Reflexões Sobre a Autonomia 5 - passa palavra

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Reflexes sobre a autonomia (5): classe e organizao26 de abril de 2015Categoria:Ideias & DebatesComentar|Imprimir quando os trabalhadores arrancam da burguesia e dos gestores o controle sobre suas lutas e conquistas, e principalmente quando sabem que esto arrancando e no pedindo ou ganhando nada de graa, a, s ento que constroem sua autonomia enquanto classe.Por Passa PalavraA esta altura, alguns tero estranhado o debate ter comeado to do alto e de longe, sem sequer tocar em problemas mais prximos nem sair apontando nomes e culpados. Optou-se neste ensaio por comear apontando, mais uma vez e como sempre, algo que deveria ser bvio: aclassequem luta e conquista autonomia, no ogrupo, aorganizaoou ocoletivo.Por isso, as crticas neste debate no so, nem sero voltadas a nenhuma organizao em particular, mas a todas as organizaes do campo autonomista que no se percebam enquanto expresso das necessidades da classe trabalhadora em luta, enquanto instrumento prtico, plstico e mutvel para fortalecer estas lutas. Ou, retificando, j que o problema no de simples autoidentificao: trata-se de criticar as caractersticas gerais de organizaes que noagemcomo instrumentos polticos da classe trabalhadora.H organizaes que se concebem autnomas por embasarem-se em tal ou qual leitura autonomista. Estranhamente, na prtica se v que tais organizaes estabelecempadres de comportamento inalcanveise dedicam boa parte do seu tempo caa fratricida aos hereges; criamritos e cdigos hermticos, causa de srias restries renovao de seu quadro de integrantes; esperando a completa submisso de seus integrantes a seus ritos, cdigos e padres de condutas, mostram-se incapazes de lidar com ascontradiesprprias de indivduos cindidos entre a integrao nos quadros sociais e ideolgicos do capitalismo e a construo de relaes sociais novas; falam um jargo incompreensvel por quem no da cena a que pertencem; isolam-se paulatinamente das lutas do presente, por no quererem se misturar com os impuros; por tudo isso,no articulamsuas pautas com o cotidiano da explorao e da opresso vivido pela classetrabalhadora, descolam-se completamente dos trabalhadores e de suas lutas. So, assim,autnomas por antfrase.A longa histria de lutas dos trabalhadores demonstra queaclasse precede a organizao, nunca o contrrio. Uma organizaoexpressa, nuncaantecipacontedos ou papis; se apoltica prefigurativato cara a alguns grupsculos no est ligada a um movimento de massas, torna-se uma simples brincadeira entre amigos, ou um perigoso e ilusrio jogo de adivinhao afinal, trata-se de umprojeto, pois no se sabe se a sociedade do futuro seguir realmente as tendncias apontadas pelas prticas organizativas adotadas. No se cria uma classe ou um povo a partir da organizao; a partir das lutas da classe, do povo, que surge a organizao, como expresso das necessidades da lutatravada pelos trabalhadores. somente na medida em que os integrantes de uma organizao refletem sobre seu lugar na diviso social do trabalho e tomam parte nos conflitos sociais do presente a partir do lugar em que se encontram (veraqui), somente assim que fortalecem a luta autnoma dos trabalhadores. a partir de sua imerso completa nas contradies do movimento de massas que uma organizao pode, sem demagogia, se dizer autnoma.A expressomovimento de massas,aqui, engloba no apenas os grandes e memorveis dias de luta multitudinria, as palavras de ordem, os enfrentamentos, as vitrias e derrotas. Refere-se ao contnuo entre estas formas de lutas e aquelas formas de enfrentamento da disciplina capitalista que, embora individuais em sua iniciativa e restritas em seu alcance, se tornam sociais, massivas, na medida em que muitos as praticam sem se articular conjuntamente e s vezes at sem saber uns dos outros. Alguns exemplos esclarecero a questo.Asnovas formas de trabalhoso uma primeira questo a debater (veraqui,aquieaqui). Sabe-se que a qualificao da fora de trabalho fator determinante para a insero em lugares mais rentveis na diviso social do trabalho; sendo assim, seja pela sua baixa escolaridade, seja pela sua ainda pequena experincia laboral, os setores mais jovens da classe trabalhadora iniciam sua sujeio explorao capitalista em trabalhos precrios, com baixa remunerao e pouco respeito s garantias trabalhistas. A alta rotatividade, ocall center, o trabalho emshopping centerse nas cadeias defast food(veraqui), a superexplorao nos comrcios de bairro, da que vem tudo isso. Por outro lado, eventuais defasagens entre as qualificaes formais da fora de trabalho e as necessidades de produo em determinado momento e lugar determinam, igualmente, uma defasagem entre o emprego que se conseguiu e as expectativas geradas pela formao recebida. da que surgem o frila permanente, a prorrogao infinita da formao universitria para garantir bolsas de pesquisa ou extenso, a sucesso de assessorias, a sujeio ao trabalho nos trs turnos para complementar renda isto sem falar dos que, no terceiro setor, vendem sua fora de trabalho como se, de quebra, vendessem tambm sua militncia e engajamento. Os trabalhadores menos qualificados encontram problemas bastante semelhantes queles encontrados por trabalhadores mais qualificados, e cada qual vai buscando suas formas de resistncia e sobrevivncia. Dado o carter atomstico das novas formas de trabalho, mantido mesmo quando se trata de trabalho terceirizado para grandes empresas, todos estes novos processos fortalecem a fragmentao e o individualismo caractersticos dos processos de explorao capitalista no processo de trabalho. Que iniciativas de luta e resistncia estratgico divulgar e fortalecer? Como estabelecer pontes com companheiros de outros setores, de outros ramos? Como estabelecer pontes entre os companheiros que esto sujeitos a estas novas formas precarizadas de trabalho e aqueles outros em postos estveis e com garantias trabalhistas?Aluguel, prestao da geladeira ou da TV, emprstimo bancrio, cheque especial, carto de crdito oendividamentonunca pensado coletivamente; sempre produto de circunstncias estritamente individuais, particulares a cada trabalhador ou a sua famlia, mas a sobrecarga de obrigaes financeiras a tnica daincluso social pelo consumo.O aumento massivo da inadimplncia dos trabalhadores, entretanto, reflete o fato de que mais e mais endividados optam por usar seu dinheiro para outra coisa que no o pagamento de suas dvidas. Os evidentes efeitos da inadimplncia massiva preocupam as instituies de crdito e outros rentistas; na medida de suas foras, podem adotar medidas que vo das cobranas judicias e extrajudiciais interferncia incisiva sobre a poltica econmica. Tornam-se ento mais frequentes nos noticirios as falas de especialistas em economia domstica ensinando como administrar dvidas e manter equilibradas as finanas familiares. A gesto do endividamento massivo, entretanto, no se presta aelimin-lo, pois o endividamento um dos meios de reforo sujeio dos trabalhadores roda viva da explorao. neste sentido que a inadimplncia pode ser entendida como um movimento de massa e, ento, serpolitizada, ou seja,integrada, enquanto fenmeno particular, numa escala mais ampla de problemas sociais e econmicos. Quem so os inadimplentes? Em funo de qu deixam de pagar suas dvidas? E que dvidas so estas, de onde vm, como as contraram? Que se pode fazer quanto a elas? H estratgias para burlar o endividamento? Como podem ser fortalecidas?Aviolncia policial nos bairros de trabalhadores outra questo sobre a qual refletir. Aqui, os efeitos individuais da violncia humilhao, traumas, hematomas, fraturas, morte so sempre percebidos diante de um pano de fundo coletivo; no h, nos bairros populares, quem no saiba que o tratamento que lhes dispensado pela polcia radicalmente diferente daquele dispensado aos bairros da burguesia e da classe mdia. No h quem no saiba que a confuso entre bandidos e pessoas de bem nas periferias proposital, feita para disciplinar a vida dos trabalhadores fora do ambiente de trabalho atravs do temor constante da violncia. Entretanto, pode-se dizer, sem medo de errar, que ocaso Amarildofoi um divisor de guas na questo; depois dele, e de l at achacina do Cabula(veraquieaqui), a postura dos familiares e amigos de vtimas, e tambm a das comunidades afetadas, passou do medo, da lei do silncio e da paz dos cemitrios para a denncia e para reivindicaes que vo da punio dos culpados desmilitarizao da polcia. Como a ocupao militar dos bairros de trabalhadores se relaciona com sua sujeio explorao nos lugares de trabalho? A que formas urbanas corresponde esta ocupao militar, que padres ela desenha? O que j est sendo feito para romper com estes padres? E o que est sendo feito para parar a matana?Aproduo cultural nos bairros de trabalhadores(poesia, grafitagem, dana, msica etc.) surge como quarto exemplo (veraqui,aquieaqui). Se estes trabalhadores tm dificultado seu acesso a determinados bens culturais (museus, cinemas, teatros e equipamentos similares), produzir cultura onde moram parece ser o passo mais lgico. Criou-se, assim, uma esttica particular, capaz de demarcar os territrios onde o som ofunk, orap, asuingueira; onde ossarausmesclam com sucesso literatura e poltica; onde modos de vestir demarcam a pertena a uma classe. Por outro lado, embora tal produo reflita a apropriao pelos trabalhadores de certos processos de produo da cultura e sirva como demarcador de sua identidade enquanto trabalhadores, enquanto moradores das periferias urbanas, enquanto jovens, enquanto negros, enquanto homens ou mulheres etc., mascara o fato de que o domnio sobrealgunsprocessos de produo cultural se d pela sua completa excluso dos processos que produzemoutrostipos de manifestao cultural. Deste jeito, fica fcil tanto para oboyquanto para apatygirlvestir as roupas certas, falar algumas palavras codificadas, fazer certa performance gestual e se dizerda quebrada; embora a generosidade caracterstica de quem se criou partilhando o pouco que tem permita esta apropriao (e enquanto a cultura for livre seus smbolos e cdigos tm circulao irrestrita), a via inversa, a de algumda quebradaque domine a literatura, a msica, o teatro, a dana, o gestual, as palavras etc. produzida com cdigos e processos outros que no os seus prprios, sempre muito mais difcil.Retoma-se deste modo, por outras vias, o velho problema, poltico por natureza, da produo e circulao de bens culturais. Que problemas so criados por esta contradio? possvel, desejvel quea quebradase aproprie destes outros cdigos, ritos e processos? Como faz-lo?Novamente, os exemplos foram escolhidos a dedo; como no se pode tratar de tudo, s possvel esperar que os exemplos indiquem o caminho que se quer trilhar. As revolues no resultam do puro desejo da militncia nem de proclamaes bombsticas, masdo crescimento material da luta de classes.No capitalismo, este crescimento s pode se dar quando a classe trabalhadora entra em disputa com a burguesia e os gestores em torno de questes muito concretas; de um lado, em torno do seu tempo de trabalho, e de outro em torno da quantidade de insumos que incorpora a si prpria. Isto significa falar dedisputa pelas condies de trabalho, deconquistas materiaise culturais, de tudo j tratado na parte 2 deste ensaio. quando os trabalhadores acirram a disputa pelas suas condies de trabalho, quando acumulam conquistas materiais e culturais expressivas, quando o fazem arrancando da burguesia e dos gestores o controle sobre suas lutas e conquistas, e principalmente quandosabemque esto arrancando e no pedindo ou ganhando nada de graa, a, s ento que constroem sua autonomia enquanto classe.A srieReflexes sobre a autonomiacontm 6 partes, com previso de publicao de uma parte a cada domingo.Etiquetas:Extrema_esquerda,Reflexes