r - d - Renato Luciano de Vasconcelos

download r - d - Renato Luciano de Vasconcelos

If you can't read please download the document

description

de

Transcript of r - d - Renato Luciano de Vasconcelos

  • UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARAN

    RENATO LUCIANO DE VASCONCELOS

    A ANLISE SCHENKERIANA E A ORNAMENTAO:

    UM ESTUDO CRTICO

    CURITIBA

    2012

  • RENATO LUCIANO DE VASCONCELOS

    A ANLISE SCHENKERIANA E A ORNAMENTAO:

    UM ESTUDO CRTICO

    Dissertao apresentada ao Curso de Ps-Graduao em Msica, rea de Concentrao em Teoria e Criao, Departamento de Artes da Universidade Federal do Paran (UFPR), como parte das exigncias para a obteno do ttulo de Mestre em Msica.

    Orientador: Professor Dr. Norton Eloy Dudeque.

    CURITIBA

    2012

  • TERMO DE APROVAO

    RENATO LUCIANO DE VASCONCELOS

    A ANLISE SCHENKERIANA E A ORNAMENTAO: UM ESTUDO CRTICO

    Dissertao aprovada como requisito parcial para obteno do grau de Mestre no Curso de Ps-Graduao em Msica, rea de Concentrao em Teoria e Criao, Departamento de Artes, Universidade Federal do Paran, pela seguinte banca examinadora:

    Prof. Dr. Norton Eloy Dudeque Orientador Departamento de Msica, UFPR

    Profa. Dra. Roseane Yampolschi Departamento de Msica, UFPR

    Prof. Dr. Carlos Alberto Silva Yansen Departamento de Msica, EMBAP

    Curitiba, 30 de maro de 2012.

  • minha famlia

  • AGRADECIMENTOS

    Ao meu orientador Prof. Dr. Norton Dudeque pelas orientaes, oportunidade,

    pacincia, disposio e aulas indispensveis para a realizao desta pesquisa.

    equipe UFPR, funcionrios e docentes. Sobretudo s professoras: Dra. Rosane

    Cardoso de Arajo pelas aulas de metodologia, acolhimento e experincia didtica

    dividida durante o estgio; e Dra. Roseane Yampolschi pelas aulas de composio,

    oportunidade de estgios, e confiana creditada que muito serviram ao crescimento

    pessoal e ao embasamento prtico do trabalho.

    Aos mestres mais antigos e tambm aos demais mais recentes que, de forma direta

    ou indireta, continuam presentes em cada trabalho e nas minhas melhores

    recordaes.

    Ao meu pai Luiz, me Graa e irm Monize pela pacincia, apoio emocional, moral,

    e financeiro.

    Aos primos, amigos, colegas, conhecidos e alunos que em algum momento

    suportaram, acreditaram, participaram ou apoiaram a conquista dos meus objetivos.

    fundao CAPES pelo incentivo fundamental e pela bolsa de estudos.

  • RESUMO

    A anlise schenkeriana uma teoria controversa, causadora de diversos debates no

    decorrer do sculo XX devido ao seu vigor, preciso crtica e repercusso nas

    universidades americanas. Heinrich Schenker (1868-1935), terico musical e crtico

    radicado em Viena, adotou a tradio clssica austro-germnica como modelo

    musical e ideolgico. Para isso, fundamentou sua teoria analtica em tratados

    tericos e prticos do sculo XVIII e nas obras do cnone clssico tonal. No entanto,

    temas abertamente relacionados ao emprego prtico dos ornamentos em sua teoria

    bem como o contexto e analogia com as com os tratados de

    ornamentao ainda no foram enfocados com preciso pela musicologia. Neste

    trabalho, esclarecemos a influncia dos ornamentos prticos neste pensamento

    analtico traando um paralelo entre os seus significados prticos e estruturais. Para

    tal finalidade, percorremos os textos de Schenker (com nfase especial em Der Freie

    Satz [1935]); os textos dos seguidores americanos Adele T. Katz (1887-1979), Allen

    Forte (1926), Felix Salzer (1904-1986) e Oswald Jonas (1897-1978); e o tratado de

    ornamentao Versuch ber die wahre Art, das Clavier zu Spielen (1753) de C.P.E.

    Bach (1714-1788), no qual Schenker embasou sua obra. Contudo, o propsito maior

    deste trabalho, que visa refletir, revisar e expor novas possibilidades para uma

    adequada compreenso musical, no foi exatamente dirigido em defesa da

    . Assim, nossa abordagem ser

    til no somente aos analistas, mas tambm aos intrpretes e aos compositores

    principalmente, os ltimos de linhagem ps-moderna que utilizam ferramentas

    analticas como um recurso composicional.

    Palavras-chave: Heinrich Schenker. Ornamentao. Anlise musical.

  • ABSTRACT

    Schenkerian analysis is considered one of the most polemical and significant

    theories of the twentieth century. Heinrich Schenker (1868-1935), music theorist and

    critic in Vienna, assumed the Austro-German classical tradition as a musical and

    ideological model. For such aim, the theorist structured an analytical theory based on

    to the use of ornamentation in his theory, as well as the circumstances dealing with

    the "diminutions" and the analogy the old treatises has not exactly been addressed.

    Thus, the aim of this research will be extend and discuss the link through

    Schenkerian analysis to ornamentation, both in practice and in theory. We intend to

    achieve a critical thought that deals with a new approach of Schenkerian analytical

    thinking equally as their probably practical-interpretive usage. Nevertheless, the

    Our main purpose is to review and raise new capabilities. For that purpose we will

    approach the ornamentation through Schenkers writings, his major followers, and

    . That study undoubtedly will be valuable to analysts,

    performers and composers - especially the last one that do use post-modern

    analytical tools as compositional resources.

    Keywords: Heinrich Schenker. Embellishment. Diminution. Musical analysis.

  • LISTA DE ILUSTRAES

    FIGURA 1 - Possibilidades de diminuio intervalar a partir do salto de quinta

    retirados do livro Regole Passagi di musica de Giovanni Battista Bovicelli ............... 27

    FIGURA 2 - her

    Simpson .................................................................................................................... 28

    FIGURA 3 - Fuga em F Maior de J.S. Bach WTC I ................................................. 37

    FIGURA 4 - Bordadura Motvica, Sinfonia n.1 Brahms ............................................. 38

    FIGURA 5 - Derivao da Trade "Natural" ............................................................... 49

    FIGURA 6 Srie harmnica e arpejo primrio ........................................................ 50

    FIGURA 7 - ................................................... 50

    FIGURA 8 Ornamentaes sobre uma estrutura intervalar fixa (5-3) ..................... 53

    FIGURA 9 Referncias bordadura em nvel bsico ............................................. 55

    FIGURA 10 Bordadura como 4 e 2 na Linha Fundamental .................................... 55

    FIGURA 11 Possibilidade da Bordadura 9 com 8 ................................................... 56

    FIGURA 12 Alguns casos possveis de bordaduras inferior e superior .................. 57

    FIGURA 13 - Possibilidades incomuns para as "dissonncias" em tempo fraco. ...... 59

    FIGURA 14 ........................................................ 60

    FIGURA 15 ............................................................................... 60

    FIGURA 16 ........................................... 60

    FIGURA 17 ........................................................................ 61

    FIGURA 18 .......................................................................... 61

    FIGURA 19 - Cambiata (forma bsica) ..................................................................... 65

    FIGURA 20 Nota Cambiata de Fux ........................................................................ 66

    FIGURA 21 Cambiata como dois agrupamentos de notas de passagem .............. 66

    FIGURA 22 Consonncia-Dissonncia-Consonncia. Similaridades na

    estrutura da dissonncia de passagem e sncopa. ................................................... 68

    FIGURA 23 - Suspenso ........................................................................................... 69

    FIGURA 24 Resoluo da sncopa em unssono ................................................... 70

    FIGURA 25 A preparao dissonante da sncopa/suspenso ............................... 72

    FIGURA 26 Consonncia em contexto dissonante. ............................................... 72

    FIGURA 27 Dissonncia aps dissonncia ............................................................ 73

    FIGURA 28 Sncope/suspenso livre e notas implcitas ........................................ 74

  • FIGURA 29 Sncopas sucessivas .......................................................................... 74

    FIGURA 30 - Preenchimento Intervalar ..................................................................... 75

    FIGURA 31 Preenchimento por Terztieler, intervalo-divisor em teras .................. 76

    FIGURA 32 Preenchimento por graus conjuntos ................................................... 77

    FIGURA 33 Preenchimento com omisso de graus conjuntos ............................... 78

    FIGURA 34 Preenchimento com omisso da terceira nota .................................... 78

    FIGURA 35 Preenchimento com omisso da segunda nota .................................. 78

    FIGURA 36 - Preenchimento com omisso da quarta nota....................................... 78

    FIGURA 37 Progresso linear ................................................................................ 80

    FIGURA 38 Arpejo inicial........................................................................................ 82

    FIGURA 39 Arpejo como reforo estrutural em nvel intermedirio ........................ 82

    FIGURA 40 Acorde bordadura ............................................................................... 84

    FIGURA 41 Casos de aproximao superior ......................................................... 85

    FIGURA 42 Segunda espcie e a aproximao superior ....................................... 85

    FIGURA 43 - Sncopa e a aproximao superior ...................................................... 86

    FIGURA 44 - Desdobramentos ................................................................................. 87

    FIGURA 45 - .......................................................... 88

    FIGURA 46 - Substituio ......................................................................................... 89

    FIGURA 47 Substituio como harmnico da srie ............................................... 90

    FIGURA 48 Substituio no Estudo em F Maior, Op.10 No8, de Chopin ............. 90

    FIGURA 49 Transferncia de registro .................................................................... 91

    FIGURA 50 Transferncia de registro por stima .................................................. 92

    FIGURA 51 Transferncia de registro com intervalos compostos .......................... 92

    FIGURA 52 - Acoplamento ........................................................................................ 93

    FIGURA 53 Apojatura ascendente ....................................................................... 102

    FIGURA 54 Apojatura descendente ..................................................................... 102

    FIGURA 55 - Apojatura ascendente e descendente ............................................... 102

    FIGURA 56 Efeito estrutural da apojatura de acordo com a composio livre ..... 103

    FIGURA 57 - Contraponto rgido e o port de voix .................................................... 103

    FIGURA 58 - Contraponto rgido e o coul ............................................................. 103

    FIGURA 59 - Passagem acentuada e port de voix .................................................. 104

    FIGURA 60 - Passagem acentuada e coul............................................................ 104

    FIGURA 61 - Apojatura por salto e grau conjunto ................................................... 105

  • FIGURA 62 - Apojatura por salto e grau conjunto com resoluo em movimento .. 105

    FIGURA 63 - Apojatura por salto e grau conjunto com resoluo em movimento

    contrrio .................................................................................................................. 105

    FIGURA 64 - Apojatura com salto consonante........................................................ 106

    FIGURA 65 - Apojatura por grau conjunto e salto com movimento contrrio .......... 107

    FIGURA 66 - Apojatura como bordadura ................................................................ 107

    FIGURA 67 - Apojatura dupla .................................................................................. 108

    FIGURA 68 - ......................................... 108

    FIGURA 69 - Apojatura dupla pontuada .................................................................. 109

    FIGURA 70 - Relao entre apojaturas duplas e aproximao superior ................. 110

    FIGURA 71 Aplicaes diversas da apojatura dupla ............................................ 110

    FIGURA 72 - Tipos de accent ................................................................................. 112

    FIGURA 73 - Tipos de chte ................................................................................... 112

    FIGURA 74 - Trinado simples ................................................................................. 113

    FIGURA 75 - Trinado ascendente ........................................................................... 114

    FIGURA 76 Trinado Curto .................................................................................... 114

    FIGURA 77 - Trinado com sufixo ............................................................................ 115

    FIGURA 78 Mordente ........................................................................................... 117

    FIGURA 79 - Accacciatura em C.P.E. Bach e F.W. Marpurg (1718-1795) ............. 118

    FIGURA 80 Grupeto e sua execuo nos andamentos ....................................... 120

    FIGURA 81 - Grupeto sobre apojatura .................................................................... 120

    FIGURA 82 - Grupeto invertido ............................................................................... 121

    FIGURA 83 - Escorregadela.................................................................................... 122

    FIGURA 84 - Escorregadela com ponto .................................................................. 122

    FIGURA 85 - Arpejo "harmnico" ............................................................................ 123

    FIGURA 86 - Arpejo "linear" .................................................................................... 124

    FIGURA 87 - ..... 124

    FIGURA 88 - Exemplo de arpejo "linear" Fonte: Adaptado de NEUMANN,

    1978, p. 508. ........................................................................................................... 125

    FIGURA 89 - ................................. 126

    FIGURA 90 - Execuo do arpejo "figurado" ........................................................... 127

    FIGURA 91 - Opes diversas de arpejos figurados ............................................... 128

    FIGURA 92 Compassos 1-2 de "Wie unglcklich bin ich nit" ............................... 130

  • FIGURA 93 - Apojatura como aproximao superior .............................................. 131

    FIGURA 94 A necessidade da nota implcita com a bordadura ........................... 131

    FIGURA 95 Apojatura em forma de coul ............................................................ 132

    FIGURA 96 - Compassos 9-10 de .............................. 133

    FIGURA 97 - Apojatura como sncopa .................................................................... 134

    FIGURA 98 Apojatura simples no compasso 14 .................................................. 134

    FIGURA 99 - ............... 135

    FIGURA 100 ................................... 135

    FIGURA 101 Acorde bordadura na segunda reduo .......................................... 135

    FIGURA 102 Desenho similar apojatura dupla .................................................. 136

    FIGURA 103 - Grupetos "notados" no Estudo n.4 ................................................... 136

    FIGURA 104 Desenhos estruturais similares aos mordentes em Coste .............. 137

    FIGURA 105 Primeira reduo e a bordadura como motivo ................................ 137

    FIGURA 106 Bordaduras como ornamentos de retardo ...................................... 138

    FIGURA 107 Possibilidade do mordente na segunda reduo ............................ 138

    FIGURA 108 Superfcie dos compassos 22-24 .................................................... 139

    FIGURA 109 Progresses lineares no estudo n.4 ................................................ 139

    FIGURA 110 Escorregadelas como progresses lineares ................................... 139

    FIGURA 111 Progresses lineares subdivididas .................................................. 140

    FIGURA 112 Arpejos derivados das progresses lineares .................................. 140

    FIGURA 113 - Escorregadela direcionada nota Sol4 ........................................... 140

    FIGURA 114 accent no estudo n.4 ..................................................... 141

    FIGURA 115 Reduo schenkeriana do trecho ................................................... 142

    FIGURA 116 Desenho similar formao ornamental do chte. ......................... 142

    FIGURA 117 Accent bordadura ............................................................................ 143

    FIGURA 118 Repetio de notas e reduo rtmica ............................................ 143

    FIGURA 119 Compassos 5-6 da sonata L.94 de Scarlatti ................................... 144

    FIGURA 120 Reduo schenkeriana dos compassos 5-6 ................................... 144

    FIGURA 121 Arpejo figurado e escorregadela ..................................................... 145

    FIGURA 122 Escorregadela em nvel estrutural profundo ................................... 145

    FIGURA 123 Compassos 14-18 da sonata L.94 de Scarlatti ............................... 146

    FIGURA 124 Transferncia de registro em larga escala ...................................... 146

    FIGURA 125 Terceira reduo ............................................................................. 146

  • SUMRIO

    TERMO DE APROVAO .................................................................................................... v

    AGRADECIMENTOS ......................................................................................................... viii

    RESUMO .............................................................................................................................. ix

    1. NEO-SCHENKERIANOS E A ORNAMENTAO ................................................... 17

    1.1. TIPOS DE ESTRUTURA .......................................................................................................... 18

    1.3. O PAPEL DA REPETIO ...................................................................................................... 22

    1.4. O PAPEL DO CONTRAPONTO ............................................................................................... 25

    1.5. CONCEITOS DE HORIZONTALIZAO E PREENCHIMENTO ............................................ 26

    1.6. A GRAMTICA MUSICAL ....................................................................................................... 32

    1.7. CONCLUSO ........................................................................................................................... 38

    2. A ORNAMENTAO NOS TEXTOS DE HEINRICH SCHENKER ........................... 40

    2.1. CONCEITO E FILOSOFIA ........................................................................................................ 40

    2.1.1. Gestalt, Ornamentos e Estruturas Dialgicas ................................................................. 40 2.1.2. A Barbrie e a Ornamentao ......................................................................................... 44 2.1.3. O Elemento Extramusical ................................................................................................ 46 2.2. OS NVEIS ESTRUTURAIS ...................................................................................................... 48

    2.2.1. Nvel Bsico ..................................................................................................................... 48 2.2.2. Nveis Superiores ............................................................................................................ 58 2.3. CONCLUSO ........................................................................................................................... 93

    3. A ORNAMENTAO PRTICA ............................................................................... 95

    3.1. IMPROVISAO VERSUS ESTRUTURA ............................................................................... 97

    3.2. ORNAMENTOS ....................................................................................................................... 101

    3.2.1. Apojatura, Port de Voix e Coul .................................................................................... 101 3.2.2. Apojatura Dupla ............................................................................................................. 107 3.2.3. Accent E Chte .............................................................................................................. 111 3.2.4. Trinado E Mordentes ..................................................................................................... 113 3.2.5. Grupeto e Escorregadelas ............................................................................................. 119 3.2.6. Arpejo ................................................................................................................123 3.3. CONCLUSO ......................................................................................................................... 128

    4. ANLISES DE OBRAS .......................................................................................... 130

    CONSIDERAES FINAIS ............................................................................................... 147

    REFERNCIAS ................................................................................................................. 150

    APNDICES ...................................................................................................................... 153

    APNDICE A ............................................. 153

    APNDICE B Segunda re ............................................ 154

    APNDICE C .............................................. 155

    APNDICE D Quart ................................................ 156

    APNDICE E ................................................ 157

  • 16

    APNDICE F Est .................................... 158

    APNDICE G ....................................... 159

    APNDICE H Primeira reduo do Estudo n.4 de Coste ........................................................... 160

    APNDICE I Segunda reduo do Estudo n.4 de Coste ............................................................ 161

    APNDICE J Terceira reduo do Estudo n.4 de Coste ............................................................ 162

    APNDICE L Quarta reduo do Estudo n.4 de Coste ............................................................... 163

    APNDICE M Quinta reduo do Estudo n.4 de Coste .............................................................. 164

    APNDICE N Estrutura fundamental do Estudo n.4 de Coste .................................................. 165

    APNDICE O Reduo ornamental do Estudo n.4 de Coste ..................................................... 166

    APNDICE P Primeira reduo da Sonata L.94 de Scarlatti ...................................................... 167

    APNDICE Q Segunda reduo da Sonata L.94 de Scarlatti ..................................................... 168

    APNDICE R Terceira reduo da Sonata L.94 de Scarlatti ...................................................... 169

    APNDICE S Quarta reduo da Sonata L.94 de Scarlatti ......................................................... 170

    APNDICE T Quinta reduo da Sonata L.94 de Scarlatti ......................................................... 171

    APNDICE U Estrutura fundamental da Sonata L.94 de Scarlatti ............................................. 172

    APNDICE V Reduo ornamental da Sonata L.94 de Scarlatti ................................................. 173

    ANEXOS ........................................................................................................................... 174

    ANEXO A ................................................. 174

    ANEXO B Reedio do Estudo n.4 (COSTE, 1920 p. 4-5). .......................................................... 175

    ANEXO C Sonata L.94 (Scarlatti, 1906-08 p. 28)......................................................................... 176

  • 17

    1. NEO-SCHENKERIANOS E A ORNAMENTAO

    Aps a morte de Heinrich Schenker em 1935, algumas geraes de

    seguidores tiveram um importante papel na divulgao e desenvolvimento de

    suas ideias. Sua teoria, que estimou pela preservao da tradio tonal austro-

    germnica, teve grande influncia no pensamento musical do sculo XX e,

    principalmente, nas universidades americanas. Entre os alunos mais prximos

    de Schenker em Viena, Hans Weisse (1892-1940) foi o primeiro a chegar aos

    Estados Unidos e, entre as dcadas de 1930 e 1940, exerceu uma importncia

    mpar na divulgao desta teoria. Weisse inseriu a teoria schenkeriana

    americana, impulsionando as geraes futuras de tericos neoschenkerianos

    (BERRY, 2005). Apesar disso, somente durante as dcadas de 1960 e 1970

    que, com a traduo dos textos de Schenker para a lngua inglesa,

    aproximaram-se os divulgadores mais representativos para consolidar esta

    teoria na Amrica do Norte. Entre eles, tomaram parte Oswald Jonas (1897-

    1978) e Felix Salzer (1904-1986) como a primeira gerao; Ernst Oster (1908-

    1977), William Mitchell (1906-1971), e John Rothgeb (s.d) como a segunda

    gerao (COOK, 2007). Ao mesmo tempo, esta tentativa visava revigorar a

    teoria contra as constantes crticas e at adapt-la ao contexto vigente que, em

    certos aspectos, dissentia do propsito inicial de Schenker. Por fim, estes

    tericos acolheram, desenvolveram e divulgaram sua teoria analtica de tal

    forma que a anlise schenkeriana foi posta no centro dos estudos de msica

    tonal nas universidades americanas.

    Para situarmos o pensamento schenkeriano, iniciaremos a abordagem

    a partir da reflexo de alguns de seus seguidores mais representativos. Neste

    captulo, como enfoque principal utilizaremos os seguintes livros: Introduction to

    Schenkerian Analysis: Form and Content in Tonal Music (1982), de Allen Forte;

    Structural Hearing: Tonal Coherence in Music (1952), de Felix Salzer;

    Introduction to the Theory of Heinrich Schenker: The Nature of Music Work of

    Art (1982) de Oswald Jonas; e Challenge to Musical Tradition: A New Concept

    of Tonality (1946) de Adele T. Katz. Estes autores, direta ou indiretamente,

    foram alunos de Schenker e abordam sua teoria desde o ponto vista mais

  • 18

    ortodoxo at sua adaptao ao repertrio no tonal1. Forte e Salzer dedicaram

    captulos de seus textos ao tema da ornamentao propriamente ou, se no,

    aos elementos diretamente relacionados ornamentao (tambm chamados,

    neste caso, de diminuies ou prolongamentos). Salzer, junto ao seu seguidor

    Carl Schachter, tambm dedicou um livro, Counterpoint in composition: the

    study of voice leading (1969), ao assunto de contraponto nos moldes da teoria

    schenkeriana. Katz enfoca sobre os aspectos da monotonalidade. Jonas, no

    entanto, aborda especialmente o conceito da elaborao (Auskomponierung),

    tambm anloga ornamentao.

    1.1. TIPOS DE ESTRUTURA

    Definir o que de fato constitui um ornamento ou uma estrutura uma

    tarefa relativamente complexa. Em comparao msica, por exemplo, as

    artes visuais so menos ambguas nestes conceitos2. Na msica, todavia,

    devido ao carter flexvel da estrutura (que, conforme o terico pode ser

    compreendida por motivo, Ursatz, srie harmnica, espectro, texto, entre

    outros), a compreenso do termo ornamento varia de acordo com o contexto,

    escola ou tendncias analtica.

    [...] a construo musical no est sujeita s leis da natureza comparveis s que governam a construo mecnica; e se usarmos

    que no pode ser equiparada com qualquer conceito externo palpvel (NEUMANN, 1970 p. 154, traduo nossa)

    3.

    1 Jonas e Salzer estudaram diretamente com Schenker, Forte e Katz so frutos das geraes

    2

    ambos os propsitos funcionais de uma construo e seus imperativos de engenharia identificaro certos elementos como inconfundivelautor diferenciar estes propsitos essenciais da msica, que so, neste prisma, mais subjetivos. 3 [...] musical construction is not subject to laws of nature comparable to those which

    govern mechanical construction; and if we use the yardstick of "essential meaning," we face the difficulty of definition, because "meaning" in music is an elusive quality which can not be equated with any palpable outside concept .

  • 19

    Uma obra de arte, ainda que visual, no se sintetiza em elementos

    exclusivamente estruturais, ou ornamentais. Neste sentido, certas

    ambiguidades fazem parte tambm da arquitetura como, por exemplo, as

    decoraes de superfcie (como um friso ou uma esttua) que, ainda assim,

    podem apontar para significados estruturais imprecisos. Alm disso, h ainda a

    alternativa de deslocar o objeto ornamental do seu sentido funcional inicial para

    que, ento, adquira um status estrutural ou parcialmente estrutural. Entre a

    estrutura e o ornamento sempre existir algum elemento impreciso de

    transio. Neste caso, fundamental que este elemento seja reconhecido e

    assumido como parte intencional e indispensvel obra.

    funo estritamente decorativa [...] Nem todos os ornamentos so "puros", todavia, no mesmo sentido. H muitos casos em que uma adio ornamental ou quase ornamental tem o objetivo maior de enriquecer a textura musical, intensificando sua comunicao ou, com a licena desta demasiada expresso, a sua expressividade (NEUMANN, 1970 p. 155, traduo nossa)

    4.

    Na anlise schenkeriana, por exemplo, a ao de decompor a obra em

    inmeros nveis estruturais possibilitou, pela primeira vez, um estudo analtico

    cuidadosamente pautado nestas subdivises. Assim, Schenker preferiu no

    enumerar os nveis intermedirios, pois os percebeu como parte livre e

    transicional da estrutura. Igualmente, os elementos estruturais intermedirios

    por cumprirem funes dbias podem ser tambm aceitos como pseudo-

    estruturas ou pseudo-ornamentos. Neumann, neste sentido, abrevia quatro

    tipos: o ornamento , ou o , ou a

    O

    designadamente na superfcie isto , eles operam exclusivamente como

    temporria de estrutura e, consequentemente, operam nos nveis

    diversamente, so planos de fundo em

    contnua sobreposio de ornamentos so diferenciadas

    unicamente pelo contexto. No mbito da teoria

    4 The expendable outermost sphere of lightest specific weight is generally composed

    same sense, however. There are many cases where an ornamental or quasi-ornamental addition has the weightier purpose of enriching the musical texture by intensifying its communication or, if this overworked term may be excused, its expressiveness .

  • 20

    schenkeriana, esta discusso vem a enriquecer o entendimento do nvel

    intermedirio.

    O conceito de estrutura em Katz, no entanto, diz menos a respeito das

    ambiguidades estruturais. Para a autora o que est implcito no pensamento

    schenkeriano o fato d exercer influncia nos demais

    ornamentos da obra

    estrutura primordial [fundamental], o protoplasma externo que envolve todo

    movimento estrutural e de prolongao 23). A ideia de

    neste caso, diz respeito funo delineadora da estrutura

    geradora (Ursatz) que, junto fora organizacional dos encadeamentos de

    vozes com as regras de ornamentao (abordadas no captulo 3), delimitam o

    tipo de ornamentao e, consequentemente, a superfcie da obra. Assim,

    utilizando uma metfora social, Schenker explica a estrutura musical como um

    esboo do que vir a ser a obra em sua completude A origem de cada vida,

    seja a de uma nao, de um cl, ou de um indivduo, se transforma no seu

    (SCHENKER, 1979, p. 3).

    Partindo da ideia que a natureza na msica representada pela srie

    harmnica, Jonas enfatiza a ideia do fenmeno acstico. Assim, destaca que a

    nota musical um fenmeno complexo desde que ela naturalmente

    compreende outros sons:

    sons que emanam da fundamental e surgem de rela

    1982 p. 15). Desde ento, devido a esta capacidade intrnseca da nota musical

    em desdobrar-se na srie harmnica, uma aptido motvica (geradora) pode

    ser atribuda j nota fundamental dado um som estrutural,

    consequentemente geram-se os demais sons harmnicos. Antes disso, a

    representao completa da srie harmnica na prtica composicional,

    especialmente tonal, um procedimento imaginvel desde que alguns

    harmnicos so inaudveis e se estendem ad infinitum. Por conseguinte, em

    um mbito proeminente de escuta, desde que o ouvido prefere as relaes

    simples ou seja, os harmnicos mais prximos da fundamental , a trade

    revelada nos primeiros harmnicos

    e acstica, resultante tanto da srie harmnica quanto da nota fundamental, e

    sntese do que a obra vir a ser. Neste ponto, via trade, a obra ser expandida

  • 21

    de forma que seja garantida a lgica, a suficincia e o direcionamento do todo

    artstico.

    O artista que deseja tornar suas formas utilizveis forado a simplific-las. [...] Mesmo a imitao mais confivel no pode incorporar a causalidade da natureza. Em limitar seus recursos para os harmnicos mais proeminentes com as relaes simples (dois, trs, e quatro), compositores tm facilmente utilizado a lei da abreviao, que absolutamente necessria. [...] A trade, assim, revela-se como uma requisio natural e, ao mesmo tempo, artstica. A essncia da atividade artstica, que consiste na elaborao claramente originada na satisfao da demanda natural, implica que a arte seja autossuficiente e fundamentada na natureza sob a mesma medida (JONAS, 1982 p. 16-17, traduo nossa)5.

    No desenrolar da estrutura, a trade tambm resultado da energia

    motvica da fundamental. No entanto, diferentemente do desdobramento

    infinitamente continuado dos harmnicos da srie, neste plano, a trade

    representa um apoio esttico, pois se torna um ponto de soluo e de coeso

    para os desdobramentos que seguem. Neste sentido, uma padronizao

    inerente dos intervalos gerados pelos harmnicos faz com que eles se

    alizarem uma estrutura tridica ( , nas palavras

    de Neumann). A mesma estrutura tridica , somente com os harmnicos

    superiores, igualmente capaz de recriar a fundamental trazendo o ouvido de

    volta um som que diversas vezes omitido na obra. Por outro lado, neste

    plano, a trade tambm opera como organizadora da hierarquia estrutural

    preservando a unidade tonal, mesmo com poucas combinaes harmnicas ou

    meldicas dos seus intervalos.

    [...] A relao entre estas notas to forte que, onde quer que elas apaream combinadas, como um nico acorde ou sucessivamente com cada nota posicionada como fundamental do seu acorde prprio, a unidade prpria de suas associaes ainda prevalece (KATZ, 1946 p. 9-10, traduo nossa)

    6.

    5

    the most faithfthe strongest overtones with the simplest relationships (two, three, and five), composers have

    triad thus reveals itself as a requirement of Nature and, at the same time, of Art. The essence of artistic activity,

    entails that Art be self-contained and based on Nature in equal measure . 6

    combination as a single chord or in succession with each tone serving as the root of its own chord, the inherent unity of their as

  • 22

    Mais adiante, este conceito ser indispensvel para o entendimento da

    ornamentao schenkeriana7, mais precisamente, a nota implcita que ser

    abordada no segundo captulo.

    1.3. O PAPEL DA REPETIO

    No pensamento schenkeriano a estrutura submetida a um tipo

    diverso de repetio que deve ser diferenciado da repetio

    horizontal. A de uma derivao e

    desdobramento vertical da estrutura ou seja, uma repetio estrutural obtida

    atravs da ornamentao. Tal estrutura assemelha-se a formao homofnica

    coral que, para tal propsito, deve ser impreterivelmente preservada e variada

    com a o carter polifnico das ornamentaes. Para Schenker, a repetio

    unicamente horizontal, ou motvica (no sentido schoenberguiano8), uma

    regresso:

    forma sonata de talentos menores uma regresso [...] O novo tipo de repetio reconhecvel, sobretudo, por sua derivao de sucesses tonais de elementos simples. A magnfica herana do coral alemo trouxe muitas composies concebidas audaciosamente (SCHENKER, 1979 p. 99, traduo nossa)

    9.

    A imitao em si um modelo de associao interna, intrnseco em

    toda arte. Jonas, assim, alude metfora que relaciona a msica a uma

    linguagem artificial (ou fictcia) sem referenciais externos (ou, ainda, sem

    cdigo preestabelecido) que conduz fatalmente falta de direcionamento

    artstico: o dever sua origem para nenhum princpio vlido, deixa de

    despertar imagens vvidas no ouvinte ou telespectador, est morta (JONAS,

    7 Neste caso as ornamentaes schenkerianas so anlogas s diminuies. No terceiro

    captulo, com maior preciso elucidaremos pequenas distines entre ambos conceitos. 8 Menor agrupamento gerador da obra (SCHOENBERG, 1967).

    9 -drama, in program

    repetition is recognizable, above all, by its derivation of tonal successions from the simplest elements. The magnificent heritage of German chorale brought forth many boldly conceived

  • 23

    1982 p. 1). Neste sentido, ao mesmo tempo em que a imitao opera como um

    princpio de coeso, a estrutura cumpre com o papel de impulso criativo. Por

    conseguinte, a criao artstica obtm status independente dos s

    externos. A funo do impulso criativo, neste caso, oferecer ao destinatrio

    um primeiro ato de interesse e satisfao pelo seu reconhecimento.

    O poeta encontra na linguagem, e o artista visual no mundo de figuras que envolvem tanto ele quanto ns, a matria-prima sobre a qual sua arte toma forma. Em diversos casos, as ideias iniciais so relacionadas a um propsito, como aquelas que orientam o arquiteto; necessitam se fixar na natureza e, portanto, (como elas so percebidas igualmente por todos ns) tm validade universal, como a observao da lei da gravidade ou condies rtmicas, concebidas apenas mais tarde. Talvez algum possa, por um lado, distinguir entre associaes diretas e indiretas associaes como aquelas na linguagem e no mundo espacial que evocam imagens imediatamente e, por outro, aquelas que alcanam sua relao com a natureza por meio de foras adormecidas em todos ns (Jonas, 1982 p. 1-2, traduo nossa)

    10.

    Um erro, entretanto, pensar que as associaes externas so inteiramente

    recusadas na anlise schenkeriana. Assim, mesmo clamando em favor do uso

    de referenciais artsticos internos, esta teoria tambm til na anlise dos

    elementos frutos de vnculos externos. Neste sentido, existem duas opes

    referenciais: ou o material musical est vinculado a um propsito

    (extramusical), ou est afixado a um elemento da natureza (musical).

    O vnculo a um propsito extramusical, por exemplo, um tipo de

    associao externa que, por sua vez, pode ser subdividido em associaes

    diretas ou indiretas (JONAS, 1982). Nas associaes diretas, os signos so

    objetivos e imediatamente reconhecveis pelo senso comum por meio de

    referncias aos sons externos retirados da natureza (ou citaes de outras

    obras), referncia textual, ou sincronizao com uma imagem ou gesto corporal

    (exemplo: sons de pssaros, motores, tempestades, toques militares, entre

    outros). Por outro lado, as associaes indiretas so aquelas totalmente

    10

    surrounds both him and us, the raw material upon which his art imposes shape. In other cases the initial ideas are purpose-related, like those that guide the architect; necessitates that reside in nature and therefore (because they are sensed equally by all of us) have general validity, such as observance of the law of gravity or rhythmic requirements, enter only later. Perhaps one could distinguish between direct and indirect associations associations like those in language and the spatial world that evoke immediate images, on the one hand, and those that gain their contact with nature by way of forces dormant in all of us, on the other .

  • 24

    subjetivas (exemplo: durao da obra, representao de sensaes,

    ambientao, entre outros), reconhecveis somente em segunda instncia, ou

    seja, no nvel inconsciente .

    Na viso schenkeriana, desde que vimos que a prpria nota

    fundamental, em certo sentido, apresenta traos motvicos, a criao musical

    (Gestaltung) dispensa os propsitos externos. A natureza da estrutura musical,

    em si, traz elementos suficientes que apontam em direo a sua efetivao

    artstica: com o mundo exterior, espacial, sem

    (JONAS, 1982 p. 2). A repetio,

    neste caso, entra como o principal elemento gerador de coeso estrutural e

    orgnica, seja na msica, na poesia, ou na arte visual. Contrariamente, as

    referncias externas no so capazes de gerar lgica que seja musical (neste

    sentido foi fundamentada a crtica de Schenker aplicao dos elementos

    externos na msica). Pois, por mais que estas manifestaes sonoras auxiliem

    um todo maior (como, por exemplo, a msica de fundo em um evento, uma

    pea de teatro, dana, ou cinema), elas sempre se comportaro como sons

    inacabados e dependentes.

    Ao mesmo tempo em que o recurso da repetio gera organicismo ele

    pode assumir o controle a obra. De acordo com a disposio da estrutura e dos

    caminhos percorridos pelos elementos internos em geral (ornamentos,

    encadeamento de vozes, desvios estruturais), os tipos de repetio podem

    ainda exigir resolues especficas dos compositores rumo superfcie. Tais

    estrutura impondo-lhe extenso, densidade e dramaticidade. Desta forma,

    quanto maior a fora de desvio das repeties maior o seu vigor dramtico:

    pode influenciar o projeto

    completo do todo composicional e ocasiona a ele um verdadeiro contedo

    (JONAS, 1982 p. 5).

  • 25

    1.4. O PAPEL DO CONTRAPONTO

    Outra maneira de compreender a anttese estrutura versus ornamento

    atravs da analogia entre a anttese consonncia versus dissonncia. Desde

    que a dissonncia pode ser concebida como um desvio rumo consonncia, a

    presena da primeira implica na preexistncia da segunda isto , o

    ornamento depende de uma estrutura prvia. A dissonncia representa um

    movimento contnuo consonncia. [...] a propriedade bsica da dissonncia

    . Por outro

    lado, isto devido ao carter esttico da consonncia, que no gera a

    expectativa necessria efetivao da obra musical.

    O contraponto, para a teoria schenkeriana, tanto uma ferramenta

    didtica quanto de expanso e prolongao. Neste sentido, a segunda espcie

    representa a primeira manifestao de prolongao no contraponto rgido, pois,

    neste caso, ela inaugura o processo de diminuio e expanso ao longo das

    espcies. Prosseguindo s demais, novas modalidades de desvios estruturais

    so expostas.

    O intervalo consonante no tempo forte tem o poder de ir alm de si mesmo e estabelecer conexes maiores. A unidade de construo do contraponto tem sido expandida; tem sido sujeita prolongao. E igualmente a lei da consonncia tem sido sujeita prolongao: ela agora no se aplica no plano nota por nota, mas no plano unidade por unidade, em que o contraponto rgido representado por notas do cantus firmus. (JONAS, 1982 p. 53-54, traduo nossa)11.

    De forma similar ao desenvolvimento motvico da Ursatz, o contraponto

    faz uso d repetio vertical como procedimento de expanso desde a

    primeira a quinta espcies. Assim, sobre a estrutura intervalar simples da

    primeira espcie, so adicionados agrupamentos preestabelecidos ou

    ornamentos prontos como: passagens, bordaduras, cambiata, entre outros ,

    11

    to establish larger connections. The unit of construction of the counterpoint has been expanded; it has been subjected to prolongation. And accordingly the law of consonance has been subjected to prolongation: it now applies not at the level of tone to tone but at the level of unit to unit, which in strict counterpoint is represented by the cantus- .

  • 26

    que conduzem s demais espcies ornamentadas. Este tipo de encadeamento

    de vozes chamado de :

    [...] nas espcies combinadas existe um exemplo adicional de uso prolongado da dissonncia que faz deste procedimento o verdadeiro

    tudo sobre prolongaes de espcies combinadas ser compreensvel em termos de encadeamento de vozes, e como unicamente encadeamentos de vozes (SALZER, 1962 p. 84, traduo nossa)

    12.

    Nas espcies combinadas, principalmente, h uma fora inerente que, atravs

    dos princpios de encadeamento de vozes, exerce uma influncia na forma da

    superfcie. Quando o compositor reconhece esta influncia, o prprio

    compreende a essncia do dilogo estrutural ou seja, um jogo entre a

    inteno criativa (Ursatz) e a fora natural dos elementos internos obra. Este

    fato refora a ideia de que o compositor no detm o domnio integral da obra,

    mas to-somente uma capacidade organizadora em direo ao seu propsito.

    1.5. CONCEITOS DE HORIZONTALIZAO E PREENCHIMENTO

    Forte dedicou um captulo do seu livro para discutir especificidades da

    diminuio na anlise schenkeriana. De tal forma, o autor resumiu as principais

    possibilidades na utilizao das diminuies. Para introduzir o tema, foram

    utilizados exemplos dos tratados Regole Passagi di Musica (1594), do

    compositor e terico italiano Giovanni Battista Bovicelli (1550-1594); e The

    Division-Viol (1665), do compositor Christopher Simpson (1602-1669). No

    exemplo adaptado de Bovicelli (FIGURA 1), possvel observar: em (a) o tema

    caracterizado pelas notas estruturais R-L (intervalo de quinta justa marcado

    -se o acento e a

    durao da nota L pelas notas ornamentais F-Sol; em (c) ambas as notas

    12

    [...] in combined species there are additional examples of prolonged uses of the dissonance which male this procedure the true beginning of what later will be

    . However, all of the prolongations of combined species will be understandable in terms of voice leading, and voice leading alone .

  • 27

    estruturais tm sua durao diminuda em uma semnima enquanto que as

    notas ornamentais alcanam o intervalo de quinta por meio de uma escala

    diatnica; em (d) os ornamentos adquirem uma curva mais independente e

    irregular em relao a estrutura bsica; em (e) somente a primeira nota

    estrutural sofre alteraes.

    FIGURA 1 - Possibilidades de diminuio intervalar a partir do salto de quinta retirados do livro Regole Passagi di musica de Giovanni Battista Bovicelli

    Fonte: Adaptado de FORTE, 2005 p. 20.

    A ideia de preenchimento intervalar de Bovicelli apresentada por

    Forte junto de um exemplo de Simpson. Neste caso, Simpson demonstra as

    diminuies como uma variao particular de cada nota da melodia, processo

    denominado breaking the ground

    (FIGURA 2), as notas estruturais adquirem maior vigor por meio das

    substituies, duplicaes rtmicas e pela ornamentao. Esta variao

    particularmente refora a altura (ou nota correspondente), consequentemente

    desfocando a propriedade motvica intervalar do trecho. Neste sentido, cada

    nota da melodia ser, por este mtodo, cuidadosamente variada. Para Jonas,

    esta uma tendncia natural do som sendo -se

    como uma fundamental, e at serem acompanhadas pelos seus prprios

    harmnicos [...] claro que este anseio mais proeminente no caso da voz

    (JONAS, 1982 p. 43).

    Contudo, o molde de ornamentao oferecido pelo exemplo de

    Simpson traz, de fato, uma distino estrutural do exemplo de Bovicelli: no

    enquanto classe

    de nota (pitch class), para emprestar uma terminologia mais concisa todavia,

    intervalo como principal elemento estrutural. Ambos os procedimentos so

    frequentes na construo musical. Assim, possvel aplicar os termos:

    preenchimento intervalar, para o mtodo de Bovicelli; e substituio de notas,

  • 28

    para o mtodo de Simpson (estes procedimentos sero mais adequadamente

    compreendidos quando abordarmos o conceito de direcionamento). Na

    FIGURA 2, Forte demonstra como as notas do baixo podem ser substitudas

    -

    (divisions) em duas mnimas, quatro semnimas, oito colcheias, ou tambm em

    notas de alturas diferentes,

    notas estruturais (ground).

    FIGURA 2 - Simpson

    Fonte: Adaptado de FORTE, 2003 p. 21.

    Assim, a ideia do baixo fundamental e seus harmnicos, e tambm a

    ideia de estrutura e ornamento, esto diretamente intricados com o conceito de

    aos nossos mestres clssicos como

    um legado inesgotvel da arte da variao de C.P.E. Bach (JONAS, 1982 p

    146).

    o melhor entendimento das diminuies desde que sempre, e frequentemente,

    traz exemplos prticos das diminuies por ele abordadas.

    [...] fica evidente que o gnero tema e variaes oferecer um corpus de msica instrutivo para o estudo dos procedimentos de diminuio na msica tonal, posto que oferece uma estrutura musical prototpica (o tema) e uma variedade de diminuies (as variaes) relacionadas diretamente com a estrutura (FORTE, 2003 p. 21, traduo nossa)

    13.

    Por fim, embora Forte aborde indiretamente as duas opes, a sua

    definio tende ao exemplo de Bovicelli,

    diminuio se refere ao processo pelo qual um intervalo formado por notas de

    (FORTE, 1982 p. 7).

    13

    -and-variations genre would provide an instructive corpus of music for the study of diminution procedures in tonal music, since it offers a prototypical musical structure (the theme) and a variety of diminutions (the variations) directly related to that structure .

  • 29

    Em certo sentido, o mtodo de Salzer em Structural Hearing traz um

    enfoque complementar s ideias de Forte. Salzer prima o carter didtico e

    fundamenta a ornamentao principalmente pelo aspecto vertical da teoria de

    Schenker. Assim, no h captulos especficos fundamentados na estrutura

    meldica das diminuies, mas sim um claro enfoque sobre as prolongaes

    de estruturas verticais que so a principal fora organizacional da tonalidade.

    De certa maneira, Jonas no que diz respeito ideia sobre a influncia das

    repeties no todo composicional e superfcie, Salzer refora que aqueles

    acordes ornamentais (contrapontsticos) tambm possuem fora organizacional

    capaz de direcionar, situar estruturas e, ento, gerar polarizaes. Assim, os

    acordes contrapontsticos so elementos horizontais, pois so gerados, nesta

    concepo, atravs dos encadeamentos de vozes; posteriormente, os mesmos

    a deter o controle sobre as vias que levam a

    estas estruturas verticais, influenciando a superfcie da obra de forma

    considervel.

    Atravs do poder de subordinar [hierarquizar] notas e acordes na tentativa de estender um nico acorde no tempo, a prolongao do acorde cria entidades tonais; ela assim uma fora organizacional. Como tal ela se torna o fator essencial neste conceito de organizao pelo qual a msica da civilizao ocidental tem criado e que ns chamamos de tonalidade (SALZER, 1962 p. 17, traduo nossa)

    14.

    Para Katz, igualmente, o elemento mais preponderante da abordagem

    schenkeriana o conceito de harmnico. Assim, neste tipo de anlise, o

    diferencial reside na opo de uma nica e exclusiva tonalidade para

    representao da obra que desconsidera a possibilidade da modulao. Os

    diversos tons so unificados, gerando lgica e unidade n

    com este ponto de vista, a tonalidade no define a fronteira de um nico tom,

    p. 1). Jonas (1982), entretanto, explica o mesmo fenmeno lembrando que o

    esforo de uma nota para independncia gera o que, no conceito schenkeriano,

    14

    ds in order to extend a single chord in time, chord prolongation creates tonal entities; it is thus an organizing force. As such it became the essential factor in that great concept of musical organization which the music of western civilization has created and which we call tonality .

  • 30

    chamado de tonicizao15. Assim, se incluirmos o conceito de tonalidade

    como elemento abrangente, sugerido por Katz, e a tendncia natural

    , de Jonas, conclumos que a tonalidade se estabelece como uma

    fora controladora das tendncias internas e naturais de independncia de

    cada som.

    Rotular um acorde como tnica cada vez que ele aparecer no explica seu papel na msica, como o mesmo acorde de tnica pode ocorrer diversas vezes dentro da frase, de maneira completamente distinta, servindo a um propsito totalmente diferente na msica (KATZ, 1946 p. 9, traduo nossa)

    16.

    Katz e Jonas, alm disso, justificam que tanto a organizao da

    tonalidade quanto a sustentabilidade da atividade harmnica musical reside no

    intervalo de quinta justa. Katz, para isso, lembra que o intervalo de quinta-justa

    faz parte dos primeiros harmnicos e do estabelecimento da progresso I-V-I:

    re a fundamental e

    a sua quinta (KATZ, 1946 p. 9). Neste caso, a quinta-justa funciona como um

    intervalo que, alm de estabilizar verticalmente o arpejo primrio, representa o

    movimento horizontal de retorno tnica

    distinta da fundamental, que direciona sua oitava. Igualmente, Jonas atribui a

    quinta a fora maior da tonalidade, um agente de movimento que garante o

    primeiro impulso vital na srie harmnica. Pela condio de terceiro harmnico

    da srie, a quinta pode ter sentido prprio, pois se a considerarmos como uma

    seus harmnicos so configurados de forma bastante

    similar aos harmnicos da tnica que a ampara:

    nota em direo ao seu harmnico mais forte, a quinta, chegamos a uma nova

    nota que estabelece a si mesma como um agente independente de seus

    21). Devido a tal semelhana, a quinta

    , tambm, fora de movimentao

    imprescindvel para a compreensibilidade tonal e de direcionamento. Neste

    15

    Tonicizao, neste caso, diz respeito caracterstica intrnseca de cada nota musical de tornar-se principal na hierrquica tonal, com efeito similar modulao. Em outras palavras, uma caracterstica usual cada nota musical, desde que valorizada, tender a reconstruir a tonalidade em sua prpria fundamental. 16

    music, as the same tonic chord may occur several times within a phrase, each time in an

  • 31

    sentido, a quinta representa o movimento com da

    condio esttica da tnica , e estabilidade, desde que representa um

    intervalo indispensvel na formao das trades maiores e menores. De tal

    forma, o gera expanso e

    interesse geral da obra musical.

    Conforme vimos, no enfoque de Salzer e Katz, o aspecto harmnico

    o elemento de enfoque que apoia todos os desdobramentos meldicos e tipos

    de elaborao e prolongao musical. Para Salzer, as prolongaes em si

    abrangem uma srie de funes distintas que funcionam na prtica

    composicional, mas sua terminologia pode causar certa impreciso na prtica

    analtica pea consiste na expanso,

    modificao, contorno e elaboraes desta direo bsica e isto ns

    chamamos de prolongao (SALZER, 1962 p. 14). Katz categoriza a

    prolongao em somente dois modelos bem definidos: (1) a de

    horizontalizao, que consiste na expanso de um nico ponto (nota ou

    acorde); (2) e de preenchimento, que consiste na ligao ou expanso do

    espao entre dois elementos estruturais. Os modelos de Katz so, em certo

    sentido, similares aos princpios de preenchimento intervalar e a expanso

    estrutural dos exemplos anteriores de Forte retirados dos tratados de Bovicelli

    e Simpson. Recordando, o preenchimento intervalar conduz o intervalo em si a

    um primeiro plano ou seja, utiliza do ornamento de maneira especialmente

    direcional ao estabelecer ligao entre duas notas distintas, sem perder o papel

    expanso estrutural amplifica elementos individuais (nota ou acorde) sem se

    importar com os demais pontos de apoio, direcionamento, ou encadeamentos

    cumpre com a funo de horizontalizar elementos estticos ou verticais e

    especialmente ampliar pontos especficos da estrutura: em alguns

    exemplos os acordes contrapontsticos expandem um nico acorde arpejado,

    enquanto em outros eles prolongam o espao entre dois acordes diversos de

    uma progresso harmnica 16). A ideia de prolongao interna

    ou externa, individual ou de ligao, assim, diz respeito respectivamente ou

    prolongao de um elemento musical, ou conduo de um elemento a outro.

  • 32

    Aqui, todas as frases e sees da obra ou de um movimento, a despeito do contraste meldico e harmnico que oferecem, constituem tanto uma prolongao harmnica de um membro da progresso principal, um movimento de passagem entre dois membros da progresso, ou uma prolongao harmnica do acorde de passagem ou de adorno. Assim, todavia o efeito destas expanses so variados e contrastantes, todos procedem dentro do limite da tonalidade fundamental, desde que so desdobramentos da estrutura primordial que esboa o movimento adentro de uma tonalidade nica (KATZ, 1946 p. 26, traduo nossa)

    17.

    Para Jonas, a prolongao um processo anlogo elaborao

    (Auskomponierung). Esta terminologia bastante recorrente nos textos de

    Jonas e, desde que ele evidencia a funo de conservar as estruturas sempre

    ouvinte, est tambm a prxima das ideias de horizontalizao

    de Katz: o na conscincia de um ponto de partida

    meldico alm dos limites da sua durao sonora efetiva, como se fosse

    realmente sustentvel 41). A elaborao pode ainda ser

    relacionada ideia do preenchimento estrutural (direcional), visto que ela

    costuma operar no mbito tambm da escuta, como elemento de juno

    estrutural: a as notas como

    parte de um todo Ibidem, p. 41).

    1.6. A GRAMTICA MUSICAL

    O aspecto da audio trazido de maneira elementar no trabalho de

    Salzer em Structural Hearing, como o prprio ttulo sugere. Assim, este

    princpio antevisto nos textos de Schenker refora o objetivo da anlise como

    algo alm do treinamento terico capaz de estimular a conscincia analtico-

    auditiva. ajustar a aptido imediata de

    17

    melodic and harmonic contrast they offer, constitute either a harmonic prolongation of a member of the primordial progression, a passing motion between two members of the progression, or a harmonic prolongation of a passing or embellishing chord. Thus, however varied and contrasting is the effect of these expansions, they all come within the boundary of the fundamental tonality, since they are all offshoots of the primordial structure that outlines a motion within a single key .

  • 33

    ouvir o que os grficos schenkerianos propem definindo estruturas,

    horizontalizaes e direcionamentos , no como notas ou acordes dispersos,

    mas como um todo interdependente e orgnico. Jonas, similarmente, relaciona

    o desenvolvimento da escuta estrutural com a ideia da elaborao e ao estudo

    do contraponto. Para isso, o estudo do contraponto, inicialmente, comina em

    uma melhoria na conscientizao da escuta: na a ouvir,

    (Ibidem p. 58). Na anlise

    schenkeriana, os elementos contrapontsticos so visto como complementar

    aos elementos estruturais. Assim sendo, a escuta consciente proporciona ao

    ouvinte o reconhecimento imediato da estrutura e suas prolongaes, assim

    como intensificar a experincia orgnica e percepo da variedade artstica.

    percepo instintiva do verdadeiro ouvido musical e pode ser chamada de

    escuta estrutural (SALZER, 1962 p. 13). Na metodologia de Salzer, para se

    alcanar tal propsito, o primeiro passo deve ser a compreenso da gramtica

    (chord grammar) e do significado (chord significance).

    Schenker desenvolveu uma distino entre acorde de estrutura e acordes de prolongao diretamente de sua diferenciao entre chord grammar e chord significance, e de sua insistncia em considerar a direo musical. Esta distino entre estrutura e prolongao se transformou na espinha dorsal de toda a sua abordagem. Por meio desta distino ouvimos uma obra, no como uma srie de frases e sees fragmentadas ou isoladas, mas como uma estrutura orgnica nica pelo qual a prolongao do princpio de unidade artstica e variedade so mantidas (SALZER, 1962 p. 13, traduo nossa)

    18.

    O chord grammar um termo que se refere ao status gramatical, ou

    seja, a nomenclatura de determinado acorde, a coluna vertebral da anlise

    harmnica moderna. Para Salzer, atravs do chord grammar que podemos

    atribuir rtulos s trades, acordes de stima, entre outros. Este termo

    apresenta o acorde referenciado estabelecido

    de nomenclatura que rompe com funo individual do acorde no todo orgnico

    da obra. Diversamente, o chord significance diz respeito funo estrutural do

    18

    chords of prolongation directly out of his differentiation between chord grammar and chord significance,

    between structure and prolongation became the backbone of his whole approach. By means of this distinction we hear a work, not as a series of fragmentary and isolated phrases and sections, but as a single organic structure through whose prolongation the principle of artistic unity and variety is maintained .

  • 34

    acorde em uma obra. O estudo do chord significance possibilita seguir adiante

    da mera descrio gramatical e demonstrar o propsito arquitetnico de cada

    acorde em uma obra. Schenker exps a diversidade dos papis que os acordes

    representam em uma frase musical ou seo. Mesmo dois acordes

    gramaticalmente idnticos, que so apresentados em uma mesma frase,

    podem cumprir funes totalmente distintas (SALZER, 1962). A ideia geral

    apresentada pelo conceito de chord significance,

    do acorde determinada pela prpria obra em que contido. Ou seja, a funo

    que um acorde cumpre na estrutura orgnica no deve dizer respeito a

    elementos extra musicais ou musicais externos a tal obra. Desta forma, na

    teoria schenkeriana, alguns acordes deixam de ter origem unicamente

    harmnica e passam a ser como s s tanto a

    cumprir papel estrutural harmnico (vertical) como um papel contrapontstico

    (horizontal). No ltimo caso, podemos dizer que ele cumprir somente a funo

    Uma vez compreendido o conceito de significado (chord significance),

    de forma concordante ou no, os acordes devem ser enquadrados em uma

    funo relacionada meta estrutural, preenchendo basicamente duas funes:

    de estabelecimento da estrutura, ou de prolongao. Respectivamente, estas

    funes devem ser relacionadas s funes: harmnica ou contrapontstica.

    Assim, em Schenker, o termo funo harmnica deve ser usado somente para

    acordes conectados diretamente com a base de associao harmnica

    (Ursatz). Todavia, aqueles acordes contrapontsticos que no fizerem parte

    funo de movimento, direo e ornamentao da estrutura. Finalmente, os

    acordes com significado estrutural sero chamados de acordes harmnicos,

    enquanto que acordes de significado ornamental sero chamados de acordes

    contrapontsticos.

    O significado estrutural pode ser tambm relacionado nos termos de

    linguagem falada. Tanto Jonas quanto Katz frequentemente fazem uso deste

    musical. Assim, no processo analtico harmnico tonal, em geral, o

    procedimento natural , primeiramente, nomear o acorde em seus aspectos de

  • 35

    sintaxe (chord grammar); em segunda instncia, o dilogo estabelecido entre

    estes aspectos induz, como na linguagem falada, ao significado semntico.

    Salzer alerta para o frequente erro, decorrente da prtica analtica funcional19

    de Hugo Riemann (1849-1919), em tornar a primeira etapa de identificao de

    omo o propsito final analtico:

    passo inicial inevitvel no estudo da msica [...] Mas ao invs de reconhec-la

    s como um trabalho de base [...] Ela tem sido feita o fator principal no enfoque

    analtico 9). Neste sentido, o reconhecimento dos acordes

    somente pelas suas nomenclaturas de superfcie (acordes funcionais como

    tnica, mediante, subdominante, indicados atravs de trades e acordes de

    stima) um recurso analtico bastante parcial. Assim, Katz argumenta que, na

    linguagem falada, o fato de conhecer adequadamente o significado gramatical

    das sentenas no habilita o leitor compreenso adequada de obras de

    Shakespeare, por exemplo. Portanto, de forma diversa, existe a tendncia no

    meio musical de presumir o entendimento da obra desde que o significado

    gramatical dos acordes seja assimilado. Desta forma, Katz argumenta sobre a

    necessidade da compreenso estrutural em significado, mais adiante das

    usuais anlises harmnicas funcionais.

    Em resumo, ns compreendemos a sintaxe de cada acorde do mesmo modo como, ao analisarmos uma sentena [falada], definimos a sintaxe de cada palavra como um substantivo, pronome, adjetivo, verbo ou advrbio. Contudo, assim como todos esses termos significam o status gramatical de uma palavra em uma frase, igualmente os termos tnica, subdominante ou dominante indicam a posio de um acorde na tonalidade. Em casos especficos, admitimos que [o fato de] analisar uma sentena corretamente no certifica o aluno adequadamente para compreender totalmente o significado de um drama de Shakespeare, um poema de Shelley, ou um ensaio de Macaulay; tambm, por outro lado, contamos que um estudante que saiba apenas os nomes dos acordes, as regras de progresses de acordes, e certos elementos de estilo e forma [j est apto para] analisar e interpretar um coral Bach, uma sonata Mozart ou uma sinfonia Beethoven (KATZ, 1946 p. 8, traduo nossa)

    20.

    19

    Hugo Riemann foi um dos principais expoentes da harmonia maneira anloga Schenker, os acordes de uma obra so interpretados em funo ou variao de uma tonalidade principal, eliminando as modulaes passageiras, mas com a distino de serem sempre relacionados s trs funes tonais: a tnica, a subdominante e a dominante. 20

    In short, we understand the syntax of each chord, exactly as when we parse a sentence we define the syntax of each word as a noun, pronoun, adjective, verb or adverb. But just as each of these terms denotes the grammatical status of a word in a sentence, so the terms tonic, subdominant or dominant indicate the position of a chord in the key. In the one

  • 36

    Enquanto Salzer expe pouco em seu livro a respeito do motivo na

    anlise schenkeriana, Forte aprofunda em um ponto especial para esta

    questo: os tipos de diminuio por exemplo, uma sequncia intervalar, notas

    de passagens ou arpejos so notados atravs do pensamento motvico

    tradicional, mas emoldurados na teoria de Schenker. Neste sentido, Forte

    demonstra como um tipo comum de repetio motvica pode conduzir

    ornamentos em

    diminuies atuando como geradores de motivos meldicos. [...] aquela que

    aparece repetida e pode ser transformada de distintas maneiras no decorrer de

    uma obra 29). Assim, o autor exemplifica a passagem

    bordadura como elementos de ligao entre os nveis diversos. Tais motivos,

    assim, promovem o dilogo estrutural, reforando as notas da estrutura

    fundamental sem que o motivo em si seja visto como a legtima estrutura da

    obra. Jonas, por exemplo, explica que a repetio schenkeriana deve ir alm

    do conceito tradicional de motivo. Igualmente, o motivo considerado por

    Schenker tambm adquire um significado distinto normalmente, atribudo

    repetio de sequncia intervalar (Linkage Knupftechnic):

    lidando com repeties que vo alm do motivo, o equivalente tonal explcito

    da palavra

    (JONAS, 1982 p 130).

    Como a nota de passagem, a bordadura pode variar em magnitude. Pode operar abertamente ou dentro do motivo como uma expanso inicial; pode conduzir uma seo formal; ou, finalmente, em sua extenso mxima, pode operar durante o decurso de uma pea inteira. Para a composio livre, seu carter ornamental oferece uma frequente vantagem, desde que com a sua aplicao, um ponto especfico pode ser estendido! (Ibidem, p. 93-94, traduo nossa)

    21

    case, we admit that to parse a sentence correctly does not automatically enable a student to comprehend fully the meaning of a drama by Shakespeare, a poem by Shelley, or an essay by Macaulay; yet, on the other hand, we expect a student who knows only the names of chords, the rules of chord progressions, and certain elements of style and form to analyze and interpret a Bach chorale, a Mozart 21

    operate overtly or within the motive as an initial expansion; it may govern a formal section; or, finally, in its maximum extension, it may operate over the course of a whole piece. For free composition, its ornamental character frequently offers an advantage, since with its use a single p

  • 37

    Assim, na FIGURA 3, Jonas demonstra como um ornamento pode

    estabelecer vnculo entre a superfcie a, e nvel intermedirio de ordens

    distintas, b e c. Em a, a bordadura acentuada estabelecida em R4 logo no

    primeiro compasso do tema. Em b e c, no compasso 46, a bordadura R4

    redor da notas D#4. De tal forma, em um procedimento anlogo ao tratamento

    dos acordes (chord grammar e significance), um elemento meldico de mesma

    sintaxe tambm capaz de operar com significados semnticos distintos desde

    que estabelecido em nveis tambm distintos.

    FIGURA 3 - Fuga em F Maior de J.S. Bach WTC I Fonte: Adaptado de JONAS, 1982, p. 94.

    Para Forte, no entanto, o exemplo de Brahms (FIGURA 4) demonstra

    como a bordadura da voz inferior R2-D2-R2 repetida e variada j nos

    primeiros compassos e no decorrer da obra. Em a, os motivos-bordadura so

    apresentados nos compassos 1, 4 e 5, com alturas e qualidade intervalar

    distintas. Em (b), nos compassos 64-65, existem variaes em ritmo e altura

    que ornamenta as notas estruturais D#4 e F#

    sempre como uma adjacncia em relao nota estrutural, j que permanece

    19). Neste sentido, a bordadura naturalmente resulta dependente de uma ou

    duas notas estruturais iguais e adjacentes nota ornamental, conferindo a este

    tipo de ornamento um significado estrutural especfico de prolongao.

  • 38

    FIGURA 4 - Bordadura Motvica, Sinfonia n.1 Brahms Fonte: Adaptado de FORTE, 2003, p. 30.

    As terminologias chord significance e chord grammar de Salzer so, de

    fato, to importantes para individualizar os elementos das estruturas musicais

    quanto os conceitos de horizontalizao e preenchimento abordados por Katz.

    Assim, desde que a abordagem de Salzer voltada ao aspecto harmnico, o

    emprstimo destas terminologias pode tambm favorecer na compreenso e

    significado de elementos meldicos. Neste sentido, adequam-se tambm as

    terminologias note grammar e note significance, ou menos, independente da

    terminologia, um entendimento da diferenciao entre o nome das notas e o

    seu significado estrutural, que tambm parte imprescindvel ao mtodo

    analtico musical.

    1.7. CONCLUSO

    Neste captulo observamos o contexto e o pensamento schenkeriano a

    partir dos seguidores Forte, Jonas, Katz, e Salzer. Entre diversos aspectos, foi

    possvel observar que na diferenciao prtica da estrutura e a superfcie

    elementos transicionais ornamentais so indispensveis e inclusos j na

    estrutura. Assim, traos ornamentais foram apontados na nota fundamental

    que, neste sentido, jamais se desvincula da repetio natural dos seus prprios

    harmnicos. neste sentido que argumentamos que um elemento estrutural

  • 39

    est intrincado com a ornamentao e, de tal forma, qualquer tentativa de

    diferenci-las somente advm de maneira contextual. Sendo contextual,

    destacamos aspectos pertinentes compreenso desta distino, incitados

    pelos tericos acima como: o conceito de contraponto prolongado e as

    espcies como nveis de ornamentao; a relao entre consonncia e a

    dissonncia com o conceito de estrutura e ornamento; a repetio

    schenkeriana e a importncia do desdobramento motvico vertical; o conceito

    de horizontalizao e preenchimento ornamental; e a gramtica como uma

    diviso de sintaxe e semntica musical.

    Alm disso, este captulo serviu para discutir aspectos incisivos nas

    obras dos autores: a gramtica em Salzer, monotonalidade em Katz,

    elaborao da srie harmnica em Jonas, e o ornamento em Forte. Outro

    aspecto relevante nesta discusso foi o tratamento extramusical no

    pensamento schenkeriano, que tem sido to pouco abordado pelos tericos

    atuais. Embora Schenker fosse oposto em pensamento ao ideal

    laborada para a anlise do

    discurso interno de uma obra musical, o prprio terico no excluiu a

    possibilidade de aplicao da anlise schenkeriana tambm em obras vocais,

    ballets e peras. No entanto, para Schenker, o discurso representativo deveria

    ser elaborado dentro dos limites de coerncia interna.

  • 40

    2. A ORNAMENTAO NOS TEXTOS DE HEINRICH SCHENKER

    2.1. CONCEITO E FILOSOFIA

    2.1.1. Gestalt, Ornamentos e Estruturas Dialgicas

    A estrutura e o ornamento, em relao s demais teorias analticas dos

    sculos XIX e XX, so conceitos peculiares na caracterizao do pensamento

    schenkeriano. Para exemplificar, em teorias como a de Arnold Schoenberg

    (1874-1951) e de Rudolph Rti (1885-1957), por exemplo, elementos que

    receberam enfoque secundrio na teoria schenkeriana (como o motivo) so

    abordados no processo analtico como parte indispensvel da estrutura.

    Conforme vimos no captulo anterior, todo material gerador da obra no

    pensamento schenkeriano deve desenvolvido de maneira vertical . No entanto,

    por uma questo prtica, o terico estabelece um ponto de partida a estrutura

    fundamental22 que no propriamente um motivo, srie harmnica, ou nota

    fundamental, mas um artifcio capaz de amparar a obra como um todo (KATZ,

    1946; SALZER, 1962; SCHENKER, 1979). Ainda assim, elementos musicais

    diversos (como o motivo, a forma e o ritmo) no so exatamente evitados nesta

    teoria. Em certas ocasies, eles tm uma importncia estrutural secundria ou,

    em outras ocasies, uma valorizao at maior que a usual no todo estrutural.

    Para o ltimo caso, incluem-se os ornamentos que basicamente contribuem

    com o reforo da estrutura.

    Qualquer que seja a maneira em que o plano frontal se desdobre, a estrutura fundamental do plano de fundo e os nveis de transformao do plano intermedirio garantem a vida orgnica [...] A estrutura fundamental representa a totalidade. Ela a marca de unidade e, desde que representa o nico ponto de vantagem de onde possvel ver tal unidade, ela previne todos os conceitos falsos e distorcidos.

    22

    Estrutura schenkeriana no qual toda a obra deve derivar-se, tambm chamada de Ursatz. A estrutura fundamental estabelecida a partir da unio da Urlinie e do Bassbrechung, que so respectivamente, a linha fundamental e baixo fundamental.

  • 41

    Nela reside a percepo global, a resoluo de toda diversidade em final completude (SCHENKER, 1979 p. 5, traduo nossa)

    23.

    O organicismo musical um objeto de ateno nos textos de Schenker

    que provm do contexto no qual so includas a teoria evolucionista24 e a

    psicologia da Gestalt25. Schenker e alguns tericos precursores, como A.B.

    Marx (1795-1866), Arnold Schering (1877-1941), e o esteta A. W. Schlegel

    (1767-1845) acreditavam que os processos criativos na arte deveriam ser

    correlacionados com os estudos da psicologia e, principalmente, com

    pensamento evolucionista. Acreditava-se, igualmente, em uma inteligncia

    intrnseca natureza capaz de influenciar este processo:

    uma obra de arte conscientemente modelada permanece um trabalho da

    n SCHLEGEL apud BENT, 1987 p.

    29). Assim, muitas das metforas utilizadas por Schenker quando compara a

    arte natureza devem ser interpretadas como anlogas a tal tendncia. Desta

    forma, a teoria de Marx pode ainda que indiretamente conviver com o

    pensamento schenkeriano. Pois, se ambos os estudos so simpatizantes do

    pensamento da Gestalt e do conceito evolucionista, ainda que na concepo

    de A.B. Marx o motivo se comporte como o elemento gerador da forma e da

    obra, o t em ambos tericos assume um significado diverso da mera soma

    das partes.

    Para Marx, a nimo do Todos os processos tm um ponto de partida, eles germinam e crescem, e em todos os pontos so harmoniosos e completos. Nesse ponto de partida Marx colocou o Motiv, uma unidade pequena de duas ou mais

    23

    The fundamental structure represents the totality. It is the mark of unity and, since it is the only vantage point from which to view that unity, prevents all false and distorted conceptions. In it

    24

    Em 1859, Charles Darwin (1809-1882), relacionando ao princpio de seleo natural, introduz a ideia de um ancestral comum a todas as espcies de seres vivos atravs do livro On the Origin of Species by Means of Natural Selection, or The Preservation of Favoured Races in the Struggle for Life. Diversos tericos musicais foram influenciados por tal ideia atribuindo ao motivo o papel musical gerador. Entre eles, encontram-se alguns precursores e contemporneos de Schenker como A.B. Marx, Rti e Schoenberg. 25

    entendida como um sistema dinmico que sintetiza a percepo (proximidade, continuidade, semelhana, segregao, preenchimento, unidade, simplicidade e figura/fundo) em conceitos que se estendem alm da soma de duas, ou mais, percepes. Em termos musicais, tal tipo de percepo gera organicismo, dramaticidade e dilogo estrutural.

  • 42

    notas que serve como semente ou origem da frase no qual ela se desenvolve (BENT, 1987 p. 28-29, traduo nossa)

    26.

    Frequentemente, a teoria schenkeriana mencionada pelo enfoque s

    camadas musicais. No entanto, Schenker no foi necessariamente o primeiro

    nem o nico a levantar este tipo de procedimento, mas foi quem apontou a

    importncia dos dilogos internos na obra musical especialmente aqueles

    ocasionados entre as camadas estruturais. Alm disso, observamos um

    equvoco comum da crtica quando na tentativa de sintetizar o propsito da

    anlise schenkeriana. Este equvoco consiste em reduzir a anlise

    schenkeriana ao objetivo nico de destacar na obra uma estrutura

    fundamental. Assim, importante lembrar que a estrutura fundamental opera

    como o remate do processo analtico schenkeriano e, desta maneira, ela

    permite os desvios em forma de prolongaes, diminuies ou ornamentos ,

    que so os elementos que abrigam possibilidades criativas e a

    da obra. Desta forma, a estrutura fundamental representa especificamente um

    propsito, cujo caminho capaz de proporcionar ao intrprete questionamentos

    fundamentais para a compreenso da trama composicional.

    Na arte musical, como na vida, o caminho em direo ao objetivo depara com obstculos, reverses, desapontamentos, e enfrenta grandes distncias, desvios, expanses, interpolaes, e, sintetizando, retardos de todos os tipos. Incluso jaz a resposta de toda demora artstica, por onde a mente criativa pode derivar o material que sempre novo. Desta maneira, ouvimos nos nveis intermedirios e superficiais um curso quase dramtico dos acontecimentos. (SCHENKER, 1979 p. 5, traduo nossa)

    27.

    A ideia schenkeriana de estrutura e desdobramento, direta ou

    indiretamente, deriva dos principais tratados de teoria musical e

    26

    starting-point, they germinate and grow, and at all points are harmonious and whole. At that starting-point Marx placed the Motiv, a tiny unit of two or more notes which serves as the seed

    27

    In the art of music, as in life, motion toward the goal encounters obstacles, reverses, disappointments, and involves great distances, detours, expansions, interpolations, and, in short, retardations of all kinds. Therein lies the source of all artistic delaying, from which the creative mind can derive content that is ever new. Thus we hear in the middleground and foreground an almost dramatic course of events

  • 43

    ornamentao28. Ainda, existem obras que

    diferenciar estrutura e ornamento (como o estudo Op. 25 n.1 de Frdric

    Chopin) que anteriormente suscitavam a ideia de hierarquia estrutural. No

    entanto, foi Schering quem, antes de Schenker, de fato,

    Dekolorieren 29 (BENT, 1987 p. 38). Desta forma, no

    sendo a anlise schenkeriana, a primeira necessariamente a reconhecer a

    ornamentao como elemento intrnseco no processo composicional, ela a

    que apontou as inter-relaes deste elemento como tambm essencial para a

    compreenso musical.

    Algumas vezes, estas inter-relaes podem ser mais bem aclaradas se

    dispostas na forma dialtica (tese, anttese e sntese). De tal maneira, a riqueza

    do dilogo entre dois elementos distintos reside basicamente, desde que as

    partes propriamente no representam o todo, no terceiro elemento que, ainda,

    pode proporcionar um material suplementar na trama composicional. Neste

    sentido, Schenker idealiza o dilogo entre as estruturas musicais. E ento,

    possvel entender esta analogia estrutura fundamental e s camadas

    superiores, ou vice-versa.

    Na inteno de representar textualmente aspectos subjetivos da

    msica, Schenker frequentemente recorre metfora. No entanto, no que diz

    respeito especialmente s menes natureza, elas podem ser tomadas em

    um sentido quase literal. Para ele, a msica em si uma representao do

    cotidiano. Neste sentido, o terico compara a estrutura fundamental origem

    da vida, a estrutura intermediria ao desenvolvimento, e a superfcie da obra ao

    presente predestinado desde sua origem.

    A origem de cada vida, seja a de uma nao, de um cl, ou de um indivduo, se transforma no seu destino. Hegel define o destino como

    nvel bsico, nvel intermedirio e nvel de superfcie sua unio expressa a integrao de um indivduo, a vida autnoma. [...] Na tentativa de compreender o que vive e se move por detrs do

    28

    Referimo-nos aos tratados Versuch ber die wahre Art das Clavier zu spielen (1753) de C.P.E. Bach, Gradus ad Parnassum (1725) de J.J. Fux, e Traite de lharmonie (1722) J. Rameau. 29

    Na desornamentao, Schering realizava o processo inverso do senso comum (prtica de ornamentar), ou seja, excluam-se os ornamentos, um a um, na inteno de alcanar a estrutura musical, ou a pea musical em seu estado puro.

  • 44

    fenmeno da vida, por detrs das ideias em geral e arte em particular, ns solicitamos um plano de fundo definido, uma alma predisposta a acolher o nvel bsico. Tal alma, constituda de um desenvolvimento peculiar da natureza humana sendo quase mais arte que natureza dada to-somente ao gnio. (SCHENKER, 1979, p. 3, traduo nossa)

    30.

    No mbito estrutural, no so bem-vindas as elaboraes aleatrias,

    pois desde que h uma estrutura, os demais elementos precisam ser

    desenvolvidos a partir dela, sob o risco de resultar em caos. Schenker

    relaciona o dia a dia das grandes massas como metfora da desordem. Para

    ele, o cotidiano catico da populao tinha a capacidade de refletir, de fato, em

    alguns compositores, como obras sem coerncia artstica, lgica ou

    organicismo:

    vidas so s uma desordenada e eterna superfcie, um presente contnuo e

    sem conexo, soltas caoticamente no vazio, de forma ani

    (SCHENKER, 1979 p.3).

    2.1.2. A Barbrie e a Ornamentao

    Em complemento a tal

    por Schenker, Nicholas Cook (2007) aponta fato similar, volvido ao significado

    social a ideia do ornamento como sinnimo da falta de civilidade. Entre 1890

    e as primeiras dcadas do sculo XX, em Viena, um tendncia modernista

    atribua um sentido pejorativo aos ornamentos. Assim, ele era relacionado ao

    desperdcio, inatividade, ao cio. Schenker, embora estivesse desfavorvel a

    esta linha de pensamento, provavelmente esteve acometido por tal tendncia.

    O arquiteto Adolph Loos (1870-1933), que permanecera no mesmo ciclo social

    vienense, estava entre os principais militantes contra a ornamentao. De tal

    30

    ll development and is ultimately part of the

    their union expresses the oneness of an individual, self-contained life. In order to comprehend what lives and moves behind the phenomena of life, behind ideas in general and art in particular, we ourselves require a definite background, a soul predisposed to accept the background. Such a soul, which constitutes a peculiar enhancement of nature in man- being almost more art than nature is given only to genius .

  • 45

    forma, Loos desvestia suas obras de qualquer tipo de ornamento e, em um

    ensaio publicado na