Racismo fenotípico e estéticas da segunda pele

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    Racismo fenotpico e estticas da segunda pele

    Jos Jorge de Carvalho

    Se algo caracteriza a nossa era, em todo o planeta, a presena do racismo

    fenotpico intenso. Os seres humanos que classificamos como caucasianos, isto , de

    pele clara, olhos claros, cabelos lisos e narizes finos - enfim, os brancos ocidentais,

    europeus em geral e muito particularmente os anglo-saxes - definiram um padro de

    valor e beleza para toda a espcie humana e o impuseram (antes a ferro e fogo e

    atualmente atravs da indstria cultural e do controle poltico e financeiro) a todo o

    resto do mundo. Essa imposio comeou no sc. XVI, quando os europeus

    conquistaram a Amrica e consolidaram o trfico de escravos da frica para o Novo

    Mundo. A partir da, a combinao de escravido, colonialismo e capitalismo marcou a

    imagem do homem branco ocidental como superior aos no-brancos (que comearam a

    ver-se como no-brancos) dos demais continentes.

    Esse racismo fenotpico cresceu ainda mais na poca do alto imperialismo,

    alcanando dimenses definitivamente globais no final do sc. XIX, quando a auto-

    intitulada raa branca se imps nos cinco continentes e forou os colonizados do

    mundo (americanos, africanos, asiticos, povos do Oriente Mdio, da sia Menor e

    ocenicos) a aceit-la como padro de referncia. E no somente a teoria racista

    moderna, formulada nos pases ocidentais, como tambm a pedagogia para transformar

    o corpo branco ocidental em objeto de desejo universal e inconteste de referncia foi

    produzida e imposta nas colnias dos imprios europeus.1

    Essa referncia generalizada do mundo ocidental como sinnimo de humanidade

    plena centrou-se primeiramente na superioridade militar (pois foi pelas armas que os

    europeus dominaram os outros continentes); logo, na econmica, por controlar o

    comrcio e a expanso do capitalismo; paralelamente, o controle poltico, por impor e

    dispor dos regimes locais segundo seus interesses; depois, o controle cientfico e

    1As idias deste ensaio, aqui apresentadas de forma extremamente concisa, so desdobramentos de outrasdiscusses sobre a indstria cultural contempornea. Cf. CARVALHO, Jos Jorge. Transformaes daSensibilidade Musical Contempornea, Horizontes Antropolgicos, Ano 5, No. 11, 59-118, 1999.

    CARVALHO, Jos Jorge. A Morte Nike: Consumir, o Sujeito, Universa, Vol. 8, N 2, 381-396.Universidade Catlica de Braslia, junho, 2000. Contei aqui com a ajuda de Jocelina Laura de Carvalho eErnesto Ignacio de Carvalho.

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    artstico, ao desqualificar os saberes e valores estticos locais e universalizar os padres

    ocidentais nas cincias e nas humanidades. Para culminar essa dominao, os prprios

    corpos dos europeus passaram a indicar, por coero e rendio, as caractersticas

    fsicas da raa humana superior. O significante mais sobressalente desses corpos

    europeus foi, sem dvida alguma, a cor da pele, que foi complementada, ao longo do

    tempo da ocidentalizao do mundo, por outras caractersticas fsicas tambm

    secundrias do ponto de vista genotpico, como a altura, o formato dos olhos, do nariz,

    dos lbios, dos pomos da face e a textura dos cabelos.

    Atualmente, os seres humanos, queiram ou no, so cada vez mais tratados de

    acordo com as caractersticas fenotpicas da sua pele. Em primeiro lugar, os no-brancos

    so tratados de um modo negativo e desqualificador pelos brancos; e, logo, os prprios

    no-brancos introjetam essa inferioridade fenotpica e passam a organizar suas vidas de

    acordo com a rejeio ausncia de brancura e tambm segundo seu esforo por emular

    essa mesma pretensa brancura. Desse modo, o racismo fenotpico cresce a cada dia e

    fora a maioria das pessoas a tentar ajustar sua pele para aproximar-se, ainda que

    minimamente, do padro de corpo ideal; ou, pelo menos, para afastar-se das

    imperfeies fsicas que acreditam portar e com que se identificam a partir da sua

    conscincia colonizada. Desde o incio do sculo XX, com a difuso da linguagem

    cinematogrfica, a operao de identificao passa da pele para o corpo como um todo,

    envolvendo a anatomia com sua gama de propores e complexidades fisiolgicas.

    No incio do sculo vinte, o racismo fenotpico era uma estrutura de

    discriminao que favorecia sempre os brancos e prejudicava exclusivamente os no-

    brancos. No momento presente, porm, cresce uma patologia de desconforto

    generalizado com a prpria pele, no apenas entre os no-brancos, mas tambm entre os

    brancos. E, conforme veremos mais adiante, esse desconforto que induz as pessoas,

    praticamente no mundo inteiro, a promoverem intervenes cada dia mais radicais,dolorosas e agonsticas (dada sua incapacidade a priori de resolver a auto-rejeio

    corporal que passaram a sofrer) no prprio corpo.

    uma questo controversa definir se a classificao dos seres humanos com

    base no fentipo existiu sempre ou se uma inveno do mundo moderno ocidental.

    Vrios estudiosos tm procurado demonstrar, atravs de evidncias arqueolgicas e

    documentais, que as sociedades do mundo antigo, antes mesmo do mundo grego (como

    os hindus e os egpcios, por exemplo), j classificavam os grupos humanos entreaqueles compostos por pessoas mais claras e por outras mais escuras de pele; e

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    atribuam as qualidades positivas e desejadas (as qualidades dos nativos e de seus

    aliados) s pessoas de pele mais clara, jogando os seres humanos de pele mais escura na

    vala comum dos estranhos, dos inferiores, dos brbaros, dos incapazes, dos inimigos ou

    dos perigosos em geral.

    Inspirados na idia dos vrios tempos das desigualdades profundas (como o so

    as de gnero e as tnico-raciais), podemos denominar essa teoria como racismo de longa

    durao, ou de racismo monumental, se comparado com outra estrutura hierrquica de

    longa durao, que a estrutura de gnero. possvel aproximar o tempo longo do

    racismo com o tempo longo da mulher, tal como teorizado por Julia Kristeva, por

    exemplo, ao discorrer sobre os vrios tempos e geraes dos feminismos.2 A

    desigualdade de gnero, ou o patriarcado, atravessou eras, civilizaes, regimes

    polticos e econmicos, ao longo de milnios, chegando at os nossos dias com sua base

    ideolgica ainda vigente e eficaz; esse mesmo tempo monumental parece ter ocorrido

    com o racismo fenotpico.

    A formulao mais erudita e mais contundente politicamente acerca da

    existncia desse racismo fenotpico de longa durao, ou monumental, foi produzida

    nos anos sessenta do sculo passado pelo grande cientista e humanista senegals Cheik

    Anta Diop.3 Utilizando as mais diversas fontes histricas, arqueolgicas, lingsticas e

    apoiando-se tambm em dataes do carbono 14 por ele mesmo concebidas, Diop

    procurou demonstrar que o racismo fenotpico j estava presente h pelo menos 4 mil

    anos atrs, quando os primeiros cdigos civilizatrios escritos atriburam

    caractersticas morais distintas aos grupos de peles claras e aos de peles escuras.

    Segundo esse raciocnio, o racismo moderno se expandiu pelo planeta com tanta

    intensidade justamente porque se adaptou a um solo imaginrio que j havia reservado

    um lugar de superioridade aos povos de pele clara.

    Todavia, mesmo reconhecendo a slida base documental da teoria de CheikAnta Diop, parece um pouco difcil generalizar essa posio quando sabemos que as

    sociedades ditas antigas ou clssicas (e que supostamente formaram o que chamamos de

    mundo ocidental) no eram homogneas fenotipicamente. Conseqentemente, no eram

    exclusivamente brancas pelo menos, no eram brancas do modo como as sociedades

    ocidentais exigem ser vistas atualmente. Assim, tanto os gregos como os romanos eram

    2

    KRISTEVA, Julia. Womens Time, Signs, Vol.7, No.1, 5-25, 1981.3 DIOP, Cheik Anta. Civilisation ou Barbarie: Anthropologie sans Complaisance. Paris: PrsenceAfricaine, 1981.

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    povos multiculturais e multi-tnicos. Duas questes importantes acerca da relao entre

    a pele e a cultura surgem dessa reavaliao do que chamamos de mundo clssico greco-

    romano.

    Cheik Anta Diop foi provavelmente, em todo o sculo vinte, o maior autor

    individual que conseguiu desmontar cientificamente o mito racista ocidental da

    superioridade da civilizao grega, como se essa representasse um milagre singular e

    irrepetvel da inteligncia, da moral, da poltica e da beleza e, fator essencial na luta

    pela descolonizao, como se os europeus modernos fossem herdeiros diretos dessa

    suposta superioridade civilizatria grega. Diop dedicou-se a mostrar que uma grande

    parte das supostas descobertas que caracterizaram o que aprendemos nas escolas como

    milagre grego foram, na verdade, no muito mais do que cpias explcitas (e

    reconhecidas, inclusive, pelos mesmos autores gregos da era clssica) de descobertas

    feitas pelos egpcios muitos sculos antes. Diop demoliu a hierarquizao fenotpica dos

    seres produzida pelos imperialismos europeus ao demonstrar duas verdades paralelas e

    complementares: primeiro, que os egpcios eram negros e, ao contrrio do que pregava a

    ideologia imperialista, foi ento um conjunto de povos negros que formularam uma das

    bases do que chamamos de civilizao.

    Remando contra a corrente racista que impera ainda hoje nas instituies

    acadmicas dentro e fora do mundo ocidental, outros pesquisadores, como Martin

    Bernal4 nos anos oitenta do sculo passado e Benjamin Isaac5 na presente dcada,

    demonstraram que o mundo grego antigo no era um mundo branco, tal como

    atribumos hoje uma brancura aos alemes e aos ingleses, por exemplo; muito pelo

    contrrio, tratava-se de um mundo de muitas cores de pele e traos fenotpicos variados,

    dada a convivncia secular e constante com egpcios, fencios, persas e judeus, todos de

    pele escura, ou no-branca (se utilizamos a pele dos nrdicos, arianos e saxes como

    referncia). Ou seja, havia entre os gregos o que Issac denomina de proto-racismo, masa cor da pele no era nem o critrio central nem o nico para a produo de uma

    hierarquia de valores atribudos aos diferentes grupos humanos ento conhecidos.

    Mais que negar de frente a validade dessa teoria que defende a idia de um

    racismo fenotpico de longa durao (Diop chega a defender a hiptese de que j na

    ndia antiga consolidou-se uma oposio entre etnias de pele clara os arianos, por

    4 BERNAL, Martin.Black Athena. The Afroasiatic Roots of Classical Antiquity. New Brunswick: Rutgers

    University Press, 1987.5 ISAAC, Benjamin. The Invention of Racism in Classical Antiquity. Princeton: Princeton UniversityPress, 2004.

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    exemplo e as de pele escura os dravdicos, povos originrios do Vale do Indus),

    penso que ela deve ser matizada e combinada com outras teorias, inclusive para no

    perdermos o foco do tipo de racismo contemporneo que nossa tarefa contribuir para

    dissolver. Nesse sentido, acredito que a absolutizao verdadeiramente patolgica das

    marcas fenotpicas para distinguir os seres humanos que nos interpela diariamente, seja

    pela realidade virtual seja pelas relaes concretas entre as pessoas, uma prtica

    tipicamente moderna, que foi se consolidando nos pases europeus entre os sculos XVI

    e XVIII e que tem sido imposta violentamente para todo o planeta desde a segunda

    metade do sculo XIX at os nossos dias.

    Quanto mais se intensificou o colonialismo europeu nos demais continentes do

    mundo, mais intenso foi ficando o racismo dos brancos contra os no-brancos. O

    imaginrio racista que nos interpela terminou por estabilizar uma hierarquia dos seres

    humanos que colocou no topo da pirmide os homens brancos, de pele clara, olhos

    preferencialmente claros e cabelos preferencialmente loiros. Em cada regio do mundo

    dominada pelos europeus (e, no sculo XX, tambm pelos Estados Unidos) foi gerada

    uma pigmentocracia entre os no-brancos: quanto mais claros (ou menos escuros) de

    pele, menos discriminados; e, quanto mais escuros, mais facilmente situados na parte

    inferior da hierarquia dos seres humanos e, portanto, mais discriminados, excludos e

    passveis de serem eliminados da face da terra. Assim como os povos das Amricas

    foram transformados em ndios, todos os povos europeus foram transformados em

    brancos e os no-europeus em no-brancos, ou nativos de alguma parte do mundo extra-

    europeu.

    A revoluo industrial possibilitou a disseminao das imagens racistas em uma

    escala monumental, sem precedentes na histria da humanidade. Antes do sculo XVIII

    no havia meios tecnolgicos para difundir o imaginrio produzido com a finalidade de

    impor a superioridade branca no mundo inteiro. Assim como Walter Benjamin6construiu uma histria das transformaes da obra de arte na era de sua

    reprodutibilidade tcnica, devemos agora incluir um recorte racial ou fenotpico em seu

    modelo interpretativo e refletir sobre a difuso e mesmo a naturalizao das imagens do

    mundo clssico (da chamada beleza greco-romana) e do mundo europeu moderno.

    Paralelo passagem da arte aurtica arte sem aura (a arte que se reproduz

    tecnicamente e se afasta de sua dimenso nica e sagrada), foi posto em marcha um

    6 BENJAMIN, Walter A obra de arte na era de sua reprodutibilidade tcnica & Pequena histria dafotografia. Em: Obras Escolhidas. So Paulo: Brasiliense, 1985.

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    processo contnuo e cada vez mais eficaz de fabricao esttica da hierarquia dos seres

    humanos. Todo o repertrio das artes visuais clssicas as esttuas, as pinturas, os

    desenhos, as xilogravuras, gregas, romanas e medievais foi atualizado atravs de

    reprodues tcnicas, difundidas conscientemente, como uma poltica imperial, pelos

    quatro cantos do mundo a partir do sculo XVIII. Nos ltimos duzentos anos, esse

    processo se intensificou ainda mais com a difuso dos livros didticos, das revistas, dos

    jornais, dos catlogos de exposies, das capas de livros enfim, com todo tipo de

    ilustraes que possibilitou, atravs do impacto direto de imagens, fixar os seres

    humanos ocidentais (homens e mulheres) em uma posio de destaque e controle face

    aos no-ocidentais. Obviamente, destaque e controle tornaram-se padres de beleza.

    Aqui, preciso lembrar dos critrios de seleo das imagens clssicas que

    passaram a circular obrigatoriamente pelas colnias. As imagens preferidas foram

    aquelas em que os deuses, heris ou seres humanos extraordinrios do mundo clssico

    apresentassem traos fenotpicos mais prximos dos europeus modernos. E, alm da cor

    da pele, procurou-se fixar tambm um tipo de propores anatmicas mais de acordo

    com aquelas dos brancos modernos. Algumas esculturas gregas e romanas que no se

    encaixavam na imagem dos gregos como brancos europeus modernos, como o

    complexo do Laocoonte, por exemplo, foram descartadas e deixadas de fora dos livros

    de histria da arte, em uma espcie de censura esttica e racista que atravessou os

    ltimos trezentos anos at praticamente os dias de hoje. Ou seja, por um lado, as elites

    intelectuais dos imperialismos europeus procuraram europeizar as artes greco-romanas.

    E, paralelamente, investiram ferozmente na produo de imagens dos europeus com

    traos helenizados. Houve, assim, uma obra de branqueamento que se voltou tambm

    para o interior do mundo europeu moderno.

    A primeira lio do corpo em sociedade que em nenhum lugar do mundo, at

    hoje, o corpo biolgico o corpo social. O corpo sempre tem um sujeito, est inseridoem alguma comunidade, grupo, etnia ou nao. O corpo sempre marcado, em alguma

    medida, pelas convenes culturais daquele grupo humano. So as marcas inscritas no

    seu corpo que singularizam o grupo tnico a que o indivduo pertence. E justamente

    apoiado na singularidade de um grupo humano que cada indivduo pode aprender a

    desenvolver e a expressar a sua prpria individualidade. So essas marcas, impressas

    temporria ou definitivamente na nossa pele biolgica (nossa primeira pele, digamos),

    que conformam a nossa segunda pele, a pele que nos faz seres humanos para os outrosseres humanos (se a segunda pele que nos faz seres humanos tambm para os animais

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    uma questo aberta que no posso equacionar neste momento). Algumas dessas

    marcas incluem: as escarificaes, as pinturas corporais, os furos e alongamentos nos

    narizes, os lbulos furados, os lbios furados, os cortes longilineares nos pomos da face

    (as marcas de nao dos grupos da Costa Ocidental da frica); os adereos, fixos ou

    intermitentes, que recobrem e sinalizam, como os braceletes, os colares, os brincos, os

    chapus, as tornozeleiras. Em todos os corpos, a beleza o resultado de alguma

    interveno fsica que completa o trabalho puramente natural da anatomia herdada no

    nascimento.

    O grupo tnico, ou a nao, o ser que o indivduo absorve, introjeta, incorpora

    e logo exibe, exterioriza, expressa simbolicamente e reconhecido como membro do

    grupo pelos que j a ele pertencem, a saber, pelos que se iniciaram antes. Como so

    muitas as naes e variados os corpos por elas marcados, pode surgir o fascnio e o

    desejo de assumir a marca alheia, ou a marca de que se carece. O desejo de identificar-

    se com o outro atravs do canibalismo cultural visvel na maquiagem tnica. O filme

    Cannibal Tours, de Dennis ORourke7, mostra os turistas europeus nas aldeias da Nova

    Guin pintados como os nativos e brincando alegremente de ser outros ao adquirir

    temporariamente (e atravs de um comrcio, obviamente) as marcas de nao enfim,

    podem experimentar uma segunda pele, eles que se vm como universais, no-tnicos,

    sujeitos supostamente livres de se apresentar socialmente apenas com sua primeira pele.

    Tambm o rockeiro Sting foi ao Xingu, no incio dos anos noventa, guiado pelo cacique

    Raoni e se pintou como os ndios Txukarrame, posando assim temporariamente de

    ndio, a despeito da sua pele branca e do seu cabelo loiro.

    A mesma sociedade que desenvolveu a tecnologia da desapario da segunda

    pele oferece agora dois tipos de tecnologia destinados a intervir no corpo na tentativa de

    recobrar uma dignidade mnima diante do padro racista idealizado. Primeiro, e mais

    definitivamente, ou atravs da operao plstica, alterando diretamente as proporesanatmicas; ou atravs das tecnologias de retoque da imagem, que evoluram da

    interveno fsica na fotografia impressa, depois nas alteraes de pontos do negativo

    da foto at finalmente na manipulao do arquivo digital, que se tornou hoje metfora

    com o termophotoshop.

    No presente momento, a biopoltica ocidental da primeira pele parte do princpio

    de que todos os seres humanos que se subjetivam segundo a lgica da indstria cultural

    7Cannibal Tours. Dir: Denis ORourke, 72 min. Austrlia: CameraWork, 1988.

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    so feios. Em uma sala de aula com 30 estudantes, perguntei este ano quem se achava

    bonito e todos responderam que se sentiam feios e imperfeitos. A indstria da pele

    decreta que toda a humanidade, sem exceo, dever se submeter a algum tipo de

    interveno cirrgica e/ou algum tipo de tratamento qumico industrializado.

    Tratamentos alternativos tambm valem, desde que estejam inseridos no mercado

    alternativo de mercadorias. As pessoas j comearam a ser divididas entre as que tm e

    as que no tm intervenes corretivas na pele. Raciocnio invertido, pois justamente a

    segunda pele que garante a beleza da primeira pele.

    Tentemos resumir esse complexo processo histrico, com todas suas

    ramificaes polticas, estticas, econmicas, tecnolgicas, psquicas e at ecolgicas.

    1. A nfase na cor da pele, ainda no racismo fenotpico monumental, implicou

    um apagamento das diferenas e marcas da segunda pele, mesmo no interior dos grupos

    humanos do mundo antigo que supostamente partilhavam da mesma cor. Esse racismo

    de longa durao generalizou os brancos, como se fossem todos iguais e os escuros, ou

    no-brancos, como se tambm fossem todos iguais.

    2. Se pensamos agora no racismo fenotpico moderno, o efeito foi igualmente

    devastador. Unindo arte clssica grega selecionada e repadronizada para fins de fantasia

    de compatibilidade com os corpos das elites dos pases europeus centrais, a difuso do

    padro branco ocidental passou da cor da pele para as propores anatmicas ditas

    clssicas: para os homens, altura de 1,80m, nem magros nem gordos; para as

    mulheres, altura de 1,75m, seios de tamanho mdio, sem excesso de quadril nem de

    glteos, mais um sem nmero de medidas secundrias que foram trabalhadas de um

    modo cada vez mais milimtrico a partir do sculo XIX. Foi ento o corpo hegemnico

    ocidental, idealizado como uma reencarnao do corpo grego clssico que se tornou

    medida para todos, inclusive para os prprios ocidentais.

    3. Apagaram-se as diferenas da segunda pele entre os brancos. Espanhis,portugueses, italianos, ingleses, alemes, holandeses, que eram percebidos como muito

    diferentes entre si no sc. XVI, passaram a ser simplesmente brancos no fim do sc.

    XIX. A indstria das imagens foi crucial nesse processo de unificao, porque

    complexificou e massificou os parmetros da anatomia do corpo hegemnico.

    4. A eliminao da segunda pele entre os brancos provocou uma excluso

    paradoxal entre eles: estavam unificados pela primeira pele, mas nem todos possuam as

    propores hegemnicas, a anatomia normatizada. O cinema fez crescer essa sensao

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    de imperfeio, porque todo o cinema provocou um achatamento dos signos corporais

    quando reduziu o corpo a duas dimenses.

    5. Em uma passagem antolgica da literatura europia do sculo XX, Hermann

    Hesse dizia, no seu livro mgico O Jogo das Contas de Vidro8, que todas as msicas da

    poca de Monteverdi eram belas. Entendemos que faz sentido o que diz Hesse: naquela

    poca ainda havia iniciao e gnose nas naes europias e a msica era bela porque

    expressava a beleza das pessoas. Do mesmo modo podemos dizer: todos os tajiques so

    belos, todos os iorubs so belos, todos os kaxinaus so belos, todos os uighur so

    belos, todos os aimars so belos, todos os balineses so belos, assim como todas as

    suas msicas so belas.

    Fizemos um zoom crescente da geografia religio, ordem legal, cultura,

    para finalmente chegar gentica e chegamos a um paradoxo: h uma luta atual por

    desqualificar a base gentica da raa e, ao mesmo tempo, uma obsesso por aproximar-

    se da loirice e da brancura. Pessoas colocam lentes de contato para deixar os olhos mais

    claros, gua oxigenada para deixar os cabelos loiros, produtos qumicos para alisar os

    cabelos, operaes plsticas nos pases asiticos e andinos para diminuir ou retirar a

    dobra monglica em volta dos olhos (os olhos puxados dos japoneses, e das

    populaes indgenas sul-americanas); plstica para diminuir as fossas nasais dos povos

    africanos; cremes de vrios tipos para clarear a cor da pele. H uma polmica dramtica

    na ndia, atualmente, provocada por um dos mais famosos atores indianos que aceitou

    fazer propaganda de um creme que clareia a pele - um paradoxo racista de

    conseqncias geopolticas monumentais. O objetivo ltimo da corporao ocidental

    que fabrica o creme (e da suposta civilizao ocidental que a estimulou a conceber essa

    idia macabra) simplesmente clarear a cor da pele de um bilho de pessoas!

    A indstria de imagens da sociedade de massa nasceu aps a consolidao desse

    imaginrio racista. Assim, a expanso da fotografia e, posteriormente, do cinema serviupara difundir a hierarquia fenotpica centrada nos brancos europeus que inventaram

    essas tecnologias. Enquanto todos os povos no-brancos, em alguma medida definidos

    como imperfeitos, exibem as variadas marcas da sua segunda pele, o branco ocidental

    parece apresentar-se como o nico grupo humano no marcado; ou seja, o nico grupo

    cujos atributos de humanidade j estariam expressos na primeira pele, na pele

    puramente biolgica. Obviamente, trata-se de uma fantasia, as mais das vezes

    8 HESSE, Hermann. O Jogo das Contas de Vidro. So Paulo: Editora Brasiliense, 1969.

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    inconsciente, de excepcionalidade, cujos efeitos de violncia, fsica e simblica, sobre

    todo o mundo ainda no foi suficientemente avaliada.

    Essa ideologia de um corpo branco perfeito, belo, inteligente e poderoso, sem

    marcas tnicas que poderiam enfei-lo foi construda no contexto de uma geopoltica

    colonialista de inferiorizao e dominao sobre os no-brancos do planeta. To

    poderosa mostrou-se, porm, que os prprios brancos passaram a no mais enxergar a

    sua segunda pele e comearam a construir uma imagem do poder, da riqueza e da beleza

    como fenmenos passveis de manipulao atravs de intervenes na sua anatomia,

    isto , diretamente na primeira pele. Ou seja, passou-se a intervir na primeira pele, no

    mais para marc-la como exemplo de um grupo singular de seres humanos, mas como

    se fosse uma alterao direta da pele biolgica, um aperfeioamento da herana gentica

    individual.

    Que fique claro, todavia, que a brancura e a loirice que se espalham hoje no se

    referem de fato ao fentipo europeu predominante, mas a uma loirice virtual, ou hiper-

    real. Aqui, podemos corrigir ou acrescentar algo teoria do simulacro de Baudrillard9: o

    corpo que primeiro desaparece na hiper-realidade o corpo branco. com o seu

    desaparecimento, e conseguinte auto-instaurao como corpo hegemnico, que ele

    procedeu a desaparecer com toda a grande diversidade de corpos portadores de milhares

    de segundas peles, decretando-os todos meramente como corpos no-brancos. Dito com

    outra metfora, o Photoshop foi inventado para retocar primeiro a pele dominante, no a

    pele dominada, como podemos pensar os subalternos de hoje.

    Na verdade, podemos complementar os ensaios de Walter Benjamin sobre a

    fotografia e o cinema e os escritos de Baudrillard sobre o simulacro, acrescentando uma

    dimenso crucial que lhes escapou: que todas as tecnologias modernas da imagem,

    incluindo a fotografia e o cinema, logo aps sua inveno, foram colocadas a servio de

    um projeto racista fenotpico. As tecnologias da imagem, alm de introduzirem novassensibilidades (como nos alertou Benjamin) e novas armadilhas sensveis (como

    teorizou Baudrillard a partir do trompe loeil, por exemplo) se dedicaram no tanto a

    retratar, mas a produzir representaes da hierarquia fenotpica dos seres humanos.

    No incio do extraordinrio filme Moloch10, de Aleksandr Sokurov, quando

    Hitler cumprimenta Eva Braun ao entrar no chal, ele lhe dirige o ento maior dos

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    BAUDRILLARD, Jean. A Troca Simblica e a Morte. So Paulo: Edies Loyola, 1996;BAUDRILLARD, Jean. Simulacros e Simulao. Lisboa: Relgio Dagua, 1981.10Moloch. Dir: Aleksandr Sokurov, 108 min. Rssia, Alemanha, Frana, Itlia, Japo,1999.

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    elogios: Eine Antike Schnheit! (Uma beleza clssica!). Esse significante Antike, to

    presente nos filsofos e historiadores da arte alemes a partir do chamado

    Renascimento, une os dois plos da idealizao de uma pele branca sem marcas e de

    preferncia coroada por um cabelo loiro: o grego antigo e o alemo (ariano ou

    germnico?) moderno. Como sabemos, essa idealizao esttica, mais do que

    agonstica, foi letal para milhes de seres humanos na metade do sculo XX e ainda o

    hoje em dia. Resta saber at quando continuar sendo.

    Um efeito devastador do uso racista da fotografia e do cinema, por mais de um

    sculo ininterrupto, foi o achatamento e a simplificao dos corpos pela

    bidimensionalidade desses dois sistemas de representao. A imagem bidimensional dos

    personagens registrados (atores ou no) pareceu retirar-lhes a segunda pele,

    universalizando o seu corpo como hegemnico e suscitando uma referncia idealizada

    de beleza praticamente inatingvel. Para os no-brancos, foi bvia sua inferiorizao

    diante dos brancos e as tecnologias cumpriram seu papel na universalizao do hetero-

    racismo: eu sou superior a vocs, a mensagem implcita na imagem bidimensional do

    corpo branco ocidental hegemnico. Mas os brancos tambm foram afetados. Diante do

    padro clssico de beleza inalcanvel dos seus supostos pares tnicos (os brancos

    representados com destaque nas fotos e nos filmes), a pessoa branca comum passou a

    introjetar o auto-racismo: eu sou um ser inferior no interior do meu prprio grupo.

    As operaes plsticas retocam a pele, mas no a marcam. A marca inscrita na

    pele, isto , a segunda pele, no necessita de retoques. Por outro lado, por mais que se

    retoque a primeira pele, no se consegue imprimir nela uma marca de segunda pele. No

    mundo ocidental contemporneo, as pessoas brancas esto desesperadamente fazendo

    intervenes fsicas e retoques imagticos na sua pele e na sua anatomia na tentativa de

    retomar alguma marca da segunda pele que sentem no mais possuir e cuja falta lhes

    retira a auto-estima. No auge das propostas de descolonizao do continente africano, napoca da luta aberta contra o racismo fenotpico ocidental, Frantz Fanon redigiu o seu

    libelo dramtico: Pele Negra, Mscaras Brancas.11 Hoje em dia esse predicamento

    continua, to ou mais intenso quanto nos anos cinqenta do sculo passado. Porm, h

    outro predicamento agora, fruto da carncia branca de uma segunda pele: Pele Branca,

    Mscaras Brancas.

    11 FANON, Frantz. Pele Negra, Mscaras Brancas. Rio de Janeiro: Editora Fator, 1983.

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    Um exemplo bem comum de auto-racismo e de hetero-racismo atravs de

    operao plstica (e bem conhecido na mdia de massa hegemnica) so as

    transformaes do corpo da apresentadora e atriz Xuxa. Nos meados dos anos oitenta,

    ela diminuiu e remodelou o nariz; reduziu o volume da coxas para parecer menos

    voluptuosa e aproximar-se mais do corpo da boneca Barbie, que supostamente combina

    com sua loirice; e diminuiu tambm os glteos e os seios, para parecer menos vulgar

    na sexualidade normatizada brasileira que tem como referncia o corpo da chamada

    mulata. No livro de Amlia Simpson sobre Xuxa, de 1982 (cuja edio brasileira teve

    baixssima circulao no Brasil, aparentemente porque a prpria apresentadora mandou

    comprar a maioria dos exemplares impressos e os destruiu), pode-se ver, na pg 142, em

    uma foto sua ao lado de Pel, como era o seu nariz original (menos branco europeu,

    digamos); e na foto da pg. 141 suas coxas so mais grossas que as de hoje e seus

    glteos mais proeminentes. J os seus seios, aparentemente foram reduzidos naquela

    poca e mais recentemente, aps a maternidade, foram de novo aumentados.

    Exemplos espetaculares de manipulao auto-racista da primeira pele, to

    comuns nos Photoshops, podem ser apreciados no site da companhia iWANEX

    Studio.12 Folheando seu portfolio de grandes celebridades podemos destacar as duas

    fotos da cantora Beyonc, antes e depois dos retoques para deixar sua imagem mais

    clssica. As alteraes so realmente drsticas e, a partir do que ali ficou representado

    do seu corpo biolgico (isto , da sua primeira pele antes das inevitveis plsticas),

    provavelmente muitos de ns no a reconheceramos se a encontrssemos casualmente

    em algum lugar pblico. Eis o que fez iWANEX com o corpo fotografado de Beyonc:

    afinou a sua cintura e retirou-lhe os pneus da barriga; corrigiu e alinhou a ossatura um

    pouco saliente do ombro direito; eliminou a flacidez e at o formato natural do brao

    direito; reduziu drasticamente a batata da perna; retirou as olheiras; levantou as

    sobrancelhas de modo a tornar mais evidente a cor clara dos olhos; corrigiu a coxa;como no caso da Xuxa, diminuiu os seus glteos para parecer menos africana e mais

    europia; levantou os seios; clareou e alisou os cabelos; arrumou a bochecha;

    eliminou uma pequena arruga do lado direito do nariz. E o que mais importa no racismo

    fenotpico moderno: clareou bastante a sua pele.

    Um grande exemplo de representao da beleza de segunda pele de um corpo

    no-branco a foto que Pierre Verger tirou de Me Senhora, que foi uma das mais

    12 Disponvel em www.iWANEXStudio.com. Acesso em 5 jan 2008.

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    famosas mes de santo da Bahia e, por muitos anos, a iyalorix do candombl Ax Op

    Afonj de Salvador. Nessa foto magistral, reproduzida na capa do livro feito em sua

    homenagem, Me Senhora exibe uma beleza majesttica deslumbrante, sem nada dever

    s propores clssicas de Eva Braun, Madonna, Xuxa, Beyonc ou equivalentes que

    recusariam seu sobrepeso, seus seios excessivos ou mesmo a sua cor retinta e as suas

    marcas de nao que a enraizavam na comunidade religiosa de matriz africana no

    Brasil.

    Assim como os no-brancos resistem com a sua segunda pele ao hetero-racismo

    fenotpico, tambm muitos brancos oferecem resistncia contra o auto-racismo que

    tambm lhes inferioriza atravs da imposio de um padro fenotpico idealizado e

    inalcanvel. Tal o caso do movimento punk britnico, por exemplo, nos anos setenta,

    que introduziu para os jovens brancos um modelo de cabelo no-clssico, no-ariano,

    no-branco: o moicano, inspirado no modelo de beleza dos ndios norte-americanos,

    grupos tnicos no-brancos que foram massacrados durante os ltimos sculos da

    modernidade pelos anglo-saxes brancos. Introduziram tambm, em outro gesto esttico

    de solidariedade, o piercing no nariz, inspirado tambm na beleza da segunda pele de

    vrios grupos tnicos no-brancos da ndia, habitantes justamente do sub-continente que

    foi devastado pelo colonialismo britnico por mais de trs sculos.

    Assim, uma vez compreendida toda a dramaticidade e a letalidade do racismo

    fenotpico ocidental contemporneo, que se globaliza atravs das poderosas tecnologias

    de imagem, fsicas e virtuais, preciso incentivar e apoiar a resistncia da segunda pele

    que une todos os oprimidos, no-brancos e brancos, vtimas tanto do hetero-racismo

    como do auto-racismo. No uma, mas milhares de belezas clssicas diferentes a se

    construir nos quatro cantos do mundo.

    Referncias bibliogrficas

    BAUDRILLARD, Jean. A Troca Simblica e a Morte. So Paulo: Edies Loyola,1996.______________. Simulacros e Simulao. Lisboa: Relgio Dagua, 1981.

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