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RAFAEL MOREIRA VANAZZI DE SOUZA PARTICULARIDADES DA MUSICOGRAFIA BRAILLE PARA O AUXÍLIO DE NOVAS METODOLOGIAS DE ENSINO UNICAMP 2014

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RAFAEL MOREIRA VANAZZI DE SOUZA

PARTICULARIDADES DA MUSICOGRAFIA BRAILLE PARA O

AUXÍLIO DE NOVAS METODOLOGIAS DE ENSINO

UNICAMP

2014

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE ARTES

RAFAEL MOREIRA VANAZZI DE SOUZA

PARTICULARIDADES DA MUSICOGRAFIA

BRAILLE PARA O AUXÍLIO DE NOVAS

METODOLOGIAS DE ENSINO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Música do Instituto de

Artes da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Mestre

em Música

Área de concentração: Fundamentos Teóricos

Orientação: Prof. Dr. Vilson Zattera

Co-Orientador: Prof. Dr. Claudiney Rodrigues Carrasco

CAMPINAS 2014

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Ficha catalográficaUniversidade Estadual de Campinas

Biblioteca do Instituto de ArtesEliane do Nascimento Chagas Mateus - CRB 8/1350

Souza, Rafael Moreira Vanazzi de, 1982- So89p SouParticularidades da musicografia braille para o auxílio de novas metodologias

de ensino / Rafael Moreira Vanazzi de Souza. – Campinas, SP : [s.n.], 2014.

SouOrientador: Vilson Zattera. SouCoorientador: Claudiney Rodrigues Carrasco. SouDissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de

Artes.

Sou1. Educação musical. 2. Educação inclusiva. 3. Musicografia braille. 4.

Pessoas com deficiência visual. I. Zattera, Vilson,1962-. II. Carrasco, ClaudineyRodrigues,1964-. III. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Artes. IV.Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Unique aspects of braille music notation for enabling new teachingmethodologiesPalavras-chave em inglês:Music educationInclusive educationBraille musicVisually impaired personsÁrea de concentração: Fundamentos TeóricosTitulação: Mestre em MúsicaBanca examinadora:Vilson Zattera [Orientador]Lucia Helena ReilyAdriano Chaves GiesteiraData de defesa: 29-08-2014Programa de Pós-Graduação: Música

Powered by TCPDF (www.tcpdf.org)

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AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, Carlos Roberto e Fátima Maria, por terem me criado e dado todo o suporte necessário para a minha educação, além da oportunidade e incentivo para hoje eu ser um músico satisfeito com o que faço.

À minha mulher, Juliana Vergueiro, pelo seu carinho, amor e companheirismo. Juntos compartilhamos e unimos nossos sonhos e aspirações de vida. Com certeza o seu apoio e todas as conversas que tivemos me ajudaram a seguir em frente com essa dissertação.

Ao meu orientador , Prof. Dr. Vilson Zattera, pelo apoio, confiança, paciência e amizade. Que ele continue sempre sendo o professor da sinceridade, da humildade e do bom humor. Grato por me orientar com discernimento, sabedoria e alegria.

Ao meu amigo, Raphael Ota, pelas conversas e produções acadêmicas sobre a Musicografia Braille. Com a sua ajuda eu pude compreender mais detalhes desse campo de estudo e acreditar na possibilidade de desenvolvê-lo em um mestrado; como se não bastasse, Raphael ainda me aproximou da culinária japonesa.

À Prof. Dra. Lúcia Reily, pela perspicácia e habilidade com que pontuou meu trabalho na fase final, ajudando assim a lapidar o seu conteúdo; não posso me esquecer dos seus livros, onde me inspirei a buscar uma escrita prazerosa, direta e criativa.

Às professoras Dra. Adriana Mendes e Dra. Mariana Baruco, pela leitura atenta do meu trabalho na fase de qualificação, me trazendo mais entendimento e confiança sobre as possibilidades da minha pesquisa.

Ao Centro Cultural Louis Braille pelo apoio que sempre ofereceu às minhas atividades musicais, e ao Cabeto Rocker pelo incentivo e suporte para que eu pudesse dar as minhas primeiras aulas de Musicografia Braille.

Ao revisor César Cruz pelo dedicado e exímio trabalho realizado.

Finalmente, a todos os meus amigos, que são muitos. São amigos de quando morei em Barra Mansa, da época da graduação e das repúblicas, também aos amigos da Casa do Brilho do Amor e da Fraternidade do Coração. Todos vocês transformaram e ainda transformam o meu Ser, profundamente.

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“The best and most beautiful things in the world cannot be seen or even touched.

They must be felt with the heart”

“As melhores e mais belas coisas do mundo não podem ser vistas ou tocadas.

Elas devem ser sentidas com o coração”

Helen Adams Keller (1880 – 1968)

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RESUMO

Este trabalho busca oferecer ferramentas teóricas que possam auxiliar a elaboração de

metodologias para o ensino da Musicografia Braille, que pode ser considerado um campo

recente, e, por isso, com poucas pesquisas especializadas e muitos relatos de experiência.

Observações acerca da relação entre as partituras convencionais, as partituras em braille e

seus respectivos leitores são feitas nesta pesquisa, percorrendo fundamentos conceituais,

métodos musicais, processo de aprendizagem, a audição das pessoas com deficiência

visual e o acesso ao conhecimento teórico-musical aprofundado. Os fundamentos teóricos

centrais são baseados em Bonilha e Sloboda, que dão suporte às analises feitas diretamente

sobre partituras em braille, que buscam revelar como os desafios de aprendizagem da

Musicografia Braille se inter-relacionam na escrita. As análises visam supor os

procedimentos lógicos que o leitor das partituras em braille deve realizar para que a leitura

seja correta. Os resultados obtidos foram concordantes com os relatos de experiência desse

campo, corroborando o caminho tomado nesta pesquisa. A partir desse material, este

trabalho propõe classificar entre cinco graus de dificuldade as partituras em braille, de

acordo com os conceitos que ela contém, assim como apresentar etapas que delineiam o

conteúdo que compõe cada grau de dificuldade, apontando os conhecimentos ou as

habilidades que devem ser assimilados em cada fase do aprendizado da Musicografia

Braille. Os resultados desta dissertação objetivam beneficiar professores de música de

pessoas com deficiência visual, oferecendo-lhes diretrizes para a elaboração e o

planejamentos de aula que incluam o ensino de partituras em braille. Nesse sentido,

também se beneficiam os cursos de música, que aqui poderão encontrar fundamentação

que os auxilie a remodelar seus métodos, voltando-os ao acolhimento das necessidades de

aprendizagem dos músicos leitores de música em braille, e também para que possam

elaborar provas de admissão que ofereçam igualdade de condições para as pessoas com e

sem deficiência visual.

Palavras-chave: educação musical, educação inclusiva, musicografia braille, deficiência

visual.

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ABSTRACT

This study seeks to provide theoretical tools to help in developing

methodologies for teaching the new field of Braille Music Notation. Despite the limited

number of specialized research, several reports of practical experience have been

published. The research covers observations on the relationship between conventional

scores and braille scores, and how these are read. The studies also present conceptual

bases, musical methods, the learning processes, hearing skills of people with visual

impairment and the access issues related to in-depth music-theoretical knowledge. The

central theoretical foundations, based on Bonilha and Sloboda, support the analysis made

directly over sheet music in braille that seek to reveal how the challenges of learning

Braille Music Notation relate to learning regular music notation. The analyses aim to

anticipate the logical procedures that braille music scores readers must do in order to

achieve a correct reading. The results were in agreement with the experiences reported in

this field, corroborating the methodology chosen for this research. For this purpose braille

scores were classified according to five difficulty levels according to the concepts

contained in each. Steps were presented to delineate the content that composed each

difficulty level, indicating the knowledge or skills that must be assimilated at each stage of

the Braille Music Notation learning process. The results of this study intends to benefit

music teachers for visually impaired persons by providing them guidelines for developing

lesson plans that include teaching Braille Music Notation. In this sense, music courses are

also benefitted, because this study provides support and motivation enabling remodeling

them in order to consider the learning needs of braille scores readers. Furthermore, it

provides arguments for the preparation of entrance exams with equal conditions for people

with and without visual impairments.

Key Words: Music notation; Music education; Inclusive education; Braille Music; Visual impaired.

 

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SUMÁRIO  

APRESENTAÇÃO  ....................................................................................................................................  XXI  

INTRODUÇÃO  ...........................................................................................................................................  23  

CAPÍTULO  1  -­‐  FUNDAMENTOS  CONCEITUAIS  ................................................................................  26  1.1  PESSOA  COM  DEFICIÊNCIA  VISUAL  OU  PORTADORA  DE  DEFICIÊNCIA  VISUAL?  ........................................  26  1.3  BREVE  HISTÓRIA  DA  MUSICOGRAFIA  BRAILLE  .............................................................................................  30  1.3.1  A  Musicografia  Braille  no  brasil  hoje  ................................................................................................  33  

CAPÍTULO  2  -­‐  ESPECIFICIDADES  DA  APRENDIZAGEM  MUSICAL  DA  PESSOA  COM  CEGUEIRA  ..................................................................................................................................................  36  2.1  A  RELAÇÃO  ENTRE  AS  PARTITURAS  CONVENCIONAIS  E  AS  PARTITURAS  EM  BRAILLE  ...........................  36  2.1.1  Métodos  diferentes  para  cada  forma  de  escrita  ...........................................................................  41  

2.2  OS  MÉTODOS  MUSICAIS  DISPONÍVEIS  ..............................................................................................................  43  2.2.1  Alguns  materiais  especializados  .........................................................................................................  46  

2.3  EXPERIÊNCIAS  E  PESQUISAS  SOBRE  O  ENSINO  DA  MÚSICA  PARA  PESSOAS  COM  DEFICIÊNCIA  VISUAL:  BREVE  REVISÃO  BIBLIOGRÁFICA  ..............................................................................................................................  48  2.3.1  Considerações  Parciais  ............................................................................................................................  51  

2.4  MATERIAL  DIDÁTICO  ESPECIALIZADO  ............................................................................................................  52  2.5  DESENVOLVIMENTO  COGNITIVO  DA  PESSOA  COM  DEFICIÊNCIA  VISUAL  ...................................................  54  2.5.1  A  construção  do  conhecimento  ............................................................................................................  57  

2.6  A  AUDIÇÃO  ..........................................................................................................................................................  60  CAPÍTULO  3  -­‐  DESAFIOS  NO  ACESSO  DE  PESSOAS  COM  DEFICIÊNCIA  VISUAL  AO  CONHECIMENTO  MUSICAL  ...................................................................................................................  64  3.1  A  INCLUSÃO  DA  PESSOA  COM  DEFICIÊNCIA  VISUAL  EM  CURSOS  DE  MÚSICA  .............................................  64  3.1.1  Direitos  e  realidade  na  inclusão  ..........................................................................................................  66  

3.2  INSERINDO  A  MUSICOGRAFIA  BRAILLE  NA  FORMAÇÃO  DE  PROFESSORES  DE  MÚSICA  ..........................  68  3.2.1  Formação  musical  dos  alunos  de  música  ........................................................................................  70  3.2.2  Incluindo  o  aluno  com  DV  em  um  curso  para  pessoas  videntes  ............................................  72  

3.3  A  TRANSCRIÇÃO  DE  UMA  PROVA  DE  APTIDÃO  MUSICAL  PARA  O  SISTEMA  BRAILLE  ...............................  73  3.3.1  A  prova  escrita  em  braille  ......................................................................................................................  76  

CAPÍTULO  4  -­‐  ANÁLISES  DE  PARTITURAS  EM  BRAILLE  .............................................................  78  4.1  OS  DESAFIOS  DE  APRENDIZAGEM  ....................................................................................................................  78  4.2  ANALISANDO  PARTITURAS  EM  BRAILLE  .........................................................................................................  81  4.3  COMO  SERÃO  FEITAS  AS  ANÁLISES  ..................................................................................................................  82  4.3.1  ANÁLISE  DO  GRAU  DE  DIFICULDADE  1  .......................................................................................................  84  Análise  1  ....................................................................................................................................................................  85  

4.3.2  ANÁLISE  DO  GRAU  DE  DIFICULDADE  2  .......................................................................................................  89  4.3.3  Análise  do  Grau  de  Dificuldade  3  ........................................................................................................  91  4.3.4  Análise  do  Grau  de  Dificuldade  4  ........................................................................................................  96  4.3.5  Analisando  o  Grau  de  dificuldade  5  ................................................................................................  100  

4.4  AS  UNIDADES  DE  TEMPO  ...............................................................................................................................  102  4.4.1  Espacialização  das  notas  musicais  relativas  ao  seu  valor  de  tempo  ................................  103  

4.4.2  UT  ESTENDIDA  POR  INFORMAÇÕES  ADICIONAIS  ....................................................................................  104  4.4.3  Fragmentação  vertical  de  diferentes  unidades  de  tempo  .....................................................  106  

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CAPÍTULO  5  -­‐  DISCUSSÃO  DOS  RESULTADOS  ..............................................................................  109  5.1  SUBDIVISÃO  DOS  GRAUS  DE  DIFICULDADES  EM  ETAPAS  .........................................................................  109  5.1.1  Etapas  do  Grau  de  Dificuldade  1  ......................................................................................................  110  5.1.2  Etapas  do  Grau  de  Dificuldade  2  ......................................................................................................  111  5.1.3  Etapas  do  Grau  de  Dificuldade  3  ......................................................................................................  113  5.1.4  Etapas  do  Grau  de  Dificuldade  4  ......................................................................................................  115  5.1.5  Etapas  do  Grau  de  Dificuldade  5  ......................................................................................................  118  

5.2  A  LEITURA  DE  PARTITURAS  EM  BRAILLE  .....................................................................................................  118  5.2.1  A  leitura  de  Agrupamentos  Complexos  nas  partituras  convencionais  e  em  braille  ...  119  5.2.2  Experiências  de  um  leitor  com  deficiência  visual  .....................................................................  124  5.2.3  Quadro  das  Etapas  .................................................................................................................................  125  

5.3  AS  ETAPAS  DO  GRAU  5  SÃO  CONTEÚDOS  COMPLEMENTARES  À  TODO  O  ENSINO  EM  BRAILLE  ........  126  CAPÍTULO  6  -­‐  QUESTIONAMENTOS  CONCLUSIVOS  ....................................................................  129  6.1  CONSIDERAÇÕES  FINAIS  .................................................................................................................................  134  

REFERÊNCIAS  BIBLIOGRÁFICAS    ......................................................................................................  140  

APÊNDICE  I  -­‐  INTRODUÇÃO  À  MUSICOGRAFIA  BRAILLE  ..........................................................  147  1  O  SISTEMA  BRAILLE  ...........................................................................................................................................  147  2  NOTAS  MUSICAIS  E  PAUSAS  ...............................................................................................................................  149  3  COMPASSO  ............................................................................................................................................................  151  4  ALTERAÇÕES  DE  NOTA  .......................................................................................................................................  152  5  ARMADURA  DE  CLAVE  ........................................................................................................................................  152  6  PONTO  DE  AUMENTO  .........................................................................................................................................  153  Ponto  duplo  de  aumento  .................................................................................................................................  153  

7  FERMATA  ..............................................................................................................................................................  153  8  ANDAMENTOS  ......................................................................................................................................................  154  Andamento  indicado  por  metrônomo  .......................................................................................................  155  

9  LIGADURAS  ...........................................................................................................................................................  155  Ligadura  de  prolongação  para  uma  nota  ...............................................................................................  155  Ligadura  de  expressão  entre  notas  ou  acordes  .....................................................................................  155  Fim  de  uma  ligadura  e  começo  de  outra  sobre  a  mesma  nota  ......................................................  157  Final  e  princípio  de  ligadura  curta  sobre  uma  nota  ...........................................................................  158  

10  CLAVES  ...............................................................................................................................................................  158  11  QUIÁLTERAS  ......................................................................................................................................................  160  12  ANDAMENTOS  II  E  NUANCES  .........................................................................................................................  160  13  INTERVALOS  ......................................................................................................................................................  162  14  EM  ACORDE  TOTAL  ...........................................................................................................................................  164  15  EM  ACORDE  PARCIAL  .......................................................................................................................................  165  16  NOTAS  MÓVEIS  ..................................................................................................................................................  166  16  SINAS  DE  NOTA  DUPLA  .....................................................................................................................................  167  17  LIGADURA  DE  PROLONGAÇÃO  DE  ACORDE  ...................................................................................................  168  18  REPETIÇÕES  CONFORME  PARTITURAS  CONVENCIONAIS  ...........................................................................  169  Casa  1  e  Casa  2  (Primeira  vez  e  segunda  vez)  .......................................................................................  169  

19  REPETIÇÕES  ESPECIAIS  PARA  PARTITURAS  EM  BRAILLE  ...........................................................................  170  

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LISTA  DE  FIGURAS    

FIGURA  1  –  DIAGRAMA  DE  COMUNICAÇÃO  PROPOSTO  POR  NATIEZ  ....................................  37  

FIGURA  2  –  TRECHO  DE  UMA  PARTITURA  CONVENCIONAL  .....................................................  39  

FIGURA  3  –  REPRESENTAÇÃO  GRÁFICA  DO  DESENHO  MELÓDICO  DA  PARTITURA  CONVENCIONAL  DA  FIGURA  2,  QUE  É  O  MESMO  DA  PARTITURA  EM  BRAILLE  DA  FIGURA  26  ....................................................................................................................  39  

FIGURA  4  –  TRECHO  MUSICAL  ESCRITO  EM  BRAILLE  COM  INDICAÇÕES.  ............................  40  

FIGURA  5  –  DIAGRAMA  DE  COMUNICAÇÃO  CONFORME  NATIEZ  (1990,  LOC.  CIT.)  COM  ALTERAÇÕES.  .....................................................................................................................  42  

FIGURA  6  –  CELA  BRAILLE  COM  OS  PONTOS  NUMERADOS.  ......................................................  52  

FIGURA  7  –  NOTAS  DÓ,  RÉ,  MI  E  FÁ  EM  BRAILLE,  COM  VALOR  DE  TEMPO  DE  COLCHEIA.  GRAU  DE  DIFICULDADE  1  ...............................................................................................  84  

FIGURA  8  –  NOTAS  DÓ,  SI,  LA  E  SOL  EM  BRAILLE,  COM  VALOR  DE  TEMPO  DE  COLCHEIA.  GRAU  DE  DIFICULDADE  1  ...............................................................................................  85  

FIGURA  9  –  PRIMEIRA  LINHA  DO  SISTEMA  BRAILLE,  FORMADA  POR  10  CELAS  SEM  OS  PONTOS  3  E  6  ......................................................................................................................  86  

FIGURA  10  –  SEGUNDA  LINHA  DO  SISTEMA  BRAILLE,  SENDO  AS  MESMAS  CELAS  PRIMEIRA  LINHA,  MAS  COM  O  ACRÉSCIMO  DO  PONTO  3  ....................................  86  

FIGURA  11  –  TERCEIRA  LINHA  DO  SISTEMA  BRAILLE,  SENDO  AS  MESMAS  CELAS  PRIMEIRA  LINHA,  MAS  COM  O  ACRÉSCIMO  DO  PONTO  3  E  6  .............................  87  

FIGURA  12  –  QUARTA  LINHA  DO  SISTEMA  BRAILLE,  SENDO  AS  MESMAS  CELAS  PRIMEIRA  LINHA,  MAS  COM  O  ACRÉSCIMO  DO  PONTO  6  ....................................  87  

FIGURA  13  –  QUINTA  LINHA  DO  SISTEMA  BRAILLE,  SENDO  AS  MESMAS  CELAS  PRIMEIRA  LINHA,  MAS  COM  OS  PONTOS  “REBAIXADOS”  ....................................  87  

FIGURA  14  –  PONTOS  DA  CELA  BRAILLE  DIVIDIDA  EM  “NOME  DA  NOTA”  E  “VALOR  DE  TEMPO  DA  NOTA”  .............................................................................................................  88  

FIGURA  15  –  PARTITURA  CONVENCIONAL  PARA  A  ANÁLISE  3.  GRAU  DE  DIFICULDADE  2    .................................................................................................................................................  90  

FIGURA  16  –  PARTITURA  EM  BRAILLE  PARA  A  ANÁLISE  3.  GRAU  DE  DIFICULDADE  2  ...  90  

FIGURA  17  –  PARTITURA  CONVENCIONAL  PARA  A  ANÁLISE  4.  GRAU  DE  DIFICULDADE  3    .................................................................................................................................................  92  

FIGURA  18  –  PARTITURA  EM  BRAILLE  PARA  A  ANÁLISE  4.  GRAU  DE  DIFICULDADE  3  ...  92  

FIGURA  19  –  PARTITURA  CONVENCIONAL  PARA  A  ANÁLISE  5.  GRAU  DE  DIFICULDADE  3  

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FIGURA  20  –  PARTITURA  EM  BRAILLE  PARA  A  ANÁLISE  5.  GRAU  DE  DIFICULDADE  3  ...  94  

FIGURA  21  –  PARTITURA  CONVENCIONAL  PARA  A  ANÁLISE  6.  GRAU  DE  DIFICULDADE  4    .................................................................................................................................................  97  

FIGURA  22  –  PARTITURA  EM  BRAILLE  PARA  A  ANÁLISE  6.  GRAU  DE  DIFICULDADE  4  ...  97  

FIGURA  23  –  PARTITURA  CONVENCIONAL  PARA  A  ANÁLISE  7.  GRAU DE DIFICULDADE 5  .............................................................................................................  101  

FIGURA  24  –  PARTITURA  EM  BRAILLE  PARA  A  ANÁLISE  7.  GRAU  DE  DIFICULDADE  5  .  101  

FIGURA  25  –  PARTITURA  EM  BRAILLE,  TRANSCRIÇÃO  DA  PARTITURA  DA  FIGURA  2  .  104  

FIGURA  26  –  PARTITURA  CONVENCIONAL,  TRECHO  COM  MUITAS  INDICAÇÕES,  DETALHANDO  A  EXECUÇÃO  SONORA  E  TÉCNICA  DO  PIANISTA.  ....................  105  

FIGURA  27  –  PARTITURA  EM  BRAILLE,  TRANSCRIÇÃO  DA  PARTITURA  DA  FIGURA  27,  COM  INDICAÇÕES  DOS  SIGNIFICADOS  DAS  CELAS  BRAILLE  .............................  105  

FIGURA  28  –  PARTITURA  CONVENCIONAL,  TRECHO  COM  DUAS  VOZES  PARALELAS.  ...  106  

FIGURA  29  –  PARTITURA  EM  BRAILLE,  TRANSCRIÇÃO  DA  PARTITURA  DA  FIGURA  29,  DEMONSTRANDO  O  USO  DO  “EM  ACORDE  TOTAL”  .............................................  106  

FIGURA  30  –  PARTITURA  CONVENCIONAL,  TRECHO  COM  DIVISI  DE  VOZ  NA  METADE  DO  COMPASSO  .........................................................................................................................  107  

FIGURA  31  –  PARTITURA  EM  BRAILLE,  TRANSCRIÇÃO  DA  PARTITURA  DA  FIGURA  31,  DEMONSTRANDO  O  USO  DO  “EM  ACORDE  PARCIAL”  .........................................  107  

FIGURA  32  –  AGRUPAMENTO  DE  SEMICOLCHEIAS  NA  ESCRITA  EM  BRAILLE  ..................  112  

FIGURA  33  –  (A)  SEQUENCIA  DE  FIXAÇÃO  VERTICAL  NA  LEITURA  PIANÍSTICA.  (B)  SEQUENCIA  DE  FIXAÇÃO  HORIZONTAL  NA  LEITURA  PIANÍSTICA.  (C)  EXEMPLO  DE  UMA  SEQUENCIA  DE  FIXAÇÃO  OBSERVADA  EM  PROGRESSÃO  DE  ACORDES  NA  MÚSICA  PIANÍSTICA  (EXTRAÍDO  DE  WEAVER,  1943).  (D)  EXEMPLO  DE  SEQUENCIA  DE  FIXAÇÃO  OBSERVADA  EM  MÚSICA  CONTRAPONTÍSTICA  PARA  PIANO  (EXTRAÍDO  DE  WEAVER,  1943)  .............  120  

FIGURA  34  –  REPRESENTAÇÃO  GRÁFICA  DO  DESENHO  MELÓDICO  DA  PARTITURA  CONVENCIONAL  DA  FIGURA  29,  QUE  É  O  MESMO  DA  PARTITURA  EM  BRAILLE  DA  FIGURA  30  ................................................................................................  123  

   

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LISTA  DE  TABELAS  

 

TABELA  1  –  OS  CINCO  GRAUS  DE  DIFICULDADE  COM  A  DESCRIÇÃO  DO  CONTEÚDO  E  TIPO  DE  PARTITURA  .......................................................................................................  81  

TABELA  2  –  ETAPAS  DO  GRAU  DE  DIFICULDADE  1  ....................................................................  110  

TABELA  3  –  ETAPAS  DO  GRAU  DE  DIFICULDADE  2  ....................................................................  111  

TABELA  4  –  ETAPAS  DO  GRAU  DE  DIFICULDADE  3  ....................................................................  114  

TABELA  5  –  ETAPAS  DO  GRAU  DE  DIFICULDADE  4  ....................................................................  118  

TABELA  6  -­‐  ETAPAS  DO  GRAU  DE  DIFICULDADE  5  ....................................................................  126  

TABELA  7  –  CONTEÚDOS  COMPLEMENTARES  .............................................................................  128  

   

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APRESENTAÇÃO

Meu primeiro contato com aulas de música foi aos 3 anos, no Conservatório

Barramansense de Música, na minha cidade natal, Barra Mansa/ RJ. Aos 5 anos comecei a

ter aulas de piano com a professora Norma Aragão, formando-me aos 18 anos. Em seguida

fiz a graduação em música, bacharelado em composição, na Unicamp.

Durante a graduação, fui convidado a substituir o regente de um coral formado

por pessoas com deficiência visual no Centro Cultural Louis Braille, de Campinas.

Imediatamente comecei a buscar ferramentas que poderiam me auxiliar nessa nova tarefa e

encontrei a Musicografia Braille. Logo percebi que ela não ajudaria o coral, que continuei

regendo por quatro anos como voluntário, mas encontrei pessoas interessadas em aprender

as partituras em braille, pois haviam poucas pessoas capazes de ensiná-las.

Com o Manual Internacional de Musicografia Braille em mãos, comecei a

estudar os seus fundamentos para, assim, poder ensinar. Logo me deparei com algumas

indagações: de que maneira abordar os conceitos musicais? O que devo ensinar primeiro?

Como fazer exercícios? Etc. Muito do que descobri foi pelo método empírico, acertando e

errando na companhia dos alunos; não era incomum eu pedir a um aluno que explicasse ao

outro o que já havia entendido, prática que me mostrou um pouco da forma como esses

alunos construíam seu conhecimento.

Desde então eu passei a reformular, ano a ano, o meu planejamento de aulas,

pois sempre havia alunos novos, alterando o planejamento de acordo com as experiências

do ano anterior. Assim fiz por cinco anos, quando comecei a escrever artigos e publicá-lo

em encontros da ABEM (Associação Brasileira de Educação Musical).

Consequentemente, seguindo com os estudos que já vinham sendo desenhados,

a presente dissertação intitulada Particularidades da Musicografia Braille para o auxílio

de novas metodologias de ensino pretende auxiliar professores a elaborar métodos e

planejamentos de aulas de música para ensinar a Musicografia Braille para pessoas com

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deficiência visual. Para isso será necessária uma compreensão da teoria musical, a partir do

referencial da escrita em braille.

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INTRODUÇÃO

O ensino de música para pessoas com deficiência visual geralmente é feito sem

o apoio de métodos ou estudos especializados, visto que se trata de campo de pesquisa

pioneiro, o que naturalmente faz com que os estudos desse campo sejam escassos e de

difícil acesso. São poucos os textos que tratam especificamente do ensino da Musicografia

Braille, e, entre esses, muitos são meros relatos de experiências. Há uma minoria que trata

apenas desse ensino inclusivo, mas que já nos revelam dados muito relevantes; contudo,

sabe-se que é impossível a esses poucos trabalhos suprir a carência desse campo. A revisão

dessa literatura será vista no capítulo 2.

Nesse contexto, essa pesquisa se dirige ao professor de música e ao

pesquisador que se interessa em conhecer as particularidades dessa escrita musical.

Pretendemos contribuir para educação musical que tem como meta não só ensinar tocar um

instrumento, mas também ensinar a leitura de partituras em braille.

O objetivo dessa pesquisa é criar uma ferramenta que ajude na elaboração de

métodos para o ensino musical de pessoas com deficiência visual a partir de dados

advindos de observações sobre a Musicografia Braille. Tendo uma ferramenta dessa

natureza como apoio, esse ensino especializado poderá se voltar com mais segurança para

as necessidades de aprendizagem dos leitores desse sistema de escrita em relevo.

No entanto, não é do escopo deste estudo o aprofundamento no campo da

alfabetização em braille, que ensina como ler e escrever em braille. O aluno a que estamos

nos dirigindo é o aluno com deficiência visual que já conhece essa leitura tátil e se

interessa por aprender música por meio da Musicografia Braille.

As figuras que aparecem no texto são todas acompanhadas por uma descrição

da imagem, para que o leitor com deficiência visual possa acompanhar o texto de forma

mais completa.

Todas as partituras em braille, que constam nas figuras, estão disponibilizadas

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para download no site www.musicografia.net, passíveis de serem lidas por softwares

especializados, ou impressas. Um caderno com todas essas partituras em braille deverá ser

impresso e incluído como apêndice ao ser disponibilizado para bibliotecas que permitam a

leitura digital desse texto para pessoas com deficiência visual. Se esse trabalho tiver uma

versão escrita em braille, essas partituras devem ser inseridas nos seus respectivos lugares 1.

Ao longo da dissertação, tentaremos esclarecer algumas dúvidas e crenças

errôneas no que diz respeito às pessoas com deficiência visual com relação aos métodos

musicais, habilidades musicais natas, audição superdesenvolvida, processo de

aprendizagem, direitos ao conhecimento e condições de igualdade no acesso aos

conhecimentos especializados.

Inicialmente apresentamos no capítulo 1 algumas questões pertinentes a esse

campo, com o intuito de contextualizar brevemente e inserir o leitor no campo que essa

pesquisa discorre. São questões relativas a como se deve escrever a palavra braille, como

se deve chamar, formalmente, as pessoas com deficiência visual e um histórico da

Musicografia Braille relevando os esforços feitos desde a sua criação até os dias mais

recentes.

Buscamos revelar no capítulo 2 como a compreensão de particularidades das

partituras em braille pode influenciar diretamente no ensino musical inclusivo. Iremos ter

contato com estudos sobre o processo cognitivo e sobre a audição das pessoas com

deficiência visual, buscando ampliar a nossa percepção acerca de mitos que envolvem a

deficiência.

No capítulo 3, apresentaremos dados que demonstram como a falta de estudos

especializados sobre as partituras em braille pode impedir a inclusão em condições de

igualdade.

1 Essa informação não irá aparecer novamente nesse texto junto às figuras com partituras em braille

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A partir de dados dos trabalhos de Bonilha (2010) e Sloboda (2008), no

capítulo 4 iremos analisar diferentes partituras em braille, que serão separadas de acordo

com sua complexidade. Essa classificação será feita conforme um esquema que nos

permite verificar quais conhecimentos teórico-musicais determinada partitura exige que

seu leitor possua para compreendê-la corretamente. Neste capítulo e no próximo é onde se

encontram as contribuições mais efetiva para o apoio à didática especializada da

Musicografia Braille.

Discutiremos no capítulo 5 os resultados das análises feitas no capítulo

anterior. Com essa tarefa feita, veremos que é possível fazer mais uma nova subdivisão das

partituras em braille, separando-as em etapas além das classificações que já foram

realizadas.

Finalizando, no capítulo 6 responderemos a algumas perguntas, buscando dar

um panorama geral e breve das principais questões que surgiram ao longo deste texto. No

final temos uma exposição conclusiva sobre os dados desta pesquisa, apontando maneiras

possíveis de utilizá-la no campo da Musicografia Braille, e dando indicações para a

realização de futuros trabalhos.

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CAPÍTULO 1 - FUNDAMENTOS CONCEITUAIS

1.1 Pessoa com deficiência visual ou portadora de deficiência visual?

Ao longo do tempo, as pessoas com DV (deficiência visual) foram sendo

chamadas por nomes e nomenclaturas diversas, títulos que foram caindo em desuso,

devido à inadequação, e sendo gradualmente substituídos por outros, sucessivamente, até

os dias atuais. Um dos mais antigos termos pode ser encontrado em letras de leis, nomes de

instituições, romances e na mídia; os deficientes visuais eram chamados de inválidos.

Encontramos referências à palavra em revistas de grande circulação, ainda no ano de 1999

(SASSAKI, 2013, p. 1). No entendimento que se tem hoje, esse termo denota falta de valor

profissional, dependência ou incapacidade social.

Segundo Sassaki (2013), no séc. XX, meados da década de 1960, os termos

incapacitados (indivíduos sem capacidade) e incapazes (indivíduos que não são capazes)

passaram a ser usados após as guerras mundiais, comumente se referindo aos soldados que

voltavam da guerra com algum tipo de deficiência. Após esse período, houve muitos

outros termos, revelando como essas pessoas eram vistas pela sociedade, tais como: os

defeituosos (indivíduos com deformidade), os deficientes (indivíduos com deficiência), os

excepcionais (indivíduos com deficiência mental). Vale citar que a ONU, pressionada por

organizações de pessoas com deficiência, fez do ano de 1981 o “Ano Internacional das

Pessoas Deficientes”. Isso ajudou a melhorar a imagem dessas pessoas, e a partir de então

não se utilizou mais a palavra indivíduo em vez de pessoa. A atribuição do termo “pessoa”

foi uma conquista histórica, fazendo com que a palavra deficiente deixasse de ser

substantivo para se tornar um adjetivo.

Após essa conquista, a forma de chamar essas pessoas ainda sofreu mais

transformações. O seguinte a aparecer foi “pessoas portadoras de deficiência”. Por uso

corrente, o termo foi contraído para “portadores de deficiência”, no entanto, o termo pode

transmitir a sensação de que a pessoa porta a deficiência como se portasse um objeto,

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podendo deixá-lo, caso decidisse. Assim, os termos que vieram a seguir foram “pessoas

com necessidades especiais” (substituindo a palavra deficiência por necessidade especial) e

“pessoas especiais” (sendo esta uma contração do termo anterior).

Finalmente, em junho de 1994, a Declaração de Salamanca recomenda a

educação inclusiva para todas as pessoas, com ou sem deficiência, defendendo o direito de

todos que tiverem necessidades educacionais especiais e se encontram excluídos a fazer

parte de escolas e sociedades inclusivas. A partir daí, essas pessoas passaram a ser

chamadas de “pessoas com deficiência”, o que representou uma nova forma de se enxergar

e de se relacionar com as pessoas que têm necessidades especiais, para que possam obter

educação, transporte, comunicação, saúde, etc.

Em maio de 2002, Frei Betto2 propõe em um artigo o termo “portadores de

direitos especiais” e a sigla “PODE”, argumentando que a palavra “deficientes”, como

substantivo ou adjetivo, insinua falha ou imperfeição, enquanto a sigla “PODE” remeteria

à ideia de capacidade. Quanto a isso, Sassaki (2013, p. 4) questiona:

O termo e a sigla apresentam problemas que inviabilizam a sua adoção em substituição a qualquer outro termo para designar pessoas que têm deficiência. O termo “portadores” já vem sendo questionado por sua alusão a “carregadores”, pessoas que “portam” (levam) uma deficiência. O termo “direitos especiais” é contraditório porque as pessoas com deficiência exigem equiparação de direitos e não direitos especiais. E mesmo que defendessem direitos especiais, o nome “portadores de direitos especiais” não poderia ser exclusivo das pessoas com deficiência, pois qualquer outro grupo pode reivindicar direitos especiais.

Somado a isso, hoje temos um grande número de documentos escritos e

aprovados por organizações de pessoas com deficiência, que “estão chegando ao consenso 2 Carlos Alberto Libânio Christo, o Frei Betto1 (Belo Horizonte, 25 de agosto de 1944), é um escritor e religioso dominicano brasileiro. Professou na Ordem Dominicana, em 10 de fevereiro de 1966, em São Paulo. Adepto da Teologia da Libertação, é militante de movimentos pastorais e sociais, tendo ocupado a função de assessor especial do presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva entre 2003 e 2004. Foi coordenador de Mobilização Social do programa Fome Zero. Frei Betto recebeu vários prêmios por sua atuação em prol dos direitos humanos e a favor dos movimentos populares. Assessorou vários governos socialistas, em especial Cuba, nas relações Igreja Católica-Estado. Fonte: (http://www.ube.org.br/biografias-detalhe.asp?ID=1005)

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quanto a adotar a expressão ‘pessoas com deficiência’ em todas as suas manifestações

orais ou escritas” (SASSAKI, 2013, p. 6). O autor ainda lista os princípios básicos que

fizeram com que esses movimentos chegassem a esse termo.

1. Não esconder ou camuflar a deficiência;

2. Não aceitar o consolo da falsa ideia de que todo mundo tem deficiência;

3. Mostrar com dignidade a realidade da deficiência;

4. Valorizar as diferenças e necessidades decorrentes da deficiência;

5. Combater neologismos que tentam diluir as diferenças, como “pessoas com

capacidade especiais” ou “pessoas com eficiências diferentes”.

6. Defender igualdade de direitos, oportunidades entre as pessoas com ou sem

deficiência e lhes proporcionando mais dignidade;

7. Identificar as restrições de participação que as pessoas com deficiência

sofrem na sociedade.

Portanto, a forma “pessoa com deficiência visual” será usada ao longo deste

texto, respeitando o longo debate a respeito de como se referir às pessoas com deficiências.

O termo será usado em uma forma abreviada comum no campo da inclusão: pessoa com

DV.

Embora a leitura em braille seja feita apenas por pessoas cegas e não por

pessoas com baixa visão, nesse texto usaremos apenas o termo pessoas com DV3, termo

que engloba os dois casos citados acima. Geralmente as pessoas com baixa visão não

querem ler em braille, mesmo que isso lhes permita ler e escrever mais rapidamente, além

3 Deficiência visual é uma categoria que inclui pessoas cegas e pessoas com visão reduzida. Na definição pedagógica, a pessoa é cega, mesmo possuindo visão subnormal, quando necessita ser instruída em braille; as pessoas com visão subnormal podem ler tipos impressos ampliados ou com o auxílio de potentes recursos ópticos (INSTITUTO BENJAMIN CONSTANT, 2002).

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do que livros em braille são mais disponíveis do que em formato ampliado. Para o caso das

partituras em braille, uma pessoa com baixa visão que sabe ler partituras convencionais e

em braille, poderia se tornar um bom transcritor de partituras por compreender os dois

sistemas de escrita, supostamente tomando decisões mais precisas e de forma mais rápida

do que um transcritor vidente, ou seja, a intenção é não excluir essa possibilidade.

1.2 BRAILLE OU BRAILE? UM OU DOIS “L”?

Há divergências sobre a escrita de alguns termos, que serão padronizados neste

trabalho. Um tema que foi amplamente debatido é se a palavra braille deve ser escrita com

um ou dois eles, se é com letra maiúscula ou minúscula (CERQUEIRA, 2006),

considerando que o termo foi usado de diferentes formas em vários textos brasileiros.

Contudo, finalizando o debate, a Comissão Brasileira do Braille define: “Pelas razões

históricas, culturais, linguísticas e legais, anteriormente explicitadas, a Comissão Brasileira

do Braille recomenda que a palavra “braille” seja sempre grafada com dois “l”, segundo a

forma original francesa, internacionalmente empregada” (CERQUEIRA, 2006, p. 93).

Essa é a forma como a palavra braille será escrita nesta pesquisa. Quando

houver a escrita Braille, com inicial maiúscula, será nos casos em que o texto se referir ao

criador desse sistema de escrita, Louis Braille.

Alguns argumentos a favor dessa decisão são relevantes de serem aqui

registrados, tais como:

-todos os países falantes da Língua Portuguesa adotam a grafia com dois “l”;

-o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (o VOLP), aprovado pela

ABL - Academia Brasileira de Letras, em 1942, define que “Os derivados portugueses de

nomes próprios estrangeiros devem escrever-se de acordo com as formas primitivas”;

-há 150 anos que textos brasileiros utilizam a palavra braille com dois “l”.

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Esses e outros argumentos podem ser encontrados em Cerqueira (2006, p. 91).

1.3 Breve história da Musicografia Braille

Louis Braille, nascido em 04 de janeiro de 1809, teve aos 3 anos um acidente

com um instrumento perfurante na oficina de couro de seu pai. Nesse acidente perdeu a

visão de um dos olhos, fato que deu início a uma infecção que o fez perder completamente

a visão do outro olho, dois anos após o acidente. Esse processo é conhecido por oftalmia

simpática, e hoje a perda da visão nesses casos é facilmente evitada pela medicina

(CERQUEIRA, 1995, p. 6).

Dos 7 aos 9 anos frequentou uma escola da comunidade de Coupvray, onde

conviveu com crianças videntes (com visão normal), algo muito raro naquela época, tendo

apresentado um bom desempenho escolar. Aos 10 anos entra para o Instituto Real de

Meninos Cegos (IRMC) de Paris. Nessa escola, Braille tem contato com a sonografia,

método criado por Charles-Marie Barbier de la Serre (1767-1841) (ibid., p. 29-30). O

objetivo inicial da sonografia era dar suporte à comunicação entre soldados no escuro,

evitando que acendessem luzes para ler no campo de batalha, chamando a atenção dos

inimigos. Como não foi aproveitado para este fim, Bardier teria apresentado o método ao

IRMC, em 1821, imaginando que poderia ser útil.

Braille tinha nessa época 12 anos, e foi um dos alunos que ficou muito

animado com esse método de escrita, que oferecia uma leitura mais fácil do que as letras

do alfabeto convencional (ampliadas e em relevo, como era feito até então), além de

permitir com eles próprios escrevessem. O sistema de pontos salientes foi um avanço nesse

campo, usando até 12 pontos para representar 36 sons da língua francesa, mas as letras

eram muito extensas e não abrangiam pontuações, tampouco números. A forma e as

possibilidades de representação ainda precisavam de melhorias. (ibid. p. 29-30)

Contudo, a partir desse invento, Braille, com apenas 16 anos, começou a

desenvolver um modo mais simplificado que usava apenas seis pontos, criando assim a

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primeira versão do sistema de leitura e escrita para cegos, fato que se deu em 1825, ano

que é considerado oficialmente como o ano na invenção do sistema braille (LEMOS &

CERQUEIRA, 2008).

Tal sistema de escrita permite registrar todas as letras do alfabeto, que são

substituídas por combinações de pontos salientes, em relevo no papel, cuja leitura se dá

através das pontas dos dedos. Assim, pode-se não apenas escrever cada letra do alfabeto,

como também partituras musicais e símbolos matemáticos.

Louis Braille também era músico, tocava violoncelo e órgão. Com o apoio do

diretor do IRMC, dr. François-René Pignier, que possuía influência entre o clero, foi

contratado como organista de duas igrejas. Após sua contratação e a de outros músicos

cegos, tornou-se comum a contratação na França de organistas com essa deficiência

(CERQUEIRA, op. cit., p. 8).

Provavelmente Louis Braille fazia uso de partituras em relevo nos seus

trabalhos como organista, o que lhe permitiu aprimorar cada vez mais esse sistema. A sua

grafia musical em relevo foi alterada várias vezes ao longo de sua vida, sendo que a versão

final deixada por ele é a base do que atualmente se utiliza em todo o mundo (SILVA,

2007). Essa versão foi publicada em 1837 com o nome de “Processo para escrever as

palavras, a música e o canto-chão, por meio de pontos, para uso dos cegos, e dispostos para

eles” (CERQUEIRA, op. cit., p. 31).

Somente após sua morte, em 1852, que o uso do Sistema Braille foi

amplamente utilizado na França. Em 1871, foi publicado um compêndio desse sistema na

Inglaterra; em 1879 foi publicado outro na Alemanha e, posteriormente, uma segunda

versão em 1885, em Paris; porém, havia discrepâncias entre todas elas. Assim, uma

comissão internacional dos países citados, além da Dinamarca, padronizaram o código em

1888, em uma conferência ocorrida na cidade alemã de Köln (Colônia). O documento foi

chamado de “Chave de Colônia”, segundo Silva (2007). O autor também comenta:

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Foi-se divulgando por toda a parte a Musicografia Braille, pois, cada vez mais, os cegos se valorizavam e empenhavam na melhoria dos meios postos ao seu serviço. Por assim dizer, em cada país e mesmo dentro dele, os usuários foram inventando e usando símbolos consoantes as necessidades. Urgia pôr cobro a esta anarquia. George L. Raverat, secretário estrangeiro da American Braille Press, de Paris, tomou a seu cargo esta delicada missão, efectuando várias viagens entre a Europa e os Estados Unidos, até conseguir a realização de um congresso, que teve lugar em Paris a 22 de Abril de 1929, o "Congresso Internacional de Especialistas em Notação Musical Braille", com o patrocínio da União Braille Norte-Americana. Aí se adoptaram acordos importantes, que conduziram ao consenso da unificação da escrita musical dos cegos a nível mundial.

Essa incompatibilidade inicial não favorecia a comunicação entre músicos com

DV de países diferentes no campo da teoria musical, tampouco a troca de partituras entre

eles. Assim sendo, as bibliotecas também eram prejudicadas, pois não havia interesse de

público em adquirir partituras que não poderiam ser lidas, impedindo o intercâmbio das

partituras entre os acervos.

Consequentemente, uma nova conferência formada por 29 países foi

convocada pela UNESCO, Conselho Mundial Braille e Conselho Mundial para o Bem-

Estar dos Cegos, em 1954, em Paris. O seu objetivo era reunir, padronizar e divulgar os

esforços de diferentes países para que a Musicografia Braille fosse aproximada, o quanto

possível, das partituras convencionais. Dessa forma, o leitor cego poderia conhecer todos

os sinais musicais que contém a partitura convencional original, permitindo uma melhor

comunicação com os músicos videntes.

Esse evento foi necessário, pois havia outro movimento que defendia que as

partituras em braille deviam primar pela clareza musical, mesmo que não contivessem

transcritos todos os eventos que ocorrem na partitura original. Se assim fosse feito, o bom

diálogo entre os músicos usuários de ambas as grafias se tornaria praticamente impossível,

já que a grande complexidade do contexto requer a assimilação de minúcias e detalhes que

ficariam perdidos.

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1.3.1 A Musicografia Braille no brasil hoje

A partir da década de 1980, o Subcomitê para a Notação Musical no Sistema

Braille, de abrangência internacional, foi criado “para que não haja desvios aos acordos

estabelecidos e pugna para que prevaleça o consenso em todo o mundo” (SILVA, 2007).

Após anos de estudos desse grupo, foi publicado o Manual Internacional de Musicografia

Braille em português (KROLICK, 2004), atualizando e validando as decisões tomadas nas

conferências desde a de 1888, em Colônia.

O objetivo desse manual é favorecer o intercâmbio de publicações musicais em

braille entre diferentes países. Ele foi traduzido para várias línguas e está disponível em

português na internet, como domínio público4, sendo uma contribuição da União Mundial

de Cegos e parceiros para “a inclusão escolar dos alunos com necessidades educacionais

especiais” (KROLICK, 2004, p. 5).

Assim se construiu a Musicografia Braille, que se tornou o método mais

conhecido e eficiente de grafia musical que não utiliza tinta, mas sim o alto-relevo,

permitindo, portanto, a sua utilização por pessoas com deficiência visual. Vale ressaltar

que o Manual Internacional de Musicografia Braille não é um material pedagógico que

auxilia o seu ensino, ele deve ser visto como um compêndio de regras.

Nesse manual não encontramos nenhuma preocupação didática ou exercícios

para ajudar na assimilação por parte do aluno. A organização do seu conteúdo segue uma

ordem que geralmente confunde o leitor que desconhece a fundo o sistema, segundo a

minha própria experiência e o relato de outros professores que tive contato. Trata-se de

uma obra que está longe de ter um caráter próximo a um manual de instruções ou a um

dicionário.

Infelizmente, esse Manual foi distribuído em diversas escolas e entidades especializadas, como se se tratasse de um material didático útil a quem quisesse aprender a notação musical em braille. Sabe-se, entretanto, que o

4 Disponível para download em: <portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/musicabraile.pdf>

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aprendizado desse código requer um acompanhamento especializado, bem como uma metodologia apropriada aos alunos com deficiência visual e a seus respectivos professores (BONILHA, 2010, p. 180).

Nos casos em que a teoria musical é mais avançada, e por isso de difícil

explicação com poucas palavras, os exemplos são dados sugerindo que o leitor compare os

exemplos oferecidos de uma partitura em tinta e uma em braille. Naturalmente, isso é

impossível de ser feito na versão em braille, como pode ser visto nas páginas 8, 79, 94, 100

e 131 do manual. Podemos supor que tais exemplos não são totalmente inteligíveis, mas

exigem muita dedicação e esforço mental para serem compreendidos sem nenhum auxílio.

Afirmo isso, pois pude encontrar diversas pessoas com DV que, mesmo sendo músicos e

conhecendo os fundamentos dessa escrita, não conseguiram usar o manual e desistiram de

compreendê-lo sozinhos, até mesmo de consultá-lo. A sua versão em braille tem nove

volumes impressos em frente e verso, que geralmente são muito pouco consultados devido

à sua complexidade técnica.

Contudo, conhecer a Musicografia Braille atende às necessidades de autonomia

dos músicos com DV, permitindo-lhes escrever música e ler qualquer partitura sem ajuda

de músicos videntes. Esses músicos podem escrever suas próprias anotações e músicas,

tocar em conjunto; esse conhecimento também permite o aprofundamento teórico

necessário para o estudo em níveis de graduação e pós-graduação.

No entanto, o acesso a essas partituras é difícil por causa de sua complicada

produção. Mesmo com o auxílio de computadores e softwares, a tarefa de transcrever

partituras convencionais para o braille ainda necessita de um especialista vidente (com

visão normal) em algum momento dessa tarefa. A revisão, comparando o original em tinta

com a versão em Braille, ainda se faz imprescindível para corrigir ou evitar erros de

transcrição. Alguns músicos com DV recorrem a amigos ou parentes que lhes descrevem a

partitura convencional que precisam estudar, de maneira que possam reproduzi-la em

braille, e a partir daí podem utilizar autonomamente a sua partitura nos estudos.

Reforçando essa metodologia, segue trecho de uma entrevista feita por Bonilha (2006, p.

173) com um músico com DV:

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Quando precisava de alguma coisa mais urgente, a professora, às vezes, escrevia a música toda por extenso com os nomes das notas, se tinha uma semínima, uma semibreve, punha a oitava e eu ia explicando para ela como é o escrito Braille, ou então, ela ditava para mim.

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CAPÍTULO 2 - ESPECIFICIDADES DA APRENDIZAGEM MUSICAL

DA PESSOA COM CEGUEIRA

Buscaremos esclarecer alguns pontos acerca dos métodos musicais

relacionados com a Musicografia Braille, assim como verificar a veracidade de algumas

crenças populares sobre aptidões e dificuldades das pessoas com DV para a música.

No decorrer deste capítulo, procurarei responder a algumas questões que julgo

importantes para reflexão.

-Como a ausência do sentido da visão influencia na aprendizagem musical das pessoas com DV?

-É fundamental desenvolver metodologias musicais diferenciadas para pessoas com DV? Não basta transcrever um método musical convencional para o sistema braille?

-Há métodos especializados nesse ensino?

2.1 A relação entre as partituras convencionais e as partituras em braille

Podemos considerar que a grafia musical consiste em compreender

determinada teoria musical e saber como registrar os eventos musicais. Tal registro deve

ser claro o suficiente para ser consultado e novamente se tornar música. Podemos fazer

uma analogia com a relação da Música/Partitura com a Fala/Escrita.

Quando escrevemos uma fala ou um pensamento que contém uma ideia,

seguindo determinadas regras de escrita, tornamos possível que uma segunda pessoa leia o

que foi escrito, decodificando aqueles caracteres impressos naquele específico idioma, e

assim recrie no próprio pensamento as ideias que foram escritas pelo autor do texto

original. Para que essa comunicação aconteça é preciso que quem escreve e quem lê

conheçam as mesmas regras. Assim como a gramática está para a escrita, as teorias

musicais estão para a partitura.

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Há teorias do campo da semiologia, sobre a transmissão de mensagens entre

duas pessoas, que podem trazer novas percepções sobre a relação entre as partituras

convencionais com as partituras em braille. Natiez (1990, p.17) cria um quadro de

conceitos a partir da teoria semiológica de Molino, recorrendo a um esquema clássico da

comunicação: o Produtor que gera uma Mensagem endereçada a um Receptor. Procurando

considerar que o processo de reconstrução da Mensagem que faz o Receptor é algo tão

complexo quanto a tarefa do Produtor em gerá-la, ele remodela esse esquema clássico.

Observe o diagrama abaixo:

Figura 1 – Diagrama de comunicação proposto por Natiez Fonte: Natiez (1990, p. 17) Descrição para pessoas com DV: No lado esquerdo da figura aparece a palavra Produtor,

relacionada aos dizeres Processo Poiético, logo acima da palavra Produtor. A partir dessa palavra há uma seta em direção ao centro do diagrama, onde temos as palavras Traço/Vestígio; no lado direito aparece a palavra Receptor, relacionada a Processo Estésico, escrito acima dela. Da palavra Receptor há uma seta que retorna em direção ao centro do quadro, onde temos a palavra Traço/Vestígio, já citada anteriormente.

Nesse esquema o “Processo Poiético” é a ação complexa do “Produtor” de

criar a sua mensagem a partir de uma ideia. Essa mensagem aqui é chamada de

“Traço/Vestígio”, sendo considerada como uma parcela do conceito inicial que o Produtor

quis comunicar. O “Processo Estésico” é a ação complexa do “Receptor” de recriar o

conceito inicial que o Produtor quis comunicar por meio do “Traço/Vestígio”.

Esse esquema sugere que Traço/Vestígio (que pode ser um poema, um filme,

uma sinfonia) não é apenas o intermediário de um processo de comunicação que transmite

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a intenção do autor para uma audiência, mas que o binômio Traço/Vestígio é o resultado

da ação complexa do Produtor em criá-lo (o processo poiético), assim como é complexa a

ação do Receptor em reconstruir o conceito original a partir do Traço/Vestígio (processo

estésico). O Traço/Vestígio é, então, considerado uma pequena amostragem, uma parte do

que o Produtor tencionou transmitir, restando ao Receptor reconstruí-la a partir de seus

próprios conhecimentos. Quanto mais conhecimentos e capacidades o Produtor e o

Receptor tiverem em comum a respeito do Processo Poiético e do Estésico, melhor será a

compreensão entre ambos.

Se traçarmos um paralelo com uma partitura em tinta, podemos considerar a

música escrita como um Processo Poiético, na qual o Produtor tem como objetivo

transmitir uma música (um conceito) por meio de um sistema definido (Traço/Vestígio). A

partitura pode ser vista como Traço/Vestígio da música, sendo algo que existe antes da

ação criativa do Produtor. A partir dessa partitura, o Receptor fará a sua interpretação, que

nesse caso será o leitor da partitura.

Nesse sentido, “partiturar” uma música é a tarefa de anotar no papel os

Traços/Vestígios de uma música de forma que possam ser compreendidos por um

Receptor/Leitor. Para tanto é necessário que existam regras definidas e conhecidas, tanto

pelo Produtor quanto pelo Receptor. Essas regras são todas as formas de representação

musical que encontramos nas partituras ocidentais em tinta. Nelas há um padrão de escrita

para os eventos musicais, fazendo uso da espacialização horizontal e vertical no papel, se

assemelhando a um “gráfico de linha”5. Nesse gráfico, o tempo da música está no eixo

horizontal; a altura da nota está no eixo vertical. Veja as figuras a seguir e compare-as.

5 O gráfico de linha é composto por dois eixos, um vertical e outro horizontal, e por uma linha que mostra a evolução de um fenômeno ou processo.

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Figura 2 – Trecho de uma partitura convencional Descrição para pessoas com DV: A imagem é de uma partitura convencional, que pode ser

compreendida na partitura em braille, apresentada na Figura 26

6 Figura 3 – Representação gráfica do desenho melódico da partitura convencional da figura 2,

que é o mesmo da partitura em braille da figura 26 Descrição para pessoas com DV: Há cinco linhas representando uma pauta e, em vez de

haver notas musicais, como em uma partitura convencional, há uma linha vermelha fazendo o desenho melódico da partitura em braille da figura 26. No alto está escrito “Desenho Melódico” e embaixo há uma pequena linha vermelha seguida do escrito “Linha melódica”, indicando o que representa a linha vermelha.

Por sua vez, a Musicografia Braille é uma espécie de descrição do que

acontece na partitura em tinta7. É como se fosse um ditado que segue regras sobre como

ditar e em que ordem isso deve ser feito. Sendo assim, podemos afirmar que a grafia em

braille é uma interpretação (Processo Estésico) dos Traços/Vestígios que a grafia em tinta

criou a partir do evento musical (Processo Poiético).

Então entre ambas as partituras estão os mesmos Traços/Vestígios? Sim. Cada

6As figuras que não possuem a “Fonte” de origem foram feitas pelo autor desta pesquisa, assim como os exemplos musicais em braille e na escrita convencional.

7Por isso, a descrição feita na figura 2 é totalmente compreensível para a pessoa com DV, que lê esse texto por meios eletrônicos. Essa característica será esclarecida gradativamente ao longo dessa pesquisa.

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detalhe contido nas partituras em tinta é escrito em braille. Uma partitura em braille

poderia facilmente ser uma gravação de voz que a narra, minuciosamente, mas ao ser

escrita ela não se enquadra no esquema letra por letra, palavra por palavra. Ela é escrita por

meio de letras em que apenas uma delas pode significar uma ou mais informações ou

mesmo conceitos complexos que não podem ser explicados com poucas palavras. Por

exemplo: apenas uma letra braille informa musicalmente a oitava na próxima nota; a letra

seguinte indica o nome da nota e seu valor de tempo correspondente (duas informações na

mesma letra); a próxima indica o dedilhado correspondente; etc. Enquanto algumas letras

contêm mais de uma informação, há casos em que é necessário duas letras juntas para

apenas uma informação, como é o caso da barra final, stacato, em acorde, entre outros.

Veja o exemplo abaixo, que mostra como a partitura da figura 2 é escrita em braille

Figura 4 – Trecho musical escrito em braille, com indicações. Descrição para pessoas com DV: a mesma partitura descrita na figura 2 aparece aqui em versão

braille, com indicações do que cada cela braille8 significa.

Todas as celas, que contêm as informações musicais, estão cuidadosamente

organizadas. A comunicação entre as duas escritas musicais é muito estreita, não havendo

espaço para dúvidas na interpretação. É possível o leitor do braille saber exatamente como

a música está escrita no seu original, em tinta.

8 Cela braille é o grupo de 6 pontos que formam as 63 combinações possíveis do sistema braille.

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O leitor da Musicografia Braille, embora não esteja lendo uma partitura em

tinta, precisa se apropriar dos mesmos conceitos teóricos que o leitor vidente precisa para

compreender a escrita dos eventos musicais. Por isso é importante manter a escrita em

braille sempre respeitando a maneira como a escrita em tinta foi feita, o que irá permitir

uma boa comunicação entre um músico leitor de partituras convencionais e um de

partituras em braille.

Contudo, mesmo com a partitura em braille compartilhando os mesmos

Traços/Vestígios da partitura em tinta, a partitura em braille os interpreta à sua maneira ao

realizar o seu próprio Processo Estésico. Contudo, a relação entre elas é tão próxima que o

Processo Estésico do seu Receptor em braille parece ser o próprio Processo Poiético feito

sobre os eventos musicais da escrita convencional.

Nesse sentido, como a música é compreendida pela pessoa com DV de forma

aproximada ao que faz o leitor vidente, a Musicografia Braille pode ser considerada como

uma escrita inclusiva para músico com DV no meio musical. Isso não quer dizer que seria

essa a única possibilidade, mas que é ela sem dúvida a ferramenta que melhor atende às

necessidades e possibilidades de inclusão de seu usuário.

Houve outras tentativas de criar sistemas mais simples de escrita musical para

pessoas com DV, mas nenhuma delas alcançou essa qualidade ímpar, que só poderia ter

sido criada por uma pessoa com DV e não por um vidente, que naturalmente desconhece a

maneira pela qual as pessoas com DV se relacionam com o mundo.

2.1.1 Métodos diferentes para cada forma de escrita

A pessoa com DV pode ler uma música escrita em braille sem precisar

conhecer a grafia convencional, embora seja recomendado por professores com DV que o

aluno venha a conhecer ambas, mas somente em um segundo momento do seu

aprendizado. Isso deve garantir que o aluno se comunique com um músico vidente (sem

DV), que só conhece a partitura em tinta, já que o objeto da comunicação é o mesmo (a

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música) e ambos têm o mesmo conceito sobre os eventos musicais.

No entanto, a comunicação se tornaria inviável caso uma dessas duas pessoas

não conhecesse a teoria musical. Fosse o músico vidente ou o músico com DV. Para

ilustrar melhor a comunicação entre os dois tipos de músico, devemos considerar outra

relação dentro do quadro de Natiez (figura 1).

Se colocarmos as duas grafias musicais no lugar de Produtor e os seus

respetivos leitores no lugar de Receptor, logo teremos Traços/Vestígios diferentes,

provenientes de uma mesma música. A música é o objeto original, acerca do qual se quer

comunicar em ambas as vias de comunicação.

Figura 5 – Diagrama de comunicação conforme Natiez (1990, loc. Cit.), com alterações. Descrição para pessoas com DV: À esquerda do diagrama está escrito Música Original; a

partir dessa frase há uma seta saindo para a direita que bifurca com uma ponta para cima e outra para baixo. Cada uma das pontas aponta para duas linhas que vão do centro até o fim do diagrama. Essas linhas se assemelham ao diagrama da figura 1. No começo da linha de cima temos a frase Partitura em braille, e dela sai uma seta também para a direita, onde se lê Traços/Vestígios. No fim dessa linha temos a palavra Leitor, com uma seta para a esquerda, em direção contrária, apontando de volta para as palavras Traços/Vestígios. Na linha que segue abaixo, temos a frase Partitura convencional, dela saí uma seta para a direita, onde lemos Traços/Vestígios. No fim dessa linha temos a palavra Leitor, com uma seta para a esquerda, em direção contrária, apontando de volta para as palavras Traços/Vestígios. As frases Partitura em braille e Partitura convencional estão relacionadas à palavra Produtor, escrita acima delas. As palavras Leitor, de ambas as linhas, estão relacionadas à palavra Receptor, escrita acima delas.

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Destacamos nesse segundo diagrama alguns pontos importantes:

a) não há semelhanças diretas entre os Traços/Vestígios;

b) mesmo sem os dois leitores compreenderem o Processo Estésico em que o outro está imerso, ambos irão executar exatamente a mesma música;

c) após a interpretação correta feita por esses diferentes leitores é que poderá haver comunicação musical entre eles, seja na execução, seja no campo teórico.

Portanto, um método musical é algo fundamentado nos Traços/Vestígios do

esquema acima e, por isso, um método para partituras em tinta não poderia ser traduzido

para o braille e utilizado para o ensino da Musicografia Braille. Para tanto é necessário

verificar quais são os Traços/Vestígios do Braille, e como isso pode influenciar na sua

metodologia, que é o que pretende esta pesquisa.

2.2 Os métodos musicais disponíveis

Para que o aprendizado musical ocorra, podemos ter ou não um esquema

didático como apoio. Por exemplo, se uma pessoa se encontra em uma cultura falante de

uma língua que ela desconhece, ela aprenderá a se comunicar gradativamente cada vez

melhor a partir das interações com as pessoas desse lugar; certamente, se há um professor

intermediando esse processo de aprendizagem, ou se ela dispõe de um método, esse

processo será mais rápido e eficiente na medida em que o método utilizado seja o mais

indicado para o seu caso.

Poderíamos pensar que qualquer método musical seria bom para o ensino da

Musicografia Braille, mas, como vimos anteriormente, isso não é verdade. Embora o

conteúdo principal seja sempre a música, a forma como ela é apresentada deve ser

específica. Como um exemplo hipotético (e exagerado, apenas para ilustrar a situação),

seria como se um método de clarinete fosse utilizado para o ensino do saxofone. Isso seria

melhor do que não usar nenhum método, no entanto, não seria nem de longe o mais

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adequado.

Constata-se que o ensino musical para pessoas com DV não foi pesquisado de

maneira holística, como ocorreu com a educação musical para pessoas videntes. Temos

disponíveis diversos métodos de musicalização, desenvolvidos a partir do começo do

século XX, todos elaborados para alunos videntes; são apenas algumas as citações acerca

da inclusão de pessoas com cegueira. Dolores, em sua dissertação (2003, p.122), aponta

que há falta de metodologias adequadas para as pessoas com DV, além de material didático

e partituras. Giesteira (2013, p. 27) afirma que, embora haja diversas instituições que

trabalham com inclusão de pessoas com DV, a bibliografia específica sobre ensino musical

é mínima. Isso refletindo na qualidade da aprendizagem musical, especialmente nas etapas

de iniciação.

Podemos considerar que a educação musical ocidental é fundamentada em

métodos de educadores musicais que trouxeram inovações para o posicionamento

educacional de suas épocas. As primeiras raízes desse movimento são encontradas já em

Rousseau e Rameau, no séc. XVIII. Ambos os autores são considerados precursores das

ideias que mais tarde culminariam na série de métodos da educação musical do séc. XX

(FONTERRADA, 2008, p. 59). Nesse período, a postura questionadora das tradições

seculares e os desafios da nova sociedade industrializada que surgia gerou a necessidade de

investir esforços na educação, afim de que o indivíduo não se perdesse em meio ao

consumismo e à sobrevivência urbana. Na educação musical, o movimento dos “métodos

ativos” surgiu para atuar individual e coletivamente em direção ao aperfeiçoamento das

qualidades e da sensibilidade humana (ibid., p. 96). A educação musical se voltou para a

valorização da prática direta da música, deixando em segundo plano o ensino da teoria e

escrita musical.

No séc. XX se destacam quatro pesquisadores, que podem ser considerados a

base da educação musical moderna: o austríaco9 Dalcroze, o húngaro Kodály, o alemão

9 Dalcroze nasceu na Áustria e aos 10 anos passou a morar em Genebra, Suíça.

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Orff e o japonês Suzuki (ibid., p. 122). Seus métodos são utilizados até hoje em muitas

escolas de música e ainda influenciam inúmeros métodos musicais atuais. Outros

importantes autores podem ser considerados influenciados por esses, tais como o belga

Willems, que foi aluno de Dalcroze; e o brasileiro Vila Lobos, que implantou nas escolas o

Sistema de Educação Musical através do Canto Orfeônico, inspirado pelo trabalho de

Kodály, ambos reforçando a identidade musical nacional e usando a voz como primeiro

instrumento musical.

A partir da metade do séc. XX, a música erudita ocidental teve novo impulso

com as experiências composicionais de Pierre Shaeffer na Radiotélévision Française, que

impulsionaram a nova “música concreta”, além das propostas musicais do compositor John

Cage. Esse movimento, ao qual ainda se uniram outros compositores, representa a época

em que a sonoridade da música passou a ser o parâmetro principal a ser considerado,

geralmente explorando procedimentos aleatórios e utilizando grande diversidade de

recursos eletrônicos. Os educadores musicais dessa época foram influenciados por essa

tendência, se interessando “pelo som como matéria-prima da música, onde as explorações

sonoras são a base para as criações e interpretações” (BUENO, 2010, p.16). Ou seja, a

apreciação da sonoridade passou a ser prioridade, colocando em segundo plano a prática e

a escrita. Alguns dos principais educadores desse movimento, citados por Bueno (2010),

chamado de “segunda geração”, são Schafer, Self, Paynter, Porena, Koellreutter e Zagonel.

No entanto, nenhum desses métodos aborda o uso da Musicografia Braille na

aprendizagem musical de pessoas com DV. Alguns desses métodos poderiam ser usados

nesse ensino especializado, mas essa ação de inclusão iria exigir do professor

conhecimentos da grafia braille para que fosse possível realizar a adaptação.

Frequentemente esses conhecimentos não são transmitidos de forma adequada na formação

de professores.

Uma das dificuldades encontradas na formação dos educadores, no estudo de alguns fundamentos teóricos para o trabalho com alunos com necessidades educacionais especiais, é o amplo leque de realidades socioculturais existentes em nosso país. Para atender esta demanda tão diversa, o material dirigido à formação tem se proposto oferecer uma

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linguagem suficientemente abrangente para ser acessível a todos. Porém, em alguns casos, se observa a excessiva simplificação dos conteúdos propostos, aliada a uma superficialidade que se distancia das situações problemáticas concretas de cada realidade (PAULON, 2005, p.21).

Desse modo, particularidades da grafia musical em braille, e questões de

aprendizagem e socialização com pessoas com DV, deveriam ser não só abordadas em

cursos de formação para professores de música, mas também com o devido

aprofundamento no tema. O objetivo seria capacitá-los a dar aulas de música para alunos

com DV, com o apoio de materiais didáticos especializados. Caso não tivesse disponíveis

tais materiais, os próprios professores seriam capazes de criar as adaptações para suas

aulas, pois teriam conhecimentos básicos no campo da inclusão.

2.2.1 Alguns materiais especializados

Ota e Vanazzi de Souza (2011) relatam a experiência na confecção de um

material usado em aulas de música para pessoas com DV na Universidade Estadual de

Maringá, em 2010. Na ocasião, foi feito um material didático em borracha de E.V.A.,10

correspondendo às letras em braille que formam as notas musicais em diferentes valores de

tempo. Com esse recurso, foi possível desenvolver atividades de musicalização e

introduzir a leitura do braille de forma gradativa e lúdica. Algumas dessas atividades foram

chamadas de bingo de notas, jogo da memória, relógio braille, ditado e piano invisível. A

sequência na abordagem do conteúdo musical foi elaborada a partir de experiências

anteriores, procurando respeitar as particularidades da escrita em braille. Os autores

concluem:

Acreditamos ser importante a utilização de materiais didático-musicais com alunos cegos, porém isso requer preparação dos professores. Nesse sentido é sensato elaborar um material didático para auxiliar o aluno com DV de modo a proporcionar dinâmicas relacionadas com a Musicografia Braille, não com a grafia em tinta. Os materiais e dinâmicas criados pela equipe certamente tornou a aprendizagem da Musicografia Braille mais

10 A borracha E.V.A. é uma mistura de Etil, Vinil e Acetato.

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prazerosa e eficiente para os alunos em nossas aulas (OTA E VANAZZI DE SOUZA, 2011, p. 272).

Temos encontrado pessoalmente outros professores que também

confeccionaram esse material braille com borracha de E.V.A. Tais professores têm obtido

resultados positivos no aumento da eficiência e qualidade na aprendizagem dos seus

alunos. Geralmente cada uma faz pequenas alterações com relação ao material original.

Alguns fizeram com que os pontos três e seis da cela braille fossem fixados com velcro11,

podendo ser destacados e colocados quando necessário, já outros professores fizeram os

pontos com pequenos pregos arredondados, também dando a liberdade de retirá-los de

acordo com a atividade. No apêndice há uma introdução à Musicografia Braille para o

leitor que desconhece o sistema e queira conhecê-lo, nele pode ser compreendido como

essas alterações citadas podem facilitar a aprendizagem e criar novos exercícios.

Giesteira (2013, p. 92) aponta dois materiais didáticos que se relacionam

diretamente com a teoria da Musicografia Braille: An Introduction to Music for the Blind

Student: A Course in Braille Music Reading, de Richard Taesch12, e How to Read Braille

Music de Betty Krolick13. Com relação à aprendizagem instrumental, temos disponível An

Introduction to the Piano for the Blind Student, também de Richard Taesch14, assim como

a tese de Giesteira (2013), que desenvolve um moderno método de violão que leva em

conta características da Musicografia Braille. Giesteira também esclarece que existe uma

grande quantidade de métodos em tinta transcritos para o sistema braille, mas que essas

11 s.m. (marca registrada, do fr. velours croché) Tecido fabricado em tiras duplas, aderentes, usado como fecho ou para fixar, uma na outra, duas coisas diversas ou duas partes de uma mesma coisa.

12 Taesch, R (2000). An Introduction to Music for the Blind Student. A Course in Braille Music Reading. (Part I, Lessons Phases one thought four). Pensilvania: Dancing Dots.

13 Publicado por Opus Technologies, 1998, 52 pages, ISBN: 1-892195-05–4. Disponível em: <http://www.opustec.com/products/howto/howprint.html>.

14 Taesch, R. (2001). An Introduction to the piano for the Blind Student. A progressive curriculum in bar-over-bar braille music reading. (Book II, Graded Studies). Pensilvania: Dancing Dots.

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transcrições literais de métodos instrumentais só são eficientes para estudantes que já

dominam a Musicografia Braille.

Constata-se que, em geral, o ensino da música para pessoas com DV vem

sendo abordado de forma superficial, sem haver preocupação direta com a Musicografia

Braille. Poucos trabalhos podem ser considerados como métodos musicais, embora sejam

ainda recentes e pioneiros se comparados às amplas pesquisas do ensino que se estruturam

na grafia em tinta.

No entanto, há boas referências de relatos de experiência fornecidos por alguns

pesquisadores/professores que ministraram aulas sem o auxílio de métodos musicais. Tais

relatos podem nos ajudar com novas ideias sobre esse ensino, e assim expandir o nosso

panorama sobre esse campo de ensino.

2.3 Experiências e pesquisas sobre o ensino da música para pessoas com

deficiência visual: breve revisão bibliográfica

Bohn (2008), em um trabalho de conclusão de curso intitulado “O ensino de

violino voltado para deficientes visuais integrando o método suzuki e a musicografia

braille”, aponta a experiência que o próprio Shinishi Suzuki teve com um aluno com

cegueira. Ele adaptou peças no corpo do violino para educar os movimentos do arco com

relação às cordas, facilitando a aprendizagem dos gestos, com resultados bem satisfatórios.

O método Suzuki preza pela memória musical, deixando a leitura de partituras e a teoria

em segundo plano. Relatos afirmam que essas adaptações têm funcionado muito bem com

os alunos com cegueira, mas esses estudos não abordam como a Musicografia Braille seria

inserida nesse ensino.

Em 1926 foi realizado o Primeiro Congresso de Rítmica Dalcroze, em

Genebra, que entre as atividades contou com uma demonstração do trabalho de Juan

Llongueres sobre a rítmica dalcrozeana com pessoas com cegueira (RODRIGUES, 2014).

Llongueres foi autor do livro “La Gymnastique rythmique dans l'éducation des aveugles”,

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infelizmente não pude encontrar esse livro, datado do começo do séc. XX, apenas constatei

sua existência ao ser citado por Mata (2012, p. 82).

De todo modo, o método Dalcroze não se preocupa em reunir em um

compêndio séries de exercícios definidos para serem aplicados com todos os alunos de

forma padronizada, mas busca fazer com que seus professores, credenciados pelo Instituto

Dalcroze da Suíça, tenham recursos pessoais para criar suas atividades de acordo com suas

habilidades musicais e adaptando-as com a realidade e necessidade de seus alunos.

Segundo Harasim (2002, p. 5), Dalcroze acreditava que, apesar de qualquer

deficiência que o aluno tenha, é preciso desenvolver a sua criatividade, autoconfiança e

percepção musical. Deve-se buscar apresentar a música não apenas como o resultado de

um processo intelectual, mas como parte de um instinto vital.

Dessa forma, devido ao método de Dalcroze ter essa característica teórico-

filosófica sobre o ensino musical, definindo pouco a forma como a musicalização deve ser

feita, esse método pode perfeitamente ser aplicado para pessoas com DV. A tarefa de

concretizar a filosofia educacional de Dalcroze na sala de aula é delegada ao professor que,

caso possua conhecimento no campo da inclusão, pode criar atividades muito proveitosas e

eficazes. No entanto, não temos notícias de que o músico Juan Llongueres tenha ensinado

Musicografia Braille por meio do método Dalcroze para os seus alunos, o que seria de

grande interesse para essa pesquisa.

No evento Actas de la IX Reunión de Sociedad Argentina para las Ciencias

Cognitivas de la Música, Chávez (2010, pág. 74) apresentou o artigo “Estrategias de

Estudo Utilizadas por Pianistas Ciegos”, vinculada ao Instituto Universitário Nacional del

Arte, de Buenos Aires. A autora entrevistou três pianistas com cegueira e descreve um

pouco de suas técnicas pianísticas e como seus professores lhes ensinaram. Cada um

desses pianistas tem uma técnica diferente para resolver saltos entre notas distantes. O

primeiro pianista entrevistado, Gabriel Bergogna, utiliza a técnica de arrastar as mãos pelo

teclado, pois assim ele consegue fazer saltos amplos entre duas notas, e também diz fazer

uso de memória motora, decorando o movimento dos braços e mãos para tocar o piano.

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Em oposição, o segundo pianista, Osvaldo Guzmán, faz no ar um caminho curvo entre as

notas saltadas, por cima do teclado, e também procura memorizar o gesto de cada trecho.

O terceiro entrevistado, a pianista Lourdes Castiñeira, diz que é apenas uma questão de

memória espacial e que não requer nenhuma técnica especial, garante que apenas com

muita repetição a pessoa adquire essa habilidade, seja ela com ou sem visão. Observamos

que o ponto comum entre esses pianistas é o estudo de um gesto associado ao trecho

musical em questão, de forma que a execução seja correta no instrumento.

Silva e Araldi (2010) relatam a experiência de iniciar um trabalho de música

para pessoas com DV, em um projeto de extensão da Universidade Estadual de Maringá, e

se depararam com dificuldades e medos sobre como tratar, falar, se dirigir e conduzir seus

alunos com DV sem ofendê-los. Também aprimoraram a metodologia dessas aulas ao

longo do curso e afirmam terem enriquecido a própria formação profissional com essa

experiência.

Junior (2010) nos apresenta como desenvolveu atividades musicais feita com

um grupo de pessoas com DV usando instrumentos de percussão. Os alunos não conhecem

a Musicografia Braille e alguns ainda não leem em braille, o autor se ateve apenas na

prática musical, e aponta que isso tem permitido aos participantes colherem benefícios em

diversas áreas de suas vidas, se revelando a cada dia “mais independentes e participativos,

apresentando uma melhora significativa no desempenho escolar e um refinamento discreto,

mas promissor, no desenvolvimento da estética musical”.

Em uma pesquisa feita com crianças com e sem DV da mesma idade, Herrera

(2010, p. 93) aponta que a capacidade de relacionar a altura de nota com a verticalidade

(agudo é no alto e grave é embaixo) é praticamente idêntica para ambos os grupos.

Herrera defende que a percepção de subir e descer entre duas notas com alturas

diferentes é adquirida pela vivência pessoal, independentemente da deficiência visual.

Também diz que esses estudos reforçam a necessidade de discutir e repensar o modo que a

aprendizagem musical em geral faz uso desta correspondência. Isso deve ser especialmente

considerado no âmbito da Musicografia Braille, já que em parte ela ignora essa relação na

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representação da altura do som. A relação vertical e horizontal das partituras em braille

será vista com detalhes no capítulo quatro.

2.3.1 Considerações Parciais

O objetivo desta pesquisa se restringe em levantar dados acerca das partituras

em braille, com o intuito de criar uma ferramenta de apoio para o seu ensino. Portanto,

questões sobre como trazer as experiências de Suzuki, Dalcroze, entre outros, para a

utilização das partituras em braille será tarefa para outras pesquisas, que certamente serão

beneficiadas com os resultados deste estudo.

Segundo minha experiência, e pelo contato com professores de música de

alunos com DV, posso afirmar que os professores geralmente começam a lecionar sem ter

nenhum apoio metodológico especializado, criando suas adaptações livremente. Alguns

utilizam partituras em braille elementares, e outros nem sequer chegam a mencioná-las,

devido ao total desconhecimento; outros, fazem uso de partituras convencionais escritas de

forma ampliada ou em alto-relevo, usando fios de barbante colados no papel para

representar as linhas da pauta, fichas de borracha para as notas e etc. Há ainda casos raros

em que o professor inventa um sistema próprio de escrita em relevo, que não usa as celas

braille, mas quando sistema assim são comparados à Musicografia Braille se mostram

rudimentares, além de impossibilitar que o próprio músico com DV escreva a música.

De modo geral, os professores acabam desenvolvendo métodos e exercícios

para auxiliar suas aulas de acordo com o que conhecem sobre inclusão e com o interesse

dos alunos com relação à música. No entanto, não chegam a publicar esses conteúdos de

forma a gerar material de apoio para outros professores.

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2.4 Material didático especializado

Existem programas de computador de criam partituras em braille que poderiam

ajudar nessas aulas especializadas?

Há diversos programas de computador que fazem automaticamente a

conversão de textos digitalizados (".doc", ".txt", etc.) para o sistema braille. Tais

programas permitem ao usuário digitar as letras da forma tradicional ou alterando-o para

que funcione como uma máquina Perkins15 virtual, digitando cada cela braille diretamente

pelos pontos que a formam. Nesse caso apenas as letras f, d, s, j, k, l funcionam para

escrever as letras, correspondendo respectivamente aos pontos 1, 2, 3, 4, 5 e 6. Veja a

figura a seguir, que representa o que é uma cela braille e o número dos pontos que a

formam.

Figura 6 – cela braille com os pontos numerados. Descrição para pessoas com DV: cela braille com o número correspondente a cada um dos

seis pontos. Os três primeiros à esquerda e os três últimos à direita.

Esses programas então geram um arquivo que, ao ser enviado para impressoras

especiais, é impresso em alto-relevo. Elas usam papéis de gramatura maior do que

geralmente é usado para impressão em tinta, isso para que não rasgue ou perca a

informação tátil com o passar do tempo.

Dessa forma, com algum conhecimento de informática e treinamento para

formatar corretamente o texto braille no computador, qualquer pessoa pode gerar arquivos 15 As máquinas Perkins são máquinas que escrevem os pontos em relevo diretamente no papel, com uma gramatura maior do que uma folha de caderno. A gramatura recomendada para a escrita em relevo é de 120g a 150g, enquanto os papéis normalmente usados para impressão em tinta têm gramatura média de 75g.

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para serem impressos em braille. O mesmo não ocorre com as partituras ou métodos

musicais, não com essa facilidade, pois estes exigem maiores conhecimentos e

especialidades técnicas.

Os melhores softwares não são gratuitos e têm custo muito alto, o que dificulta

o acesso não só pelos usuários interessados, mas também por pesquisadores que poderiam

utilizá-los em transcrições ou avaliar sua eficiência. Os programas gratuitos, como o

MusiBraille16, ainda não atendem a todas as necessidades de escrita e de transcrição,

faltando abranger recursos avançados da Musicografia Braille. Esse programa se mostra

muito conveniente para o usuário iniciante com DV e para músicos que queiram escrever

apenas partituras simples, carecendo de tecnologia para produzir partituras mais

complexas. A percepção das diferentes complexidades das partituras em braille será vista

no capítulo 3.

Contudo, a participação de um transcritor especialista é importante para que

uma partitura seja transposta para o braille corretamente, mesmo com o apoio de

programas especializados. Algumas decisões de formatação, como por exemplo de que

forma o programa irá escrever determinadas passagens ou trechos, podem ser feitos

somente por alguns poucos programas.

Nesse quesito, um programa que tem se destacado é o GoodFeel Music

Translator, que tem feito transcrições de partituras a partir do programa Lime Aloud Music

Notation, de partituras convencionais, com grande precisão. Os estudos desenvolvidos na

área de Musicografia Braille (da Biblioteca de Acessibilidade da Unicamp) com esse

programa têm encontrado algumas dificuldades, mas geralmente, depois de muitos testes,

os problemas têm sido resolvidos satisfatoriamente. O Goodfeel está sendo constantemente

aprimorado pelos seus criadores, suprindo necessidades e recebendo sugestões de usuários

16 Dolores Tomé, juntamente como professor Antônio Borges do Núcleo de Computação Eletrônica da Universidade Federal do Rio de Janeiro, lançaram um software gratuito chamado Musibraille, o primeiro programa para computadores em língua portuguesa para escrita da linguagem musical em Braille. Disponível gratuitamente para download em: http://intervox.nce.ufrj.br/musibraille/.

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de diferentes partes do mundo. Embora seja um programa de alto custo no mercado, ele é o

programa que mais tem se destacado e está em constante melhoria.

Não há dúvida que esses programas podem ajudar no aprendizado, mas apenas

como ferramentas auxiliares. A pedagogia da Musicografia Braille é um campo diferente

do campo da transcrição computadorizada de partituras convencionais para o braille. Isso

quer dizer que não é possível passarmos um livro de musicalização produzido em tinta

para o sistema braille por meio de softwares. A metodologia desses materiais, ou o modo

como a música e a grafia são ensinados, podem ser incompatíveis ou inadequados para o

aluno que irá usar o braille. Como vimos anteriormente, na seção 2.1 deste capítulo, um

método especializado deve considerar a maneira que o aluno com DV compreende e

escreve os conceitos musicais, pois certamente isso irá interferir no planejamento do

aprendizado musical.

Nesse sentido, questões relativas ao processo de aprendizagem e compreensão

de conceitos abstratos das pessoas com DV, e quais as diferenças na cognição entre as

pessoas com e sem DV, serão vistas a seguir, nos estudos em torno da teoria cognitiva e do

construtivismo piagetiano.

2.5 Desenvolvimento cognitivo da pessoa com deficiência visual

Os quatro estágios da teoria cognitiva de Jean Piaget (1987), sensório-motor,

pré-operacional, operatório concreto e operatório formal, foram levantados pelo autor

observando o desenvolvimento de seus filhos, que eram crianças videntes. Tais estágios

podem ser considerados os mesmos que uma criança com DV deve percorrer durante seu

desenvolvimento, o que significa que ambas irão passar e superar os mesmos quatro

estágios cognitivos, exceto quando houver deficiência cognitiva.

A diferença entre uma criança com e sem DV está na via sensorial pela qual os

estágios cognitivos serão vivenciados e superados, pois os objetivos a serem alcançados

ainda serão os mesmos. “O desenvolvimento intelectual do cego é semelhante ao dos

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videntes, o que difere é o caminho do desenvolvimento. Isso é por causa dos recursos

sensoriais diferentes que dispõem” (COLL et al, 1995, p. 196)

No primeiro estágio piagetiano, o sensório-motor, a criança até os 2 anos

desenvolve o controle motor e aprende sobre os objetos que a cercam. O bebê começa a

perceber como suas ações interferem com os objetos e o sentido da visão tem grande

participação no processo exploratório do mundo. A visão estimula o bebê a atingir os

objetos que estão dentro do seu alcance, engatinhando, depois buscando com as mãos e

também imitando os gestos dos familiares e de outras crianças mais velhas, como sentar,

andar, correr, bater, chutar, arremessar objetos, etc.

O bebê com DV deverá desenvolver essas mesmas percepções e habilidades

típicas de um bebê nessa fase, mas isso será feito por meio de uma estimulação externa

diferenciada. Esse estágio geralmente leva um tempo maior para ser vivenciado do que

leva para uma criança vidente.

Na fase seguinte, a pré-operacional, que vai dos 2 aos 7 anos, a criança

desenvolve a chamada Inteligência Simbólica. Resumidamente, se entende que ela irá

perceber e se relacionar com o mundo por meio de abstrações, dando vida aos objetos,

sendo egocêntrica, pedindo explicações sobre o mundo, entre outras manifestações afins.

Dessa forma, assim como na fase anterior, se a criança com DV não receber

estimulação adequada, pode levar mais tempo para vencer essa etapa ou mesmo pode

passar por ela sem superar de forma completa todos os desafios. Nesses casos, nos quais

houve pouca estimulação, pode haver um erro diagnóstico ao atribuir o “atraso” natural da

criança a uma deficiência cognitiva, já que criança não venceu os desafios comuns às

crianças videntes de sua idade.

De forma geral, as crianças com ou sem DV devem entrar em contato com os

desafios cognitivos próprios de cada fase, e serem estimuladas a vencê-los. Algumas

posturas de familiares de pessoas com DV podem criar justamente os problemas que eles

estão tentando evitar. Segundo Louro (2012, p. 39), atitudes familiares de negação da

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deficiência e superproteção podem dificultar que os desenvolvimentos cognitivos sejam

plenamente vivenciados e superados. Quanto mais as pessoas com deficiência ficam

expostas aos desafios da convivência social, e lhes é permitido resolver sozinhas suas

limitações pessoais, melhor será sua forma de se posicionar no mundo e se socializar.

Por exemplo, uma pessoa com DV pode andar sozinha pelas ruas, tomar

ônibus, fazer compras, com a ajuda de uma bengala e conhecendo previamente o trajeto

que deverá fazer. Isso é uma habilidade chamada de locomoção pelo meio inclusivo. Essa

mesma pessoa pode ler e escrever de forma autônoma, em papel, com uso do sistema

braille e aparelhos de escrita, tendo acesso a livros, jornais, podendo ter um diário pessoal

ou anotações de estudo. Essa pessoa também pode usar um computador e navegar na

internet como uma pessoa vidente, salvo restrições de modelos de sites que não são

acessíveis, assim como ler partituras musicais e escrevê-las. Isso sem falar de pessoas com

outras deficiências. Para tanto a ajuda especializada é essencial, fornecendo os

conhecimentos e treinamentos necessários para realizar essas ações.

Portanto, recebendo capacitação adequada, uma pessoa com DV pode se

incluir na sociedade o suficiente para ter uma vida social e profissional comum a muitas

pessoas, mas desde que entre em contato com suas limitações, se empenhando em vencer

seus próprios desafios.

Dessa forma, se um professor ou familiar impede ou evita constantemente que

a pessoa com DV entre em contato e sinta a sua real limitação, isso pode trazer mais

dificuldades para que ela aprenda e se relacione com o mundo de maneira eficiente e

independente. O desconhecimento das reais condições de aprendizagem da criança com

cegueira e a escassez de métodos especializados são problemas reais que devem ser vistos

com atenção. Consequentemente, a falta de capacitação e apoio aos professores e a

“dificuldade” de aprendizagem de alunos com DV é rapidamente atribuída a um atraso

cognitivo (CASTRO, 1996, p. 45), quando, na verdade, a pessoa com DV deveria ser alvo

de estímulos diferenciados por meio de métodos especializados, que lhe garantiriam o

tempo adequado para a assimilação.

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2.5.1 A construção do conhecimento

O construtivismo vê no aprendiz um papel ativo nesse processo, afirmando que

ele próprio é quem constrói o seu conhecimento. O foco do aprendizado sai do conteúdo

para o sujeito que aprende (BRANDOLI & NIEMANN, 2012, p. 5). Dessa forma, há uma

atenção especial às facilidades de aprendizado do aluno e também às suas dificuldades,

fazendo com que cada experiência de ensino ganhe características únicas.

Andrade (2010), citando Piaget, afirma que as múltiplas ações que um

indivíduo realiza podem ser apontadas se encontramos a unidade básica comum entre as

várias tarefas que envolvem determinado grupo de ações. Ele busca definir uma unidade

básica, chamando de “esquema ação”. Cada um desses esquemas “corresponde ao aspecto

organizativo de uma ação, a estrutura que permite que essa ação possa ser repetida e

aplicada com ligeiras modificações em situações distintas para conseguir objetivos

similares”.

Analogamente, podemos pensar que a leitura de partituras, seja em braille ou

não, é um “esquema ação”, constituída por grupos de ações. Cada ação pode ser

considerada como a habilidade de reconhecer a altura de notas, oitavas, valores de tempo,

unidades de tempo, notas, vozes simultâneas, acordes, armaduras de clave, cadências

harmônicas, etc. Sendo que essas pequenas ações devem ser assimiladas de modo que

sirvam para o aluno ler partituras nunca antes lidas, mas com características próximas o

suficiente de alguma outra partitura que o aluno já teve contato.

Segundo Piaget (apud ANDRADE, 2010, p. 132), “denominam esquema de

ação aquilo que em uma ação é transportável, generalizável ou diferençável de uma outra

ou, dito de outra maneira, o que é comum às diversas repetições ou aplicações da mesma

ação”.

Assim sendo, a instrução é, conforme Piaget, bem-vinda, desde que permita ao

indivíduo transcender os limites da informação recebida, avançando para um novo estágio

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do conhecimento onde só é possível quando há, por parte do receptor da instrução, uma

atitude de reconstrução, e não apenas de incorporação definitiva e inconteste do que lhe

fora exposto (ANDRADE, 2010). Segundo ZÓFILI (2002, p. 204):

Para professores construtivistas, é uma questão de equilíbrio: as estratégias e técnicas de ensino devem variar dentro de um amplo espectro, que vai de uma completa liberdade para permitir a livre expressão das concepções espontâneas trazidas pelos alunos até uma rigorosa disciplina que caracteriza o trabalho intelectual.

Nesse sentido, preparar aulas para pessoas com DV não quer dizer seguir um

manual, ou mesmo deixá-las aprendendo por sua própria conta num método empírico de

tentativa, acerto e erro. Não. O que se propõe é que o professor esteja preparado para ser

flexível de acordo com as dificuldades e interesses de seus alunos, sem perder de vista o

seu objetivo em aula. Cada aula deve estar alinhada com o planejamento geral do conteúdo

que será assimilado, mas o seu percurso é livre, e às vezes imprevisível. Essa perspectiva

geral da Musicografia Braille é o que pretendo demonstrar ao final desta pesquisa, quando

o sistema será classificado nas diversas etapas e nos conteúdos musicais pelos quais o

aluno com DV deve passar.

Segundo Hatano (apud FINO, 2004, p. 4), que aponta “características da

aquisição de conhecimento que corroboram e complementam a conciliação entre o

construtivismo [de Piaget] e a teoria histórico-cultural [de Vigostky]”. Apenas os pontos

mais significativos para esse trabalho constam abaixo, seguidos por comentários meus,

cujo intuito é direcioná-los para o ensino especializado da Musicografia Braille.

a) “O conhecimento é adquirido através de construção e não apenas por

transmissão”, havendo habilidades que só podem ser construídas de maneira empírica;

b) “Qualquer aquisição de conhecimento envolve reestruturação, de modo que

uma nova aquisição não resulta apenas em aumento do conhecimento, mas implica na

reorganização do conhecimento anterior”. Assim, quanto mais profunda é a mudança na

forma como se compreende o mundo, mais ampla e profunda é a assimilação do novo;

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c) “O processo de aquisição de conhecimento é condicionado, internamente,

pelo conhecimento já acumulado e, externamente, por artefactos culturais partilhados

(como a linguagem)”. Podemos pensar que a musicalidade do indivíduo é a condição

interna, tão importante quanto a compreensão teórica da música, que se torna a linguagem

comum entre os músicos;

d) um ou mais conhecimentos específicos podem ser usados para resolver

problemas nunca antes vistos, ao ser feito analogias ou abstrações. Musicalmente,

compreender trechos musicais novos está relacionado com o repertório musical prévio do

indivíduo, favorecendo aquele com maior número de informações conhecidas ou com as

informações mais semelhantes com a música a ser compreendida;

e) a aquisição de conhecimento não consiste apenas de “regras, leis, ou

fórmulas abstractas, sendo também composto de experiência pessoal” refletindo o modo

como foi adquirido e a maneira como tem sido utilizado. Quando o aprendiz se torna

especialista, o conhecimento se torna mais amplo, passando “a ser menos dependente de

laços contextuais e menos ligado às características superficiais”.

De modo geral, todas essas características na construção de conhecimento são

comuns a todas as pessoas. O que varia entre uma pessoa com ou sem DV são apenas as

vias sensoriais através das quais o conhecimento, ou as ações, são incorporados para

construir o “esquema ação” do indivíduo.

Portanto, a falta do sentido da visão faz com que os demais sentidos sejam

melhorados. Já foi demonstrado (COLL et al, 1995, p. 191) que o tato passa a ser o sentido

principal para assimilar as informações do ambiente, como texturas, temperaturas,

tamanhos, formas, etc. Em segundo lugar a comunicação verbal se revela fundamental para

a compreensão e relação com o mundo e a sociedade. O autor finaliza sobre o assunto

dizendo:

A linguagem (sem dúvida muito relacionada ao pensamento abstrato, mesmo na teoria piagetiana) cumpre um importante papel no desenvolvimento cognitivo das pessoas cegas. Possuir essa forma de

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pensamento, fato que permite pensar em termo de hipótese, transforma-se em uma poderosa ferramenta, capaz de remediar os problemas apresentados no acesso à representação figurativa, na ausência da visão. Assim, as pessoas cegas são capazes de resolver as tarefas clássicas deste tipo de pensamento, mas podem até mesmo vir a compreender, mediante hipótese, problemas para os quais não têm acesso perceptivo direto.

Vale ressaltar que a pessoa com DV adquire conhecimento a partir da interação

com outro indivíduo, que por sua vez lhe apresenta o significado das palavras, sons,

objetos, etc., assimilando-o por meio da linguagem e/ou da atribuição do tato. No caso da

grafia em braille, as informações táteis significam letras ou ideias musicais que uma outra

pessoa lhes ensinou, de forma que ao final do aprendizado o aprendiz compartilhará o

mesmo sistema de signos de outras pessoas, permitindo mais formas de comunicação e

entendimento.

2.6 A Audição

Normalmente se acredita que as pessoas com DV possuem uma audição

superior a das pessoas videntes, possuindo uma forte inclinação para a música. Veremos a

seguir alguns estudos sobre a audição de pessoas com e sem DV, de forma que possamos

tirar conclusões sobre o que de fato acontece com a sua capacidade de escuta em

comparação à de pessoas videntes, e se há relação com fatores ligados à música.

Há diversos estudos sobre a audição de pessoas com diferentes tipos de

cegueira. Bezerra (2011) fez amplo levantamento bibliográfico na pesquisa intitulada

“Avaliação da Percepção de Alturas em Adultos Cegos” e afirma que “os resultados de

pesquisas a respeito da ativação do córtex visual em pessoas cegas congênitas e de

cegueira adquirida são confusos e controversos”, ao testarem as habilidades auditivas e

táteis. Segundo o autor, tal posicionamento é baseado nos estudos de Kujala et al (2000),

Amedi et al (2005), Théoret, Merabet & Pascual-Leone (2004), Melzer et al (2001).

Bezerra (2011) aponta que a prática musical, sendo definida como treinamento

auditivo, é uma atividade que melhora a percepção de sinais acústicos complexos, ou seja,

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melhora a capacidade do indivíduo em obter informações através do sentido da audição

(SONCINI & COSTA, 2006).

Outro estudo levantado é de Oxenham et all (2003), que afirma que a simples

prática musical promove o desenvolvimento da percepção melódica e harmônica, a partir

do treinamento de intervalos e ritmos.

Assim, Bezerra (2011, p. 80) afirma que o domínio de habilidades musicais

poderia facilitar a execução de tarefas auditivas complexas no cotidiano das pessoas com

DV. Em outras palavras, quando a pessoa com DV possui habilidade musical

desenvolvida, ela possui maior capacidade de extrair informações dos detalhes de sons e

vozes. A mesma informação está sempre disponível para todos os ouvidos, no entanto,

para os ouvidos treinados e atentos, variações no timbre, reverberação, eco e harmônicos

são percebidas e se tornam informações significativas sobre o mundo exterior.

Desse modo, a pessoa com DV pode possuir um melhor aproveitamento do

sentido da audição, porque ela precisou usar mais esse sentido do que uma pessoa vidente

precisou para superar os desafios cognitivos do desenvolvimento “piagetiano”, desafios

comuns a todas as pessoas.

Por isso, julga-se que os indivíduos cegos desenvolvem habilidades superiores

no uso de seus sentidos remanescentes, a fim de compensar a perda da visão (AMEDI et

all., 2005). No entanto, alguns estudos têm encontrado resultados que limitam o número de

vantagens auditivas do cego frente aos videntes, conforme Fisher (1964), Starlinger, &

Niemeyer (1981), Weaver & Stevens (2006), Yates, Johnson, & Starz (1972) 17.

Nesse sentido, podemos compreender que a aptidão natural para a música das

pessoas com DV é um mito. “A observação de que muitos cegos atingem níveis muito

elevados no aspecto da proficiência musical levou à impressão popular de que a cegueira

pode ser associada com habilidades perceptuais auditivas especiais” (HAMILTON,

17 Esses autores são citados por Bezerra (2011, p. 81).

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PASCUAL-LEONE, & SCHLAUG, 2004). O aluno com DV precisará vencer todos os

desafios cognitivos musicais comuns a todos os músicos, com ou sem metodologia

especializada, culminando em uma habilidade de excelência construída por vias sensoriais

e de entendimento, diferente do caminho seguido pelas pessoas videntes.

Voltando a Bezzera (2010), sua pesquisa sugere que a cegueira congênita (de

nascença) não causa alteração da percepção de notas musicais de adultos cegos quando

comparados a adultos com visão normal.

A autora indica estudos que comprovam a ocorrência de plasticidade neural

em pessoas com DV, quando têm o funcionamento dos seus cérebros comparados aos de

pessoas videntes, porém refere que isso não significou alterações diretas de suas

habilidades musicais.

Portanto, afirmações como de Vygostky em “The Fundamental Problemas of

Defectology”, de 1929, que influenciou muito a educação inclusiva no séc. XX, ganham

outra perspectiva. Ele afirma que quando há “falta de um órgão, o próprio corpo encarrega-

se de substituí-lo, desenvolvendo outro mais consolidadamente. No caso dos olhos, as

pessoas cegas acabam por ter a audição e o tato mais desenvolvidos” (apud Santos, 2010).

Sob a ótica das recentes pesquisa acima citadas, a forma como entendemos “ter a audição

mais desenvolvida” ganha outra dimensão, menos cartesiana, que não necessariamente se

relaciona com um ganho audiométrico propriamente dito.

“Todas as teorias contemporâneas sobre o desenvolvimento psicológico ressaltam que é através da ação sobre o ambiente e da comunicação social que esse [estudante com DV] alcança o domínio das habilidades mentais que possibilitam o conhecimento da realidade. Não é, pois, de se estranhar que o desenvolvimento dessas habilidades tenha que se ajustar às possibilidades de representação e ação que os canais sensoriais permitem. Isso faz com que o desenvolvimento cognitivo do cego siga um caminho que não tem porque ser coincidente com o dos videntes” (COLL et al, 1995, p. 184).

Uma pessoa com DV pode conhecer uma realidade, um objeto ou uma

abstração (como uma partitura) com o mesmo domínio que uma pessoa vidente. Mas para

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isso ela precisa ter uma postura ativa e trocar informações sobre as impressões de outras

pessoas, videntes ou não, por meio da comunicação. Quanto maior for a diversidade de

dados sobre um conhecimento, melhor será o seu domínio e a capacidade de lidar com as

suas variáveis.

Conclui-se que a forma como uma pessoa com DV compreende o que é uma

coisa, seja uma cadeira, um carro, uma nuvem ou uma emoção, possui bases cognitivas

diferentes das de uma pessoa vidente. No entanto, considerando que a construção do

conhecimento a respeito desse objeto tenha sido bem fundamentada, essa pessoa será capaz

de se relacionar com esse objeto de forma natural e simples como qualquer outra pessoa

que também tenha tido um processo bem fundamentado.

“A gente naturalmente, por não enxergar, acaba sendo mais atento ao som. Não é nada assim de [...] tem gente que pensa assim: o cego tem o dom natural pra música. Não tem nada disso. É na verdade natural que a gente, não enxergando, a gente precisa do som, né. Então a gente está sempre mais atenta aos sons do ambiente. E isso facilita a nossa concentração, assim, pra estudar música” (OLIVEIRA, 2013, p. 53).

Esse trecho faz parte de uma entrevista feita por Oliveira (2013) em seu

trabalho a respeito da importância da música na vida das pessoas com DV e das

problemáticas enfrentadas quanto ao acesso à aprendizagem musical, seja atuando tratando

a música como atividade de lazer ou profissionalmente.

Oliveira (op. cit., p. 62) conclui que o amparo da família e/ou rede social são

fundamentais para que a pessoa com DV tenha uma identidade sonora bem-estruturada,

além de um ambiente rico culturalmente. O ensino formal de música, desde a infância, irá

lhe proporcionar maior desenvolvimento global e musical, trazendo “um leque de

oportunidades e campo de atuação profissional mais amplo: instrumentista, compositor,

pesquisador, professor de música”. Além disso, fatores socioeconômicos e a constelação

familiar do indivíduo também influenciam no seu desenvolvimento, pois atuam

diretamente sobre o tipo e qualidade de ajuda que recebem, já que pela via pública essa

ajuda é ainda é muito precária educacionalmente.

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CAPÍTULO 3 - DESAFIOS NO ACESSO DE PESSOAS COM

DEFICIÊNCIA VISUAL AO CONHECIMENTO MUSICAL

A seguir serão apresentados estudos que corroboram que a falta de

conhecimento especializado no campo do ensino da Musicografia Braille afeta diretamente

a inclusão, resultando em condições desiguais no acesso ao conhecimento entre pessoas

com e sem DV.

Neste capítulo observaremos as oportunidades de estudos musicais disponíveis

para as pessoas com DV que se interessam em entrar em cursos de graduação em música,

assim como relatos de experiência com relação a essa questão. Veremos algumas

iniciativas de aulas de música inclusivas em universidades, pessoas com DV que cursaram

a universidade, a transcrição de uma prova de aptidão musical para o braille e a preparação

dos alunos para essa prova.

Assim poderemos ter uma visão geral das condições atuais que uma pessoa

com DV tem para estudar teoria musical e se preparar para fazer uma prova de vestibular

para música.

3.1 A inclusão da pessoa com deficiência visual em cursos de música

Para entrar em um curso de graduação em música é necessário passar por uma

prova de aptidão musical, além da prova de vestibular comum para todos os cursos. O

objetivo dessa prova musical, segundo as normas do vestibular da UNICAMP para 2015, é

“avaliar a aptidão e o potencial dos candidatos para o curso superior em que pretendem

ingressar”18.

18 Conforme Artigo 1º, III, em Normas do Vestibular - Vestibular 2015. Acessado dia 20/07/2014: https://www.comvest.unicamp.br/vest2015/manual/normas.html

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Tal aptidão e conhecimentos teóricos musicais podem ser incorporados por

alunos videntes frequentando escolas de música ou fazendo aulas particulares, pois são

relativamente simples para um professor de música ensinar. De acordo com a dedicação

nos estudos e a vivência musical do aluno é possível ter um bom resultado em uma prova

de aptidão em música. Ou seja, o acesso do aluno vidente a esse conhecimento de forma

didática é facilitado por professores e métodos musicais.

Conforme já foi citado no capítulo anterior, tais métodos não foram formulados

para atender leitores de partituras em braille. Além disso, os professores de música

normalmente não conhecem a Musicografia Braille o suficiente para ensiná-la.

Segundo Bonilha (2010, p. 36), “uma vez que os educadores musicais

desconhecem os mecanismos da leitura braille, eles não são aptos para desenvolverem as

habilidades necessárias para a aquisição de fluência no uso da musicografia”. Essas

habilidades são diferentes das habilidades dos leitores de partituras em tinta, simplesmente

porque são duas grafias distintas. Na partitura em tinta, o evento musical é escrito em duas

dimensões, horizontal e vertical, se assemelhando a um gráfico de linha. Na partitura em

Braille, o evento musical é descrito de forma linear, como se fosse uma narrativa onde há

regras para posicionar cada informação.

Portanto, os educadores musicais não podem desenvolver as habilidades

musicais necessárias em seus alunos com DV se desconhecem quais habilidades são

necessárias. Podemos até considerar que o músico vidente não possui as habilidades

necessárias que o músico cego precisa desenvolver, pelo simples fato de serem versados

em outra grafia.

A maioria deles [educadores musicais] possui formação para lecionar aos alunos que aprendem a ler em tinta, e por isso a metodologia de trabalho por eles adotada se baseia nas especificidades desse código. Os livros didático-musicais são também estruturados de acordo com as características peculiares da escrita musical utilizada por quem vê (BONILHA, 2010, p. 17).

Por isso se torna comum a recusa de alunos com DV pelas escolas, e quando os

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aceitam, os professores tendem a confeccionar partituras convencionais em alto-relevo.

Embora haja relatos de professores que se empenharam nessa inclusão, como de Silva &

Araldi (2009), Ota & Vanazzi de Souza (2011), a escassez de estudos ainda é uma barreira

que dificulta que esse campo se desenvolva e se consolide.

Essa falta de estudos pode ser considerada natural, já que o ensino da

Musicografia Braille é ainda um campo muito novo. O material que temos à disposição é

fruto da experiência pessoal de um ou mais professores, e que geralmente não tiveram

nenhuma referência anterior. Contudo, a escrita braille já é adotada mundialmente, e até

hoje tem se mostrado a melhor forma de proporcionar independência musical para as

pessoas cegas; até hoje nenhuma forma de escrita para cegos se mostrou realmente

vantajosa, se comparada ao braille.

Nesse cenário, a pessoa com DV que pretende fazer essa mesma prova de

vestibular se depara com dificuldades relacionadas à falta de métodos especializados e

professores capacitados nesse ensino especial.

3.1.1 Direitos e realidade na inclusão

De forma geral, observando o histórico de alunos em diversos cursos de

universidades, encontramos um “crescente número de alunos deficientes no ensino

superior” (CAIADO, 2003, p. 30). Atualmente temos casos de pessoas cegas que cursaram

ou ainda cursam a graduação, mestrado, doutorado e pós-doutorado em música nas

universidades públicas brasileiras. Mesmo com a falta de professores especializados nesse

campo, esses músicos conseguiram superar problemas de inclusão, cada qual de uma

maneira particular. A maioria conseguiu com a ajuda inestimável de parentes, amigos e

alguns professores; em outras palavras, com ajuda de gente não especializada, mas que os

auxiliaram no processo de obter os conhecimentos necessários e receber suas titulações

acadêmicas. Como exemplos dessa inclusão em universidades, citaremos alguns casos.

A Universidade Federal do Rio Grande do Norte previa para o primeiro

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semestre de 2009 a “criação da primeira turma de Musicografia Braille na Escola de

Música” dessa universidade (OLIVEIRA, 2008, p.4) após o ingresso de um aluno com

DV, em 2010. A Universidade Estadual de Campinas aprovou o doutorado da

pesquisadora, pessoa com cegueira congênita, Fabiana Bonilha, que por sinal também

cursou, nessa mesma universidade, a graduação e o mestrado em piano erudito.

Em 2011, o Phd. em Ethnomusicology pela University of Washington-USA,

Prof. Dr. Vilson Zattera, ingressou no pós-doutorado na Unicamp na área de acessibilidade

computacional para pessoas com DV e Musicografia Braille. Desde então desenvolve um

trabalho sobre educação para pessoas com DV, e iniciou um grupo de pesquisa em

Musicografia Braille, do qual eu venho participando.

Na Universidade Estadual de Maringá, em 2010, pude desenvolver aulas

preparatórias para pessoas com DV prestarem a prova de aptidão de música em braille. O

aprendizado foi satisfatório dentro da relação conteúdo e tempo disponível, mas não foi o

suficiente para a aprovação dos alunos. Constatei que seria necessária maior frequência e

acréscimo no tempo de aula, além de metodologia mais alinhada com as particularidades

da Musicografia Braille. Essa última necessidade vem ao encontro com os objetivos da

presente pesquisa.

No âmbito das leis, sendo as pessoas com DV cidadãos, e com direitos à

educação, o Poder Público tem o dever de atender à demanda existente de alunos cegos e

de se preparar de acordo com a crescente demanda19 (COLOMBO, 2004, p. 44). Mas esse

não é o ambiente que encontramos no ensino público, pois é comum casos de escolas que

rejeitam a matrícula de alunos com alguma deficiência e os encaminham para outra

instituição. Questões de escassez de verbas, poucos especialistas atualizados e disponíveis

e o desconhecimento das necessidades reais dessa parcela da população contribuem para

que esse direito não seja garantido.

19 “A Lei de Diretrizes e Bases (LDB) obriga o poder público a ampliar o atendimento aos alunos com necessidades especiais na rede pública regular de ensino” (art. 60, parágrafo único).

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A emenda número 12 de 1978 da Constituição Brasileira cita pela primeira vez

a educação especial, onde diz que: “é assegurado aos deficientes a melhoria de sua

condição social e econômica, especialmente mediante educação especial e gratuita”

(CAIADO, 2003, p. 99).

Certamente a educação especial, e principalmente a gratuita, são realidade

distantes no Brasil, não havendo nenhuma garantia dessa implementação. Ao menos as

conquistas por leis têm sido ampliadas, assim como tem sido chamada a atenção para sua

importância e urgência. Segundo CAIADO (2003, p. 31) “na legislação atual, a pessoa

deficiente ganhou o status de cidadã. Hoje, olha-se para ela como alguém com direitos e

capacidades”. O que ainda está longe de acontecer é a sociedade atingir o patamar da real

efetivação desses direitos.

Ao mesmo tempo, as pessoas com DV precisam de muita dedicação,

perseverança e ajuda para conseguir ingressar e se formar nas universidades brasileiras de

música. Mesmo com tantos empecilhos, as experiências demonstram que isso é possível;

no entanto, almeja-se que isso possa vir a acontecer em condições de maior igualdade em

relação ao que acontece com as pessoas videntes.

3.2 Inserindo a Musicografia Braille na formação de professores de música

As universidades são polos que formam profissionais de diversas áreas, entre

os quais estão os músicos com habilitação em licenciatura. Nesses cursos, o conteúdo

relativo à inclusão geralmente é superficial ou não é abordado, proporcionando pouco ou

nenhum contato e informações sobre o tema para seus alunos (cf. BRUNO, 2007 e SILVA,

2009). Geralmente, os professores universitários desconhecem até mesmo a existência da

Musicografia Braille. Se a grafia em braille e questões relativas ao ensino musical

inclusivo fossem contempladas na grade curricular desses futuros professores de música,

eles seriam capazes de dar aulas para pessoas com DV com certa autonomia, mesmo sem

terem à disposição um material didático especializado e sem precisarem se tornar

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especialistas. Além disso, essa ação iria incentivar a pesquisa nesse campo dentro da

própria universidade, beneficiando diretamente a inclusão em aulas de música.

Essa questão é mais ampla se considerarmos a arte não apenas como uma

terapia ocupacional para as pessoas com DV, mas sim como uma habilidade possível de

ser desenvolvida a nível profissional.

As pesquisas acadêmicas nesse campo podem contribuir para gerar:

a) materiais didático-musicais especializados;

b) estudos teóricos aprofundados;

c) capacitação de professores;

d) observações críticas de experiências de ensino;

e) transcrição de partituras em braille;

f) promoção de ações inclusivas na sociedade.

Com os resultados de algumas dessas ações poderíamos até mesmo imaginar

que o campo do ensino musical convencional poderia se beneficiar ao incluir ou enfatizar

algumas habilidades musicais próprias de músicos com DV. Algumas dessas habilidades

serão delineadas ao final dessa pesquisa.

Com essas ações seria favorecida uma parcela de cidadãos que também têm

direito a acessar os bens culturais e intelectuais desenvolvidos nas universidades, fato que

está longe da nossa realidade, conforme apresentado anteriormente. Quanto à formação de

professores, Caiado (2003, p.30) aponta “a necessidade da formação de pessoal

especializado em educação especial, em níveis de graduação e pós-graduação. Tarefa

especialmente indicada às universidades públicas”.

Mesmo as universidades não estando preparadas para a inclusão de alunos com

DV em um curso de música ou aulas de extensão, há certa mobilização para recebê-los. No

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entanto, essa mobilização só acontece a partir do momento em que um aluno especial é

recebido entre suas fileiras, e não antes disso. Um caso que exemplifica essa situação é

encontrado em Simão et all (2009), onde um grupo de estudos da Universidade Estadual de

Maringá ofereceu aulas para pessoas com DV, desenvolvendo vivenciais musicais para

trabalhar a percepção, notação musical, leitura e escrita de partituras convencionas

ampliadas e da Musicografia Braille. A ação perdurou até 2011, sofrendo alterações

positivas a cada ano, findando por falta de pessoas interessadas nesse campo (cf . OTA e

VANAZZI DE SOUZA, 2012). Devido às características da educação especial, “é

necessário que haja oferta permanente de serviços de apoio especializado na escola regular

para que esse alunado possa se incluir na escola” (CAIADO, 2003, p. 23).

O ideal seria a universidade pública estar preparada para receber um aluno com

qualquer tipo de deficiência. No caso da música, acredito que para incluir satisfatoriamente

um aluno cego entre seus alunos em um curso de música, a universidade deveria oferecer

disciplinas exclusivas a ele, elaboradas de acordo com a Musicografia Braille e ministradas

por especialistas. Tais disciplinas extras, naturalmente, teriam um conteúdo dispensável

para os alunos videntes.

3.2.1 Formação musical dos alunos de música

A respeito da situação hipotética apresentada acima, podemos pensar que: se o

aluno vidente teve que estudar para entrar nesses cursos, por que com o aluno com DV

seria diferente? Ele irá estudar a leitura de partituras em braille durante o curso?

Responderemos a essas perguntas a seguir.

A diferença principal está no acesso à informação que os alunos com ou sem

DV têm, devido a falta de conhecimento do braille por parte de professores de música.

Assim sendo, a habilidade de ler partituras não pode ser exigida da mesma forma que se

faz com alunos videntes. A prova de aptidão deveria selecionar os alunos com DV que

demonstraram potencial musical para apreender os princípios avançados da música em

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braille.

Isso não quer dizer que deveríamos pensar em uma prova totalmente

diferenciada para os alunos com DV. Embora pareça inviável, essa prova deveria ser

concebida após a verificação das oportunidades oferecidas para o aprendizado da

Musicografia Braille na sua cidade ou região, e o que se pretende de fato que o aluno tenha

assimilado após a conclusão do curso.

Contudo, muitas outras questões podem ser levantadas, mas nenhuma será bem

respondida e compreendida pelo leitor se não se verificar mais a fundo sobre o que

estamos falando: as partituras em braille. Essa tarefa será realizada nos capítulos que

seguem, quando serão analisadas e comparadas suas características com as das partituras

em tinta.

Ainda no nível da inclusão em sala de aula, essas adaptações de currículo são

coerentes, porque a educação musical tradicional é alicerçada em cognições relacionadas

às partituras convencionais, ou seja, em princípios visuais. “Os educadores musicais

tentam aplicar aos alunos cegos as mesmas estratégias de trabalho utilizadas com alunos

dotados de visão e, ao fazerem isso, constatam que algumas dessas práticas se mostram

ineficientes” (BONILHA, 2010, p. 17). Assim sendo, os desafios enfrentados pelos

aprendizes da notação musical em braille seriam contemplados em um curso de música.

Deve-se ressaltar que o ensino de música para deficientes visuais só se difere do ensino para demais pessoas, no que diz respeito ao método de leitura e escrita utilizado. Desse modo, para que o aluno com deficiência tenha acesso aos mesmos conhecimentos musicais disponíveis aos outros alunos, faz-se necessário que eles contem com um atendimento educacional especializado (BONILHA, 2006, p. 20).

Portanto, é necessária a criação de métodos de ensino musical que abordem os

conceitos musicais da Musicografia Braille, tornando possível um curso formar um músico

com DV com a mesma qualidade e autonomia com que forma um músico com visão

normal.

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3.2.2 Incluindo o aluno com DV em um curso para pessoas videntes

Quando numa universidade não for possível a inclusão imediata do aluno com

DV na mesma sala com alunos videntes, devido ao conteúdo de determinada disciplina, se

faz necessário atendimento especializado para preparar o aluno com DV ao contexto da

aula ou fornecer um acompanhamento paralelo às aulas.

Muitas das disciplinas de um curso de graduação em música podem ser

acompanhadas por alunos com DV se o material usado pelo professor for disponibilizado

com antecedência para impressão em braille, seja ele um texto ou uma partitura. No caso

de partitura, o seu estudo deve ser feito em casa, previamente, e não no momento da aula.

Geralmente as pessoas com DV que estudam música escrevem seus exercícios

em braille e depois narram o que está escrito para o professor poder corrigi-los. Uma boa

solução é um colega vidente transcrever na partitura convencional a leitura do texto em

braille lido pelo aluno com DV, pois isso permite ao professor corrigir o exercício a partir

da escrita convencional.

Seria conveniente que o professor conhecesse a leitura em braille, para que

assim pudesse ter contato direto com o que o aluno escreveu em pontos e corrigir seus

exercícios sem intermediações, como faz com os exercícios de alunos videntes. Além de

poder ajudá-lo a aprimorar sua escrita musical, o professor poderia, ao dialogar entre as

duas grafias, enriquecer o processo de aprendizagem do aluno. Casos assim são muito

raros; uma alternativa satisfatória seria a presença de um transcritor para acompanhar esse

aluno, intermediando aluno e professor. COLOMBO (2004, p. 44) afirma que “quando

necessário, as escolas deverão contar com serviços de apoio especializados, para atender os

alunos da educação especial”.

Contar com o serviço de estudantes bolsistas pode ser uma boa alternativa para

suprir essa demanda no atendimento inclusivo, seja na transcrição de partituras ou

acompanhamento do aluno com DV em disciplinas específicas.

Existe o software Musibraille, criado pela UFRJ, que permite ao músico

escrever uma linha melódica com as celas braille no computador, enquanto a partitura é

transcrita, simultaneamente, para a forma convencional. Certamente facilitaria muito o

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trabalho de um professor ter disponível esse software instalado num computador portátil

em sala de aula.

No entanto, algumas formas avançadas de escritas em braille, como intervalos,

vozes paralelas e pauta simultâneas ainda não são compreendidos pelo programa20 quando

mostra seu correspondente na escrita convencional ou quando executa o áudio do trecho. A

versão atual desse programa se mostra muito útil para o uso de alunos iniciantes,

escrevendo apenas uma voz. Contudo, tal programa ainda está sendo aperfeiçoado nos

pontos citados acima e também na interface “MusicXml”, que é um formato de arquivo

comum entre todos os softwares de edição de partituras convencionais.

Independentemente do software usado, problemas na impressão dos arquivos

em braille são muito comuns quando se imprimem partituras, e alguma celas braille podem

aparecer trocadas ou em branco. É importante considerar que isso pode ser um impecilho,

já que é muitas vezes inviável a solução de questões de informáticas por pessoas não

especializadas. Assim, muitas vezes é preferível escrever a partitura em programas de

texto, conferindo depois se tudo foi impresso corretamente, já que dessa maneira haverá

menos erros na transcrição dos caracteres. Quando há pouca coisa a ser escrita, ou para fins

de agilização do processo, muitos professores optam por escrever diretamente no papel

usando uma máquina Perkins.

3.3 A transcrição de uma prova de aptidão musical para o sistema braille

Como algumas universidades têm lidado com a questão da inclusão quando um

aluno com DV busca entrar em seus cursos de música? Quais as questões e problemas que

emergem nessas situações?

Em 2009, tive a oportunidade de transcrever pela primeira vez a prova do

vestibular de música para o braille da UEM (Universidade Estadual de Maringá).

20 Sinais braille para intervalos (erro apenas na escrita convencional e na execução MIDI), em acorde total e parcial, nota móvel, pautas simultâneas escritas em linhas diferentes, são exemplos a que me refiro.

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A UEM teve entre seus inscritos de 2009 um aluno com DV para a prova de

aptidão musical. Nenhum dos professores esperava essa inscrição, que surpreendeu a

todos. A primeira alternativa pensada pela comissão de vestibular e pelos professores do

curso de música foi realizar a prova de forma oral. Uma pessoa vidente iria ler a prova e

escrever as respostas do aluno na prova, em tinta.

Foi discutido se tal método seria de fato justo, e se não haveria outras formas

de realizar essa avaliação. A Musicografia Braille foi indicada por uma professora, que

resolveu entrar em contato com um especialista dessa área. Tirada algumas dúvidas e

confirmado que o aluno inscrito conhecia a Musicografia Braille, optaram pela transcrição

integral da prova, que seria aplicada pelo próprio transcritor da prova para a escrita braille.

A transcrição automática de partituras em tinta para o braille, de forma

computadorizada, atualmente é bastante complexa para ser realizada de modo integral e

fiel, como já foi dito anteriormente. Há decisões que precisam ser tomadas no que tange à

formatação e à forma de abordagem dos conteúdos, algo que apenas um especialista

poderia executar. Por exemplo, questões que envolvem a leitura de pentagramas na prova

original, precisam ser repensadas para a transcrição, visto que não há pentagramas em

braille. Essas e outras particularidades poderão ser melhor observadas nos próximos

capítulos.

Portanto, uma questão da prova que envolva o conhecimento de diferentes

claves é prejudicada, podendo haver um nível de dificuldade inferior ao cobrado na prova

em tinta. Por esse motivo, nos anos seguintes, os elaboradores da prova de música

retiraram esse tipo de questão ao saberem com antecedência que a prova seria novamente

transcrita para o braille. Essa adaptação não prejudicou em nada a qualidade da prova,

apenas tornou-a um pouco mais inclusiva.

Em contrapartida, outros exercícios, que são simples quando feitos em tinta,

tornam-se complexos quando transcritos para o braille. Alguns deles até poderiam ser

considerados avançados devido à maneira como são apresentados ou pela resposta que se

espera do aluno, mas de um modo geral, todas as questões que fazem uso de duas pautas

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simultâneas, vozes paralelas e sinais de dinâmica, se tornam avançadas em braille.

Uma questão que utiliza acordes abertos escritos em duas pautas (sistema de

piano), torna os acordes muito mais complexos para serem classificados do que quando

escrito em tinta. Isso porque “as partes [pautas diferentes] são lidas em diferentes

momentos, cabendo ao músico realizar, mentalmente, a junção entre elas” (BONILHA,

2010, p. 48). Isso exige do leitor noções teóricas complexas, que veremos no capítulo 5.

No entanto, as questões que utilizam as pautas simultâneas não foram alteradas

pelos elaboradores da prova, como ocorreu no caso das claves, pois desconheciam essa

particularidade da escrita em braille. Caso fizessem, seria necessária uma alteração

cuidadosa de todo o conteúdo da prova, demandando um tempo maior para a elaboração da

prova. Isso fez com que o entendimento de determinadas questões em braille tivessem um

grau de dificuldade maior do que sua original na escrita musical convencional.

Houve casos em que o enunciado sofreu alterações em benefício do

entendimento e coerência com a grafia braille. Todas as alterações foram feitas com o

consentimento dos elaboradores da prova, constantemente consultados durante a

transcrição.

A título de informação, na prova de instrumento o aluno obteve nota máxima,

pois o candidato teve sua musicalidade muito bem desenvolvida por causa da vida prática

com a música. Contudo, a nota da prova teórica não foi suficiente para sua aprovação,

visto que seus conhecimentos em Musicografia Braille eram rudimentares.

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3.3.1 A prova escrita em braille

Por fim, as questões da prova em braille foram apresentadas em um caderno

em que cada questão ocupava sozinha uma página, buscando assim facilitar o manuseio da

prova pelo aluno. A prova foi escrita diretamente no software Braille Fácil21 e impresso

por impressoras braille22. As respostas eram escritas pelo aluno em uma segunda folha,

utilizando uma máquina Perkins, sendo também uma folha individual para cada questão.

Para a prova de leitura, foram preparadas inicialmente quatro frases para o

solfejo em braille, e o aluno sorteou apenas uma delas para ser lida e solfejada. Nesse

momento ficou evidente que a habilidade de solfejar em braille exige mais conhecimento

musical do aluno do que quando solfejado em tinta. “Ler uma partitura em braille não

significa apenas decodificar um conjunto de símbolos e executar a peça lida ao

instrumento, mas pressupõe compreendê-la em profundidade, sob o ponto de vista estético

e musical” (BONILHA, 2010, p. 14). A rapidez e qualidade da leitura musical variam de

acordo com a profundidade dos conhecimentos musicais e a maturidade do aluno como

músico prático e teórico. Tal cobrança em uma prova, envolvendo dificuldades avançadas

de leitura, parecia desproporcional com relação aos seus concorrentes videntes. Os

examinadores sentiram a dificuldade do aluno mesmo com o tempo extra para ler e decorar

seu solfejo, direito assegurado por lei.

Para solfejar, o aluno com DV precisa ter dominado os seguintes pontos: a

escrita em paralelo à leitura; a ordem dos sinais musicais em braille; o reconhecimento de

padrões rítmicos e a conciliação do código com a teoria musical. Esses são quatro dos sete

desafios enfrentados no aprendizado da Musicografia Braille, apontados por Bonilha

(2010, p. 45), que serão os fundamentos teóricos dos próximos capítulos. Grande

desembaraço musical não é exigido como é dos candidatos videntes. Uma forma justa de

aplicar essa prova seria avaliar separadamente a capacidade do aluno em lidar com cada 21 Software gratuito lançado pelo Núcleo de Computação Eletrônica da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

22 Impressora que imprime em relevo, no papel, as celas braille.

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um dos desafios do aprendizado em braille.

Deveria haver um controle sobre o que estaria sendo cobrado do leitor em

braille ao utilizar cada formato de partitura ou regra de escrita. Vale afirmar que o simples

ato de ler e escrever em Braille indica que provavelmente essa pessoa com DV seja um

músico maduro, e que teve acesso a uma formação sólida e consistente (BONILHA, 2010,

p. 16).

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CAPÍTULO 4 - ANÁLISES DE PARTITURAS EM BRAILLE

A partir dos diferentes desafios de aprendizagem que os alunos com DV

encontram para assimilar a Musicografia Braille, apontados por Bonilha (2010, p. 45 et

seq.), classificarei as partituras em braille em cinco graus de dificuldade. Cada um desses

graus, exceto o quinto, serão analisados conforme a Teoria Sistêmica usada por Sloboda

(2008) para observar os procedimentos mentais de um músico. O quinto grau será

observado por meio de comparações com as partituras convencionais.

Dessa forma procuramos saber quais os conhecimentos que determinada

partitura musical escrita em braille exige para que o leitor possa compreendê-la. Isso deve

permitir que o professor de música avalie o quanto seu aluno superou cada desafio da

aprendizagem musical em braille, permitindo a ele remodelar seu planejamento de aulas de

acordo com o desenvolvimento do aluno.

4.1 Os desafios de aprendizagem

Daldegan (2005, p. 140) traça um interessante paralelo entre a aprendizagem

musical e a teoria cognitiva desenvolvida por Piaget, segundo a qual:

[...] a criança primeiro aprende conceitos e depois adquire palavras para nomear tais conceitos. As ideias mais simples são então expressas antes das mais complexas mesmo que sejam gramaticalmente mais complicadas.

Analogamente, a estruturação da metodologia em sala de aula pode ser

orientada para assimilar conceitos musicais mais simples, seguidos dos mais complexos,

independentemente se sua grafia em braille é mais ou menos complexa, já que o “nomear”,

ou o grafar, seriam tarefas posteriores à compreensão do respectivo conceito musical. Por

esse motivo apresentaremos os Conteúdos Complementares no capítulo 5, que devem ser

lecionados de acordo com os objetivos musicais do aluno, e da pretensão do curso ou

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professor na formação do seu aluno, desde as primeiras aulas.

Neste ponto, é importante afirmar que “todas as informações de uma partitura

em tinta são perfeitamente transcritas em Braille, contudo, o que é vertical dentro de um

mesmo pentagrama em tinta é inteiramente representado de forma horizontal quando em

Braille” (VANAZZI DE SOUZA, 2010a). Na escrita braille, todas as informações

aparecem em uma ordem definida, como se fosse um ditado minucioso e organizado do

trecho musical.

Tendo em vista essa particularidade, encontramos no trabalho de Sloboda

(2008) algumas possibilidades para análises das partituras em braille. O autor afirma que a

aprendizagem musical pode ser analisada em etapas, nas quais se adquire, de forma

sequencial, novas habilidades e estruturas cognitivas.

Bonilha (2010, p. 52 et seq.) apresenta um delineamento do aprendizado da

Musicografia Braille em sete tópicos, baseados nos principais desafios desse aprendizado

especializado, que são:

a) “Apreensão de notas musicas”. Compreender as notas musicais e suas

relações de altura, sem apresentar a informação do valor de tempo (fazendo uso apenas das

celas de colcheia);

b) “Assimilação de padrões rítmicos”. Reconhecer os diferentes valores de

tempo e, em seguida, os agrupamentos rítmicos. Num primeiro momento fazer o

reconhecimento de forma isolada, depois dentro das fórmulas de compasso.

c) “Assimilação dos sinais de oitava”. Compreender os sinais de oitava e a

Regra de Uso das Oitavas. Caso o aluno não saiba contar os intervalos entre as notas, é

necessário estudar isso primeiramente nessa etapa.

d) “Representação da armadura de clave”. Conhecer a formação das

tonalidades, sustenidos e bemóis, trabalhando com escalas de diferentes tons.

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e) “Leitura de acordes”. Compreensão dos sinais de intervalo para formar

tríades, tétrades e suas inversões.

f) “Leitura de obras/trechos polifônicos”. Familiarização e entendimento com a

leitura polifônica, fazendo uso da regra do “em acorde” total e parcial.

g) “Representação de sinais acessórios”. “Dentre esses sinais, se destacam:

nuances, ligaduras, dedilhados, dinâmica, ornamentação. Há também que se destacar

variadas formas de abreviações comumente utilizadas em braille, incluindo: repetições

parciais, abreviação de sequencias, duplicação de símbolos” (ibid., 58).

Note que esses desafios são atribuídos para o leitor de uma partitura em braille

completa, que é usada para instrumentos como piano e violão. Partituras para instrumentos

melódicos dispensam o uso da leitura de vozes paralelas e acordes (itens “d” e “e” ).

Partituras para percussão dispensam também alguns desses itens, além de outros, como o

ítem “a”, mas isso varia a depender do instrumento e da complexidade da escrita.

Considerando esses tópicos, podemos inferir a dificuldade de um trecho

musical de acordo com o número de desafios de aprendizagem exigidos do seu leitor. Um

trecho musical escrito para alunos iniciantes deve abranger um ou mais dos tópicos

expostos anteriormente. Se um trecho determina o entendimento de muitos desses tópicos,

certamente podemos considerá-lo como um trecho mais difícil, o que pode nos permitir

classificar a dificuldade de um trecho musical em braille de acordo com a sua abrangência

dentro desse quadro.

Podemos, por exemplo, considerar que a partitura em braille mais simples

possível é escrita apenas em colcheias, que ainda permite ser apresentada para o aluno

iniciante sem atribuição do valor da nota, sendo essa a etapa 1 do aprendizado sugerido. O

estudo dos valores de tempo, incluindo o reconhecimento de grupos rítmicos, pertence à

etapa 2. A etapa 3 segue com o conceitos das oitavas. O nível de dificuldade da etapa 3 já

possibilita escrever melodias para instrumentos melódicos, pois não necessitam de acordes

ou polifonias, etc. As etapas podem ser cumulativas em alguns casos.

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Baseado nesses tópicos, proponho um quadro que classifica as partituras em

braille conforme os conceitos que as compõem. Os tópicos “d” e “g” não foram incluídos

por motivos que mais adiante serão apresentados. Segue um quadro convencional para

indicar qual tipo de partitura é lida em cada uma das etapas.

Tabela 1 – Os cinco graus de dificuldades com a descrição do conteúdo e tipo de partitura

Grau  de  Dificuldade   Descrição  do  conteúdo  /  Tipo  de  partitura  

1   As  notas  musicais  e  suas  alturas  /  partitura  com  notas  sem  valor  de  tempo  e  oitava.  

2   Valores  de  tempo  /  partitura  com  notas  e  valores  de  tempo,  com  uso  de  compasso,  sem  oitava.  

3   Sinais  de  oitava  e  regra  de  uso  das  oitavas  /  partituras  que  fazem  uso  das  celas  de  oitava.  

4   Escrita  de  tríades,  tétrades  e  suas  inversões  /  partituras  que  fazem  uso  das  celas  de  intervalo.  

5   Vozes  simultâneas  e  escrita  com  mais  de  duas  pautas  /  partituras  que  usam  “em  acorde  total”,  “em  acorde  parcial”  e/ou  pautas  simultâneas.  

Com a classificação de trechos musicais conforme proposta acima, cada grau

de dificuldade será analisado/observado separadamente.

4.2 Analisando partituras em braille

Sloboda afirma que quadros usados pela psicologia para tentar interpretar a

aprendizagem musical são muitos, alguns chegando a ser conflitantes entre si. O autor

apresenta em seu livro A Mente Musical: A Psicologia Cognitiva da Música alguns desses

quadros e afirma que a Teoria Sistêmica de Produção pode ser empregada para

fundamentar “generalizações amplas acerca de questões de ensino e aprendizagem” (2010,

p. 285).

A Teoria Sistêmica foi inicialmente empregada, por Anderson (1981, 1982

apud. Sloboda, 2010, p. 285), para o estudo sobre aquisição de habilidades. Ela enquadra o

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raciocínio humano em procedimentos que operam de acordo com postulados estabelecidos.

O autor reconhece que tais sistemas não fazem parte da mente humana, mas que podem ser

análogos formais dos processos mentais, nos permitindo adentrar e organizar conteúdos

que seriam insondáveis apenas pela observação.

Se aplicarmos os princípios da Teoria Sistêmica sobre diferentes trechos

musicais em braille, poderemos observar como os desafios da aprendizagem se inter-

relacionam na escrita ao supor os procedimentos lógicos do leitor. Após a leitura de cada

cela braille, pretendemos apontar o que o leitor deve concluir para que a leitura seja

correta.

Mesmo classificando as partituras musicais em graus de dificuldades e uma

subdivisão em etapas, o que será feita no próximo capítulo, não pretendo estabelecer uma

metodologia, mas proporcionar reflexões para o professor de música e para os músicos

com DV a respeito da Musicografia Braille.

As considerações que seguem analisam os graus 1 ao 4 com base na Teoria

Sistêmica. No grau 5 foi necessário usar uma análise comparativa entre as partituras em

braille e as convencionais.

4.3 Como serão feitas as análises

A análise que segue pode ser feita apenas com a partitura em braille e não com

a sua versão na escrita convencional. Isso se deve à característica linear da primeira, seu

modo descritivo de grafar a música. Podemos compará-la com uma fala que dita a partitura

em uma ordem definida por regras, exigindo do ouvinte memória, conhecimentos musicais

e experiência nessa tarefa; em outras palavras, ela pode ser considerada uma descrição

ordenada da partitura convencional, que é a sua verdadeira matriz. Como essa linearidade

descritiva não é realidade na partitura convencional, ela não pode ser analisada da mesma

forma que será feita a seguir com a escrita em braille.

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Todas as partituras em braille nessas análises serão acompanhadas pela sua

versão em tinta, o que também permite ao músico que não conhece o braille acompanhar

as análises.

Cada balão desenhado nas partituras em braille está circundando uma ou mais

celas Braille, que correspondem às informações escritas ao seu lado.

Nessa análise, chamaremos de “Cela” a própria cela braille, seguida pelo

número de seu posicionamento dentro da partitura, por exemplo: Cela 1, Cela 2. Após cada

“Cela” são indicados entre parênteses os números dos pontos que formam a cela em

braille, buscando permitir a leitura desse textos por pessoas com DV conhecedoras da

Musicografia Braille. Por exemplo, “Cela 1 (1, 4, 5)” significa: primeira cela do trecho,

formada pelos pontos 1, 4 e 5. Reveja a figura 6.

Entre algumas celas será incluído o “Procedimentos Mental”, que se refere ao

raciocínio lógico que o leitor do braille deve fazer para compreender corretamente a

partitura até aquele ponto. Embora cada procedimento esteja descrito como frases

padronizadas, isso não quer dizer que seja exatamente dessa forma que o leitor do braille

pensa. Isso é uma tentativa de observar o que esse leitor precisa ter de conhecimento após

se deparar com cada cela braille, e tornar essas informações em música. Os procedimentos

também são enumerados e geralmente contêm várias ações que passa por diferentes graus

de dificuldade. Esse será o padrão de todas as análises usando a Teoria Sistêmica.

As análises a seguir foram feitas do ponto de vista de quem lê a partitura. No

entanto, se as analisássemos do ponto de vista de quem escreve, a análise se tornaria mais

abstrata e com mais variáveis. As habilidades pessoais desse suposto indivíduo que escreve

uma partitura podem influenciar significativamente esse tipo de análise no que tange os

procedimentos mentais, tais como: O quanto é desenvolvida sua percepção musical ou

musicalidade? O quanto domina o sistema braille? Toca bem algum instrumento? Tem um

bom solfejo? Etc. Também poderia influenciar a análise as diferentes situações em que

essa escrita estaria sendo feita, por exemplo: é uma composição própria? É uma música já

existente? É um exercício de ditado musical? Com todas essas variáveis impossíveis de

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serem medidas ou definidas, se a análise fosse sobre a pessoa que escreve, analisar trechos

do ponto de vista de quem lê se mostrou mais eficiente e suficiente para os nossos

objetivos.

Após serem apresentadas as análises dos graus de dificuldade, teremos um

quadro resumindo os resultados de cada uma delas. São quadros nos quais teremos um

panorama geral dos tópicos do ensino da Musicografia Braille, disposto de forma a auxiliar

o professor na tarefa de planejar o ensino e estruturar avaliações sobre os conhecimentos

do aluno com DV nessa área do conhecimento.

4.3.1 Análise do Grau de Dificuldade 1

Neste grau temos escritas apenas as notas em tempo de colcheia, são partituras

básicas para o aluno iniciante. Essa partitura é rudimentar, pois as informações que a

tornam precisa musicalmente não aparecem.

No apêndice há uma tabela com a correspondência da Musicografia Braille

com as partituras convencionais. Seguem abaixo duas análises conforme esse grau:

Figura 7 – Notas dó, ré, mi e fá em braille, com valor de tempo de colcheia. Grau de dificuldade 1 Descrição para pessoas com DV – conforme as celas na Musicografia Braille: dó colcheia,

espaço, ré colcheia, espaço, mi colcheia, espaço e fá colcheia.

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Análise 1

Cela 1 (1, 4, 5): dó

Procedimento Mental 1:

- Grau 1. Reconhecer a nota escrita em braille (válido para todas as celas)

Cela 2 (1, 5): ré

Procedimento 2:

Grau 1. Reconhecer que o ré é mais agudo que o dó

Cela 3 (1, 2, 4): mi

Procedimento 3:

Grau 1. Reconhecer que o mi é mais agudo que o ré

Cela 4 (1, 2, 4, 5): fá

Procedimento 4:

Grau 1: Reconhecer que o fá é mais agudo que o mi

Figura 8 – Notas dó, si, lá e sol em braille, com valor de tempo de colcheia. Grau de dificuldade 1

Descrição para pessoas com DV – conforme as celas na Musicografia Braille: dó colcheia, espaço, si colcheia, espaço, lá colcheia, espaço e sol colcheia.

Análise 2

Cela 1 (1, 4, 5): dó

Procedimento Mental 1:

- Grau 1. Reconhecer a nota escrita em braille (válido para todas as celas)

Cela 2 (2, 4, 5): si

Procedimento 2:

Grau 1. Reconhecer que o si é mais grave que o dó23

Cela 3 (2, 4): lá 23 Nestas análises do grau 1, a busca pela próxima nota se deu pela mais próxima, por isso o “si” foi encontrado abaixo do “dó”.

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Procedimento 3:

Grau 1. Reconhecer que o lá é mais grave que o si

Cela 4 (1, 2, 5): sol

Procedimento 4:

Grau 1. Reconhecer que o sol é mais grave que o lá

Nesta análise observamos dois procedimentos mentais distintos: reconhecer a

cela de cada nota musical e perceber se a melodia está subindo ou descendo. Sendo assim,

no grau de dificuldade 1 podemos dizer que o conteúdo que o aluno deverá aprender é:

quais celas braille correspondem a quais notas musicais e qual a relação de altura entre

elas, se a melodia sobe ou desce em determinado ponto.

É unânime entre os professores que entrevistei que se deve ensinar as notas

pelas colcheias, mas sem revelar o valor de tempo. Essa preferência se deve ao fato de que

as colcheias fazem parte do grupo das dez celas fundamentais do Sistema Braille (figura na

primeira linha), conhecidas por “primeira linha do sistema braille”. Elas não possuem os

pontos 3 e 6, pois o acréscimo de um ou dois desses pontos fará com que a cela seja

enquadrada em cima das próximas linhas. Veja as figuras abaixo.

Figura 9 – primeira linha do sistema braille, formada por 10 celas sem os pontos 3 e 6 Descrição para pessoas com DV – não necessário

A partir dessa primeira linha fundamental, as demais celas são formadas ao

receberem o acréscimo dos pontos 3 e/ou 6 na sua parte inferior.

Figura 10 – segunda linha do sistema braille, sendo as mesmas celas da primeira linha, mas

com o acréscimo do ponto 3 Descrição para pessoas com DV – não necessário

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Figura 11 – terceira linha do sistema braille, sendo as mesmas celas da primeira linha, mas

com o acréscimo do ponto 3 e 6 Descrição para pessoas com DV – não necessário

Figura 12 – quarta linha do sistema braille, sendo as mesmas celas da primeira linha, mas

com o acréscimo do ponto 6 Descrição para pessoas com DV – não necessário

A quinta linha é formada pela transposição da primeira linha para a posição

inferior dos pontos na cela.

Figura 13 – quinta linha do sistema braille, sendo as mesmas celas da primeira linha, mas

com os pontos “rebaixados” Descrição para pessoas com DV – não necessário

Por sua vez, cada linha é associada a um valor de tempo. A primeira é a

colcheia, a segunda é a mínima, a terceira é a semibreve ou semicolcheia e a quarta é a

semínima. As notas musicais de “dó” a “si” se encontram a partir da quarta cela até a

décima (ver o apêndice Introdução à Musicografia Braille). Observe que os pontos 1, 2, 4 e

5 informam o nome da nota, são os pontos superiores e centrais da cela braille. Os pontos 3

e 6 informam o valor de tempo da nota, são os pontos inferiores da cela. Veja o desenho

abaixo:

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Figura 14 – Pontos da cela braille dividida em “nome da nota” e “valor de tempo da nota” Descrição para pessoas com DV – Uma cela braille é cortada horizontalmente ao meio,

separando os pontos 1, 2, 4 e 5 na parte de cima, tendo escrito ao lado “nome da nota”, e na parte debaixo do corte ficando os pontos 3 e 6, tendo escrito ao lado “valor de tempo da nota”

Em conversas com usuários desse sistema, pude constatar que a leitura das

notas musicais geralmente é feita começando pela parte superior da cela, e depois a

inferior. Logo verificamos que essa sequência se assemelha ao modo como falamos a nota

musical. Por exemplo, de acordo com os dados pessoais, quando se lê a nota dó semínima,

primeiro se lê a parte superior da cela (dó) e depois a parte inferior (semínima). Assim

seria o mesmo procedimento para qualquer outra nota. Podemos dizer que a parte superior

da cela corresponde ao grau de dificuldade 1 (nome da nota) e a parte inferior ao grau de

dificuldade 2 (valores de tempo).

A partir dessa mesma percepção sobre a cela braille, que a divide em uma parte

superior e outra inferior, Garmo (2005, p.13) recomenda que o transcritor faça o seguinte

procedimento para revisar a sua transcrição:

1. Conferir somente a parte superior das celas, os nomes das notas, ignorando a

parte inferior24.

2. Conferir somente a parte inferior das celas, os valores de tempo, e contar as

batidas por compasso.

A autora aconselha que a correção seja feita duas vezes em cada partitura,

sendo que na primeira se atente apenas ao nome das notas, e na segunda vez com os

valores de tempo e a contagem dos compassos.

Esse cuidado com pequenos erros é essencial, pois uma nota ou ritmo escrito

errado pode afetar todo um trecho musical e fazer com que o músico com DV decore um

trecho ou a música inteira de forma errada. Conferir a “Regra de Uso das Oitava” (será

24 Tradução livre

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vista adiante) também é muito importante, e deve ser feito logo no primeiro passo da

revisão. Um erro com apenas uma cela de oitava pode afetar o desenho melódico do todo

um trecho.

4.3.2 Análise do Grau de Dificuldade 2

Ao passarmos para o grau de dificuldade 2, incluímos na leitura das partituras

em braille o valor de tempo. Nesse grau podemos ter contato com o conceito de compasso,

fórmula de compasso e a percepção dos agrupamentos rítmicos. Considero que um

agrupamento simples seja um pequeno grupo de notas que formam uma célula rítmica, um

padrão sonoro; já um agrupamento complexo, considero como sendo as estruturas formais

internas de uma obra, assim como define Sloboda (2008, p. 203). No grau 2 apenas o

agrupamento simples são trabalhados, o agrupamento complexo estará associado ao grau

5.

Sinais como barra final e ligadura também podem ser vistos aqui, pois também

ajudam a desenvolver exercícios que trabalham com os valores e o tempo. Note que apenas

os conteúdos mais centrais serão destacados nas análises, pois os conteúdos mais

“periféricos” devem ser usados pelo professor para garantir que o conteúdo principal seja

bem trabalhado e atinja seus objetivos de aula.

Vamos analisar apenas o segundo compasso do exemplo abaixo, que pertence

ao grau de dificuldade 2. Portanto, não será analisada as celas que indicam a oitava, pois

fazem parte do grau 3. O estudante que vai ler essa partitura pode ser informado que a

tessitura ficará sempre dentro de determinada oitava ou região de seu instrumento.

Seguindo corretamente a Regra de Uso das Oitavas, não se deve usar celas de

oitava nesse trecho, exceto pela primeira nota, devido aos saltos intervalares feito pela

melodia (veremos essa regra adiante). Segue a análise:

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Figura 15 – Partitura convencional para a análise 3. Grau de dificuldade 2

Figura 16 – Partitura em braille para a análise 3. Grau de dificuldade 2

Análise 3: segundo compasso

Cela 1 (1, 2, 5, 6): sol semínima

Procedimento mental 1: válido para todas as celas:

Grau 1. Reconhecer a nota escrita em braille

Grau 2. Reconhecer o valor de tempo da nota

Procedimento 2: reconhecer que:

Grau 2. A semínima dura um tempo e ocupa a primeira UT

Cela 2 (1, 2, 4, 5): fá colcheia

Procedimento 3: reconhecer que:

Grau 1. O fá está abaixo do sol

Grau 2. A colcheia dura meio tempo e ocupa a primeira parte da segunda UT

Cela 3 (1, 2, 4): mi colcheia

Procedimento 4: reconhecer que:

Grau 1. O mi está abaixo do fá

- se a colcheia dura meio tempo, então:

Grau 2. Essa ocupa a segunda parte da segunda UT

Grau 2. As duas colcheias juntas completam a segunda UT (conceito de

agrupamento)

Cela 4 (1, 2, 4, 5): fá colcheia

Procedimento 5: reconhecer que:

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Grau 1. O fá está acima do mi

Grau 2. A colcheia dura meio tempo e ocupa a primeira parte da terceira UT

Cela 5 (1, 2, 4): mi colcheia

Procedimento 6: reconhecer que:

Grau 1. O mi está abaixo do fá

- se a colcheia dura meio tempo, então:

Grau 2. Ela ocupa a segunda parte da terceira UT

Grau 2. As duas colcheias juntas completam a segunda UT

- a terceira UT é idêntica à segunda (percepção estrutural)

Cela 6 (1, 5, 6): ré semínima

Procedimento 7: reconhecer que:

Grau 1. O ré está abaixo do mi

Grau 2. A semínima dura um tempo e ocupa a quarta UT

Cela 7: cela em branco: mudança de compasso.

Naturalmente, nesse grau de dificuldade já existem mais conceitos musicais

envolvidos do que no anterior. Podemos destacar a presença do conceito de escala, do grau

de dificuldade 1, e do conceito de valor de tempo nas notas, unidade de tempo, unidade de

compasso e agrupamento simples, que fazem parte do grau de dificuldade 2.

4.3.3 Análise do Grau de Dificuldade 3

No grau de dificuldade 3, o conteúdo a ser assimilado são os conceitos e celas

de oitavas e a “Regra de Uso das Oitavas”. A análise a seguir foi feita apenas sobre o

primeiro compasso, adiante outro trecho desse mesmo grau também será analisado. Vale

apontar aqui que a “terceira oitava” das partituras convencionais corresponde à chamada

“quarta oitava” em braille, portanto, nas análises que seguem as oitavas serão chamadas

conforme a orientação em braille.

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Figura 17 – Partitura convencional para a análise 4. Grau de dificuldade 3

Figura 18 – Partitura em braille para a análise 4. Grau de dificuldade 3

Análise 4 - primeiro compasso

Cela 1 (5) oitava 4

Cela 2 (1, 4, 5, 6) dó semínima

Procedimento Mental 1: válido para todas as celas:

Grau 1. Reconhecer a nota escrita em braille

Grau 2. Reconhecer o valor de tempo da nota

Procedimento Mental 2: reconhecer que:

Grau 2. O dó está da quarta oitava

Grau 2. A semínima dura um tempo e ocupa a primeira UT (unidade de tempo)

Cela 3 (1, 5): ré colcheia

Procedimento Mental 3: reconhecer que:

Grau 3. O ré está da quarta oitava

Grau 3. A colcheia dura meio tempo e ocupando metade da segunda UT

Cela 4 (1, 2, 4): mi colcheia

Procedimento Mental 4: reconhecer que:

Grau 3. O mi está na quarta oitava

Grau 2. A colcheia dura meio tempo, ocupando a segunda metade da segunda UT

Grau 2. As duas colcheias juntas completam a segunda UT

Cela 5 (1, 2, 4, 5, 6): fá semínima

Procedimento Mental 5: reconhecer que:

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Grau 3.O fá está na quarta oitava

Grau 2. A semínima dura um tempo e ocupa a terceira UT (unidade de tempo)

Cela 6 (1, 2, 5, 6): lá semínima

Procedimento Mental 6: reconhecer que:

Grau 3. O lá está na quarta oitava

Grau 2. A semínima dura um tempo e ocupa a quarta UT (unidade de tempo)

Cela 7: cela em branco

Procedimento Mental 7: mudança de compasso

Outros entendimentos poderiam ser inseridos nos Procedimentos Mentais,

principalmente no que se refere à compreensão das estruturas musicais do trecho. A

compreensão musical por estruturas geralmente é tarefa feita por músicos com certo grau

de amadurecimento. Isso é defendido por determinados experimentos sobre leitura à

primeira vista (SLOBODA, p. 93), que atestam que a habilidade de bons leitores de

partituras em tinta está relacionada com a capacidade de identificar, à primeira vista,

estruturas musicais em unidades maiores do que conseguem leitores iniciantes de

partituras. Questões relacionadas à estrutura, ou aos agrupamentos complexos, serão

abordadas no grau de dificuldade 5, onde será usada outra forma de análise no lugar da

Teoria Sistêmica.

O resultado da Análise 4, a anterior, poderia ser similar ao de uma partitura

convencional, caso fizermos uma avaliação análoga. Porém essa aproximação só existe

porque não foi necessário o conhecimento da Regra de Uso das Oitavas, mas apenas o

reconhecimento das celas de oitavas e sua localização em um instrumento.

Resumidamente, a Regra de Uso das Oitavas se limita a três pontos:

a) se a melodia saltou o intervalo diatônico de uma segunda ou terça, mesmo

que a segunda nota esteja em uma oitava diferente da primeira nota, não se coloca sinal se

oitava na segunda nota;

b) se a melodia saltou o intervalo de quarta e quinta, só se deve colocar sinal de

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oitava se a segunda nota está em uma oitava diferente da primeira nota, caso esteja na

mesma oitava, não se repete o sinal de oitava;

c) se a melodia saltou intervalos de sexta e sétima, mesmo que a segunda nota

esteja na mesma oitava que a primeira, sempre se deve colocar sinal de oitava. Saltos a

partir da oitava sempre usarão sinais de oitava.

A seguir veremos a análise de uma partitura do grau 3 que exige o

conhecimento da Regra de Uso das Oitavas. Nessa análise iremos perceber como uma

melodia com vários saltos maiores do que o intervalo de terça já implica em um novo

desafio para o aluno com DV. A análise foi feita apenas sobre o terceiro compasso.

Figura 19 – Partitura convencional para a análise 5. Grau de Dificuldade 3

Figura 20 – Partitura em braillepara a análise 5. Grau de dificuldade 3

Análise 5 - terceiro compasso

Cela 1 (4, 6): oitava 5

Cela 2 (1, 4, 5, 6): dó semínima

Procedimento mental 1:

Grau 1. Reconhecer a nota escrita em braille (válido para todas as celas)

Grau 2. Reconhecer o valor de tempo da nota (válido para todas as celas)

Procedimento mental 2: reconhecer que:

Grau 3. O dó está na quinta oitava

Grau 2. A semínima dura um tempo e ocupa a primeira UT

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Cela 3 (4): oitava 4

Cela 4 (1, 2, 5): sol colcheia, com oitava indicada.

Procedimento mental 3: reconhecer que:

Grau 3. Só se usa sinal de oitava em intervalos de quarta e quinta quando houver

mudança de oitava (Regra de Uso das Oitavas)

- Sendo: a nota anterior o dó5, o intervalo será de quarta descendente

- Então: o sol está na quarta oitava;

Grau 2. A colcheia dura meio tempo e ocupa a primeira metade da segunda UT

Cela 5 (2, 4): lá colcheia, sem indicação de oitava.

Procedimento mental 4: reconhecer que:

Grau 3. Não se usa sinal de oitava quando o intervalo for de segunda ou terça,

mesmo que mude de oitava (Regra de Uso das Oitavas)

- Sendo: a nota anterior o sol4, o intervalo será de segunda ascendente

- Então: o lá está na quarta oitava;

Grau 2. A colcheia dura meio tempo e ocupa a segunda metade da segunda UT

- Então: as duas colcheias juntas completam a segunda UT (agrupamento de nota)

Cela 6 (5): oitava 4

Cela 7 (1, 4, 5, 6): dó semínima, com indicação de oitava

Procedimento mental 5: reconhecer que:

Grau 3. Sempre se usa sinal de oitava quando o intervalo for de sexta e sétima,

mesmo que não mude de oitava (Regra de Uso das Oitavas)

- Sendo: a nota anterior o lá 4, o intervalo será de sexta descendente

- Então: o dó está na quarta oitava;

Grau 2. A semínima dura um tempo e ocupa a terceira UT

Cela 8 (1, 2, 5, 6): ré semínima, sem indicação de oitava

Procedimento mental 6: reconhecer que:

Grau 3. Não se usa sinal de oitava quando o intervalo for de segunda ou terça,

mesmo que mude de oitava (Regra de Uso das Oitavas)

- Sendo: a nota anterior, o dó 4, o intervalo será de segunda ascendente

- Então: o ré está na quarta oitava

Grau 2. A semínima dura um tempo e ocupa a quarta UT

Cela 9: cela em branco: mudança de compasso.

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A cela de oitava só tem função quando está associada a uma nota musical,

portanto, embora fizesse sentido, achei desnecessário incluir um procedimento mental após

a leitura de cada uma dessas celas.

Com essa análise podemos perceber que a Regra de Uso das Oitavas deve ser

constantemente observada na leitura de uma partitura em braille, o que exige do leitor

familiaridade com tal regra e rapidez na contagem dos intervalos diatônicos.

O mesmo conhecimento não é exigido do leitor vidente, que lê esse mesmo

trecho escrito em uma partitura convencional, já que irá ler cada nota da melodia sem

precisar considerar a anterior, podendo assim começar sua leitura pelo meio da melodia.

Por exemplo, na Musicografia Braille é preciso acompanhar os sinais de oitavas desde o

início da melodia. Outro ponto importante é que o aluno vidente não precisa contar o

intervalo formado entre cada nota da melodia escrita.

Certamente esse mesmo trecho musical, exposto acima, exige mais

conhecimento teórico-musical para o leitor da Musicografia Braille do que para o leitor da

partitura convencional. Para fazer uma leitura eficiente em braille, o leitor precisa

memorizar qual foi a última nota e sua oitava e ficar atento à Regra das Oitavas antes de

prosseguir com segurança sem precisar retornar repetidas vezes às celas já lidas.

4.3.4 Análise do Grau de Dificuldade 4

Esse grau de dificuldade compreende a escrita de acordes, também conhecidos

pelos músicos videntes por “cachos de notas”. Na Musicografia Braille eles são escritos

usando um grupo especial de celas braille, possuindo regras específicas de utilização (mais

detalhes no apêndice Introdução à Musicografia Braille). No trecho musical abaixo, escrito

em braille e na forma convencional, veremos o uso de todos os intervalos e algumas

possibilidades de escrita. Isso deve permitir ao leitor compreender como os intervalos são

representados nas partituras em braille:

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Figura 21 – Partitura convencional para a análise 6. Grau de dificuldade 4

Figura 22 – Partitura em braille para a análise 6. Grau de dificuldade 4 Descrição para pessoas com DV – a partitura em braille anexa possui círculos com linhas

apontadas para textos que descrevem as celas que estão dentro do seus respectivos círculos.

Ao acompanharmos a descrição acima, comparando as escrita em braille com a

partitura convencional, poderemos ter uma noção aproximada do processo da leitura

musical em braille nesse grau de dificuldade. Com isso podemos destacar alguns dados

relevantes para esta pesquisa:

a) a cela de intervalo é tratada como se fosse uma nota, pois pode receber

sinais de alteração, sinal de oitava25, ligaduras e dedilhado (dado externo à observação

25 Quando o salto for maior que uma oitava, já que não há sinais para intervalos a partir da nona.

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anterior).

b) o intervalo indicado pela cela braille é sempre diatônico, nunca intervalo

cromático. Isso faz com que se devam respeitar as alterações da “armadura de clave”

correspondente à tonalidade do trecho.

c) é preciso definir o sentido na contagem dos intervalos, se será ascendente ou

descendente. Nos nossos exemplos, adotaremos sempre o sentido ascendente. A regra da

Musicografia Braille diz que, nas vozes com tessitura média, acima do Dó 4, os intervalos

serão contados no sentido descendentes (contralto e soprano), se tiver tessitura média

abaixo do Dó 4, o sentido será ascendente (tenor e baixo).

d) os intervalos aparecem sempre do menor para o maior. Dessa forma, se for

lido uma quinta seguida pela terça, logo se saberá que a terça é na verdade um intervalo de

décima (ver compasso 3 do exemplo).

e) A celas de intervalo possuem o mesmo valor de tempo da nota que origina o

acorde.

Vamos analisar o primeiro compasso do trecho acima, de acordo com a Teoria

Sistêmica.

Análise 6 - primeiro compasso

Cela 1 (5): oitava 4

Procedimento mental 1: Válido para todas as celas de oitava:

Grau 3. Reconhecer as celas de oitava (pode ser em um instrumento musical)

Cela 2 (1, 3, 5): ré mínima

Procedimento 2: reconhecer que:

Grau 3. O ré pertence à quarta oitava

Grau 2. A mínima dura dois tempos e ocupa a primeira e a segunda UT

Cela 3 (3, 4, 6): intervalo de terça (dif. 4)

Procedimento 3: válido para todas as celas de intervalos:

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Grau 4. Reconhecer as celas de intervalos.

Procedimento 4: reconhecer que:

Grau 4. Esta cela está representando a nota fá # da oitava 4 (terça diatônica

ascendente)

Grau 4. Ele possui a mesma duração da nota ré mínima e devem ser tocadas juntas

Cela 4 (1, 5, 6): ré semínima

Procedimento 5: reconhecer que:

Grau 3. O ré pertence à quarta oitava

Grau 2. A mínima dura um tempo e ocupa a terceira UT

Cela 5 (3, 5, 6): intervalo de sexta

Procedimento 6: reconhecer que:

Grau 4. Esta cela está representando a nota si da oitava 4 (sexta diatônica

ascendente)

Grau 4. Ele possui a mesma duração da nota ré semínima e devem ser tocadas

juntas

Cela 6 (1, 5, 6): ré semínima

Procedimento 7: reconhecer que:

Grau 3. O ré pertence à quarta oitava

Grau 2. A semínima dura um tempo e ocupa a quarta UT

Cela 7 (1, 4, 6): sustenido

Cela 8 (3, 4, 5, 6): intervalo de quarta

Procedimento 2: reconhecer que:

Grau 4. Esta cela está representando a nota sol #

Grau 4. Ele possui a mesma duração da nota ré semínima e devem ser tocadas

juntas

Nessa análise, podemos verificar que o conceito musical que deve ser

assimilado pelo aluno será o de montar o acorde descrito pelos intervalos, seguindo as

regras desse tópico. Note que aqui também é imprescindível que o aluno compreenda bem

a contagem dos intervalos diatônicos, capacidade exigida já no grau 3, que pede a

identificação do intervalo entre duas notas dentro de uma melodia.

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O fato da escrita tratar a cela de intervalo como a própria nota musical a que se

refere, possuindo o mesmo valor de tempo da “nota base” e podendo receber sinais de

alteração e dinâmicas, parece reforçar a percepção de que as notas representadas pelos

intervalos estão agrupadas e devem ser tocadas juntas, com o mesmo valor de tempo.

4.3.5 Analisando o Grau de dificuldade 5

O grau de dificuldade 5 se refere à leitura de vozes simultâneas. Poucos dados

relacionados a essa etapa do aprendizado foram encontrados na literatura disponível.

Provavelmente isso se deve porque esse assunto tem um nível de abstração maior do que

uma simples apresentação da correspondência entre as duas grafias, algo semelhante ao

que se encontra no apêndice “Introdução à Musicografia Braille”. Tal conteúdo

introdutório também pode ser encontrado em alguns trabalhos acadêmicos publicado há

alguns anos, tais como o de Tomé (2003), o mais popular.

Na partitura convencional, a escrita de vozes simultâneas pode ser lida pelo

estudante iniciante sem grande dificuldade, assim como novas questões a serem

assimiladas. Na partitura em braille, essa escrita compreende vencer um novo desafio de

aprendizagem, pois irá exigir do aluno uma nova forma de ler a música (grau de

dificuldade 5) e poderá fazer uso das habilidades musicais compreendidas pelo graus de

dificuldade 1 a 4.

Contudo, quais seriam os novos conceitos necessários para a leitura de

partituras do grau 5? Qual é a nova percepção na escrita musical em braille desse grau?

Devido às particularidades do grau de dificuldade 5 a análise feita com a

Teoria Sistêmica não é a mais adequada; esse grau requer mais abstração e técnica de

leitura por parte do músico com DV do que os anteriores. O músico precisará ler duas

vozes consecutivas e compreender como ambas as vozes soam, simultaneamente. Assim é

feito porque duas vozes com ritmos diferentes não podem ser escritas usando as celas de

intervalo, é preciso clareza e precisão na descrição de cada voz.

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Observando as figuras abaixo, veremos como acontece esse processo, que

aparentemente é muito distante da realidade das partituras convencionais.

O processo pode ser descrito da seguinte maneira: o leitor lê a primeira voz

durante todo o primeiro compasso. Em seguida há um sinal (chamado de “em acorde

total”) informando que existe uma segunda voz paralela à voz que ele acabou de ler. Então

o leitor segue com a leitura da segunda voz, correspondendo ao mesmo compasso. Ao ele

precisa compreender como as duas vozes lidas soam. Quando houver mais de uma voz,

aparecerão outros sinais de “em acorde total” em quantas vezes forem necessárias. Desde

já podemos imaginar que isso exige do aluno uma certa capacidade de solfejo e memória

musical. Compare as duas escritas abaixo:

Figura 23 – Partitura convencional para a análise 7. Grau de dificuldade 5

Figura 24 – Partitura em braille para a análise 7. Grau de dificuldade 5

Portanto, podemos dizer que no grau de dificuldade 5 o aluno precisará

desenvolver a capacidade de relacionar dois trechos melódicos lidos consecutivamente,

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sendo essa uma nova forma de se relacionar com a escrita musical. Podemos considerar

esse grau como avançado, por exigir o acúmulo de outros conhecimentos para que possa

ser plenamente compreendido e utilizado.

É possível analisar e observar partituras do grau 5 de forma suficiente para

tirarmos conclusões que contribuam para esta pesquisa?

Sim. Primeiramente nesse grau nos deparamos com a capacidade do leitor do

braille em associar dois ritmos diferentes lidos em momentos consecutivos, algo que na

partitura convencional não acontece, porque todos os sons são organizados por unidades de

tempo. Esse ponto de diferença poderá nos revelar dados interessantes.

A partitura convencional é alinhada por unidades de tempo, o que faz com que

haja uma espaço após cada nota, definido de acordo com o seu valor de tempo. Ao termos

contato com a Musicografia Braille logo notamos que as unidades de tempos não são

uniformes como são nas partituras convencionais. Portanto, faremos comparações acerca

desse ponto, observando como as unidades de tempo se comportam na grafia em braille.

4.4 As Unidades de Tempo

A verticalidade na partitura convencional agrega as informações musicais que

devem acontecer no mesmo tempo, tais como acordes, notas de vozes diferentes e sinais de

expressão. De um modo geral, os compassos são divididos em UT’s (unidades de tempo),26

e visualmente isso organiza a distância horizontal entre as notas.

Vale reafirmar que todas as informações de uma partitura podem ser transcritas

para o braille, tudo o que é vertical dentro de um mesmo pentagrama convencional passa a

ser representado de forma horizontal quando escrito em braille. Certamente esse fato tem

consequências acentuadas nos métodos de ensino musical usados por professores videntes. 26 UT será a abreviatura usada em todo esse texto para “unidade de tempo”. Unidades de tempo será UT’s.

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Nesse sentido, analisar a formatação das partituras em braille apresenta apenas

um dos possíveis caminhos para se iniciar uma busca por novos formatos de materiais

didáticos, explicações, exercícios e planejamento de aulas de música para alunos com DV.

A seguir, apresento comparações entre o mesmo trecho musical escrito em

formato convencional e em braille. Com isso poderemos apontar três características

relevantes das UT’s em braille.

a) Espacialização das notas musicais relativas ao seu valor de tempo;

b) UT estendida por informações adicionais;

c) Fragmentação vertical de diferentes Unidades de Tempo.

4.4.1 Espacialização das notas musicais relativas ao seu valor de tempo

Na formatação da escrita em tinta, cada UT possui um espaçamento padrão e

quase idêntico entre si, independentemente do número de notas que o compõe. Após cada

nota musical, de acordo com seu respectivo valor de tempo, há um espaço em branco até a

próxima nota. Isso torna o compasso subdividido em partes quase iguais para cada UT.

Veja na figura 2 a variação nos espaços após cada nota relativa ao seu valor de tempo.

Figura 2 – (recapitulação) – Partitura convencional, explicitando a relação dos espaços após

as notas com o seu valor de tempo

Essa informação espacial certamente contribui nas leituras à primeira vista,

facilitando o solfejo e a execução musical. Abaixo, segue a versão em braille desse mesmo

trecho apresentado.

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Figura 25 – Partitura em braille, transcrição da partitura da figura 2

Podemos observar que não existe espaços relativos aos valores de tempo das

notas, assim como existe na partitura convencional. A subdivisão do compasso em UT’s

do mesmo tamanho é comum na escrita em tinta. Para um aluno com DV essa informação

não existe em braille.

4.4.2 UT estendida por informações adicionais

A cada informação que incide na mesma UT serão necessárias mais celas

braille para escrevê-la, e consequentemente mais tempo será preciso para a sua leitura e

compreensão. Os itens que fazem com que uma UT se estenda são:

-Ocorrência do sinal de oitava (KROLICK, 2004, p. 22)

-Acorde (Ibid., p. 36)

-Acentuação e dinâmica (Ibid., p. 95)

-Alteração (Ibid., p. 28)

-Quiáltera (Ibid., p. 34)

-Dedilhado (Ibid., p. 65)

-Início ou fim de ligadura (Ibid., p. 49)

-Início ou fim, crescendo ou decrescendo (Ibid., p. 99)

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Exemplo:

Figura 26 – Partitura convencional, trecho com muitas indicações, detalhando a execução sonora e técnica do pianista.

Figura 27 – Partitura em braille, transcrição da partitura da figura 27, com indicações dos significados das celas braille

Como visto, todas as informações da partitura original estão escritas em braille.

Certamente a dificuldade em ler esse trecho musical transcrito é grande devido à

quantidade de informações musicais que contém, fazendo-o ficar longo. Note que foram

necessárias dez celas braille para transcrever apenas a segunda UT do trecho acima.

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4.4.3 Fragmentação vertical de diferentes unidades de tempo

Quando se escrevem vozes independentes na mesma pauta, a escrita em braille

pode usar o recurso chamado de “em acorde total” (KROLICK, 2004, p. 41). Com essa

técnica de escrita, cada voz aparece sucessivamente, fazendo com que a mesma UT

apareça em momentos diferentes. Isso beneficia o entendimento do fraseado do trecho, em

detrimento do contraponto das vozes. Exemplo:

Figura 28 – Partitura convencional, trecho com duas vozes paralelas.

Figura 29 – Partitura em braille, transcrição da partitura da figura 29, demonstrando o uso do

“em acorde total”

Note que as UT1 e UT2 aparecem em dois momentos diferentes dentro do

compasso braille, de forma fragmentada.

Também temos os recursos chamados de em acorde parcial (KROLICK, p.

43). Nele, nem todas as UT’s se repetem, pois somente se escreve as notas que se

encontram na partitura. No Manual Internacional de Musicografia Braille encontramos:

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O acordo internacional de se respeitar o original impresso em tinta, transcrevendo o material de texto como texto braille, ao invés de usar sinais específicos, tem permitido um consenso em matéria de notação para a teoria. Esse acordo se revela especialmente útil quando músicos cegos e não-cegos estudam ou trabalham juntos (KROLICK, 2004, p. 112).

O “em acorde parcial” é ideal para grafar os casos em que o divisi das vozes

acontece em trechos do compasso, o que permite que os detalhes da partitura original

possam ser precisamente claros. O exemplo abaixo ilustra bem um caso desse tipo.

Figura 30 – Partitura convencional, trecho com divisi de voz na metade do compasso

Figura 31 – Partitura em braille, transcrição da partitura da figura 31, demonstrando o uso do

“em acorde parcial”

Note que a divisão das vozes começa na segunda UT. O uso do “em acorde

parcial” evitou escrever em braille a nota “dó semínima” duas vezes, o que aconteceria

caso fosse utilizado o “em acorde total”. Caso não fosse usado o “parcial”, a escrita em

braille poderia passar a ideia de que o divisi melódico começou em um ponto diferente do

que a partitura convencional indica. Perceba também que a primeira UT apareceu uma vez

na escrita, enquanto que a segunda UT apareceu duas vezes.

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No capítulo seguinte serão apresentadas considerações acerca dos dados aqui

levantados, e alguns parâmetros que poderão auxiliar na metodologia de ensino da

Musicografia Braille.

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CAPÍTULO 5 - DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

A partir das análises do capítulo anterior, apresentamos a seguir algumas

conclusões sobre cada grau de dificuldade. Para facilitar a compreensão dos resultados,

eles serão organizados de forma que teremos subdivisões para cada grau, que aqui

chamaremos de etapas.

Portanto, cada partitura pode ser classificada como pertencendo a um grau e a

uma etapa, embora isso não signifique que esses conhecimentos sejam pré-requisitos um

do outro. Isso será feito apenas para moldarmos uma ferramenta que pode auxiliar o

desenvolvimento de metodologias ou avaliações mais precisa quanto ao conhecimento que

é exigido do aluno com DV.

5.1 Subdivisão dos Graus de Dificuldades em Etapas

A partir das análises feitas sobre cada grau de dificuldade, torna-se possível

subdividir cada um deles de acordo com o seu conteúdo. Assim podemos deixar mais claro

o que compõe as diferentes etapas de aprendizado, em que o aluno pode estar, seja no

momento em que for de sua evolução, também ajudando a avaliar seus conhecimentos e

auxiliando metodologias a versarem sobre os principais tópicos de cada desafio de

aprendizagem.

Portanto, os trechos analisados anteriormente ganham neste capítulo mais uma

categoria classificatória. Isso significa que o aluno precisará dominar bem todas as etapas

para que se considere que determinado grau de dificuldade foi assimilado por completo.

Mas isso não necessariamente significa que as etapas precisam ser vistas

consecutivamente, mas que podem servir como balizas para organizar a estrutura de

métodos de ensino, grades curriculares e provas avaliativas.

As etapas que seguem servem principalmente para auxiliar o professor a

desenvolver exercícios e materiais didáticos, garantindo um aprendizado consistente do

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aluno. Essa pesquisa se limita a observar os conteúdo a partir das análises anteriores e

experiências pessoais.

5.1.1 Etapas do Grau de Dificuldade 1

Há dois conteúdos diferentes dentro desse grau e que, se o tivermos com

clareza, é possível vencer esse desafio de aprendizagem de forma mais ampla. Um deles é

a assimilação da correspondência das celas braille com as notas musicais, o outro é a

percepção da disposição das notas dentro da escala. Veja como a tabela desse grau pode

ser formulada:

Tabela 2 – Etapas do grau de dificuldade 1

Etapas  do  grau  de  dificuldade  1  

Descrição  do  conteúdo  

1   Assimilar  as  notas  musicais  e  suas  celas  braille  

2   Compreender  a  relação  das  alturas  das  notas  em  braille  

As duas etapas podem ser trabalhadas em separado ou em conjunto, servindo

de orientação para exercícios em sala de aula. Perceba que é possível apresentar ao aluno o

conceito de escala sem antes falar das celas braille, a ordem das etapas não é o ponto

principal nessa subdivisão, mas sim definir os conceitos que compõem cada grau, de forma

a que ajude o professor na sua tarefa de ensinar essa matéria ainda nova para o campo do

ensino musical. De todo modo, as duas etapas são mutuamente complementares e

caminham juntas nesse grau de dificuldade.

A etapa 2 foi separada da etapa 1 porque em braille não temos a altura da nota

desenhada no papel conforme temos nas partituras convencionais. Então esse conceito

deve ser visto com atenção especial, não devendo ser negligenciado e pouco trabalhado

com o aluno iniciante.

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5.1.2 Etapas do Grau de Dificuldade 2

Como neste grau o conteúdo central são os valores de tempo, ou seja, a

compreensão de como as notas ficarão dispostas dentro do tempo, as questões relativas às

figuras rítmicas ou agrupamentos simples de notas se mostram relevantes para organizar e

enriquecer esse ensino. Ao buscarmos por uma subdivisão do grau 2, podemos nos basear

em agrupamentos simples e complexos. Segue o quadro:

Tabela 3 – Etapas do grau de dificuldade 2

Etapas  do  grau  de  dificuldade  2  

Descrição  do  conteúdo  

1   Compreender  que  o  valor  de  tempo  é  dado  pelo  uso  ou  não  dos  pontos  3  e  6  e  o  que  eles  representam;  Perceber  os  valores  de  tempo  com  relação  entre  si  

2   Unidades  de  tempo;  Agrupamento  simples  de  notas  dentro  de  uma  UT  

3   Agrupamento  simples  de  notas  maiores  que  uma  UT  

4   Fórmula  de  compassos  simples;  Transposição  de  um  trecho  musical  para  outra  fórmula  de  compasso  

5   Fórmula  de  compassos  compostos;  Transposição  de  um  trecho  musical  para  outra  fórmula  de  compasso  

Neste grau de dificuldade observamos uma variedade maior de conceitos

musicais envolvidos, e, como em todos os graus de dificuldade, as etapas não devem ser

consideradas como independentes ou pré-requisitos de sua subsequente. Nenhuma das

subetapas dos graus de dificuldades pode ser considerada de forma isolada.

Consideremos que essas etapas devem se repetir ao longo da aprendizagem,

mas sempre que forem revisitadas isso deve acontecer com um maior grau de

aprofundamento. Por exemplo: na etapa 1 poderia ser visto apenas semínimas e colcheias,

seguindo pelas etapa 2, 3 e 4; depois o ensino retornaria para a etapa 1 e seria explicado as

mínimas e a semibreve, retornando para as etapas 2, 3 e 4; e enfim retornaria novamente

para a etapa 1, acrescentando as notas pontuadas e pausas, lembrando novamente que o

professor deve usar as etapas adaptadas de acordo com o que julga ser mais vantajoso para

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seus alunos ou com os seus objetivos de aula, passando e aprofundando cada etapa de

forma particular.

Os exercícios de transposição de um trecho para outras fórmulas de compassos

são ótimo para serem feitos em braille, já que isso pode ser bem simples para o aluno com

DV quando já assimilou os conceitos das etapas 1 a 3. Nesse exercício o aluno precisa

apenas trocar a informação da parte inferior da nota, escrevendo o novo valor de tempo,

dobrando ou dividindo o valor de tempo de todas as notas que forem encontradas.

Os agrupamentos simples de notas, que constam nas etapas 2 e 3, podem ser

compreendidos como a capacidade de o músico reconhecer padrões rítmicos durante a

leitura de uma partitura. Essa habilidade deve facilitar a memorização, o solfejo e a

execução do trecho musical. A percepção do agrupamento na escrita revela que o

agrupamento pode e deve ser feito no nível mental; ao se encontrar uma serie de notas, já é

possível “lembrar” do ritmo e/ou do desenho melódico escrito.

Por exemplo, quando o leitor de uma partitura convencional encontra quatro

semicolcheias reunidas, ele rapidamente compreende sua execução rítmica. Isso deve valer

para qualquer outro agrupamento simples de nota igual ou superior à uma UT. Esse tipo de

agrupamento, na escrita, acontece em braille apenas no caso de haver quatro semicolcheias

consecutivas. Em vez de aparecer quatro notas com o acréscimo dos pontos 3 e 6

(semicolcheias), esse acréscimo é feito apenas na primeira. A segunda, terceira e quarta

semicolcheias são escritas sem o acréscimo de pontos, como se fossem colcheias,

facilitando o reconhecimento desse agrupamento. Veja o exemplo na figura abaixo:

Figura 32 – Agrupamento de semicolcheias na escrita em braille

Note que para não haver confusão na leitura, o músico precisa estar atento ao

número de notas dentro do compasso, observando os seus valores de tempo. O leitor deve

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reconhecer esse agrupamento para evitar confundir as suas três últimas semicolcheias com

colcheias. Portanto, considerando o exemplo acima como sendo de um compasso ternário

(3 por 4), e já conhecendo essa forma de agrupamento na escrita em braille, o leitor

certamente não cairá em erro. Casos em que há outras figuras rítmicas no mesmo

compasso além das citadas acima, o transcritor deve estar atento se as semicolcheias

poderão ser escritas agrupadas, de modo a não trazer dúvidas para o leitor.

A capacidade de reconhecer padrões rítmicos também pode ser considerada

para agrupamentos maiores que uma UT, chegando a abranger um ou mais compassos.

Seria como se o aluno, ao ler uma semínima seguida por duas colcheias, percebesse

rapidamente que fazem parte de duas UT’s diferentes e como elas soam. Portanto, se o

aluno consegue reconhecer esses agrupamentos simples, subentende-se que o leitor já teve

bastante contato com essa figura rítmica anteriormente. Isso revela a necessidade de

exercícios que levariam gradativamente o aluno a desenvolver essa “capacidade de

percepção estrutural”. Tal habilidade poderia ser desenvolvida não apenas no grau de

dificuldade 2, como também ao longo de todo o ensino da Musicografia Braille, sempre

buscando compreender as estruturas dessas partituras e proporcionar uma leitura mais

eficiente por parte do aluno.

5.1.3 Etapas do Grau de Dificuldade 3

Comparando as duas análises feitas no grau 3 constatamos que, embora ambos

os trechos musicais sejam do mesmo grau, há diferenças muito relevantes entre si. O

primeiro trecho é mais simples que o segundo porque não exige que o leitor conheça

perfeitamente a regra de uso das oitavas, basta que saiba reconhecer a oitava em que a

primeira nota começa e ler as notas restantes, escolhendo tocar sempre a que estiver uma

terça ou segunda acima ou abaixo, sem se preocupar com a mudança de oitava. O segundo

trecho analisado já exige o conhecimento da Regra de Uso das Oitavas, de forma que se o

leitor não dominar a regra suficientemente pode não compreender a melodia de forma

correta.

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Bonilha (2010) afirma que o uso de intervalos de segunda e terça na

melodia (já que nunca se utilizam sinais de oitava mesmo quando se muda de oitava) deve

facilitar a leitura para o aluno iniciante. Basta o aluno reconhecer a oitava da primeira nota

e ler o restante da melodia. No caso das sextas e sétimas, sempre se usa sinais de oitava

mesmo que não mude de oitava. Isso também não deixa de ser simples para o aluno

iniciante, pois esses sinais serão usados invariavelmente. Porém, seria interessante misturar

os quatro intervalos citados antes de seguir com os próximos, até mesmo porque a inversão

dos intervalos de segunda e terça correspondem aos de sétima e sexta. Por último, seriam

usadas melodias com saltos de quarta e quinta, que recebem o sinal de oitava somente

quando mudam de oitava. Resumindo, o ensino da Regra de Uso das Oitavas deveria ser

iniciado pelos intervalos de segunda e de terça, tendo apenas a primeira nota da melodia

com a sua oitava indicada; depois seriam abordados os saltos de sexta e sétima e, em

seguida, os de quarta e quinta.

A seguir, como pode ser desenhado o quadro com as etapas do grau 3.

Tabela 4 – Etapas do grau de dificuldade 3

Etapas  do  grau  de  dificuldade  3   Descrição  do  conteúdo  

1   Contagem  de  intervalos  diatônicos  entre  as  notas  

2   Apresentação  do  conceito  de  oitavas  e  suas  celas  braille  correspondentes  

3   Regra  de  Uso  da  Oitavas  para  os  intervalos  de  segunda  e  terça  

4   Regra  de  Uso  da  Oitavas  para  os  intervalos  de  sexta  e  sétima  

5   Regra  de  Uso  da  Oitavas  para  os  intervalos  de  quarta  e  quinta  

Assim os trechos analisados no capítulo anterior podem ser classificados de

uma forma mais precisa. O primeiro trecho (Figura 18) seria: grau de dificuldade 3, etapa

1. O segundo (Figura 20) seria: grau de dificuldade 3, etapa 5. As etapas deste grau

possuem um caráter cumulativo maior do que em outros, de todo modo, considero que isso

não é suficiente para alterações nas tabelas, tendo em vista que a clareza na visualização

dos conteúdos é, aqui, o mais importante.

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No caso do leitor desse mesmo trecho musical escrito em partitura

convencional, não faria sentido se fizéssemos essa mesma subdivisão. Nelas os saltos

melódicos não exigem que o aluno reconheça se mudou ou não de oitava e quais são os

intervalo entre as notas, tudo para que a melodia seja corretamente compreendida. Na

partitura em braille, se há muitos saltos, consequentemente a leitura se tornará mais lenta e

com mais regras a serem conferidas.

Nesse contexto, imagine a mesma prova teórica de música escrita em tinta e

em braille. Será que a dificuldade de ambas seria equivalente? O que se exige da prova em

braille também é exigido da prova em tinta? Penso que, dependendo dos saltos da melodia

a ser lida, essa prova pode ser no mínimo mais trabalhosa para o leitor em Braille,

principalmente porque o aluno com DV deverá reter na memória o trecho do exercício sem

o uso de um instrumento, o que exigiria também um bom nível solfejo. Seria interessante

fazermos análises de questões de provas de aptidão transcritas para o braille e compará-las

a sua versão original, mas essa tarefa foge do foco deste projeto.

Na minha opinião, o uso de um instrumento musical na aprendizagem seria

essencial para o bom entendimento do grau 3. Não faria sentido aprender as oitavas apenas

teoricamente, se o aluno não tiver contato com o que realmente isso significa sonoramente.

5.1.4 Etapas do Grau de Dificuldade 4

A pergunta para esse grau de dificuldade seria: há alguma ordem didática para

que as celas de intervalo sejam apresentadas? A análise feita não foi suficiente para

responder a essa pergunta e, ainda assim, não me parece que funcionaria se a aplicássemos

em mais trechos musicais a fim de levantarmos mais dados. Nesse caso, seguirei com o

relato de experiências de pesquisadores e professores a respeito desse assunto, para assim

poder estabelecer as etapas deste grau.

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5.1.4.1 A aprendizagem de acordes

Bonilha afirma que compreender as bases do sistema tonal facilita o

aprendizado da leitura e escrita musical em braille, assim como a leitura de escalas e

acordes (2010, p.82). Esse conteúdo engloba os conceitos de tons e semitons que formam

as diferentes tonalidades, as suas armaduras de clave, a classificação dos acordes por

graus, cadências harmônicas mais comuns, etc. Mais uma vez nos deparamos com a

necessidade de o professor criar alternativas para explicar esse conteúdo de forma

acessível, seja usando o canto ou um instrumento, usando ditados, solfejos, jogos e

materiais didáticos. A percepção musical também deve ser trabalhada no que tange ao

reconhecimento de cadências harmônicas.

A partir dessas colocações, a pesquisadora apresenta um relato de experiência

em que apresenta os conceitos do grau 4 para um aluno. Primeiro foram apresentados os

intervalos de terça e quinta, permitindo escrever em braille uma tríade em estado

fundamental. Apenas com esse acorde já é possível fazer exercício em tons diferentes.

Depois apresentou os intervalos de quarta e sexta, podendo então escrever acordes na

primeira e segunda inversão. Os intervalos de segunda e sétima foram abordados apenas

quando houve a necessidade de se usar acordes com nona e sétima.

As classificações dos acordes como maiores, menores, diminutos e aumentados

não foram vistos nessa ocasião de ensino, porque “não constituem um aspecto fundamental

para a leitura em braille” (BONILHA, 2010, p. 85). Para realizar essa classificação, o

aluno precisará aprender os intervalos cromáticos, o que difere do conteúdo até então

estudado, pois eles já não fazem uso das celas de intervalo.

Com a ajuda desse relato, somado à minha experiência pessoal em dar aulas de

Musicografia Braille, podemos subdividir o grau de dificuldade 4 em etapas com base na

formação das tríades, de forma que a assimilação dos acordes no estado fundamental, suas

inversões e o reconhecimento de arpejos na partitura se tornem referência.

Apresentar um conteúdo fazendo referência a um outro conteúdo,

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didaticamente se mostra mais eficiente do que apenas apresentar as celas de intervalos para

serem decorados e praticados. Fazer essa referência é apresentar as celas de intervalo

fazendo uso das tríades e tétrades: invertidas, arpejos escritos, escalas, etc. Se não for feito

assim, podemos pensar que houve pouca fundamentação na elaboração da didática de aula.

Esse erro eu cometi nas primeiras aulas de Musicografia Braille que ministrei,

quando apresentei as celas de intervalos para os alunos sem incluir a classificação dos

acordes. Apresentei os intervalos de dois em dois, começando pelos menores e fazendo

exercícios com todos eles. Eles compreenderam bem o assunto e faziam corretamente os

exercícios. Uma das alunas criou uma maneira simples de associar os intervalos ao número

de pontos que formam a cela, de uma maneira que eu não havia pensado. Ela associou que

o intervalo de segunda é escrito com uma cela formada por dois pontos, os pontos 3 e 4. O

intervalo de terça é escrito com três pontos: 3, 4 e 6. O intervalo de quarta, por sua vez, é

escrito com quatro pontos: 3, 4, 5 e 6. Os demais intervalos acabam tendo outros tipos de

relação, que não vem ao caso aprofundarmos aqui.

Porém, quando apresentei os acordes no estado fundamental e suas inversões,

foi como se eu estivesse abordando um assunto completamente novo, e percebi que todos

tiveram muita dificuldade, o que naquele momento me surpreendeu. Posteriormente, a

partir da percepção que expus acima, ficou claro para mim que por mais que as atividades

de ler as celas e compreender as tríades tenham como base as mesmas celas em braille, elas

configuram conteúdos diferentes.

Portanto, se no planejamento das aulas o conteúdo for estruturado relacionando

todos os conteúdos possíveis, supõe-se que o aprendizado se tornaria mais consistente e

eficiente. Isso permitiria ao aluno desenvolver uma percepção mais ampla acerca de um

conceito em vez de ter que relacioná-lo com outros complementares após a sua

aprendizagem. Considerando essa questão, segue abaixo as etapas do grau de dificuldade

4.

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Tabela 5 – Etapas do Grau de Dificuldade 4

Etapas  do  grau  de  dificuldade  4  

Descrição  do  conteúdo  

1   Intervalos  de  terça  e  quinta  Acordes  no  estado  fundamental  

2   Intervalos  de  quarta  e  sexta  Acordes  na  primeira  e  na  segunda  inversão  

3   Intervalos  de  segunda  e  sétima  Acordes  de  nona  e  sétima  e  suas  inversões  

5.1.5 Etapas do Grau de Dificuldade 5

Esse grau se revelou ser o mais complexo da escrita em braille, recebendo um

tratamento diferente dos anteriores. Vamos seguir com alguns dados novos advindos de

pesquisas e relatos de experiência (além dos assuntos apontados no capítulo anterior), para

a construção do quadro com as etapas desse grau.

5.2 A leitura de partituras em braille

A partir das comparações entre as UT’s da duas formas de escrita musical,

podemos perceber mais claramente que a Musicografia Braille é uma espécie de “descrição

dos eventos musicais”, na qual cada cela braille tem sua função e posicionamento dentro

do discurso musical. Aparentemente essa forma de escrever música é complicada, o que

nos faz questionar se não haveria outra forma mais simples de escrita para o músico com

DV. O músico vidente geralmente faz esse questionamento desde o primeiro contato, já

nas etapas iniciais do braille, e principalmente quando se depara com a escrita de vozes

múltiplas no grau 5, onde as UT’s são fragmentadas.

Ainda nesse contexto de incertezas, podemos nos fazer as seguintes perguntas:

-Como o leitor experiente do braille consegue compreender o paralelismo das

vozes a partir da escrita?

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-Quais as técnicas de leitura e lógica às quais o leitor do braille geralmente

recorre?

Para responder a essas perguntas, vamos explorar mais nossa percepção dos

agrupamentos complexos, conforme Sloboda (2008), e observar como isso influencia na

leitura à primeira vista de músicos videntes. Veremos também como a leitura realizada por

músicos videntes experientes é incrivelmente semelhante à forma como a Musicografia

Braille descreve os eventos musicais.

5.2.1 A leitura de Agrupamentos Complexos nas partituras convencionais

e em braille

Segundo Sloboda (2010, p. 89), a habilidade do músico em detectar um padrão

ou estrutura na partitura está diretamente relacionada com uma boa leitura à primeira vista.

Em uma leitura fluente, os olhos do músico vidente retornam pouco ou nenhuma vez ao

mesmo ponto em uma partitura, pois ele segue adiante sem necessidade de conferir o que

já foi lido.

Como essa varredura do olhar é feita? O movimento dos olhos na leitura

musical não tem sido devidamente pesquisado, contudo há informações muito relevantes

que podemos avaliar. O olhar humano consegue ler o que se encontra dentro de um círculo

de uma polegada (2,54 cm) de diâmetro (a altura de um pentagrama), a uma distância de

30 a 40 cm, distância média que as pessoas tendem a manter o livro afastado do rosto. Fora

desse pequeno espaço no papel, os olhos precisam se mover para colher mais informações

(SLOBODA, 2010, p. 91). Se pensarmos na partitura convencional para piano, com duas

pautas, percebemos que é impossível a apreensão de todas as notas do compasso com

apenas um ponto de fixação do olhar; ou seja, os olhos precisam se mover.

Fazendo uso de métodos especializados, foi possível detectar o caminho que o

olhar do músico vidente percorre na partitura, encontrando diferenças de acordo com o tipo

de escrita. Segue um quadro sobre como os olhos de um músico com leitura fluente

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percorre a partitura convencional.

Figura 33 – (a) Sequencia de fixação vertical na leitura pianística. (b) Sequencia de fixação horizontal na leitura pianística. (c) Exemplo de uma sequencia de fixação observada em progressão de acordes na música pianística (extraído de Weaver, 1943). (d) Exemplo de sequencia de fixação observada em música contrapontística para piano (extraído de Weaver, 1943)

Fonte: Sloboda, 2008, p. 91 Descrição para pessoas com DV – (a) são duas pautas convencionais para piano, com três

pontos na pauta de cima e três pontos na pauta de baixo. Há uma seta saindo do primeiro ponto da pauta de cima em direção ao primeiro ponto da pauta de baixo, numa linha vertical. A partir desse ponto, há uma seta na diagonal em direção ao segundo ponto da linha de cima, que dele sai outra seta vertical para o segundo ponto da pauta de baixo, que dele sai outra seta em diagonal para o terceiro ponto da pauta de cima, que dele sai uma seta vertical para o terceiro ponto da pauta de baixo. (b) As mesmas duas pautas com os mesmos três pontos em cada, mas aqui a seta percorre, sai do primeiro ponto da pauta de cima em direção ao segundo e depois ao terceiro, desse ponto a seta volta para o primeiro ponto da pauta de baixo, que vai para o segundo ponto, que vai para o terceiro ponto. (c) São duas pautas para piano, com quatro grupos de acordes no mesmo compasso. Há linhas fazendo um desenho semelhante ao descrito em (a), substituindo os pontos pelo acorde feito com cada uma das mãos. (d) São duas pautas para piano com uma melodia em cada mão. Há linhas fazendo um desenho semelhante ao descrito em (b), substituindo os pontos pelas notas da melodia.

De acordo com pesquisas feitas por Weaver (1943 apud. SLOBODA, 2010, p.

91), constatou-se que em partituras com acordes nas duas mãos (c), os olhos leem uma UT

por vez, saltando entre as pautas (a). No trecho (d) há duas vozes paralelas e, considerando

a complexidade e a capacidade de memorização do leitor, dentro do mesmo compasso o

olhar percorreu toda a primeira voz dentro do compasso, e depois toda a segunda voz.

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Com isso podemos fazer um paralelo com a escrita musical em braille, pois nos

dois casos ocorre exatamente o mesmo tipo de “coleta de dados”.

No primeiro caso, o caminho da leitura dos acordes feito pelo olhar do músico

vidente (a) se assemelha à narrativa musical que propõem as celas de intervalos (Grau 4)

na escrita braille. Como foi dito antes, o foco da visão não abrange as duas pautas e por

isso os olhos precisam alternar entre elas. Sendo a escrita por acordes, a maneira mais

eficaz de se ler o trecho (c) é passar acorde por acorde, exatamente como faz a

Musicografia Braille nesses casos, embora ela também faça com acordes que estejam na

mesma pauta. De todo modo, a comparação me parece válida.

No segundo caso, a leitura das vozes paralelas (b) é feita lendo cada voz

consecutivamente pelo músico vidente, com leitura à primeira vista fluente, e não de forma

contrapontística. Como já vimos antes, é exatamente assim que acontece na leitura de

vozes simultâneas na escrita braille (Grau 5).

Assim sendo, podemos afirmar que a forma como a Musicografia Braille

descreve os eventos musicais é semelhante ao percurso que o olhar de um músico vidente

com leitura fluente de partituras faz para colher as informações.

Aparentemente, a estratégia geral consiste em identificar unidades estruturais significativas em fixações sucessivas. Na música homofônica, essas unidades são acordes, então é necessário colher amostras de ambos os pentagramas em fixações sucessivas. Na música contrapontística, as unidades significativas são os fragmentos melódicos que se estendem horizontalmente no curso de um único pentagrama. (SLOBODA, 2010, p.92)

Antes de assimilar o grau 5, o aluno com DV precisará ser capaz de ler cada

voz com segurança. Isso não quer dizer que a técnica do “em acorde” não possa ser

compreendida pelo aluno iniciante, mas indica que o seu domínio exige amadurecimento

musical. Após conseguir ler bem as melodias (Graus 1, 2 e 3) e acordes (Grau 4), o novo

desafio desse aluno será entender como duas vozes diferentes soam simultaneamente (Grau

5). Bonilha (2010, p.100) fala sobre essa dificuldade.

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Considera-se que esse tipo de leitura polifônica requer um grau de abstração bastante grande por parte do leitor em braille, dada a ausência de representação bidimensional na partitura. Por isso, este é um conceito que necessita ser bem trabalhado do ponto de vista auditivo.

Nessa perspectiva, a percepção bidimensional é um fator importante para o

aluno com DV desenvolver, mesmo que tal percepção não exista na Musicografia Braille.

A escrita a duas vozes nas partituras convencionais proporciona, por meio da visão, uma

percepção bidimensional quase que instantânea da melodia e do ritmo. Para o aluno com

DV construir a percepção bidimensional de um trecho musical em braille, sendo essa uma

partitura descritiva, ele passa por um processo mental diferente do processo do vidente.

Sendo assim essa percepção bidimensional em música pode ser considerada

relevante para uma leitura fluente em braille. Se compararmos a partitura convencional

com um “gráfico de linha”, a altura das notas iria corresponder à orientação vertical, e o

decorrer do tempo à orientação horizontal. Como exemplo, reveja as Figuras 2 e 3,

comparando-as.

Essa mesma transposição para o gráfico também pode ser feita com um trecho

a duas vozes.

Figura 29 - (recapitulação) - Partitura convencional, trecho com duas vozes paralelas.

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Figura 34 – representação gráfica do desenho melódico da partitura convencional da figura

29, que é o mesmo da partitura em braille da figura 30 Descrição para pessoas com DV: Há cinco linhas representando uma pauta e ao invés de

haver notas musicais, conforme uma partitura convencional, há uma linha azul acima e outra verde abaixo. Elas fazem o desenho melódico da partitura em braille da figura 30. No alto está escrito “Desenho Melódico” e embaixo há uma pequena linha azul e outra verde, respectivamente seguidas do escrito “Voz 1” e “Voz 2”, indicando o que representa cada linha.

No segundo gráfico, cada ponto ao longo da linha corresponde ao tempo de

uma semicolcheia. Com isso se torna possível a observação do contraponto das notas das

duas vozes, e de que maneira esse delineamento é visível na escrita musical convencional;

ou seja, o músico vidente tem a informação bidimensional na própria escrita. Neste ponto

da pesquisa já temos a clara percepção de que o mesmo não acontece na escrita em Braille,

já que o leitor com DV precisa construir mentalmente o desenho bidimensional da melodia

a partir de informações descritivas.

Para apoiar essa tarefa de aprendizagem, Bonilha (2010, p. 57) aponta que se

deve apresentar para o aluno obras polifônicas, como fugas e corais, com o intuito de

inseri-lo no campo da escrita musical de vozes. A aprendizagem de regras de contraponto

também favorece a compreensão da polifonia na leitura em braille.

Esses conteúdos teóricos fazem parte de um campo de estudo que Sloboda

(2008, p. 203) chama de “mecanismos primitivos de agrupamento em música”. Essa área

busca encontrar mecanismos e propensões naturais do sistema auditivo humano, que

podem definir como ouvimos agrupados os sons musicais. Para a aprendizagem, os

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resultados desses estudos demonstram a importância do desenvolvimento perceptivo

quanto à relação entre os sons, não de forma isolada, mas também pela identificação dos

agrupamentos simples e complexos mais significativos.

Sloboda (op. cit., p. 217) afirma que o ouvinte agrupa na memória frases,

melodias e estruturas a partir do reconhecimento de pequenos padrões sonoros ou células

rítmicas, e do reconhecimento das estruturas internas da obra. “A percepção dos eventos

musicais requer do ouvinte atenção para os aspectos gerais do trecho e memória de eventos

passados que tem relações importantes com o material corrente”.

Surge a indagação: como o leitor com DV realiza na prática essa tarefa?

5.2.2 Experiências de um leitor com deficiência visual

Perguntei para o músico pesquisador e orientador dessa pesquisa, Prof. Dr.

Vilson Zattera, algumas questões relativas à sua leitura pessoal. Ele é músico com

deficiência visual e conhece profundamente a Musicografia Braille, usada tanto para a

música erudita quanto para a música popular.

Primeiramente, o método de leitura é relativo à complexidade do trecho a ser

lido, que é variável de acordo com determinadas características da melodia e do ritmo. Por

exemplo, dependendo em qual etapa de cada grau a partitura em questão se encontra, a

dificuldade em memorizar pode se maior ou menor. De acordo com essa complexidade e

com a capacidade pessoal de memorização do leitor, ele poderá ler uma UT por vez,

mesmo que elas estejam fragmentadas dentro do compasso (Grau 5), fazendo com o que

um mesmo trecho seja lido mais de uma vez para não se perder na partitura.

A necessidade de se ler o mesmo trecho musical mais de uma vez, indo e

voltando na partitura, é porque, embora haja o uso do “em acorde total”, faz-se necessário

ler cada UT por completo antes de seguir para a próxima. Casos assim acontecem quando,

em cada UT, o trecho musical tem notas com valores de tempo diferentes entre si e/ou

entre as duas vozes, além de informações adicionais de dinâmicas. Ou seja, quando a UT

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está fragmentada e é mais rica em detalhes, a leitura é feita na primeira UT de cada voz

para se compreender como elas se relacionam apenas nesse tempo. Um trecho com poucas

notas, melodias com menos saltos intervalares (Grau 3) e uma boa memória musical são

fatores que facilitam ler mais UT’s “ao mesmo tempo”, dentro de um compasso em braille.

Nesse contexto, ter um bom solfejo e conhecer teorias sobre harmonia tonal

podem realmente contribuir para melhorar a leitura de vozes simultâneas em braille. O

solfejo permite ao leitor ouvir o que está sendo lido sem a ajuda intermediária de um

instrumento, e a harmonia permite reconhecer padrões de arpejos, escalas e cadências de

acordes. Podemos presumir que quanto mais próxima de escalas e arpejos é a melodia

(questão relativa ao campo harmônico), mais simples deverá ser a memorização do trecho.

Detectamos que a memória mecânica/espacial do instrumentista também deve

ser incluída como uma capacidade que auxilia na leitura. Ao ler um trecho, o músico com

DV pode imaginar o gesto físico que deverá ser feito para sua execução em seu

instrumento, assim como pode fazer o músico vidente, tarefa que pode ajudar na

memorização.

A percepção da polirritmia também é uma habilidade importante a ser

desenvolvida no aluno com DV, pois facilita o reconhecimento de como soaria a

superposição das vozes ainda na fase do solfejo.

Esses pontos foram levantados a partir de conversar com leitores de partituras

em braille e observações pessoais; contudo, esses pontos precisarão ser aprofundados de

forma mais completa por outras pesquisas. Aqui nos limitaremos apenas a citá-los.

5.2.3 Quadro das Etapas

A partir desses dados, podemos formar o quadro de etapas do grau 5. No grau

5 as etapas não se destinam a propor uma progressão, mas a relacionar os tópicos que a

compõem.

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Tabela 6 - Etapas do Grau de Dificuldade 5

Etapas  do  grau  de  dificuldade  5  

Descrição  do  conteúdo  

1   Percepção  bidimensional  da  linha  melódica  

2   Agrupamentos  simples  (aprofundamento  do  grau  2)  

3   Agrupamentos  complexos  (estruturas  musicais)  

4   Contraponto  (superposição  de  linhas  melódicas)  

5   Polirritmia  (superposição  de  linhas  rítmicas)  

6   Harmonia  tonal  e  polifonia  

7   Memória  mecânica/espacial  em  um  instrumento  musical  

8   Solfejo  

Muito professores defendem que o contato do aluno com DV com a escrita

convencional deve ser feito porque isso ajuda na comunicação com os músicos videntes,

além de contribuir para que se compreenda melhor a formação da Musicografia Braille,

gerando a curiosidade de conhecer esse sistema.

Contudo, na minha opinião, o primeiro contato com os conceitos musicais pelo

aluno com DV deve ser feito através do sistema braille, deixando em caráter secundário as

partituras convencionais. Dessa forma, a cognição do músico com DV fica fundamentada

em conceitos próprios do sistema braille, de acordo com a própria escrita braille, e não

com o sistema convencional de “partituração”.

5.3 As Etapas do Grau 5 são Conteúdos Complementares à todo o ensino em

braille

No entanto, as etapas do grau 5 deveriam ser vistas gradativamente, mas em

profundidade, desde o grau 1, quando pequenas inserções desse conteúdo começariam a

ser gradualmente enxertadas nos exercícios e nas explicações. Como esse conteúdo é

complexo e envolve muita prática, ele não deve ser introduzido de uma só vez após o grau

4. Essas etapas do grau 5 também poderiam ser chamadas de conteúdos complementares.

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Encarar dessa forma essas etapas como conteúdos gerais tem se revelado uma

alternativa natural para o ensino de conceitos teóricos mais complexos. Geralmente são

assuntos que podem ser aprofundados à medida que são revisitados em sala de aula, ou

simplesmente inseridos quando se faz necessária a sua utilização.

Há alguns tópicos que também podem ser incluídos nos conteúdos

complementares e que não se encontram nas etapas do grau 5. São eles: “nuances,

ligaduras, dedilhados, dinâmica, ornamentação. Há também que se destacar variadas

formas de abreviações comumente utilizadas em braille, incluindo: repetições parciais,

abreviação de sequencias, duplicação de símbolos” (BONILHA, 2010, p.58).

Mesmo que o aluno aprenda formalmente todas essas técnicas e regras de

escrita, a real compreensão se desenvolve de forma muito pessoal, exigindo tempo para a

aquisição de experiência e maturidade na escrita e leitura de partituras em braille.

Por exemplo, o dedilhado pode ser visto tanto no grau de dificuldade 1 quanto

no grau de dificuldade 2 ou 3. Isso vai depender dos objetivos e planejamento do

professor. O momento da sua abordagem deve ser escolhido de acordo com o

desenvolvimento das aulas e instrumento utilizado, com o intuito de facilitar ou criar novos

desafios para o aluno durante o seu aprendizado, enriquecendo e renovando o interesse do

aluno pelas aulas.

O assunto das tonalidades e armaduras de clave (Grau 5 - Etapa 6) também

pode ser tratado dessa forma. Ambos podem ser apresentados no decorrer das aulas, de

acordo com as partituras escolhidas pelo professor. O aluno não precisa conhecer de uma

só vez todas as armaduras de clave de todos os tons sustenidos e bemóis, elas podem ser

introduzidas gradativamente no decorrer dos diferentes graus de dificuldade.

Conforme os dados levantados até aqui, esta seria a tabela dos conteúdos

complementares:

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Tabela 7 – Conteúdos Complementares

Tabela  7  –  Conteúdos  Complementares    

Descrição  do  conteúdo  

1   Nuances  

2   Ligaduras  

3   Dedilhados  

4   Dinâmica  

5   Ornamentação  

6   Repetições  

7   Abreviação  de  sequencias  

8   Duplicação  de  símbolos  

9   TODAS  AS  ETAPAS  DO  GRAU  5  

Vale salientar que as ligaduras, que são sinais expressivos importantes para os

iniciantes, mas que podem trazer certa complexidade para a escrita, podem ser

introduzidos nas aulas de forma lúdica, sem a necessidade da escrita. Poderia ser, por

exemplo, apresentado em uma aula o conceito das ligaduras em uma melodia, mas sem que

fossem escritas em braille, apenas enfatizado musicalmente o fraseado existente nas

músicas estudadas.

Esse mesmo procedimento poderia ser feito com as nuances, dedilhado,

dinâmica e ornamentação.

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CAPÍTULO 6 - QUESTIONAMENTOS CONCLUSIVOS

As perguntas a seguir estão presentes ao longo deste texto, e aqui são

retomadas para serem respondidas à luz dos resultados dessa pesquisa. Essas respostas não

devem ser consideradas como definitivas, uma vez que esse campo é novo e muitos

estudos ainda devem ser formulados. Algumas questões até poderiam ser respondidas de

outras maneiras, mas aqui será dada uma visão geral sobre as inquietações que moveram

este trabalho e as respostas obtidas nos estudos consultados.

1) Como a ausência do sentido da visão influencia na aprendizagem musical

das pessoas com DV?

A capacidade de aprendizagem das pessoas com DV é realizada através do tato

e da capacidade da comunicação verbal, sendo essas as duas vias de maior importância

para o entendimento de novos conceitos ou ideias (cf. COLL et al, 1995).

Também percebemos que a audição não se torna mais aguçada ou

superdesenvolvida; ocorre que a pessoa cega, por estar privada de um importante canal de

percepção do mundo, é capaz de extrair mais informações das variações sonoras do

ambiente, já que se concentra, de maneira mais detida, nessa via sensorial. Esses mesmos

sinais chegam para as pessoas videntes, que em geral não conseguem aproveitar tão

profundamente seus significados, por nunca terem precisado usar esse sentido de forma

isolada.

A capacidade musical ou a musicalidade também não é alterada, sendo mais

relacionada com a história de vida de cada pessoa com relação à música ou ao fazer

musical (cf. OLIVEIRA, 2013 e HERRERA, 2010)

A diferença entre a aprendizagem das pessoas com ou sem DV está apenas nas

vias sensoriais pelas quais ela acontece, pois para ambas essa assimilação acontece por

meio da experiência com o mundo, na relação com o outro. Dessa forma, o ensino

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especializado deve cuidar para transmitir informações que valorizem os sentidos certos

para a construção do conhecimento nas pessoas com DV, de maneira a não perder o

objetivo final, que deverá ser comum a todas as pessoas, de forma suficiente para que a

comunicação possa ser estabelecida natural e fluentemente. No nosso caso, esse sistema

sígnico, comum às pessoas com DV e às videntes, são os conceitos musicais grafados em

braille.

2) É fundamental desenvolver metodologias musicais diferenciadas para

pessoas com DV? Não basta transcrever um método musical convencional para o sistema

braille?

As partituras convencionais são escritas musicais que se assemelham a gráficos

de linha, usando a orientação vertical para as alturas de notas e horizontal para o tempo,

entre outras indicações paralelas. As partituras em braille são explicitamente descritivas,

narrando os eventos musicais de forma organizada e precisa, conforme as partituras

convencionais a que se referem. Perceber isso deve ser suficiente para compreendermos a

importância da utilização de métodos musicais exclusivos para a Musicografia Braille, ou

que ao menos a considere para tornar um processo de aprendizagem musical inclusivo

junto a alunos videntes.

Por esse mesmo motivo, transcrever um método de música baseado nas

partituras convencionais para o sistema braille se torna inapropriado para um ensino

especializado que pretenda adentrar a Musicografia Braille.

3) Há métodos especializados nesse ensino?

Por ser um campo de estudo ainda recente, temos disponíveis muitos relatos de

experiência, que geralmente não são referências entre si. Entre esses, poucos fazem uso do

ensino da Musicografia Braille, se restringindo a desenvolver atividades musicais ou a

simples prática de um instrumento sem a utilização de partituras em braille.

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Verificamos que os métodos musicais tradicionais não tratam do ensino de

partituras em braille. Encontramos nas experiências de Rodrigues (2014), Chávez (2010),

Silva e Araldi (2010), Junior (2010), Herrera (2010) e Bohn (2008) relatos de como

lidaram com a tarefa de ensinar música para pessoas com deficiência visual, mas nenhum

deles trata do ensino da Musicografia Braille.

Poucos materiais tratam diretamente desse assunto, havendo ainda muito a ser

experimentado e pesquisado.

4) Existem programas de computador que criam partituras em braille e que

poderiam ajudar nessas aulas especializadas?

Os programas de computador podem auxiliar na parte prática das aulas,

ajudando a criar exercícios, fazer correções rápidas, ouvir o que está sendo escrito pelo

aluno, etc. Podem ser ótimas ferramentas para o aluno criar suas músicas, fazer anotações

em aulas ou imprimir partituras, em braille ou em formato convencional. No entanto, os

programas trabalham muito bem somente até determinado grau de dificuldade. O

MusiBraille (programa gratuito já citado anteriormente), por exemplo, atualmente abrange

até o grau 3, com qualidade. Já no grau 4, ele consegue escrever em braille e soar o que foi

escrito, porém o visor que mostra a correspondência na escrita musical convencional ainda

não funciona corretamente, o que pode reduzir o caráter inclusivo de uma aula, já que não

permite ao professor vidente (não conhecedor de braille) ler o que o aluno com DV

escreveu. Esse programa ainda não trabalha com o grau 5, e alguns dos conteúdos

complementares não são atendidos.

Já o programa pago GoodFeel Music Translator atende até o grau 5 com

precisão, transcrevendo partituras convencionais digitalizadas no Lime Aloud Music

Notation ou importando-as através do formato “MusicXML”. Há nele uma rica gama de

opções para transcrição. A edição ou escrita feita diretamente em braille pelo GoodFeel

pode ser feita apenas pelo aparelho Braille Display27, de custo muito elevado. Esse

27 Aparelho que, ao ser conectado no computador, mostra em uma linha de pontos salientes a

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programa não transforma o teclado do computador na digitação Perkins (já dito

anteriormente), o que dificulta a correção após a transcrição de arquivos importados.

De todo modo, o uso de softwares especializados não interfere diretamente na

metodologia de ensino especializada. O planejamento atento às particularidades das

partituras em braille deve estar sempre orientando o uso das tecnologias, para que a

formação musical do aluno seja alicerçada nos principais conceitos e habilidades que a

Musicografia Braille exige de seu leitor.

5) Como as universidades têm lidado com a questão da inclusão quando um

aluno com DV busca entrar em seus cursos de música? Quais as questões e problemas que

emergem nessas situações de vestibular?

As universidades brasileiras não estão prontas para receber alunos com DV em

seus cursos de música. Nelas não existem programas fixos de Musicografia Braille que

possam promover iniciativas para atrair interessados e, posteriormente, acompanhá-los ao

longo de sua jornada acadêmica. Apenas quando há a inscrição de um aluno com DV para

o vestibular é que os professores parecem refletir acerca da questão, e procuram aplicar

provas mais justas, nas quais o intuito é avaliar o potencial do aluno, verificar se ele tem os

conhecimentos e habilidades musicais mínimas esperadas.

Se um aluno com DV é aprovado, surge um impasse para o professor e o corpo

docente da universidade: como ministrar aulas para ele? Geralmente há duas alternativas:

cria-se um grupo especializado para dar assistência ao aluno (que costuma ser dissolvido

assim que o aluno se forma, como temos visto ocorrer), ou cada professor procura incluir o

aluno da maneira que é capaz, ou acredita ser possível, num lamentável método quebra-

galho.

Algumas universidades possuem núcleos de apoio à acessibilidade que

linha em que o cursor está na tela do computador. Permite ler e digitar em braille, assim como acessar todas informações do computador. Mais informações: https://www.humanware.com/en-usa/products/blindness/braille_displays.

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geralmente facilitam essa tarefa, no entanto, especificamente para a música, é preciso o

apoio de especialistas em Musicografia Braille. Mas como esse campo é recente, existem

poucos profissionais disponíveis e poucas pesquisas com resultados efetivos.

Dessa forma é complicado pressupor se o curso facilitou ou dificultou a

entrada de alunos com DV devido a questões culturais, crenças errôneas, posturas pessoais,

preconceitos, etc. Tais variáveis podem fazer com que uma avaliação, que pretenda ser

equânime com todos os candidatos, se torne mais difícil ou mais fácil para as pessoas com

DV.

De modo geral, considerando uma prova que se tornou mais difícil,

poderíamos imaginar que a banca examinadora exigiu que o aluno demonstrasse estar

preparado para realizar a sua própria inclusão no curso, já estando apto para enfrentar os

desafios intrínsecos a esse campo. Se considerarmos uma prova que se tornou mais fácil,

isso pode transmitir a sensação de que teria sido dada uma oportunidade para que o aluno

se forme da maneira que for possível, já que não há como a banca saber o que de fato é

importante para a sua formação como músico com DV. Podem considerar “muito difícil”

ler e ensinar partituras em braille, caracterizando tal conhecimento como secundário na sua

formação, e por vezes facilitar a oportunidade de estudos como uma aparente inclusão ou

assistencialismo.

Nos dois casos apresentados acima, pode ter havido um excesso na suposição,

mas são duas situações que poderiam coexistir num mesmo grupo de professores que

recebem alunos com DV. Ao buscarem por alternativas para conceber uma prova justa e

demonstrar que valorizam a acessibilidade tratando todos igualmente, esquecem que o

“tratamento igualitário” já não acontece na formação musical de base, e que uma “prova

imparcial” é, na verdade, socialmente injusta, já que o próprio princípio da igualdade

defende que devemos tratar “igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida

de suas desigualdades”.

Portanto, é necessário um estudo mais aprofundado da realidade da música na

vida das pessoas com DV para realizar uma real acessibilidade na própria formatação dos

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cursos de música. A atuação de especialistas desse campo, nesse tipo de situação, se torna

essencial e exige tempo de preparo e reformulação do curso, não podendo ser

legitimamente feito às vésperas de uma prova de vestibular.

6.1 Considerações finais

A classificação das partituras, conforme os cinco graus de dificuldade, foi

baseada nos sete tópicos apresentados por Bonilha (2010, p. 52 et seq.) ao buscar delinear

o aprendizado da Musicografia Braille. Então, com partituras atribuídas a cada um desses

graus, fizemos análises alicerçadas na Teoria Sistêmica de Produção (ANDERSON,1981,

1982 apud. SLOBODA, 2010, p. 285) com o intuito de ressaltar os conceitos que estão

presentes em cada partitura em braille. Os resultados obtidos das análises formam quadros

com a subdivisão de cada um dos 5 graus de dificuldade em etapas, propondo um

encadeamento de conceitos que não são necessariamente contínuos.

Essa característica é conferida aos quadros aqui expostos se considerarmos a

notação musical em um plano inferior ao da musicalidade, de forma a permitir ao professor

escolher o que deve ser ensinado ao aluno em determinado momento do aprendizado.

Essas tabelas devem lhe servir como “conselheiros” ao apontar os conteúdos que compõem

cada desafio de aprendizagem da Musicografia Braille.

Com base nas classificações de grau de dificuldade e suas respectivas etapas,

esperamos que os dados apresentados nesta pesquisa sejam úteis para professores de

Musicografia Braille aos lhes fornecer parâmetros para estruturar seu planejamento de

aula, de maneira a que suas aulas ganhem mais qualidade ao se voltarem para os conceitos

que compõem cada desafio de aprendizagem, e para as habilidades mais importantes para o

leitor do braille, lembrando que alguns desses pontos não têm a mesma relevância que têm

para os músicos videntes.

Esse suporte teórico também pode favorecer cursos de música aos lhes oferecer

fundamentos para reestruturar sua grade curricular, ou criar um novo curso, de forma que

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pudesse atender às necessidades do músico que irá trabalhar com partituras em braille,

assim como possibilitar a elaboração de provas de admissão com mais paridade de

condições entre as pessoas com e sem DV.

Nesse caso, por exemplo, uma universidade que queira ter um curso de

Musicografia Braille para pessoas com DV poderia oferecer para a comunidade local

cursos preparatórios de música para o vestibular em braille. Nessas aulas poderia ser

ensinado até o grau de dificuldade 3, sendo então razoável cobrar em uma prova de aptidão

questões que abordem os conceitos pertencentes aos graus 1, 2 e 3. Nada impede incluir na

prova questões que avaliem a capacidade do aluno em compreender os graus 4 e 5, desde

que sejam avaliadas apenas as suas capacidades cognitivas, sem envolver diretamente a

leitura de partituras desses graus mais avançados, tendo em vista que esses graus serão

vistos dentro do curso.

Dessa forma, a parte teórica da grade curricular desse curso seria voltada para

aprimorar os graus 1 ao 3, ensinar e aprofundar os graus 4 e 5 e desenvolver ao longo do

curso os conteúdos complementares. A parte prática desse curso também poderia ter

relação com esse planejamento, mas de forma mais flexível.

Ao final desse curso, o aluno precisará ter assimilado e praticado todas as

etapas que compõem cada um dos cinco graus de dificuldade e dos conteúdos

complementares para ter uma formação teórico-musical sólida. O curso deve proporcionar

a esse aluno o contato gradativo e sistemático com todos os desafios de aprendizagem da

Musicografia Braille, ajudando-o a vencer cada um deles.

Para o ensino da Musicografia Braille acontecer de forma efetiva, constatamos

que se faz necessária uma metodologia especializada, por se tratar de um sistema diferente

do qual os músicos videntes alicerçam o seus conhecimentos teórico-musicais. Claramente

vimos que não basta fazer uma tradução para o braille dos métodos tradicionais da

educação musical, sem que haja a devida atenção e sem alguns conhecimentos do campo

da acessibilidade.

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A confecção de partituras em braille também exige a participação de um

especialista para que a partitura transcrita atenda às necessidades de seu objetivo, que pode

ser para uma prova, uma aula ou um método para estudantes de níveis diferentes. Para a

prova deve se considerar o que será avaliado no aluno, quais os pré-requisitos que se

espera que o aluno tenha e o que o curso pode oferecer para a sua formação final. As

partituras de uma aula devem estar de acordo com o conteúdo que já foi assimilado e o que

se pretende nesse ponto do ensino, assim como o instrumento musical que o aluno utiliza,

a sua compreensão dos conteúdos complementares e dos diferentes formatos possíveis de

partitura.

Questões sobre a formatação das partituras em braille não fizeram parte deste

estudo por tratar de outro tipo de complexidade, que foge ao escopo proposto. No entanto,

poderíamos classificá-las como sendo do grau de dificuldade 5, porque tangem questões

relativas às vozes paralelas, assunto sem dúvida importante para os estudos acerca das

partituras de piano e o seu ensino, que trabalham com duas pautas, e também para análises

de peças com formações instrumentais diversas.

A progressão no uso das formatações de partituras em braille para pianistas

iniciantes é um tema para outro estudo, dada a sua nova gama de possibilidades de

avaliações e observações. A análise de peças em braille escrita para mais de um

instrumento é tarefa para estudantes avançados de música, o que também requer novas

pesquisas apenas para esses temas. Dessa forma, temos aqui duas sugestões de trabalhos

que podem ser desenvolvidos nesse campo de estudo.

Constatamos trata-se de campo de estudo novo no Brasil, e por isso os estudos

especializados no ensino da Musicografia Braille são poucos se comparados aos de outros

campos do universo da educação musical. No entanto, já há um saber construído a partir de

várias experiências relatadas, conversas com professores brasileiros de Musicografia

Braille com e sem DV, retorno de alunos a respeito do aprendizado obtido, assim como

comparações produtivas com outros campos do conhecimento, como o que fizemos nesta

dissertação.

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Atualmente estão surgindo pesquisas em diversas universidades brasileiras

sobre esse assunto. Em breve será producente fazer uma leitura e síntese de tudo o que tem

sido feito com o intuito de encontrar os assuntos para o quais essas pesquisas ainda não se

voltaram, apontado onde novas pesquisas ainda podem nos trazer mais entendimento. O

desenvolvimento de métodos em braille para instrumentos musicais também é um campo

ainda muito pouco explorado, com grande potencial de expansão, seja para o nível

iniciante, intermediário ou avançado.

Além disso, é necessário criar ações de efeito prático dentro e fora das

universidades, divulgando a Musicografia Braille, ofertando cursos de musicalização para

pessoas com DV, cursos de instrumentos para alunos iniciantes com partituras em braille e

estruturando cursos de conservatórios e de graduação, para que músicos com uma

instrução consistente na utilização das partituras em braille possam ser formados.

A tendência internacional em abandonar o braille em prol do uso da voz

gravada ou sintetizada é um assunto muito debatido desde o advento das tecnologias

inclusivas. Esse assunto é extenso e não entraremos em detalhes nesta pesquisa.

Resumidamente, segundo Souza (2001), se vê de um lado pessoas com DV que defendem

veementemente o uso do braille, em geral pessoas com mais estudo e com melhores

oportunidades de trabalho e que geralmente atribuem o seu sucesso ao conhecimento do

braille, e do outro lado entusiastas da informática que desqualificam o braille, contribuindo

para a disseminação de mitos que apontam o braille como antissocial e segregador, que não

pode ser impresso em cores, que não é atraente, que não pode reproduzir gráficos, que é

difícil a sua descodificação para a leitura ocular, além de outros mitos que revelam

profunda desinformação acerca do assunto. Segundo Souza (2001):

O sistema braille não é um sistema fechado e anti-social; fechadas são as políticas de produção do texto braille, que geralmente não providenciam livros didáticos e outros em tempo real, trazendo à criança cega o desconforto de ser discriminada todos os dias, nas escolas regulares de ensino, ou de ter acesso à escolarização de um modo muitas vezes defasado, nos estabelecimentos especiais de ensino. O braille precisa ser descoberto em suas possibilidades estéticas; a pedagogia precisa inventar estratégias que recuperem na criança cega e nos professores, o amor por

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essa conquista. Os livros precisam ser instrumentos que despertem o prazer da leitura e do manuseio. Finalmente, para os que acham o braille intratável aos olhos, as novas tecnologias de impressão já permitem o braille a cores e também já é possível a ampliação dos pontos, para uma leitura ótica mais adequada.

A opinião de pesquisadores do campo sobre o Sistema Braille é que as

tecnologias devem ser incluídas na vida das pessoas com DV junto ou após a

alfabetização. Elas devem servir como apoio e não como substituto (ARAUJO, 2013).

Segundo Moysés Bauer, presidente da Organização Nacional dos Cegos do Brasil

(CARDOSO, 2010) “A tecnologia é um elemento de inclusão social no País”, diz. “Mas é

preciso cuidado para que não haja uma desbrailização por conta dá má utilização dessas

inovações”.

Nesse sentido, para o campo da Musicografia Braille, a meu ver, as tecnologias

apresentam mais alternativas de registro e expansão de possibilidades de seu uso, além de

viabilizar transcrições de partituras convencionais para o braille, e vice-versa. Por ser o

sistema de escrita musical em braille descritivo, como vimos ao longo dessa pesquisa, se o

colocarmos em um ambiente onde não se escreve em braille, a Musicografia poderia ser

transformada em um estudo sobre “como descrever uma partitura” ou “Musicodescrição”.

Isso é plausível, porque cada cela de uma partitura em braille pode ser narrada

ao invés de escrita, bastando manter a ordem original das celas e informando apenas o que

elas representam. Isso pode ser feito tanto a partir de uma partitura em braille quanto de

uma partitura convencional. Por exemplo, se neste momento gravássemos uma descrição

de uma partitura em braille, narrando as celas corretamente, um leitor de partituras em

braille poderia compreender perfeitamente o que está sendo transmitido.

Essa forma de trabalhar com as partituras em braille também poderia

desenvolver a capacidade do aluno com DV em ler partituras, como um exercício, pois traz

novas formas de perceber um assunto já conhecido, além de permitir novas possibilidades

de utilização, ainda desconhecidas. Certamente, esse tipo de exercício poderia ser feito

com músicos videntes, proporcionando-lhes novas formar de perceber a própria grafia

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convencional e impulsionando o desenvolvimento de novas técnicas de ensino musical.

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Apêndice I - Introdução à Musicografia Braille

Esse apêndice pretende apresentar os principais tópicos e questões sobre a

Musicografia Braille de forma breve, dando exemplos e referências para consultas no

próprio Manual Internacional de Musicografia Braille (KROLICK, 2004), que também

serviu de base para a elaboração deste texto e de onde foi tirado alguns dos exemplos

usados a seguir. Tais exemplos serão indicados pela sua página e número do texto original,

as imagens sem citação foram criadas pelo próprio autor do texto.

Não há aqui sugestão de exercícios para o desenvolvimento desses conteúdos,

e nem a sua organização está de acordo com o ensino para pessoas com deficiência visual,

se concentrando apenas em servir para consultas por conhecedores desse sistema ou que

queiram brevemente se inteirar da natureza dessa grafia.

Afirmo que o músico vidente que sabe ler partituras convencionais terá

considerável facilidade para compreender o sistema, e sua tarefa será aprender como as

regras da escrita já conhecida serão transpostas para a escrita em braille, consultando no

texto a seguir a sua correspondência e regras de uso.

1 O Sistema Braille

O sistema baseia-se na formação de seis pontos em relevo, que formam a cela

braille, configurada e numerada da seguinte forma:

Estes 6 pontos formam 63 combinações diferentes, com as quais se repetem as

letras do alfabeto, os sinais de pontuação, os números, a notação musical e científica.

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A simplicidade do alfabeto braille permite grande facilidade de aprendizagem.

Conhecendo-se dez sinais da primeira linha, que estão colocados na parte superior da cela

(pontos 1, 2, 4 e 5), já se tem a base para 50 combinações.

a b c d e f g h i j

A segunda linha é derivada da primeira, acrescentando-se o ponto 3.

k l m n o p q r s t

A terceira linha forma-se pelo acréscimo dos pontos 3 e 6.

u v x y z ç é á è ú

A quarta linha é formada pela primeira linha com o acréscimo do ponto 6.

â ê ì ô ù à ï ü õ ò ou w

A quinta linha é formada pela transposição da primeira linha para a posição

inferior dos pontos na cela.

, ; : . ? ! ( ) “ * ”

Celas além das cinco linhas:

í ã ó

Todas as letras são reconhecidas como minúsculas. Para maiúsculas, uma cela

com os pontos 4 e 6 é colocada anteriormente.

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O Sistema Braille é empregado por extenso, isto é, escrevendo-se a palavra,

letra por letra ou de forma abreviada, adotando-se o código especial de abreviaturas para

cada língua ou grupo linguístico. O braille por extenso é denominado grau 1 ou integral. O

grau 2 é a forma abreviada, empregada para representar as conjunções, preposições,

pronomes, prefixos, sufixos e grupos de letras que são comumente encontrados nas

palavras de uso corrente. A principal razão de seu emprego é reduzir o volume dos livros

em braille e permitir o maior rendimento na leitura e na escrita. Uma série de abreviaturas

mais complexas forma o grau 3, que requer conhecimento profundo da língua, boa

memória e sensibilidade tátil muito desenvolvida por parte do leitor cego.

No que se refere ao Sistema Braille abreviado, é importante ressaltar que, por

orientação da Comissão Brasileira de Braille Integral e Abreviado, com base nos

resultados obtidos na pesquisa sobre a aceitação ou não do Sistema Braille Grau 2 da

Língua Portuguesa pelos leitores cegos brasileiros, está totalmente abolido o uso desse

sistema na transcrição de quaisquer obras pelos centros de produção e imprensas Braille do

Brasil, a partir de 1º de janeiro de 1996. A Comissão Brasileira de Braille Integral e

Abreviado recomendou, ainda, a elaboração de um sistema padronizado de abreviaturas

braille da Língua Portuguesa, para ser usado exclusivamente na escrita individual. Esse

sistema está sendo preparado por técnicos devidamente capacitados.

2 Notas musicais e pausas

Uma única cela braile indica a nota musical e o seu tempo, sendo que cada

linha do sistema braile remete a dois tempos musicais diferentes. Os valores conjugados

são: semibreve com semicolcheia, mínima com fusa, semínima com semifusa e colcheia

com quartifusa.

Para definir qual valor de tempo está sendo representado, deve-se observar o

número de vezes que ele incide no mesmo compasso, o que geralmente é o suficiente. Nos

casos em que existir ambiguidade, haverá um símbolo especial indicando se o que vale é o

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valor menor ou o maior (cf. KROLICK, 2004, p. 19)

As notas correspondem da quarta à décima cela de cada linha, respectivamente

de “dó” a “si.” São elas:

- Colcheias - primeira linha braile a partir da quarta cela.

Dó Ré Mi Fá Sol Lá Si

- Mínimas e fusas - segunda linha braile a partir da quarta cela (acréscimo do

ponto 3).

Dó Ré Mi Fá Sol Lá Si

- Semibreves e semicolcheias - terceira linha braile a partir da quarta cela

(acréscimo dos pontos 3 e 6).

Dó Ré Mi Fá Sol Lá Si

- Semínimas e semifusas - quarta linha braile a partir da quarta cela (acréscimo

do ponto 6).

Dó Ré Mi Fá Sol Lá Si

As pausas seguem o mesmo compartilhamento de significado de tempo que as

notas.

Colcheia (pontos 1, 3, 4 e 6)

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Mínima / Fusa (pontos 1, 3 e 6)

Semibreve / Semicolcheia (pontos 1, 3 e 4)

Semínima / Semifusa (pontos 1, 2, 3 e 6)

3 Compasso

No braille, os números são indicados com as celas da primeira linha

antecedidas pela cela (pontos 3, 4, 5 e 6). Ou seja:

1 = 2 = 3 = 4 = 5 = 6 = 7 = 8 = 9 = 0 =

O sinal de compasso vem no começo da partitura, assim como na partitura

convencional. A Unidade de Tempo (UT) é o sinal numérico correspondente, deslocado

uma linha abaixo na cela braille. A Unidade de Compasso (UC) é escrita sem alterações.

Exemplos de compassos:

A mudança de compasso é indicada pelo uso da cela em branco. Há casos de

partituras que, após a indicação de compasso, há um espaço em branco, que logo já é

seguido por notas. Em outros casos, após a escrita do compasso, as notas começam na

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próxima linha. Um ou outro é mera questão de escolha pessoal do transcritor ou do leitor

quando pode optar por essa formatação.

4 Alterações de nota

Aparecem antes das notas, assim como na partitura convencional. Os sinais

valem até o final do compasso ou até serem anulados ou trocados por outro sinal de

alteração ou acidente.

Sustenido m (pontos 1, 4 e 6)

Bemol b (pontos 1, 2 e 6)

Dobrado sustenido z (duas celas de sustenido seguidas)

Dobrado bemol bb (duas celas de bemol seguidas)

Bequadro n (pontos 1 e 6)

5 Armadura de Clave

É necessário o conhecimento da sequência dos sustenidos e dos bemóis.

Após a indicação do compasso se encontrará a armadura de clave.

Bemóis: si, mi, lá, ré, sol, dó, fá / Sustenidos: fá, dó, sol, ré, lá, mi, si

Sol Maior Ré Maior

Lá Maior Mi Maior

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Como visto no exemplo, acima de três alterações na armadura, usa-se

indicação de número antecedendo a alteração em questão.

Réb Maior Solb Maior

6 Ponto de Aumento

Usado logo após a nota pontuada: (ponto 3)

Ponto duplo de aumento

Usado logo após a nota pontuada: (ponto 3; ponto 3) Ex:

7 Fermata

Inserir depois da nota a ser prolongada: (pontos 1, 2 e 6; pontos 1, 2 e

3). Ex.:

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8 Andamentos

Toda palavra de uma partitura convencional deve ser escrita em braile.

Nesses casos as celas que representam letras deverão ser precedidas pelo “Sinal de

Palavra” ou “Prefixo Literário”, representado pela cela: (pontos 3, 4 e 5).

Isso vale para letras isoladas, abreviaturas, palavras completas ou grupo de

palavras.

Para uma ou duas palavras usa-se o Prefixo literário antes de cada uma. Caso

seja uma frase grande, usa-se o sinal antes da primeira palavra e novamente após a última.

Na continuação vem um espaço em branco, e a nota que segue vem com indicação de

oitava.

A língua padrão para a escrita em partituras em tinta é o italiano, também

respeitada em braile.

-Allargando -Rallentando

-Ritardando -Ritenuto

-Accelerado -Affretando

-Stringendo

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Andamento indicado por metrônomo

9 Ligaduras

As ligaduras possuem funções diferentes de acordo com o instrumento. Para as

cordas significam mudanças no sentido arco; nos metais, os lugares onde se respira, assim

como no canto e nas madeiras; no piano é uma questão sensível de sonoridade.

Ligadura de prolongação para uma nota

(ponto 4; pontos 1 e 4)

Usada entre notas de mesma altura para somar os seus valores. Estando

separadas por mudança de compasso, esse sinal aparece apenas sucedendo a primeira nota.

Para maiores detalhes: cf. KROLICK (2004, p. 55). Ex.:

Ligadura de expressão entre notas ou acordes

(pontos 1 e 4)

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É usado para ligaduras até quatro notas. O sinal a seguir aparece depois de

cada nota, exceto da última. Assim ele fica entre todas as notas que estão ligadas. Ex.:

Quando há mais de quatro notas dentro da mesma ligadura, temos duas

opções:

Ligadura de fraseio para mais de quatro notas ou acordes

A primeira opção é indicar duas vezes a cela anterior depois da primeira nota

ligada, e uma vez antes da última nota ligada. Exemplo (KROLICK, 2004, p. 50, exemplo

6.3 [a]):

Forma alternativa de expressar a ligadura anterior

A segundo opção são as celas (pontos 5 e 6; pontos 1 e 2) antes da nota onde

começa a ligadura, e as celas (pontos 4 e 5; pontos 2 e 3) depois da nota onde termina a

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ligadura. Exemplo (ibid., p. 50, exemplo 6.3 [b]):

Quando há uma ligadura maior e outras menores dentro daquela, usa-se a

segunda opção acima para a maior, e a primeira (para a de até quatro notas, ou mais de

quatro) representando as ligaduras menores. Exemplo (ibid, p. 51, exemplo 6.4):

Fim de uma ligadura e começo de outra sobre a mesma nota

Usam-se as duas celas vistas anteriormente, as duas que iniciam e as duas que

terminam o período da ligadura, sem espaço e antecedendo a nota em questão. Exemplo

(ibid., p. 51, exemplo 6.5 [a]):

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Final e princípio de ligadura curta sobre uma nota

Após a nota em questão, usamos as celas (ponto 6; pontos 1 e 4). Exemplo

(ibid., p. 51, exemplo 6.5 [b]):

Ligaduras para acordes serão vistas adiante, após a escrita de acordes. Há

outras ligaduras para mudança de voz e de pentagrama, cf. KROLICK (2004, p. 59).

10 Claves

Devido à sinalização de oitava, o sinal de clave é dispensável para o

entendimento de uma partitura, no entanto, temos celas que correspondem às claves em

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braile, visando viabilizar a comunicação, aulas e estudos entre músicos usuários de ambas

as grafias, a convencional e a em braille.

O sinal de clave aparece somente no começo do primeiro compasso da

partitura, ou quando a original em tinta mudar de clave. Se a cela seguinte à clave tiver

quaisquer dos pontos 1, 2 ou 3, deve-se usar uma cela com o ponto 3 no seu final para não

confundir o leitor com outras celas.

Clave de sol na segunda linha.

Clave de sol na parte da mão esquerda.

Clave de fá na quarta linha.

Clave de fá na parte da mão direita.

Clave de dó na terceira linha; clave para viola e para as notas agudas de instrumentos graves.

Clave de dó na quarta linha; clave para tenor.

Clave de sol oitava acima.

Clave de sol oitava abaixo.

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11 Quiálteras

São inseridas antecedendo o grupo de notas a que se referem.

Grupo de duinas ou quiáltera de dois.

Grupo de tercinas quiáltera de três. (Forma abreviada utilizada: )

Grupo de sestina ou quiáltera de sete.

Grupo de dez notas ou quiáltera de dez.

Para indicar quiálteras dentro de outras quiálteras é necessário apenas indicar o

grupo antes da primeira nota.

12 Andamentos II e Nuances

Em continuação ao tópico de mesmo nome, apresentamos aqui outras grafias

de expressão.

Staccato Staccatíssimo

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Mezzo-staccato Acento agógico

Acento Acento invertido

Martellato

Pianíssimo Piano

Mezzo Piano Mezo Forte

Forte Fortíssimo

Crescendo Início Fim

Diminuindo Início Fim

Exemplo de utilização:

Quando houver mais de um desses sinais sobre uma mesma nota, as celas

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respectivas aparecerão uma seguida da outra, sempre antecedendo a nota em questão (cf.

KROLOCK, 2004, p. 99).

Observe que qualquer palavra ou letra pode ser escrita dessa forma, o que pode

ser útil para a escrita de músicas experimentais/ contemporâneas.

13 Intervalos

Os trechos abaixo fazem parte do documento conhecido como “Cologne Key”,

que estabelecia as normas para a leitura e escrita dos acordes.

“Nos acordes formados por notas do mesmo valor escreve-se apenas uma delas

em braile, na sua forma habitual (a mais aguda ou a mais grave). As demais são escritas

mediante os sinais de intervalo correspondentes, com relação à nota escrita”.

“Nos acordes do registro agudo (soprano, contralto, violino, viola, mão

direita do piano, órgão harpa...) escreve-se a nota mais aguda, representando-se as restantes

mediante intervalos descendentes relativos à nota escrita. No registro grave (tenor, baixo,

violoncelo, mão esquerda do piano e harpa...) escreve-se a nota mais grave, representando-

se as demais mediante intervalos ascendentes relativos à referida nota1”.

Segunda Terceira Quarta Quinta

Sexta Sétima Oitava

No caso do piano, há duas celas que indicam se a linha a seguir é para a mão

esquerda ou direita.

1 Trechos extraídos de: Musical Notation for the Blind, British and Foreign Blind Assoc., Londres, 1888

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Parte de mão direita Parte de mão esquerda Ex.:

Casos especiais:

- O uníssono é escrito com o intervalo de oitava antecedido pelo sinal da

oitava, que é o mesmo da nota indicada como ponto de referência do intervalo.

- Se houver mais de um intervalo sobre uma mesma nota, esses intervalos vêm

em ordem crescente de distância, sem ser necessário indicar oitava, salvo distâncias

maiores que oitava ou uníssono.

Ex.:

Ex.:

- Os intervalos sempre possuem o mesmo valor de tempo que a nota indicada,

sendo desnecessário repetir pontuações ou acentuações.

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- Para três ou mais notas seguidas com o mesmo intervalo, usa-se a indicação

duplicada na primeira nota, sem necessitar aparecer nas intermediárias e terminando com

uma única indicação na última nota (KROLICK, 2004, p. 39).

- Os intervalos são referentes às notas diatônicas à nota em questão, não

representando se maior, menor, diminuto, aumentado ou justo. Caso haja alteração da nota

do intervalo, esse deve vir com o acidente em questão. Lembre-se que essa musicografia

preza sempre (na medida do possível) por manter as mesmas informações e as formas que

existem na partitura em tinta.

- Em oitavas, se forem alteradas com acidentes, não é necessário indicá-las nos

intervalos. Há países que indicam novamente a alteração, sendo preciso ter atenção ao

trabalho de transcrição consultado (ibid., p. 40).

14 Em acorde total

Quando duas ou mais vozes não puderem ser representadas por intervalos

devido a diferenças de tempo entre elas, elas serão escritas sucessivamente e sem espaço,

unidas pelo sinal chamado “em acorde total”.

Em acorde total.

Há exemplos do seu uso disponíveis nesta dissertação, nas páginas 88 e 93, a

seguir teremos tópicos aprofundando esse assunto.

A nota que segue o sinal do “em acorde” sempre terá nova indicação de oitava,

assim como a primeira nota do compasso seguinte. A ordem da escrita das vozes segue o

mesmo princípio da ordem dos intervalos, com relação a escrever primeiro o mais agudo

ou o mais grave, ou seja, para os instrumentos agudos se escreve primeiro a voz superior;

para os instrumentos graves, a inferior.

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Pode-se duplicar a indicação de intervalo para atingir várias notas, mesmo que

elas passem para outro compasso, desde que se siga na mesma voz, bastando indicar

novamente uma única vez na última nota em que se usará o intervalo (ibid., p. 42, exemplo

5.14).

As alterações escritas antes de um sinal de “em acorde” não afetam as notas

escritas depois, na segunda voz, sendo necessário reafirmar a alteração num mesmo

compasso. Se o sinal precisou ser escrito em braille por causa dessa regra, mas no seu

original na partitura convencional ele não aparece, o sinal de alteração deve ser precedido

por uma cela formada pelo ponto 5. O mesmo caso de indicação vale para as pausas que

não aparecerem na partitura convencional, mas que foram incluídas em benefício do

entendimento do trecho. (ibid., p. 42-43, exemplos 5.15 e 5.16).

15 Em acorde parcial

Se for preciso usar “em acorde” para apenas uma parte do compasso,

empregam-se os sinais para “em acorde parcial”.

Em acorde parcial

Sinal de separação para ser usado no “em acorde parcial”.

Todos os casos citado para o “em acorde” são válidos para o “em acorde

parcial”. Exemplo (ibid., p. 44, exemplo 5.21):

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16 Notas móveis

Quando duas notas ou a soma de três notas de igual valor se movem abaixo ou

acima de uma nota mais longa, pode-se escrevê-las como intervalos separados pelo ponto

6.

Sinal de nota móvel para um intervalo.

Exemplo (ibid., p. 45, exemplo 5.24):

Quando dois ou mais intervalos se movem simultaneamente, tem-se o uso dos

pontos 5 e 6.

Sinal de nota móvel para dois ou mais intervalos.

Exemplo (ibid., p. 46, exemplo 5.24):

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16 Sinas de nota dupla

Esses sinais são empregados em trechos que contêm notas escritas

convencionalmente com haste dupla, expressando dois valores simultâneos (iguais ou

diferentes) que não possam ser transcritos adequadamente pelo uníssono e nem pelo “em

acorde”. Quando as hastes representam valores diferentes, o menor deles é escrito como

nota, e o maior com um sinal de nota dupla.

Nota dupla para semibreve. Nota dupla para mínima.

Nota dupla para semínima. Nota dupla para colcheia.

Nota dupla para semicolcheia. Nota dupla parafusa.

São colocados depois das notas que modificam e não devem estar separados

pelo hífen musical. Tanto esses sinais quantos as notas escritas podem conter pontos, e

podem ser modificados por ligaduras de prolongamento, ligaduras de expressão e nuances.

Exemplo: (ibid., p. 48, exemplo 5.31)

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17 Ligadura de prolongação de acorde

Emprega-se quando duas ou mais notas de um acorde se prolongam até o

acorde seguinte. Caso os dois acordes em questão sejam idênticos e com apenas algumas

notas ligadas, é preciso usar a ligadura de prolongação para cada uma das notas ligadas.

Exemplo (ibid., p. 56, exemplo 6.16):

Em uma série de acordes com intervalos duplicados um deles leva ligadura de

prolongação, em todas as suas notas não há necessidade de interromper a duplicação.

Exemplo (ibid., p. 56, exemplo 6.17):

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Em alguns países a ligadura de acorde pode ser ligada com as seguintes celas:

( cf., ibid., p. 54, exemplo 6.8)

18 Repetições conforme partituras convencionais

Ritornelo – Barra dupla seguida de pontos; início de repetição (pontos 1, 2 e 6;

pontos 2, 3, 5 e 6):

Ritornelo – Barra dupla precedida de pontos; fim de repetição (pontos 1, 2 e 6;

pontos 2 e 3):

Esses sinais aparecem logo após a última nota do compasso a que se refere,

sem espaço. Caso haja mais informações a serem escritas em braile após a última nota, elas

virão após o ritornelo, que será seguido do hífen musical (ponto 5), mais um espaço em

branco.

Casa 1 e Casa 2 (Primeira vez e segunda vez)

Acompanhe os exemplo a seguir:

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Exemplo (ibid., p. 73, exemplo 9.7):

Símbolo para SEGNO na forma impressa em tinta -

Sinal para CODA na forma impressa em tinta -

Esses dois últimos sinais são precedidos e seguidos de um espaço em branco.

Expressões como “D.S.”, “coda”, devem ser escritas diretamente na partitura dentro do

compasso a que se referem.

A nota que segue a quaisquer dos sinais aqui apresentados levará sinal de

oitava. Os sinais de primeira e segunda vez terão o ponto 3, sempre que a cela braille

seguinte tiver quaisquer dos pontos 1, 2 ou 3. Além disso, devem ser renovadas as

“duplicações” vigentes, caso desejemos que elas continuem.

19 Repetições especiais para partituras em braille

A diferença mais notável entre a escrita musical em braile e a convencional são

os sinais de repetição, que se mostram muito funcionais. As repetições em braile, utilizadas

criteriosamente, têm como objetivo facilitar a leitura e a memorização, além de poupar

espaço na escrita.

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Repetição de compasso completo ou fração de compasso

É usado para indicar repetição de notas dentro de um mesmo compasso. Seu

uso exige intuição e boa formação musical. Exemplo (ibid., p. 76, exemplo 9.17):

Separação de repetições parciais com diferentes valores

Para indicar repetições parciais de valores diferentes e próximas. Exemplo

(ibid., p. 77, exemplo 9.19):

Para maior aprofundamento nessas questões, cf. Krolick (2004, p. 77-94).