Rastros 10.1 - Apresentação

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Ano IX - n°10 - Outubro de 2008 5 Apresentação A edição de número 10 da Rastros que apresentamos aos nossos leitores é representativa de um ciclo de transformações que o Núcleo de Estudos em Comunicação (Necom) vem empreen- dendo desde o semestre passado. Após comemorarmos os 10 anos do curso de Comunicação Social, damos início a uma fase de reestruturação editorial da revista. Ampliamos o conselho editoral, que neste momento, conta com pareceristas permanentes e ad hocs, nacionais e internacionais, bem como, estamos empenhados em um processo de reconfiguração gradual do projeto gráfico da Rastros. Como forma de atender a uma demanda crescente de artigos que nos são encaminhados a cada novo edital, alteramos a periodicidade da publicação, permitindo que leitores, articulistas e conselho editorial possam contar com duas edições da revista por ano. À essas novidades, soma-se o trabalho da equipe do núcleo para que, em breve, a revista também possa estar indexada digital- mente, acompanhando um movimento de organização e sistematização das publicações da área da comunicação. Os 11 artigos que conformam esta edição, cada qual com seu enfoque, compartilham de reflexões e questões que têm mobilizado, nos últimos tempos, os pesquisadores que se movimen- tam pelo campo da comunicação. Ainda que esta edição não seja temática, é interessante perceber determinadas “zonas conceituais” por onde o leitor estará transitando durante a leitura dos textos aqui compilados. Espaço, Jornalismo e Estética são as esferas que mobilizaram, de alguma maneira, os autores que contribuíram para essa edição a buscar objetos que tocassem elementos tão diversos e di- nâmicos, tais como: imagem, movimento, linguagem, corpo (retrato da morte e suporte da dança), espaço (da cidade, do global, das fronteiras, do virtual), moderno e pós-moderno (a possibilidade de coexistência). Todos convergem e são sensibilizados pela mesma ambição, pensar a comunicação para além dos meios, enquanto “encontro”: lugar da diversidade e flexibilidade de olhares. A linha de pesquisa da Rastros está, nesta edição, contemplada em toda sua diversidade, já que o diálogo entre os textos aqui apresentados procura dar conta exatamente do desafio de “promover articula- ções complexas com a cultura contemporânea”, as quais são permeadas em grande medida por uma preocupação “estética-expressiva”. Eis que o convite para transitar por esse universo rico de possibilidades de articulação, em termos teóricos e metodológicos, é lançado por Alberto Efendy Maldonado (Unisinos), autor convidado desta edição. Ao sistematizar o percurso epistemológico dos três principais autores que constituíram o campo teórico da comunicação na América Latina, Eliseo Véron, Armand Matte- lart e Jesús Martin-Barbero, o autor inspira e dá o tom das questões orientadoras dessa edição no artigo Reflexões sobre a pesquisa teórica em comunicação na América Latina. Ainda que as disciplinas de Teoria da Comunicação sejam obrigatórias na maioria dos cursos da América Latina, Maldo- nado chama atenção para a circulação restrita dos autores latino-americanos nas universidades. O convite ao desbravamento e compreensão do pensamento comunicacional regional é fruto de pes- quisas empreendidas pelo autor ao longo da década de 1990 e atende à preocupação de sensibilizar os pesquisadores “a concepção de que o pensamento deve ser construído, aperfeiçoado, criticado, reformulado, em cada pesquisa”. Em Véron, o autor vê a figura do “pioneiro” e do “metodólogo”, pesquisador preocupado com a crítica das técnicas e reflexão sobre os métodos. Na trajetória de Mattelart, estão presentes a preocupação com a transdisciplinaridade teórico-metodológica e com uma postura crítica e de militância, elementos que o caracterizam, nos termos de Maldonado, como um “autor/paradigma” ou fundador”, por ter gerado uma obra científica reconhecida amplamente nas comunidades de pares na América Latina. O pesquisador também acompanha atentamente a luta de Martín-Barbero para que as comunidades do Terceiro Mundo desenvolvam pesquisa teóri- ca, sobretudo, quando o paradigma do Modelo Informacional constitui um contexto hegemônico difícil de ser superado. Mobilizado pelas idéias do autor da obra Dos Meios às Mediações, nosso articulista convidado chama atenção para o fato da dimensão teórica no campo da comunicação ser considerada como “lugar estranho”. Seguindo as pistas da trajetória intelectual de Martin-Barbero,

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Ano IX - n°10 - Outubro de 2008 5

Apresentação

A edição de número 10 da Rastros que apresentamos aos nossos leitores é representativa de um ciclo de transformações que o Núcleo de Estudos em Comunicação (Necom) vem empreen-dendo desde o semestre passado. Após comemorarmos os 10 anos do curso de Comunicação Social, damos início a uma fase de reestruturação editorial da revista. Ampliamos o conselho editoral, que neste momento, conta com pareceristas permanentes e ad hocs, nacionais e internacionais, bem como, estamos empenhados em um processo de reconfiguração gradual do projeto gráfico da Rastros. Como forma de atender a uma demanda crescente de artigos que nos são encaminhados a cada novo edital, alteramos a periodicidade da publicação, permitindo que leitores, articulistas e conselho editorial possam contar com duas edições da revista por ano. À essas novidades, soma-se o trabalho da equipe do núcleo para que, em breve, a revista também possa estar indexada digital-mente, acompanhando um movimento de organização e sistematização das publicações da área da comunicação.

Os 11 artigos que conformam esta edição, cada qual com seu enfoque, compartilham de reflexões e questões que têm mobilizado, nos últimos tempos, os pesquisadores que se movimen-tam pelo campo da comunicação. Ainda que esta edição não seja temática, é interessante perceber determinadas “zonas conceituais” por onde o leitor estará transitando durante a leitura dos textos aqui compilados. Espaço, Jornalismo e Estética são as esferas que mobilizaram, de alguma maneira, os autores que contribuíram para essa edição a buscar objetos que tocassem elementos tão diversos e di-nâmicos, tais como: imagem, movimento, linguagem, corpo (retrato da morte e suporte da dança), espaço (da cidade, do global, das fronteiras, do virtual), moderno e pós-moderno (a possibilidade de coexistência). Todos convergem e são sensibilizados pela mesma ambição, pensar a comunicação para além dos meios, enquanto “encontro”: lugar da diversidade e flexibilidade de olhares. A linha de pesquisa da Rastros está, nesta edição, contemplada em toda sua diversidade, já que o diálogo entre os textos aqui apresentados procura dar conta exatamente do desafio de “promover articula-ções complexas com a cultura contemporânea”, as quais são permeadas em grande medida por uma preocupação “estética-expressiva”.

Eis que o convite para transitar por esse universo rico de possibilidades de articulação, em termos teóricos e metodológicos, é lançado por Alberto Efendy Maldonado (Unisinos), autor convidado desta edição. Ao sistematizar o percurso epistemológico dos três principais autores que constituíram o campo teórico da comunicação na América Latina, Eliseo Véron, Armand Matte-lart e Jesús Martin-Barbero, o autor inspira e dá o tom das questões orientadoras dessa edição no artigo Reflexões sobre a pesquisa teórica em comunicação na América Latina. Ainda que as disciplinas de Teoria da Comunicação sejam obrigatórias na maioria dos cursos da América Latina, Maldo-nado chama atenção para a circulação restrita dos autores latino-americanos nas universidades. O convite ao desbravamento e compreensão do pensamento comunicacional regional é fruto de pes-quisas empreendidas pelo autor ao longo da década de 1990 e atende à preocupação de sensibilizar os pesquisadores “a concepção de que o pensamento deve ser construído, aperfeiçoado, criticado, reformulado, em cada pesquisa”. Em Véron, o autor vê a figura do “pioneiro” e do “metodólogo”, pesquisador preocupado com a crítica das técnicas e reflexão sobre os métodos. Na trajetória de Mattelart, estão presentes a preocupação com a transdisciplinaridade teórico-metodológica e com uma postura crítica e de militância, elementos que o caracterizam, nos termos de Maldonado, como um “autor/paradigma” ou fundador”, por ter gerado uma obra científica reconhecida amplamente nas comunidades de pares na América Latina. O pesquisador também acompanha atentamente a luta de Martín-Barbero para que as comunidades do Terceiro Mundo desenvolvam pesquisa teóri-ca, sobretudo, quando o paradigma do Modelo Informacional constitui um contexto hegemônico difícil de ser superado. Mobilizado pelas idéias do autor da obra Dos Meios às Mediações, nosso articulista convidado chama atenção para o fato da dimensão teórica no campo da comunicação ser considerada como “lugar estranho”. Seguindo as pistas da trajetória intelectual de Martin-Barbero,

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comprometida com o pensar historicamente e com o desvendar das mediações e das matrizes cul-turais, o autor instiga os pesquisadores a romper com a “visão instrumentalista do método”, tendo em vista, para a nossa “intranqüilidade”, que “não existem métodos” e tampouco “teorias prontas”, já que toda problemática exige construções teórico-metodológicas que dependem do fenômeno a ser pesquisado.

Na trilha do resgate epistemológico empreendido por Maldonado e também dando pros-seguimento às discussões sobre o “futuro da comunicação e a comunicação do futuro”, que mar-caram as comemorações dos 10 anos do Curso de Comunicação Social do Bom Jesus/Ielusc, é também nosso convidado, nesta edição da Rastros, o professor e diretor do Curso Samuel Lima. Balizado por tais reflexões, o autor volta-se, em seu artigo intitulado O futuro da mídia impressa na sociedade da informação, para os movimentos do campo do jornalismo, mais especificamente, sobre os rumos do jornal em papel na chamada “era da informação”. Questões como credibilidade, margem de lucro e qualidade da informação são repensadas pelo autor à luz de um novo conceito de notícia posto pela possibilidade da convergência digital. Em um cenário marcado pelo excesso de informação, o pesquisador percorre várias perspectivas teóricas, reconhecendo igualmente a crise de identidade da mídia tradicional e a necessidade de apostar na alta qualidade a ser alcançada pelo jornalismo diário. Instigado por previsões tais como a de Philip Meyer de que, em 2014, assisti-remos a uma queda de 0.6 ao ano do número de leitores, Lima vislumbra caminhos alternativos à mídia impressa, caminhos estes alicerçados por um “sólido paradigma” conformado por “influência social”, “credibilidade” e verdade como “substrato deontológico”.

Ao tratar do futuro da mídia impressa, Lima abre espaço para pensar de maneira aprofun-dada o campo do jornalismo que, nesta edição, é perpassado, sobretudo, pela questão da “suposta” objetividade. Nessa linha de raciocínio, Paulo Roberto Figueira Leal (UFJF), em seu artigo Lin-guagem política no Diário Mercantil de Juiz de Fora (1955-1965), questiona-se em que medida os jornais de cidades do interior, como é o caso de Juiz de Fora, ostentavam, no período entre 1950 e 1965, estilos de texto e de diagramação que seguiam um padrão de “objetividade” jornalística .Ten-do como objeto empírico de análise a produção noticiosa do Diário Mercantil (DM), empresa dos Diários Associados, Leal analisa o estilo textual da cobertura política nas primeiras páginas de todas as edições do jornal no período acima apresentado. Tanto em 1955, quanto em 1960 e 1965, o pesquisador percebe que o jornal permanecia associando o conteúdo jornalístico à opinião explícita, bem como a cobertura local era tratada de forma periférica e burocrática. Dentre as possibilidades de explicação para o fenômeno está o processo de efetiva “profissionalização da redação”, determi-nado pela necessidade da formação superior em Jornalismo.

Seguindo a perspectiva da teoria da comunicação como encontro, Vilso Junior Chie-rentin Santi (UFSM) e Adair Caetano Peruzzolo (UFSM), no texto Da dimensão antropológica da comunicação ao jornalismo como encontro, também vão questionar, em um determinado ponto, o porquê dos mitos da objetividade e do jornalismo como espelho da realidade ainda teimam em perseguir os profissionais, veículos e cidadãos, quando é sabido que em cada discurso há também um certo modo “implícito de sugerir” o lugar de onde se fala, pois há “uma maneira estratégica de representar e afirmar a visão de mundo que se integra e a perspectiva ideológica que se adota”. Na trilha dessa inquietação e embasados por uma “dimensão antropológica da comunicação”, os pes-quisadores investem na possibilidade do jornalismo encontrar sua dimensão humana. Para tanto, observam os autores, é necessário superar teórica e metodologicamente a insuficiência que “paira” sobre as obras “tradicionais” que se propõem a dar conta dos fenômenos da comunicação e do jor-nalismo. Pensar o jornalismo enquanto construção cultural e comunicacional, significa tomá-lo no seu aspecto relacional e, portanto, no nível das representações sociais.

Reflexão semelhante é proposta por Nívea Rohling da Silva, em seu artigo A(s) entrevista(s) na ótica das esferas sócio-discursivas do jornalismo e da ciência da comunicação, define o jornalismo enquanto esfera sócio-discursiva e ideológica, responsável pela mediação exercida en-tre os seus gêneros. Com base na linha sócio-histórica do Círculo de Bakhtin, a autora empreende

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análise sobre a percepção das esferas sócio-discursivas do jornalismo e da Ciência da Comunica-ção sobre o(s) gênero(s) entrevista. Tendo em vista que não é possível estabelecer uma fronteira nítida entre a descrição do fato (informação) e a exposição de uma versão sobre esse (opinião), a pesquisadora pôde perceber que os conceitos de entrevista acabam apontando para uma “flu-tuação conceitual”, ou um não consenso (definições tanto se misturam quanto se contradizem) instaurado pelas esferas pesquisadas.

As relações entre estética, imagem e corpo conformam a segunda esfera temática a ser per-corrida pelo leitor. No âmbito dessas vinculações, é instigante a reflexão sobre o corpo como meio de comunicação e registro da dança apresentada no artigo Corpo-obra de arte, cultura e mídia de Denise Siqueira (UERJ). Tendo como ponto central das suas observações os espetáculos realizados, ao longo dos dez primeiros anos (1996-2006) da Companhia Ana Vitória Dança Contemporânea, a pesquisadora toma como base teórica Mauss, Becker, Eco e Jeudy para compreender esse encontro entre corpo e mídia (corpo-mídia), enquanto extensão ou prolongamento da “dança pensada”. A análise do material empírico, conformado pelo registro dos espetáculos e também pelas informações concedidas pela coreógrafa, permitiu à pesquisadora situar o corpo como suporte da dança, onde essa se torna paradoxalmente em algo concreto e efêmero e também, nesse processo, o artista se tor-na o suporte de sua própria obra, sendo intérprete e obra simultaneamente. Neste ponto, a autora assume a perspectiva de construção de um “corpo-obra-de-arte”, que se movimenta em função de intenções estéticas e culturais e que, portanto, acaba por “incorporar” a obra.

A possibilidade de “jogo” entre as formas de “ver” e de “se fazer ver” é lançada por dois artigos, dessa segunda esfera, que se ocupam da compreensão do universo das imagens e dos “novos regimes de visualidade”. A cobertura do atentado à Escola de Beslan, na Rússia, é foco da análise re-alizada por Laura Fabrício (Unifra), Marina Chiapinotto (Unisinos) e Michele Negrini (UFSM) no artigo Caso Beslan: a morte como apelo discursivo nas fotografias jornalísticas de Veja. Objetivando refletir sobre a fotografia enquanto mecanismo de apelo discursivo ao retratar a morte, as pesquisa-doras observaram a produção de sentidos e a discursividade de dois textos imagéticos publicados na Veja sobre o caso. As técnicas fotográficas, bem como os elementos morfológicos e barthesianos de análise de imagens estáticas serviram como base para que as autoras se lançassem no desvelamento das formas e elementos que a revista se utiliza para construir o “discurso imagético da morte”. O artigo se carateriza pelo exercício reflexivo sobre a estética da morte nas páginas da Veja, o qual é sustentado pela análise da forma pela qual a mídia, ao assumir uma postura “espetacular e apelativa”, acaba, muitas vezes, por “naturalizar detalhes cruéis da finitude humana”.

A articulação entre as diferentes modalidades do conhecer, pensar e comunicar aos pro-blemas da morte, doença e amor também são contemplados por Liliane Heynemann (UFF) no artigo À distância do mundo: ver, conhecer, comunicar. A partir da análise dos filmes Janela da Alma (de Eduardo Jardim e Walter Carvalho) e A pessoa é para o que nasce (Roberto Berliner) e do ro-mance A montanha mágica (de Thomas Mann), a pesquisadora analisa como a partir da dificuldade ou impossibilidade dos sujeitos verem, se instituem outros “regimes de visibilidade” que conferem a esses um outro conhecimento do mundo e de si próprios. Da mesma forma, a autora joga com a “possibilidade original” presente no ensaio A montanha Mágica, um dos romances mais importantes da literatura alemã do século XX, do mundo ser contemplado à distância, em função do isolamento e da doença que acabam por alterar a percepção da temporalidade por parte dos personagens. En-quanto interface entre os universos do cinema e da literatura, a visualidade orienta as reflexões da autora acerca do que seria uma “imagem verdadeira”, nos termos de Deleuze, quando o “mundo e seus objetos” são imaginados a partir de uma memória remota que advém do tato e da subjetividade sem contar com a mediação do ato de ver.

Pensar o espaço em suas múltiplas dimensões (o urbano, o ciberespaço, as fronteiras) é objetivo comum aos três artigos da última esfera temática desta edição. Atendendo a esse desafio, Fabio da Souza Cruz (UCPEL) e Guilherme Carvalho da Rosa (UFPEL) apresentam no texto A recepção e produção de sentido sobre os espaços urbanos: olhares dos acadêmicos de cinema da UFPEL

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algumas amarrações em termos teóricos e empíricos da pesquisa que estão empreendendo sobre o espaço da cidade. O trabalho que tem como objeto a observação das circunstâncias de recepção e produção de um documentário (Olhares) sobre espaços urbanos produzido por acadêmicos de cinema da Universidade Federal de Pelotas, objetiva produzir um primeiro olhar sobre como as práticas culturais se articulam com os espaços urbanos no âmbito da América Latina. No contexto de uma “modernidade em crise”, os pesquisadores assumem o desafio de pensar a circulação da cultura e a produção de sentidos sobre a cidade, a qual vem sofrendo, igualmente como as grandes narrativas, um “processo de deslegitimação” e de “esfacelamento de suas certezas” A problemática central do artigo está voltada para a compreensão das maneiras pelas quais as mensagens sobre os espaços urbanos são reelaboradas desde o momento da recepção até a produção de sentidos e, para dar conta desse desafio, os autores dividiram a pesquisa em dois momentos interconectados pelas relações culturais: recepção dos espaços urbanos e produção do texto midiático e imagens sobre a cidade. Cruz e Rosa se dedicam ao desbravamento do espaço urbano, a partir de um jogo complexo de “relações simbólicas” entre maneiras de narrar e imaginar a cidade, que vai sendo tecido a partir da perspectiva das mediações (recepção) e das interculturalidades.

O espaço, em sua dimensão virtual, é que mobiliza Leonel Azevedo de Aguiar (PUC-RJ) a se questionar sobre a possibilidade de ainda ser possível, na pós-modernidade, os sujeitos estarem “enraizados”, quando convivem simultaneamente com a possibilidade de um “nomadismo ciberespacial” que a rede rizomática da Internet lhes proporciona. A partir da análise da trajetória do Movimento Enraizados, criado por jovens do Morro Agudo, Nova Iguaçu e Rio de Janeiro, o autor, no artigo intitulado Apropriação das tecnologias de informação e estratégias da Ecologia Virtual, procura compreender de que maneira os grupos da periferia se apropriam das tecnologias da in-formação e da comunicação como forma de configurar outras “atitudes de ciberativismo político”. O pesquisador assume a perspectiva socioantropológica da observação participante para analisar como o Movimento, enquanto rede de militância e de articulação política, visa construir campos específicos de disputas simbólicas através de estratégias comunicacionais, ou com base em Guattari, de uma “ecologia virtual”. Seguindo essa perspectiva, o autor atenta também para a emergência de “inovadoras potências na cibercultura” que têm no ciberativismo político dos grupos periféricos a possibilidade de produção de uma “subjetividade singular”. O espaço constituído pela fronteira do Brasil Meridional é para onde convergem os olhares dos pesquisadores Ada Cristina da Silveira (UFSM), Aliandra Barlete (UFSM), Leandro Stevens (UFSM), Lindamir Adamczuk (UFSM) e Micheli Seibet (UFSM) no artigo Mídia e política de identidade: a malha de comunicação local-internacional nas fronteiras brasileiras. Diante dos processos de globalização, os autores convidam o leitor a pensar na necessidade de propor uma política de identidade voltada para o papel da mídia na relação conflituosa entre “sociedades próximas territorialmente” e “separadas pelo Estado nação”. As características constitutivas da “malha de comunicação” e os aspectos característicos (polifônicos) da relação entre o local e o global em terras de fronteira (TF) são o fio condutor do artigo, que é produto da sistematização e análise de dados coletados em pesquisa desenvolvida pelo grupo. Em época de “incerteza e desconfiança”, as estratégias discursivas próprias dessa “malha” apontam tanto para “benefícios do Estado-Nação” como para a subversão desses.

Fernanda Guimarães Cruz