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  • R e v i s t a d e E s p i r i t i s m o C r i s t ã oAno 121 / Outubro, 2003 / No 2.095

    Fundada em 21 de janeiro de 1883

    Fundador: Augusto Elias da Silva

    ISSN 1413-1749Propriedade e orientação daFederação Espírita Brasileira

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    Capa: Alessandro Figueredo

    Tema da Capa: Homenagem a Kardec, em sua du-pla missão de Educador: Emérito professor e autorde obras pedagógicas, e Codificador do Espiritismo.

    EDITORIAL 4Kardec e a educação

    PRESENÇA DE CHICO XAVIER 15No reino das borboletas – Irmão X

    ENTREVISTA: JOÃO DE JESUS MOUTINHO 19Dirigente fala sobre os primórdios do Movimento Espírita e da FEB em Brasília

    ESFLORANDO O EVANGELHO 21Ricamente – Emmanuel

    A FEB E O ESPERANTO 25Fortaleçamos o Movimento Esperantista organizado –

    Affonso Soares

    PÁGINAS DA REVUE SPIRITE 36 Intervenção da Ciência no Espiritismo – Allan Kardec

    SEARA ESPÍRITA 42

    Educação – Juvanir Borges de Souza 5Lei de amor – Narcisa Amália 7Homenagem a Allan Kardec – Vianna de Carvalho 8Lições de falar – Passos Lírio 10

    Um dia – Isabel de Castro 11Pena de morte resolve? – Marcelo Paes Barreto 12Agonias da Terra, premissas do Céu!... – Rogério Coelho 16 Caminhando e aprendendo – Daltro Rigueira Vianna 18Doutrinar e transformar – Emmanuel 20Dois séculos, duas projeções – Kleber Halfeld 22Reencarnação: Processo universal de aplicação da Justiça 26

    Divina – Jorge Hessen

    Esquecimento do passado – Inaldo Lacerda Lima 28Boa vontade – Meimei 29Passe – Em reuniões públicas é ele obrigatório? – 30

    Gebaldo José de SousaTodos os homens têm fome – Conceição Almeida 32Retorno à Pátria Espiritual – Ana Fuentes de Cardona 33Referência passo a passo – I – O livro por inteiro – 34

    Geraldo Campetti SobrinhoAssembléia Geral Extraordinária – 35

    Aviso aos Sócios Efetivos da FEBO Espiritismo em seu tríplice aspecto: científico, filosófico 39

    e religioso – Parte III (final) – Silvio Seno Chibeni

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    Tratando de assunto voltado à melhoria social do homem, em nota ao final do cap.III, da Parte 3a, de O Livro dos Espíritos, Allan Kardec aborda a questão da educa-ção moral, com a experiência de quem já havia devotado longos anos a serviço da

    instrução popular, inclusive gratuita:

    “(...) Há um elemento, que se não costuma fazer pesar na balança e sem o qual aciência econômica não passa de simples teoria. Esse elemento é a educação, não aeducação intelectual, mas a educação moral. Não nos referimos, porém, à educaçãomoral pelos livros e sim à que consiste na arte de formar os caracteres, à que incu-te hábitos, porquanto a educação é o conjunto dos hábitos adquiridos.”

    Mais à frente, como que antevendo o agravamento dos problemas sociais da Huma-nidade, provocado pela ausência de uma ação educacional com característica moral e es-piritual, observa:

    “(...) Considerando-se a aluvião de indivíduos que todos os dias são lançados natorrente da população, sem princípios, sem freio e entregues a seus próprios instin-tos, serão de espantar as conseqüências desastrosas que daí decorrem? Quando essaarte for conhecida, compreendida e praticada, o homem terá no mundo hábitos deordem e de previdência para consigo mesmo e para com os seus, de respeito a tu-do o que é respeitável, hábitos que lhe permitirão atravessar menos penosamente osmaus dias inevitáveis. A desordem e a imprevidência são duas chagas que só umaeducação bem entendida pode curar. Esse o ponto de partida, o elemento real dobem-estar, o penhor da segurança de todos.”

    Com estas observações tão claras e objetivas do Codificador, não resta dúvida de queo ponto fulcral da tarefa do Movimento Espírita é o de difundir a Doutrina Espírita, co-locando em prática a caridade plena no que ela tem de mais significativo, que é o de pro-mover, com prioridade, o trabalho de educação moral e espiritual do homem.

    EditorialKardec e a educação

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    Dentro dos diversos significa-dos da palavra educação, to-maremos o termo no seu sen-tido lato, extensivo, e não no sen-tido estrito de instrução escolar, co-mo é usualmente tomado no seiodas sociedades.

    No esforço e no efeito de edu-car(-se) o Espírito, encontramos to-dos os processos de desenvolvimen-to intelectual e moral do Ser, parasua evolução e integração individuale social.

    Apesar do inegável progressoalcançado pelos homens no campocientífico e tecnológico, a Huma-nidade depara-se com inúmerosproblemas, que se agravam com opróprio crescimento da populaçãomundial: as guerras, os conflitos,a violência individual e coletiva, amiséria e a pobreza, a corrupçãomoral, a insatisfação com as orga-nizações sociais, a degeneração domeio ambiente.

    Tentativas diversas têm sidooferecidas para a solução desses gra-ves problemas: emprego de forçasmilitares; união de nações para aimposição de normas; criação de leisespeciais, nacionais e internacionais;surgimento de regimes políticos esociais de diferentes tendências.

    Todos esses ensaios e soluçõespropostas têm fracassado, como

    comprova a situação do mundo noinício do terceiro milênio da EraCristã.

    Tudo indica que, com o agra-vamento das dificuldades, a popu-lação terrena chega ao fim de umperíodo evolutivo que reclama so-luções bem diferentes dos tentamesanteriores.

    Acreditamos que, para iniciar aera regeneradora da Humanidade,há necessidade de implantar-se aeducação integral de cada indiví-duo, de todas as sociedades huma-nas em todas as latitudes.

    O norteamento para a educa-ção moral do ser humano já se en-contra no mundo, desde a vinda doCristo, há 2.000 anos.

    Sua Mensagem, aclarada ecomplementada pelo Consoladorpor Ele prometido e enviado à Hu-manidade, nos meados do séculoXIX, é o grande pedestal sobre oqual se há de construir a regenera-ção humana.

    ...Chegou o tempo de se aclara-

    rem muitas coisas.Agora, depois de tantos desvios

    no entendimento do Evangelhode Jesus, após tanto progresso nocampo material da vida no Planeta,cumpre aos homens o reencontrocom os ensinos do Mestre, ouvindoo Espírito da Verdade e os EspíritosSuperiores.

    Na Nova Revelação encon-tram-se as regras e normas para a

    reeducação de cada indivíduo. É oCristo de volta retificando os cami-nhos seguidos pelos homens, porfalso entendimento de seus ensinos.

    As religiões e as ciências, nabusca da Verdade, independente-mente do criticismo que adotamseus representantes, têm condiçõesde aceitar o raciocínio superior e osentimento elevado do Amor, parareconduzi-las ao caminho certo.

    A missão do Cristianismo edas religiões orientais não era a dealiarem-se aos governantes e às for-ças políticas, desviando-se da obraeducacional de significação espi-ritual tão importante para os ho-mens.

    O que ocorreu com o Cristia-nismo, a partir da aliança de seus lí-deres com o Imperador Constanti-no, nos princípios do século IV, foilastimável desvio.

    Em troca do poder temporalperdeu sua força educacional natransformação de cada indivíduo,característica essencial que se en-contra nos ensinos do Mestre Jesus.

    O triste resultado da aliança foio enveredamento do Cristianismonos ínvios caminhos dos interessestransitórios do mundo, perdendosuas características divinas de forçaeducacional capaz de transformar,para melhor, cada seguidor sincero.

    A partir de 325, formalizada aaliança ilusória com o poder tem-poral, foram sendo esquecidos oudeturpados os ensinos do Cristo,instituindo-se em seu lugar os dog-

    EducaçãoJuvanir Borges de Souza

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    mas humanos, as castas sacerdotais,os cultos exteriores, os templos lu-xuosos.

    De concílio a concílio, na su-cessão dos séculos, a Igreja Romanaafastou-se cada vez mais da Mensa-gem primitiva do Cristo.

    As impróprias interpretaçõeshumanas dos ensinos cristãos, preo-cupadas em impor pontos de vistaem vez de convencer pelo raciocí-nio e pelos sentimentos do Amor,levaram o dogmatismo a perseguirem lugar de educar, à violênciasubstituindo a perquirição e o con-vencimento, às guerras religiosas, àInquisição, às Cruzadas, à divisãodos cristãos e a todos os males hojereconhecidos pelo próprio chefe daIgreja Romana.

    A realidade em que se encontraa Humanidade, sob a influência dasreligiões antigas e tradicionais, tempreocupado pensadores, filósofos,estudiosos de todas as tendências.

    Há, no mundo, uma idéia ge-ral de que a Humanidade se encon-tra em um ciclo evolutivo que ten-de a findar-se.

    A Espiritualidade Superior já sereferiu ao fim de um longo períodode um mundo atrasado, com possi-bilidades de sua transformação emmundo regenerado, no qual a ten-dência da maior parte da populaçãoserá para a vivência do Bem e nãodo mal.

    De outro lado, não resta dúvi-da de que o Consolador prometi-do por Jesus já se encontra entre oshomens, desde meados do séculoXIX.

    O Consolador, a Doutrina dosEspíritos, é enviado ao mundo jus-tamente na época em que o mate-rialismo se mostrou mais influentee arrogante.

    O materialismo histórico-dia-lético de Karl Marx e Engels, inicia-do com o Manifesto Comunista de1848, com vastas conseqüências so-ciais e políticas em todo século XX,ao lado do Positivismo de AugustoComte, negação absurda de todarealidade espiritual, para caracteri-zar o cientificismo do pensamentomaterialista como o condutor doprogresso humano, dão ao “séculodas luzes” um característico de pre-domínio nitidamente materialistadas idéias filosóficas.

    Agravando a influência mate-rialista no mundo ocidental, reapa-rece o Utilitarismo de Bentham eStuart Mill, reavivando antiga esco-la grega do materialismo, que colo-ca o prazer individual como o fun-damento das ações humanas.

    Piorando a influência pernicio-sa do materialismo no mundo, asreligiões tradicionais, impotentespara se oporem às filosofias negati-vistas, agravam a situação, com ainfeliz decretação da infabilidadepapal, com Pio IX, em 1870.

    Pois é nesse período, de inegá-vel influência do materialismo mul-tifário e de preceitos dogmáticosdas Igrejas que se denominam cris-tãs, que vem ao mundo o Consola-dor prometido.

    É o Cristo de volta, sob novaforma, para repor a Verdade, esque-cida ou deturpada.

    É o Espírito da Verdade, com aplêiade de Espíritos Superiores in-cumbidos de restabelecer os ensinosdo Mestre Incomparável e ampliá--los com novas revelações.

    Para estabelecer a ligação entrea Espiritualidade Superior e o mun-do das formas, reencarna o missio-nário incumbido de sintetizar e sis-tematizar a novel doutrina.

    Em 1804, nasce em Lyon,França, o missionário da TerceiraRevelação – Allan Kardec – e di-versos intermediários entre os doisplanos de vida, a serviço da grandeCausa.

    Aos cinqüenta anos de idade,em 1854, inicia o missionário suasobservações, estudos e conclusõessobre a vasta fenomenologia produ-zida pelos Espíritos em diversospontos do Planeta.

    Durante todo o período inicialde sua vida preparou-se o Codifica-dor para a difícil missão, dedican-do-se à educação dos jovens desdea adolescência. Mestre, professor,educador, experimentador, escritor,com um estilo em que sobressaema clareza e a perfeição da lingua-gem, todas essas qualidades estãorefletidas nas obras que escreveu noperíodo de 1857 a 1868, a “obra desua vida”, como ele mesmo a deno-minou, que constitui a Doutrinados Espíritos.

    Essa é a base fundamental doEspiritismo, a Doutrina Espírita.

    Nela, os continuadores do Cris-to revivem o Evangelho, reafirman-do as Verdades já conhecidas e des-vendando os mistérios da vida quea inteligência humana já está emcondições de compreender.

    É, ao mesmo tempo, o roteiroe a prática para um vasto programade educação e reeducação para todaa Humanidade.

    Opõe-se a todas as formas dematerialismo, combatendo-o comas armas da realidade presente emtodo o Universo – o espírito, ele-mento essencial.

    Revela as leis divinas que re-gem o espírito e a matéria, mos-trando às ciências humanas que elasnão poderão firmar-se em caráter

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    definitivo enquanto se ocuparemsomente da matéria, desconhecen-do o espírito.

    Vem em socorro das religiõesque se desviaram nos caminhos dospreceitos, dos preconceitos e dodogmatismo, com graves conse-qüências para seus seguidores, indi-cando-lhes as leis morais do Cria-dor, a Inteligência Suprema, resu-midas pelo Cristo de Deus noAmor, na Justiça e na Caridade, emsubstituição aos cultos exteriores.

    A doutrina de educação ereeducação que os Espíritos revela-ram à Humanidade, por outro ân-gulo, não fica adstrita ao círculo doscientistas, acadêmicos e intelectuais,ou, como religião natural, não seprende ao dogmatismo imposto porresoluções humanas que deturparamas verdades essenciais já conhecidas.

    Pelo contrário, a Doutrina doConsolador dirige-se a todos os que,com boa vontade, procuram a Ver-dade, no seu sentido mais amplo.

    Por mais simples e humildeque seja o ser humano, pode ele ini-ciar-se no conhecimento de verda-des eternas, a respeito de si mesmoe da vida que se manifesta sob múl-tiplas formas. Pode saber do desti-no que o espera após a morte tãotemida, deduzindo facilmente queé um ser imortal. Toma conheci-mento, através de demonstraçõesinequívocas que, sendo imortal, re-vive muitas vezes em corpos mate-riais, em busca do conhecimento edo aperfeiçoamento moral.

    Doutrina profunda em seusfundamentos fatuais e filosóficos,foi formulada de tal forma quequalquer pessoa normal pode en-tendê-la, estudando-a e observan-do-a, sem necessidade dos intérpre-tes sacerdotais, da hierarquia re-

    ligiosa e da complicada teologiacriada pelas igrejas.

    O Espiritismo oferece a todosque nele se iniciam a idéia essencialde Deus, o Criador de todas as coi-sas, a Inteligência Suprema dosUniversos, Causa essencial de tudo,cujas Leis naturais regem tudo oque existe, com base no Amor e naJustiça.

    Essa idéia primordial retificavelhas concepções religiosas doDeus antropomórfico das religiõestradicionais.

    Dela parte uma nova maneirade conceber a Divindade, o Ser Su-premo ao qual Jesus se refere comoPai, Pai Nosso, na concepção ver-dadeiramente cristã.

    É dessa concepção que partemtodas os princípios da DoutrinaConsoladora.

    Nessa fonte luminosa e esclare-cedora é que se fundamentam aeducação e reeducação dos homensde todos as nações, para a implan-tação de uma Nova Era de ummundo regenerado.

    Lei de amor

    – “Rua!... Rua, infeliz que me ensombraste o nome!...” –Clama o pai, a rugir para a filha que implora:– “Não me expulses, meu pai!... Temo a noite, lá fora!...”E ele mostra o punhal na fúria que o consome.

    Voa o tempo a rolar, sem que a vida o retome...Ele, desencarnado, ansioso e triste agora,Traz à filha exilada o coração que chora,Espírito a sofrer, em sede, chaga e fome.

    Ela sente-lhe a dor, através da lembrança,E dá-lhe um corpo novo, ante a luz que o descansaNos fios da oração, em celeste rastilho!...

    E, mais tarde, no lar que os apascenta e acalma,Ele diz: “Minha mãe, doce mãe de minhalma!...”E ela diz a cantar: “Deus te abençoe, meu filho!...”

    Narcisa Amália

    Fonte: XAVIER, Francisco Cândido. Luz no Lar, Diversos Espíritos. 8. ed., Riode Janeiro: FEB, 1997, cap. 26, p. 67.

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  • As exuberantes claridades doSéculo das Luzes não foramsuficientes para arrancar acriatura humana do materialismoe do pessimismo. Enquanto as Esco-las de pensamento se debatiam nasrudes procelas do cepticismo e danegação, apoiadas sobre os alicercesdo mecanicismo científico, afir-mando a morte do ser no momen-to da anóxia cerebral, igualmentealargavam-se os horizontes da inves-tigação em torno da personalidadee do comportamento, da psique eda saúde mental, tentando-se com-preender a estrutura profunda dasestruturas do inconsciente e da suaconstituição neurológica.

    Teorias grandiosas apareciamcom entusiasmo e emurcheciamdominadas por outras não menosesdrúxulas, que deslumbravam asmentes aturdidas e cansadas doDeus teológico e arbitrário, que ate-morizava e punia sem compaixãoem nome do amor que preconizavaem Seu nome.

    Pensadores cristãos sinceros,não obstante, proclamavam a ne-cessidade de uma releitura doEvangelho baseados na necessidadede uma renovação moral funda-mentada em Deus e liberdade. Es-píritos notáveis reencarnados, quaisLamennais, Lacordaire e outros lí-dimos servidores do Bem, após ini-

    ciarem a nova era do pensamentocristão através do seu periódicoL’Avenir, convidando os teólogos eestudiosos católicos a uma revisãodos textos evangélicos e aplicaçãomais consentânea com os dias deentão, viram o seu órgão ser fecha-do pela intolerância clerical, emtentativa cruel de silenciar-lhes avoz, mas não desistindo de darprosseguimento à luta em favor deuma sociedade feliz e realmentecristã, conforme os postuladosenunciados e vividos por Jesus.

    Dessa forma, pairava na psicos-fera cultural da França e do mundoalgo de extraordinário que deveriaacontecer para alterar completa-mente e por definitivo a condutareligiosa que se debatia nos esterto-res da obstinação medieval, sobre-vivente a todos os avançados passosdo conhecimento existente. Eramos prenúncios da chegada do Espi-ritismo, cujos missionários respon-sáveis pelo ministério já se encon-travam reencarnados uns, enquantoos outros preparavam a instalaçãoda Nova Era.

    O materialismo vigoroso era aresposta das conquistas logradas noslaboratórios e da reação filosófica dehomens e mulheres que não mais sesubmetiam aos ditames escravocra-tas das paixões que produziam o fa-natismo religioso, sempre distanteda realidade, porém, dominante eperverso.

    A razão, naqueles dias, liberta-va-se dos grilhões do magister dixite a severa vigilância na literatura

    que somente podia proclamar aqui-lo que estivesse sob os ditames darevisão religiosa autorizada pelo Im-primatur da Igreja começava a per-der força e poder. O panfletismo eas impressões desautorizadas sacu-diam as mentes e os corações queaspiravam por liberdade, abrindo oshorizontes da fé para novas concei-tuações e procedimentos.

    Foi nesse báratro que surgiu OLivro dos Espíritos, publicado pelacoragem moral e cultural de AllanKardec, graças ao compromisso es-tabelecido com o Sr. Dentu e man-tido pela sua viúva Sra. Mèlanie,que lhe honrou a memória, ense-jando a impostergável revisão ereestudo da doutrina de Jesus sob aóptica da Razão e da Ciência, con-firmando a indestrutibilidade doEspírito, a sua comunicabilidadecom os seres humanos, a reencarna-ção, e apresentando a ética-moralque ressuma do Seu Evangelho, eque se encontrava mergulhada noabismo da ignorância e dos interes-ses subalternos.

    Com as novas propostas espíri-tas, os camartelos do bom senso e dainvestigação abriram as carcomidasbases das religiões dominantes, facul-tando novas incursões filosóficas nainterpretação dos textos de Jesus edos Seus discípulos, que trouxeramcoragem e alegria de viver aos mi-lhões de sofredores aquartelados nossombrios redutos da ignorância, domedo ou do desespero e da revolta...

    O Espiritismo veio confirmara promessa de O Consolador pro-

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    Homenagem a Allan Kardec

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  • posta por Jesus antes de despedir-sedos amigos, com os notáveis instru-mentos da investigação científica edo pensamento ético, ensejandoa religião do amor e da razão, úni-cos requisitos que podem oferecerresistência contra o mal e a perver-sidade histórica sempre presentenos comportamentos humanos.

    Inesperadamente, face ao cinis-mo e à vulgaridade que o materia-lismo propunha ao compor-tamento com expressões he-donistas desgastantes, sentin-do-se aturdido e desestrutu-rado, levantou-se para exter-minar o Espiritismo, utili-zando-se do ridículo que an-tes dirigia aos clérigos e reli-giosos outros para atingir osmédiuns, que eram acusadosde charlatães ou de psicopa-tas, não ocultando os esterto-res agônicos em que se es-torcegava.

    Enquanto os religiososlevantavam bandeiras de no-va caça às bruxas, repetindoos desgastados refrões medie-vais, de intervenção demo-níaca na sua conduta, o cep-ticismo orgulhoso e vão ri-dicularizava a mediunidade eos espíritas, utilizando-se deepítetos chulos e mesquinhos, parasubestimarem a nova revolução queignoravam, não tendo a coragemcultural de se dedicarem ao seu es-tudo e análise. É sempre mais fácilcombater o que se ignora, manten-do-se na presunçosa figuração desapiente do que reconhecer os pró-prios limites, avançando sempre norumo de sempre enobrecida eru-dição. Isto porque o conhecimentoque realmente liberta impõe condu-ta compatível com as informações

    constatadas, exigindo radical mu-dança dos hábitos doentios e pri-mários com os quais se encontraacostumado o indivíduo, para gal-gar um patamar mais elevado decomportamento, que exige esforço,porém compensa pela plenitudeque propicia.

    O Espiritismo é uma ciência deprofundas conseqüências ético-mo-rais por estruturar-se na compreen-

    são de uma filosofia existencial estri-bada no comportamento saudável.De nada adiantaria o conhecimen-to da imortalidade da alma e os efei-tos da sua conduta terrestre, se nãoproporcionasse uma alteração realna maneira de ser do indivíduo quelhe assimila os paradigmas. Exige,portanto, expressivo esforço do seuadepto para que se adeqüe aos seusimpositivos doutrinários.

    Sobrevivendo ao Século dasLuzes, que pôde mais clarear com as

    estrelas fulgurantes das suas propos-tas, venceu sobranceiro o Século daCiência e da Tecnologia, sem quequalquer um dos seus postuladossofresse alteração ou fosse superado,antes confirmados pelas diferentesáreas da investigação científica, sejana Física Quântica, quanto na Bio-logia Molecular, na Psicologia Trans-pessoal, quanto na Embriogenia,havendo enfrentado as mais avan-

    çadas conquistas revolucioná-rias dos últimos tempos, quaisos transplantes de órgãos, acriogenia, a clonagem, a fe-cundação in vitro, a viruste-rapia... É o maior adversárioda eutanásia, do aborto crimi-noso, da pena de morte, dosuicídio, das guerras, semprede pé contra o direito huma-no de matar, avançando estói-co pelos caminhos do Ter-ceiro Milênio com as suaspropostas libertadoras e no-bres, construindo o homemmais saudável, integral, e a so-ciedade feliz por todos anela-dos.

    Dessa forma, recordandoo ínclito Codificador AllanKardec, que abriu a cortinada Nova Era com o seu cará-ter invulgar de homem de

    bem, de erudição e de dignidade,nós, os Espíritos-espíritas agradece-mos a sua contribuição e valor, porhaver sido o excelente instrumentodo Mundo espiritual para a Huma-nidade no momento mais grave dopensamento histórico de todos ostempos.

    Vianna de Carvalho

    (Página psicografada pelo médiumDivaldo P. Franco, na noite de 4 de ju-nho de 2001, em Paris, França.)

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    Sobre essas questões de falar noEspiritismo muito há que sedizer.Vale a pena o registro de im-

    pressões, que quase podem ser asmesmas para observadores diferen-tes, ainda que em circunstâncias di-versas.

    A psicofonia, por um lado, e ainspiração, por outro, explicam coi-sas aparentemente absurdas.

    Partindo dessas duas faculda-des, temos situações bem caracteri-zadas no amplo campo das mani-festações da palavra.

    Surpresas sem conto nos co-lhem em suas malhas a cada passo,porque o que nos é dado ver e ou-vir dá mesmo para estarrecer.

    Fala quem sabe por quem nãosabe e passa a saber quem antes nãosabia falar.

    O dom da palavra alcança pes-soas até então tidas por incapazes deexpressar-se em público.

    Miguel Vives, médium que te-ve grande atuação no MovimentoEspírita espanhol, frisa a diferençaentre o que era ele antes e o queveio a ser depois que se fez espírita.Tornaram-se famosas suas pre-gações.

    Elementos que se mantinhamem regime de mutismo transfor-mam-se em bem-falantes de umahora para outra.

    Não é, porém, para configurarcasos de tribunos e médiuns inspi-rados, situando-os nas discrimina-ções específicas de suas nuançaspróprias, que nos propomos trazerà baila o assunto.

    Desejamos tão-somente assina-lar situações relacionadas com oexercício de tal mister, quando a elesomos levados por força das cir-cunstâncias.

    Deixaremos de lado os casos,muito freqüentes, de o expositor es-colher um tema e, na hora de falar,discorrer sobre outro completamen-te diferente; de lhe ser dado umponto para estudo e, no desenvolvi-mento da preleção, dissertar sobreassunto que não guarda nenhumaconotação doutrinária com ele; delevar esquematizada a conferênciae, no momento, não encontrar oroteiro de sua apresentação.

    Esses assuntos dariam e dão –sem exagero o dizemos – matériapara um livro de bem alentada lei-tura.

    Citaremos apenas três casosque poderão claramente demons-trar nossa responsabilidade diantede problema de tal magnitude.

    Aqui está o primeiro: distintoe culto confrade, professor de ní-vel universitário, um belo dia foifalar aos presidiários de determi-nada penitenciária de grande me-trópole. Discorreu amplamentesobre o tema proposto, esgotando,por assim dizer, o assunto. Haviapreenchido plenamente o tempo aseu dispor.

    Terminada a reunião, um dosdetentos, entre respeitoso e sorri-dente, aproximou-se do palestrantee disse-lhe:

    – Professor, hoje aprendi umagrande lição.

    – Uma grande lição? Qual?– Como é difícil falar fácil.Agora, o segundo: um correli-

    gionário nosso, aplicado estudantee estudioso do Espiritismo, gostavamuito de termos técnicos e frasesempoladas, quando esflorava pon-tos doutrinários.

    Íntimo amigo seu observou-lhede uma feita:

    – Fale de maneira a fazer-se en-tendido por todos. Para tanto, ima-gine achar-se no auditório alguémquase analfabeto ou de todo não al-fabetizado, e, em sua exposição, usede linguagem simples, ao alcancedessa pessoa, porque, se assim o fi-zer, não haverá na assistência quemnão lhe assimile as consideraçõesexpendidas. Dando o máximo emfavor do menos letrado ou iletrado,você dará a melhor instrução emproveito próprio e geral.

    Finalmente, o terceiro: doiscompanheiros, sempre que possível,iam às reuniões públicas de estudosde um Centro Espírita do bairro,dando preferência às dos sábados,por lhes serem mais propícias aocomparecimento. Ocupava a tribu-na, normalmente, na última sabati-na do mês, um confrade já madu-ro, caracterizado por muita facili-dade de expressão, a quem eles ou-viam com relativa regularidade.

    Lições de falarPassos Lírio

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    Certa ocasião, ambos comen-tavam entre si quando a caminhode casa:

    – Você não tem a impressão deter ouvido a mesma coisa da vezpassada, apesar de ser outro o as-sunto?

    – Tenho, sim; aliás, sempre tive,mas não lhe dizia nada porque recea-va ser injusto na minha observação.

    – Lembremo-nos de que o ex-positor costuma dizer que é espíri-ta pela segunda vez e já conhece oEspiritismo de encarnação anteriore que por isso não precisa estudá-lo,basta recordar o que já sabe. Seriaesta a explicação para o caso?

    – Não pode ser outra. Achomesmo que, enquanto ele pensarassim, nós não teremos coisa nova

    em matéria de preleção doutrinária.– Então, vamos deixá-lo no

    passado e caminhemos nós.E passaram a freqüentar outro

    Centro.Sobre essa questão de falar no

    Espiritismo muito há que se dizer.Mas deixemos que cada um se dêconta do que sabe a respeito e tireas suas próprias conclusões.

    Um dia, Sócrates deliberou sair de si mesmo,apresentando alguns aspectos da verdade, eimortalizou-se.Um dia, Colombo resolveu empreender a via-

    gem ao Mundo Novo e desvelou o caminho para aAmérica.

    A gloriosa missão de Jesus começou para oshomens no dia da Manjedoura. O ministério dosApóstolos foi definitivamente homologado pelosPoderes Divinos no dia de Pentecostes.

    Tudo no Universo começa num dia.O bem e o mal, a felicidade e o infortúnio, a ale-

    gria e a dor, invocados por nossa alma, guardam oexato momento de início.

    Quando plantamos, sabemos que a produçãosurgirá certo dia. Se encetamos uma jornada, nãoignoramos que, em certo momento, ela terminará.

    Um dia criamos, um dia recolheremos.Não olvides, porém, que a semente não germi-

    nará sem cuidado, em tua quinta.Se deres teu dia à erva ingrata, ela se alastrará,

    sufocando-te o horto amigo. Se abandonares teusminutos aos vermes daninhos, multiplicar-se-ão eles,indefinidamente, impedindo a colheita.

    Ocupa-te com o dia, de olhos voltados para aeternidade.

    Das resoluções de uma hora podem sobreviracontecimentos para mil anos.

    Tudo depende de tua atitude na intimidade dotempo.

    Judas era um discípulo fiel a Jesus, mas, um dia,acreditou mais no poder frágil da Terra que na ad-ministração do Céu, e traiu a si mesmo.

    Madalena era estranha mulher, possessa de setedemônios; um dia, no entanto, ofereceu-se à virtudee inscreveu seu nome na História, figurando nocânone das almas inesquecíveis.

    O amanhã será o que hoje projetamos.Alcançarás o que procuras.Serás o que desejas.Acorda para a realidade do momento e amon-

    toa bênçãos pelos serviços que prestaste e pelo co-nhecimento que difundiste em tuas horas.

    O Tempo é o rio da vida cujas águas nos de-volvem o que lhe atiramos.

    Enquanto dispões das horas de trabalho, dedi-ca-te às boas obras.

    Se acreditas no bem e a ele atendes, cedo atin-girás a messe da felicidade perfeita; mas se agoramofas do dia, entre a indiferença e o sarcasmo,guarda a certeza de que, a seu turno, o dia se riráde ti.

    Isabel de Castro

    Fonte: XAVIER, Francisco Cândido. Falando à Terra. 5. ed.,Rio de Janeiro: FEB, 1991, p. 129-130.

    Um dia

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    Sabemos que a ação delituosa,nas suas mais variadas moda-lidades, assusta a sociedade,que, na maioria das vezes, sem en-xergar uma saída positiva para amanutenção da paz social, envere-da por caminhos violentos, optan-do, muitas vezes, para a punição ca-pital, ou seja, a morte do autor dodelito.

    Tal procedimento vem ocor-rendo há milênios. Na antiguidade,podemos visualizar a pena definiti-va, com eliminação da vida, nos po-vos do Oriente, da África, da Ásia,e nos do Ocidente. Os tipos de exe-cução variavam muito, dependen-do do clamor popular por um cas-tigo maior e do grau do delitocometido. Daí sabermos do méto-do de se esmagar o crânio com apata de um elefante; do sacrifíciovagaroso, arrancando determinadospedaços do corpo do condenado,para depois separar os membros,puxados por potentes cavalos (Fran-ça e Inglaterra); da execução pelaguilhotina (França); pela forca; pe-la cruz, entre os judeus; execuçãopor arma de fogo; e, mais recente-mente, pela câmara de gás, cadeiraelétrica e injeção letal, nos EUA.Devemos ressaltar que, dos cento etrinta países do nosso planeta queainda mantêm a pena de morte,

    alguns a utilizam como uma formaprofundamente pedagógica, objeti-vando a inibição da criminalidade,exemplo das duas Coréias, que exe-cutam os seus réus no centro de umestádio de esportes, obrigando a to-dos, principalmente os jovens, a as-sistirem.

    Apesar de toda essa barbárie,podemos verificar, através de pes-quisas inteiramente confiáveis, queesses métodos –“práticas pedagó-gicas” – não inibiram o aumentodos crimes. Muito pelo contrário,em muitos casos se constatou umacentuado aumento da criminali-dade.

    A busca dos cientistas

    Há tempos, cientistas sociais eespecialistas das ciências médicasiniciaram buscas para se descobrir aorigem da delinqüência.

    Vamos encontrar, nesse contex-to, o Positivismo Penal implemen-tando na Criminologia as fases An-tropológica, pelo médico CesareLombroso; Sociológica, pelo profes-sor Enrico Ferri e a Jurídica, peloestudioso Rafael Garofalo (todas nofinal do século XIX).

    Tempos depois, Lombroso, pes-quisador emérito, desenvolve novosestudos criando a Teoria da Regres-são Atávica – presença hereditária –procurando elucidar a gênese cri-minosa. Daí, o mestre italiano crianovas divisões: Criminoso nato elouco moral; Criminoso epilético;

    Criminoso portador de ímpeto pas-sional; Criminoso insano e Crimi-noso ocasional.

    Mais adiante, o professor Enri-co Ferri, também aprofundando amatéria, dita a tese da SaturaçãoCriminal – saturação de elementosquímicos e a pressão das condiçõessobre o caráter – e apresenta novasdivisões: Criminoso nato; Crimino-so louco; Criminoso habitual; Cri-minoso ocasional; Criminoso pas-sional.

    No Brasil tivemos vários estu-diosos do empolgante assunto, den-tre os quais destacamos Clóvis Be-vilácqua, Carlos Xavier Paes Barretocom a obra O Crime, o Criminosoe a Pena, Hilário Veiga de Carva-lho, classificando, segundo o fatormesológico ou biológico: mesocrimi-noso, mesocriminoso preponderan-te, mesobiocriminoso, biocrimino-so preponderante e biocriminoso.E Odon Ramos Maranhão, que es-creveu uma importante obra: A Psi-cologia do Crime.

    Tais estudos criminológicos, noentanto, são baseados na hipótesede que o homem é apenas matéria,sem antecedentes psicológicos esem conseqüências psicossociais.Além disso, parte desses pensadoresimagina que eliminando o cidadãodo convívio social desaparecem asraízes da criminalidade.

    Quando o sistema não responde

    Diante de tantas dúvidas, a so-ciedade mostrava-se cada vez mais

    Pena de morte resolve?Marcelo Paes Barreto

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    ansiosa, já que tais medidas, apesarda sua natureza particularmentecruel, não faziam surtir os efeitosdesejados.

    O pensamento positivista, co-mo se vê, já não respondia às ques-tões mais profundas, mais comple-xas, seja na sua superficialidade, sejano âmago da questão. O criminosovisto apenas como um ente mate-rial, já não se enquadra de maneirasimples no contexto filosófico des-ses estudiosos.

    Conseqüentemente, as solu-ções para os problemas decorrentestambém não se encaixavam no sis-tema proposto por essas autorida-des, porque o homem, se conside-rado o binome corpo-alma, trans-cende à matéria, deixa de ser sim-plesmente máquina corpórea, paratranspirar um conjunto psicosso-mático, imprevisível nas suas im-perfeições.

    Impossível, portanto, ao pen-samento positivista, lidar com ques-tões tão sensíveis como essa, comotambém, apresentar solução à altu-ra para os problemas sociais e socio-lógicos decorrentes desse pensa-mento estruturado tão-somente nohomem-matéria.

    Quando o sistema responde

    É nesse contexto que aparecena França, nos idos de 1857, umconjunto de informações que iriaproporcionar uma das maiores re-voluções das idéias deste planeta –a Doutrina dos Espíritos Supe-riores, codificada pelo pedagogoHippolyte Léon Denizard Rivail,que adotou o cognome de AllanKardec, em cinco grandes obras: OLivro dos Espíritos, O Livro dosMédiuns, O Evangelho segundo o

    Espiritismo, O Céu e o Inferno e AGênese.

    Na primeira obra, O Livro dosEspíritos, Allan Kardec esclareceque os homens são Espíritos, criadospor Deus, simples e ignorantes, des-tinados à perfeição, na dependênciadireta da qualidade de suas obras,segundo o desenvolvimento da suainteligência e o equilíbrio do seulivre-arbítrio.

    Na quarta obra, O Céu e oInferno, ele demonstra que a pe-na de morte não propicia o fimda problemática dos conflitos ter-renos:

    “Segundo a Doutrina Espíri-ta, de acordo mesmo com as pa-lavras do Evangelho, com a ló-gica e com a mais rigorosa jus-tiça, o homem é o filho de suasobras, durante esta vida e depoisda morte, nada devendo ao fa-voritismo: Deus o recompensapelos esforços e pune pela ne-gligência, isto por tanto tempoquanto nela persistir.” (O Céu eo Inferno – Allan Kardec – FEB– 38a edição, 1a Parte, cap. VI,item 21.)

    Ainda em O Céu e o Inferno,Kardec traz o depoimento do Pa-dre Verger, então assassino doArcebispo de Paris, condenado àmorte e executado em 30 de janei-ro de 1857. Encontrava-se em ple-na existência espiritual e afirmava:

    “Fiz mal em matar, mas aisso fui levado pelo meu cará-ter, que não podia tolerar hu-milhações...” “Sou punido por-que tenho consciência da mi-nha falta.”

    Ensina Emmanuel:

    “A morte a ninguém propi-ciará passaporte gratuito paraa ventura celeste. Nunca pro-moverá compulsoriamente ho-mens a anjos. Cada criaturatransporá essa aduana da eter-nidade com a exclusiva baga-gem do que houver semeado, eaprenderá que a ordem e ahierarquia, a paz do trabalhoedificante, são característicosimutáveis da Lei, em todaparte.

    Ninguém, depois do sepul-cro, gozará de um descanso aque não tenha feito jus, por-que ‘o Reino do Senhor nãovem com aparências externas’.”(Prefácio do livro No MundoMaior, do Espírito André Luiz,psicografado por Francisco Cân-dido Xavier, ed. FEB.)

    A outra face da morte

    A Doutrina Espírita, assim,chega para esclarecer que a mortenada mais é do que uma viagemde volta ao mundo dos Espíritos,em que se levam na bagagem as

    A Doutrina Espírita

    chega para

    esclarecer que a

    morte nada mais é

    do que uma viagem

    de volta ao mundo

    dos Espíritos

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    próprias obras, responsabilizando--se, cada qual, efetivamente, porelas.

    É importante ressaltar que, apartir do esclarecimento espírita,a morte perde a sua face aterrori-zante, ganha outra percepção e seapresenta – agora sim – como umconjunto de fatores pedagógicos,que propicia, a quantos dele to-mem conhecimento, a oportuni-dade da preparação disciplinada,capaz de permitir a escalada dosdegraus da evolução com vistas àconquista da verdadeira felici-dade.

    Aparece também, em conse-qüência da Revelação, o institutodas vidas sucessivas (reencarna-ção), dando a todos a oportuni-dade da reabilitação diante dos er-ros, e, principalmente, da redefi-nição, novamente, no caminho dobem.

    A educação da alma como novaperspectiva

    A partir dessa perspectiva, por-tanto, a pena de morte, como con-dição de assepsia social, deixa de terqualquer validade funcional-peda-gógico-educacional. E assim, noque tange à questão do crime, asuniversidades e seus pesquisadoresterão que reconhecer que a únicaforma de se reformar o criminoso –também um ser eterno e criado pa-ra o bem – é a realização de umprofundo trabalho de educação daalma, capaz de reciclá-la nos aspec-tos mais estacionários, para que ne-la apareçam os caracteres da per-feição.

    Para concluir, podemos anotarque, como poderoso instrumentode ação sociológica,

    “(...) o Espiritismo, por issomesmo, é o disciplinador de nos-sa liberdade, não apenas paraque tenhamos na Terra uma vi-da social dignificante, mas tam-bém para que mantenhamos,no campo do espírito, uma vidaindividual harmoniosa, devida-mente ajustada aos impositi-vos da Vida Universal Perfeita,consoante as normas de EternaJustiça, elaboradas pelo supremoequilíbrio das Leis de Deus.”(Prefácio de Emmanuel no li-vro Ação e Reação, ditado peloEspírito André Luiz e psico-grafado por Francisco CândidoXavier, 21a edição, p. 10-11,FEB.)Complementarmente, temos

    que:“(...) a reencarnação é um

    estágio sagrado de recapitula-ção das nossas experiências eque a Doutrina Espírita, revi-vendo o Evangelho do Senhor,é facho resplendente na estradaevolutiva, ajudando-nos a re-generar o próprio destino, pa-ra a edificação da felicidadereal.” (Emmanuel, op. cit.,p. 11.)

    E assim, analisando a questãoda pena de morte, mesmo diantedos quadros pesarosos que nosoferece atualmente a criminalida-de, considerando, porém, o que jáexpusemos, quando nos referimosàs práticas (inócuas) de extermínioda vida humana como solução pa-ra o combate ao crime, chegamosà conclusão de que a vida na so-ciedade terrena jamais deve ser in-terrompida como solução para osmales que hoje afligem a socie-dade.

    Ao contrário, é preciso que asociedade evolua em seus conceitossobre a vida e a morte, enxergandoo homem como criatura de Deus,portanto, abonada pela Misericór-dia Divina.

    E avançando mais em seusconceitos, refletir sobre o homemcomo uma alma pensante, inteli-gente, sujeita ao progresso infinito,e que, para isso, habita, temporaria-mente, um corpo humano, o quelhe permite recomeçar sempre, re-construindo a si mesmo e a tudo oque pode influenciar, questão essaque nos traz, novamente, o já co-mentado conceito da reencarnaçãocomo elevado instrumento da Jus-tiça Divina.

    Finalmente, condenando a pe-na de morte, é preciso que a socie-dade humana se aprimore e se afi-nize com as Leis Divinas, seguindoo seu fluxo enobrecedor, laborandoo aperfeiçoamento social em cadauma de suas etapas pedagógicas eorientadoras.

    E diante dos males que hoje as-sustam, com a sua violência, a so-ciedade de nossos dias, buscar nasLeis da Criação a necessária inspira-ção para que todas as criaturas pos-sam conviver fraternalmente, numasociedade justa, na qual os benefí-cios do trabalho, do desenvolvi-mento e do progresso constantepossam ser repartidos eqüitativa-mente.

    Desse modo, amparadas porum projeto social de convivênciafraterna, alicerçada em profundasbases educadoras, que as criaturashumanas, visualizadas como ho-mens e almas, possam ter a necessá-ria oportunidade de, passo a passo,atingir o fim essencial para o qualforam criadas: o Bem.

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    Àbeira de um charco, formosaborboleta, fulgurando ao cre-púsculo, pousou sobre um ni-nho de larvas e falou para as peque-ninas lagartas, atônitas:

    – Não temais! Sou eu... umavossa irmã de raça!... Venho paracomunicar-vos esperança. Nemsempre permanecereis coladas à er-va do pântano! Tende calma, forta-leza, paciência!... Esforçai-vos pornão sucumbir aos golpes da venta-nia que, de quando em quando,varre a paisagem. Esperai! Depoisdo sono que vos aguarda, acordareiscom asas de puro arminho, refletin-do o esplendor solar... Então, nãomais vos arrastareis, presas ao soloúmido e triste. Adquirireis preciosavisão da vida! Subireis muito alto evosso alimento será o néctar das flo-res... Viajareis deslumbradas, con-templando o mundo, sob novoprisma!... Observareis o sapo quenos persegue, castigado pela serpen-te que o destrói, e vereis a serpenteque fascina o sapo, fustigada pelasarmas do homem!...

    Enquanto a mensageira se en-tregava a ligeira pausa de repouso,ouviam-se exclamações admirati-vas:

    – Ah! não posso crer no quevejo!

    – Que misteriosa e bela criatu-ra!...

    – Será uma fada milagrosa?– Nada possui de comum co-

    nosco...Irradiando o suave aroma do

    jardim em que se demorara, a lindavisitante sorriu e continuou:

    – Não vos confieis à increduli-dade! Não sou uma fada celeste!Minhas asas são parte integrante danova forma que a Natureza vosreserva. Ontem, vivia convosco;amanhã, vivereis comigo! Equili-brar-vos-eis no imenso espaço, des-ferindo vôos sublimes à plena luz!Libertadas do chavascal, elevar-vos--eis, felizes! Conhecereis a belezadas copas floridas e o saboroso licordas pétalas perfumadas, a delícia daaltura e a largueza do firmamen-to!...

    Logo após, lançando carinho-so olhar à família alvoroçada, dis-tendeu o corpo colorido e, volitan-do, graciosa, desapareceu.

    Nisso chega ao ninho a lagartamais velha do grupo, que andavaausente, e, ouvindo as entusiásticasreferências das companheiras maisjovens, ordenou, irritada:

    – Calem-se e escutem! Tudo is-so é insensatez... Mentiras, diva-gações... Fujamos aos sonhos e aosdesvarios. Nunca teremos asas.Ninguém deve filosofar... Somos la-gartas, nada mais que lagartas. Se-jamos práticas, no imediatismo daprópria vida. Esqueçam-se de pre-

    tensos seres alados que não existem.Desçam do delírio da imaginaçãopara as realidades do ventre! Aban-donaremos este lugar, amanhã. En-contrei a horta que procurávamos...Será nossa propriedade. Nossa for-tuna está no pé de couve que passa-remos a habitar. Devorar-lhe-emostodas as folhas... Precisamos sim-plesmente comer, porque, depois,será o sono, a morte e o nada... na-da mais...

    Calaram-se as larvas, desen-cantadas.

    Caiu a noite e, em meio àsombra, a lagarta-chefe adormeceu,sem despertar no outro dia. Estavaela completamente imóvel.

    As irmãs, preocupadas, obser-vavam curiosas o fenômeno e puse-ram-se na expectativa.

    Findo algum tempo, com infi-nito assombro, repararam que a or-gulhosa e descrente orientadora semetamorfoseara numa veludosa fa-lena, voejante e leve...

    ......................................................

    Anotando a lição breve e sim-ples, creio que há muitos pontos decontacto entre o reino dos homense o reino das borboletas.

    Irmão X

    Fonte: XAVIER, Francisco Cândido.Contos e Apólogos. 9. ed., Rio de Janei-ro: FEB, 2000, cap. 29, p. 125, 126 e127.

    PRESENÇA DE CHICO XAVIER

    No reino das borboletas

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    “(...) o martírio não é mais doque a casca de um fruto delei-tável, dando coragem e resig-nação.”

    Marcel 1

    Ahistória do sofrimento na Ter-ra começa com a fábula deAdão e Eva no Paraíso, quan-do, segundo a letra (que mata) avoz de Deus dirigindo-se a Eva sen-tenciou2: “(...) Multiplicarei gran-demente a tua dor (...)”; e logo aseguir, voltando-se para Adão, pro-feriu3: “(...) com dor comerás daterra todos os dias da tua vida”.

    É evidente que todo esse fol-clore bíblico, elaborado por Moisés,tinha por finalidade levar às cons-ciências o sentimento de culpa e anecessidade de repará-la, e o gran-de legislador desincumbiu-se de taltarefa fazendo crer que havia umaculpa universal, originária do pri-meiro tronco, da qual cada um de-veria empenhar-se em livrar-se. Deoutra maneira, como aquele povoignorante poderia compreender quea perda do paraíso traduzia o degre-do de outro sistema planetário on-de faliram todos? E como devedo-res da Lei Divina fazia-se mister o

    devido ressarcimento?! Portanto, aalternativa de Moisés foi valer-se dalenda de Adão e Eva personifican-do um casal matriz desobediente.Se ainda hoje existem criaturas to-talmente refratárias à verdadeira cos-mogonia revelada pelo Espiritismo,imaginemos no tempo de Moisés!...Mas, de qualquer forma, estava aliconsignada a incontestável realida-de da dor e do sofrimento decorren-tes dos humanos equívocos. Masnão somente ali, pois também aolongo de todas as Antigas Escriturasquanto das Neotestamentárias, po-demos flagrar os proscênios de do-res e escarcéus, culminando com opróprio martírio do Cristo, ao qualse seguiram os de Seus discípulos edemais seguidores...

    Somente agora, com as luzesda Doutrina Espírita, podemos en-tender o porquê da dor, e sua fun-ção regeneradora.

    Segundo o nobre MentorEmmanuel4:

    “(...) essa pesada bagagem desofrimentos constitui os alicerces deuma vida superior, repleta de paz ealegria. Essas dores representam au-xílio de Deus à terra estéril dos co-rações humanos. Chegam como adu-bo divino aos sentimentos das

    criaturas terrestres, para que de pân-tanos desprezados nasçam lírios deesperança.

    (...) Cristo (...) reservou traba-lhos e sacrifícios aos companheirosamados, para que se não perdessemna ilusão e chegassem à vida realcom valioso patrimônio de estáveisedificações.

    Eis por que a alegria cristã nãoconsta de prazeres da inconsciência,mas da sublime certeza de que to-das as dores são caminhos para jú-bilos imortais.”

    Léon Denis, o notável conti-nuador de Kardec, ensina5:

    “A todos aqueles que pergun-tam: Para que serve a dor? respon-do: Para polir a pedra, esculpir omármore, fundir o vidro, martelaro ferro. Serve para edificar e ornaro templo magnífico, cheio de raios,de vibrações, de hinos, de perfu-mes, onde se combinam todas asartes para exprimirem o divino,prepararem a apoteose do pensa-mento consciente, celebrarem a li-bertação do Espírito! (P. 382.)

    Na oficina augusta, onde se for-jam as almas, não são suficientes ogênio e a glória para fazê-las verda-deiramente formosas. Para dar-lheso último traço sublime tem sido

    Agonias da Terra, premissas do Céu!...

    Rogério Coelho

    1 KARDEC, Allan. O Céu e o Inferno – 2a

    parte – cap. VIII: “Expiações Terrestres”, FEB.2 Gênesis, 3:16.3 Gênesis, 3:17.

    4 XAVIER, F. C. Caminho, Verdade e Vida,

    pelo Espírito Emmanuel, cap. 93, FEB.

    5 DENIS, Léon. O Problema do Ser, do Des-

    tino e da Dor. Parte Terceira, caps. XXVI e

    XXVII, FEB.

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    sempre necessária a dor. Se certasexistências se tornaram, de obscurasque eram, tão santas e sagradas co-mo dedicações célebres, é que nelasfoi contínuo o sofrimento (...). (P.377.) [Chico Xavier que o diga.]

    (...) Na Terra será simultanea-mente físico e moral e constituiráum modo de reparação; mergulharáo culpado em suas chamas para pu-rificá-lo; tornará a forjar a alma, de-formada pelo mal, na bi-gorna das provas. Assim,cada um de nós pode oupoderá apagar seu passa-do, as tristes páginas doprincípio da sua história,as faltas graves cometidasquando era apenas Espí-rito ignorante ou ar-rebatado. Pelo sofrimen-to aprendemos a humil-dade, ao mesmo tempoque a indulgência e acompaixão para com to-dos os que sucumbemem volta de nós sob oimpulso dos instintos in-feriores, como tantas ve-zes nos sucedeu a nósmesmos outrora (p. 384).

    Por muito tempoainda a Humanidade ter-restre, ignorante das leissuperiores, inconscientedo futuro e do dever, pre-cisará da dor para estimulá-la na suavia, para transformar o que nelapredomina, os instintos primitivose grosseiros, em sentimentos purose generosos. Por muito tempo teráo homem de passar pela iniciaçãoamarga para chegar ao conheci-mento de si mesmo e do alvo aque deve mirar. (...) a dor persisti-rá, enquanto o egoísmo e o inte-resse regerem as sociedades terres-

    tres, enquanto o pensamento sedesviar das coisas profundas, en-quanto a flor da alma não tiverdesabrochado (p. 385).

    Se, nas horas da provação, sou-béssemos observar o trabalho inter-no, a ação misteriosa da dor em nós,em nosso “eu”, em nossa consciência,compreenderíamos melhor sua obrasublime de educação e aperfeiçoa-mento (...). (P. 379, grifo do autor.)

    Aprende a sofrer. Não te direi:procura a dor. Mas, quando ela seerguer inevitável em teu caminho,acolhe-a como uma amiga. Apren-de a conhecê-la, a apreciar-lhe a be-leza austera, a entender-lhe os secre-tos ensinamentos. Estuda-lhe a obraoculta. Em vez de te revoltares con-tra ela ou, então, de ficares acabru-nhado, inerte e fraco debaixo de suaação, associa tua vontade, teu pen-

    samento ao alvo que ela visa, pro-cura tirar dela, em sua passagempor tua vida, todo o proveito queela pode oferecer ao espírito e aocoração.

    (...) A Harmonia e a Beleza sãoleis universais e, nesse conjunto, aDor tem o seu papel estético. Seriapueril enraivecermo-nos contra es-te elemento necessário à beleza domundo. Exaltemo-la antes, com vis-

    tas e esperanças mais eleva-das! Vejamos nela o remédiopara todos os vícios, para to-das as decadências, para to-das as quedas!” (P. 399.)

    A notável psiquiatra suí-ça, naturalizada norte-ameri-cana, Drª. Elisabeth Kübler--Ross6, afirma com proprie-dade e sabedoria:

    “Todas as penúrias quesofremos na Vida, todas astribulações e pesadelos, todasas coisas que poderíamosconsiderar castigos de Deus,são na realidade, presentes.São a oportunidade de cres-cer, que é a única finalidadeda Vida.

    Se cobríssemos os desfi-ladeiros para protegê-los dosvendavais, jamais veríamosa beleza de suas formas.”

    Assim, embora estandotodos nós à mercê das pro-

    celas da Vida, a Doutrina Espíritaoferece-nos “a claridade matinalque toca a despertar” através do co-nhecimento e do amor, mas mui-tas criaturas só acordam com o do-loroso e às vezes cruento impo-sitivo da dor.

    6 ROSS, Elisabeth Kübler-. La Rueda de la Vi-da – Ediciones Grupo Zeta.

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  • 18 Reformador/Outubro 2003376

    Tarde invernal. O Sol já se des-pedia no horizonte, cobrin-do-o com seus matizes exube-rantes. Transitando por entre asfrondosas árvores daquela avenida,meus olhos observavam a movi-mentação dos transeuntes e meu cé-rebro registrava os acontecimentos.Veio-me à baila um ensinamentode alguém: “O Mundo do Senhor éuma planície de esperanças, onde ascascatas de luzes, as árvores floridasde bênçãos, os campos verdejantes eperfumados de virtudes esperam oser, dando-lhe a verdadeira felici-dade.” As criaturas iam e vinham,cada qual demonstrando nas fisio-nomias, muito dos sentimentos quelhes iam na alma. Um filósofo es-creveu: “A alma em sua jornadaterrena é a tecelã da alegria e da fe-licidade, do amor e da abnegação,da paciência e da tolerância quedevemos ter uns pelos outros.” Nafrente de uma lanchonete, pessoasdialogavam sobre variados assuntos.Despontou na minha casa mentalum pensamento, anotado de algumlugar: “Os homens medíocres discu-tem pessoas... os homens medianosdiscutem fatos... Já os homens supe-riores discutem idéias!”... Uma jo-vem passa tristonha, derraman-

    do-se em lágrimas – um drama cer-tamente a entristecia. Flui no meucérebro uma frase anotada nos esca-ninhos da mente: “Lágrimas sãoemoções materializadas que rompe-ram as barreiras do corpo físico.Em realidade, são energias que ne-cessitam transportar seus excessospara fora do corpo somático.”

    Um pedinte, cabelos encaneci-dos, olhos embaciados. Caridosamão estende-lhe um pacote de bis-coitos. O valoroso Espírito Bezerrade Menezes ministrou: “Distribua-mos, de alma a cantar, o pão, aveste e o livro; o sorriso, a palavrae a oração; o consolo, a esperança ea fé... Caridade em marcha.” Umparaplégico, numa cadeira de rodas,esforça-se para impulsioná-la pelacalçada, sob o olhar dos curiosos. OEspírito Victor Hugo elucida-nos:

    “Expiações redentoras são, também,as mãos do amor trabalhando assubstâncias do ser para o fanal glo-rioso.” Uma grande fila de veículosaguça-me a curiosidade. Volvo oolhar por entre os mesmos e descu-bro, ao final, um carro funerário –um cortejo fúnebre. Lembro-me damaravilhosa lição do Espírito Gú-bio: “Morte é simples mudança deveste, somos o que somos. Depois dosepulcro, não encontramos senão oparaíso ou o inferno criados por nósmesmos.” Caminho feliz. Meu olharse estende ao infinito. Reluz nosmeus pensamentos grandiosa as-sertiva do Espírito Victor Hugo:“Quem vai devagar vai seguro.Quem vai seguro vai longe.”

    Volvo os olhos para cima. Umaconstrução de um edifício em an-damento. Trabalhadores se movi-mentam febrilmente. Guardada nomeu inconsciente está uma extraor-dinária frase que, outrora, marqueinum livro: “Não esqueças que osamigos encarnados e desencarnadoste oferecem andaimes; as dificulda-des e padecimentos te proporcionampedras; a fé carreou cimento divi-no para o teu coração, entretanto aconstrução é tua.” E, assim, conti-nuei a caminhada, observando e re-fletindo nas palavras do EspíritoLourdes Catherine: “Na cidade davida, quando pensamos estar su-bindo a rua da felicidade, às vezespodemos estar descendo a ladeirada decepção.”

    Caminhando e aprendendoDaltro Rigueira Vianna

    “Expiações

    redentoras são,

    também, as mãos do

    amor trabalhando

    as substâncias

    do ser”

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  • Reformador/Outubro 2003 19377

    ENTREVISTA: JOÃO DE JESUS MOUTINHO

    Dirigente fala sobre os primórdios doMovimento Espírita e da FEB em Brasília

    O Presidente da Federação Espírita do Distrito Federal, João de Jesus Moutinho,traz significativas informações sobre a evolução do Movimento Espírita no Distrito Federal

    e sobre os tempos iniciais da Sede da FEB em Brasília

    P. – Há quanto tempo e comose envolveu com o Movimento Es-pírita?

    JJM – De berço espírita, co-nhecemos as primeiras lições de“catecismo espírita”, das quais nosrecordamos ainda hoje. A partir deoutubro de 1946, com 21 anos, ini-ciamos as atividades de expositor doGrêmio Espírita de Araguari (Mi-nas Gerais), de cuja fundação tam-bém participamos. Prosseguimos natarefa de expositor, na década de50, em vários núcleos da cidade.Em 1960, assumimos a direção doCentro Espírita Obreiros do Bem,até 1971 – quando nos transferi-mos para Brasília –, e da AliançaMunicipal Espírita de Araguari, porduas gestões. Em 1973, além daspalestras em vários núcleos destaCapital, já estávamos vinculadosà FEB, onde permanecemos até1986, quando assumimos a direçãoda Federação Espírita do DistritoFederal.

    P. – Há algum fato a ser des-tacado sobre o seu período inicialcomo espírita?

    JJM – Destacaria a oportuni-dade rara que tivemos de conhecer,no lançamento, as obras que a FEBeditou de Chico Xavier e de Yvon-ne A. Pereira, que vieram dar qua-

    lidade aos estudos que fizemos, in-cluindo Velho e Novo Testamento,sob a orientação de sábio instrutorencarnado.

    P. – Qual sua atuação, na fa-se da construção da sede da FEB emBrasília?

    JJM – Para a construção dedois módulos, inicialmente progra-mados, a fim de viabilizar a transfe-rência da Sede da FEB, foi consti-tuída uma comissão, da qual fize-mos parte com Antonio FernandesSoares, primeiro Diretor da FEB emBrasília, e de Israel Quirino do Nas-cimento, autor dos projetos. Comoo Presidente Francisco Thiesen ain-da residia no Rio de Janeiro, indi-cou-nos também seu procurador.

    Vivemos, assim, um período muitosobrecarregado, respondendo pelasatividades espirituais da FEB, aqui-sição de materiais de construção,admissão e demissão de emprega-dos, organização da contabilidade,prestações de contas com pedidosde provisão de caixa, além de acom-panhar, com os dois Diretores, diaa dia, o andamento das construções.

    P. – Como iniciou seu traba-lho junto à Federação Espírita doDistrito Federal?

    JJM – Ainda como secretário,respondendo pela correspondênciada FEB em Brasília, fomos convi-dados, na qualidade de sócio daFEDF, a participar de seu processode eleição em 1986. Vale recordarque seus dirigentes não tinhamqualquer intenção em nos indicarpara o cargo. No entanto, à vista deocorrências que surgiram durante oprocesso eleitoral, fomos consulta-dos sobre a nossa indicação comoPresidente. E assim permanecemosaté hoje.

    P. – Esteve no Conselho Fede-rativo Nacional, desde a transfe-rência para Brasília?

    JJM – Atualmente, juntamen-te com Pedro Valente, ex-Presidenteda União Espírita Mineira, acredi-tamos ser um dos raros espíritas en-

    João de Jesus Moutinho

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  • carnados, presentes à Reunião Ple-nária do Conselho Federativo Na-cional, em Brasília, nos dias 19 a 21de abril de 1975, ainda na gestão doPresidente Armando de Oliveira As-sis. Naquela oportunidade, ouvimosa mensagem espírita de Ismael parao CFN, através do médium DivaldoPereira Franco. Essa reunião contoucom a presença de Noraldino deMelo Castro, um dos signatários doPacto Áureo, em 1949.

    P. – Como analisa esse Órgãoda FEB ao longo desses anos?

    JJM – Acompanhando as ativi-dades do CFN, desde a sua transfe-rência para o Planalto Central, acre-ditamos que, à semelhança do queocorreu com a Doutrina Espírita,transladada de seu berço para oBrasil, também o CFN e o Movi-mento Espírita ganharam vulto ecompreensão com a mudança paraa Capital Federal. Assim como re-conhecemos duas fases na difusãoda Doutrina, de Kardec até ChicoXavier e deste em diante, tambémidentificamos duas fases no proces-so de Unificação, do Pacto Áureoaté a transferência do CFN paraBrasília e a partir desta mudança eda gestão do Presidente Thiesen emdiante.

    P. – Como avalia a evoluçãodo Espiritismo no Distrito Federal?

    JJM – Qualificamos o Espiri-tismo no Distrito Federal comomuito saudável e muito dinâmico.Contando com o trabalho de espí-ritas procedentes de todos os Esta-dos da União, acreditamos que aProvidência Divina muito tenhafeito e ainda faz para que isto acon-teça. Nas atividades regionais, ob-servamos o apoio incondicional nãosomente de conselheiros da FEDF,como também dos diversos traba-

    lhadores. Um dos fatores que mui-to contribuem igualmente para fa-cilitar o processo de Unificação é aproximidade das cidades que com-põem o Distrito Federal.

    P. – Gostaria de deixar algu-ma mensagem aos leitores de Refor-mador?

    JJM – Acreditamos que asobras da psicografia de Chico Xa-vier muito contribuíram para o

    processo de Unificação. Somentedepois de melhor conscientização daDoutrina foi possível a assinatura doPacto Áureo, em outubro de 1949,e, já no final do século XX a criaçãodo Conselho Espírita Internacional.A Unificação, contudo, sem adotarum modelo de hierarquias mate-riais, é processo permanente que sedesenvolverá à custa do amor e davivência do Evangelho.

    20 Reformador/Outubro 2003378

    Doutrinar e transformarMeus amigos:

    Em verdade é preciso doutrinar para esclarecer.Mas é imprescindível, igualmente, transformar para redimir.Doutrinação que melhore.Transformação que recupere.A teoria prepara.A prática realiza.Ensinando, induzimos.Fazendo, demonstramos.Quem instrui, acende luz.Quem edifica, é a própria luz em si.Para doutrinar com segurança, é necessário atender à sabedoria

    através do cérebro.Para transformar com êxito, é indispensável obedecer ao amor, por

    intermédio do coração.Não basta, pois, o ensinamento.Imperioso sejamos nós mesmos a lição viva.Pensamento que observe e ilumine.Sentimento que compreenda e ajude sempre.Não nos limitemos, desse modo, aos méritos da palavra.Procuremos, com o mesmo fervor, as vantagens da ação.Cultura que aperfeiçoe.Trabalho que santifique.Hermes, Zoroastro, Confúcio, Sidarta e Sócrates foram grandes e

    veneráveis instrutores que nos revelaram a senda.Jesus-Cristo, porém, associando lição e exemplo, é o Mestre Amo-

    roso e Sábio que nos ensina a percorrê-la.

    Emmanuel

    Fonte: XAVIER, Francisco Cândido. Vozes do Grande Além, Diversos Espíritos.4. ed., Rio de Janeiro: FEB, 1990, cap. 31, p. 127-128.

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  • Reformador/Outubro 2003 379 21

    Ricamente“A palavra do Cristo habite em vós, ricamente...”

    – Paulo. (Colossenses, 3:16.)

    Dizes confiar no poder do Cristo, mas, se o dia aparece em cores con-trárias à tua expectativa, demonstras deplorável indigência de fé na inconfor-mação.

    Afirmas cultivar o amor que o Mestre nos legou, entretanto, se o com-panheiro exterioriza pontos de vista diferentes dos teus, mostras enorme po-breza de compreensão, confiando-te ao desagrado e à censura.

    Declaras aceitar o Evangelho em sua simplicidade e pureza, contudo, seo Senhor te pede algum sacrifício perfeitamente compatível com as tuas pos-sibilidades, exibes incontestável carência de cooperação, lançando reptos esolicitando reparações.

    Asseveras procurar a Vontade do Celeste Benfeitor, no entanto, se os teuscaprichos não se encontram satisfeitos, mostras lastimáve1 miséria de paciên-cia e esperança, arrojando teus melhores pensamentos ao lamaçal do desen-canto.

    Acenderemos, porém, a luz, permanecendo nas trevas?

    Daremos testemunho de obediência, exaltando a revolta?

    Ensinaremos a serenidade, inclinando-nos à desesperação?

    Proclamaremos a glória do amor, cultivando o ódio?

    A palavra do Cristo não nos convida a marchar na fraqueza ou na lamen-tação, como se fôssemos tutelados da ignorância.

    Segundo a conceituação iluminada de Paulo, a Boa Nova deve irradiar--se de nossa vida, habitando a nossa alma, ricamente.

    Fonte: XAVIER, Francisco Cândido. Fonte Viva. 28. ed., Rio de Janeiro: FEB, 2002, cap. 125,p. 283-284.

    ESFLORANDO O EVANGELHOEmmanuel

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  • 22 Reformador/Outubro 2003380

    Século I a.C. Nasce Hilel – na Babilônia, da famí-lia de Davi –, um dos mais respeitáveis fundado-res do judaísmo rabínico, líder ético de sua gera-ção. Suas “Sete Regras”, de exegese, lançariam as basespara uma interpretação mais liberal das Escrituras.

    Século XIV. Nasce no Porto, Portugal, D. Henri-que de Sagres, aquele que mais contribuiria para a ex-pansão ultramarina portuguesa. Malgrado nunca tertomado parte em uma viagem marítima, seria cogno-minado como – o Navegador.

    Duas personalidades em dois distantes séculos, asquais se confundiriam como o Espírito atento ao cha-mado de Jesus, para execução no planeta Terra de no-bilíssimos trabalhos em prol de sua Humanidade.

    ...Chamo a atenção do leitor para estes dois versí-

    culos da Bíblia, no livro “Juízes” (Velho Testamento),capítulo 12, versículos 13 e 14:

    “Depois dele Abdom [juiz de Israel], filho de Hi-lel, piratonita, julgou a Israel (...) Morreu Abdom fi-lho de Hilel, piratonita e foi sepultado em Piratom,na terra de Efraim, na região dos amalequitas.”

    (O nome Hilel é a forma aportuguesada de Hil-lel, que por sua vez pode ser também escrito Helil, noárabe. A forma gráfica depende de cada autor. Hilel,de acordo com o Dicionário da Bíblia1 significa “eletem louvado”.

    Observando-se as datas de nascimento e desencar-nação do personagem em foco (c. 70 a.C. – c. 10 d.C.)concluir-se-á que não chegou ele a conhecer o Cristia-nismo, todavia, seus ensinamentos seriam confirmadosmais tarde por Jesus e pela Doutrina Espírita.

    O estudo com os mestres de sua época, Shemaiáh

    e Abtaliom, proporcionou-lhe invejável cultura, salien-tando-se que a tradição lhe atribuiu alto posto no Sa-nedrim com o título de Nasi (Príncipe). Todavia, suapersonalidade não se projetou tão apenas na área daCultura. Ismael Gomes Braga em sua obra O Esperan-to na Visão Espírita2, no capítulo que descreve algu-mas passagens dessa figura do século I a.C., esclareceque viveu ele “na memória da posteridade como ogrande instrutor que reunia e praticava as virtudesda caridade, humildade, paciência e piedade”. E qua-se ao término de seu bem elaborado trabalho não es-conde o autor sua admiração para o vulto que “era umhomem bom, prudente e gostava de estudar”. E aindaacrescenta: “A concisão nas máximas de Hilel [formagráfica que usou] tem muita semelhança com as má-ximas de Jesus. Umas e outras se destinam a diversasinterpretações no correr dos séculos, de conformidadecom o adiantamento das inteligências e o progresso daRevelação Divina.”

    Por outro lado, o livro de Hermínio Miranda,Reencarnação e Imortalidade3, fornece-nos mais al-guns dados sobre o personagem que estamos tecendoconsiderações:

    “(...) Seu espírito de há muito devia estar ligadoao do Mestre, porque seus ensinamentos são notavel-mente coincidentes com os do Cristo:

    – O que for desagradável para ti, não faças ao teupróximo, nisto se resume toda a Lei; tudo o mais nãopassa de comentário.

    – Não julgues o teu semelhante antes de te colo-cares em seu lugar.”

    Realmente, uma identificação visível!ss

    ...Humberto de Campos, em sua obra bem conhe-

    cida Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho4,até hoje de expressiva vendagem, em seu primeiro ca-pítulo vem colocar-nos a par do curioso diálogo queum dia, no Espaço Sideral, foi mantido entre Jesus e

    Dois séculos, duas projeçõesKleber Halfeld

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  • Reformador/Outubro 2003 23381

    o Espírito daquele que, no passado, foi um dos maiseminentes rabis de seu povo, considerado mesmo lí-der ético de uma geração.

    (No mencionado diálogo, a forma nominal usa-da pelo autor é a árabe – Helil –, em vez de Hilel, for-ma aportuguesada.)

    No encontro, as palavras iniciais de Jesus ao seufiel mensageiro, encarregado dos problemas socioló-gicos da Terra, conforme se toma conhecimento:

    “– Helil (...) meu coração se enche deprofunda amargura, vendo a incompreensãodos homens, no que se refere às lições domeu Evangelho. Por toda parte é aluta fratricida, como polvo de in-finitos tentáculos, a destruir to-das as esperanças; recomendei--lhes que se amassem comoirmãos, e vejo-os em movi-mentos impetuosos, aniqui-lando-se uns aos outroscomo Cains desvairados.”

    (Oportuno esclarecerque segundo Humbertode Campos esse encontro severificou no último quarteldo século XIV em uma dasperiódicas visitas de Jesus àTerra.)

    Busca o mensageiro aduzirque semelhantes movimentos –referência feita às Cruzadas –, pos-sivelmente teriam uma justificativa.Que os príncipes cristãos “empreen-dendo as iniciativas daquela natureza,guardavam a nobre intenção de velar pelapaisagem deliciosa dos Lugares Santos”.

    O diálogo continua repleto de doce emoção,quando o leal mensageiro, entre brando e humilde,considera:

    “– Senhor, se esses povos infelizes, que procuramna grandeza material uma felicidade impossível,marcham irremediavelmente para os grandes infor-túnios coletivos, visitemos os continentes ignorados,onde espíritos jovens e simples aguardam a sementede uma vida nova. Nessas terras, para além dos gran-des oceanos, poderíeis instalar o pensamento cristão,dentro das doutrinas do amor e da liberdade.”

    Noticia então Humberto de Campos que acom-panhados de querubins e arcanjos, dirigem-se Jesus eseu mensageiro para o continente que posteriormen-te seria o mundo americano. E quando se detêm deforma mais específica sobre o solo que mais tarde re-ceberia a designação de Brasil, uma nobre incumbên-cia é dada pelo Mestre:

    “(...) Tu, Helil, te corporificarás na Terra, no seiodo povo mais pobre e mais trabalhador do Ocidente;instituirás um roteiro de coragem, para que sejamtranspostas as imensidades desses oceanos perigosos e

    solitários, que separam o velho do novo mundo(...) Aqui, Helil, sob a luz misericordiosa

    das estrelas da Cruz, ficará localizadoo coração do mundo!”

    Essas doces quão emotivas pa-lavras de Jesus são suficientes,em verdade, para identificar, noEspírito posto em evidência,aquele que estava pronto paraatender ao amoroso chama-do do Cristo. É o que vemosconfirmado nesta afirmativado autor da obra Brasil, Co-ração do Mundo, Pátria doEvangelho:

    “Consoante a vontadepiedosa do Senhor, todas as suas

    ordens foram cumpridas inte-gralmente.”

    ...É vocábulo bem conhecido este que

    aqui anotamos: Sagres.Consoante a Grande Enciclopédia Larous-

    se Cultural, identifica ele a freguesia do concílio daVila do Bispo, Portugal; lembra o local onde – segun-do a tradição – D. Henrique teria fundado sua céle-bre escola de navegação, conhecida como Escola deSagres, da qual partiram as caravelas para a conquistade desconhecidos mares... e terras. Finalmente nos trazà mente o nome de um promontório, ao sul da po-voação de Sagres.

    Entretanto, destas designações inegavelmenteaquela que mais se projetou foi, de fato, a Escola fun-dada pelo Infante D. Henrique.

    Reconhecendo ele as necessidades de uma povoa-

    D. Henrique de Sagres

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    e

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  • 24 Reformador/Outubro 2003382

    ção destinada aos trabalhos de apetrechamento dasnaus que se encontravam na baía de Lagos – na ver-dade, um excelente porto de abrigo –, imaginouD. Henrique reunir, em sua residência, mestres astrô-nomos portugueses, que formariam pilotos como Jai-me de Maiores, Mestre Joam, Samuel Goleimo, An-tônio de Nola e outros.

    (Em 1755, um terremoto destruiu muitas cons-truções ali existentes.)

    Porém, neste ponto, é o caso de questionar-se:– Por que motivo a especificação de semelhantes

    detalhes?Explicamos.Foi exatamente o Infante D. Henrique, quinto fi-

    lho de D. João I e D. Filipa de Lencastre, quem maislutou pela ampliação ultramarina dePortugal, conforme já esclarecido, ouseja, era o Espírito determinado acumprir na Terra o compromisso fir-mado no Além, diante da figura ex-celsa de Jesus! Os historiadores não sefurtam em admitir que entre as pos-síveis razões que levaram D. Henri-que a agir de forma tão obstinada,dois motivos podem ser especifica-dos: um de ordem econômica; outro,de fé. (Grifei.)

    Confirmemos com Humbertode Campos:

    “(...) Desde a expedição de Ceu-ta, o Infante deixou transparecer, emvários documentos que se perderamnos arquivos da Casa de Avis, que ti-nha a certeza da existência das terras maravilho-sas, cuja beleza haviam contemplado os seus olhosespirituais, no passado longínquo. (Destaquei.) (...)A prova de que os seus estudos particulares falavamda terra desconhecida é que o mapa de André Bian-co, datado de 1448, mencionava uma região frontei-ra à África (...).”

    É interessante salientar, todavia, que o trabalhode D. Henrique não se findaria com sua desencarna-ção em 1460.

    “Novamente no Além – escreve o grande cronis-ta do mundo espiritual –, o antigo mensageiro doMestre [que no passado fora Hilel, ou Helil] não des-cansou, chamando a colaborar com ele numerosas fa-

    langes de trabalhadores devotados à causa do Evan-gelho do Senhor.”

    A influência espiritual do antigo Infante busca en-volver esses mesmos trabalhadores. Entre eles, a figu-ra de Pedro Álvares Cabral, que depois de implorar asbênçãos de Deus na Ermida do Restelo, parte confian-te em direção ao seu objetivo. Estava criado – comodiz o autor da obra que estamos focalizando – o cam-po favorável para a “assistência espiritual do men-sageiro incansável [D. Henrique de Sagres] que, de fa-to, era ali o divino expedicionário”.

    ...Duas épocas.Século I a.C.

    Século XIV.Um Espírito. Uma individuali-

    dade e duas personalidades. Duasrespeitáveis projeções: Hilel (ou co-mo queiram, Helil), líder de uma ge-ração na antiga Palestina; Infante D.Henrique, o Navegador, celebrizadopor uma escola de navegação quefundou em Portugal.

    Quais as demais personalidadesdesse iluminado Espírito em outrosséculos?

    Como responder?Entretanto, quem poderá negar

    não ter ele se apresentado debaixo deoutras roupagens físicas, sempre co-mo o fiel mensageiro envolto por umprofundo sentimento de amor a Jesus?

    Amor que deveria refletir-se através de abençoa-dos trabalhos em favor da Humanidade.

    REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

    1 DAVIS, John D. Dicionário da Bíblia. 2. ed., Rio de Janeiro. CasaPublicadora Batista, p. 274.

    2 BRAGA, Ismael G. O Esperanto na Visão Espírita. 1. ed., Rio deJaneiro. Sociedade Editora Espírita F. V. Lorenz, capítulo “Hilel”.

    3 MIRANDA, Hermínio C. Reencarnação e Imortalidade. 4. ed., Riode Janeiro: FEB, 1991, p. 20-21.

    4 CAMPOS, Humberto de. Brasil, Coração do Mundo, Pátria doEvangelho, pelo Espírito Humberto de Campos. 28. ed., Rio de Janeiro:FEB, 2002, caps. I e II.

    É interessante

    salientar, todavia,

    que o trabalho de

    D. Henrique não se

    findaria com sua

    desencarnação

    em 1460

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  • Reformador/Outubro 2003 25383

    A FEB E O ESPERANTO

    Renato Corsetti, ativo e cons-ciente esperantista italiano,atualmente na presidência daAssociação Universal de Esperanto,pede-nos dar divulgação do textoque abaixo transcrevemos, em tra-dução, endereçado a todos os queaderiram à causa da Língua Inter-nacional Neutra Esperanto, masainda não cerraram fileiras nos ser-viços do movimento esperantistaorganizado. Apresentamo-lo, por-tanto, pela sua oportunidade e uti-lidade, ao leitor de Reformador.

    Por uma Comunidade mais vasta

    Por que, afinal de contas, eudeveria filiar-me ao clube de Espe-ranto de minha localidade? à asso-ciação esperantista nacional? à as-sociação de minha especialidade oude meu hobby? à Associação Uni-versal de Esperanto?

    Existem, pelo menos, dois bonsmotivos.

    As associações esperantistas, emtodos os níveis, trabalham por ummundo melhor, por um mundo on-de não haja discriminação lingüís-tica e cultural, numa palavra, poruma “democracia lingüística”.

    Se você acha que elas visam aum bom objetivo, então você, comcerteza, quererá sustentá-la. Ade-rindo ao clube local, ou à associa-ção nacional, ou à entidade especia-lizada, ou à organização mundial(até mesmo, eventualmente, a todaselas), você se tornará parte inte-grante desse Movimento Esperantis-ta Mundial que, há mais de um sé-culo, trabalha em favor dos direitoshumanos no campo lingüístico emtodos os níveis, tentando convencero mundo de que também no terre-no cultural-lingüístico a justiça va-le muito mais do que a força.

    Ao mesmo tempo, você talvezgoste de simplesmente pertencer àcomunidade que fala a língua in-ternacional Esperanto; de encontraroutras pessoas que falem o Esperan-to; de comprar livros em Esperanto;de viajar a outros países, conhecerseus habitantes e, eventualmente,ser mesmo hóspede de es-perantistas locais.

    Tudo isso é pratica-do, de forma totalmentenatural, pelos membros deassociações esperantistas,pois que eles são perma-nentemente informadossobre revistas, livros, con-gressos, grupos e páginasda rede mundial, anún-cios de correspondência epossibilidade de viagem.

    No Brasil, você deve contactara LIGA BRASILEIRA DE ESPE-RANTO (Caixa Postal 03625,CEP 70084-970, Tel.: 0xx61226-1298, Fax 0xx61 226-4446,http://www.esperanto.org.br, e-mail:[email protected], onde colherádetalhadas informações sobre o mo-vimento em sua cidade e em seuEstado.

    Ainda através da LIGA, vocêse informará sobre as condições deadesão à Universala Esperanto-Aso-cio (Associação Universal de Espe-ranto), que oferece diversas moda-lidades de filiação. A UEA tem osseguintes endereços: Nieuwe Bin-nenweg 176, 3015 BJ Rotterdam,Nederlando; tel.: +31 10 4361044; fax +31 10 436 1751;http://www.uea.org; e-mail:[email protected].

    Fortaleçamos o MovimentoEsperantista organizado

    Affonso Soares

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    As primeiras referências à idéiade reencarnação perdem-se nanoite dos evos da História. Te-mos notícias dela há dois mil e qui-nhentos anos, nas Upanichades (es-crituras sagradas do Hinduísmo),até hoje a maior religião da Índia.Neste mesmo período, Pitágoras1,filósofo e matemático, grego, nasci-do por volta do ano 580 a.C., quefoi discípulo de Ferecides de Siros –dizia que a alma era imortal e, de-pois da morte do corpo, ela ocupa-va outro corpo (palingenesia), àsvezes, de um animal (metempsico-se) – tese equivocada do matemáti-co de Samos. Pelas fontes históricas,

    é a primeira vez que a teoria dareencarnação foi mencionada noOcidente. Posteriormente, Platão(429-347 a.C.), também filósofogrego, discípulo de Sócrates, ensi-nava que a alma nasce muitas vezes,até mesmo durante dez mil anos, e,depois, parte para a bem-aventu-rança celestial.

    Nos primeiros séculos, muitosgrupos cristãos, majoritários, defen-deram a palingenesia, especialmen-te os gnósticos2, com sua visão pro-fundamente inteligente do corpo eda matéria em geral. O extraordiná-rio cristão Orígenes3, de Alexandria,defendeu a reencarnação. A partirdas suas reflexões, surgiu um gruposábio de monges que passaram aprofessar também a doutrina daspreexistências. Para os “donos” dopoder clerical o chamado “origenis-

    mo” tornava-se nefasto e tumultua-va, mormente a Palestina. Em facedisso, o patriarca da igreja de Jeru-salém, no século VI, solicitou aoimperador bizantino Justiniano queinterviesse.

    O Imperador escreveu um tra-tado contra Orígenes, e que levou o“dono” da igreja de Constantino-pla a reunir aí um sínodo4 em 543,que condenou as teses relativas àpreexistência da alma e outras posi-ções origenistas. Dez anos depois,em 553, com a aquiescência ambí-gua do papa Virgílio5, o ImperadorJustiniano convocou o II Concíliode Constantinopla, no qual, comastuta maquinação, retirou definiti-vamente a chamada “controvérsiaorigenista”, mediante eleição espú-ria que venceu por 3 a 2 votos. E areencarnação foi definitivamentebanida dos preceitos de direito ecle-siático6. Lógico! a Igreja estava de-

    Reencarnação: Processo universal deaplicação da Justiça Divina

    Jorge Hessen

    1 Pitágoras de Samos (séc. VI a.C.), filósofo ematemático grego. Seus seguidores, os pitagó-ricos, que, dos sécs. VI ao IV a.C., organizadosem comunidades filosófico-religiosas multipli-cadas pela Magma Grécia, constituíram a cha-mada escola itálica ou escola pitagórica. De-fine-se o pitagorismo por duas tendências: amístico-moralista, ligada ao orfismo e ao xa-manismo, e a filosófico-matemática, de que re-sultou brilhante acervo de conhecimentos arit-méticos, geométricos, astronômicos e acústi-cos, integrados pelo descobrimento de corres-pondências numéricas entre as várias ordens derealidade.

    2 Diz-se de, ou adepto do gnosticismo, movi-mento filosófico-religioso surgido nos primei-ros séculos da nossa era e diversificado em nu-merosas seitas, e que visava a conciliar todas asreligiões e a explicar-lhes o sentido mais pro-fundo por meio da gnose (conhecimento eso-térico e perfeito da divindade, e que se trans-mite por tradição e mediante ritos de Inicia-ção).3 Morreu em 254 d.C., na cidade de Tiro, emvirtude da perseguição de Décio, mais conhe-cido pelo nome de Trajano, o qual era um in-cansável opositor do Cristianismo.

    4 Órgão colegiado e permanente do governoeclesiástico das Igrejas do Oriente.5 Vírgilio (537-555) nasceu em Roma, de fa-mília nobre. Foi eleito graças à simonia, à calú-nia e à cumplicidade da Imperatriz Teodora.De caráter débil, foi vítima de chantagens porparte da Imperatriz e do Imperador Justiniano.Morreu em Siracusa, quando voltava a Romaapós demorada visita ao Oriente.6 Há quem afirme que foi por influência de

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    fendendo nesse ato extravagante adoutrina do céu e do inferno e aspenas eternas, porque centrava maispoder em suas mãos. E dessa formaa reencarnação foi banida num dosmais graves equívocos cometidospelo Catolicismo.

    Antes disso, no século III o no-tável Clemente de Alexandria ob-servou em sua obra Stromata (Mis-celâneas): “A hipótese de Basílides,um mestre gnóstico, diz que a al-ma, tendo pecado anteriormenteem outra vida, experimenta puni-ção nesta vida.”

    Nessa mesma época, Tertulia-no, o primeiro autor cristão a escre-ver em latim, negando a metem-psicose, expressa-se muitas vezessobre o assunto, como nesta passa-gem: “Quão mais digno de aceita-ção é o nosso ensino de que as al-mas irão retornar aos mesmoscorpos. E quão mais ridículo é oensino herdado [pagão] de que o es-pírito humano deve reaparecer emum cão, cavalo ou pavão!” (Ad Na-tiones, cap.19). Fica evidente quetanto quanto os espíritas, os sábiosda Igreja também não aceitavam ametempsicose.

    A tese da metempsicose confli-tava a mente de alguns teólogos,questão que a rigor só foi mais bemesclarecida com a advento do Espi-ritismo. Vejamos o apologista e his-toriador Lactâncio, no século IV,expressando pensamento dos seus

    contemporâneos cristãos: “Os pita-góricos e estóicos afirmavam que aalma não nasce com o corpo. Antes,eles dizem que ela foi introduzidano mesmo e que migra de um cor-po para outro.” Em outro ponto desua obra As Institutas Divinas eleafirma: “Pitágoras insiste que as al-mas migram de corpos desgastadospela velhice e pela morte. Ele dizque elas são admitidas em corposnovos e recém-nascidos. Ele tam-bém diz que as mesmas almas sãoreproduzidas ora em um homem,ora em uma ovelha, ora em umanimal selvagem, ora em um pás-saro... Essa opinião de um homeminsensato é ridícula.”

    Outro testemunho importantevem do maior teólogo da Igreja an-tiga do século V, Agostinho. Ele es-tava familiarizado com as teorias dereencarnação tanto maniqueístasquanto platônicas do seu tempo.Em um comentário sobre Gênesis,ele rejeitou como contrária à fé cris-tã a idéia de que as almas humanasretornavam em corpos de diferen-tes animais, de acordo com a suaconduta moral (transmigração). EmA Cidade de Deus (Livro X, cap.30), o bispo de Hipona observaque, embora o filósofo neoplatôni-co Porfírio tenha rejeitado esse con-ceito ensinado por Platão e Plotino,e não hesitasse em corrigir os seusmestres nesse ponto, ele achava queas almas humanas voltavam em ou-tros corpos humanos. Sobre essaquestão – metempsicose – o Espiri-tismo corrige o equívoco de Pitágo-ras.

    Atualmente, para alguns cris-tãos, a “prova” da unicidade da vi-da humana está inserta no capítu-lo 9 versículo 27 da carta de Pauloaos Hebreu