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Quinta Comissão da Assembléia Geral das Nações Unidas: Econômico e Financeiro (EcoFin) Tópico: Políticas Macroeconômicas e Desenvolvimento

Autores: Carlos Góes Dimas Fazio

Marina Calonego de Oliveira Paula Coury Andrade

Thiago Pessoa Gusman

Políticas Macroeconômicas e Desenvolvimento Lições históricas e tendências futuras para um ambiente de crise

Sem crise não há desafios, sem desafios, a vida é uma rotina, uma lenta agonia. / Sem crise não há

mérito. / É na crise que se aflora o melhor de cada um. / Falar de crise é promovê-la, e calar-se sobre

ela é exaltar o conformismo. / Em vez disso, trabalhemos duro. / Acabemos de uma vez com a

única crise ameaçadora, que é a tragédia de não querer lutar para superá-la.

Albert Einstein

A lição é clara: o Estado e o mercado existem para servir ao homem e não o contrário.

Rubens Ricupero

Introdução

As questões econômicas estão incrustadas no cerne da vida social e dela não se distinguem. A separação entre economia, política, ecologia e sociologia, entre outras áreas, é puramente técnica, um simples método de facilitar o estudo da realidade.

Nesse sentido, se torna mais fácil observar que a economia não é unicamente um assunto concernente aos economistas ou aos tomadores de decisão – mas a todos os indivíduos. Isto, pois, estando entrelaçados às diversas facetas da vida social, os fenômenos econômicos influenciam de forma direta a vida individual, criando limitações e oportunidades de escolha nos outros aspectos da vida.

Conjecturando, não é difícil imaginar que uma recessão econômica pode adiar os planos de um casal para uma grande festa de casamento. Por outro lado, a queda nos preços dos aluguéis pode facilitar o intento de um grupo de jovens em criar uma organização não-governamental para defender o meio-ambiente, tendo para ela uma sede.

Este artigo tem por objetivo analisar as influências das políticas macroeconômicas – adotadas pelas autoridades políticas – no desenvolvimento econômico, isto é, no nível de bem-estar de cada um dos indivíduos que compõe uma sociedade nacional. Pretende-se analisar lições históricas relativas à macroeconomia e

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apontar determinadas tendências futuras de organização macroeconômica para o desenvolvimento na contemporaneidade. Em um ambiente de crise financeira internacional, contudo, compreende-se que o horizonte futuro se torna embaçado e que a previsibilidade se torna significantemente prejudicada.

Inicialmente, far-se-á uma revisão histórica dos organismos econômico-financeiros internacional, com especial atenção ao papel que a Segunda Comissão da Assembléia Geral ocupou para a formulação dos princípios ordenadores das relações econômicas internacionais. Posteriormente, será observada a evolução do pensamento em economia política no mundo capitalista e a influência que as correntes teóricas tiveram para a organização econômica dos diversos países. Ademais, serão descritos e explicados alguns conceitos fundamentais para a compreensão das políticas macroeconômicas. Em seguida, explicitar-se-ão os principais debates em voga nos fóruns econômico-financeiros internacionais e as mais claras tendências a serem seguidas pelos diversos atores. Afinal, a conclusão debaterá a necessidade de uma urgente adoção de medidas políticas para mitigar os efeitos negativos da crise financeira internacional.

Histórico e Mandato das Organizações Econômico-Financeiros Internacionais

O princípio da organização jurídica do sistema internacional contemporâneo

teve fundamentos rudimentares, especialmente por meio de acordos bilaterais acerca de interesses específicos das partes contratantes. Nota-se o aprimoramento dos mecanismos de cooperação internacional quando essas negociações deixaram de ser primordialmente bilaterais, e passaram a ter um caráter multilateral.

Em meio a esse processo, surgiu a necessidade de institucionalizar os acordos multilaterais, fenômeno que adquiriu grande destaque no século XX, em especial a partir da Segunda Guerra Mundial. A importância das Organizações Internacionais consiste no fato de elas constituírem “um espaço de diálogo, por vezes de confronto, que representa um esforço civilizatório significativo no contexto das relações internacionais”1.

Esta seção trata do surgimento de algumas organizações internacionais, com foco específico nas organizações econômico-financeiras internacionais. A priori, abordar-se-á a criação da Sociedade das Nações e de sua sucessora, a Organização das Nações Unidas – como as primeiras organizações internacionais de caráter universal. Ademais, serão expostas as organizações criadas na Conferência de Bretton Woods: o Fundo Monetário Internacional e o BIRD (que, posteriormente, tornou-se o Banco Mundial). Por fim, o surgimento da Organização Mundial do Comércio, decorrente da institucionalização do GATT (Acordo Geral de Tarifas Aduaneiras e Comércio), será analisado.

O surgimento das Organizações Internacionais de caráter universal: da

Sociedade das Nações à Organização das Nações Unidas

1 SEITENFUS, Ricardo Antonio Silva. Manual das Organizações Internacionais. São Paulo: Saraiva, 1994.

p. 21.

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Em meio às negociações de paz posteriores à Primeira Guerra Mundial (1914-1918), nasceu o pacto da Sociedade das Nações, firmado a 28 de abril de 1919. A finalidade de sua criação era encontrar instrumentos de solução pacífica de controvérsias e de cooperação internacional2, a fim de evitar novas guerras dessa proporção.

A criação da Sociedade das Nações foi uma tentativa “de aplicar os princípios do liberalismo”3 na criação de instituições formais que pudessem organizar a cena internacional. Todavia, os responsáveis por essa tentativa deixaram de considerar inúmeras dificuldades referentes à possibilidade de implementação de decisões internacionais contra estados soberanos, principalmente na ausência de uma força militar internacional4. O resultado disso foi a grande fragilidade e ineficiência da Sociedade das Nações em sua função de manter a paz e a ordem internacional, o que ficou patente com a eclosão da Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

Findo o conflito, havia um reconhecimento geral da necessidade de se estabelecer novas instituições, que fossem mais condizentes com a nova realidade política e econômica mundial. “O gerenciamento da paz foi o grande e primeiro problema pós-conflito. O segundo foi o reordenamento dos processos econômicos”. Embora íntimamente relacionadas, “as duas dimensões tiveram desdobramentos próprios entre 1945 e 1947”5, com o nascimento da Organização das Nações Unidas e dos mecanismos de Bretton Woods.

A sucessora da Sociedade das Nações foi criada em 1945, através da Carta de São Francisco, e constitui um importante mecanismo de regulação das relações internacionais contemporâneas. Fundamentada nas idéias do controle da violência e cooperação internacional entre Estados Soberanos, a ONU distingue-se da Sociedade das Nações por prezar pelo realismo.

Ao garantir um espaço distinto às grandes potências, como membros permanentes do Conselho de Segurança, haveria maior garantia no cumprimento de suas decisões. Um dos grandes problemas da Sociedade das Nações era sua incapacidade em tornar suas decisões efetivas. Para evitar que as decisões internacionais, referentes à paz e segurança internacionais, tornassem-se letra-morta, aderir-se-ia ao princípio de aquiescência entre potências, isto é, só haveria uma decisão na ausência de obstrução de todas as grandes potências.

A emergência do Sistema de Bretton Woods

No apagar das luzes da Segunda Guerra Mundial, todos os aliados se reuniriam

em Bretton Woods, nos Estados Unidos da América, para a realização da Conferência Monetária e Financeira das Nações Unidas. Esta reunião marcaria profundamente o sistema capitalista mundial, pois delinearia grande parte das estruturas sob as quais a relações econômicas internacionais se dariam a partir de então.

2 SARAIVA, José Flávio Sombra (org.). História das Relações Internacionais Contemporâneas. São Paulo:

Editora Saraiva, 2007. 3 R. H. S. Crossman apud CARR, Edward Hallett. Vinte Anos de Crise: 1919 – 1939. Brasília: Editora

Universidade de Brasília, 2001. p. 40. 4 V. CARR, Edward Hallett. Vinte Anos de Crise: 1919 – 1939. Brasília: Editora Universidade de Brasília,

2001. p. 40 5 SARAIVA. Op. Cit. p. 188.

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Um dos principais desdobramentos da conferência foi a criação do Sistema de Bretton Woods. Previu-se o surgimento de um Fundo Monetário Internacional, de um Banco Mundial e de uma Organização Internacional do Comércio. Durante esta conferência “os Estados Unidos” demonstraram “sua capacidade para impor a força do dólar no conjunto das relações econômicas internacionais e sua determinação para participar dos esforços de reconstrução das estruturas capitalistas da Europa Ocidental”’6.

Um fruto importante da Conferência para a estrutura das relações econômicas internacionais foi a nova política cambial acordada pelos países. Anteriormente, “o padrão-ouro clássico”, que vinculava uma taxa cambial fixa de cada moeda em relação ao ouro, “fora sucumbido pela Primeira Guerra Mundial”7. A esquemática de Bretton Woods pode ser vista como um modelo intermediário entre o padrão-ouro e as taxas de câmbio flutuante, estas hoje vigentes na maioria dos países do mundo.

Em Bretton Woods se estabeleceu que todos os países que participassem do sistema deveriam vincular sua moeda a uma taxa fixa em relação ao dólar. Este, por sua vez, estaria vinculado ao ouro. Os países dentro do sistema financeiro internacional só poderiam alterar sua taxa base de câmbio sob autorização do Fundo Monetário Internacional. Estava autorizada, entretanto, uma variação de um ponto percentual para mais ou para menos da taxa básica. Este limite de variação ficou conhecido como banda cambial.

Este modelo não seria, a princípio, maléfico aos EUA, uma vez que o dólar encontrava-se naturalmente valorizado, já que a Segunda Guerra Mundial não foi travada em seu território – mas na Europa e no Pacífico – e, após o cessar-fogo, as outras partes do globo precisavam de produtos estadunidenses. Entretanto, quando as plantas industriais da Europa Ocidental e do Japão se restabeleceram, um dólar sobrevalorizado fazia com que os EUA comprassem mais do exterior (importação) do que vendessem para o exterior (exportação). Importações maiores que exportações geram o que em economia se denomina déficit na balança comercial – isto é, no comércio, mais dinheiro saiu do país do que ingressou no mesmo.

Com repetidos déficits ao longo dos anos, o sistema cambial de Bretton Woods, faria com que os EUA ajustassem, ao longo do tempo, o valor do dólar. Em 1971, todavia, o presidente Nixon decretaria o fim da vinculação do dólar ao ouro, o que significava o fim do Sistema de Bretton Woods.

Não obstante, tanto o Fundo Monetário Internacional, quanto o Banco Mundial, continuaram a existir após a falência do sistema de Bretton Woods. Entretanto, ambos tiveram suas funções reformuladas. O FMI, que tinha inicialmente a função de emprestar dinheiro aos Estados que estivessem com um déficit elevado, passou a agir como avalizador internacional de empréstimos, sugerindo planos de política econômica que deveriam ser adotados para a liberação de empréstimos. Já o Banco Mundial, que surgiu com a função de ajudar a reconstrução das localidades destruídas durante a Segunda Guerra Mundial, passou a financiar essencialmente medidas infra-estruturais direcionadas ao desenvolvimento.

6 SARAIVA, José Flávio Sombra. Relações Internacionais: dois séculos de história. Volume II. Brasília: Ed.

UnB, 2001. p. 25. 7 EICHENGREEN, Barry; BORDO, Michael. A Retrospective on the Bretton Woods System: Lessons for

International Monetary Reform. Chicago: University of Chicago Press, 2004. p. 109.

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O sistema internacional do comércio: do GATT à OMC Em meio aos esforços para criar instituições econômicas mais adequadas à

realidade mundial, ocorreu a Conferência sobre Comércio e Emprego de Havana, entre 1947 e 1948. Essa conferência dava continuidade ao processo iniciado em Bretton Woods (1944) e pretendia criar uma Organização Internacional do Comércio (OIC).

A OIC tinha o intuito de regulamentar o comércio internacional, contudo, não entrou em vigor, pois o Congresso estadunidense não ratificou o acordo assinou em Havana. E seria inviável qualquer instituição relacionada ao comércio que não envolvesse a maior potência da época. Ainda assim, durante as negociações, firmou-se o Acordo Geral de Tarifas Aduaneiras e Comércio (GATT), que foi aprovado em 1947 e entrou em vigor no ano seguinte.

Entre todas as atividades econômicas, o comércio internacional foi objeto das maiores discussões multilaterais desde a Conferência de Bretton Woods. Concebido como o terceiro pilar do sistema econômico do pós-guerra, ao lado do FMI e do Banco Mundial, o GATT foi implantado em 1947 com a responsabilidade de organizar e regular o comércio internacional, segundo os parâmetros de uma concepção liberal da ordem econômica nacional e internacional8.

Ainda que fosse apenas um acordo, o GATT funcionou, na prática, como uma instituição. Isto, pois, ainda que o GATT não fosse dotado de personalidade jurídica formal, sob os princípios Acordo, viriam a ser convocados uma série de rodadas de negociação, com o propósito de diminuir barreiras protecionistas e promover o livre comércio.

Em 1º de janeiro de 1995, foi criada a Organização Mundial do Comércio (OMC), que passou a substituir o GATT como epicentro das discussões comerciais internacionais. A OMC foi resultado da Rodada Uruguai, que se estendeu de 1986 a 1993, tendo sua ata final firmada em abril de 1994, na cidade de Marrakesh. A Organização foi criada com a finalidade de desenvolver códigos de conduta para os Estados Membros, de modo a regulamentar o comércio internacional e garantir a liberalização econômica.

O GATT apresentava certas deficiências, que viriam a ser supridas pela OMC. Por exemplo, era evidente que ao excluir das regras multilaterais categorias inteiras, como serviços, bens imateriais (investimentos, patentes e tecnologia proprietária) ou mesmo bens tradicionais como os produtos agrícolas, por exemplo, o comércio internacional deixava de fora do terreno legal-contratual do Acordo Geral de 1947 alguns dos setores mais dinâmicos e rentáveis das trocas mundiais9.

A OMC incorporou os princípios do GATT, mas ampliou seu âmbito de interferência, passando a incluir também o comércio de serviços e as questões de propriedade intelectual, por meio do GATS (Acordo Geral de Comércio de Serviços) e do TRIPS (acordo referente aos aspectos dos direitos de propriedade intelectual relacionados ao comércio). A OMC representa a realização última dos princípios do GATT e da natimorta OIC, pois significa não somente a adoção do livre comércio como padrão internacional e modelo ideal a ser perseguido como tamém a consolidação de uma instituição para promover e defender tais princípios.

8 SARAIVA, Op. Cit. p. 329.

9Ibidem. pp. 276-277.

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Parlamento dos Povos: a Assembléia Geral e sua Segunda Comissão

Esta seção trata da Segunda Comissão da Assembléia Geral da ONU,

responsável por assuntos econômicos e financeiros (ECOFIN), Analisar-se-ão os mecanismos decisórios utilizados no âmbito da ECOFIN e, posteriormente, as principais questões relacionadas à esfera de decisão da Segunda Comissão.

Conforme os mecanismos de decisão vigentes na Comissão Econômico-Financeira – e nas demais comissões da Assembléia Geral – todos os países membros da ONU têm mesmo peso nas votações. Isso garante maior legitimidade às decisões da Comissão que, apesar de não terem caráter mandatório para os países envolvidos, acabam por ser consideradas pelos tomadores de decisões, uma vez que as referidas decisões representam a vontade da maioria dos Estados, expressa de forma democrática.

É importante ressaltar que a estrutura uniforme e igualitária de organização política da Assembléia Geral a leva a divergir, muito freqüentemente, dos organismos financeiros internacionais onde há votos diferenciados, como o Fundo Monetário Internacional ou o Banco Mundial. Ademais, como não é necessário o consenso absoluto – caso da Organização Mundial do Comércio –, as decisões não podem ser bloqueadas por poucos países. De tal sorte, os países em desenvolvimento em geral fazem da ECOFIN um espaço de formulação de princípios gerais alternativos àqueles exarados pelos demais organismos econômico-financeiros internacionais.

Visando ao aprimoramento da qualidade dos debates e a garantia de uma maior importância ao impacto de suas decisões e deliberações, a Segunda Comissão da Assembléia Geral tem realizado amplos esforços para reformular suas práticas e métodos de trabalho. Este interesse está em consonância com o esforço geral da Assembléia Geral de atualizar e adequar seus métodos de trabalho aos atuais desafios10. Os temas discutidos na Comissão Econômica e Financeira dizem respeito a assuntos concernentes a crescimento e desenvolvimento econômico11. Dentre os assuntos tratados pela ECOFIN, podem-se citar as iniciativas de financiamento do desenvolvimento e erradicação da pobreza. Há também temas relacionados à globalização e interdependência e a políticas macroeconômicas, como comércio internacional e sistema financeiro.

Evolução da Economia Política no Mundo Capitalista: das construções teóricas à construção da realidade

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ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Economic and Financial: Second Committee. Disponível em: < http://www.un.org/ga/second/index.shtml>. Acesso em: 05/10/2008. 11

Crescimento econômico é um conceito que envolve simplesmente a produção de riquezas dentro de uma sociedade. Já desenvolvimento econômico considera em que grau o crescimento é traduzido em bem-estar social (saúde, renda e educação, principalmente).

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O pensamento econômico tem influência ímpar sobre a política econômica aplicada pelos diversos Estados. Ainda que não seja acurado afirmar que as políticas governamentais sejam determinadas pelos estudos acadêmicos, não há dúvida de que estes influenciam aquelas. Por outro lado, é importante ressaltar que o sucesso ou fracasso das políticas aplicadas por governos também exercem influência sobre os escritos científicos.

Liberalismo clássico: laissez-faire, laissez-passer

A tradição filosófica liberal tem uma característica fundamental: o indivíduo como valor máximo. De tal sorte, o Estado teria como objetivo elementar a garantia da liberdade individual e de direitos individuais que são tidos como inatos, inalienáveis e imprescritíveis.

Numa perspectiva liberal, “o homem nasce com direito a perfeita liberdade e gozo ilimitado de todos os direitos e privilégios da lei da natureza”12. Nesse sentido, surgiria um espaço de ação individual que seria inviolável:

Enquanto a conduta de uma pessoa afeta prejudicialmente os interesses de outrem, a sociedade tem jurisdição sobre ela. [...] [Mas] se a conduta de uma pessoa não afeta os interesses de ninguém a não ser ela mesma, [...] deve haver perfeita liberdade, legal e social, para realizar as ações e arcar com as conseqüências da mesma13. É essencial contextualizar a emergência do liberalismo. Durante os séculos XVII

e XVIII, se tinha como objetivo fundamental a contraposição ao absolutismo monárquico então vigente. Para tanto, delinear-se-iam as esferas de ação individual – naturais e invioláveis – que deveriam ser respeitadas pelo poder político. Esses valores seriam consolidados pela Revolução Americana (1776) e pela Revolução Francesa (1789), que seriam inspiradas por princípios liberais e significariam uma ruptura com o modelo absolutista.

Por tal razão, é um dos elementos característicos do Estado liberal a separação de poderes. Isto, pois “tudo estaria perdido se o mesmo homem [...] exercesse esses três poderes: o de fazer leis, o de executar as resoluções públicas e o de julgar os crimes ou as divergências dos indivíduos”14.

O liberalismo, entretanto, não se limita aos valores políticos. Ao contrário, tem grande parte de seu sustentáculo na reflexão sobre a esfera econômica. Nesse ramo, destacam-se como precursores fundamentais do liberalismo Adam Smith e David Ricardo.

A visão liberal parte do pressuposto de que os indivíduos, ao buscarem seu próprio interesse, garantem a prosperidade da sociedade como um todo. Deste modo, se compreende que:

Não é da benevolência do açougueiro, do cervejeiro ou do padeiro que esperamos nosso jantar, mas de seu próprio interesse. Observamos assim não

12

LOCKE, John. Segundo Tratado Sobre o Governo. São Paulo: Martin Claret, 2004 [1690]. p. 69. 13

MILL, John Stuart. On Liberty. Versão Digital: Batoche Books, 2001. Disponível em: <http://socserv.mcmaster.ca/~econ/ugcm/3ll3/mill/liberty.pdf>. Acesso em 17/10/2008. p.70. 14

MONTESQUIEU. Do Espírito das Leis. São Paulo: Martin Claret, 2002. p. 202.

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sua compaixão, mas seu amor-próprio, e não se preocupam com nossas necessidades, mas com as vantagens que eles próprios alcançam15. Ademais, há no liberalismo clássico uma defesa da divisão do trabalho. Dando

como exemplo uma manufatura de alfinetes, Adam Smith fala dos benefícios da especialização e da divisão do trabalho. Para Smith,

um trabalhador que não seja treinado, poderia, talvez, [...] fazer um alfinete em um dia – e certamente não faria vinte. Mas da maneira que esta indústria está hoje organizada, [...] ela está dividia em dezoito operações distintas, cada uma realizada por mãos diferentes. [Neste caso,] dez homens são capazes de produzir quatro mil alfinetes por dia16. Nesse sentido, seria benéfico a todos que cada um se especializasse naquilo em

que é mais eficiente e, então, efetuasse trocas livres no mercado. Com isso, surge uma defesa do livre comércio – em contraposição à lógica protecionista vigente no século XVIII. Resume-se na expressão francesa laissez-faire, laissez-passer: deixe fazer, deixe passar.

De tal modo, a função estatal para o liberalismo clássico é limitada. Ela deve se limitar à proteção dos direitos naturais, à defesa externa, à segurança interna. Ademais, o Estado teria o papel fundamental de resguardar o direito de propriedade privada e assegurar o cumprimento dos contratos. À parte disso, não deveria o Estado interferir na economia. Isto, pois se tinha a concepção de que os interesses individuais necessariamente conduziriam à prosperidade geral. Por esta razão, mercado seria autoregulado e, assim, prescindiria de qualquer intervenção estatal.

Embora o liberalismo clássico tenha incentivado uma série de inovações nas esferas política e econômica – como, por exemplo, a proibição da escravidão e um aumento substancial na produtividade –, é fato que seus princípios foram, muitas vezes, vulgarizados para privilegiar determinados grupos. É exemplo disso a utilização do poder coercitivo estatal contra trabalhadores em greve, durante o século XIX, que protestavam contra as deterioradas condições de trabalho existentes quando da revolução industrial.

Além disso, se evidenciou posteriormente que uma completa ausência de regulação estatal tenderia à concentração monopolista e minaria, fatalmente, o próprio princípio da concorrência em livre mercado pregado pelo liberalismo. Estas constatações iniciariam uma série de críticas que levariam à derrocada da hegemonia liberal no pensamento econômico.

Revolução keynesiana e estruturalismo econômico

A ótica liberal da economia política reinaria soberana até a Primeira Guerra

Mundial, sustentando-se cambaleante até a Grande Depressão de 1929. Antes desse período, havia uma alternativa marginal ao liberalismo, que fora adotado em larga escala pela Alemanha durante o entreguerras: o protecionismo. Seu principal impulsionador fora Friedrich List, segundo o qual “medidas de proteção [da indústria

15

SMITH, Adam. An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations. Edimburgo: Royal Society of Edinburg, 1793. p. 27. 16

Ibidem. p. 14.

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nacional] são justificadas com o propósito de estimular e proteger a capacidade produtiva interna”17.

Não obstante, seria somente após a Crise de 1929 que uma visão alternativa ao liberalimso clássico dominaria as estratégicas econômicas nacionais. Nesse período, seria impulsionado pelo New Deal – resposta política e econômica do Presidente estadunidense Franklin Delano Roosevelt à Grande Depressão – uma visão keynesiana da economia. O keynesianismo econômico – isto é, a adoção das estratégias econômicas inspiradas nas idéias do britânico John Maynard Keynes – se opõe à visão liberal da autoregulação do mercado. Para os keynesianos

não é verdade que os indivíduos possuem uma “liberdade natural” prescritiva em suas atividades econômicas. [...] O mundo não é governado dos céus, de tal modo que o interesse privado e o interesse público sempre coincidam. [...] Não é correto deduzir, dos princípios econômicos, que um interesse privado “iluminado” sempre opere no sentido do interesse público18. Nesse sentido, o Estado e a ação privada teriam papel de cumplicidade para o

bom funcionamento da economia. Essa nova visão traria, em várias partes do mundo capitalista, um grande aumento das instituições estatais, uma vez que, não predominando mais o dogma do livre mercado, não era mais necessário um Estado Mínimo.

A Segunda Guerra Mundial e a destruição da planta industrial dos vários envolvidos no conflito, em especial dos europeus, poriam termo definitivamente ao liberalismo clássico, em que a única função do Estado seria prover a segurança nacional e assegurar o cumprimento dos contratos. No pós-guerra, acreditava-se que a presença estatal seria necessária para a reconstrução de uma economia nacional completamente destruída.

Em termos da organização das economias nacionais, o Estado passava a ter um papel mais proeminente do que quando da época do liberalismo – ecoando assim os efeitos do pensamento keynesiano –, principalmente pelo fato de os recursos do Plano Marshall terem sido emprestados a governos e não a empresas de direito privado. O comércio internacional já demonstrava sinais de alguma liberalização, dada a destruição quase total da planta industrial européia e japonesa – o que impossibilitava a produção interna e gerava a necessidade de importação.

Paralelamente, uma corrente de pensamento econômico influenciada pelo keynesianismo e pelo marxismo surgiria na América Latina. Sob a égide de um órgão das Nações Unidas, a Comissão Econômica para América Latina e o Caribe – CEPAL –, emergiu uma corrente teórica que se convencionaria denominar posteriormente de economia estruturalista.

Uma crítica ao liberalismo clássico feita com especial relevância pelos escolásticos da CEPAL foi a tendência liberal à perpetuação das desigualdades entre os países desenvolvidos e subdesenvolvidos. Segundo Raul Prebisch, a especialização da América Latina em produtos primários e a importação de manufaturas por esta, resultaria em uma deterioração dos termos de troca19, ou seja, na constante elevação

17

LIST, Friedrich. The international system of political economy. Versão Digital, Liberty Fund, 2005 [1841]. Disponível em: <http://oll.libertyfund.org/EBooks/List_0168.pdf>. Acesso em 30/06/2008. p. 209. 18

KEYNES, John Maynard. The end of laissez-faire. Londres: L. & Virginia Woolf, 1926. p. 95. 19

Cf. PREBISCH, Raúl. Capitalismo periférico: crisis y transformación. Cidade do México, UBC, 1981.

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de preços de manufaturas e redução dos preços dos produtos primários. Esta situação levaria ao aumento das desigualdades entre os países desenvolvidos e o terceiro mundo.

Como solução, propôs-se a substituição de importações, estratégia protecionista de inspiração em Marx, Keynes e List que agregava altas tarifas de importação ao fomento estatal da produção industrial. Tinha-se como objetivo a proteção na infante indústria nacional. Entretanto, idéia era que, após a consolidação das indústria nacional, fossem retiradas as proteções e fosse incentivada a competição, destas indústrias, no cenário internacional.

O renascimento liberal em face ao planejamento econômico As críticas ao modelo keynesiano surgiram muito anteriormente ao renascimento

dos princípios liberais como prática política. Já em 1944 seria lançada a obra que é considerada a pedra fundamental do novo pensamento liberal: O Caminho da Servidão, de Friedrich von Hayek20.

Em O Caminho da Servidão, Hayek ressalta que o controle da economia pelo Estado era característico de regimes coletivistas e totalitários, tais como os da União Soviética e da Alemanha Nazista e que, portanto, o planejamento econômico central implica seguramente numa limitação da liberdade dos cidadãos – inclusive de sua liberdade política21. Afora isso, Hayek assinala que o Estado não é capaz de planejar de maneira eficiente toda a ação econômica de toda a sociedade – pois esta é composta de incalculáveis planos individuais de inúmeros agentes privados22. De tal sorte, uma economia planificada acarretaria em totalitarismo político e ineficiência econômica.

É importante ressaltar que, entretanto, há diferenças substanciais entre os novos liberais e o liberalismo clássico. Por um lado, é mantida a mesma base filosófica, com a supremacia do indivíduo, dos direitos individuais e da proteção das minorias, somada à idéia de que

a preservação da liberdade é uma razão preventiva para a limitação e descentralização do poder governamental. Mas [que] há também uma razão construtiva. Os grandes avanços da civilização, sejam eles na arquitetura ou pintura, na ciência ou na literatura, na indústria ou na agricultura, nunca vieram de um governo centralizado23. Por outro, ressalta-se que “é importante não confundir a oposição contra o

planejamento [central] com uma atitude dogmática de laissez-faire”. Pois, “o argumento liberal é favorável a se fazer o melhor uso possível das forças da competição como meio de coordenação dos esforços humanos, não um argumento favorável à manutenção das coisas como elas estão”24. Nesse sentido, chega-se à conclusão que, na perspectiva liberal, o governo deveria, entre outras coisas,

manter a ordem e o império da lei, definir direitos de propriedade; [...] mediar disputas sobre a interpretação das regras do jogo; garantir o cumprimento dos contratos; promover a competição; intervir onde haja efeitos colaterais [e] se

20

Cf. HAYEK, Friedrich. The Road to Serfdom. Chicago: University of Chicago Press, 1994. 21

Ibidem. pp. 63ss; 97ss. 22

Ibidem. p. 56. 23

FRIEDMAN, Milton. Capitalism and Freedom. Chicago: University of Chicago Press, 1963. p. 3. 24

HAYEK. Op. Cit. p. 41.

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envolver em atividades para combater monopólios. [...] Tal governo certamente tem papéis importantes a desempenhar. [Assim,] o verdadeiro liberal não é um anarquista25. Em termos práticos, todavia, o liberalismo somente viria a lograr êxito a partir

da crise do welfare state – isto é, o Estado do Bem Estar Social. De acordo com o modelo do welfare state, cabe ao Estado promover o maior número de benefícios sociais possível. Nesse sentido, teriam papel fundamental, por exemplo: uma previdência social – inclusive com seguro-desemprego –, direitos trabalhistas assegurados, uma grande rede de serviços públicos como escolas primárias e secundárias, hospitais, etc. Naturalmente, todos esses serviços seriam seguidos de uma alta carga tributária, ou seja, impostos que pudessem arcar com os custos destes benefícios.

Este modelo começou a sofrer suas maiores críticas a partir da década de 1970, quando tomou seu lugar o neoliberalismo. “A grave recessão econômica de meados dos anos 1970 deu espaço político e intelectual para a renascença das doutrinas neoliberais”26.

A crise do modelo do welfare state foi explicada por um fenômeno chamado de “espiral ascendente de expectativas”27. Ele presume que a sociedade dentro de um modelo de welfare state demandará cada vez mais benefícios sociais com cada vez menos impostos – o que torna o sistema insustentável.

Ademais, a grande presença do Estado na economia acarretara a uma larga ineficiência econômica, com baixas taxas mundiais de crescimento durante toda a década de 1970. Especificamente na América do Sul, apesar de adotada com entusiasmo da grande parte dos regimes militares, a política de substituição de importações chegou a um saturamento. Ao fim do controle militar, a primeira constatação foi que “as empresas” estatais careciam “de eficiência”28. Isto, pois teriam sido “capturadas por forças políticas específicas” e, assim, “caíram no clientelismo, nepotismo e corporativismo”, transformando-se em “instrumento de defesa de interesses particulares”29. Também os subsídios garantidos criavam uma reserva de mercado para a burguesia nacional e desestimulava a inovação.

Nesse sentido, a grande importância que tinha o protecionismo para a produção nacional levava a uma busca pela obtenção desses benefícios por grupos particulares, por meio de instrumentos tais como lobby, corrupção e tráfico de influência, entre outros. Esta situação foi caracterizada como “armadilha listiana”30, pois apesar de ser adotada a fase primária do protecionismo industrial de Friedrich List, não cessaram posteriormente as proteções, o que significou a impossibilidade de construção de uma indústria nacional competitiva internacionalmente.

Os principais expoentes políticos da implementação do neoliberalismo em escala global foram Ronald Reagan, presidente estadunidense (1981-1989), e Margaret

25

FRIEDMAN, Op. Cit. p. 34. 26

OFFE, Claus. Some Contradictions of the Modern Welfare State. p. 2 Disponível em: <http://www.ceeol.com/aspx/getdocument.aspx?logid=5&id=00CAFDB5-91AC-4997-89AE-5C5BC07DD79D>. Acessado em 11/11/2008. 27

Idem. 28

GONÇALVES, Reinaldo. Economia Política Internacional. Rio de Janeiro: Campus, 2005. p. 214. 29

Idem. 30

MUELLER, Bernardo. A política de substituição de informações. Disponível em: <http://www.angelfire.com/ky2/mueller>. Acesso em 02/07/2008.

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Thatcher, primeira-ministra do Reino Unido (1979-1990). Ambos protagonizaram uma “revolução conservadora”31 que buscava implementar a agenda liberal no plano econômico – mas não necessariamente em todos os seus aspectos políticos. Nesse sentido, buscava-se a diminuição do papel do Estado na economia, por meio de privatizações, eliminação de subsídios e uma redução drástica nos impostos. Tais medidas tinham como finalidade a dinamização da economia, por meio de um maior crescimento econômico e a conseqüente geração de empregos.

Além disso, havia a intenção política de redemocratização, retirando o poder dos grupos – em geral lobbies classistas – que tradicionalmente buscavam maior benefícios e proteções estatais para seu próprio grupo em detrimento do restante da sociedade civil. No Reino Unido, estes grupos eram tradicionalmente os sindicatos. Por tal razão, Thatcher afirmou que a privatização estava “devolvendo o poder ao povo”32. Thatcher afirmava, ademais, que o novo liberalismo consistia em um capitalismo popular, em contraposição ao keynesianismo, que era um capitalismo de Estado – ecoando a tradicional oposição liberal entre o Estado e a sociedade civil.

O retorno de políticas econômicas de linha liberal influenciou de forma significativa governos de diversas linhas partidárias, a ponto de um parlamentar do Partido Trabalhista, anteriormente o maior opositor de Thatcher, que “agora somos todos thatcheristas”33. As reformas liberalizantes foram adotadas na América Latina, com menor escala na África, e com mais intensidade entre os tigres asiáticos.

Reforma da esquerda A despeito da relativa hegemonia do pensamento neoliberal a partir da década

de 1980 que, aos poucos, foi sendo adotado, ainda que em escala diferenciada, por diversos países ao redor do globo, o neoliberalismo foi muito contestado. Em geral, podem-se dividir as respostas ao neoliberalismo em dois grandes grupos: os social-democratas, associados à chamada Terceira Via; e os anti-sistêmicos, que se autodenominam como membros da “nova esquerda”.

A Terceira Via se identifica com políticos de esquerda que viam como importantes a implementação ou manutenção de determinadas políticas liberalizantes. Dentre eles, destacam-se Tony Blair, Bill Clinton, Gerhard Schröder e Fernando Henrique Cardoso. Os valores da Terceira Via são: a busca pela igualdade e pela justiça social; a proteção aos vulneráveis; liberdade como autonomia de ação; a idéia de que não há direitos sem responsabilidade e que não há autoridade sem democracia; o apoio a uma globalização cosmopolita; e um conservadorismo filosófico-moral34.

A Terceira Via reconhece que a base teórica do “socialismo sempre foi inadequada, subestimando a capacidade do capitalismo de inovar, adaptar e gerar uma produtividade crescente” e que, por isso, hoje “o socialismo está morto”35.

31

Cf. ADONIS, Andrew; HAMES, Tim. A Conservative Revolution? The Thatcher-Reagan decade in perspective. Manchester: Manchester University Press, 1994. 32

THATCHER, Margaret. Discurso à Conferência do Partido Conservador Britânico. Brighton, 10 de outubro de 1980. 33

THE GUARDIAN. Mandelson: we are all Thatcherites now. 10 de junho de 2002. Disponível em: <http://www.guardian.co.uk/politics/2002/jun/10/labour.uk1>. Acesso em 01/10/2008. 34

GIDDENS, Anthony. A terceira via. Rio de Janeiro: Record, 1999. p. 72. 35

Ibidem. p. 14.

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Entretanto, entende que o governo deve intervir na esfera econômica com vistas à promoção do bem-estar social, da justiça social e da proteção do meio-ambiente. De tal sorte, observa-se na nova social-democracia um lugar intermediário entre o velho keynesianismo e o neoliberalismo.

Por outro lado, os intelectuais da chamada “nova esquerda”36, mantinham sua fé nos preceitos fundamentais do socialismo marxista. Nesse sentido, buscavam transformar a realidade contemporânea, por meio da derrocada do capitalismo. Por tal razão, a nova esquerda denuncia os social-democratas de reformistas, por compactuarem com princípios capitalistas.

Inicialmente, o novo elemento da corrente estaria em sua rejeição à ortodoxia stalinista e à busca por novos espaços para discurso e ação revolucionários. Após 2000, o movimento renovou-se, tendo como máxima a contestação do modelo neoliberal37, por meio do apoio a “movimentos anti-sistêmicos”38.

Nesse sentido, os membros da nova esquerda vêem com grande entusiasmo movimentos de contestação ao neoliberalismo, como o Fórum Social Mundial. Immanuel Wallerstein vê como fundamental a expansão do “espírito de Porto Alegre”39, em referência à capital gaúcha, onde ocorreu o primeiro Fórum. Em termos de prática política, ao menos uma parte da nova esquerda se identifica com os regimes “anti-sistêmicos” de Venezuela, Equador e Bolívia40 - que têm como uma de suas bandeiras a construção de uma alternativa ao neoliberalismo.

Noções de Macroeconomia

Visto como se determinou a evolução do pensamento econômico desde Adam

Smith, é necessário definir alguns termos específicos da análise econômica, em especial os termos macroeconômicos e suas características. A economia pode ser dividida de diversas maneiras. Dentre elas, a mais comum separa esta área de conhecimento em microeconomia e macroeconomia.

A primeira examina o comportamento econômico dos agentes – indivíduos e empresas – e suas interações, sendo, portanto, um estudo específico de uma parte do todo. Já a segunda é o contrário, já que se utiliza de indicadores como o PIB, as taxas de desemprego e os índices de preços para explicar a economia em seu conjunto, sendo, portanto, uma visão genérica do todo. São objetos da análise macroeconômica os seguintes termos: inflação, políticas monetária e fiscal, crescimento econômico, pleno emprego, consumo, poupança e investimento, comércio internacional, entre outros.

Logo, a macroeconomia representa um eficiente meio de se analisar variações econômicas em curto prazo e, além disso, de se entender os determinantes para o crescimento econômico a longo prazo. A utilidade dos modelos macroeconômicos é evidente para governos e grandes empresas que se baseiam nestes dados para avaliar

36

O conceito de “nova esquerda” é advindo de uma publicação científica chamada New Left Review, na qual artigos dessa linha ideológica eram publicados. Vide http://www.newleftreview.com. 37

V. ANDERSON, Perry. Renewals. New Left Review. n. 1. January-February 2000. pp. 1-22. 38

WALLERSTEIN, Immanuel. O Declínio do Poder Americano. São Paulo: Contraponto, 2004. p. 266. 39

Ibidem. p. 259. 40

V. ALI, Tariq. Piratas do Caribe: o eixo da esperança. São Paulo: Record, 2008.

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os efeitos de políticas econômicas e delinear estratégias de planejamento. Além disso, auxilia-os a identificar e corrigir possíveis falhas em suas decisões. Em suma, a decisão de políticas voltadas ao incentivo do crescimento e a manutenção de uma estabilidade econômica é auxiliada por uma cuidadosa análise macroeconômica. É ela que dará a base para escolher o melhor caminho a ser tomado por aqueles que governam determinado país.

No decorrer da história, houve intensas alternâncias de consensos econômicos entre os países do globo. Desde 1944, quando houve a Conferência de Bretton Woods, até o ano de 1971, com a crise e decadência do padrão-ouro, havia um entendimento comum internacional de que os governos deveriam intervir na economia intensamente para garantir o desenvolvimento. Já após 1973, a crise do petróleo influenciou na mudança a dessa ideologia para uma visão mais neoliberal. É interessante perceber nesse período que não só foi a situação econômica global que se modificou, porém houve também uma alteração da percepção dos dados econômicos por esses mesmos governantes. Ou seja, estava confirmado o caráter consultivo da macroeconomia, porém não decisivo.

No entanto, antes de explicar de quais maneiras um governante pode agir usando esses dados como base e quais as implicações dessas políticas no cenário nacional e no internacional, os seguintes termos devem ser explicados e aclarados.

Inflação O fenômeno do aumento geral do nível de preços é decorrente da perda

relativa do poder de compra da moeda, que é denominado inflação. Para se explicar o fenômeno da inflação é necessário dividi-la em dois tipos: inflação de custos e inflação de demanda.

O primeiro está relacionado com a oferta de bens, ou seja, sua disponibilidade no mercado. Um aumento dos custos de produção irá ser repassado ao preço dos produtos finais, o que acarreta em inflação. Um bom exemplo disso é o aumento de salários dos trabalhadores de uma empresa. Se não há um aumento de produtividade na mesma proporção a esse aumento de salários, o custo por unidade produzida irá aumentar, pois a empresa terá que compensar essa elevação dos custos para manter a mesma margem de lucro e, portanto, os preços de seus produtos subirão.

Já o segundo tipo, é causado pelo excesso de demanda. De acordo com a própria essência do homo economicus, se um bem se torna escasso, irá possuí-lo aquele que está disposto a pagar mais por ele – a famosa lei da oferta e da procura. Dessa forma, um grande número de indivíduos, ao procurar por um produto não disponível para todos, irá fazer com que seu preço aumente.

As chances da inflação de demanda acontecer aumentam quando a economia funciona próxima do pleno emprego de recursos. Um bom exemplo disso, no cenário internacional, é o aumento do preço do metal e aço verificado até recentemente41. Esse aumento decorre de um período de grande crescimento econômico mundial e de

41

UNIVERSO ONLINE. FMI prevê queda de preço dos metais a médio prazo. 06 de setembro de 2006. Disponível em: <http://noticias.uol.com.br/economia/ultnot/2006/09/06/ult1767u75193.jhtm>. Acesso em 11/11/2008.

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aumento de demanda dessa commodity42 em todo o mundo, principalmente em mercados emergentes como o da China. Este país, para poder abastecer suas siderúrgicas que passavam por rápido crescimento de produção, precisava importar cada vez maiores quantidades de metais.

Pode-se citar o governo em especial no assunto de inflação de demanda, pois esse é, muitas vezes, o principal consumidor na economia nacional. Seus gastos, se excessivos, irão causar o aumento do nível geral de preços por demanda. Como alerta Friedman, os referidos gastos podem levar a “uma mentalidade inflacionária quanto a política governamental”43, ou seja, a idéia de não ser a inflação prejudicial à economia nacional. Para esse autor, esse pensamento é perigoso, pois nega os efeitos negativos do aumento de preços, que serão explicados a seguir.

O contrário também vale no sentido em que a redução dos seus gastos também diminui a pressão inflacionária. Nesse ponto, em particular, há nas discussões econômicas e políticas, uma oposição de idéias em relação ao papel do governo na economia. Como já foi visto, essa disputa envolve duas correntes antagônicas, os liberais – também chamados de monetaristas – e os keynesianos – também chamados de estruturalistas –, que divergem acerca da eficiência dos gastos públicos e do papel governamental.

Os estruturalistas, como Celso Furtado, apontam outros motivos causadores de inflação. Essas razões advêm de características específicas da economia e da sociedade de certo país, portanto de sua estrutura. Em suas palavras:

[A] inflação é fundamentalmente uma luta entre grupos pela distribuição de renda real e que a elevação do nível de preços é apenas uma manifestação exterior do fenômeno. [...] A redistribuição deve ser entendida, aqui, no sentido dinâmico: não se trata de uma transferência de um grupo para outro, e sim do aumento da participação de certos grupos em uma renda maior44. Celso Furtado, então, afirma que a inflação nada mais é do que o meio pelo

qual alguns grupos sociais dispõem para aumentar a sua apropriação do acréscimo de renda gerado ao crescimento econômico. Ou seja, o maior beneficiário do aumento dos preços seria aquela classe social que estivesse no poder. J. M. Keynes explica o porquê desse fato, quando afirma que

enquanto os preços estão subindo mês após mês, os empresários têm uma nova e maior fonte de ganhos extraordinários. Comerciante ou industrial, ele geralmente comprará antes de vender, e, ao menos em relação a uma parte de seu estoque, correrá o risco de alterações nos preços. Se, portanto, mês após mês, o estoque se valorizar em suas mãos, ele estará sempre vendendo a preços melhores do que os esperados, e assegurando um ganho extra que não foi calculado. Em tais períodos, os negócios do comércio se tornam injustificadamente fáceis45. Já que os empresários controlam grande parte do processo produtivo, são

beneficiados com o encarecimento de seus produtos, pois passam a ganhar com sua

42

Commodity é tudo aquilo que pode ser negociado no mercado em troca de outra commodity ou de dinheiro. Exemplos: Soja, petróleo, milho, etc. No Brasil, esses produtos são negociados na Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F). 43

FRIEDMAN, Milton. Capitalism and Freedom. University of Chicago Press, 1963. p. 76. 44

FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. pp. 317-318. 45

KEYNES, J.M. Inflação e Deflação – Série Os Economistas. São Paulo: Abril, 1987. p. 287.

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venda em preços cada vez maiores. O que explica o porquê de ser a inflação mais danosa para os que têm menor renda, já que estes dispõem de menos recursos para se proteger da desvalorização monetária.

Nos países em desenvolvimento, os interesses dos empresários são, na maioria das vezes, protegidos por seus governos. Essa teoria consegue explicar satisfatoriamente o porquê desses países tenderem a apresentar taxas de inflação maiores que os desenvolvidos. Todo um ambiente propício a elevadas taxas de inflação é criado devido a estrutura social e política dos países em desenvolvimento, que apresentam enorme desigualdade na distribuição de renda46, ineficiência das instituições e instabilidade político-econômica.

O aumento generalizado de preços não traria benefícios para nenhuma das classes de uma sociedade. Primeiro, ela pode prejudicar a conjuntura socioeconômica de uma nação ao afetar seriamente a população mais pobre de um país, influenciando em sua estrutura de consumo. Supondo que uma pessoa ganhe somente o suficiente para se sustentar, ela não conseguirá comprar a mesma quantidade de bens e serviços se os preços desses produtos aumentarem excessivamente, sem que haja a contrapartida de um correspondente aumento de salários. As pessoas que possuem melhores condições de vida, por outro lado, conseguiriam manter seu padrão de consumo por uma maior quantidade de tempo, pois possuem uma reserva de riqueza para tais situações.

Outro fator negativo é a influência de uma alta inflação no plano econômico-financeiro. Ao gerar incerteza sobre o futuro, ela acarreta instabilidade econômica. Quando não se sabe quanto certo bem irá custar em um futuro próximo, os planos dos agentes econômicos são prejudicados. A classe empresarial, por exemplo, não conseguirá prever com certeza suas margens de lucro, que nessa situação são incertos. Com isso, o crescimento econômico é seriamente afetado.

No entanto, muitos economistas defendem que a inflação é necessária para que seja evitado um ambiente de queda de preços, ou seja, de deflação. Se perpetuada por um longo período e com altas taxas, essa diminuição dos preços ocasiona problemas econômicos.

No Japão, por exemplo, a década de 1990 e o começo do século XXI foi marcada por um período de estagnação e deflação. Longe de beneficiar o país, essa diminuição de preços perpetuou a crise econômica no Japão47. Com um longo processo deflacionário, há a queda dos lucros das empresas devido à falta de incentivo em se aumentar a produção. Ao mesmo tempo, há uma reação por parte da população em atrasar o seu consumo, pois os preços estando em queda, é melhor adiar sua compra, para que eles diminuam ainda mais. Configura-se, assim, um processo de círculo vicioso que desestimula a produção. Portanto, a inflação faria o papel de uma contra-tendência a esse acontecimento.

46

PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO. Human Development Report 2007/2008. Disponível em: <http://hdrstats.undp.org/indicators/147.html>. Acesso em 11/11/2008 47

REUTERS. What is deflation and why is it feared? 25 de Novembro de 2008. Disponível em: <http://www.reuters.com/article/companyNewsAndPR/idUSLC18923020081125?sp=true>. Acesso em 28/11/2008.

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Em suma, alguma inflação é necessária visto que o aumento dos preços é um incentivo a produção. Contudo, é aconselhável usar-se de meios48 para controlá-la, pois uma inflação descontrolada pode causar muitos malefícios, como a imprevisibilidade e instabilidade econômica.

Taxa de Juros

O juro representa um pagamento no futuro por uma transferência de dinheiro no presente. De uma forma mais simplista, é a taxa cobrada a partir de todo capital emprestado por certo período de tempo, ou seja, é o “preço de um empréstimo”. Porém, qual a razão da existência dos juros? Há dois lados para serem levados em consideração. O daqueles que possuem o dinheiro disponível para emprestar e o daqueles que demandam o empréstimo. Alfred Marshall49 afirma que

todos sabem que não se ofereceria pagamento algum pelo emprego do capital, se não se esperasse algum resultado da sua utilização; e mais ainda, que esses ganhos são de muitas espécies. [...] Todo mundo acha que as pessoas, em regra, não emprestam de graça porque, mesmo que não tivessem uma boa aplicação para os seus capitais ou equivalentes, poderiam encontrar outras pessoas a que seu uso seria benéfico e que pagariam para tê-lo por empréstimo50. Portanto, uma pessoa que empresta ou que emprega parte de sua riqueza para

algum outro fim, como em aplicações financeiras, deseja que, juntamente com a devolução integral do valor do empréstimo, se tenha uma compensação, isto é, uma remuneração pelo capital, que poderia estar sendo usado para outras finalidades. Do outro lado, uma pessoa que pega emprestado sabe que deve devolver o dinheiro com certa taxa para seu credor, pois esse dinheiro de terceiros estará sendo usado para benefício próprio, como a compra de automóveis, imóveis, entre outros.

Outro fator que determina a taxa de juros cobradas em um empréstimo é o risco, definido como a probabilidade de que o devedor não pague o que foi pego emprestado. Isso acontece quando uma pessoa usa o dinheiro de terceiros para um investimento qualquer, e não consegue ter o retorno esperado para o mesmo, podendo até ter prejuízos. Portanto, sempre há um risco de que algo desse tipo ocorra e que o credor não consiga ter o dinheiro de volta rapidamente. A solução para tal situação é que, se o credor perceber que o risco de emprestar seu capital para uma pessoa em particular é alto, ele aumenta os juros cobrados para pressionar que o dinheiro seja devolvido logo. Da mesma forma, se há confiança que uma pessoa pague o empréstimo, o credor terá espaço para cobrar juros baixos, já que terá certeza que o dinheiro será devolvido.

Um exemplo é o de um investidor estrangeiro, mais especificamente aquele que deseja investir em um país através da compra de ações de empresas ou da compra

48

O aumento da taxa básica de juros é um meio de se reduzir a inflação, mas também possui outras conseqüências. Ver mais adiante em “Poupança e Investimento”. Outro meio de controlá-la seria o de se reduzir os gastos governamentais, que, como já visto, pode aliviar a pressão inflacionária. 49

Alfred Marshall foi um dos mais importantes economistas neoclássicos, contribuindo para as teorias de oferta e demanda, de utilidade marginal e de custos de produção. Foi professor em Cambridge e teve como aluno John Maynard Keynes. 50

MARSHALL, Alfred. Princípios da economia. Série Os Economistas. São Paulo: Ed. Abril, 1982. p. 203.

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de títulos públicos, ou seja, naqueles investimentos que têm seu retorno relacionado com a cobrança de juros. Tal investidor espera uma remuneração ao realizá-lo.

Excluindo da seguinte análise todos os fatores exceto o risco, o retorno esperado seria maior em países desenvolvidos ou em desenvolvimento? A resposta lógica é que deveria ser maior naqueles países em desenvolvimento, já que é um mercado mais arriscado para investimentos do que os desenvolvidos, países mais estáveis e confiáveis economicamente. É claro que outros fatores serão levados em consideração, mas eles serão explicados mais adiante.

Além disso, a inflação, que faz com que o dinheiro perca parte de seu valor, pode ser contrabalançada pela remuneração de um investimento vinculado à taxa de juros. Há duas formas de se medir a taxa de juro: a nominal e a real. A primeira é a taxa sem o desconto da inflação e a segunda é ela após esse desconto. Utilizando de uma situação hipotética como exemplo, se a inflação de um período for de 5% e uma pessoa emprestar uma determinada quantidade de dinheiro com uma taxa nominal de juros de 7% nesse mesmo período, a taxa real de juros será de 2%. Em suma, quando essa pessoa receber seu dinheiro de volta, ele terá rendido em 7% do valor inicial, mas que, ao mesmo tempo, terá se desvalorizado em 5% do mesmo valor. Logo, o rendimento líquido, isto é, descontado a inflação, é de 2% e esse será o valor real que será recebido pelo credor.

Poupança e investimento

É muito clara a divisão entre aquelas pessoas que querem poupar dinheiro, e

aquelas que necessitam de dinheiro, tendo que pedir empréstimos para poder investir. Então há aqueles que não consomem tudo o que ganham e, portanto, querem guardar esse restante em algum lugar seguro de possíveis perdas. Por outro lado, há aqueles que consomem mais do que ganham ou querem investir em algum projeto e não possuem dinheiro suficiente para isso. Percebe-se a existência de uma interdependência entre esses dois tipos de trabalho, pois o primeiro pode ofertar o dinheiro necessário para o segundo, que o está demandando.

Então como essas pessoas conseguem se encontrar para poder satisfazer seus interesses? É através do mercado financeiro que uma pessoa que deseja poupar pode oferecer fundos diretamente a uma pessoa que deseje tomar empréstimo. Aqueles que querem poupar depositam seu dinheiro em uma caderneta de poupança em troca do pagamento de juros sobre aquele dinheiro depositado. Os poupadores conseguiram conseqüentemente o seu “porto seguro” para seu dinheiro, já que os juros irão compensar as possíveis perdas decorrentes da inflação. Os investidores, por outro lado, podem pedir dinheiro emprestado ao banco em troca de ter que devolvê-lo com um valor reajustado pelos juros cobrados. Esses indivíduos conseguirão então o capital necessário para aplicar em algum investimento, como o aumento da produção de uma empresa qualquer (quando se trata de um empresário) ou a compra de uma casa (no caso de cidadãos comuns).

Por que se deve estimular o investimento ou a poupança da população de um país? Isso se explica pelo fato que o investimento gera o crescimento econômico. Com o investimento há uma alocação de recursos para o aumento da capacidade produtiva, ou seja, determina-se um aumento da capacidade de produção de bens para um futuro próximo. Um país que não investe e utiliza suas riquezas só para o consumo não

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terá possibilidade de aumento de produção no futuro. Por isso, em economia, se diz que a geração do presente deve privar-se de uma parte de seu bem estar (ou seja, privar-se do consumo) para que as próximas gerações possam gozar de uma melhor condição de vida. Em resumo, para que se tenham investimentos, precisa-se de poupança para tal.

A poupança é a oferta de fundos destinados a empréstimos, e o investimento é a demanda desses fundos. Dessa forma, a taxa de juros seria o preço desses empréstimos, representando o quanto os tomadores têm que pagar pelo empréstimo e o quanto os que emprestam, devem receber por sua poupança. Quanto maior a taxa de juros, maior é o incentivo à poupança, pois terá maior retorno, e menor é o incentivo ao investimento, pois esse será mais caro. Portanto, com maior taxa de juros o consumo é penalizado e a parcimônia recompensada. É por esse motivo que o aumento das taxas básicas de juros é uma das formas de se conter a inflação, apesar de ser uma forma polêmica, já que desestimula o investimento e, portanto, o crescimento.

Taxas de câmbio Com o crescimento das transações comerciais internacionais, tanto no fluxo de

bens como no fluxo financeiro, a medição da variação dos preços a qual se dão estas transações tornou-se importante para facilitar ainda mais o processo complexo que as envolvem, além de avaliar o desempenho econômico de um país. De acordo com Mankiw, “assim como o preço em qualquer mercado desempenha a importante função de coordenar compradores e vendedores no mercado, os preços internacionais [isto é, as taxas de câmbio] ajudam a coordenar as decisões dos consumidores e dos produtores quando interagem nos mercados mundiais”51.

Existem dois tipos de taxa de câmbio, nominal e real. A taxa de câmbio nominal indica o valor que uma determinada moeda assume em face a uma moeda estrangeira, ou seja, a qual taxa esta moeda será trocada por aquela. Esta taxa é resultado das forças de oferta e demanda, o que influencia na apreciação ou depreciação da moeda nacional em face da estrangeira. Apreciação significa que, em determinado momento, o consumidor pode, com a moeda nacional, comprar uma quantidade maior de moeda estrangeira do que compraria normalmente. Ao inverso, temos a depreciação, quando a quantidade de moeda estrangeira passível de ser comprada pela moeda nacional é menor. Quando a moeda sofre apreciação, diz-se que ela se encontra fortalecida e, ao contrário, estará enfraquecida quando sofrer depreciação.

Pela taxa de câmbio real mede-se “a taxa à qual uma pessoa pode negociar os bens e serviços de um país pelos bens e serviços de outro país”52. Neste caso, temos uma situação real do valor que um produto nacional assume perante um produto estrangeiro, indicando uma relação íntima com a taxa de câmbio nominal. Entretanto, a taxa de câmbio real é um determinante-chave nas políticas de exportação e importação de um determinado país, já que facilita uma comparação de custos entre dois produtos estrangeiros.

Existem historicamente alguns modos distintos de definição das taxas de câmbio. Até a Crise de 1929, se utilizava o padrão ouro. Nesta situação, os valores das moedas estavam atreladas a determinada quantidade de ouro. Após as Conferências

51

MANKIW, N.G. Introdução à Economia. Rio de Janeiro: Campus, 1999. p. 685. 52

Ibidem, p. 686.

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de Bretton Woods estabeleceu ou padrão ouro-dólar, no qual se atrelavam as moedas ao dólar e este estava atrelado ao ouro. A partir da década de 1970, com a falência do sistema de Bretton Woods, passou a ser majoritário o esquema de taxas flutuantes, na qual as forças de mercado, isto é, a demanda e a oferta pela moeda estrangeira, determinam a taxa de câmbio.

Produto Interno Bruto e Produto Nacional Bruto

Na busca por um melhor estudo dos fenômenos que afetam a economia como um todo, o monitoramento por meio de dados macroeconômicos é uma ferramenta deveras importante, servindo como base para a formulação de políticas tanto governamentais como do setor privado. Desta maneira, ressalta-se o papel fundamental do Produto Interno Bruto (PIB) como termômetro do desempenho de uma dada economia.

Conceituado como “o valor de mercado de todos os bens e serviços finais produzidos em um país em um dado período de tempo”53, o PIB é medido como a soma das rendas e despesas totais de um determinado país54. A razão de apenas considerar os bens finais a despeito dos bens intermediários deve-se ao fato de que o valor dos últimos está incluso nos primeiros, evitando, portanto, uma dupla contagem.

O Produto Nacional Bruto (PNB) também é uma ferramenta importante para medir a renda total dos residentes permanentes de um determinado país. Contudo, diferentemente do PIB, que inclui a renda sem qualquer diferenciação, o PNB conta com a renda dos cidadãos do país que moram no exterior e excluem aqueles estrangeiros que recebem algo no país. Desta maneira, detêm-se os dados reais do desempenho econômico da população nacional, o que pode servir como motivação para o investimento em políticas públicas como a educação fundamental, por exemplo. Entretanto, segundo Mankiw, “para a maioria dos países, incluindo os Estados Unidos, os residentes domésticos são responsáveis pela maior parte da produção interna, de modo que o PIB e o PNB são muito próximos”55.

Crescimento e Desenvolvimento Econômicos

A medição do crescimento econômico de um determinado país significa, em outras palavras, avaliar as forças que influenciam e determinam as variáveis macroeconômicas. É de fundamental importância o entendimento de que, apesar dos indicadores como o nível do PIB apresentarem indicativos da prosperidade econômica de um determinado país, a relação deste com a produtividade determina qual a influência real da produção econômica no padrão de vida da população.

Entende-se por produtividade “a quantidade de bens e serviços produzida em cada hora de trabalho de um trabalhador”56. Grosso modo, é dizer que quanto maior a quantidade e a variedade de produtos produzidos, maior será o padrão de vida deste 53

Ibidem, p. 502. 54

No caso, o PIB é definido pela equação Y = C + I + G + EL, sendo (C) o consumo, (I) o investimento, (G) as compras do governo e (EL) as exportações líquidas, ou seja, as exportações menos as importações. Essa equação é uma identidade, ou seja, ela deve ser verdadeira a propósito de como as variáveis são definidas. 55

Ibidem, p. 504. 56

Ibidem, p. 541.

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país. É evidente, entretanto, que a consideração desde indicador apenas não demonstra o desenvolvimento real de um país: além da relação com o PIB, a qual se obtém uma amostra da prosperidade econômica, diversos fatores como a distribuição de renda e a qualidade dos serviços básicos devem ser considerados para então ter-se uma visão real do que se sucede dentro deste país.

Índice de Desenvolvimento Humano e Índice de Gini Como supracitado, é importante a consideração de variáveis como a

distribuição de renda e a qualidade dos serviços básicos na medição da prosperidade de um determinado país. Para que isto ocorra de forma eficiente, foram criados o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e o Índice de Gini.

Desenvolvimento é um conceito bastante amplo e complexo, sendo arduamente discutido na literatura econômica. Esta inclusão de indicadores sociais na avaliação da riqueza de um determinado país insere-se particularmente nesta discussão entre crescimento e desenvolvimento econômico. Afirma-se que é perfeitamente possível que um país gere crescimento sem desenvolver-se. Isso acontece, na maior parte das vezes, devido à concentração de renda nas mãos de uma parcela pequena da população, evitando que os demais gozem dos benefícios advindos deste crescimento.

Uma das formas de avaliar o desenvolvimento é observar indicadores como saúde e educação, serviços básicos necessários para a manutenção da dignidade humana. Foi então criado pela ONU o IDH, que tem por objetivo a avaliação da qualidade de vida nos países. O IDH - que leva em consideração as variáveis saúde, educação e renda per capita - varia de zero a um, classificando os países em três grupos: os de baixo desenvolvimento (IDH menor do que 0,5), os de médio desenvolvimento (IDH entre 0,5 e 0,8) e os de alto desenvolvimento (IDH maior que 0,8).

A justificativa para a análise destas variáveis deve-se ao fato de que o crescimento material (refletido pela renda per capita) deve vir acompanhado de um aumento da esperança de vida da população (saúde) e de uma expansão na qualidade da educação, de modo a tornar universal este crescimento. O cálculo do IDH e sua divulgação conferiram um pouco mais de precisão para o debate sobre crescimento versus desenvolvimento, mas este debate ainda não está sequer próximo de seu final.

Outro indicador importante para a mensuração da prosperidade de um país é o índice de Gini. Como dito anteriormente, a concentração de renda está entre as principais causas da ausência de desenvolvimento em determinados países. O índice de Gini mede, com precisão, a distribuição de renda do país em questão e, conjuntamente com o IDH, funciona como ferramenta importante para a percepção verdadeira da situação em que este país se encontra. Assim como o IDH, o Índice de Gini varia de zero a um, mas, ao contrário do primeiro, quanto mais próximo da unidade, pior é a concentração de renda. Alguns países que possuem um PIB elevado mostram um índice de Gini preocupante, o que demonstra que apenas crescimento econômico não é o suficiente para a melhoria do padrão de vida da população.

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Políticas Macroeconômicas na Contemporaneidade: debates e tendências

Atualmente, sob a turbulência da crise no sistema financeiro internacional

decorrente das falências de grandes bancos estadunidenses, é essencial que seja discutido o rumo que deve ser adotado pelos governos como modelo ideal para alcançar o desenvolvimento neste novo contexto. Além disso, é necessária a reavaliação do papel que deve ser ocupado pelas instituições financeiras internacionais - bem como as políticas por elas adotadas.

É, ademais, importante que o comércio internacional, hoje razoavelmente liberalizado, tenha papel central na avaliação a ser feita pelos representantes diplomáticos dos membros das Nações Unidas. Todos esses elementos devem ser considerados sob a meta fundamental do desenvolvimento, dando especial atenção às necessidades especiais de Estados débeis com condições sociais precárias.

Não há qualquer consenso definitivo sobre os rumos últimos da economia mundial. Nem mesmo sobre a base da economia política que deve ser seguida, isto é, sobre qual o papel que o Estado deve ter na economia. Nesta seção serão brevemente apresentados os mais importantes debates sobre macroeconomia e desenvolvimento existentes contemporaneamente.

Estado, sociedade e desenvolvimento Ainda há uma dubiedade quanto a qual deve ser a posição hegemônica

referente ao papel que o Estado deve exercer, no pós-crise financeira, na atividade econômica. Tal dubiedade se revela, por exemplo, na Declaração do Grupo dos 20, de novembro de 2008.

Por um lado, os líderes presentes se comprometeram a “implementar reformas que irão fortalecer os mercados financeiros e os regimes regulatórios com vistas a evitar crises futuras” e afirmam que a “regulação é responsabilidade essencial dos reguladores nacionais, que constituem a primeira linha de defesa contra a instabilidade no mercado”57. Por outro, declararam:

Reconhecemos que estas reformas só serão bem sucedidas se baseadas em um comprometimento com os princípios do livre mercado, inclusive o império da lei, o respeito à propriedade privada, livre comércio e investimento, mercados competitivos e sistemas financeiros eficientemente e efetivamente regulados58. Nesse sentido, não há consenso sobre qual deve ser, em termos gerais, o papel

do Estado na economia. Há uma tensão entre o corrente liberalismo e uma proposta de ressurgimento keynesiano. Entretanto, pode-se reduzir o conflito a um mínimo denominador comum consensual. Primeiramente, os mercados financeiros e o capital especulativo tende a ser mais regulado. Com isso, pretende-se mitigar os efeitos negativos que o capital especulativo

57

SUMMIT ON FINANCIAL MARKETS AND THE WORLD ECONOMY. Final Declaration. 15 de novembro de 2008. § 8º. Disponível em: <http://news.bbc.co.uk/2/hi/business/7731741.stm>. Acesso em 22/11/2008. 58

Ibidem. § 12.

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pode causar sem, por outro lado, acabar com todo o estímulo ao investimento – seja ele de curto ou longo prazo.

Além disso, há o compromisso da rejeição ao protecionismo. Segundo a Declaração, os países deverão “absterem-se de criar novas barreiras ao investimento ou ao comércio de bens e serviços; de impor novas restrições à exportação; ou de implementar medidas inconsistentes de estímulo às exportações”59.

Nesse sentido, há uma significativa divergência em relação à Crise de 1929. A resposta à maior crise econômica do Século XX foi protecionista e nacionalista. O comércio mundial foi “reduzido em 66% entre 1929 e 1934”60, em grande parte por conseqüência da duplicação das tarifas de importação dos Estados Unidos da América61.

Finalmente, há um consenso sobre a necessidade de maior transparência e responsabilização no setor público. Essas medidas têm como meta reduzir o impacto que a corrupção e o tráfico de influência podem ter sobre o delineamento de políticas econômicas nacionais. Busca-se, portanto, universalizar a ratificação da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção62 e buscar sua implementação efetiva.

Orientações de política monetária, política fiscal e política cambial Não há uma regra de aplicação universal para nenhum conjunto de políticas

monetária, fiscal e cambial. Para qualquer tipo de análise, é importante considerar as especificidades estruturais e circunstanciais de determinada economia nacional. Existem, todavia, algumas atuações concertadas necessárias para a mitigação dos efeitos negativos da crise financeira internacional.

Inicialmente, considerando as perspectivas de desaquecimento da economia internacional decorrente da crise, há relativo consenso na necessidade de adaptação das políticas macroeconômicas como método de estímulo à atividade econômica. “O FMI”, por exemplo, “está clamando aos países que estimulem suas economias em face de uma desaceleração da economia global superior à esperada”63.

O Fundo argumenta, além disso, que “o espaço existente para suavizar a política monetária deve ser aproveitado”, por meio da redução de taxas de juros, “especialmente agora que as preocupações relativas à inflação se amenizaram”64. O FMI alerta, entretanto, que a política monetária pode ser insuficiente.

59

Ibidem. § 13. 60

ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. DEPARTAMENTO DE ESTADO. Protectionism in the interwar period. Disponível em: <http://www.state.gov/r/pa/ho/time/id/17606.htm>. Acesso em 22/11/2008. 61

V. ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. DEPARTAMENTO DE ESTADO. Smoot-Hawley Tariff. Disponível em: <http://future.state.gov/when/timeline/1921_timeline/smoot_tariff.html>. Acesso em 22/11/2008. 62

V. CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS CONTRA A CORRUPÇÃO. 29 de Março de 1996. Disponível em: <http://www.unodc.org/pdf/brazil/ConvONUcorrup_port.pdf>. Acesso em 11/11/2008. 63

FUNDO MONETÁRIO INTERNACIONAL. IMF Urges Stimulus as Global Growth Marked Down Sharply. Survey Magazine: in the news. 06 de novembro de 2008. Disponível em: <http://www.imf.org/external/pubs/ft/survey/so/2008/NEW110608A.htm> Acesso em 06/11/2008. 64

FUNDO MONETÁRIO INTERNACIONAL. World Economic Outlook Update - rapidly weakening

prospects call for new policy stimulus. Washington: FMI, 2008. Disponível em:

<http://www.imf.org/external/pubs/ft/weo/2008/update/03/pdf/1108.pdf>. Acesso em

11/11/2008. p. 3.

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Por isso, é necessário avançar no sentido de uma mudança na política fiscal, por meio do corte de impostos. O “estímulo fiscal pode ser efetivo se bem direcionado, apoiado em uma política monetária razoável, e implementado em países onde há espaço fiscal”65, isto é, onde não há escassez de dinheiro para cobrir os gastos totais do governo.

É importante ressaltar que, no mesmo relatório, o Fundo Monetário Internacional enfatiza que, ao fim de 2008, as medidas macroeconômicas tomadas eram ainda muito tímidas e que precisavam ser aprofundadas para um combate efetivo da crise financeira. Ademais, a Declaração do G-20, de novembro de 2008, se refere à importância da coordenação de medidas macroeconômicas para amenizar os efeitos da crise.

No final de 2008, muitos países, como a Alemanha, o Canadá, os Estados Unidos, o Reino Unido, a Argentina e o Brasil, anunciaram medidas para garantir a estabilização financeira em suas economias. Entre os principais recursos estão: a concessão de crédito a bancos; a garantia de depósitos de correntistas em bancos até determinada quantia; o fornecimento de crédito direto a grandes firmas; e a nacionalização de grandes instituições financeiras66. Em seu Relatório sobre a Estabilidade Financeira Global, o FMI ressalta a importância de medidas desse tipo como medidas emergenciais de alívio em relação à crise de confiança nos mercados financeiros.

Entretanto, o Fundo inclui como medida fundamental a de se “garantir que as intervenções governamentais sejam temporárias e que os interesses dos contribuintes sejam protegidos. A responsabilização dos agentes públicos é importante para todas as partes envolvidas”67. Isto, pois a ação governamental de socorro de instituições privadas acaba por distorcer a lógica de mercado de que um agente pode apropriar-se dos lucros de sua empreitada, mas deve, para tanto, correr os riscos de um eventual prejuízo. Se a intervenção governamental se tornar rotineira, a mesma pode significar um incentivo a ações deliberadamente irresponsáveis por parte dos agentes econômicos.

No que se refere à política cambial, seu trato está relacionado ao supracitado compromisso de rejeição ao protecionismo. Nesse sentido, mantém-se a tendência de câmbios flutuantes como padrão internacional, de modo a evitar possíveis distorções propositais de cunho protecionista, ainda que com eventuais intervenções governamentais para evitar instabilidades. Não obstante, os países que, por motivos específicos, mantêm taxas de câmbio fixo tendem sua manutenção – é o caso vários países africanos e caribenhos.

Organismos financeiros internacionais: rumo a uma nova arquitetura

financeira internacional

65

Idem. 66

V., por exemplo, infográfico em: FINANCIAL TIMES. Government interventions. 13 de outubro de 2008. Disponível em: <http://www.ft.com/cms/s/0/54f2b80e-9947-11dd-9d48-000077b07658,dwp_uuid=698e638e-e39a-11dc-8799-0000779fd2ac.html?nclick_check=1 >. Acesso em 17/11/2008. 67

FUNDO MONETÁRIO INTERNACIONAL. Global Financial Stability Report. Washington: FMI, 2008. p. xii.

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Nos últimos anos, “a criação de uma ‘nova arquitetura financeira internacional’ tem sido objeto de debate entre acadêmicos e formuladores de políticas nos tesouros nacionais, bancos centrais e instituições financeiras internacionais tais como o FMI e o Banco Mundial”68. Basicamente, compreende-se que os organismos financeiros internacionais devem se adaptar às mudanças recentes da atual economia globalizada.

Impulsionadas pela crise financeira internacional, as reformas, ao fim de 2008, começam a tomar contornos práticos. A título de exemplo, vale citar que, em setembro de 2008, foi implementado, pelo Fundo Monetário Internacional, uma comissão de notáveis para sugerir reformas na estrutura de governança do fundo69.

Um dos principais pontos de debate é a reformulação da estrutura de cotas nas votações do FMI e do Banco Mundial. O principal argumento a favor da reforma é que os países em desenvolvimento estão subrepresentados nos organismos, haja vista que sua relevância economica é atualmente muito maior do que há alguns anos.

Em 2008, o FMI realizou uma atualização nas cotas de votação, aumentando a representação de países emergentes70. Entretanto, o poder de voto dos países emergentes é ainda inferior a sua participação relativa na composição do PIB mundial. Por esse motivo, a tendência é que o assunto da adaptação das estruturas dos organismos de Bretton Woods à nova arquitetura financeira internacional deve continuar central.

Outra discussão nevrálgica a respeito da reforma das instituições financeiras internacionais é o papel que devem ter as condicionalidades nos empréstimos concedidos pelas mesmas. Condicionalidades são as exigências que os organismos financeiros fazem para a liberação do crédito, em geral uma série de reformas e políticas a serem seguidas pelo governo receptor.

Por um lado, as condicionalidades funcionam como garantias aos organismos credores, já que as linhas de crédito não são feitas a fundo perdido. Os Estados-Membros do FMI e do Banco Mundial são “acionistas” das instituições, e têm seu poder de voto atrelado a sua contribuição para os fundos institucionais. Nesse sentido, justificam-se determinadas garantias para o fornecimento de empréstimos.

Entretanto, as instituições financeiras internacionais comumente atrelam condicionalidades a modalidades específicas de políticas, com a justificativa de que somente aquele conjunto de ações logrará êxito no alcance do desenvolvimento. Neste outro cenário, já não se focam nas garantias ao empréstimo, mas no próprio direcionamento das políticas nacionais – e aí residem as maiores críticas às condicionalidades.

As condicionalidades, mal aplicadas, podem significar a imposição de um projeto de desenvolvimento exógeno, pela simples aplicação de modelos e princípios externos sem sua adaptação às especificidades nacionais e locais. Esse tipo de projeto

68

EATWELL, John. The new International Financial Architecture: promise or threat? Disponível em: <http://www-cfap.jbs.cam.ac.uk/publications/files/Cambridge-MIT%20lecture%2022.5.pdf>. Acesso em 11/11/2008. 69

FUNDO MONETÁRIO INTERNACIONAL. Managing Director Strauss-Kahn Appoints Committee on IMF Governance Reform. Press Release No. 08/200. 6 de setembro de 2008. Disponível em <http://www.imf.org/external/np/sec/pr/2008/pr08200.htm>. Acesso em 10/11/2008. 70

FUNDO MONETÁRIO INTERNACIONAL. IMF Board of Governors Adopts Quota and Voice Reforms by Large Margin. Press Release No. 08/93. Disponível em: <http://www.imf.org/external/np/sec/pr/2008/pr0893.htm>. Acesso em 11/11/2008.

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de desenvolvimento vai de encontro com o princípio da apropriação71, isto é, a idéia de que cada sociedade deve ser inclusa no processo decisório, “tomar a direção de seu próprio desenvolvimento e caminhar para um momento em que a ajuda externa já não seja necessária”72.

Outrossim, o grande desafio é compatibilizar condicionalidades e apropriação, por meio da inclusão da sociedade civil no direcionamento dos recursos de financiamento internacional. Tal medida, ademais, significaria um passo rumo à melhor aplicação dos referidos recursos, uma vez que governos centrais em geral carecem de eficiência para aplicá-los – em especial aqueles que não têm estruturas políticas democráticas.

Ademais, um possível caminho para a melhor eficiência das condicionalidades é agregar metas de desenvolvimento sócio-ambiental. Usualmente as condicionalidades incluem: a) padrões de confiabilidade política; b) padrões de direitos humanos; e c) a adoção de reformas direcionadas ao mercado73. A elas, podem ser agregadas metas de redução da pobreza, por meio da aplicação efetiva dos recursos providos para tal fim; e a adoção de padrões de desenvolvimento sustentável.

Comércio internacional e fluxos internacionais de capitais.

A partir da década de 1970, tornou-se evidente um processo de integração

econômica internacional ao qual se convencionou dar o nome de globalização. Entre as características mais fundamentais da globalização estão um aumento substancial nas trocas comerciais e, impulsionado pelos avanços tecnológicos de comunicação, o crescimento exponencial de fluxos internacionais de capitais que podem ser movimentados de forma instantânea entre os diversos mercados financeiros nacionais74.

O aumento do comércio internacional foi impulsionado pela liberalização comercial internacional, evidenciada, principalmente, pela redução das tarifas médias de importação. Tomando-se os EUA como exemplo, observa-se uma redução de 92% nas tarifas de importação desde a criação do GATT até a década de 1980 (Ver Figura 1). Com isso, tendia-se à especialização na produção e a conseqüente redução de custos, em consonância com a visão liberal da economia política.

71

V. LOPES, Carlos. Cooperação e Desenvolvimento Humano. São Paulo: Ed. Unesp: 2005. p. 119 72

GÓES, Carlos; PINHEIRO, Leonardo; DIAS, Maurício. Parceria Mundial para o Desenvolvimento: a necessidade de desenvolver uma percepção recíproca. Anais da III Conferência Mundial para as Relações Internacionais. Brasília, Outubro de 2006. p. 21. 73

NATRAJ, V. K. Conditionalities and Assistance: Looking for the Immutable. Economic and Political Weekly, Vol. 28, No. 7 (Feb. 13, 1993), pp. 270-271. 74

V., por exemplo, OHMAE, Kenichi. O fim do Estado-Nação. São Paulo: Campus, 1999.

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FIGURA 1 – Tarifas médias dos EUA de 1945 a 198075 Contemporaneamente o comércio internacional tem grande relevância para as

economias nacionais, em especial para os países que não detêm um mercado interno robusto. Em 2007, o comércio internacional correspondia por cerca de um quinto do Produto Mundial Bruto76.

De tal sorte, uma redução drástica no comércio internacional afetaria de forma substancial a economia mundial como um todo. Por este motivo, conforme já afirmado, as lideranças mundiais têm se movimentado para rechaçar qualquer reação protecionista à crise financeira internacional, uma vez que tal reação poderia agravar a desaceleração econômica, tal como ocorreu após o desencadeamento da crise de 1929, quando as trocas comerciais foram reduzidas em 66%77.

Nesse sentido, a crise pode significar a abertura de um espaço de diálogo que antes se encontrava travada. O Grupo dos 20 já declarou a importância de se encontrar uma solução para a Rodada de Doha da Organização Mundial do Comércio, que foi inaugurada em 2001 e ainda não foi finalizada. Não obstante, não é somente o comércio internacional que hoje significa um elemento fulcral para a economia internacional. Há, ademais, fluxos internacionais de capitais, que consistem em investimentos estrangeiros – seja no mercado financeiro, o capital especulativo, seja na produção, o capital produtivo.

O Consenso de Monterrey sobre Financiamento para o Desenvolvimento, documento assinado em 2002 por Chefes de Estado e Governo, já ressaltava que

75

BHAGWATI, Jagdish. Protecionismo versus Comércio Livre. Rio de Janeiro: Nórdica, 1989. p. 16. 76

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMÉRCIO. Estadísticas del comercio internacional, 2008. Genebra: OMC, 2008. pp. 1-36. 77

ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. DEPARTAMENTO DE ESTADO. Protectionism in the interwar period. Disponível em: <http://www.state.gov/r/pa/ho/time/id/17606.htm>. Acesso em 22/11/2008.

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os fluxos privados de capital, e particularmente o investimento estrangeiro direto, ao lado da estabilidade financeira internacional, são vitais para complementar os esforços nacionais e internacionais de desenvolvimento. O investimento estrangeiro direto contribui para o financiamento de um crescimento econômico sustentado a longo prazo. Ele é especialmente importante por seu potencial para transferir conhecimento e tecnologia, gerar empregos, incentivar a produção, aumentar a competitividade e o empreendendorismo e, em última instância, erradicar a pobreza através de crescimento e desenvolvimento econômicos78. Entretanto, existem efeitos colaterais negativos concomitantes aos

supracitados benefícios, especialmente no que se refere ao capital especulativo. Os dois principais efeitos negativos são: a) o fato de os fluxos internacionais de capitais nos mercados emergentes serem muito voláteis, isto é, não permitirem uma previsibilidade de longo prazo e estarem sempre sujeito a crises; e b) o fato de haver um contágio epidêmico muito acentuado no caso de uma crise, ou seja, um mercado saudável pode rapidamente ser contaminado pela incerteza e pessimismo presentes em outro mercado similar79.

Até o período anterior à crise, se tinha a clara percepção que a “liberalização das restrições nos fluxos internacionais [de capitais] tendem a aumentar a liquidez no mercado de ações” e que isso levaria a um “aumento no crescimento econômico”80. Entretanto, após o início da crise imobiliária, os argumentos de keynesianos favoráveis a uma maior regulação nos mercados financeiros passaram a ser mais considerados81.

A julgar pelo encontro do Grupo dos 20, de novembro de 2008, a tendência é uma maior regulação dos fluxos internacionais de capital. O grande desafio é saber a dosagem desta regulação, já que um excesso de regulação pode significar um desincentivo completo ao investimento externo que, como já visto, é essencial para o desenvolvimento econômico de países em desenvolvimento e países com economia em transição.

Estados falidos

Os vários Estados que convivem na cena internacional, tendo diferentes capacidades de poder, ocupam espaços distintos nas relações internacionais82. Não há qualquer dúvida que as posições de política exterior de uma grande potëncia exercem impacto distinto dos pronunciamentos da chancelaria de um estado de pouca relevância política e econômica, sobre o quadro político internacional.

78

MONTERREY CONSENSUS ON FINANCING FOR DEVELOPMENT. 18-22 de março de 2002. § 20. Disponível em: <www.un.org/esa/ffd/monterrey/MonterreyConsensus.pdf>. Acesso em: 11/11/2008. 79

FISCHER, Stanley. Reforming the international financial system. The Economic Journal. n. 109. November 1999. pp. 557-556. 80

LEVINE, Ross. International Financial Liberalization and Economic Growth. Review of International Economics. Volume 9, Issue 4. pp. 668-702. 81

HERMANN, Jennifer. Da liberalização à crise financeira norte-americana: a morte anunciada chega ao Paraíso. In: ASSOCIAÇÃO KEYNESIANA BRASILEIRA. Dossiê da Crise. Porto Alegre: AKB, 2008. pp. 29-34. Disponível em: <http://www.ppge.ufrgs.br/akb/dossie-crise.pdf>. Acesso em 01/12/2008. 82

V. ESCUDÉ, Carlos. El realismo de los estados debiles : la politica exterior del primer gobierno Menem frente a la teoria de las relaciones internacionales. Buenos Aires: Grupo Ed. Latinoam, 1995.

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Entretanto, a política internacional não é uma exclusiva política do poder, uma vez que idéias e ideologias têm influência ímpar na ação externa dos Estados83. As questões de justiça, ainda que subordinadas ao interesse nacional dos Estados84, sempre figuraram como elementos relevantes para o debate diplomático.

Tal relevância se mostra evidente em alguns instrumentos jurídicos ou iniciativas políticas práticas. Em 1996, o Banco Mundial lançou um programa para incentivar o perdão da dívida externa de países mais pobres85. Por sua parte, o Tratado de Marrakesh, constituinte da Organização Mundial do Comércio, afirma que

os países menos desenvolvidos, reconhecidos como tal pelas Nações Unidas, somente serão requeridos a cumprir os acordos e concessões na extensão cabível às suas necessidades individuais financeiras, comerciais e de desenvolvimento ou suas capacidades administrativas e institucionais86. A problemática dos Estados falidos surge no debate da economia política

internacional contemporânea como uma dessas questões à parte da política do poder. Buscar resolvê-la significa, por uma parte, responder à pressão interna da sociedade civil organizada, e, por outra, lidar com as demandas de um tratamento justo em relação aos países mais pobres.

Estados falidos são aqueles “incapazes de exercer seu poder e estabelecer sua autoridade dentro de suas próprias fronteiras, deixando em seus territórios um vácuo governamental”87, geralmente coexistindo com fontes paralelas de poder, como grupos paramilitares e rebeldes. Constatando-se a incapacidade do Estado em crise de atender as necessidades básicas de sua população, como a educação, saúde e segurança, a intervenção internacional, muitas vezes liderada pelas Nações Unidas ou por Estados vizinhos, é utilizada no intuito de se evitar catástrofes de proporções ainda maiores, decorrente da beligerância.

Surge, portanto, a questão da existência de qualquer possibilidade de se alcançar um mínimo de estabilidade macroeconômica para rumar ao desenvolvimento em Estados falidos. Inicialmente, emerge um ponto fundamental: a paz e a estabilidade securitária são pré-requisitos básicos para se atingir o desenvolvimento. Nesse sentido, o cumprimento imediato das resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas88 sobre determinados Estados falidos – tais como Somália, Sudão, Chade, Zimbábue e Costa do Marfim89 – devem ser tidas como base elementar para a construção de uma perspectiva futura de desenvolvimento.

Ademais, cumpre ressaltar que somente com um trato diferenciado as situações de Estados falidos podem ser amenizadas. É necessária, ademais, uma

83

V. WENDT, Alexander. Social Theory of International Politics. Cambridge: Cambridge University Press, 1999. 84

V. BULL, Hedley. A Sociedade Anárquica. Brasília: Ed. UnB, 2002. 85

BANCO MUNDIAL. The Enhanced Heavily Indebted Poor Countries Initiative (HIPC). Disponível em: <http://go.worldbank.org/85B908KVE0>. Acesso em: 09/11/2008. 86

ACUERDO DE MARRAKECH POR EL QUE SE ESTABLECE LA ORGANIZACIÓN MUNDIAL DEL COMÉRCIO. 15 de abril de 1994. Artigo XI. § 2. Disponível em: <http://www.wto.org/spanish/docs_s/legal_s/04-wto_s.htm>. Acesso em 11/11/2008. 87

ROTBERG, Robert. Failed states in a world of terror. Foreign Affairs. Vol. 81, No. 4 (Jul. - Aug., 2002), pp. 127-140. 88

V., por exemplo, CONSELHO DE SEGURANÇA DAS NAÇÕES UNIDAS. S/RES/1816 (2008); S/RES/1831 (2008); e S/RES/1844. 89

FOREIGN POLICY. The Failed States Index 2008. Disponível em: <http://www.foreignpolicy.com/story/cms.php?story_id=4350&page=1>. Acesso em 11/11/2008.

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coordenação de várias frentes, que vai além dos organismos econômico-financeiros internacionais. De tal sorte, além da importância da solução das questões securitárias, medidas tais como a supracitada ação do Banco Mundial para o perdão da dívida dos países mais pobres devem ser incentivadas.

Finalmente, a participação da sociedade civil é também elemento fundamental para que atinja qualquer perspectiva de desenvolvimento em Estados falidos. Uma vez existente um vácuo governamental no território desses Estados, não existe qualquer estrutura política legitimada com a qual possível uma negociação internacional. Nesse sentido, somente com a inclusão de outros grupos da sociedade civil pode amenizar essa situação e caminhar rumo ao conceito fundamental da apropriação.

Conclusão

Se há um consenso absoluto sobre o futuro do atual cenário das relações

econômicas internacionais é que nenhum consenso absoluto existe. Entretanto, ainda que sob o risco de errar nos apontamentos, é possível ousar e estabelecer determinadas tendências que têm mais possibilidade de ocorrerem em relação às demais.

Lançando mão das lições históricas emergentes das construções e práticas em economia política, observa-se uma tensão permanente entre o corrente liberalismo e propostas keynesianas. Em meio às posições radicalizadas, surgem soluções intermediárias, que mantêm a base liberal da economia de mercado e reconhecem a importância de intervenções governamentais pontuais para amenizar o pânico irracional nos mercados e evitar maiores efeitos sobre a economia.

Arranjos políticos e econômico-financeiros são necessários à mitigação dos efeitos negativos da crise financeira internacional. E um elemento razoavelmente consensual é a rejeição ao protecionismo. Ademais, uma coordenação de políticas relativas ao mercado financeiro, por meio da garantia de transparência e larga informação, parece ser o caminho acertado pelos líderes mundiais no último encontro do Grupo dos 20.

Neste artigo, se tentou fazer a exposição dos principais debates concernente às questões macroeconômicas em voga nos foros econômico-financeiros internacionais. Enfocaram-se as questões de possível resolução internacional, em detrimento de políticas macroeconômicas que, ainda que de relevância ímpar, são relativas à organização político-econômica interna.

Destarte, destacam-se, sob este conceito, o alinhamento de políticas monetária, fiscal e cambial, comércio internacional e fluxo internacional de capitais, além da questão dos Estados falidos. Ademais, a reforma das instituições financeiras internacionais continua como foco de debates. Outros elementos macroeconômicos, tais como a concepção de qual deve ser o papel do Estado na atividade econômica e o caráter das políticas públicas de combate à crise – ambos de aplicação interna – são ainda menos consensuais e, também por isso, não foi meta deste artigo neles se aprofundar.

Por certo que as atuais instabilidades tornam arriscadas previsões objetivas. Por esta razão, as conclusões tendenciais ora apresentadas posam como o mínimo denominador comum sobre o qual reside um consenso aceitável.

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A corrente “crise financeira já passou a ser uma crise econômica”90, disse Robert Zoellick, presidente do Banco Mundial. E, por isso, somente uma reversão na atual falta de consenso pode amenizar os reflexos da crise no bem-estar de cada indivíduo. Ações concertadas em nível internacional, regional e nacional são necessárias para que os efeitos da crise financeira – que parecem quase virtuais ao cidadão comum – não contagiem ainda mais seriamente a economia real, o que implicaria em efeitos nefastos no cotidiano individual, com sérios prejuízos humanos, econômicos e sociais.

Posicionamento de Blocos América Latina Os países da América Latina se destacam no cenário atual pela procura de

novas formas de se relacionar com o resto do mundo. Historicamente conhecidos pela dependência em relação aos países desenvolvidos principalmente no que tange o comércio e dívidas financeiras, hoje a América Latina tenta tornar-se ativa participante nas relações internacionais através da diversificação de parcerias. Alguns fatos confirmam essa tendência, como por exemplo: a intensificação dos fóruns multilaterais com outras regiões do mundo e, além disso, o aumento do volume do comércio com o terceiro mundo. Para complementar, há um intenso processo de integração intra-regional, expressos essencialmente no Mercosul91 e na Comunidade Andina de Nações (CNA).

No contexto da crise econômica internacional, a expectativa para a América Latina é sombria. O crescimento econômico da região ameaça ser reduzido a 1,1% em 2009, enquanto possuía um crescimento constante de, em média, 5% nos últimos anos. Aqueles mais afetados são os que mais dependem do comércio com os Estados Unidos e a Europa.

O discurso latino-americano, nessa questão, culpa os países desenvolvidos de terem liberalizado demais suas economias, fazendo o globo acreditar que um capitalismo extremo e amplamente liberalizado era o único caminho para o desenvolvimento, e no caso da região ter sido forçada a adotar tais medidas pelas condições impostas por organismos financeiros internacionais, como o FMI e o Banco Mundial92. A América Latina propõe um capitalismo social, ou seja, voltado ao bem estar da população, mas não negando a importância do mercado para a economia. Pede, também, maior importância nas decisões econômicas internacionais e maior poder nas instituições de Bretton Woods93, querendo reformar também suas políticas de empréstimos.

90

FOLHA DE SÃO PAULO. Mundo atravessará crise de desemprego em 2009, diz Banco Mundial. 14 de dezembro de 2008. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u479267.shtml>. Acesso em 14/12/2008. 91

Veja: http://www.mercosur.int/msweb/portal%20intermediario/pt/index.htm 92

A América Latina critica esses dois organismos internacionais em específico também porque a região se tornou mais forte para resistir a crises econômicas sem precisar de empréstimos do FMI e do Banco Mundial. Para mais informações acerca deste assunto, veja: http://www.iht.com/articles/ap/2008/10/19/business/LT-IMF-Latin-America.php 93

Idem

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África Fruto de um processo histórico da colonização por potências européias, a África

é o continente, no mundo contemporâneo, que possui mais obstáculos e complicações ao seu desenvolvimento. Detentora de indicadores socioeconômicos muito abaixo do nível plausível, a África é o segundo continente mais populoso do mundo, com aproximadamente 920 milhões de habitantes, e, mesmo sendo uma região abundante em recursos naturais94, somente alguns países estão usufruindo desse fato para a promoção de seu desenvolvimento. As guerras civis, a ineficiência governamental, a forte vulnerabilidade econômica e a exploração estrangeira indiscriminada são os principais problemas que fazem com que muitos países da região tenham sua população vivendo na miséria e sem nenhum acesso a serviços públicos indispensáveis para seu bem estar.

Uma das formas de se dividir o continente de forma a enfatizar diferenças e semelhanças peculiares em cada região, é a seguinte: África do Norte95 e a África Subsaariana96. Como o próprio nome diz, a primeira região se concentra no extremo norte, próximo ao continente europeu. No plano social, destacam-se, relativamente ao resto do continente, índices socioeconômicos melhores e o fato da população branca ser numerosamente significativa, tanto que o norte é vulgarmente conhecido por “África Branca”. As políticas econômicas dos países da região possuem como característica importante o incentivo à liberalização, como forma de aproximação à União Européia e em busca de novos acordos com esse bloco econômico.

Já a segunda região, se concentra no centro-sul do continente, ao sul do deserto do Saara. A região é conhecida vulgarmente como “África Negra” por apresentar populações predominantemente negras. Com a clara exceção da África do Sul, considerada um país emergente97, muitos países subsaarianos estão em uma grave situação social e econômica, sendo que muitos governos não conseguem ter poder sobre todo o território, devido à falta de representatividade e de guerras civis entre etnias inimigas, que vivem no mesmo território. Um bom exemplo é a Somália, cujo governo não consegue exercer sua soberania sobre o território. Nesse país, quem detêm realmente o poder são vários “senhores da guerra”, que perpetuam uma guerra civil indiscriminada no território somaliano. Um bom exemplo da ineficiência estatal é a presença de piratas na costa somali. Eles representam uma preocupação internacional, uma vez que constituem uma ameaça à livre circulação de navios e barcos que transitam pelo Golfo Pérsico e o de Áden, estratégicos para a indústria petrolífera mundial98.

94

Para mais informações sobre as oportunidades dos recursos naturais da África, veja: http://www.independent.co.uk/money/invest-save/africas-natural-resources-are-a-potential-gold-mine-406135.html 95

Compreende: Argélia, Egito, Líbia, Marrocos, Sudão, Tunísia, Saara Ocidental. 96

Compreende todos os outros países continentais da África. 97

A África do Sul é um bom exemplo de democracia e possui uma economia emergente. As perspectivas para o futuro são otimistas, tanto que um estudo da União Européia aponta o país como um futuro “Tigre Africano” (clara referência aos tigres asiáticos que possuem uma economia muito dinâmica). Veja: http://ec.europa.eu/development/body/publications/courier/courier195/en/en_069_ni.pdf 98

Lista de barcos sob possessão desses piratas: http://www.reuters.com/article/worldNews/idUSTRE5083SA20090109

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Além disso, a economia da região é altamente dependente de ajuda externa99. Esta consiste tanto em ajuda financeira, quanto em suprimentos necessários para abastecer a população. A grave situação econômica dos países subsaarianos é uma das piores em termos de qualidade de vida e desenvolvimento econômico. Para complicar ainda mais, a dívida externa, adquirida através de empréstimos externos, comuns no decorrer da história desses países, é enorme e, portanto, criadora de outro obstáculo para o crescimento. Ao procurar pagá-la, o governo utiliza-se de verbas que poderiam ser destinadas a outros setores e, em muitos casos, emite papel-moeda para conseguir efetuar o pagamento, gerando, portanto, inflação.

Um claro exemplo desse fato apresentado acima é o Zimbábue100. Esse país que atualmente passa por uma grave crise política101, possui também sua economia muito debilitada. Internacionalmente conhecido como o país que atingiu o maior nível de inflação na atualidade, com taxas chegando a 231.000.000%102, grande parte da população não consegue suprir suas necessidades103.

O que falta em muitos dos Least Developed Countries (Países menos desenvolvidos) é a falta de um planejamento político e de engajamento para atingir o objetivo de desenvolver-se. Nesses países, a questão de ser neoliberal ou intervencionista não tem lugar, pois o que está em jogo são os serviços básicos de estabilização na qualidade de vida da população.

Europa Europa Ocidental A Europa é o berço da democracia e do liberalismo, exportando sua ideologia e

cultura para todo o mundo nos últimos séculos. Por razões históricas, o “velho continente”, como também é conhecido, possui, na sua parte ocidental, a região mais desenvolvida104. Nela, encontramos os fundadores105 da Comunidade Econômica Européia, em 1957, que veio a se tornar a União Européia, em 1992. Hoje em dia quase todo o continente europeu faz parte desse bloco regional, sendo que até países da ex-URSS integram-no. Ao mesmo tempo, várias políticas comuns estão sendo postas em prática.

No entanto, apesar da aparente união, há muitas diferenças entre países da Europa Ocidental em questões políticas, econômicas e de relações internacionais. Dentre elas, a mais importante é entre os modelos econômicos do Reino Unido, da Europa Continental e o Modelo Nórdico.

O modelo econômico do Reino Unido possui características neoliberais, pois defendee a baixa regulação da economia por meio de menores impostos e de menor

99

http://www.bbc.co.uk/portuguese/especial/1419_africaneconomy/ 100

Veja: http://www.newzimbabwe.com/pages/inflation180.17386.html 101

Em 2008, houve denúncias que as eleições gerais foram fraudadas, dando vitória para o ditador Mugabe. A oposição, por isso, desistiu das eleições e protestou contra o fato. A comunidade internacional forçou Mugabe a rever a eleição ou então formar um governo de coalizão com a oposição. Essa última proposta foi aceita depois de meses de instabilidade. Veja: http://www.alertnet.org/thenews/newsdesk/L26458560.htm 102

Disponível em: http://www.guardian.co.uk/world/2008/oct/09/zimbabwe 103

Disponível em: http://www.nytimes.com/2006/05/02/world/africa/02zimbabwe.html?_r=2 104

Anderson, Perry. Linhagens do Estado Absolutista, Editora: Brasiliense. 1965 105

Os fundadores foram: Alemanha, Bélgica, França, Itália, Luxemburgo e Países Baixos.

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gasto público. Portanto, haveria uma concessão para que a iniciativa privada prestasse determinados serviços em lugar do governo, em troca do direito de explorar financeiramente tal prestação. Defensores dessa ideologia afirmam que esse sistema é o mais eficiente para a criação de empregos e para desenvolver o país106. Portanto, o neoliberalismo não necessariamente quer dizer que não há investimento social no país. Muito pelo contrário, o Reino Unido gasta parte de seu orçamento para a manutenção do Estado de Bem Estar Social (Welfare State).

O modelo nórdico é o oposto do modelo anglo-saxão no sentindo em que o Estado tem o objetivo de prover uma ampla gama de direitos humanos básicos, como a saúde, educação, transporte, dentre outros. O modelo de Welfare State, nesse caso, é mais desenvolvido e robusto que os outros países europeus, sendo assim a forma mais pura desse sistema. Há uma maior igualdade na distribuição de renda do que em qualquer outro país do mundo, excetuando Cuba. Muitos empreendimentos privados em setores importantes nacionalmente são fiscalizados e algumas vezes administrados pelo Estado, em busca da maximização dos interesses nacionais. Por esses e outros motivos, a inovação e o crescimento nessas regiões ficam prejudicadas, mas o mais importante para os governos desses países é manter a qualidade de vida.

Por outro lado, o modelo econômico da Europa Continental, que compreende países como Itália, Alemanha, França, dentre outros, é o meio termo entre os dois modelos explicados acima. Há restrições ao mercado e ações do Estado em prol de políticas sociais, mas também existem muitos aspectos do liberalismo. O gasto público tende a ser maior do que no Reino Unido, e, portanto, os impostos também. Mas, por outro lado, os níveis de qualidade de vida são melhores do que na Grã-Bretanha já que a participação em relação ao PIB do investimento no Welfare State é maior. A crítica a esse modelo é que o desemprego na área continental da Europa é maior que no Reino Unido, devido a essas restrições governamentais. Os direitos trabalhistas são muito mais consolidados, fazendo com que as empresas não tenham incentivos para contratar um maior número de trabalhadores. Por outro lado, esses direitos trabalhistas tendem a garantir melhores condições para os que estão empregados.

A esperança dos neoliberais foi a eleição de Nicholas Sarkozy na França em 2007107. O novo presidente tinha propostas de mudar completamente a política francesa de Jacques Chirac, que havia sido muito intervencionista. Sarkozy defendeu a aproximação com o Reino Unido e com o seu modelo econômico108.

Em um período conturbado como o atual, assolado por uma séria crise internacional, esse embate ideológico e político não é mais relevante e os países da Europa estão voltando suas políticas para uma maior intervenção estatal. Ou seja, o modelo econômico continental está sendo utilizado para reavivar a economia européia109. Até Nicholas Sarkozy e Gordon Brown, primeiro-ministro da Inglaterra, estão adotando medidas em prol da mudança das políticas econômicas110. Entre os

106

Veja: http://www.management-issues.com/2006/8/24/research/anglo-saxon-model-offers-better-jobs-and-incomes-deal.asp 107

Disponível em: http://news.bbc.co.uk/2/hi/europe/6630797.stm 108

Disponível em: http://humaniteinenglish.com/spip.php?article880 109

Disponível em: http://www.newsweek.com/id/178822 110

Disponível em: http://www.telegraph.co.uk/news/worldnews/europe/france/3205033/Gordon-Browns-Bretton-Woods-summit-call-risks-spat-with-Nicholas-Sarkozy.html

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analistas, enquanto alguns dizem que o modelo Anglo-Saxão falhou111, outros afirmam que a radicalização para o capitalismo menos neoliberal é uma grande ameaça para os avanços já feitos por instituições neoliberais e que não é a solução para a crise112.

Leste Europeu O Leste Europeu concentra países da ex-União Soviética e de sua esfera de

influência, que, após seu colapso, buscaram se inserir no contexto da Nova Ordem Mundial. Por esta causa, são considerados “países em transição” para o capitalismo, ou seja, estão passando por mudanças para se adequar a esse sistema. Afinal, muitas instituições, comportamentos e regras, devem ser mudados no dia-a-dia de um país para que essa transição seja feita e o mercado seja um fator atuante na economia. A principal delas é o advento da democracia, onde a população passa a ter um novo papel político: de eleger seus representantes e de participar diretamente da política de um país.

O advento do liberalismo econômico e da economia de mercado, em oposição a uma economia planejada pelo governo, foi outro marco importante para a integração do leste europeu. Através dessa política, procurava-se trazer eficiência para o plano econômico, como também, atrair investimentos e empresas estrangeiras para seu território. A privatização de empresas estatais tornou-se comum nos país mais avançados da região, como os países do Báltico, a Polônia, a República Tcheca e a Eslováquia. Combinados com a estabilidade política e econômica, as condições necessárias para o estabelecimento de um importante pólo tecnológico foram constituídas.

Por esses notáveis avanços na economia, os países do Leste Europeu foram se integrando gradativamente ao bloco da União Européia e, portanto, ao mundo ocidental.

Estados Unidos da América Os Estados Unidos, maior economia do planeta, segue a risca o modelo

econômico anglo-saxão, o mesmo aplicado no Reino Unido, ou seja, liberal. A única diferença é com esse último país é que os EUA possuem taxas de impostos relativamente menores já que gasta muito menos com o Welfare State do que os britânicos. A liberdade individual é um ideal que está enraizado na cultura da sociedade americana desde a independência do país em 1783113, e, portanto influencia fortemente nas políticas e nos planejamentos econômicos desse país.

Além disso, em busca de eficiência, há a privatização de muitos setores da economia, como em alguns serviços públicos. O principal caso é o de sistema de saúde nos Estados Unidos. Esse sistema é considerado melhor do mundo devido a importantes investimentos na área de tecnologia, capacitação de funcionários e na

111

Disponível em: http://www.ft.com/cms/s/0/3e21fbb0-f713-11dd-8a1f-0000779fd2ac.html?nclick_check=1 112

Disponível em: http://www.astrid-online.it/Dossier--d1/Studi--ric/Grant_in-defence-of-Anglo_Saxon-capitalism_29_09_08.pdf 113

Alexis de Tocqueville, Da Democracia na América: leis e costumes. Editora: Martins Fontes, 2005 (1835).

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infra-estrutura hospitalar. No entanto, é o único sistema de saúde dentre os países industrializados que não é universal, ou seja, para se poder usufruir desse serviço, é preciso pagar. Milhões de americanos não tem acesso a esse serviço114, pois não possuem dinheiro suficiente para tal. O governo dos Estados Unidos possui alguns, mas não suficientes, programas sociais que consistem na compra de seguros de saúde para amparar o maior número possível dessas pessoas que não têm condições de pagar por esse benefício.

Berço da crise atual, a economia dos Estados Unidos está sendo extremamente afetada pela recessão econômica e desemprego em massa. Em 2009, os americanos elegeram um novo presidente, Barack Obama, que oferecera uma enorme mudança no setor de políticas econômicas como forma de solucionar para o problema. Será esse um indício de que os Estados Unidos voltará com a política do New Deal da década de 30, onde o governo garantia o crescimento econômico? Ainda é cedo para se afirmar isso, já que os planos já elaborados pelo novo governo ainda não puderam surtir efeito.

Ásia O continente asiático vem se destacando atualmente por seu ritmo de

crescimento econômico e aumento da participação no plano internacional. Podemos citar como exemplos os populosos países da China e da Índia, cujas economias atingiram, nos últimos anos, dois dígitos de crescimento anual do PIB (em porcentagem); os Tigres Asiáticos, que são novos importantes atores internacionais que, utilizando-se de medidas neoliberais, modernizaram sua economia; e também a Rússia, que se recuperou do colapso da União Soviética se integrando com a Europa e, portanto, o resto do mundo.

As esferas política e econômica chinesa são possuem divergências antagônicas em suas ideologias. O governo chinês é de partido único e é, muitas vezes, considerado opressor e autoritário, possuindo o controle absoluto sobre a circulação de informações, principalmente aquelas que criticam o próprio governo. Por outro lado, a economia tem sofrido um grande processo de liberalização e de abertura de seu mercado a produtos e investimentos do mundo globalizado115, passando, assim, por uma transformação nas últimas décadas116. Um bom exemplo disso é a liberalização do comércio internacional, por meio da redução das taxas alfandegárias e o estabelecimento de parcerias. A China se tornou um grande importador global, com o objetivo de consumo, mas, também de abastecer a indústria chinesa, cuja produção aumenta fortemente a cada ano.

Questões que uma resolução deve responder:

Quais são as origens da crise financeira internacional?

114

Veja: http://www.alertnet.org/thenews/newsdesk/N07438178.htm 115

Veja: http://iaps.cass.cn/english/articles/showcontent.asp?id=377 116

Essa liberalização econômica é a causadora principal do crescimento econômico acelerado nessas últimas décadas. Veja: http://media.mcclatchydc.com/smedia/2008/10/20/15/270-20081020-China-growth.large.prod_affiliate.91.jpg

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Deve haver uma padronização entre as diferentes escolhas das políticas macroeconômicas?

Deve haver uma harmonização de políticas macroeconômicas para amenizar os efeitos da crise? Qual tipo de harmonização?

É necessária uma maior regulamentação do sistema financeiro internacional? Como evitar que a regulamentação - ou sua ausência - não cause baixo crescimento econômico?

Que caráter devem ter, doravante, os organismos financeiros internacionais? Como lidar com as condicionalidades impostas aos países devedores por esses empréstimos?

Quais medidas devem ser tomadas para reduzir a vulnerabilidade externa de países em desenvolvimento a choques externos?

Como garantir transparência e maior previsibilidade ao sistema financeiro internacional? Como evitar a corrupção?

Qual deve ser o papel das Nações Unidas no combate aos efeitos negativos da crise financeira internacional?

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Documentos legais:

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