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    1/12Cadernos Temticos de Qumica Nova na Escola N 7, DEZEMBRO 2007

    A noo clssica de valncia

    Recebido em 10/10/06; aceito em 18/10/07

    Anoo de valncia um temaao mesmo tempo controversoe central na histria da Qu-

    mica. Por meio das diferentes aproxi-maes desenvolvidas para precisaro seu papel no desenvolvimento doconhecimento qumico, a noo devalncia demonstrou ser pelo menosuma estratgia metodolgica bastan-te eficiente para aproximao doqumico com o misterioso mundo in-terior da transformao qumica. Essanoo se atreveu a tentar explicar osantigos domnios da afinidade qumi-ca, produzindo com isso uma manei-ra especial de representar a realidadeinvisvel dos tomos e das molculasmediante as chamadas frmulas es-truturais. Sua influncia encontra-se

    registrada na inaugurao tanto doprograma de pesquisa da qumica or-gnica, por meio dos trabalhos deLaurent, Gerhardt e Kekul, entre ou-tros, quanto na forte colaborao paraa formulao das hipteses explica-tivas da relao estrutura-propriedadedos complexos de Werner. Como seno bastasse, a valncia provocoutambm o mundo peridico, organi-zando a posio dos primeiros ele-

    Waldmir Nascimento de Araujo Neto

    O artigo apresenta alguns fatos histricos relativos ao perodo inicial de desenvolvimento da noo de valncia qumica, consideradacomo a Noo Clssica de Valncia. So focalizados os aspectos derivados do programa de pesquisa da qumica orgnica,situados a partir de meados do sculo XIX. Pretende-se caracterizar a influncia da noo de valncia como um construto crucialpara o desenvolvimento de uma Teoria Estrutural e a premncia de formas de representao que participam como ferramentaheurstica em detrimento de uma funo simblica para um objeto fsico. A centralidade da noo de valncia mantm-se por meiode seu valor histrico como uma referncia na elaborao de formas de representao e de novos conceitos que permanecem aindahoje na prtica dos qumicos.

    valncia, estruturas qumicas, histria da Qumica, filosofia da Qumica

    mentos tanto no sistema russo, pro-posto por Medeleev, como no ale-mo, proposto por Meyer. A partir detodas essas influncias, professoresde Qumica concordam que impos-svel dar os primeiros passos na dis-ciplina sem ser apresentado a ela.

    Contudo a situao da noo devalncia no presente bem diferentedo ponto de vista acadmico. Osavanos crescentes da chamadaqumica terica retiraram da valnciaseus atributos e designaram-na comouma funo meramente sinttica. As-sim, o que outrora fo-ra analisado comouma teoria fundado-ra, agora mormenteremetido por meio de

    locues adjetivastais como: eltronsde valncia, nvel devalncia e configu-

    rao de valncia.Em relao a uma evoluo tem-

    poral restrita, a histria da valncia po-de ser dividida, grosso modo, em trsperodos. O primeiro, de 1850 a 1870, caracterizado pela emergncia doconceito e seu desenvolvimento no

    interior do programa de pesquisa daqumica orgnica. O segundo, de1870 at 1920, assinala a influnciada periodicidade qumica sobre ela,determinando uma ampla divulgaoe utilizao do conceito tanto nocampo acadmico quanto no did-tico. E o terceiro, aps 1920, assinalaa coliso entre os antigos referenciaisda noo de valncia com os resul-tados da utilizao de mtodos fsicosmodernos no estudo da estrutura dassubstncias, incluindo-se o alcancedos preceitos da mecnica quntica

    sobre os objetos daQumica. O que con-sidero aqui anooclssica de valnciatratar, ainda que

    brevemente, de al-gumas situaesque se desenrolamno primeiro perodo

    e em parte do segundo. A estratgia/organizao de mi-

    nha narrativa mais bem identificadacomo ummapa histrico de idias e

    problemas que, em diversas pocas,constituram ou foram constitudospela noo de valncia, preservando

    A valncia provocou omundo peridico,

    organizando a posio dosprimeiros elementos tanto

    no sistema proposto porMedeleev como noproposto por Meyer

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    Cadernos Temticos de Qumica Nova na Escola N 7, DEZEMBRO 2007

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    A noo clssica de valncia

    sempre que possvel uma ordem cro-nolgica. Denota-se, assim, uma pre-tensa histria das idias que, emdiversas pocas, constituram os fun-damentos dessa importante noo.No considero possvel reunir nessetexto todos os personagens, centraisou adjuvantes, ainda assim me sintoconfortvel em no faz-lo, pois o que

    encerro nessas li-nhas , em boa me-dida, um recorte quecarrega a marca deminhas leituras epesquisas acerca dotema. Advirto o leitorinteressado nesseassunto para a ne-cessidade de ampliar sua leitura pormeio da bibliografia indicada e, princi-palmente, no se prender a umanica escola historiogrfica ou filos-fica ao saborear a histria de um con-ceito. Faz-se muito importante, nesseprocesso, a permanente recolocaodas impresses obtidas.

    Pretende-se oferecer aqui uma lei-tura em duas dimenses do que foiimpresso durante a constituio danoo clssica de valncia, digo comisso que no tratarei (ainda que nessemomento responsabilize o tamanhodo texto) das influncias e conflun-cias espaciais que marcaram, tam-

    bm nesse perodo, o incio de umaestereoqumica1. Finalmente, iteroque pretendo percorrer a histria danoo clssica de valncia para ilu-minar ao leitor as circunstncias quese colocaram naquilo que consideroo limiar da representao estrutural,e digo que desse perodo decorreuma potente carga epistemolgicaque permanecer como uma esp-cie de tabu para os praticantes dessadisciplina ao longo dos anos seguin-tes.

    Noo clssica de valncia:

    De quem essa idia?

    Costuma ser um empreendimentoproveitoso e acalorado o debate acer-ca da primazia de uma idia ou noocientfica. bem verdade que, paramuitos casos, a ponderao de quetenha havido uma aproximao simul-tnea de diferentes correntes, a partirde diferentes direes. Alm do mais,

    a primazia no o critrio exclusivopara a indicao de um mrito cien-tfico. No caso da noo clssica devalncia, a disputa desse mrito aca-bou sendo to acirrada entre os histo-riadores quanto entre os protagonis-tas. Questes polticas colocarammuitas vezes a disputa dessa historio-grafia entre um bloco oriental e um

    outro ocidental. Mes-mo assim, na criaoda noo clssica devalncia, no se po-de imputar a um ni-co personagem essaresponsabilidade.

    Um estudo da bi-bliografia que trata

    da histria da noo clssica devalncia revela, em alguns momen-tos, relatos implicados por questesde carter externo2, e que denotamcerta polarizao em torno da prima-zia dessa noo. Num extremo, esta-ria, por exemplo, o nobre ingls SirEdward Frankland (1825-1899), quefoi responsvel pela identificaoprioritria das regularidades existen-tes nas capacidades de combinaodos metais com radicais orgnicos.No entanto, Frankland no fez uso da-quilo que havia observado em seuprograma de pesquisa, que perma-necia ancorado nas propostas dualis-

    tas de Berzelius.No outro extremo, costuma-se po-sicionar o alemo Fiedrich AugustKekul (1829-1896)que, imbudo da von-tade de responder sdemandas de suarecm-inventada pa-lavra: valncia, intuiucomo salsichas car-bnicas a soluode problemas a res-peito da estrutura de

    compostos desafia-dores. Entre Fran-kland e Kekul, esto tambm outrosatores e fatores, no coadjuvantes,mas to importantes quanto os pri-meiros, algumas vezes minimizadosem seus papis e suas influncias.

    Uma questo importante a serconsiderada no nascedouro da no-o clssica de valncia a influnciaque esta recebe da noo de afinida-

    de qumica, utilizada como conceitoorganizador da rede de pesquisasdesenvolvidas na Qumica durante ossculos XVII e XVIII. Outra forteinfluncia que marcar as tendnciasde organizao de pensamento emtorno da noo de valncia so asteorias que, poder-se-ia dizer, fundamo programa de pesquisa da qumica

    orgnica durante o sculo XIX: aTeoria dos Radicais, a Teoria dos N-cleos e, principalmente, a Teoria dosTipos3.

    Valncia e capacidade de combinao

    At o incio do sculo XIX, a Qu-mica, que utilizava como material departida para sua prtica plantas eanimais, inclua uma aproximaomuito forte com a histria natural, bus-cava esclarecer a fisiologia das plan-tas e dos animais e mantinha suasfronteiras prximas as da farmcia ede outras artes. A partir de 1820,comeam a ocorrer mudanas funda-mentais na conduo das tcnicasdos praticantes dessa qumica dosseres vivos. Franceses e alemes fo-ram responsveis por um mergulhono interior do objeto qumico, tendoprioritariamente reaes de substitui-o como seus objetos principais deestudo. Organiza-se nesse momentouma mudana de rumo no conjunto

    de procedimentos tcnicos daquelesque preferem investir na preparaode substncias que no possuem

    anlogos na nature-za, tais como com-postos clorados, eque tambm noso atraentes ao mo-delo de comrciovigente. Mesmo as-sim, qumicos envol-vidos na nova cor-rente disciplinar, que

    formaria a qumicaorgnica, tais comoJustus Liebig (1803-1873), FriedrichWhler (1800-1882), Jean Dumas(1800-1884) e Auguste Laurent (1808-1853), mantiveram suas ligaes coma farmcia e com a indstria (Klein,2004).

    O perodo entre 1830 e 1860 temcomo caractersticas certas tensesmetodolgicas e epistemolgicas no

    O debate acerca da primazia

    de uma idia ou noocientfica costuma ser to

    proveitoso quantoacalorado. No caso da

    noo clssica de valncia, a

    disputa desse mrito acabousendo to acirrada entre os

    historiadores quanto entre os

    protagonistas

    Uma questo importante aser considerada no

    nascedouro da nooclssica de valncia a

    influncia que esta recebeda noo de afinidade

    qumica

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    Cadernos Temticos de Qumica Nova na Escola N 7, DEZEMBRO 2007A noo clssica de valncia

    interior dessa nova qumica orgnica,disciplina que aos poucos ia se con-solidando como um corpo de estudospromissor nos institutos de pesquisa,principalmente na Alemanha e naFrana desse perodo. Em boa medi-da, no interior da qumica orgnicaque a noo de valncia vai crescere se consolidar. Dentre outros fatores

    de tenso epistemolgica, pode-sedestacar o incio de uma reflexo so-bre quais seriam as verdadeiras impli-caes da busca de teorias que evi-denciassem a reali-dade interior domundo qumico.Uma preocupaopermanente, masno necessariamen-te evidente nos resul-tados das pesquisasda poca, pode serenunciada como: o que podemos di-zer (e escrever) acerca do mundo in-terior da matria? Alia-se a esse temorepistmico uma organizao cientfi-ca na qual pesquisadores mantm-se presos s concepes de seusmentores, o que caracteriza a forma-o de verdadeiras disputas entreescolas de pensamento duranteesse perodo.

    A teoria dos tipos4 de Charles Fr-dric Gerhardt (1816-1856) no foi

    bem recebida por Adolf Wilhelm Her-mann Kolbe (1818-1884) e EdwardFrankland, ambos ainda discpulos dodualismo de Berzelius. Os dois cien-tistas preferiam rejeitar o conceito uni-trio de compostos qumicos e consi-derar os radicais como grupos est-veis de elementos. Tanto Kolbe quan-to Frankland receberam influnciasacadmicas de Lyon Playfair (1818-1898) da Universidade de Edinburg,onde permanecia a convico sobrea Teoria da Cpula de Berzelius5.

    Frankland conduzia experimentos afim de confirmar a estabilidade do ra-dical etil durante algumas transforma-es qumicas. Quando o iodeto deetila era tratado com zinco, formava-se iodeto de zinco e butano (na pocachamado etil-livre), conforme a Figu-ra 1.

    Na reao acima, como subpro-duto, um pouco de etil zinco sempreera produzido, conforme a Figura 2.

    O produto inesperado etil zinco foio precursor da classe dos compostosorganometlicos e a primeira pistapara Frankland passar a confiar numaregularidade de capacidade de com-binao de alguns elementos. Esteexpandiu suas snteses para outrosmetais, confirmando que um metalapresentava sempre mesma capaci-dade de saturao em relao a umtipo de radical e, mesmo quando osradicais eram modificados, essaregularidade se mantinha. A conclu-

    so a que havia che-gado indicava que oscompostos organo-metlicos eram deri-vados por substitui-o de tipos inorg-nicos.

    A fora de combi-nao, que tambm

    ficou conhecida como capacidade desaturao, era uma nova expressoda antiga afinidade qumica dos ele-mentos. A favor de Frankland, esta-vam as leis das propores mltiplase das propores constantes, quecarregavam a implicao de que a ca-pacidade dos tomos de se combi-narem deveria ser exata e limitada. Osargumentos de Frankland se basea-vam em um conjunto restrito de re-gularidades e ele se recusava a cons-

    tituir uma teoria a respeito. Isso favo-receu a apresentao de diversoscontra-exemplos, que decorriam daconfuso que atormentava as frmu-las empricas, em funo da ausnciade uma demarcao clara entre ostomos e os equivalentes qumicos.Esses exemplos e o fato de que acapacidade de combinao de umelemento podia variar minaram aampla aceitao das idias de Fran-kland.

    Uma noo funcional de valncias poderia emergir aps a soluodos problemas na determinao defrmulas empricas de compostosorgnicos e inorgnicos, ou seja,aps os conceitos de tomo, mol-cula e equivalente terem sido diferen-ciados.

    As primeiras frmulas de KekulDe acordo com Alan Rocke

    (1993), o perodo em torno do ano de1850 assinala uma Revoluo Silen-ciosa na Qumica. Para alm de umadisputa entre radicais e tipos, na qualestava em jogo a unicidade do objetode estudo dos qumicos, a qumicaorgnica se via diante de desacordosquanto aos pesos atmicos dos ele-mentos e, sobretudo, uma confusosem precedentes no que se refere auma notao qumica.

    A metodologia de pesquisa em-prica praticada nesse perodo fo-calizada no isolamento e na caracte-rizao de compostos orgnicosproduzidos nas reaes qumicas.Uma qumica orgnica sinttica, nosentido de um desenho racional deatividades de produo de compos-tos, um evento raro at o final dosculo XIX. O esforo terico, ou demaior carter dedutivo presente notrabalho dos praticantes da Qumica

    nesse perodo, refere-se possibili-dade de diferenciar centenas de com-postos orgnicos com diferentespropriedades e, lembre-se, formadospor apenas alguns elementos.

    Ainda que Frankland no tenhasido capaz de formular uma hipteseacerca da causa da regularidade em-prica na combinao de radicaisorgnicos com metais, sua capaci-dade de combinao, que posterior-mente viria a ser conhecida comoatomicidade6, chamou a ateno

    para a possibilidade de uma ordema ser seguida nos processos de trans-formao dos materiais. SegundoRamberg (2003), o movimento emdireo a uma teoria unificadora, osnecessrios acordos em torno de pe-sos atmicos e a noo de valnciaestavam em cena conjuntamente nosanos 1850 quando Kekul iniciou aidealizao daquilo que viria a se tor-nar uma teoria estrutural para a qumi-

    2C2H5I + Zn C4H10 + ZnI2Iodeto de etila Butano

    Figura 1: Equao representando a obten-o do butano a partir do iodeto de etila ezinco.

    2C2H5I + 2Zn (C4H5)2Zn + ZnI2Iodeto de etila Etil zinco

    Figura 2: Equao representando a pro-duo de etil zinco.

    A fora de combinao,que tambm ficouconhecida como

    capacidade de saturao,era uma nova expresso da

    antiga afinidade qumicados elementos

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    A noo clssica de valncia

    ca orgnica.Friedrich Kekul iniciou sua vida

    acadmica como aluno de arquiteturana Universidade de Giessen, onde,sob a influncia de Liebig, foi conver-tido para o estudo da Qumica, gra-duando-se em 1851. Seguiu entopara Paris, onde desenvolveu seu tra-balho de doutoramento sob a orien-

    tao de Charles Gerhardt. Em 1853,por meio de uma recomendao doprprio Liebig, mudou-se para Lon-dres a fim de trabalhar como assis-tente de John Stenhouse no St. Bar-tholomews Hospital, o que lhe valeucontatos preciosos com WilliamOdling (1829-1921). na Inglaterraque Kekul vai amadurecer a arqui-tetura de suas estruturas qumicasrevolucionrias que, segundo suasprprias palavras, teriam sido revela-das a partir de sonhos.

    Em 1854, enquanto desenvolviaum mtodo de preparao para o ci-do tioactico, Kekul chegou a algu-mas concluses que validavam osistema de pesos atmicos deGerhardt e rejeitavam as conclusesde Frankland sobre a equivalncia decombinao entre o cloro e o oxig-nio.

    Ao representar a reao conformedescrito na Figura 3, Kekul atentoupara a diferena na capacidade de

    combinao entre cloro e enxofre. Oproduto clorado era resultado dadestruio do tipo original, enquantocom o enxofre isso no acontecia. Aafirmao para tal efeito era que aquantidade de enxofre que equiva-lente a dois tomos de cloro no divisvel (Ihde, 1984, p. 223). Com

    essa interpretao, Kekul passou afornecer um sentido terico para ostipos de Gerhardt, indicando que onmero de tomos de um elementoque combinam com um outro ele-mento dependem de suabasicidadeou relao de tamanho (Verwands-chaftsgrsse) de suas partes compo-nentes (Kuznetsov, 1980, p. 38, grifo

    meu). A esse respeito, os elementospodiam recair em trs grupos princi-pais: monobsicos, e.g. H e Cl; dib-sicos, e.g. O e S; e tribsicos, e.g. Ne P.

    Em 1857, como professor na Uni-versidade de Heidelberg, Kekul intro-duz o tipo gs do pntano (gsmetano), aplicando-o a um nmerolimitado de compostos e utilizando in-convenientes representaes comdois carbonos que, no entanto, eramextremamente populares entre os qu-micos alemes (Figura 4).

    No ano de 1858, Kekul se mudapara a Blgica e assume uma ctedrana Universidade de Ghent. L ele voltaa usar os pesos atmicos deGerhardt, o que reconduz seu tipogs do pntano forma CH4. Foi du-rante sua estada em Ghent que Ke-kul formulou a tetra-atomicidade docarbono alm de sua capacidade deestabelecer esqueletos pela utilizaode duas das quatro atomicidades

    entre tomos de carbono: o carbono tetratmico, [...] e entra em combi-nao com ele mesmo, possuindocapacidade de saturao mtua(Nye, 1996, p. 130). Em sistemas comdois carbonos, os esqueletos eramentendidos como arranjos na qual aatomicidade do sistema era 6 e no

    8, porque cada carbono era satisfeitoparcialmente por uma combinaoentre carbonos. Assim, em compos-tos como o etano (C

    2H

    6), cloreto de

    etila (C2H5Cl) e acetaldedo(CH3CHO), h seis elementos emcombinao com o esqueleto de doiscarbonos. Com essa inferncia, Keku-l propunha tambm que no meca-nismo das reaes desses compos-tos o esqueleto permanecia inaltera-do7.

    O escocs Archibald Scott Couper(1831-1892), que trabalhava comWurtz, publicou as mesmas idias deKekul semanas depois. Mesmosendo derrotado no que se refere primazia, as representaes utilizadaspor Couper em seu artigo eram muitomais eficientes do que aquelas utili-zadas por Kekul. Este utilizou umaforma de representao que ficou co-nhecida como a forma salsicha devido sua caracterstica arredondada nas

    extremidades, enquanto Couper ex-plicitou a combinao dos elementospor linhas retas. Couper no pdedesenvolver seus trabalhos devido a

    Figura 3: Reaes conduzidas por Kekul que implicaram na diferenciao entre acapacidade de combinao do cloro e do enxofre (Ihde, 1984, p. 222).

    Figura 4: Representaes de Kekul paracompostos tipo gs do pntano, utilizan-do frmulas empricas com dois carbonos.

    Figura 5: Representaes de: (A) Kekulpara o gs metano na forma salsisha(Nye, 1996, p. 130) e (B) Couper para ocido tartrico (Reproduo do autor apartir do artigo de Couper, 1858).

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    Cadernos Temticos de Qumica Nova na Escola N 7, DEZEMBRO 2007A noo clssica de valncia

    graves problemas de sade que lheobrigaram a afastar-se da pesquisa.

    Kekul entendia que a afinidadede um tomo pode ser usada com-pleta ou parcialmente. No caso doSO2, por exemplo, a substncia seriacomposta de trstomos, cada umdos quais dibsico.

    Das seis afinidadespossveis para o en-xofre, quatro sousadas para conec-tar os tomos de oxi-gnio, de modo queduas afinidades per-maneceriam semuso. Apesar de seusentido estar praticamente completono entorno de 1860, a palavra valn-cia s ser usada a partir do finaldessa dcada.

    Valncia e ligao qumica

    O termo ligao qumica foi utili-zado primeiramente por AlexanderMikhailovich Butlerov (1828-1886) emum artigo de 1863 sobre a isomerianos compostos orgnicos. Desde aprimeira vez que os termos valnciae ligao qumica comearam a seencontrar, observou-se uma amplaconfuso para o sentido de ambos.Essa dificuldade foi marcada pela

    ausncia de uma tentativa inicial dedemarcar os limites de abrangnciados dois termos. Mesmo assim, osprimeiros esforos envolvidos em taldistino colocavam a valncia comouma fora inata ao elemento utiliza-da para atacar outros elementos eexpressa numericamente pelo nme-ro de elementos monovalentes capa-zes de serem atacados por ele e aligao qumica como sendo o efeitoresultante da ao dessa fora.

    Para Butlerov, havia uma relao

    diferente entre a valncia e a ligaoqumica. O elemento possua umaquantidade de fora que produzia ofenmeno qumico. Parte dessa foraou sua quantidade total era convertidaem outra forma e transformada naligao ao se formar um composto.

    A fora era sempre expressa por meiode nmeros inteiros e o valor relativoao hidrognio constitua o valor mni-mo que podia ser assumido por qual-

    quer elemento. Nessa descrio deButlerov, est implcita a aceitao deuma valncia varivel, a partir da utili-zao completa ou incompleta da afi-nidade do elemento. Ao contrrio deButlerov, Kekul no aceitava a idia

    de que unidades deafinidade podiam serusadas parcial-

    mente, sustentandosempre o conceitode uma valncia fixapara cada elemento.Tanto para Butlerovquanto para Kekul,a valncia era umapropriedade inerenteao elemento e suas

    ligaes qumicas, uma manifestaodessa propriedade.

    Butlerov tambm utilizou as unida-des de valncia para explicar o meca-nismo de algumas reaes. Em suaspropostas mecansticas, existe comopressuposto a conservao das uni-dades de valncia, de um mesmo ele-mento, durante a combinao. Aexplicao para essa combinao conduzida a partir da noo de valn-cia: o elemento possui unidades devalncia que so usadas no momentoda combinao qumica. Ele desfazas valncias em uso com um elemen-to para poder utiliz-las com outro,

    conservando essas quantidades, ouseja, durante o processo no so cria-das nem destrudas unidades devalncia em um elemento.

    Valncia e frmulas racionais

    No incio dos anos 1860, a explo-so da quantidadede substncias org-nicas que se come-ava a conhecer sera comparvel aocrescimento da com-

    plexidade delas. Asnomenclaturas queeram propostas, namaioria das vezes,no conseguiam darconta das relaesde funcionalidadeespecficas que havia entre os dife-rentes grupos de compostos. Emcontrapartida, cresciam as correntesque apostavam na necessidade de

    uma representao simblica comosoluo para essa limitao. O suces-so de uma teoria estrutural dependiatanto da normalizao dos pesos at-micos quanto da noo de valncia.Essa proposta confiava na hiptesede que o arranjo e a posio dos ele-mentos eram to ou mais importantesdo que sua quantidade para a carac-

    terizao das propriedades de umasubstncia. Naturalmente, havia umadisputa entre aqueles que confiavamnas possibilidades de uma represen-tao estrutural conhecida pocacomo frmula racional e os queentendiam que esse seria um esforoimprodutivo.

    A primeira representao qumicaisenta de caracteres alfabticos foi ohexgono de Kekul associado aobenzeno em 1865. Essa trajetria nofoi direta nem livre de uma especula-o inicial marcada por arbitrarie-dades e influncias pouco cientficas,como denotam as propostas estru-turais feitas poca para explicar ascaractersticas pouco comuns dessasubstncia, que precisava justificarprincipalmente como seis tomos decarbono podiam estar associados asomente seis tomos de hidrognio frmula emprica C6H6 , numasubstncia altamente estvel e resis-tente a muitos ataques por combina-

    o qumica.As propostas estruturais feitas porKekul para o benzeno oferecerambastante dificuldade devido baixarelao carbono:hidrognio (1:1). Es-sa relao sugeria que o compostodeveria possuir um alto grau de insa-

    turao, mas o ben-zeno no sofria pro-cessos de adio,assim como outroscompostos insatu-rados. Sua sada pa-

    ra o dilema foi a pro-posio de uma es-trutura cclica, quelhe teria ocorrido emum sonho.

    Mesmo com asdificuldades do ben-

    zeno, Kekul insistiu e manteve atetravalncia do carbono como o n-cleo duro de sua proposta. Em suasprimeiras publicaes acerca dos

    O termo ligao qumica foiutilizado primeiramente por

    Butlerov, em um artigo de1863 sobre a isomeria noscompostos orgnicos. E

    desde a primeira vez queos termos valncia e

    ligao qumica comearama se encontrar, observou-se

    uma ampla confuso para osentido de ambos

    A primeira representao

    qumica isenta de

    caracteres alfabticos foi ohexgono de Kekul

    associado ao benzeno em

    1865. Essa trajetria no foidireta nem livre de uma

    especulao inicial marcada

    por arbitrariedades einfluncias pouco cientficas

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    A noo clssica de valncia

    compostos aromticos, Kekul prefe-ria as formas salsisha (Figura 6A),sendo essa a forma utilizada no pri-meiro volume do seu livro: Lerbuchder organischen chemie (1865). Noano seguinte, Kekul adota o hex-gono (Figura 6C). O problema datetravalncia do carbono foi resolvidocom a suposio da existncia de

    valncias duplas alternadas entre oscarbonos da estrutura do benzeno(Figura 6B). Entretanto, muitos qumi-cos no estavam dispostos a aceitara forma do benzeno como um ciclo-hexatrieno, uma vez que no haviareao de adio para ele nos mes-mos moldes de outros compostosinsaturados. A presena das valn-cias duplas continuou em aberto.

    Uma teoria estrutural deveria inclu-ir a utilizao de esquemas grficoscomo suporte para sua comunicao.Tal conjectura nos remete questo:o que isso que estavam escrevendona folha de papel? Kolbe chama is-so de qumica de lpis e papel, deuma forma bem desacreditada paracom as possibilidades de correspon-dncia com aquilo que se produz noslaboratrios (Nye, 1996). Para Alexan-der Butlerov, o arranjo aparente damatria (qumico) poderia ser revela-

    do pelas reaes qumicas, sem sefazer nenhum julgamento de suaidentidade com o arranjo verdadeiro(fsico). As proposies de Butlerovsugerem que seria possvel investigara estrutura qumica dos corpos semse preocupar com questes at entosem resposta. Butlerov definiu o ter-mo estrutura qumica de diferentes

    maneiras desde 1861 at 1864:(1) coeso mtua ou maneira de

    ligao mtua entre os tomos emum composto;

    (2) a forma como os elementosqumicos esto conectados;

    (3) distribuio da ao de afini-dade;

    (4) ordem da ao qumica mtuados vrios tomos elementares, resul-tando na existncia de partculas defi-nidas;

    (5) seqncia de ao mtua aforma da ligao qumica mtua dostomos em uma molcula.

    Em 1861, mesmo ano em que Bu-tlerov iniciou a descrio das possi-bilidades de uma ligao qumica, oqumico escocs Alexander CrumBrown (1838-1922) comeou a usarfrmulas com linhas conectandosmbolos dos elementos, assim comoCouper havia feito anteriormente.

    Brown foi paulatinamente sofisticandotanto a forma de descrio por meiodos desenhos, quanto corrigindoseus pesos atmicos, at uma confi-gurao bastante precisa e simplifi-cada para diferentes compostos. Nanotao de Brown, os smbolos doselementos esto inscritos em crculosde onde partem tantas linhas quantas

    forem os equivalentes desse ele-mento. Quando os equivalentes dosdois elementos que pretendem a liga-o so mutuamente satisfeitos, aslinhas so unidas. Conforme descritaspelo prprio, as frmulas dele procu-ravam descrever a localizao qumi-ca dos tomos em lugar dalocaliza-o fsica.

    Outra tentativa de oferecer umaforma de representao para o corpoqumico foi feita por Josef Loschmidt(1821-1895), que divulgou em um livro(Chemische Studien 1861) represen-taes designadas como frmulas deconstituio da qumica orgnica emrepresentao grfica. Inspiradoprimariamente nas representaes deDalton, Loschmidt apresentava ostomos de carbono como crculos; ostomos de hidrognio como crculosmenores; os tomos de oxignio comodois crculos inscritos; e o nitrogniocomo trs crculos inscritos. As repre-sentaes de Loschmidt receberam

    pouca ateno, inicialmente devido circulao restrita da obra que fora edi-tada pelo prprio autor e, posterior-mente, porque no conseguia darconta regularmente da representaode todas as valncias do carbono, prin-cipalmente para a molcula de benze-no (Figura 8).

    A intensa atividade dedicada pelospraticantes da Qumica constituio

    Figura 6: Representaes de Kekul (1866) para aquilo que ele referia como o Kern(ncleo) da frmula racional de tipo C6A6, na qual A pode ser um elemento que possuauma unidade de afinidade a ser satisfeita. Todas as formas acima so encontradas nomesmo livro: (A) frma salsicha (p. 496); (B) uma aproximao para a forma de linhasconsiderando o tomo de carbono (kohlenstoffatom) explicitado e com valncias nopreenchidas (p. 496); e (C) representaes esquemticas cclicas (p. 514)8.

    Figura 7: Frmula constitucional do cidosuccnico por Crum Brown (1865, p. 233).

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    Cadernos Temticos de Qumica Nova na Escola N 7, DEZEMBRO 2007A noo clssica de valncia

    de um sistema de representao ca-paz de assinalar estruturas sem com-promissos ontolgicos, sob orien-tao da noo de valncia, permitiualcanar a meta de diferenciao deismeros ainda no ltimo quarto dosculo XIX. A possibilidade de im-primir um smbolo que tivesse umaespcie de correspondncia biunvo-ca com aquilo que se produzia pormeio das reaes qumicas garantiupoder preditivo e maior confiana nosprogramas de pes-quisa. Observe-seque a condio din-mica do objeto daQumica ainda uma hiptese frgil eno possui valor res-

    tritivo para aquelesque propem tais formas de repre-sentao. O que se pretende pro-gredir com as pesquisas na rea demodo a alcanar certa eficincia fabrilna produo de novas substncias.Mesmo assim, percebe-se que osdesenhos que foram tentados comodescritores do corpo qumico somuito mais do que uma forma eficien-te de comunicao entre pares. Elespermitem propor novas situaes eajudam a pensar novos objetos de

    pesquisa.Contudo, o estudo intenso de for-mas de representao pode exigirmuito debate e revises que vo almde colocar novas convenes emsituaes de uso que possam aco-modar novos dados empricos. Umsistema de signos pode estar incom-pleto mesmo tendo toda sua baselegal acordada e um amplo conjuntode situaes de uso apropriadas.

    Podemos indicar que a evidncia em-prica cumpre, para um sistema se-mitico, o mesmo papel que cumprepara um sistema terico: oferecepossibilidades de falsificao e impea necessidade de sua ampliao.Essa dilatao, todavia, no costumaser imediata. Mesmo com todas asevidncias empricas postas na mesae uma formulao terica em crise, aaceitao de novos modos de pensare olhar depende de muitos fatores.

    Mesmo quando La-denburg coloca Ke-kul contra a paredecom evidncias em-pricas acerca da ine-xistncia de isme-ros 1,2 dissubstitu-

    dos em sua estruturahexagonal a resposta de Kekulvem em 1872 , o debate e a disputapermanecem acesos por mais de 30anos (Russel, 2004).

    Albert Ladenburg9 (1842-1911)props que uma estrutura hexagonalpara o benzeno indicaria a existnciade dois ismeros de substituio paraa posio 1,2 do anel aromtico, de-pendendo de onde estivessem essessubstituintes em relao posiodas trs duplas alternadas (Figu-

    ra 9)10.Uma vez que tais ismeros noeram conhecidos para nenhum com-posto aromtico dissubstitudo nasposies 1,2, Ladenburg argumentouque cada tomo de carbono deveriaestar ligado a trs outros e sugeriutrs formas alternativas para as dis-tribuies de valncia (Figura 10). Aprimeira proposta de Ladenburg(10A) foi idntica a uma outra feita por

    Adolf Claus (1840-1900). O prisma(10B) e a estrela (10C) so originais,sendo que o autor preferia o prisma,pois conseguia explicar em boamedida os ismeros di e trissubstitu-dos, mas era ineficiente para o enten-dimento das valncias para outrassituaes.

    Um dos mritos do trabalho de La-denburg est associado ao relevantecontra-exemplo que fora revelado emrelao inexistncia de ismeros 1,2dissubstitudos no anel aromtico.Esse mrito fez reavivar o Kekul ar-quiteto que, a partir de todas as pro-postas de saturao de valncia fei-tas at ento, delineou, em 1872, umacomplementao sua proposiooriginal, indicando um mecanismooscilatrio entre as duplas valnciasdo anel que fazia com que todas asposies dos seis tomos de carbonofossem equivalentes, o que particu-larmente resolvia o problema da ine-

    xistncia dos ismeros. Segundo asproposies de Kekul, os tomos namolcula oscilavam em torno de umasituao de equilbrio, colidindo cons-tantemente com os tomos vizinhos.O nmero dessas colises por uni-dade de tempo era capaz de geraruma fora que tanto mantinha a mol-cula coesa, quanto era transformadanuma valncia uniforme para cadatomo de carbono na estrutura.

    As questes postas por Kekulindicavam que as duas estruturas da

    Figura 8: Representaes de Loschmidt para diferentes compostos orgnicos: (A) (B) e(C) tentativas de representar o ncleo aromtico, (D) Benzeno, (E) fenol, (F) metoxibenzeno, (G) anilina, (H) diaminobenzeno, (I) uma imida (Ihde, 1984, p. 308).

    Figura 9: Frmula estrutural plana dos pre-tensos ismeros aromticos obtidos porsubstituio do benzeno nas posies1,2, que foi refutada por Ladenburg.

    Um sistema de signos podeestar incompleto mesmo

    tendo toda sua base legalacordada e um amplo

    conjunto de situaes deuso apropriado

    Figura 10: Possibilidades de distribuiodas valncias dos carbonos na molculado benzeno, segundo Ladenburg (Ihde,1984, p. 314).

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    Cadernos Temticos de Qumica Nova na Escola N 7, DEZEMBRO 2007

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    A noo clssica de valncia

    Figura 11 eram a situao inicial e afinal em cada intervalo de tempo pro-posto para a ento chamadasituaode equilbrio. A comunidade cientficaem geral no conseguiu entender osignificado estrutural das representa-es de Kekul, at mesmo porqueela tinha problemas de consistnciaquando procurava se referir din-

    mica das colises e do equilbrio con-seqente delas. Apesar de uma afir-maoad hoc, o saldo final bastan-te positivo: as valncias dos seistomos de carbono no anel benzni-co deveriam ser equivalentes. Esse um exemplo de proposio ad hocque possui carter crucial no interiorde um programa de pesquisa por suamanuteno. Em 1874, um dos alu-nos de Kekul, Wilhelm Krner (1839-1925), demonstrou a equivalncia dosseis tomos de carbono do benzeno(Nye, 1996).

    A pesquisa sobre a natureza dasligaes no benzeno chegou ao final

    da dcada de 1880 com a intenode convergncia. A maior vontadedos praticantes da recm-nata teoriaestrutural era a de buscar reconcilia-o entre as hipteses existentes, afim de obter uma conjectura o maisabrangente possvel.

    Alguns axiomas po-dem ser enunciados

    como a base dessabusca final: (i) a es-trutura cclica comcada carbono utili-zando duas valn-cias com outros doiscarbonos contguos,perfazendo um total de seis carbo-nos; (ii) a terceira valncia de cadacarbono utilizada com um elementoexterno a esse anel; (iii) todas asvalncias dos carbonos nessa estru-tura so equivalentes. A questoainda em aberto : como est situadaa quarta valncia de cada carbonodesse ciclo?

    Nesse circuito de pesquisas, duasrespostas competem: de um lado, asduplas alternadas de Kekul e, do ou-tro, as representaes comafinidades

    livres de Meyer e seguidores. JuliusLothar Meyer (1830-1895) discutiu no

    ano de 1872 o pro-blema da localizaoda quarta valncia do

    tomo de carbono naestrutura do benze-no. Ele introduziu aidia de que cadacarbono possuauma afinidade livre(Figura 12).

    As representaes de Meyer fica-ram conhecidas como frmulas cn-tricas e, apesar de adormecidas apssua divulgao, foram retomadas porJohann Friedrich Adolf von Baeyer(1835-1917) e tambm por AdolfClaus12. instigante conferir o textooriginal de Meyer e perceber como anarrativa desse captulo (intitulado alei de encadeamento dos tomos)trata de contrapor racionalmente asafinidades livres em relao propos-ta de Kekul, destacando-se umaabordagem estatstica das ligaespossveis entre os carbonos no anelde seis membros e a caractersticarestrio emprica dos ismeros.

    Ainda que bastante contemplada,

    tanto racional quanto empiricamente,a disputa acerca da quarta valnciado carbono na estrutura do benzenono ficar completamente decididaat que a fsico-qumica ilumine ocaminho da qumica orgnica j nosculo XX. Contudo, uma proposiomecanstica sobre a adio em com-postos aromticos e a dilatao danoo de valncia colocaria o time deKekul em boa vantagem.

    O fato de os compostos aromticos

    Figura 11: Reproduo de uma pgina do peridico alemo Annalen der Chemie undPharmacie (n. 162, v. 88, 1872), no qual Kekul publica as formas equivalentes do ben-zeno e inicia uma apresentao acerca do que viria a se tornar a ressonncia dobenzeno: ocorre na primeira unidade de tempo expressos por 1. 2,6,h,2 onde hrepresenta hidrognio. Na segunda unidade de tempo, o mesmo tomo de carbonoque vem da posio 2, se vira para a posio do carbono 6. Seus elementos durante asegunda unidade de tempo so 2. 6, 2, h, 6. Enquanto os elementos da primeira unidadede tempo so representados pela forma escrita acima, encontram o da segunda suarepresentao de acordo com a seguinte forma (Ihde, 1984, p. 315).

    Figura 12: Esquema representativo, con-forme apresentado por Meyer em seu livro(foi usada a traduo francesa, 1887,p. 29411), comparando a proposta deKekul (esquerda) com a sua forma dasafinidades livres para o benzeno (direita).

    A disputa acerca da quarta

    valncia do carbono na

    estrutura do benzeno no ficar completamente

    decidida at que a fsico-

    qumica ilumine o caminhoda qumica orgnica j no

    sculo XX

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    Cadernos Temticos de Qumica Nova na Escola N 7, DEZEMBRO 2007A noo clssica de valncia

    no sofrerem adio foi investigadopor Friedrich Karl Johannes Thiele(1865-1918) com uma estratgiabastante peculiar. convenientedestacar que, no terceiro quarto dosculo XIX, as reaes de adio noeram to trabalhadas quanto s desubstituio. Apesar de serem citadosambos os processos como de satu-

    rao, o termo no se referia neces-sariamente ao preenchimento de in-saturaes como fazemos uso nosdias de hoje. Thiele conduziu umasrie de experimentos de adio emcompostos de cadeia aberta com ascaractersticas de duplas alternadasdos anis aromticos. Ele verificouque, em compostos como o butadie-no, a adio feita nas posies 1,4,com a transposio da dupla ligaopara os carbonos 2,3 (Figura 13).

    Para explicar esse efeito, Thielesugeriu em 1899 que algumas liga-es duplas possuem valncias nosatisfeitas ou uma ligao qumicapotencial. Quando ligaes duplasesto em tomos de carbono adja-centes, as valncias centrais parciaisse tornam ineficazes, e as posiesmais externas (1,4) so as mais reati-vas.

    Todas as valncias parciais soadjacentes no anel do benzeno e porisso so ineficazes. A molcula s

    participa de processos de adio sobcondies extremas. As questespostas por Thiele corroboraram paraa instalao de um programa de pes-quisa em qumica orgnica, duranteo incio do sculo XX, que conside-rasse as particularidades reativas decada carbono13. Em suma, havia anecessidade de se iniciar uma novainterpretao funcional do objeto daQumica.

    As relaes entre afinidade, valn-cia, ligao qumica e energia s fica-

    ram um pouco mais claras quando amecnica quntica estabeleceu qual

    seria a melhor forma para se entendera essncia do quimismo, instituindorelaes quantitativas entre energiade formao de uma substncia esuas caractersticas estruturais. Parachegar a esse estgio, a Qumicaprecisou passar pelo caminho sinuo-so das teorias fenomenolgicasconsideradas anteriormente.

    Valncia: uma idia no concluda

    Ao final dessa histria, falta pergun-tar: o que valncia? Reunindoafinidade qumica e valncia no mes-mo escopo, uma resposta possvel que a valncia se constitui na perma-nente, tumultuada, desordenada, con-troversa e no completada tentativa deentender como a natureza organiza etransforma seus constituintes. Mesmoentre acadmicos ou especialistas, autilizao do termo valncia se refereao ntimo da atividade qumica. No ima-ginrio daqueles que atravessaramuma graduao em Qumica ou reasafins, falar de valncia particularmente falardo poder que mui-tas vezes assumediferentes sentidos que faz com que umtomo tenha determi-nada atitude qumi-ca frente a outro.

    A busca pelas ori-gens da valncia naafinidade qumica re-vela que esse empreendimento sem-pre foi o pano de fundo das atividadesda Qumica, mesmo antes de ela seconstituir como um domnio cientficoou disciplinar de estudo. A afinidadeemerge dos frascos e cadinhos alqu-micos para procurar seu lugar nasprateleiras dos laboratrios das uni-versidades.

    As diferentes abordagens concei-

    tuais que foram utilizadas para dar con-ta do modus existendi desse corpo

    qumico por exemplo: radicais,ncleos e tipos precipitavam aexistncia de certa ordem. A formacomo esse corpo qumico se organizadepende, obviamente, da afinidadeque seus componentes possuem. Taiscomponentes, por sua vez, se valemde tipos de afinidade diferentes parase combinarem e para se manterem

    combinados. A valncia resultadodisso: no somente da percepo deuma regularidade na combinao doselementos, mas principalmente nadeterminao de transpor essa regula-ridade para outros elementos, tornan-do-a uma propriedade geral dos cor-pos elementares e um conceito-chavepara a criao da teoria estrutural.

    Valncia e afinidade no so amesma coisa. A valncia um produ-to da afinidade de um elemento. Asdescries da valncia como, porexemplo,poder, capacidade e fora refletem caractersticas ontolgicasque foram herdadas da afinidade qu-

    mica. No entanto, ocarter abrangentetomado pela noode valncia imprimiao trao de uma per-sonalidade mltipla,ao que sua prpriautilizao e prticaorientaram-na para

    uma nova marca on-tolgica, caracteri-zada pela distino

    como grau. Essa graduao exigiuque nmeros fossem utilizados comodescritores de uma quantidade devalncia. Essa atribuio foi herdadada teoria dos tipos, outro argumentofundador da noo clssica de valn-cia.

    Apesar de perceber-se certa or-dem intrnseca do arranjo do corpoqumico a partir dos tipos, essa carac-

    terstica no foi examinada naquelemomento, mas explorada a partir davalncia. Graduar a valncia permitiano apenas classificar os elementosem termos de suas potencialidadesde combinao, mas tambm distin-guir caractersticas dos componentesdo corpo qumico. A unidade de va-lncia no pode ser medida de formaindependente, mas somente emrelao a uma outra unidade, pois ela

    Figura 13: Equao da reao de adio 1,4 do bromo ao butadieno, indicando atransposio da dupla ligao para a posio 2,3.

    As relaes entre afinidade,

    valncia, ligao qumica eenergia s ficaram um

    pouco mais claras quandoa mecnica quntica

    estabeleceu relaes

    quantitativas entre energiade formao de uma

    substncia e suascaractersticas estruturais

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    A noo clssica de valncia

    uma grandeza relacional. A expec-tativa inicial era a de que a valnciafosse uma propriedade invariante eregular como cada tipo, a fim de setornar mais uma marca especial enica de cada constituinte da nature-za, mas no foi bem assim, pois ummesmo elemento apresentava dife-rentes graus de valncia.

    Verifica-se com essa histria paraa noo de valncia que novas teoriaspodem surgir no interior de situaesde trabalho emprico e de disputasconceituais no muito claras paraaqueles que esto jogando na cidadecientfica. As controvrsias advindasda representao estrutural demons-tram como proposies ad hoc sousadas para tentar salvar modelosexplicativos que so contrariados pornovas evidncias empricas, e decomo esse tipo dedisputa, ou at a per-sistncia em propo-sies no contem-pladas empirica-mente, podem serparticularmente fe-cundas para o pro-gresso de umdeterminado dom-nio do conhecimen-to. Podemos citar, por exemplo, a res-posta de Kekul ao problema da

    insaturao. Mesmo que este tenhaflutuado entre admitir valncias fixase ter de aceitar valncias variveis, aoestar completamente convencido einteressado na defesa de um tomotetravalente, sua assuno de queesse mesmo carbono pode conterafinidades no satisfeitas se transfor-ma em uma proposio ad hoc. Aidia de afinidades no satisfeitasviola o sistema de te-travalncia do carbo-no em termos de sua

    coerncia interna.Todavia, o mecanis-mo oscilatrio dasduplas propostaspor Kekul no textode 1872, mesmo po-dendo ser considerado como umaespcie de paradigma para os casosde proposiesad hoc, exatamenteo que se v escrito nos livros de divul-gao desse corpo de conhecimento

    at os dias de hoje.A instabilidade da idia de valncia

    fixa e a sua disputa com a valnciavarivel proporcionou a criao deligao qumica, propriedade verstil,varivel, conseqn-cia da ao qumicae entendida comouma causa da valn-

    cia. A ligao qu-mica podia serformada durante acombinao, poisela pertencia ao cor-po qumico, mas era externa ao ele-mento que participava dele. A par-ceria entre ligao qumica e valnciafoi irreversvel, marca do final do s-culo XIX e da criao da teoria estru-tural. Passa-se a ter possibilidade derepresentar, simbolizar a valncia, no

    entanto, isso tudo s conseguido pormeio do uso de fr-mulas empricas cor-retas, isto , preci-samos saber quan-tas e quais so asespcies que parti-cipam dessa repre-sentao.

    Na conclusodesse discurso histrico, a noo devalncia emerge como uma idia

    controversa e disputada, responsvelpela organizao de conceitos funda-mentais a partir do sculo XIX. Nummundo ainda sem eltrons, ela refor-ou a busca por frmulas empricascorretas e, quando estas ficaramprontas, permitiu o salto para umolhar no interior do que elas represen-tavam. O horizonte de pesquisa da-queles que fizeram uso dela foi

    ampliado, no por-que a valncia tives-se trazido uma res-

    posta direta parasuas perguntas, masporque havia criadodvidas necessrias.

    A tenso entre ar-ranjos qumicos e f-

    sicos nos remete ao tabu a que mereferi no comeo deste trabalho. Maisdo que uma tentativa de encerrar umaepistemologia particular para o co-nhecimento criado pelos qumicos

    como, por exemplo, nos assinalaRocke (2003), a distino entrearranjos qumicos e fsicos pareceremeter a uma espcie de totemis-

    mo14 em relao Fsica. Nessa dis-tino, os praticantesda Qumica parecemter a necessidade deentregar Fsica a

    possibilidade de re-velar a ordem dascoisas no mundo in-terior da matria.Com a opo por ca-

    racterizar as frmulas racionais comoarranjos fsicos, os qumicos fogemdo compromisso com a realidadedaquele objeto ou mesmo de algoque ele possa representar. Podemosinferir que h, pelo menos, uma pos-tura instrumentalista na forma de pra-ticar esse conhecimento que estsendo criado. Ou seja, frmulas racio-nais de matriz atomista servem comodispositivos para resumir, sistematizare at prever fatos e dados empricos.

    bem verdade que os fsicosconduziro a nova ordem do conhe-cimento sobre a matria no incio dosculo XX. Tambm verdade que asfrmulas racionais no so fotos des-ses objetos desejados pelos qumi-cos do sculo XIX nem so uma pintu-ra de como eles so. Ento, se tam-

    bm verdade que a foto do cachorrono late, podemos concordar com asprovocaes de J. Schummer (1998)quanto a estarmos vivendo um pro-cesso especial de esquizofrenia, mar-cado pela certeza de que o desenhoque colocamos no papel no umretrato da coisa como ela , mas nosajuda a sermos estranhamente pre-cisos ao prever como essa coisa vaiagir se a colocarmos em determina-das situaes. Quero somente realara importncia de reconhecer que es-

    sa forma de representar deve conteralgo de particular, algo merecedor dedestaque.

    As formas de representao e declassificao que foram herdadas dautilizao da noo clssica devalncia permanecem vivas na ativi-dade do qumico e no Ensino de Qu-mica. Quando o mundo dos eltronscobriu o corpo qumico com equa-es e indeterminaes, a valncia

    Em um mundo ainda semeltrons, a noo de

    valncia reforou a busca

    por frmulas empricascorretas e, quando estas

    ficaram prontas, permitiu osalto para um olhar no

    interior do que elasrepresentavam

    Novas teorias podem surgir

    no interior de situaes de

    trabalho emprico e dedisputas conceituais nomuito claras para aqueles

    que esto jogando na

    cidade cientfica

    A noo de valnciaemergiu como uma idia

    controversa e disputada,responsvel pela

    organizao de conceitosfundamentais a partir do

    sculo XIX

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    quase ficou reduzida ao lugar ondeesses eltrons, os novos protagonis-tas da ao qumica, realizam as mo-dificaes da matria. Mesmo assim,a valente valncia no perde a pose,seja na Teoria Eletrnica da Valncia,na Teoria da Ligao de Valncia, naeletrovalncia ou na covalncia. Adespeito de seu carter controverso

    e profundamente atraente, ela perma-nece no mago da Qumica.

    Notas1Para uma leitura acerca das ques-

    tes histricas e epistemolgicas darepresentao espacial em Qumica,veja Ramberg (2003). Recomendotambm Cooke (2004) para umaviso geral sobre formas de represen-tao na Qumica.

    2Gostaria de chamar a ateno domeu leitor para certa tenso em boamedida presente na discusso sobreo tema e a proposta por autores quediscutem a questo da primazia acer-ca da noo clssica de valncia.Recomendo aos interessados a lei-tura de Kuznetsov (1980) e de Russel(1971).

    3Para entender um pouco mais so-bre o papel crucial dessas teorias co-mo precursoras danoo de valncia, apartir de diferentes

    perspectivas histor-iogrficas, vejaKuznetsov (1980) eRussel (1971).

    4Em 1844,Gerhardt se colocacontra o estabeleci-mento de desenhosque remetam or-ganizao estrutural da matria, de-fendendo o uso exclusivo de frmulasempricas. Qualquer arranjo estruturalassinalado para tomos numa frmu-

    la era considerado uma conveninciaparticular, no possuindo nenhumsentido real. Na teoria dos tipos,prope-se que tanto o arranjo quantoo mecanismo de ao de diversassubstncias pode ser reduzido aalguns padres (ou tipos) j exis-tentes em outras substncias (prot-tipos). Veja Crosland (2004).

    5A teoria da cpula foi uma dasltimas formulaesad hoc que Ber-

    zelius apresentou (em 1841) para re-sistir teoria dos tipos e noo desubstituio como proposta mecans-tica para reaes orgnicas, e defen-der sua noo de dualismo e dosradicais para o corpo qumico. Nela,por exemplo, Berzelius contorna apossibilidade de tomos de clorosubstiturem tomos

    de hidrognio (e.g.cido tricloroactico)ao sugerir que osradicais no compos-to substitudo (cidotricloro actico) dife-rem em termos desua composio do composto origi-nal (cido actico). Veja Ihde (1984).

    6Em 1865, August Wilhelm vonHoffman (1818-1892) sugere a intro-duo do termo quantivalncia paradescrever as possibilidades decombinao de um elemento (Russel,1971). Sugere ainda que as capaci-dades de saturao como queriaFrankland sejam descritas por termoscomo monovalente, divalente e assimpor diante.

    7A cadeia carbnica era descritacomo coluna vertebral. Utilizo a pala-vra esqueleto em referncia ao termo

    usado por Kekul em1858 (Nye, 1996).

    8Percebe-se na lei-

    tura do Lehrbuchque Kekul no rela-ciona a palavra Vors-tellung com nenhumadas representaespara o benzeno. Elefaz uso da expresso

    graphische Dars-tellung para indicar

    algumas frmulas tipo e outras soreferidas diretamente como typischenFormeln, contudo estas esto vincula-das forma (bildung) e so teis

    Kekul na apresentao de ismeros.

    Frmulas tipo para a dietil-oxima(Kekul, 1866, p. 51). Reproduo

    feita pelo autor.A palavra Darstellung utilizada

    prioritariamente no sentido de descri-o quando Kekul deseja narrar umprocedimento de sntese. Nessemesmo livro, Kekul mistura as repre-sentaes salsicha e com linhaspara muitos derivados do benzeno,

    e.g. bifenila e azo-

    benzol.9Que fora aluno

    de Kekul em Ghent.10Sabemos hoje

    que as duas repre-sentaes referem-se mesma subs-

    tncia, contudo sem que se tenhaclareza sobre a equivalncia dos seistomos de carbono do benzeno,pode-se defender que tais represen-taes referem-se a duas unidadesmoleculares distintas.

    11Primeira edio em alemo noano de 1864.

    12Confira uma republicao dotexto original de Claus (2004).

    13Para esse novo olhar sobre oobjeto da Qumica, tambm contri-buram os trabalhos de VladimirVasilevich Markovnikov (1838-1904).

    14O totemismo pode ser definidocomo uma identificao metafsicaentre seres humanos e partes danatureza. Tpicos processos totmi-

    cos so aqueles nos quais sereshumanos se comparam ou se fun-dem em personalidade com ani-mais: guia, corvo, urso etc. Aoassumir-se como parte da natureza,o indivduo totemista cr que ter aproteo e o abrigo da natureza (ede seu totem), pois parte dela. Seo indivduo faz parte da natureza, anatureza no se voltar contra ele.

    Associado ao totem, existe nor-malmente um tabu que significa noagredir ou ingerir o todo ou partes

    do vegetal ou animal totemisado.Esse procedimento garante que aproteo ser continuada e haversempre harmonia entre o totem esua comunidade.

    Waldmir Nascimento de Araujo Neto, engenheiroqumico e licenciado em Qumica pela Universidadedo Estado do Rio de Janeiro, mestre em Educaopela Universidade Federal Fluminense e doutorandoem Educao pela Universidade de So Paulo, professor do CEFET-Qumica no Rio de Janeiro.

    A noo clssica de valncia

    O totemismo pode serdefinido como uma

    identificao metafsicaentre seres humanos e

    partes da natureza.

    Processos totmicos soaqueles nos quais seres

    humanos se comparam ouse fundem em

    personalidade com animais

    Qualquer arranjo estruturalassinalado para tomos numa

    frmula era considerado umaconvenincia particular, nopossuindo nenhum sentido

    real

  • 8/14/2019 Qumica - Cadernos Temticos - Medeleev

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    A noo clssica de valncia

    Abstract: The Classic Notion of Valence and the Dawn of Structural Representation The article presents some relative historical aspects from the initial period of development of the notion ofchemical valency, considered as the Classic Notion of Valency. The aspects of the research program of the organic chemistry are focused, initially located from the middle of the 19 th century. Theinfluence of the notion of valency as a crucial idea for the development of a Structural Theory is informed as representation ways that will play the role of a heuristic tool better than a symbolicfunction for a physical object. The historical value of the notion of valence can reveal in a proper way how this concept influenced the practice of the Chemists nowadays.Keywords: valence, chemical structures, History of Chemistry, Philosophy of Chemistry

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