verdade, se estar apai#onado é nãopoder viver sem possuir o que se dese'a, sacri"icar a essa idéia o

tempo, os prazeres( a vida, então é certo que estou realmenteapai#onado. ão estou mais avançado do que estava.ão teria mesmo mais nada a contar&lhe a esse respeito se

não "osse um acontecimento que me dá muito que pensar, e que nãosei ainda se deve inspirar&me receio ou esperança.

7arquesa conhece o meu criado, tesouro de intriga everdadeiro lacaio de comédia: e bem pode imaginar que entre assuas atribuiç+es cabe a de se apai#onar pela criada de quarto, e a deperturbar as pessoas.

2 pati"e é mais "eliz do que eu: 'á conseguiu uma vit*ria.caba de descobrir que 7adame de 3ourvel encarregou uma criatura

sua de tirar in"ormaç+es sobre a minha conduta, e mesmo de meseguir nos meus passeios de manhã, até onde possa, sem que

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alguém se aperceba. 0ue pretende esta mulher> ssim pois a maismodesta de todas ousa arriscar&se a um ponto que n*s malousar$amos permitir&nos=

e que serve protestar>. . ntes de pensar em vingar&medesta astúcia "eminina, ocupemo&nos do meio de a p%r ao nosso

serviço.té agora esses passeios de que se suspeita não tinhamqualquer ob'etivo( é preciso dar&lhes um. Fsto merece toda a minhaatenção, e vou "indar para pensar nisso. deus minha bela amiga.

)empre do 9astelo de. . ., CO de gosto de CD .

CARTA XVI

CECÍLIA VOLANGES A SOFIA CARNAY 

h, minha )o"ia, tenho novidades a dar&te= 3alvez nãodevesse dizer: mas é preciso que eu "ale nisto a alguém( é mais "ortedo que eu. Esse 9avaleiro ancenP... Estou tão perturbada que nãoposso escrever. ão sei por onde começar. epois que te contei olindo serão que passei com ele e com 7adame de 7erteuil 'unto da7amã, não voltei a "alar&te a seu respeito: é que eu não queria "alardele a ninguém( mas era nele que eu pensava sempre. epois, tinha&se tornado tão triste, mas tão triste, tão triste, que me "azia pena. E

quando eu lhe perguntava porqu!, dizia&me que não: mas eu bem viaque sim. En"im, ontem ainda estava mais triste que de costume. Fssonão impediu que tivesse a gentileza de cantar comigo, como dasoutras vezes( mas, sempre que olhava para mim, eu sentia apertar&se&me o coração. epois de termos acabado de cantar, "oi "echar aminha harpa no esto'o( e, quando me trou#e a chave, pediu&me quetocasse ainda naquela noite, logo que me encontrasse s*. Eu nãodescon"iei de nada( nem mesmo queria: mas ele pediu&me tanto, quelhe disse que sim. Ele tinha as suas raz+es. E"etivamente, quando meretirei para o meu quarto, e assim que a criada saiu, "ui buscar aharpa. Encontrei nas cordas uma carta, simplesmente dobrada, e não

lacrada( era dele= h= )e tu soubesses o que me diz= epois de a terlido senti tanto prazer que nem posso pensar noutra coisa. Geli&aquatro vezes seguidas, e depois "echei&a na minha secretária. 4á asabia de cor( e depois de deitada repeti&a tantas vezes que nempensava em dormir.

ssim que "echei os olhos vi&o ao pé de mim, dizendo&me tudoquanto eu acabara de ler. )* adormeci muito tarde( e mal tinhaacordado Lera ainda muito cedo1, "ui logo buscar a carta para atornar a ler - minha vontade. @evei&a para a cama e depois bei'ei&acomo se... 3alvez se'a mal "eito bei'ar uma carta como esta, mas averdade é que não pude impedir&me de o "azer.

gora, minha querida amiga, sinto&me muito "eliz, mastambém muito embaraçada( pois é certo que não devo responder a

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esta carta. )ei bem que isso não se deve "azer, no entanto ele pede&mo( e se eu não responder, estou certa de que se vai p%r ainda maistriste. J uma desgraça para ele=

0ue me aconselhas tu> J claro que a este respeito não sabesmais do que eu. 3enho muita vontade de "alar nisto a 7adame de

7erteuil, que é tão minha amiga. <em gostaria de o consolar( masnão quero "azer nada que se'a mal "eito. Gecomendam&nos tanto quetenhamos bom coração= E depois pro$bem&nos de seguir o que elenos inspira, quando se trata de um homem= Fsto também não é 'usto.

5or acaso um homem não é o nosso pr*#imo, como umamulher ou mais ainda> 5ois en"im, não temos n*s um pai, tal comouma mãe, um irmão, tal como uma irmã> lém disso ainda "ica omarido. 7as se eu "osse "azer qualquer coisa que não "osse bem"eita, talvez o pr*prio senhor ancenP não "icasse com boa idéia ameu respeito= 2h= Fsso então era o que me "altava. 5re"iro que "iquetriste. E depois, en"im, estou sempre a tempo. @á porque ele

escreveu ontem, não sou obrigada a escrever&lhe ho'e.Esta noite verei 7adame de 7erteuil, e se tiver coragem

conto&lhe tudo. )e "izer s* o que ela me disser, nada terei a censurar&me.

 3alvez ela me diga que lhe responda poucochinho, para queele não "ique tão triste= 2h= Estou num momento muito di"$cil.

deus, minha boa amiga. iz&me sempre o que pensas.

CR de gosto de CD .

*# carta em que se +ala deste serão não +oi encontrada Devemos suporque é o que )adame de )erteuil prop3e no seu bilhete, e de que também se +alana precedente carta de &ecília olanges 

CARTA XVII

O CAVALEIRO DANCENY A CECÍLIA VOLANGES

ntes de me entregar, 7ademoiselle, -quilo que chamo oprazer ou a necessidade de lhe escrever, começo por lhe suplicar queme ouça. )into que, para ousar declarar&lhe os meus sentimentos,tenho precisão de indulg!ncia( se apenas tivesse de 'usti"icá&los, elaser&me&ia inútil. 0ue vou eu "azer, a"inal, senão mostrar&lhe o meu$ntimo> E que tenho eu a dizer&lhe que os meus olhares, o meu

embaraço, a minha conduta e mesmo o meu sil!ncio lhe não tenhamdito antes de mim> 5or que se havia pois de zangar por um

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sentimento que "ez nascer> Emanado de si, é sem dúvida digno delhe ser o"erecido( se é ardente como a minha alma, é também purocomo a sua. )eria um crime ter sabido apreciar a sua "iguraencantadora, os seus talentos sedutores, as suas graças "ascinantes,essa comovente candura que acrescenta um preço inestimável a

qualidades 'á tão preciosas>ão, sem dúvida. 7as, mesmo não se sendo culpado, podeser&se in"eliz. E é a sorte que me espera, se se recusar a aceitar aminha homenagem. J a primeira que o meu coração até ho'e ao"ereceu. )e a não tivesse visto eu seria ainda, não "eliz, mastranqSilo. ?i&a( o repouso "ugiu para longe de mim, e o meu coraçãoestá inquieto. dmira&se da minha tristeza( pergunta&me a causa.lgumas vezes 'ulguei ver que ela a a"ligia.

h= iga uma palavra, e a minha "elicidade será obra sua.7as, antes de a pronunciar, pense que uma palavra pode sertambém o cúmulo da minha tristeza. )e'a pois o árbitro do meu

destino. 5or si vou ser eternamente "eliz ou in"eliz. Em que mãosmais queridas poderia eu depositar um interesse maior>

cabarei, como comecei, por implorar a sua indulg!ncia.5edi&lhe que me ouvisse( ousarei mais, pedir&lhe que me

responda.Gecusá&lo, seria dei#ar&me crer que "icou o"endida, e o meu

coração é garantia de que em mim o respeito iguala o amor.

5. ). & 5oderá servir&se, para me responder, do mesmo meio de queme sirvo para "azer chegar esta carta -s suas mãos( parece&me

igualmente seguro e c%modo.CU de gosto de CD .

CARTA XVIII

CECÍLIA VOLANGES A SOFIA CARNAY 

5ois qu!, )o"ia= 3u censuras de antemão o que eu vou "azer=

 3inha 'á bastantes inquietaç+es( vieste tu agora aumentá&las.J claro, dizes tu, que não devo responder. alas disto com todo o -&vontade( mas a verdade é que não sabes ao certo do que se trata:não estás aqui para ver.

Estou certa de que se estivesses no meu lugar, "arias comoeu. 9om certeza que, de maneira geral, não se deve responder( e tubem viste, pela minha carta de ontem, que eu pr*pria não queria"az!&lo. 7as é que não creio que alguém se tenha visto alguma vezna situação em que me encontro.

E ainda ser obrigada a decidir&me sozinha= 7adame de7erteuil, que eu contava ver ontem - noite, não veio. 3udo conspira

contra mim: "oi ela quem teve a culpa de eu o conhecer.oi quase sempre na presença dela que eu o vi, que lhe "alei.

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J claro que não lhe quero mal por isso: mas o que é certo éque me abandona no momento mais di"$cil. 2h= )ou na verdadedigna de lástima=

Fmagina que ontem ele veio como de costume. Eu estava tãoperturbada que nem ousei olhá&lo. Ele não podia "alar comigo,

porque a 7amã estava presente. 3inha quase a certeza de que ele sezangaria, quando visse que eu não lhe tinha escrito. Eu não sabia oque havia de "azer.

;m momento depois perguntou&me se eu queria que "ossebuscar a minha harpa. 2 coração batia&me tão "ortemente que tudoquanto pude "azer "oi responder&lhe que sim. 0uando ele voltou éque "oi pior. )* o olhei por um momentinho. Ele nem sequer olhoupara mim( mas tinha um aspecto que toda a gente diria que estavadoente. Fsto dava&me muita pena. 5%s&se a a"inar a harpa e, depois,quando ma trou#e, disse&me: 6h= 7ademoiselle=...6 ão disse maisdo que essas duas palavras( mas disse&as num tal tom que "iquei

completamente transtornada. 5us&me logo a tocar sem saber bem oque "azia. 7amã perguntou&me se não cantávamos.

Ele desculpou&se dizendo que estava adoentado( e eu, quenão tinha qualquer desculpa, tive de cantar. ese'ei então nunca tertido voz.

Escolhi de prop*sito uma música que não sabia, pois estavacerta de que não poderia cantar nada, e assim daria a perceber quehavia qualquer coisa. elizmente entrou uma visita( e, logo que ouvio ru$do de uma carruagem, dei#ei de cantar e pedi&lhe que "ossearrumar a harpa. 3ive muito medo que ele se "osse embora ao

mesmo tempo( mas voltou.Enquanto a 7amã e a senhora que veio visitá&la conversavam 'untas, quis olhar para ele ainda um instante. Encontrei os seusolhos, e "oi&me imposs$vel desviar os meus. ;m momento depois vias suas lágrimas correram, e "oi obrigado a voltar&se para não servisto. esse momento não tive mão em mim( senti que ia chorartambém. )a$, e imediatamente escrevi a lápis, num pedaço de papel:6ão este'a tão triste, peço&lhe( prometo que lhe responderei.6 9omcerteza não podes dizer que ha'a algum mal nisto( e depois, "oi mais"orte do que eu. 5us o papel nas cordas da harpa( como estava acarta dele, e voltei - sala. )entia&me mais tranqSila. 4á me tardava

que a senhora se "osse embora. elizmente( "oi uma visita curta(dei#ou&nos pouco depois. @ogo que ela saiu, eu disse que queriaoutra vez a minha harpa, e pedi&lhe que a "osse buscar. ?i bem, peloseu aspecto, que não descon"iava de nada. 7as quando voltou, oh=,como ele estava contente=

o p%r a harpa na minha "rente, colocou&se de maneira que a7amã não podia v!&lo, e tomou&me a mão, que apertou... mas deuma maneira=...

oi apenas um momento( mas eu sou incapaz de te dizer oprazer que isso me deu. o entanto, retirei a mão( por isso não tenhonada a censurar&me.

gora, minha boa amiga, bem v!s que não posso dispensar&me de lhe escrever, visto que lho prometi. E depois, não quero que

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volte a estar triste, pois eu so"reria mais do que ele. )e "osse algumacoisa de mal, eu não a "aria. 7as que mal pode haver em escrever,principalmente quando é para impedir que alguém se'a in"eliz> 2 queme aborrece é saber que não sou capaz de "azer uma carta bem"eita. 7as ele há de perceber que a culpa não é minha. E depois

estou bem certa de que s* por ser minha lhe dará prazer.deus, minha querida amiga. H medida que se apro#ima omomento de lhe escrever, o meu coração bate de uma maneirainconceb$vel. o entanto é preciso, visto que o prometi. deus.

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CARTA XIX

CECÍLIA VOLANGES AO CAVALEIRO DANCENY 

Estava ontem tão triste, senhor, e isso causava&me tantapena, que não resisti a prometer&lhe que responderia - carta que meescreveu. ão é que eu sinta ho'e menos que não o devia "azer( mas,como lhe prometi, não quero "altar - minha palavra, e isso deveprovar&lhe a amizade que sinto pelo senhor. gora que 'á sabe,espero que não volte a pedir&me que lhe escreva mais. Esperotambém que não diga a ninguém que lhe escrevi, porque comcerteza me censuravam e isso podia causar&me muitos desgostos.

Espero principalmente que não "ique a "azer má idéia de mim, o queseria o maior desgosto que eu podia ter.5osso dar&lhe a certeza de que não teria essa complac!ncia

para outro que não "osse o senhor. ese'aria que tivesse a bondadede não estar triste como estava, o que me tiraria todo o prazer quesinto em o ver. <em v! que lhe "alo com toda a sinceridade.

)* peço que a nossa amizade dure sempre( mas, suplico&lhe,não torne a escrever&me.

 3enho a honra de ser, etc.

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CARTA XX

A MARQUESA DE MERTEUIL AO VISCONDE DE VALMONT

h, tratante, "az&me "estas porque receia a minha troça=?amos, consinto em perdoar: escreve&me tantas loucuras, que

realmente é preciso que eu lhe desculpe a prud!ncia do seuprocedimento em relação - sua 5residente. ão creio que o meu

9avaleiro usasse de tanta indulg!ncia como eu( seria homem paranão aprovar a renovação do nosso contrato e para não achar nada

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de divertido na sua louca idéia. o entanto "ez&me rir muito, e senti&me verdadeiramente aborrecida de ser obrigada a rir tanto sozinha.)e o ?isconde estivesse pr*#imo, não sei onde me poderia ter levadoessa alegria: mas tive tempo para re"letir e armei&me de severidade.ão é o caso de recusar para sempre( mas vou adiando, e tenho

razão. 5oria nisso talvez vaidade, e, uma vez entrada no 'ogo, não sesabe onde se vai parar.)erei mulher para o prender de novo, para lhe "azer esquecer

a sua 5residente( e se eu, ser indigno, o a"astasse da virtude, ve'aque esc8ndalo=

5ara evitar esse perigo, eis as minhas condiç+es.ssim que tenha possu$do a sua devota e me possa "ornecer

uma prova, venha, e serei sua. 7as não ignora que, nos neg*ciosimportantes, não se recebem provas senão por escrito. 5or estacombinação, serei, por um lado, uma recompensa em vez de ser umaconsolação, e essa idéia agrada&me mais( por outro lado, o seu !#ito

será mais e#citante. ?enha pois, venha o mais cedo poss$vel trazer&me o penhor do seu triun"o: semelhante aos nossos es"orçadoscavaleiros, que vinham depor aos pés das suas damas os "rutosbrilhantes da vit*ria. )eriamente, estou curiosa de saber o que podeescrever uma mulher virtuosa depois de um tal momento, e que véuporá nas suas palavras, depois de não ter dei#ado nenhum sobre asua pessoa. o ?isconde cabe avaliar se eu me coloco num preçomuito alto( mas previno&o de que não "arei qualquer abatimento...té lá, meu caro ?isconde, achará bem que eu "ique "iel ao meu9avaleiro e que me divirta a torná&lo "eliz, apesar do pequeno

desgosto que isso causa.Entretanto, se os meus costumes não "ossem tão regrados,creio que teria, neste momento, um rival perigoso( é a pequena?olanges. Estou louca por essa pequena( é uma verdadeira pai#ão.

2u eu me engano, ou ela virá a ser uma das nossas mulheresda moda. ?e'o o seu coraçãozinho desenvolver&se, e é um espetáculoencantador. J 'á com "uror que ela ama o seu ancenP( mas porenquanto não percebe destas coisas. 0uanto a ele, embora muitoapai#onado, tem ainda a timidez da sua idade e não ousa ensinar&lhedemasiado. 2s dois permanecem em adoração na minha "rente.5rincipalmente a pequena tem grande dese'o de me dizer o seu

segredo( desde há alguns dias, em particular, ve'o&averdadeiramente su"ocada por ele, e eu prestar&lhe&ia um grandeserviço se a a'udasse um pouco. 7as não esqueço que é umacriança, e não quero comprometer&me. ancenP "alou&me um poucomais claramente, mas, para ele, o meu partido está tomado, nãoquero ouvi&lo.

0uanto - pequena, sinto&me muitas vezes tentada a "azerdela minha disc$pula( é um serviço que tenho vontade de prestar aercourt. Ele dá&me tempo para isso, porque está na 9*rsega até aom!s de 2utubro.

 3enho em mente empregar todo esse tempo, de modo a

podermos dar&lhe uma mulher inteiramente "ormada, em lugar dasua inocente pensionista. a verdade, em que se baseia a insolente

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con"iança desse homem, que ousa dormir tranqSilo, enquanto umamulher, que dele tem motivos de quei#a, não se vingou ainda> 9reia,se a pequena estivesse aqui neste momento, nem eu sei o que lhediria.

deus, ?isconde( boa noite e bom !#ito: mas, por eus, ve'a

se avança. 5ense que, se não possuir essa mulher, as outras terãovergonha de terem sido possu$das.

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CARTA XXI

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

En"im, minha bela amiga, dei um passo em "rente, mas umgrande passo, e que, se não me conduziu até ao "im, me "ez pelomenos conhecer que estou no bom caminho, e dissipou o receio emque estava de me ter perdido. eclarei en"im o meu amor( e emborame tenha respondido o sil!ncio mais obstinado, obtive a respostatalvez menos equ$voca e mais lison'eira( mas não antecipemos osacontecimentos e voltemos mais atrás.

7arquesa recorda&se que os meus passos eram espiados.5ois bem= ecidi que esse meio esc8ndalo servisse para a

edi"icação do público, e aqui está o que eu "iz. Encarreguei o meu

con"idente de me encontrar, nos arredores, qualquer in"eliz quetivesse necessidade de au#$lio.Essa missão não era di"$cil de cumprir. 2ntem de tarde, deu&

me ele a not$cia de que ho'e, de manhã, deviam ser penhorados osm*veis de uma "am$lia inteira que não podia pagar a derrama.ssegurei&me de que nessa casa não havia nenhuma mulher ourapariga cu'a idade pudesse tornar suspeita a minha ação( e, logoque "iquei bem in"ormado, declarei - ceia o meu pro'eto de ir - caçano dia seguinte. evo aqui "azer 'ustiça - minha 5residente: semdúvida teve ela alguns remorsos das ordens que deu( e, não tendo"orça de vencer a sua curiosidade, teve pelo menos a de contrariar o

meu dese'o.evia haver calor em e#cesso( arriscava&me a "icar doente(não apanharia nenhuma caça e "atigar&me&ia em vão( e, durante estediálogo, os seus olhos, que "alavam talvez mais do que ela queria,davam&me a conhecer que ela dese'ava que eu tomasse por boas assuas más raz+es.

9omo pode crer, eu não pensava em me render a tais raz+es,e resisti do mesmo modo a uma pequena diatribe contra a caça e oscaçadores, e a uma pequena nuvem de mau humor que obscureceu,durante todo o serão, esta "igura celeste. 5or um momento receeique as suas ordens "ossem anuladas e que a sua delicadeza

acabasse por me pre'udicar.

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iz um mau cálculo sobre a curiosidade duma mulher( por issome enganei. 2 meu criado tranquilizou&me nessa mesma noite, edeitei&me satis"eito.

o romper do )ol, levanto&me e parto. penas a cinqSentapassos do castelo, ve'o que o meu espião me segue. Entro no terreno

da caça e caminho através dos campos para a aldeia onde pretendiadirigir&me( sem outro prazer, na minha 'ornada, além do de obrigar acorrer o pati"e que me seguia, e que, não se atrevendo a dei#ar oscaminhos, muitas vezes tinha de percorrer, a toda a velocidade, umespaço triplo do meu. e tanto o p%r - prova, eu pr*prio ia cheio decalor, e sentei&me 'unto de uma árvore. 5ois não teve ele a insol!nciade deslizar para trás de uma moita, a menos de vinte passos dedist8ncia, e de se sentar também> 5or um momento estive tentado amandar&lhe um tiro, que, embora "osse apenas de chumbo, lhe teriadado uma lição su"iciente sobre os perigos da curiosidade.elizmente para ele, tornei a lembrar&me de que estava sendo útil e

mesmo necessário aos meus pro'etos( esta re"le#ão salvou&o.Entretanto chego - aldeia( ve'o que há movimento( avanço(

interrogo( contam&me o que se passa. 9hamo o cobrador( e, cedendo- minha generosa compai#ão, pago nobremente cinqSenta e seislibras, pelas quais cinco pessoas iam ser reduzidas - indig!ncia e aodesespero. epois desta ação tão simples, não imagina o coro deb!nçãos que se ergueu - minha volta por parte dos assistentes= 0uelágrimas de reconhecimento corriam dos olhos do velho che"edaquela "am$lia, e embelezavam a sua "igura de patriarca, que ummomento antes a contração "eroz do desespero tornava

verdadeiramente hedionda= Eu e#aminava o espetáculo e logo outrocampon!s mais moço, conduzindo pela mão uma mulher e duascrianças, avança para mim a passos precipitados, dizendo&lhes:6'oelhemo&nos todos aos pés desta imagem de eus=6( e no mesmoinstante "ui rodeado por toda a "am$lia, prosternada perante mim.9on"essarei a minha "raqueza( os meus olhos tinham&se molhado delágrimas, e senti em mim um movimento involuntário, mas delicioso.iquei surpreendido do prazer que se e#perimenta ao "azer&se bem( eestive tentado a crer que aqueles a quem chamamos pessoasvirtuosas não t!m tanto mérito como geralmente se diz.

osse como "osse, achei que era 'usto pagar -quela pobre

gente o prazer que acabava de me dar. 3inha comigo dez lu$ses: dei&lhos. qui recomeçaram os agradecimentos, mas 'á não tinham omesmo grau de patético: o necessário tinha produzido o grande, overdadeiro e"eito( o resto era apenas uma simples e#pressão dereconhecimento e de espanto por uma dádiva supér"lua.

Entretanto, no meio das b!nçãos tagarelas daquela "am$lia, eunão dei#ava de me parecer um pouco com o her*i de um drama, nacena do desenlace. 9alculará decerto que entre a multidão semantinha a pé "irme o espião "iel. 2 meu "im "ora atingido( separei&me de todos, e voltei para o castelo. eitados todos os cálculos,"elicito&me da minha invenção. Esta mulher vale bem, sem dúvida,

que eu me d! a tais cuidados( eles serão um dia os meus t$tulos 'untodela( e tendo&lhe, de algum modo, pago assim de antemão, terei o

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direito de dispor dela segundo a minha "antasia, sem ter de mecensurar.

Esquecia&me dizer&lhe que, para que tudo resultasse em meu"avor, pedi -quela boa gente que rogasse a eus pelo bom !#ito dosmeus pro'etos. 7arquesa verá se os seus rogos não "oram 'á em

parte atendidos... 7as anunciam&me que a ceia está servida e "ar&se&ia tarde para mandar esta carta se eu não a "echasse ao retirar&me.ssim, o resto no pr*#imo número. borrece&me isso, pois o resto é omelhor. deus, minha bela amiga.

caba de me roubar um momento do prazer de v!&la.

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CARTA XXII

A PRESIDENTE DE TOURVEL A MADAME DE VOLANGES

icareis sem dúvida satis"eita, senhora, por conhecer umgesto do senhor de ?almont, que contrasta em muito, parece&me,com todos aqueles sob os quais vo&lo apresentaram. J uma coisa tãopenosa pensar des"avoravelmente de quem quer que se'a, tãoaborrecido encontrar apenas v$cios naqueles que podem ter todas asqualidades necessárias para "azer amar a virtude=

En"im, gostais tanto de usar de indulg!ncia que dar&vos

motivo para reparar um 'u$zo demasiado rigoroso é decerto servir&vos.2 senhor de ?almont parece&me ter as condiç+es necessárias

para esperar esse "avor, direi quase 'ustiça( e vou dizer&vos porque openso.

Esta manhã deu ele um daqueles passeios que poderiam levara supor qualquer pro'eto da sua parte nos arredores, con"orme aidéia que vos veio( idéia que me acuso de ter partilhado talvez comdemasiada vivacidade. elizmente para ele, e sobretudo "elizmentepara n*s, pois isso nos salva de sermos in'ustas, um dos meusservidores tinha de ir para os mesmos lados que ele( e "oi por a$ que

a minha curiosidade repreens$vel, mas "eliz, "oi satis"eita. 9ontou&noso criado que o senhor de ?almont, tendo encontrado na aldeia de...uma in"eliz "am$lia cu'os m*veis iam ser vendidos, por não poderpagar os impostos, não somente se apressara a solver a d$vidadaquela pobre gente, mas lhe dera até uma import8ncia em dinheirobastante considerável.

2 meu criado "oi testemunha daquela virtuosa ação, e maisme contou que os camponeses, conversando entre si e com ele,haviam dito que um criado que designaram, e que o meu 'ulga ser odo senhor de ?almont, tinha ontem ido tirar in"ormaç+es sobre quaisos habitantes da aldeia que poderiam estar necessitados de au#$lio.

)e isto é assim, se não é unicamente uma compai#ão passageira eque a ocasião determina, então é o pro'eto "ormado de "azer bem( é

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a solicitude da bene"ic!ncia( é a mais bela virtude das mais belasalmas. 7as, se'a acaso ou pro'eto, é sempre uma ação honesta elouvável, e de que a simples narração me enterneceu até -slágrimas. crescentarei ainda, e sempre por 'ustiça, que, quando lhe"alei dessa ação, da qual ele não dizia palavra, começou por se

de"ender e mostrou atribuir&lhe tão pouco valor que a sua modéstialhe redobrava o mérito.izei&me agora, minha respeitável amiga, se o senhor de

?almont é na verdade um libertino sem remissão> )e ele é apenasisso e procede assim, que "icará para as pessoas honestas>

5ois qu!= 2s maus partilhariam com os bons o prazer sagradoda bene"ic!ncia> 5ermitiria eus que uma "am$lia virtuosa recebessedas mãos dum celerado os socorros que teria de agradecer - suadivina 5rovid!ncia>

E poderia ele sentir prazer em ouvir, de bocas puras,espalharem&se b!nçãos sobre um réprobo> ão.

5re"iro acreditar que os erros, por durarem longo tempo, nãosão eternos( e não posso pensar que quem "az o bem se'a inimigo davirtude. 2 senhor de ?almont é talvez um e#emplo mais do perigo decertas ligaç+es. etenho&me nesta idéia que me parece a melhor. )e,por um lado, ela pode servir a 'usti"icá&lo no vosso esp$rito, por outrotorna cada vez mais preciosa a terna amizade que me liga a v*s portoda a vida.

 3enho a honra de ser, etc.

5. ). & 7adame de Gosemonde e eu vamos, dentro de momentos, ver

também a honesta e in"eliz "am$lia, e 'untar os nossos socorrostardios aos do senhor de ?almont. @evá&lo&emos conosco. aremosao menos a essa boa gente o prazer de tornar a ver o seu ben"eitor(é, creio eu, tudo o que ele dei#ou para n*s "azermos.

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CARTA XXIII

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

 3$nhamos "icado no meu regresso ao castelo: retomo a minhanarrativa.

7al tive tempo de me arran'ar um pouco, e regressei - sala,onde a minha bela tecia um tapete, enquanto o cura lia a gazeta -minha velha tia.

)entei&me 'unto do tear. lguns olhares, mais doces ainda doque o costume, e quase acariciantes, depressa me "izeram adivinharque o criado tinha 'á dado conta da sua missão.

e "ato, a minha amável curiosa não p%de guardar por muito

tempo o segredo que me tinha roubado( e, sem receio deinterromper um venerável pastor cu'a prédica no entanto se parecia

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com uma homilia, disse: 63ambém tenho as minhas novidades adar6( e imediatamente contou a minha aventura com uma e#atidãoque "azia honra - intelig!ncia do seu historiador.

7arquesa pode imaginar como eu mani"estei toda a minhamodéstia( mas quem poderia deter uma mulher que "az, sem o

suspeitar, o elogio daquele que ama> 3omei pois o partido de adei#ar continuar. ir&se&ia que ela pregava o paneg$rico de um santo.urante esse tempo eu observava, não sem esperança, tudo o queprometiam ao amor os seus olhares cheios de animação, os seusgestos agora mais livres, e principalmente aquele tom de voz que,pela sua alteração 'á sens$vel, tra$a a emoção da sua alma. @ogo queela acabou de "alar, 7adame de Gosemonde disse&me: 67eusobrinho, chegue ao pé de mim( quero abraçá&lo.6 Fmediatamentesenti que a linda pregadora não poderia de"ender&se de ser abraçadapor sua voz. 0uis "ugir, entretanto( mais depressa a atra$ para osmeus braços( e, longe de ter "orças para resistir, apenas lhe

restavam as bastantes para se manter de pé. 0uanto mais observoesta mulher, mais ela me parece dese'ável. pressando&se a voltarpara 'unto do tear, simulou, para os presentes, recomeçar a suatare"a( mas vi bem que a sua mão tr!mula não lhe permitia continuá&la.

epois do 'antar, as senhoras quiseram ir ver os in"ortunadosque eu tão piedosamente tinha socorrido( acompanhei&as.

5oupo a minha boa amiga ao en"ado desta segunda cena dereconhecimento e de louvores. 2 meu coração, impedido por umarecordação deliciosa, apressa o momento do regresso ao castelo.

5elo caminho, a minha bela 5residente, mais pensativa que decostume, não dizia palavra. Eu pensava em encontrar os meios deaproveitar o e"eito que nela causara o acontecimento do dia, e porisso mantinha igualmente sil!ncio. )* 7adame de Gosemonde "alavae apenas obtinha de n*s respostas curtas e raras. Era quase certoque a estávamos aborrecendo: era precisamente o que eu dese'ava,e "ui bem sucedido. o descer da carruagem, minha tia dirigiu&se aosseus aposentos, e dei#ou&nos "rente a "rente, a minha bela e eu,numa sala mal iluminada: obscuridade doce, que torna ousados osamores t$midos.

ão tive o trabalho de orientar a conversação para o ponto

em que dese'ava conduzi&la. 2 "ervor da amável pregadora serviu&me melhor do que não o teria "eito a minha habilidade.60uando se é digno de "azer o bem6, disse&me ela, detendo

sobre mim o seu doce olhar, 6como se pode passar a vida praticandoo mal>6 6ão mereço6, respondi&lhe, 6nem esse elogio, nem essacensura( e não compreendo como, com a sua intelig!ncia, não meadivinhou ainda. 7esmo que a minha con"iança viesse a pre'udicar&me, a senhora é demasiado digna dela para que eu pudesse recusá&la. Encontrará a chave da minha conduta num temperamentoin"elizmente "ácil em demasia. Godeado de indiv$duos sem moral,dei&me a imitar os seus v$cios( talvez tenha posto algum amor&

pr*prio em ultrapassá&los. a mesma "orma, senti&me seduzido aquipelo e#emplo das virtudes, e, embora sem esperança de poder

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igualá&la, procurarei ao menos segui&la. 3alvez o ato por que ho'e melouva perdesse a seus olhos todo o valor, se conhecesse o seuverdadeiro motivo=6 L minha amiga bem v! quanto eu estava pertoda verdade.1 6ão é a mim6, continuei, 6que esses in"elizes devem oau#$lio que lhes prestei. 2nde 'ulga ver uma ação merit*ria, procurei

eu apenas um meio de agradar. Eu era apenas, é "orçoso diz!&lo, o"rágil emissário da divindade que adoro.6 Lqui ela quis interromper&me( mas eu não lhe dei tempo para tal.1 6este momento mesmo6,acrescentei, 6o meu segredo escapa&me devido a uma "raqueza.5rometera a mim mesmo calar&me( era para mim uma "elicidadeo"erecer -s suas virtudes e aos seus encantos uma homenagem que"icaria ignorada para sempre( mas, incapaz de enganar, quandotenho debai#o dos olhos o e#emplo da candura, não terei a censurar&me uma culposa dissimulação. ão creia que a o"endo por umacriminosa esperança. )erei in"eliz, bem sei( mas os meus so"rimentosser&me&ão caros( provar&me&ão o e#cesso do meu amor. J a seus pés,

é no seu seio que eu deporei as minhas mágoas. $ encontrarei"orças para so"rer de novo( a$ encontrarei a bondade compadecida, e

 'ulgar&me&ei consolado, s* porque me lastimou. doro&a= Escute&me,lastime&me, socorra&me=6.

Entretanto eu estava a seus pés, e apertava as suas mãos nasminhas( ela, porém, desprendendo&as de repente, e cruzando&assobre os olhos com e#pressão de desespero, e#clamou: 6h,desventurada=6( e desatou a chorar.

5or "elicidade, eu a tal ponto me tinha abandonado - emoçãoque chorei também( e, voltando a tomar&lhe as mãos, banhei&as de

lágrimas.Esta precaução era muito necessária, pois ela estava tãoocupada com a sua dor que não se teria apercebido da minha, se eunão tivesse encontrado este meio de patenteá&la.

lém disso, aproveitei o momento para contemplar - minhavontade aquele rosto encantador, embelezado ainda pelo poderosoatrativo das lágrimas. )enti a cabeça quente, e estava tão poucosenhor de mim que me senti tentado a aproveitar aquele momento.

0ue "raqueza é esta nossa>= que ponto nos dominam ascircunst8ncias, se eu pr*prio, esquecendo os meus pro'etos, mearrisquei a perder, por um triun"o prematuro, o encanto dos longos

combates e os pormenores de uma penosa derrota> )e, seduzido porum dese'o de homem moço, pensei e#por o vencedor de 7adame de 3ourvel a não recolher, como "ruto dos seus trabalhos, senão ains$pida vit*ria de possuir mais uma mulher>=

h= 0ue ela se renda, mas que combata( que, sem ter a "orçade vencer, tenha a de resistir( que saboreie - vontade o sentimentoda sua "raqueza, e se'a obrigada a con"essar a sua derrota. ei#emoso obscuro caçador "urtivo matar o veado que surpreendeu numacilada( o verdadeiro caçador deve "orçá&lo.

J sublime este pro'eto, não acha> 7as talvez neste momentoeu lamentasse não o ter seguido, se o acaso não viesse em socorro

da minha prud!ncia.

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2uvimos ru$do. lguém vinha do salão. 7adame de 3ourvel,horrorizada, levantou&se precipitadamente, agarrou um doscandelabros e saiu. 3ive de a dei#ar proceder. Era apenas um criado.@ogo que me assegurei disso, segui&a. penas eu tinha dado algunspassos, "osse porque ela me reconhecesse, "osse por um sentimento

de vago terror, ouvi&a precipitar os passos e lançar&se, em vez deentrar, no seu quarto, "echando a porta atrás de si. ui 'unto daporta( mas a chave estava do lado de dentro.

 3ive o cuidado de não bater( seria "ornecer&lhe a ocasião deuma resist!ncia demasiado "ácil. 3ive a "eliz e simples idéia de tentarver através da "echadura, e vi de "ato essa mulher adorável de

 'oelhos, banhada em lágrimas, rezando com "ervor. 0ue eus ousavaela invocar> E#istirá algum com poder bastante contra o amor> J emvão que ela procura agora socorros estranhos( s* eu decidirei da suasorte.

 4ulgando ter 'á "eito bastante para um s* dia, retirei&me

também para o meu quarto e comecei a escrever esta carta.Esperava voltar a v!&la - ceia( no entanto, ela mandou dizer que sesentira indisposta e se tinha deitado. 7adame de Gosemonde quissubir ao quarto dela, mas a maliciosa doente prete#tou uma dor decabeça que não lhe permitia ver ninguém.

9omo "acilmente imagina, depois da ceia pouco tempoestivemos - mesa, e também eu tive a minha dor de cabeça.echado no meu quarto, escrevi uma longa carta para me quei#ar detal rigor, e deitei&me, com o pro'eto de a entregar esta manhã. ormimal, como poderá ver pela data desta carta. @evantei&me, e reli a

minha ep$stola. ?eri"iquei que nela eu me su'eitara a uma med$ocreobservação, que mostrava mais ardor do que amor, e maiscontrariedade do que tristeza. J preciso re"az!&la( mas necessitareide estar mais calmo.

2 dia começa a romper, e espero que a "rescura que oacompanha me trará o sono. ?ou meter&me na cama( e, se'a qual "oro império desta mulher, prometo&lhe não me ocupar dela a tal pontoque não "ique tempo para sonhar muito consigo. deus, minha belaamiga.

TC de gosto de CD , I horas da manhã.

CARTA XXIV

O VISCONDE DE VALMONT A PRESIDENTE DE TOURVEL

h= 5or piedade, senhora, dignai&vos acalmar a perturbaçãoda minha alma( dignai&vos dizer&me o que devo esperar ou recear.

9olocado entre o e#cesso da "elicidade e o do in"ortúnio, aincerteza é um tormento cruel. 5or que vos "alei> 5or que não pude

eu resistir ao encanto imperioso que vos entregava os meuspensamentos> 9ontente de vos adorar em sil!ncio, eu gozava ao

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menos do amor que sentia( e esse sentimento puro, que não eraperturbado ainda pela imagem da vossa dor, bastava para a minha"elicidade. 7as essa "onte de ventura trans"ormou&se em "onte dedesespero, desde que vi correrem lágrimas dos vossos olhos( desdeque ouvi aquele cruel ah, desventurada=

)enhora, aquelas duas palavras ressoarão por muito tempo nomeu coração. 5or que "atalidade o mais doce dos sentimentos nãopode inspirar&vos mais do que horror> 0ue receio é esse que sentis>h= ão é o receio de partilhar tal sentimento: o vosso coração, queconheci mal, não "oi "eito para o amor( o meu, que caluniais semcessar, é dos dois o único sens$vel. 2 vosso não tem piedade. )eassim não "osse, não ter$eis recusado uma palavra de consolação aodesgraçado que vos contava os seus so"rimentos( não vos ter$eis"urtado aos olhares de quem não tem outro prazer além de ver&vos(não vos ter$eis divertido cruelmente com a sua inquietação,anunciando&lhe que estáveis doente sem lhe permitir que se

in"ormasse do vosso estado( ter$eis sentido que essa mesma noite,que para v*s representava doze horas de repouso, ia ser para eleséculo de dores.

5or onde mereci, dizei&me, esse rigor implacável> ão tenhoreceio de tomar&vos por 'uiz: que "iz eu, além de ceder a umsentimento involuntário, inspirado pela beleza e 'usti"icado pelavirtude, sempre contido pelo respeito, e cu'a inocente con"issão "oi oe"eito da con"iança e não da esperança>

5ois traireis essa con"iança, que me pareceu v*s mesmaterdes permitido, e - qual me entreguei sem reservas> ão, não

posso acreditá&lo( seria supor&vos capaz de malevol!ncia, e o meucoração revolta&se s* com a idéia de vos achar em semelhante "alta.Getiro as minhas censuras: pude escrev!&las, mas não pensá&las. h=ei#ai&me supor&vos per"eita, é o único prazer que me resta. 5rovai&me que o sois concedendo&me os vossos generosos cuidados. 0uein"eliz tereis 'á socorrido que tivesse tanta necessidade deles comoeu>

ão me abandoneis no del$rio em que me lançastes=9oncedei&me a vossa razão, 'á que me roubastes a minha= epois deme haverdes corrigido, esclarecei&me para terminardes a vossa obra=

ão dese'o iludir&vos: não conseguireis vencer o meu amor(

mas ensinar&me&eis a governá&lo: guiando os meus passos, ditandoas minhas palavras, salvar&me&eis ao menos da horr$vel desgraça devos desagradar.

cima de tudo, dissipai este desesperador receio( dizei&meque me perdoais, que me lamentais( dai&me a certeza da vossaindulg!ncia= J certo que nunca disporeis de tanta como eu dese'ariaque tivésseis( mas reclamo aquela de que necessito. 5odereisrecusar&me>

deus, senhora. Gecebei com bondade a homenagem dosmeus sentimentos( ela não impede a do meu respeito.

TV de gosto de CD .

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CARTA XXV

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

qui lhe apresento o boletim do dia de ontem.s onze horas entrei nos aposentos de 7adame de

Gosemonde( e, sob os seus ausp$cios, "ui introduzido no quarto dadoente "ingida, que permanecia deitada. 3inha os olhos muitopisados( espero que tenha dormido tão mal como eu. proveitei ummomento em que 7adame de Gosemonde se a"astara para entregara minha carta( recusou&se a aceitá&la, mas dei#ei&a sobre a cama, e"ui muito honestamente apro#imar a poltrona da minha velha tia,que queria estar 'unto da sua querida "ilha( para evitar o esc8ndalo,teve de guardá&la. )em convicção alguma, a doente disse que

 'ulgava ter um pouco de "ebre. 7adame de Gosemonde intimou&me aque lhe tomasse o pulso, elogiando muito os meus conhecimentos demedicina.

minha bela teve pois o duplo desgosto de ser obrigada aestender&me o braço, e de sentir que a sua mentirola ia serdescoberta. e "ato, tomei a sua mão que apertei numa das minhas,enquanto que com a outra percorria o seu braço "resco e redondo. maliciosa pessoa não respondeu a nada, o que me "ez dizer aoretirar&me: 6ão tem sequer a mais ligeira perturbação.6 9alculei queos seus olhares deviam ser severos, e para a castigar não os

procurei.p*s um instante, disse que dese'ava levantar&se, e dei#ámo&la s*.

pareceu ao 'antar, que "oi triste( anunciou que não sairiapara passear, o que era dizer&me que eu não teria ocasião de lhe"alar. )enti bem que era o momento de soltar um suspiro e lançar umolhar doloroso. Ela esperava isso por certo, pois "oi a única vezdurante o dia que consegui encontrar os seus olhos.

pesar de toda a sua honestidade, tem os seus pequenosardis como qualquer outra. Encontrei o momento de lhe perguntar6se tinha a bondade de me instruir sobre a minha sorte6, e "iquei um

pouco admirado de a ouvir responder&me: 6)im, senhor, escrevi&lhe.6Eu estava muito apressado em receber a carta( mas "osse ainda porardil, desastramento ou timidez, ela s* ma entregou - noite, nomomento de se retirar para o seu quarto.

qui lha envio, 'untamente com o rascunho da minha( leia e 'ulgue: ve'a com que insigne "alsidade ela a"irma que não senteamor, quando eu estou convencido do contrário. E há de quei#ar&sese eu a enganar depois, quando ela não receia enganar&me antes=7inha bela amiga, o homem mais avisado consegue apenas manter&se ao n$vel da mulher mais verdadeira. )erá pois preciso acreditarem todo este contra&senso, e "atigar&me de desespero, porque

apetece - senhora simular rigor= 9omo é poss$vel evitar vingarmo&nos de tais per"$dias>... 7as paci!ncia...

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deus. 3enho ainda muito para escrever. prop*sito, devolver&me&á a carta da desumana( pode dar&se

o caso que por diante ela pretenda dar valor a essas misérias, e épreciso estar em regra.

ão lhe "alo da pequena ?olanges( "alaremos disso noutro

dia.

o castelo, TT de gosto de CD .

CARTA XXVI

A PRESIDENTE DE TOURVEL AO VISCONDE DE VALMONT

ecerto, senhor, não vir$eis a receber qualquer carta minha se

a minha tola conduta de ontem - noite não me obrigasse a entrarho'e em e#plicaç+es convosco. )im, chorei, con"esso&o: é poss$veltambém que me tivessem escapado as duas palavras que citais comtanto escrúpulo.

@ágrimas e palavras, tudo notastes( é preciso, pois, e#plicar&vos tudo.

Aabituada a inspirar apenas sentimentos honestos, a ouvirapenas palavras que posso escutar sem corar, a gozar porconseqS!ncia de uma tranqSilidade que ouso dizer que mereço, nãosei dissimular nem combater as impress+es que e#perimento. 2

espanto e a con"usão em que me lançou o vosso procedimento( nãosei que receio, inspirado por uma situação que não "oi "eita paramim( talvez a idéia revoltante de me ver con"undida com asmulheres que desprezais e tratada tão ligeiramente como elas( todasestas causas reunidas provocaram as minhas lágrimas e puderam"azer&me dizer, com razão segundo penso, que era desventurada.Esta e#pressão, que achais demasiado "orte, seria certamentedemasiado "raca se as minhas lágrimas e as minhas palavrastivessem motivo di"erente( se, em vez de reprovar sentimentos queme o"endem, eu tivesse receio de os partilhar.

ão, senhor ?isconde, não tenho esse receio( se o tivesse, eu

"ugiria para cem léguas de dist8ncia. Fria chorar para um deserto adesgraça de vos ter conhecido. 3alvez mesmo, apesar da certeza emque estou de nunca vos poder amar, talvez eu "izesse melhor emseguir os conselhos dos meus amigos: não dei#ar que vosapro#imásseis de mim.

)upus, e é esse o meu único erro, supus que respeitar$eis umamulher honesta, que não pedia mais do que achar&vos igualmentehonesto e "azer&vos 'ustiça( que 'á vos de"endia, enquanto aultra'áveis com os vossos criminosos dese'os. <em se v! que não meconheceis( não, senhor ?isconde, não me conheceis.

)e me conhec!sseis não ter$eis querido trans"ormar em

direitos os vossos agravos: porque me dirigistes palavras que eu nãodevia ouvir, não vos 'ulgar$eis autorizado a escrever&me uma carta

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que eu não devia ler. E pedis&me que guie os vossos passos, que diteas vossas palavras= 5ois bem, senhor, o sil!ncio e o esquecimento,eis os conselhos que me apraz dar&vos, e que vos convém seguir:então tereis, na verdade, direito - minha indulg!ncia. E s* de v*sdepende obterdes mesmo o meu reconhecimento...

7as não, não "arei um pedido a quem não teve respeito pormim( não darei mostras de con"iança a quem abusou da minhatranqSilidade. )ois v*s quem me obriga a recear&vos, talvez a odiar&vos. Eu não o dese'ava( queria ver em v*s apenas o sobrinho daminha mais respeitável amiga: opunha a voz da amizade - vozpública que vos acusava. ?*s destru$stes tudo( e, 'á o preve'o, não"areis nada para reparar o que destru$stes.

7e o"endem, que a con"issão deles me ultra'a, e sobretudoque, longe de poder um dia partilhá&los, me "orçais a não tornar aver&vos se não vos impuserdes a tal respeito um sil!ncio que meparece ter o direito de esperar, e mesmo de vos e#igir. 4unto a esta

carta a que me escrevestes e espero que "areis o "avor de medevolver esta( "icaria verdadeiramente desgostosa se "icasse algumvest$gio de um acontecimento que não deveria nunca ter&seproduzido. 3enho a honra de ser, etc.

TC de gosto de CD .

CARTA XXVII

CECÍLIA DE VOLANGES A MARQUESA DE MERTEUIL

7eu eus, como sois boa, senhora 7arquesa= 9omocompreendeste que me seria mais "ácil escrever&nos do que "alar&vos= a verdade, o que tenho a dizer&vos é muito di"$cil. 7as soisminha amiga, não é verdade> 2h= )im, minha boa amiga=

?ou "azer o poss$vel por não ter medo( e, depois, tenho tantaprecisão de v*s, dos vossos conselhos= )into&me muito triste, parece&me que toda a gente adivinha o que eu penso( e principalmentequando ele está presente, coro assim que alguém olha para mim.

2ntem, quando me vistes chorar, "oi porque eu queria "alar&vos ehavia não sei qu! que me impedia( e quando me perguntastes o queeu tinha, saltaram&me as lágrimas contra minha vontade. ão teriapodido dizer uma palavra. )e não "*sseis v*s, a 7amã saberia logodo que se tratava, e que iria ser de mim> E no entanto é assim queeu passo a minha vida, principalmente de há quatro dias para cá=

oi nesse dia, senhora 7arquesa, sim, sempre vos digo, "oinesse dia que o senhor 9avaleiro ancenP me escreveu: oh=, possodar&vos a certeza de que quando encontrei a carta eu não sabia doque se tratava( mas, para não mentir, não nego que senti muitoprazer ao l!&la. 5odeis acreditar, gostaria mais de( "icar triste toda a

vida, do que se ele me não tivesse escrito.

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7as eu sabia bem que não devia dizer&lhe isso, e possogarantir&vos que cheguei a dizer&lhe que tinha "icado zangada( masele disse que era mais "orte do que ele e eu acreditei( pois tinharesolvido não lhe responder, e no entanto não pude dei#ar de o"azer. 2h=

Escrevi&lhe apenas uma vez, e mesmo isso "oi em parte paralhe dizer que não voltasse a escrever&me. 7as apesar disso elecontinua( e como eu não lhe respondo, ve'o bem que ele está triste,e isso a"lige&me ainda mais. e maneira que não sei que "azer( nem oque resolver, e o que é certo é que sou digna de lástima.

izei&me, peço&vos, senhora 7arquesa, será mal "eitoresponder&lhe de tempos a tempos> )* até que ele compreenda quenão deve voltar a escrever&me, e "icarmos como dantes( pois, pormeu lado, se isto continua, não sei o que vai ser de mim. E estoubem certa de que se eu não lhe respondo, isso nos "ará so"rer aosdois.

?ou enviar&vos também a carta dele, ou uma c*pia, e "areis ovosso 'u$zo( vereis que o que ele me pede não é nada de mal. 7as sevirdes que não é coisa que se deva "azer, prometo&vos que nãocontinuarei( entretanto, creio que pensareis como eu e que em tudoisto não há nada de mal.

Enquanto aguardo o vosso parecer, permiti&me, senhora7arquesa, que vos "aça ainda uma pergunta: t!m&me dito que é "eioamar alguém( mas porque> 2 que me leva a perguntar&vos isto é queo 9avaleiro ancenP pretende que não é "eio tal e que quase todasas pessoas amam alguém( se é assim, não ve'o porque serei a única

a não poder "az!&lo( ou será que s* é "eio para as meninas solteiras>5ois eu tenho ouvido até - 7amã dizer que 7adame ... amava osenhor 7...( e quando ela "alava a esse respeito não parecia re"erir&se a uma coisa má, mas no entanto tenho a certeza de que ela sezangaria comigo se suspeitasse da minha amizade pelo senhorancenP. 7amã trata&me sempre como se eu "osse uma criança enão me diz nada. Eu 'ulgava, quando ela me "ez sair do convento,que era para me casar( mas agora parece&me que não. ão é que eutenha nisso interesse, asseguro&vos. 7as, sendo tão amiga da 7amã,sabeis talvez o que há a esse respeito e, se o souberdes, espero quemo direis.

2ra aqui está uma carta comprida, senhora 7arquesa, mas,como permitistes que eu vos escrevesse, aproveitei para vos dizertudo e conto com a vossa amizade.

 3enho a honra de ser, etc.

5aris, TB de gosto de CD .

CARTA XXVIII

O CAVALEIRO DANCENY A CECÍLIA VOLANGES

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5ois qu!, 7ademoiselle, continua a recusar responder&me=ão há nada que a possa comover, e cada dia leva consigo a

esperança que trou#era= )e consente que subsista entre n*s umaamizade, que amizade é essa não bastante poderosa para a tornarsens$vel - minha mágoa> )e a dei#a "ria e tranqSila, enquanto eu

passo pelos tormentos dum "ogo que não posso e#tinguir>)e, longe de lhe inspirar con"iança, não chega sequer para"azer nascer a sua piedade> 5ois qu!= 2 seu amigo so"re, e não "aznada para o socorrer= 5ede&lhe apenas uma palavra, e recusa&lha=

E quer que ele se contente com um sentimento tão "raco, etem até receio de lho con"irmar=

isse&me ontem que não dese'aria ser ingrata. h=, creia&me,7ademoiselle, querer pagar amor com amizade não é temer apenasa ingratidão, é amedrontar&se s* da idéia de parecer ingrata.Entretanto, não ouso continuar a "alar&lhe dum sentimento que nãopode dei#ar de a aborrecer, se não lhe interessa.

J preciso pelo menos encerrá&lo dentro de mim mesmo,aguardando que possa um dia venc!&lo. Eu sinto quanto será penosoesse trabalho( não dissimulo perante mim pr*prio que tereinecessidade de todas as minhas "orças( tentarei todos os meios:e#iste um que será o mais di"$cil para o meu coração, é o de repetirmuitas vezes comigo mesmo que o seu é insens$vel.

 3erei de e#perimentar v!&la menos vezes, e penso 'á namaneira de encontrar um prete#to plaus$vel.

5ois qu!= 3erei de perder o doce hábito de a ver todos os dias=h= 5elo menos não dei#arei 'amais de lamentá&lo. ;ma perpétua

angústia será o preço do amor mais terno( assim o terá querido, eessa será sua obra= 4amais, sinto&o, tornarei a encontrar a "elicidade que ho'e

perco( s* a 9ec$lia era "eita para o meu coração. 9om que prazer"arei o 'uramento de não viver senão para si= 7as ve'o bem que nãoquer receber esse 'uramento.

2 seu sil!ncio basta para me "azer compreender que o seucoração não lhe diz nada em meu "avor( é ao mesmo tempo a provamais segura da sua indi"erença e a maneira mais cruel de maanunciar.

deus, 7ademoiselle.

 4á não ouso esperar uma resposta( o amor t!&la&ia escrito comsolicitude, a amizade com prazer, a piedade mesmo comcomplac!ncia( mas a piedade, a amizade e o amor são igualmenteestranhos ao seu coração.

5aris, TB de gosto de CD

CARTA XXXIX

CECíLIA VOLANGES A SOFIA CARNAY 

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Eu bem te tinha dito, )o"ia, que havia casos em que se podiaescrever( e asseguro&te que me censuro muito por ter seguido o teuconselho, que nos deu tanta mágoa, ao 9avaleiro ancenP e a mim. prova de que eu tinha razão é que 7adame de 7erteuil, que é umamulher que com certeza o sabe muito bem, acabou por pensar como

eu. 9on"essei&lhe tudo. 5rimeiro ela disse&me o mesmo que tu(mas quando eu lhe e#pliquei tudo, concordou que era muitodi"erente. E#ige somente que eu lhe mostre todas as minhas cartas etodas as do 9avaleiro ancenP, a "im de estar certa de que eu nãodirei senão o que "or necessário.

5or isso, sinto&me agora tranqSila. 7eu eus, como eu gostode 7adame de 7erteuil= J tão boa= E olha que é uma senhora muitorespeitável. 5or isso não há nada a dizer.

e que maneira vou escrever ao senhor ancenP e como elevai "icar contente= ?ai "icar ainda mais contente do que ele pensa,

pois até aqui eu s* lhe "alava da minha amizade, e ele queria sempreque eu dissesse o meu amor. 4ulgo que é a mesma coisa( mas en"imeu não ousava, e ele teimava nesse ponto. 9ontei isso a 7adame de7erteuil( ela disse&me que eu tinha razão, e que não convinha "alarde amor, enquanto uma pessoa se pode impedir de o "azer. 2ra eutenho a certeza de que não poderei impedir&me de o "azer por muitotempo( no "im de contas é a mesma coisa, e isso agradar&lhe&á muitomais.

7adame de 7erteuil disse&me também que ia emprestar&melivros que "alam de tudo isso, e que me ensinariam a conduzir&me, e

também a escrever melhor do que o "aço( pois, como v!s, ela diz&metodos os meus de"eitos, o que é uma prova de que é muito minhaamiga. )* me recomendou que não dissesse nada - 7amã a respeitodos livros, porque podia parecer que ela 'ulgava que a 7amã tinhadescuidado a minha educação e isso "azer com que ela se zangasse.2h = ão lhe direi nada a tal respeito.

cho no entanto muito e#traordinário que uma senhora quequase não é da minha "am$lia tenha mais cuidado comigo do que aminha mãe=

oi uma "elicidade para mim t!&la conhecido=Ela pediu também - 7amã que me dei#asse ir com ela depois

de amanhã - Npera, para o seu camarote( disse&me que estar$amossozinhas e que conversar$amos todo o tempo, sem receio de quealguém nos ouvisse: pre"iro isso muito mais a ouvir a *pera.9onversaremos também a respeito do meu casamento, pois eladisse&me que sempre era certo que eu ia casar&me( mas não pudesaber mais do que isso. 2ra não é na verdade muito de admirar quea 7amã não me tenha dito nada a tal respeito>

deus, minha )o"ia( vou imediatamente escrever ao 9avaleiroancenP. 2h= 9omo eu estou contente=

TI de gosto de CD .

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CARTA XXX

CECÍLIA VOLANGES AO CAVALEIRO DANCENY 

En"im, senhor, consinto em escrever&lhe, para que este'a certoda minha amizade, do meu amor, visto que, sem isso, se sentiriain"eliz. iz o senhor que eu não tenho bom coração( garanto&lhe quese engana e espero que de agora em diante não tenha dúvidas aesse respeito. )e se sentia triste por eu não lhe escrever, 'ulga queisso não me "azia pena a mim também> 7as é que, por coisanenhuma do mundo, eu dese'aria "azer qualquer coisa que me"icasse mal( e mesmo não estaria tão certa do meu amor por si senão tivesse sentido mágoa por não lhe escrever.

7as a sua tristeza custava&me muito. Espero que daqui pordiante 'á a não sinta e que iremos ser muito "elizes.

9onto ter o prazer de o ver esta noite e que virá tão cedoquanto poss$vel( nunca será tão cedo como eu dese'o. 7amã ceiaem casa, e creio que lhe dirá para "icar. Espero que não este'acomprometido como anteontem. Era então muito agradável a ceia aque ia assistir> 2 certo é que "oi para lá muito cedo.

7as en"im, não "alemos disso: agora que 'á sabe que o amo,espero que "icará 'unto de mim o mais tempo que possa. 5ois eu nãoestou contente senão quando está ao pé de mim, e dese'aria que omesmo acontecesse com o senhor.

borrece&me muito que este'a ainda triste neste momento,

mas não é minha a culpa. @ogo que chegue, pedirei para tocar harpa,a "im de que receba a minha carta o mais cedo poss$vel.ão posso "azer mais do que isto.deus. mo&o muito, de todo o coração. 0uanto mais lho digo,

mais me sinto satis"eita. Espero que o este'a também.

TI de gosto de CD .

CARTA XXXI

O CAVALEIRO DANCENY A CECÍLIA VOLANGES

)im, sem dúvida, seremos "elizes. minha "elicidade é certa,porque sou amado por si( a sua não terá "im, se tiver de durar tantocomo o amor que me inspirou. 5ois qu!= ma&me, e 'á não receia"alar&me do seu amor=

0uanto mais mo diz, mais se sente satis"eita= epois de leraquele encantador amo&o, escrito pela sua mão, ouvi a sua lindaboca con"essar&mo de novo. ?i "i#arem&se em mim esses olhosencantadores que a e#pressão de ternura embelezava ainda mais.

Gecebi a 'ura de viver sempre para mim somente. h= Geceba a

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minha de consagrar a vida inteira - sua "elicidade( receba&a, e podeestar certa de que não a trairei nunca.

0ue dia "eliz passamos ontem= h= 5or que é que 7adame de7erteuil não tem segredos para dizer todos os dias - sua 7amã> 5orque é necessário que a idéia do constrangimento que nos espera

venha misturar&se - lembrança deliciosa que me prende> 5or quenão posso eu ter sempre segura essa linda mão que me escreveuamo&o> 9obri&la de bei'os, vingar&me assim da recusa de meconceder um "avor maior>

iga&me, minha 9ec$lia: quando a sua 7amã voltou para 'untode n*s( quando "omos obrigados, pela sua presença, a não dirigirmosum ao outro mais do que olhares indi"erentes( quando não podia 'áconsolar&me, pela certeza do seu amor, da recusa de me dar provasdele, não sentiu nenhum pesar> ão disse consigo mesma: 6;m bei'ot!&lo&ia tornado mais "eliz, e "ui eu quem lhe roubou essa "elicidade>65rometa&me, minha adorável amiga, que na primeira ocasião será

menos severa. 9omo au#$lio dessa promessa, encontrarei coragempara suportar as contrariedades que as circunst8ncias nos preparam(e as privaç+es cruéis serão ao menos suavizadas pela certeza de quea 9ec$lia partilha comigo esse segredo.

deus, minha encantadora 9ec$lia. 9hegou a hora em quedevo dirigir&me a sua casa. )er&me&ia imposs$vel dei#á&la, se não"osse para a tornar a ver. deus, * ente que tanto amo e a quemamarei cada vez mais=

TO de gosto de CD.

CARTA XXXII

MADAME DE VOLANGES A PRESIDENTE DE TOURVEL

ese'ais pois, senhora, que eu acredite na virtude do senhorde ?almont> 9on"esso que não posso resolver&me a isso, e que "areitanto es"orço em sup%&lo honesto, em "ace da única circunst8ncia deque me destes parte, como em 'ulgar vicioso um homem de bem

reconhecido como tal, de quem tivesse chegado ao meuconhecimento uma "alta. humanidade não é per"eita em nenhumg!nero, nem no mal nem no bem.

2 celerado tem as suas virtudes, como o homem honesto temas suas "raquezas.

Esta verdade parece&me tanto mais necessária a ter presentequanto é dela que depende a necessidade de indulg!ncia para osmaus como para os bons( e é ela que preserva estes do orgulho, esalva os outros do des8nimo. eveis sem dúvida achar que eu usomuito mal neste momento daquela indulg!ncia que preconizo( masnão ve'o nela senão uma "raqueza perigosa, se nos obrigar a tratar

de igual modo o vicioso e o homem de bem.

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ão me permitirei perscrutar os motivos da ação do senhor de?almont( dese'o acreditar que tais motivos são tão louváveis como apr*pria ação. 7as, por isso, dei#ou ele de passar a sua vida a levar aperturbação, a desonra e o esc8ndalo ao seio das "am$lias> Escutai,se o entendeis, a voz do in"eliz que ele socorreu( mas que ela não

vos prive de ouvirdes os gritos das cem v$timas que ele imolou. indaque ele não "osse, como dizeis, senão um e#emplo do perigo decertas ligaç+es, dei#aria por isso de ser ele pr*prio uma ligaçãoperigosa> 5odeis 'ulgá&lo suscet$vel de um resgate "eliz>

?amos mais longe: suponhamos que esse milagre se cumpriu.ão "icaria ainda contra ele a opinião pública e não basta ela pararegular a vossa conduta> )* eus pode absolver no instante doarrependimento( Ele l! nos coraç+es. 7as os homens não podem

 'ulgar os pensamentos senão através dos atos( e nenhum de entreeles, depois de ter perdido a estima dos outros homens, tem o direitode se quei#ar da descon"iança necessária, que torna essa perda tão

di"$cil de reparar.5ensai sobretudo, minha 'ovem amiga, que, para perder essa

estima, basta algumas vezes parecer atribuir&lhe pouco valor( e nãochameis in'ustiça a essa severidade( pois, além de haver "undamentopara crer que não se renuncia a esse bem precioso quando se tem odireito de o pretender, quem assim procede está na verdade maispr*#imo de praticar o mal quando não é impedido por esse poderoso"reio. Esse seria, entretanto, o aspecto sob o qual vos deveriaaparecer uma ligação $ntima com o senhor de ?almont, por muitoinocente que ela pudesse ser.

medrontada pelo calor com que o de"endeis, apresso&me aprevenir as ob'eç+es que anteve'o. 9itar&me&eis 7adame de 7erteuil,a quem "oi perdoada essa ligação( ides perguntar&me por que motivoo recebo eu em minha casa( dir&me&eis que, longe de ser repelidopelas pessoas honestas, ele é admitido, procurado mesmo pelo quese chama a boa sociedade. 5osso, segundo creio, responder a tudo.

Em primeiro lugar 7adame de 7erteuil, de "ato uma pessoamuito estimável, não tem talvez outro de"eito além de depositardemasiada con"iança nas suas "orças: é um guia muito hábil que secompraz em conduzir um carro entre rochedos e precip$cios e que s*o !#ito 'usti"ica. J 'usto que a louvemos, mas seria imprudente segui&

la. Ela pr*pria está de acordo e disso se acusa. H medida que os seusolhos se "oram abrindo, os seus princ$pios tornaram&se mais severos(e não tenho receio de a"irmar&vos que ela deve pensar como eu.

0uanto ao que me diz respeito, não me 'usti"icarei mais doque aos outros. )em dúvida, recebo o senhor de ?almont, que érecebido em toda a parte( é uma inconseqS!ncia mais a acrescentara muitas outras que governam a sociedade. )abeis tão bem como euque passamos a vida a notá&las, a lamentá&las e a entregarmo&nos aelas. 2 senhor de ?almont, com um bom nome, uma grande "ortuna,muitas qualidades amáveis, reconheceu muito cedo que, paradominar na sociedade, basta saber mane'ar, com igual destreza, o

louvor e o rid$culo. inguém como ele possui esse duplo talento:seduz com um e "az&se temer com o outro. inguém o estima( mas

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todos o lison'eiam. 3al é a sua e#ist!ncia no meio de um mundo que,mais prudente que cora'oso, pre"ere poupá&lo a combat!&lo.

7as nem a pr*pria 7adame de 7erteuil, nem nenhuma outramulher, ousaria sem dúvida ir encerrar&se no campo, quase a s*scom semelhante homem. Estava reservado a mais a'uizada, - mais

modesta de todas as mulheres, dar o e#emplo dessa inconseqS!ncia(perdoai&me esta palavra, que escapou - minha amizade. 7inha boaamiga, é a vossa pr*pria honestidade que está a trair&vos, em virtudeda segurança que vos inspira.

5ensai entretanto que tereis por 'u$zes, por um lado, pessoas"r$volas que não acreditarão numa virtude de que não encontram omodelo - sua volta( e, por outro, pessoas malévolas, que "ingirão nãoacreditar em tal virtude, para vos castigarem de a possuirdes.

9onsiderai que estais "azendo, neste momento, o que algunshomens não ousariam arriscar. e "ato, entre as pessoas 'ovens, dequem o senhor de ?almont se tornou em e#cesso o oráculo, ve'o que

as mais prudentes receiam parecer ligadas demasiado intimamentecom ele( e v*s não tendes qualquer receio=

h= 5ensai, pensai muito nisto, sou eu que vos peço... )e asminhas raz+es não "orem su"icientes para vos persuadir, cedei então- minha amizade( é ela que me "az renovar as minhas inst8ncias, é aela que cabe 'usti"icá&las. 5or certo a achareis severa eu dese'o queela se'a inútil( mas pre"iro que tenhais antes de vos quei#ardes davossa solicitude do que da vossa neglig!ncia.

TI de gosto de CD .

CARTA XXXIII

A MARQUESA DE MERTEUIL AO VISCONDE DE VALMONT

;ma vez que receia ser bem sucedido, meu caro ?iscondeuma vez que o seu pro'eto consiste em "ornecer armas contra sipr*prio, e que dese'a menos triun"ar do que combater, nada maistenho a dizer&lhe. sua conduta é uma obra&prima de prud!ncia.

)eria uma obra&prima de tolice na suposição contrária( e para lhe"alar com "ranqueza, receio que o ?isconde se este'a a iludir.2 que eu lhe censuro não é o ter dei#ado de aproveitar o

momento.5or um lado, não ve'o muito claramente que ele se tivesse

apresentado( por outro, sei su"icientemente, digam o que disserem,que uma ocasião perdida se torna a encontrar, ao passo que não seresgata nunca um passo precipitado.

7as é de verdadeiro colegial o ter sido levado a escrever.esa"io&o neste momento a prever onde isso o pode conduzir.

5orventura espera provar a essa mulher que deve entregar&

se>

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"igura&se&me que nisso pode haver uma verdade desentimento, não de demonstração( e que, para a "azer reconhecer, épreciso agir pelo enternecimento e não pelo racioc$nio( mas de quelhe servirá enternecer por meio de cartas, visto que o ?isconde nãoestaria lá para se aproveitar do momento> 7esmo que as suas belas

"rases produzam a embriaguez do amor, pode o ?isconde ter apretensão de que essa embriaguez se'a bastante durável para que are"le#ão não venha a impedir&lhe a con"issão>

epois, pense em tudo o que é necessário para escrever umacarta, em tudo o que se passa antes de a remeter( e ve'a&se,sobretudo uma mulher de princ$pios, como a sua devota, podequerer por tanto tempo o que ela procura não querer nunca. Esseprocedimento pode dar resultado com crianças, que, quandoescrevem 6eu amo6, não sabem que dizem 6eu entrego&me6. 7as avirtude raciocinadora de 7adame de 3ourvel conhece muito bem,segundo creio, o valor das palavras. 5or isso, apesar da vantagem

que o ?isconde tomara sobre ela na conversação que tiveram, elavenceu&o na carta que lhe escreveu. E depois, sabe o que acontece>)* pelo motivo de se discutir, não se dese'a ceder "orça de procurarboas raz+es, acaba&se por encontrá&las( dizem&se essas raz+es, edepois sente&se apego a elas, não tanto porque são boas, como paranão se desmentir.

lém do mais, uma observação que me admiro que o?isconde não tenha "eito, é que não há nada tão di"$cil em amorcomo escrever o que se não sente. 0uero dizer, escrever de maneiraveross$mil: não é que as palavras usadas não se'am as mesmas( mas

não são arran'adas do mesmo modo, ou antes, são arran'adas, e issobasta. Geleia a sua carta: reina nela uma ordem que a cada "rase odenuncia. 0uero acreditar que a sua 5residente não tem instruçãobastante para disso se aperceber: mas que importa> em por isso oe"eito dei#a de "rustrar&se. J este o de"eito dos romances( o autores"orça&se em vão para elevar a temperatura, e o leitor "ica "rio.Aelo$sa é o único que pode "azer e#ceção( e apesar do talento doautor, esta observação levou&me sempre a crer que o "undo eraverdadeiro. ão é o mesmo quando se "ala. 2 hábito de trabalhar oseu *rgão dá&lhe sensibilidade( a "acilidade das lágrimas aumenta oe"eito: a e#pressão do dese'o con"unde&se nos olhos com a ternura(

en"im, o discurso menos seguido conduz mais "acilmente -quele arde perturbação e de desordem que é a verdadeira eloqS!ncia doamor( e principalmente a presença do ob'eto amado impede are"le#ão e "az&nos dese'ar sermos vencidos.

9reia&me, ?isconde: ser&lhe&á "avorável não escrever mais:aproveite essa pausa para reparar a sua "alta e espere a ocasião de"alar. )abe que essa mulher tem mais "orça do que supunha>

sua de"esa é boa( sem a e#tensão da sua carta e o prete#toque ela lhe dá para voltar ao assunto na sua "rase dereconhecimento, de nenhum modo se teria tra$do.

2 que me parece ainda que deve convenc!&lo do triun"o, é

que ela emprega demasiadas "orças ao mesmo tempo( preve'o que

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ela acabará por as esgotar pela de"esa da palavra e que nenhumalhe "icará para a do ato.

evolvo&lhe as duas cartas, e, se "or prudente, serão essas asúltimas até ao "eliz momento. )e não "osse tão tarde "alar&lhe&ia dapequena ?olanges, que avança bastante depressa, o que muito me

satis"az. 9reio que terminarei a minha tare"a antes do ?isconde, edeve sentir&se "eliz por isso. deus por ho'e.

TI de gosto de CD .

CARTA XXXIV

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

ala maravilhosamente, minha boa amiga( mas para que se"atiga tanto a provar aquilo que ninguém ignora> 5ara avançardepressa no amor, vale mais "alar do que escrever( a isto, creia, seresume, a sua carta. 5ois sim=

7as são os elementos mais simples da arte de seduzir.2bservarei somente que a 7arquesa abre apenas uma e#ceção aeste princ$pio( e que na verdade há duas. as crianças que seguemesse caminho por timidez e se entregam por ignor8ncia, devemosacrescentar as mulheres espirituosas, que se dei#am comprometerpor amor&pr*prio, e que se dei#am cair na ratoeira por vaidade. 5or

e#emplo( estou bem certo de que a 9ondessa de <..., que respondeusem di"iculdade - minha primeira carta, não tinha então mais amorpor mim do que eu por ela, e que viu apenas a ocasião de tratar umassunto que lhe "aria honra.

e qualquer modo, um advogado diria - minha boa amiga queo princ$pio não se aplica - questão. e "ato, a 7arquesa sup+e queeu posso escolher entre escrever e "alar, o que não é o caso. esde ahist*ria do dia CR, a minha desumana, que se mantém na de"ensiva,tem evitado os encontros com uma habilidade que desarmou aminha. coisa chegou a tal ponto que, se isto continua, ela acabarápor me obrigar a ocupar&me seriamente dos meios de recuperar a

vantagem perdida( pois seguramente não quero ser vencido por elaem qualquer campo. 7esmo as minhas cartas estão sendo motivo deuma pequena guerra: não contente de lhes não responder, recusareceb!&las. 5ara cada uma é necessário p%r em prática uma novaastúcia, que nem sempre resulta.

eve recordar&se do meio simples de que usei para lheentregar a primeira( a segunda não o"ereceu maior di"iculdade. Elapedira&me que lhe devolvesse a sua carta: dei&lhe a minha no lugardaquela, sem que ela tivesse a menor suspeita. 7as, "osse pelodespeito de ter sido apanhada, "osse por capricho, ou, en"im, porvirtude, pois ela "orçar&me&á a crer nessa virtude, recusou&se

teimosamente a receber a terceira. Espero todavia que o embaraço

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em que acabará por a lançar a obstinação nessa recusa lhe serviráde corretivo para o "uturo.

ão me admirei muito por ela não querer receber a carta queeu lhe o"erecia com toda a simplicidade( seria 'á conceder qualquercoisa, e eu estou na e#pectativa de uma de"esa mais prolongada.

p*s esta tentativa, que não passou de uma e#peri!ncia passageira,pus um sobrescrito na minha carta( e, aproveitando o momento datoalete, quando 7adame de Gosemonde e a criada de quartoestavam presentes, enviei&lha pelo meu criado, com ordem de lhedizer que era o papel que ela me tinha pedido. Eu adivinhara que elateria receio da e#plicação escandalosa a que uma recusa obrigaria:com e"eito aceitou a carta( e o meu embai#ador, que tinha ordem deobservar o seu rosto, e que tem boa vista, en#ergou apenas umaleve vermelhidão e mais embaraço do que c*lera.

elicitei&me pois por ela ter guardado a carta, a menos quequisesse entregar&ma, o que s* poderia "azer estando s* comigo,

dando&me ocasião de lhe "alar. 9erca de uma hora depois, um dosseus criados entra&me no quarto e entrega&me, da parte da suasenhora, um embrulho de "orma di"erente do meu, e em cu'osobrescrito reconheci a letra tão dese'ada.

bro&o precipitadamente...Era a minha pr*pria carta, por abrir, e apenas dobrada ao

meio.)uspeito que s* o receio de que eu "osse menos escrupuloso

do que ela sobre o esc8ndalo a levou a empregar esta astúciadiab*lica.

7arquesa conhece&me( não tenho necessidade de lhedescrever a minha c*lera. oi&me preciso no entanto recuperar osangue&"rio e procurar novos meios. Eis o único que encontrei.

 3odos os dias alguém vai daqui buscar as cartas ao correio,que "ica a cerca de tr!s quartos de légua( para este "im, servem&sede uma cai#a coberta pouco mais ou menos como um tronco, de queo che"e do correio tem uma chave e 7adame de Gosemonde outra.

urante o dias as cartas são a$ depositadas, a qualquer hora(- noite levam&nas para o correio, e de manhã vão buscar as quechegaram. 3odos, mesmo os estranhos ao castelo, "azem esseserviço igualmente. ão era a vez do meu criado( mas ele

encarregou&se de lá ir, com o prete#to de que tinha a"azeres paraaquele lado.Entretanto escrevi a minha carta. is"arcei a letra para o

endereço, e imitei muito bem, no sobrescrito, o carimbo de i'on.Escolhi esta cidade porque achei mais engraçado( visto que eu mecandidatava aos mesmos direitos que o marido, escrever do lugaronde ele se encontra, e também porque a minha bela "alava durantetodo o dia do dese'o que tinha de receber cartas de i'on. 5areceu&me 'usto conceder&lhe esse prazer.

 3omadas estas precauç+es, era "ácil "azer que esta carta se 'untasse -s outras. 9om este e#pediente tive ainda a vantagem de

ser testemunha da recepção, pois há aqui o uso de nos 'untarmos

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para almoçar e esperar a chegada das cartas antes de nossepararmos. 9hegaram en"im as cartas.

7adame de Gosemonde abriu a cai#a. 6e i'on6, disse ela,dando a carta de 7adame de 3ourvel. 6ão é a letra de meu marido6,replicou ela com voz inquieta, rompendo o lacre com vivacidade. 2

primeiro olhar deu&lhe a saber de que se tratava( e houve tamanhaalteração no seu rosto, que 7adame de Gosemonde, dando contadisso, perguntou: 60ue tem>6

pro#imei&me também, dizendo: 6J assim tão terr$vel essacarta>6 t$mida devota não ousava levantar os olhos, não diziapalavra, e, para dis"arçar o seu embaraço, "ingia percorrer a ep$stola,que ela não estava em estado de ler. Eu gozava da sua perturbação,e não "iz cerim%nia em a aumentar: 62 seu aspecto mais tranqSilo6,acrescentei, 6"az esperar que essa carta lhe tenha causado maissurpresa do que mágoa.W c*lera então inspirou&a melhor do quenão o havia "eito a prud!ncia. 6Esta carta contém coisas que me

o"endem6, respondeu ela, 6e surpreendeu&me que alguém ousasseescrev!&las.6 60uem "oi então>6, interrompeu 7adame deGosemonde. 6ão está assinada6, respondeu a bela encolerizada,6mas a carta e o seu autor inspiram&me igual desprezo. 2bsequeiam&me não me "alando mais nisto6. izendo estas palavras, rasgou aaudaciosa missiva, meteu os pedaços no bolso, levantou&se e saiu.

pesar da sua c*lera, não dei#ou de receber a minha carta( eeu con"io bastante na sua curiosidade, que a obrigará a l!&la porinteiro.

2s pormenores do dia levar&me&iam muito longe. 4unto a esta

narrativa os rascunhos das minhas duas cartas: assim a 7arquesa"icará tão instru$da como eu. )e quiser estar ao corrente da minhacorrespond!ncia, é preciso acostumar&se a deci"rar as minhasminutas, pois por nada no mundo eu devoraria o aborrecimento deter de as copiar. deus, minha bela amiga.

TO de gosto de CD .

CARTA XXXV

O VISCONDE DE VALMONT A PRESIDENTE DE TOURVEL

J preciso obedecer&vos, senhora, é preciso provar&vos que, nomeio dos agravos que vos comprazeis em atribuir&me, me resta aomenos bastante delicadeza para não me permitir uma censura ebastante coragem para me impor os mais dolorosos sacri"$cios.2rdenais&me o sil!ncio e o esquecimento= 5ois bem= orçarei o meuamor a calar&se( e esquecerei, se "or poss$vel, a maneira cruel comoo acolhestes. )em dúvida o dese'o de vos agradar não dava taldireito, e con"esso ainda que a necessidade que tenho da vossa

indulg!ncia não era um t$tulo para a obter.

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7as achais que o meu amor é um ultra'e( esqueceis que se elepudesse ser um agravo, ser$eis ao mesmo tempo a causa e a

 'usti"icação.Esqueceis também que, acostumado a abrir&vos a minha

alma, mesmo quando essa con"iança podia ser&me desvanta'osa, 'á

me não era poss$vel esconder&vos os sentimentos de que estoupenetrado( e o que "oi a obra da minha boa "é, é por v*s avaliadocomo o "ruto da audácia. 9omo preço por amor mais terno, maisrespeitoso, mais verdadeiro, e#pulsais&me para longe de v*s. E, por"im, "alais&me do vosso *dio...

0ue outro se não quei#aria de ser tratado assim> Eu, contudo,submeto&me: so"ro tudo e não me lamento de nada( "eris&me e euadoro&vos. 2 inconceb$vel dom$nio que tendes sobre mim torna&vossenhora absoluta dos meus sentimentos( e se s* o meu amor vosresiste, se não o podeis destruir, é porque ele é a vossa obra e não aminha.

ão peço um regresso a um tratamento de que nunca pudegozar.

ão espero mesmo aquela piedade que o interesse quealgumas vezes me testemunhastes podia "azer&me esperar. 7ascreio, con"esso&o, poder reclamar a vossa 'ustiça. izestes&mecompreender, senhora, que alguém procurou diminuir&me no vossoesp$rito. )e tivésseis seguido o conselho dos vossos amigos, nãoter$eis dei#ado sequer que me apro#imasse: são os vossos pr*priostermos. 0uais são pois esses amigos o"iciosos> )em dúvida pessoastão severas, e duma virtude tão r$gida, consentem em ser nomeadas(

sem dúvida não quererão cobrir&se de uma obscuridade que ascon"undiria com vis caluniadores( e não ignorarei nem os seusnomes, nem as suas censuras. 5ensai, senhora, que tenho o direitode conhecer uns e outros, pois que me 'ulgareis segundo eles. ão secondena um criminoso sem se lhe dizer qual o seu crime, sem lhenomear os seus acusadores. ão peço outra graça, e comprometo&me de antemão a 'usti"icar&me, a "orçá&los a desdizerem&se.

)e desprezei demasiado, talvez, os vãos clamores de umpúblico que tive em pequena conta, não acontece assim com a vossaestima: e quando consagro a minha vida a merec!&la, não dei#areiimpunemente que ma roubem. Ela tornar&se&me&á tanto mais

preciosa, quanto lhe deverei sem dúvida esta pergunta que temeis"azer&me, e que me daria, como dizeis, direitos ao vossoreconhecimento. h= @onge de o e#igir, 'ulgarei "icar&vos em d$vida,se me concederdes a ocasião de vos ser agradável. 9omeçai pois porme "azer mais 'ustiça, não me dei#ando ignorar o que dese'ais demim. )e eu pudesse adivinhá&lo, evitar&vos&ia a pena de o dizer. oprazer de vos ver, acrescentai "elicidade de vos servir, e louvar&me&eida vossa indulg!ncia.

0ue pode deter&vos> ão é, espero&o, o receio de uma recusa.)into que não poderia perdoar&vos tal receio. ese'o, mais do quev*s, senhora, que ela dei#e de me ser necessária: mas acostumado a

 'ulgar&vos uma alma tão doce, é nessa carta que eu posso encontrar&vos tal como quereis parecer. 0uando "ormulo o voto de vos tornar

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sens$vel, ve'o nessa carta que, em vez de consentirdes em tal, maisdepressa "ugir$eis para cem léguas de dist8ncia de mim( quando tudoaumenta e 'usti"ica o meu amor, é ainda ela que me repete que omeu amor é recebido como um ultra'e( e quando, ao ver&vos, esseamor me parece o bem supremo, tenho necessidade de ler essa

carta, para sentir que ele é apenas um horr$vel tormento. 9oncebeiagora que a minha maior "elicidade estaria em poder entregar&vosessa carta "atal( pedir&ma ainda seria autorizar&me a não acreditar noque ela contém( não duvidareis, espero, da minha prontidão emdevolv!&la.

TC de gosto de CD .

CARTA XXXVI

O VISCONDE DE VALMONT A PRESIDENTE DE TOURVEL

Lcarimbo de i'on1

vossa severidade aumenta dia a dia, senhora( e se me épermitido diz!&lo, parece&me que receais menos ser in'usta do queser indulgente.

epois de me haverdes condenado sem me ouvir, deveis tersentido, de "ato, que vos seria mais "ácil não ler as minhas raz+es

que responder&lhes.Gecusais as minhas cartas com obstinação( devolveis&mascom desprezo. 2brigais&me por "im a recorrer - astúcia, no pr*priomomento em que o meu único "im é convencer&vos da minha boa "é. necessidade em que me pusestes de me de"ender bastará semdúvida para desculpar os meios que uso para tal "im. 9onvencido,aliás, pela sinceridade dos meus sentimentos, que para os 'usti"icar avossos olhos me basta dá&los bem a conhecer, 'ulguei poder permitir&me este ligeiro desvio. 2uso crer também que mo perdoareis( e quepouco vos deverá surpreender que o amor se'a mais engenhoso aproduzir&se do que a indi"erença a a"astá&lo.

5ermiti, pois, senhora, que o meu coração se vos descubrainteiramente. 5ertence&vos, é 'usto que o conheçais.o chegar a casa de 7adame de Gosemonde, eu estava muito

longe de prever a sorte que a$ me esperava. Fgnorava que estivésseisaqui( e acrescentarei, com a sinceridade que me caracteriza, que,ainda que o soubesse, a minha tranqSilidade não se perturbaria. ãoque a vossa beleza não me merecesse a 'ustiça que é imposs$velrecusar&lhe( mas, acostumado a sentir apenas dese'os, e a entregar&me apenas -queles que eram animados pela esperança, eu nãoconhecia os tormentos do amor.

ostes testemunha das inst8ncias de 7adame de Gosemonde

para que eu me demorasse algum tempo. 3inha 'á passado um dia avosso lado( entretanto não me rendi, ou pelo menos 'ulguei render&

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me apenas ao prazer, tão natural e tão leg$timo, de dedicar algumasatenç+es a uma parenta respeitável. 2 g!nero de vida que se levavaaqui era sem dúvida muito di"erente daquele a que estavaacostumado. ada me custou con"ormar&me a ele( e, sem procurarpenetrar a causa da mudança que se operava em mim, atribu$&a

ainda unicamente -quela "elicidade de caráter de que 'ulgo ter&vos"alado.Fn"elizmente Le por que é necessário que isto se'a uma

in"elicidade>1, conhecendo&vos melhor, depressa reconheci que essa"igura encantadora, que simplesmente me havia impressionado, erao menor dos vossos dotes( a vossa alma celestial surpreendeu,seduziu a minha. dmirava a beleza( "iquei adorando a virtude.

)em pretender obter&vos, preocupava&me em vos merecer.Geclamando a vossa indulg!ncia para o passado, ambicionava

a vossa aprovação para o "uturo. 5rocurava&a nas vossas palavras,espiava&a nos vossos olhares( nesses olhares donde partia um

veneno tanto mais perigoso quanto era derramado sem intenção erecebido sem descon"iança.

Então conheci o amor. 7as como eu estava longe de melamentar= ecidido a sepultá&lo num eterno sil!ncio, entregava&mesem receio e sem reserva a esse sentimento delicioso.

9ada dia aumentava o seu império. epressa o prazer de vosver se trans"ormou em necessidade. )e vos ausentáveis por ummomento, o meu coração sentia&se apertado de tristeza( e palpitavade alegria, ao ru$do que me anunciava o vosso regresso. Eu 'á nãoe#istia senão por v*s, e para v*s.

Entretanto, é a v*s mesmo que suplico uma resposta:porventura na alegria dos 'ogos despreocupados, ou no interesseduma conversação séria, me escapou uma palavra que pudesse trairo segredo do meu coração>

9hegou en"im um dia em que devia começar o meu in"ortúnio(e por uma inconceb$vel "atalidade, uma ação honesta devia marcaresse começo. )im, "oi no meio dos in"elizes que eu tinha socorrido,que v*s, senhora, entregando&vos a essa sensibilidade preciosa queembeleza a pr*pria beleza e aumenta o preço da virtude, acabastesde desvairar um coração inebriado 'á por e#cesso de amor. @embrais&vos, talvez, da preocupação que se apoderou de mim no regresso= i

de mim= 5rocurava combater uma inclinação que eu sentia tornar&semais "orte do que eu.oi depois de ter esgotado as minhas "orças nesse combate

desigual, que um acaso, que eu não pudera prever, me "ez encontrara s*s convosco.

)ucumbi nesse momento, con"esso&o. 2 meu coraçãodemasiado cheio não p%de reter as suas palavras e as suas lágrimas.7as é isso um crime> E se o é, não so"reu 'á castigo bastante pelostormentos horrorosos a que estou entregue>

evorado por um amor sem esperança, imploro a vossapiedade e encontro apenas o vosso *dio. )em outra "elicidade além

de ver&vos, os meus olhos procuram&vos para além da minhavontade, e tremo de encontrar os vossos olhares. o estado cruel a

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que me reduzistes, passo os dias a dis"arçar as minhas penas e asnoites a entregar&me a elas( enquanto que v*s, tranqSila e calma,não conheceis esses tormentos senão para os causardes e aplaudir&vos deles. Entretanto, sois v*s que vos lamentais, e sou eu quempede perdão.

qui está, todavia, senhora, a narração "iel do que chamais osmeus agravos, e que talvez "osse mais 'usto chamar os meusin"ortúnios. ;m amor puro e sincero, um respeito que 'amais sedesmentiu, uma submissão per"eita: tais são os sentimentos que meinspirastes. ão recearia apresentar semelhante homenagem -pr*pria divindade. N v*s, que sois a sua mais bela obra, imitai&a nasua indulg!ncia= 5ensai nas minhas penas cruéis( pensai sobretudoque, colocado por v*s entre o desespero e a "elicidade suprema, aprimeira palavra que pronunciardes decidirá para sempre da minhasorte.

TB de gosto de CD .

CARTA XXXVII

A PRESIDENTE DE TOURVEL A MADAME DE VOLANGES

)ubmeto&me, senhora, aos conselhos que a vossa amizade medá.

costumada a tudo con"iar nas vossas opini+es, creio"irmemente que elas se "undam sempre na razão. 9on"essareimesmo que o senhor de ?almont deve ser, na verdade, in"initamenteperigoso, se pode ao mesmo tempo "ingir ser aquilo que parece aqui,e "icar tal como o descreveis. e qualquer modo visto que o e#igis,a"astá&lo&ei de mim( pelo menos "arei para isso o que estiver ao meualcance: pois, muitas vezes, as coisas que no "undo deveriam ser asmais simples tornam&se embaraçosas na prática.

9ontinua a parecer&me impraticável "azer esse pedido a suatia( seria igualmente descort!s, para ela e para ele. 3ambém nãotomarei sem alguma repugn8ncia o partido de me a"astar eu pr*pria:

pois além das raz+es que vos comuniquei, relativas ao senhor de 3ourvel, se a minha partida viesse a contrariar o senhor de ?almont,como é poss$vel, não teria ele "acilidade de me seguir a 5aris> E oseu regresso, do qual eu seria, ou de que ao menos pareceria ser oob'eto, não se a"iguraria mais estranho do que um encontro nocampo, em casa de uma pessoa que se sabe ser sua parenta e minhaamiga>

ão me resta pois outro recurso senão obter dele pr*prio quese a"aste. )into que esta proposta é di"$cil de "azer( entretanto, comome parece que ele toma a peito provar&me que é na verdade maishonesto do que o sup+em, não desespero de o vir a conseguir. ão

sentirei mesmo qualquer embaraço em tentá&lo( e isso me daráocasião de a'uizar se, como ele diz muitas vezes, as mulheres

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honestas nunca tiveram e não terão nunca motivo de quei#a do seuprocedimento. )e ele se a"astar como eu dese'o, será de "ato porrespeito - minha pessoa: pois não posso duvidar de que ele tivesse opro'eto de passar aqui uma grande parte do 2utono. )e ele recusaraceder ao meu pedido e se se obstinar em "icar, estarei a tempo de

me a"astar eu pr*pria, e prometo&vos que o "arei.)egundo creio, senhora, é tudo o que a vossa amizade e#igiade mim: apresso&me a dar&lhe satis"ação, e a provar&vos que, apesardo calor que porventura pus na de"esa do senhor de ?almont, nempor isso estou menos disposta, não somente a escutar, mas até aseguir os conselhos dos meus amigos.

 3enho a honra de ser, etc.

TO de gosto de CD .

CARTA XXXVIII

A MARQUESA DE MERTEUIL AO VISCONDE DE VALMONT

2 seu enorme pacote chega&me neste instante -s mãos, meucaro ?isconde. )e a data está e#ata, deveria t!&lo recebido vinte equatro horas mais cedo( de qualquer modo, se tivesse tempo de oler, não teria 'á o de lhe responder. 5re"iro pois acusar&lhe somente arecepção, e conversaremos sobre outro assunto. ão é que eu tenha

alguma coisa a dizer&lhe a meu respeito( o 2utono não dei#a em5aris quase nenhum homem que tenha "igura humana. 5or isso, háum m!s que me mantenho numa moderação desesperadora( equalquer outro que não "osse o meu 9avaleiro estaria "atigado dasprovas da minha const8ncia. ão tendo qualquer ocupação, distraio&me com a pequena ?olanges( e é dela que lhe quero "alar.

)abe, ?isconde, que perdeu mais do que sup+e não querendoencarregar&se dessa criança> J verdadeiramente deliciosa=

ão tem nem caráter nem princ$pios( imagine como a suaconviv!ncia será doce e "ácil. ão creio que ela venha a brilhar pelosentimento( mas tudo anuncia nela as sensaç+es mais vivas. )em

esp$rito e sem "inura, ela tem todavia certa "alsidade natural, se sepode dizer assim, que algumas vezes a mim pr*pria me espanta e deque ela virá a aproveitar tanto mais quanto o seu rosto o"erece aimagem da candura e da ingenuidade. Ela é naturalmente muitomeiga, e isso diverte&me algumas vezes. quela cabecita perturba&secom uma "acilidade incr$vel( e é nesses momentos tanto maisgraciosa quanto é certo que nada sabe, absolutamente nada, daquiloque tanto dese'a saber. 3em -s vezes impaci!ncias muitoengraçadas( ri, atordoa&se, chora, e depois pede&me que a ensine,com uma boa "é realmente sedutora.

a verdade, quase me sinto ciumenta daquele a quem esse

prazer está reservado.

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ão sei se lhe mandei dizer que há quatro ou cinco dias tenhoa honra de ser a sua con"idente. Fmagina decerto que ao princ$pioa"etei severidade( mas logo percebi que ela 'ulgava ter&meconvencido com as suas más raz+es, comecei a "ingir que as aceitavapor boas( e ela está intimamente persuadida de que deve o !#ito -

sua eloqS!ncia: esta precaução era necessária para não mecomprometer. 5ermiti&lhe que escrevesse e que dissesse eu amo ( enesse mesmo dia, sem que ela o suspeitasse, proporcionei&lhe umencontro a s*s com o seu ancenP. 7as imagine que ele é tão toloque ainda não conseguiu nem ao menos um bei'o. o entanto esserapaz "az versos bem bonitos=

7eu eus= 9omo são estúpidas as pessoas de talento= Esse é&o a tal ponto que me embaraça( pois, en"im, a ele não posso euconduzi&lo=

J neste momento que o ?isconde me seria muito útil. Estáligado com ancenP o bastante para obter as suas con"id!ncias, e se

ele lhas "izesse uma vez que "osse, ir$amos a galope. presse&se porconseguinte com a sua 5residente, pois, en"im, não quero queercourt se salve: aliás, "alei ontem dele - rapariguinha, e descrevi&otão bem, que, ainda que ela "osse sua mulher há dez anos, não oodiaria mais do que o "icou odiando. o entanto, preguei&lhe muitoacerca da "idelidade con'ugal( nada iguala a minha severidade sobreeste ponto. 5or esse meio, restabeleço 'unto dela, por um lado, aminha reputação de virtude, que demasiada condescend!nciapoderia destruir( por outro, aumento nela o *dio com que pretendograti"icar o marido. E, en"im, espero que, "azendo&lhe crer que não

lhe é permitido entregar&se ao amor senão durante o pouco tempoque lhe resta de solteira, ela se decidirá mais depressa a não perdernada.

deus, ?isconde( vou para o meu quarto de vestir onde lerei oseu volume.

TD de gosto de CD .

CARTA XXXIX

CECÍLIA VOLANGES A SOFIA CARNAY 

Estou triste e inquieta, minha querida )o"ia. 9horei quase todaa noite. ão é que neste momento eu não se'a muito "eliz( maspreve'o que isso não durará.

Estive ontem na Npera com 7adame de 7erteuil( "alamos ládo meu casamento, e o que soube a esse respeito não "oi bom.

J com o senhor 9onde de ercourt que eu devo casar, e deveser no m!s de 2utubro. J rico, é homem de qualidade, é coronel doregimento de... té a$ tudo vai muito bem. 7as, primeiro, é velho:

imagina que tem pelo menos trinta e seis anos= E depois, 7adame de7erteuil diz que é triste e severo, e receia que eu não se'a "eliz com

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ele. ?i mesmo que ela está certa disso e que não queria dizer&mopara não me a"ligir. urante toda a noite quase não "alou de outracoisa senão dos deveres das mulheres para com seus maridos:concorda que o senhor de ercourt não é nada amável e no entantodiz que é preciso que eu o ame. 5ois não me disse também que, uma

vez casada, eu devia dei#ar de amar o 9avaleiro ancenP> 9omo seisso "osse poss$vel= 2h, podes ter a certeza de que o amarei sempre.<em v!s, gostava mais de não me casar. Esse senhor de ercourtque se arran'e, eu não o "ui procurar. Ele está agora na 9*rsega,muito longe daqui( dese'aria que lá "icasse dez anos. )e eu nãotivesse medo de voltar para o convento, diria - 7amã que não queroaquele marido( mas seria pior ainda. Estou muito aborrecida. )intoque nunca amei tanto o senhor ancenP como agora( e quandopenso que não me resta mais do que um m!s para ser como sou,v!em&me as lágrimas aos olhos imediatamente. ão encontroconsolação a não ser na amizade de 7adame de 7erteuil. 3em tão

bom coração= 5artilha as minhas tristezas como eu pr*pria.E é tão amável que, quando estou com ela, quase nem penso

em tais tristezas. lém disso é&me muito útil: pois o pouco que sei, "oiela quem mo ensinou. E é tão boa, que eu digo&lhe tudo quantopenso, sem me sentir nada envergonhada. 0uando acha que nãoestá bem, ralha&me algumas vezes( mas é muito brandamente, edepois eu abraço&a de todo o coração, até ver que ela não estázangada. o menos essa, posso&a amar quanto me apetece, sem quenisso ha'a mal algum, o que me dá muito prazer.

Entretanto combinamos que eu não daria a perceber diante

das outras pessoas que gosto dela como gosto, principalmentediante da 7amã, para que não descon"ie nada a respeito do9avaleiro ancenP. 5osso garantir&te que se eu pudesse viversempre como vivo agora, creio que seria muito "eliz. minha únicapena é aquele "eio senhor de ercourt=... 7as não quero "alar&te maisdele, pois acabaria por "icar triste. Em vez disso, vou escrever ao9avaleiro ancenP( s* lhe "alarei do meu amor e não das minhastristezas, pois não quero que se a"li'a.

deus, minha boa amiga. <em v!s que não tens razão de tequei#ar, e que o meu prazer é estar ocupada, como tu dizes, poisnem por isso me "alta o tempo para ser tua amiga e te escrever.

TD de gosto de CD .

CARTA XL

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

J pouco para a minha desumana não responder -s minhascartas e recusar&se a receb!&las( quer&me privar de a ver e e#ige que

eu me a"aste. 2 que surpreenderá mais ainda a minha boa amiga, éque eu me submeta a tamanho rigor. <em sei que vai censurar&me.

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Entretanto, 'ulguei não dever perder a ocasião de dei#ar que medessem uma ordem: persuadido, por um lado, de que quem mandase compromete( e, por outro, de que a autoridade ilus*ria que n*ssimulamos dei#ar tomarem as mulheres é uma das ciladas que elasevitam mais di"icilmente. lém disto, a habilidade que esta soube p%r

em evitar encontrar&se comigo a s*s colocava&me numa situaçãoperigosa, da qual 'ulguei dever sair custasse o que custasse( poisestando continuamente 'unto dela, sem poder ocupá&la do meuamor, havia lugar para o receio de que ela viesse a acostumar&se deme ver, por "im, sem se perturbar( e é esta uma disposição da qual a7arquesa sabe bem como é di"$cil sair.

divinha, aliás, que eu não me submeti sem condiç+es. 3ivemesmo o cuidado de p%r uma imposs$vel de conceder( tanto para"icar sempre senhor de manter a minha palavra, ou de "altar a ela,como para poder iniciar uma discussão, ou verbal ou por escrito, nummomento em que a minha bela está satis"eita comigo, ou tem

necessidade de que eu o este'a dela( sem contar que eu seria bemdesastrado se não encontrasse meio de me compensar da minhadesist!ncia a esta pretensão, por insustentável que ela se'a.

epois de lhe ter e#posto as minhas raz+es neste longopre8mbulo, começo a hist*ria destes dois últimos dias. 4untarei comopeças 'usti"icativas a carta da minha bela e a minha resposta.

7arquesa há de convir que poucos historiadores haverá tãoe#atos como eu.

Gecorda&se do e"eito que "ez anteontem de manhã a minhacarta de i'on( o resto do dia "oi muito tempestuoso. linda hip*crita

chegou s* - hora de 'antar e anunciou uma "orte en#aqueca(prete#to com que quis encobrir um dos violentos acessos de mauhumor que uma mulher pode ter.

2 seu rosto estava verdadeiramente alterado( a e#pressão dedoçura que lhe conheço trans"ormara&se num ar de rebeldia que lhedava uma nova beleza. 5rometo a mim pr*prio "azer uso mais tardedesta descoberta: substituir algumas vezes a amante terna pelaamante rebelde.

5revi que o resto da tarde seria triste( e para me poupar oaborrecimento, prete#tei cartas a escrever e retirei&me para o meuquarto.

?oltei ao salão pelas seis horas( 7adame de Gosemondeprop%s que passeássemos, o que "oi aceite. 7as no momento desubir para a carruagem, a pretendida doente, por mal$cia in"ernal,prete#tou por sua vez, e talvez para se vingar da minha aus!ncia,um redobramento de dores, e obrigou&me a suportar sem piedade acompanhia da minha velha parenta.

ão sei se as imprecaç+es que dirigi contra esse dem%nio"eminino "oram e#altadas, mas encontrámo&la deitada no regresso.

o dia seguinte ao almoço, não era a mesma mulher. ?oltaraa doçura natural, e tive razão para me 'ulgar perdoado. cabáramosapenas de almoçar, quando a doce criatura se levantou com ar

dolente e se dirigiu ao parque( segui&a, como pode crer.

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6onde pode nascer esse dese'o de passear>6, perguntei&lheao abordá&la. 6Escrevi muito esta manhã6, respondeu&me ela, 6etenho a cabeça um pouco cansada6. 6ão serei eu bastante "eliz6,tornei, 6para ter de me censurar desse cansaço>6. 6Escrevi&vos6,respondeu ela ainda, 6mas hesito em dar&vos a minha carta. Essa

carta contém um pedido, e não me acostumastes a esperar resposta"avorável6. 6h= 4uro que se me "or poss$vel...6 6ada há mais "ácil6,interrompeu ela, 6e embora pudésseis talvez conceder&mo como

 'ustiça, consinto em obt!&lo como graça6. izendo estas palavras,apresentou&me a sua carta( ao receb!&la, tomei&lhe também a mão,que ela retirou, mas sem c*lera, e com mais embaraço do quevivacidade. 6Está mais calor do que eu supunha6, disse ela( 6tenho devoltar para casa.W

E retomou o caminho do castelo. oram vãos os meuses"orços para persuadi&la a continuar o seu passeio, e "oi&me precisorecordar&me de que pod$amos ser vistos, para que nesse sentido

empregasse apenas a minha eloqS!ncia. Ela voltou sem pro"erir umapalavra e vi claramente que esse "ingido passeio não tivera outro "imalém do de me entregar a carta. o regressar, ela subiu para o seuquarto e eu retirei&me para o meu, a "im de ler a ep$stola, que a7arquesa "ará bem em ler também, assim como a minha resposta,antes de ir mais longe...

CARTA XLI

A PRESIDENTE DE TOURVEL AO VISCONDE DE VALMONT

vossa conduta para comigo, senhor, "az crer queprocuráveis apenas aumentar, dia a dia, as raz+es de quei#a que eutinha contra v*s.

Essa obstinação em querer continuar a "alar&me,incessantemente, de um sentimento que eu não quero nem devoescutar( o abuso que não temestes "azer da minha boa "é, ou daminha timidez, para me enviardes as vossas cartas( o meio,sobretudo, ouso dizer pouco delicado, de que vos servistes de uma

surpresa que podia comprometer&me( tudo deveria dar lugar daminha parte a censuras tão vivas como 'ustamente merecidas.er &arta 444  

Entretanto, em vez de voltar a "alar desses agravos, limito&mea "azer&vos um pedido simples como 'usto( e se o obtiver de v*s,consinto em que tudo se'a esquecido.

?*s mesmo me dissestes, senhor, que eu não devia recearuma recusa( e ainda que, por uma inconseqS!ncia que vos épeculiar, essa mesma "rase "osse seguida da única recusa quepod$eis "azer&me, dese'o crer que por isso não dei#areis de manteressa palavra "ormalmente dada há poucos dias.

ese'o pois que tenhais a bondade de vos a"astardes de mim(de dei#ar este castelo, onde uma perman!ncia mais longa por vossa

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parte não poderia dei#ar de me e#por ainda mais ao 'ulgamento deum público sempre pronto a pensar mal dos outros, e que v*s nãotendes senão acostumado demais a "i#ar os olhos sobre as mulheresque vos admitem na sua sociedade.

Fn"ormada 'á, há muito tempo, desse perigo pelos meus

amigos, negligenciei, combati mesmo a opinião deles enquanto avossa conduta a meu respeito me levou a crer que não me t$nheisquerido con"undir com a multidão de mulheres que, todas elas, t!mmotivo de quei#a de v*s. Ao'e que me tratais como a elas, e que eunão posso ignorá&lo, devo ao público, aos meus amigos, a mimpr*pria, a necessidade de seguir esta resolução.

5oderia acrescentar aqui que nada ganhar$eis se recusásseisaceder ao meu pedido, pois estou decidida a partir eu pr*pria, se vosobstinardes em "icar: mas não procuro diminuir o obséquio que vos"icarei devendo por essa bondade, e é meu dese'o que saibais que,tornando necessária a minha partida, contrariar$eis as minhas

combinaç+es. 5rovai&me pois, senhor, que, como me dissestes tantasvezes, as mulheres honestas não terão nunca de quei#ar&se de v*s(provai&me, pelo menos, que quando lhes dais motivos de agravo,sabeis repará&los.

)e eu 'ulgasse ter necessidade de 'usti"icar o meu pedido avossos olhos, bastar&me&ia dizer&vos que tendes passado a vossavida a torná&lo necessário, e que, todavia, não "oi nunca minhaintenção vir a "ormulá&lo. 7as não recordemos acontecimentos quequero esquecer, e que me obrigariam a 'ulgar&vos com rigor, nummomento em que vos o"ereço a ocasião de merecerdes todo o meu

reconhecimento.deus, senhor( a vossa conduta me dirá quais os sentimentoscom que devo ser, toda a minha vida, a vossa humilde, etc.

TO de gosto de CD .

CARTA XLII

O VISCONDE DE VALMONT A PRESIDENTE DE TOURVEL

5or muito duras que se'am, senhora, as condiç+es que meimpusestes, não recuso cumpri&las. )into que me seria imposs$velcontrariar qualquer dos vossos dese'os. ;ma vez de acordo sobreeste ponto, ouso supor que me permitireis, por meu lado, que vos"aça alguns pedidos, bem mais "áceis de conceder que os vossos, eque todavia não dese'o obter senão pela minha per"eita submissão -vossa vontade.

;m, que espero será "eito pela vossa 'ustiça, é o de menomeardes os meus acusadores 'unto de v*s( "izeram&me, ao que

 'ulgo, bastante mal para que eu tenha o direito de os conhecer.

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2 outro, que espero da vossa indulg!ncia, é o de permitirdesque renove algumas vezes a homenagem de um amor que mais doque nunca vai merecer a vossa piedade.

5ensai, senhora, que me apresso á obedecer&vos, aindamesmo quando não posso "az!&lo senão - custa da minha "elicidade(

direi mais, apesar de estar persuadido de que não dese'ais a minhapartida senão para vos "urtardes ao espetáculo, sempre penoso, doob'eto da vossa in'ustiça.

eveis convir, senhora: é menor o vosso temor de um públicodemasiado acostumado a respeitar&vos para ousar "ormular sobrev*s um 'u$zo des"avorável, do que o vosso aborrecimento pelapresença de um homem que vos é mais "ácil punir que censurar.

"astais&me de v*s como quem desvia os seus olhares de umdesgraçado que não se quer socorrer.

7as, enquanto que a aus!ncia vai redobrar os meustormentos, a que outra pessoa além de v*s posso eu dirigir as

minhas quei#as> e quem poderei esperar consolaç+es que me vãoser tão necessárias> Gecusar&mas&eis, quando sois a causa única dasminhas penas>

ão vos admirareis, sem dúvida, que antes de partir eu metenha imposto 'usti"icar&me 'unto de v*s dos sentimentos que meinspirastes( como também que eu não encontre a coragem para mea"astar senão recebendo a ordem da vossa boca.

Esta dupla razão "az que vos peça um encontro de ummomento.

Fnutilmente querer$amos substitu$&lo por cartas: escrevem&se

volumes e "icam mal e#plicadas as coisas que um quarto de hora deconversação basta para esclarecer. Encontrareis "acilmente o tempode mo concederdes: pois por muito empenho que eu tenha emobedecer&vos, sabeis que 7adame de Gosemonde é conhecedora domeu pro'eto de passar 'unto dela uma parte do 2utono, e será pelomenos necessário que eu espere uma carta para poder prete#tar umassunto que me "orça a partir.

deus, senhora( 'amais esta palavra me custou a escrevercomo neste momento, que me traz - idéia a nossa separação. )epudésseis imaginar o que tal palavra me "az so"rer, ouso crer que vossentir$eis um pouco grata pela minha docilidade. Gecebei, ao menos,

com mais indulg!ncia a certeza e a homenagem do amor mais ternoe mais respeitoso.

TX de gosto de CD .

CONTINUAÇÃO DA CARTA XL

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

Gaciocinemos agora, minha bela amiga. )entis como eu queao primeiro dos meus pedidos, e trair a con"iança das suas amigas,

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nomeando os meus acusadores( assim, prometendo tudo sob estacondição, não chego a comprometer&me. 7as, como a minha amigacompreenderá também, essa recusa tornar&se&á um t$tulo para obtertudo o que resta( e nesse caso, a"astando&me, "ica&me a vantagemde iniciar com ela, e com o seu consentimento, uma correspond!ncia

em regra: pois a entrevista que lhe peço pouco conta, e quase nãotem outro ob'etivo que o de a acostumar de antemão a não recusaroutras, quando me "orem verdadeiramente necessárias.

única coisa que me resta "azer antes da minha partida ésaber quais são as pessoas que se ocupam em me pre'udicar 'untodela. 5resumo que se'a o pedante do marido( gostaria que assim"osse: além de uma o"ensa con'ugal ser um aguilhão ao, dese'o, euestaria certo que, desde o momento em que a minha belaconsentisse em escrever&me, nada mais teria a temer do marido,visto ela encontrar&se 'á na necessidade de o enganar.

7as, se ela tem uma amiga com a intimidade bastante para

lhe "azer as suas con"id!ncias, e se essa amiga é contra mim, parece&me necessário "azer com que se zanguem, e conto ser bem sucedidona tentativa. 7as antes de tudo preciso ser in"ormado. 9hegueiontem a pensar que o ia ser( mas essa mulher não "az nada comoqualquer outra. Encontrávamo&nos nos seus aposentos, quandovieram dizer&nos que o 'antar estava servido.

Ela acabava de se arran'ar, e ao mesmo tempo que seapressava e nos pedia desculpa, notei que dei#ava "icar a chave nasecretária( e eu sei que ela não costuma tirar a do quarto. 5ensavanisso enquanto 'antávamos, quando ouvi descer a criada: tomei

imediatamente o meu partido( "ingi que sangrava do nariz e sa$.irigi&me em seguida - secretária, mas encontrei todas asgavetas abertas, e nem um papel escrito. 9ontudo, não há ocasiãopara os queimar nesta estação. 0ue "az ela das cartas que recebe>

E o certo é que recebe muitas. ão tive o m$nimo descuidotudo estava aberto, e procurei por toda a parte: mas nada ganheicom isso, salvo o convencer&me de que esse dep*sito precioso estános seus bolsos.

9omo conseguir tirar&lhe as cartas> esde ontem que meocupo inutilmente a encontrar um meio: entretanto não posso vencero dese'o de o "azer. @amento não possuir o talento dos larápios. ão

é certo que tal talento devia entrar na educação de um homem quenão desdenha as intrigas>ão seria agradável "urtar a carta ou o retrato dum rival, ou

tirar dos bolsos de uma hip*crita o que bastasse para adesmascarar> 7as os nossos pais não pensam em nada( e eu, pormuito que pense em tudo, não posso dei#ar de me convencer de quesou um desa'eitado sem remédio.

e qualquer "orma, acabei por voltar - mesa, muitodescontente.

minha bela acalmou, contudo, um pouco o meu mau humorcom o interesse que tomou pela minha "ingida indisposição, e eu não

dei#ei de lhe a"irmar que, 'á há algum tempo, sentia perturbaç+esviolentas que alteravam a minha saúde. 5ersuadida como está de ser

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ela a causa dessas perturbaç+es, não é verdade que devia, de acordocom a sua consci!ncia, "azer por acalmá&las> 7as, com toda a suadevoção, é pouco caridosa( recusa toda a esmola de amor, e essarecusa chega bem, ao que parece, para autorizar que lha roubem.7as adeus( pois embora conversando com a minha amiga, não penso

senão nessas malditas cartas.

TD de gosto de CD .

CARTA XLIII

A PRESIDENTE DE TOURVEL AO VISCONDE DE VALMONT

5or que procurais, senhor, diminuir o meu reconhecimento>

5or que dese'ais obedecer&me pela metade e de algum modoregateais um procedimento honesto> ão somente pedis muito,como pedis coisas imposs$veis. J certo que amigos meus me "alaramde v*s e se o "izeram "oi apenas por interesse por mim( e ainda quese tivessem enganado, nem por isso dei#ariam de o "azer com boaintenção. E, segundo a vossa proposta, eu reconheceria essa provade dedicação da sua parte, denunciando&vos o seu segredo= Eu nãodevia ter&vos "alado em tal, "azeis&me sentir neste momento=

2 que com qualquer outra pessoa seria uma ingenuidade,torna&se perante v*s leviandade, que me levaria a cometer uma "eia

ação se acedesse ao vosso pedido. pelo para v*s mesmo, para avossa honestidade: 'ulgais&me capaz de semelhante procedimento>chais em verdade que me dever$eis ter "eito tal proposta> ão, semdúvida( e estou certa de que, se re"letirdes melhor, não voltareis a"azer esse pedido.

2 outro pedido que me "azeis Lo de escrever1 não é mais "ácilde conceder( e se quiserdes ser 'usto, não é de mim que podereisquei#ar&vos.

ão dese'o o"ender&vos( mas com a reputação queadquiristes, e que, segundo a vossa pr*pria con"issão, merecereispelo menos em parte, que mulher poderia con"essar que mantinha

correspond!ncia convosco> E que mulher honesta pode determinar&se a "azer aquilo que seria obrigada a esconder>inda se as vossas cartas "ossem de tal modo que nunca eu

tivesse de lamentar&me delas, que pudesse sempre 'usti"icar&me ameus olhos de as ter recebido= 3alvez então o dese'o de vos provarque é a razão e não o *dio que me guia os passos me levasse aesquecer esses poderosos motivos, e a "azer mais do que deviapermitindo&vos que me escrev!sseis algumas vezes. )e na verdade odese'ais tanto como o dizeis, de bom grado vos su'eitareis - únicacondição que me poderia levar a consentir&vos tal( e se sentis algumreconhecimento pelo que neste momento "aço por v*s, não adiareis

mais a vossa partida.

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5ermiti&me que a este respeito vos observe que recebestesesta manhã uma carta e que não a aproveitastes para anunciar avossa partida a 7adame de Gosemonde, como me hav$eis prometido.

Espero que presentemente nada poderá impedir&vos decumprir a vossa palavra. 9onto principalmente que não esperareis,

para isso, o encontro que me pedis, ao qual não queroabsolutamente prestar&me( e que, em vez da ordem que pretendeisser&vos necessária, vos contentareis com a súplica que vos renovo.

deus, senhor.

TD de gosto de CD .

CARTA XLIV

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

5odeis partilhar a minha alegria, minha boa amiga: souamado( triun"ei daquele coração rebelde. J em vão que ele dissimulaainda( a minha bem sucedida astúcia surpreendeu o seu segredo.raças - atividade que empreguei, sei tudo o que me interessa:desde a noite, a "eliz noite de ontem, encontro&me no meu elemento.Getomei o "io de toda a minha e#ist!ncia( descobri um duplo mistériode amor e de iniqSidade( gozarei dum e vingar&me&ei do outro( voareide prazer em prazer. )* de o pensar sinto&me entusiasmado a tal

ponto que é com algum custo que me lembro de quanta prud!nciame é necessária( a custo também conseguirei talvez p%r algumaordem na narração que passo a "azer. Entretanto, e#perimentemos.

2ntem mesmo, depois de lhe ter escrito a minha carta, recebiuma da celestial devota. qui a 'unto: a minha amiga verá que elame dá, o menos desa'eitadamente que pode, a permissão de lheescrever. o entanto apressa a minha partida e eu senti que nãopodia adiá&la por mais tempo sem desvantagem para mim.

Entretanto, atormentado pelo dese'o de saber quem poderiater&lhe escrito coisas desagradáveis a meu respeito, estava aindaincerto quanto ao partido que tomaria. 3entei subornar a criada de

quarto e pretendi obter dela que me "acultasse os bolsos da suaama, de que ela poderia apoderar&se "acilmente de noite, e que lheseria "ácil tornar a colocar no mesmo lugar de manhã, sem despertara menor suspeita. 2"ereci dez lu$zes por esse trabalho ligeiro. 7as vi&me diante de uma hip*crita, escrupulosa ou t$mida, que nem a minhaeloqS!ncia nem o meu dinheiro conseguiram vencer.

9ontinuava a pregar&lhe, quando chegou a hora da ceia. 3ivede a dei#ar, dando&me ainda por "eliz por ela me prometer guardarsegredo, com o qual, como decerto imagina, eu não podia contar.

unca tive tamanho aborrecimento. )entia&me comprometido(e a mim pr*prio censurei, durante toda a noite, a minha imprudente

tentativa.

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Getirei&me para o meu quarto, não sem inquietação, e "aleicom o meu criado, que, na sua qualidade de amante "eliz, devia, teralgum crédito.

5retendia eu, ou que ele obtivesse dessa rapariga aquilo queeu lhe tinha pedido, ou pelo menos que se assegurasse da sua

reserva: mas ele, que de ordinário não duvida de nada, pareceuduvidar do !#ito dessa negociação, e a tal respeito teve uma re"le#ãoque me espantou pela sua pro"undeza. isse&me ele: 62 senhor sabecom certeza melhor do que eu que dormir com uma rapariga é s* agente conseguir que ela "aça aquilo que lhe agrada( de a$ aconseguirmos que ela "aça aquilo que n*s queremos vai uma grandedist8ncia.6

@e bon sens du 7araud quelque"ois mKépouvante.6Eu não me responsabilizo por esta6, acrescentou ele, 6tanto

mais que tenho raz+es para supor que ela tem um amante, e o queconsegui 'unto dela "oi por não haver mais nada que "azer, aqui no

campo. )e não "osse o meu apego ao serviço do senhor, s* o teriaconseguido uma vez6. LJ um verdadeiro tesouro este rapaz=1 60uantoao segredo6, acrescentou ele ainda, 6de que serve "azer que ela oprometa, se não arrisca nada em nos enganar> 3ornar a "alar&lhenisso é o mesmo que dar&lhe conta da import8ncia da coisa, e da$dar&lhe mais vontade de meter tudo no bico - senhora6.

0uanto mais eram 'ustas estas re"le#+es, mais o meuembaraço *5 bom senso de )araud algumas ve6es me apavoravaaumentava( "elizmente o maroto estava disposto para a conversa( ecomo eu tinha precisão dele, dei#ei&o tagarelar. o mesmo tempo

que me contava a sua hist*ria com a rapariga, lá "ui sabendo que oquarto que ela ocupa é separado do da senhora s* por um tabique,que podia dei#ar ouvir qualquer ru$do suspeito e que era no dele quese encontravam todas as noites.

esde logo "ormei o meu plano, comuniquei&lho, e e#ecutámo&lo com !#ito.

Esperei as duas da manhã( e então dirigi&me, como t$nhamoscombinado, ao quarto do encontro, levando luz comigo e com oprete#to de ter tocado várias vezes inutilmente. 2 meu con"idente,que desempenha os seus papéis - maravilha, simulou uma pequenacena de surpresa, de desespero e de desculpa, a que pus termo

mandando&o aquecer água, de que "ingi ter precisão( isto enquanto aescrupulosa camareira estava tanto mais envergonhada, quanto écerto que o pati"e, indo muito além dos meus pro'etos, a obrigara auma toalete que a estação comportava, mas que de modo algumdesculpava.

)entindo que quanto mais a rapariga "osse humilhada mais"acilmente eu disporia dela, não lhe permiti mudar de situação nemde vestimenta( e depois de ter ordenado ao meu criado que meesperasse no meu quarto, sentei&me ao lado dela sobre a cama, queestava muito em desordem, e comecei a minha conversa.

Eu tinha necessidade de manter o dom$nio que as

circunst8ncias me davam sobre ela( por isso conservei um sangue&"rio que teria "eito honra - castidade de 9ipião( e sem tomar a menor

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liberdade com ela, o que, todavia, a sua "rescura e a ocasiãopareciam dar&lhe o direito de esperar, "alei&lhe de neg*cios tãotranquilamente como o poderia "azer com um procurador.

s minhas condiç+es "oram que eu guardaria "ielmentesegredo, contanto que no dia seguinte, - mesma hora pouco mais ou

menos, ela me con"iasse os bolsos da sua senhora. 6lém disso6,acrescentei, 6eu ontem tinha&lhe o"erecido dez lu$ses( ho'e mantenhoa o"erta. ão quero abusar da sua situação6.

 3udo "icou combinado, como pode imaginar( retirei&me entãoe permiti ao par "eliz que recuperasse o tempo perdido.

2 meu tempo, empreguei&o a dormir( e ao despertar,querendo ter um prete#to para não responder - carta da minha belaantes de ter revistado os seus papéis, o que s* podia "azer na noiteseguinte, decidi&me a ir - caça, no que ocupei quase todo o dia.

a volta, "ui recebido com bastante "rieza. 3ive razão parasupor que houvesse um pouco de melindre por eu mostrar tão pouco

empenho em aproveitar o escasso tempo que me restava(principalmente depois da carta mais branda que me tinha sidoescrita. )upu&lo assim, porque, tendo&me 7adame de Gosemonde"eito algumas censuras pela longa aus!ncia, a minha, bela retrucoucom um pouco de azedume: 6h= ão censuremos ao senhor de?almont que se entregue ao único prazer que pode encontrar.6

@amentei&me da in'ustiça e aproveitei para assegurar -s duassenhoras que me agradava tanto a sua companhia que por ela iasacri"icar uma carta de muito interesse que tinha a escrever.crescentei que, não podendo conciliar o sono desde algumas noites,

quisera e#perimentar se a "adiga "aria que eu o recuperasse( e osmeus olhares e#plicavam com su"iciente clareza o assunto da minhacarta e a causa da minha ins%nia. 3ive o cuidado de aparentardurante o serão uma doçura melanc*lica que me pareceu cair bem, esob a qual eu mascarava a impaci!ncia de ver chegar a hora quedeveria revelar&me o segredo que se obstinavam em esconder&me.)eparamo&nos por "im, e algum tempo depois a "iel criada de quartoveio trazer&me o preço combinado do meu segredo.

;ma vez de posse deste tesouro, procedi ao inventário com aprud!ncia que a minha amiga me conhece( pois era importante quetudo voltasse aos seus lugares. 5rimeiro deparei com duas cartas do

marido, mistura indigesta de pormenores de processos e de tiradasde amor con'ugal, que tive a paci!ncia de ler até ao "im e nãoencontrei uma palavra que me dissesse respeito. 5u&las no seu lugar,de mau humor( mas este abrandou quando me vieram -s mãos ospedaços da minha "amosa carta de i'on, cuidadosamente reunidos.elizmente tive a "antasia de a reler. Fmagine a minha alegria,distinguindo nela os sinais, bem vis$veis, das lágrimas da minhaadorável devota. 9on"esso, cedi a um movimento de rapaz e bei'eiessa carta com um transporte de que 'á não me 'ulgava suscet$vel.9ontinuei o "eliz e#ame( encontrei todas as minhas cartas seguidas epor ordem de datas. E o que me surpreendeu mais agradavelmente

ainda "oi ter encontrado a primeira de todas, aquela que eu supunhater&me sido devolvida por uma ingrata, "ielmente copiada pela sua

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mão, e com uma ortogra"ia alterada e tr!mula, que testemunhavacom su"iciente clareza os doces debates do seu coração enquantodisso se ocupara.

té ali todo eu estava entregue ao amor( depressa este deulugar - c*lera. 0uem imagina a minha amiga que queira perder&me

aos olhos dessa mulher que eu adoro> 0ual é a úria que sup+e commaldade bastante para maquinar semelhante per"$dia> 7arquesaconhece&a( é a sua amiga, a sua parenta( é 7adame de ?olanges.ão imagina que tecido de horrores a in"ernal megera lhe escreveu ameu respeito. oi ela, ela unicamente quem perturbou atranqSilidade dessa mulher angélica, é pelos seus conselhos, pelassuas opini+es perniciosas, que eu me ve'o "orçado a a"astar&me( é aela en"im, que eu sou sacri"icado.

h= ão duvide que é preciso seduzir&lhe a "ilha. 7as isso nãoé o bastante, é preciso perd!&la( e 'á que a idade dessa malditamulher a p+e ao abrigo dos meus golpes, é preciso "eri&la no ob'eto

das suas a"eiç+es.0uer ela então que eu regresse a 5aris= J ela quem me obriga

a isso=)e'a, voltarei, mas há de gemer pelo meu regresso.borrece&me que se'a ancenP o her*i desta aventura. 3em

um "undo de honestidade que será para n*s um obstáculo. J certoque está apai#onado, e eu ve'o&o muitas vezes( talvez se possa tirarpartido dessas circunst8ncias. minha c*lera "ez&me esquecer quelhe devo ainda a narração do que se passou ho'e. Geatemos.

Esta manhã voltei a ver a minha sens$vel devota. unca a

tinha achado tão bela. 3inha de ser assim( o mais belo momentoduma mulher, o único em que ela pode produzir embriaguez de almade que se "ala sempre e que tão raras vezes se e#perimenta, éaquele em que, seguros do seu amor, não o estamos dos seus"avores( e era precisamente o caso em que me encontrava. 3alveztambém a idéia de que ia ser privado do prazer de a ver servissepara a embelezar. En"im, - chegada do correio entregaram&me a suacarta de TD( e, enquanto a lia, hesitava ainda em saber se manteria aminha palavra( mas encontrei os olhos da minha bela, e ter&me&iasido imposs$vel recusar&lhe "osse o que "osse.

nunciei pois a minha partida. ;m momento depois, 7adame

de Gosemonde dei#ou&nos s*s( mas, estava eu ainda a quatro passosda "eroz criatura, 'á ela se levantava com um aspecto horrorizado,dizendo&me: 6ei#e&me, dei#e&me, senhor( em nome de eus, dei#e&me.6 Esta súplica "ervorosa, que denunciava a sua emoção, teveapenas o e"eito de mais me encora'ar.

 4á eu estava perto dela e lhe segurava as mãos, que ela 'untara com uma e#pressão absolutamente comovente( 'á eubalbuciava ternas quei#as, quando um dem%nio inimigo "ez regressar7adame de Gosemonde. t$mida devota, que na verdade temalguns motivos para receio, aproveitou o momento para se retirar.

2"ereci&lhe todavia a mão, que ela aceitou( e, augurando bem

esta benevol!ncia, de que ela não usava havia muito tempo, aomesmo tempo que recomeçava as minhas quei#as procurava

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apertar&lhe a sua. 5rimeiro ela quis retirá&la( mas, ap*s uma inst8nciamais viva, entregou&se sem grande resist!ncia, ainda que semresponder nem a este gesto nem -s minhas palavras.

9hegado - porta dos seus aposentos, quis bei'ar&lhe a mãoantes de a dei#ar. de"esa começou por ser "ranca( mas um pense

que vou partir, pronunciado com muita ternura, tornou&a indecisa e"rou#a. 7al eu tinha dado o bei'o, a mão encontrou "orça para seescapar, e a bela entrou nos seus aposentos onde a esperava acriada de quarto. qui "inda a minha hist*ria.

9omo presumo que a minha amiga este'a amanhã em casa da7arechala de..., onde com certeza não poderei encontrá&la( comosuponho também que no nosso primeiro encontro teremos mais deum assunto a tratar, e principalmente o da pequena ?olanges, quenão perco de vista, tomei o partido de me "azer preceder por estacarta( e por muito longa que se'a, não a "echarei senão no momentode a enviar ao correio, pois nas circunst8ncias em que me encontro

tudo pode depender de uma ocasião( e dei#o&a agora para espiar omomento.

5. ). & Hs oito horas da noite.ada de novo( nem o mais pequeno momento de liberdade( houveaté a preocupação de o evitar. o entanto, tanta tristeza como aced!ncia permitia, pelo menos. 2utro acontecimento que não podeser indi"erente é que estou encarregado dum convite de 7adame deGosemonde a 7adame de ?olanges para vir passar algum tempo aocastelo.

deus, minha bela amiga( até amanhã ou depois de amanhã omais tardar.

TU de gosto de CD .

CARTA XLV

A PRESIDENTE DE TOURVEL A MADAME DE VOLANGES

2 senhor de ?almont partiu esta manhã, senhora( pareceu&meque dese'áveis tanto esse a"astamento, que 'ulguei do meu deverdar&vos conhecimento dele. 7adame de Gosemonde lamenta muitoseu sobrinho, cu'a conviv!ncia, devemos convir, é agradável( passoutoda a manhã a "alar&me dele com a sensibilidade que lhe conheceis(não se cansava de o elogiar. 4ulguei dever&lhe a complac!ncia de aouvir sem a contradizer, tanto mais que é preciso con"essar que elatinha razão sobre muitos pontos. emais, eu sentia que tinha acensurar&me ser a causa desta separação, e não espero podercompensá&la do prazer de que a privei. )abeis que de meu naturaltenho pouca alegria, e o g!nero de vida que vamos levar aqui não é

de molde a aumentá&la.

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)e eu não me tivesse conduzido em concord8ncia com asvossas advert!ncias, recearia ter procedido com um pouco deligeireza, pois me sinto verdadeiramente penalizada com a dor daminha respeitável amiga( comoveu&me a um ponto que de bomgrado teria 'untado as minhas lágrimas -s suas.

o presente momento vivemos na esperança de que aceiteiso convite que o senhor de ?almont deve "azer&vos, da parte da7adame de Gosemonde, de virdes passar algum tempo em casadela. Espero que não duvidareis do prazer que teria em ver&vos aqui(deveis&me na verdade essa recompensa. icaria muito contente deaproveitar essa ocasião para tomar conhecimento mais amplo com7ademoiselle de ?olanges, e para de mais perto vos poderconvencer dos sentimentos respeitosos, etc.

TR de gosto de CD .

CARTA XLVI

O CAVALEIRO DANCENY A CECÍLIA VOLANGES

0ue "oi que lhe aconteceu, minha adorável 9ec$lia> 0uecircunst8ncia p%de causar em si uma mudança tão rápida e tãocruel> 0ue "ez dos seus 'uramentos de nunca mudar> 2ntem ainda,repetia&os com tanto prazer= 0uem teria podido ho'e "az!&los

esquecer> ebalde "aço e#ame de consci!ncia( não posso achar emmim a causa, e tenho horror em a procurar em si. h= não suspeitoque a 9ec$lia se'a leviana ou goste de enganar( e mesmo nestemomento de desespero, nenhuma suspeita ultra'ante conspurcará aminha alma. o entanto, por que "atalidade não é 'á a mesma> ão,cruel, 'á não é a mesma= terna 9ec$lia, a 9ec$lia que eu adoro, e dequem recebi as 'uras, não teria evitado os meus olhares, não teriacontrariado o acaso "eliz que me colocou 'unto dela( ou, se qualquerrazão que eu não posso conceber a tivesse obrigado a tratar&me comtamanho rigor, não teria ao menos desdenhado dizer&me o motivo.

h= minha 9ec$lia, não sabe, não saberá nunca o que me "ez

so"rer ho'e, o que so"ro ainda neste momento. 4ulga pois que eupossa viver e não ser amado por si> o entanto, quando lhe pediuma palavra, uma única palavra, para dissipar os meus receios, emlugar de me responder, "ingiu que tinha receio de ser ouvida( e esseobstáculo que então não e#istia, "!&lo a 9ec$lia aparecer nessemomento, pelo lugar que escolheu entre os convidados.

0uando, "orçado a dei#á&la, lhe perguntei a hora a quepoderia voltar a v!&la amanhã, "ingiu ignorá&la, e "oi preciso que7adame de ?olanges ma indicasse. ssim esse momento sempre tãodese'ado que deve apro#imar&nos, amanhã s* "ará nascer em miminquietação( e o prazer de a ver, até agora tão caro ao meu coração,

será substitu$do pelo receio de lhe ser importuno.

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)into que 'á esse receio me detém, e não ouso "alar&lhe domeu amor. quele amo&o, que eu gostava tanto de repetir quando oouvia, essa palavra tão doce, que bastava para a minha "elicidade,não o"erece para mim agora, se a 9ec$lia está mudada, mais do quea imagem do desespero eterno. ão posso crer todavia que esse

talismã do amor tenha perdido todo o seu poderio, e e#perimentoservir&me dele ainda,. )im, minha 9ec$lia amo&a. Gepita pois comigoesta e#pressão da minha "elicidade.

5ense que me habituou a ouvi&la, e que privar&me dela écondenar&me a um tormento que, tal como o meu amor, s* acabarácom a minha vida.

TR de gosto de CD .

CARTA XLVII

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

ão a verei ainda ho'e, minha bela amiga, e aqui estão asminhas raz+es, que lhe peço receba com indulg!ncia. 2ntem em vezde "azer diretamente a viagem de regresso, parei em casa da9ondessa de..., cu'o castelo se encontrava quase no meu caminho, ea quem pedi de 'antar. )* cheguei a 5aris por volta das sete horas, edesci na Npera, onde pensei que a 7arquesa poderia estar.

inda a *pera, "ui ao salão para voltar a ver as minhasamigas( lá encontrei a minha velha Em$lia, rodeada de uma cortenumerosa, tanto de mulheres como de homens, a quem ela dava decear nessa mesma noite em 5... 7al eu me tinha reunido -sociedade, "ui rogado para assistir - ceia, por aclamação. os rogosde todos 'untaram&se os de uma "igurinha gorda e bai#a que mealgaraviou um convite em "ranc!s da Aolanda, e que reconheci comoverdadeiro her*i da "esta. ceitei.

5elo caminho, soube que a casa a que nos dirig$amos era opreço convencionado das bondades de Em$lia para aquela "iguragrotesca, e que a ceia era um verdadeiro banquete de núpcias.

2 homenzinho não cabia em si de contente, na e#pectativa da"elicidade que ia gozar. 5areceu&me tão satis"eito, que me deuvontade de perturbar a sua alegria( o que de "ato "iz.

única di"iculdade que tive "oi decidir Em$lia, a quem ariqueza do burgomestre tornava um pouco escrupulosa. cabou porse prestar, contudo, depois de algumas combinaç+es, ao pro'eto, quelhe comuniquei, de encher de vinho aquele pequeno tonel de cerve'a,e de o p%r assim "ora de combate por toda a noite.

idéia sublime que t$nhamos "ormado de um bebedorholand!s "ez que empregássemos todos os meios conhecidos. 2 !#ito"oi tão grande, que - sobremesa 'á ele não tinha "orça para segurar o

copo( mas a caridosa Em$lia e eu engorgitávamo&lo o mais que

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pod$amos. 5or "im caiu para debai#o da mesa, numa bebedeira talque deve pelo menos durar oito dias.

ecidimo&nos então a recambiá&lo para 5aris( e como ele nãotinha levado a sua carruagem, mandei&o p%r na minha, e "iquei emseu lugar. Gecebi em seguida os cumprimentos da assembléia, que

se retirou pouco depois, e me dei#ou senhor do campo de batalha. 3oda aquela alegria, e talvez o meu longo retiro, "izeram&meachar Em$lia tão dese'ável que lhe prometi "icar com ela até -ressurreição do holand!s.

Esta complac!ncia da minha parte é o preço da que ela acabade ter, servindo&me de secretária para escrever - minha bela devota,a quem achei divertido enviar uma carta escrita na cama e quaseentre os braços de uma prostituta, interrompida mesmo por umain"idelidade completa, e na qual lhe "iz uma narração e#ata da minhasituação e do meu procedimento. Em$lia, que leu a ep$stola, riu comouma louca, e espero que a 7arquesa rirá também.

9omo é necessário que a minha carta leve o carimbo de 5aris,envio&lha( dei#o&a aberta. minha amiga "ará o "avor de a ler, lacrare mandar p%r no correio. )obretudo não esqueça que não deveservir&se do seu sinete, nem mesmo de qualquer emblema amoroso(um cunho qualquer serve.

deus, minha bela amiga.

5. ). & 3orno a abrir a minha carta( convenci Em$lia a ir ao 3eatro dosFtalianos... proveitarei esse intervalo para ir ver a minha amiga.Estarei em sua casa -s seis horas o mais tardar( e, se isso lhe

convier, iremos 'untos por volta das sete horas a casa de 7adame de?olanges. )erá decente que eu não demore o convite que tenho a"azer&lhe da parte de 7adame de Gosemonde( além disso, serei "elizde voltar a ver a pequena ?olanges.

deus, * bel$ssima dama. ese'o ter tanto prazer em abraçá&la, que o 9avaleiro possa sentir ciúmes.

e 5..., BV de gosto de CD .

CARTA XLVIII

O VISCONDE DE VALMONT À PRESIDENTE DE TOURVEL

L9orreio de 5aris1

J depois de uma noite tempestuosa, e durante a qual nãopude conciliar o sono( é depois de ter estado sem cessar ou naagitação de um ardor "ebricitante, ou no total aniquilamento detodas as "aculdades da minha alma, que venho procurar 'unto de v*s

senhora, uma calma de que tenho necessidade, e da qual todavianão espero poder gozar ainda. a verdade, a situação em que me

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encontro ao escrever&vos dá&me a conhecer mais do que nunca opoder irresist$vel do amor. custo consigo manter dom$nio su"icientesobre mim para p%r alguma ordem nas minhas idéias( e desde 'ápreve'o que não terminarei esta carta sem ser obrigado ainterromp!&la. 5ois qu!= ão poderei esperar que partilheis algum dia

a perturbação que e#perimento neste instante>2uso crer entretanto que, se pudésseis "azer uma idéia do quesinto, não "icar$eis inteiramente insens$vel. 5odeis crer, senhora( a"ria tranqSilidade, o sono da alma, imagem da morte, não levam -"elicidade( s* as pai#+es vivas podem conduzir lá.

E apesar dos tormentos que me "azeis suportar, possoassegurar&vos sem receio que, neste momento, sou mais "eliz do quev*s. Em vão sobre mim pesam os vossos rigores implacáveis: nãoimpedirão que eu me abandone inteiramente ao amor e queesqueça, no del$rio que em mim causa, o desespero a que meentregais. J assim que eu me quero vingar do e#$lio a que me

condenastes. unca tive tanto prazer em escrever&vos.unca senti, nesta ocupação, uma emoção tão doce e todavia

tão viva. 3udo parece aumentar a minha e#altação: o ar que respiro é

pleno de volúpia( até a mesa sobre que vos escrevo, consagrada pelaprimeira vez a este uso, se torna para mim o altar sagrado do amor.9omo vai embelezar&se a meus olhos, por ter traçado sobre ela o

 'uramento de vos amar sempre=5erdoai, suplico&vos, a desordem dos meus sentidos= Eu

deveria talvez abandonar&me menos a transportes que não

partilhais. 5reciso dei#ar&vos por um momento para dissipar umaembriaguez que aumenta a cada instante, e que se torna mais "ortedo que eu.

?olto a v*s, senhora, e volto sem dúvida com o mesmo "ervor.Entretanto o sentimento da "elicidade "ugiu para longe de

mim, dando lugar ao das privaç+es cruéis. e que me serve "alar&vosdos meus sentimentos, se procuro em vão os meios de vosconvencer> p*s tantos e tão repetidos es"orços, a con"iança e a"orça abandonam&me ao mesmo tempo. )e imagina ainda osprazeres do amor, é para sentir mais vivamente o pesar de ser delesprivado. ão ve'o outro recurso que o da vossa indulg!ncia, e sinto

demasiado, neste momento, quanto dela tenho necessidade paraesperar obt!&la. Entretanto, nunca o meu amor "oi mais respeitoso,nunca ele deveu o"ender&vos menos. J de tal maneira, ouso diz!&lo,que a virtude mais severa não poderia ter qualquer receio dele( maseu pr*prio temo "alar&vos por mais tempo do so"rimento que sinto.9erto de que o ente que o causa não o partilha, não devo ao menosabusar das suas bondades( e seria "az!&lo se empregasse maistempo a descrever esta dolorosa imagem. ão tomo mais do que ode suplicar&vos uma resposta, e que não duvideis nunca da verdadedos meus sentimentos.

Escrita de 5..., datada de 5aris, BV de gosto de CD .

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CARTA XLIX

CECíLIA VOLANGES AO CAVALEIRO DANCENY 

)em ser leviana nem gostar de enganar, basta&me, senhor,ser esclarecida sobre o meu procedimento para sentir a necessidadede o mudar( prometi esse sacri"$cio a eus, até poder o"erecer&lhetambém o dos meus sentimentos por v*s, que o estado religioso emque vos encontrais torna mais criminosos ainda.

)into bem que isso me "ará so"rer, e não vos escondereimesmo que desde anteontem tenho chorado todas as vezes quepenso em v*s. 7as espero que eus me "ará a graça de me dar a"orça necessária para vos esquecer, como lhe peço de manhã -noite.

Espero mesmo da vossa amizade, e da vossa honestidade,que não tentareis perturbar&me na boa resolução que me inspirou, ena qual procuro manter&me. 5eço, por conseqS!ncia, que tenhais abondade de não voltar a escrever&me, tanto mais que vos previno deque não responderei, e que me "orçar$eis a avisar a 7amã de tudo oque se passa: o que me privaria absolutamente do prazer de vos ver.

ão dei#arei de conservar por v*s toda a dedicação que sepossa ter sem que nisso ha'a algum mal( e é de toda a minha almaque vos dese'o toda a espécie de "elicidade. )into bem que dei#areisde amar&me tanto, e que em breve amareis talvez outra melhor do

que eu. 7as isso será mais uma penit!ncia da "alta que eu cometi aodar&vos o meu coração, que eu devia dar s* a eus, e a meu maridoquando o tiver. Espero que a miseric*rdia divina tenha piedade daminha "raqueza, e que não me d! so"rimentos que eu não possasuportar.

deus, senhor( posso assegurar&vos que, se me "ossepermitido amar alguém, não amaria outro além de v*s. 7as eis tudoo que eu posso dizer, e talvez se'a mais do que deveria.

BC de gosto de CD .

CARTA L

A PRESIDENTE DE TOURVEL AO VISCONDE DE VALMONT

J então desta maneira, senhor, que correspondeis -scondiç+es que vos pus para receber algumas vezes cartas vossas> Eposso eu não ter de que me quei#ar, quando nelas não me "alaissenão de um sentimento ao qual eu recearia ainda entregar&me,mesmo que o pudesse "azer sem "erir todos os meus deveres >

liás, se eu necessitasse de novas raz+es para conservar essereceio salutar, parece&me que as poderia encontrar na vossa última

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carta. e "ato, no pr*prio momento em que 'ulgais "azer a apologiado amor, que "azeis, pelo contrário, senão mostrar&me as tem$veistempestades a que ele dá lugar> 0uem poderá dese'ar uma"elicidade adquirida - custa da razão, e cu'os prazeres poucoduráveis são pelo menos seguidos pelos pesares, quando o não são

pelos remorsos>  ?*s pr*prio, em quem o hábito desse del$rio perigoso devediminuir&lhe o e"eito, não sois obrigado a con"essar que ele se tornamais "orte que v*s, e não sois o primeiro a quei#ar&vos daperturbação involuntária que ele em v*s causa> 0ue horr$veldevastação não produziria ele num coração 'ovem e sens$vel, queaumentaria o seu poder pela grandeza dos sacri"$cios que seriaobrigado a "azer&lhe>

 4ulgais, senhor, ou "ingis 'ulgar, que o amor conduz -"elicidade( e eu persuado&me a tal ponto de que ele me tornariadesgraçada, que dese'aria não ouvir nunca pronunciar o seu nome.

"igura&se&me que s* o "alar dele altera a tranqSilidade( e étanto por gosto como por dever que vos peço que guardeis sil!ncio atal respeito.

o "im de contas, deve ser&vos "ácil presentemente conceder&me o que vos peço. e regresso a 5aris, encontrareis a$ bastasocasi+es de esquecer um sentimento que deve o seu nascimentotalvez apenas ao hábito de vos ocupardes de tais assuntos, e a sua"orça - ociosidade do campo. esse mesmo lugar onde estais, nãome vistes tantas vezes com indi"erença> 5odereis dar a$ um passosem encontrardes um e#emplo da vossa "acilidade em mudar, e não

estais a$ rodeado de mulheres, que, todas mais amáveis do que eu,t!m talvez mais direito -s vossas homenagens> ão tenho a vaidadeque é censurada ao meu se#o( tenho ainda menos essa "alsamodéstia que é apenas um re"inamento do orgulho( e é de muito boa"é que vos digo aqui que reconheço em mim muito poucos meios deagradar: mas ainda que dispusesse de todos, não os 'ulgariasu"icientes para vos chamar a atenção. 5edir&vos que não vosocupeis de mim é apenas rogar&vos que "açais ho'e o que 'á "izesteso que com toda a certeza "ar$eis dentro de pouco tempo, ainda queeu vos pedisse o contrário.

Esta verdade, que eu não perco de vista, seria, por si s*, uma

razão bastante "orte para não querer ouvir&vos. 3enho mil outrasraz+es ainda: mas sem entrar nessa longa discussão, limito&me asuplicar&vos, como 'á "iz, que não volteis a "alar&me num sentimentoque eu não devo atender, e ao qual devo ainda menos responder.

C de )etembro de CD .

SEGUNDA PARTE

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CARTA LI

A MARQUESA DE MERTEUIL AO VISCONDE DE VALMONT

a verdade, ?isconde, é insuportável. 3rata&me com tanta

ligeireza como se eu "osse sua amante. )abe que acabei por mezangar, e que estou neste momento com um humor horr$vel>9omo= 2 ?isconde precisa ver ancenP amanhã de manhã(

sabe como é importante que eu lhe "ale antes dessa entrevista( esem se inquietar muito, dei#a que eu o espere todo o dia, para correratrás sei lá de qu!= J o senhor o causador de que eu tenha chegadoindecentemente tarde a casa de 7adame de ?olanges e de quetodas as senhoras de certa idade me tenham achado maravilhosa.oi&me necessário estragá&las com mimos toda a noite para asapaziguar: pois ninguém se deve zangar com as mulheres de certaidade( são elas que "azem a reputação das novas.

eu 'á uma hora da manhã, e em lugar de me deitar, e morrode vontade de o "azer, é preciso que lhe escreva uma longa carta,que vai redobrar o meu sono pelo aborrecimento que ela me vaicausar. 5ode dar&se por "eliz de eu não ter tempo para lhe ralharmais. ão vá 'ulgar por isso que lhe perd%o( é s* porque estou commuita pressa. Escute, pois, que vou despachar&me.

5or pouco que o ?isconde se'a hábil, tem de ouvir amanhã ascon"id!ncias de ancenP. 2 momento é "avorável para a con"iança: éo momento da desgraça. pequena "oi - con"issão( disse tudo, comouma criança( e depois "icou atormentada a tal ponto com medo do

diabo, que quer romper absolutamente.9ontou&me todos os seus pequenos escrúpulos, com umavivacidade que me deu a perceber quanto o medo lhe tinha subido -cabeça. 7ostrou&me a carta de rompimento, que é um verdadeirosermão. 3agarelou uma hora comigo, sem me dizer uma palavra quetivesse senso comum. 7as nem por isso me dei#ou menos con"usa(pois o ?isconde imagina que eu não podia "alar abertamente a umacabecinha a tal ponto transtornada.

5ude entretanto entender, no meio de toda aquela tagarelice,que ela não gosta menos do seu ancenP( notei mesmo que elalança mão de um daqueles recursos que ao amor nunca "altam, e a

que a rapariguinha se presta de boa vontade, enganando&se a simesma. tormentada pelo dese'o de se ocupar do seu namorado, epelo receio de ser condenada ocupando&se dele, imaginou rogar aeus que lho "aça esquecer e, como renova esse rogo a cadainstante do dia, encontra o meio de pensar nele constantemente.

9om qualquer que estivesse mais usado que ancenP, estepequeno acontecimento seria talvez mais "avorável que contrário,mas o rapaz é tão lamecha que, se não o a'udarmos, ser&lhe&ánecessário tanto tempo para vencer os mais ligeiros obstáculos quenão nos dei#ará o de e"etuarmos o nosso pro'eto.

2 ?isconde tem razão( é pena, e estou tão aborrecida com

isso como o senhor, que se'a ele o her*i desta aventura. 7as quequer> 2 que está "eito está "eito( e a culpa é sua. 5edi que me

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mostrasse a resposta dele( "ez&me pena. ancenP apresenta&lheraz+es até perder o "%lego, para lhe provar que um sentimentoinvoluntário não pode ser um crime( como se não dei#asse de serinvoluntário, no momento em que se dei#a de o combater=

Esta idéia é tão simples, que até - pequena ocorreu. Ele

quei#a&se da sua in"elicidade de uma "orma bastante comovente,mas a sua dor é tão doce e parece tão "orte e tão sincera, que 'ulgoposs$vel que uma mulher que encontra ocasião de desesperar umhomem a tal ponto, e com tão pouco perigo, não se'a tentada adivertir&se com semelhante "antasia. 5or "im e#plica&lhe que não émonge, como a pequena sup+e( e não há dúvida que é o que ele "azde melhor: pois, se chegassem tão longe na per"eição que se desseminteiros ao amor monástico, seguramente os senhores 9avaleiros de7alta nos mereceriam a pre"er!ncia.

e qualquer "orma, em vez de perder o meu tempo emracioc$nios que poderiam comprometer&me, e talvez sem conseguir

persuadi&la, aprovei o pro'eto de rompimento( mas disse&lhe que eramais honesto, em semelhante caso, dizer as suas raz+es do queescrev!&las( que era também de uso entregar as cartas e as outrasbagatelas que possam ter&se recebido. E simulando assim partilharos pareceres da pequena, decidi&a a marcar um encontro comancenP. 9ombinamos imediatamente a maneira, e encarreguei&a deresolver a mãe a sair sem a "ilha( é para amanhã - tarde o instantedecisivo. ancenP 'á está instru$do( mas, por eus, se o ?iscondeachar ocasião, decida esse belo pastor a ser menos l8nguido( eensine&lhe tudo, que a verdadeira maneira de vencer os escrúpulos é

não dei#ar nada a perder a quem os tem.epois, para que essa rid$cula cena não se renovasse, nãodei#ei de levantar algumas dúvidas no esp$rito da pequena sobre osegredo de con"issão( e garanto&lhe que neste momento ela paga omedo que me meteu com o que ela tem de que o con"essor vá dizertudo - mãe. Espero que depois de eu ter podido "alar com ela maisuma vez ou duas, 'á não irá contar assim as suas tolices ao primeiroque aparecer.* 5 leitor deve ter adivinhado há muito tempo, pelos costumes de )adame de)erteuil, como ela respeitava pouco a religião $oderia ter%se suprimido todo este

 parágra+o, mas -ulgou%se que, mostrando os e+eitos, não se devia dei(ar de dar aconhecer as causas

deus ?isconde( tome posse de ancenP, e se'a o seu guia.)eria vergonhoso que não "izéssemos o que nos apetece de

duas crianças. )e isso nos "or mais di"$cil do que ao princ$piosupusemos, lembremo&nos, para animar o nosso zelo, o ?isconde,que se trata da "ilha de 7adame de ?olanges, e eu, que ela virá a sera mulher de ercourt.

deus.

T de )etembro de CD .

CARTA LII

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O VISCONDE DE VALMONT A PRESIDENTE DE TOURVEL

5roibis&me, senhora, que vos "ale do meu amor( mas ondeencontrar a coragem necessária para vos obedecer> 2cupado

unicamente por um sentimento que deveria ser tão, doce, e quetornais tão cruel( entristecendo no e#$lio a que me condenastes(vivendo apenas de privaç+es e de saudades( entregue a so"rimentostanto mais dolorosos quanto me recordam sem cessar a vossaindi"erença( ser&me&á necessário ainda perder a consolação únicaque me resta> E posso eu ter outra que não se'a a de vos abriralgumas vezes uma alma que encheis de perturbação e deamargura>

esviareis os vossos olhos para não ver as lágrimas que meobrigais a derramar> Gecusareis até a homenagem dos sacri"$ciosque e#igis> ão seria, no entanto, mais digno de v*s, da vossa alma

honesta e meiga, lamentar um in"eliz, que o é apenas por vossacausa, em vez de pretenderes agravar as suas penas, por umade"esa ao mesmo tempo in'usta e rigorosa>

ingis recear o amor, e não quereis ver que sois v*sunicamente a causadora dos males que lhe censurais. h= estesentimento é penoso, por certo, quanto o ob'eto que o inspira nãolhe corresponde( mas onde encontrar a "elicidade, se um amorrec$proco não "or bastante para a conseguir> amizade terna, acon"iança tranqSila e sem reserva, as penas suavizadas, os prazeresaumentados, a esperança e#ultante, as recordaç+es deliciosas, onde

encontrar tudo isso senão no amor> 9aluniais esse sentimento, v*sque, para gozar de todos os bens que ele vos o"erece, não tendesmais que cessar de vos "urtardes a ele( quanto a mim, esqueço aspenas que so"ro, para me ocupar em de"end!&lo.

2brigais&me também a de"ender&me a mim pr*prio( pois aopasso que eu consagro a minha vida a adorar&vos, v*s passais avossa a procurar em mim motivos de agravo( supúnheis&me 'áleviano e "also( e abusando, contra mim, de alguns erros que eupr*prio vos con"essei, deleitais&vos a con"undir o que eu era entãocomo o que eu sou agora. ão contente de me haverdes entregue aotormento de viver longe de v*s, acrescentais a isso uma zombaria

cruel sobre prazeres aos quais sabereis bem a que ponto metornastes insens$vel. ão acreditais nem nas minhas promessas, nemnos meus 'uramentos. 5ois bem= Gesta&me uma garantia a o"erecer&vos, que ao menos não se vos tornará suspeita: sois v*s mesma. ãovos peço senão que vos interrogueis de boa "é( se não acreditais nomeu amor, se duvidais por um momento de ser a única a reinar naminha alma, se não estais segura de terdes conquistado estecoração, até aqui demasiado volúvel, consinto em e#piar a pena quecabe a este erro( soltarei gemidos, mas não "arei qualquer súplica.7as se, ao contrário, "azendo 'ustiça a n*s dois, "ordes obrigada aconvir no vosso "oro $ntimo que não tendes, que não tereis nunca

uma rival, não volteis a obrigar&me, suplico&vos, a combaterquimeras, e dei#ai&me a consolação de saber que não duvidais dum

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sentimento que, na verdade, não acabará, não pode acabar senãocom a minha vida. 5ermiti&me, senhora, que vos rogue uma respostapositiva a este ponto da minha carta.

)e eu abandono entretanto aquela época da minha vida queparece pre'udicar&me tão cruelmente a vossos olhos, não é porque,

em caso de necessidade, me "altassem raz+es para a de"ender.0ue "iz eu, no "im de contas, além de não o"erecer resist!nciaao turbilhão que me envolvia> Entrei no mundo, 'ovem e seme#peri!ncia( passei, por assim dizer, de mão em mão, por umamultidão de mulheres, que se apressaram todas a antecipar pela sua"acilidade uma opinião que elas sentiam dever ser&lhes des"avorável.everia ser eu pois a dar o e#emplo de uma resist!ncia que me nãoera oposta> 2u deveria castigar&me a mim pr*prio por um momentode irre"le#ão, e que em muitos casos "ora provocado, por umaconst8ncia deveras inútil, e na qual todos veriam um motivo derid$culo> 5ois qual é o meio para 'usti"icar a vergonha de uma escolha

senão um pronto rompimento>7as, posso diz!&lo, essa embriaguez dos sentidos, talvez

mesmo esse del$rio da vaidade, não penetrou o meu coração.ascido para o amor, a intriga poderia distra$&lo( não bastava

para tomar inteira posse dele( rodeado de seres sedutores, masdesprez$veis, nenhum deles ia até - minha alma. 2"ereciam&meprazeres, eu buscava virtudes. E, porque era delicado e sens$vel, eupr*prio por "im me 'ulguei inconstante.

oi ao ver&vos que me senti iluminado( depressa compreendique o encanto do amor se enraizava nas qualidades da alma( que s*

elas podiam causar&lhe o e#cesso e 'usti"icá&lo. )enti en"im que meera igualmente imposs$vel dei#ar de vos amar e amar outra que não"%sseis v*s.

Eis, senhora, como é este coração ao qual temeis entregar&vose sobre a sorte do qual tendes de pronunciar&vos. 7as qualquer quese'a o destino que lhe reserveis, não mudareis nada aos sentimentosque o prendem a v*s( são inalteráveis como as virtudes que os"izeram nascer.

B de )etembro de CD .

CARTA LIII

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

Estive com ancenP, mas apenas obtive dele meiacon"id!ncia( teimou, sobretudo, em calar&me o nome da pequena?olanges, de quem me "alou como de uma mulher muito atilada, eaté um pouco devota( a prop*sito, contou&me com bastante verdadea sua aventura, e sobretudo o último acontecimento. E#citei&o o mais

que pude e grace'ei bastante acerca da sua delicadeza e dos seusescrúpulos( mas ele pareceu manter&se "irme, não posso responder

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por ele. este respeito poderei dizer alguma coisa mais depois deamanhã. @evo&o amanhã a ?ersailles e durante o caminho ocupar&me&ei em o sondar.

2 encontro marcado para ho'e dá&me também algumaesperança( pode dar&se o caso de tudo se passar como dese'amos( e

talvez no presente momento nos reste apenas arrancar&lhe acon"issão e recolher as respectivas provas. Esta tare"a será mais "ácil- 7arquesa do que a mim, pois a pequena é mais con"iante, ou, oque vem a dar no mesmo, mais tagarela do que o seu discretoapai#onado. Entretanto "arei o que me "or poss$vel.

deus, minha bela amiga, estou com muita pressa( não averei nem esta noite, nem amanhã. )e por seu lado souber algumacoisa, escreva&me uma palavra no meu regresso. ?irei com certezadormir a 5aris.

B de )etembro de CD , - noite.

CARTA LIV

A MARQUESA DE MERTEUIL AO VISCONDE DE VALMONT

2h= sim= é de "ato 'unto de ancenP que há alguma coisa asaber= )e ele lha disser, gabou&se. ão conheço ninguém tão tolo emcoisas de amor e cada vez me censuro mais pelas bondades que

temos para ele. )aiba o ?isconde que cheguei a 'ulgar&mecomprometida por culpa dele. E pensar que tudo resultou em puraperda= 2h= Aei&de vingar&me, prometo&lho.

0uando cheguei ontem a casa de 7adame de ?olanges para alevar comigo, ela não queria sair( sentia&se incomodada. oi&menecessária toda a minha eloqS!ncia para a persuadir, e via chegar omomento de ancenP aparecer sem que tivéssemos sa$do, o queseria tanto mais aborrecido quanto 7adame de ?olanges lhe disserana véspera que não estaria em casa. Eu e a "ilha estávamos sobrebrasas. )a$mos por "im( e a pequena apertou&me a mão tãoa"etuosamente ao despedirmo&nos que apesar do seu pro'eto de

rompimento, de que ela 'ulgava de boa "é ocupar&se ainda, augureimaravilhas para essa noite.ão tinha chegado ao "im das minhas inquietaç+es. Aavia

apenas meia hora que estávamos em casa de 7adame de..., quando7adame de ?olanges se sentiu de "ato mal, mas seriamente mal( e,como era razoável, quis voltar para casa. Eu dese'ava&o tanto menosquanto receava, se surpreend!ssemos os dois 'ovens, como tudoindicava, que as minhas inst8ncias 'unto da mãe para que sa$sse selhe tornassem suspeitas. 3omei o partido de a assustar sobre o seuestado de saúde, o que "elizmente não é di"$cil( e consegui ret!&ladurante hora e meia, sem consentir em levá&la a casa, "ingindo ter

medo do movimento perigoso da carruagem.

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Gegressamos por "im - hora combinada. 5elo arenvergonhado que notei ao chegar, con"esso que esperei que aomenos as minhas canseiras não tivessem sido baldadas.

2 dese'o que eu tinha de ser in"ormada "ez que "icasse ao péde 7adame de ?olanges, que se deitou logo, e depois de termos

ceado 'unto do seu leito, dei#ámo&la muito cedo, com o prete#to deque ela necessitava repousar( e passamos aos aposentos da "ilha.Esta "ez tudo o que eu esperava dela( escrúpulos desvanecidos,novas 'uras de amor eterno, etc., de boa vontade e#ecutou oprograma( mas o parvo do ancenP não avançou de uma linha oponto em que antes se encontrava. 2h= com aquele pode haveramuos( as reconciliaç+es não são perigosas.

pequena assegura todavia que ele queria mais, mas que elasoube de"ender&se. Fa 'urar que ela se gaba, ou que o desculpa(tenho mesmo quase a certeza. e "ato, tive a "antasia de querersaber por e#peri!ncia pr*pria de que de"esa é ela capaz( e, simples

mulher, de conversa em conversa, dei&lhe volta - cabeça a umponto... En"im, o ?isconde pode crer, não conheço ninguém maissuscet$vel de uma surpresa dos sentidos. J na verdade digna de seramada, esta querida pequena= 7erecia outro amante( terá pelomenos uma boa amiga, pois estou&lhe sinceramente dedicada.5rometi&lhe instru$&la e creio que cumprirei a minha palavra. 7uitasvezes sinto a necessidade de ter uma mulher por con"idente, egostaria mais que "osse esta que qualquer outra( mas nada posso"azer, enquanto ela não "or... aquilo que é preciso que se'a( e esta émais uma razão para estar aborrecida com ancenP.

deus, ?isconde( não venha a minha casa amanhã, a menosque se'a de manhã. 9edi -s inst8ncias do 9avaleiro para uma noitadano nosso ninho.

I de )etembro de CD .

CARTA LV

CECÍLIA VOLANGES A SOFIA CARNAY 

 3inhas razão, minha querida )o"ia( as tuas pro"ecias são maiscertas do que os teus conselhos. ancenP, como tinhas previsto, "oimais "orte que o con"essor, que tu e do que eu pr*pria( e eis&nosvoltados e#atamente ao ponto em que estávamos.

2ra= ão me arrependo disso( e se tu me censurares, será pornão saberes o prazer que se sente em amar ancenP. ti é muito"ácil dizeres o que se deve "azer, nada to impede( mas se tivessese#perimentado como nos "az mal a tristeza de alguém que se ama,como a sua alegria se torna nossa e como é di"$cil dizer não quando ésim que se dese'a dizer, não te admiravas de nada( eu mesma, que o

senti, e que o senti vivamente, não compreendo ainda. 4ulgas tu, pore#emplo, que eu possa ver chorar ancenP sem chorar eu também>

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"irmo&te que isso me é imposs$vel( e quando ele está contente, sou"eliz com ele. 5odes dizer o que entenderes( o que se diz não altera oque é, e eu estou certa de que é assim.

0ueria ver&te no meu lugar... ão, não é isso que eu querodizer, pois com certeza não dese'aria ceder o meu lugar a ninguém(

mas queria que tu amasses assim alguém( não seria s* para que meentendesses melhor, e me ralhasses menos( mas porque assim tuserias mais "eliz, ou, para melhor dizer, s* então começarias a ser"eliz.

2s nossos divertimentos, os nossos risos, tudo isso, bem v!s,são brincadeiras de crianças( delas nada "ica depois de passarem.

7as o amor, ah= o amor=. . uma palavra, um olhar, somente osabermos que ele está ali, cr!: isso é a "elicidade. 0uando ve'oancenP, não dese'o mais nada( quando não o ve'o, s* o dese'o aele. ão sei porque isto é assim( mas dir&se&ia que tudo de que eugosto se lhe assemelha.

0uando ele não está comigo, penso nele( e quando estousozinha, por e#emplo, sou ainda "eliz( "echo os olhos, e logo 'ulgo queo estou vendo( lembro&me das suas palavras, e creio ouvi&lo( isto "az&me suspirar( e depois sinto um "ogo, uma agitação... ão posso estarno mesmo lugar. J como um tormento, e esse tormento dá umprazer ine#prim$vel.

 4ulgo até que quando uma vez se sente amor, essesentimento se espalha até sobre a amizade. o entanto, a que eutenho por ti não mudou( é sempre como no convento: mas isto queeu digo, sinto&o com 7adame de 7erteuil. 5arece&me que a minha

amizade por ela se parece mais com o amor que sinto por ancenPdo que com a minha amizade por ti, e algumas vezes dese'aria queela "osse ele. Fsto vem talvez de não ser uma amizade de in"8nciacomo a nossa( ou talvez de os ver tantas vezes 'untos, o que "az comque me engane. En"im, o que é certo é que os dois me tornam muito"eliz( e no "im de contas, não creio que ha'a grande mal no que eu"aço. 5or isso s* peço que me dei#em "icar como estou( e s* a idéiado meu casamento me "az so"rer( pois se o senhor de ercourt écomo me disseram, e não duvido de que o se'a, não sei o que será demim.

deus, minha )o"ia( sou sempre a tua amiga muito terna.

I de )etembro de CD .

CARTA LVI

A PRESIDENTE DE TOURVEL AO VISCONDE DE VALMONT

e que vos serviria, senhor, a resposta que me pedistes> 9rernos vossos sentimentos não será uma razão mais para os temer> E

sem atacar nem de"ender a sinceridade deles, não me basta, não

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deve bastar&vos a v*s mesmo, saber que não devo nem querocorresponder&lhes>

)uponho que me tendes amor verdadeiro Le é apenas paranão voltar a "alar neste assunto que eu consinto nesta suposição1(seriam por isso menos insuperáveis os obstáculos que nos separam>

E teria eu outra coisa a "azer que dese'ar&vos uma rápida vit*riasobre esse amor, e principalmente a'udar&vos com todo o meu poder,apressando&me a tirar&vos toda a esperança>

?*s mesmo concordais que esse sentimento é penoso quandoo ob'eto que o inspira não lhe corresponde. 2ra, sabeissu"icientemente que me é imposs$vel corresponder&lhe e, ainda queessa in"elicidade me acontecesse, eu seria mais digna de lástima,sem que "%sseis por isso mais "eliz. Espero que me estimareis obastante para que não duvideis disso por um momento. ei#ai pois,rogo&vos, dei#ai de pretender perturbar um coração ao qual atranqSilidade é tão necessária( não me obrigueis a lamentar ter&vos

conhecido.0uerida e estimada por um marido que amo e respeito, os

meus deveres e os meus prazeres reúnem&se numa s* pessoa.)ou "eliz e tenho obrigação de o ser. )e e#istem prazeres mais

vivos, não os dese'o( não quero conhec!&los. Aaverá alguma coisamais doce que estar em paz consigo mesma, ver decorrer diasserenos, adormecer tranqSila e despertar sem remorsos>

quilo a que chamais "elicidade é apenas um tumulto dossentidos, uma tempestade das pai#+es, cu'o espetáculo horroriza,mesmo quando o contemplamos da margem. 5ois bem= 9omo

a"rontar tais tempestades>9omo haverá quem possa aventurar&se a um mar coberto dosdespo'os de mil e mil nau"rágios> E com quem> ão, senhor?isconde, eu "ico na terra "irme( são&me caros os laços que a ela meprendem. 5oderia cortá&los, e não o "aria( se eles não e#istissem,apressar&me&ia a "or'á&los para que me prendessem.

5or que seguis os meus passos> 5or que vos obstinais nessecaminho>

s vossas cartas, que deviam ser raras, sucedem&se comrapidez.

eviam ser prudentes, e nelas s* "alais do vosso louco amor.

Envolveis&me na vossa idéia, mais do que o "azeis da vossa pessoa."astado sob uma "orma, reproduzis&vos sob outra. s coisas que sevos pede que não digais, voltais a diz!&las de outra maneira. 3endesprazer em me con"undir com racioc$nios capciosos( mas "urtais&vos-s minhas raz+es. ão quero voltar a responder&vos, não vosresponderei... e que maneira tratais as mulheres que seduzistes=9om que desprezo "alais delas= ese'o acreditar que algumas omerecem: mas serão todas elas a tal ponto desprez$veis> h= semdúvida, pois tra$ram os seus deveres para se entregarem a um amorcriminoso. esde esse momento, perderam tudo, até a estimadaquele a quem tudo sacri"icaram. J 'usto esse supl$cio, mas s* a sua

idéia "az tremer. 0ue me importa, a"inal> 5or que me ocuparei delasou de v*s> 9om que direito perturbais a minha tranqSilidade>

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ei#ai&me, não volteis a ver&me( dei#ai de me escrever, peço&vos( e#i'o&o. Esta carta é a última que recebereis de mim.

O de )etembro de CD .

CARTA LVII

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

Encontrei a sua carta ontem - minha chegada. sua c*leradeu&me um prazer absoluto. minha amiga não sentiria maisvivamente os desastres de ancenP, se estivesse diretamenteinteressada neles. J sem dúvida por vingança que habituais aenamorada 9ec$lia a "azer&lhe pequenas in"idelidades. 7arquesa é

uma terr$vel pessoa= )im, encanta&me esse modo de ver, e não meadmira que se lhe resista menos que a ancenP.

En"im, sei tudo o que diz respeito a esse belo her*i deromance=

ei#ou de ter segredos para mim. 3antas vezes lhe disse queo amor honesto era o bem supremo, que um sentimento valia maisque dez intrigas, que eu pr*prio, nesse momento, era um apai#onadot$mido( mostrei&lhe, en"im, uma "orma de pensar tão con"orme -dele, que, encantado com a minha candura, disse&me tudo, e 'urou&me uma amizade sem reservas. o entanto, não estamos mais

avançados por isso com o nosso pro'eto.5rimeiro, pareceu&me que, segundo o seu sistema, umamenina merece mais que a poupem do que uma mulher, porque temmais a perder.

cha, sobretudo, que nada pode 'usti"icar um homem de p%ruma rapariga na necessidade de casar com ele ou de viverdesonrada, quando a rapariga é in"initamente mais rica do que ohomem, como no caso em que ele se encontra.

severidade da mãe, a candura da "ilha, tudo o intimida e odetém.

di"iculdade não está em combater os seus racioc$nios, por

muito verdadeiros que se'am. 9om um pouco de habilidade ea'udado pela pai#ão, depressa se conseguirá destru$&los( tanto maisque se prestam ao rid$culo, e que se tem a seu "avor a autoridade dae#peri!ncia. 7as o que impede que se consiga com ele alguma coisa,é que ele se considera "eliz como está. e "ato, se os primeirosamores parecem, em geral, mais honestos, e, como é costume dizer&se, mais puros( se pelo menos são mais lentos na sua marcha, não é,como se pensa, por delicadeza ou timidez, é porque o coração,surpreso ante um sentimento desconhecido, se suspende por assimdizer a cada passo, para gozar do encanto que e#perimenta, eporque esse encanto tem tanto poder sobre um coração 'ovem, que

o preenche a ponto de lhe "azer esquecer todo o prazer di"erente.Fsto é tão verdadeiro, que um libertino apai#onado, se um libertino o

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pode ser, desde o momento em que se apai#ona, torna&se menosávido de gozar( e que, en"im, entre o comportamento de ancenPcom a pequena ?olanges, e o meu com a severa 7adame de 3ourvel,há apenas a di"erença do mais ou menos.

)eria necessário, para e#citar o nosso 'ovem, maior número

de obstáculos do que os que ele tem encontrado( sobretudo que lhetivesse sido preciso rodear&se de mais mistério, pois o mistérioconduz - audácia.

ão ando muito longe de crer que a 7arquesa nos pre'udicouao servi&lo tão bem( a sua manobra teria sido e#celente com umhomem usado, que tivesse apenas dese'os( mas a minha amigadeveria ter previsto que para um homem novo, honesto eapai#onado o maior "avor que lhe concedem é "azer dele a prova doamor( e que, por conseqS!ncia, quanto mais ele está certo de seramado, menos ativo será. 0ue "azer agora> ão sei( mas não creioque a pequena se'a conquistada antes do casamento, e trabalhamos

em pura perda. Fsto aborrece&me, mas não lhe ve'o remédio.Enquanto eu uso aqui a minha eloqS!ncia, a 7arquesa

emprega melhor o seu tempo com o 9avaleiro. Fsso "az&me pensarque me prometeu uma in"idelidade em meu "avor, tendo a suapromessa por escrito, e não quero servir&me dela como de um bilhetede @a 9h8trel. 9oncordo que o vencimento ainda não tenha chegado:mas seria generoso da sua parte não esperar por ele e por meu lado,pedir&lhe&ei 'uros. 0ue diz a isto, minha bela amiga> ão está"atigada da sua const8ncia> Esse 9avaleiro é assim tão maravilhoso>2h= dei#e&me entrar em "unç+es( dese'o "orçá&la a concordar que, se

lhe encontra algum mérito, é porque me esqueceu.deus, minha bela amiga( bei'o&a tal como a dese'o( desa"iotodos os dese'os do 9avaleiro a terem tamanho ardor.

O de )etembro de CD .

CARTA LVIII

O VISCONDE DE VALMONT À PRESIDENTE DE TOURVEL

0ue "iz eu para merecer, senhora, as censuras que me dirigise a c*lera que me testemunhais> dedicação mais viva e todaviamais respeitosa, a submissão mais completa -s vossas menoresvontades( eis em duas palavras a hist*ria dos meus sentimentos e daminha conduta.

cabrunhado pelos so"rimentos dum amor in"eliz, não tinha euoutro consolo além de poder ver&vos( haveis&me ordenado que meprivasse dele: obedeci sem me permitir um murmúrio. 9omo preçodesse sacri"$cio, haveis&me permitido que vos escrevesse, e ho'epretendeis tirar&me esse único prazer. everei dei#á&lo arrebatar&me,

sem tentar de"end!&lo> ão, sem dúvida( pois não será caro ao meucoração sendo o único que me resta, e tendo&o recebido de v*s>

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s minhas cartas, dizeis, são demasiado "reqSentes= 5ensai,peço&vos, que há dez dias que dura o meu e#$lio, que durante essetempo não passei um momento sem me ocupar de v*s, e queentretanto recebestes apenas duas cartas minhas. elas s* vos "alodo meu amor= 5ois que posso eu dizer, senão o que penso>

 3udo o que pude "azer "oi moderar&lhe a e#pressão( e, podeiscrer, não vos dei#ei ver senão o que me "oi imposs$vel esconder&vos.meaçais&me por "im de não voltar a responder&me.este modo, ao homem que vos pre"ere a tudo, e que vos

respeita mais ainda do que vos ama, não satis"eita de o tratardescom rigor, quereis ainda 'untar a isso o desprezo= 5orqu! taisameaças e tal c*lera> 5or que necessitais de tais sentimentos>

ão estais segura de ser obedecida, mesmo nas vossasordens in'ustas> 5orventura me é poss$vel contrariar qualquer dosvossos dese'os, e não o provei 'á> busareis do dom$nio que tendessobre mim> epois de me terdes "eito desgraçado, e de vos terdes

tornado in'usta, ser&vos&á assim tão "ácil gozar dessa tranqSilidadeque declarais ser&vos tão necessária> ão vireis a dizer um dia:6dei#ou&me senhora do seu destino, e "iz a sua desgraça( imploravaos meus socorros, e olhei&o sem piedade6>

)abeis até onde pode chegar o meu desespero> ão.5ara calcular a e#tensão dos meus males, seria preciso saber

a que ponto vos amo, e não conheceis o meu coração.)acri"icais&me a qu!> quiméricos receios. E quem vo&los

inspira> ;m homem que vos adora( um homem sobre quem nãodei#areis nunca de e#ercer dom$nio absoluto. 0ue receais, que

podeis recear dum sentimento que sereis sempre senhora de dirigircomo vos aprouver> 7as a vossa imaginação cria monstros, eatribu$s ao amor o horror que eles vos causam.

;m pouco de con"iança, e esses "antasmas desaparecerão.;m sábio disse que quem queira dissipar os seus receios não

tem mais que apro"undar&lhes a causa. J principalmente no amorque esta verdade encontra a sua aplicação. mai, e os vossos receiosdesvanecer&se&ão. o lugar dos ob'etos que vos horrorizam,encontrareis um sentimento delicioso, um amante terno e submisso(e todos os vossos dias, marcados pela "elicidade, não vos dei#arãooutro pesar além de terdes perdido alguns na indi"erença. Eu pr*prio,

depois que, distanciado dos meus erros, e#isto apenas para o amor,lamento um tempo que supunha ter passado no meio de prazeres( esinto que s* a v*s pertence tornar&me "eliz. 7as, suplico&vos, que oprazer que encontro em escrever&vos não se'a perturbado pelo receioe vos desagradar.

ão quero desobedecer&vos: mas a'oelho&me perante v*s, ereclamo a "elicidade que quereis tirar&me, a única que me haveisdei#ado( e grito&vos: escutai as minhas súplicas, concedei um olhar-s minhas lágrimas. h= senhora, recusar&me&eis tão pouco>

D de )etembro de CD .

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CARTA LIX

O VISCONDE DE VALMONT À MARQUESA DE MERTEUIL

iga&me, se sabe, o que signi"ica este desatino de ancenP.0ue "oi que aconteceu, e que perdeu ele> sua belaaborreceu&se talvez do seu eterno respeito> J preciso ser 'usto, pormenos qualquer pessoa acabaria por se aborrecer. 0ue vou eu dizer&lhe esta noite, no encontro que ele me pediu, e que eu lhe concedipara ver o que da$ resultaria>

)eguramente não perderei o meu tempo a ouvir os seuslamentos, se isso não nos conduzir a nada.

s quei#as de amor não são boas de ouvir senão emrecitativos obrigat*rios, ou em árias de grande estilo. iga&me poisde que se trata e que devo "azer( ou acabo por desertar, a "im de

evitar o aborrecimento que preve'o. 5oderei "alar com a minha amigaesta manhã> )e estiver ocupada, pelo menos escreva&me umapalavra, e "orneça&me as dei#as do meu papel.

2nde esteve a 7arquesa ontem> ão consigo voltar a v!&la.a verdade, não me valia a pena ter "icado em 5aris no m!s

de )etembro. ecida&se, contudo, pois acabo de receber um convitemuito insistente da 9ondessa de <... para a visitar no campo( e,como ela me manda dizer de modo bastante agradável, 6seu maridopossui o mais belo bosque do mundo, que conserva cuidadosamentepara os prazeres dos seus amigos6. 2ra, a minha amiga sabe que eu

tenho alguns direitos adquiridos sobre esse bosque( e irei v!&lo denovo se não lhe posso ser útil.deus( pense que ancenP estará em minha casa pelas

quatro horas.

U de )etembro de CD .

CARTA LX

O CAVALEIRO DANCENY AO VISCONDE VALMONT

LFnclusa na precedente1

h= senhor, estou desesperado, perdi tudo. ão ouso con"iarao papel o segredo das minhas mágoas: mas tenho necessidade deas e#pandir no seio de um amigo "iel e seguro. que horas podereiv!&lo, e procurar 'unto do ?isconde consolaç+es e conselhos> Eu eratão "eliz no dia em que lhe abri a minha alma=

gora, que di"erença= 3udo mudou para mim. 2 que eu so"ropor mim pr*prio é ainda a menor parte dos meus tormentos( a minha

inquietação sobre um ob'eto bem mais querido, eis o que não possosuportar. 7ais "eliz do que eu, o ?isconde pode v!&la, e espero da sua

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amizade que não me recusará este "avor: mas é preciso que eu lhe"ale, que lhe diga de que se trata. Aá de lamentar&me, socorrer&me(s* tenho esperança no meu amigo.

)ei que é sens$vel, que conhece o amor( e é o único a quemeu posso con"iar&me( não me recuse o seu au#$lio.

deus, senhor( o único al$vio que e#perimento na minha dor éo de pensar que me resta um amigo como o ?isconde.7ande&me dizer, peço&lhe, a que horas poderei encontrá&lo. )e

não "or esta manhã, dese'aria que "osse -s primeiras horas da tarde.

U de )etembro de CD .

CARTA LXI

CECíLIA VOLANGES A SOFIA CARNAY 

7inha querida )o"ia, lamenta a tua 9ec$lia, a tua pobre 9ec$lia,que é muito in"eliz. 7amã sabe tudo. ão percebo como p%de eladescon"iar de alguma coisa, mas a verdade é que descobriu tudo.2ntem - noite, a 7amã pareceu&me estar de mau humor( mas nãodei ao caso grande atenção( e até, enquanto esperava que elaacabasse a sua paci!ncia, conversei muito alegremente com7adame de 7erteuil, que tinha ceado conosco, e "alamos muito deancenP. 7as parece&me que ninguém nos ouviu. @ogo que ela se "oi

embora, retirei&me para o meu quarto.Estava a despir&me, quando a 7amã entrou e mandou sair aminha criada de quarto, pedindo&me em seguida a chave da minhasecretária. 2 tom com que ela me "ez esse pedido causou&me umtremor tão "orte que apenas me podia ter em pé.

ingi que não a encontrava, mas por "im tive de obedecer. primeira gaveta que ela abriu "oi precisamente aquela onde estavamas cartas do 9avaleiro ancenP. Eu estava tão perturbada, quequando ela me perguntou o que aquilo era, não soube responder&lheoutra coisa senão que não era nada( mas quando a vi começar a ler aque estava ao de cima, s* tive tempo para ir até uma poltrona, e

senti&me tão mal que perdi o conhecimento.@ogo que voltei a mim, minha mãe, que tinha chamado acriada de quarto, retirou&se, dizendo&me que me deitasse. 3inhalevado todas as cartas de ancenP. 3remo todas as vezes que pensoque é preciso aparecer diante dela. 3oda a noite não "iz outra coisasenão chorar.

Escrevo&te ao romper do dia, na esperança de que 4ose"inavenha.

)e eu puder "alar&lhe sozinha, pedir&lhe&ei que leve a casa de7adame de 7erteuil um bilhetinho que lhe vou escrever( se o nãoconseguir, met!&lo&ei na tua carta e tu "arás o "avor de lho enviar

como sendo teu. J s* dela que eu posso receber alguma consolação.o menos, "alaremos dele, pois não espero voltar a v!&lo. )ou muito

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in"eliz= Ela terá talvez a bondade de se encarregar de uma carta paraancenP. ão ouso con"iar&me a 4ose"ina para esse "im, e aindamenos - minha criada de quarto( pois talvez tenha sido ela quemdisse a minha mãe que eu tinha cartas na minha secretária.

Aei&de escrever&te mais longamente, pois quero ter tempo

para escrever a 7adame de 7erteuil, e também a ancenP, para tera minha carta pronta, se ela quiser encarregar&se de a "azer seguir.epois disso, voltarei a deitar&me, para que me encontrem na camaquando entrarem no meu quarto. irei que estou doente, para medispensar de ir ao pé da 7amã. ão será grande a mentira( comcerteza so"ro mais do que se tivesse "ebre.

2s olhos ardem&me por ter chorado tanto( e tenho um peso noest%mago que me impede de respirar. 0uando penso que nãovoltarei a ver ancenP, dese'aria estar morta. deus, minha querida)o"ia. ão posso dizer&te mais nada( as lágrimas su"ocam&me.

D de )etembro de CD .

"ota % 7uprimiu%se a carta de &ecília olanges 8 )arquesa, porque continhaapenas os mesmos +atos da carta precedente, e com menos pormenores # carta para o &avaleiro Dancen9 não +oi encontrada; ver%se%á qual a ra6ão na &arta 04,de )adame de )erteuil ao isconde

CARTA LXII

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MADAME DE VOLANGES AO CAVALEIRO DANCENY 

epois de terdes abusado, senhor, da con"iança de uma mãee da inoc!ncia de uma criança, não "icareis surpreendido, por certo,

de não voltar a ser recebido numa casa onde não correspondestes -sprovas da amizade mais sincera, senão esquecendo todos ospreceitos. 5re"iro pedir&vos que não volteis a minha casa, a darordens que nos comprometeriam a todos igualmente, pelos reparosque os criados não dei#ariam de "azer.

 3enho o direito de esperar que não me obrigareis a recorrer aesse meio.

5revino&vos também de que, se no "uturo "izerdes a menortentativa para manter a minha "ilha no desvairamento em que alançastes, um recolhimento austero e eterno a subtrairá -s vossasperseguiç+es. v*s compete, senhor, saber se receais tão pouco

causar o seu in"ortúnio como receastes pouco tentar a sua desonra.0uanto a mim, a minha escolha está "eita, e disso lhe dei

participação.Encontrareis 'unto o maço das vossas cartas. 9onto que me

devolvereis em troca todas as de minha "ilha( e que vos prestareis aapagar qualquer vest$gio de um acontecimento de que nãopoderemos lembrar&nos, eu sem indignação, ela sem vergonha, e v*ssem remorso. 3enho a honra de ser, etc.

D de )etembro de CD.

CARTA LXIII

A MARQUESA DE MERTEUIL AO VISCONDE DE VALMONT

9laro que sim, que lhe e#plicarei o bilhete de ancenP. 2acontecimento que o levou a escrev!&lo é obra minha, e é, creio, aminha obra&prima. ão perdi o meu tempo depois da sua últimacarta, e disse como o arquiteto ateniense: 62 que ele disse, eu o

"arei.6 )ão pois necessários obstáculos a esse belo her*i de romance(que se dei#a dormir na "elicidade= 2h= que venha ter comigo, eu lhedarei que "azer( e, ou eu me engano, ou o seu sono tempo, e gabo&me de que no presente ele lamente o que perdeu.

Era preciso, dizia o ?isconde, que ele sentisse a necessidadede mais mistério( pois bem= Essa necessidade não lhe vai "altar. Eutenho isto de bom: é que basta apenas chamarem&me a atençãopara os meus erros( não descanso enquanto não tiver posto tudocerto. )aiba pois o que eu "iz.

o entrar em casa anteontem de manhã, li a sua carta( achei&

a luminosa. 9onvencida de que o ?isconde indicara muito bem acausa da doença, não me ocupei senão de encontrar maneira de a

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curar. 9omecei todavia por me deitar( pois o in"atigável 9avaleironão me tinha dei#ado dormir um momento e eu 'ulgava ter sono.7as enganava&me( toda entregue a ancenP, o dese'o de o tirar dasua indol!ncia, ou de lha castigar, não me permitiu "echar os olhos, es* depois de ter concertado o meu plano é que pude achar duas

horas de repouso.essa mesma noite "ui a casa de 7adame de ?olanges, e,con"orme o meu pro'eto, con"idenciei&lhe que 'ulgava estar certa dee#istir entre a sua "ilha e ancenP uma ligação perigosa.

Esta mulher, tão clarividente no caso do ?isconde, estavacega a ponto de me ter respondido primeiro que com certeza euestava enganada( que sua "ilha era uma criança, etc. Eu não podiadizer&lhe tudo quanto sabia a tal respeito( mas citei os olhares, osditos, que tinham alarmado a minha virtude e a minha amizade.

En"im, "alei quase tão bem como o poderia "azer uma devota,e, para vibrar o golpe de miseric*rdia, cheguei a dizer que supunha

ter visto entregar e receber uma carta. 6Fsto "az&me recordar6,acrescentei 6que um dia ela abriu diante de mim uma gaveta dasecretária, na qual vi muitos papéis, que com certeza ela conserva.9onheceis&lhe alguma correspond!ncia "reqSente>6.

qui o rosto de 7adame de ?olanges mudou, e vi algumaslágrimas nos seus olhos. 6gradeço&vos, minha digna amiga6, disseela, apertando&me a mão(6 eu porei tudo isso a limpo6.

epois desta conversa, demasiado curta para se tornarsuspeita, apro#imei&me da pequena. ei#ei&a pouco depois, parapedir - mãe que não me comprometesse 'unto da "ilha, o que ela me

prometeu de bom grado, tanto mais que lhe observei quantavantagem haveria em que essa criança tivesse bastante con"iançaem mim para me abrir o seu coração e me p%r ao alcance de lhe daros meus prudentes conselhos. 2 que me dá a certeza de que elacumprirá a sua promessa é que não tenho dúvidas de que elaconsidere um ponto de honra e#ercer a sua penetração 'unto da"ilha. Encontrava&me, por esse lado, autorizada a conservar o meutom de amizade com a pequena, sem parecer "alsa aos olhos de7adame de ?olanges, o que dese'ava evitar. 3ive ainda a vantagemde continuar por muito tempo e tão secretamente como eu dese'ava

 'unto da rapariguinha, sem que a mãe tivesse qualquer suspeita.

proveitei aquele mesmo serão( e depois de terminar a minhapaci!ncia, arrastei a petiza para um canto, e levei&a a "alar deancenP, assunto em que ela é inesgotável. iverti&me a dar&lhevolta - cabeça sobre o prazer que ela teria em v!&lo no dia seguinte(não houve loucura que eu não a obrigasse a dizer.

Era preciso dar&lhe em esperanças o que lhe tirava emrealidade( além disso, tudo isso a tornaria mais sens$vel ao golpe, eestou convencida de que quanto mais ela so"rer, mais ansiosa "icaráde na primeira ocasião tirar a des"orra. J bom, aliás, habituar aosgrandes acontecimentos as pessoas que se destinam -s grandesaventuras.

o "im de contas, não é 'usto que ela pague com algumaslágrimas o prazer de possuir o seu ancenP> Está doida por ele=

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5ois bem, prometo&lhe que o há de ter, e até mais cedo doque o conseguiria sem este contratempo. J um sonho mau cu'odespertar será delicioso( e, bem "eitas as contas, parece&me que elame deve estar reconhecida. e "ato, mesmo que eu tenha posto nocaso um pouco de mal$cia, é preciso divertirmo&nos.

Getirei&me por "im, muito satis"eita de mim pr*pria. 62uancenP6, dizia eu comigo, e#citado pelos obstáculos, vai redobrarde amor, e então servi&lo&ei em tudo o que possa( ou, se não passade um tolo, como algumas vezes sou tentada a crer, "icarádesesperado e considerar&se&á vencido( ora, neste caso, pelo menoster&me&ei vingado dele, na medida em que o posso "azer( ao mesmotempo terei aumentado para mim a estima da mãe, a amizade da"ilha e a con"iança de ambas.

0uanto a ercourt, primeiro ob'eto dos meus cuidados, muitoin"eliz seria eu, ou muito inábil, se, dominando o esp$rito de suamulher, o que acontece 'á, e nesse sentido mais conseguirei ainda,

eu não encontrar mil maneiras de "azer dela o que eu quiser que elase'a6.

eitei&me acalentando estas doces idéias( o que me permitiudormir, e despertar muito tarde.

o acordar, encontrei dois bilhetes, um da mãe, outro da "ilha(e não pude impedir&me de rir, encontrando em ambos literalmente amesma "rase: J apenas de v*s que espero alguma consolação. ão éengraçado, de "ato, consolar contra e a "avor, e ser o único agente dedois interesses diretamente contrários>

Eis&me como a divindade: recebendo os votos opostos dos

cegos mortais e não mudando nada aos meus decretos imutáveis.bandonei todavia esse augusto papel, para tomar o de an'oconsolador( e, segundo os preceitos, "ui visitar os meus amigos nasua a"lição.

9omecei pela mãe( encontrei&a numa tristeza que 'á em partevinga o ?isconde das contrariedades que ela lhe "ez so"rer por parteda sua bela hip*crita. 3udo correu - maravilha. minha únicainquietação era que 7adame de ?olanges não aproveitasse essemomento para conseguir a con"iança de sua "ilha( o que teria sidomuito "ácil, desde que empregasse 'unto dela a linguagem da doçurae da amizade, e dando conselhos cheios de razão, com o ar e o tom

da ternura indulgente. 5or "elicidade, armou&se de severidade( en"im,portou&se tão mal, que s* tive ocasião de aplaudir. J certo queesteve para deitar por terra todos os nossos pro'etos, pensando em"azer voltar a "ilha para o convento( mas eu aparei o golpe( econsegui que apenas "izesse a ameaça, no caso em que ancenPcontinuasse a importuná&las, a "im de obrigar as duas a umamoderação que 'ulgo necessária para o !#ito.

Em seguida estive com a "ilha. 2 ?isconde não pode imaginarcomo a dor a embeleza= 7esmo que venha a usar pouco decoqueteria, garanto&lhe que há de chorar muitas vezes( por esta vez,chorava sem mal$cia...

)urpreendida por aquele motivo de agrado que eu não lheconhecia, e que me sentia "eliz de observar, s* lhe dei a princ$pio

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consolaç+es ineptas, que aumentam mais as mágoas do que asaliviam( e, por este meio, levei&a a ponto de estar verdadeiramentesu"ocada. ei#ou de chorar, e por um momento temi as convuls+es.conselhei&a a deitar&se, o que ela "ez( servi&lhe de criada de quarto.ão se tinha vestido, e em breve os cabelos esparsos lhe ca$am

sobre os ombros e o pescoço inteiramente descobertos. bracei&a(ela dei#ou&se embalar nos meus braços, e as lágrimas recomeçarama cair&lhe sem es"orço. eus= como ela estava bela=

h= se 7adalena era assim, deve ter sido bem mais perigosapenitente que pecadora.

0uando a bela desolada se deitou, pus&me a consolá&la de boa"é.

 3ranquilizei&a primeiro sobre os receios do convento.iz nascer nela a esperança de ver ancenP secretamente.

6)e ele estivesse aqui...6, disse&lhe eu, sentando&me na cama(depois, "antasiando sobre esse tema, levei&a, de distração em

distração, a esquecer&se de que estava a"lita. 3er&nos&$amosseparado per"eitamente satis"eitas uma com a outra se ela nãotivesse querido encarregar&me de uma carta para ancenP, o que eurecusei "irmemente. provará com certeza os motivos, que passo ae#por.

5rimeiro, seria comprometer&me 'unto de ancenP( e, se "oiesta a única razão de que pude servir&me 'unto da pequena, haviamuitas outras que nos dizem respeito. ão seria arriscar o "ruto domeu trabalho dar tão depressa aos nossos 'ovens um meio tão "ácilde suavizar as suas mágoas> E depois, não me descontenta obrigá&

los a meterem alguns criados nesta aventura( porque, en"im, se ela"or levada a bom "im, como espero, é preciso que se'a conhecidaimediatamente depois do casamento( e poucos meios mais segurosdo que esses e#istem para que todos o venham a saber.

7as se, por milagre, os criados não "alassem, "alar$amos n*s,e sempre é mais c%modo que as incon"id!ncias "iquem a cargo deles.

J necessário pois que o ?isconde d! ho'e essa idéia aancenP( e como não estou segura da criada de quarto da pequena?olanges, de quem ela pr*pria parece descon"iar, indique&lhe aminha "iel ?it*ria. 3omarei precauç+es para que esta dilig!ncia se'acoroada de bom !#ito. Esta idéia agrada&me tanto mais, quanto a

con"id!ncia s* nos será útil a n*s, e nunca a eles( não cheguei aindaao "im da minha narração.Enquanto eu me "urtava a encarregar&me da carta da

pequena, temia a todo o momento que ela me propusesse p%&la nocorreio, o que eu não poderia recusar. elizmente, ou por estar muitoperturbada, ou por ignor8ncia da sua parte, ou ainda porque dessemenos import8ncia - carta que - resposta, a qual ela não poderia terpor esse meio, o certo é que não me "alou em tal( mas para evitarque lhe viesse semelhante idéia, ou pelo menos que pudesse servir&se dela, tomei imediatamente o meu partido( e voltando a "alar -mãe, decidi&a a a"astar a "ilha por algum tempo, a mandá&la para o

campo... E para onde> ão lhe bate de alegria o coração, ?isconde>...5ara casa de sua tia, a velha Gosemonde. Ao'e mesmo 7adame de

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?olanges escreverá nesse sentido: assim, eis o ?isconde autorizado avoltar a ver a sua devota, que 'á não terá a ob'etar o esc8ndalo doconv$vio a s*s, e, graças aos meus cuidados, 7adame de ?olangesterá ocasião de reparar o agravo que lhe "ez.

7as ouça&me, e não se ocupe tão vivamente dos seus

assuntos que acabe por perder este de vista( pense que ele meinteressa.ese'o que o ?isconde se torne o correspondente e o

conselheiro dos dois 'ovens. 9omunique pois a ancenP esta viagem,e o"ereça&lhe os seus serviços. 0ue a sua única di"iculdade se'a a de"azer chegar -s mãos da bela a sua credencial( e suprima esseobstáculo imediatamente, indicando&lhe a minha criada de quartocomo intermediária. ão tenho qualquer dúvida de que ele aceite( ecomo prémio das suas canseiras, terá o ?isconde as con"id!ncias deum coração 'ovem, o que é sempre interessante.

5obre pequena= 9omo ela há de corar ao entregar&lhe a sua

primeira carta= a verdade, este papel de con"idente, contra o qualse erguem preconceitos, parece&me um lindo passatempo quando setem outras ocupaç+es( e será este o seu caso.

epende agora dos seus cuidados o des"echo desta intriga.2 campo o"erece mil ocasi+es( e ancenP, com toda a certeza,

estará pronto a seguir logo que o ?isconde lhe "aça o primeiro sinal.;ma noite, um dis"arce, uma 'anela..., que sei eu> 7as, en"im, se arapariguinha continuar na mesma, ao ?isconde pedirei contas. )eachar que ela precisa que eu a encora'e, mande&mo dizer. 9reio ter&lhe dado uma boa lição sobre o perigo de guardar cartas, para ousar

escrever&lhe agora( e continuo com a intenção de "azer dela minhadisc$pula.5arece&me ter esquecido dizer&lhe que as suspeitas da

pequena no que respeita - denúncia da correspond!ncia ca$ramprimeiro sobre a criada de quarto, e eu desviei&as para o con"essor.

9hama&se a isto matar dois coelhos de uma ca'adada.deus, ?isconde( estou há muito tempo a escrever&lhe e

atrasei&me para o 'antar( mas o amor&pr*prio e a amizade ditaramesta carta, e ambos são tagarelas. 2 que é preciso é que a cartaeste'a em sua casa -s tr!s horas.

gora quei#e&se de mim, se se atrever, e volte a ver, se lhe

apetece, o bosque do 9onde de <... iz o ?isconde que ele o guardapara prazer dos seus amigos= Esse homem é então amigo de toda agente> 7as adeus, tenho "ome.

R de )etembro de CD .

CARTA LXIV

O CAVALEIRO DANCENY A MADAME DE VOLANGES

Lminuta 'unta - 9arta @Y?F, do ?isconde - 7arquesa1

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)em procurar 'usti"icar a minha conduta, senhora, e sem mequei#ar da vossa, s* me resta a"ligir&me por um acontecimento que"az a in"elicidade de tr!s pessoas, todas dignas de um destino mais"eliz. 7ais sens$vel ainda - tristeza de lhe ter sido a causa do que -

de ter sido a v$tima, tentei muitas vezes, desde ontem, ter a honrade vos responder, sem poder encontrar "orças para tal. 3enho, noentanto, tantas coisas a dizer&vos, que me é necessário "azer umgrande es"orço sobre mim pr*prio( e se esta carta "or um tantodesordenada, devereis sentir quanto a minha situação é dolorosa,para me concederdes alguma indulg!ncia.

5ermiti&me primeiro que proteste contra a primeira "rase davossa carta. Eu não abusei( ouso diz!&lo, nem da vossa con"iançanem da inoc!ncia de 7ademoiselle de ?olanges( respeitei uma eoutra nas minhas aç+es. )* elas dependem de mim( e quando metornásseis responsável por um sentimento involuntário, não recearia

acrescentar que o que me "oi inspirado por vossa "ilha podedesagradar&vos, mas nunca o"ender&vos.

)obre este assunto, que me interessa mais do que eu possodizer&vos, s* a v*s, senhora, dese'o por 'uiz, e -s minhas cartas portestemunhas.

5roibis&me de me apresentar de "uturo em vossa casa, e semdúvida terei de su'eitar&me a tudo o que vos aprouver ordenar a esterespeito: mas esta aus!ncia súbita e total não dará lugar aosmurmúrios que quereis evitar, tanto como a ordem que, pelo mesmomotivo, não quiseste dar aos vossos criados> Fnsistirei tanto mais

sobre este ponto, quanto é certo que ele é mais importante para7ademoiselle de ?olanges do que para mim.)uplico&vos pois que peseis atentamente todas as raz+es, de

modo a não permitir que a vossa severidade altere a vossaprud!ncia.

5ersuadido de que s* o interesse de vossa "ilha ditará asvossas resoluç+es, aguardarei novas ordens da vossa parte.

Entretanto, no caso em que me permit$sseis "reqSentar avossa casa algumas vezes, comprometo&me Le podeis contar com ocumprimento da minha promessa1 a não abusar dessas ocasi+espara tentar "alar em particular com 7ademoiselle de ?olanges, ou

entregar&lhe qualquer carta.2 receio de p%r em perigo a sua reputação leva&me a estesacri"$cio( e a "elicidade de a ver algumas vezes me compensará.

J esta a única resposta que posso dar ao que me dizeis sobrea sorte que destinais a 7ademoiselle de ?olanges, e que quereistornar dependente da minha conduta. 5rometer&vos mais seriaenganar&vos. ;m vil sedutor pode adaptar os seus pro'etos -scircunst8ncias e calcular segundo os acontecimentos( mas o amorque me anima permite&me apenas dois sentimentos: a coragem e aconst8ncia.

Eu, consentir em ser esquecido por 7ademoiselle de

?olanges, ou esquec!&la eu mesmo> ão, nunca= )er&lhe&ei "iel( ela

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recebeu o 'uramento, e eu renovo&o agora. 5erdão, minha senhora,eu desvairo, tentarei reagir.

Gesta&me outro assunto a tratar convosco: o das cartas queme pedistes. ico verdadeiramente penalizado por ter de acrescentaruma recusa aos agravos que tendes de mim( mas suplico&vos,

atendei as minhas raz+es, e dignai&vos lembrar&vos, para asapreciardes, que a única consolação para a desgraça de ter perdido avossa amizade é a esperança de conservar a vossa estima.

s cartas de 7ademoiselle de ?olanges, sempre tão preciosaspara mim, muito mais preciosas se tornaram neste momento.

)ão o único bem que me resta( s* essas cartas me recordamainda um sentimento que constitui todo o encanto da minha vida.Entretanto, podeis crer&me, não hesitaria um instante em "azer&vosesse sacri"$cio( e o pesar de ser privado delas cederia ao dese'o devos provar a minha de"er!ncia respeitosa( mas consideraç+espoderosas me tolhem o impulso, e estou certo de que v*s mesma

não podereis censurá&las.J certo que entrastes na posse do segredo de 7ademoiselle

de ?olanges( mas, permiti que vos diga, estou autorizado a crer que"oi o e"eito da surpresa e não da con"iança. ão pretendo censurar&vos um ato que a solicitude materna talvez autorize.

Gespeito os vossos direitos, mas não ao ponto de medispensar dos meus deveres. 2 mais sagrado de todos é o de nuncatrair a con"iança que alguém nos concede. )eria "altar a ela e#poraos olhos de outrem os segredos de um coração que dese'ou con"iá&los s* aos meus. )e vossa "ilha consente em vo&los con"iar, a ela

compete "alar( as suas cartas ser&vos&iam inúteis. )e, pelo contrário,ela quer encerrar o seu segredo em si pr*pria, não esperareis, porcerto, que se'a eu quem vos instrua a tal respeito.

0uanto ao mistério no qual dese'ais que este acontecimento"ique sepulto, podeis "icar tranqSila, minha senhora( sobre tudo o queinteressa 7ademoiselle de ?olanges, posso desa"iar mesmo ocoração de uma mãe.

5ara vos tirar todo o motivo de inquietação, previ tudo. 2precioso dep*sito, que até aqui tinha inscrito: papéis para queimar,tem agora: papéis pertencentes a 7adame de ?olanges. Estaresolução que tomei deve provar&vos assim que a minha recusa não

se baseia no receio de que encontreis nessas cartas um únicosentimento de que pessoalmente tenhais de quei#ar&vos.Eis, minha senhora, uma bem longa carta. ão o seria ainda

bastante se vos dei#asse a menor dúvida sobre a honestidade dosmeus sentimentos, do pesar muito sincero de vos ter desagradado, edo pro"undo respeito com que tenha a honra de ser, etc.

R de )etembro de CD .

CARTA LXV

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O CAVALEIRO DANCENY A CECÍLIA VOLANGES

LEnviada aberta - 7arquesa de 7erteuil na 9arta @Y?F do ?isconde1

N minha 9ec$lia, que vai ser de n*s> 0ue eus nos salvará das

desgraças que nos ameaçam> o menos, que o amor nos d!coragem para as suportar= 9omo descrever&lhe o meu espanto, omeu desespero - vista das minhas cartas, ante a leitura do bilhete de7adame de ?olanges>

0uem nos terá tra$do> )obre quem recaem as suas suspeitas> 3eria a 9ec$lia cometido alguma imprud!ncia> 0ue "az agora> 0uelhe t!m dito>

 3anto eu dese'ava saber tudo, e tudo ignoro. 3alvez mesmo a9ec$lia não saiba mais do que eu.

Envio&lhe o bilhete da sua 7amã, e a c*pia da minha resposta.Espero que aprovará o que eu lhe disse. 5reciso muito que

aprove também as dilig!ncias que "iz desde aquele "atalacontecimento, pois que todas t!m por "im conseguir not$cias suas edar&lhe as minhas( e, quem sabe>, talvez voltar a v!&la, e com maiorliberdade do que nunca. 5+e na sua idéia, minha 9ec$lia, que prazerseria voltarmos a encontrar&nos, podermos 'urar&nos de novo umamor eterno, e ver nos nossos olhos, sentir nas nossas almas queesse 'uramento não será desmentido> ;m momento tão doce, quemágoas não "ará esquecer> 5ois bem=

 3enho esperança de que tal momento sur'a, e devo&a a essasmesmas dilig!ncias para que suplico a sua aprovação. 0ue digo( eu>

evo essa esperança aos consoladores cuidados do mais( terno dosamigos( e o único pedido que lhe "aço é que permita( que esse amigose'a também o seu.

 3alvez eu não devesse con"iar tanto sem o seuconsentimento( mas tenho por desculpa a má sorte e a necessidade.oi o amor que me conduziu( é ele que reclama a sua indulg!ncia,que lhe pede que perdoe uma con"id!ncia necessária, e sem a qual"icar$amos talvez separados para sempre. 9onhece o amigo de quelhe "alo( é&o também da mulher de quem a 9ec$lia tanto gosta. J o?isconde de ?almont. 2 meu pro'eto, ao dirigir&me a ele, era primeiroo de lhe pedir que conseguisse de 7adame de 7erteuil encarregar&se

de uma carta para a 9ec$lia. ão 'ulgou ele que esse meio "osse bemsucedido mas, na "alta da 7arquesa, responde pela sua criada dequarto, que lhe deve obrigaç+es. )erá ela quem lhe entregará estacarta e a 9ec$lia poderá dar&lhe a resposta.

Este au#$lio não nos será de qualquer utilidade, se, comosup+e o ?isconde, a 9ec$lia partir em breve para o campo. 7as nessecaso ele pr*prio dese'a servir&nos. dona da casa é parente dele,que aproveitará esse prete#to para a visitar ao mesmo tempo. E serápor seu intermédio que poderemos trocar a nossa correspond!ncia.eu&me mesmo a certeza de que, se a 9ec$lia o consentir, eleconseguirá arran'ar maneira de nos vermos sem o perigo de se

comprometer.

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gora, minha 9ec$lia( se tem amor por mim, se lamenta aminha má sorte, se, como espero, toma parte nas minhas mágoas,recusará a sua con"iança a um homem que será o nosso an'o tutelar>)em ele, "icarei reduzido ao desespero de nem mesmo podersuavizar as tristezas que lhe causei. Elas terão "im, espero&o( mas,

minha terna amiga, prometa&me que não se entregará demasiado atais tristezas, que não se dei#ará vencer por elas. idéia da sua dor é para mim um tormento insuportável.

aria a minha vida para a "azer "eliz= <em o sabe. 5ossa a certeza deser adorada levar alguma consolação - sua alma= minha temnecessidade da certeza de que perdoa ao meu amor os males que aobriga a so"rer.

deus, minha 9ec$lia, adeus minha terna amiga.

R de )etembro de CD .

*5 &avaleiro Dancen9 não +ala verdade /inha -á +eito essa con+idência ao senhorde almont antes desse acontecimento er &arta 0.

CARTA LXVI

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

@endo as duas cartas que 'unto, a minha bela amiga verá seme desempenhei bem ou mal da missão de que me encarregou.

Embora ambas se'am datadas de ho'e, "oram escritas ontem,em minha casa, e debai#o dos meus olhos. carta para a pequenadiz tudo o que n*s dese'ávamos. 5erante a pro"undeza dos planos daminha boa amiga, e a 'ulgar pelo !#ito dos seus empreendimentos,não posso senão humilhar&me. ancenP está em brasa( e,seguramente, na primeira ocasião dei#ará de ser digno das censuras

que lhe tem dirigido. )e a bela ing!nua quiser ser d*cil( tudo estaráterminado pouco tempo depois da sua chegada( tenho cem maneiraspreparadas. raças aos cuidados da 7arquesa, eis&medecididamente o amigo de ancenP( a ele, não lhe "alta mais senãoser 5r$ncipe.

J ainda muito novo, esse ancenP= credite, minha amiga,que não consegui obter dele que prometesse - mãe a renúncia aoamor pela "ilha( como se "osse muito di"$cil prometer, quando se estádecidido a não cumprir=

)eria enganar & repetia&me ele continuamente.ão é verdade que é um escrúpulo edi"icante, principalmente

quando se trata de seduzir a pequena> E são assim os homens=

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 3odos igualmente celerados nos seus pro'etos, quando "raque'am nae#ecução, chamam a isso probidade.

5ertence - minha amiga impedir que 7adame de ?olanges seen"ureça pelas pequenas liberdades que o nosso 'ovem se permitena sua carta( livre&nos do convento( e consiga também que a

senhora desista do pedido das cartas da pequena. Em primeiro lugar,ele não as entregará, e nisso sou da mesma opinião( neste ponto oamor e a razão estão de acordo.

@i todas essas cartas, devorei o tédio que elas destilam.5odem vir a ser úteis. Eu me e#plico.

pesar da prud!ncia de que usaremos, pode acontecer oimprevisto( isso "aria que o casamento "alhasse, e todos os nossospro'etos concernentes a ercourt cairiam por terra, não é assim> 7ascomo, por meu lado, tenho de me vingar da mãe, reservo&me odireito de desonrar a "ilha. azendo uma escolha habilidosa nessacorrespond!ncia e dando a público apenas uma parte, a pequena

?olanges "icaria suspeita de ter dado os primeiros passos e ter&seabsolutamente atirado de cabeça. lgumas dessas cartas poderiammesmo comprometer a mãe e dei#á&la&iam maculada pelo menos deuma imperdoável neglig!ncia.

)ei bem que o escrupuloso ancenP se sentiria revoltado -sprimeiras impress+es( mas como seria atacado pessoalmente, creioque acabaria por se recuperar. E#istem mil probabilidades contrauma de que as coisas não sigam este caminho( mas é preciso prevertudo.

deus, minha bela amiga( seria muito amável se aceitasse o

convite da 7arechala de... para cear amanhã em sua casa( por mim,não pude recusar. 4ulgo não ser necessário recomendar&lhe segredo, em relação

a 7adame de ?olanges, no que respeita ao meu pro'eto de "érias nocampo( ela teria o cuidado de "icar na cidade. ssim, uma vez quenos encontraremos, com certeza não partirá no dia seguinte. E se elanos der somente oito dias, respondo por tudo.

R de )etembro de CD .

CARTA LXVII

A PRESIDENTE DE TOURVEL AO VISCONDE DE VALMONT

ão dese'aria responder&vos, senhor, e talvez o embaraço quesinto neste momento se'a uma prova de que não o deveria "azer.Entretanto, não quero dei#ar&vos um único motivo de quei#a contramim. ese'o convencer&vos de que "iz por v*s tudo quanto poderia"azer.

izeis que vos permiti que me escrev!sseis> 9onvenho( mas

quando me lembrais essa permissão, 'ulgais que me esqueci dascondiç+es em que ela "oi dada> )e eu tivesse sido tão "iel a tal

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concessão quando vos a"astastes dela, ter$eis recebido uma únicaresposta minha> o entanto, esta 'á é a terceira( e enquanto "azeistudo o que é preciso para me obrigardes a terminar estacorrespond!ncia, sou eu que me ocupo dos meios de a continuar.

E#iste um, mas é o único( e se recusais aceitá&lo, se'a o que

"or que digais, será provar&me o pouco apreço que lhe dais.ei#ai pois uma linguagem que não posso nem quero ouvir(renunciai a um sentimento que me o"ende e me horroriza, e ao qualtalvez vos sent$sseis menos ligado se pensásseis no obstáculo quenos separa. )erá esse o único sentimento que possais conhecer, e oamor terá a meus olhos mais esse de"eito de e#cluir a amizade>

 3ereis, v*s pr*prio, a maldade de não querer por amiga aquela emquem dese'ais sentimentos mais ternos>

ão quero acreditá&lo( essa idéia humilhante revoltar&me&ia, ea"astar&me&ia de v*s sem remédio.

2"erecendo&vos a minha amizade, senhor, dou&vos tudo o que

me pertence, tudo aquilo de que posso dispor. 0ue podereis querermais> 5ara me entregar a esse sentimento tão doce, tão - medida domeu coração, espero apenas o vosso acordo, e a palavra que de v*se#i'o, de que essa amizade bastará para vos "azer "eliz. Esquecereitudo o que pudestes dizer&me( dei#ar&vos&ei o cuidado de 'usti"icar aminha escolha.

?edes a minha "raqueza( ela deve provar&vos a minhacon"iança.

epende de v*s aumentá&la( mas previno&vos de que aprimeira palavra de amor a destruirá para sempre, ressuscitando

todos os meus receios( que marcará para mim o in$cio de um sil!ncioeterno para convosco.)e, como dizeis, estais distanciado dos vossos erros, não

achais pre"er$vel ser ob'eto da amizade de uma mulher honesta, quecausador dos remorsos de uma mulher culpada>

deus, senhor( deveis sentir que, depois de ter "alado assim,nada posso dizer&vos a que não me tenhais 'á respondido.

R de )etembro de CD .

CARTA LXVIII

O VISCONDE DE VALMONT A PRESIDENTE DE TOURVEL

9omo responder, senhora, - vossa última carta> 9omo ousareiser verdadeiro, quando a minha sinceridade pode perder&me avossos olhos>

ão importa, é necessário( terei essa coragem. mim pr*prio digo e repito que vale mais merecer&vos do que

obter&vos( e, embora me recuseis uma "elicidade que dese'arei

incessantemente, é preciso ao menos provar&vos que o meu coraçãoé digno dela.

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0ue pena que, como dizeis, eu este'a distanciado dos meuserros=

9om que transportes de alegria eu teria lido essa mesmacarta - qual tremo ho'e de responder= alais&me nela com "ranqueza,testemunhais&me con"iança, o"ereceis&me por "im a vossa amizade:

tantas o"ertas, senhora, e que pesar eu tenho de não poderaproveitar delas= 5or que não continuo eu a ser o mesmo>)e de "ato o "osse, se sentisse por v*s apenas uma a"eição

vulgar, aquela a"eição ligeira, "ilha da sedução e do prazer, - qual, noentanto, se dá ho'e o nome de amor, apressar&me&ia a tirarvantagem de tudo o que pudesse obter. 5ouco delicado sobre osmeios, contanto que eles me garantissem o !#ito, daria 8nimo -vossa "ranqueza pela necessidade de vos adivinhar( dese'aria avossa con"iança com o "im de a trair( aceitaria a vossa amizade, naesperança de a desencaminhar... 5ois qu!, senhora= horroriza&voseste quadro>... o entanto, seria essa a minha obra se vos dissesse

que consinto em ser apenas vosso amigo...5ois consentiria eu partilhar com alguém um sentimento

emanado da vossa alma> )e alguma vez eu o disser, não oacrediteis.

esde esse momento procuraria enganar&vos( poderiadese'ar&vos ainda, mas seguramente 'á não vos amaria.

ão é o caso que a amável "ranqueza, a doce con"iança, asens$vel amizade não tenham a meus olhos certo valor... 7as oamor= o amor verdadeiro, e tal como v*s o inspirais, reunindo todosesses sentimentos, dando&lhes maior energia, não poderia prestar&

se, como eles, a essa tranqSilidade, a essa "rieza da alma, quepermite comparaç+es, que suporta mesmo pre"er!ncias.ão, minha senhora, não serei vosso amigo( amar&vos&ei com

o amor mais terno, e mesmo o mais ardente, embora o maisrespeitoso.

5odereis tirar&lhe toda a esperança, mas não aniquilá&lo.9om que direito pretendeis dispor de um coração de que

recusais as homenagens> 5or que requinte de crueldade medisputais até a "elicidade de vos amar> Essa "elicidade pertence&me,é independente de v*s( saberei de"end!&la. )e é ela a "onte dosmeus males, é&lhes também o remédio.

ão, ainda uma vez, não. 5odeis persistir nas vossas cruéisrecusas( mas dei#ai&me o meu amor. 9omprazeis&vos em tornar&mein"eliz= Está bem( se'a= E#perimentai cansar a minha coragem(saberei "orçar&vos ao menos a decidir a minha sorte. E talvez um diame "açais maior 'ustiça. ão é que eu espere tornar&vos alguma vezsens$vel( mas sem serdes persuadida, "icareis convencida, e direis av*s mesma: 63inha&o 'ulgado mal.6

izendo melhor, a vossa in'ustiça recai sobre v*s. 9onhecer&vos sem vos amar, amar&vos sem ser constante, eis duas coisasigualmente imposs$veis( e apesar da modéstia que é vosso timbre,deve ser&vos mais "ácil quei#ar&vos do que admirar&vos dos

sentimentos que "azeis nascer. 5or mim, cu'o único mérito é o tersabido apreciar&vos, esse não quero perd!&lo( e longe de consentir

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nas vossas traiçoeiras o"ertas renovo a vossos pés o 'uramento devos amar sempre.

CV de )etembro de CD .

CARTA LXIX

CECÍLIA VOLANGES AO CAVALEIRO DANCENY 

L<ilhete escrito a lápis e copiado por ancenP1

5ergunta&me o que "aço( amo&o e choro. 7inha mãe não me"ala( tirou&me papel, penas e tinta( sirvo&me dum lápis, que por"elicidade me "icou, e escrevo&lhe num bocado de papel da sua carta.

J&me "orçoso aprovar tudo o que "ez( amo&o demasiado para nãoaproveitar todos os meios de receber as suas not$cias e dar&lhe asminhas. Eu não gostava do senhor ?almont, e não supunha que ele"osse tão seu amigo( tentarei habituar&me a ele, e a gostar dele porsua causa. ão sei quem "oi que nos traiu.

ão pode ter sido senão a minha criada de quarto ou o meucon"essor. )ou muito in"eliz. 5artimos amanhã para o campo( não seipor quanto tempo. 7eu eus= ão mais o ver= ão haverá meio de oconseguir.

deus( tente ler este bilhete. Estas palavras escritas a lápis

virão talvez a apagar&se, mas nunca os sentimentos agravados nomeu coração.

CV de )etembro de CD .

CARTA LXX

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

 3enho uma revelação importante a "azer&lhe, minha queridaamiga.2ntem, ceava eu, como sabe, em casa da 7arechala de...,

quando se "alou da minha amiga, e aproveitei para dizer a seurespeito não todo o bem que penso, mas todo aquele que não penso.

 3oda a gente parecia ser da minha opinião, e a conversa iaa"rou#ando, como acontece sempre que se diz apenas bem dopr*#imo, quando se ergueu a voz de um contraditor: era 5révan.

6eus me de"enda6, disse ele levantando&se, 6de duvidar daseriedade de 7adame de 7erteuil= 7as ousaria crer que ela a devemais - sua ligeireza do que aos seus princ$pios. J talvez mais di"$cil

segui&la que agradar&lhe( e como, quando se corre atrás de umamulher, acontece sempre aparecerem outras no caminho, como, em

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suma, as outras podem valer tanto ou mais do que ela( uns sãodistra$dos por um gesto novo, outros desistem por cansaço( por issoela é talvez a mulher de 5aris que menos tenha tido de se de"ender.5or mim6, acrescentou ele Lencora'ado pelo sorriso de algumasmulheres1, 6não acreditarei na virtude de 7adame de 7erteuil senão

depois de ter rebentado seis cavalos a "azer&lhe a minha corte6.Este mau grace'o caiu bem, como todos os que se baseiam namaledic!ncia( e, enquanto duravam os risos que ele e#citou, 5révanretomou o seu lugar e a conversação geral mudou de rumo. 7as asduas 9ondessas de <..., 'unto das quais estava o nosso incrédulo,tiveram com ele uma conversa particular, que "elizmente estava aoalcance do meu ouvido.

5révan garantiu que despertaria a sua sensibilidade, minhaboa amiga, e o desa"io "oi aceito, com a sua palavra de contar tudo(e de todas as palavras que viriam a dar&se nessa aventura, essa seriaseguramente a mais religiosamente guardada. 7as agora está

prevenida, e conhece o provérbio.Gesta&me dizer&lhe que esse 5révan, que a 7arquesa não

conhece, é in"initamente amável, e ainda mais habilidoso. )e algumavez me ouvir dizer o contrário, "oi simplesmente porque não gostodele, porque me apraz diminuir os seus !#itos e por que não ignoro opeso da minha opinião 'unto de trinta, pelo menos, das mulheres damoda.

e "ato, mani"estando&me de tal modo, impedi&o por muitotempo de "azer "igura no que chamamos os grandes meios( podia"azer prod$gios: nem por isso aumentava a sua reputação.

7as o ru$do da sua tr$plice aventura, chamando as atenç+essobre ele, deu&lhe aquela con"iança que até então lhe "altava etornou&o verdadeiramente tem$vel. En"im, é ho'e, talvez, o únicohomem que eu recearia encontrar no meu caminho( - parte ointeresse que a minha amiga nisso possa ter, prestar&me&ia umverdadeiro serviço se o e#pusesse, de passagem, a qualquer rid$culo.

ei#o&o em boas mãos( e tenho a esperança de que no meuregresso será um homem liquidado.

5rometo&lhe, em troca, levar a bom "im a aventura da suapupila e ocupar&me dela tanto como da minha bela e virtuosa5residente.

Esta acaba de me enviar um pro'eto de capitulação. 3oda asua carta anuncia o dese'o de ser enganada. J imposs$vel o"erecerum meio mais c%modo e também mais usado. 0uer que eu se'a seuamigo. 7as eu, que gosto dos processos novos e di"$ceis, não queropossu$&la por tão bai#o preço( e seguramente não me obrigaria atanto trabalho com ela para terminar por uma vulgar sedução.

2 meu pro'eto, pelo contrário, é que ela sinta bempro"undamente o valor e a e#tensão de cada um dos sacri"$cios quevirá a "azer por mim( não a conduzirei tão rapidamente que nãopossa ser seguida pelo remorso( "azer e#pirar a sua virtude numalenta agonia( obrigá&la a ter sempre presente esse desolador

espetáculo( e não lhe conceder a "elicidade de me apertar nos seusbraços senão depois de a ter "orçado a não dissimular o dese'o. a

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verdade, valho muito pouco se não valho o es"orço de ser solicitado.E poderei dese'ar menor vingança de uma mulher altiva, que pareceenvergonhar&se de con"essar a sua adoração>

Gecusei pois a preciosa amizade e "i#ei&me "irmemente nomeu t$tulo de amante. 9omo não me iludo sobre esse t$tulo que,

parecendo - primeira vista uma disputa de palavras, é todavia deuma import8ncia real a obter, pus todos os cuidados na minha carta,e tratei de introduzir nela aquela desordem que constitui o únicomeio de descrever os sentimentos. ui, en"im, tão pouco razoávelquanto me "oi poss$vel( pois sem aus!ncia de racioc$nio não háternura( e creio que é por esta razão que as mulheres nos são a talponto superiores nas cartas de amor.

 3erminei a minha carta por um galanteio, e "i&lo ainda emresultado das minhas pro"undas observaç+es. 0uando o coração deuma mulher é posto - prova durante algum tempo, tem necessidadede repouso( e tenho observado que um galanteio constitui, para

todas, o travesseiro mais macio que lhes podemos o"erecer.deus, minha bela amiga. 5arto amanhã. )e tiver ordens a

dar&me pela 9ondessa de..., "arei paragem em casa dela, pelo menospara 'antar.

borrece&me ter de partir sem a ver. !&me parte das suassublimes instruç+es e a'ude&me com os seus sábios conselhos, nestemomento decisivo. )obretudo, de"enda&se de 5révan( e possa eu umdia recompensá&la por esse sacri"$cio=

deus.

CC de )etembro de CD .

CARTA LXXI

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

2 pateta do meu criado dei#ou a minha pasta em 5aris= scartas da minha bela, as de ancenP para a pequena ?olanges, tudolá "icou, e tenho precisão de tudo. 3ive de o mandar regressar, para

reparar a sua tolice( e enquanto ele sela o cavalo, vou contar&lhe aminha hist*ria desta noite: pois decerto não vai supor que perco omeu tempo.

aventura, em si mesma, é pouca coisa( trata&se apenas deum caldo requentado com a ?iscondessa de 7... 7as interessa pelospormenores. 5or outro lado sinto&me "eliz por lhe mostrar que, sepossuo o talento de perder as mulheres, não possuo menos, quandoquero, o de as salvar. 2 partido mais di"$cil, ou o mais alegre, ésempre o que eu tomo( e nunca tenho de me censurar por uma boaação, contanto que ela me ponha - prova ou me divirta.

eu&se pois o caso de encontrar aqui a ?iscondessa, e como

ela 'untava as suas inst8ncias -s que me "aziam para passar a noiteno castelo, disse&lhe: 6Está bem= 9onsinto, com a condição de a

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passar a seu lado.6 6Fsso é imposs$vel6, respondeu&me ela. 6?ressacestá aqui.6 té ali eu pensava que lhe "azia uma proposta honesta(mas aquela palavra 6imposs$vel6 revoltou&me, como de costume.)enti&me humilhado por ser sacri"icado a ?ressac e resolvi não osuportar. 3ive pois de insistir.

s circunst8ncias não me eram "avoráveis. Esse ?ressaccometeu a tolice de despertar suspeitas no ?isconde, de modo que a?iscondessa não pode receb!&lo em sua casa( e a visita de ambos -boa 9ondessa tinha sido combinada entre eles, de maneira aaproveitarem algumas noites. 2 ?isconde chegou até a mostrar&seaborrecido por ali encontrar ?ressac( mas como é ainda mais caçadordo que ciumento, nem por isso dei#ou de "icar. E a 9ondessa, sempreigual a si mesma La minha amiga conhece&a=1, depois de ter instaladoa mulher num quarto do corredor principal, p%s o marido de um ladoe o amante do outro, e dei#ou&os arran'arem as coisas entre si. másorte dos dois homens quis que eu "icasse instalado em "rente.

esse mesmo dia, quer dizer, ontem, ?ressac, que, comopode imaginar, estraga o ?isconde com mimos, "oi - caça com ele,apesar de pouco gostar de caçar, e esperava consolar&se - noite,entre os braços da mulher, do aborrecimento que o marido lhecausara todo o dia. Eu, porém, achei que ele teria necessidade derepouso, e procurei maneira de decidir a amante a dei#ar&lhe tempopara tal. 2btive o que pretendia e consegui que ela arran'asse umazanga com motivo naquela mesma caçada, - qual ele,evidentemente, se su'eitara por ela. ão poderia haver pior prete#to(mas nenhuma mulher tem, como a ?iscondessa, o talento, comum a

todas, de p%r no lugar da razão o mau humor, e de ser tanto maisdi"$cil de apaziguar quanto menos motivos tem de agravo. 2momento aliás não era c%modo para e#plicaç+es( e como eu s*pretendia uma noite, consenti que eles "izessem as pazes no diaseguinte.

?ressac teve pois de aturar - volta os arru"os da ?iscondessa.0uis saber o motivo, obteve ralhos. 3entou 'usti"icar&se( o

marido, que estava presente, serviu de prete#to para acabar aconversa. 5rocurou ainda aproveitar um momento em que o?isconde se ausentara para pedir audi!ncia noturna: "oi então que a?iscondessa atingiu o sublime. Fndignou&se contra a audácia dos

homens, que, s* porque p+em - prova a bondade de uma mulher, 'ulgam ter o direito de continuarem a abusar, mesmo quando ela temmotivos de quei#a( e tendo mudado de tese com esta habilidade,"alou tão bem de delicadeza e de sentimentos, que ?ressac "icoucon"uso e mudo. Eu pr*prio estive tentado a crer que ela tinha razão(pois deve supor que, como amigo de ambos, eu era testemunha dodiálogo.

5or "im, a ?iscondessa declarou que não acrescentaria as"adigas do amor -s da caça, para não ter de se censurar porperturbar tão doces prazeres. 2 marido voltou. 2 desolado ?ressac,que 'á não tinha liberdade de responder, dirigiu&se a mim( e depois

de por muito tempo me ter contado as suas raz+es, que eu conheciatão bem como ele, pediu&me que "alasse - ?iscondessa, e eu

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prometi&lho. e "ato, "alei&lhe( mas "oi para lhe agradecer, ecombinar com ela a hora e a maneira de nos encontrarmos.

isse&me ela que, instalada entre o marido e o amante,achara mais prudente ir ao encontro de ?ressac do que receb!&lo noseu quarto( e, 'á que eu estava instalado em "rente dela, 'ulgava

mais seguro também vir ao meu encontro. ?iria assim que a criadade quarto a dei#asse s*( eu s* tinha de dei#ar a porta entreaberta eesperá&la.

 3udo se e#ecutou como t$nhamos combinado( pela uma horada madrugada chegou ela ao meu quarto.

Kune beauté quKon vient dKarracher au sommeil.9omo não sou vaidoso, não lhe descreverei os pormenores da

noite( mas a 7arquesa conhece&me, e eu "iquei satis"eito comigo.o raiar do dia, "oi necessário separarmo&nos. qui começa a

coisa a ser interessante. estouvada 'ulgou que tinha dei#adoentreaberta a porta do seu quarto( encontrámo&la "echada, e a chave

tinha "icado do lado de dentro. ão "az idéia da e#pressão dedesespero com que a ?iscondessa me disse então: 6h= Estouperdida=6 J preciso convir que teria sido divertido dei#á&la naquelasituação( mas podia eu suportar que uma mulher "icasse perdidapara mim, sem o ser por mim> E devia eu, como o comum doshomens, dei#ar&me dominar pelas circunst8ncias>

Era preciso pois encontrar um meio. 0ue teria "eito a minhabela amiga> Eis o partido que tomei, e que resultou com !#ito.

epressa veri"iquei que a porta em questão podia serarrombada, desde que se pudesse "azer muito barulho. 9onsegui pois

da ?iscondessa, não sem custo, que ela soltasse gritos agudos deterror, como cudam= um ladrão= um assassino= etc. E combinamosque, ao primeiro grito, eu arrombaria a porta, e ela correria a meter&se na cama. ão pode imaginar o tempo que "oi preciso para adecidir, mesmo depois de ela ter consentido.

o entanto, acabou&se por cumprir o combinado, e aoprimeiro pontapé a porta cedeu. ?iscondessa "ez bem em nãoperder tempo, pois no mesmo instante o ?isconde e ?ressacapareceram no corredor, e a criada de quarto acorreu também aoquarto da senhora. )* eu mantinha o sangue&"rio, e aproveitei acircunst8ncia para ir apagar uma lamparina que estava ainda acesa e

derrubá&la por terra( pois "az bem idéia quanto seria rid$culo "ingiraquele terror p8nico, tendo luz no quarto. Em seguida repreendi omarido e o amante pelo seu sono letárgico e dei&lhes a certeza deque os gritos a que eu tinha acudido e os meus es"orços paraarrombar a porta tinham durado pelo menos cinco minutos. ?iscondessa, que recuperara a coragem logo que se meteu na cama,

 'urava com a má#ima sinceridade que nunca tivera tanto medo nasua vida. 5rocurávamos por toda a parte sem nada encontrar,quando "iz notar a lamparina derrubada, e conclu$ que, sem dúvida,um rato tinha causado o dano e o terror( a minha opinião "oi *&omuma bele6a dos que acabam de despertar !" do :2

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aprovada por unanimidade e, depois de alguns grace'os - custa dosratos, o ?isconde "oi o primeiro a ir&se deitar, pedindo - esposa quede "uturo tivesse ratos mais sossegados.

?ressac, "icando s* conosco, apro#imou&se da ?iscondessapara lhe dizer ternamente que era uma vingança do amor, ao que ela

respondeu olhando&me: 6esse caso o amor devia estar muitozangado, pois se vingou cruelmente( mas6, acrescentou ela, 6estoucheia de "adiga e quero dormir.6

Eu estava num momento de bondade( em conseqS!ncia,antes de nos separarmos, advoguei a causa de ?ressac e preparei areconciliação. 2s dois amantes bei'aram&se e, por minha vez, "uibei'ado por ambos. 2s bei'os da ?iscondessa dei#aram&meindi"erente( mas con"esso que o de ?ressac me deu prazer. )a$mos

 'untos( e depois de ter recebido os seus prolongadosagradecimentos, cada um de n*s "oi&se meter na cama.

)e achar que esta hist*ria é engraçada, não lhe peço que

guarde segredo. gora que 'á me diverti, é 'usto que o público tenhaa sua vez. este momento "alo&lhe s* da hist*ria( talvez dentro empouco tenhamos de. "alar da sua hero$na.

deus( há uma hora que o meu criado está - minha espera. 3omo apenas o tempo para lhe mandar um abraço, e lhe recomendarsobretudo que tenha cuidado com 5révan.

o 9astelo de...,CB de )etembro de CD .

CARTA LXXII

O CAVALEIRO DANCENY A CECÍLIA VOLANGES

LEntregue somente em CI1

N minha 9ec$lia= como inve'o a sorte de ?almont= manhã elev!&la&á. J ele quem lhe entregará esta carta( e eu, longe de si,entregue -s minhas mágoas, arrastarei a minha penosa e#ist!nciaentre as saudades e a dor.

7inha amiga, minha terna amiga, lastime&me pelos meusmales( lastimo&me sobretudo pelos seus( é contra estes que acoragem me abandona.

0uanto me é penoso causar a sua in"elicidade= )em mim seria"eliz e tranqSila. 5erdoa&me> iga= h= iga que me perdoa( diga&metambém que me tem amor, que há de amar&me sempre. )intonecessidade que mo repita. ão é que eu duvide( mas parece&meque quanto mais se tem essa certeza mais doce é ouvi&lo dizer. ma&me, não é verdade> )im, ama&me com toda a sua alma. ão esqueçoque "oi a última palavra que lhe ouvi pronunciar. 9omo a recolhi nomeu coração= 9omo ela se gravou ali pro"undamente= E com que

transportes o meu lhe corresponde=

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i= esse momento de "elicidade, estava eu longe de prever asorte horrorosa que nos esperava. 2cupemo&nos, minha 9ec$lia, dosmeios para a suavizar. crer no meu amigo, bastará, para que oconsigamos, que a 9ec$lia deposite nele a con"iança que merece.

iquei contristado, con"esso&o, com a idéia pouco vanta'osa

que parece ter a seu respeito. Geconheço a$ as prevenç+es da sua7amã: "oi para me submeter a elas que descuidei, durante algumtempo, a sociedade desse homem verdadeiramente amável, queho'e tudo "ará por mim( que, en"im, trabalha para nos reunir, quandoa sua 7amã nos separou. 5eço&lhe, querida amiga, ve'a&o com olhosmais "avoráveis. 5ense que ele é meu amigo, que o quer ser seu, quepode proporcionar&me a "elicidade de voltar a v!&la. )e estas raz+esa não convencem, minha 9ec$lia, é porque me não ama tanto comoeu a amo, é porque me não ama tanto quanto amou 'á.

h= )e alguma vez vier a ter&me menos amor... 7as não, ocoração da minha 9ec$lia pertence&me( é meu por toda a vida( e se

eu tenho a temer as penas dum amor in"eliz, a sua const8ncia pelomenos me salvará dos tormentos dum amor tra$do.

deus, minha encantadora amiga( não esqueça que eu so"ro,e que s* a si cabe tornar&me "eliz, per"eitamente "eliz. Escute osvotos do meu coração, e receba os mais ternos bei'os de amor.

5aris, CC de )etembro de CD .

CARTA LXXIIIO VISCONDE DE VALMONT A CECÍLIA VOLANGES

L4unta - precedente1

2 amigo que a serve soube que lhe "altava tudo que énecessário para escrever e remediou essa "alta. Encontrará naantec8mara do aposento que ocupa, debai#o do grande armário -esquerda, uma provisão de papel, de penas e de tinta, que elerenovará quando quiser e que lhe parece poder "icar no mesmo lugar

se não encontrar outro mais seguro.Esse amigo pede&lhe que não se o"enda, se simular que nãolhe dá nenhuma atenção nas reuni+es e que a olha como umacriança. 3al procedimento parece&lhe necessário para inspirar asegurança de que ele precisa e poder trabalhar mais e"icazmente na"elicidade do seu amigo e na sua. 5rocurará suscitar as ocasi+es delhe "alar, quando tiver alguma coisa a comunicar&lhe ou a entregar&lhe( e espera consegui&lo, se a menina tiver o cuidado de o secundar.

conselha&a também a entregar&lhe as cartas - medida que as"or recebendo, a "im de a arriscar menos a comprometer&se.

 3ermina por lhe dar a certeza de que, se quiser depositar nele

con"iança, porá os seus cuidados em suavizar a perseguição que umamãe demasiado cruel "az so"rer a duas pessoas, das quais uma é 'á o

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seu melhor amigo, e a outra lhe parece merecer o mais ternointeresse.

o 9astelo de..., CI de )etembro de CD .

CARTA LXXIV

A MARQUESA DE MERTEUIL AO VISCONDE DE VALMONT

esde quando, meu amigo, se assusta tão "acilmente> Esse5révan é assim tão tem$vel> ?e'a como eu sou simples e modesta=

 3enho&o encontrado muitas vezes, a esse soberbo vencedor( e mal otenho olhado=

altava s* a sua carta para que eu lhe desse atenção. Geparei

ontem a minha in'ustiça. Ele estava na Npera, quase na minha"rente, e entretive&me com ele. J bonito ao menos, mesmo muitobonito( que traços "inos e delicados= eve ganhar em ser visto deperto. E diz o ?isconde que ele me quer possuir=

)eguramente "ar&me&á honra e prazer. alando sério, tenhoessa "antasia, e con"io&lhe aqui que dei para isso os primeiros passos.

ão sei se terão !#ito. 5asso a narrar&lhe o caso.Ele estava a dois passos de mim, - sa$da da Npera, e eu

marquei encontro, em voz alta, - 7arquesa de... para cear se#ta&"eira em casa da 7arechala. J, segundo creio, o único lugar onde

posso encontrá&lo. ão duvido de que ele me tenha ouvido...E se esse ingrato lá não "osse> iga&me: acha que ele irá>)aiba que, se não "or, "icarei aborrecida toda a noite. <em v!

que ele não terá assim tanta di"iculdade em seguir&me( e o ?iscondevai admirar&se mais quando souber que terá ainda menos di"iculdadeem agradar&me. Ele quer, segundo diz, rebentar seis cavalos a "azer&me a sua corte=

2h= eu salvarei a vida a esses cavalos. unca eu teria apaci!ncia de esperar tanto tempo. 2 ?isconde sabe que não está nosmeus princ$pios "azer so"rer quando me decido por alguém, e averdade é que me decidi por ele. 2h= convenha, ?isconde, que sentiu

prazer em me pregar um sermão= sua revelação importante nãoteve um grande !#ito> 0ue quer o ?isconde= Aá tanto tempo que euvegeto= Aá mais de seis semanas que não me permito uma aventura.presenta&se&me esta( posso recusá&la> pessoa não vale a pena>

Aaverá alguém mais agradável, em qualquer sentido quetome a palavra.

2 pr*prio ?isconde é obrigado a "azer&lhe 'ustiça( "az mais queelogiá&lo, tem ciúmes dele. 5ois bem= serei eu o 'uiz entre ambos.7as primeiro é preciso tomar conhecimento da causa, e é o quedese'o "azer. )erei 'uiz $ntegro, e ambos serão pesados na mesmabalança. 0uanto ao ?isconde, tenho 'á as suas mem*rias, e a sua

causa está per"eitamente instru$da. ão será 'usto que me ocupeagora do seu adversário> ?amos, preste&se de bom grado - 'ustiça(

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e, para começar, conte&me, peço&lhe, essa tr$plice aventura de queele "oi her*i. ala&me disso como se eu não conhecesse outra coisa, enão sei uma palavra a tal respeito.

2 caso deve ter&se passado durante a minha viagem aenebra, e o seu ciúme t!&lo&á impedido de mo contar. Gepare esta

"alta o mais cedo poss$vel( pense que nada do que lhe diz respeitome é indi"erente. 9reio bem que se "alava ainda no assunto quandoregressei( mas eu tinha outros motivos de preocupação, e raramentedou ouvidos a coisas desse g!nero quando não são do pr*prio dia ouda véspera.

7esmo que o contrarie um pouco o que lhe peço, não seráesse o menor preço que o ?isconde deve aos cuidados que por suacausa tenho tido> ão "oram esses cuidados que o apro#imaram dasua 5residente, quando as suas tolices o tinham a"astado dela> ão"ui ainda eu que pus nas suas mãos o meio de se vingar do amargozelo de 7adame de ?olanges> 3antas vezes o ?isconde lamentou o

tempo que perdia a procurar aventuras=5resentemente, tem&nas - mão. 2 amor, o *dio, s* tem o

trabalho de escolher, tudo está debai#o do mesmo teto. E pode até,"azendo e#ist!ncia dupla, a"agar com uma das mãos e "erir com aoutra.

sua aventura com a ?iscondessa é ainda a mim que a deve.eu&me muita satis"ação( mas, como o ?isconde diz, é preciso

que se "ale no caso( pois se a ocasião "oi de molde a que pre"erisse omistério ao ru$do, e compreendo que assim "osse, devemos noentanto convir que essa mulher não merecia um procedimento tão

honesto.lém do mais, tenho motivos de quei#a de tal criatura. 29avaleiro de <elleroche acha&a mais bonita do que eu dese'aria( e,por muitas raz+es, "icaria bem contente se tivesse um prete#to pararomper com ela. 2ra não há nada mais c%modo do que poder dizer:64á ninguém recebe essa mulher.6

deus ?isconde( pense que, no lugar onde está, o tempo éprecioso( vou empregar o meu a ocupar&me da "elicidade de 5révan.

5aris, CO de )etembro de CD .

CARTA LXXV

CECÍLIA VOLANGES A SOFIA CARNAY 

Está aqui uma boa amiga da 7amã, que eu não conhecia, queparece também não gostar muito do senhor de ?almont, embora eletenha muitas atenç+es para ela. 3enho receio que ele se aborreçadepressa da vida que levamos aqui e que regresse a 5aris( isso serialamentável. eve ter muito bom coração para ter vindo

e#pressamente a "im de prestar um serviço ao seu amigo e a mim=<em dese'aria testemunhar&lhe o meu reconhecimento, mas não sei

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como "azer para "alar( e mesmo que achasse ocasião para isso,"icaria tão envergonhada que não saberia que dizer&lhe.

J s* com 7adame de 7erteuil que eu "alo livremente, quando"alo do meu amor. 3alvez mesmo contigo, a quem digo tudo, eu"icasse envergonhada, se "osse a conversarmos. 9om o pr*prio

ancenP tenho muitas vezes sentido, contra minha vontade, certoreceio que me impedia de dizer tudo o que pensava.Estou bem arrependida agora, e daria tudo para encontrar o

momento de lhe dizer uma vez, uma única vez, quanto o amo...2 senhor de ?almont prometeu&lhe que, se eu me dei#asse

conduzir, arran'aria maneira de nos tornarmos a ver. Eu "arei tudo oque ele quiser( mas não posso conceber que tal se'a poss$vel.

deus, minha boa amiga, não posso escrever mais.

o castelo de...,CI de )etembro de CD .

"ota % "esta carta, &ecília olanges narra com muitos pormenores tudo o que lhedi6 respeito nos acontecimentos que o leitor conhece do +im da $rimeira $arte,&arta 04 e seguintes ulgou%se oportuno suprimir essa repetição $or +im, +ala doisconde de almont, e e(prime%se do seguinte modo< #+irmo%te que é um homem e(traordinário # )amã di6 muito mal dele; mas o&avaleiro Dancen9 di6 muito bem, e creio que é ele quem tem ra6ão "unca vihomem mais e(pedito =uando me entregou a carta de Dancen9, estava muitagente e ninguém viu nada certo que tive bastante medo porque não tinha sido prevenida; mas agora estou sempre 8 espera á compreendi muito bem o que elequer que eu +aça para lhe entregar a resposta > muito +ácil entendermo%nos comele, pois tem um olhar que di6 tudo o que ele quer "ão sei o que ele +a6 para isso<

di6ia%me no bilhete de que te +alei que diante da )amã +ingira sempre não meligar import?ncia "a verdade, dir%se%ia que não pensa nisso; mas todas as ve6esque procuro os seus olhos, estou certa de encontrá%los imediatamente*/endo )ademoiselle de olanges, pouco tempo depois, mudado de con+idente,como se verá pela continuação destas cartas, não virá a encontrar%se nestacoleção nenhuma das que continuou a escrever 8 sua amiga do convento, poisnada revelariam ao leitor

CARTA LXXVI

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

2u a sua carta é um grace'o, que não cheguei a compreender,ou estava, quando ma escreveu, num del$rio muito perigoso.

)e eu a conhecesse menos, minha bela amiga, "icariaverdadeiramente horrorizado( e se'a o que "or que possa dizer, nãome horrorizo "acilmente.

ebalde li e reli a sua carta, não "iquei mais adiantado( poisnão há maneira de a tomar no sentido natural que ela apresenta.

0ue quis a minha amiga dizer> penas que era inútil tertantos cuidados contra um inimigo tão pouco tem$vel> 7as, nessecaso, pode não ter razão. 5révan é realmente amável( é&o mais aindado que sup+e. 3em sobretudo o talento deveras útil de interessar

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muita gente nas suas relaç+es amorosas, pela habilidade quedesenvolve ao "alar sobre tal assunto em sociedade, diante de toda agente, servindo&se da primeira conversação que topa a 'eito. 5oucasmulheres há que se salvem da armadilha de lhe dar réplica, vistoque, tendo todas pretens+es de intelig!ncia, nenhuma quer perder

ocasião de a mostrar. 2ra, sabe muito bem a minha amiga que todaa mulher que consente em "alar de amor, cedo acaba por tomarparte nele, ou pelo menos por se conduzir como se o sentisse. 5révantira ainda vantagens do processo, que ele realmente aper"eiçoou, dechamar "requentemente as pr*prias mulheres em testemunho dasderrotas que lhes in"lige. E "alo&lhe disto porque o presenciei.

2 segredo veio até mim em segunda mão, pois nunca estiveligado a 5révan( éramos por "im seis a escutá&lo: a 9ondessa de 5...,

 'ulgando&se muito inteligente, tomou os ares de quem sustenta umaconversação geral e "oi contando aos que nada sabiam, até aosm$nimos pormenores, de como se tinha entregado a 5révan e tudo o

que se passara entre ambos. azia a narração com tal segurança,que nem se sentiu perturbada por um riso louco que nos tomou osseis ao mesmo tempo( e hei&de recordar&me sempre de que, a um den*s que, para se desculpar, quis "ingir que não acreditava no que eladizia, ou antes, no que ela parecia querer dizer, respondeu elagravemente que com certeza nenhum de n*s estava tão bemin"ormado como ela( e não receou mesmo dirigir&se a 5révan, paralhe perguntar se tinha enganado numa s* palavra.

5ude então considerar aquele homem perigoso para toda agente( mas para si, 7arquesa, não bastava que ele "osse bonito,

muito bonito, con"orme as suas pr*prias palavras> 2u que ele lhe"izesse um desses ataques que lhe agrada algumas vezesrecompensar, sem outro motivo do que achá&los bem "eitos> 2u queachasse agradável entregar&se por uma razão qualquer>

2u... que sei eu> 5osso porventura adivinhar os mil e umcaprichos que governam a cabeça de uma mulher, que s* por si aligam ao seu se#o>

gora que está prevenida do perigo, não duvido que se livrarádele "acilmente: todavia era necessário preveni&la.

?olto ao meu assunto: que quis dizer na sua carta>)e é apenas um grace'o sobre 5révan, além de ser demasiado

longo, não era a mim que devia dirigi&lo, por inútil( é - sociedade quese deve o"erecer um bom motivo de rid$culo para esse homem, erenovo&lhe o meu pedido a tal respeito.

h= 4ulgo ter encontrado a chave do enigma= sua carta éuma pro"ecia, não do que virá a "azer, mas do que ele a 'ulgarápronta a "azer no momento da queda que lhe prepara. provo essepro'eto( no entanto, ele e#ige grandes preparativos. minha amigasabe tão bem como eu que, para a opinião pública, ceder a umhomem ou aceitar&lhe a corte é absolutamente a mesma coisa, amenos que esse homem se'a um tolo( e 5révan está muito longe de oser. )e ele tiver as apar!ncias a seu "avor, irá gabar&se, e está tudo

dito. 2s tolos acreditarão nele, os maus "ingirão que acreditam( quaisserão então, 7arquesa, os seus recursos> 9reia, tenho medo. ão é

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que eu duvide da sua habilidade( mas são os bons nadadores que sea"ogam.

Eu não me 'ulgo mais estúpido que qualquer outro= 0uanto ameios de desonrar uma mulher, tenho encontrado cem, tenhoencontrado mil: mas quando procuro a maneira de ela se salvar,

nunca ve'o tal possibilidade. 7esmo na minha bela amiga, cu'aconduta é uma obra&prima, cem vezes tenho eu 'ulgado ver maissorte do que simulação per"eita.

7as no "im de tudo, estou talvez a procurar uma razão ao quenão e#iste. dmiro como, há uma boa hora, eu trato com seriedade oque não passa, com certeza, de uma brincadeira da sua parte. ?aitroçar de mim=

5ois se'a= )e'a( mas apresse&se, e "alemos de outra coisa. eoutra coisa= Engano&me, é sempre a mesma( sempre mulheres apossuir ou a perder, e muitas vezes ambas as coisas.

9omo a minha amiga muito bem notou, tenho aqui com que

me entreter nos dois g!neros, mas não com a mesma "acilidade.5reve'o que a vingança irá mais depressa do que o amor. pequena ?olanges está rendida, respondo por ela( depende

apenas da ocasião, e encarrego&me de "azer que ela apareça. 7ascom 7adame de 3ourvel não é a mesma coisa: esta mulher édesoladora, não chego a compreend!&la. 3enho cem provas do seuamor, mas tenho mil da sua resist!ncia( e, na verdade, receio que elame escape.

2 primeiro e"eito produzido pelo meu regresso animou&me aesperar maiores vantagens. Fmagina decerto que era meu intuito

 'ulgar por mim pr*prio( e para ter a certeza de apreciar os primeirosmovimentos, não mandei ninguém - minha "rente e calculei o tempode viagem de modo a chegar quando estivessem - mesa. e "ato, ca$do céu, como uma divindade de *pera que prepara o desenlace.azendo ao entrar bastante ru$do, para "i#ar os olhares sobre mim,pude ver num s* golpe de vista a alegria da minha velha tia, odespeito de 7adame de ?olanges e o prazer desmedido de sua "ilha. minha bela, pelo lugar que tinha - mesa, estava de costas para aporta. 2cupada nesse momento a servir&se de qualquer coisa, nemsequer voltou a cabeça. 7as eu dirigi a palavra a 7adame deGosemonde( e, tendo reconhecido a minha voz -s primeiras palavras,

um grito escapou - sens$vel devota, no qual 'ulguei reconhecer maisamor do que surpresa ou susto. Eu avançara 'á o bastante parapoder ver o seu rosto: nele se espelharam, de vinte maneirasdi"erentes, o tumulto da sua alma, a luta das suas idéias e dos seussentimentos.

)entei&me - mesa ao lado dela( "icou sem saberpositivamente o que havia de "azer ou de dizer. 3entou continuar acomer( não houve maneira.

5or "im, não tinha ainda passado um quarto de hora,tornando&se mais "ortes do que ela o seu embaraço e o seu prazer,não imaginou nada melhor do que pedir licença para se levantar, e

saiu para o parque, sob o prete#to de ter necessidade de tomar ar.7adame de ?olanges quis acompanhá&la( a terna hip*crita não lho

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permitiu( demasiado "eliz, sem dúvida, por encontrar um prete#topara estar s* e se entregar livremente -s doces emoç+es quee#perimentara.

breviei o 'antar o melhor que me "oi poss$vel. 7al tinhamservido a sobremesa, a in"ernal ?olanges, apressando&se sem dúvida

a tirar&me qualquer vantagem, levantou&se do seu lugar para ir aoencontro da encantadora doente( mas eu tinha previsto esse pro'etoe pre'udiquei&o. ingi pois tomar esse movimento isolado pelomovimento geral, e, tendo&me levantado ao mesmo tempo, apequena ?olanges e o cura dei#aram&se levar por esse duploe#emplo( de maneira que 7adame de Gosemonde se encontrou s* -mesa com o velho comentador de 3..., e ambos tomaram também opartido de se levantar. omos pois todos 'untar&nos - minha bela,que encontramos no pequeno bosque perto do castelo( e como elanecessitava de solidão e não de passeio, tanto valeu para elaregressar conosco como "azer&nos "icar 'unto dela.

0uando tive a certeza de que 7adame de ?olanges não teriaocasião de lhe "alar a s*s, pensei em e#ecutar as suas ordens eocupei&me dos interesses da sua pupila. @ogo ap*s o ca"é, subi aomeu quarto, e entrei também nos dos outros, para reconhecer oterreno( tomei as minhas disposiç+es para assegurar acorrespond!ncia da pequena( depois desse primeiro ato debenemer!ncia, escrevi uma palavra para lhe dar instruç+es e lhepedir a sua con"iança e 'untei o meu bilhete - carta de ancenP.

?oltei ao salão. $ encontrei a minha bela instalada numacadeira de encosto num abandono delicioso.

Este espetáculo, - medida que despertava os meus dese'os,animava os meus olhares( senti que estes deviam ser ternos einsistentes, e coloquei&me de maneira a "azer uso deles. 2 primeiroe"eito conseguido "oi o de obrigar os grandes olhos modestos daceleste criatura a bai#arem&se.

9ontemplei por algum tempo essa "igura angélica( depois,percorrendo toda a sua pessoa, diverti&me a adivinhar os contornos eas "ormas através de um vestuário ligeiro, mas sempre importuno.epois de ter descido da cabeça aos pés, tornei a subir dos pés -cabeça... 7inha bela amiga, o doce olhar estava "i#o em mim( derepente bai#ou de novo, e eu desviei os olhos, a "im de "avorecer o

regresso dos seus. Então estabeleceu&se entre n*s aquelaconversação tácita, primeiro tratado do amor t$mido, que, parasatis"azer o dese'o mútuo da vista, permite aos olhares sucederem&se esperando que se con"undam.

5ersuadido de que a minha bela se entregara inteiramente aesse novo prazer, encarreguei&me de velar pela nossa comumsegurança( mas, convencendo&me de que um diálogo vivo nossalvaria de sermos notados pelos que nos rodeavam, tratei de obterdos seus olhos que "alassem uma linguagem "ranca. 5ara esse e"eitotomei primeiro alguns olhares de surpresa, mas com tanta reservaque a modéstia não poderia "icar alarmada( e para p%r mais -

vontade a t$mida pessoa, eu pr*prio a"etei tácita con"usão como ela.5ouco a pouco os nossos olhos, acostumados a encontrarem&se,

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"i#aram&se mais longamente( por "im não se dei#aram mais( esurpreendi nos seus olhos aquela doce languidez, sinal "eliz do amore do dese'o. 7as "oi apenas por um momento( depressa voltando asi, mudou, não sem alguma vergonha, a posição e o olhar.

ão querendo que ela tivesse alguma dúvida de que eu

houvesse notado os seus diversos movimentos, levantei&me comvivacidade e perguntei&lhe, "ingindo&me assustado, se se sentia mal.esse momento toda a gente veio rodeá&la. ei#ei que todospassassem - minha "rente( e como a pequena ?olanges, que teciaum tapete perto da 'anela, levasse algum tempo a desembaraçar&sedo trabalho, aproveitei a ocasião para lhe entregar a carta deancenP. Eu estava um pouco a"astado dela, lancei&lhe a ep$stolasobre os 'oelhos. Ela "icou sem saber que "azer.

minha amiga teria rido do seu ar de surpresa e embaraço(todavia eu não ri, temendo que tanta "alta de 'eito acabasse por nostrair. 7as um olhar e um gesto imperiosos "izeram&lhe en"im

compreender que era preciso guardar a carta no bolso.2 resto do dia não teve nada de interessante. 2 que depois se

passou dará talvez lugar a acontecimentos de que a minha amiga"icará satis"eita, pelo menos no que diz respeito - sua pupila( masvale mais empregar o tempo a e#ecutar pro'etos do que a contá&los.lém disso, é esta a oitava página que escrevo, e sinto&me "atigado.5or isso lhe digo adeus.

divinha decerto, sem que eu lho diga, que a pequenarespondeu a ancenP. Eu tive também resposta da minha bela, aquem escrevera no dia seguinte ao da minha chegada. Envio&lhe as

duas cartas. @eia&as ou não as leia( pois essa perpétua maçada, que 'á não me diverte muito, deve ser muito ins$pida para qualquerpessoa desinteressada.

inda uma vez, adeus. 9ontinuo a amá&la sempre( mas, peço&lhe, se voltar a "alar&me de 5révan, "aça&o de maneira que euentenda.

o 9astelo de...,CD de )etembro de CD .

CARTA LXXVII

O VISCONDE DE VALMONT À PRESIDENTE DE TOURVEL

e onde poderá vir, senhora, o empenho cruel que mostraisem "ugir&me> 9omo pode dar&se que a mais terna dedicação daminha parte obtenha da vossa um procedimento que apenas seriapermitido para o homem de quem tivésseis os maiores motivos dequei#a> 5ois qu!> 2 amor conduz&me a vossos pés( e, quando um"eliz acaso me coloca a vosso lado, apraz&vos "ingir uma indisposição,alarmar os vossos amigos, em vez de consentirdes em "icar ao pé de

mim = 0uantas vezes desviastes ontem os olhos para me privar do"avor de um olhar> E se pude ver neles menos severidade por um

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único instante, esse momento "oi tão curto que parece ter sidomenos vosso intuito dar&me algum prazer do que "azer&me sentir oque eu perdia em ser dele privado.

ão é esse, ouso diz!&lo, nem o tratamento que merece oamor, nem o que pode permitir&se a amizade( e todavia, desses dois

sentimentos, bem sabeis se um deles me anima, e eu estava, parece&me, autorizado a supor que não vos recusar$eis ao outro.Essa amizade preciosa, da qual sem dúvida me 'ulgastes

digno, visto que ma quisestes o"erecer, que "iz eu para a ter perdidodepois> 3er&me&ei pre'udicado pela minha con"iança, e ter&me&eispunido pela minha "ranqueza> ão receais ao menos abusar de umae de outra> ão "oi, verdadeiramente, no seio da minha amiga queeu depus o segredo do meu coração> ão "oi perante ela s* que eupude 'ulgar&me obrigado a recusar condiç+es que me bastariaaceitar, para me dar a "acilidade de não as manter, e talvez paradelas abusar com vantagem> 0uerereis, en"im, por um rigor tão

pouco merecido, obrigar&me a supor que teria sido su"icienteenganar&vos para obter mais indulg!ncia>

ão me arrependo de um procedimento que vos devia, quedevia a mim pr*prio( mas por que "atalidade cada ação louvável setorna para mim o sinal de uma nova in"elicidade>

oi depois de ter dado lugar ao único elogio que vos dignastesainda "azer ao meu procedimento que tive, pela primeira vez, degemer pela desgraça de vos ter desagradado. oi depois de vos terprovado a minha submissão per"eita, privando&me da "elicidade devos ver, unicamente para tranqSilizar a vossa delicadeza, que

quisestes romper toda a correspond!ncia comigo, tirar&me essa "rágilcompensação de um sacri"$cio que hav$eis e#igido, e arrebatar&meaté o amor que unicamente vos poderia dar tal direito. J en"im porvos ter "alado com uma sinceridade que o pr*prio interesse desseamor não p%de en"raquecer, que ho'e me "ugis como a um sedutorperigoso, de que tivésseis reconhecido a per"$dia.

ão vos cansareis nunca de ser in'usta> izei&me ao menosque novos motivos de agravo puderam levar&vos a tanta severidadee não recuseis ditar&me as ordens que quereis que eu siga( pois queme comprometo a e#ecutá&las, não é pretender demasiado procurarconhec!&las.

CO de )etembro de CD .

CARTA LXXVIII

A PRESIDENTE DE TOURVEL AO VISCONDE DE VALMONT

5areceis, senhor, surpreendido pela minha conduta, e pouco"alta mesmo para me pedirdes contas, como se tivésseis o direito de

censurá&la.

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9on"esso que me 'ulgaria mais autorizada do que v*s aadmirar&me e a quei#ar&me( mas, depois da recusa contida na vossaúltima carta, tomei o partido de me "echar numa indi"erença que nãodei#a lugar -s observaç+es nem -s censuras.

Entretanto, como me pedis esclarecimentos, e como, graças

ao 9éu, não sinto nada em mim que possa impedir&me de os dar,dese'o entrar ainda uma vez em e#plicaç+es convosco.0uem lesse as vossas cartas 'ulgar&me&ia in'usta ou

caprichosa. 4ulgo merecer que ninguém "orme essa idéia de mim( parece&

me sobretudo que, menos do que ninguém, este'ais no caso de a"ormar.

)entistes, sem dúvida, que necessitando 'usti"icar&me me"orçar$eis a recordar tudo o que se passou entre n*s. parentementesupusestes que ter$eis tudo a ganhar com esse e#ame( como, pelomeu lado, 'ulgo não ter nada a perder, pelo menos aos vossos olhos,

não receio su'eitar&me a ele. 3alvez se'a esse, na verdade, o único meio de conhecer qual

de n*s dois tem o direito de se quei#ar do outro. contar do dia da vossa chegada a este castelo, devereis

con"essar, senhor, segundo creio, que pelo menos a vossa reputaçãome autoriza a usar de alguma reserva convosco, e que eu teriapodido, sem recear ser acusada de um e#cesso de pudor, manter&menas e#press+es da mais "ria delicadeza. ?*s pr*prio me ter$eistratado com indulg!ncia, e ter$eis achado natural que, uma mulhertão pouco "ormada não tivesse mesmo o mérito necessário para

apreciar o vosso. Era esse precisamente o partido da prud!ncia( eter&me&ia custado tanto menos segui&lo, que não vos esconderei que,quando 7adame de Gosemonde me veio dar parte da vossachegada, tive necessidade de recordar a minha amizade por ela, e aque ela tem por v*s, para não lhe dei#ar ver quanto essa not$cia mecontrariava.

9onvenho de vontade que vos mostrastes primeiramente sobum aspecto mais "avorável do que eu tinha imaginado( mas convireispor vosso lado que esse aspecto durou bem pouco e que depressavos cansastes de uma obrigação, de que aparentemente vos não

 'ulgastes compensado pela idéia vanta'osa que por ela "ormei a

vosso respeito.oi então que, abusando da minha boa "é, da minhatranqSilidade, não receastes comunicar&me um sentimento do qualnão poder$eis duvidar que eu me sentisse o"endida( e, enquanto nãovos ocupáveis senão de aumentar os vossos agravos, eu procuravaum motivo para os esquecer, o"erecendo&vos a ocasião para osreparardes, pelo menos em parte. 2 meu pedido era arvorando aminha indulg!ncia como um direito, aproveitastes dela para umpedido ao qual, sem dúvida, eu não deveria aceder, e cu'a permissãotodavia obtivestes. as condiç+es que "oram impostas, nãocumpristes nenhuma( e a vossa correspond!ncia era tal que cada

uma das vossas cartas me punha no dever de não lhe responder. oino pr*prio momento em que a vossa obstinação me "orçava a

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a"astar&vos de mim que, por uma condescend!ncia talvezcensurável, tentei o único meio que podia permitir&me a vossaapro#imação( mas que valor tem aos vossos olhos um sentimentohonesto> esprezais a amizade( e, na vossa louca embriaguez,desdenhando por completo a desgraça e a vergonha, procurais

apenas prazeres e v$timas. 3ão ligeiro no vosso procedimento como inconseqSente nasvossas censuras, esqueceis as promessas, ou antes, comprazeis&vosem violá&las, e, depois de terdes consentido em a"astar&vos de mim,voltais aqui sem que "%sseis chamado( sem respeito pelas minhassúplicas, pelas minhas raz+es, sem terdes mesmo a atenção de meprevenir, não tivestes receio de me e#por a uma surpresa cu'o e"eito,embora decerto bem natural, teria podido ser interpretadodes"avoravelmente para mim, pelas pessoas que me rodeiam. Essemomento de con"usão que "izestes nascer, longe de procurar distra$&lo ou dissimulá&lo, parecestes p%r todos os vossos cuidados em

aumentá&lo. H mesa, escolhestes precisamente o vosso lugar ao ladodo meu( uma ligeira indisposição obrigou&me a sair antes dos outros:em lugar de respeitardes a minha solidão, arrastastes toda a gente avir perturbá&la.

?oltando ao salão, se dou um passo( encontro&vos a meu lado(se digo uma palavra, sois sempre v*s quem me responde. 2 ditomais indi"erente serve&vos de prete#to para conduzir umaconversação que eu não dese'aria ouvir, que pode mesmocomprometer&me( pois, en"im, senhor, por muita intelig!ncia queha'a nos vossos prop*sitos, creio que os outros podem também

compreender aquilo que eu compreendo.orçada assim por v*s - imobilidade e ao sil!ncio, nem porisso dei#ais de perseguir&me( não posso levantar os olhos nemencontrar os vossos. )ou constantemente obrigada a desviar osmeus olhares( e, por uma inconseqS!ncia bem incompreens$vel,"azeis que todos os olhos se "i#em em mim, num momento em queaté aos meus pr*prios olhos eu dese'aria "urtar&me.

E quei#ais&vos do meu procedimento= E admirais&vos do meuempenho em vos "ugir= 9ensurai&me antes a minha indulg!ncia,admirai&vos de que eu não tenha partido no momento da vossachegada. 3alvez eu devesse t!&lo "eito, e obrigar&me&eis a essa

solução violenta mas necessária se não cessardes a vossa o"ensivaperseguição. ão, não esqueço, não esquecerei nunca o que devo amim pr*pria, aos laços que "ormei, que respeito e amo( e peço&vosque acrediteis: se alguma vez me encontrar reduzida - escolha in"elizde os sacri"icar ou me sacri"icar a mim mesma, não hesitarei por uminstante.

deus, senhor.

CX de )etembro de CD .

CARTA LXXIX

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O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

9ontava ir - caça esta manhã, mas está um tempo detestável.9omo leitura, tenho apenas um romance novo que

aborreceria até um colegial. 2 almoço será daqui a duas horas,nunca menos. ssim, apesar da minha longa carta de ontem, vou denovo conversar com a minha amiga. Estou certo de não a aborrecer,pois vou "alar&lhe do lindo 5révan.

9omo é poss$vel que não conheça a sua "amosa aventura, aque separou as inseparáveis>

posto que se recordará dela -s primeiras palavras. )emprevou contá&la, visto que o dese'a.

Aá de lembrar&se de que todo 5aris se admirava que tr!smulheres, todas tr!s bonitas, tendo todas tr!s os mesmos talentos, epodendo ter as mesmas pretens+es, continuassem intimamente

ligadas entre si ap*s o momento da sua entrada na sociedade. 4ulgou&se primeiro encontrar a razão na sua e#trema timidez(

mas logo, rodeadas por uma corte numerosa de que elas partilhavamas homenagens, e conhecendo o seu pr*prio valor pelo calor e pelasatenç+es de que eram ob'eto, a sua união tornou&se ainda mais "orte.ir&se&ia que o triun"o para uma era sempre o das duas outras.Esperava&se pelo menos que o momento do amor trou#esse tambémo de alguma rivalidade. 2s nossos 'ovens namoradores disputavam&se a honra de ser o ponto de disc*rdia( e eu pr*prio me teria postonas suas "ileiras se os grandes "avores que a 9ondessa de... me

concedia por esse tempo me tivessem permitido ser&lhe in"iel antesde obter a liberdade que solicitava.Entretanto as nossas tr!s belezas, no mesmo 9arnaval,

"izeram a sua escolha como por combinação prévia( e essa escolha,longe de proporcionar a tempestade que se esperava, teve apenascomo resultado tornar a amizade delas mais interessante peloencanto das con"id!ncias.

multidão dos pretendentes in"elizes 'untou&se então - dasmulheres ciumentas e a escandalosa const8ncia "oi submetida -censura pública. ;ns pretendiam que, na sociedade das inseparáveisLassim lhe chamavam então1, a lei "undamental era a comunidade de

bens e que até o amor lhe estava submetido( outros asseguravamque os tr!s amantes, livres de rivais masculinos, não o eram de rivais"emininos( chegou mesmo a dizer&se que s* por dec!ncia eles tinhamsido admitidos, e haviam obtido apenas um t$tulo sem "unç+es.

Estes rumores, verdadeiros ou "alsos, não tiveram o e"eito quese esperava. 2s tr!s pares, pelo contrário, sentiram&se que estavamperdidos se se separassem naquele momento, e tomaram o partidode en"rentarem a tempestade. 2 público, que se cansa de tudo,depressa se cansou de uma sátira in"rutuosa.

@evado pela sua ligeireza natural, ocupou&se de outrosassuntos( depois, voltando a este com a sua inconseqS!ncia habitual,

trans"ormou a not$cia em elogio. 9omo tudo se passa consoante asmodas, o entusiasmo venceu( tornou&se um verdadeiro del$rio,

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quando 5révan tomou a peito veri"icar aqueles prod$gios e "i#ar sobreeles a opinião pública e a sua.

5rocurou pois tais modelos de per"eição. dmitido "acilmentena sua sociedade, da$ tirou um augúrio "avorável. Ele sabia bem queas pessoas "elizes não são de "ácil acesso. epressa viu, de "ato, que

uma tão louvada "elicidade era, como a dos reis, mais inve'ada quedese'ada. otou que, entre os pretendidos inseparáveis, secomeçava a procurar os prazeres do e#terior, que 'á se ocupavam dedistraç+es( e concluiu que os laços de amor e de amizadecomeçavam a a"rou#ar ou a romper&se e que s* os do amor&pr*prio edo hábito conservavam a sua "orça.

Entretanto as mulheres, que a necessidade reunia,conservavam entre elas a apar!ncia da mesma intimidade( mas oshomens, mais livres no seu comportamento, reencontravam deveresa cumprir ou neg*cios a seguir. )oltavam ainda alguns quei#umes,mas 'á não se dispensavam deles, e raramente os ser+es eram

completos.Este procedimento "oi proveitoso ao ass$duo 5révan, que,

colocado naturalmente 'unto da abandonada do dia, ia o"erecendoalternadamente, e segundo as circunst8ncias, a mesma homenagem-s tr!s amigas.

acilmente compreendeu que "azer uma escolha entre elasseria perder&se( que a "alsa vergonha de se considerar a primeirain"iel encheria de susto a pre"erida( que a vaidade "erida das duasoutras as tornaria inimigas do novo amante e que não dei#ariam debrandir contra ele a severidade dos grandes princ$pios( en"im, que o

ciúme por certo chamaria as atenç+es dum rival que podia ser aindapara temer. 3udo se tornaria obstáculo( tudo "icava "ácil no seutr$plice pro'eto: cada mulher seria indulgente porque estavainteressada, cada homem, porque 'ulgava não o estar.

5révan, que então tinha apenas uma mulher a sacri"icar, tevea "elicidade de ver a sua amante célebre de um momento para ooutro. sua qualidade de estrangeira e a homenagem de um grandepr$ncipe recusada com bastante desenvoltura tinham "i#ado sobreela as atenç+es da corte e da cidade( o seu amante partilhava essashonras, e delas aproveitou 'unto das suas novas amantes. únicadi"iculdade estava em levar avante as tr!s intrigas, cu'o

desenvolvimento tinha "orçosamente de regular&se pela mais tardia(de "ato, vim a saber por um dos seus con"identes que a sua maiorpena "oi a de ter de suspender uma, que esteve prestes a atingir o!#ito cerca de quinze dias antes das outras.

En"im, o grande dia chegou. 5révan, que tinha obtido as tr!scon"iss+es, achava&se 'á senhor dos acontecimentos, e ordenou&oscomo vai ver. os tr!s maridos, um estava ausente, o outro partia nodia seguinte muito cedo, o terceiro estava na cidade.

s inseparáveis amigas deviam cear em casa da "utura viúva(mas o novo senhor não tinha permitido que os antigos servidores"ossem convidados. a manhã desse mesmo dia, "ez tr!s coleç+es

das cartas da sua bela, 'untou a uma delas um retrato que dela tinharecebido, - segunda 'untou uma ci"ra amorosa que ela pr*pria

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pintara, - terceira um anel dos seus cabelos( cada uma recebeu porcompleto esta terça parte de sacri"$cio, e consentiu, em troca, emenviar ao amante ca$do em desgraça uma retumbante carta derompimento.

Era muito( não o era bastante. quela cu'o marido estava na

cidade s* podia dispor daquele dia( combinaram que uma "ingidaindisposição a dispensaria de ir cear a casa da amiga e que o serãoseria reservado a 5révan( a noite "oi destinada para aquela cu'omarido estava ausente( e o romper do dia, momento da partida doterceiro esposo, "oi marcado para a última, para os gozos do amor.

5révan, que não descuida nada, corre em seguida a casa dabela estrangeira, inventa um estado de esp$rito que suscita o mauhumor de que ele necessitava, e sai depois de conseguir umadiscussão que lhe assegura vinte e quatro horas de liberdade.

ssim tomadas as suas disposiç+es, entra em casa, contandorepousar um pouco( outros assuntos o esperavam.

s cartas de rompimento tinham sido um súbito clarão paracada um dos amantes ca$dos em desgraça( nenhum deles podiaduvidar de que o seu sacri"$cio aproveitava a 5révan. E o despeito deter sido 'oguete, 'unto - imitação que traz quase sempre a pequenahumilhação de se ser abandonado, deu aos tr!s, sem secomunicarem, mas como se estivessem combinados, a resolução depedirem uma satis"ação ao seu a"ortunado rival.

Este encontrou em casa os tr!s desa"ios( aceitou&oslealmente( mas, não querendo perder nem os prazos nem o brilhodesta aventura, "i#ou os encontros para o dia seguinte de manhã, e

indicou aos tr!s o mesmo lugar e a mesma hora. oi a uma dasportas do <osque de <olonha.9hegada a noite correu a sua tr$plice aventura com um !#ito

igual( pelo menos gabou&se depois de que cada uma das suas novasamantes recebera tr!s vezes o penhor e o 'uramento do seu amor.qui, como está vendo, "altam provas - hist*ria( tudo o que ohistoriador imparcial pode "azer é observar ao leitor incrédulo que avaidade e a imaginação e#altadas podem obrar prod$gios, tanto maisque a manhã que devia seguir&se a uma brilhante noite parecia deverdispensar reservas para o "uturo. e qualquer modo, os "atos que seseguem inspiram maior certeza.

5révan dirigiu&se - hora e#ata ao encontro que marcara( nolocal viu&se em presença dos seus tr!s rivais, um tanto surpreendidosdo mútuo encontro, e cada um deles talvez 'á consolado em parte,vendo&se no meio de companheiros de in"ortúnio.

bordou&os com ar a"ável e cavalheiresco, e dirigiu&lhes esta"ala, que me "oi reproduzida "ielmente: 6)enhores6, disse&lhes ele,6uma vez que vos encontro reunidos aqui, adivinhantes sem dúvidaque tendes os tr!s o mesmo motivo de quei#a contra mim. Estoupronto a dar&vos razão. 0ue a sorte decida, entre v*s, qual dos tr!stentará primeiro uma vingança - qual tendes um direito igual. ãotrou#e padrinho nem testemunhas. ão os institu$ para a o"ensa( não

os e#i'o para a reparação6. epois, cedendo ao seu caráter de 'ogador, acrescentou: 6Eu sei que raramente se ganha em 'ogos de

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azar( mas, se'a qual "or a sorte que me espera, 'á se viveu semprebastante quando se teve tempo de adquirir o amor das mulheres e aestima dos homens.6

Enquanto os seus adversários estupe"atos se olhavam emsil!ncio, e na sua delicadeza calculavam talvez que o triplo amante

impedia que a partida "osse igual, 5révan retomou a palavra: 6ãovos escondo6, continuou ele, 6que a noite que acabo de passar me"atigou cruelmente. )eria generoso da vossa parte que mepermit$sseis reparar as minhas "orças. ei as minhas ordens para quetivessem aqui pronto um almoço( dai&me a honra de o aceitar.lmocemos 'untos e, sobretudo, almocemos alegremente. 5odemosbater&nos por semelhantes bagatelas( no entanto elas não devem,creio eu, alterar o nosso humor6.

2 almoço "oi aceito. )egundo se disse, nunca 5révan "oi maisamável. 3eve a habilidade de não humilhar nenhum dos seus rivais,de os persuadir e que todos teriam conseguido "acilmente os

mesmos !#itos, e sobretudo de os p%r de acordo em que nenhumdeles dei#aria escapar as ocasi+es, tal como ele, 5révan. ;ma vezcon"essados estes "atos, tudo se arran'ou por si mesmo. inda oalmoço não tinha terminado, 'á haviam repetido dez vezes quesemelhantes mulheres não mereciam que homens honestos sebatessem por elas. Esta idéia trou#e a cordialidade( o vinho"orti"icou&a( tão bem que, poucos momentos depois, 'á não erabastante não haver entre eles rancor, 'uraram&se amizade semreserva.

5révan, que sem dúvida gostava tanto deste desenlace como

do outro, não dese'ava todavia perder ali a sua celebridade. EmconseqS!ncia, submetendo habilmente os seus pro'etos -scircunst8ncias, disse aos tr!s o"endidos: 6e "ato, não é de mim, masdas vossas in"iéis amantes que deveis vingar&vos. 2"ereço&vos aocasião. 9omo v*s pr*prios, sinto 'á uma in'úria que dentro em brevepartilharei: pois se cada um de v*s não conseguiu conservar a"idelidade de uma s*, posso porventura esperar á "idelidade das tr!s> vossa o"ensa tornou&se minha. ceitai para esta noite uma ceia emminha casa, e espero que a vossa vingança não "icará adiada pormuito tempo.W 0uiseram que ele se e#plicasse( porém ele, com o tomde superioridade que as circunst8ncias o autorizavam a tomar:

6)enhores6 respondeu, 6creio ter&vos provado que sei como conduzir&me( tende con"iança em mim6. 3odos consentiram( e, depois deterem abraçado o seu novo amigo, separaram&se até - noite,esperando o e"eito das promessas.

)em perda de tempo, 5révan regressa a 5aris, e vai,consoante o uso, visitar as suas novas conquistas. 2btém das tr!sque viriam naquela mesma noite cear a s*s com ele em sua casa.

uas delas opuseram algumas di"iculdades( mas que "ica pararecusar no dia seguinte> 7arcou os encontros com uma hora dedist8ncia, tempo necessário aos seus pro'etos. epois dessespreparativos, retirou&se, mandou avisar os outros tr!s con'urados, e

todos quatro "oram alegremente esperar as suas v$timas.

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2uviu&se chegar a primeira. 5révan apresenta&se s*, recebe&acom ar de solicitude, conduz&la até ao santuário de que ela se 'ulgavaa divindade( depois, desaparecendo sob um ligeiro prete#to, "az&sesubstituir imediatamente pelo amante ultra'ado.

9omo decerto imagina, a con"usão de uma mulher que não

tem ainda a e#peri!ncia das aventuras tornava, em tal momento, otriun"o muito "ácil. 3oda a censura que não "oi "eita "oi contada poruma graça( e a escrava "ugitiva, entregue de novo ao seu antigosenhor, sentiu&se muito "eliz por poder esperar o seu perdão,retomando as suas primeiras algemas. 2 tratado de paz rati"icou&senum lugar mais solitário, e a cena, "icando vazia, "oi alternadamenteocupada pelos outros atores, mais ou menos da mesma maneira, esobretudo com o mesmo des"echo.

 3odavia, cada uma das mulheres 'ulgava&se ainda s* emcampo. 2 seu espanto e o seu embaraço aumentaram quando, nomomento da ceia, os tr!s pares se reuniram( mas a con"usão chegou

ao cúmulo quando 5révan, que reapareceu no meio de todos, teve acrueldade de apresentar -s tr!s in"iéis umas desculpas que,divulgando o seu segredo, lhes revelaram inteiramente até queponto elas tinham sido burladas.

Entretanto puseram&se - mesa e pouco depois a moderaçãovoltou: os homens entregaram&se, as mulheres submeteram&se.

 3odos tinham o *dio no coração( mas as palavras trocadasnão eram por isso menos ternas. alegria despertou o dese'o, que,por seu turno, lhe emprestou novos encantos. Esta espantosa orgiadurou até de manhã( e, quando se separaram, as mulheres 'ulgaram&

se perdoadas. 7as os homens, que tinham conservado o seuressentimento, procederam no dia seguinte a um rompimento quenão teve apelo( e, não contentes de dei#ar as suas levianas amantes,terminaram a sua vingança dando a público a aventura.

esde então, uma delas está num convento, e as outras duasde"inham e#iladas nas suas terras.

qui está a hist*ria de 5révan( cumpre&lhe, 7arquesa, 'ulgarse dese'a aumentar a sua gl*ria e atrelar&se ao seu carro de triun"o. sua carta causou&me verdadeira inquietação e espero comimpaci!ncia uma resposta mais a'uizada e mais clara - última quelhe escrevi.

deus, minha bela amiga( descon"ie das idéias divertidas oue#c!ntricas que tão "acilmente a t!m seduzido sempre. 5ense que,na tra'et*ria que a minha amiga segue, a intelig!ncia não basta, eque uma única imprud!ncia pode tornar&se um mal sem remédio.)uporte en"im que a prudente amizade se'a algumas vezes o guiados seus prazeres.

deus. pesar de tudo, continuo a gostar de si como se "osserazoável.

CU de )etembro de CD .

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CARTA LXXX

O CAVALEIRO DANCENY A CECÍLIA VOLANGES

9ec$lia, minha querida 9ec$lia, quando virá o tempo de

voltarmos a ver&nos> 0uem me ensinará a viver longe de si> 0uemme dará para isso "orça e coragem> unca, sinto que nunca podereisuportar esta "atal aus!ncia. 9ada dia aumenta o meu so"rimento, enão posso ver&lhe um termo= ?almont, que me tinha prometidosocorros, consolaç+es, ?almont descuida&se, e esquece&me talvez.Está 'unto daquela que ele ama( não sabe quanto so"re aquele queestá a"astado. o enviar&me a sua última carta, não me escreveu. oentanto é ele quem deve dizer&me quando poderei v!&la e por quemeio. ada terá pois a dizer&me>

9ec$lia mesmo não me "ala em tal( será por não partilharesse dese'o> h= 9ec$lia, sou muito in"eliz. mo&a mais do que nunca:

mas esse amor, que "az o encanto da minha vida, torna&se otormento dela.

ão, não posso mais viver assim, é preciso que eu a ve'a, épreciso, nem que se'a por um momento. 0uando me levanto, digo amim mesmo: 6ão a verei.6 eito&me dizendo: 6ão a vi.6 2s dias tãolongos não t!m um momento para a "elicidade.

 3udo é privação, tudo é saudade, tudo é desespero( e todosestes males me v!m de onde eu esperava todos os meus prazeres=

crescente a estas penas mortais a minha inquietação sobreas suas, e "ará uma idéia da minha situação. 5enso em si a todo o

momento, e nunca penso sem perturbação. )e a ve'o a"lita, in"eliz,so"ro por todas as suas tristezas( e se a ve'o tranqSila e consolada,são as minhas que redobram. 5or toda a parte encontro o so"rimento.

h= não era assim, quando habitava os mesmos lugares doque eu=

 3udo então era prazer. certeza de a ver embelezava mesmoos momentos da aus!ncia( o tempo que era preciso passar longe desi apro#imava&me da 9ec$lia enquanto ia passando.

2 emprego que eu "azia dele nunca era estranho - 9ec$lia. )ecumpria deveres, estes tornavam&me mais digno de si( se cultivavaalgum talento, esperava agradar&lhe cada vez mais. 7esmo quando

as distraç+es da sociedade me levavam para longe de si, nuncaestávamos separados.os espetáculos, procurava adivinhar o que lhe teria

agradado( um concerto recordava&me os seus talentos e as nossastão doces ocupaç+es.

a sociedade, como nos passeios, aprendia a mais ligeirasemelhança.

9omparava&a a tudo( por toda a parte era a 9ec$lia quemlevava a palma. 9ada momento do dia era marcado por umahomenagem nova, e cada noite eu lhe levava o tributo a seus pés.

gora, que me resta> olorosas saudades, privaç+es eternas,

e uma ligeira esperança de que o sil!ncio de ?almont diminua, que oseu se mude em inquietação. ez léguas somente nos separam, e

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este espaço, tão "ácil de transpor, s* para mim se torna numobstáculo invenc$vel= E quando, para me a'udar a venc!&lo, imploro omeu amigo, a minha amada, ambos "icam "rios e tranqSilos= @ongede me socorrerem, nem mesmo me respondem.

0ue é "eito da amizade ativa de ?almont> 0ue é "eito,

sobretudo, minha 9ec$lia, dos seus sentimentos tão ternos, que atornavam tão engenhosa para encontrar maneira de nos vermostodos os dias> lgumas vezes, recordo&me, sem dei#ar de o dese'ar,via&me obrigado a sacri"icar esse dese'o a consideraç+es, a deveres.2 que não me dizia então a 9ec$lia> 5or quantos prete#tos nãocombatia as minhas raz+es> E lembre&se de que as minhas raz+escediam sempre aos seus dese'os. ão pretendo e#trair da$ ummérito= em mesmo tinha o do sacri"$cio= 2 que a 9ec$lia dese'avaobter, ardia eu em dese'os de conced!&lo=

7as, en"im, cabe&me agora a vez de pedir( e que peço eu> ?!&la por um momento, renovar e receber o 'uramento dum amor

eterno. 5ois 'á não está a$ a sua "elicidade, como está a minha>Gepito essa idéia desesperadora, que poria o cúmulo aos

meus males. 9ec$lia ama&me, amar&me&á sempre( creio&o, estou certa

disso, não quero duvidar 'amais. 7as a minha situação é horrorosa enão posso suportá&la por mais tempo.

deus, 9ec$lia.

5aris, CU de )etembro de CD .

CARTA LXXXI

A MARQUESA DE MERTEUIL AO VISCONDE DE VALMONT

9omo os seus temores me causam piedade= 9omo me provama minha superioridade sobre o ?isconde= E quer ensinar&me,conduzir&me= h= meu pobre ?almont, que dist8ncia vai ainda de si amim= ão, todo o orgulho do seu se#o não seria su"iciente parapreencher o intervalo que nos separa. 5orque não poderia e#ecutar

os meus pro'etos, 'ulga&os imposs$veis=Ente orgulhoso e "raco, "ica&te bem quereres calcular os meusmeios e 'ulgar dos meus recursos= a verdade, ?isconde, os seusconselhos conseguiram irritar&me, e não posso esconder&lho.

0ue para mascarar a sua inacreditável "alta de 'eito emrelação - sua 5residente o ?isconde ostente como um triun"o o "atode ter con"undido por um momento essa mulher t$mida e que o ama,consinto( ter obtido dela um olhar, um único olhar, sorrio e passoadiante. 0ue sentindo, a seu pesar, o pouco valor das suasdilig!ncias, espere "urtá&las - minha atenção, lison'eando&me peloes"orço sublime de apro#imar duas crianças que ardem no dese'o de

se ver, e que, diga&se de passagem, devem a mim somente o ardordesse dese'o( admito&o ainda. 0ue, en"im, a si mesmo autorize essas

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aç+es brilhantes, para me dizer num tom doutoral que vale maisempregar o tempo a e#ecutar pro'etos do que a contá&los( essavaidade não me pre'udica, e perdoo&lha.

7as que possa supor que eu tenho necessidade da suaprud!ncia, que eu poderia perder&me se não escutasse as suas

opini+es, que devo sacri"icar&lhes um prazer, uma "antasia( naverdade, ?isconde, é e#orbitar da con"iança que dese'o ter em si=0ue tem o ?isconde "eito que eu não tenha ultrapassado mil

vezes>)eduziu, perdeu mesmo muitas mulheres: mas que

di"iculdade teve a vencer> que obstáculos a ultrapassar> 2nde está omérito que verdadeiramente lhe caiba> ;ma bela "igura, puro e"eitodo acaso( maneiras graciosas, que o hábito dá quase sempre(esp$rito, na verdade, mas o qual uma certa g$ria de salão substituiem caso de necessidade( um impudor muito louvável, mas talvezdevido unicamente - "acilidade dos seus primeiros !#itos. )e me não

engano, eis todos os seus dotes( pois, para a celebridade que p%deadquirir, não e#igirá, creio, que conte por muito a arte de suscitar ouaproveitar a ocasião dum esc8ndalo.

0uanto - prud!ncia, - "inura, não "alo de mim: mas que(mulher não as possui de melhor qualidade que o ?isconde> 2h= a sua5residente leva&o como uma criança.

9reia&me, ?isconde, raramente se adquirem as qualidadessem as quais se pode passar. 9ombatendo sem risco, deve&se( agirsem precaução.

5ara v*s, os homens, as derrotas são apenas !#itos a menos.

este combate tão desigual, a nossa sorte está em não perder e avossa in"elicidade em não ganhar. inda que eu concedesse aoshomens tantos talentos como a n*s, mulheres, em quantos ter$amosn*s ainda de ultrapassá&los, pela necessidade em que estamos de"azer deles um uso cont$nuo=

)uponhamos, admito, que voc!s p+em tanta habilidade emvencer&nos como n*s a de"ender&nos ou a ceder( convirá ao menosque ela se lhes torne útil ap*s a vit*ria. ;nicamente ocupados dosabor que achais na nova ligação, entregais&vos a ela sem receio,sem reserva( o tempo que ela poderá durar não vos interessa.

e "ato, esses laços reciprocamente dados e recebidos, para

"alar na g$ria do amor, s* v*s podeis, - vossa escolha, estreitá&los ouromp!&los( "elizes ainda se na vossa ligeireza, pre"erindo o mistérioao ru$do, vos contentais com um abandono humilhante e não "azeisdo $dolo da véspera a v$tima de manhã.

7as que uma mulher in"ortunada sinta primeiro o peso da suacadeia que riscos não terá a correr se tentar subtrair&se a ela, seousar somente soergu!&la> )e e#perimenta a"astar de si o = homemque o seu coração repele com es"orço, é tremendo que o "az. )e elese obstina em "icar, é "orçoso entregar ao medo o que antes eraconcedido ao amor.

sua prud!ncia deve desatar com destreza aqueles mesmos

laços que v*s ter$eis des"eito. H merc! do seu inimigo, ela "ica semrecursos, se ele não tiver generosidade( e como esperar tal

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sentimento, quando, se algumas vezes o louvam quando o tem,nunca todavia o censuram por ele lhe "altar>

2s seus braços abrem&se ainda, quando o seu coração está"echado.

2 ?isconde não negará, sem dúvida, estas verdades, cu'a

evid!ncia as tornou triviais. )e, entretanto, alguma vez me viu,dispondo dos acontecimentos e das opini+es, "azer desses homenstão tem$veis o 'oguete dos meus caprichos ou das minhas "antasias(tirar a uns a vontade, a outros o poder de me serem nocivos( se eusoube, pouco a pouco, e consoante a variedade dos meus gostos,

 'untar ao meu séqSito ou e#pulsar da minha beira( se, em meiodessas revoluç+es "reqSentes, a minha reputação apesar de tudo seconservou pura( não deverá o ?isconde concluir que, nascida paravingar o meu se#o e dominar o seu, eu soube inventar para o meuuso meios desconhecidos até de mim pr*pria>

2ra= guarde os seus conselhos e os seus receios para certas

mulheres delirantes, das quais se diz serem sentimentais( cu'aimaginação e#agerada levaria a supor que a atureza lhes p%s ossentidos na cabeça( que, não tendo nunca re"letido, con"undem semcessar o amor e o amante( que, na sua louca ilusão, acreditam ques* o homem com quem procuraram o prazer é o seu únicodepositário( e que, verdadeiramente supersticiosas, t!m pelosacerdote o respeito e a "é que se deve apenas - divindade.

5ode ainda ter receio por aquelas que, mais super"iciais doque prudentes, não sabem consentir, se "or necessário, em seremabandonadas.

everá tremer principalmente pelas mulheres ativas na suaociosidade, a quem o ?isconde chama sens$veis, e das quais o amorse apodera tão "acilmente e com tamanha "orça( que sentem anecessidade de se ocuparem ainda do amor, mesmo quando delenão podem 'á e#trair prazer algum( e que, abandonando&se -"ermentação das suas idéias, inventam para si pr*prias cartas tãodoces, mas tão perigosas de escrever, e que não receiam con"iaressas provas da sua "raqueza ao pr*prio ob'eto que lhes deu causa.Fmprudentes que, no seu atual amante, não sabem ver o seu "uturoinimigo=

7as que tenho eu de comum com essas mulheres irre"letidas>

0uando me viu o ?isconde a"astar&me das regras que a mimpr*pria determinei, e "altar aos meus princ$pios> 2s meus princ$pios,repito&o, e digo&o deliberadamente, pois eles não são, como os dasoutras mulheres, colhidos ao acaso, aceites sem análise e seguidospor hábito( são o "ruto das minhas pro"undas re"le#+es. 9riei&os, eposso dizer que são a minha obra.

Entrando na sociedade num tempo em que, criança ainda, ascircunst8ncias me condenavam ao sil!ncio e - inação, delas soubetirar proveito para observar e re"letir. Enquanto me 'ulgavamestouvada ou distra$da, não dando ouvidos - verdade dosensinamentos que me dispensavam, eu recolhia cuidadosamente

tudo o que procuravam esconder&me.

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Essa curiosidade útil, ao mesmo tempo em que servia parame instruir, ensinava&me a dissimular. 2brigada muitas vezes aesconder dos olhos dos que me rodeavam os motivos que mechamavam a atenção, e#perimentei pousar os meus no que meagradasse( o resultado desde logo "oi ter adotado aquele olhar sem

constrangimento que o ?isconde tantas vezes me gabou.nimada por este primeiro !#ito, tratei de regular, pelomesmo processo, os diversos movimentos do meu rosto. )e sentiaqualquer apreensão, estudava&me até assumir um ar de serenidadeou mesmo de alegria( levei o meu zelo ao ponto de a mim pr*priacausar dores voluntárias, para durante esse tempo procurar ae#pressão do prazer. 9om o mesmo cuidado e maior custo, e#ercitei&me a reprimir os sintomas de uma alegria inesperada.

oi assim que consegui tomar sobre a minha "isionomiaaquele dom$nio que algumas vezes admirou em mim.

Eu era ainda muito nova e quase sem interesse( mas s* tinha

de meu os pr*prios pensamentos, e indignava&me - idéia de que mospudessem roubar ou surpreender contra minha vontade.

7unida dessas primeiras armas, e#perimentei servir&me delas.ão me satis"azia o não me dei#ar penetrar: divertia&me

mostrar&me sob "ormas di"erentes. ominando os meus gestos,observava as minhas "alas.

;ns e outras eram regulados segundo as circunst8ncias, oumesmo segundo as minhas "antasias. esde então, a minha maneirade pensar pertenceu&me a mim s*, e não mostrei nunca senão o queme era útil dei#ar ver.

Este trabalho sobre mim pr*pria "i#ou a minha atenção sobrea e#pressão dos rostos e o caráter das "isionomias( e adquiri estamirada penetrante, na qual a e#peri!ncia todavia me ensinou a nãome "iar inteiramente, mas que, em todos os casos, raramente meenganou.

inda não tinha quinze anos, possu$a 'á os talentos a que amaior parte dos nossos pol$ticos devem a sua reputação, eencontrava&me ainda nos rudimentos da ci!ncia que pretendiaadquirir.

9omo pode calcular, procurava, como todas as raparigas,adivinhar o amor e os seus prazeres( mas, não tendo passado pelo

convento, não possuindo uma amiga segura, e guardada por umamãe vigilante, tinha apenas idéias vagas e que não podia "i#ar. pr*pria natureza, da qual mais tarde, seguramente, s* tive de melouvar, não me dava ainda qualquer ind$cio. ir&se&ia que trabalhavaem sil!ncio para aper"eiçoar a sua obra. )* a minha cabeça"ermentava( o meu dese'o não era gozar, era saber. 2 dese'o de meinstruir sugeriu&me os meios.

)enti que o único homem com quem podia "alar sobre esseassunto, sem me comprometer, era o meu pro"essor. E logo tomei omeu partido.

5assei por cima dessa pequena vergonha( e, gabando&me

duma "alta que não tinha cometido, acusei&me de ter "eito tudo o que"azem as mulheres. 3al "oi a e#pressão de que usei( mas, "alando

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assim, eu não sabia na verdade que idéia e#primia. minhaesperança não "oi de todo iludida, nem inteiramente realizada( oreceio de me trair impedia&me de me esclarecer.

7as o bom do padre pintou&me o mal tão grande que euconclu$ que o prazer devia ser e#tremo( e ao dese'o de o conhecer

sucedeu o de o saborear.ão sei onde esse dese'o me teria conduzido( e, "altando&mepor completo a e#peri!ncia, uma única oportunidade ter&me&ia talvezperdido.

elizmente para mim, minha mãe anunciou&me alguns diasdepois que eu ia casar&me. certeza de que ia saber e#tinguiuimediatamente a minha curiosidade, e cheguei virgem aos braços dosenhor de 7erteuil.

Era com tranqSilidade que esperava o momento que tudodevia ensinar&me e "oi&me preciso re"letir para mostrar con"usão ereceio. primeira noite, de que geralmente se tem uma idéia tão

cruel ou tão doce, apresentava&me apenas uma ocasião dee#peri!ncia: dor e prazer, tudo eu observava com e#atidão, e nessasdiversas sensaç+es via apenas "atos para recolher e meditar.

Este g!nero de estudo depressa começou a agradar&me( mas,"iel aos meus princ$pios, e sentindo, talvez por instinto, que ninguémdevia estar mais longe da minha con"iança do que o meu marido,resolvi, pelo simples "ato de que era sens$vel, mostrar&me impass$vela seus olhos. Esta "rieza aparente "oi, ao longo do tempo, o"undamento inabalável da sua cega con"iança. 4untei&lhe, ap*s umasegunda re"le#ão, o aspecto estouvado que a minha idade

autorizava( e nunca ele me 'ulgou mais criança do que nosmomentos em que com mais audácia eu o iludia.Entretanto, devo con"essá&lo, dei#ei&me primeiro arrastar pelo

turbilhão do mundo, e entreguei&me inteiramente -s suas distraç+es"úteis.

7as ao "im de alguns meses, tendo&me o senhor de 7erteuillevado a partilhar as suas tristes "érias no campo, o medo doaborrecimento "ez com que me voltasse o gosto do estudo( eencontrando&me rodeada apenas de pessoas cu'a dist8ncia de mimme punha ao abrigo de toda a suspeita, aproveitei a ocasião para darum campo mais vasto -s minhas e#peri!ncias.

oi ali, principalmente, que obtive a certeza de que o amorque nos louvam como a causa dos nossos prazeres é apenas, quandomuito, o seu prete#to. doença do senhor de 7erteuil veiointerromper tão doces ocupaç+es( "oi necessário segui&lo - cidade,onde ele ia procurar socorros.

7orreu, como sabe, pouco tempo depois( e embora, no "im decontas, eu não tivesse de me quei#ar dele, nem por isso senti menosvivamente o preço da liberdade que a minha viuvez ia proporcionar&me, e a mim pr*pria prometi aproveitar bem essa liberdade.

7inha mãe contava que eu entrasse num convento, ouvoltasse a viver com ela. Gecusei uma e outra solução( e tudo o que

concedi - dec!ncia "oi voltar ao mesmo lugar no campo, onde merestavam ainda algumas observaç+es a "azer.

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Essas observaç+es ganharam "orça com o au#$lio da leitura(mas não 'ulgue que "oram todas do g!nero que sup+e. Estudei osnossos costumes nos romances( as nossas opini+es nos "il*so"os(procurei mesmo nos mais severos moralistas o que eles e#igiam den*s, e soube assim o que se podia "azer, o que se devia pensar e o

que era preciso parecer. uma vez "i#ada sobre esses tr!s pontos, s*último apresentava algumas di"iculdades na sua e#ecução( espereivenc!&las e medirei nos meios.

9omeçava a aborrecer&me dos meus prazeres rústicos,demasiado mon*tonos para a minha imaginação( sentia umanecessidade de coquetismo que me reconciliasse com o amor( nãopara verdadeiramente o sentir, mas para o inspirar e o "ingir.

Em vão me haviam dito e eu tinha lido que não se podia "ingiresse sentimento( eu via, no entanto, que para o conseguir bastava

 'untar - intelig!ncia de um autor o talento de um comediante.E#perimentei os dois g!neros, e talvez com algum !#ito( mas

em lugar de procurar os vãos aplausos do teatro, resolvi empregarna minha "elicidade o que tantos outros sacri"icavam - vaidade.

;m ano se passou nessas diversas ocupaç+es. 9omo o meuluto 'á me permitia voltar a aparecer, regressei - cidade com osmeus grandes pro'etos( não esperava o primeiro obstáculo que a$encontrei.

quela longa solidão, aquele retiro austero tinham lançadosobre mim uma apar!ncia de virtude que amedrontava os nossosgalãs( mantinham&se a"astados e dei#avam&me entregue a umamultidão de aborrecidos senhores, que pretendiam todos a minha

mão. 2 embaraço não estava em recusá&los( mas várias dessasrecusas desagradavam - minha "am$lia, e eu perdia nessas quest+esinternas o tempo que prometera a mim mesma gastar tãoagradavelmente. ui pois obrigada, para atrair uns e a"astar osoutros, a p%r em relevo algumas inconseqS!ncias e a empregar empre'udicar a minha reputação, o cuidado que pensava aplicar emconservá&la. 9onsegui&o "acilmente, como pode imaginar. 7as nãome sentindo arrebatada por nenhuma pai#ão, "iz s* o que 'ulgueinecessário, e medi com prud!ncia as doses da minha leviandade.

@ogo que atingi o "im que me propusera voltei ao ponto departida e "iz promessas de emenda a algumas daquelas mulheres

que, não podendo ter pretens+es a agradar, se pavoneiam com as domérito e da virtude. oi um lance de dados que me valeu mais doque eu esperava. quelas reconhecidas donas arvoraram&se emminhas apologistas( e o zelo cego que empregaram para louvar oque elas chamavam a sua obra chegou ao ponto de, - menor "raseque alguém se permitisse a meu respeito, todo o partido da virtudegritar contra o esc8ndalo e a in'úria. 5elo mesmo processo conseguiainda a aprovação das mulheres que pretendiam agradar, as quais,persuadidas de que eu renunciava a seguir carreira id!ntica - sua,me escolheram para alvo dos seus elogios, todas as vezes quequeriam provar que não diziam mal de toda a gente.

Entretanto, a minha anterior conduta tinha atra$do osapai#onados( e, para me equilibrar entre eles e as minhas in"iéis

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protetoras, mostrei&me como uma mulher sens$vel, mas di"$cil, aquem o e#cesso de delicadeza "ornece armas contra o amor.

Então comecei a desenvolver no grande teatro os talentos quedera a mim pr*pria. 2 meu primeiro cuidado "oi o de adquirir orenome de invenc$vel. 5ara chegar a isso, os homens que não me

agradavam "oram sempre os únicos de quem simulei aceitar ashomenagens. Empreguei&os utilmente em alcançar por meio deles ashonras da resist!ncia, enquanto me entregava sem receio ao amantepre"erido. 7as a esse a minha "ingida timidez não permitiu nuncaque me seguisse na sociedade( e os olhares do mundo "i#aram&se,desse modo, no amante recusado.

)abe, meu amigo, que levo pouco tempo a decidir&me( é porter observado que são quase sempre os cuidados anteriores querevelam o segredo das mulheres. 5or muito que se "aça, o tom nuncaé o mesmo, antes e depois do acontecimento. Esta di"erença nãoescapa ao observador atento, e achei menos perigoso enganar&me

na escolha do que dei#ar&me penetrar. anho ainda com esseprocedimento a"astar as evid!ncias, que "ornecem os únicoselementos para nos 'ulgarem.

Estas precauç+es, e ainda a de nunca escrever, não entregarnunca uma prova da minha derrota, poderiam parecer e#cessivas( amim nunca me pareceram su"icientes. esci ao "undo do meucoração, e nele estudei o dos outros. )oube assim que não háninguém que não conserve a$ um segredo que não deve serrevelado( eis uma verdade que a ntiguidade parece ter conhecidomelhor do que n*s, e da qual a hist*ria de )ansão poderia ser apenas

uma engenhosa alegoria. ova alila, empreguei sempre, como ela,o meu poder em surpreender esse importante segredo.0uantos )ans+es modernos não tive eu 'á com a cabeleira sob

a minha tesoura= E a esses, dei#ei eu de temer( são os únicos queme tenho permitido humilhar algumas vezes. 7ais subtil com osoutros, a arte de os tornar in"iéis para evitar parecer&lhes volúvel,uma "ingida amizade, uma aparente con"iança, alguns rasgosgenerosos, a idéia lison'eira que cada um conserva de ter sido o meuúnico amante, tudo serviu para obter o seu sil!ncio.

5or "im, quando esses meios me "altaram, soube, antes deromper, aba"ar de antemão, sob o rid$culo ou a calúnia, a con"iança

que esses homens perigosos pudessem obter.2 que lhe estou dizendo, tem&me o ?isconde visto praticarconstantemente( e duvida da minha prud!ncia= 5ois bem: evoque otempo em que me dispensou as suas primeiras atenç+es.

unca uma homenagem me lison'eou tanto( dese'ava&o antesde o ter visto. )eduzida pela sua reputação, parecia&me que "azia"alta - minha gl*ria. rdia no dese'o de o combater corpo a corpo. oio único dos meus prazeres que teve algum império sobre mim.Entretanto, se o ?isconde tivesse querido perder&me, que meios teriaencontrado> 5alavras vãs que não dei#am sulco atrás de si, que asua pr*pria reputação teria a'udado a tornar suspeitas, e uma

sucessão de "atos sem verossimilhança, cu'a narração sincera teria oar de um romance mal urdido.

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J certo que, mais tarde, vim a entregar&lhe todos os meussegredos( mas o ?isconde sabe os interesses que nos unem, e se, den*s dois, sou eu quem deve culpar&se de imprud!ncia.

 4á que estou em maré de lhe prestar contas, dese'o "az!&locom e#atidão. aqui ouço&o dizer&me que estou, pelo menos, -

merc! da minha criada de quarto( de "ato, se ela não possui osegredo dos meus sentimentos, possui o dos meus atos. 0uando o?isconde em tempos me "alou a esse respeito, respondi&lhe apenasque estava segura dela( e a prova de que esta resposta bastou entãopara a sua tranqSilidade é que depois disso lhe con"iou, por suaconta, segredos bastante perigosos. 7as agora que 5révan lhe "azsombra, e que a cabeça lhe anda - roda, tenho dúvidas de que meacredite sob palavra. ?ou pois edi"icá&lo.

Em primeiro lugar, essa rapariga é minha irmã de leite, e esse*irá a saber%se na continuação, &arta &0, não o segredo do senhor de almont,mas apro(imadamente de que gênero ele era; e o leitor sentirá que não +oi

 possível esclarecê%lo melhor sobre este assuntolaço que aparentemente nada vale não dei#a de ter import8ncia parapessoas dessa categoria. lém disso, conheço o segredo dela, e maisainda: v$tima duma loucura de amor, estaria perdida se eu não ativesse salvo. 2s pais dela, todos eriçados de honra, queriam nadamenos do que interná&la.

irigiram&se a mim. ?i, num relance, quanto a sua c*lera mepoderia ser útil.

)ecundei essa c*lera, e solicitei a ordem de internamento,que obtive. epois, passando subitamente ao partido da clem!ncia,para o qual atra$ os pais, e aproveitando do meu crédito 'unto do

velho ministro, levei&os a consentir que me dei#assem depositáriadessa ordem, e senhora de pedir ou deter a sua e#ecução, consoanteo mérito do procedimento dessa rapariga. Ela sabe que tenho a suasorte nas minhas mãos e ainda que, por absurdo, esse poderosomeio não a detivesse, não é evidente que a sua conduta desregradae a sua punição aut!ntica tirariam todo o crédito -s suas palavras>

essas precauç+es que chamo "undamentais, 'untam&semuitas outras, locais ou ocasionais, que a re"le#ão e o hábito "arãoencontrar, caso se'a necessário, e que seria "astidioso pormenorizar,mas cu'a prática é importante. )e quer chegar a conhec!&las,?isconde, d!&se ao trabalho de considerar o meu comportamento noseu con'unto.

7as pretender que eu me tenha entregue a tantos cuidadospara não retirar deles o "ruto( que depois de tanto me ter elevadosobre outras mulheres pelos meus penosos trabalhos eu consinta emraste'ar como elas, entre a imprud!ncia e a timidez( que sobretudoeu possa temer um homem a ponto de não ver salvação a não ser na"uga> ão, ?isconde( nunca. J preciso vencer ou morrer. 0uanto a5révan, quero t!&lo e hei&de t!&lo( ele quererá divulgá&lo, e não odivulgará. Em duas palavras, eis o nosso romance.

deus.

TV de )etembro de CD .

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CARTA LXXXII

CECÍLIA VOLANGES AO CAVALEIRO DANCENY 

7eu eus, como a sua carta me "ez pena= E tinha eu tantaimpaci!ncia de a receber= Esperava encontrar nela consolação ea"inal "iquei muito mais a"lita do que antes de a ter recebido.

9horei muito enquanto a lia. 7as não é isso que eu lhecensuro( 'á tenho corado muitas vezes por sua causa, sem que issome "aça pena. 7as, desta vez, não é a mesma coisa.

0ue é que quer dizer quando escreve que o seu amor se tornaum tormento, que não pode viver assim( nem suportar por maistempo a sua situação> )erá o caso que vai dei#ar de amar&me, s*

porque isso não é tão agradável como noutro tempo>5arece&me que eu não sou mais "eliz, bem pelo contrário( e no

entanto,amo&o cada vez mais. )e o senhor de ?almont não lheescreveu, a culpa não é minha( não lhe pude pedir, porque nuncaestive s* com ele, e combinamos que não nos "alar$amos diante dasoutras pessoas( e isso é ainda por si, para que ele possa "azer o maiscedo poss$vel aquilo que dese'a. ão digo que o não dese'e também,e disso pode estar certo( mas que quer que eu "aça> )e 'ulga que é"ácil, encontre o meio, que eu não peço melhor.

 4ulga que me é agradável ser repreendida pela 7amã, que

antes não me ralhava nunca, bem pelo contrário> gora é pior doque se eu estivesse no convento. inda me consolava pensando queera por si( havia até ocasi+es em que eu me dava por "eliz.

7as quando ve'o que também está zangado sem que ha'a daminha parte culpa nenhuma, "ico mais triste do que estava por tudoquanto aconteceu até aqui.

)* para receber as suas cartas são uns trabalhos, que se osenhor de ?almont não "osse tão bom e tão e#pedito como é, eu nãosabia o que havia de "azer. E para lhe escrever é ainda mais di"$cil.

e manhã não me atrevo, porque a 7amã está muito perto demim, e a cada momento entra no meu quarto. lgumas vezes posso

"az!&lo de tarde, com o prete#to de cantar ou tocar harpa( e mesmoassim é preciso interromper&me a cada linha para que ouçam queestou a estudar.

elizmente a minha criada de quarto adormece algumas vezesao serão, e eu digo&lhe que me deito muito bem sozinha, para queela se vá embora e me dei#e luz.

epois, tenho de me p%r debai#o dos cortinados, para quenão se possa ver a claridade, e para que ao menor ru$do eu possaesconder tudo na cama, se vier alguém. )empre queria que estivesseno meu lugar, para ver o que "azia= <em v! que é preciso amar muitopara "azer isto. En"im, o certo é que "aço tudo o que posso( e eu

dese'ava poder "azer ainda mais.

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J claro que não recuso dizer&lhe que o amo e que o amareisempre( nunca lho disse tão do "undo do coração( e ainda estázangado= o entanto, tinha&me dado a certeza, antes que eu lhodissesse, que isso bastava para o tornar "eliz. ão pode negar o quedisse: está nas suas cartas.

Embora eu 'á as não tenha, lembro&me disso como quando aslia todos os dias. E s* porque estamos longe um do outro 'á pensa demaneira di"erente= 7as esta aus!ncia não há de durar sempre. 7eueus, como eu sou in"eliz= E por sua causa, s* por sua causa=

prop*sito das suas cartas, espero que tenha guardado asque a 7amã me tirou, para lhas entregar( há de vir um tempo emque não este'a tão vigiada como agora, e então tornar&me&á a dartodas. 9omo serei "eliz, quando puder guardá&las sempre, sem queninguém tenha nada a ver com isso= gora é ao senhor de ?almontque as entrego, porque seria muito arriscado proceder de outramaneira( apesar disso nunca lhe dou nenhuma que não me "aça

pena.deus, meu querido amigo. mo&o de todo o meu coração.má&lo&ei toda a minha vida. Espero que 'á não este'a

zangado( e se estivesse certa disso, também 'á o não estaria.Escreva&me o mais depressa que puder, pois sinto que até lá estareisempre triste.

9astelo de. . ., TC de )etembro de CD .

CARTA LXXXIII

O VISCONDE DE VALMONT A PRESIDENTE DE TOURVEL

)uplico&vos, senhora, reatemos o nosso diálogo tãodesgraçadamente interrompido= 0ue eu possa acabar de vos provarquanto sou di"erente do odioso retrato que vos tinham "eito a meurespeito( que eu possa, principalmente, gozar ainda dessa amávelcon"iança que começáveis a testemunhar&me= 0ue de encantossabeis dar - virtude= e que maneira embelezais e tornais queridos

todos os sentimentos honestos= J essa a vossa sedução( é a mais"orte, a única, ao mesmo tempo poderosa e respeitável.)em dúvida basta ver&vos para que se dese'a agradar&vos(

ouvir&vos em meio dos indi"erentes, para que esse dese'o aumente.7as aquele que teve a "elicidade de vos conhecer melhor, que p%dealgumas vezes ler na vossa alma, depressa cede a um entusiasmomais nobre, e, penetrado de admiração e de amor, adora em v*s aimagem de todas as virtudes. 3alvez mais predestinado que outrospara as amar e as seguir, mas alheado delas por alguns erros que mehaviam arrastado, "ostes v*s que me apro#imastes, que de novo me"izestes sentir todo o seu encanto.

chais que é um crime esse novo amor> 9ondenareis a vossaobra>

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9ensurareis a v*s pr*pria o interesse que por ela podereissentir> 0ue mal se pode recear dum sentimento tão puro, e quedel$cias não poderá ele proporcionar>

ssusta&vos o meu amor porque o achais violento,arrebatado>

5odereis temperá&lo por um amor mais doce( não recuseis odom$nio que vos o"ereço, ao qual, 'uro, 'amais dei#arei de submeter&me, e que, ouso cr!&lo, não será inteiramente perdido para a virtude.0ue sacri"$cio poderia parecer&me penoso, com a certeza de que ovosso coração saberia dar&lhe o preço> 2nde está o homem tãodesgraçado que não saiba e#trair prazer das privaç+es que se imp+e(que não pre"ira uma palavra, um olhar concedidos, a todos os gozosque poderia roubar ou surpreender=

E pudestes supor que era eu esse homem= E tivestes receiode mim= h= 5or que não depende de mim a vossa "elicidade>

9omo eu me vingaria de v*s, tornando&vos "eliz= 7as esse

suave 'ugo não é a estéril amizade que o imp+e( para produzi&lo, s* oamor.

Esta palavra intimida&vos= E porqu!> ;ma dedicação maisterna, uma união mais "orte, um único pensamento, a pr*pria"elicidade, os pr*prios so"rimentos, que há em tudo isso de estranho- vossa alma> 3odavia, é isso o amor= 5elo menos esse que inspiraise que eu sinto= J ele principalmente que, calculando sem interesse,sabe apreciar as aç+es pelo seu mérito e não pelos seus resultados(tesouro inesgotável das almas sens$veis, tudo que é "eito por ele ouatravés dele se torna precioso.

Estas verdades tão "áceis de compreender, tão doces depraticar, que t!m de assustador> 0ue apreens+es pode causar&vosum homem sens$vel, a quem o amor 'á não permite outra "elicidadeque não se'a a vossa> J esse ho'e o meu único dese'o: sacri"icareitudo para o realizar, e#ceto o sentimento que o inspira( e seconsentirdes em partilhar esse sentimento, dirigi&lo&eis como vosaprouver. 7as não suportemos que ele nos divida, quando nosdeveria reunir. )e a amizade que me o"erecestes não é uma palavravã, se, como ontem me dissestes, é o sentimento mais doce que avossa alma p%de conhecer, se'a ela que regule as condiç+es entren*s, não me "urtarei aos seus mandatos.

7as, chamada a 'ulgar o amor, que ela consinta em ouvi&lo(uma recusa tornar&se&ia uma in'ustiça, e amizade não é in'usta.;m segundo encontro não terá mais inconvenientes do que o

primeiro: o acaso pode ainda "ornecer&nos a ocasião. 5odereismesmo ainda indicar o momento pr*prio. dmito que eu não tenharazão( não gostar$eis mais de convencer&me do que de combater&me> E duvidais da minha docilidade> )e um importuno não tivessevindo interromper&nos, talvez eu 'á me tivesse rendido inteiramente- vossa opinião( quem sabe até onde pode chegar o vosso poder>

everei diz!&lo> Esse poder invenc$vel, ao qual me entregosem ousar calcular a sua e#tensão, esse encanto irresist$vel, que vos

torna soberana dos meus pensamentos como das minhas aç+es,acontece&me algumas vezes receá&los. 5obre de mim=

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 3alvez eu deva antes temer esse encontro que vos peço= 3alvez depois, cativo das minhas promessas, eu me ve'a reduzido aabrasar&me num amor que eu sinto bem que não poderá e#tinguir&se, sem ousar mesmo implorar o vosso socorro= h= senhora, suplico&vos, não abuseis do vosso dom$nio= 7as qu!= )e assim vos sentirdes

mais "eliz, se por isso eu vos dever parecer mais digno de v*s, quemágoas não serão suavizadas por essas consoladoras idéias> )im,bem o sinto( "alar&vos ainda é dar&vos armas mais "ortes contra mim(é submeter&me mais inteiramente - vossa vontade. J mais "ácil ade"esa contra as vossas cartas( as palavras são as mesmas, mas"alta a vossa presença para lhes dar "orça. Entretanto, o prazer devos ouvir "az que eu arroste o perigo: terei ao menos a "elicidade detudo tentar por v*s, mesmo contra mim( e os meus sacri"$cios tornar&se&ão uma homenagem.

9onsidero&me "eliz por vos provar de mil maneiras, como demil modos o sinto, que sois v*s e sereis sempre o ob'eto mais caro ao

meu coração.

9astelo de..., TB de )etembro de CD .

CARTA LXXXIV

O VISCONDE DE VALMONT A CECÍLIA VOLANGES

?iu bem como ontem "omos contrariados. urante todo o dianão pude entregar&lhe a carta que tinha para si( não sei se ho'e serámais "ácil.

Geceio compromet!&la, pondo nisso mais zelo do quehabilidade( e não perdoaria a mim pr*prio uma imprud!ncia que lheseria "atal e causaria o desespero do meu amigo, tornando&a a sieternamente in"eliz. o entanto, conheço as impaci!ncias do amor(sei quanto deve ser penoso, na sua situação, suportar qualquerdemora na única consolação que possa e#perimentar nestemomento. H "orça de me ocupar do processo de a"astar osobstáculos, encontrei uma cu'a e#ecução será "ácil, se nisso puser

algum empenho. 4ulgo ter reparado que a chave da porta de seu quarto, que dápara o corredor, está sempre sobre a chaminé da sua 7amã.

 3udo se tornaria "ácil com essa chave, como está vendo( mas,- "alta dela, procurarei arran'ar&lhe uma parecida e que a substitua.

<astar&me&á, para isso, ter a outra uma hora ou duas - minhadisposição. evo achar "acilmente ocasião de a tirar, e para queninguém d! pela "alta, 'unto aqui uma, muito parecida, e ninguémnotará a di"erença, a menos que a e#perimentem, o que é poucoprovável. )erá preciso apenas que tenha o cuidado de lhe p%r uma"ita azul igual - que tem a outra.

eve ter essa chave em seu poder amanhã ou depois deamanhã, - hora do almoço, porque lhe será mais "ácil dar&ma nessa

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altura, e poderá voltar a p%&la no seu lugar - noite, que é quando sua7amã poderá dar&lhe mais atenção. 5osso entregar&lha na altura do

 'antar, se concordar com isto.9omo sabe, quando vamos do salão para a sala de 'antar, é

sempre 7adame de Gosemonde que vem em último lugar. Eu dar&

lhe&ei a mão. 3erá apenas de dei#ar o seu tear vagarosamente, ouentão dei#ar cair qualquer coisa, de maneira a "icar atrás de todos(nesse momento agarrará a chave, que eu lhe estenderei.

ão se esquecerá, logo que tenha a chave, de vir 'unto daminha velha tia, "azendo&lhe algumas car$cias. )e por acaso dei#arcair a chave, não lhe cause isso embaraço( eu "ingirei que é minha erespondo pelo resto.

"alta de con"iança da sua 7amã e a maneira dura como atrata autorizam&na a esta pequena "raude. lém do mais, é a únicamaneira de continuar a receber as cartas de ancenP, e de "azer queele receba as suas( qualquer outro meio é realmente demasiado

perigoso, poderia perder&vos aos dois sem recurso( e a minhaprudente amizade não se consolaria de o ter empregado.

;ma vez de posse da chave, restar&nos&ão algumasprecauç+es a tomar para evitar o ru$do da porta e da "echadura( masserá coisa "ácil. 5or bai#o do mesmo armário onde pus o papel,encontrará *leo e uma pena.

9omo vai ao seu quarto algumas vezes a horas em que estásozinha, aproveite para olear a "echadura e os gonzos. )* deve tercuidado em não dei#ar n*doas, que "ariam descon"iar. 5or isso serámelhor "azer esse trabalho - noite, porque, se o "izer com a atenção

de que a 'ulgo capaz, no dia seguinte de manhã não se notará nada.)e apesar de tudo alguém notar alguma coisa, não hesite emdizer que "oi o serralheiro do castelo. esse caso, será precisoespeci"icar o tempo e até as conversas que ele teve consigo( como,por e#emplo, que ele toma esse cuidado, para evitar a "errugem,com todas as "echaduras de que se não "az uso( pois está vendo quenão seria veross$mil ouvir esse barulho todo sem perguntar a causa.)ão estes pequenos pormenores que dão verossimilhança, e averossimilhança "az que as mentiras não tenham conseqS!ncias,tirando o dese'o de as veri"icar.

epois de ter lido esta carta, peço&lhe que volte a l!&la, e,

mesmo, que a estude em pormenor: primeiro, porque é preciso saberbem o que se quer "azer bem( em seguida, para ter a certeza de quenão omiti nada.

5ouco habituado a usar por minha conta destas habilidades,não tenho "eito delas grande uso. oi preciso até a minha vivaamizade por ancenP, e o interesse que me inspira, para me resolvera servir&me destes processos, aliás bem inocentes. 3enho *dio a tudoque se pareça com enganar o pr*#imo( é este o meu caráter. 7as asvossas in"elicidades tocaram&me a tal ponto, que tentarei tudo parasuavizá&las.

9omo deve imaginar, depois desta combinação entre n*s ser&

me&á mais "ácil conseguir, com ancenP, o encontro que ele dese'a.7as por agora não lhe "ale nisto( não "aria senão aumentar a sua

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impaci!ncia, e não chegou ainda o momento de a satis"azer. eveantes, segundo creio, empregar os seus cuidados em acalmá&la, depre"er!ncia a agravá&la. este respeito, con"io na sua delicadeza.

deus, minha bela pupila. me um pouco o seu tutor, esobretudo empregue com ele docilidade( será bem recompensada

por isso. 2cupo&me da sua "elicidade e pode crer que nela encontreitambém a minha.

TI de )etembro de CD .

CARTA LXXXV

A MARQUESA DE MERTEUIL AO VISCONDE DE VALMONT

?ai en"im tranquilizar&se, e, sobretudo, "azer&me 'ustiça.Escute, e não me con"unda com as outras mulheres. 9heguei

ao "im da minha ventura com 5révan( ao "im= 9ompreende bem oque isto quer dizer> gora o ?isconde vai 'ulgar qual de n*s, eu ouele, se poderá gabar. narração não é tão agradável como a ação(por outro lado, não seria 'usto que, enquanto o ?isconde nada mais"ez que raciocinar bem ou mal sobre este assunto, e#tra$sse deletanto prazer como eu, que empreguei tempo e trabalho.

Entretanto, se tem algum grande golpe de audácia ae#ecutar, se pretende tentar qualquer empreendimento em que esse

rival perigoso lhe "aça sombra, pode vir. Ele dei#ou&lhe o campo livre,pelo menos por algum tempo( talvez mesmo não torne a erguer&seda prostração em que o lancei.

9omo o ?isconde é "eliz em ter&me por amiga= )ou para siuma "ada ben"aze'a= Enquanto vai de"inhando longe da beleza que oatrai, eu digo uma palavra, e de novo se encontra 'unto dela. ese'avingar&se de uma mulher que lhe "urta( eu marco o lugar onde deve"eri&la, e entrego&a - sua merc!. 5or "im, para a"astar do combate umconcorrente tem$vel, sou ainda eu que o inspiro e o ponho no maisalto lugar. a verdade, se não passa a vida a agradecer&me, éporque é um ingrato. 7as volto - minha aventura, desde o in$cio.

2 encontro, marcado em voz alta, - sa$da da Npera, "oiouvido, como eu tinha esperado. 5révan compareceu( e quando a7arechala lhe disse delicadamente que se sentia "eliz por o ver duasvezes seguidas nas suas recepç+es, ele teve o cuidado de responderque desde a tarde de terça&"eira tinha des"eito mil compromissospara poder assim dispor daquela noite. bom entendedor...

o entanto, como eu dese'ava ter a certeza se era ou não o*er &arta 044*er &arta 044 verdadeiro ob'etivo daquela lison'eira solicitude, quis obrigar o novoapai#onado a escolher entre mim e o seu gosto dominante. eclareique não 'ogava( de "ato, ele encontrou, por seu lado, mil prete#tos

para não 'ogar. E o meu primeiro triun"o "oi sobre o lansquené.

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 3omei a meu cargo o bispo de... para ter com quemconversar( escolhi&o em virtude da sua ligação com o her*i do dia, aquem eu queria dar toda a "acilidade de me abordar. o mesmotempo, sentia&me - vontade por ter uma testemunha respeitávelque, em caso de necessidade, poderia depor sobre o meu

comportamento e os meus prop*sitos. Esta combinação deuresultado.epois das conversas vagas do costume, 5révan, tendo&se

tornado o guia da conversação, "oi tomando diversos tons, parae#perimentar o que me poderia agradar. Gecusei o do sentimento,como não acreditando nele( com o meu aspecto sério, "iz deter a sua

 'ovialidade, que me pareceu demasiado ligeira para um in$cio( bai#oude tom, tomando o da amizade discreta( e "oi sob esta bandeiravulgar que começamos o nosso rec$proco ataque.

a altura da ceia, o bispo não descia( 5révan o"ereceu&me obraço e - mesa tomou naturalmente o lugar a meu lado. J preciso

ser 'usto: soube sustentar com habilidade a nossa conversaparticular, parecendo no entanto ocupar&se da conversa geral, daqual aparentemente ocupava o posto central. H sobremesa, "alou&sede uma peça nova que na segunda&"eira seguinte devia ir - cena no

 3eatro ranc!s. "etei algum pesar por não ter marcado o meucamarote( ele o"ereceu&me o seu, que recusei, como é da pra#e( aoque ele respondeu muito agradavelmente que eu não tinha ouvidobem( que com certeza não "aria o sacri"$cio do seu camarote aalguém que ele não conhecia, mas que somente me avisava de que asenhora 7arechala disporia dele.

Ela prestou&se a este grace'o e eu aceitei.0uando subimos ao salão, ele pediu, como pode imaginar, umlugar nesse camarote( e como a 7arechala, que o trata com muitabondade, lho prometeu se ele tivesse 'u$zo, aproveitou a ocasiãopara uma daquelas conversaç+es de duplo sentido, para as quaistem um talento que o ?isconde 'á me gabou. e "ato, tendo&se postode 'oelhos diante da 7arechala, como uma criança submissa, diziaele, sob o prete#to de lhe pedir a opinião e de implorar o seu au#$lio,disse ainda muitas coisas lison'eiras e ternas, as quais me era "ácilsupor que se dirigiam a mim.

9omo havia ainda várias pessoas que não tomavam parte no

 'ogo depois da ceia, a conversa "oi mais geral e menos interessante(mas os nossos olhos "alaram muito. 2s nossos olhos, disse eu( masdeveria dizer os dele, pois os meus tiveram s* uma linguagem, que"oi a da surpresa. Ele teve ocasião para pensar que eu o admirava eme ocupava e#cessivamente do e"eito prodigioso que causava sobremim. 4ulgo que o dei#ei muito satis"eito( pelo meu lado, eu nãoestava menos contente.

a segunda&"eira seguinte, "ui ao 3eatro ranc!s, comot$nhamos combinado. pesar da sua curiosidade literária, caro?isconde, nada posso dizer&lhe do espetáculo, a não ser que 5révantem um talento maravilhoso para o galanteio, e que a peça caiu( eis

tudo o que lhe posso dizer. Era com pena que eu via "indar o serão,que realmente me agradava muito. E para o prolongar, convidei a

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7arechala a vir cear comigo( o que me "orneceu prete#to parapropor o mesmo ao amável galanteador, que pediu apenas o tempopara ir, correndo, a casa das 9ondessas de <..., a "im de se libertarde um compromisso. Este nome reavivou toda a minha c*lera( viclaramente que ele ia começar as con"id!ncias. Gecordei&me dos

seus prudentes conselhos e prometi a mim pr*pria... continuar aaventura. Estava certa de que o emendaria de tão perigosatend!ncia.

Estranho ao meu grupo, que naquela noite era pouconumeroso, ele devia&me as atenç+es que são de uso neste caso. 5orisso, quando "omos cear, o"ereceu&me a mão. Eu tive a mal$cia, aoaceitá&la, de p%r na minha um ligeiro "r!mito, e de conservar,enquanto andávamos, os olhos bai#os e a respiração alta.

 3inha o aspecto de pressentir a minha derrota e de temer omeu vencedor. Ele notou&o - maravilha( e logo o traidor mudou detom e de maneira. e galanteador, tornou&se meigo. 2s prop*sitos

que me dirigia eram mais ou menos os mesmos: as circunst8ncias"orçavam&no a isso. 7as o seu olhar, que se tornara menos vivo, eramais acariciador( as in"le#+es da sua voz, mais doces( o seu sorriso 'ánão era o da "inura, mas o da satis"ação.

En"im, nas palavras, em que pouco a pouco se e#tinguia o"ogo de in$cio, o esp$rito deu lugar - delicadeza. E agora queroperguntar&lhe: "aria melhor do que isto>

5elo meu lado, dei&me ares de pensativa, a tal ponto que,sendo "orçado a notá&lo, mo censurou. 3ive então a habilidade de mede"ender desastradamente e de lançar sobre 5révan um olhar rápido,

mas t$mido e con"undido, de prop*sito para o levar a crer que todo omeu receio era que ele adivinhasse a causa da minha preocupação.epois da ceia, aproveitei a ocasião em que a boa 7arechala

contava uma das hist*rias que conta sempre, para me recostar naotomana, naquela atitude de abandono que se presta aos sonhosternos. ão me desagradava que 5révan me visse assim( de "ato, elehonrou&me com uma atenção particular. 2 ?isconde imagina decertoque os meus t$midos olhares não ousavam buscar os do meuvencedor( mas, dirigidos para ele da maneira mais humilde, logo mederam a certeza de que eu obtinha o e"eito que pretendia produzir.altava ainda persuadi&lo de que o mesmo encantamento me

penetrava( por isso, quando a 7arechala anunciou que ia retirar&se,e#clamei numa voz terna e indolente: 62h= 7eu eus= E eu estavaaqui tão bem=6 3odavia levantei&me( mas, antes de me separar dela,perguntei&lhe quais os seus pro'etos para ter um prete#to de lhedizer os meus e de dar a saber que estaria em minha casa no diaposterior ao seguinte.

)eparámo&nos por "im.Então, pus&me a re"letir. ão duvidava que 5révan

aproveitasse a espécie de entrevista que eu acabava de lhe marcar(que viesse bastante cedo para me encontrar s*, e que me atacassecom vivacidade. 7as estava certa também de que, dada a minha

reputação, ele me não trataria com aquela ligeireza que, por poucohábito que se tenha, se emprega apenas com as mulheres dadas -

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aventura ou com as que não t!m e#peri!ncia( e tinha a vit*ria certase ele pronunciasse a palavra amor, ou sobretudo se tivesse apretensão de a obter de mim.

J tão c%modo ter de lidar com as pessoas de princ$pios=lgumas vezes é um pobre diabo apai#onado que nos

desconcerta pela sua timidez, ou nos atordoa com os seus "ogosostransportes( é uma "ebre que, como a outra, dá ardor e cala"rios, ealgumas vezes varia nos sintomas. 7as adivinha&se tão "acilmentequando o plano é traçado de antemão= chegada, a atitude, o tom,as palavras, tudo isso eu conhecia desde a véspera.

ão lhe descreverei por isso a nossa conversação, que o?isconde adivinha "acilmente. ote apenas que, na minha "ingidade"esa, eu a'udava&o tanto quanto podia( embaraço, para lhe dartempo a que "alasse( raz+es más, para que pudessem sercombatidas( receio e descon"iança, para provocar os protestos( e dasua parte o perpétuo estribilho( peço&lhe apenas uma palavra( e da

minha um sil!ncio, comunicando&lhe uma e#pectativa que "aziacrescer o seu dese'o( e, através de tudo isso, a mão que se toma cemvezes, que se retira sempre e nunca se recusa. 5oderia passar&seassim um dia: passamos uma hora mortal. Estar$amos talvez aindanisso se não ouv$ssemos o ru$do de uma carruagem entrando nopátio. Esse "eliz contratempo tornou, como é natural, as suasinst8ncias mais vivas( e eu, vendo chegado o momento em que 'ánada me podia surpreender, depois de me ter preparado para umlongo suspiro, concedi a preciosa palavra.

9omeçaram a ser anunciadas as visitas e pouco depois

rodeava&nos numerosa sociedade.5révan pediu&me para vir no dia seguinte de manhã e euconsenti( mas, cuidando da minha de"esa, ordenei - criada de quartoque durante a visita "icasse no meu quarto de dormir, donde, comosabe, se v! tudo o que se passa no quarto de vestir, e "oi neste que orecebi. 2 diálogo correu livremente, e como ambos t$nhamos omesmo dese'o, breve nos pusemos de acordo( mas era precisodes"azer&nos daquele espectador importuno( era a$ que eu queriachegar.

Então, pintando&lhe a meu belo prazer o quadro da minha vidainterior, persuadi&o "acilmente de que não chegar$amos a encontrar

um momento de liberdade, que dev$amos olhar como uma espéciede milagre aquele de que t$nhamos gozado na véspera, e que aindaassim tivera perigos e#cessivos para que eu me e#pusesse a eles,pois a todo o instante alguém poderia entrar no salão. ão meesqueci de acrescentar que os hábitos da minha casa estavam assimestabelecidos porque, até ao presente, nunca me tinhamcontrariado( e insisti ao mesmo tempo na impossibilidade de osmudar, porque seria comprometer&me aos olhos dos meusservidores. Ele simulou entristecer, "icar amuado, dizer&me que erabem "rágil o meu amor( e o ?isconde adivinha quanto tudo aquilo mecomovia= 7as, querendo vibrar o golpe decisivo, chamei as lágrimas

em meu socorro.

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oi e#atamente o Zaire, vous pleurezl. 4ulgando dominar&se, ena esperança, a"etou estar possu$do de todo o amor de 2rosmane.5assado o lance teatral, voltamos -s combinaç+es. ão podendo serdurante o dia, pensamos escolher uma noite. 7as o meu porteirotornava&se um obstáculo intranspon$vel e eu "ui de opinião que não

se podia pensar em suborná&lo.Ele prop%s&me a pequena porta do 'ardim: mas eu tinha&oprevisto e inventei um cão que, manso e silencioso de dia, era umverdadeiro dem%nio durante a noite. "acilidade com que eu entravaem todos aqueles pormenores era de molde a e#citá&lo, o que deuem resultado propor&me o e#pediente mais rid$culo, e "oi esse que euaceitei.

5rimeiro "alou&me dum criado dele, que era tão discreto comoele pr*prio: nisto não me enganava 5révan, pois, em tal matéria,patrão e criado valiam o mesmo. Eu daria uma grande ceia emminha casa, - qual ele seria convidado. 9hegado o momento,

despedir&se&ia, simulando sair s*.2 hábil con"idente chamaria a carruagem, abriria a porta( e

ele, 5révan, em vez de subir, esquivar&se&ia com destreza. 2 cocheironão chegaria a dar por nada( deste modo todos 'ulgariam que eletinha sa$do, e entretanto, reentrando em minha casa, tratar&se&iaapenas de conhecer o caminho mais curto para o meu quarto.9on"esso que a minha primeira di"iculdade "oi de encontrar, contratal pro'eto, raz+es su"icientemente más para que ele tivesse apretensão de as destruir. Ele respondeu dando&me e#emplos(segundo ele, não havia processo mais vulgar. 4á várias vezes se

servira dele. Era mesmo o de que "azia mais uso, como o menosperigoso.)ub'ugada por estas raz+es irrespond$veis, revelei&lhe, cheia

de candura, que havia uma escada secreta que conduzia perto domeu quarto de vestir( eu dei#aria "icar a chave na porta e ser&lhe&iaposs$vel entrar e esperar, sem grandes riscos, que as criadas serecolhessem( e, para dar maior verossimilhança ao meuconsentimento, e#igia que o momento do encontro "osse, semdiscussão, de uma submissão per"eita. Era preciso ter 'u$zo, oh=muito 'u$zo= En"im, eu queria apenas provar&lhe o meu amor, masnão satis"azer o seu.

sa$da, esquecia&me dizer&lhe, seria pela pequena porta do 'ardim( bastava esperar o romper do dia, o cão não daria sinal.Hquela hora não passava vivalma, os criados estariam no sono

mais pro"undo. ão se admire de tanto racioc$nio disparatado( pensena nossa situação rec$proca. 0ue necessidade t$nhamos de umamelhor combinação> Ele queria apenas que tudo viesse a saber&se,eu estava certa de que ninguém o saberia. 9ombinamos para o diaposterior ao seguinte.

Gepare o ?isconde que era um assunto combinado, e queninguém tinha ainda visto 5révan na minha companhia. Encontro&o acear em casa de uma das minhas amigas, ele o"erece&me o seu

camarote para uma peça nova, eu aceito nele um lugar.

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9onvido a minha amiga a cear, durante o espetáculo e diantede 5révan( quase não posso dispensar&me de o convidar. Ele aceitae, dois dias depois, "az&me a visita e#igida pelas boas normas. Jcerto que volta a visitar&me no dia seguinte de manhã( mas, além deque as visitas de manhã não contam, s* eu podia 'ulgar esta

demasiado apressada. e "ato, coloco&o no número das pessoas queme estão menos ligadas, com um convite escrito para uma ceia decerim%nia. 5osso bem dizer como nnette e, todavia, eis tudo=9hegado o dia "atal, o dia em que eu devia perder a minha virtude ea minha reputação, dei as minhas instruç+es - "iel ?it*ria e ela p%&lasem e#ecução como vai ver.

Entretanto, chegou a noite. 3inham 'á entrado muitosconvidados, quando anunciaram 5révan. Gecebi&o "azendo notar apolidez que havia entre n*s. 9oloquei&o ao lado da 7arechala, comoacentuando que era por intermédio dela que nos t$nhamosconhecido. ceia não produziu mais do que um bilhetinho, que o

discreto apai#onado encontrou meio de me entregar, e que queimeicon"orme o meu costume. nunciava&me que podia contar com ele( eesta palavra essencial era rodeada de todas as palavras parasitas,como amor, "elicidade, etc., que nunca "altam a "estas destanatureza.

H meia&noite, terminados os 'ogos, propus uma curtamaced%nia.

2 meu duplo pro'eto era "avorecer a evasão de 5révan e aomesmo tempo torná&la notada, o que não podia dei#ar de acontecer,dada a sua reputação de 'ogador. 5or outro lado, todos viriam a

lembrar&se de que eu não tivera pressa de "icar s*.2 'ogo durou mais do que eu pensara. 2 diabo tentava&me eeu sucumbia ao dese'o de ir consolar o impaciente prisioneiro.

Encaminhava&me para a minha perda, quando re"leti que, logoque inteiramente me rendesse, dei#aria de ter sobre ele o dom$niobastante para o manter vestido com a dec!ncia necessária aos meuspro'etos. 3ive a "orça de resistir. Getrocedi e voltei, bastanteaborrecida( *#lgumas pessoas ignoram talve6 que uma maced@nia é umcon-unto de vários -ogos de a6ar, entre os quais cada -ogador tem o direito deescolher quando lhe pertence dar cartas > uma das invenç3es do séculoa retomar o meu lugar naquele 'ogo que não "indava mais. 5or "im lá

acabou, e todos se "oram embora.icando s*, chamei as criadas, despi&me muito depressa, edespedi&as.

Está a ver&me, ?isconde, vestida ligeiramente, caminhandocom passo t$mido e circunspeto, e com a mão mal segura abrir aporta ao meu vencedor> 7al que me viu, o rel8mpago não seria maisrápido. 0ue digo eu> ui vencida, absolutamente vencida, antes deter podido dizer uma palavra para o deter ou me de"ender. Ele quisem seguida tomar uma situação mais c%moda e mais adequada -scircunst8ncias. maldiçoava o vestuário que, dizia ele, o a"astava demim, e queria combater&me com armas iguais. 7as a minha e#trema

timidez op%s&se ao pro'eto, e as minhas ternas car$cias não lhederam tempo. 2cupou&se de outra coisa.

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2s seus direitos eram a dobrar e as suas pretens+es voltaram.Então eu disse&lhe: 6Escute: até aqui teve assunto para uma

agradável narrativa a "azer -s duas 9ondessas de <... , e a muitasoutras( mas eu gostaria de saber como lhes vai contar o "im destaaventura.6 o "alar assim, pu#ei o cordão da campainha com toda a

"orça. 9hegara a minha vez e o gesto "oi mais rápido do que a suaresposta. 7al tinha ainda balbuciado, quando ouvi ?it*ria acudir, echamar os criados que escondera no seu quarto, como eu lheordenara. Então, tomando o meu tom de rainha, continuei, elevandoa voz: 6)aia, senhor, e não torne a aparecer diante de mim.6 estemomento, o grupo dos criados entrou.

2 pobre 5révan perdeu a cabeça e, 'ulgando ver uma ciladano que era no "undo apenas um grace'o, levou a mão - espada.

oi o mal que "ez, pois um dos meus criados, vigoroso evalente, agarrou&o pelo meio do corpo e derrubou&o. 9on"esso quesenti um terror mortal. ritei&lhes que parassem e ordenei que lhe

dei#assem livre a retirada, certi"icando&se apenas se ele sa$a daminha casa. 2s criados obedeceram, mas entre eles era grande orumor. Fndignavam&se que alguém tivesse "altado ao respeito - suavirtuosa senhora. 3odos acompanharam o in"eliz cavaleiro, comalgazarra e esc8ndalo, como eu dese'ava. )* ?it*ria "icou eocupamo&nos durante esse tempo a reparar a desordem do meuleito.

2s criados tornaram a subir sempre em tumulto( e eu, aindamuito emocionada, perguntei&lhes por que "elicidade estavam aindatodos levantados( respondeu&me ?it*ria, contando que tinha dado de

cear a suas das suas amigas, que tinham "eito "esta no quarto delas,en"im, tudo o que t$nhamos combinado.gradeci a todos e mandei&os retirar, ordenando a um deles

que "osse imediatamente chamar o meu médico. 5areceu&me queestava autorizada a temer o e"eito do meu susto mortal( além disso,era um meio seguro de dar curso e celebridade - aventura.

2 médico veio de "ato, lamentou&me, e ordenou&me repouso.epois, ordenei a ?it*ria que logo de manhã "osse tagarelar

com a vizinhança. 3udo decorreu tão bem que, antes do meio&dia e assim que

consenti que abrissem as 'anelas do meu quarto, 'á tinha - cabeceira

uma das minhas vizinhas, muito devota, para saber a verdade e ospormenores daquela horr$vel aventura. ui obrigada a desolar&mecom ela, durante uma hora, sobre a corrupção destes tempos. ;mmomento depois recebi da 7arechala o bilhete que 'unto aqui. 5or"im, antes das cinco horas, vi chegar, com grande espanto meu, osenhor... ?inha, segundo me disse, apresentar&me as suasdesculpas, por um o"icial do seu regimento ter podido "altar&me aorespeito a tal ponto. )oubera&o quando estava 'antando em casa da7arechala e tinha imediatamente mandado ordem a 5révan para quese entregasse - prisão.

5edi que lhe perdoasse e ele recusou. 5ensei então que, para

lhe dar a minha cumplicidade, era preciso resignar&me pelo meu lado

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e a"etar uma atitude r$gida. 7andei "echar a minha porta e dizer queestava incomodada.

J - minha solidão que o ?isconde deve esta longa carta.Escreverei uma a 7adame de ?olanges, que com certeza há

de "azer leitura pública, e onde verá esta hist*ria tal como deve ser

contada.Esquecia&me de dizer que <elleroche está indignado, e querabsolutamente bater&se com 5révan. 5obre rapaz= elizmente tereitempo de lhe acalmar os nervos. Enquanto espero, vou repousar osmeus, que estão "atigados de escrever.

deus, ?isconde.

TO de )etembro de CD , - noite.

*5 comandante do regimento no qual servia o senhor $révan

CARTA LXXXVI

A MARECHALA DE... À MARQUESA DE MERTEUIL

L<ilhete 'unto - precedente17eu eus= 0ue me contais, minha querida amiga> J poss$vel

que 5révan se'a capaz de semelhantes abominaç+es= E logo com aminha amiga= o que uma pessoa se e#p+e= 7as então nem em suacasa uma pessoa está em segurança> a verdade, taisacontecimentos consolam&me de ser velha. 7as do que nunca mepoderei consolar, é de ter sido em parte causadora de terdesrecebido semelhante monstro em vossa casa. 5rometo&vos que, se oque me disseram é verdade, ele não tornará a p%r os pés em minhacasa. 3odas as pessoas honestas procederão assim com ele, se

"izerem o que é devido.

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isseram&me que estáveis muito doente, e estou inquieta pelavossa saúde. 5eço&vos que me deis as vossas dese'adas not$cias( ouque mas mandeis dar por uma das vossas criadas, se v*s mesma onão puderdes "azer. ão vos peço mais do que uma palavra paraminha tranqSilidade. )e não "ossem os meus banhos, que o médico

não me permite interromper, teria ido esta manhã a vossa casa( eesta tarde tenho de ir a ?ersailles, sempre por causa do assunto domeu sobrinho.

deus, minha querida amiga( conte com a minha sinceraamizade por toda a vida.

 5aris, TO de )etembro de CD .

CARTA LXXXVII

A MARQUESA DE MERTEUIL A MADAME DE VOLANGES

Escrevo&vos do meu leito, querida e boa amiga. 2 maisdesagradável dos acontecimentos, e o mais imposs$vel de prever,p%s&me doente de susto e de tristeza. ão é que eu tenha de mecensurar por algum motivo( mas é sempre tão penoso para umamulher honesta, e que conserva a modéstia que convém ao seuse#o, "i#ar sobre si as atenç+es públicas, que eu daria tudo nomundo para ter podido evitar esta in"eliz aventura, e não sei ainda se

decidirei ir para o campo, esperar que tudo tenha esquecido.?ou contar&vos de que se trata.Encontrei em casa da 7arechala de... um tal senhor de

5révan, que decerto conheceis de nome, e que eu não conhecia deoutro modo. 7as, encontrando&o nessa casa, estava bem autorizada,parece&me, a 'ulgá&lo boa companhia. 3em certa eleg8ncia de "igurae pareceu&me inteligente. 2 acaso e o aborrecimento do 'ogodei#aram&me s* entre ele e o bispo de..., enquanto todos os outrosconvidados 'ogavam o lansquené. 9onversamos os tr!s até - hora daceia. H mesa "alou&se de uma novidade teatral, o que lhe deu ense'oa o"erecer o seu camarote - 7arechala, que aceitou( e "icou

combinado que eu teria lá um lugar. Era para segunda&"eira passada,no 3eatro ranc!s. 9omo a 7arechala vinha cear comigo - sa$da doespetáculo, propus -quele senhor que a acompanhasse, o que ele"ez. ois dias passados "ez&me uma visita que se passou nasconversas do costume, sem que houvesse absolutamente nada anotar. o dia seguinte veio ver&me de manhã, o que me pareceu umpouco apressado( mas 'ulguei que, em vez de lho "azer sentir pelaminha maneira de o receber, valia mais adverti&lo pela minhadelicadeza de que não estávamos ainda tão intimamente ligadoscomo ele parecia supor.

5ara isso enviei&lhe, nesse mesmo dia, um convite muito seco

e muito cerimonioso para uma ceia que dei anteontem. ão lhe dirigia palavra quatro vezes em toda a noite( e ele pelo seu lado retirou&se

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logo que acabou de 'ogar. Aaveis de convir que até ali nada haviaque parecesse conduzir a uma aventura.

epois do 'ogo, houve ainda uma maced%nia que durou atéperto das duas horas( e "inalmente "ui para a cama.

Aavia pelo menos uma mortal meia hora que as minhas

criadas estavam recolhidas, quando ouvi ru$do no meu quarto.bri o cortinado cheia de susto e vi um homem entrar pelaporta que conduz ao quarto de vestir. )oltei um grito agudo( ereconheci, - luz da minha lamparina, esse senhor de 5révan, que,com uma ousadia inconceb$vel, me disse que não me alarmasse( queia esclarecer&me o mistério da sua conduta e me suplicava que não"izesse ru$do algum. o "alar assim, acendia uma vela.

Eu estava a tal ponto assustada que nem podia "alar. 2 seudesembaraço e tranqSilidade petri"icavam&me ainda mais, se époss$vel. 7as não tinha ainda dito duas palavras, 'á eu vira qual era opretendido mistério( e a minha única resposta "oi( como podeis crer,

pu#ar o cordão da campainha.5or uma incr$vel "elicidade, todos os criados se tinham reunido

no quarto de uma das minhas criadas, e não estavam ainda deitados. minha criada de quarto, que, dirigindo&se aos meus aposentos, meouviu "alar com e#altação, "icou horrorizada, e chamou toda aquelagente. 5odeis imaginar o esc8ndalo= 2s criados estavam "uriosos(houve um momento em que um deles queria matar 5révan. 9on"essoque, nesse momento, me senti "eliz por ter quem me au#iliasse.Ge"letindo agora, gostaria mais que s* a minha criada de quartotivesse acudido( teria sido su"iciente, e talvez se pudesse ter evitado

o ru$do, que me a"lige.Em vez disso, o tumulto despertou os vizinhos, os criados"alaram, e desde ontem a novidade corre todo 5aris. 2 senhor de5révan está preso por ordem do comandante do seu regimento, queteve a honestidade de passar por minha casa para me apresentardesculpas. Esta prisão vai ainda aumentar o ru$do( mas não pudeconseguir que "osse de outra maneira. cidade e a corteinscreveram&se - minha porta, que está "echada para toda a gente.s poucas pessoas que vi disseram&me que me "aziam 'ustiça e que aindignação contra o senhor de 5révan tinha chegado ao cúmulo. Jcerto que ele o merece, mas nem por isso a aventura dei#a de ser

muito desagradável.lém do mais, esse homem tem com certeza alguns amigos, eesses amigos devem ser maus( quem sabe, quem poderá saber oque irão inventar para meu pre'u$zo> 7eu eus, como uma mulher

 'ovem é in"eliz= )em ter "eito nada, tem de se p%r ao abrigo damaledic!ncia( e é preciso ainda sobrepor&se - calúnia.

izei&me, peço&vos, o que ter$eis "eito se estivésseis no meulugar( en"im, tudo o que pensais. J sempre de v*s que recebo asmais doces consolaç+es e os mais prudentes conselhos( por isso é dev*s que mais gosto de os receber.

deus, minha querida e boa amiga( conheceis os sentimentos

que para sempre me prendem a v*s. <ei'o a vossa adorável "ilha.

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5aris, TX de )etembro de CD .

TERCEIRA PARTE

CARTA LXXXVIIICECÍLIA VOLANGES AO VISCONDE DE VALMONT

pesar de todo o prazer que tenho, senhor, em receber ascartas do 9avaleiro ancenP, e se bem que não dese'e menos do queele que nos possamos voltar a ver, sem que nos perturbem, nãoousei no entanto "azer que me haveis prometido.

Em primeiro lugar, é demasiado perigoso: a chave que quereisque ponha no lugar da outra assemelha&se&lhe bastante na verdade:contudo, não dei#a de haver certa di"erença, e a 7amã repara em

tudo, dá por tudo. 5ara mais, se bem que ainda não tenha sidoutilizada desde que aqui estamos, bastava uma "alta de sorte( e sedessem por isso, estaria perdida para sempre.

epois, isso parece&me muito mal( mandar "azer uma chavedupla é demasiada ousadia= J certo que ter$eis a bondade de vosencarregardes disso( mas, mesmo assim, se o viessem a saber, acensura e a "alta recairiam sobre mim, visto que seria por mim que oter$eis "eito. En"im, tentei duas vezes apoderar&me dela, ecertamente teria sido bastante "ácil se se tratasse de outra coisa(mas não sei porqu! de ambas as vezes me pus a tremer e nunca tivecoragem. 5or isso creio que é melhor "icar como estamos.

)e tiverdes a bondade de continuar tão prestável como atéaqui, sempre encontrareis processo de me entregar uma carta.

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7esmo quando da última, sem o azar que num certomomento vos obrigou a a"astar&vos de repente, ter&nos&ia sido muito"ácil.

)into bem que não podeis, como eu, ocupar&vos disso apenas(mas pre"iro ter paci!ncia e não arriscar tanto. Estou certa de que o

senhor ancenP pensaria como eu: porque sempre que ele dese'avaqualquer coisa que me custasse demasiado, acabava por ceder.Entregar&vos&ei, ao mesmo tempo que esta carta, a vossa, a

do senhor ancenP e a vossa chave. ão vos estou menosreconhecida por todas as atenç+es para comigo e suplico&vos quecontinueis a dispensá&las. J bem verdade que sou muito in"eliz, esem v*s s!&lo&ia ainda muito mais: mas, apesar de tudo, trata&se deminha mãe( é preciso ter paci!ncia. E desde que o senhor ancenPcontinue a amar&me, e v*s não me abandoneis, talvez venhamtempos mais "elizes.

Entretanto, tenho a honra de ser, senhor, cheia de

reconhecimento, a vossa muito humilde e obediente serva.

TX de )etembro de CD .

CARTA LXXXIX

O VISCONDE DE VALMONT AO CAVALEIRO DANCENY 

)e o seu caso não progride tão depressa como dese'a, meuamigo, não é comigo que se deve zangar. 3enho mais de umobstáculo a vencer. vigil8ncia e a severidade de 7adame de?olanges não são os únicos( a sua 'ovem amiga também me criaalguns. )e'a "rieza ou timidez, nem sempre "az o que lhe aconselho(e creio no entanto saber melhor do que ela o que se deve "azer.

 3inha encontrado um meio simples, c%modo e seguro, de lheentregar as cartas e até de "acilitar, mais tarde, as entrevistas que omeu amigo dese'a( mas não pude decidi&la a utilizá&lo.

Estou tanto mais a"lito, quanto é certo que não ve'o outropara o apro#imar dela( e que, até por causa da vossa

correspond!ncia, receio incessantemente que nos comprometamosos tr!s.2ra, deve imaginar que não quero correr esse risco, nem que

ambos a ele se e#ponham.9ontudo "icaria verdadeiramente penalizado se a "alta de

con"iança da sua amiguinha me impedisse de vos ser útil: talvez omeu amigo "izesse bem em lhe escrever nesse sentido. ?e'o o quedese'a "azer, é a si que cabe decidir( porque não basta ser prestávelaos amigos, é também preciso s!&lo da maneira que lhes agrada.5oderia ser também um processo de se assegurar dos sentimentosque ela lhe dedica( porque a mulher que teima numa opinião não

ama tanto como diz.

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ão que suspeite da inconst8ncia a sua eleita( mas é muitonova( tem muito medo da 7amã que, como sabe, procura apenaspre'udicá&lo( e seria talvez perigoso dei#ar passar muito tempo sem aocupar a seu respeito.

o entanto, não se inquiete muito com o que lhe digo. o

"undo, não tenho nenhum motivo de descon"iança( é apenas asolicitude da amizade.ão me alongo mais porque tenho alguns assuntos meus a

cuidar. ão estou tão adiantado como o meu amigo( mas amo com amesma "orça, e isso consola( e mesmo que não tenha !#ito pelaminha parte, se conseguir ser&lhe útil, darei sempre por bemempregado o meu tempo.

deus, meu amigo.

9astelo de..., TX de )etembro de CD .

CARTA XC

A PRESIDENTE DE TOURVEL AO VISCONDE DE VALMONT

ese'o muito, senhor, que esta carta não vos "aça so"rer( mas,se assim não "or, que ao menos a vossa dor se'a suavizada pela quee#perimento ao escrev!&la. eveis conhecer&me o bastante,presentemente, para estardes bem certo de que o meu dese'o é não

vos magoar( mas v*s, sem dúvida, não querer$eis tambémmergulhar&me num desespero eterno. )uplico&vos pois, em nome daterna amizade que vos prometi( em nome até dos sentimentosporventura mais vivos, mas certamente não mais sinceros, quetendes por mim, que não voltemos a ver&nos( deveis partir. E até lá,evitemos sobretudo essas conversas particulares e demasiadoperigosas, durante as quais, por qualquer "orça inconceb$vel, semnunca conseguir dizer&vos o que quero, passo o tempo a escutar oque não deveria ouvir.

inda ontem, quando viestes 'untar&vos a mim no parque, eutinha como único pro'eto dizer o que ho'e vos escrevo( e que "iz,

a"inal, senão ocupar&me do vosso amor>... do vosso amor, ao qualnunca poderei corresponder= h= por piedade, a"astai&vos de mim=ão receeis que a aus!ncia altere os meus sentimentos por

v*s: como conseguiria venc!&los, quando 'á nem tenho coragem paraos combater> 9omo vedes, digo&vos tudo( temo menos con"essar aminha "raqueza do que sucumbir a ela. 5erdi o dom$nio dossentimentos, mas conservarei o das aç+es( sim, conservá&lo&ei, estouresolvida a isso( mesmo - custa da vida.

i= ão vai longe o tempo em que 'ulgava que nunca teria taiscombates a sustentar= elicitava&me talvez demasiado. 2 céu puniucruelmente este orgulho( mas, cheio de miseric*rdia, no pr*prio

momento em que "ere, adverte&me ainda antes da queda( e eu seria

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duplamente culpada se continuasse a ser imprudente, prevenida 'áda minha pouca "orça.

Aaveis&me dito cem vezes que não quer$eis uma "elicidadecomprada com as minhas lágrimas. h= não "alemos 'á de "elicidade(dei#ai&me recuperar um pouco de sossego.

)e atenderdes ao meu pedido, que novos direitos não tereissobre o meu coração> 7as desses, assentes na virtude, nãoprecisarei de"ender&me. 9omo serei "eliz no meu reconhecimento=

icarei a dever&vos a doçura de gozar sem remorsos umsentimento delicioso. este momento, assustada com os meussentimentos e pensamentos, receio igualmente ocupar&me de v*s ede mim( s* de pensar em v*s me assusto: quando não posso "ugir -vossa imagem, combato&a( não a a"asto, e#pulso&a.

ão será melhor para ambos cessar este estado deperturbação e de ansiedade> ?*s, cu'a alma sempre sens$vel, mesmono meio dos erros, se conservou amiga da virtude, tereis certamente

piedade da minha dolorosa situação( sei que não re'eitareis a minhasúplica= ;m interesse mais doce, e não menos terno, sucederá aestas agitaç+es violentas( então, devendo&vos a vida, a e#ist!nciaser&me&á cara, e na alegria do meu coração direi: esta tranqSilidade,devo&a ao meu amigo.

5arece&vos que este pequeno sacri"$cio, que vos não imponho,mas peço, é um preço demasiado caro para dar termo aos meustormentos> h= se para vos tornar "eliz bastasse aceitar ain"elicidade, podeis crer, não hesitaria um momento... 7as cometeruma "alta=... ão, meu amigo, não, antes morrer mil vezes.

ssaltada pela vergonha, - beira dos remorsos, temo osoutros e a mim pr*pria( coro quando estou acompanhada, e tremo nasolidão( a minha vida é apenas dor( s* por vossa vontade terei paz.s minhas resoluç+es mais louváveis não bastam para metranqSilizar( "ormulei esta ordem e no entanto passei a noitebanhada em lágrimas.

Eis a vossa amiga, aquela que amais, a pedir&vos con"usa esuplicante o repouso e a inoc!ncia. h= meu eus= sem v*s, nuncaela teria sido obrigada a pedido tão humilhante. ada vos censuro(sinto demasiado por mim pr*pria como é di"$cil resistir, a umsentimento imperioso. ;ma quei#a não é um murmúrio. azei por

generosidade o que "aço por dever( e a todos os sentimentos que mehaveis inspirado acrescentarei uma eterna gratidão.deus, adeus, senhor.

TD de )etembro de CD .

CARTA XCI

O VISCONDE DE VALMONT A PRESIDENTE DE TOURVEL

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9onsternado pela vossa carta, ignoro ainda, senhora, comolhe poderei responder. )em dúvida, se "or preciso escolher entre avossa in"elicidade e a minha, sacri"ico&me e não hesito( mas assuntostão importantes merecem, se bem me parece, ser antes de maisnada discutidos e esclarecidos( mas como consegui&lo, se não nos

devemos "alar, nem ver>5ois qu!= pesar de nos unirem os sentimentos mais doces,um vão terror bastará para nos separar, talvez irremediavelmente=

ebalde a terna amizade, o ardente amor, reclamarão os seusdireitos( essas vozes não serão escutadas( e porqu!> 0ue perigo tãopremente vos ameaça então> h= acreditai, tais receios, tãoligeiramente concebidos, são, s* por si, "ortes motivos de segurança.

5ermiti que vo&lo diga, reencontro aqui o vest$gio dasimpress+es des"avoráveis que a meu respeito vos deram. ão setreme 'unto do homem que se estima( não a"astamos,principalmente, quem 'ulgamos digno de alguma amizade( tememos

e evitamos apenas o homem perigoso.o entanto, e#istiu 'amais alguém tão respeitador e submisso

como eu> 9omo notais, tomo 'á cautelas com as palavras, 'á não mepermito aqueles nomes tão doces, tão caros ao& meu coração, queem segredo não cessa de vo&los dirigir.

 4á não sou o amante "iel e in"eliz, recebendo consolaç+es econselhos duma amiga terna e sens$vel( sou o réu perante o 'uiz( oescravo perante o senhor. Estes novos t$tulos imp+em sem dúvidanovos deveres( assumo o compromisso de os cumprir a todos.Escutai&me, e, se depois me condenardes, submeto&me e parto.

5rometo ainda mais( pre"eris o despotismo que 'ulga sem ouvir> 3endes a coragem de ser in'usta> 2rdenai e obedecerei sempre.7as, ao menos, que essa sentença ou essa ordem a ouça da

vossa boca. 6E porqu!>6, perguntais. h= se "azeis tal pergunta,conheceis pouco o amor e o meu coração= Então o ver&nos ainda umavez não signi"icaria nada> E quando "inalmente a vossa boca lançar odesespero sobre a minha alma, talvez um olhar consolador a impeçade sucumbir. E se "or obrigado a renunciar ao amor e - amizade paraque vivo, ao menos podereis ver a vossa obra, e "icar&me&á a vossapiedade( mesmo que não mereça este pequeno "avor, arrisco&me,parece&me, a pagá&lo bem caro, na esperança de o obter. )erá

poss$vel que me a"asteis de v*s> 5ermitis então que nos tornemosdois estranhos> 0ue digo>ssim o dese'ais( e enquanto me a"irmais que a minha

aus!ncia não alterará os vossos sentimentos, apressais&me a partidapara mais "acilmente os destruir.

5ois se 'á dizeis que a gratidão os substituirá= ssim, osentimento que obteria de v*s um desconhecido pelo mais leveserviço, ou até o vosso inimigo desde que 'á vos não a"rontasse, eis oque me o"ereceis= E quereis que o coração se me alegre. Fnterrogai ovosso: se o vosso amante, se o vosso amigo, um dia vos "alassem emgratidão, não dir$eis indignada: 6Getirai&vos, ingratos>6

qui me detenho e suplico a vossa indulg!ncia. 5erdoai ae#pressão duma dor de que sois autora( não será obstáculo - minha

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submissão total. 7as peço&vos em nome desses sentimentos tãodoces, que v*s pr*pria vos atribu$s, aceitai ouvir&me( e por piedadeao menos pelo tormento mortal em que me haveis lançado, nãoretardeis o momento.

deus, senhora.

TD de )etembro de CD , - noite.

CARTA XCII

O CAVALEIRO DANCENY AO VISCONDE DE VALMONT

2h= meu amigo= a sua carta gelou&me de receio. 9ec$lia...7eu eus, será poss$vel= 9ec$lia 'á me não ama. )im, ve'o

esta verdade terr$vel através do véu com que a sua amizade a cerca.0uis&me preparar para receber esse golpe mortal( agradeço&

lhe as cautelas, mas podemos imp%&las ao amor> Ele antecipa&se emtudo o que o interessa, não precisa que lhe digam a sua sorte,adivinha&a. a minha 'á não duvido( "ale&me sem rodeios, pode "az!&lo, suplico&lhe. 9onte&me tudo: o que "ez nascer as suas suspeitas, oque as con"irmou. 2s m$nimos pormenores são preciosos.

Es"orce&se, principalmente, por se recordar das palavras dela.;ma palavra em vez de outra pode trans"ormar toda uma "rase( amesma tem -s vezes dois sentidos... 2 meu amigo pode ter&se

enganado: ai= procuro iludir&me ainda. 0ue lhe disse ela>ez&me alguma censura> ão se de"ende ao menos dos seuserros>

Eu devia ter previsto esta mudança pelas di"iculdades que, dehá um tempo para cá, ela encontra em tudo. 2ra o amor nãoconhece tantos obstáculos.

0ue devo "azer> 0ue me aconselhais> )e eu tentasse v!&la>)erá imposs$vel> aus!ncia é tão cruel, tão "unesta=... E ela

recusou um meio de me ver=... 2 ?isconde não me e#plica do que setratava( se o perigo era demasiado grande, ela bem sabe que nãoquero que se arrisque muito. 7as como conheço também a sua

prud!ncia, nem posso para minha in"elicidade acreditar em tal.0ue vou eu "azer agora> 9omo hei&de escrever&lhe> ei#á&lasuspeitar dos meus receios> 3alvez a desgostem, e, se são in'ustos,nunca me perdoaria o t!&la a"ligido. Escond!&los> J enganá&la, e nãosei dissimular perante ela.

2h= se ela soubesse o que so"ro, o meu mal comov!&la&ia.)ei que é sens$vel, tem um coração e#celente e possuo mil

provas do seu amor. J demasiado t$mida, algumas vezes indecisa, etão 'ovem= mãe trata&a com tanta severidade= ?ou escrever&lhe(saberei conter&me( pedir&lhe&ei somente que con"ie plenamente nomeu amigo. 7esmo que recuse mais uma vez, não poderá zangar&se

com o meu pedido( e talvez consinta. si, meu amigo, peço&lhe mil perd+es, por ela e por mim.

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sseguro&lhe que ela aprecia o valor dos seus cuidados, pelosquais lhe está grata. ão é por descon"iança, é por timidez. )e'aindulgente( é a mais bela "ace da amizade. sua é&me preciosa enem sei como agradecer tudo o que tem "eito por mim.

deus, vou escrever&lhe 'á...

)into que todos os meus receios voltam( quem me diria quealguma vez me custaria escrever&lhe= i= ainda ontem era o meumais doce prazer.

deus, meu amigo( continue a proteger&nos e tenha piedadede mim.

5aris, TD de )etembro de CD .

CARTA XCIII

O CAVALEIRO DANCENY A CECÍLIA VOLANGES

L4unta - precedente1

ão lhe posso esconder como "iquei a"lito ao saber por?almont a escassa con"iança que continua a ter nele. ão ignora queé meu amigo, a única pessoa que nos pode apro#imar: 'ulguei queestes t$tulos bastariam( ve'o com mágoa que me enganei. 5oderei aomenos esperar que me diga as suas raz+es>

ão haverá ainda outras di"iculdades que a impeçam de tercon"iança nele> ão posso no entanto, sem que mo diga, perceber omistério da sua conduta. ão ouso p%r em dúvida o seu amor, seitambém que não ousaria trair o meu. h = 9ec$lia =...

J então verdade que recusou um meio de me ver> ;m meiosimples, c%modo e seguro> E é assim que me tem amor= ;ma tãocurta aus!ncia p%de alterar a tal ponto os seus sentimentos=

7as para qu! enganar&me> 5ara qu! repetir que continua aamar&me, e cada vez mais> sua 7amã, ao destruir o seu amor,destruiu&lhe também a candura> )e ela lhe dei#ou ao menos algumapiedade, não será sem dor que a 9ec$lia saberá os tormentos

horr$veis que me causa. h = so"reria menos ao morrer.iga&me pois: o seu coração "echou&se de"initivamente paramim> J certo que me esqueceu inteiramente> raças - sua recusa,não sei quando ouvirá as minhas quei#as, nem quando lhesresponderá. amizade de ?almont tinha assegurado a nossacorrespond!ncia: mas a 9ec$lia não quis( achava&a di"$cil, pre"eriuque ela "osse mais rara. ão, não acreditarei mais no amor, na boa"é. Em quem acreditar, se a 9ec$lia me enganou>

Gesponda&me pois: é certo que 'á não me tem amor> ão, issonão é poss$vel( a 9ec$lia ilude&se a si pr*pria( calunia o seu pr*priocoração. ;m receio passageiro, um momento de des8nimo, que o

amor depressa "ez desaparecer: não é verdade, minha 9ec$lia> h=)em dúvida, e "aço mal em a acusar. 9omo eu seria "eliz se me

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tivesse enganado= 9omo gostaria de pedir ternas desculpas, decompensar este momento de in'ustiça com uma eternidade de amor=

9ec$lia, 9ec$lia, tenha piedade de mim= 9onsinta em me ver(aceite todos os meios= ?e'a o que produz a aus!ncia: receios,suspeitas, talvez "rieza=

;m s* olhar, uma s* palavra, e seremos "elizes. 7as qu!=5osso eu ainda "alar de "elicidade> 3alvez este'a perdida para mim,perdida para sempre. 3orturado pelo receio, cruelmente apertadoentre a suspeita in'usta e a mais cruel das verdades, não me possoagarrar a nenhum pensamento( o pouco que conservo de vida é paraso"rer e amar. h= 9ec$lia= J a única pessoa que tem o direito de meembelezar a e#ist!ncia, de ma tornar cara( e espero das suaspalavras o regresso - "elicidade ou a certeza dum desespero eterno.

5aris, TD de )etembro de CD .

* Dancen9 não sabe de que meio se trata; repete apenas a e(pressão de almont

CARTA XCIV

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CECÍLIA VOLANGES AO CAVALEIRO DANCENY 

ada percebo da sua carta, a não ser a dor que me causa. 2que lhe contou então o senhor de ?almont e o que é que lhe p%de"azer crer que 'á não o amava> 3alvez isso "osse bem melhor para

mim, porque certamente estaria menos atormentada( e é muitoduro, amando&o de tal maneira, ver como 'ulga sempre que nãotenho razão, e que, em vez de me consolar, se'a de si que me v!msempre as dores que mais magoam. 4ulga que o engano e minto= azuma linda idéia de mim, não ha'a dúvida=

7as mesmo que mentisse como me censura, que interesseteria nisso>

9ertamente, se 'á o não amasse, bastava&me diz!&lo, e todosme elogiariam( mas, por in"elicidade, este amor é mais "orte do queeu( e ainda por cima por alguém que não tem qualquer obrigaçãopara comigo=

0ue "iz eu para tanto se zangar> ão ousei roubar uma chave,porque receei que a 7amã desse por tal e isso me trou#esse maisdissabores, e a si também por minha causa( e, além disso, parece&meuma coisa muito "eia. 7as "ora apenas o senhor de ?almont quemme "alara nisso( não podia adivinhar se estava de acordo ou não,pois supus que de nada sabia. gora sabendo o que dese'a, recusopor acaso roubá&la> á&lo&ei amanhã mesmo( e veremos então seainda tem alguma coisa a dizer.

2 senhor de ?almont pode muito bem ser seu amigo( mas 'ulgo que o meu amor vale bem a amizade dele( e no entanto é

sempre ele quem tem razão e nunca a minha pessoa. "irmo&lhe queestou muito zangada. 3anto lhe "az, é claro, pois sabe que meacalmo logo de seguida: mas desde que tenha chave, posso v!&loquando bem me apetecer( e garanto&lhe que não hei de quererquando me tratar assim. 5re"iro so"rer por minha culpa do que pelasua: ve'a bem o que "az.

5od$amo&nos amar tanto, se quisesse= E ao menos as únicaspenas que ter$amos, seriam as provocadas pelos outros= sseguro&lhe que, se "osse dona do meu destino, nunca lhe daria motivo dequei#a: mas se não acredita em mim, seremos para sempre in"elizese a culpa não será minha. Espero que nos poderemos ver em breve e

que então não teremos ocasião de nos irritarmos como agora.)e pudesse prever tudo isto, teria logo roubado a chave: masna verdade 'ulgava proceder bem. ão se zangue pois comigo, peço.ão este'a triste e ame&me tanto quanto eu o amo: dessa "orma"icarei muito contente.

deus, querido amigo.

9astelo de. .., TU de )etembro de CD .

CARTA XCV

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CECÍLIA VOLANGES AO VISCONDE DE VALMONT

5eço&vos, senhor, a bondade de me entregardes de novo achave que me t$nheis dado para p%r no lugar da outra( visto quetodos o querem, sou obrigada a consentir.

ão sei por que haveis contado ao senhor ancenP que eu 'áo não amava( creio que nunca vos dei lugar a pensar tal coisa( tudoisso o "ez so"rer e a mim também. )ei bem que sois amigo dele( masisso não é razão para o "azer in"eliz, nem a mim tão pouco: ar&me&$eis prazer se lhe mandásseis dizer o contrário, da pr*#ima vez quelhe escreverdes, e que tendes bem a certeza: por que é em v*s queele tem con"iança( e eu, quando digo uma coisa e não me acreditam,não sei 'á o que "aça.

cerca da chave, podeis estar tranqSilo( lembro&me bem doque me recomendáveis na vossa carta. o entanto, se ainda a tendese ma quiserdes dar de novo, prometo rel!&la com atenção.

)e pudesse ser amanhã - hora do 'antar, dar&vos&ia a outrachave depois de amanhã ao almoço, e devolver&ma&$eis da mesmamaneira que a primeira. ese'ava que tudo isto não demorassemuito, porque nos arriscar$amos menos a que a 7amã desse porqualquer coisa.

E depois, assim que tiverdes a chave, tereis a bondade de autilizar para receber as minhas cartas( dessa "orma, o senhorancenP terá mais "requentemente not$cias minhas. a verdade serámais c%modo que no presente( mas a princ$pio tive muito medo.5eço&vos que me desculpeis e espero que não dei#eis de ser tão

atencioso como dantes. icar&vos&ei sempre muito grata. 3enho a honra de ser, senhor, vossa muito humilde eobediente serva.

5. ). & ssim que tiverdes a chave, peço&vos que tenhais cuidado eque ninguém a ve'a, porque seria muito perigoso.

TU de )etembro de CD .

CARTA XCVI

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

posto que, depois da sua aventura, espera todos os dias osmeus cumprimentos e elogios( nem sequer duvido que este'a umpouco aborrecida com o meu longo sil!ncio( mas que quer>

)empre pensei que, quando 'á não há senão elogios a dar auma mulher, podemos estar descansados a seu respeito e ocuparmo&nos sossegadamente de outra coisa. o entanto agradeço&lhe pelaminha parte e "elicito&a pela sua. 5ara a tornar verdadeiramente "eliz,

concordo até que, desta vez, ultrapassou a minha e#pectativa.

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epois disto, ve'amos se pela minha parte terei ao menoscorrespondido - sua.

ão é de 7adame de 3ourvel que lhe quero "alar( o seu passolento desagrada&lhe. minha amiga s* gosta dos casos arrumados.borrecem&na as cenas que se vão lentamente desenrolando( e eu

nunca tinha apreciado o prazer que sinto nestas pretensas lentid+es.)im, gosto de ver, de apreciar, esta mulher prudente, lançada,sem disso se aperceber, num caminho que não permite regresso ecu'a ladeira rápida e perigosa a leva a seguir&me, mesmo contravontade e - "orça.

ssustada com o perigo que corre, gostaria de parar, mas nãopode.

s cautelas e a habilidade podem tornar&lhe os passos maiscurtos( mas eles suceder&se&ão inevitavelmente. Hs vezes, nãoousando "itar o perigo, "echa os olhos e, dei#ando&se guiar, entrega&se aos meus cuidados.

7uitas vezes um novo terror "á&la redobrar de es"orços. umpavor mortal, quer ainda voltar atrás( gasta as "orças para subirpenosamente um curto espaço( e em breve um mágico poder acoloca de novo mais perto daquele mesmo perigo de que em vãopretendera "ugir. Então, tendo em mim o único guia e apoio, sempensar em me censurar pela queda inevitável, implora&me que aretarde. s preces "ervorosas, as humildes súplicas, tudo o que osmortais, no seu medo, o"erecem - ivindade, recebo&o eu dela( equer a minha amiga que, surdo aos seus pedidos e destruindo eupr*prio o culto que ela me presta, me sirva, para a aniquilar, do

poder que ela invoca para a amparar= h= dei#e&me ao menos otempo de observar estes tocantes combates entre o amor e avirtude=

5ois qu!= Esse mesmo espetáculo que a "az correr ao teatrocom ardor, e que a$ aplaude com entusiasmo, 'ulga&o menos"ascinante na vida real> 2s sentimentos duma alma pura e terna, queteme a "elicidade que dese'a e não para de se de"ender, mesmoquando dei#a de resistir, escuta&os com e#altação( não serão elessem preço para aquele que os "ez nascer>

Eis no entanto os prazeres deliciosos que esta mulher celestialme o"erece todos os dias= E censura&me que lhes saboreie as

del$cias= h= 9edo virá o momento em que, degradada pela queda,ela não será para mim mais do que uma mulher vulgar.7as esqueço, ao "alar dela, que o não queria "azer. ão sei

que "orça me prende e sem cessar me atrai a ela, mesmo quando aultra'o. "astemos essa imagem perigosa( recuperemos a calma paratratar dum assunto mais alegre. 3rata&se da sua disc$pula,presentemente minha, e espero que agora me reconheça em ação.

esde há alguns dias, mais bem tratado pela terna devota,por conseguinte menos ocupado com ela, notara eu 'á que apequena ?olanges é com e"eito muito bonita( e que, se era parvo$ceestar apai#onado por ela como ancenP, talvez não o "osse menos

da minha parte não procurar 'unto dela a distração que a solidão metornava necessária. e resto pareceu&me 'usto pagar&me dos

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trabalhos que tinha tido por ela( lembrava&me além disso que aminha amiga ma tinha o"erecido, antes que ancenP tivessequalquer pretensão( e considerava&me autorizado a reclamar algunsdireitos sobre um bem que ele possu$a apenas devido - minharecusa e abandono. cara gentil da rapariguinha, a boca tão "resca,

o ar in"antil, o pr*prio embaraço, "orti"icavam estas sábias re"le#+es(resolvi portanto agir, e a empresa "oi coroada de !#ito. 3enta 'á adivinhar o meio pelo qual suplantei tão depressa o

ente querido( qual a sedução conveniente para esta idade eine#peri!ncia.

Evite tanto trabalho( não me servi de nenhuma. Enquantoque, mane'ando com habilidade as armas do seu se#o, a minha caraamiga triun"ava pela sutileza( eu, devolvendo ao homem os seusdireitos imprescrit$veis, sub'ugava pela autoridade.

)eguro da presa se pudesse estar a s*s com ela, necessitavade astúcia apenas para me apro#imar, e a de que me servi quase

nem merece esse nome.proveitando&me da primeira carta que ancenP enviara -

sua bela e depois de a ter prevenido por um sinal combinado entren*s, em vez de a minha habilidade servir para lha entregar, serviu&me apenas para não encontrar um meio de o "azer: a impaci!nciaque "iz nascer, "ingi compartilhá&la, e depois de ter provocado o mal,indiquei o remédio.

donzela dorme num quarto que tem uma das portas para ocorredor( mas, como mandam as regras, a 7amã guardara a chave.0ueria apenas apoderar&me dela. ada mais "ácil( bastava&me dispor

dela por duas horas e trataria de obter outra igual.Então, correspond!ncia, entrevistas, encontros noturnos, tudose tornava c%modo e seguro: no entanto, será capaz de acreditar> virgem t$mida teve medo e recusou. 2utro qualquer "icaria desolado(eu vi apenas a oportunidade para um prazer mais picante. Escrevi aancenP quei#ando&me da recusa, e "iz tanto e tão bem que o nossotonto não descansou enquanto não conseguiu, e#igindo até, que areceosa apai#onada acedesse ao meu pedido e se entregassetotalmente aos meus cuidados.

gradava&me, con"esso, ter assim mudado de papel e que o 'ovem "izesse por mim aquilo que esperava que eu "izesse por ele.

Esta idéia duplicava, a meus olhos, o valor da aventura, assim, logoque possu$ a preciosa chave, apressei&me a utilizá&la.oi a noite passada.epois de me ter certi"icado de que tudo estava tranqSilo no

castelo, armado de lanterna de "urta&"ogo e com o vestuário que ahora permitia e a circunst8ncia e#igia, "iz a primeira visita - suapupila. 3inha mandado preparar tudo Le até por ela pr*pria1, parapoder entrar sem ru$do. Estava no primeiro sono, aquele que épr*prio da idade dela, de "orma que pude chegar até ao leito sem aacordar. princ$pio estive tentado a ir mais longe e a "azer&mepassar por um sonho( mas temendo o e"eito da surpresa e o barulho

que se lhe seguiria, pre"eri acordar com precaução a belaadormecida, e consegui com e"eito evitar o grito que receava.

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epois de lhe ter acalmado os primeiros receios, e como a"inalnão estava ali para conversar, arrisquei algumas liberdades.

)em dúvida não lhe ensinaram bem no convento a quantosperigos está e#posta a t$mida inoc!ncia e tudo o que ela deveresguardar para não ser surpreendida( porque, 'untando toda a

atenção e todas as "orças para se de"ender dum bei'o, que eraapenas um "also ataque, todo o resto era abandonado sem de"esa(como não me aproveitar= lterei então a táctica e num ápice ocupeio meu posto. qui pensamos ambos estarmos perdidos( a pequena,toda assustada, quis gritar de verdade( "elizmente as lágrimastinham&lhe roubado a voz. 5rocurara também o cordão dacampainha, mas a minha habilidade segurou&lhe o braço a tempo.

60ue queres "azer6, disse&lhe então, 6perderes&te parasempre>W

0ue me importa se vier alguém. quem convencerás que nãoestou aqui com o teu consentimento> 0uem me teria "ornecido o

meio de entrar senão tu> E como e#plicarás a e#ist!ncia desta chaveque s* pude arran'ar por teu intermédio, que não arran'aria sem atua a'uda>6 Este curto discurso não acalmou nem a dor, nem ac*lera( mas trou#e a submissão. ão sei se o tom lhe davaeloqS!ncia( na verdade, não seria com certeza embelezado pelapostura em que me encontrava. ;ma das mãos empregada na "orça,a outra no amor, que orador em semelhante posição pretenderia sergracioso> )e está a ver bem, concordará que em troca era prop$ciaao ataque( mas sou um pateta, como diz, e a mulher mais simples,uma colegial, me leva como a uma criança.

Esta, se bem que desolada, percebia que era preciso tomaruma decisão, e negociar. Encontrando&me ine#orável aos pedidos, "oipreciso passar -s o"ertas. 4ulga se calhar que vendi bem caro umposto avançado tão importante: não, prometi ceder tudo por umbei'o. J verdade que depois dele, não cumpri a promessa( mas tinhaboas raz+es. 5orventura t$nhamos combinado se o bei'o seria passivoou ativo> H "orça de negociar, acabamos por concordar numsegundo( e este, assim "oi combinado, seria passivo. Então, tendo&lheguiado os t$midos braços em torno do meu corpo, e apertando&aamorosamente com um dos meus, o doce bei'o "oi com e"eito dado(mas per"eita e belamente dado( de tal "orma en"im que o pr*prio

amor não poderia ter "eito melhor. 3anta boa "é merecia recompensa, por isso acediimediatamente ao pedido. mão retirou&se( mas não sei por queacaso, encontrei&me eu pr*prio no lugar dela. )up+e&me 'á apressadoe ativo, não é verdade> e "orma nenhuma. 3omei o gosto dalentidão, digo&lhe. 9erto de chegar, para qu! apressar a viagem>

sério, tinha todo o vagar para observar por uma vez o poderda ocasião, e encontrava&a aqui despida de toda a a'uda alheia. Elatinha no entanto de combater o amor( e o amor apoiado pelo pudorou pela vergonha( e "orti"icado sobretudo pela ira que eu provocara.

 3udo o que havia entre n*s era a ocasião( mas estava ali, o"erecida,

presente, e o amor estava longe.

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5ara certi"icar as minhas observaç+es, tive a mal$cia deempregar apenas a dose de "orça que a donzela podia combater.

)omente, se a encantadora inimiga, abusando da minhabondade, se encontrava pronta a escapar&se&me, continha&a pelomesmo temor, que 'á antes tão "elizes resultados dera. 5ois bem=

)em mais trabalho, a terna amorosa, esquecendo os 'uramentos, começou por ceder e acabou consentindo( não sem queap*s o primeiro momento as censuras e as lágrimas não tivessemvoltado simultaneamente( ignoro se eram verdadeiras ou "ingidas(mas, como sucede sempre, cessaram logo que me conduzi demaneira a 'usti"icá&las de novo.

inalmente, de concessão em censura, e de censura emconcessão, s* nos separamos depois de satis"eitos e de acordoquanto ao encontro desta noite.

)* me retirei para os meus aposentos ao raiar do dia, e estavae#austo de "adiga e sono, no entanto sacri"iquei ambos ao dese'o de

assistir de manhã ao pequeno almoço( adoro loucamente o aspectodelas no dia seguinte. ão "az idéia do ar desta.

Era um embaraço na maneira de estar= ;ma di"iculdade noandar=

2lhos sempre bai#os, tão inchados e batidos= 2 rosto redondotão comprido= ada de mais agradável. E, pela primeira vez, a mãe,alarmada com tão grande trans"ormação, lhe testemunhava uminteresse assaz terno=

E a 5residente também se desvelava em volta dela= 2h= Estescuidados são por agora dispensáveis( um dia virá em que ela os

merecerá de verdade, e esse dia não está longe.deus, minha bela amiga.

9astelo de..., T de 2utubro de CD.

CARTA XCVII

CECÍLIA DE VOLANGES A MARQUESA DE MERTEUIL

h= 7eu eus, senhora, como estou a"lita= 9omo sou in"eliz=0uem me consolará na minha dor> 0uem me aconselhará nadi"iculdade em que me encontro> Este senhor de ?almont=...

E ancenP= ão, a lembrança de ancenP lança&me nodesespero...

9omo contar> 9omo ousar dizer&vos>... ão sei como o "azer.o entanto o meu coração transborda... 5reciso de desaba"ar comalguém e v*s sois a única a quem posso escrever.

 3em sido tão boa para mim= 7as não espero que o se'aisagora( não sou digna disso( como dizer&vos> 4á não o dese'o. Ao'e"oram todos aqui muito carinhosos para comigo, mas s* contribu$ram

para aumentar o meu so"rimento. )enti pro"undamente que nãomerecia tanta atenção= ?*s, pelo contrário, ralhai&me( severamente,

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porque tenho imensa culpa, mas depois salvai&me( se não tiverdes abondade de me aconselhar, morrerei de desgosto.

?ergonha. 5ois bem= )uportá&la&ei( será o primeiro castigo daminha "alta. )im, dir&vos&ei tudo.

)abei pois que o senhor de ?almont, que me entregara até

agora as cartas de ancenP, descobriu de repente que erademasiado di"$cil( quis ter uma chave do meu quarto. aranto&vosque não queria, mas ele escreveu a ancenP e este concordou( e amim custa&me tanto recusar&lhe qualquer coisa, sobretudo desde quea minha aus!ncia o torna tão in"eliz, que acabei por consentir. ãoprevia a desgraça que da$ resultaria.

2ntem, o senhor de ?almont serviu&se dessa chave paraentrar no meu quarto, enquanto eu dormia( estava tão longe deesperar semelhante coisa que me assustei ao acordar( mas como"alou imediatamente, reconheci&o e não gritei( e além disso veio&melogo a idéia de que talvez trou#esse uma carta de ancenP.

ada disso. 5assado um momento quis bei'ar&me( e enquantoeu me de"endia, como era natural, insinuou&se de tal "orma 'unto demim, que não quereria por coisa alguma deste mundo que elecontinuasse naquela posição. 7as e#igiu um bei'o primeiro. orçoso"oi( que "azer>, tanto mais que tentara tocar, mas além de não terpodido, ameaçou&me que, se viesse alguém, lançaria toda a culpasobre mim( e com e"eito seria muito "ácil, por causa da chave. 7asdepois nem por isso se retirou.

0uis um segundo( e desta vez, não sei porqu!, perturbou&mede tal "orma... e em seguida "oi ainda pior. 2h= ão se "az uma coisa

destas. En"im, depois..., dispensar&me&eis de dizer o resto( sou tãoin"eliz quanto é poss$vel s!&lo.quilo de que mais me acuso, "orçoso é que vo&lo diga, é o

receio de não me ter de"endido quanto podia. ão sei como "oi, nãoamo o senhor de ?almont, bem pelo contrário( mas houve no entantomomentos em que "oi como se o amasse. <em sabeis que isso nãome impedia de ir repetindo que não( mas senti que não estavaagindo como dizia( e tudo isto independentemente da minhavontade( e depois também, ora, estava tão perturbada=

)e é assim tão di"$cil a gente de"ender&se, grande prática épreciso=

 3ambém é verdade que este senhor de ?almont tem umasmaneiras de "alar que não se sabe como responder&lhe, en"im, queracreditar que quando partiu eu estava de certo modo zangada, e queapesar disso tive a "raqueza de consentir que voltasse esta noite( oque me desola ainda mais que tudo o resto.

2h= pesar disso, prometo&vos que o impedirei de entrar. 7alele sa$ra, 'á sentia como tinha errado ao consentir. 2 resto do temponão "iz senão chorar. )obretudo a recordação de ancenP "azia&meso"rer= 9ada vez que pensava nele, as lágrimas aumentavam aoponto de su"ocar, e não podia dei#ar de pensar nele... E ainda agora,vede o e"eito( eis o papel todo molhado. ão, nunca mais me

consolarei, quanto mais não se'a por causa dele... Estava e#austa, e

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no entanto não dormi um minuto. Esta manhã ao levantar&me,perante o espelho, metia medo, de transtornada que estava.

7amã reparou assim que me viu, e perguntou&me o quetinha. esatei logo a chorar. 4ulguei que me ia ralhar, o que talvezme tivesse custado menos, mas não. alou&me com doçura=

ão o merecia, de "orma nenhuma. isse que não mea"ligisse=Fgnorava o motivo do meu desespero. 9omo me sentia mal=

Aá momentos em que dese'o a morte. ão resisti. @ancei&me nosbraços dela aos soluços, e dizendo: 6h= 7amã, a vossa "ilha é tãoin"eliz=6 7amã não p%de dei#ar de chorar um pouco( o que s* tevecomo conseqS!ncia aumentar a minha dor, "elizmente não perguntoupor que razão eu era tão in"eliz, pois não saberia que responder.

)uplico&vos, senhora, escrevei o mais cedo que puderdes, edizei&me o que devo "azer, porque não tenho coragem de pensar emnada, não "aço outra coisa senão a"ligir&me. Enviai a carta pelo

senhor de ?almont( mas, peço&vos, se lhe escreverdes ao mesmotempo, não lhe "aleis no que vos contei.

 3enho a honra de ser, minha senhora, com imensa amizade, avossa muito humilde e obediente escrava...

ão ouso assinar esta carta.

9astelo de..., C de 2utubro de CD , - noite.

CARTA XCVIIIMADAME DE VOLANGES A MARQUESA DE MERTEUIL

inda há bem poucos dias, minha encantadora amiga, "ostesv*s a pedir&me consolaç+es e conselhos( ho'e, é a minha vez( "aço&vos o mesmo pedido que então me "izestes. Estou muito preocupadae receio não ter sabido evitar o desgosto que me a"lige.

9ec$lia é a causa da minha inquietação. esde a nossa vindaque a ve'o sempre triste e desgostosa( mas 'á o esperava e tinhaescudado o coração com a severidade que 'ulgara necessária.

Esperava que a aus!ncia e as distraç+es destruiriam depressaum amor que me parecia mais uma "antasia in"antil do que umaverdadeira pai#ão. o entanto, em vez de se ter restabelecido com aestada aqui, apercebo&me de que a minha "ilha se entrega cada vezmais a uma perigosa melancolia( e temo, até, que a sua saúde seressinta.

5articularmente nos últimos dias ela muda a olhos vistos.2ntem, sobretudo, comoveu&me, e todos aqui "icaram sinceramentealarmados.

2 que me revela até que ponto ela está pro"undamente "eridaé o v!&la pronta a dei#ar a timidez que sempre mostrou para comigo.

2ntem de manhã, ao perguntar&lhe apenas se estava doente,precipitou&se nos meus braços dizendo&me que era muito in"eliz( e

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chorou abundantemente. ão posso e#primir quanto isto me tocou(vieram&me logo as lágrimas aos olhos( e s* tive tempo para mevoltar, para impedir que ela o visse. 7as "elizmente tive a prud!nciade não lhe "azer nenhuma pergunta, e ela não ousou dizer maisnada: mas ve'o claramente que é a sua pai#ão in"eliz que a

atormenta.0ue "azer se isto continua> )erei a causadora da in"elicidadeda minha "ilha> Estarei a voltar contra ela as qualidades maispreciosas da alma, a sensibilidade e a const8ncia> J assim quecumpro o meu papel de mãe> E se aba"ar em mim este sentimentotão natural de dese'ar a "elicidade da minha "ilha( se considerar comouma "raqueza o que creio, pelo contrário, o primeiro e mais sagradodos nossos deveres( se "orço a sua escolha, não serei a responsávelpelas conseqS!ncias "unestas que possam seguir&se> 0ue mauemprego de autoridade materna, colocar a pr*pria "ilha entre o crimee a in"elicidade=

ão, minha amiga, não imitarei o que tantas vezes tenhocensurado.

o tentar escolher em vez da minha "ilha, pretendia a'udá&lacom a minha e#peri!ncia( não e#ercia um direito cumpria um dever.7as "altarei a um se, pelo contrário, dispuser dela desprezando umaa"eição que eu não soube impedir de nascer e de que nem eu nemela podemos conhecer a duração e a "orça. ão, não posso admitirque case com este para amar aquele, pre"iro comprometer a minhaautoridade a p%r em perigo a sua virtude.

cho que vou tomar a decisão mais a'uizada, retomar a

palavra que dei ao senhor de ercourt. E#pus&vos as raz+esparecem&me mais importantes do que a minha promessa. igo mais:no estado em que as coisas estão, cumpri&la seria, na verdade, violá&la. 5orque en"im, se devo - minha "ilha o não revelar o seu segredoao senhor de ercourt, devo também não abusar da ignor8ncia emque o dei#o e "azer em vez dele o que creio que ele "aria sesoubesse. Frei, pelo contrário, tra$&lo indignamente, e, enquanto elecon"ia em mim e me honra escolhendo&me para segunda mãe,enganá&lo na escolha da mãe dos seus "ilhos> Estas re"le#+es, tãoverdadeiras e -s quais me não posso "urtar, alarmam&me mais doque dei#o transparecer.

Hs desgraças que receio, comparo a minha "ilha, "eliz com oesposo que o seu coração escolheu, presa aos deveres s* peladoçura que encontra em cumpri&los( o meu genro também satis"eitoe "elicitando&se sempre pela sua escolha( cada um deles encontrandoa "elicidade na "elicidade do outro, e a de ambos con'ugando&se paraaumentar a minha. esperança dum "uturo tão doce deve sersacri"icada a vãs consideraç+es> E quais são elas> ;nicamente asditadas pelo interesse. 5ara que terá servido - minha "ilha ternascido rica, se tem de ser do mesmo modo escrava do dinheiro>

9oncordo que o senhor de ercourt é um partido melhor doque eu poderia esperar para a minha "ilha( con"esso até que "iquei

e#tremamente lison'eada com a escolha dele. 7as en"im ancenP édum nome igualmente ilustre( não lhe é em nada in"erior em

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qualidades pessoais( tem sobre o senhor de ercourt a vantagem deamar e ser amado. ão é rico, na verdade( mas não o é minha "ilha osu"iciente para ambos> h= 5orqu! tirar&lhe a satis"ação tão doce deenriquecer aquele que ela ama=

Estes casamentos arran'ados, em vez de entregues ao livre

arb$trio do coração, e a que chamamos de conveni!ncia, nos quaistudo se a'usta de "ato, menos os gostos e os caracteres, não serãoeles a nascente mais "ecunda dessas rupturas escandalosas ho'e emdia tão "reqSentes> 5re"iro adiar( pelo menos terei tempo paraestudar melhor a minha "ilha, que não conheço. )into&me comcoragem de lhe causar um desgosto passageiro, se ele pudercontribuir para uma "elicidade mais s*lida, mas arriscar&me a arrastá&la para um desespero eterno, isso não me está no coração.

Eis, querida amiga, as idéias que me atormentam e acercadas quais vos peço a opinião. Estas preocupaç+es sérias contrastammuito com a vossa alegria gentil e nem são para a vossa idade( mas

v*s estais muito acima dela= amizade 'untar&se&á de resto - vossaprud!ncia( e sei que uma e outra se não recusarão - solicitudematernal que as implora.

deus, encantadora amiga( não duvideis nunca da sinceridadedos meus sentimentos.

9astelo de..., T de 2utubro de CD .

CARTA XCIXO VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

penas pequenos incidentes, minha bela amiga( mas s*cenas, nada de aç+es. este modo, arme&se de paci!ncia( mesmomuita, porque enquanto a minha 5residente avança com lentidão, asua pupila recua, o que é muito pior. 5ois bem= 3enho bom humorpara me divertir com estas catástro"es. a verdade acostumei&memuito bem - minha estada aqui e posso a"irmar que no triste casteloda minha velha tia não e#perimentei um momento de tédio. 5ois não

tenho aqui prazeres, privaç+es, esperança, incerteza> 0ue se tem amais num teatro maior> Espectadores> h= Esperemos, eles não"altarão. )e não me v!em entregue ao trabalho, mostrar&lhes&ei atare"a pronta( s* terão de admirar e aplaudir. )im, aplaudirão(porque posso "inalmente prever, com e#atidão, o momento da quedada minha austera devota. ssisti esta tarde - agonia da virtude. doce "raqueza reinará agora. 5reve'o esse momento para a nossaprimeira entrevista, mas 'á a ouço acusar&me de orgulho.

nuncia a vit*ria, gaba&se antecipadamente= <om, acalme&se=5ara lhe provar como sou modesto, vou começar pela hist*ria

da minha derrota.

sua pupila é de "ato uma criaturinha rid$cula= J uma criançaque deveria ser tratada como tal e a quem não "ar$amos mais que

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perdoar se nos limitássemos a p%&la de castigo = credita que, depoisdo que se passou anteontem entre ela e mim, depois do modoamigável como nos despedimos ontem de manhã, quando eu quisvoltar - noite, como combináramos encontrei a porta "echada pordentro> 0ue diz a isto>

turam&se -s vezes in"antilidades destas na véspera( mas nodia seguinte=ão acha c%mico>7as não ri logo, nunca sentiria de tal "orma o peso do meu

mau g!nio. sseguro&lhe que ia -quela entrevista sem prazer,apenas por deliberação. 2 meu leito, de que muito necessitava,parecia&me, nesse momento, pre"er$vel ao de outrem, e a"astara&medele com pena. o entanto, logo que encontrei um obstáculo ardi poro vencer( e acima de tudo senti&me humilhado por uma criança meter ludibriado. Getirei&me então de muito mau humor e com o pro'etode nunca mais me ocupar daquela criança estúpida, nem dos seus

problemas, escrevi&lhe imediatamente um bilhete que pensavaentregar ho'e, em que a apreciava no seu 'usto valor. 7as, comocostuma dizer&se, a noite é boa conselheira( pensei esta manhã que,não tendo aqui a possibilidade de escolher distraç+es, não deviaperder aquela: destru$ pois o severo bilhete. epois re"leti, espantei&me de ter tido a idéia de acabar uma aventura sem ter na minhamão com que perder a hero$na. 2nde nos pode conduzir um primeiromovimento=

elizes aqueles que desde sempre se acostumaram como aminha boa amiga a nunca lhe ceder= En"im, adiei a minha vingança(

"iz esse sacri"$cio -s suas intenç+es em relação a ercourt.gora que 'á não estou zangado, ve'o s* o rid$culo na condutada sua pupila. ostaria na verdade de descobrir o que espera elaganhar deste modo= 9on"esso&me incapaz( se é s* para se de"ender,concordemos que se acautela demasiado tarde. ;m, dia ela e#plicar&me&á este enigma= nseio por conhec!&la. )eria somente por seencontrar "atigada> rancamente acho poss$vel, porque, sem dúvida,ela ignora ainda que as "lechas do amor, como a lança de quiles,trazem consigo remédio para os golpes que "azem. 7as não, pelae#pressão dela durante todo o dia, iria apostar que há ali remorsos...uns resqu$cios de virtude...

?irtude= <em precisa dela. h= 0ue a dei#e mas é para amulher nascida na realidade para ela, a única que a sabe embelezare seria capaz de no&la "azer amar... 5erdão, minha bela amiga, mas"oi esta tarde que se passou entre mim e 7adame de 3ourvel a cenaque quero narrar&lhe e de que ainda conservo a emoção.

5reciso "azer um es"orço para sacudir a impressão que mecausou( é para me livrar disso que me pus a escrever&lhe. eve&sedesculpar este momento de "raqueza.

Aá 'á alguns dias que n*s, 7adame de 3ourvel e eu, estamosde acordo sobre os nossos sentimentos( discut$amos apenas acercade palavras.

Era sempre a sua amizade que respondia ao meu amor, masessa linguagem de convenção não modi"icava o "undo das coisas( e

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mesmo que assim nos tivéssemos mantido, eu teria certamenteavançado mais devagar, mas não menos seguramente. 4á não setratava de me a"astar, como ela queria primeiro( e, quanto -sconversas que temos tido diariamente, se ponho os meus es"orçosem lhe o"erecer a ocasião, ela p+e os dela em a agarrar.

9omo é habitualmente nos passeios que se dão as nossasconversas, o tempo terr$vel que "ez ho'e todo o dia não me permitiater esperança, estava muito contrariado( não previa quanto lucrariacom este contratempo.

ão se podendo passear, pusemo&nos a 'ogar quandodei#amos a mesa( como não 'ogo bem, e não era necessária a minhapresença, aproveitei para subir ao meu quarto, com o pro'eto deesperar pouco mais ou menos o "im da partida.

?oltava para me 'untar ao grupo, quando encontrei aencantadora dama que entrava nos seus aposentos e que, porimprud!ncia ou "raqueza, me disse com voz doce: 6onde ides> ão

há ninguém no salão.6 ão "oi preciso mais para eu, como devecalcular, e#perimentar entrar com ela( encontrei menos resist!nciado que esperava. J certo que eu tivera a precaução de começar aconversa - porta, e de a começar com um tom indi"erente, masassim que nos sentamos, voltei ao que me interessava e "alei do meuamor - minha amiga. primeira resposta dela, embora simples,pareceu&me e#pressiva: 62h=, não6, disse&me, 6não "alemos dissoaqui6( e tremia. 5obre mulher= 4ulga morrer.

o entanto não havia motivo para temer. 4á há algum tempoque, certo do sucesso mais cedo ou mais tarde, e vendo&a gastar as

"orças em combates inúteis, tinha resolvido economizar as minhas eesperar sem es"orço que ela se entregasse por cansaço. ?! bemcomo e#i'o um triun"o completo e nada quero dever -scircunst8ncias. oi mesmo de acordo com o plano assim elaborado, epara poder insistir sem me empenhar muito, que voltei - palavraamor, tão obstinadamente recusada, certo de que ela me 'ulgavademasiado ardoroso, tentei um tom mais terno. recusa 'á não me"azia zangar, a"ligia&me apenas( não me devia a minha sens$velamiga algumas consolaç+es>

Enquanto me consolava, dei#ara uma das mãos na minha( olindo corpo apoiava&se no meu braço, e estávamos estreitamente

unidos. 4á reparou como nesta situação, - medida que a de"esaen"raquece, os pedidos e as recusas são "eitos de mais perto( acabeça a"asta&se, os olhares bai#am&se, enquanto que as palavrasditas em murmúrio se tornam raras e entrecortadas> Estes sintomaspreciosos anunciam de modo inequ$voco o consentimento da alma,mas raramente este chega aos sentidos( creio mesmo que é sempreperigoso ousar demasiado, visto que este estado de abandono éacompanhado por um doce prazer e não é poss$vel arrancar alguéma ele, sem causar um estado de esp$rito que se torna in"alivelmente"avorável - de"esa.

7as, no caso presente, a prud!ncia era&me tanto mais

necessária quanto eu tinha sobretudo a recear o susto que este

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esquecimento de si pr*pria não dei#aria de causar - ternasonhadora.

ão e#igia que a con"issão que suplicava "osse pronunciada(um olhar bastava( um s* olhar e seria "eliz.

7inha amiga, aqueles belos olhos ergueram&se de "ato para

mim( aquela boca celeste pronunciou até: 6<om= )im eu...67as de súbito e#tinguiu&se&lhe o olhar, "altou&lhe a voz e estamulher adorável caiu nos meus braços. 7al tivera tempo de( asegurar e 'á ela, libertando&se com uma "orça convulsiva, o olharperdido, as mãos elevadas para o céu... 6eus, * eus, salvai&me=6,gritou( e, no mesmo instante, mais rápida do que um rel8mpago,caiu de 'oelhos a dez passos de mim. )entia&a prestes a su"ocar.vancei para a socorrer, mas, tomando&me as mãos que banhava delágrimas e abraçando&me por vezes pelos 'oelhos, disse: 6)im, sereisv*s que me salvareis= )e não quereis a minha morte, dei#ai&me(salvai&me, dei#ai&me por amor de eus, dei#ai&me=6 E outras

palavras entrecortadas mal se ouviam através de soluçosredobrados. Entretanto prendia&se&me com uma "orça que me nãopermitia a"astar&me( então, 'untando as minhas, elevei&a nos meusbraços. o mesmo momento cessaram as lágrimas, dei#ou de "alar,os membros inteiriçaram&se&lhe, e violentas convuls+es sucederam aesta tempestade.

Eu estava, con"esso, violentamente comovido, e creio queteria acedido aos seus rogos, mesmo que as circunst8ncias não me"orçassem a tal. epois de lhe ter dado algum amparo, dei#ei&acon"orme me pedia, e "elicito&me por isso. Em breve receberei o

pr!mio.Esperava que, tal como no dia da minha primeira declaração,ela não aparecesse - noite. 7as, cerca das oito horas, desceu aosalão e limitou&se a declarar que estivera muito incomodada.

 3inha o rosto abatido, a voz sumida, e os modos erama"etados( mas o olhar era doce e muitas vezes me "i#ou. 9omo serecusou a 'ogar "ui obrigado a substitu$&la e veio sentar&se a meulado. urante a ceia "icou sozinha no salão. 0uando voltamos,reparei que chorara( para me certi"icar, disse&lhe que me parecia queela ainda se ressentia do seu mal&estar( ao que respondeudelicadamente: 6Este mal não se vai tão depressa como vem=6

0uando "inalmente nos retiramos, dei&lhe a mão( e - portados seus aposentos apertou a minha com "orça. J certo que estemovimento pareceu&me ter qualquer coisa de involuntário, mas tantomelhor( é mais uma prova do meu poder.

postaria que neste momento ela está encantada com oponto a que chegamos, acabou&se o trabalho= ozemos agora.

 3alvez, no momento em que lhe escrevo, ela se ocupe 'ádesta doce idéia= E mesmo que pelo contrário ela se ocupasse dumnovo pro'eto de de"esa, não sabemos 'á no que resultariam todosesses pro'etos> cha que isto pode ir além da nossa pr*#imaentrevista> )ei bem que se "ará rogada para a conceder, mas en"im=

)aberão estas beatas austeras conter&se uma vez "ranqueado oprimeiro passo> 2 amor delas é uma verdadeira e#plosão( a

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resist!ncia dá&lhes mais "orça. minha "anática devota correria atrásde mim, se eu dei#asse de a perseguir.

En"im, minha bela amiga, em breve irei 'unto de si, para lhee#igir o cumprimento da sua palavra. ão esqueceu sem dúvida queprometeu, ap*s o sucesso, uma in"idelidade ao seu 9avaleiro>

Está preparada> 5elo meu lado, dese'o&a como se nunca ativesse conhecido. 2u antes, conhec!&la é talvez uma razão para adese'ar ainda mais.

...'e suis 'uste, et ne suis point galant... )erá a primeira in"idelidade que "arei a esta severa conquista(

e prometo&lhe aproveitar o primeiro prete#to para me a"astar delapor vinte e quatro horas. )erá o castigo por me ter mantido tantotempo longe de si.

)abe que há mais de dois meses que esta aventura meprende> )im, dois meses e tr!s dias( 'á incluo na verdade o dia deamanhã, pois ela s* então se consumará.

Fsto "az&me lembrar que 7ademoiselle de <... resistiu tr!smeses inteiros. Estimo veri"icar que a coqueteria pura e simples temmais de"esa que a austera virtude.

deus, minha bela amiga( tenho de a dei#ar porque é muitotarde. Esta carta levou&me mais longe do que esperava( mas como aenvio amanhã de manhã a 5aris, quis aproveitar, para a "azerpartilhar um dia mais cedo da alegria deste seu amigo.

9astelo de..., T de 2utubro de CD, - noite.

*7ou -usto, e não sou galanteador oltaire &omédie de "anrne!" do #2

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CARTA C

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

7inha amiga, "ui ludibriado, tra$do, abandonado( estou

desesperado( 7adame de 3ourvel partiu. 5artiu e eu não o soube=E não estava lá para me opor - sua partida, para lhe censurartão indigna traição= h= ão 'ulgue que a dei#aria "ugir( ela teria"icado( teria "icado nem que "osse "orçado a recorrer - viol!ncia.

7as qu!= a minha crédula tranqSilidade, dormiasossegadamente: dormia e o raio "ulminou&me. ão, nãocompreendo este abandono( devemos renunciar a compreender asmulheres.

0uando me lembro do dia de ontem= 0ue digo= a noite até=quele olhar doce= quela voz tão terna= E a mão que apertou aminha= E durante todo esse tempo pro'etava "ugir de mim= 2h=

7ulheres, mulheres= 0uei#ais&vos depois se alguém vos engana= )im,toda a per"$dia que empregamos é um roubo que vos "azemos.

0ue prazer terei em vingar&me= 3ornarei a encontrar essapér"ida mulher e retomarei o meu dom$nio sobre ela. )e o amor mebastou para descobrir o caminho, que não "arei guiado pelavingança. inda a hei&de ver a meus pés, tremendo e banhada emlágrimas, pedindo&me perdão com aquela voz enganadora( serei sempiedade.

0ue "az agora, que pensa> 3alvez se regozi'e por me terenganado e, "iel aos gostos do seu se#o, este prazer lhe pareça o

mais doce. 2 que não p%de a tão louvada virtude, conseguiu&o amanha sem es"orço. Fnsensato=Eu temia a sensatez dela( devia antes temer a má "é.E ser obrigado a engolir o meu ressentimento= 2usar apenas

mostrar uma terna dor, quando tenho o coração cheio de raiva=?er&me reduzido a suplicar outra vez a uma mulher rebelde,

que se "urtou ao meu poder= 7erecia eu ser humilhado a este ponto>E por quem> 5or uma mulher t$mida, sem prática destas lutas.e que me vale ter&lhe conquistado o coração, t!&la abrasado

pelo "ogo do amor, ter elevado até ao del$rio a perturbação dossentidos, se, tranqSila no seu re"úgio, ela pode ho'e orgulhar&se mais

da sua "uga do que eu das minhas vit*rias> )uportarei isto> minha amiga não pode acreditar em tal( não tem de mimidéia tão humilhante=

7as que "atalidade me liga a esta mulher> ão há centenasque dese'am as minhas atenç+es> 0ue se apressariam acorresponder&me>

E mesmo que não se comparem a esta, a atração davariedade, o encanto de novas conquistas, o prest$gio do seunúmero, não o"erecerão também doces prazeres> 5or que correratrás de quem nos "oge e desprezar os que nos procuram>

h= 5orqu!>. .. Fgnoro&o mas não posso sentir de maneira

di"erente. ão e#iste para mim "elicidade ou repouso se não possuir

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esta mulher que odeio e amo com "úria igual. )* poderei suportar aminha vida a partir do momento em que disponha da sua.

Então, tranqSilo e satis"eito, v!&la&ei, por sua vez, entregueaos tormentos que me sacodem nesta hora( e criarei ainda miloutros.

0uero que a esperança e o temor, a descon"iança e atranqSilidade, todos os males inventados pelo *dio, e todos os bensconcedidos pelo amor, possuam o seu coração, e a$ se alternemsegundo o meu dese'o. Aá de chegar esse momento... 7as quantostrabalhos ainda= 9omo ontem estive perto e ho'e me sinto a"astado=9omo apro#imar&me> ão ouso tentar qualquer movimento( paratomar uma decisão seria preciso estar mais calmo, e o sangue "erve&me nas veias.

2 que aumenta o meu tormento é o sangue&"rio com quetodos respondem -s minhas perguntas sobre este acontecimento esobre a causa, e tudo o que me parece tão e#traordinário.

inguém sabe nada nem procura saber, nem teriam "aladonisso, se eu consentisse que se "alasse doutra coisa. 7adame deGosemonde, que visitei no seu quarto logo de manhã quando soubea not$cia, respondeu&me, com a calma da sua idade, que se tratavada continuação natural da indisposição que 7adame de 3ourveltivera ontem( que ela receara uma doença e pre"erira ir para casa.chava muito natural e teria "eito o mesmo, a"irmou&me.

9omo se pudesse haver qualquer coisa de comum entreambas=, entre esta, a quem não resta senão a morte, e a outra,encanto e tormento da minha vida=

7adame de ?olanges, que 'ulguei primeiro cúmplice, parecea"inal o"endida por não ter sido consultada sobre esta partida.Estou satis"eito, con"esso, por ela não ter tido o prazer de me

dar um desgosto. Fsto prova que ela não possui inteiramente, talcomo eu temia, a con"iança da amiga( sempre é uma inimiga amenos. 9omo se "elicitaria se soubesse que era de mim que "ugiam=9omo estaria inchada de orgulho se isso tivesse acontecido devidoaos seus conselhos= 9omo se sentiria importante=

7eu eus, como a odeio= 2h, recomeçarei com a "ilha( queromoldá&la segundo a minha "antasia( e creio que "icarei aqui algumtempo. 5elo menos, as poucas re"le#+es que "iz levam&me a esta

conclusão.ão acha que( depois desta decisão tão viva, a ingrata deverecear a minha presença> )e pensou que podia segui&la, certamenteme proibiu a entrada( e não quero nem acostumá&la a isso, nemso"rer a humilhação.

5re"iro dizer&lhe que "ico aqui( rogar&lhe&ei que volte( e quandoestiver persuadida da minha aus!ncia, apresentar&me&ei( veremoscomo reage a esta entrevista.

7as é preciso adiá&la para lhe aumentar o e"eito, e não sei seterei paci!ncia para isso. bri umas vinte vezes a boca durante o diapara pedir os meus cavalos. 7as conseguirei dominar&me(

comprometo&me a receber a sua resposta aqui( peço&lhe s*, minhabela amiga, que ma não "aça esperar. 2 que me poderia contrariar

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mais seria não saber o que se passa( mas o meu criado, que está em5aris, tem possibilidade de acesso 'unto da criada de quarto eportanto poder&me&á ser útil. ?ou&lhe enviar instruç+es e dinheiro.ão se importará que eu 'unte ambos a esta carta e que lhe peça ocuidado de lhos enviar por um dos seus, com a ordem de lhos

entregar pessoalmente. 3omo esta precaução porque o tolo tem o hábito de nuncareceber as cartas que lhe escrevo, quando elas lhe ordenamqualquer coisa que o mace( e, neste momento, não me parece tãoapai#onado pela sua conquista como eu o dese'aria.

deus, bela amiga( se tiver idéia "eliz, qualquer meio deapressar a marcha, diga&me. 4á mais de uma vez senti quanto a suaamizade me pode ser útil, sinto&o ainda neste momento, porque"iquei mais calmo enquanto lhe escrevia( pelo menos, "alo a alguémque me compreende, e não aos aut%matos 'unto de quem vegetodesde manhã. a verdade, quanto mais penso mais acredito que s*

e#istimos voc! e eu no mundo, que tenhamos qualquer valia.

9astelo de..., B de 2utubro de CD .

CARTA CI

O VISCONDE DE VALMONT A AOLAN! SEU CRIADO

L4unta - precedente1eves ser muito imbecil para, tendo partido daqui esta

manhã, não teres descoberto que 7adame de 3ourvel tambémpartia( ou, se o soubeste, para me não teres prevenido. e que servegastares o meu dinheiro a beber com os criados, e que em vez deempregares o tempo a servir&me o desperdices a "azer a corte -scriadas de quarto, se apesar disso não "ico mais bem in"ormadoacerca do que se passa> 3anta neglig!ncia= 7as previno&te de que,se te acontecer uma que se'a neste caso, será a última que terás aomeu serviço.

Fn"ormar&me&ás de tudo o que se passar em casa de 7adamede 3ourvel, da saúde dela( se dorme( se está triste ou alegre( se saimuitas vezes e aonde vai( se recebe visitas, e quem( em que passa otempo, se se zanga com as criadas, especialmente com a que veiocom ela( o que "az quando está s*( se quando l!, l! seguidamente ouse interrompe a leitura para meditar( e o mesmo quando escreve.5rocura tornar&te amigo do criado que leva as cartas para o correio.2"erece&te até para "azer esse recado em vez dele( e quando aceitarnão mandes senão as que te parecerem indi"erentes, e envia&me asoutras, sobretudo as endereçadas a 7adame de ?olanges, se algumahouver.

5rocura ser ainda por algum tempo o amante "eliz da tua 4úlia.)e ela tem outro, como 'ulgaste, que consinta em se dividir( e não te

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a"li'as com escrúpulos rid$culos, estarás no caso de muitos outros,que valem mais do que tu. )e no entanto o teu rival se tornarimportuno, se, por e#emplo, vires que ele ocupa demasiado a 4úliadurante o dia, e que por isso ela está menos tempo 'unto da senhora,a"asta&o de qualquer modo( ou procura uma questão com ele( não

temas as conseqS!ncias, responderei por ti. ão dei#es essa casa. Jpela assiduidade que se nota e percebe tudo. )e por um acaso algumdos criados "or despedido, apresenta&te para o substituir como se 'áme não pertencesses.

5odes dizer nesse caso que me dei#aste para procurar umacasa mais tranqSila e regrada. az o poss$vel para que te aceitem.icarás do mesmo modo ao meu serviço durante esse tempo( serácomo em casa da uquesa de...: e, ainda por cima, 7adame de

 3ourvel te virá a recompensar.)e tivesses 'eito e zelo estas instruç+es deviam bastar, mas

para suprir a ambos envio&te dinheiro. 2 bilhete 'unto autoriza&te

como verás a levantar vinte e cinco lu$ses do meu administrador(porque tenho a certeza de que estás sem dinheiro. Empregarás destaquantia o que "or necessário para decidir 4úlia a estabelecercorrespond!ncia comigo. 2 resto será para beberes com os criados.0uando o "izeres, não esqueças que não são os teus prazeres que euquero pagar, mas os teus serviços.

costuma 4úlia a observar e a contar&te tudo, mesmo o quelhe pareça demasiado minucioso. ?ale mais que ela escreva dez"rases inúteis do que omita uma com interesse( e muitas vezes o queparece indi"erente não o é. 9omo é necessário que possa ser

in"ormado imediatamente, se acontecer qualquer coisa que te pareçaimportante, assim que tenhas recebido esta carta mandarás ilipe"i#ar&se em... com um cavalo( a$ "icará até nova ordem( haverá umamuda em caso de necessidade. 5ara a correspond!ncia corrente,bastará o correio.

 3em cuidado em não perder esta carta. Gel!&a todos os dias,não s* para te certi"icares de que não te esqueceste de nada, mastambém para teres a certeza de ainda a possu$res. az en"im tudo oque é preciso, quando se tem a honra da minha con"iança.*#ldeia a meio caminho de $aris ao castelo de )adame de :osemonde!" do #2

ão terás de que te arrepender se eu "icar satis"eito contigo.

9astelo de..., B de 2utubro de CD .

CARTA CII

A PRESIDENTE DE TOURVEL A MADAME DE ROSEMONDE

icareis muito admirada, senhora, ao saberdes que parto devossa casa assim tão precipitadamente. 5arecer&vos&á e#traordinária

esta atitude, mas a vossa surpresa aumentará ainda, quandosouberdes quais os motivos=

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chareis talvez que, ao con"iar&vo&los, não respeitei comodevia a tranqSilidade tão necessária - vossa idade( que me a"astoaté dos sentimentos de veneração que a tantos t$tulos vos sãodevidos. h= senhora, perdão, mas o meu coração está oprimido, eprecisa de e#pandir a sua dor no seio duma amiga simultaneamente

doce e prudente: quem poderia ele escolher senão v*s> 9onsiderai&me como vossa "ilha. 3ende para comigo toda a bondade maternal( imploro&vos. 2s

meus sentimentos por v*s talvez possam 'usti"icar as minhassúplicas.

2nde está o tempo em que, inteiramente devotada asentimentos louváveis, não conhecia ainda aqueles que, lançando aalma na perturbação que sinto agora, nos roubam a "orça de oscombater no momento e#ato em que imp+em esse dever>

h=Esta viagem "atal perdeu&me...0ue vos posso dizer> mo, sim, amo loucamente. i= Esta

palavra que escrevo pela primeira vez, esta palavra tanta vezdese'ada sem ser obtida, pagaria com a vida a doçura de a poderdizer uma s* vez -quele que ma inspira( e contudo devo sem cessarabster&me de tal= Ele vai ainda duvidar dos meus sentimentos( 'ulgar&se&á com direito a quei#ar&se. )ou tão in"eliz=

5or que não l! ele no meu coração com a mesma "acilidadecom que a$ reina> )im, seria menos in"eliz, se ele soubesse comoso"ro( mas mesmo v*s, a quem o revelo, não "azeis senão ainda umaleve idéia da minha dor.

entro de poucos momentos vou "ugir e a"ligi&lo. 4ulgar&se&á

ainda perto de mim, e 'á eu estarei longe, - hora a que noscostumávamos ver todos os dias, estarei num local aonde nuncaveio, aonde não devo permitir que venha. 2s preparativos estãotodos "eitos( tenho tudo em "rente dos meus olhos( não os possorepousar sobre nada que não me anuncie a cruel partida. Está tudopronto, e#ceto eu. E quando mais o coração se recusa, mais meprova a necessidade de me submeter a esta decisão.

)ubmeter&me&ei sem dúvida( antes morrer do que viverculpada.

e resto, sinto que 'á o sou( salvei apenas a sensatez, avirtude 'á desapareceu. ão é preciso con"essar&vos( o que ainda me

resta, devo&o apenas - generosidade dele. Entontecida com o prazerde o ver, de o ouvir, com a doçura de o sentir 'unto de mim e com a"elicidade de poder "azer a dele, encontrava&me sem recursos e sem"orças( mal podia ainda lutar, 'á não resistia( estremecia com operigo sem conseguir "ugir&lhe. 5ois bem= ?iu a minha dor e tevepiedade de mim. 9omo não o adorar>

evo&lhe mais do que a vida.h= )e ao "icar 'unto dele eu tivesse apenas que temer por

ela, podeis crer que nunca me a"astaria. e que me serve a vida semele> ão seria para mim uma "elicidade perd!&la> 9ondenada aprovocar eternamente a in"elicidade de ambos( a não ousar quei#ar&

me, nem consolá&lo( a de"ender&me todos os dias dele e de mim

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pr*pria( a p%r todos os meus cuidados em "azer&lhe mal, quandoa"inal dese'aria consagrá&los - sua "elicidade.

?iver assim, não serão mil mortes> Eis todavia o meu destino.)uportá&lo&ei no entanto, não me "altará a coragem. Gecebei v*s, aquem escolho por mãe, este 'uramento.

Gecebei igualmente aquele que "aço de nunca vos ocultarnenhuma das minhas aç+es( recebei&o, suplico&vos( peço&vo&lo comoum au#$lio precioso: obrigada assim a dizer&vos tudo, sentirei comose estivesse sempre na vossa presença. vossa virtude substituirá aminha. unca consentirei, sem dúvida, em corar diante de v*s, eretida por esse "reio poderoso, ao mesmo tempo que adorei em v*s aamiga tolerante e con"idente da minha "raqueza, venerarei ainda oan'o tutelar que me há de salvar da vergonha.

J 'á sentir muita o ter de "azer este pedido. atal e"eito dumapresunçosa con"iança= 5or que não temi mais cedo esta inclinaçãoque senti nascer> 5or que me lison'eei de a poder dominar ou vencer

- minha vontade> Fnsensata= 7uito mal conhecia eu o amor= h= )e ativesse combatido com mais cuidado, talvez tivesse adquirido menospoder= E então talvez esta "uga não "osse necessária( ou,submetendo&me embora a tão dolorosa decisão, poderia não romperinteiramente uma ligação que bastaria tornar menos "reqSente= 7asperder tudo duma s* vez, e para sempre= N minha amiga...= 7asqu!> 7esmo ao escrever&vos, desvairo ainda em dese'os criminosos>h= 5artamos, partamos, e que ao menos estes erros involuntáriosse'am e#piados pelos meus sacri"$cios.

deus, respeitável amiga( amai&me como "ilha, adotai&me

como tal( e podes estar certa de que, apesar da minha "raqueza,pre"eriria morrer a tornar&me indigna da vossa escolha.

B de 2utubro de CD , - uma hora da manhã.

CARTA CIII

MADAME DE ROSEMONDE A PRESIDENTE DE TOURVEL

iquei, minha querida amiga, mais a"lita com a vossa partidado que surpreendida pela causa( uma longa e#peri!ncia e o interesseque me inspirais bastaram para me esclarecer quanto ao estado dovosso coração( e, para dizer tudo, nada me dissestes na carta que eunão soubesse 'á. )e s* por ela tivesse tomado conhecimento,ignoraria ainda quem é aquele que amais( porque, embora me "aleisdele todo o tempo, não lhe escrevestes o nome uma s* vez. 7as nãoera preciso, sei bem de quem se trata.

oto&o apenas, porque me lembrei que é sempre esse o estilodo amor. ?e'o que é ainda tal como no passado.

5ensei que nunca mais voltaria a recordaç+es tão long$nquas

e tão estranhas - minha idade. o entanto, desde ontem, tenhopensado muito nelas, pelo dese'o que sentia de encontrar algo que

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vos pudesse ser útil. 7as que posso "azer além de vos admirar elamentar> cho louvável a sensata decisão que tomastes, masassusta&me, porque concluo que a 'ulgastes necessária( e quando seestá nesse ponto é di"$cil mantermo&nos a"astadas daqueles que onosso coração chama sem cessar.

o entanto não deveis perder a coragem. ada sei imposs$vel- vossa bela alma( e mesmo que um dia tivésseis a in"elicidade desucumbir Lque eus não o permita=1, acreditai&me, minha queridaamiga, "icar&vos&á ao menos a consolação de ter lutado com todas as"orças. E depois, o que a sensatez humana não consegue, opera&o agraça divina quando quer.

 3alvez em breve se'ais socorrida( e a vossa virtude,e#perimentada nestes penosos combates, sairá mais pura ebrilhante. "orça que não tendes ho'e, podeis receb!&la amanhã.ão deveis ter esperança nela para vos repousardes, mas antes paravos encora'ar a usar todas as de que 'á podeis dispor.

ei#ando - 5rovid!ncia o encargo de vos socorrer dum perigocontra o qual nada posso, reservo&me o de vos a'udar e consolartanto quanto me "or poss$vel. ão aliviarei as vossas penas, mascompartilhá&las&ei.

J com esse "im que receberei de boa vontade as vossascon"id!ncias.

)into que o vosso coração deve ter necessidade de see#pandir.

bro&vos o meu( a idade ainda não o gelou a ponto de serinsens$vel - amizade. Encontrá&lo&eis sempre pronto para vos

receber. 5odeis vir com con"iança repousar&vos de cruéis agitaç+es.)erá "raco al$vio para as vossas dores, mas pelo menos não chorareissozinha( e quando esse amor in"eliz, dominando&vos demasiado, vosobrigar a "alar, mais vale que se'a comigo do que com ele. Eis que"alo como v*s e creio que ambas não chegaremos a nomeá&lo( deresto compreendemo&nos.

ão sei se "aço bem em dizer&vos que ele me pareceu muitoatingido pela vossa partida( talvez "osse mais sensato não vos "alarnisso, mas não gosto dessa sensatez que "az a"ligir os amigos.

)ou "orçada a não vos "alar mais longamente. vista débil, amão vacilante não me consentem longas cartas, quando é preciso

que eu pr*pria as escreva.deus, então, minha querida amiga( adeus, minha "ilhaadorável( sim, adoto&vos de boa vontade como minha "ilha( tendestudo o que é preciso para "azer o orgulho e o prazer duma mãe.

9astelo de..., B de 2utubro de CD .

CARTA CIV

A MARQUESA DE MERTEUIL A MADAME DE VOLANGES

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Em verdade, minha querida e boa amiga, custou&me a evitarum movimento de orgulho, ao ler a vossa carta. 0u!= 5ois honrais&me com a vossa inteira con"iança= E ides mesmo ao ponto de mepedir conselhos= h= )entir&me&ia muito "eliz, se soubesse mereceruma opinião tão "avorável da vossa parte, e não dev!&la apenas -

indulg!ncia da amizade. e resto, qualquer que se'a o motivo, estanão é menos preciosa para o meu coração( e t!&la obtido, é emminha opinião mais uma razão para procurar merec!&la.

?ou deste modo Lmas sem pretender dar&vos um conselho1,dizer&vos livremente a minha maneira de pensar. escon"io delaporque é di"erente da vossa, mas depois de vos e#por as minhasraz+es v*s as 'ulgareis( e se as condenardes submeto&meantecipadamente ao vosso 'u$zo. 3erei pelo menos a sensatez de menão 'ulgar mais ponderada do que v*s.

)e no entanto, e por uma s* vez, a minha opinião "ossepre"er$vel, a causa disso seriam as ilus+es do amor maternal. E este

sentimento, visto que é louvável, encontrar&se&á por certo no vossocoração. oi ele com certeza que vos ditou a decisão que estais atomar= )e alguma vez vos acontecer errar é apenas na escolha dasvirtude.

prud!ncia é, ao que me parece, a que se deve pre"erir,quando temos nas nossas mãos o destino dos outros( e sobretudoquando se trata de o "i#ar por um laço indissolúvel e sagrado como ocasamento. J então que uma mãe, simultaneamente sensata e terna,deve, como tão bem dizeis, a'udar a "ilha com a sua e#peri!ncia. 2ra,pergunto&vos, que deve "azer para o conseguir, se não distinguir,

para ela, entre o que agrada e o que convém>ão será rebai#ar a autoridade materna, não será reduzi&la anada, subordiná&la a um gosto "r$volo, "ilho do capricho e pai dodel$rio, cu'o poder ilus*rio domina s* os que o temem, e desaparecelogo que o desprezam>

5or mim, con"esso, nunca acreditei nessas pai#+esarrebatadoras e irresist$veis com que, segundo me parece, seconvencionou desculpar de modo geral os nossos desregramentos.ão concebo como um gosto, que nasce num momento e logo morre,pode ter mais "orça que os princ$pios inalteráveis do pudor, dahonestidade e da modéstia( e não compreendo que uma mulher que

os trai possa ser mais 'usti"icada pela sua pseudopai#ão, que umladrão pela pai#ão do dinheiro, ou um assassino pela da vingança.2h= 0uem se pode gabar de nunca ter tido que resistir> 7as

sempre tentei persuadir&me que para resistir basta quer!&lo( e atéaqui, pelo menos, a minha e#peri!ncia con"irmou esta opinião.

0ue seria a virtude sem os deveres que imp+e> 2 seu cultoestá nos nossos sacri"$cios e a recompensa nos coraç+es. Estasverdades s* podem ser negadas pelos que t!m interesse em asdesconhecer( e que, 'á depravados, esperam iludir&se um momento,tentando 'usti"icar a sua má conduta com más raz+es.

7as pod!&lo&emos recear quando se trata duma criança

simples e t$mida, duma criança que é vossa "ilha, e cu'a educaçãomodesta e pura "orti"icou as 'á "elizes tend!ncias naturais> J no

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entanto a este temor, ouso dizer humilhante para vossa "ilha, quequereis sacri"icar o vanta'oso casamento que a vossa prud!nciapreparara para ela= osto muito de ancenP( e há muito tempo,como sabe, que pouco ve'o o senhor de ercourt, mas a amizade porum e a indi"erença que sinto pelo outro não me impedem de sentir a

enorme di"erença que e#iste entre esses dois partidos.2 nascimento é igual, concedo( mas um não tem "ortuna, e ado outro é tal que, mesmo sem o nascimento, teria bastado para lheabrir todas as portas. 9on"esso que o dinheiro não "az a "elicidade(mas devemos con"essar também que a'uda muito.

7ademoiselle de ?olanges é, como dizeis, rica por dois, noentanto, as sessenta mil libras de renda de que ela gozará não são 'átanto quando se traz o nome de ancenP e quando se tem de p%r emanter uma casa que lhe corresponda. 4á não estamos no tempo de7adame de )évigné. 2 lu#o absorve tudo( censuramo&lo, mas épreciso imitá&lo( e o supér"luo acaba por nos privar do necessário.

0uanto -s qualidades pessoais que tendes, com razão, em tãogrande conta, nada há com certeza a censurar ao senhor deercourt( e, quanto a ele, as provas estão "eitas. J&me agradávelcrer, e creio de "ato, que ancenP em nada lhe é in"erior( maspoderemos ter absoluta certeza> J certo que até aqui me pareceuisento dos de"eitos pr*prios da sua idade e, apesar das tend!ncias daépoca, mostra um gosto pelas boas companhias que parece ser debom augúrio( mas quem sabe se não deve esta aparente sensatez -mediocridade da "ortuna> 7esmo que se não tema ser corrupto oudevasso, é preciso dinheiro para se ser 'ogador ou libertino, e até se

podem amar os de"eitos de que tememos os e#cessos. En"im, nãoseria o único que procuraria as boas companhias unicamente por nãopoder ocupar&se mais a seu gosto.

ão digo Leus me livre=1 que creia tudo isto a seu respeito,mas sempre seria correr um risco( e que censuras não "ar$eis a v*smesma, se o acontecimento não "osse "eliz= 0ue responder$eis -vossa "ilha quando ela vos dissesse: 6 7ãe, eu era 'ovem e seme#peri!ncia, era arrastada por um erro perdoável na minha idade(mas o céu, prevendo a minha "raqueza, dera&me uma mãe sensata,para tudo remediar e me acautelar desse mal. 5or que "oi então que,esquecendo a vossa prud!ncia, consentistes na minha in"elicidade>

)eria eu que deveria escolher marido, quando nada sabia do estadode casada> 7esmo que eu o quisesse não t$nheis o dever de moimpedir> 7as nunca tive esse louco dese'o. ecidida a obedecer&vos,esperei a vossa escolha com respeitosa resignação( nunca me a"asteida submissão que vos devia, e ho'e suporto os males que s* caemsobre os "ilhos rebeldes. vossa "raqueza perdeu&me.6 3alvez orespeito lhe su"ocasse estas quei#as, mas o amor materno adivinhá&las&ia e as lágrimas da vossa "ilha( apesar de dis"arçadas, correriamdo mesmo modo sobre o vosso coração.

)er&vos&ia poss$vel então encontrar consolaç+es> )eriaposs$vel encontrá&las nesse amor louco, contra o qual vos dever$eis

ter armado e pelo qual ao contrário vos dei#astes a"inal seduzir>

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 3alvez, querida amiga, eu tenha contra a pai#ão umaprevenção demasiado grande, mas 'ulgo&a tem$vel, mesmo nocasamento.

9laro que não desaprovo que um sentimento honesto e docevenha embelezar o laço con'ugal e suavizar de algum modo os

deveres que imp+em( mas não é a ele que compete criar este último(não é - ilusão dum momento que cabe "azer a escolha de toda anossa vida. 9om e"eito, para escolher, é preciso comparar( e como éisso poss$vel quando um s* ob'eto nos ocupa( quando nem essepodemos conhecer, mergulhados como estamos na embriaguez e nacegueira>

Encontrei, como podeis supor, várias mulheres atingidas poresse perigoso mal( ouvi as con"id!ncias de algumas. e ouvi&las,convencer&nos&emos que não há nenhuma que não tenha comoamante um ser per"eito, mas essas per"eiç+es quiméricas e#istem s*na imaginação delas. sua cabeça e#altada s* v! atrativos e

virtudes( adornam - sua vontade aqueles que amam( é o vestuáriodum eus, envergado muitas vezes por um modelo ab'eto, mas nãoimporta o que ele é, depois de o terem ornado, enganadas pela suapr*pria obra prostram&se para o adorar.

2u a vossa "ilha não ama ancenP, ou é v$tima desta ilusão(que é comum a ambos, se o seu amor é rec$proco. 2 vosso motivopara os unir para sempre reduz&se a"inal - certeza de que eles se nãoconhecem, se não podem conhecer. 7as, responder&me&eis, o senhorde ercourt e minha "ilha conhecem&se melhor>

ão, sem dúvida( mas pelo menos não se enganam a si

pr*prios, ignoram&se apenas. 2 que acontece neste caso entre doisesposos, que 'ulgo honestos> 9ada um estuda o outro, observa&seem relação a ele, procura e depressa encontra em que deve cedernos seus gostos e vontades para a tranqSilidade comum.

Esses ligeiros sacri"$cios "azem&se sem es"orço, porque sãorec$procos e 'á previstos( em breve "azem nascer uma mútuabenevol!ncia( e o hábito que "orti"ica todas as tend!ncias que nãodestr*i, conduz pouco a pouco a essa doce amizade, a essa ternacon"iança, que, 'untas - estima, "ormam, ao que me parece, averdadeira e s*lida "elicidade.

s ilus+es do amor podem ser mais doces, mas não sabemos

bem que são também menos duráveis> E que perigos não trazconsigo o momento que as destr*i= J então que os m$nimos de"eitosparecem chocantes e insuportáveis, pelo contraste que "ormam coma idéia de per"eição que nos seduzira. 9ada um dos esposos pensaque s* o outro mudou, e que ele é ainda o mesmo que o outroapreciara a"inal num momento de desvario.

Espanta&se de 'á não "azer nascer o encanto que ele pr*prio 'ánão sente( isto humilha&o, a vaidade "erida azeda os esp$ritos,aumenta os agravos, produz o mal&estar, "az nascer o *dio( e os"r$volos prazeres são pagos por longos in"ortúnios.

Eis, minha querida amiga, a minha opinião sobre o assunto

que nos ocupa( não a de"endo, e#ponho&a apenas( é a v*s que cabedecidir. 7as se persistis no vosso parecer, peço&vos que me

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comuniqueis as raz+es que venceram as minhas( "icarei radiante porme esclarecer 'unto de v*s, e sobretudo por "icar descansada quanto- sorte da vossa adorável "ilha, para quem dese'o ardentemente a"elicidade, não s* pela amizade que tenho por ela, mas também pelaque me une para sempre a v*s.

5aris, I de 2utubro de CD .

CARTA CV

A MARQUESA DE MERTEUIL A CECÍLIA DE VOLANGES

2ra bem, minha pequena, eis&te muito zangada e cheia devergonha= E o senhor de ?almont é um homem mau, não é>

5ois então= 2usa tratar&te como - mulher que mais amasse=Ensina&te aquilo que morrias de dese'o por saber= e "ato,

essas coisas não se "azem. E tu, pelo teu lado, querias guardar a tuapureza para o teu amado Lque não abusa dela1( do amor s*apreciavas os males e não os prazeres= ada de melhor para daruma bela "igura de romance. 5ai#ão, in"ortúnio, virtude ainda porcima, que belas coisas= 5or vezes no meio desse corte'o aborrecemo&nos deveras, mas representa&se bem a nossa parte.

?e'am como a pobre pequena é de lamentar= 3inha os olhospisados no dia seguinte= E que dirás quando "orem os do teu

amante> 9onsola&te, belo an'o, não os terás sempre assim( nemtodos os homens são ?almonts. E depois, não ousar levantar essesolhos= 2h= 3iveste razão, toda a gente leria neles a tua aventura. 7ascr!&me, se assim "osse, as nossas mulheres e raparigas teriam oolhar mais modesto.

pesar dos louvores que sou "orçada a "azer&te, como v!s,concordemos no entanto que "alhaste a tua obra&prima( deviascontar tudo - tua 7amã= 3inhas começado tão bem= Eis&te 'álançada, soluçando, nos seus braços( ela choraria também, que cenapatética= E que pena não a teres levado até ao "im= tua terna7amã, arrebatada de contentamento, para re"orçar a tua atitude,

ter&te&ia enclausurado para toda a vida num convento( e a$ amariasancenP enquanto te agradasse, sem rivais nem pecado, poder&te&ias desolar - tua vontade, e ?almont não iria, seguramente,perturbar a tua dor com prazeres importunos.

)eriamente, admiro&me que, 'á "eitos os quinze anos, se possaser tão criança= 3ens razão em dizer que não mereces a minhaatenção. ostaria no entanto de ser para ti uma amiga, terásnecessidade talvez duma amizade com a mãe que tens, e o maridoque ela te quer dar= 7as se não progrides, que queres que "açam deti> 0ue se pode esperar, se o que costuma despertar o esp$rito -sraparigas parece, pelo contrário, tirar&to>

)e "ores capaz de raciocinar um momento, depressa verásque te deves "elicitar em vez de te quei#ares. 7as és uma

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envergonhada e isso inibe&te= <em= 3ranquiliza&te( a vergonha que oamor causa é como a dor que ele desperta, e#perimentamo&la umas* vez. 5odemos ainda "ingi&la, mas nunca mais a sentimos.

o entanto "ica o prazer e 'á é alguma coisa. 4ulgo terdepreendido, através da tua tagarelice, que para ti valerá mesmo

muito. ?amos, um pouco de boa "é. Então essa perturbação que teimpedia de agir, como dizias, que te "azia achar tão di"$cil de"ender&te, que te "ez "icar de certo modo zangada quando ?almont partiu,era a vergonha que a causava, ou era o prazer> E as suas maneirasde "alar -s quais não se sabe como responder, não provinha tudoisso da maneira de ele agir> h, menina, mentes e mentes - tuaamiga= Fsso não está bem. 7as dei#emo&lo.

2 que para toda a gente seria um prazer, e poderia serapenas isso, torna&se na tua situação uma verdadeira "elicidade.

9om e"eito, colocada entre uma mãe por quem te convém

"azeres&te amada, e um apai#onado pelo qual dese'as s!&lo sempre,como não v!s que o único meio de obter estes prop*sitos tãocontrários é ocupar&te duma terceira pessoa> istra$da por uma novaaventura, enquanto diante de tua mãe tens o ar de sacri"icar -submissão por ela um gosto que lhe desagrada, adquires perante oteu amado a honra duma bela de"esa. ssegurando&lhe sem cessar oteu amor, nunca lhe concederás as últimas provas. Estas recusas, tãopouco di"$ceis na situação em que te encontras, não dei#ará ele de astomar - conta de virtude( talvez se quei#e, mas amar&te&á aindamais( e para ter o duplo mérito, aos olhos de um de sacri"icar o amor,

aos do outro de lhe resistir, terás apenas de "azer o sacri"$cio de lhesaborear os prazeres.2h, quantas mulheres perderam a reputação, quando com

cuidado a poderiam ter conservado se se tivessem podido servir desemelhantes processos=

Esta solução que proponho não te parece a mais razoável, amais doce> )abes o que ganhaste com a que tomaste> tua mãeatribuiu a redobrada tristeza a um redobrado amor, está indignada eespera apenas ter a certeza para te castigar. caba de me escrever(tentará tudo para obter de ti mesma a con"issão. 3alvez vá até,segundo me disse, propor&te ancenP como esposo, e isso s* para te

"azer "alar. E se te dei#asses seduzir por essa enganadora ternura,respondendo segundo o teu coração, em breve enclausurada pormuito tempo, talvez para sempre, chorarias com vagar a tua cegacredulidade.

J preciso opor um outro a este ardil que ela quer empregarcontra ti.

eves começar por mostrar menos tristeza e "azer&lhe crerque pensas menos em ancenP. Ela persuadir&se&á tanto mais"acilmente, quanto é esse e"eito habitual da aus!ncia( e "icar&te&ámuito grata porque encontrará uma ocasião para aplaudir a suaprud!ncia, que lhe sugeriu este processo. 7as se, conservando ainda

dúvidas, ela persistisse no entanto em e#perimentar&te, se viesse a"alar&te de casamento, deverias encerrar&te, como "ilha bem

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educada, numa inteira submissão. "inal que arriscas> 5ara aquilo deque nos serve um marido, tanto "az um como outro( e o maisinc%modo é ainda menos importuno do que uma mãe.

;ma vez contente contigo, a tua mãe casar&te&á en"im( eentão, mais livre nas tuas aç+es, poderás, a teu gosto, dei#ar

?almont para tomar ancenP, ou mesmo conservar os dois.5orque, toma atenção, o teu ancenP é gentil, mas é umhomem que se tem quando se quer e enquanto se quer( podemosdeste modo estar - vontade com ele. ão acontece o mesmo com?almont: é di"$cil guardá&lo( perigoso dei#á&lo. eve&se usar com elede muita habilidade, ou, quando a não temos, de muita docilidade.7as se conseguisses prend!&lo como amigo, seria uma sorte.9olocar&te&ia na primeira "ila das mulheres da moda.

J assim que se adquire uma posição no mundo, e não a corare a chorar, como quando as religiosas te obrigavam a 'antar de

 'oelhos.

5rocura, se és sensata, reconciliar&te com ?almont, que deveestar muito zangado contigo( e como é preciso saber emendar osnossos erros, não receeis tomar a iniciativa( e aprenderás logo que,se são os homens que ousam primeiro, somos quase sempre n*s asobrigadas a atra$&los em seguida. 3ens um prete#to, não devesguardar esta carta( peço&te e e#i'o&te que a entregues a ?almontassim que a tiveres lido. ão te esqueças de a tornar a lacrar antes.5rimeiro, é preciso dei#ar&te o mérito do gesto que vais "azer, e quenão deve parecer ter&te sido aconselhado( e depois, porque és tu aúnica pessoa no mundo de quem sou su"icientemente amiga para te

"alar como o "aço.deus, meu an'o( segue os meus conselhos, e dir&me&ás se"oram úteis.

5. ). & prop*sito, esquecia&me... uma palavra ainda. 9uida mais doteu estilo. Escreves ainda como uma criança. ?e'o bem qual a causa(dizes tudo o que pensas e nada do que não pensas. Fsso não temimport8ncia entre n*s, que nada devemos esconder uma - outra,mas com os outros, e sobretudo com o teu amado, parecerás sempreuma tontinha. 5ensa que quando escreves a alguém, é para essapessoa e não para ti, deves antes procurar dizer aquilo que lhe

agradará, de pre"er!ncia -quilo que pensas.deus, meu coração( bei'o&te em vez de te ralhar, na esperança deque te tornarás mais razoável.

5aris, I de 2utubro de CD .

CARTA CVI

A MARQUESA DE MERTEUIL AO VISCONDE DE VALMONT

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7aravilhoso, ?isconde, e, pelo seu !#ito, adoro&operdidamente=

e resto, ap*s a sua primeira carta, a continuação era deesperar( por isso, não me espantou( e enquanto que, 'á orgulhosodos "uturos sucessos, solicitava a devida recompensa, e me

perguntava 6se eu estava pronta6, percebi bem que não havianecessidade de me apressar. )im, por minha honra( lendo a beladescrição dessa terna cena, que o tinha tão 6violentamenteemocionado6( vendo o seu comedimento, digno dos mais belostempos da nossa cavalaria, repeti vinte vezes: 6Eis um caso "alhado=6

7as é que não podia ser doutra "orma= 0ue quer que "açauma pobre mulher que se lhe entrega, e de quem não se apoderou>

5or minha "é, num caso desses, é preciso ao menos salvar ahonra( "oi o que "ez a 5residente. 5roponho&me, vendo o e"eito doprocedimento dela, utilizá&lo por minha conta, na primeira ocasiãoque se me apresente, mas prometo que se, tal como o meu amigo,

aquele por quem eu "izer toda a cena não souber aproveitar&se dela,pode renunciar a mim para sempre.

Ei&lo pois reduzido a nada, e isto entre duas mulheres uma 'ávencida, e outra que não pedia senão a mesma sorte= 5ois bem= ?aicrer que me gabo, e dizer que é "ácil pro"etizar depois doacontecimento, mas 'uro&lhe que 'á o esperava. J que realmente nãotem o g!nio pr*prio da condição de libertino( sabe apenas o queaprendeu e não é capaz de inventar. ssim, desde que ascircunst8ncias não se adaptam -s manhas usuais e é preciso seguircaminho novo, "ica desarmado como um rapazinho.

En"im, criancice dum lado, regresso ao pudor do outro emvirtude de não acontecerem todos os dias, bastam para odesconcertar( e nem sequer os sabe evitar ou remediar. h=?isconde, ?isconde, ensina&me a não 'ulgar os homens pelos seus!#itos( e em breve se dirá a seu respeito: outrora teve mérito.6 Edepois de ter "eito asneira sobre asneira, recorre a mim= 5arece queeu não tenho outra coisa a "azer senão dar&lhe remédio. )eria naverdade trabalho de sobra.

essas duas aventuras, uma "oi iniciada contra a minhavontade, e por isso não me intrometo nela( quanto - outra, como aaceitou por amabilidade para comigo, encarrego&me eu dela. carta

que envio 'unto, e que entregará - pequena ?olanges depois de a terlido, é mais do que su"iciente para a "azer regressar aos seus braços(mas, peço&lhe, d! alguma atenção a esta criança, e "açamos dela, decomum acordo, o desespero da mãe e de ercourt. ão receemos"orçar as doses. ?e'o claramente que a garota não se assustará( umavez realizados os nossos des$gnios, que se arran'e como puder.

esinteresso&me inteiramente dela. 3ive dese'o de a tornar aomenos uma intrigante in"erior, que representaria os segundos papéissob a minha direção, mas não tem esto"o( so"re duma ingenuidadeestúpida que não cedeu sequer ao espec$"ico que o ?iscondeempregou, e contudo costuma dar resultado, é na minha opinião, a

doença mais perigosa que uma mulher possa ter. Ela indica,sobretudo uma "raqueza de caráter quase sempre incurável e que se

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op+e a tudo( de maneira que, se procurássemos "ormar arapariguinha para a intriga, criar$amos apenas mais uma mulher"ácil. 2ra, não conheço nada mais vulgar do que a "acilidade daestupidez, que se entrega sem saber nem como nem porqu!,unicamente porque a atacam e não sabe resistir.

7ulheres desta espécie são puras máquinas de prazer.ir&me&á que não há outra coisa a "azer dela e que isso bastapara os nossos pro'etos. )e'a assim= 7as não esqueçamos que cedotoda a gente descobre as molas e os motores dessas máquinas(assim, para nos servirmos desta sem perigo, é preciso apressarmo&nos, parar oportunamente e destru$&la em seguida.

a verdade, não nos "altarão os meios para nos des"azermosdela, e ercourt "á&la&á enclausurar quando quisermos. e "ato,quando ele 'á não puder duvidar do seu in"ortúnio, quando este "orbem público e not*rio, que nos importa que se vingue, contanto quenão se console> 2 que digo do marido, pensa&o sem dúvida da mãe(

por isso mãos - obra.Esta posição, que 'ulgo a melhor, decidiu&me a conduzir a

 'ovem um pouco mais depressa, como verá pela minha carta(importa nada dei#ar nas suas mãos que nos possa comprometer.

tente nisto, peço&lhe. 3omada esta precaução, encarrego&meeu do moral( o resto é consigo. 9ontudo, se virmos que aingenuidade se corrige, estaremos sempre a tempo de mudar depro'eto. e qualquer "orma seria preciso, mais dia menos dia,ocuparmo&nos do que vamos "azer, em qualquer dos casos, ascanseiras não serão inúteis.

)abe que as minhas quase o "oram, e que a boa estrela deercourt ia levando a melhor sobre a minha ci!ncia> 7adame de?olanges teve um momento de "raqueza maternal= 0ueria dar a "ilhaa ancenP= Eis o que anunciava esse interesse mais terno que o meuamigo notara 6no dia seguinte6. )eria ainda o ?isconde o causador desemelhante obra&prima=

elizmente a mãe carinhosa escreveu&me e espero t!&ladissuadido.

a minha carta "alo tanto de virtude, e sobretudo lison'eei&atanto, que ela deve achar que tenho razão.

 3enho pena de não ter tempo para copiar a carta a "im de o

edi"icar quanto - austeridade moral. ?eria como desprezo asdepravadas capazes de terem um amante= J tão c%modo ser&serigorista nas palavras= )* pode ser pre'udicial aos outros e não nosestorva de "orma alguma... E depois, não ignoro que essa 6virtuosa6mulher teve as suas "raquezas como qualquer outra, nos seustempos, e não me desagradou humilhá&la ao menos na suaconsci!ncia( isso consolou&me um pouco dos elogios que lhe "iz -custa da minha. oi isso que, na mesma carta, a idéia de "azer mal aercourt me deu coragem para dizer bem dele.

deus ?isconde( aprovo a decisão de permanecer a$. ãotenho meios para apressar a sua marcha( mas convido&o a distrair&se

com a nossa comum aluna. 0uanto a mim, apesar da delicada

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citação que usou, bem v! que ainda é preciso esperar( e concorda,sem dúvida, que não é minha a culpa.

5aris, I de 2utubro de CD .

CARTA CVII

AOLAN AO VISCONDE DE VALMONT

)enhor:

2bedecendo -s vossas ordens, "ui, logo que recebi a vossacarta, a casa do senhor <ertrand, que me entregou os vinte e cincolu$ses, como v*s lhe hav$eis ordenado. inda lhe pedi mais dois para

ilipe, a quem mandara partir imediatamente, como o senhor tinhaordenado, e que estava sem dinheiro( mas o vosso administrador nãoquis, a"irmando que não recebera tal ordem da vossa parte. uiobrigado a dar&lhos do meu bolso, e espero que o senhor terá abondade de levar isso em conta.

ilipe partiu ontem - tarde. Gecomendei&lhe muito que nãodei#asse a estalagem, para o podermos encontrar se "or preciso.

ui logo a seguir a casa da senhora 5residente para ver a 4úlia,mas ela tinha sa$do e s* "alei ao @a leur, por quem nada conseguisaber, porque desde a chegada que não vai ali senão - hora das

re"eiç+es. E o segundo criado que "az todo o serviço, e o senhor sabebem que a este eu não o conhecia. 7as comecei ho'e.?oltei esta manhã a estar com a 4úlia e ela "icou muito

satis"eita por me ver. Fnterroguei&a sobre a causa do regresso dapatroa( mas respondeu&me que nada sabia, e 'ulgo que "alavaverdade.

9ensurei&a por me não ter avisado da partida e ela a"irmou&me que s* soubera naquela noite, quando "ora deitar a senhora(tanto assim que passara toda a noite a arran'ar as coisas e a pobrerapariga não chegou a dormir duas horas. )a$ra nessa noite doquarto da patroa depois da uma hora, e quando a dei#ou punha&se

esta a escrever.e manhã, 7adame de 3ourvel, ao partir, entregou uma cartaao porteiro do castelo. 4úlia não sabia para quem: disse que talvez"osse para o senhor, mas o senhor não me "ala nisso.

urante toda a viagem a senhora tinha um grande capuz nacabeça, o que impedia que se lhe visse o rosto, mas 4úlia 'ulga queela chorou muito. ão disse uma palavra durante o caminho, e nãoquis parar em..., como "izera - ida( o que desagradou a 4úlia, quenão tinha almoçado. 7as, tal como eu lhe disse, manda quem pode.*#inda a mesma aldeia a meio do caminho 

H chegada, a senhora deitou&se( mas s* "icou duas horas na

cama. 0uando se levantou, mandou chamar o porteiro e deu&lheordem de não dei#ar entrar ninguém. em sequer se arran'ou.

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)entou&se - mesa para 'antar, mas s* comeu um pouco desopa e levantou&se logo. @evaram&lhe o ca"é ao quarto, 4úlia entrouao mesmo tempo. ?iu que a patroa arrumava os papéis da secretáriae reparou que eram cartas. postaria que são as do senhor( e dastr!s que recebeu durante a tarde, houve uma que conservou diante

dela até - noite. 3enho a certeza de que se trata ainda de algumavossa. 7as por que regressou ela deste modo> Espanta&me= 7as,en"im, com certeza que o senhor o sabe, e não tenho nada com isso.

senhora 5residente "oi - tarde - biblioteca e escolheu doislivros para o tocador, mas 4úlia a"irma que ela não leu nem umquarto de hora em todo o dia e que não "ez outra coisa senão ler atal carta, e pensar apoiada a uma mão. 9omo 'ulguei que o senhor"icaria contente por saber de que livros se trata, e 4úlia não sabia,consegui ir ho'e - biblioteca, com o prete#to de a ver.

)* estava vazio o lugar de dois livros: um é o segundo volumedos 5ensées 9hrétiennes( e o outro o primeiro dum livro que tem por

t$tulo 9larisse. Escrevo tal como lá estava: o senhor saberá talvez doque se trata.

2ntem - noite, a senhora não 'antou: s* tomou chá. 9hamoucedo esta manhã( pediu logo os cavalos e "oi antes das nove aeuillants, onde ouviu missa. 0uis con"essar&se mas o seu con"essorestava ausente e s* voltará dentro de oito a dez dias. 5ensei que osenhor gostaria de saber isto.

senhora voltou logo, almoçou, e p%s&se a escrever, e assimesteve quase até - uma hora. proveitei a ocasião para "azer o que osenhor tanto dese'ava: "ui eu que levei as cartas ao correio.

ão havia nenhuma para 7adame de ?olanges( mas envio&lheuma que era para o senhor 5residente: pensei que seria a maisinteressante. Aaviatambém uma para 7adame de Gosemonde, mas achei que o senhora conseguiria ler quando quisesse, e dei#ei&a seguir. e resto, osenhor saberá tudo porque a senhora 5residente também lheescreve. ?erei de "uturo todas as cartas que eu quiser( porque é a

 4úlia que as entrega aos criados, e ela prometeu&lhe que por amizadepor mim, e pelo senhor, "ará de boa vontade o que eu lhe pedir.

Ela nem sequer quis o dinheiro que lhe o"ereci, mas acho queo senhor deverá querer recompensá&la com algum presente( se o

dese'ar e se "or da sua vontade que eu me encarregue disso, sabereiachar "acilmente algo que lhe agradará.Espero que o senhor não ache deste vez que mostrei

neglig!ncia em servi&lo e dese'o lavar&me das censuras que me "ez.)e não soube da partida da senhora 5residente, "oi por causa do meuzelo em servir&vos, pois "oi devido a ele que parti -s tr!s da manhã(desse modo não vi 4úlia na véspera - noite, como de costume, vistoque "ui dormir a 3ournebride, para não acordar no castelo.

0uanto ao que o senhor me censura de estar muitas vezessem dinheiro, em primeiro lugar é porque gosto de me vestirconvenientemente, como o senhor pode ver, depois porque preciso

corresponder ao "ato que se traz, bem sei que devia economizar um

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pouco para o "uturo, mas con"io inteiramente na generosidade dosenhor, que é tão bom patrão.

0uando entrar para o serviço de 7adame de 3ourvel, "icandona mesma no do senhor, espero que não o e#igirá de mim. Era muitodi"erente em casa da senhora duquesa( eu não poderia usar uma

libré, e para mais uma libré de nobreza de toga, depois de ter tido ahonra de ser vosso criado.5ara tudo o resto, o senhor pode dispor daquele que tem a

honra de ser, com muito respeito e consideração, vosso humildeservidor.

Gou# zolan, criado.

5aris, O de 2utubro de CD -s onze horas da noite.

CARTA CVIII

A PRESIDENTE DE TOURVEL A MADAME DE ROSEMONDE

2h, minha indulgente mãe= 9omo vos agradeço e como meera necessário a vossa carta= @i&a e reli&a sem cessar( não podiaarrancar&me dela. evo&lhe os únicos momentos menos penosos quepassei desde a minha partida. 9omo sois boa= sensatez e a virtudesabem pois condoer&se da "raqueza= 3endes piedade dos meusmales= h, se os conhec!sseis=... )ão terr$veis. 4ulgava ter

e#perimentado os males do amor( mas o tormento ine#prim$vel, queé preciso ter sentido para o poder avaliar, é separarmo&nos daqueleque amamos, separarmo&nos para sempre=... )im, a dor que ho'esinto voltará amanhã, depois de amanhã, toda a minha vida= 7eueus, como sou 'ovem ainda, e que longo tempo me resta paraso"rer=

)ermos n*s pr*prios os autores da nossa in"elicidade( rasgar ocoração com as pr*prias mãos( e enquanto so"ro dores insuportáveis,sentir a cada instante que as posso "azer cessar com uma palavra, eque essa palavra é um crime= h, minha amiga=...

0uando tomei esta decisão tão penosa de me a"astar dele,

esperava que a aus!ncia me aumentaria a coragem e as "orças,como me enganei= 5arece&me que pelo contrário acabei por destru$&las.

5recisava de combater mais, é verdade, mas mesmoresistindo, nem tudo era privação( ao menos via&o algumas vezes(muitas vezes, mesmo sem ousar olhá&lo, sentia os olhos dele "i#osem mim( sim, minha amiga, sentia&os, parecia que me aqueciam aalma( e mesmo sem me atravessarem os olhos, chegavam&me aocoração. gora, na minha triste solidão, isolada de tudo o que me écaro, "rente ao meu in"ortúnio, todos os momentos da minha tristee#ist!ncia são regados de lágrimas, e nada me suaviza a amargura(

nenhuma consolação se 'unta aos meus sacri"$cios( e os que até ho'e"iz s* serviram para tornar mais dolorosos os que me resta "azer.

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2ntem ainda, senti&o vivamente. as cartas que metrou#eram, havia uma dele( estavam ainda a dois passos de mim e 'áeu a reconhecera entre as outras. @evantei&me involuntariamente(tremia, a custo escondia a minha emoção( e este estado não dei#avade me ser agradável. 0uando "iquei s* no momento seguinte, essa

enganadora doçura depressa se desvaneceu, e "icou&me apenas maisum sacri"$cio a "azer. 9om e"eito, poderia eu abrir essa carta quetanto ansiava por ler> 5ela "atalidade que me persegue, mesmo asconsolaç+es que parecem apresentar&se&me imp+em&me pelocontrário novas privaç+es( e estas tornam&se mais cruéis ainda pelaidéia de que o senhor de ?almont as compartilha.

Ei&lo en"im, esse nome que me ocupa sem cessar e que tantome custou a escrever( a quase censura que me "azeis a esteprop*sito, alarmou&me deveras. )uplico&vos que acrediteis que uma"alsa vergonha não alterou a minha con"iança em v*s( e por quetemeria nomeá&lo> 9oro dos meus sentimentos e não do ob'eto que

os causa. h= 0uem é mais digno do que ele de os inspirar=E contudo não sei por que me é tão di"$cil escrever esse nome(

e mesmo desta vez, "oi deliberadamente que o escrevi. ?olto a ele.9ontais&me que vos pareceu vivamente a"etado com a minha

partida. 0ue "ez ele> 0ue disse> alou em voltar a 5aris>5eço&vos que o a"asteis dessa idéia tanto quanto puderdes. )e

ele me interpretou bem, não deve ter levado a mal a minha partida,mas deve sentir também que é uma decisão sem apelo. ;m dosmeus maiores tormentos é não saber o que ele pensa. indaconservo a carta...( mas sois seguramente da minha opinião, não a

devo abrir.J a v*s, minha indulgente amiga, que devo não estarinteiramente separada dele. ão quero abusar da vossa bondade(ve'o bem que as vossas cartas não podem ser longas, mas nãonegareis duas palavras - vossa "ilha( uma para lhe manter acoragem, a outra para a consolar.

deus, minha respeitável amiga.

5aris, O de 2utubro de CD .

CARTA CIX

CECÍLIA DE VOLANGES A MARQUESA DE MERTEUIL

oi s* ho'e, senhora, que entreguei ao senhor de ?almont acarta que me destes a honra de escrever. uardei&a durante quatrodias, apesar do terror de que "osse encontrada, guardei&a com muitocuidado( e quando a tristeza me assaltava, "echava&me para a reler.

?e'o que o que 'ulgava uma tão grande in"elicidade não o é( e

devo con"essar até que me dá muito prazer( de modo que isso 'áquase me não a"lige. )omente a idéia de ancenP ainda me

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atormenta -s vezes. 7as há muitos momentos em que nem sequerpenso nisso e o senhor de ?almont é tão amável=

iz as pazes com ele há dois dias( "oi&me muito "ácil( porqueainda mal eu pronunciara duas palavras, 'á ele me dizia que se eutinha qualquer coisa a dizer&lhe iria nessa noite ao meu quarto, e s*

tive de responder&lhe que me agradaria muito. E depois, logo queentrou, pareceu&me tão contente comigo como se eu nada lhetivesse "eito. )* depois é que me ralhou, mas muito docemente( eduma maneira... 3al como v*s( isso provou&me que ele também temmuita amizade por mim.

ão seria capaz de dizer&vos quantas coisas engraçadas eleme contou, coisas que nunca teria acreditado( especialmente sobre a7amã.

gradecer&vos&ia muito se me dissésseis se tudo aquilo éverdade. 2 que é certo, é que eu não podia impedir&me de rir( dumavez mesmo -s gargalhadas, o que nos causou grande medo, porque

a 7amã podia ter ouvido( e se tivesse vindo, que me teriaacontecido> esta vez é que me mandaria para o convento=

9omo devemos ser prudentes e o senhor de ?almont me disseque por nada deste mundo queria correr o risco de me comprometer,combinamos que de ora avante ele viria s* abrir a porta e ir$amospara o seu quarto. $ nada há a recear( 'á lá estive ontem, e nomomento em que vos escrevo aguardo que me venha buscar. gora,minha senhora, espero que me não ralheis mais.

Aá no entanto uma coisa que me surpreendeu muito na vossacarta( é o que me mandais dizer acerca de ancenP e do senhor de

?almont quando eu estiver casada. 5arece&me que um dia, na Npera,me dissestes, pelo contrário, que, uma vez casada, não poderia amarsenão o meu marido, e que devia mesmo esquecer ancenP( deresto, talvez não tenha percebido bem, e pre"iro que não se'a assim,porque então, 'á não terei tanto receio de me casar. ese'o&o atévisto que terei mais liberdade( e espero então arran'ar maneira depensar s* em ancenP. )into bem que s* com ele sereiverdadeiramente "eliz, porque a sua lembrança agora atormenta&mesempre, e s* tenho "elicidade quando consigo não pensar nele, o queé muito di"$cil( e logo que penso, volto a "icar desgostosa.

2 que me consola um pouco é a certeza que me dais de que

ancenP me "icará amando mais devido a isto, mas tendes bem acerteza...2h, sim, ser$eis incapaz de me enganar. J engraçado que se'a

ancenP que eu ame, e que se'a o senhor de ?almont...7as, pelo que me dizeis, é talvez uma sorte = En"im, veremos.

ão compreendi bem o que me dizeis a respeito da minha maneirade escrever. 5arece&me que ancenP acha as minhas cartas bem talcomo são. o entanto, sinto que nada lhe devo dizer acerca do quese passa com o senhor de ?almont( nada tendes a temer.

7amã ainda me não "alou do meu casamento, mas não nospreocupemos( quando me "alar, visto que é para me apanhar,

prometo&vos que saberei mentir.

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deus, minha boa amiga, agradeço&vos, e prometo&vos quenunca esquecerei todas as bondades que tendes para comigo. evoacabar, é quase uma hora e o senhor de ?almont não tarda.

9astelo de..., CV de 2utubro de CD .

CARTA CX

O VISCONDE DE VALMONT À MARQUESA DE MERTEUIL

65oderes do céu, eu tinha uma alma para a dor( dai&me outrapara a "elicidade.6 9reio que é assim que se e#prime o terno )aint&preu#. 7ais bem dotado do que ele, possuo simultaneamente asduas e#ist!ncias. )im, minha amiga, sou ao mesmo tempo muito "eliz

e muito desgraçado( e visto que lhe dou inteira con"iança, devo&lhe adupla hist*ria das minhas dores e dos meus prazeres.

)aiba pois que a ingrata devota continua a ser severa paracomigo.

 4á estou na quarta carta devolvida. 0uarta, digo mal( porque,tendo adivinhado desde a primeira devolução que outras se lheseguiriam, e não querendo desperdiçar tempo, tomei a decisão deescrever os meus quei#umes em lugares&comuns, e de não datar,desde o segundo correio, é sempre a mesma carta que vai e vem(mudo apenas o sobrescrito. )e a minha bela acabar como acabam

geralmente as belas, e se se enternecer um dia, pelo menos decansaço, guardará en"im a missiva, e então será a altura de me p%rem dia. <em v! que, com este novo g!nero de correspond!ncia, nãoposso estar nem mais avançado, nem mais in"ormado do que noprimeiro dia.

escobri contudo que a volúvel criatura mudou de con"idente,tenho a certeza de que, desde a partida daqui, não veio nenhumacarta dela para 7adame de ?olanges, ao passo que 'á vieram duaspara a velha Gosemonde( e como esta nada nos diz, como 'á nãoabre a boca sobre 6a sua querida "ilha6, de quem antes "alava semcessar, conclu$ que "ora ela quem recebera a con"id!ncia. 5resumo

que por um lado a necessidade de "alar de mim( e por outro lado avergonha de e#por, perante 7adame de ?olanges, um sentimento hátanto tempo renegado, produziram esta grande revolução. Geceio terperdido com a troca, porque as mulheres quanto mais velhas, maisr$spidas e severas se tornam.

primeira dir&lhe&ia mal de mim, mas esta dir&lhe&á ainda piordo amor( e a sens$vel e pudibunda dama tem mais terror dosentimento do que de mim.

única maneira de saber o que se passa é, como v!,interceptar a correspond!ncia clandestina. 4á dei ordem ao meucriado( e aguardo a e#ecução de dia para dia. té lá, s* posso agir ao

acaso, assim, há oito dias, reve'o inutilmente todos os processosconhecidos, os dos romances e os das minhas mem*rias secretas(

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não encontro nenhum que convenha -s circunst8ncias da aventuraou ao caráter da hero$na. 2 di"$cil não seria introduzir&me em casadela, mesmo de noite, adormec!&la e trans"ormá&la numa nova9larisse, mas depois de mais de dois meses de cuidados e detrabalhos, recorrer a meios que me são estranhos, arrastar&me

servilmente pelo caminho dos outros, e triun"ar sem gl*ria=...ão, ela não terá 6os prazeres do v$cio e as honras davirtude6. ão me basta possu$&la, quero que ela se entregue.

2ra, para tal não basta penetrar até 'unto dela, mas sim "az!&lo com o seu consentimento( encontrá&la s* e na disposição de meescutar( sobretudo "echar&lhe os olhos quanto ao perigo, porque, se ov!, saberá venc!&lo ou morrer. 7as quanto melhor sei o que épreciso "azer, mais reconheço as di"iculdades, e ainda que a minhaamiga "aça outra vez troça de mim, con"esso&lhe que o meuembaraço aumenta - medida que me ocupo cada vez mais do caso.

cabeça "icar&me&ia tonta, creio, sem as "elizes distraç+es

que me dá a nossa comum aluna( é a ela que devo o ter aindaalguma coisa a "azer que não elegias.

credita que a rapariguinha estava de tal modo "uriosa, quese passaram tr!s longos dias antes que a sua carta produzisse e"eitocompleto> Eis como uma s* idéia "alsa pode estragar o maisagradável dos temperamentos=

En"im( s* no sábado é que veio andar - roda de mim, ebalbuciar&me algumas palavras( pronunciadas no entanto tão bai#o eaba"adas de tal maneira pela vergonha, que era imposs$vel ouvi&las.7as o rubor que causaram "ez&me adivinhar o sentido.

té aqui tinha&me mantido sobranceiro, mas amaciado por umtão agradável arrependimento, consenti em encontrar&me nessamesma noite com a linda penitente( e esta graça da minha parte "oirecebida com todo o reconhecimento devido a uma tão grandemerc!.

9omo nunca perco de vista os seus pro'etos e os meus, resolviaproveitar a ocasião para conhecer ao certo o valor desta criança etambém para lhe apressar a educação. 7as, para continuar estetrabalho com mais liberdade, tive necessidade de mudar o local dosnossos encontros( porque um pequeno gabinete, que separa o quartoda sua aluna do da mãe, não lhe inspirava su"iciente segurança para

a dei#ar mani"estar&se - vontade.5rometera a mim mesmo provocar 6inocentemente6 algumru$do suscet$vel de lhe causar o receio bastante para a decidir aescolher, de "uturo, um asilo mais tranqSilizador( ela poupou&me otrabalho.

pequena gosta de rir( e, para lhe agradar, decidi&me, nosintervalos, a contar&lhe todas as aventuras escandalosas que mepassavam pela cabeça( para as tornar mais picantes e prender&lhe aatenção, atribu$&as todas - 7amã dela, que me deliciei desta "orma agalardoar de v$cios e de rid$culos.

ão era sem motivo que tinha tomado esta decisão, de "ato

não havia melhor maneira de encora'ar a t$mida aluna e de lheinspirar ao mesmo tempo o mais pro"undo desprezo pela mãe. 4á há

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muito tinha notado que, se este meio nem sempre é necessário paraseduzir uma rapariga, é indispensável, e muitas vezes até o maise"icaz, quando a queremos depravar( porque aquela que nãorespeita a mãe não se respeitará a si pr*pria( verdade moral queacho tão útil, que me "oi bem "ácil "ornecer um e#emplo em apoio do

preceito.o entanto, a sua aluna, que não pensava na moral, su"ocavade riso a cada instante( e en"im, uma vez, ia quase rebentando -sgargalhadas.

ão tive di"iculdade em lhe "azer crer que tinha sido 6umbarulho horr$vel6. ingi um grande medo que ela "acilmentecompartilhou. 5ara que ela se lembrasse bem, não permiti que oprazer nascesse de novo, e dei#ei&a tr!s horas mais cedo que decostume( combinamos também, ao despedir&nos, que a partir do diaseguinte seria no meu quarto que nos encontrar$amos.

 4á aqui a recebi duas vezes( e neste curto intervalo a

aprendiza tornou&se quase tão sabida como o mestre. )im, naverdade, ensinei&lhe tudo, até mesmo as complac!ncias= 2mitiapenas as precauç+es.

2cupado toda a noite, ganho desta "orma o bene"$cio dedormir uma grande parte do dia( e como não há neste momento nocastelo companhia que me atraia, limito&me a aparecer no salãodurante uma hora.

 3omei mesmo, a partir de ho'e, a decisão de comer no meuquarto, e não tenciono dei#á&lo a não ser para pequenos passeios.Estas e#centricidades são levadas - conta do meu estado de saúde.

eclarei que estava ligeiramente indisposto( anunciei também umpouco de "ebre. 3enho apenas de "alar com uma voz lenta eapagada. 0uanto - alteração do meu rosto, con"ie na sua aluna. 62amor providenciará.6

2cupo o *cio pensando nos meios de reconquistar - minhaingrata as vantagens que perdi, e também a escrever uma espéciede catecismo da depravação para uso da minha pupila. ivirto&me adesignar tudo pelo termo técnico, e rio antecipadamente dainteressante conversa que daqui resultará entre ela e ercourt, nanoite de núpcias. ada mais agradável do que a ingenuidade comque ela se serve 'á do pouco que sabe desta l$ngua=

Ela não imagina que se possa "alar doutra "orma. Esta criançaé realmente sedutora= 2 contraste entre a ing!nua candura e alinguagem descarada não dei#a de "azer e"eito, e, não sei porqu!,agora s* me agradam as coisas e#travagantes.

 3alvez me abandone demasiado a esta, visto que comprometoo tempo e a saúde, mas espero que a minha "ingida doença, além deme salvar do tédio do salão, ainda me possa ser de qualquerutilidade 'unto da austera devota, cu'a virtude de tigre se aliacontudo - doce sensibilidade=

ão duvido que 'á este'a instru$da deste grandeacontecimento, e gostava imenso de saber o que ela pensa( tanto

mais que apostaria de bom grado que não dei#ará de se atribuir as

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honras. Gegularei o meu estado de saúde pela impressão queproduzir sobre ela.

Ei&la, minha bela amiga, ao corrente dos meus problemascomo se "ora eu pr*prio. ese'o ter em breve not$cias maisinteressantes para lhe transmitir, e, peço&lhe que o creia, no prazer

que prometo a mim mesmo, conto muito com a recompensa queespero de si.

9astelo de..., CC de 2utubro de CD .

*:egnard, 1olies #moureuses

CARTA CXI

O CONDE DE GERCOURT A MADAME DE VOLANGES

5arece que tudo está tranqSilo nesta região, minha senhora( eesperamos, dum dia para o outro, a licença de voltar a rança.

Espero que não duvidareis que dese'o sempre com o mesmoardor regressar e atar os laços que me deverão unir a v*s e a

7ademoiselle de ?olanges. o entanto o duque de..., meu primo, aquem sabeis bem que devo obrigaç+es, acaba de me participar a suachamada a ápoles.

7anda&me dizer que tenciona visitar Goma e ver, no caminho,a parte da Ftália que lhe "alta conhecer. E#orta&me a acompanhá&lonessa viagem que durará apro#imadamente seis semanas ou doismeses. ão devo ocultar&vos que me seria agradável aproveitar estaocasião, pois bem ve'o que uma vez casado não terei tempo paramais aus!ncias do que as e#igidas pelo serviço. 3alvez se'a, aliás,mais conveniente adiar o casamento para o Fnverno( pois s* entãotodos os meus parentes estarão reunidos em 5aris, e principalmente

o marqu!s de..., a quem devo a esperança de vir a pertencer - vossa"am$lia. pesar destas consideraç+es, os meus pro'etos a este

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respeito subordinar&se&ão inteiramente aos vossos( e se pre"erirdes oque combinamos em primeiro lugar, renunciarei a estes meus planos.5eço&vos somente que me "açais saber o mais depressa poss$vel asvossas intenç+es a este respeito. Esperarei a vossa resposta aqui es* por ela regularei o meu procedimento.

)ou com todo o respeito, minha senhora, e com todos ossentimentos que conv!m a um "ilho, o vosso muito humilde, etc.

9onde de ercourt

<astia, CV de 2utubro de CD .

CARTA CXII

MADAME DE ROSEMONDE A PRESIDENTE DE TOURVEL

Litada1

)* agora recebi, minha querida "ilha, a vossa carta de C/CC, eas doces censuras que contém. 9on"essai que tivestes vontade deme "azer ainda mais( e que se vos não tivésseis lembrado de queéreis minha "ilha, ter&me&$eis ralhado a valer. 3er$eis sido no entantobem in'usta= Era o dese'o e a esperança de vos poder responder eupr*pria que me "aziam adiar todos os dias( e vedes que ainda ho'e

sou obrigada a servir&me da mão da minha criada de quarto. 2maldito reumatismo voltou&me( anichou&se desta vez no braço direitoe estou mesmo maneta. Eis de que vos serve, 'ovem e "resca comosois, ter uma amiga tão velha= 5agais pelos meus inc%modos.

@ogo que as dores me d!em um pouco de descanso, prometoconversar longamente convosco. Entretanto dir&vos&ei apenas querecebi as vossas duas cartas, que teriam duplicado, se tal "osseposs$vel, a minha terna amizade por v*s( e que nunca dei#arei decompartilhar intensamente tudo o que vos diz respeito.

2 meu sobrinho também está um pouco indisposto, mas semgravidade, nada de inquietante( um ligeiro inc%modo, que, ao que

me parece, lhe a"eta mais o esp$rito do que a saúde.0uase não o vemos.2 a"astamento dele e a vossa partida tiraram a alegria ao

nosso grupo. pequena ?olanges sobretudo não diz uma palavra eboce'a desalmadamente durante todo o dia. Especialmente de háalguns dias para cá, dá&nos a honra de adormecer pro"undamentelogo ap*s o 'antar.

deus, minha querida "ilha( serei sempre para v*s a amiga, amãe, e até a irmã, se a avançada idade me permitisse tal t$tulo.

En"im, estou&vos ligada pelos mais ternos sentimentos.ssinada: delaide, em nome de 7adame de Gosemonde.

9astelo de..., CI de 2utubro de CD .

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CARTA CXIII

A MARQUESA DE MERTEUIL AO VISCONDE DE VALMONT

9reio que devo preveni&lo, ?isconde, que começam a "alar desi em 5aris( reparam na sua aus!ncia e 'á se começa a adivinhar acausa. ssisti ontem a um 'antar muito concorrido, onde se dissepositivamente que estava preso na aldeia por um amor romanesco ein"eliz( logo a alegria se pintou no rosto de todos os inve'osos dosseus !#itos e de todas as mulheres que desprezou.

)e me acreditar, não dei#ará aumentar estes murmúriosperigosos e virá destru$&los imediatamente com a sua presença.

5ense que, se uma vez dei#ar perder a idéia de que se lhe não

resiste, em breve sentirá que lhe resistem com e"eito mais"acilmente( e que os seus rivais lhe perdem o respeito e ousamcombat!&lo: qual de entre eles se não 'ulga mais "orte que a virtude>

)obretudo pense que, na multidão de mulheres de que sevangloriou, todas as que não possuiu vão tentar elucidar o público,enquanto as outras procurarão enganá&lo. En"im, conte com ser

 'ulgado tão abai#o do seu valor, como até agora o "oi acima.?olte, ?isconde, não sacri"ique a reputação a um capricho

pueril.  9umpriu todos os nossos planos em relação - pequena

?olanges( quanto - sua 5residente, não será, parece&me,permanecendo a dez léguas dela que se libertará dessa "antasia. 4ulga que ela o irá procurar> 3alvez 'á se se não se lembre de si, ous* se recorde para se "elicitar de o ter humilhado.

o menos aqui, poderá achar ocasião para reaparecer combrilho, e bem precisa disso( e mesmo que se obstine na sua rid$culaaventura, não ve'o em que o seu regresso o possa pre'udicar( antespelo contrário.

9om e"eito, se a sua 5residente o 6adora6 como tantas vezesme disse, e tão poucas provou, a sua única consolação e prazer deveser agora "alar de si, saber o que "az, o que diz, o que pensa, tudo

en"im que lhe diga respeito. Estas misérias tornam&se importantesem relação -s privaç+es que se so"rem. )ão as migalhas de pão quecaem da mesa do rico: este desdenha&as( mas o pobre recolhe&asavidamente e alimenta&se delas. 2ra, a pobre 5residente recebeagora todas essas migalhas, e quantas mais tiver, menos pressa teráem ceder ao apetite do resto.

5ara mais, visto que lhe conhece a con"idente, não duvidaráque cada carta contenha um pequeno sermão, e tudo o que ela 'ulgapr*prio para corroborar a sensatez e "orti"icar a virtude.

5ara qu!, pois, dei#ar a uma recursos para se de"ender e -outra para o pre'udicar>

ão que eu se'a da sua opinião quanto - perda que 'ulga terso"rido com a mudança de con"idente. Em primeiro lugar, 7adame

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de ?olanges odeia&o, e o *dio é sempre mais engenhoso eclarividente do que a amizade. virtude da sua velha tia não seempregará nem um s* instante a denegrir o querido sobrinho(porque a virtude também tem "raquezas. 5ara mais os seus receiospartem duma observação absolutamente "alsa.

ão é verdade que as mulheres quanto mais velhas, maisr$spidas e severas se tornam. J dos quarenta aos cinqSenta anos queo desespero de ver no rosto "anar&se, a raiva de se sentiremobrigadas a abandonar as pretens+es e prazeres a que estão aindapresas, tornam quase todas as mulheres azedas e hip*critas.

5recisam desse longo intervalo para "azer por inteiro essegrande sacri"$cio, mas uma vez consumado, dividem&se todas emduas classes.

mais numerosa é a das mulheres que, nunca tendo tidomais do que beleza e 'uventude, caem numa apatia imbecil de ques* acordam por causa do 'ogo ou de algumas práticas de devoção(

estas são sempre ameaçadoras, muitas vezes impertinentes, -svezes um pouco intriguistas, mas raramente más.

em se pode dizer se essas mulheres são ou não severas,sem idéias e sem consist!ncia, repetem, sem compreender eindi"erentemente, tudo o que ouvem dizer e conservam&se por sipr*prias absolutamente nulas.

outra classe, muito mais rara, mas verdadeiramentepreciosa, é a das mulheres que, tendo tido um caráter e nãodesprezando alimentar a razão, sabem criar&se uma e#ist!nciaquando a da natureza lhes "alta( e tomam o partido de en"eitar o

esp$rito com os ornatos que dantes empregavam para o corpo.Estas t!m geralmente uma sã maneira de 'ulgar, o esp$rito aomesmo tempo s*lido, alegre e gracioso. )ubstituem as graçassedutoras por uma bondade que prende, e ainda por uma alegriacu'o encanto aumenta em proporção com a idade, é assim queconseguem apro#imar&se de 'uventude e "azer&se amar por ela. 7asentão, em vez de serem, como o seu amigo diz, r$spidas e severas, ohábito da indulg!ncia, as longas re"le#+es sobre a natureza humana,e en"im, as recordaç+es da 'uventude, os únicos laços que ainda asprendem - vida, colocá&las&iam talvez demasiado perto da "acilidade.

2 que lhe posso dizer é que tendo sempre procurado as

senhoras idosas, de quem cedo achei útil a aprovação, encontreimuitas para quem me atra$a tanto a inclinação como o interesse.ico por aqui( porque como o meu amigo agora se in"lama tão

depressa e de "orma tão moralona, tenho medo que se apai#onesubitamente pela sua velha tia e que vá com ela a sepultar notúmulo onde a"inal o ?isconde 'á vive de há uns tempos a esta parte.?olto pois ao que me interessa.

pesar do encantamento em que está com a colegialzinha,não creio que ela pese qualquer coisa nos seus pro'etos. chou&a -mão de semear, apossou&se dela: ainda bem= 7as não se trataverdadeiramente duma inclinação. em sequer é, vendo bem, um

verdadeiro prazer: o meu amigo possui&lhe apenas o corpo= 4á não"alo do coração, pois duvido que se preocupe com isso, mas nem

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sequer lhe ocupa o esp$rito. ão sei se deu conta disso, mas tenho aprova na última carta que ela me escreveu( envio&lha para que ve'acom os seus pr*prios olhos. Gepare que, quando "ala de si, é sempreo senhor de ?almont( que todas as idéias, mesmo as que lhe "aznascer, conduzem&na sempre a ancenP e a este não chama senhor,

mas simplesmente ancenP .J assim que ela o distingue de todos os outros( e mesmoquando se entrega a si, é apenas dele que se torna $ntima. )e talconquista lhe parece sedutora, se os prazeres que ela o"erece oprendem, é certamente modesto e pouco e#igente= dmito que aguarde para si( entra até nos nossos pro'etos. 7as acho que isso nãovale qualquer*er &arta &4espécie de inc%modo( dever$amos ter também algum dom$nio sobreela e não permitir, por e#emplo, que se apro#ime de ancenP senãodepois de lho termos "eito esquecer um pouco.

ntes de dei#ar de me ocupar de si, para chegar - minha vez,quero ainda dizer&lhe que esse processo de se desculpar com umadoença me parece demasiado conhecido e usado. e "ato, ?isconde,que "alta de imaginação= 3ambém me repito -s vezes, como irá terocasião de ver( mas procuro variar os pormenores, e, o que é maisimportante, o !#ito dá&me razão. ?ou tentar obter mais um e correruma nova aventura. 9oncordo que esta não será uma distração, emorro de tédio.

ão sei porqu!, mas desde a aventura de 5révan que<elleroche se me tornou insuportável. Está de tal "orma atencioso,terno e cheio de veneração, que 'á não posso mais. c*lera dele, noprimeiro momento, agradou&me( no entanto tive de o acalmar,porque dei#á&lo agir seria comprometer&me, não haveria maneira deo chamar - razão. ecidi pois mostrar&lhe mais amor para p%r ponto"inal no assunto, mas ele tomou&me a sério, e desde essa alturae#aspera&me com o seu encantamento eterno.

oto principalmente a insultante con"iança que vaidepositando em mim e a segurança com que me considera sua parasempre. )into&me verdadeiramente humilhada. eve apreciar&mebem pouco, para se 'ulgar com bastante valor para me prender= 5oisnão me dizia ultimamente que eu nunca amara ninguém além dele>

2h, naquele momento "oi preciso apelar para toda a minha prud!nciapara o não desiludir, contando&lhe a verdade.Eis mais um cavalheiro que pretende direito e#clusivo=9oncordo que é elegante e tem um belo rosto, mas no "undo é

apenas um recruta nestas coisas do amor. 9hegou "inalmente omomento, é preciso que nos separemos.

Aá 'á quinze dias que e#perimento, e tentei sucessivamente a"rieza, o mau humor, as discuss+es( mas o su'eito é tenaz e não largaa presa "acilmente, é preciso portanto tomar uma decisão maisviolenta( por isso levo&o para a minha casa de campo. 5artimosdepois de amanhã. Frão conosco apenas algumas pessoas

desinteressadas e pouco perspicazes, e teremos quase tantaliberdade como se estivéssemos s*s. Então, sobrecarregá&lo&ei a tal

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ponto de amor e car$cias, viveremos de tal modo unicamente umpara o outro, que aposto que ele dese'ará ainda mais do que eu o "imdesta estada, que agora considera uma tão grande "elicidade( se nãoregressar mais "arto de mim do que eu 'á estou dele, poderá dizer,caro ?isconde, que não percebo mais disto que o meu amigo.

2 prete#to para esta retirada é ter de me ocupar seriamentecom o meu processo, que irá "inalmente a tribunal no começo doFnverno. 2 que sem dúvida me convém, porque é muitodesagradável ter assim toda a "ortuna em perigo. ão chego a estarinquieta: primeiro porque a razão está do meu lado( todos os meusadvogados mo asseguram. E mesmo que assim não "osse, erapreciso ser bem inábil se não soubesse ganhar um processo em quetenho por adversários apenas menores e o velho tutor=

7as como é preciso não descurar nada num assunto tãoimportante, terei e"etivamente comigo dois advogados. 5arece&lhetriste esta viagem> o entanto, se ela me "izer ganhar o processo e

perder <elleroche, não lamentarei o meu tempo.E agora, ?isconde, adivinhe&lhe o sucessor( aposto cem contra

um. 2ra= 9omo se eu não soubesse 'á que nunca acerta em nada...5ois bem, é ancenP. dmirado> 5orque, en"im, ainda não estoureduzida - educação de crianças= 7as este merece que se lhe "açae#ceção( tem todas as graças da 'uventude e de "orma nenhuma a"rivolidade. sua grande reserva é de molde a a"astar todas assuspeitas, e não se pode imaginar nada de mais agradável naintimidade. ão que tenhamos chegado 'á a vias de "ato, porenquanto sou apenas a con"idente( mas sob o véu da amizade, creio

ver&lhe uma grande simpatia por mim, e sinto que vou retribuir. )eriana verdade grande lástima que tanto esp$rito e delicadeza se "ossemsacri"icar e embotar 'unto dessa imbecil da ?olanges= Espero que elese engane quando 'ulga amá&la, ela está tão longe de o merecer= ãoque tenha ciúmes dela( mas seria um crime e quero salvar ancenP.5eço&lhe pois, ?isconde, evite que durante a minha viagem ele sepossa encontrar com a sua 9ec$lia, como tem ainda o mau hábito dea chamar.

;m primeiro amor tem sempre maior poder do que 'ulgamos,e não respondo por nada se ele a tornasse a ver agora( sobretudodurante a minha aus!ncia. epois do meu regresso, tratarei de tudo

e responsabilizo&me pelo !#ito.inda pensei levá&lo comigo, mas sacri"iquei este plano -minha habitual prud!ncia( e depois tive medo que percebessequalquer coisa entre mim e <elleroche( "icaria desesperada se eletivesse a menor idéia do que se passa. 0uero pelo menos que meimagine pura e sem mácula( en"im, tal como seria preciso ser para omerecer.

5aris, CO de 2utubro de CD .

CARTA CXIV

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A PRESIDENTE DE TOURVEL A MADAME DE ROSEMONDE

7inha querida amiga, cedo a uma viva inquietação( e semsaber se estareis em estado de me responder, não posso impedir&me

de vos interrogar. 2 estado do senhor de ?almont, que v*sconsiderais 6sem perigo6, não me dei#ou tão tranqSila como pareceisestar. ão é raro que a melancolia e o dese'o de solidão se'amsintomas precursores de alguma grave doença( os so"rimentos docorpo, como os do esp$rito, "azem dese'ar o isolamento( e muitasvezes censuramos o mau humor de quem dever$amos anteslamentar os males.

5arece&me que ele devia pelo menos consultar alguém.9omo é que estando também tão doente, não tendes um

médico ao pé de v*s> 2 meu, que 'á ho'e vi, e não vos escondereique o consultei indiretamente, é de opinião que nas pessoas ativas

essa espécie de apatia súbita não deve ser dei#ada sem vigil8ncia( eacentuou que as doenças s* cedem quando tratadas a tempo. 5orque dei#ar correr esse risco a alguém que vos é tão caro>

2 que "az aumentar a minha inquietação é que há quatro diasnão recebo not$cias dele. 7eu eus= ão me estareis a enganarquanto ao seu estado> 5orque teria dei#ado de me escrever tão derepente> )e "osse somente o e"eito da minha teimosia em lhedevolver as cartas, creio que ele teria tomado mais cedo essadecisão. En"im, mesmo sem crer em pressentimentos, desde há unsdias pesa sobre mim uma tristeza que me assusta.

h, talvez eu este'a na véspera da maior das in"elicidades=ão podeis calcular, e tenho vergonha de vo&lo contar, quantome custa não receber essas mesmas cartas, que a"inal me recusariaa ler. 3inha ao menos a certeza de que ainda pensava em mim, etocava qualquer coisa vinda dele. ão abri essas cartas, mas choravaolhando&as, as minhas lágrimas eram mais doces e mais "áceis( e s*elas dissipavam um pouco a constante opressão que sinto desde omeu regresso. )uplico&vos, minha indulgente amiga,escrevei&meassim que puderdes( e entretanto enviai&me todos os dias not$ciasvossas e dele.

percebo&me de que mal escrevi uma palavra em especial

para v*s, mas conheceis os meus sentimentos, a dedicação semreservas, o terno reconhecimento que dedico - vossa amizade(perdoareis a perturbação em que estou, devida -s penas mortais, aoterr$vel tormento de recear males de que sou talvez a causadora.7eu eus= Esta idéia desesperante persegue&me e dilacera&me ocoração( "altava&me esta in"elicidade, e sinto que estou destinada aso"r!&las todas.

deus, minha querida amiga: não me "alteis com a vossaamizade, e lamentai&me. Geceberei ho'e carta vossa>

5aris, CX de 2utubro de C D .

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CARTA CXV

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

J inconceb$vel, minha bela amiga, como as pessoas dei#am dese compreender assim que se a"astam. Enquanto estive ao pé de si,tivemos sempre as mesmas reaç+es, a mesma maneira de ver( eporque 'á não vos vemos há tr!s meses, não chegamos a acordosobre nada. 0uem tem a culpa> 9ertamente a 7arquesa nãohesitaria em responder, mas eu, mais prudente, ou mais delicado,pre"iro calar&me. Gesponderei apenas - sua carta, e continuarei acontar&lhe o que "aço.

Em primeiro lugar, quero agradecer&lhe o conselho que me dáacerca dos boatos que correm a meu respeito( mas não me inquietopor enquanto( tenha a certeza de os "azer cessar em breve. Este'a

tranqSila( reaparecerei mais célebre do que nunca e cada vez maisdigno de si.

Espero até que venham a atribuir qualquer mérito - aventurada pequena ?olanges, que despreza tão "acilmente, como se não"osse nada roubar, numa noite, uma rapariga ao bem&amado, emseguida servir&se dela como de coisa sua, e sem qualquer embaraço(obter dela aquilo que nem sequer se ousa e#igir a todas aspro"issionais, e isto, sem a perturbar no seu terno amor, sem a tornarinconstante, nem mesmo in"iel & porque, com e"eito, não lhe ocupoapenas a cabeça &, de maneira que, depois de me passar a "antasia,

a colocarei de novo nos braços do bem&amado, sem que ela tenhadado por nada. )erá isto um "eito vulgar> E, além disto, creia&me,uma vez sa$da das minhas mãos, os princ$pios que lhe reveleicontinuarão a desenvolver&se( e pro"etizo que a t$mida aluna selançará em breve em largos v%os, capazes de honrarem o mestre.

o entanto, se alguém pre"erir o g!nero her*ico, mostrarei a5residente, esse modelo de todas as virtudes, respeitada mesmopelos mais libertinos, a tal ponto que se tinha perdido até a idéia dea atacar= 7ostrá&la&ei, digo, esquecida dos deveres e da virtude,sacri"icando reputação e dois anos de prud!ncia, para correr atrás da"elicidade de me agradar, para se embriagar com a de me querer

bem( 'ulgando&se paga de tantos sacri"$cios, com uma palavra, umolhar, que nem sequer obterá sempre. arei ainda mais, abandoná&la&ei( e ou não conheço esta mulher ou não terei sucessor.

Ela resistirá - necessidade de consolação, ao hábito do prazer,ao dese'o de vingança. En"im, terá vivido apenas para mim( e quer asua vida se'a longa ou não, terei sido o único a abrir e a "echar abarreira. Gealizado este triun"o, direi aos meus rivais: 6Eis a minhaobra, e procurem um segundo e#emplo em todo o século=6

?ai&me perguntar donde me vem ho'e este e#cesso decon"iança>

J que desde há oito dias sou con"idente da minha bela( ela

não me diz os seus segredos, mas eu surpreendo&lhos. uas cartasdela para 7adame de Gosemonde bastaram para me instruir, e s*

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lerei as outras por curiosidade. pro#imar&me dela será mais do quesu"iciente para alcançar o !#ito, e os meios para tal 'á os encontrei.?ou imediatamente p%&los em ação.

Está curiosa, suponho> 7as não, para a castigar de nãoacreditar nas minhas invenç+es, não as saberá. 7erecia que lhe

retirasse radicalmente a minha con"iança, pelo menos nestaaventura( e, com e"eito, sem o doce prémio atribu$do por si ao meubom sucesso, não lhe voltaria a "alar nela.

<em v! que estou zangado. o entanto, na esperança de quese venha a corrigir, limitar&me&ei a esta ligeira punição( e,regressando - indulg!ncia, esqueço por uns momentos os meusgrandes pro'etos, para conversar consigo acerca dos seus.

Ei&la portanto no campo, en"adonho como o sentimento etriste como a "idelidade= E esse pobre <elleroche= ão se contentaem o obrigar a beber a água do esquecimento, necessita ainda de oatormentar= 9omo está ele> )uporta bem as náuseas do amor>

ivertir&me&ia se ele ainda por cima se prendesse mais a si( teriacuriosidade de ver que remédio mais e"icaz conseguireis empregar.@amento&a de "ato por ter sido obrigada a recorrer a esse. )* umavez, na minha vida, utilizei o amor como processo.

 3inha certamente um "orte motivo, visto que se tratava da9ondessa de...( e vinte vezes, nos braços dela, tentei dizer&lhe:67inha senhora, renuncio ao lugar, que solicito, e permita&me queabandone aquele que ocupo.6 E também, de todas as mulheres quepossu$, a única de quem tenho verdadeiramente prazer em dizer mal.

0uanto ao seu motivo, acho&o, para dizer a verdade, dum

rid$culo raro( e tinha razão em crer que não conseguiria adivinhar osucessor. 5ois qu!> J por ancenP que está com esse trabalho todo>h= 9ara amiga, dei#e&o lá adorar a sua virtuosa 9ec$lia e não semeta nessas brincadeiras de crianças. ei#e&as educarem&se 'untodas criadas, ou entregarem&se a pequenos 'ogos inocentes umas comas outras. 5ara que se vai ocupar dum noviço que não saberá nempossu$&la nem dei#á&la, e a quem será preciso ensinar tudo> igo&lhemuito a sério, desaprovo a escolha, e por muito secreta que venha a"icar, humilhá&la&á pelo menos a meus olhos e perante a suaconsci!ncia.

iz que começa a tomar interesse por ele, ora vamos, vamos,

engana&se certamente, e creio até que 'á descobri a causa do seuerro. 2 seu "astio por <elleroche veio num tempo de escassez e, nãolhe o"erecendo 5aris por onde escolher, as suas idéias, sempredemasiado vivas, concentraram&se sobre o primeiro ob'eto que lheapareceu. 7as pense que, no regresso, poderá escolher entre mil( ese en"im receia cair na inação adiando, o"ereço&me para a distrair.

aqui até ao seu regresso, os meus grandes a"azeres terãoterminado duma maneira ou doutra( e, certamente, nem a pequena?olanges, nem a pr*pria 5residente me ocuparão de tal modo quenão possa estar ao pé de si sempre que a minha amiga o dese'ar.

 3alvez mesmo que, daqui até lá, 'á eu tenha reposto a rapariguinha

nas mãos do seu discreto apai#onado. )em concordar, por mais quea 7arquesa diga, que não se'a um gozo atraente como tenho em

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pro'eto que ela guarde de mim toda a vida uma idéia superior - detodos os outros homens, lancei&me com ela num ritmo que nãopoderei manter por muito tempo sem pre'udicar a saúde( e 'á apenasme prende a ela o interesse devido aos assuntos de "am$lia...

9ompreende&me, não é verdade>... J que espero uma

segunda época para con"irmar a minha esperança, e assegurar&mede que realizei plenamente os meus pro'etos. )im, bela amiga, 'ápossuo um ind$cio de que o marido da minha aluna não correrá orisco de morrer sem posteridade( e que o "uturo che"e da casa deercourt será apenas um rebento da de ?almont. 7as dei#e&meterminar segundo a minha "antasia esta aventura que encetei a seupedido. 5ense que, se "izer de ancenP um inconstante, tirará todo opicante - hist*ria. 9onsidere "inalmente que, o"erecendo&me para orepresentar 'unto de si, tenho, parece&me, alguns direitos -pre"er!ncia.

9omo estou certo dela, não receei contrariar os seus

ob'etivos, concorrendo eu pr*prio para aumentar a terna pai#ão dodiscreto apai#onado pelo primeiro e digno ob'eto da sua escolha.

 3endo ontem encontrado a sua aluna ocupada em lheescrever, e tendo&a primeiro arrancado desta doce ocupação paraoutra mais doce ainda depois para ler a carta( e como a achei "ria econstrangida, "iz&lhe sentir que não era assim que ela consolaria oseu namorado, e decidia&a a escrever outra ditada por mim( na qual,imitando o melhor que pude o seu tom disparatado, tratei dealimentar o amor do 'ovem com uma esperança mais certa. pequena estava toda encantada, disse&me, por se ver a escrever tão

bem, e daqui em diante serei eu o encarregado da correspond!ncia.0ue não terei eu sido para ancenP> ui, sucessivamente, amigo,con"iante, rival e amante= inda neste momento, presto&lhe o serviçode o salvar dos perigosos tentáculos da minha amiga. )im, semdúvida, perigosos( porque possu$&la e perd!&la, é comprar ummomento de "elicidade por uma eternidade de saudades.

deus, bela amiga( tenha a coragem de liquidar <elleroche omais depressa que puder. ei#e ancenP sossegado, e prepare&separa me reencontrar e me dar de novo os deliciosos prazeres danossa primeira ligação.

5. ). elicito&a pela pr*#ima decisão do grande processo, e agradar&me&ia imenso que esse "eliz acontecimento se desse sob o meureinado.

9astelo de..., CR de 2utubro de CD .

CARTA CXVI

O CAVALEIRO DANCENY A CECÍLIA VOLANGES

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7adame de 7erteuil partiu esta manhã para o campo( assim,minha encantadora 9ec$lia, eis&me privado do único prazer que merestava na sua aus!ncia, o de "alar de si - nossa amiga.

5ermitiu&me há pouco tempo que lhe desse este t$tulo(apressei&me a servi&me dele, pois parecia&me que assim me

apro#imava mais de si. 7eu eus, como essa mulher é amável= Eque encanto lison'eiro ela sabe dar - amizade= a 7arquesa pareceque este belo sentimento se embeleza e se "orti"ica com tudo o queela recusa ao amor. )e soubesse como ela gosta de si e como gostade me ouvir "alar a seu respeito=... J sem dúvida isso o que meprende a ela. 0ue "elicidade poder viver unicamente para ambas,passar incessantemente das del$cias do amor - doçura da amizade,consagrar&lhes toda a minha e#ist!ncia, ser de qualquer "orma oponto de encontro da vossa rec$proca a"eição( e sentir sempre que,ocupando&me com a "elicidade duma, trabalho igualmente para a daoutra= 3em o dever de gostar muito, muito, encantadora amiga,

desta mulher adorável. a"eição que tenho por ela, deve a 9ec$liadar&lhe ainda mais valor, compartilhando&a comigo. epois de tere#perimentado o encanto da amizade, dese'o que o conheçatambém. 2s prazeres que não compartilhamos 'untos, parece&meque os gozo apenas por metade. )im, minha 9ec$lia, gostaria decercar o seu coração dos mais doces sentimentos( que cada uma dassuas palpitaç+es a "izesse e#perimentar uma sensação de "elicidade(e 'ulgaria ainda retribuir&lhe apenas uma parte da "elicidade quereceberia de si.

5or que é que estes encantadores pro'etos são apenas uma

quimera da minha imaginação, e a realidade não me o"erece senãoprivaç+es dolorosas e inde"inidas> esperança que me tinha dado denos vermos nesse castelo, compreendo que é preciso renunciar a ela.)* me resta a consolação de me persuadir de que na realidade tallhe não é poss$vel. E esquece&se de mo dizer, de chorar comigo= 4ápor duas vezes as minhas quei#as a este respeito "icaram semresposta. h= 9ec$lia= 9ec$lia= 9reio que me tem amor com todas as"orças da sua alma, mas a sua alma não é ardente como a minha=5or que não me cabe a mim a"astar os obstáculos>

5or que não são os meus interesses que devo proteger, emvez dos seus> Em breve lhe provaria que nada é imposs$vel ao amor.

 3ambém não me in"orma quando deve terminar esta cruelaus!ncia.o menos aqui, ver&nos&$amos algumas vezes. 2s seus olhos

maravilhosos reanimariam a minha alma abatida( a enternecedorae#pressão deles tranqSilizaria o meu coração, que algumas vezesbem o precisa. 5erdão, minha 9ec$lia( este receio não é umasuspeita. credito no seu amor, na sua const8ncia.

h, muito in"eliz seria se duvidasse. 7as tantos obstáculos, esempre renovados= 7inha amiga, estou triste, muito triste. 5areceque a partida de 7adame de 7erteuil avivou em mim o sentimentode todas as minhas dores.

deus, 9ec$lia( adeus, minha bem&amada. 5ense que o seuamado se a"lige, e que está na sua mão "az!&lo "eliz.

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5aris, CD de 2utubro de CD .

CARTA CXVII

CECíLIA VOLANGES AO CAVALEIRO DANCENY 

Litada por ?almont1

credita pois, meu bom amigo, que é preciso censurar&mepara eu estar triste, quando sei que se a"lige> E duvida que so"ratambém por todas as suas dores> 9ompartilho consigo mesmo asque lhe causo voluntariamente( e ainda por cima me entristeço porver que não me "az 'ustiça. 2h= Fsso não está certo. <em ve'o o que o

aborrece( é que nas duas últimas vezes em que me pediu para viraqui, nada lhe respondi a esse respeito( mas será essa resposta tão"ácil de dar> 4ulga que não sei que o que dese'a não me "ica bem> Eno entanto, se me é tão penoso recusar de longe, que seria seestivesse presente> E depois, por o ter querido consolar ummomento, "icaria in"eliz toda a minha vida.

Gepare, nada lhe escondo por minha parte, eis as minhasraz+es( 'ulgue agora por si. 3eria talvez "eito o que quer se não "osseo que lhe contei, que o senhor de ercourt, causador de todas asnossas dores, não chegará tão cedo( e que, como, de há um tempo

para cá, a 7amã me testemunha muito mais amizade e eu, pelolado, a acarinho quanto posso, nem sei o que não será poss$velobtermos dela. E se pudermos ser "elizes sem que eu nada tenha acensurar&me, não será muito melhor> acreditar no que me dizem,os homens gostam menos das suas mulheres quando elas osamaram muito antes de o serem. J esse temor que me contém aindamais que tudo o resto. 7eu amigo, não está seguro do meu coração,e não será sempre tempo>

Escute, prometo&lhe que, se não puder evitar a in"elicidade decasar com esse senhor de ercourt, que 'á tanto odeio mesmo antesde o conhecer, nada me impedirá depois de me dedicar a si tanto

quanto puder e de o amar acima de tudo. 9omo s* me interessa seramada por si, e saberá bem que se procedo mal não é por minhaculpa, nada mais me importará( contanto que me prometa amar&mesempre tanto como agora.

7as, meu amigo, até lá, dei#e&me continuar a proceder assim(e não insista mais numa coisa que tenho raz+es para não "azer, e noentanto me penaliza recusar&lhe.

ostaria também que o senhor de ?almont não "osse tãosol$cito por si( isso torna&me ainda mais triste 2h= 3em ali um grandeamigo, asseguro&lhe= 3udo o que "aria se aqui estivesse, ele o "az.

7as adeus, querido amigo( comecei a escrever&lhe demasiado

tarde e passei nesta tare"a uma parte da noite. ?ou&me deitar erecuperar o tempo perdido. <ei'o&o, mas não me ralhe mais.

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9astelo de..., CU de 2utubro de CD .

CARTA CXVIII

O CAVALEIRO DANCENY A MARQUESA DE MERTEUIL

)e acreditar no calendário, adorável amiga, há apenas doisdias que estais ausente( mas, se acreditar no meu coração, há doisséculos. 2ra, sei&o por v*s, é sempre no coração que devemosacreditar( é pois 'á tempo que regresseis, todos os vossos assuntosdevem estar mais que tratados. 9omo quereis que me interesse pelovosso processo, se, perdido ou ganho, devo do mesmo modo pagar&lhe as custas pelo tédio da vossa aus!ncia>

2h= 0ue vontade eu tenho de ralhar= E como é triste, com umtão belo prete#to para estar zangado, não ter o direito de o mostrar=

ão vos parece que é uma verdadeira in"idelidade, uma negratraição, dei#ar este amigo longe de v*s, depois de o ter habituado -vossa presença> 5or mais que consulteis os advogados, nuncaencontrarão 'usti"icação para este mau procedimento( e, de resto,essa gente s* dá raz+es, e não bastam raz+es para responder aossentimentos.

5or mim, tanto me assegurastes que era a razão que vosordenava essa viagem, que me indispusestes com ela. 4á não a quero

ouvir( mesmo que me ordene que vos esqueça. E no entanto essarazão é bem razoável( e na verdade não seria tão di"$cil comopensais. <astaria apenas desabituar&me de pensar em v*s: e nadaaqui, asseguro&vos, me "aria recordar de v*s.

s nossas mais belas mulheres, as que são consideradas maisdese'áveis, estão tão longe de v*s que s* dariam uma pálida idéia davossa beleza. 9reio mesmo que com olhos mais e#perimentados,quanto mais parecidas convosco as 'ulgamos a princ$pio, maioresdi"erenças se acham depois( por mais que "açam, por mais queempreguem tudo o que sabem, "alta&lhes sempre o serem v*s, e é a$que reside positivamente o encanto.

Fn"elizmente, quando os dias são longos, e se estádesocupado, sonha&se, constroem&se castelos de areia, inventam&sequimeras( pouco a pouco a imaginação e#alta&se, quer&se embelezara obra, 'unta&se tudo o que pode agradar, atinge&se por "im aper"eição( e quando aqui se chega, o retrato conduz&nos de novo aomodelo, e "ica&se espantado por ver que a"inal não se "azia outracoisa senão pensar em v*s.

este mesmo momento, sou ainda v$tima dum erro id!ntico.5ensais talvez que "oi para me ocupar de v*s que me pus a

escrever&vos> ada disso: "oi pelo contrário, para vos esquecer. 3inha cem coisas a dizer&vos, de que não éreis o ob'eto, e que, como

o sabeis, me interessam vivamente( "oi contudo destas que acabeipor me desviar. esde quando o encanto da amizade suplanta o do

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amor> h= )e eu observasse melhor, talvez tivesse uma pequenacensura a "azer&lhe= 7as chiu= Esqueçamos esta ligeira "alta commedo de nela recair( e que a minha pr*pria amiga o ignore.

 3ambém, porque não estais aqui presente para me responder,para me conduzir ao bom caminho se me perco, para me "alar da

minha 9ec$lia, para aumentar, se é poss$vel, a "elicidade quee#perimento ao amá&la, com a idéia tão doce ao meu coração de queé a vossa amiga que amo> )im, con"esso, o amor que ela me inspiratornou&se&me ainda mais precioso, desde que tivestes a bondade deser minha con"idente. osto tanto de vos abrir o coração, de ocuparo vosso com os meus sentimentos, de os depositar nele sem reserva=5arece&me que os acarinho melhor desde que vos dignastes acolh!&los( e depois, olhando&vos, digo para comigo: 6J nela que estáguardada toda a minha "elicidade.

ada tenho de novo a comunicar&vos sobre a minha situação. última carta que recebi dela aumenta e con"irma a minha

esperança, mas retarda&a ainda. o entanto as raz+es dela são tãoternas e tão honestas, que não posso nem censurá&la nem quei#ar&me. 3alvez não vos se'a poss$vel compreender muito bem o que vosdigo( mas porque não estais aqui> 9onquanto se diga tudo - amiga,nem tudo se ousa escrever.

2s segredos do amor, sobretudo, são tão delicados que não époss$vel con"idenciá&los de qualquer maneira. )e algumas vezespermitimos que se nos escapem, é preciso não os perder de vista e,de certo modo, v!&los entrar no seu novo asilo. h, regressai pois,adorável amiga( bem vedes que o vosso regresso é necessário.

Esquecei "inalmente as mil raz+es que vos ret!m onde vos encontraisou então dai&me uma que me ensine a viver onde não estais. 3enho a honra de ser, etc.

5aris, CR de 2utubro de CD .

CARTA CXIX

MADAME DE ROSEMONDE A PRESIDENTE DE TOURVEL

)e bem que ainda so"ra muito, querida amiga, tento noentanto escrever&vos eu pr*pria, a "im de poder "alar do que vosinteressa. 2 meu sobrinho continua na sua misantropia. 7andaregularmente saber not$cias minhas todos os dias( mas nem umaúnica vez veio ele pr*prio in"ormar&se, se bem que lho tivessepedido, de "orma que não o ve'o mais do que se ele estivesse em5aris. Encontrei&o no entanto esta manhã, onde menos o esperava.

oi na capela, aonde desci pela primeira vez depois da minhadolorosa doença. )oube ho'e que há quatro dias ele vai regularmenteouvir missa. eus queira que isto dure=

0uando entrei, dirigiu&se&me e "elicitou&me a"etuosamentepelas minhas melhoras. 9omo a missa começasse, abreviei a

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conversa que tencionava retomar depois, mas desapareceu antesque o pudesse encontrar. ão vos esconderei que o achei um poucomudado. 7as, querida "ilha, não me "açais arrepender da con"iançana vossa sensatez com inquietaç+es demasiado vivas( e sobretudopodeis estar certa de que pre"eriria a"ligir&vos a enganar&vos.

)e o meu sobrinho continuar a evitar&me, tomarei a decisão,assim que estiver melhor, de o visitar no seu quarto e tratarei deadivinhar a causa desta singular mania, que creio bem tenha algo aver convosco. Fn"ormar&vos&ei do que tiver sabido. ei#o&vos, 'á nãoposso me#er os dedos, e além disso, se a delaide soubesse queescrevi, ralhar&me&ia toda a noite.

deus, querida amiga.

9astelo de..., TV de 2utubro de CD .

CARTA CXX

O VISCONDE DE VALMONT AO PADRE ANSELMO

L<ernardo do convento da Gua )aint&Aonoré1

ão tenho a honra de ser conhecido por v*s, senhor, mas seida inteira con"iança que em v*s tem a senhora de 3ourvel e sei, alémdisso, quanto essa con"iança é dignamente merecida.

9reio portanto poder, sem ser indiscreto, dirigir&me a v*s,para obter um "avor essencial, verdadeiramente digno do vossosanto mister, e no qual o interesse da senhora de 3ourvel seencontra aliado ao meu.

 3enho em meu poder papéis importantes que lhe dizemrespeito, que não podem ser con"iados a ninguém e que não queronem devo entregar senão nas pr*prias mãos dela. ão tenhomaneira de a in"ormar disto, porque certas raz+es, que talvezconheçais por ela, mas que não me 'ulgo autorizado a comunicar&vos,a levaram a tomar a decisão de recusar toda a correspond!nciacomigo: decisão que ho'e voluntariamente con"esso não poder

censurar, visto que ela não podia prever acontecimentos que eupr*prio estava bem longe de esperar e que apenas "oram poss$veispela "orça sobre&humana que é "orçoso reconhecer neles.

5eço&vos, pois, senhor, vos digneis in"ormá&la das minhasnovas resoluç+es, e pedir&lhe da minha parte uma entrevistaparticular, durante a qual possa, pelo menos em parte, reparar oserros com as desculpas( e, com este último sacri"$cio, destruir a seusolhos os únicos vest$gios ainda e#istentes dum erro ou duma "altaque me tornou culpado para com ela.

)* ap*s esta e#piação preliminar ousarei depor a vossos pés ahumilhante con"issão das minhas imensas loucuras( e implorar a

vossa mediação para uma reconciliação bem mais importante ainda,e in"elizmente mais di"$cil. 5osso contar, senhor, que não me

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recusareis as vossas atenç+es, tão necessárias e tão preciosas> Eque vos dignareis encora'ar a minha "raqueza e guiar os meus passosnum caminho novo que dese'o sinceramente seguir, mas quecon"esso, corando, não conhecer ainda>

Espero a vossa resposta com a impaci!ncia do arrependido

que dese'a reparar o mal "eito, e peço&vos que me acrediteis tãoreconhecido quão venerador, ?osso muito humilde, etc.

5. ). & utorizo&vos, senhor, caso o 'ulgueis conveniente, a comunicaresta carta por inteiro a 7adame de 3ourvel, a quem me considerareitoda a vida no dever de respeitar e em quem não dei#arei 'amais devenerar aquela de quem o 9éu se serviu para reconduzir a minhaalma - virtude, por meio da tocante visão da sua.

9astelo de..., TT de 2utubro de CD .

CARTA CXXI

A MARQUESA DE MARTEUIL AO CAVALEIRO DANCENY 

Gecebi a vossa carta, meu 'ovem amigo( mas antes de vosagradecer é preciso que vos ralhe e vos previna de que, se não voscorrigirdes, não obtereis resposta para a pr*#ima vez. )e quereis tera minha con"iança, abandonai pois esse tom galanteador, que é

apenas g$ria do amor, desde que não se'a a e#pressão dele. J esse oestilo da amizade> ão, meu amigo, cada sentimento tem alinguagem que lhe é peculiar( servir&se de outra, é dis"arçar opensamento que se e#prime. <em sei que as mulheres vulgares nadaentendem do que se lhes diz se não "or traduzido, de qualquermaneira, na g$ria do costume( mas 'ulgava merecer, con"esso&o, queme distingu$sseis delas. Estou verdadeiramente zangada, talvez maisdo que deveria, por me terdes avaliado mal.

Encontrareis pois na minha carta tudo o que "alta na vossa,"ranqueza e simplicidade. ir&vos&ei de boa vontade, por e#emplo,que teria um grande prazer em vos ver, e que estou contrariada por

s* ter - minha volta pessoas que me aborrecem, em vez de outrasque me agradam( mas v*s, a esta mesma "rase, traduzi&la&eis assim:ensinai&me a viver onde não estais( de maneira que quandoestiverdes, suponho, 'unto da vossa amada, não vos sentir$eis bemse eu não estivesse presente como terceiro elemento. 0ue pena= Eessas mulheres, a quem "alta sempre serem eu, achais por acaso queisso também "alta - vossa 9ec$lia> Eis no entanto aonde conduz umalinguagem que, pelo abuso que dela se "az ho'e em dia, está ainda abai#o da g$ria dos cumprimentos, e se trans"orma cada vez mais numsimples protocolo em que se acredita tanto como no 6muito humildeservidor6 =

7eu amigo, quando me escreverdes, que se'a para me dizer avossa maneira de pensar e sentir, e não para me enviar "rases que

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encontrarei, sem precisar de v*s, mais ou menos bem ditas noromance em moda. Espero que não vos zangareis com o que vosdigo, mesmo que veri"iqueis um pouco de mau humor( porque nãonego que o tenha, mas para evitar até a suspeita do de"eito que voscensuro, não vos direi que este mau humor se'a talvez um pouco

aumentado pelo a"astamento em que me encontro de v*s. 5arece&me a"inal de contas que valeis mais que um processo e doisadvogados, e talvez até do que o atencioso <elleroche.

?ede como em vez de vos desolardes com a minha aus!ncia,vos dever$eis "elicitar( porque nunca vos tinha "eito um tão beloelogio. 9reio que o e#emplo me contagia e que dese'o também dizer&vos galanteios, mas não, pre"iro continuar na minha "ranqueza( épois apenas ela que vos assegura da terna amizade que tenho porv*s, e do interesse que ela me inspira. J maravilhoso ter um 'ovemamigo cu'o coração está ocupado 'unto de outra.

ão é o sistema de todas as mulheres( mas é o meu. 5arece&

me que nos entregamos com mais prazer a um sentimento do qualnada se pode ter a recear, "oi por isso que desde muito cedo passeiconvosco ao papel de con"idente. 7as escolhei as vossas amadas tão

 'ovens, que pela primeira vez me apercebi de que começo aenvelhecer, preparai&vos assim para uma longa carreira deconst8ncias, e sinceramente dese'o que se'a rec$proca.

 3endes razão em vos submeterdes -s raz+es ternas ehonestas que, segundo dizeis, retardam a vossa "elicidade. ;made"esa prolongada é o único mérito que resta -s que não resistemsempre( e aquilo que eu acharia imperdoável em qualquer outra,

e#ceto numa criança como a pequena ?olanges, seria o não saberevitar um perigo, de que 'á "oi su"icientemente advertida pelacon"issão que ela pr*pria "ez do seu amor. ?*s, os homens, nãoavaliais o que é a virtude, e quanto custa sacri"icá&la= 7as por poucoque uma mulher raciocine, ela deve saber que independentementeda "alta que comete, um momento de "raqueza é para ela a maiordas in"elicidades( e não percebo como pode haver alguma que sedei#e conquistar, desde que tenha um momento para re"letir.

ão deveis combater esta idéia, porque ela é que me prendeprincipalmente a v*s. )alvar&me&eis dos perigos do amor( e se bemque até aqui tenha sabido de"ender&me sem v*s, consinto em estar&

vos reconhecida por tal, e amar&vos&ei mais e melhor.E ap*s isto, caro 9avaleiro, peço que eus vos tenha na )uasanta e digna guarda.

9astelo de. . ., TT de 2utubro de CD .

CARTA CXXII

MADAME DE ROSEMONDE A PRESIDENTE DE TOURVEL

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Esperava, querida "ilha, poder "inalmente acalmar as vossasinquietaç+es( e ve'o com pesar que vou pelo contrário aumentá&lasde novo. )ossegai, no entanto( o meu sobrinho não está em perigo(não se pode mesmo dizer que este'a verdadeiramente doente. 7aspassa&se certamente qualquer coisa de e#traordinário nele. ão

compreendo absolutamente nada( mas sa$ do quarto dele com umsentimento de tristeza, talvez até de medo, que me censuro de vos"azer compartilhar, e acerca do qual não posso no entanto impedir&me de conversar convosco. Eis o que se passou: podeis estar certaque sou "iel, porque mesmo que eu viva ainda outros oitenta anos,não esquecerei a impressão que me "ez essa cena tão triste.

ui pois esta manhã aos aposentos do meu sobrinho,encontrei&o a escrever, e cercado por uma multidão de montes depapéis, que pareciam ser o ob'eto do seu trabalho. Estava de tal"orma entretido, que 'á eu estava no meio do quarto, ainda ele nãotinha voltado a cabeça para saber quem entrara. ssim que me viu,

notei que enquanto se levantava se es"orçava por dar uma certacompostura ao rosto, e talvez tenha sido isso mesmo que me "ezreparar com mais atenção. 5ara dizer a verdade, não se tinhaarran'ado nem empoado( mas achei&o pálido e magro, e sobretudocom a "isionomia transtornada. 2 olhar, que vimos 'á tão vivo e tãoalegre, estava triste e abatido( en"im, aqui entre n*s, não gostariaque o tivésseis visto assim, porque tinha um aspecto comovente, emuito pr*prio, segundo creio, a inspirar essa terna piedade, que éuma das mais perigosas armadilhas do amor.

)e bem que abalada pelo que observava, comecei no entanto

a conversa como se não me tivesse apercebido de nada. Fnquiriprimeiro da sua saúde, e sem me dizer que era boa, não se lamentouno entanto que "osse má. Então quei#ei&me da sua aus!ncia, quetinha um pouco o aspecto de mania, e procurei 'untar um pouco debom humor ao meu 6sermão6( mas respondeu&me apenas, e numtom compenetrado, ah mais um erro, con"esso... mas será reparadocon'untamente com os outros. e#pressão do rosto, ainda mais doque as palavras, desconcertou&me, e apressei&me a dizer&lhe queestava a dar demasiada import8ncia a uma simples censura ditadapela amizade.

9omeçamos então a conversar tranquilamente. eclarou&me,

pouco depois, que talvez um assunto, 6o caso mais importante dasua vida6, o chamasse em breve a 5aris, mas como tive medo deadivinhar o que era, querida, e que este intr*ito levasse a umacon"id!ncia que não queria ouvir, não lhe "iz perguntas, e contentei&me em dizer que esperava que as distraç+es lhe "ossem úteis -saúde. crescentei que desta vez não lhe "aria nenhum pedido, vistoamar os meus amigos por eles pr*prios( a esta simples "rase,cerrando&me as mãos e "alando com uma veem!ncia que nãoconsigo reproduzir: 6)im, minha tia6, disse&me, 6amai, amai muito umsobrinho que vos respeita e vos adora( e, como dizeis, amai&o por elepr*prio. ão vos preocupeis com a sua "elicidade, e não perturbeis

com nenhum remorso a eterna tranqSilidade que espera "ruir embreve. Gepeti que me perdoais e amais( sim, haveis de perdoar&me(

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conheço a vossa bondade( mas como esperar a mesma indulg!nciadaqueles que o"endi tantas vezes>6. Então curvou&se um pouco, parame esconder, creio, os traços de dor que o timbre da voz tra$a contraa vontade dele.

7ais comovida do que posso dizer&vos, levantei&me

precipitadamente( e sem dúvida notou o meu susto, porqueimediatamente, retomando a compostura, disse: 65erdão, perdão,senhora( sinto que me perturbo contra minha vontade. 5eço&vos queesqueçais as minhas palavras e recordeis apenas o meu pro"undorespeito. ão dei#arei6, acrescentou, 6de ir 'unto de v*s renovar asminhas homenagens antes de partir6. 5areceu&me que esta última"rase me convidava a terminar a visita( e de "ato retirei&me.

7as quanto mais re"lito, menos percebo o que ele quis dizer.0ue assunto é este, que considera 6o mais importante da sua vida6 >5or que me pedia perdão> onde lhe veio este enternecimentoinvoluntário com que me "alava> 4á "ormulei mil vezes estas

interrogaç+es, sem conseguir responder&lhes. ada ve'o nelas que serelacione convosco, no entanto, como os olhos do amor são maisclarividentes que os da amizade, quis que nada ignorásseis do que sepassou entre mim e meu sobrinho.

 3ive de me interromper quatro vezes para escrever esta longacarta, que seria ainda mais longa se me não sentisse tão "atigada.

deus, minha querida "ilha.

9astelo de..., TO de 2utubro de CD .

CARTA CXXIII

O PADRE ANSELMO AO VISCONDE DE VALMONT

Gecebi, senhor ?isconde, a carta com que me honrastes( eontem dirigi&me, con"orme os vossos dese'os, a casa da pessoa emquestão. E#pus&lhe o ob'eto e os motivos da dilig!ncia que mehav$eis pedido para desempenhar 'unto dela. pesar de achardemasiado presa - sensata decisão que tomara, depois de lhe ter

demonstrado que se arriscava com a sua recusa a p%r um obstáculoao vosso "eliz regresso e a opor&se assim aos pro'etosmisericordiosos da ivina 5rovid!ncia, acabou por consentir na vossavisita, com a condição de que seria a última, e encarregou&me de vosanunciar que estaria em casa na pr*#ima quinta&"eira, TU. 5ede&vosque se esse dia vos não convier, a in"ormeis e lhe indiqueis um outro. vossa carta será recebida.

o entanto, senhor ?isconde, permiti&me que vos peça quenão adieis sem "ortes raz+es, para que mais cedo vos possaisconsagrar inteiramente -s louváveis disposiç+es que me a"irmastes.

5ensai que o que se não apressa a aproveitar o momento da

graça se arrisca a que ela lhe se'a retirada( que embora a bondadedivina se'a in"inita, a sua aplicação é regulada pela 'ustiça( e pode

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haver um momento em que o eus de miseric*rdia se trans"orme emeus de vingança.

)e continuardes a honrar&me com a vossa con"iança, peço&vosque acrediteis que estarei -s vossas ordens sempre que odese'ardes, e por maiores que se'am os meus a"azeres, a minha

importante tare"a será sempre cumprir os deveres do santoministério a que me dediquei inteiramente( e o momento mais beloda minha vida seria aquele em que visse os meus es"orços seremrealçados pela b!nção do 3odo&5oderoso. )omos "racos e pecadorese nada podemos por n*s pr*prios=

7as o eus que vos chama tudo pode( e devemos também -sua bondade, v*s, o dese'o constante de vos unirdes a Ele, e eu, osmeios de a$ vos conduzir. E com o )eu socorro, espero convencer&vosde que s* a santa religião pode dar, mesmo neste mundo, a"elicidade s*lida e durável que vãmente se procura na "ogueira daspai#+es humanas.

 3enho a honra de ser, com respeitosa consideração, etc.

5aris, TO de 2utubro de CD .

CARTA CXXIV

A PRESIDENTE DE TOURVEL A MADAME DE ROSEMONDE

 3omada ainda do espanto em que se lançou a nova de queontem conhecimento, não esqueço, senhora, a satis"ação que ela vosdeve causar, e apresso&me a dar&vos parte dela. 2 senhor de?almont 'á se não ocupa de mim nem do seu amor( agora pretendeapenas emendar, com uma vida mais edi"icante, as "altas, ou antes,os erros da 'uventude. ui in"ormada dessa resolução pelo padrenselmo, a quem se dirigiu para de "uturo o guiar, e também paralhe conseguir um encontro comigo, que segundo 'ulgo terá comoprincipal ob'etivo devolver&me as minhas cartas que conservara atéaqui, apesar do meu pedido em contrário.

)* me resta, sem dúvida, aplaudir esta "eliz trans"ormação, e

"elicitar&me se, tal como diz, pude de algum modo concorrer para ela.7as por que havia de ser eu o instrumento, e por que me custariaisso o repouso da minha vida> 5or que motivo seria o meu in"ortúnioo preço da "elicidade do senhor de ?almont>

2h, minha indulgente amiga, desculpai este quei#ume. )eique não me cabe perscrutar os des$gnios de eus, mas enquanto eulhe suplico sem cessar, e sempre em vão, "orça para vencer estemeu desgraçado amor, Ele prodigaliza&a a quem a não pedia, edei#a&me sem socorro, inteiramente entregue - minha "raqueza.

7as aba"emos murmúrios tão culpados. <em sei que o "ilhopr*digo recebe, no regresso, mais graças do pai do que o "ilho que

nunca se ausentara. 9omo poderemos pedir contas Hquele que nadanos deve> E mesmo que gozássemos perante Ele de alguns direitos,

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quais poderiam ser os meus> 2usarei vangloriar&me duma sensatezque s* devo a ?almont> )alvou&me como poderia quei#ar&me porso"rer por ele> ão: ser&me&ão caros os meus so"rimentos, se são opreço da sua "elicidade. Era necessário que ele regressasse ao 5ai. 2eus que o "ormou ama com certeza a sua obra. ão criou esse ser

encantador para "azer dele um réprobo. evo suportar a dor daminha audaciosa imprud!ncia( pois não devia eu compreender que,se me era interdito amá&lo, nem sequer me devia permitir&me v!&lo>

2 meu erro ou a minha desdita "oi não ter aceitado durantemuito tempo esta verdade. )ois testemunha, minha querida e dignaamiga, de que me submeti a esse sacri"$cio, assim que o reconhecinecessário( mas para que ele "osse completo, "altava s* que o senhorde ?almont o não compartilhasse. 2usarei con"essar&vos que estaidéia é agora a que mais me atormenta>

Fnsuportável orgulho, que adoça os males quee#perimentamos com aqueles que "azemos so"rer= h= Aei&de vencer

este coração rebelde e acostumá&lo -s humilhaç+es.oi sobretudo para conseguir isso que consenti em receber, na

pr*#ima quinta&"eira, a penosa visita do senhor de ?almont.)erá, então, o pr*prio a dizer&me que 'á não represento nada

para ele, que a "rágil passageira emoção que nele despertara see#tinguiu inteiramente= ?erei o seu olhar pousar&se sobre mim, semcomoção, enquanto o medo de denunciar a minha me obrigará abai#ar os olhos. E receberei da sua indi"erença essas mesmas cartasque recusou durante tanto tempo -s minhas insistentes súplicas(devolv!&las&á como ob'etos inúteis que 'á lhe não interessam( e as

minhas mãos tr!mulas, ao receber esse despo'o vergonhoso,sentirão que ele lhe é entregue por uma mão "irme e tranqSila=En"im, v!&lo&ei a"astar&se, a"astar&se para sempre, e os meus olhossegui&lo&ão, sem verem os seus voltarem&se para mim.

Era preciso que suportasse tanta humilhação= h= 3entarei aomenos torná&la útil, dei#ando&me penetrar pelo sentimento da minha"raqueza. )im, conservarei precisamente essas cartas de que ele 'ánão "az caso. Fmpor&me&ei a vergonha de as ler todos os dias, até queas lágrimas lhes apaguem os últimos traços( e as dele, hei&dequeimá&las, porque estão contaminadas com o perigoso veneno quecorrompeu a minha alma. 2h= 7as que é o amor, que nos "az até ter

saudades dos perigos a que nos e#p+e( e que sobretudo tememossentir ainda, quando 'á o não inspiramos= ei#emos esta pai#ão"unesta, que s* permite a escolha entre a vergonha e a desgraça, eque por vezes as reúne( que pelo menos a prud!ncia substitua avirtude.

9omo quinta&"eira ainda está longe= 0ue pena não poderconsumar imediatamente esse doloroso sacri"$cio e esquecer&lhe emseguida a causa e o dese'o= Esta visita importuna&me( arrependo&mede ter acedido. 2h= 5ara que precisa ainda ver&me>

0ue representamos agora um para o outro> )e me o"endeu,perdoo&lhe. elicito&o e louvo&o por querer emendar as suas "altas.

arei mais, imitá&lo&ei( e visto que "ui seduzida pelos mesmoserros, o e#emplo dele a'udar&me&á. 7as se pro'eta "ugir de mim, por

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que começa por me procurar> ão está cada um de n*s empenhadoem esquecer o outro> h= )erá esse de ho'e em diante o meu únicocuidado.

)e o permitirdes, minha respeitável amiga, será 'unto de v*sque me irei ocupar desse di"$cil trabalho. )e necessito socorro e até

mesmo consolação, s* de v*s os quero receber. )* v*s sabeis ouvir&me e "alar ao meu coração. vossa preciosa amizade preencherátoda a minha e#ist!ncia. ada me parecerá di"$cil para secundar oscuidados que me dispensardes. ever&vos&ei a tranqSilidade, a"elicidade, a virtude( e o "ruto das vossas bondades será o de metornardes digna de tudo isto.

 4ulgo que me dispersei muito nesta carta( presumo&o pelaperturbação em que estive sempre enquanto vos escrevia. )e nela seencontrar algum sentimento de que eu deva corar, cobri&lo com avossa indulgente amizade. 9on"io inteiramente nela. e v*s nãoesconderei nenhum movimento do meu coração.

deus, minha respeitável amiga. Espero dentro de poucosdias anunciar&vos a minha chegada.

5aris, TO de 2utubro de CD .

QUARTA PARTE

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CARTA CXXV

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

Eis vencida essa mulher orgulhosa que ousara crer que mepodia resistir= )im, minha amiga, tive&a, possu$&a inteiramente( edesde ontem que nada mais tem a conceder&me.

Estou ainda demasiado cheio da minha "elicidade para apoder apreciar: espanto&me do encanto desconhecido quee#perimentei.

)erá pois verdade que a virtude aumenta o valor dumamulher, até no momento em que dei#a de a ter> 7as não,releguemos essa idéia pueril para as almas simpl*rias. ão seencontra quase por toda a parte uma resist!ncia mais ou menos bem

"ingida ao primeiro triun"o> E 'á alguma vez tinha eu encontrado oencanto de que "alo> 9ontudo, não é o do amor( porque, en"im, se

 'unto desta mulher espantosa tive por vezes momentos de "raquezaque se assemelhavam a essa pai#ão pusil8nime, soube semprevenc!&los e voltar aos meus princ$pios.

7esmo que a cena de ontem me tenha, segundo suponho,levado um pouco mais longe do que contava( mesmo que tenhapartilhado por um momento a perturbação e a embriaguez queinspirava, essa ilusão passageira estaria dissipada presentemente( e,no entanto, o mesmo encanto subsiste. E#perimentaria até,

con"esso&o, um prazer assaz doce em me entregar a ele, se isso nãome causasse uma certa inquietação. )eria eu, na minha idade,dominado como um principiante por um sentimento involuntário edesconhecido> ão: é preciso, antes de tudo, combat!&lo eapro"undá&lo.

e resto, talvez 'á tenha entrevisto a causa= 9omprazo&mepelo menos com esta idéia, e gostaria que "osse verdadeira.

a multidão de mulheres 'unto das quais desempenhei atého'e o papel e as "unç+es de amante, não tinha ainda encontradonenhuma que não tivesse pelo menos tanta vontade de se entregarcomo eu de a isso a "orçar( tinha&me até habituado a chamar

pudibundas -s que "aziam apenas metade do caminho, por oposiçãoa tantas outras, cu'a de"esa provocante cobria imper"eitamente osprimeiros "avores que tinham concedido.

qui, pelo contrário, encontrei a princ$pio uma prevençãodes"avorável, "undamentada depois nos conselhos e nas in"ormaç+esduma mulher odienta, mas sagaz( uma timidez natural e e#tremaque "orti"icava um pudor lúcido( um apego - virtude, conduzida pelareligião, e que contava 'á dois anos de triun"o( e, para "inalizar,iniciativas súbitas, inspiradas por estes di"erentes motivos, tendo por"im "urtar&se - minha perseguição.

ão se trata, pois, como nas minhas outras aventuras duma

simples capitulação mais ou menos vanta'osa, da qual é mais "áciltirar proveito do que vaidade( é uma vit*ria completa, arrancada por

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uma campanha penosa e resolvida de"initivamente por sábiasmanobras. ada de espantar pois que este !#ito, devido apenas amim, me se'a mais precioso( e o acréscimo de prazer quee#perimentei no triun"o, e que ainda sinto, é a doce impressão dosentimento da gl*ria. carinho esta maneira de ver, que me poupa a

humilhação de pensar que possa depender de qualquer maneira daescrava que submeti: que não detenho apenas em mim a plenitudeda minha "elicidade( e que a "aculdade de ma "azer gozar em toda asua "orça este'a reservada a tal ou tal mulher, com e#clusão dequalquer outra.

Estas sensatas re"le#+es regularão toda a minha condutanesta importante ocasião( e pode estar certa de que não me dei#areiprender de maneira a não poder, a todo o momento, quebrar a meubel&prazer estes novos laços. alo&lhe 'á da ruptura, e ignorais aindapor que meios a ela adquiri direitos( leia, pois, e ve'a a que se e#p+ea sabedoria quando tenta socorrer a loucura.

Estudava tão atentamente as minhas palavras e as respostas,que obtinha, que espero reproduzi&las com uma e#atidão que,satis"aça.

?erá, pelas duas c*pias de cartas aqui 'untas, qual omedianeiro que escolhera para me apro#imar da minha bela, e comque zelo a santa criatura se empenhou em nos unir. 2 que é precisosaber também, e que eu tinha descoberto por uma carta,interceptada como de costume, é que o receio e a pequenahumilhação de ser abandonada tinham perturbado um pouco apudic$cia da austera devota( e tinham&lhe enchido o coração e a

cabeça de idéias que, lá por não terem sentido, nem por issodei#avam de ser interessantes. oi depois destes preparativosindispensáveis que ontem, quinta&"eira, TU, dia marcado e concedidopela ingrata, me apresentei, escravo t$mido e arrependido, em casadela, para sair mais tarde coroado vencedor.

Eram seis horas da tarde quando cheguei a casa da belareclusa( porque, desde o regresso, a sua porta tem estado "echada atoda a gente.

 3entou levantar&se quando "ui anunciado( mas os 'oelhostr!mulos não lho permitiram: voltou a sentar&se imediatamente.9omo o criado que me tinha introduzido tivesse qualquer serviço a

"azer na sala, pareceu impacientar&se e preenchemos este intervalocom os cumprimentos usuais. 7as para não perder tempo numaocasião em que todos os instantes eram preciosos, e#amineicuidadosamente o local( e marquei logo qual seria o teatro da minhavit*ria. 5oderia ter escolhido um mais c%modo: porque neste mesmoquarto havia uma otomana.

7as notei que em "ace dela estava um retrato do marido( ereceei, con"esso&o, que, com esta mulher tão singular, um simplesolhar *&artas &44 e &44lançado por acaso para aquele lado bastasse para destruir num ápiceo resultado de tantos es"orços. icamos "inalmente s*s e entrei no

assunto.

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epois de e#plicar, em poucas palavras, que o padre nselmoa devia ter in"ormado do motivo da minha visita, quei#ei&me dotratamento rigoroso a que "ora submetido( e acentueiparticularmente o desprezo que me tinha sido testemunhado.

e"endeu&se, como esperava( e, como certamente calcula,

apresentei como provas a descon"iança e o medo que eu inspirara( a"uga escandalosa que se seguira, a recusa de responder -s minhascartas, de as receber até, etc., etc. 0uando começou a 'usti"icação,que seria bem "ácil, 'ulguei dever interromp!&la( e para me "azerperdoar por esta brusquidão, cobri&a logo de lison'as.

6)e tais encantos6, recomecei eu, 6produziram uma impressãotão pro"unda sobre o meu coração, as vossas virtudes não "izerammenos sobre a minha alma. )eduzido, sem dúvida, pelo dese'o de meapro#imar, atrevi&me a 'ulgar&me digno delas. ão vos censuro porterdes sido de opinião di"erente( mas castigo&me pelo meu erro.9omo o embaraço a "orçasse ao sil!ncio, continuei: 6ese'ei,

senhora, ou 'usti"icar&me aos vossos olhos, ou obter o vosso perdãopelos erros que me atribu$s, a "im de poder ao menos terminar comalguma tranqSilidade uma vida a que 'á não dou valor, desde quevos recusastes embelezá&la.6

qui tentou responder. 62 meu dever não me permitia...6 E adi"iculdade de terminar a mentira que o dever lhe e#igia não adei#ou acabar a "rase. Gecomecei então no tom mais terno: 6J entãoverdade que "oi de mim que "ugistes>6 & 6quela partida eranecessária.6 & 6E também que me a"astais de v*s>6 & 6ssim épreciso.6 & 6E para sempre>6 & 6J o meu dever.6 esnecessário se

torna dizer&lhe que, durante este curto diálogo, a voz da terna devotaestava opressa e que os seus olhos não se erguiam para mim. 4ulguei dever animar um pouco esta cena esmo recente(

assim, levantando&me com ar de despeito, disse então: 6 vossa"irmeza devolve&me a minha. 5ois bem, senhora, "icaremosseparados sim( mais separados até do que pensais, e tereis entãotodo o tempo para vos "elicitardes da vossa obra.6 ;m pouco,surpreendida por este tom de censura, quis replicar. 6 resoluçãoque haveis tomado6, disse ela... 6J apenas o e"eito do desespero6,acrescentei com $mpeto. 60uisestes "azer&me in"eliz( provar&vos&eique o haveis conseguido para além mesmo dos vossos dese'os.6

6ese'o a vossa "elicidade6, respondeu. E o tom da voz começava aanunciar uma emoção assaz "orte. ssim, lançando&me aos seus pés,e com o tom dramático que me, conhece, e#clamei: 6h, cruel= 9omopode e#istir para mim uma "elicidade se v*s a não compartilhardes>9omo encontrá&la longe de v*s> h, nunca, nunca=6 9on"esso que,abandonando&me a este ponto, contara imenso com o au#$lio dasminhas lágrimas( mas, ou por má disposição, ou talvez apenas pore"eito da atenção penosa e cont$nua que prestava a tudo, "oi&meimposs$vel chorar.

5or "elicidade recordei&me que para sub'ugar uma mulhertodos os meios são bons( e que bastava impressioná&la com um "orte

arrebatamento, para que a impressão permanecesse pro"unda e"avorável. )upri então a "alta de sensibilidade pelo terror( e para tal,

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mudando apenas a in"le#ão da voz, e mantendo a mesma atitude,continuei: 6)im, "aço este 'uramento a vossos pés: ou vos possuo oumorro.6 o pronunciar estas últimas palavras, os nossos olharesencontraram&se. ão sei o que a t$mida criatura viu ou 'ulgou ver nosmeus( mas levantou&se com ar assustado e escapou&se dos meus

braços que a rodeavam.?erdade se'a que nada "iz para a reter, porque 'á notaravárias vezes que as cenas de desespero, conduzidas com demasiadavivacidade, caem no rid$culo quando se tornam longas ou quando s*dei#am sa$das verdadeiramente trágicas, coisa que eu estava muitolonge de dese'ar. Entretanto, enquanto ela se esquivava, acrescenteinum tom bai#o e sinistro, mas de maneira a poder ser ouvido: 65oisbem= morte=6

@evantei&me então( e, guardando um momento de sil!ncio,lançava sobre ela, como por acaso, olhares selvagens, que lá porparecerem alucinados nem por isso eram menos clarividentes e

observadores. 2 porte pouco seguro, a respiração apressada, acontração dos músculos, os braços tr!mulos e meio levantados, tudome provava que o e"eito "ora tal como o dese'ava mas, como noamor s* de perto algo se concretiza, e como estávamos um poucoa"astados um do outro, era necessário antes do mais que nosapro#imássemos. 5ara o conseguir, passei o mais rapidamenteposs$vel a uma aparente tranqSilidade, prop$cia para acalmar ose"eitos desta situação violenta, mas sem lhe en"raquecer aimpressão.

minha transição "oi: 6)ou um in"eliz. 0uis viver para a vossa

"elicidade, e estraguei&a. 9onsagrei&me - vossa tranqSilidade, eperturbo&a.6 Em seguida, com um ar calmo mas constrangido:65erdão, senhora, pouco habituado -s tempestades das pai#+es, nãosei reprimir&lhes os $mpetos. )e "iz mal em dei#ar&me levar por eles,pensai ao menos que é a última vez. h, acalmai&vos, acalmai&vos,peço&vos.. E durante esta longa "rase, apro#imei&meinsensivelmente. 6)e quereis que me acalme, respondeu a belaamedrontada, 6estai também mais tranqSilo6.

65ois bem= )im, prometo&vos6, disse&lhe eu. E acrescentei comuma voz mais "raca: 6)e o es"orço é grande, ao menos não serálongo. 7as6, acrescentei logo com um ar alucinado, 6vim, não é

verdade, para restituir as vossas cartas> 5or piedade, dignai&vosaceitá&las. J mais um sacri"$cio que me resta "azer( não me dei#eisnada que me possa diminuir a coragem. E tirando do bolso a preciosacoleção, disse: 6Eis o enganador testemunho das a"irmaç+es davossa amizade= Era o que me prendia - vida( tomai&o. ai pois v*smesma o sinal que nos deve separar para todo o sempre.6

qui, a amante receosa cedeu inteiramente - sua meigainquietação.

67as, senhor de ?almont, que tendes, que quereis dizer> 2passo que ho'e destes não é voluntário> ão é o "ruto das vossaspr*prias re"le#+es> E não são elas que vos levaram a aprovar a

atitude absolutamente necessária que tomei por dever>

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65ois bem=6, disse eu, 6essa atitude impede&me uma decisão.6& 60ual=>6 & 6 única que pode, ao mesmo tempo que me separa dev*s, p%r "im aos meus tormentos.6 & 67as, respondei&me, que decisãoé>6 este ponto, apertava&a nos meus braços, sem que ela sede"endesse( e calculando, por este esquecimento do decoro, quanto

a emoção devia ser "orte e poderosa: 67ulher adorável6, disse eu,ousando o entusiasmo, 6não "azeis idéia do amor que inspirais.unca sabereis até que ponto "ostes adorada, e como estesentimento me era mais caro que a minha e#ist!ncia= 0ue os vossosdias se'am a"ortunados e tranqSilos( que se embelezem com toda a"elicidade de que me haveis privado= Getribu$ ao menos este dese'osincero com um remorso, uma lágrima( e crede que o último dosmeus sacri"$cios não será o mais doloroso para o meu coração.deus.6

Enquanto "alava assim, sentia o seu coração palpitar comviol!ncia( observava&lhe a alteração do rosto( sobretudo via as

lágrimas su"ocá&la, e no entanto s* corriam raras e penosas. )*então tomei a decisão de "ingir a"astar&me( mas agarrando&me com"orça: 6ão, escutai&me6, disse ela vivamente. 6ei#ai&me6, respondi.63endes de me escutar, quero que me escuteis.6

6evo a"astar&me de v*s=6 & 6ão=6, gritou ela... 9om estaúltima palavra lançou&se, ou antes, caiu desmaiada nos meus braços.9omo duvidava ainda de tão "eliz !#ito, "ingi um grande susto( masao mesmo tempo, conduzi&a, ou melhor, levei&a ao colo para o localprecedentemente escolhido como terreno da minha gl*ria( e come"eito, quando voltou a si 'á estava abandonada e submetida ao seu

"eliz vencedor.té aqui, minha bela amiga, achar&me&á, creio, duma purezade método que lhe agradará( e verá que não me a"astei em nada dosverdadeiros princ$pios desta guerra, que 'á muitas vezes notáramosser tão parecida com a outra. 9ompare&me pois com 3urenne ourederico. 2briguei a combater um inimigo que queria apenascontemporizar( consegui, por meio de sábias manobras, escolher oterreno e a disposição das "orças( inspirei con"iança ao inimigo paramais "acilmente o poder alcançar no seu esconderi'o( nada dei#ei aoacaso, considerando o valor que teria o triun"o e a necessidade dereservar uma sa$da em caso de derrota( "inalmente, s* abri as

hostilidades quando 'á tinha uma retirada assegurada, de "orma apoder proteger e conservar tudo o que conquistara anteriormente.Eis, creio, tudo o que é poss$vel "azer( mas receio agora ter&medei#ado amolecer, como n$bal pelas del$cias de 9ápua. Eis o queaconteceu depois. Esperava evidentemente que um tão grandeacontecimento não se passaria sem as lágrimas e o desespero docostume( ora notei a princ$pio sobretudo um estado de con"usão euma espécie de recolhimento( mas atribu$ ambos - sua pudic$cia,assim, sem me preocupar com estas ligeiras di"erenças, que supusmeramente locais, enveredei pela grande estrada das consolaç+es,convencido de que, como de costume, as sensaç+es a'udariam o

sentimento, e que uma s* ação "azia mais do que todas as palavras,que eu, porém, não dei#ava de lado. 7as encontrei uma resist!ncia

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verdadeiramente assustadora, menos pela sua "orça do que pela"orma que revestia.

Fmagine uma mulher sentada, r$gida, rosto im*vel( semaspecto de pensar, ouvir ou compreender( de cu'os olhos "itos aslágrimas deslizam continuamente e sem es"orço. ssim estava

7adame de 3ourvel enquanto eu lhe "alava( mas se eu tentavachamar&lhe a atenção para mim por meio duma car$cia, mesmo pelogesto mais inocente, a esta aparente apatia sucedia imediatamenteo terror, a su"ocação, as convuls+es, e alguns gritos entrecortados,mas sem articular uma palavra.

Estas crises repetiram&se várias vezes, e cada vez mais "ortes(a última "oi mesmo tão violenta que "iquei inteiramente desanimado,e receei por momentos ter obtido uma vit*ria inútil.

Gecorri então aos lugares&comuns do costume, entre os quaisse encontrava este: 6esesperais&vos porque me haveis "eito "eliz>6 estas palavras, a adorável mulher voltou&se para mim( e o rosto, se

bem que ainda um pouco alucinado, 'á tinha no entanto retomado asua e#pressão celestial. 6)ois pois "eliz>6 "irmei com mais "orçaainda. 6E "eliz por minha causa=6 7ultipliquei as lison'as e asmeiguices. Enquanto eu "alava os membros distenderam&se&lhe(tombou com moleza, apoiada contra o so"á( e abandonando&me umadas mãos de que ousara apossar&me, disse: 6)into que essa idéia meconsola e alivia.6

9alcula certamente que uma vez colocado no bom caminho,não o voltei a abandonar( era realmente o que tinha a "azer.

ssim, quando quis tentar um segundo !#ito, encontrei a

princ$pio certa resist!ncia, e o que se passara anteriormente tornou&me circunspeto. 7as chamando de novo em meu au#$lio aquelamesma idéia da minha "elicidade, veri"iquei logo o seu e"eitobené"ico: 63endes razão6, disse&me a meiga criatura( 6s* possosuportar a minha e#ist!ncia na medida em que ela servir para vos"azer "eliz. ?ou&me consagrar inteiramente a isso: a partir destemomento entrego&me, e nunca mais encontrareis da minha partenem recusas, nem remorsos.6 oi com esta ing!nua e sublimecandura que me abandonou a sua pessoa e os seus encantos, eaumentou assim a minha "elicidade ao compartilhá&la.

embriaguez "oi completa e rec$proca( e, pela primeira vez, a

minha sobreviveu ao prazer. o sair dos braços dela ca$a&lhe aos pés, 'urando&lhe amor eterno( e, é preciso con"essá&lo, eu acreditava noque dizia. En"im, mesmo depois de nos termos separado, a sualembrança não me dei#ava, e tive de "azer um es"orço para aesquecer.

h, por que não está aqui para equilibrar o mérito da açãopelo da recompensa> 7as não perderei nada por esperar, não éverdade> E espero poder considerar como assente entre n*s o "elizacordo que lhe propus na minha última carta. <em v! que cumpro aminha parte, e que, como lhe prometi, os meus assuntos estarãosu"icientemente avançados para lhe poder dedicar uma parte do

meu tempo. presse&se a despachar esse estorvo do <elleroche, e

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dei#e em paz o dulçoroso ancenP, para se ocupar apenas de mim.7as o que "az no campo, que nem sequer me responde>

)abe que tenho vontade de lhe ralhar> 7as a "elicidadepredisp+e - indulg!ncia. E não esqueço, aliás, que ao colocar&me denovo no número dos seus apai#onados, devo submeter&me -s suas

pequenas "antasias. @embre&se, porém, de que o novo amante nadaquer perder dos antigos direitos do amigo...deus, como outrora... )im, adeus, meu an'o= Envio&te todos

os bei'os do amor.

5. ). & )abe que 5révan ao "im do seu m!s de prisão "oi obrigado aabandonar o regimento> J a novidade do dia em 5aris. a verdade,ei&lo cruelmente punido por uma pati"aria que não cometeu, e aminha amiga obteve um !#ito completo=

5aris, TR de 2utubro de CD .

CARTA CXXVI

MADAME DE ROSEMONDE A PRESIDENTE DE TOURVEL

 3er&vos&ia respondido mais cedo, minha amável "ilha, se a"adiga da minha última carta me não tivesse provocado dores queme impediram durante estes dias de poder utilizar o braço.

Estava dese'ando agradecer&vos as boas not$cias que medestes do meu sobrinho, e de vos dar, a v*s, as minhas sinceras"elicitaç+es.

 3emos de ver nisto um golpe da 5rovid!ncia, que, tocandoum, salvou o outro. )im, minha querida "ilha, eus que queriaapenas e#perimentar&vos, socorreu&vos no momento em que asvossas "orças estavam esgotadas( e apesar do vosso quei#ume,deveis, creio, prestar&@he aç+es de graças. ão é que eu não ve'amuito bem que seria mais agradável para v*s que tivésseis sido aprimeira a tomar essa resolução, e que a de ?almont "osse apenas aseqS!ncia( parece&me até, "alando humanamente, que os direitos do

nosso se#o teriam sido assim mais resguardados, e n*s nãoqueremos perder nenhum= 7as que interessam essas consideraç+esligeiras perante os importantes ob'etivos que se encontramrealizados> ?emos alguém que se salva dum nau"rágio quei#ar&sepor não ter podido escolher o meio>

)entireis em breve, minha querida "ilha, que as penas quetemeis se hão&de aligeirar por si pr*prias( e mesmo que subsistissemsempre e com a mesma agudeza, não dei#ar$eis por isso de sentirque seriam ainda mais "áceis de suportar que os remorsos do crime eo desprezo por si pr*pria. Fnutilmente vos teria "alado mais cedo comesta aparente severidade: o amor é um sentimento independente,

que a prud!ncia pode "azer evitar, mas que não sabe vencer( e que,uma vez nascido, morre apenas ou de morte natural, ou pela

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aus!ncia absoluta de esperança. J este último caso, no qual vosencontrais, que me dá a ousadia e o direito de vos dizer livremente aminha opinião. J cruel assustar um doente desesperado, a quem s*se devem consolaç+es e paliativos, mas é sensato esclarecer umconvalescente sobre os perigos que correu, para lhe inspirar a

prud!ncia de que necessita e a submissão aos conselhos que lhepodem ser necessários.?isto que me escolhestes como médico, é como tal que vos

"alo, e que vos digo que os incomodozinhos que sentis agora, e quetalvez necessitem ainda alguns remédios, nada são comparados coma doença alarmante de que está agora assegurada a cura. E emseguida como amiga, amiga duma mulher razoável e virtuosa,permitir&me&ei acrescentar que essa pai#ão, que vos sub'ugou,pai#ão tão in"eliz em si pr*pria, era&o ainda mais pelo seu ob'eto. acreditar no que se diz, o meu sobrinho, que con"esso amar talvezcom "raqueza, e que reúne muitas qualidades louváveis e outros

tantos atrativos, é perigoso para as mulheres e culpado perante elas,e para ele seduzi&las e desgraçá&las é o mesmo. 9reio que o ter$eisconvertido. unca alguém "oi mais digno disso, mas 'á tantas segabaram do mesmo, vendo depois essa esperança desenganada, quepre"iro não vos ver reduzida a esse recurso.

5ensai agora, minha querida "ilha, que em vez de tantosperigos que correr$eis, tereis, além do repouso de consci!ncia e datranqSilidade, a satis"ação de ter sido a principal causa da "eliztrans"ormação de ?almont.

5or mim, não duvido que se'a grande parte trabalho da vossa

cora'osa resist!ncia, e que um momento de "raqueza da vossa parteteria dei#ado o meu sobrinho numa danação eterna. J&me agradávelpensar assim, e dese'o ver&vos pensar da mesma maneira(encontrareis assim as primeiras consolaç+es, e eu terei raz+es paravos amar ainda mais.

Espero&vos aqui dentro de poucos dias, minha amável "ilha, talcomo anunciais. ?inde encontrar de novo a calma e a "elicidade nosmesmos lugares em que as perdestes, vinde principalmenteregozi'ar&vos com a vossa terna mãe, de terdes tão "ielmentecumprido a palavra que lhe hav$eis dado de nada "azer que não "ossedigno dela e de v*s=

9astelo de..., BV de 2utubro de CD .

CARTA CXXVII

A MARQUESA DE MERTEUIL AO VISCONDE DE VALMONT

)e ainda não respondi, ?isconde, - sua carta de CR, não "oipor "alta de tempo( mas simplesmente porque ela me irritou e a não

achei razoável. 3inha pensado que o melhor era dei#á&la noesquecimento( mas visto que insiste, que parece empenhado nas

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idéias que sugere, e que toma o meu sil!ncio por um consentimento,urge que lhe e#ponha claramente a minha opinião.

 3ive por vezes a pretensão de substituir sozinha um serralhointeiro( mas nunca aceitei "azer parte de um. 5ensava que o meuamigo sabia isso. 5elo menos, neste momento, 'á não o ignora e

 'ulgará "acilmente quanto me pareceu rid$cula a sua proposta.5ois qu!= 5oderia eu sacri"icar uma inclinação, e para maisuma inclinação recente, para me ocupar de si> E ocupar&me como>

Esperando a vez, como escrava submissa, dos sublimes"avores de )ua lteza. 0uando, por e#emplo, se quiser distrair porum momento desse encanto desconhecido que a adorável, a celeste7adame de 3ourvel "oi a única a "azer&lhe sentir, ou quando temercomprometer perante a atraente 9ec$lia a idéia superior que elaconserve de si( então, descendo até mim, virá procurar prazeres, naverdade menos vivos, mas sem conseqS!ncias( e as suas preciosasbondades, embora um pouco raras, bastarão para a minha "elicidade.

?e'o que está cheio de si, mas eu também não sou modesta( epor mais que me olhe, não me acho deca$da até esse ponto.

 3alvez se'a de"eito da minha parte, mas previno&o de quepossuo ainda muitos outros.

Em primeiro lugar o de acreditar que o colegial, o dulçorosoancenP, s* se ocupando de mim, sacri"icando&me, sem se "azervaler, uma primeira pai#ão, ainda antes de a ter satis"eito, eamando&me en"im como se ama na idade dele, poderia, apesar dosseus vinte anos, contribuir bem mais do que o ?isconde para a minha"elicidade e os meus prazeres. 5ermito&me mesmo acrescentar que,

se me desse na "antasia a idéia de lhe dar um ad'unto, não seriacertamente o ?isconde, pelo menos por agora.5or que raz+es>, perguntará. Em primeiro lugar poderia não

haver nenhuma, porque o capricho que me "aria pre"eri&lo, podeigualmente e#clu$&lo. 7as quero, por delicadeza, dar&lhe o motivo daminha decisão. 5arece&me que teria de me "azer demasiadossacri"$cios, e eu, em vez de mostrar o reconhecimento que esperariade mim, seria capaz de 'ulgar que ainda merecia mais= <em v! que,tão a"astados um do outro pela nossa maneira de pensar, de nenhummodo nos podemos unir( e temo que me se'a necessário muitotempo, mesmo muito, antes de mudar de sentimentos.

5rometo avisá&lo quando estiver corrigida. té lá, creia&me,pode arran'ar outras aventuras e guardar os seus bei'os( tem muitoonde empregá&los melhor=...

deus, como antigamente, diz> ntigamente, porém, "aziamuito mais caso de mim( não me limitava aos terceiros papéis eesperava que eu dissesse sim, para estar certo do meuconsentimento.

ceite pois que em vez de lhe dizer também adeus, comoantigamente, lhe diga adeus como agora.

sua serva, senhor ?isconde.

o castelo de..., BC de 2utubro de CD .

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CARTA CXXVIII

A PRESIDENTE DE TOURVEL A MADAME DE ROSEMONDE

)* ontem recebi, senhora, a vossa resposta tardia. 3er&me&iacausado imediatamente a morte se a minha e#ist!ncia mepertencesse, mas outro a possui( e esse outro é o senhor de ?almont.

?ede que nada vos escondo. 9onsiderareis talvez que 'á nãosou digna da vossa amizade, mas pre"iro perd!&la a iludi&la.

 3udo o que vos posso dizer é que, obrigada pelo senhor de?almont a escolher entre a sua morte e a sua "elicidade me decidipor esta. ão me envaideço, nem me acuso: digo simplesmente oque se passou.

5odeis imaginar "acilmente, depois disto, como me "ez

impressão a vossa carta e as severas verdades que contém não 'ulgueis que ela tenha "eito nascer em mim o remorso ou que possatrans"ormar os meus sentimentos ou conduta. ão é que eu nãopasse por momentos cruéis( mas quando sinto o coraçãodespedaçado, quando temo 'á não poder suportar os tormentos,penso: ?almont é "eliz( e tudo desaparece perante essa idéia ouantes, tudo se trans"orma em prazer.

ediquei&me pois ao vosso sobrinho( "oi por ele que me perdi. 3ornou&se o centro único dos meus pensamentos, sentimentos eaç+es. vida ser&me&á preciosa enquanto "or necessária - sua

"elicidade, e considerá&la&ei sempre venturosa. )e algum dia elepensar doutro modo.... não terá da minha parte nem quei#as nemcensuras. 4á ousei imaginar esse momento "atal, e a minha decisãoestá tomada.

 4á vedes quão pouco me pode a"etar o temor, que pareceister, de que um dia o senhor de ?almont me desgrace, porque, antesde o querer, terá cessado de amar&me( e que me importarão as vãscensuras que não ouvirei> )* ele será o meu 'uiz.

9omo terei vivido s* para ele, será ele o detentor da minhamem*ria( e se se vir obrigado a reconhecer que o amava, sentir&me&ei su"icientemente 'usti"icada.

cabais, senhora, de ler o meu coração. 5re"eri a desgraça deperder a vossa estima, pela minha "ranqueza, - de me tornar indignadela pelo aviltamento da mentira. 5ensei que devia esta inteiracon"iança -s vossas antigas bondades para comigo. )e acrescentasseuma palavra poder&vos&ia levar a suspeitar que tenho o orgulho decontar ainda com ela, quando pelo contrário me "aço 'ustiça dei#andode pretend!&la.

)ou com respeito, senhora, a vossa muito humilde eobediente serva.

5aris, C de ovembro de CD .

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CARTA CXXIX

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

iga&me pois, minha bela amiga, donde vem esse tom deazedume e de sarcasmo que predomina na sua última carta>0ue crime cometi eu, aparentemente sem dar por isso, e que

tanto a irrita> cusa&me de me ter dado ares de contar com o seuconsentimento antes de o ter obtido, mas 'ulguei que o que para osoutros poderia parecer presunção, seria sinal da con"iança quedeposito em si( e desde quando este sentimento pre'udica a amizadeou o amor> ;nindo a esperança ao dese'o, cedi apenas ao impulsonatural que nos leva a colocar&nos sempre o mais perto poss$vel da"elicidade que buscamos( e tomou como e"eito do orgulho o que eraapenas o re"le#o da minha ansiedade.

<em sei que é costume, nestes casos, aparentar uma dúvidarespeitosa, mas sabe per"eitamente que é apenas uma "*rmula, umsimples protocolo( e achei&me autorizado a supor que essasprecauç+es minuciosas não eram necessárias entre n*s.

5arece&me até que esta atitude "ranca e livre, quando "undadasobre uma antiga ligação, é pre"er$vel -s ins$pidas meiguices, que tão"requentemente tornam o amor desen#abido. e resto, o valor queve'o nesta atitude talvez resulte apenas daquele que atribuo -"elicidade que ela me lembra, mas por isso mesmo, ser&me&ia penosov!&la discordar de mim.

Eis o único erro que suponho ter cometido: porque nãoimagino que pudesse ter pensado seriamente que e#istisse umamulher no mundo que me parecesse pre"er$vel a si( e, ainda menos,que tenha podido apreciá&la tão mal como "inge crer.

iz&me a este respeito que olhou para si pr*pria e que não seencontrou decadente a esse ponto. isso estou certo, e provaapenas que o seu espelho é "iel. 7as não poderia ter conclu$do, commais "acilidade e 'ustiça, que eu não iria pensar isso de si >

5rocuro em vão a causa de tão estranha idéia. 5arece&me noentanto que ela resulta, mais ou menos, dos elogios que "iz a outrasmulheres. eduzo&o pelo menos da sua a"etação em salientar os

ep$tetos de adorável, celeste, atraente, de que me servi ao "alar&lheem 7adame de 3ourvel e na pequena ?olanges.7as não sabe que estas palavras, mais escolhidas ao acaso

que por re"le#ão, e#primem menos a opinião que se tem da pessoa,do que a situação em que nos encontramos quando dela "alamos>

E se, no pr*prio momento em que me sentia tão vivamentea"etado, quer por uma quer por outra, eu não a dese'ava menos( selhe dava a pre"er!ncia sobre ambas, visto que en"im não poderiarenovar a nossa ligação senão em pre'u$zo das outras duas, não ve'oque isso "osse motivo de grande censura.

ão me será mais di"$cil 'usti"icar&me do encanto

desconhecido, com que parece ter "icado também um poucochocada, porque, antes do mais, nem sempre as sensaç+es

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desconhecidas são as mais "ortes. 2h, quem poderia levar a melhorsobre os deliciosos prazeres que s* a minha amiga sabe tornarsempre novos, e cada vez mais vivos> 0uis portanto apenas dizerque aquele encanto era dum g!nero que ainda não tinhae#perimentado( mas sem pretender atribuir&lhe qualquer

classi"icação( e acrescentei, o que ho'e repito, que o sabereicombater e vencer.E nisto aplicarei todo o meu zelo, se vir nesse ligeiro trabalho

uma homenagem a o"erecer&lhe.0uanto - pequena 9ec$lia creio inútil "alar dela. oi a seu

pedido que me encarreguei dessa criança, e s* espero a sua ordemde partida para me p%r ao largo. otei a ingenuidade e a "rescuradela( achei&a atraente por momentos porque nos comprazemossempre na nossa obra, mas não possui consist!ncia su"iciente paraprender as atenç+es.

gora, minha bela amiga, apelo para o seu senso de 'ustiça,

para as suas primeiras bondades para comigo( para a longa eper"eita amizade, para a inteira con"iança que depois estreitaramainda mais os laços que nos uniam, mereci porventura o tomrigoroso que tomou para comigo> 7as como lhe será "ácilcompensar&me quando quiser= ;ma palavra sua apenas, e verá see#istem encantos e a"eiç+es que me retenham um s* minuto.

?oaria para os seus braços, e provar&lhe&ia, mil vezes e de milmaneiras, que é, que será sempre, a verdadeira soberana do meucoração.

deus, bela amiga( espero a sua resposta com toda a

ansiedade.5aris, B de ovembro de CD .

CARTA CXXX

MADAME DE ROSEMONDE À PRESIDENTE DE TOURVEL

5or que motivo, minha querida, 'á não quereis ser minha "ilha>

5or que é que pareceis comunicar&me que vai acabar acorrespond!ncia entre n*s> J para me castigar de não ter adivinhadoo que era tão pouco veross$mil> 2u descon"iais que vos a"ligivoluntariamente> ão, conheço demasiado o vosso coração para crerque assim possa 'ulgar o meu. esta "orma o desgosto em que memergulhou a vossa carta é muito menos por minha causa do que porv*s=

N minha 'ovem amiga= igo&vos com tristeza( mas soisdemasiado digna de ser amada, para que alguma vez o amor vostorne "eliz.

h= 0ual "oi a mulher verdadeiramente delicada e sens$vel

que não encontrou o in"ortúnio nesse mesmo sentimento que lhe

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parecia anunciar tanta "elicidade= )aberão os homens apreciar amulher que possuem>

lguns haverá honestos no procedimento e constantes naa"eição, mas, mesmo entre esses, quão poucos se sabem elevar -altura do nosso coração= ão penseis, minha querida "ilha, que o

amor deles se'a igual ao nosso. E#perimentam a mesma loucura(muitas vezes entregam&se&lhe com mais arrebatamento( masdesconhecem este zelo inquieto, esta delicada solicitude, que nosobriga a cuidados ternos e cont$nuos, cu'o único "im é sempre oob'eto amado. 2 homem goza com a "elicidade que sente, e a mulhercom a que proporciona. Esta di"erença, tão importante e tão pouconotada, in"lui no entanto, de modo bem palpável, na totalidade dasrespectivas condutas. 2 prazer de um consiste em satis"azer os seusdese'os, o da outra, principalmente, em os "azer nascer. gradar épara ele um meio de chegar ao triun"o( enquanto para ela é o pr*priotriun"o. E a coqueteria, tantas vezes censurada -s mulheres,

representa apenas o e#agero desta "orma de sentir e prova a suaverdade. En"im, o gosto e#clusivo, que caracteriza particularmente oamor, é no homem apenas uma pre"er!ncia, que serve, quandomuito, para graduar um prazer, que um outro ob'eto en"raqueceriatalvez mas não destruiria( enquanto nas mulheres é um sentimentopro"undo, que não s* destr*i todo o dese'o estranho, mas que, mais"orte do que a natureza, e independente até do dom$nio dela, s* asdei#a e#perimentar repugn8ncia e desgosto, onde pareceria devernascer a voluptuosidade.

E não deveis pensar que as e#ceç+es, mais ou menos

numerosas, que se'a poss$vel citar, se oponham com !#ito a estasverdades comuns= Estão até con"irmadas pelo consenso geral, quedistinguiu, apenas para os homens, a in"idelidade da inconst8ncia,distinção de que se orgulham, em vez de por ela se sentiremhumilhados( e que, no nosso se#o, s* "oi adotado por essas mulheresdepravadas que "azem a vergonha dele, e para quem todos osprocessos são bons, a "im de se salvarem da penosa sensação da suabai#eza. 4ulguei, minha querida "ilha, que podia ser&vos útil ter estasre"le#+es a opor -s idéias quiméricas duma "elicidade per"eita, comque o amor ilude sempre a nossa imaginação( esperançaenganadora, a que nos conservamos presas, mesmo quando nos

vemos "orçadas a abandoná&la, e cu'a perda agrava e multiplica osdesgostos 'á demasiado reais duma viva pai#ão= Este papel de vossuavizar as dores, de lhes diminuir o número, é o único que quero,que posso desempenhar neste momento. os males sem remédio, osconselhos s* podem incidir sobre o regime a seguir. 5eço&vossomente que vos lembreis que lamentar um doente não é censurá&lo.2h, quem somos n*s para nos censurarmos uns aos outros>ei#emos o direito de 'ulgar Hquele que l! nos coraç+es( e tenho aousadia de acreditar que, aos seus olhos paternais, uma multidão devirtudes pode resgatar uma "raqueza.

7as, suplico&vos, minha querida amiga, evitai sobretudo essas

resoluç+es violentas, que não mostram "orça mas antes umdes8nimo completo, não esqueçais que, tornando um outro possuidor

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da vossa e#ist!ncia, para me servir da vossa e#pressão, nãopudestes contudo privar os vossos amigos do que 'á antes possu$am,e que nunca cessarão de reclamar.

deus, minha querida "ilha, lembrai&vos -s vezes da vossaterna mãe, e crede que sereis sempre, e acima de tudo, o ob'eto dos

seus mais queridos pensamentos.

9astelo de..., I de ovembro de CD .

CARTA CXXXI

A MARQUESA DE MERTEUIL AO VISCONDE DE VALMONT

té que en"im, ?isconde( desta vez estou mais contente

consigo do que da outra( e agora, "alemos amigavelmente, esperoconvenc!&lo de que, tanto para si como para mim, o acordo queparece dese'ar seria uma verdadeira loucura.

unca reparou que o prazer, que é com e"eito o único "im dereunião dos dois se#os, não basta no entanto para os unir> E que, seé precedido do dese'o que apro#ima, é também seguido doalheamento que a"asta> ;ma lei da natureza, que s* o amor podetrans"ormar( e o amor( é poss$vel senti&lo quando se quer>

o entanto é sempre necessário( e seria na verdadeembaraçoso, se se não tivesse notado que "elizmente bastava que

e#istisse dum lado. di"iculdade tornou&se de metade do tamanho, enem sequer há muito a perder( com e"eito um goza a "elicidade deamar, o outro a de agradar, um pouco menos viva na verdade, mas aque se 'unta o prazer de trair, o que provoca o equil$brio( en"im, tudose arran'a.

7as, diga&me, ?isconde, qual de n*s dois se encarregará detrair o outro> 9onhece a hist*ria dos dois batoteiros, que sereconheceram durante o 'ogo, nada conseguiremos, disserampaguemos as despesas a meias( e abandonaram a partida. )igamos,creia&me, este e#emplo prudente, e não percamos 'untos um tempoque podemos empregar tão bem algures.

5ara lhe provar que penso tanto no seu interesse como nomeu, e que não procedo assim nem por irritação nem por capricho,não lhe recuso o prémio combinado entre n*s, de resto bem ve'o queuma única noite nos bastará( e tenho a certeza de que saberemostão bem embelezá&la, que a veremos "indar com pena. 7as nãoesqueçamos que essa mágoa é necessária - "elicidade( e por maisdoce que se'a a nossa ilusão, não vamos acreditar que possa serdurável.

9omo v!, resigno&me, e isto sem que o ?isconde tenha aindacumprido a obrigação que tinha para comigo, porque en"im, deviater&me dado a primeira carta da celeste pudibunda( e no entanto, ou

porque ela representa algo para si, ou porque esqueceu as condiç+esdo contrato, que talvez o interesse menos do que me pretende "azer

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crer, não recebi nada, absolutamente nada. o entanto, ou meengano muito, ou a terna devota deve escrever bastante, pois emque se há de ocupar quando está s*>

9ertamente que não tem 8nimo para se distrair. 9omo v!,teria se quisesse algumas censuras a "azer&lhe( mas dei#o&as em

sil!ncio, para compensar um pouco da irritação que pus talvez naminha última carta.E agora, ?isconde, s* me resta "azer&lhe um pedido( e é tanto

por si como por mim: é o de adiar o momento que também dese'omuito, mas que me parece dever ser retardado até ao meu regresso- cidade. 5or um lado, aqui não ter$amos a necessária liberdade( e,por outro, eu correria um risco: porque bastaria um pouco de ciúmepara prender sem remédio este triste <elleroche, que no entantoagora parece estar por um "io. ?e'o bem que ele 'á se es"orça paracontinuar a amar&me( e eu ponho por vezes tanta mal$cia comoprud!ncia nas car$cias com que o sobrecarrego.

o mesmo tempo, bem v! que não seria um sacri"$cio dignode si= ;ma in"idelidade rec$proca dará um encanto bem mais picante.

)abe que -s vezes lamento que este'amos reduzidos a estesrecursos>

o tempo em que nos amávamos, porque creio que era amor,eu era "eliz( e o ?isconde> 7as porque ocupar&me ainda duma"elicidade que não volta> ão, por mais que diga, o regresso éimposs$vel. Em primeiro lugar, e#igirei sacri"$cios que não poderia ounão quereria "azer&me, e que eu talvez não mereça( e depois, comoprend!&lo> 2h, não, não, nem quero pensar nisso( e apesar do prazer

que acho em escrever&lhe, pre"iro dei#á&lo bruscamente.deus, ?isconde.

9astelo de..., X de ovembro de CD .

CARTA CXXXII

A PRESIDENTE DE TOURVEL A MADAME DE ROSEMONDE

9omovida pelas vossas bondades para comigo, senhora, teriarepousado inteiramente nelas se me não retivesse de algum modo oreceio de as pro"anar, aceitando&as. 5or que motivo é que sou"orçada a considerá&las tão preciosas, no pr*prio momento em que 'ánão me sinto digna delas> h, mas ousarei pelo menos testemunhar&vos o meu reconhecimento( admirarei, sobretudo, essa indulg!nciada virtude, que s* conhece as nossas "raquezas para se apiedar, ecu'o poderoso encanto e#erce sobre os coraç+es uma in"lu!ncia tãodoce e tão "orte, mesmo comparada com o encanto do amor.

7as essa amizade, merec!&la&ei ainda quando 'á não bastapara a minha "elicidade> 5osso dizer o mesmo dos vossos conselhos(

aprecio&lhes o valor e não os posso seguir. E como não acreditarnuma "elicidade per"eita, quando a e#perimento neste momento>

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)im, se os homens são tal como dizeis, é necessário "ugir&lhes, sãoodiosos( mas como ?almont está longe de se lhes assemelhar= )etem como eles essa viol!ncia da pai#ão, a que chamaisarrebatamento, é nele ultrapassada pelo e#cesso da sua delicadeza=2h, minha amiga, "alais&me de partilhar as minhas penas, regozi'ai&

vos então com a minha "elicidade( é ao amor que a devo, e o ob'etodele aumenta&lhe o valor. mais o vosso sobrinho, dizeis, talvez por"raqueza. h, se o conhec!sseis como eu= mo&o idolatradamente, emuito menos do que ele merece. ei#ou&se sem dúvida arrastar paraalguns erros, ele pr*prio concorda( mas quem conheceu como ele overdadeiro amor> 0ue mais posso dizer> )ente&o com a mesma "orçacom que o inspira.

Frei 'ulgar que esta é uma das idéias quiméricas com que oamor ilude sempre a nossa imaginação, mas nesse caso, por que seteria tornado mais terno, mais sol$cito, agora que nada mais tem aobter> 9on"esso que antes lhe notava um ar de re"le#ão de reserva,

que raramente abandonava, é que muitas vezes me recordava,mesmo sem querer, as "alsas e cruéis impress+es que me haviamdado acerca dele. 7as desde que se pode entregar semconstrangimento aos movimentos do seu coração, parece adivinhartodos os dese'os do meu. 0uem sabe se não nascemos um para ooutro> )e me não estava reservada a "elicidade de lhe sernecessária> h, se é uma ilusão, que eu morra antes que ela acabe.7as não( quero viver para o amar, para o adorar. 5or que dei#aria deamar&me> 0ue outra mulher o poderia tornar mais "eliz do que eu> E,sinto&o por mim, a "elicidade que damos é a mais "orte cadeia, a

única que prende verdadeiramente. )im, é este sentimento deliciosoque enobrece o amor, que o puri"ica e o torna digno de uma almaterna e generosa, como a de ?almont.

deus, minha querida, respeitável e indulgente amiga.0uereria demorar mais tempo a escrever&vos( mas chegou a hora emque ele me prometeu vir, e qualquer outra idéia me abandona.

5erdão= 7as sei que dese'ais a minha "elicidade( e é tãogrande neste momento que me abandono totalmente a ela.

5aris, D de ovembro de CD .

CARTA CXXXIII

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

0uais são pois, minha bela amiga, esses sacri"$cios que me 'ulga incapaz de "azer, e cu'o prémio seria a"inal agradar&lhe>

h= !&mos somente a conhecer, e, se hesitar em lhoso"erecer permito&lhe que recuse as minhas homenagens. 0ue 'ulgade mim desde há algum tempo, se, mesmo quando é indulgente,

ainda continua a duvidar dos meus sentimentos ou da minhaenergia> )acri"$cios que eu não poderia ou não queria "azer= )up+e&

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me então apai#onado, dominado> E o valor que dei ao triun"o,suspeita que o atribuo - pessoa> h, graças ao 9éu, não estou aindareduzido a isso, e guardo&me para lho provar. )im, prová&lo&ei,mesmo que se'a com 7adame de 3ourvel. )eguramente, depoisdisso, não lhe "icarão dúvidas.

oi&me poss$vel, 'ulgo que sem me comprometer, concederalgum tempo a uma mulher, que tem pelo menos o mérito de serdum g!nero que raramente se encontra. 3alvez também a estaçãomorta em que veio esta aventura me tenha levado a entregar&mecom mais entusiasmo( e agora que o grande movimento malrecomeça, não é de admirar que ela me ocupe ainda quaseinteiramente. 5ense no entanto que ainda não há oito dias que gozoo "ruto de tr!s meses de trabalhos. 3antas vezes me demorei maistempo com o que valia muito menos e não me custara tanto= Enunca a minha amiga me 'ulgou mal por isso.

7ais ainda, quer saber a verdadeira causa da solicitude que

emprego> Ei&la. Esta mulher é naturalmente t$mida( durante osprimeiros dias duvidava sem cessar da sua "elicidade, e essa dúvidabastava para a perturbar, de "orma que s* agora começo a poderobservar até onde vai o meu poder nesse campo. Eis uma coisa queardia em curiosidade por saber( e a oportunidade não é tão "ácil deencontrar como se 'ulga.

Em primeiro lugar, para muitas mulheres, o prazer é apenas oprazer e nada mais do que isso( e para essas, se'a qual "or o t$tuloque nos concedam, somos simples criados, puros moços de recados,cu'o mérito reside apenas na atividade, e entre os quais o que mais

"az é sempre o que "az melhor.uma outra classe, talvez ho'e a mais numerosa, acelebridade do amante, o prazer de o ter arrebatado a uma rival, oreceio de que por sua vez lhe se'a roubado, ocupa quaseinteiramente as mulheres, n*s contribu$mos, claro, mais ou menospara esta "elicidade de que gozam( mas ela depende mais dascircunst8ncias do que da pessoa. ?em&lhes por n*s, mas não de n*s.

5recisava por isso de encontrar, para as minhas observaç+es,uma mulher delicada e sens$vel, que se dedicasse unicamente aoamor, e que, no pr*prio amor, visse s* o amante( cu'a emoção, nãoseguindo o caminho habitual, partisse sempre do coração para os

sentidos( 'á a vi, por e#emplo Le não "alo do primeiro dia1, sair doprazer toda chorosa, e um instante depois reencontrar avoluptuosidade numa palavra que respondia - sua alma.

En"im, era necessário ainda acrescentar essa natural candura,tornada invenc$vel de tanto se lhe entregar, e que lhe não permiteesconder nenhum dos sentimentos do coração.

2ra, concordará que tais mulheres são raras( e 'ulgo mesmoque, sem esta, nunca me teria sido dado encontrar nenhuma.

ão será pois de estranhar se ela me prender mais tempo doque qualquer outra( e se a observação que quero "azer sobre elae#ige que a torne "eliz, inteiramente "eliz, por que me recusaria eu a

tal, tanto mais que isso serve os meus planos, em vez de oscontrariar> 7as por que o esp$rito se encontra ocupado, segue&se&lhe

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que o coração se'a escravo> ão, sem dúvida. 7as o valor que nãodei#o de atribuir a esta aventura não me impedirá de me entregar aoutras, ou mesmo de a sacri"icar a algumas mais agradáveis.

)into&me de tal modo livre que nem sequer descurei apequena ?olanges, a quem a"inal dou tão pouca import8ncia. mãe

trá&la para a cidade dentro de tr!s dias( e desde ontem que arran'eimaneira de assegurar as minhas comunicaç+es: uma grati"icação aoporteiro, e umas bugigangas - mulher, resolveram o assunto. Eimaginar que ancenP não soube encontrar um processo tãosimples= E ainda dizem que o amor nos torna inventivos= 5elocontrário, embrutece aqueles que domina. E pensa que me nãosaberei de"ender> h= Este'a tranqSila. ?ou 'á, dentro de poucos dias,en"raquecer, partilhando&a, a impressão talvez demasiado viva quee#perimentei( e se uma s* partilha não bastar, multiplicá&las&ei.

7as estarei pronto a entregar a 'ovem colegial ao seu discretoamante, logo que a minha amiga o 'ulgue oportuno. 5arece&me que

 'á não tem raz+es para o impedir( e eu consinto em prestar esseinsigne serviço ao pobre ancenP. J, na verdade, o m$nimo que lhedevo por todos os que me prestou. Está agora numa grandeinquietação por saber se será recebido em casa de 7adame de?olanges. ?ou&o acalmando o melhor que posso, assegurando&lheque, dum ou doutro modo, o tornarei "eliz na primeira oportunidade,e enquanto espero, continuo a ocupar&me da correspond!ncia, queele quer recomeçar logo ap*s a chegada da sua 9ec$lia. 4á tenho seiscartas dele, e ainda receberei mais uma ou duas antes desse dia"eliz. J preciso que o rapaz este'a muito desocupado=

7as dei#emos esse par in"antil, voltemos a n*s( que eu possaocupar&me unicamente da tão doce esperança que me deu a suacarta. )im, prender&me&á, sem dúvida( nem lhe perdoaria seduvidasse. lguma vez dei#ei de lhe ser constante> 2s nossos laços"oram des"eitos, mas não quebrados( a nossa pretensa ruptura "oium erro da nossa imaginação, os nossos sentimentos e interessesmantiveram&se unidos. 3al como o via'ante que regressadesenganado, reconhecerei que dei#ara a "elicidade para perseguir aesperança( e direi como dKAancourt: &5lus 'e vis dKétrangers, plus

 'Kamai ma patrie.ão "u'a mais - idéia, ou antes, ao sentimento que a reconduz

até mim( e depois de termos provado todos os prazeres nas nossasdiversas incurs+es, regozi'emo&nos com a "elicidade de sentir quenenhum deles é comparável ao que e#perimentáramos e quereencontraremos mais delicioso ainda.

deus, encantadora amiga. cedo em esperar pelo seuregresso, mas apresse&o e não esqueça que o dese'o muito.

9astelo de..., CC de ovembro de CD .

*=uanto mais vi o estrangeiro, mais amei a minha pátria

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CARTA CXXXIV

A MARQUESA DE MERTEU"L AO VISCONDE DE VALMONT

a verdade o ?isconde é como as crianças, diante de quemnão se pode dizer nada e a quem não se pode mostrar nada, que nãodese'em imediatamente= <astou passar&me uma simples idéia pelacabeça, - qual, aliás, o preveni de que não queria prestar atenção, e"oi o bastante para que tentasse prender&me a ela, quando eu aprocurava esquecer, querendo, por assim dizer, obrigar&me acompartilhar os seus estouvados dese'os= cha generoso da suaparte dei#ar&me carregar sozinha o "ardo da prud!ncia> 3orno adizer&lho, e repito&o a mim pr*pria mais "requentemente ainda, oacordo que me prop+e é realmente imposs$vel. inda que o ?isconde

pusesse no assunto toda a generosidade que me mostra nestemomento, não acredita que eu tenha também as minhassuscetibilidades, e não queira aceitar sacri"$cios que pre'udiquem asua "elicidade>

2ra, não será verdade, ?isconde, que se ilude quanto aosentimento que o prendeu a 7adame de 3ourvel> J amor, ou essesentimento nunca e#istiu: nega&o de cem maneiras mas prova&o demil. 2 que é, por e#emplo, esse subter"úgio de que se serve paraconsigo mesmo, porque acredito que se'a sincero comigo, e que oleva a atribuir ao prazer de observar, o dese'o, que não pode

esconder nem combater, de conservar essa mulher>ão parecerá que nunca "ez nenhuma outra "elizper"eitamente "eliz>

h= )e duvida, tem a mem*ria bem curta= 7as não, não setrata de nada disto. 7uito simplesmente o coração ilude&lhe oesp$rito, e obriga&o a recorrer a "racas 'usti"icaç+es( mas eu, que nãotenho nenhum interesse em enganar&me a mim pr*pria, não sou tão"ácil de contentar.

J o caso que, notando embora a delicadeza que o levou asuprimir cuidadosamente todas as palavras que imaginou pudessemter&me desagradado, vi no entanto que, talvez sem dar por isso,

conservava as mesmas idéias. 9om e"eito, 'á não se trata daadorável, da celeste 7adame de 3ourvel, mas é ainda uma mulherespantosa, uma mulher delicada e sens$vel, e isto, com e#clusão detodas as outras( uma mulher rara, en"im, e como não se encontraoutra igual. 2 mesmo se passa com o tal encanto desconhecido, quenão é o mais "orte. 5ois bem, se'a: mas visto que até aqui nunca otinha encontrado, é bem de crer que não o volte a encontrar no"uturo, e que a sua perda se'a irreparável.

2ra, ou isto são sintomas in"al$veis de amor, ou então temosde renunciar a encontrá&lo em parte alguma.

 3enha a certeza que desta vez lhe "alo sem mau humor.

5rometi a mim mesma nunca mais me dei#ar assaltar por ele(reconheci que se podia tornar uma armadilha perigosa. 9reia&me,

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se'amos amigos, e "iquemos por a$. gradeça&me a coragem quemostrei em de"ender&me: sim, coragem( porque -s vezes é bemprecisa, até para não se tomar uma decisão que se sabe errada.

J pois apenas para o p%r de acordo comigo por persuasão quevou responder - sua pergunta sobre os sacri"$cios que eu e#igiria e

que o ?isconde não poderia "azer. )irvo&me de prop*sito da palavrae#igir, porque tenho a certeza de que, dentro em breve, irá achar&me, com e"eito, demasiado e#igente: mas tanto melhor= Em vez deme zangar com as suas recusas, agradecer&lhas&ei.

2lhe, não é consigo que quero dissimular, embora o devessetalvez "azer.

E#igirei pois, ve'a a crueldade=, que essa rara, essa espantosa7adame de 3ourvel não se'a para si mais do que uma mulher vulgar,uma mulher como ela é, a"inal, porque, não nos dei#emos enganar,esse encanto, que supomos achar nos outros, é em n*s que e#iste( éapenas o amor a embelezar o ob'eto amado.

7esmo que este sacri"$cio lhe se'a imposs$vel, tem no entantoque mo prometer, 'urar até( mas, aviso, não acreditarei em "alsaspromessas. )* me dei#arei convencer pelo con'unto do seuprocedimento.

7as ainda não é tudo( sou muito caprichosa= 2 sacri"$cio dapequena 9ec$lia, que me o"erece com tão boa vontade, não meinteressa. 5edir&lhe&ei, pelo contrário, que continue esse penososerviço, até nova ordem da minha parte( talvez porque goste deabusar do meu poder ou talvez porque, mais indulgente ou mais

 'usta, me baste dispor dos seus sentimentos, sem querer pre'udicar

os seus prazeres. e qualquer "orma, quero ser obedecida( e asminhas ordens serão rigorosas=9onsiderar&me&ia então obrigada a agradecer&lhe( quem sabe>

 3alvez até a recompensá&lo. 5or e#emplo, abreviaria uma aus!nciaque se me tornaria insuportável. Encontrar&nos&$amos "inalmente,?isconde, encontrar&nos&$amos... de que maneira>...

7as lembre&se de que isto é apenas uma conversa, o simplesrelato dum pro'eto imposs$vel, e não quero ser a única a esquec!&lo...

)abe que o meu processo me inquieta um pouco> 0uis"inalmente conhecer ao certo quais eram as minhas armas( osadvogados citam&me as leis, e sobretudo autoridades, como eles lhes

chamam: mas 'á não me acho tão "orte como supunha. 0uaselamento não ter aceitado o acordo. o entanto tranquilizo&me,pensando que o procurador é hábil, o advogado eloqSente e ademandista bonita. )e estes tr!s argumentos não bastassem, seriapreciso alterar toda a seqS!ncia do assunto, e que viria a acontecerao respeito pelos antigos costumes>

2 processo é atualmente a única coisa que me retém aqui.<elleroche, acabou&se: desistiu( trabalho compensado. 9hegou

ao ponto de se lamentar por não ter ido ao baile desta noitequei#ume desocupado= Gestitu$&lo&ei - liberdade quando regressar a5aris. o "azer este doloroso sacri"$cio, consolo&me com a

generosidade que ele me atribui.

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deus, ?isconde, escreva muitas vezes, os pormenores dosseus prazeres compensam&me em parte dos aborrecimentos queen"rento.

9astelo de...CC de ovembro de CD .

CARTA CXXXV

A PRES"DENTE DE TOURVEL A MADAME DE ROSEMONDE

 3ento escrever&vos, sem saber ainda se serei capaz. h= 7eueus 0uando penso que na minha última carta era o e#cesso de"elicidade que me impedia de a continuar= J o de desespero que mepesa agora( s* me dei#a "orça para sentir as dores, e rouba&ma

quando tento e#primi&las.?almont... ?almont 'á me não ama, o seu amor nunca e#istiu.2 amor não desaparece assim. Ele engana&me, trai&me,

ultra'a&me.)uporto todos os in"ortúnios e humilhaç+es que é poss$vel

reunir, e é dele que me v!m=E não 'ulgueis que é uma simples suspeita: estava bem longe

de as sentir. em tenho a sorte de poder duvidar. ?i&o: que mepoderá dizer para se 'usti"icar>... 7as que lhe importa= em sequertentará... Fn"eliz= 0ue lhe interessarão as tuas censuras e lágrimas>

ão é de ti que ele se ocupa=...J pois verdade que me sacri"icou, me abandonou mesmo...E por quem> 5or uma vil criatura... 7as que digo> h= 4á nem

tenho o direito de a desprezar. Ela traiu menos deveres, é menosculpada do que eu.

2h= 9omo é doloroso o desgosto, quando é "ruto do remorso=)into que os meus tormentos redobram.

deus minha querida amiga( por muito indigna de piedadeque me tenha tornado, senti&la&$eis certamente por mim, sepudésseis "azer uma idéia do que so"ro.

cabo de reler a carta e apercebi&me de que em nada vos

pode elucidar( vou pois tentar a coragem de vos contar este cruelacontecimento.oi ontem( eu devia, pela primeira vez desde o meu regresso,

cear "ora da minha casa. ?almont veio ver&me -s cinco horas( nuncame parecera tão terno. eu&me a entender que o meu pro'eto de sairo contrariava, e, como imaginais, tive logo a idéia de "icar em casa.o entanto, duas horas depois, e de repente, o seu ar e tommudaram sensivelmente.

ão sei se me escapou qualquer coisa que lhe tenhadesagradado( pelo quer que "osse, pouco tempo depois, a"irmoulembrar&se de uma ocupação que o obrigava a dei#ar&me, e "oi&se

embora, mas não o "ez sem mani"estar uma muito viva pena, que mepareceu carinhosa, e que então 'ulguei sincera.

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Entregue a mim pr*pria, achei mais conveniente não "altaraos meus primeiros compromissos, visto que estava livre agora.

cabei por me arran'ar e parti na carruagem. Fn"elizmente ococheiro "ez&me passar diante da Npera, e vi&me envolvida notumulto da sa$da( uns quatro passos - minha "rente, e na "ila ao lado

da minha, vi a carruagem de ?almont. 2 coração bateu&me logo commais "orça, mas não de temor( e a única idéia que me ocupava era odese'o de que a minha carruagem avançasse.

Em vez disso, "oi a dele que "oi obrigada a recuar, e que "icouao lado da minha. ebrucei&me imediatamente: qual não "oi o meuespanto quando vi a seu lado uma prostituta, bem conhecida comotal= "astei&me, como podereis supor, e era 'á bastante para mea"ligir o coração( mas o que vos deve custar a acreditar, é que essarapariga, aparentemente instru$da por alguma odiosa con"id!ncia,não dei#ara a portinhola, nem cessara de me olhar, com gargalhadascapazes de provocarem uma cena.

o acamrunhamento em que me encontrava, dei#ei&me noentanto conduzir - casa onde devia cear( mas "oi&me imposs$vel "icar(sentia&me a cada instante prestes a desmaiar, e sobretudo custava&me reter as lágrimas.

ssim que regressei escrevi ao senhor ?almont e enviei&lhelogo a carta( não estava em casa. 0uerendo, por qualquer preço, sairdo estado de morte em que me achava, ou con"irmá&lo para sempre,reenviei&a com ordem de o esperar( mas antes da meia&noite o meucriado voltou, com a not$cia de que o cocheiro, que recolhera, lhedissera que o patrão não voltaria nessa noite. Esta manhã 'ulguei

nada mais ter a "azer do que tornar a pedir as minhas cartas, e dizer&lhe que não voltasse a minha casa. ei ordens nesse sentido( maseram, certamente, inúteis.

5assa do meio&dia( ainda não apareceu, nem recebi qualquerrecado da parte dele.

gora, querida amiga, nada mais tenho a acrescentar: eis&vosinstru$da e conheceis o meu coração. minha única esperança é deque não tenha muito tempo para a"ligir a vossa delicada amizade.

5aris, CO de ovembro de CD .

CARTA CXXXVI

A PRESIDENTE DE TOURVEL AO VISCONDE DE VALMONT

9om certeza, senhor, que, depois do que ontem se passou,não esperais voltar a ser recebido em minha casa, e com certeza quenem sequer o dese'ais= Este bilhete é pois menos para vos pedir quenão volteis, do que para vos solicitar essas cartas que nuncadeveriam ter e#istido( e que, se puderam interessar&vos um

momento, como provas da cegueira que t$nheis procurado "azer

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nascer, s* poderão ser&vos indi"erentes agora que ela se dissipou,visto que e#primem um sentimento que destru$stes.

Geconheço e con"esso que errei ao depositar em v*s umacon"iança de que tantas outras antes de mim tinham sido v$timas(nisto s* tenho de me acusar a mim pr*pria: mas 'ulgava que pelo

menos não merecia ser abandonada por v*s ao desprezo e aoinsulto. 4ulgava que, tendo&vos sacri"icado tudo, e renunciando porv*s aos direitos, - estima dos outros e - minha pr*pria, podiaesperar todavia não ser 'ulgada por v*s mais severamente que pelopúblico, cu'a opinião separa ainda, por um imenso intervalo, amulher "raca da depravada. Estes erros, que são os de toda a gente,são os únicos de que vos "alo. 9alo os quei#umes de amor( o vossocoração não compreenderia o meu.

deus, senhor.

5aris, CO de ovembro de CD .

CARTA CXXXVII

O VISCONDE DE VALMONT A PRESIDENTE DE TOURVEL

cabam agora, senhora, de me entregar a vossa carta( tremiao l!&la, e mal me dei#ou "orças para lhe responder. 0ue idéiahorr$vel "az de mim= h, sem dúvida tenho de"eitos( e tais que nunca

mos perdoarei em toda a vida, mesmo que os cubr$sseis com a vossaindulg!ncia. 7as os de que me acusais estiveram sempre bem longeda minha alma= 2 qu!, eu= humilhar&vos= viltar&vos= quando vosrespeito tanto como vos amo( quando s* conheci o orgulho, nomomento em que me 'ulgastes digno de v*s. s apar!ncias iludiram&vos( e con"esso que eram contra mim, mas não t$nheis no coração oque bastava para as combater>

E ele não se revoltou s* com a idéia de que poderia ter raz+espara quei#ar&se do meu> 9ontudo acreditastes= ssim, não s* me

 'ulgastes capaz desse del$rio atroz, mas haveis até receado serv$tima dele em virtude das vossas bondades para comigo.

h, se vos 'ulgais degradada a esse ponto pelo vosso amor, éporque eu pr*prio sou aos vossos olhos bem vil=2primido pelo sentimento doloroso que esta idéia me causa,

perco a a"astá&la o tempo que devia empregar a destru$&la.9on"essarei tudo( ainda uma outra consideração me retém. J

então preciso recordar "atos que queria aniquilar, e "i#ar a vossaatenção e a minha sobre um momento de erro que quereria resgatarcom o resto da minha vida, de que procuro ainda a causa, e cu'alembrança deve "azer para sempre a minha humilhação e o meudesespero> h, se acusando&me e#cito a vossa c*lera, não tereis aomenos que procurar longe a vingança( bastar&vos&á dei#ar&me

entregue aos meus remorsos.

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E no entanto, quem acreditará> Este acontecimento tevecomo causa primeira o poderoso encanto que sinto 'unto de v*s. oiele que me "ez esquecer por tempo e#cessivo um assuntoimportante, que não podia ser adiado. ei#ei&vos demasiado tarde enão encontrei a pessoa que procurava. Esperava avistá&la na Npera,

mas a minha tentativa "oi também baldada. Encontrei a$ Em$lia, comquem me relacionei num tempo em que estava bem longe de vosconhecer ou de conhecer o amor( não tinha levado carruagem epediu&me que a dei#asse em casa, bem perto dali. ão vi nenhumperigo nisso e acedi. 7as "oi então que vos encontrei( senti logo queser$eis levada a 'ulgar&me culpado.

2 temor de vos desagradar ou de vos a"ligir é tão "orte emmim, que deveria ser e "oi com e"eito logo notado. 9on"esso mesmoque me levou a tentar evitar que a rapariga se mostrasse( estees"orço de delicadeza voltou&se a"inal contra o amor. Aabituada,como todas as da sua espécie, a s* se sentir segura dum prest$gio

sempre usurpado por meio de abusos a que se atrevem, Em$lia nãoquis dei#ar escapar uma ocasião tão retumbante.

0uanto mais via aumentar o meu embaraço, mais "azia por semostrar( e a sua louca alegria, de que coro que tenhais podido 'ulgar&vos ob'eto, tinha apenas por motivo a dor cruel que eu sentia, doressa proveniente ainda do meu respeito e do meu amor.

té aqui sou sem dúvida mais in"eliz do que culpado( e esteserros, que são os de toda a gente, e os únicos de que me "alais, esteserros, não e#istindo, não me podem ser censurados. 7as calais emvão os quei#umes do amor( não poderei guardar sobre eles o mesmo

sil!ncio( um interesse demasiado vivo obriga&me a romp!&lo.ão é que, na con"usão em que "ui lançado por esteinconceb$vel equ$voco, possa, sem uma dor aguda, dedicar&me aevocar lembranças. 9ompenetrado dos meus erros, consentirei emsuportar o castigo, ou esperarei com o tempo o perdão merecidopela minha constante ternura e pelo meu arrependimento.

7as como me poderei calar, quando o que me "alta dizer é tãoimportante para a sensibilidade de todo o vosso ser>

ão penseis que procuro um subter"úgio para desculpar oualiviar a minha "alta( con"esso que sou culpado. 7as não con"esso,nem con"essarei nunca, que este erro humilhante possa ser encarado

como um ultra'e "eito ao amor. 2h, que pode haver de comum entreuma surpresa dos sentidos, entre um momento de esquecimento den*s pr*prios, logo seguido pela vergonha e pelo remorso, e umsentimento puro, que s* pode nascer numa alma delicada, manter&sepela a"eição, e ter como "ruto a "elicidade= h, não pro"aneis assim oamor= Evitai sobretudo pro"anar&vos, reunindo no mesmo ponto devista o que nunca se p%de con"undir. ei#ai as mulheres vis edegradadas recearem uma rivalidade que sentem que contra elas sepode estabelecer, e so"rer os tormentos duma inve'a igualmentecruel e humilhante: mas v*s= "astai os olhos desses ob'etos quemaculariam os vossos olhares( e, pura como a ivindade, puni como

ela a o"ensa sem a sentirdes.

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7as que pena me podereis impor que me se'a mais dolorosado que a que sinto> 0ue possa ser comparada ao remorso de vos terdesagradado, ao desespero de vos ter a"ligido, - idéia insuportávelde me ter tornado menos digno de v*s> 5rocurais castigar&me= E eupeço&vos consolaç+es. ão porque as mereça, mas porque me são

necessárias, e s* me podem vir de v*s.)e de repente, esquecendo o nosso amor dei#ando de darvalor - minha "elicidade, quiserdes pelo contrário arrastar&me parauma dor eterna, tendes esse direito: "eri( mas se, mais indulgente oumais sens$vel, vos lembrais ainda dos sentimentos tão ternos queuniam os nossos coraç+es( dessa voluptuosidade da alma, semprerenascente e de cada vez mais vivamente sentida( desses dias tãodoces, tão "elizes que cada um de n*s deve ao outro( de todos essesbens do amor que s* ele pode dar( pre"erireis talvez "az!&losrenascer a destru$&los. 0ue mais poderei dizer> 5erdi tudo, e porminha culpa, mas tudo posso reaver pela vossa bondade. 9ompete&

vos decidir agora.crescento s* uma palavra. inda ontem me 'uráveis que a

minha "elicidade estava segura enquanto dependesse de v*s= h=senhora, abandonar&me&eis ho'e a um desespero eterno>

5aris, CO de ovembro de CD .

CARTA CXXXVIII

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

Fnsisto, minha bela amiga: não estou apai#onado( e não tenhoculpa se as circunst8ncias me "orçam a representar esse papel. <astaque consinta, e volte( verá com os seus pr*prios olhos como sousincero. 5restei ontem as minhas provas, e estas não podem seranuladas pelo que se passa.

Estava eu ontem em casa da meiga e pudica dama, e nãotinha mais nenhum assunto a tratar, porque a pequena ?olanges,apesar do seu estado prematuro, devia passar toda a noite no baile

de 7adame ?... desocupação "izera&me dese'ar prolongar oencontro( e e#igira até para isso um pequeno sacri"$cio, mas apenasme "ora concedido, e 'á todo o prazer que esperava tinha sidoperturbado pela idéia desse amor que se obstina em atribuir&me( oupelo menos em censurar&me( de "orma que s* sentia o dese'o depoder simultaneamente certi"icar&me e convenc!&la de que era dasua parte pura calúnia.

 3omei então uma decisão violenta( e, alegando um prete#tobastante inconsistente, abandonei a minha bela, algo surpreendida,e sem dúvida bastante a"lita. Eu, porém, "ui tranquilamente ter comEmilia - Npera( e ela poder&lhe&ia contar que, até - manhã de ho'e

em que nos separamos, nenhum remorso perturbou os nossosprazeres.

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o entanto eu teria uma grande causa de inquietação, se aminha per"eita indi"erença me não tivesse salvo: imagine queestando a uns quatro prédios de dist8ncia da Npera, com Em$lia naminha carruagem, veio a da austera devota arrumar&se e#atamenteao lado da minha, e a di"iculdade de circulação dei#ou&no perto dum

quarto de hora ao lado um do outro. ?ia&se tão bem como se "ossemeio&dia e não havia maneira de escapar.7as não "oi tudo( decidi dizer a Em$lia que se tratava da

senhora da carta. L@embra&se talvez dessa loucura e de que Em$liaera a mesa.1 Ela, que o não tinha esquecido, e que é zombeteira, nãodescansou enquanto não e#aminou - vontade esta virtude, como eladizia, e isso com grandes e irritantes gargalhadas.

7as também ainda não "oi tudo( pois a dama ciumenta nãomandou logo uma carta a minha casa nessa mesma noite> Eu nãoestava, mas, na sua obstinação, tornou a mandar com ordem parame esperarem. Eu, como estava decidido a "icar com Em$lia,

mandara embora a carruagem, com ordem ao cocheiro de voltar abuscar&me esta manhã( e quando ao chegar encontrou o mensageirodo amor, achou bem dizer&lhe simplesmente que eu 'á nãoregressava naquela noite. Fmaginará o e"eito desta not$cia( na voltaencontrei&me despedido com toda a dignidade que e#igia acircunst8ncia=

ssim esta aventura, que acha interminável, teria podido,como v!, acabar esta manhã( se não acabou, não "oi, como irá talvezpensar, porque d! muito valor - continuação, mas antes porque, porum lado, não achei decente dei#ar que outrem rompesse( e, por

outro, porque quis reservar&lhe a homenagem desse sacri"$cio.Gespondi pois ao severo bilhete com uma longa ep$stolasentimental. E#pus longas raz+es, e contei com o amor para as "azerpassar por boas. [#ito total. cabo de receber um segundo bilhete,ainda muito severo, que con"irma a eterna ruptura, como é dasregras( mas 'á num tom di"erente. Fnsiste em que não quer voltar aver&me: essa decisão é enunciada quatro vezes repetida da maneiramais irrevogável. 9onclu$ que não tinha um momento a perder paraaparecer. Enviei 'á o meu criado para entreter o porteiro( e dentrodum momento irei eu pr*prio "azer assinar o meu perdão: porque nasquest+es desta espécie, s* há uma "*rmula capaz de obter a

absolvição geral, e essa s* se e#ecuta pessoalmente.deus, minha encantadora amiga( parto para tentar estegrande golpe.

5aris, CO de ovembro de CD .

CARTA CXXXIX

A PRESIDENTE DE TOURVEL A MADAME DE ROSEMONDE

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9omo me acuso, minha sens$vel amiga, por vos ter "aladodemasiado, e demasiado cedo,de males passageiros= )ou a causa deque vos a"li'ais neste momento( esses desgostos que vos v!m demim duram ainda, e eu sou 'á de novo "eliz. )im, tudo estáesquecido, perdoado( digamos antes sanado. o estado de dor e

angústia sucederam a calma e as del$cias. 2h, alegria do meucoração, como posso e#primir&vos= ?almont está inocente( não se éculpado quando se ama tanto. Esses erros graves e o"ensivos que eulhe censurava com tanta amargura, não os cometera( e se, num s*ponto, precisei de indulg!ncia, não é certo que também eu tinhain'ustiças a serem perdoadas>

ão vos "alarei pormenorizadamente dos "atos ou das raz+esque os 'usti"icam( talvez até o esp$rito os apreciasse mal, s* aocoração é que compete senti&los. 7as se me acusardes de "raqueza,chamarei a vossa opinião para apoiar a minha. Em relação aoshomens, v*s pr*pria o dissestes, a in"idelidade não é inconst8ncia.

ão é que eu não sinta que esta distinção, aprovada peloconsenso geral, "ere ainda a delicadeza( mas de que se quei#aria aminha, quando a de ?almont so"re mais ainda> Esse erro queesqueço, não penseis que ele o perdoe a si pr*prio ou se console( eno entanto, 'á reparou bem essa ligeira "alta pelo e#cesso do seuamor e da minha "elicidade=

2u a minha "elicidade é maior, ou aprecio&a mais desde quereceei t!&la perdido, mas o que vos posso dizer é que, se ainda mesentisse com "orça para suportar desgostos tão cruéis como os queacabo de so"rer, não 'ulgaria pagar assim demasiado caro o

acréscimo de "elicidade que depois saboreei. 2h, minha terna mãe=Gepreendei a esta vossa "ilha irre"letida por vos ter a"ligido comtanta precipitação( ralhai&lhe por ter 'ulgado temerariamente ecaluniado aquele que ela não devia cessar de adorar, mas ao mesmotempo que a reconheceis imprudente, contemplai&a "eliz e aumentai&lhe a alegria compartilhando&a.

5aris, noite de CX de ovembro de CD .

CARTA CXL

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

0ue se passa, minha bela amiga, que não recebo respostasua> minha última carta parecia&me no entanto merec!&la( 'á hátr!s dias que a devia ter recebido e espero ainda= 2 menos que lheposso dizer é que estou zangado( deste modo nada lhe contarei dasminhas aventuras.

cerca do bel$ssimo e"eito da reconciliação( de ter dado lugara novas ternuras, em vez de censuras e descon"iança( de ser eu

agora quem recebe as desculpas e reparaç+es devidas - minhacandura caluniada, nada lhe direi( e sem o acontecimento imprevisto

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da última noite, nem sequer lhe escreveria. 7as como diz respeito -sua pupila, e como naturalmente ela não estará capaz de lheescrever durante algum tempo, encarrego&me eu disso.

5or motivos que "acilmente adivinhará ou não, de há uns diaspara cá que 7adame de 3ourvel não me podia ocupar o tempo( e

como essas raz+es não podiam e#istir na pequena ?olanges, tornara&me mais ass$duo 'unto dela. raças ao amável porteiro, nãoprecisava de vencer quaisquer obstáculos( e levávamos, a sua pupilae eu, uma vida c%moda e regrada. 7as o hábito conduz -neglig!ncia( nos primeiros dias, achávamos sempre as precauç+esinsu"icientes para a nossa segurança( trem$amos ainda detrás dos"errolhos. 2ntem, uma distração inacreditável causou o acidente quelhe quero contar( e se pelo meu lado apanhei um susto, a donzelapagou mais caro.

ão dorm$amos, mas estávamos no repouso e no abandonoque se seguem - voluptuosidade, quando ouvimos a porta do quarto

abrir&se de repente. garrei logo a espada, tanto para minha de"esacomo para da nossa comum pupila: avancei e não vi ninguém, mascom e"eito a porta estava aberta. 9omo t$nhamos luz, "iz uma busca,mas não encontrei vivalma. @embrei&me então que nosesquec!ramos das precauç+es habituais( e que a porta, apenasencostada, ou mal "echada, se abrira por si pr*pria.

?oltei para me 'untar - minha t$mida companheira etranqSilizá&la, mas não a encontrei no leito( ca$ra ou tentaraesconder&se na alcova: en"im, estava desmaiada e sem outromovimento a não ser "ortes convuls+es. Fmagine o meu embaraço=

inda consegui deitá&la na cama, e até "az!&la voltar a si, mas"erira&se na queda, e as conseqS!ncias não tardaram.ores de rins e c*licas violentas, outros sintomas ainda menos

equ$vocos, depressa me esclareceram quanto ao seu estado, mas,para a elucidar, "oi preciso revelar&lhe primeiro que se encontravagrávida( porque não "azia a m$nima idéia. unca ninguém, antesdesta pequena, conservou tanta inoc!ncia, "azendo ao mesmo tempotão bem tudo o que é preciso para se des"azer dela= 2h, esta nãoperde tempo a re"letir=

7as lamentava&se e vi que era preciso tomar uma decisão.icou então combinado que eu iria imediatamente ao médico

e ao cirurgião da casa, e que os preveniria de que alguém os viriabuscar, contando&lhes tudo, sob segredo( que ela, por seu lado,chamaria a criada de quarto logo que eu sa$sse( que lhecon"idenciaria tudo ou não, como quisesse( mas que a mandariabuscar socorro, e proibiria sobretudo que acordassem 7adame de?olanges, delicada e natural atenção duma "ilha que teme inquietar amãe.

iz as duas dilig!ncias e as duas con"iss+es o mais depressaque pude, e voltei para casa, donde não sa$ ainda, mas o cirurgião,que eu aliás 'á conhecia, veio ao meio&dia relatar&me o estado dadoente. ão me enganara( mas ele espera que, se não sobrevier

qualquer complicação, ninguém lá em casa dará por nada. criadade quarto está no segredo( o médico deu um nome - doença( e este

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assunto arrumar&se&á como milhares de outros, a não ser que maistarde nos possa ser útil que dele se "ale.

7as haverá ainda interesses comuns entre a minha amiga eeu> 2 seu sil!ncio dei#a&me dúvidas( 'á nem acreditaria nisso, se omeu dese'o não procurasse a todo o custo manter&me a esperança.

deus, minha bela amiga: bei'o&a, mal&grado o seu rancor.

5aris, TC de ovembro de CD .

CARTA CXLI

A MARQUESA DE MARTEUIL AO VISCONDE DE VALMONT

7eu eus= ?isconde, como me maça com a sua obstinação=

0ue lhe importa o meu sil!ncio> 5ensa talvez que o mantenhopor "alta de raz+es para me de"ender> h= 5rouvera a eus=

7as não, é antes porque me custa dizer&lhas.ale&me "rancamente( ilude&se a si pr*prio ou procura

enganar&me> di"erença entre as suas palavras e aç+es dei#a&me hesitar

apenas entre esses dois sentimentos: qual é o verdadeiro>0ue quer que lhe diga, quando eu pr*pria não sei que pensar>5arece que dá grande valor - sua última cena com a

5residente( mas o que é que ela prova a "avor da sua opinião e

contra a minha> 9om certeza que eu lhe não disse que amava essamulher o bastante para não a enganar, para não aproveitar todas asocasi+es que lhe parecessem agradáveis ou "áceis( nem sequerduvido de que para si se'a quase a mesma coisa satis"azer comoutra, com a primeira que apareça, os dese'os que aquela lhe tem"eito nascer( e nem sequer me surpreende que, por umalibertinagem de esp$rito que é inútil negar&lhe, tenha uma vez "eitopor deliberação o que "ez mil outras por acidente. 0uem sabe se issonão é moda do tempo, e o que "azem todos, desde o perverso aomais idiota dos inocentes> Ao'e o que se abstém passa porromanesco, e não é esse, parece&me, o de"eito de que o acuso.

7as o que disse, o que pensei, o que penso ainda é que nempor isso dei#a de amar a 5residente( não, com certeza, com um amorpuro e terno, mas com o que lhe é dado sentir( com aquele que "az,por e#emplo, ver numa mulher atrativos ou qualidades que ela nãotem( que a coloca num lugar - parte, e todas as outras abai#o( que oconserva preso a ela, mesmo quando a ultra'a( tal como um sultãopode sentir pela "avorita, o que não o impede de pre"erir muitasvezes uma simples odalisca. Esta comparação parece&me tanto maiscerta, quanto é verdade que, tal como ele, o ?isconde nunca é nem oamigo, nem o amante duma mulher( mas sempre ou o seu tirano ouo seu escravo. 5or isso estou bem certa que se humilhou e aviltou,

para voltar a estar nas graças desse belo ob'eto= E demasiado "eliz

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por t!&lo conseguido, assim que 'ulgou chegado o momento de obtero perdão, dei#a&me por virtude desse grande acontecimento.

inda na sua última carta, se me não "ala unicamente dessamulher, é porque nada me quer dizer das suas grandes aventuras(são para si tão importantes, que 'ulga o sil!ncio que "az sobre elas

uma punição para mim. E é depois de mil provas da sua acentuadapre"er!ncia por uma outra, que me pergunta tranquilamente se háainda interesses comuns entre n*s= 3ome cuidado, ?isconde= 0uandoeu responder, a minha resposta será irrevogável( e recear pronunciá&la neste momento é 'á talvez esclarecer demasiado. este modo, nãoquero "alar nisso.

2 mais que posso "azer é contar&lhe uma hist*ria. ão terátalvez tempo para a ler, ou para lhe prestar a necessária atenção>

Fsso é consigo. )erá a"inal, supondo o pior, apenas umahist*ria deitada ao mar.

;m dos meus conhecidos tinha&se dei#ado prender, tal como

o meu amigo, por uma mulher que não estava - sua altura.7as ao mesmo tempo tinha a lucidez de ver que, mais tarde

ou mais cedo, aquela aventura o pre'udicaria( e corava de vergonhapor não ter coragem para romper. 2 seu embaraço era tanto maior,quanto se gabara aos amigos de se manter inteiramente livre( e nãoignorava que o rid$culo aumenta - medida que procuramos "ugir&lhe.5assava assim a vida a "azer tolices e a dizer depois: não tenhoculpa. Este homem tinha uma amiga que por um momento estevetentada a revelá&lo a todos nesse estado de embriaguez, e a tornarassim o seu rid$culo perpétuo, mas, mais generosa do que maliciosa,

ou talvez por qualquer outro motivo, quis tentar um último recurso,para poder, em qualquer caso, dizer como o amigo: não tenho culpa.Gemeteu&lhe então, sem mais palavra, a carta que segue, como umremédio cu'o uso poderia ser útil para debelar o mal.

6e tudo nos aborrecemos, meu an'o, é uma lei da natureza(não tenho culpa.

)e agora me aborreço duma aventura que me ocupouinteiramente durante quatro longos meses, não tenho culpa.

)e tive tanto amor como tu virtude, e 'á é a"irmar muito, nãoé para admirar que um tenha acabado ao mesmo tempo que a outra.ão tenho culpa.

Gesulta disso, que desde há algum tempo te engano: mastambém a tua implacável ternura a isso me obrigava= ão tenhoculpa.

Ao'e, uma mulher que amo loucamente e#ige que tesacri"ique.

ão tenho culpa.<em ve'o que 'ulgarás chegado o momento de me chamares

per'uro, mas se a natureza concedeu aos homens apenas aconst8ncia, e legou -s mulheres a obstinação, não tenho culpa.

9r!&me( tal como eu, escolhe outro amante. Este conselho ébom, muito bom( se o achas mau, não tenho culpa.

deus, meu amigo, tive&te com prazer, dei#o&te sem pena(talvez volte ainda. J assim o mundo. ão tenho culpa. 6

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ão é o momento para lhe dizer, ?isconde, o e"eito destaúltima tentativa, e o que se lhe seguiu, mas prometo que lho direi napr*#ima carta. ela encontrará também o ultimatum sobre arenovação do tratado que me prop+e. té lá, simplesmente adeus...

prop*sito, agradeço&lhe todos os pormenores sobre a

pequena ?olanges( é um artigo que se deve guardar até ao diaseguinte ao casamento, para a gazeta de maledic!ncia. Entretanto,apresento&lhe os meus p!sames pela perda da sua descend!ncia.

<oa noite, ?isconde.

9astelo de..., TI de ovembro de CD .

CARTA CXLII

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

5alavra, minha bela amiga, não sei se li mal ou se nãocompreendi a sua carta, a hist*ria que me narra e o modelo epistolarque continha. 2 que lhe posso dizer, é que este último me pareceuoriginal e pr*prio para o e"eito, por isso copiei&o simplesmente e,mais simplesmente ainda, enviei&o - celestial 5residente.

ão perdi um momento, pois enviei ontem - tarde a ternamissiva. 5re"eri assim, em primeiro lugar porque prometera come"eito escrever&lhe ontem( e também porque pensei que toda a noite

não seria demais para ela se recolher e meditar sobre esse grandeacontecimento, mesmo que pela segunda vez me censure ae#pressão.

Esperava poder enviar&lhe esta manhã a resposta da minhabem&amada, mas é quase meio&dia e ainda nada recebi. Esperareiaté -s tr!s horas, e se até então não tiver not$cias, irei eu pr*prioprocurá&las( porque, quando se trata de decis+es, s* o primeiro passoé que custa.

gora, como pode imaginar, estou ansioso por saber o "im dahist*ria desse seu conhecido, tão cruelmente suspeitado de nãosaber, em caso de necessidade, sacri"icar uma mulher. 3er&se&á

corrigido> E a generosa amiga ter&lhe&á perdoado>nseio também por receber o seu ultimatum: como diz tãopoliticamente= 3enho curiosidade em saber se, mesmo nesta últimadilig!ncia, ainda encontrará amor. 2h, sem dúvida, há, e muito= 7aspor quem> o entanto, não quero p%r nada em realce, e espero tudoda sua bondade.

deus, minha encantadora amiga( s* "echarei esta carta -sduas horas, na esperança de lhe poder 'untar a dese'ada resposta.

uas horas da tarde. ão veio nada, o tempo urge( s* possoacrescentar uma palavra: recusar&me&á ainda desta vez os ternosbei'os de amor>

5aris, TD de ovembro de CD .

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CARTA CXLIII

A PRESIDENTE DE TOURVEL A MEDAME DE ROSEMONDE

7inha senhora, despedaçou&se o véu em que estava pintada ailusão da minha "elicidade. "unesta verdade alumia&me, e s* medei#a esperar uma morte certa e pr*#ima, cu'o caminho está traçadoentre a vergonha e o remorso. )egui&la&ei e bendirei os meustormentos se eles me abreviarem a e#ist!ncia. Envio&vos a carta queontem recebi( não acrescentarei nenhuma re"le#ão, não o necessita.ão é 'á altura para quei#as, resta&me so"rer.

ão preciso de piedade, mas de "orça.Gecebei pois, minha senhora, o meu único adeus, e atendei o

meu último pedido( é que me dei#eis entregue - minha sorte, queme esqueçais inteiramente, que não conteis mais comigo.

Aá um limite na in"elicidade, para além do qual até a pr*priaamizade aumenta os so"rimentos e não os pode sarar. 0uando as"eridas são mortais, todo o socorro se torna desumano. 0ualquersentimento que não se'a o desespero me é alheio. ada me podeconvir mais do que a noite pro"unda em que vou ocultar a minhavergonha. 9horarei as minhas "altas, se é que ainda posso chorar,pois desde ontem que não deito uma lágrima. 2 meu coração seco 'áas não consente.

deus, minha senhora. ão deveis responder&me. 4urei sobreessa carta cruel que não receberia mais nenhuma outra.

5aris, TD de ovembro de CD .

CARTA CXLIV

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

7inha bela amiga, ontem -s cinco horas da tarde, impacientepor não ter not$cias, apresentei&me em casa da bela abandonada(disseram&me que sa$ra. ?i, nesta "rase, uma recusa de me receberque me não zangou, nem surpreendeu( e retirei&me, na esperança deque esta dilig!ncia da minha parte levaria pelo menos uma dama tãoeducada a honrar&me com uma palavra de resposta. 2 dese'o quetinha de a receber "ez&me passar de prop*sito por minha casa porvolta das nove horas, mas nada encontrei.

Espantado com este sil!ncio, que não esperava, encarreguei omeu criado de ir buscar in"ormaç+es, e saber se a sens$vel criaturaestava morta ou moribunda. En"im, quando voltei in"ormou&me que

7adame de 3ourvel sa$ra de "ato, -s onze horas da manhã, com acriada de quarto( que mandara seguir para o convento de..., e que -s

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sete da tarde reenviara a carruagem e os criados, dizendo que a nãoesperassem em casa. Evidentemente, tomou a grande decisão. 2convento é o re"úgio pr*prio para uma viúva( e se persiste numa tãolouvável resolução, acrescentarei, a todas as obrigaç+es que 'á lhedevo, a da celebridade que vai ter esta aventura.

<em lhe dizia, há 'á algum tempo, que, apesar das suasinquietaç+es, eu reapareceria na sociedade brilhando com um novoesplendor. 0ue se mostrem, pois, esses cr$ticos severos, que meacusavam dum amor romanesco e in"eliz( que "açam rupturas maisrápidas e mais brilhantes, ou antes, e#i'o melhor: que se apresentemcomo consoladores, o caminho está&lhes aberto. 5ois bem= 0ueousem tentar a carreira que percorri até ao "im( e se um delesobtiver o m$nimo !#ito, cedo&lhe o primeiro lugar. 7as todos sentirãoque, quando me emprego a "undo, a impressão que dei#o éinapagável. h= Esta s!&lo&á, sem dúvida( e dei#arei de me vangloriarde todos os meus outros triun"os, se algum dia tiver 'unto desta

mulher um rival pre"erido.9oncordo que esta decisão que ela tomou lison'eia o meu

amor&pr*prio( mas custa&me que ela tenha encontrado em si "orçasu"iciente para se separar de mim. ão haverá pois, entre n*sambos, outros obstáculos além dos que eu pr*prio coloquei=

2 qu!= )e eu ansiasse pela reconciliação, ela poderia não aquerer( que digo> ão a dese'ar, não a considerar a suprema"elicidade=

E então é assim que se ama= cha, minha bela amiga, quedevo permitir isto> ão poderei eu, e não seria pre"er$vel tentar

conduzir de novo esta mulher a encarar a possibilidade de umareconciliação, tão dese'ada quanto esperada> 5oderia tentar estadilig!ncia sem lhe atribuir qualquer import8ncia( e, deste modo, semque representasse qualquer menosprezo em relação a si. )eria, pelocontrário, uma simples e#peri!ncia que tentar$amos de acordo( emesmo que obtivesse !#ito, seria um processo de renovar, - suavontade, um sacri"$cio que lhe deve ter sido agradável. gora, minhabela amiga, resta&me receber o prémio, e "aço votos pelo seuregresso. ?olte depressa para reencontrar o seu amante, os seusprazeres, os seus amigos, e a continuação das aventuras.

da pequena ?olanges correu maravilhosamente. 2ntem

como a minha inquietação me não permitia permanecer em ladonenhum, passei, nas minhas diversas sa$das, pela casa de 7adamede ?olanges. Encontrei a sua pupila 'á no salão, ainda com tra'os dedoente, mas em plena convalescença, e cada vez mais "resca einteressante. ?*s, mulheres, num tal caso, "icar$eis um m!s numso"á: palavra, vivam as raparigas= Esta, na verdade, deu&me dese'ode me certi"icar se a cura "ora per"eita=

evo ainda dizer&lhe que este acidente da menina quasetornou louco o seu sentimental ancenP. 5rimeiro de desgosto( ho'ede alegria. sua 9ec$lia estava doente= 9omo deve imaginar, acabeça anda - volta com uma tal desgraça. 3r!s vezes por dia

mandava saber not$cias, e não dei#ava passar nem um sem seapresentar ele pr*prio( en"im pediu, numa bela missiva - mãe,

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licença para a ir "elicitar pela convalescença dum ente tão querido(7adame de ?olanges consentiu( de modo que encontrei o rapazinstalado como noutro tempo, apenas com um pouco mais de"amiliaridade que ele não ousava ainda permitir&se.

oi mesmo por ele que soube pormenores( porque sa$mos ao

mesmo tempo e o "iz tagarelar. ão imagina o e"eito que esta visitalhe causou. ;ma alegria, dese'os e transportes imposs$veis dee#primir. Eu, que gosto das grandes iniciativas, acabei de lhe "azerperder a cabeça, garantindo&lhe que dentro de poucos dias lhearran'aria maneira de ver ainda de mais perto a sua bela.

Estou, de "ato, decidido a entregar&lha, logo que "aça a minhae#peri!ncia. 0uero consagrar&me inteiramente a si( e depois valeriaa pena que a sua pupila "osse também minha aluna, se não soubesseenganar senão o marido> obra&prima é que engane também oamante, e sobretudo o seu primeiro amante( porque eu, por mim,não tenho que me acusar de alguma vez ter pronunciado a palavra

amor.deus, minha bela amiga( volte logo que possa para gozar do

seu poder sobre mim, receber as homenagens e pagar&me o prémio.

5aris, TU de ovembro de CD .

CARTA CXLV

A MARQUESA DE MERTEUIL AO VISCONDE DE VALMONT)eriamente, ?isconde, abandonou a 5residente> Enviou&lhe a

carta que redigi para ela> J na verdade encantador( e ultrapassou asminhas esperanças= 9on"esso com sinceridade que esse triun"o melison'eia mais do que todos os que até agora tenho obtido. charátalvez que avalio muito alto essa mulher, que antes apreciava tãopouco( nada disso( é que não "oi sobre ela que alcancei esta vit*ria("oi sobre o ?isconde. Eis o que me diverte, e que é verdadeiramentedelicioso.

)im, ?isconde, sei que amava muito 7adame de 3ourvel e que

a ama ainda( ama&a como um louco, mas porque eu me divertia aenvergonhá&lo, sacri"icou&a cora'osamente. 3eria sacri"icado mil paranão ser v$tima dum grace'o. o que nos conduz a vaidade= @e )agetem razão quando diz que ela é inimiga da "elicidade.

9omo "icaria agora, se eu tivesse querido apenas pregar&lheuma partida> 7as sou incapaz de enganar, bem o sabe( e mesmoque, por minha vez, "icasse agora reduzida ao desespero e aoconvento, corro todos os riscos, e entrego&me ao vencedor.

o entanto, se capitulo é por pura "raqueza( porque, se euquisesse, quantas brincadeiras não teria ainda para "azer= E talvez o?isconde o merecesse= dmiro, por e#emplo, a sutileza ou a "alta de

 'eito com que docemente me prop+e que o dei#e reconciliar&se com a

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5residente. 9onvinha&lhe muito, não é assim, vangloriar&se dessaruptura sem perder os prazeres da posse>

E como então esse aparente sacri"$cio nada signi"icaria parasi, o"erece&se para o renovar segundo a minha vontade= 5or estain"eliz combinação, a celeste devota 'ulgar&se&ia sempre a única

eleita do seu coração, enquanto eu me orgulharia de ser a rivalpre"erida( ser$amos ambas enganadas, mas o meu amigo estariacontente, e o resto que importa>

J pena que com tanto talento para os pro'etos, tenha tãopouco para a e#ecução( e que por uma s* dilig!ncia inconsideradatenha levantado um obstáculo invenc$vel ao que mais dese'a.

2 qu!= 3inha a idéia de tentar uma reconciliação e ousouescrev!&lo na minha carta= )up%s&me inábil a esse ponto= 9reia&me,?isconde, quando uma mulher quer "erir o coração de outra,raramente dei#a de encontrar o ponto mais sens$vel, e o "erimento éincurável. Enquanto "eria esta, ou antes, dirigia os seus golpes, não

esqueci que esta mulher era minha rival, que por um momento apre"eriu a mim, e que en"im me colocara abai#o dela. )e "alhei navingança, consinto em pagar o erro.

5or isso, ?isconde, acho que deve tentar todos os meios(insisto mesmo, e prometo não me aborrecer com o seu !#ito, se oalcançar.

Estou tão descansada a este respeito que nem penso maisnisso. alemos doutra coisa. 5or e#emplo, da saúde da pequena?olanges. ar&me&á not$cias seguras no meu regresso, não éverdade> 7uito estimarei receb!&las. epois disso, compete&lhe a si

decidir do que mais convirá: entregar a menina ao namorado, outentar ser pela segunda vez o "undador dum novo ramo dos ?almont,sob o nome de ercourt. Esta idéia diverte&me muito( dei#o&lhe aescolha, mas peço&lhe que não tome uma decisão de"initiva sem queconversemos ambos. ão se trata de adiar uma data long$nqua,porque brevemente estarei em 5aris. ão lhe posso dizerprecisamente o dia( mas tenho a certeza que, logo que eu chegue,será o primeiro a ser in"ormado.

deus, ?isconde( apesar das minhas disputas, partidas ecensuras, amo&o sempre muito, e preparo&me para lho provar.

té - vista, meu amigo.

9astelo de..., TR de ovembro de CD .

CARTA CXLVI

A MARQUESA DE MERTEUIL AO CAVALEIRO DANCENY 

5arto en"im, meu 'ovem amigo, e amanhã - tarde estarei devolta a 5aris. o meio de toda a con"usão que acarreta uma viagem,

não receberei ninguém. o entanto, se tiverdes alguma con"id!nciaurgente a "azer&me, abrirei uma e#ceção - regra geral( mas s* para

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v*s( por isso, peço&vos segredo da minha chegada. 2 pr*prio?almont não será in"ormado.

)e alguém me tivesse dito, há uns tempos atrás, que dentroem pouco ter$eis a minha e#clusiva con"iança, não o acreditaria.

7as a vossa "oi a causa da minha. 0uase estou tentada a

acreditar que usastes de muita habilidade, direi mesmo sedução. Eisso seria muito mal= 3odavia não seria perigosa agora( tendes de"ato mais com que vos ocupar= 0uando a hero$na está em cena,esquece&se a con"idente.

5or isso não tivestes tempo de me contar os vossos últimostriun"os. 0uando a vossa 9ec$lia estava ausente, o tempo nãochegava para escutar as vossas ternas quei#as. 3!&las&$eis "eito parao eco, se não e#istisse eu para as escutar. 0uando, depois, elaesteve doente, ainda "ui honrada com o relato das vossasinquietaç+es, t$nheis necessidade de alguém a quem as contar.

7as agora que ela está em 5aris, que recuperou a saúde, e

sobretudo que a vedes -s vezes, ela basta&vos, e os vossos amigos 'ánão valem nada.

ão vos repreendo( a culpa é dos vossos vinte anos. esdelcib$ades até v*s, não sabemos 'á que os 'ovens s* recorrem -amizade nos desgostos de amor> "elicidade torna&os -s vezesindiscretos, mas 'amais con"identes. irei tal como )*crates: gostoque os meus amigos venham até mim, quando se sentem "elizes,mas, na sua qualidade de "il*so"o, passava bem sem eles quandonão apareciam. isso, não sou tão sensata como ele, e senti o vossosil!ncio com toda a "raqueza duma mulher.

ão penseis que sou e#igente: estou muito longe de o ser= 2mesmo sentimento que me leva a notar estas privaç+es "az com queas suporte com coragem, quando são a causa ou a prova da"elicidade dos meus amigos. 9onto convosco amanhã - tarde,contanto que o amor vos dei#e livre e desocupado: pro$bo&vos de me"azerdes o m$nimo sacri"$cio.

deus, 9avaleiro( terei muito prazer em ver&vos: vireis>

9astelo de..., TR de ovembro de CD .

CARTA CXLVII

MADAME DE VOLANGES A MADAME DE ROSEMONDE

icareis certamente tão a"lita como eu, minha digna amiga,quando souberdes do estado em que se encontra 7adame de

 3ourvel( está doente desde ontem( a doença atacou&apro"undamente, e apresenta sintomas tão graves que estouverdadeiramente alarmada.

;ma "ebre ardente, um del$rio violento e quase cont$nuo, uma

sede que se não sacia nunca, eis tudo o que se observa. 2s médicosdizem que não podem diagnosticar ainda( e o tratamento será tanto

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mais di"$cil quanto é certo que a doente recusa com obstinação todaa espécie de remédios( a ponto que "oi preciso agarrá&la para asangrar( e de duas outras vezes "oi necessário usar do mesmoprocesso para lhe tornar a p%r a ligadura, que ela pretendia arrancarno meio do del$rio.

?*s que a conhecestes como eu, tão "raca, tão t$mida e tãodoce, podereis imaginar que quatro pessoas mal a possam conter, eque logo que lhe tentem "alar razoavelmente se lance numa iraine#prim$vel> 5or mim, creio que não se'a mais do que del$rio, e quenão se trate duma verdadeira alienação do esp$rito.

2 que aumenta os meus receios a esse respeito é o que sepassou anteontem.

esse dia, ela chegou pelas CC horas da manhã, com a criadade quarto, ao convento de... 9omo "oi educada nessa casa econservou o hábito de a$ voltar -s vezes, "oi recebida comohabitualmente, e pareceu a todos tranqSila e de boa saúde.

pro#imadamente duas horas depois, perguntou se o quarto queocupara quando era pensionista estava vago, e como lherespondessem que sim, pediu para o ir ver( a superiora e outrasreligiosas acompanharam&na. oi então que declarou que voltava aviver nesse quarto, que, a"irmava, nunca deveria ter abandonado( edonde s* sairia por morte( "oram as palavras dela.

5rimeiro ninguém soube que dizer( mas, passado o primeiroespanto, e#puseram&lhe que o seu estado de mulher casada nãoautorizava a que a recebessem sem permissão especial. em essarazão, nem mil outras conseguiriam nada( e a partir desse momento

obstinou&se, não s* a não sair do convento, mas até a não dei#ar oquarto. En"im, impotentes, -s sete horas da tarde, consentiram quepassasse lá a noite. 7andaram embora as carruagens e os criados, eadiaram para o dia seguinte a decisão.

9erti"icam que durante o serão o seu ar e porte nada tinhamde alucinados, ambos eram modestos e re"letidos( apenas caiuquatro ou cinco vezes num cismar tão pro"undo que nãoconseguiram despertá&la "alando&lhe( e que, cada vez que sa$a dele,levava as mãos - "ronte como se a apertasse com "orça( e por isso,como uma das religiosas presentes lhe perguntasse se lhe do$a acabeça, olhou&a longamente antes de responder, e disse por "im:

6ão é a$ que está o mal=6 ;m momento depois pediu que adei#assem s*, e que de "uturo lhe não "izessem mais perguntas. 3oda a gente se retirou, e#ceto a criada de quarto, que

"elizmente devia dormir no mesmo quarto que a senhora, por "alta delugar.

9on"orme a narração da rapariga, a ama esteve muitotranqSila até -s onze da noite. isse então que se queria deitar, mas,antes de estar completamente despida, p%s&se a andar pelo quarto,com muitos movimentos e gestos. 4úlia, que "ora testemunha de tudoo que se passara durante o dia, não ousou dizer nada e esperou emsil!ncio durante perto de uma hora. 5or "im, 7adame de 3ourvel

chamou&a duas vezes seguidas( s* teve tempo de acudir, e a senhoracaiu&lhe nos braços dizendo: 6ão posso mais.6 ei#ou&se conduzir

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até ao leito, mas não quis tomar nada, nem que alguém "osse buscarsocorro. 7andou somente p%r água perto dela, e ordenou a 4úlia quese deitasse.

Esta assegura que esteve sem dormir até -s duas da manhã,e que não ouviu, durante esse tempo, nem movimentos nem

quei#as. 7as a"irma que "oi acordada -s cinco horas pelo del$rio daama, que "alava em voz alta e "orte( e que tendo&lhe entãoperguntado se não precisava de nada, e não obtendo resposta,acendeu o castiçal e "oi ao leito de 7adame de 3ourvel, que a nãoreconheceu( mas que, interrompendo de repente a conversação semseguimento que ia discorrendo, gritou vivamente: 6ei#em&me s*,dei#em&me nas trevas( são as trevas que me conv!m.6 Eu pr*prianotei ontem que esta "rase lhe volta muitas vezes.

En"im, 4úlia aproveitou&se desta ordem para sair e ir procurargente e socorro, mas 7adame de 3ourvel recusou ambos, com iras edel$rios que depois se repetiram "requentemente.

con"usão em que isto "ez mergulhar o convento decidiu asuperiora a mandar procurar&me ontem -s sete da manhã...

inda não era dia. cudi imediatamente. 0uando meanunciaram a 7adame de 3ourvel, pareceu retomar o conhecimento,e respondeu: 6h, sim, que entre.6 E assim que me apro#imei doleito, olhou&me "i#amente, tomou&me a mão, que apertou, e dissecom voz "orte, mas triste: 67orro por vos não ter acreditado.6 7aslogo em seguida, escondendo os olhos, voltou - sua "rase mais"reqSente: 6ei#em&me s*, etc.6( e perdeu por completo oconhecimento.

Estas palavras que me dirigiu, e ainda outras que dei#ouescapar no seu del$rio, "azem&me temer que esta cruel doença tenhauma causa mais cruel ainda. 7as respeitemos os segredos da nossaamiga, e limitemo&nos a lastimar a sua in"elicidade.

 3odo o dia de ontem "oi muito agitado, e dividido entreaterradores acessos de del$rio e momentos de abatimento letárgico,os únicos em que tem e dá algum repouso. ei#ei a sua cabeceira s*-s nove da noite, e voltarei esta manhã para todo o dia. 9laro quenão abandonarei a minha amiga tão in"eliz( mas o que é desolador éa obstinação dela em recusar todos os cuidados e socorros.

Envio&vos o boletim desta noite, que acabo de receber, e que,

como vereis, é um pouco consolador. 3erei o cuidado de vos trazerinteiramente a par de tudo.deus, minha digna amiga, vou para 'unto da doente. minha

"ilha, que "elizmente está quase inteiramente restabelecida,cumprimenta&vos.

5aris, TR de ovembro de CD .

CARTA CXLVIII

O CAVALEIRO DANCENY A MARQUESA DE MERTEUIL

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N v*s que eu amo= N tu que eu adoro= v*s que "izestes aminha "elicidade= 3u que a cumulaste= miga sens$vel, terna amante,por que é que a lembrança da tua dor vem perturbar o encanto quee#perimento> h= acalmai&vos, é a amizade que vo&lo roga. 2h=

minha amiga, sede "eliz= J a súplica do amor.h= 0ue censuras tendes a "azer&vos> 9rede&me, a vossadelicadeza engana&vos. 2s remorsos que vos causa, os erros de queme acusa, são igualmente ilus*rios( e sinto no meu coração quehouve entre n*s um sedutor único: o amor. ão temas entregar&teaos sentimentos que inspiras, dei#ar&te penetrar pelo "ogo que "azesnascer. 2 qu!= )eriam os nossos coraç+es menos puros por s* tardeterem sido esclarecidos> ão, com certeza. J s* a sedução que,agindo sempre com um "im, pode combinar a marcha e os meios, eprever de longe os acontecimentos. 7as o verdadeiro amor nãopermite meditar e re"letir( a"asta&nos dos pro'etos por meio dos

sentimentos( o seu poder é tanto mais "orte quanto nos édesconhecido, e é na sombra do sil!ncio que nos prende por laçosque são imposs$veis de conhecer ou de romper.

este modo, ainda ontem, apesar da viva emoção que mecausava a idéia do vosso regresso, do prazer intenso que senti aover&vos, 'ulgava no entanto ser chamado e conduzido apenas pelatranqSila amizade, ou antes, inteiramente entregue aos docessentimentos do meu coração, bem pouco me preocupava emesclarecer&lhes a origem ou a causa. 3al como eu, minha ternaamiga, também tu sentias, sem o saber, esse encanto poderoso que

entregava as nossas almas -s doces impress+es da ternura( e amboss* reconhecemos o amor ao sair da embriaguez em que esse deusnos mergulhara.

7as é isso que nos 'usti"ica em vez de nos condenar. ão, nãotra$ste a amizade, nem eu abusei da tua con"iança. mbos, é certo,ignorávamos os nossos sentimentos( mas essa ilusãoe#perimentávamo&la apenas, não a procurávamos "azer nascer.

h, em vez de a lamentarmos, pensemos na "elicidade quenos trou#e( e sem a perturbarmos com in'ustas censuras,dediquemo&nos antes a aumentá&la ainda com o encanto dacon"iança é da segurança. 2h, minha amiga= 9omo esta esperança é

cara ao meu coração= )im, de ora em diante, livre de todo o temor,inteiramente dada ao amor, partilharás os meus dese'os, os meus!#tases, o del$rio dos meus sentidos, a embriaguez da minha alma( ecada instante dos nossos dias a"ortunados será assinalado por umanova voluptuosidade.

deus, adoro&te= ?er&te&ei esta tarde, mas encontrar&te&ei s*>ão ouso esperá&lo. h= 3u não o dese'as tanto como eu.

5aris, C de ezembro de CD .

CARTA CXLIX

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MADAME DE VOLANGES A MADAME DE ROSEMONDE

2ntem durante todo o dia tive esperanças, minha dignaamiga, de vos poder dar esta manhã not$cias mais "avoráveis da

saúde da nossa querida doente( mas desde ontem - tarde que essaesperança "oi destru$da, e s* me resta a pena de a ter perdido.;m acontecimento, bem indi"erente na apar!ncia, mas bem

cruel pelas conseqS!ncias que teve, tornou o estado da doente tãolastimável como antes, se é que o não agravou.

ada teria compreendido desta súbita trans"ormação, seontem não tivesse recebido as con"id!ncias da nossa in"eliz amiga.

9omo ela me não dei#ou ignorar que também estáveisin"ormada de todos os seus in"ortúnios, posso "alar sem reservasobre a sua triste situação.

2ntem de manhã, quando cheguei ao convento, disseram&me

que a doente dormia há mais de tr!s horas( e o sono era tãopro"undo e tranqSilo, que por um momento receei que "osseletárgico.

lgum tempo depois acordou, e abriu ela pr*pria as cortinasdo leito. 2lhou&nos a todos surpreendida( e quando me levantei parair 'unto dela, reconheceu&me, chamou&me e pediu&me que meapro#imasse. ão me deu tempo para a interrogar, e perguntou&meonde estava, o que "az$amos ali, se estava doente e por que não seencontrava em casa. 5rimeiro pensei que se tratava dum novodel$rio, embora mais tranqSilo que o precedente, mas vi que ela

compreendia muito bem as minhas respostas. 3inha com e"eitorecuperado a razão, mas não a mem*ria.Fnterrogou&me, com muitos pormenores, sobre tudo o que lhe

acontecera desde que chegara ao convento, para onde não selembrava de ter vindo. Gespondi com e#atidão, suprimindo apenas oque teria podido assustá&la, e quando pelo meu lado lhe pergunteicomo estava, respondeu&me que não so"ria nesse momento( mas quetinha sido muito atormentada durante o sono, e que ainda se sentia"atigada. E#ortei&a a acalmar&se e a "alar pouco( depois disto, "echeiem parte as cortinas, que dei#ei somente entreabertas, e sentei&meperto do leito. o mesmo tempo, o"ereceram&lhe um caldo que

tomou e achou bom.icou assim cerca de meia hora, durante a qual não "alousenão para agradecer os cuidados que eu lhe dispensara( e p%s nosagradecimentos a gentileza e a graça que lhe conheceis. Em seguidaguardou durante algum tempo um absoluto sil!ncio, que s* rompeupara dizer: 6h, sim, lembro&me de aqui ter vindo6( e um momentodepois, gritou dolorosamente: 67inha amiga, minha amiga, lamentai&me( reencontro os meus in"ortúnios.6 9omo nesse momento meapro#imei dela, agarrou&me na mão e, apoiando nela a cabeça,continuou: 6rande eus, não poderei então morrer>6 suae#pressão, mais ainda que as palavras, enterneceu&me até -s

lágrimas( compreendeu&o pela minha voz, e disse&me: 6@amentais&

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me= h, se soubésseis...6 E depois interrompendo&se: 62rdenai quenos dei#em s*s, e dir&vos&ei tudo. 6

 3al como 'ulgo ter&vos indicado, tinha 'á suspeitas sobre qualdeveria ser o assunto desta con"id!ncia( e temendo que estaconversa, que previa dever ser longa e triste, pre'udicasse o estado

da nossa in"eliz amiga, recusei&me a princ$pio, sob o prete#to de queela necessitava de repouso, mas insistiu e acedi -s suas inst8ncias.ssim que "icamos s*s, contou&me tudo o que 'á vos narrou, e quepor essa razão vos não repetirei.

alou&me en"im da maneira cruel como "oi sacri"icada eacrescentou: 6Estava certa de que morreria por causa disso e tinhacoragem( mas sobreviver ao in"ortúnio e - vergonha, é&meimposs$vel.6 3entei combater este des8nimo, ou antes, estedesespero, com as armas da religião, até então com tanto podersobre ela( mas senti logo que não tinha "orça su"iciente para essasaugustas "unç+es, e propus&lhe então que se chamasse o padre

nselmo, que sei ser depositário de toda a sua con"iança.9onsentiu e pareceu mesmo dese'á&lo muito. 7andamos com

e"eito buscá&lo, e ele veio imediatamente. 5ermaneceu muito tempocom a doente, e disse ao sair que, se os médicos pensassem comoele, 'ulgava poder adiar a cerim%nia dos sacramentos, e que voltariano dia seguinte.

Eram cerca das tr!s horas da tarde, e até -s cinco a nossaamiga esteve muito tranqSila, de modo que todos voltáramos a teresperança. 5or desgraça, trou#eram&lhe então uma carta.

0uando pretenderam entregar&lha, respondeu não querer

receber nenhuma e ninguém insistiu. 7as a partir desse momento,"icou muito agitada. 5ouco depois, perguntou donde vinha a carta.ão estava selada. 0uem a trou#era> inguém sabia. a parte dequem vinha> ão o tinham dito ao porteiro. Em seguida guardousil!ncio durante algum tempo( depois disto, recomeçou a "alar, masas suas "rases sem seguimento s* nos indicaram que o del$riovoltara.

9ontudo houve ainda um intervalo tranqSilo, até que pediuque lhe entregassem a carta que haviam trazido para ela. ssim quelhe lançou um olhar gritou: 6ele= 7eu eus=6, e depois com uma voz"orte, mas aba"ada: 63omem&na, tomem&na.6

7andou imediatamente "echar as cortinas do leito e proibiutodos de se apro#imarem, mas pouco depois "omos obrigados avoltar 'unto dela. 2 del$rio recomeçara mais violento do que nunca, eera acompanhado de convuls+es verdadeiramente assustadoras.

Estes acidentes não cessaram em toda a tarde( e o boletimdesta manhã in"orma&me de que a noite não "oi menos agitada.En"im, o seu estado é tal, que me espanto que não tenha 'ásucumbido( e não vos escondo que me restam poucas esperanças.

)uponho que essa "unesta carta seria do senhor de ?almont,mas que ousará ele dizer&lhe ainda> 5erdão, minha cara amiga(evitarei qualquer re"le#ão, mas é muito cruel ver perecer tão

desgraçadamente uma mulher, até agora tão "eliz e tão digna de oser.

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5aris, T de ezembro de CD .

CARTA CL

O CAVALEIRO DANCENY A MARQUESA DE MERTEUIL

Enquanto espero a "elicidade de te tornar a ver, minha ternaamiga, entrego&me ao prazer de te escrever( e é ocupando&me de tique atenuo a pena de estar a"astado. E#por&te os meus sentimentos,recordar&me dos teus, é para o meu coração um verdadeiro prazer( eé através dele que mesmo o momento das privaç+es me o"ereceainda mil bens preciosos. o entanto, segundo disseste, nãoreceberei resposta tua, mesmo esta carta será a última( e privar&nos&

emos duma correspond!ncia que, quanto a ti, é perigosa, e de quenão temos necessidade. 9laro que, se insistes, te acreditarei, poisque podes tu querer que por essa mesma razão eu não queiratambém> 7as antes de dizer a última palavra, não consentirás que"alemos sobre isso>

0uanto aos perigos, deves tu decidir, nada posso prever, elimito&me a pedir&te que olhes pela tua segurança, porque não possoestar tranqSilo sabendo&te inquieta. o que respeita a este assunto,não somos n*s ambos que "ormamos um, és tu que és n*s ambos.

ão é o mesmo quanto - necessidade, aqui temos de pensar

do mesmo modo, e se temos opini+es di"erentes, é com certeza pornão nos e#plicarmos ou compreendermos. Eis pois o que 'ulgo sentir.)em dúvida que uma carta parece muito pouco necessária

quando nos podemos ver livremente. 0ue poderá ela dizer, que umapalavra, ou olhar, ou mesmo um sil!ncio, não e#primissem cemvezes melhor> Fsto parece&me tão verdadeiro que, no momento emque me "alaste de não mais nos escrevermos, essa idéia deslizou"acilmente sobre a minha alma( perturbou&a talvez, mas não aa"etou. 3al como quando, querendo bei'ar&te sobre o coração,encontro uma "ita ou um véu( a"asto&o apenas, sem chegar a ter osentimento de um obstáculo.

7as depois separámo&nos( e logo que dei#aste de estarpresente, essa idéia da carta voltou a atormentar&me. 5orqu!,murmurei, mais essa privação> 5ois qu!= 5or estarmos a"astadosnada mais teremos a dizer&nos> )uponhamos que, "avorecidos pelascircunst8ncias, passamos 'untos um dia inteiro( será preciso que otempo para conversar se'a roubado ao do prazer>

)im, ao do prazer, minha terna amiga( porque ao pé de ti,mesmo os momentos de repouso "ornecem ainda umavoluptuosidade deliciosa. En"im, mesmo que tenhamos muito tempo,acabamos por nos separar( e, depois, "ica&se tão s*= J então que umacarta se torna preciosa= )e a não lemos, pelo menos olhamo&la...

h= )em dúvida, pode&se olhar uma carta sem a ler, tal comode noite sinto que teria ainda prazer em tocar o teu retrato...

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2 teu retrato, digo> 7as uma carta é o retrato da alma. ãotem, como a "ria imagem, essa "i#idez que tão distante é do amor(presta&se a todos os nossos movimentos: alternadamente anima&se,goza, repousa&se... 3odos os teus sentimentos me são tão preciosos=5rivar&me&ás dum meio de os coligir>

 3ens a certeza de que a necessidade de me escrever nunca teatormentará> )e na solidão o teu coração se dilata ou se a"lige, seum movimento de alegria agita a tua alma, se uma involuntáriatristeza a vem perturbar por um momento, não será então no seio doteu amigo que e#pandirás a tua "elicidade ou o teu desgosto>

 3erás então um sentimento que ele não partilhará> ei#á&lo&ás então, sonhador e solitário, vaguear longe de ti>...

7inha amiga=... 7inha terna amiga=... 7as é a ti que competedecidir. 0uis somente debater o assunto e não seduzir&te( s* teapresentei raz+es, ouso crer que seria mais convincente comsúplicas.

5rocurarei, se persistes, não me a"ligir( "arei es"orços paradizer a mim pr*prio o que me terias escrito, mas escuta, di&lo&iasmelhor do que eu( e sobretudo ser&me&ia muito mais agradável deouvir.

deus, minha encantadora amiga( apro#ima&se a hora em quete poderei ver, abandono&te com pressa, para te reencontrar maiscedo.

5aris, B de ezembro de CD .

CARTA CLI

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

)em dúvida, 7arquesa, me não 'ulga tão ine#periente, aponto de pensar que me pude dei#ar iludir quanto ao encontro a s*sem que a surpreendi esta tarde, e ao espantoso acaso que conduziraancenP a sua casa= ão é que a sua "isionomia tão treinada nãotenha sabido assumir -s mil maravilhas uma e#pressão calma e

serena, nem que se tenha tra$do por alguma das "rases que -s vezesescapam - perturbação ou ao pesar. 9oncordo até que os seusolhares d*ceis a serviram per"eitamente( e se se tivessem "eitoacreditar tão bem como compreender, eu estaria longe de sentir ouconservar a m$nima suspeita, e nem por um momento descon"iariado desgosto enorme que lhe causava esse estranho importuno. 7as,para não ostentar em vão tão grandes talentos, para obter o !#itoque dese'ava, para conseguir en"im a ilusão que procurava "azernascer, seria preciso em primeiro lugar instruir o seu c8ndido amantecom mais cuidado.

?isto que se começa a dedicar - educação, ensine os seus

alunos a não corarem e a não se desconcertarem ao m$nimo grace'o(a não negarem tão vivamente, quanto a uma s* mulher, as mesmas

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coisas de que se de"endem tão debilmente quanto a outras. Ensine&lhes ainda a saberem escutar o elogio da sua amante, sem se

 'ulgarem obrigados a prestar&lhe as homenagens( e se permite que aolhem em sociedade, que ao menos saibam dis"arçar esse olhar deposse tão "ácil de reconhecer, e que con"undem tão inabilmente com

o do amor. Então pode mandá&los comparecer aos e#ames públicos,sem que a sua conduta dei#e mal a sábia pro"essora( e eu pr*prio,muito "eliz por concorrer para a sua celebridade, prometo&lheelaborar e publicar os programas desse novo colégio.

7as até lá espanto&me, con"esso, que "osse a mim quee#perimentasse tratar como um colegial. 2h, com qualquer outramulher, depressa me vingaria= E teria nisso um tão grande prazer=

9omo esse prazer ultrapassaria "acilmente o que ela me 'ulgara "azer perder= )im, é s* para si que pre"iro a reparação -vingança( e não 'ulgue que este'a preso pela m$nima dúvida ou pelamais ligeira incerteza( sei tudo.

Está em 5aris há quatro dias( e todos os dias recebeuancenP, e s* ele. inda ho'e a sua porta estava "echada( e s* "altouao porteiro, para me impedir de chegar a si, uma segurança igual -sua. o entanto eu podia ter a certeza, como me mandou dizer, deser o primeiro in"ormado da sua chegada( dessa chegada de queainda me não podia in"ormar o dia, enquanto me escrevia na vésperada partida. egará estes "atos ou tentará desculpar&se> ;ma e outracoisa são igualmente imposs$veis( e no entanto ainda me contenho=5or aqui reconhecerá o seu poder( mas creia&me, satis"eita por o tere#perimentado, não deverá abusar dele mais tempo. 9onhecemo&nos

bem, 7arquesa( estas palavras devem bastar&lhe.isse&me que amanhã estará "ora de casa todo o dia> 2#aláque saia de "ato( pode ter a certeza de que o saberei. 7as, en"im,voltará ao "im da tarde( e para a nossa di"$cil reconciliação, nãoteremos tempo de sobra até ao dia seguinte. 7ande&me dizer se seráem sua casa, ou na outra, que se "arão as nossas numerosas erec$procas e#piaç+es. )obretudo, acabou&se o ancenP. sua mácabeça estava cheia dele, não posso ter ciúmes desse del$rio daimaginação, mas pense que a partir deste momento, o que eraapenas uma "antasia tornar&se&á uma n$tida pre"er!ncia. ão me

 'ulgo "eito para essa humilhação, e não quero receb!&la de si.

9onto até que esse sacri"$cio não vos pareça tal. 7as mesmoque lhe custasse um tanto, parece&me que 'á lhe dei um beloe#emplo= ;ma mulher simultaneamente sens$vel e bela, que s* viviapara mim, e que neste momento morre talvez de amor e remorso,vale bem um 'ovem colegial, a quem, poderemos dizer, não "alta"igura nem esp$rito, mas que não tem nem prática nem segurança.

deus, 7arquesa( nada lhe digo dos meus sentimentos por si.5re"iro neste momento não sondar o meu coração. Espero a suaresposta. 7edite bem nela, pense bem que tanto quanto lhe é "ácilainda "azer&me esquecer o"ensa que me in"ligiu, tanto mais umarecusa da sua parte, um simples adiamento, a gravará no meu

coração em traços inapagáveis.

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5aris, noite de B de ezembro de CD .

CARTA CLII

A MARQUESA DE MERTEUIL AO VISCONDE DE VALMONT

  3enha cuidado, ?isconde, poupe mais a minha e#trematimidez=

9omo quer que eu suporte a idéia deprimente de incorrer nasua indignação( e sobretudo que não sucumba ao terror da suavingança> 3anto mais que, como sabe, se me "izer uma in"8mia ser&me&á imposs$vel retribu$&la. )eria escusado que eu "alasse, a suae#ist!ncia não seria nem menos brilhante, nem menos tranqSila. averdade, que teria a temer> )er obrigado a partir, se lhe dessem

tempo. 7as não se vive no estrangeiro tão bem como aqui> E a"inalde contas, contanto que a 9orte de rança o dei#asse tranqSilo ondese "i#asse, para si seria apenas mudar o cenário dos seus triun"os.p*s ter tentado chamá&lo - razão por meio destas consideraç+esmorais, voltemos ao nosso problema.

)abe, ?isconde, por que é que não tornei a casar> ão "oi comcerteza por não ter encontrado partidos vanta'osos( mas unicamentepara que ninguém tenha o direito de censurar as minhas aç+es. emsequer "oi por medo de não poder "azer o que me apetecesse, poissempre acabaria por o conseguir, mas porque me teria incomodado a

idéia de que alguém se 'ulgasse com direito a quei#ar&se( e, en"im,porque s* gosto de atraiçoar por prazer, e não por necessidade. E eisque o ?isconde me escreve a carta mais con'ugal que se possaimaginar= )* me "ala de erros do meu lado e de benevol!ncia do seu=7as como se pode "altar -quele a quem nada se deve> ão soucapaz de o saber=

?e'amos: a"inal de que se trata> Encontrou ancenP emminha casa, e isso desagradou&lhe> 5ois bem: e que concluiu da$> 2uque se tratava dum acaso, como eu lhe disse, ou que "ora por minhavontade, ao contrário do que lhe dizia. o primeiro caso a sua carta éin'usta( no segundo, rid$cula( não valia a pena escrev!&la= 7as está

com ciúmes, e os ciúmes não raciocinam.5ois bem= 5ensarei eu por si.2u tem rival, ou não. )e tem, deve agradar para ser pre"erido(

se não tem, deve agradar ainda mais para evitar vir a t!&lo.Em ambos os casos, deve seguir a mesma conduta( assim,

para que atormentar&se= 5ara qu!, sobretudo, atormentar&me a mim= 4á não sabe ser amável> 4á duvida do seu !#ito> ?e'amos,

?isconde, é in'usto para si pr*prio. 7as não é isso( é que, aos seusolhos, eu não mereço tanto trabalho. ese'a muito menos as minhasbondades, do que abusar do seu poder. ?amos, o ?isconde é umingrato. E aqui estou eu a "icar sentimental= E por pouco que eu

continuasse neste tom, esta carta podia tornar&se muito terna, mas osenhor não o merece.

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 3ambém não merece que eu me 'usti"ique. 5ara o castigar dassuas suspeitas, dei#o&o "icar com elas, deste modo, nada direi sobrea data do meu regresso, nem sobre as visitas de ancenP.

 3eve muito trabalho para se in"ormar, não é verdade>5ois bem= 4á está mais adiantado> Espero que tenha tido

muito prazer nessa tare"a( quanto a mim, em nada estragou o meu.2 que posso responder - sua ameaçadora carta, é que ela nãoteve nem o dom de me agradar, nem o poder de me intimidar( e queneste momento não estou nada disposta a aceder aos seus pedidos.

5ara "alar verdade, aceitá&lo tal como ho'e se mostra, seria"azer&lhe realmente uma in"idelidade. ão era recomeçar com o meuantigo amante( mas antes arran'ar um novo, e que nem de longevale o outro. inda não esqueci bastante o primeiro para assim meenganar. 2 ?almont que eu amava era encantador.

9oncordo mesmo que não encontrei homem mais agradável.h, suplico&lhe, ?isconde, se o encontrar, traga&mo( esse será

sempre bem recebido.9ontudo previna&o de que, em qualquer caso, não será nem

para ho'e nem para amanhã. 2 seu 7enechmel pre'udicou&o( e,apressando&me demasiado, temo enganar&me. 2u talvez 'á eu tenhadado a palavra a ancenP para esses dois dias> E a sua cartamostrou&me que se zangava quando "altavam - palavra.

<em v! que é preciso esperar.7as que lhe importa> cabará por se vingar bem do seu rival.

Ele não "ará pior - sua amante do que o ?isconde 'á "ez - dele( ea"inal, não vale uma mulher o mesmo que outra> )ão estes os seus

princ$pios. 7esmo aquela que "osse terna e sens$vel, que e#istisse s*para si, que morresse por "im de amor e remorso, seria do mesmomodo sacri"icada - primeira "antasia, ao terror de ser troçado por ummomento( e quer que nos morti"iquemos>

h, isso não é 'usto.deus, ?isconde( volte de novo a ser amável. Escute, s* quero

achá&lo outra vez encantador( e desde que este'a certa disso,comprometo&me a provar&lho. )ou na verdade demasiado indulgente.

5aris, I de ezembro de CD .

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*#lude 8 comédia de $lauto 5s )enechmes, que trata de dois irmãos gêmeos,inteiramente semelhantes !" do /2

CARTA CLIII

O VISCONDE DE VALMONT À MARQUESA DE MERTEUIL

Gespondo imediatamente - sua carta, e procurei ser claro( oque não é "ácil em relação a si, quando por vezes toma a decisão denão compreender.

ão eram necessários longos discursos para estabelecer que,tendo cada um de n*s na mão tudo o que é preciso para destruir ooutro, temos igual interesse em nos pouparmos mutuamente: não édisso que se trata. 7as, entre a decisão violenta de nos destruirmos,e a outra, sem dúvida melhor, de "icarmos unidos como temos sido,

de nos tornarmos ainda mais $ntimos reatando a nossa antigaligação( entre estas duas decis+es, dizia eu, há mil outras a tomar.ão é rid$culo dizer&lhe, repetir&lhe que, a partir de ho'e, serei seuamante ou seu inimigo.

<em ve'o que a necessidade da escolha a importuna( que lheagradaria mais tergiversar( e não ignoro que nunca "oi do seu agradoser assim colocada entre o sim e o não, mas deve sentir também quea não posso dei#ar sair desse c$rculo estreito sem me arriscar a seriludido( e devia prever que o não suportaria.

9ompete&lhe pronunciar&se: dei#o&lhe a decisão, mas não

posso "icar na incerteza. 4á a previno de que me não enganará com os seus racioc$nios,bons ou maus( que me não seduzirá com lison'as a en"eitar recusas(e que en"im chegou o momento da "ranqueza. ese'o até dar&lhe oe#emplo( e declaro com prazer que pre"iro paz e união, mas se épreciso quebrar ambas, quero ter o direito e os meios para tal.

crescento até que o m$nimo obstáculo levantado do seuguerra, bem v! que a resposta que lhe peço não e#ige "rases largase belas. <astam duas palavras.

5aris, I de ezembro de CD

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CARTA CLIV

MADAME DE VOLANGES A MADAME DE ROSEMONDE

2s boletins in"ormar&vos&ão melhor do que eu poderia "azer,minha cara amiga, acerca do estado grave da nossa doente.

Fnteiramente entregue aos cuidados que lhe dispenso, s*roubo tempo para vos escrever, quando há outros acontecimentosalém dos da doença. Eis um, que eu estava bem longe de esperar.

 3rata&se duma carta do senhor de ?almont, a quem aprouveescolher&me como con"idente e mesmo como intermediária 'unto de7adame de 3ourvel, para quem 'untara uma carta - minha. evolviuma ao mesmo tempo que respondia - outra.

7ando&vos esta última e penso que 'ulgareis, como eu, quenão podia nem devia "azer o que ele me pede. 7esmo que o tivessequerido, a nossa in"eliz amiga não estaria em estado de mecompreender. 2 del$rio é cont$nuo. 7as que dizeis deste desesperodo senhor de ?almont> Em primeiro lugar, devemos acreditá&lo, ouquererá ele somente iludir todos e até ao "im> )e desta vez é

sincero, bem pode dizer que construiu ele pr*prio a sua in"elicidade.9reio que terá "icado pouco satis"eito com a minha resposta, mascon"esso que tudo o que me "az pensar sobre esta "unesta aventurame revolta cada vez mais contra o seu autor.

deus, minha querida amiga( volto -s minhas tristes "unç+es,e pouca esperança tenho de as ver coroadas de !#ito. 9onheceis osmeus sentimentos para convosco.

5aris, O de ezembro de CD .

" dos / % "a edição &lassiques 'arnierA, de BCE, elaborada sobre o manuscritoautFgra+o, dá%se em nota a carta re+erida por )adame de olanges, que 0aclosteria escrito e depois suprimido, e de que damos a tradução<

O VISCONDE DE VALMONT A MADAME DE VOLANGES

)ei, minha senhora, que não gostais de mim( também nãoignoro que "ostes sempre contrária - minha pessoa 'unto de 7adamede 3ourvel, e do mesmo modo não tenho dúvidas de que, mais doque nunca, e#perimenteis os mesmos sentimentos a meu respeito.

9onvenho até que possais 'ulgar 'ustos esses sentimentos.

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Entretanto, é a v*s que me diri'o, e não receio pedir&vos queentregueis a 7adame de 3ourvel a carta que 'unto aqui para ela, eainda solicitar&vos que consigais que a leia e a disponhais a issodando&lhe a certeza do meu arrependimento, do meu pesar esobretudo do meu amor. )into que esta dilig!ncia poderá parecer&

vos estranha( a mim pr*prio ela admira. 7as o desespero apodera&sedos meios sem os calcular, e, por outro lado, um interesse tãogrande, tão caro e que nos é comum deve a"astar qualquer outraconsideração. 7adame de 3ourvel está - morte( 7adame de 3ourvelé in"eliz( é necessário restituir&lhe a vida, a saúde e a "elicidade. Eis oob'etivo a cumprir. 3odos os meios são bons, desde que possamassegurar ou apressar o !#ito. )e re'eitardes este que vos o"ereço,"icareis responsável pelo acontecimento da sua morte, o vosso pesare o meu desespero eterno, tudo será obra vossa. )ei que ultra'eiindignamente uma mulher digna de toda a minha adoração( sei ques* as minhas torpes o"ensas são a causa de todos os males que ela

suporta. ão pretendo diminuir as minhas "altas nem desculpá&las.7as v*s, senhora, deveis temer tornar&vos cúmplice impedindo&mede as reparar. 7ergulhei o punhal no coração da vossa amiga, mass* eu posso retirar o "erro da "erida, s* eu conheço os meios de acurar. 0ue importa que eu se'a culpado, se posso ser útil> )alvai avossa amiga, salvai&a=

J do vosso socorro que ela necessita, e não da vossavingança.

5aris, I de ezembro de CD .

CARTA CLV

O VISCONDE DE VALMONT AO CAVALEIRO DANCENY 

5assei duas vezes por sua casa, meu caro 9avaleiro, masdesde que abandonou o papel de apai#onado pelo de aventureirogalante, é imposs$vel encontrá&lo. 3odavia o seu criado de quarto

assegurou&me que voltaria a casa esta tarde, e que tinha ordem parao esperar( mas eu, que estou ao par dos seus pro'etos, bem vi que omeu amigo não voltaria senão por um momento, para vestir o tra'oapropriado, e que imediatamente recomeçaria as suas corridasvitoriosas. inda bem, e s* devo aplaudi&lo, mas talvez, para estanoite, se'a tentado a mudar de direção. Fgnora ainda o caminho quetomaram metade dos assuntos que lhe dizem respeito( devo p%&lo aocorrente daquele que desconhece, e depois decidirá. edique algumtempo a ler esta carta. ão será a"astá&lo dos seus prazeres, pois,pelo contrário, ela tem como ob'etivo permitir&lhe a escolha.

)e "osse eu o depositário de todas as suas con"id!ncias, se

tivesse sabido por si a parte dos segredos que "ui "orçado aadivinhar, a elucidação teria vindo a tempo( e o meu zelo, menos

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hábil, não entravaria agora os seus movimentos. 7as partamos doponto em que estamos. 0ualquer que se'a a decisão que tome,nunca dei#ará de "azer a "elicidade de alguém.

 3em um encontro para esta noite, não é verdade> 9om umamulher encantadora e a quem adora> 5ois na sua idade, que mulher

não adoramos, pelo menos nos oito primeiros dias= 2 cenário devecontribuir também para o prazer. ;ma casinha deliciosa, que e#istes* para si, deve aumentar a voluptuosidade com os encantos daliberdade e do mistério. Está tudo combinado, esperam&no e o meuamigo arde no dese'o de chegar= Eis o que ambos sabemos, se bemque nada me tenha dito. gora, eis o que não sabe, e de que devoin"ormá&lo.

esde o meu regresso a 5aris que me ocupava com os meiosde o p%r em contato com 7ademoiselle de ?olanges, tal como lheprometera( e ainda da última vez que lhe "alei, tive ocasião de 'ulgarpelas suas respostas, direi até pelo seu entusiasmo, que contribu$a

para a sua "elicidade. )ozinho não conseguiria eu resolver estaquestão tão di"$cil, mas, depois de ter preparado os meios, dei#ei oresto entregue ao zelo da sua 'ovem apai#onada.

Ela encontrou, no seu amor, recursos que "altavam - minhae#peri!ncia, en"im, para mal do meu amigo, ela conseguiu o quedese'ava. Aá dois dias, disse&me ela esta tarde, que todos osobstáculos estão vencidos e que a vossa "elicidade depende s* de si.

Aá dois dias que anseia por transmitir&vos ela pr*pria anot$cia, e, apesar da aus!ncia da mãe, não dei#aria por isso de serrecebido, mas nem sequer apareceu= E, para lhe não esconder nada,

ou por capricho ou a valer, a criaturinha pareceu&me um tantozangada por essa "alta de ardor da sua parte. Encontrou en"im ummeio de me mandar chamar e obrigou&me a prometer que lheenviaria o mais cedo poss$vel a carta que 'unto. 5elo zelo quemostrou, iria apostar que se trata dum encontro para esta noite. )e'ao que "or, prometi, pela honra e pela amizade, que lhe "aria chegar-s mãos a terna missiva durante o dia, e não posso nem quero "altar- minha palavra.

E agora, 'ovem, que tenciona "azer> 9olocado entre acoqueteria e o amor, entre o prazer e a "elicidade, qual vai ser a suaescolha> )e eu "alasse ainda ao ancenP de há tr!s meses, ou

mesmo de há oito dias, conhecedor do coração dele, s!&lo&ia tambémdas suas decis+es( mas o ancenP de ho'e, arrastado pelasmulheres, entregando&se a aventuras, e tornado, como é costume,um tanto nervoso, pre"erirá ele uma donzela t$mida, que s* tem porsi a beleza, a inoc!ncia e o amor, aos atrativos duma mulhere#periente>

5or mim, meu caro amigo, parece&me que, mesmo dentro dosseus novos princ$pios, que con"esso serem também um pouco osmeus, as circunst8ncias "ar&me&iam decidir pela 'ovem amante.5rimeiro, será mais uma, e depois a novidade, e ainda o temor deperder o "ruto dos seus cuidados desprezando colh!&lo( porque,

en"im, por esse lado, seria de "ato uma oportunidade "alhada, quenem sempre volta, sobretudo se se trata duma primeira "raqueza,

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muitas vezes, neste caso, basta um momento de zanga, umasuspeita de ciúme, menos ainda, para impedir o mais belo triun"o. virtude que se a"oga agarra&se -s vezes aos ramos( mas uma vezsalva, mantém uma certa reserva e não é 'á "ácil de surpreender.

E do outro lado, a"inal que se arrisca> em sequer uma

ruptura( quando muito uma disputa, que, com alguns cuidados,pagará o prazer duma reconciliação. 0ue mais resta a uma mulherque se entregou, a não ser á indulg!ncia> 0ue poderá ganhar com aseveridade> perda dos prazeres, sem proveito para a suareputação.

)e, como suponho, seguir o caminho do amor, que me pareceser também o da razão, creio que será prudente não se desculparpela "alta do encontro( dei#e simplesmente que o esperem, se searrisca a dar uma desculpa é muito poss$vel que tentem veri"icá&la.s mulheres são curiosas e obstinadas( tudo se pode descobrir,acabo, como sabe, de ser v$tima de um e#emplo disso.

7as se lhe dei#ar a esperança, como será alimentada pelavaidade, s* morrerá muito tempo depois do momento prop$cio paraas in"ormaç+es, e então amanhã o meu amigo s* terá de escolher oobstáculo intranspon$vel que o reteve( esteve doente, morto até se"or preciso, ou qualquer outra coisa com que estará igualmentedesesperado, e tudo se arran'ará.

e resto, qualquer que se'a a decisão que tome, peço&lhe s*que me in"orme( e como não tenho qualquer interesse, achareisempre que "ez bem.

deus, meu caro amigo.

crescento ainda que lastimo 7adame de 3ourvel( estoudesesperado por estar separado dela( daria metade da minha vidapela "elicidade de lhe consagrar a restante. h= credite&me, s* oamor nos pode "azer "elizes.

5aris, O de ezembro de CD .

CARTA CLVI

CECíLIA VOLANGES AO CAVALEIRO DANCENY 

L4unta - precedente1

5or que é que acontece, meu caro amigo, que dei#o de o ver,quando não dei#o de lhe querer> ão o dese'a tanto como eu>

h= gora é que estou triste= 7ais triste do que quandoestávamos completamente separados. 2 desgosto que os outros me"aziam so"rer é agora de si que me vem, e isso custa&me muito mais.

esde há uns dias que a 7amã nunca está em casa, bem osabe( e esperava que procurasse aproveitar esse tempo de

liberdade, mas 'á nem sequer pensa em mim( sou muito in"eliz= 3anta vez me disse que era eu que amava menos= Eu bem sabia que

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era o contrário, e eis a prova. )e tivesse vindo ver&me, ter&me&iavisto de "ato, porque eu não sou como o 9avaleiro( penso s* no quenos pode reunir. 7erecia que eu nada lhe dissesse do que "iz paraisso, e que me deu tanto trabalho, mas amo&o demasiado e tenhotanta vontade de o ver, que não posso "ugir a dizer&lhe tudo. E

depois, verei se realmente me tem amor= 3rabalhei tão bem que convenci o porteiro, o qual meprometeu que o dei#ará entrar como se o não visse todas as vezesque venha, e podemos con"iar nele, porque é muito boa pessoa.

 3rata&se apenas de evitar que o ve'am em casa( e isso serámuito "ácil, se s* vier - noite, quando 'á nada há a temer. 5ore#emplo, desde que a 7amã sai todos os dias, deita&se todas asnoites -s onze horas( assim teremos tempo de sobra.

2 porteiro disse&me que quando quiser vir deste modo, emvez de bater - porta, deve bater - 'anela dele e que ele abriráimediatamente( e, depois, achará a escada interior( e como não pode

usar luz, dei#arei a porta do meu quarto entreaberta, o que sempre oiluminará um pouco. 3omará cuidado em não "azer barulho,principalmente ao passar pela porta da 7amã.

0uanto - da minha criada de quarto, não "az mal, porque meprometeu que não acordaria( é também muito boa rapariga= E parase ir embora, será o mesmo. gora, veremos se vem.

7eu eus, por que é que sinto o coração bater tão "orteenquanto lhe escrevo> J porque me vai acontecer algumain"elicidade, ou é a esperança de o ver que assim me perturba> 2que sinto é que nunca o amei tanto, e nunca dese'ei tanto dizer&lho.

?enha, meu amigo, meu querido amigo( para que lhe possarepetir cem vezes que o amo, que o adoro, que s* o amarei a si.chei um meio de mandar dizer ao senhor de ?almont que

precisava "alar&lhe( e ele, como é um bom amigo, virá com certezaamanhã, e vou pedir&lhe que lhe mande logo a minha carta...

Esperá&lo&ei pois amanhã - noite, e virá sem "alta se nãoquiser que a sua 9ec$lia se'a muito in"eliz.

deus, meu caro amigo( bei'o&o com todo o amor.

5aris, I de ezembro de CD .

CARTA CLVII

O CAVALEIRO DANCENY AO VISCONDE DE VALMONT

ão duvide, meu caro ?almont, nem do meu coração, nem domeu procedimento: como poderia eu resistir a um dese'o da minha9ec$lia> h= J certamente ela a única que amo, que sempre amarei= sua ingenuidade, a sua ternura, t!m para mim um encanto de quepude ter a "raqueza de me dei#ar a"astar, mas que nada apagará.

7etido noutra aventura, por assim dizer sem dar por isso, muitasvezes a lembrança de 9ec$lia me veio perturbar mesmo nos mais

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doces prazeres( e talvez nunca o meu coração lhe tenha rendidohomenagens mais verdadeiras do que no pr*prio momento em quelhe era in"iel. 9ontudo, meu amigo, respeitemos a delicadeza dela, eescondamos&lhe os meus erros( não para a iludir, mas para a nãoa"ligir. "elicidade de 9ec$lia é o mais ardente voto que "ormulo(

nunca me perdoaria uma "alta que lhe tivesse custado uma lágrima.7ereci, bem o sinto, as zombarias que me dirige, sobre o quechama os meus novos princ$pios, mas pode crer que não é por elesque me guio neste momento( e a partir de amanhã estou decidido aprová&lo. Fr&me&ei acusar -quela que "oi a causa do meu desvario e opartilhou( dir&lhe&ei: 6@ede no meu coração( ele tem por v*s a maisterna amizade( a amizade unida ao dese'o parece&se tanto com oamor=... Enganámo&nos ambos( mas, suscet$vel de erro, sou incapazde má "é.6 9onheço a minha amiga( é tão honesta como indulgente("ará mais do que perdoar, aprovar&me&á até. Ela pr*pria muitas vezesse censurava por ter tra$do a amizade( muitas vezes a sua

suscetibilidade perturbava o amor. 7ais sensata do que eu,"orti"icará na minha alma esses temores que eu temerariamenteprocurava su"ocar na sua. icar&lhe&ei devendo o ter&me tornadomelhor e a si o ser mais "eliz. N meus amigos= 5artilhem o meureconhecimento.

idéia de que lhes devo a "elicidade aumenta&lhe o valor.deus, meu caro ?isconde. 2 e#cesso de alegria não me

impede de pensar nas suas penas, e de as compartilhar. )e lhepudesse ser útil= 7adame de 3ourvel continua então ine#orável>

izem&na doente. 7eu eus, como tenho pena de si= 2#alá

que ela recupere simultaneamente a saúde e a indulg!ncia, e o "açaeternamente "eliz= )ão os dese'os da amizade( espero que o amor osescute.

ostaria de "alar mais tempo consigo( mas o tempo urge, etalvez 'á 9ec$lia me espere.

5aris, O de ezembro de CD , - noite.

CARTA CLVIII

O VISCONDE DE VALMONT A MARQUESA DE MERTEUIL

Lo despertar1

Então, 7arquesa, que tal os prazeres da noite passada> ;mpouco "atigada> 9oncorde que ancenP é encantador= az prod$gios,esse rapaz= ão esperava isto dele, não é verdade> ?amos, quero ser

 'usto para comigo mesmo( semelhante rival merecia bem que eu lhe"osse sacri"icado. sério, é um rapaz cheio de boas qualidades= 7assobretudo de amor, const8ncia, delicadeza=

h= )e conseguir que ele a ame como ama a sua 9ec$lia,nunca mais terá rivais a temer: ele provou&lhe esta noite. 3alvez, -

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"orça de coqueteria, outra mulher possa roubá&lo por um momento(os 'ovens não sabem resistir a "osquinhas provocantes( mas este'atranqSila, uma palavra s* do ob'eto amado basta, como agora v!,para dissipar as ilus+es( assim s* lhe "alta vir a ser esse ob'eto paraser per"eitamente "eliz.

9ertamente a 7arquesa não "alhará( possui um tatodemasiado seguro para que se possa recear tal. o entanto, aamizade que nos une, tão sincera da minha parte como reconhecidada sua, levou&me a dese'ar&lhe a e#peri!ncia desta noite( "oi obra domeu zelo, que teve um belo !#ito, mas nada de agradecimentos( nãovale a pena, nada podia ser mais "ácil.

o "undo, que me custou> ;m ligeiro sacri"$cio e um pouco dehabilidade. 9onsenti em partilhar com esse 'ovem os "avores daamada dele( mas en"im, ele sempre tinha tantos direitos como eu(esquecera&me disso= carta que ela lhe escreveu, "ui eu que a ditei,mas "oi s* para ganhar tempo, porque bem sab$amos em que o

empregar. que eu pr*prio enviei, oh=, não era nada, quase nada(algumas re"le#+es da amizade para guiar a escolha do novo amante,mas, por minha honra, eram inúteis( a verdade deve dizer&se, ele nãohesitou um momento.

E depois, com toda aquela candura, irá ho'e a sua casa contar&lhe tudo( e certamente essa narrativa lhe agradará = 9omeçaráassim: 6@ede no meu coração6 é o que ele me escreveu, e bem v!que desta "orma tudo se remedeia. Espero que, ao "azer essa leitura,compreenda "inalmente que os amantes demasiado 'ovens t!m osseus perigos( e ainda que mais vale ter&me como amigo do que como

inimigo.deus, 7arquesa( até - primeira ocasião.

5aris, X de ezembro de CD .

CARTA CLIX

A MARQUESA DE MERTEUIL AO VISCONDE DE VALMONT

ão gosto que se acrescentem graças de mal gosto a atitudesdeselegantes( e isso não está mais nos meus hábitos que no meugosto. 0uando tenho motivos de quei#a de alguém, não o escarneço("aço melhor: vingo&me. 5or muito contente que este'a nestemomento, não se esqueça de que não seria a primeira vez que seaplaudiria antecipadamente, na esperança dum triun"o que lheescaparia no pr*prio momento em que se "elicitava.

deus.

5aris, X de ezembro de CD .

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CARTA CLX

MADAME DE VOLANGES A MADAME DE ROSEMONDE

Escrevo do quarto da nossa in"eliz amiga, cu'o estado é mais

ou menos o mesmo. Ao'e - tarde haverá uma con"er!ncia de quatromédicos. 2 que, como sabeis, costuma ser mais uma prova de perigodo que um socorro.

5arece no entanto ter recuperado um pouco de lucidezdurante a noite passada. criada de quarto in"ormou&me estamanhã que, por volta da meia&noite, a sua ama a chamou( quis "icarsozinha com ela, e ditou&lhe uma carta assaz longa. 4úlia acrescentouque, quando estava ocupada a preencher o sobrescrito, o del$rio seapossou de novo de 7adame de 3ourvel de "orma que a rapariga"icou sem saber a quem o remeter. dmirei&me a princ$pio de que apr*pria carta não bastasse para lho revelar, e tendo&me ela

respondido que receara enganar&se e que a 5residente lherecomendara que enviasse a carta imediatamente, tomei a decisãode a abrir.

7ando&vos 'ustamente o que encontrei, e que na verdade nãose dirige a ninguém, visto que se dirige a toda a gente. 9reio noentanto que "oi ao senhor de ?almont que a nossa in"eliz amiga quisprimeiro escrever, mas acabou por ceder, sem dar por isso, -desordem das idéias. 9omo quer que se'a, pensei que esta carta nãodevia ser remetida a ninguém. J a v*s que a envio, pois assimpodereis ver melhor os pensamentos que ocupam o cérebro da nossa

doente. Enquanto permanecer tão vivamente a"etada, não tereiesperanças. 2 corpo di"icilmente se restabelece quando o esp$ritoestá tão pouco tranqSilo.

deus, querida e digna amiga. elicito&vos por estardesa"astada do triste espetáculo que tenho diariamente debai#o dosolhos.

5aris, X de ezembro de CD .

CARTA CLXI

A PRESIDENTE DA TOURVEL A...

Litada por ela e escrita pela criada de quarto1

Ente cruel e mal"aze'o, não dei#arás de me perseguir> ão tebasta teres&me torturado( degradado, aviltado, queres ainda roubar&me a paz do túmulo> 5ois como= esta mansão de trevas onde aignom$nia me obrigou a enterrar&me, as dores não dão tréguas e aesperança é desconhecida> ão imploro um perdão que não mereço,

para so"rer sem me quei#ar, bastará que os so"rimentos nãoe#cedam as minhas "orças. 7as não tornes os tormentos

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insuportáveis. ei#a&me as dores, apaga&me a cruel mem*ria dosbens que perdi. epois de mos roubares, não traces de novo diantedos meus olhos a sua desoladora imagem. Eu era inocente etranqSila( "oi por te ter visto que perdi o repouso( "oi ao escutar&teque me tornei criminosa. utor dos meus erros, que direito tens de

os punir>2nde estão os amigos que me adoravam, onde estão eles> 2meu in"ortúnio horroriza&os. enhum ousa apro#imar&se. )into&meoprimida, e eles dei#am&me sem au#$lio= 7orro, e ninguém melamenta. 3oda a consolação me é recusada. piedade detém&se nasmargens do abismo onde o criminoso mergulha.

2s remorsos dilaceram&no, e os seus gritos não são ouvidos=E tu, a quem ultra'ei( tu, cu'a estima aumenta o meu supl$cio(

tu, que serias a"inal o único a ter o direito de te vingares, que "azeslonge de mim>

?em punir uma mulher in"iel. 0ue eu so"ra "inalmente

tormentos merecidos. 4á me teria submetido - tua vingança( mas"altou&me a coragem de te revelar a tua desonra.

ão "oi por dissimulação, "oi por respeito. 0ue ao menos estacarta te in"orme do meu arrependimento. 2 céu assumiu a de"esa datua causa e vinga&te duma in'úria que ignoravas.

oi ele que me prendeu a l$ngua e me reteve as palavras(receou que me perdoasses uma "alta que ele queria punir.

)ubtraiu&me - tua indulg!ncia, que teria "erido a sua 'ustiça.Fmplacável na sua vingança, abandonou&me -quele que me

desgraçou. Este último é simultaneamente o causador do meu

desvario e o carrasco que me castiga. Em vão lhe quero "ugir(persegue&me( está sempre presente, obceca&me sem cessar. 7ascomo está mudado= 2s olhos e#primem apenas *dio e desprezo.

boca s* pro"ere insultos e censuras. 2s braços, que dantesme abraçavam, querem despedaçar&me. 0uem me salvará do seubárbaro "uror>

7as qu!> J ele... ão me engano( é ele que volto a ver. 2h,meu adorável amigo= colhe&me nos teus braços( esconde&me no teuseio: sim, és tu, és tu mesmo= 5or que "unesta ilusão não te tinhareconhecido> 9omo so"ri com a tua aus!ncia = 2h = ão nosseparemos outra vez. unca mais nos separemos. ei#a&me respirar.

?! como o meu coração bate= h= 4á não é de receio, mas sim dadoce emoção do amor. 5or que te recusas -s minhas ternas car$cias>7ostra&me o teu olhar tão doce= 0ue laços procuras desta maneiraromper> 5ara quem preparas esse cada"also>

0ue é que te transtorna assim a "isionomia> 0ue "azes>ei#a&me: tremo= eus= J outra vez esse monstro=7inhas amigas, não me abandoneis. ?*s que me

aconselháveis a evitá&lo, a'udai&me a combat!&lo( e v*s que, maisindulgente, hav$eis prometido diminuir as minhas dores, vinde poispara 'unto de mim. 2nde estais ambas> )e 'á não é permitido ver&vos, respondei ao menos a esta carta( dizei ao menos que a vossa

amizade é ainda a mesma.

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@arga&me, cruel= 0ue nova "úria te anima> Geceias que umsentimento suave penetre até - minha alma> uplicas os meustormentos( obrigas&me a odiar&te. 2h= 9omo o *dio é doloroso= 9omocorr*i o coração que o destila= 5or que me persegues>

0ue podes ter ainda para me dizer> ão me colocaste na

impossibilidade de te escutar e de te responder> ão esperes maisnada de mim. deus, senhor.

5aris, O de ezembro de CD .

CARTA CLXII

O CAVALEIRO DANCENY AO VISCONDE DE VALMONT

Estou in"ormado, senhor, do vosso procedimento para comigo.)ei também que, não contente por me terdes indignamente

enganado, não receais vangloriar&vos e aplaudir&vos. ?i a prova datraição escrita por vosso punho. 9on"esso que senti o coraçãocompungido, e que tive vergonha de ter contribu$do para o odiosoabuso que "izestes da minha cega con"iança, contudo não vos inve'oeste vergonhoso triun"o( tenho apenas curiosidade de saber se oconservareis no campo da honra. Espero ter a resposta amanhã demanhã, entre as oito e nove horas, se quiserdes aparecer na porta dobosque de ?incennes, aldeia de )aint&7ande. Encarregar&me&ei de a$

"azer aparecer tudo o que "or necessário para os esclarecimentos queme restam obter de v*s.9avaleiro ancenP.

5aris, X de ezembro de CD , - noite.

CARTA CLXII

O SENHOR 5ERTRAND A MADAME DE ROSEMONDE

7inha senhora,

J com grande pena que cumpro o doloroso dever de anunciaruma not$cia que vos vai causar um tão grande desgosto.

5ermiti que e#orte em primeiro lugar essa piedosa resignaçãoque todos admiram por v*s, e que é o único sentimento capaz de nosa'udar a suportar os males de que está semeada a nossa miserávelvida.

2 senhor vosso sobrinho... 7eu eus= ?er&me obrigado aa"ligir uma tão respeitável dama= 2 vosso sobrinho teve a

in"elicidade de sucumbir num combate singular que teve esta manhãcom o 9avaleiro ancenP. Fgnoro inteiramente a causa da disputa(

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mas a"igura&se&me, pelo bilhete que encontrei ainda na algibeira dosenhor ?isconde e que tenho a honra de vos enviar, a"igura&se&me,dizia, que não era ele o agressor. E "oi 'ustamente ele que o céupermitiu que sucumbisse=

Estava eu em casa do senhor ?isconde, esperando&o, no

pr*prio momento em que o trou#eram. Fmaginai a minhaperturbação, ao ver o vosso sobrinho conduzido por dois criados etodo banhado em sangue. Gecebera dois golpes, e 'á se encontravamuito "raco. 2 senhor ancenP estava também presente, e chorava.h= )em dúvida que deve chorar, mas de que serve derramarlágrimas quando se causou uma desgraça irreparável=

Eu por mim não me contive( e apesar do pouco que sou, disse&lhe o que pensava do caso. 7as "oi então que o senhor ?isconde semostrou verdadeiramente grande. 2rdenou que me calasse( agarrouna mão do assassino, chamou&lhe amigo, bei'ou&o diante de todos, edisse&nos: 62rdeno&vos que trateis este senhor com toda a

consideração devida a um homem valente e de brio.6 7andou aindaque lhe entregassem, diante de mim, uns papéis volumosos que nãoconheço, mas de que sei terem para ele muita import8ncia. Emseguida, quis que os dei#assem s*s por um momento. Entretanto eumandara sem demora buscar todos os socorros, tanto espirituaiscomo temporais, mas, ai=, o mal não tinha remédio. 7enos de meiahora depois, o senhor ?isconde perdera o conhecimento. )* p%dereceber a e#trema&unção( e mal a cerim%nia acabara, dava ele oúltimo suspiro.

7eu eus= 0uando recebi nos braços - nascença este

precioso esteio duma ilustre casa, poderia eu prever que seria nosmeus braços que ele e#piraria e que teria de chorar a sua morte>;ma morte tão precoce e tão in"eliz= s lágrimas deslizam&me

mesmo sem eu querer. 5eço&vos perdão, minha senhora, de ousarmisturar a minha dor - vossa, mas em todas as classes se pode tercoração e sensibilidade( e seria muito ingrato se não chorasse toda avida um senhor que tantas atenç+es tinha para comigo, e que mehonrava com a má#ima con"iança.

manhã, depois do "uneral, mandarei selar tudo e podeisdescansar inteiramente nos meus cuidados. ão ignoraiscertamente, minha senhora, que este in"eliz acontecimento anula o

vosso testamento e torna as vossas disposiç+es inteiramente livres.)e vos puder ser de qualquer utilidade, peço&vos que mequeirais dar as vossas ordens, porei todo o meu zelo em as e#ecutarpontualmente.

)ou, com o mais pro"undo respeito, minha senhora, vossomuito humilde, etc.

<ertrand

5aris, D de ezembro de CD .

CARTA CLXIV

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MADAME DE ROSEMONDE AO SENHOR 5ERTRAND

Gecebi a vossa carta mesmo agora, meu caro <ertrand, e porela soube do terr$vel acontecimento de que o meu sobrinho "oi a

in"eliz v$tima. )im, sem dúvida que terei ordens a dar&vos( e s* elasme "arão pensar noutra coisa que não se'a a minha mortal a"lição.2 bilhete do senhor ancenP, que me enviastes, é prova

convincente de que "oi ele o provocador do duelo, e a minha intençãoé que apresenteis quei#a imediatamente em meu nome.

5erdoando ao seu inimigo, ao seu assassino, o meu sobrinhop%de satis"azer a sua natural generosidade( mas cabe&me a mimvingar ao mesmo tempo a sua morte, a humanidade e a religião.

unca será demais e#citar a severidade das leis contra esteresto de selva'aria que ainda in"ecta os nossos costumes( e não creioque o perdão das in'úrias nos possa ser prescrito num caso destes.

Espero pois que seguireis esta questão com todo o zelo e todaa atividade de que vos sei capaz, e que deveis - mem*ria do meusobrinho. 3ratareis, antes de tudo, de ir ter da minha parte com osenhor 5residente de..., e de con"erenciar com ele.

ão lhe escrevo, apressada como estou de me entregarinteiramente - minha dor. presentareis as minhas desculpas, emostrar&lhe&eis esta carta.

deus, meu caro <ertrand( louvo e agradeço os vossos bonssentimentos, e estou para sempre ao vosso dispor.

9astelo de..., U de ezembro de CD .

CARTA CLXV

MADAME DE VOLANGES A MADAME DE ROSEMONDE

)ei que 'á estais in"ormada, minha querida e digna amiga, daperda que acabais de so"rer( conhecia a vossa ternura para com osenhor de ?almont, e partilho sinceramente a a"lição que deveis

sentir. 9usta&me imenso na verdade ver&me "orçada a acrescentarnovas dores -s que 'á so"reis, mas s* vos resta também verterlágrimas pela nossa in"eliz amiga. 5erdemo&la ontem, -s onze horasda noite. 5or uma "atalidade ligada ao seu destino, e que pareciatroçar de toda a prud!ncia humana, o curto intervalo que sobreviveuao senhor de ?almont "oi o bastante para tomar conhecimento damorte dele( e, como ela pr*pria o disse, para sucumbir sob o pesodas suas desgraças, s* depois da medida estar completamentecheia.

9om e"eito, 'á vos in"ormara de que havia dois dias que elaestava absolutamente inconsciente( e ainda ontem de manhã,

quando o médico chegou e nos apro#imamos do leito, não nosreconheceu e não pudemos obter nem uma palavra, nem o menor

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sinal. 5ois bem= 7al nos t$nhamos apro#imado da chaminé, eenquanto o médico me in"ormava do triste acontecimento da mortedo senhor de ?almont, aquela in"eliz mulher recuperou a lucidez, ouporque a natureza sozinha tivesse produzido essa trans"ormação, ouporque "osse causada pelas repetidas palavras de 6senhor de

?almont6 e de 6morte6, que talvez tenham recordado - doente asúnicas idéias de que ela se ocupava de há muito tempo a esta parte.)e'a como "or, abriu precipitadamente as cortinas do leito,

gritando: 62 qu!= 0ue dizeis> 2 senhor de ?almont morreu>6inda tive esperanças de lhe "azer crer que se enganara, e

assegurei&lhe a princ$pio que tinha ouvido mal, mas, longe de sedei#ar convencer, e#igiu que o médico recomeçasse a cruelnarrativa( e vendo que eu procurava ainda dissuadi&la, chamou&me edisse&me em voz bai#a: 65ara qu! querer enganar&me> Ele 'á tinhamorrido para mim=6 oi "orçoso ceder.

nossa in"eliz amiga escutou primeiro com um ar bastante

tranqSilo( mas logo interrompeu a narrativa, dizendo: 6<asta, 'á sei osu"iciente.6 5ediu imediatamente que se "echassem as cortinas( equando o médico lhe quis prestar os cuidados que o seu estadoe#igia, não consentiu que ele se apro#imasse.

ssim que ele saiu, mandou também embora a en"ermeira e acriada de quarto( e quando 'á estávamos s*s, pediu&me que aa'udasse a p%r&se de 'oelhos sobre o leito, e que a segurasse.

5ermaneceu algum tempo em sil!ncio, e sem outra e#pressãoque a das lágrimas que corriam abundantemente. 5or "im, 'untandoas mãos e elevando&as ao céu: 6eus 3odo&5oderoso6, disse ela com

voz "raca mas "ervorosa, 6submeto&me - 3ua 'ustiça( mas perdoa a?almont. 0ue as minhas desgraças, que reconheço merecidas, nãolhe se'am motivo de censura, e bendirei a 3ua miseric*rdia=6.5ermiti&me, minha querida e digna amiga, entrar em pormenoressobre um tal assunto que bem ve'o deve renovar e agravar as vossasdores, apenas porque penso que este rogo de 7adame de 3ourvelserá de grande consolo para a vossa alma.

epois de ter pro"erido estas poucas palavras a nossa amigadei#ou&se cair nos meus braços( e mal voltara a deitá&la, veio&lheuma prolongada "raqueza, que no entanto cedeu aos tratamentoshabituais. ssim que voltou a si, pediu&me que mandasse chamar o

padre nselmo, e acrescentou: 6este momento é o único médico deque preciso( sinto que os meus males vão em breve terminar.6 iziasentir uma opressão e "alava com di"iculdade.

5ouco depois mandou&me entregar, pela criada de quarto, oco"rezinho que vos envio( disse&me que continha papéis pessoais, eencarregou&me de vo&lo enviar logo ap*s a sua morte.

Em seguida "alou&me de v*s, e da vossa amizade por ela,tanto quanto o seu estado lho permitia, e com muita ternura.

2 padre nselmo chegou por volta das quatro horas, e "icouperto de uma hora sozinho com ela. 0uando entramos de novo, orosto da doente estava calmo e sereno( mas era "ácil perceber que o

padre nselmo tinha chorado muito. icou para assistir -s últimascerim%nias da igre'a. Este espetáculo, sempre tão imponente e

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doloroso, "oi&o ainda mais pelo contraste que "ormava a tranqSilaresignação da doente com a dor pro"unda do seu venerávelcon"essor, que se des"azia em lágrimas ao lado dela. comoçãotornou&se geral( e aquela que todos choravam "oi a única a nãochorar.

2 resto do dia passou&se nas habituais rezas, que s* "oraminterrompidas pelos "reqSentes desmaios da doente. inalmente, porvolta das onze da noite, pareceu mais oprimida e a"lita.

vancei a mão para procurar o braço dela( ainda teve "orçaspara a agarrar, e colocou&a sobre o coração. 4á não o senti bater( e,com e"eito, a nossa in"eliz amiga e#pirou nesse mesmo momento.

Gecordais&vos, minha querida amiga, que quando da vossaúltima viagem aqui, há menos de um ano, ao "alarmos de algumaspessoas cu'a "elicidade nos parecia mais ou menos assegurada, nosdetivemos com prazer sobre o destino desta mesma mulher, dequem ho'e choramos simultaneamente as desventuras e a morte>

?irtudes, qualidades louváveis, graças( um caráter tão doce e "ácil(um marido que ela amava, e por quem era adorada, um c$rculo deamigos onde ela se sentia bem, e de que "azia as del$cias( beleza,

 'uventude, "ortuna( tantos dons reunidos e perdidos por uma s*imprud!ncia= 2h, 5rovid!ncia= )em dúvida que devemos adorar osteus decretos( mas como são incompreens$veis= ico&me por aqui(receio aumentar a vossa tristeza, ao entregar&me - minha.

ei#o&vos e vou ver a minha "ilha que está um poucoindisposta. *.ste co+re6inho continha todas as cartas relativas 8 sua aventuracom o senhor de almont

o in"ormá&la esta manhã da morte tão rápida de duaspessoas suas conhecidas, sentiu&se mal e mandei&a deitar&se.

Espero no entanto que este ligeiro inc%modo não teráconseqS!ncias.

aquela idade ainda não se está habituado aos desgostos, e aimpressão que causam é por isso mais viva e "orte.

Esta sensibilidade tão - "lor da pele é sem dúvida umaqualidade louvável( mas como aquilo que vemos todos os dias nosensina a tem!&la=

deus, querida e digna amiga.

5aris, R de ezembro de CD .

CARTA CLXVI

O SENHOR 5ERTRAND A MADAME DE ROSEMONDE

7inha senhora,

Em conseqS!ncia das ordens que me haveis "eito a honra de

dar, encontrei&me com o senhor 5residente de..., comuniquei&lhe avossa carta, prevenindo&o de que, segundo os vossos dese'os, eu

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nada "aria a não ser pelos seus conselhos. 2 respeitável magistradoencarregou&me de vos observar que a quei#a que tendes a intençãode "azer contra o senhor 9avaleiro ancenP comprometeriaigualmente a mem*ria do senhor vosso sobrinho, cu'a honra "icariainevitavelmente manchada pela sentença da corte, o que seria sem

dúvida uma grande in"elicidade. sua opinião é, pois, que se deveevitar semelhante dilig!ncia( e que, se houvesse alguma coisa a"azer, seria pelo contrário tratar de evitar que o 7inistério 5úblicotomasse conhecimento desta in"eliz aventura, que 'á "ez demasiadoru$do.

Estas observaç+es pareceram&me cheias de sabedoria, e tomoa decisão de esperar novas da vossa parte.

5eço&vos, minha senhora, que tenhais a amabilidade de, aoenviar&mas, acrescentar algumas linhas sobre o vosso estado desaúde, de que receio e#tremamente a reação a tantas desgraças.

Espero que perdoareis esta liberdade - minha dedicação e

zelo.)ou com respeito, minha senhora, vosso, etc.

5aris, CV de ezembro de CD .

CARTA CLXVII

AN6NIMA AO SENHOR CAVALEIRO DANCENY )enhor,

 3enho a honra de vos prevenir de que se "alou, esta manhã,no tribunal da corte, entre os "uncionários de El&Gei, do duelo quetravastes nestes últimos dias com o senhor ?isconde de ?almont, e éde recear que o 7inistério 5úblico apresente quei#a.

5ensei que este aviso vos podia ser útil, quer para que "açaisagir os vossos protetores a "im de evitar conseqS!nciasdesagradáveis( quer, no caso de isso não ser poss$vel, para estardes

em posição de vos de"enderdes. )e me permitis um conselho, creioque "ar$eis bem, durante algum tempo, em aparecerdes menos vezesem público do que o tendes "eito ultimamente. )e bem quegeralmente se se'a indulgente para com casos destes, deve&se aomenos esse respeito para com a lei.

Esta precaução torna&se tanto mais necessária quanto mechegou aos ouvidos que uma certa 7adame de Gosemonde, que mea"irmam ser tia o senhor de ?almont, queria apresentar quei#acontra v*s, e então o 7inistério 5úblico não poderia dei#ar de tomaro assunto em mãos. 3alvez "osse conveniente que consegu$sseisintervir 'unto dessa dama.

7otivos particulares impedem&me de assinar esta carta.

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7as espero que, ignorando embora donde ela vos vem, nãodei#areis ao menos de prestar 'ustiça ao sentimento que a ditou.

 3enho a honra de ser, etc.

5aris, CV de ezembro de CD .

CARTA CLXVIII

MADAME DE VOLANGES A MADAME DE ROSEMONDE

Espalham&se por aqui, minha querida e digna amiga, acercade 7adame de 7erteuil, boatos bastante estranhos e muitolastimáveis.

Evidentemente estou bem longe de os crer, e apostaria até

que não passam de horr$veis calúnias( mas sei demasiado bem comoeste g!nero de maldades, mesmo as menos veross$meis, adquirem"acilmente consist!ncia, e como a impressão que dei#am se apagadi"icilmente, para não estar alarmada com estas, embora eu 'ulgue"ácil destru$&las. ese'aria, sobretudo, que "osse poss$vel sust!&lasdesde 'á, e antes que se tivessem espalhado mais. )* ontem soube,demasiado tarde, os horrores que se começam por a$ a dizer( equando mandei esta manhã um criado a casa de 7adame de7erteuil, acabara ela de partir para o campo, onde deve passar doisdias. ão me souberam dizer para casa de quem tinha ido. criada,

com quem "alei, disse&me que a sua ama lhe ordenara que s* aesperasse na pr*#ima quinta&"eira( e nenhum dos criados que elaaqui dei#ou sabia mais qualquer coisa. Eu pr*pria não sou capaz deadivinhar onde possa estar( não me recordo de nenhum dos seusconhecimentos que este'a no campo até tão tarde.

9omo quer que se'a, podereis, assim o espero, conseguir&me,daqui até ao seu regresso, os esclarecimentos que lhe podem serúteis, porque "undamentam estas odiosas hist*rias sobre ascircunst8ncias da morte do senhor de ?almont, das quais suponhodeverei ter sido in"ormada se são verdadeiras, ou que pelo menosvos será "ácil esclarecer, "avor que muito vos peço.

Eis o que espalham( ou, pelo menos, o que por enquanto semurmura apenas, mas que não tardará certamente a dar mais brado.iz&se que a querela surgida entre o senhor de ?almont e o

9avaleiro ancenP é obra de 7adame de 7erteuil, que os enganavaigualmente a ambos( que, como quase sempre acontece, os doisrivais começaram por se bater, e s* depois é que, entre si,descobriram a verdade, daqui resultou uma reconciliação sincera( eque para acabar de revelar a verdadeira 7adame de 7erteuil ao9avaleiro ancenP, e também para se 'usti"icar inteiramente, osenhor de ?almont 'untou -s suas palavras um grande maço decartas, constituindo a correspond!ncia que mantinha regularmente

com ela, e em que esta conta sobre si pr*pria, e no mais audaciosodos estilos, as anedotas mais escandalosas que se possam imaginar.

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crescenta&se que ancenP, na sua primeira indignação,entregou as cartas a quem as quis ver, e que circulam agora por5aris. 9itam&se particularmente duas: uma onde ela narra a inteirahist*ria da sua vida e dos seus princ$pios, e que dizem ser o cúmulodo horror( a outra, que iliba totalmente o senhor de 5révan, de cu'a

hist*ria certamente vos recordais, pela prova que contém de que eleapenas cedeu a n$tidas provocaç+es de 7adame de 7erteuil, e que oencontro estava combinado com ela.

 3enho "elizmente "ortes raz+es para crer que estas acusaç+essão tão "alsas como odiosas. 5rimeiro, sabemos ambas que o senhorde ?almont não se ocupava com certeza de 7adame de 7erteuil, etenho todo o motivo para crer que ancenP não lhe dava maisatenção, parece&me assim demonstrado que ela não podia ser nem omotivo, nem a autora da desavença. ão compreendo igualmenteque interesse teria tido 7adame de 7erteuil, que sup+em de acordocom 5révan, em "azer uma cena que s* poderia ser desagradável

pelo seu esc8ndalo, e que poderia vir a ser muito perigosa para ela,visto que *&artas 0444 e 0444 desta coleção!" do #2arran'ava assim um inimigo irreconciliável que "icava senhor de umaparte do seu segredo, e que possu$a então muitos partidários. oentanto, é caso para pensar que, depois desta aventura, não setenha levantado uma única voz a "avor de 5révan, e que, mesmo dasua parte, não tenha havido qualquer reação.

Estas re"le#+es levar&me&iam a suspeitá&lo de ser o autor dosboatos que correm, e a considerar estas in"8mias como obra do *dioe da vingança dum homem que, vendo&se perdido, esperava por este

meio espalhar pelo menos dúvidas, e desviar as atenç+es, o quetalvez lhe convenha. 7as qualquer que se'a a origem destasmaldades, o mais urgente é destru$&las. 9airiam por si pr*prias se sedescobrisse, como é veross$mil, que os senhores de ?almont eancenP não se "alaram ap*s o in"eliz duelo, e que não houvenenhuma entrega de papéis.

a minha impaci!ncia de veri"icar os "atos, enviei esta manhãum criado a casa do senhor ancenP( mas também não se encontraem 5aris. 2s seus criados disseram ao meu que ele partira nessanoite, por causa dum aviso que recebera ontem, e que se encontravaem lugar secreto. parentemente receia as conseqS!ncias da

questão. J pois s* por v*s, minha querida e digna amiga, que possoobter os pormenores que me interessam, e que tão necessáriospodem vir a ser a 7adame de 7erteuil.

Genovo os meus pedidos para que mos "açais chegar -s mãoso mais cedo poss$vel.

5. ). & indisposição de minha "ilha não teve conseqS!ncias( elaapresenta&vos os seus respeitos.

5aris, CC de ezembro de CD .

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CARTA CLXIX

O CAVALEIRO DANCENY A MADAME DE ROSEMONDE

7inha senhora,

 3alvez acheis a decisão que ho'e tomo um pouco estranha(mas, suplico&vos, escutai&me antes de me 'ulgar, e não ve'ais audáciae temeridade onde s* e#istem respeito e con"iança. ão ignoro aculpa de que sou réu a vossos olhos( e nunca ma perdoaria a mimpr*prio, se pudesse pensar por um momento que me teria sidoposs$vel evitá&la. 5odeis mesmo ter a certeza, minha senhora, de queo "ato de me considerar isento de censura não me inibe dedesgostos( e posso ainda acrescentar com sinceridade que aquelesque vos causo contam muito entre os que sinto. 5ara que acrediteisnestes sentimentos que ouso e#por diante de v*s, deve bastar&vos

que vos preste 'ustiça, e que saibais que, sem ter a honra de ser porv*s conhecido, tenho no entanto a de vos conhecer.

9ontudo, quando gemo sob a "atalidade que causousimultaneamente os vossos desgostos e a minha in"elicidade,querem "azer&me recear que, inteiramente entregue - vingança, v*sprocurareis os meios de a satis"azer, recorrendo até - severidade dalei.

5ermiti que vos observe que a este respeito a vossa dor vosengana, visto que neste ponto o meu interesse está essencialmenteligado ao do senhor de ?almont, que se encontraria envolvido ele

pr*prio na condenação que ter$eis provocado contra mim. 4ulgaria eu,minha senhora, poder pelo contrário contar mais com o vosso au#$liodo que com a vossa oposição, nos cuidados que eu poderia vir a serobrigado a tomar para que este in"eliz acontecimento permanecesseenvolto em sil!ncio.

7as este recurso de cumplicidade, que convém igualmente aoculpado e ao inocente, não satis"az a minha delicadeza( e dese'andoa"astar&vos como parte, reclamo&vos como 'uiz. estima das pessoasque respeitamos é demasiado preciosa para que eu me dei#ee#poliar da vossa sem a de"ender, e creio que possuo os meios paratal.

e "ato, se concordais que a vingança nos é permitida,digamos melhor, que temos a obrigação de a e#ercer, quando se "oitra$do no seu amor, na sua amizade, e, sobretudo, na sua con"iança(se concordais com isto, os meus erros vão desaparecer a vossosolhos. ão acrediteis nas minhas palavras( mas lede, se para tantotiverdes coragem, a correspond!ncia que deposito em vossas mãos. quantidade de cartas a$ inclu$das em original parece dar o direitode supor como aut!nticas as de que s* e#istem c*pias. e resto,recebi estes papéis, tais como tenho a honra de vo&los enviar, dopr*prio senhor de ?almont.

ada acrescentei, e tirei apenas duas cartas que me autorizei

a publicar.

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;ma era necessária - comum vingança do senhor de ?almonte minha, - qual ambos t$nhamos direito, e de que ele meencarregara e#pressamente. chei, de resto, que era prestar umverdadeiro serviço - sociedade desmascarar uma mulher tãorealmente perigosa como é 7adame de 7erteuil, e que, como

podereis ver, é a única, a verdadeira causadora de tudo o que sepassou entre mim e o senhor de ?almont.;m sentimento de 'ustiça levou&me também a publicar a

segunda, para 'usti"icação do senhor de 5révan, que mal conheço,mas que não merecia de "orma alguma o tratamento rigoroso queacaba *1oi com esta correspondência, com a entregue igualmente por ocasião damorte de )adame de /ourvel, e com as cartas con+iadas também a )adame de:osemonde por )adame de olanges, que se +ormou a presente recolha, cu-osoriginais subsistem nas mãos dos herdeiros de )adame de :osemondede so"rer, nem a severidade dos 'u$zos do público, mais tem$vel aindae sob a qual geme desde então, sem nada ter com que se de"enda.

Encontrareis pois apenas as c*pias destas duas cartas, de queme ve'o "orçado a guardar os originais. 0uanto ao resto, não creiopoder colocar em mãos mais seguras um dep*sito que me interessanão se'a destru$do, mas de que me envergonharia de abusar. 9reio,minha senhora, ao con"iar&vos estes papéis, servir tão bem aspessoas a quem dizem respeito, como se os tivesse enviado a elaspr*prias( e poupo&lhes o embaraço de os receberem de mim, e de mesaberem in"ormado de aventuras que, sem dúvida, dese'am quetodos ignorem.

5arte duma coleção bem mais volumosa, donde o senhor de?almont a tirou na minha presença, e que encontrareis quando os

selos "orem tirados, sob o t$tulo, que eu vi, de 9onta aberta entre a7arquesa de 7erteuil e o ?isconde de ?almont.

 3omareis, a este respeito, a decisão que a prud!ncia vossugerir.

)ou com respeito, minha senhora, o vosso, etc.

5. ). & lguns avisos que recebi e os conselhos dos amigos decidiram&me a ausentar&me de 5aris por algum tempo, mas o meu esconderi'o,secreto para toda a gente, não o será para v*s.)e me honrardes com uma resposta, peço&vos que a envieis para a9omendadoria de..., por intermédio de 5..., e ao cuidado do senhor9omendador de... J de casa dele que tenho a honra de vos escrever.

5aris, CT de ezembro de CD .

CARTA CLXX

MADAME DE VOLANGES A MADAME DE ROSEMONDE

9aminho, cara amiga, de surpresa em surpresa, e de desgostoem desgosto. )* uma mãe pode imaginar o que ontem so"ri durante

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toda a manhã( e embora as mais cruéis inquietaç+es se tenhamacalmado depois, resta&me ainda uma grande a"lição a que não ve'oo "im.

2ntem, pelas dez da manhã, admirada por a minha "ilha nãoter ainda aparecido, mandei a minha criada de quarto descobrir qual

seria a causa do atraso. ?eio um momento depois muito assustada, eassustou&me ainda mais, comunicando&me que a minha "ilha nãoestava nos seus aposentos( e que desde manhã que a criada dela anão encontrava. Fmagine a minha situação= 7andei reunir todos oscriados e o porteiro, e todos me 'uraram não saber nada e nadapoder dizer&me sobre o acontecimento.

5assei pelo quarto da minha "ilha. desordem que a$ reinavamostrou&me claramente que s* sa$ra de manhã, mas não encontreimais nenhum esclarecimento. E#aminei os armários e a secretária(encontrei tudo no lugar e todos os tra'os, com e#ceção do vestidocom que sa$ra. em sequer levara o pouco dinheiro que tinha com

ela.9omo s* ontem ela tivera conhecimento do que se diz acerca

de 7adame de 7erteuil, e lhe era dedicada, a ponto de ter choradodurante todo o serão, lembrei&me que ela ignorava que 7adame de7erteuil estava no campo, e a minha primeira idéia "oi que tivessequerido ir ver a amiga, e cometido a loucura de ir sozinha. 7as otempo, que corria sem que ela voltasse, mergulhou&me de novo emterr$veis inquietaç+es. 9ada instante aumentava a minha a"lição( e,ardendo por saber a verdade, não ousava tentar in"ormar&me, comterror de dar a conhecer uma dilig!ncia que, talvez, depois pre"erisse

ter escondido de todos.ão, nunca so"ri tanto na minha vida.En"im, 'á passava das duas, quando recebi ao mesmo tempo

uma carta da minha "ilha e outra da )uperiora do convento de... carta de 9ec$lia dizia apenas que temia que eu me opusesse - suavocação religiosa, e que não ousara "alar&me em tal( o resto eram s*desculpas por ter tomado, sem minha licença, aquela decisão, que eunão desaprovaria decerto, acrescentava, se lhe conhecesse osmotivos, que no entanto me pedia que não tentasse descobrir.

)uperiora contava&me que, tendo visto chegar uma 'ovems*, se recusara primeiro a receb!&la( mas que, depois de a interrogar

e saber quem ela era, 'ulgara prestar&me um serviço, começando pordar asilo - minha "ilha, para a não obrigar a novas dilig!ncias, a queparecia estar resolvida. )uperiora, o"erecendo&se como erarazoável para me entregar a minha "ilha, se eu a reclamar, e#orta&me, como convém - sua posição, a não me opor a uma vocação queconsidera tão decidida( dizia&me ainda que não me pudera in"ormarmais cedo do sucedido, devido - di"iculdade que tivera em conseguirque a minha "ilha me escrevesse, porque o pro'eto dela era, segundome in"orma, que todos ignorassem para onde se retirara. J bem cruela obstinação dos 'ovens=

irigi&me imediatamente a esse convento( e depois de ter

visto a superiora, pedi&lhe que me dei#asse ver a minha "ilha( estaconsentiu em vir a muito custo, e toda tr!mula. alei&lhe diante das

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religiosas, e s*, tudo o que consegui arrancar&lhe, entre muitaslágrimas, é que nunca poderia ser "eliz senão no convento( tomei adecisão de a dei#ar "icar, mas ainda sem "azer parte das noviçascomo me pedia. Geceio que a morte de 7adame de 3ourvel e a dosenhor de ?almont tenham a"etado de algum modo esta cabeça tão

 'ovem. 5or muito respeito que tenha pela vocação religiosa, nãoveria sem pena, e até sem temor, a minha "ilha tomar um talcaminho. 5arece&me que temos 'á bastantes deveres a cumprir,mesmo sem procurarmos mais( e ainda que não é naquela idade quesabemos o que nos convém.

2 que aumenta o meu embaraço é o pr*#imo regresso dosenhor de ercourt( será preciso romper este casamento tãovanta'oso> 9omo dar a "elicidade aos "ilhos, se não basta dese'á&la edispensar&lhe todos os cuidados> icar&vos&ia muito agradecida seme dissésseis como preceder$eis no meu lugar( não posso tomarnenhuma decisão. ada me aterroriza tanto como ter de decidir do

destino dos outros, e temo igualmente empregar nesta ocasião aseveridade do 'uiz e a "raqueza da mãe.

cuso&me de aumentar os vossos desgostos "alando&vos dosmeus( mas conheço o vosso coração, a consolação que dais aosoutros torna&se para v*s na maior que poder$eis receber.

deus, querida e digna amiga( espero as duas respostas comgrande impaci!ncia.

5aris, CB de ezembro de CD .

CARTA CLXXI

MADAME DE ROSEMONDE AO CAVALEIRO DANCENY 

epois do que me deu a conhecer, senhor, resta&me chorarem sil!ncio. @amentamos vivermos ainda, quando sabemossemelhantes horrores( coro de ser mulher quando ve'o uma capaz desemelhantes e#cessos.

9oncordo, senhor, em pelo meu lado dei#ar no sil!ncio e

esquecimento tudo o que possa re"erir&se ou dar seguimento a estestristes acontecimentos. ese'o até que eles vos não causem maisnenhuns desgostos além dos resultantes da in"eliz vit*ria quetivestes sobre meu sobrinho. pesar dos erros que sou "orçada areconhecer nele, sinto que nunca me consolarei da sua perda, mas aminha eterna mágoa será a única vingança que me permitirei sobrev*s( cabe ao vosso coração apreciar&lhe a grandeza.

)e permitis - minha idade uma re"le#ão que se não "az navossa, é que, se estivéssemos esclarecidos quanto - nossaverdadeira "elicidade, não a procurar$amos "ora dos limites prescritospelas leis e pela religião.

5odeis estar certo de que guardarei "ielmente o dep*sito queme con"iastes, mas peço&vos que me autorizeis a não o dar a

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ninguém, nem a v*s, senhor, a não ser que se'a necessário paravossa 'usti"icação. 2uso crer que vos não recusareis a esta súplica, eque sentis que muitas vezes se so"re por nos termos dei#adoarrastar, mesmo pela mais 'usta vingança.

ão me atardo mais em pedidos, de tão persuadida que estou

da vossa generosidade e delicadeza( seria digno de ambos depositartambém nas minhas mãos as cartas de 7ademoiselle de ?olanges,que parece que conservais e que certamente vos não interessam 'á.)ei que esta menina cometeu muitas "altas para convosco( mas não

 'ulgo que penseis em a castigar, e, pelo menos por respeito por v*spr*prio, não aviltareis um ob'eto que tanto amastes. em precisoacrescentar que a consideração que a "ilha não merece é devida -mãe, essa respeitável dama, em relação - qual algo tendes areparar, porque, en"im, mesmo que procuremos 'usti"icar&nos poruma pretensa delicadeza de sentimentos, aquele que primeiro tentaseduzir um coração ainda honesto e simples torna&se o primeiro

incitador - sua corrupção, e para sempre responsável dos desvariose e#cessos que se lhe seguem.

ão vos admireis, senhor, de encontrar tanta severidade domeu lado( é a maior prova que vos posso dar da minha inteiraestima. Esta aumentará ainda se aceitardes, como dese'o, guardarum segredo, cu'a repercussão vos pre'udicaria e traria a morte a umcoração maternal, que 'á "eristes. En"im, senhor, dese'o prestar esteserviço - minha amiga( e se receasse que me recusásseis estaconsolação, pedir&vos&ia que meditásseis primeiro que é a única queme dei#astes.

 3enho a honra de ser. etc.o castelo de..., CO de ezembro de CD .

CARTA CLXXII

MADAME DE ROSEMONDE A MADAME DE VOLANGES

)e tivesse sido obrigada, minha querida amiga, a mandar vir e

a esperar de 5aris os esclarecimentos que me pedis a respeito de7adame de 7erteuil, ainda não me seria poss$vel dar&vos&los( e semdúvida s* teria recebido in"ormaç+es vagas e incertas, mas vieram&me donde as não esperava, donde menos as poderia esperar( e estassão absolutamente certas. 2h, minha amiga= 9omo essa mulher vosenganou=

Gepugna&me entrar em pormenores sobre este amontoado dehorrores( mas, se'a o que "or que se diga, podeis ter a certeza queainda se está longe da verdade. Espero, minha querida amiga, queme conheçais o su"iciente para acreditar na minha palavra( que nãoe#igireis de mim nenhuma prova( que vos bastará saber que e#istem

em abund8ncia, e que as tenho neste momento entre mãos.

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J com uma imensa dor que vos peço que não me obrigueis a 'usti"icar o conselho que me pedis, relativamente a 7ademoiselle de?olanges. Gogo&vos que não vos oponhais - vocação que ela mostra.9ertamente nenhum motivo vos pode autorizar a "orçar alguém atomar semelhante decisão, quando o interessado não se sente

chamado, mas -s vezes é uma grande "elicidade que ele sinta oapelo divino( e bem vedes que a vossa pr*pria "ilha vos diz que não adesaprovar$eis, se soubésseis os motivos dela. quele que inspira osnossos sentimentos sabe melhor que a nossa vã sabedoria o queconvém a cada um, e muitas vezes o que parece um ato da suaseveridade, é, pelo contrário, uma mani"estação de clem!ncia.

En"im, a minha opinião, que bem sei que vos a"ligirá, e porisso mesmo deveis crer que não vo&la dou sem ter re"letido, é de quedei#eis 7ademoiselle de ?olanges "icar no convento, visto ser essa asua escolha( que encora'eis, em vez de contrariar, o pro'eto que elaparece ter "ormado( e que, enquanto se espera pela e#ecução do

mesmo, não deveis hesitar em romper o casamento que t$nheiscombinado.

epois de ter preenchido estes penosos deveres da amizade ena impossibilidade em que me encontro de acrescentar qualquerconsolação, resta&me, querida amiga, pedir&vos a graça de nuncamais me interrogardes sobre nada que este'a relacionado com estestristes acontecimentos,dei#emo&los esquecer, como merecem( e semprocurar inúteis e terr$veis esclarecimentos submetamo&nos aosdecretos da 5rovid!ncia, con"iemos na sabedoria das suas decis+es,mesmo quando ela não permite que as compreendamos.

deus, minha querida amiga.9astelo de, CO de ezembro de CD .

CARTA CLXXIII

MADAME DE VOLANGES A MADAME DE ROSEMONDE

2h, minha amiga= 9om que véu assustador envolveis o

destino da minha "ilha= E pareceis temer que eu tente levantá&lo=0ue me esconde ele pois, que possa a"ligir ainda mais ocoração de uma mãe do que as horr$veis suspeitas a que meabandonais>

0uanto mais conheço a vossa amizade, a vossa indulg!ncia,mais os tormentos redobram, vinte vezes, desde ontem, quis sairdesta cruel incerteza e pedir&vos que me in"ormásseis semconsideraç+es nem desvios( e de cada vez tremi de medo, pensandono pedido que me haveis "eito de não vos interrogar. En"im, tomouma decisão que me dei#a ainda alguma esperança( e espero que avossa amizade não se recusará ao meu pedido: é que me in"ormeis

se compreendi apro#imadamente o que me quer$eis dizer( que nãoreceeis revelar&me tudo o que a indulg!ncia materna pode cobrir, e

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que não se'a imposs$vel de emendar. )e as minhas desgraçase#cedem esta medida então consinto com até onde os meus receiospodem ir.

7inha "ilha mostrou ter certa simpatia pelo 9avaleiroancenP, e "ui in"ormada de que chegou a receber cartas dele, e até

a responder&lhe( mas supunha ter conseguido impedir que este errode criança tivesse conseqS!ncias perigosas( ho'e, que tudo receio,concebo que teria sido poss$vel enganar a minha vigil8ncia, e temoque a minha "ilha, seduzida, tenha levado os seus desvarios aocúmulo.

Gecordo&me ainda de certas circunst8ncias que parecem"orti"icar este receio. Fn"ormei&vos de que minha "ilha se sentiu malao receber a not$cia da desgraça acontecida ao senhor de ?almont(talvez esta reação tivesse apenas por causa a idéia dos riscos que osenhor ancenP tinha corrido no combate. epois, quando elachorou tanto ao saber o que se dizia a respeito de 7adame de

7erteuil, talvez o que interpretei como sendo a dor da amizade "osseapenas o e"eito do ciúme ou da pena de descobrir que o seu amadolhe era in"iel. sua última decisão pode também, parece&me,e#plicar&se pelo mesmo motivo. 7uitas vezes supomo&nos chamadaspara eus, apenas porque nos sentimos revoltadas contra oshomens. En"im, supondo que estes "atos se'am verdadeiros, e que osconheci, será poss$vel, sem dúvida, que os acheis su"icientes para

 'usti"icar o conselho rigoroso que me haveis dado.9ontudo, se assim "osse, e embora censurando minha "ilha,

pensaria no entanto dever tentar ainda todos os meios para a salvar

dos tormentos e dos perigos inseparáveis duma vocação ilus*ria epassageira. )e o senhor ancenP não perdeu por completo a noçãoda honestidade, não se recusará a reparar um erro de que s* ele éautor( e creio en"im que o casamento com minha "ilha se'asu"icientemente vanta'oso para que ele e a "am$lia se sintamlison'eados.

Eis, querida e digna amiga, a única esperança que me resta(apressai&vos a con"irmá&la, se tal é poss$vel. divinhais como anseiopela vossa resposta, e golpe terr$vel signi"icaria o vosso sil!ncio.

Fa "echar a carta, quando um cavalheiro meu conhecido meveio visitar e me contou a cena cruel por que 7adame de 7erteuil

passou anteontem. 9omo não recebi ninguém nestes últimos dias, denada sabia até este momento( eis a hist*ria, tal como ma narrouuma testemunha ocular.

7adame de 7erteuil, ao chegar do campo, antes de ontem,quinta&"eira, dirigiu&se - 69omédia Ftaliana6, onde tinha o seucamarote( estava sozinha, e, o que lhe deve ter parecido estranho,nenhum homem a "oi cumprimentar durante todo o espetáculo.

H sa$da, entrou, como era seu costume, no pequeno salão que 'á estava cheio de gente( imediatamente se levantou um rumor, deque aparentemente não se sup%s ob'eto. vistou um lugar vago numdos bancos, e sentou&se( mas logo todas as mulheres que a$ se

encontravam se levantaram como de acordo e dei#aram&naabsolutamente s*. Este n$tido movimento de indignação geral "oi

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aplaudido por todos os homens e "ez aumentar os murmúrios, que,dizem, "oram até -s vaias.

5ara que nada "altasse - sua humilhação, teve o azar de osenhor 5révan, que ainda não tinha aparecido em parte algumadepois da sua aventura, entrar nesse momento no pequeno salão.

ssim que o viram, toda a gente, homens e mulheres, ocercou e aplaudiu( achou&se, por assim dizer, transportado paradiante de 7adame 7erteuil, pelo público que "azia c$rculo em voltadeles. "irmam que 7adame de 7erteuil conservou o ar de quem nãov! nem ouve coisa alguma, e que nem sequer o rosto se lhe alterou,mas creio que é e#agero.

e qualquer "orma, esta situação, verdadeiramenteignominiosa para ela, durou até ao momento em que anunciaram asua carruagem( - partida, os apupos escandalosos redobraram. Jhorr$vel ser&se ainda parente desta mulher. 2 senhor de 5révan "oi,nessa mesma noite, muito bem acolhido por todos os o"iciais do seu

regimento que a$ se encontravam, e ninguém duvida que em brevelhe restituirão o cargo e o posto.

mesma pessoa que me contou tudo isto disse&me que7adame de 7erteuil teve, na noite seguinte, um "orte ataque de"ebre, que se sup%s a princ$pio ser o e"eito da situação violenta emque se encontrava( mas 'á se sabe, desde ontem - noite, que sedeclarou um ataque de var$ola, con"luente e com grande virul!ncia.

a verdade creio que morrer seria para ela uma "elicidade.iz&se ainda que toda esta aventura a pre'udicará muito no

seu processo, que está prestes a ser 'ulgado e no qual se pretende

que ela tinha necessidade que a "avorecessem.deus, minha querida e digna amiga. ?e'o que os maus "oramcastigados, mas não encontro nisso nenhum consolo para as in"elizesv$timas.

5aris, CU de ezembro de CD .

CARTA CLXXIV

O CAVALEIRO DANCENY A MADAME DE ROSEMONDE

 3endes razão, minha senhora, e certamente não vos recusareinada que dependa de mim e a que parecerdes atribuir qualquervalor. 2 maço que tenho a honra de vos enviar contém todas ascartas de 7ademoiselle de ?olanges. )e as lerdes, vereis comespanto como se pode reunir tanta ingenuidade e tanta per"$dia. J,pelo menos, o que mais me impressionou na última leitura que acabode "azer.

7as, podemos sobretudo dei#ar de sentir a mais vivaindignação contra 7adame de 7erteuil, quando nos recordarmos do

horroroso prazer com que aplicou todos os cuidados em abusar detanta inoc!ncia e candura>

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ão, 'á não amo. ada conservo dum sentimento tãoindignamente tra$do( e não é ele que me leva a procurar 'usti"icar7ademoiselle de ?olanges. o entanto, esse coração tão simples,esse caráter tão doce e "ácil, não se dei#ariam levar para o bem,mais "acilmente ainda do que o "oram para o mal> 0ue outra 'ovem,

saindo do mesmo convento, sem e#peri!ncia e quase sem idéias, etrazendo para o mundo, como quase sempre acontece, uma igualignor8ncia do bem e do mal( que outra, dizia eu, teria podido resistirmelhor a tão condenáveis arti"$cios>

h, para ser indulgente, basta re"letir a quantas circunst8nciasindependentes de n*s se encontra ligada a alternativa assustadorada delicadeza ou da depravação dos nossos sentimentos.

ar&me&$eis pois 'ustiça, minha senhora, pensando que oserros de 7ademoiselle de ?olanges, que sem dúvida sentivivamente, não me inspiram contudo qualquer idéia de vingança. 4ábasta ser obrigado a renunciar a amá&la= 9ustar&me&ia demasiado

odiá&la.ão precisei de re"letir para dese'ar que tudo o que lhe diz

respeito, e que a poderia pre'udicar, "icasse para todo o sempreignorado por toda a gente. )e na apar!ncia adiei durante algumtempo a realização dos vossos dese'os a este respeito, creio poderrevelar&vos o motivo( quis esperar até ter a certeza de que não seriaincomodado pelas conseqS!ncias deste in"eliz caso.

a altura em que pedia a vossa indulg!ncia, a que ousavacrer&me mesmo com alguns direitos, receei ter o aspecto de acomprar por esta condescend!ncia da minha parte( e certo da pureza

dos meus motivos, tive, con"esso&o, o orgulho de querer que nãopudésseis duvidar deles. Espero que me perdoareis este escrúpulo,talvez demasiado suscet$vel, pela veneração que me inspirais e pelaimport8ncia que esta me leva a atribuir - vossa estima.

2 mesmo sentimento me "az pedir&vos, como última graça,que me in"ormeis se achais que preenchi todos os deveres que meimpuseram as in"elizes circunst8ncias em que me encontrei.

;ma vez tranqSilo a este respeito, a minha decisão estátomada( parto para 7alta. Frei com prazer, e a$ guardareireligiosamente os votos que me separarão dum mundo do qual, tãonovo ainda, 'á tenho tanto a quei#ar&me( irei en"im procurar

esquecer, sob um céu estrangeiro, a lembrança de tantos horroresacumulados, e cu'a recordação s* poderia entristecer e torturar&me aalma.

)ou com respeito, minha senhora, etc.

5aris, TX de ezembro de CD .

CARTA CLXXV

MADAME DE VOLANGES A MADAME DE ROSEMONDE

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2 destino de 7adame de 7erteuil parece cumprir&se"inalmente, minha querida e digna amiga( e é de tal sorte que osseus maiores inimigos estão divididos entre a indignação que elamerece, e a piedade que inspira. 3inha razão ao dizer que seria paraela uma "elicidade morrer da var$ola. 9urou&se, é verdade, mas "icou

horrivelmente des"igurada( por cúmulo, perdeu um olho. ão a volteia ver( mas disseram&me que está verdadeiramente hedionda.2 7arqu!s de..., que não perde ocasião para uma maldade,

dizia ontem, "alando dela, que a doença a virara do avesso, e quetinha agora a alma estampada no rosto. Fn"elizmente todos acharamque a e#pressão era 'usta.

;m outro acontecimento vem acrescentar&se -s desgraças eaos erros dela. 2 processo "oi 'ulgado anteontem, e perdeu&o porunanimidade. 9oube&lhe o pagamento das custas, danos e 'uros, e "oi"orçada a restituir os bens aos menores( de "orma que o pouco da"ortuna dela que não estava comprometido no processo "oi

absorvido, e até para mais, pelas despesas.ssim que soube esta not$cia, embora ainda doente, "ez os

seus preparativos e partiu de noite, sozinha e pela mala&posta.2s criados dizem ho'e que nenhum a quis seguir. 9r!&se que

tomou o caminho da Aolanda.Esta partida ainda "ez mais barulho que todo o resto( visto

que levou os diamantes, coisa de muito valor, e que deviam serintegrados na herança do marido( as pratas, as '*ias( en"im, tudo oque p%de, dei#ando perto de OVVVV libras de d$vidas.

;ma verdadeira bancarrota.

"am$lia deve reunir&se amanhã para chegar a acordo com oscredores. )e bem que parente muito a"astada, o"ereci o meuconcurso( mas não estarei presente - reunião, pois devo assistir auma cerim%nia muito mais triste. minha "ilha toma amanhã ohábito de noviça. Espero que não esquecereis, querida amiga, que,neste grande sacri"$cio que "aço, não tenho outro motivo para a talme 'ulgar obrigada, a não ser o sil!ncio que guardastes para comigo.

2 senhor ancenP abandonou 5aris há quinze dias. izem quevai para 7alta e que tem o pro'eto de lá se "i#ar. 3alvez ainda "osse atempo de o reter... 7inha amiga=... minha "ilha é assim tãoculpada> 5erdoareis sem dúvida que uma mãe s* muito di"icilmente

ceda a esta horr$vel certeza.0ue "atalidade se espalhou pois em volta de mim desde háum tempo, que me "eriu nos seres que me eram mais queridos= minha "ilha e a minha amiga=

0uem poderá dei#ar de tremer ao pensar nos males que podecausar uma s* ligação perigosa= E que desgostos se não poupariammeditando mais nesta verdade= 0ue mulher não "ugiria - primeiraproposta de um sedutor> 0ue mãe poderia sem tremer ver alguémalém dela "alar - sua "ilha> 7as estas tardias re"le#+es v!m s* depoisdos acontecimentos( e uma das mais importantes verdades, e talvezdas mais largamente reconhecidas, permanece su"ocada e sem

emprego no turbilhão dos nossos inconseqSentes costumes.

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7/18/2019 Relacoes Perigosas Choderlos de Laclos

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deus, minha querida e digna amiga( sinto neste momento