Quem é a professora de crianças menores de 6 anos para Maria ...

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1 Universidade Federal de São Carlos Centro de Educação e Ciências Humanas Curso de Pedagogia Quem é a professora de crianças menores de 6 anos para Maria Montessori? Uma análise a partir de suas obras educacionais Priscila Menarin Cesário São Carlos junho de 2007

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Universidade Federal de São Carlos

Centro de Educação e Ciências Humanas

Curso de Pedagogia

Quem é a professora de crianças menores de 6 anos para Maria

Montessori? Uma análise a partir de suas obras educacionais

Priscila Menarin Cesário

São Carlos

junho de 2007

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Priscila Menarin Cesário

Quem é a professora de crianças menores de 6 anos para Maria

Montessori? Uma análise a partir de suas obras educacionais

Monografia apresentada ao curso de

Pedagogia da Universidade Federal de

São Carlos como requisito parcial a

obtenção do título de Licenciatura em

Pedagogia, sob a orientação da Profª Drª

Alessandra Arce

São Carlos

junho de 2007

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Universidade Federal de São Carlos

Aluna: Priscila Menarin Cesário

RA: 237248

Curso: Licenciatura em Pedagogia

Título da monografia: Quem é a professora de crianças menores de 6 anos

para Maria Montessori? Uma análise a partir de suas obras educacionais

Orientadora: Profª Drª Alessandra Arce

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Dedicatória

Dedico este trabalho aos meus pais Ana e Arlindo e ao meu namorado Ricardo pelos estímulos que me impulsionaram a buscar vida nova a cada dia, meus agradecimentos por terem aceito se privar de minha companhia pelos estudos concedendo a mim a oportunidade de me realizar intelectualmente ainda mais.

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Agradecimentos

Em especial, à minha orientadora Profª Drª Alessandra Arce pelo auxílio sobre o

andamento dessa monografia de conclusão de curso.

Para as professoras Emília e Sandra que auxiliaram, através da disciplina TCC 1,

na elaboração do projeto de pesquisa para a realização desta monografia.

Para todos os amigos e amigas que me auxiliaram cedendo o computador para

que este trabalho fosse realizado.

Para minha família que sempre me apoiou e ensinou a importância da

persistência na realização dos sonhos.

A todos os professores da Universidade Federal de São Carlos pelo

conhecimento, carinho, dedicação e entusiasmo demonstrado ao longo do curso.

Para os amigos e amigas que de certa forma ajudaram na confecção deste

trabalho auxiliando em algumas dúvidas.

Para meu primo Carlos, historiador, pelos esclarecimentos históricos presentes

no trabalho.

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Resumo

Este trabalho monográfico busca a compreensão da imagem do profissional de

crianças menores de 6 anos que atualmente está atrelada a tributos pessoais como “ter

jeitinho” e “gostar de crianças” em detrimento de uma formação profissional intelectual

e crítica. Para isso busca-se auxílio nas obras educacionais de Maria Montessori para

investigar se em suas obras encontra-se esse mesmo ideal de professora que

presenciamos atualmente.

Palavras-chave: Maria Montessori, criança, educação e professor de educação infantil

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Sumário

Introdução.......................................................................................................................08

1-Biografia e contexto histórico de Maria Montessori...................................................09

1.1 A criança e a concepção de desenvolvimento infantil..............................................14

1.2 O professor................................................................................................................32

Considerações Finais......................................................................................................41

Referências Bibliográficas..............................................................................................49

Bibliografia.....................................................................................................................50

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Introdução

Atualmente, na sociedade capitalista, na qual estamos inseridos presenciamos de

diversas formas o controle da classe social dominante, a fim de reproduzir suas

ideologias políticas e econômicas, para assim manter-se no poder. Para isso ela acaba se

apropriando inclusive sobre a educação. Os meios utilizados para essa apropriação são

diversos, como, por exemplo, através de receituários contidos nos Referenciais

Curriculares para a Educação Infantil e nas teorias “da moda”.

Nesse sentido, presenciamos cada vez mais um discurso de que é mais

importante o desenvolvimento da inteligência, das capacidades intelectuais e morais por

meio da construção livre e autônoma de conhecimentos, ou seja, o aprender a aprender,

ao invés de aprender a cultura construída historicamente.

Isso induz cada vez mais ao esvaziamento do trabalho educativo realizado pelo

professor, tornando-o um indivíduo não crítico e alienado, ou seja, afastado de tudo o

que já foi produzido simbólica ou materialmente pela humanidade. Tudo isso contribui

para uma imagem de que basta ao professor “ter jeitinho” e “gostar de crianças”, em

detrimento de uma formação intelectual crítica e sólida.

Assim, chama a atenção do quão arraigada esta imagem encontra-se não só no

cotidiano das escolas de educação infantil, mas também na imagem que os estudantes de

Pedagogia possuem, em um primeiro momento, deste profissional. Portanto, através

desse trabalho monográfico procura-se através de uma pesquisa histórico-bibliográfica,

com a utilização das obras educacionais de Maria Montessori, compreender se, em suas

obras educacionais encontra-se este mesmo ideal de professora, ou não.

Para isso buscar-se-á compreender a partir de sua concepção de infância a

construção da imagem da professora e também através da análise e do desvelamento

presentes em suas obras de como deve ser a professora de crianças menores de 6 anos.

Primeiramente será feita uma breve biografia e contextualização histórica do

período vivido por Maria Montessori, bem como da corrente pedagógica, seguida por

Montessori, vigente na época. Assim, será apresentado também algumas idéias dessa

corrente (escolanovismo) que se remete à pedagogia montessoriana.

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Em seguida será subdividido em dois itens, a criança e o professor,

respectivamente: no primeiro buscar-se-á entender qual a concepção de

desenvolvimento infantil segundo Montessori, ou seja, sua concepção de infância. No

segundo remeterá a visão expressa nas obras educacionais de Montessori acerca de

como deve ser a professora que trabalha com crianças menores de 6 anos. É importante

ressaltar também que dentro desses dois itens está contida a visão montessoriana de

educação.

Para as discussões acima serão utilizadas três obras fundamentais de Maria

Montessori: Mente Absorvente (1949), A criança (s.d.) e Pedagogia Científica (1965).

Em relação às considerações finais será feita uma crítica em relação às

concepções da autora, ou seja, uma crítica a partir da classificação da pedagogia

montessoriana como uma teoria não crítica em educação com base nas obras “Escola e

Democracia” de Dermeval Saviani e da Pedagogia na “Era das revoluções” de

Alessandra Arce.

Dessa maneira buscar-se-á, com este trabalho monográfico, confirmar ou não

uma volta histórica em relação à essa imagem atrelada a atributos pessoais em

detrimento de uma formação intelectual crítica, do profissional de educação infantil.

através da análise das obras montessorianas, bem como uma crítica em relação à essa

imagem da professora.

1-Biografia e contexto histórico de Maria Montessori

Segundo o livro “Maria Montessori” (1988) de Rita Kramer e Anna Freud Maria

Montessori nasceu em Chiaravalle, no norte da Itália no ano de 1870. Desde pequena se

interessou pelas ciências e decidiu enfrentar a resistência do pai e de todos à sua volta

para estudar Medicina na Universidade de Roma. Graduou-se em Medicina no ano de

1884 por esta Universidade tornando-se a primeira mulher médica da Itália.

Segundo Kramer e Freud foi através de suas observações clínicas, na sua prática

como médica, levaram Montessori a estudar e aprofundar como as crianças aprendem e

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como constroem a aprendizagem a partir do que existe no ambiente. Assim, direcionou

sua carreira para a Psiquiatria e logo se interessou por crianças com retardo mental.

Ela percebeu que as crianças consideradas pela sociedade como ineducáveis

respondiam com rapidez e entusiasmo aos estímulos para realizar trabalhos domésticos.

Em pouco tempo, através de observações práticas e de pesquisas acadêmicas Montessori

teve experiências com as crianças ditas normais. Além disso, Montessori realizou várias

conferências sobre os métodos educativos para crianças com deficiência mental.

Segundo Kramer (1988) em 1902 Montessori graduou-se também em

Pedagogia, Antropologia e Psicologia para melhor entender a maneira que as crianças

constroem a aprendizagem a partir do ambiente e para auxiliá-la com as crianças com

retardo mental. Montessori também criou em Roma a Escola Ortofrênica, da qual foi

diretora até 1900. Além disso, pôs suas idéias em prática na primeira Casa dei Bambini,

criada em 1907, aberta numa região pobre no centro de Roma, onde se converteu na

origem de seu método educativo Montessori. O sucesso das "casas" tornou Montessori

uma pessoa reconhecida nacionalmente.

Em 1909 Montessori dita seu primeiro curso de formação profissional. E em

1911 deixa a profissão de médica e se dedica ao trabalho pedagógico. No ano de 1913

inaugura a Associação Educativa Montessori em Washington, Estados Unidos, e dá

conferências sobre seu trabalho com crianças.

Em 1915, também nos Estados Unidos, atrai a atenção com seu trabalho de aula

e conduz cursos de aprendizagem para professores. Em 1917 o governo espanhol a

convida para inaugurar um instituto de investigação. Em 1919, começa a ditar uma série

de cursos de aprendizagem aos professores em Londres.

Em 1922 o governo a nomeou inspetora-geral das escolas da Itália. Com a

ascensão do regime fascista Montessori acusou publicamente a essa doutrina de “formar

a juventude segundo seus moldes brutais” e decidiu deixar o país em 1934, pois para a

educadora a ascensão do regime fascista de Benito Mussolini, representou triunfo

momentâneo dos valores opostos aos que defendeu. Entretanto, continuou trabalhando

na Espanha, no Ceilão (hoje Sri Lanka), na Índia e na Holanda.

Em 1947 fundou o “Centro Montessori” em Londres. Além disso, em 1949,

1950 e 1951 foi nomeada para o prêmio Nobel. Em 1951 se retira da sua vida de

conferencista.

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Após 14 anos de exílio regressou à Itália para reorganizar as escolas e ingressar

como docente na Universidade de Roma. Em 1952, Montessori falece, em Noordwijk,

Holanda, com 81 anos de idade.

Assim, Montessori desenvolveu sua "pedagogia científica" baseada

principalmente na transposição de métodos desenvolvidos no trabalho com crianças

"anormais" para o trabalho com crianças "normais".

A pedagogia Montessoriana está inserida no movimento escolanovista e teve

grande importância e destaque para os jardins de infância e para as primeiras séries do

ensino, pois se opôs aos métodos tradicionais que não respeitavam as necessidades e os

mecanismos evolutivos do desenvolvimento da criança, que são extremamente

importantes nessa faixa etária.

Segundo Luzuriaga (1961) o movimento escolanovista é uma corrente

pedagógica que teve início na metade do século XX. Foi um movimento renovador para

a época, pois questionavam o enfoque pedagógico da escola tradicional presente até

então que era centrado na tradição, na cultura intelectual e abstrata, na obediência, na

autoridade, no esforço e na concorrência.

Para os reformistas, a educação deveria assumir-se como fator constituinte de

um mundo moderno e democrático, em torno do progresso, da liberdade, da iniciativa,

da autodisciplina, do interesse e da cooperação. As reformas nas instituições escolares

visavam à retomada da unidade entre aprendizagem e educação, rompida a partir do

início da era moderna, pela própria escolarização, e buscavam religar a educação à vida.

O movimento escolanovista desejava reencontrar a vocação da escola na

sociedade urbana de massas, industrializada e democrática para isso visava uma

reformulação do ensino.

Essa reformulação da escola esteve associada à valorização da atividade ou

experiência em sua prática cotidiana. O entendimento da educação como vida, e não

como preparação para a vida.

No século XX houve em várias partes do mundo uma série de experiências

educacionais escolanovistas que tinham algumas das características básicas que

poderiam ser consideradas constituidoras de uma concepção de escola de educação

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integral. As próprias denominações destas escolas já mostram seus objetivos. Entre elas,

podemos citar as "escolas de vida completa" inglesas; os "lares de educação no campo"

e as "comunidades escolares livres" na Alemanha; a "escola universitária" nos EUA; as

"casas das crianças" orientadas por Montessori, na Itália; a "casa dos pequenos", criada

por Claparède e Bovet em Genebra; a "escola para a vida", criada por Decroly em

Bruxelas, e muitas outras.

Apesar das particularidades de cada uma destas escolas, todas davam

importância à articulação da educação intelectual com a atividade criadora, em suas

mais variadas expressões, à vida social-comunitária da escola, à autonomia dos alunos e

professores e à formação global da criança.

Com esta tentativa de desformalizar parcialmente a educação escolar, o

movimento escolanovista pretendia que a escola interviesse de maneira ao mesmo

tempo mais profunda e mais abrangente na educação dos indivíduos.

Do ponto de vista político-social, as novas idéias eram uma resposta à

generalização e laicização da educação escolar alcançada, na Europa e nos Estados

Unidos, em fins do século XIX. O ideal da educação para todos ganha concretude, e esta

concretude põe em xeque as tradições escolares. Já do ponto de vista do conhecimento

científico, as novas idéias eram uma conseqüência dos avanços da biologia e da

psicologia, que embasavam uma nova visão da criança, da aprendizagem, da educação

em geral e da educação escolar.

No século XX, principalmente com Claparède, Montessori, Decroly, Dewey e

Freinet são desenvolvidas e sistematizadas as propostas da Escola Nova. O sentido

dessas novas idéias é o da criação de canais de comunicação e interferência entre os

conhecimentos formalizados e as experiências práticas e cotidianas de vida. Toda a

discussão em torno da questão do método, de uma nova visão de como se aprende,

continha a idéia de um religamento entre os conhecimentos escolares e a vida, uma

reaproximação de pensamento e experiência.

O movimento escolanovista teve início na metade do século XX com John

Dewey, um grande defensor do direito de todas as classes sociais à educação. Esse

movimento tinha como princípio a defesa da escola pública e gratuita e a necessidade da

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implantação de experiências práticas nas salas de aula. Para Dewey a aprendizagem era

um processo ativo, e por isso, criou a expressão "escola ativa" para denominar o ensino

baseado em experiências práticas. Para ele todo conhecimento autêntico vem da

experiência. Essa foi uma das bases do movimento da Escola Nova.

Esse movimento pretendeu criar novas bases para o reconhecimento da

"autoridade pedagógica". Bases que dispensassem a existência de um acervo cultural

fechado e que permitissem a livre expressão e desenvolvimento das diversas

individualidades e culturas, possibilitando um encontro delas em algum ponto a ser

aberto. Não por acaso, foi nos Estados Unidos que o pensamento escolanovista mais se

desenvolveu e onde sua prática foi mais consistente. Isso está relacionado à própria

característica da formação social americana. Sua pluralidade étnica e cultural

demandava um tipo de escolarização da qual emergissem cidadãos capazes de construir

uma identidade cultural coletiva.

O surgimento da Escola Nova pode ser interpretado de diversas maneiras, no

caso americano, ela foi uma resposta às necessidades de uma sociedade que se formara

pela imigração variada, no caso europeu, ela foi uma tentativa de democratização

efetiva do sistema em vista da extensão da escolarização a todas as camadas sociais.

Além disso, um dos grandes impulsos do pensamento escolanovista foi a ocorrência das

guerras mundiais, particularmente a primeira grande guerra, que surpreendeu o espírito

iluminista com o fato de que foram exatamente as nações mais desenvolvidas na

ciência, na tecnologia e na filosofia que protagonizaram o episódio bárbaro.

A pedagogia Montessoriana está baseada nesses princípios escolanovistas

visando harmonizar a interação de forças corporais e espirituais, corpo, inteligência e

vontade através de uma educação da vontade e da atenção, com o qual a criança tem

liberdade de escolher o material a ser utilizado e de proporcionar a cooperação.

Para isso, há alguns princípios fundamentais como a atividade, a individualidade

e a liberdade com ênfase nos aspectos biológicos, pois, para Montessori como a vida é

desenvolvimento, seria função da educação favorecer esse desenvolvimento. Os

estímulos externos formariam o espírito da criança, precisando, portanto, ser

determinados.

Influenciada por Rousseau e pelo desejo de adequar a educação às possibilidades

das crianças o método Montessori se propõe a desenvolver a totalidade da personalidade

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da criança e não somente suas capacidades intelectuais. Preocupa-se também com as

capacidades de iniciativa, de deliberação e de escolhas independentes e com os

componentes emocionais.

Assim, na sala de aula, a criança seria livre para agir sobre os objetos sujeitos a

sua ação, mas estes já estariam preestabelecidos, como os conjuntos de jogos e outros

materiais que desenvolveu como, por exemplo, o material dourado.

Foi com ela que surgiram novidades tão básicas como mesas e cadeiras menores

para as salas de Educação Infantil e a utilização de brinquedos educativos.

O material criado por Montessori visa a compreensão das coisas a partir delas

mesmas, estimulando e desenvolvendo na criança, um impulso interior que se manifesta

no trabalho espontâneo do intelecto.

Para Montessori o papel da professora teria as seguintes características:

Ela ensina pouco, mas observa muito; além do mais, sua função consiste em dirigir as atividades psíquicas das crianças bem como seu desenvolvimento fisiológico. (MONTESSORI, 1969, p.156).

Além disso:

Montessori estabelecia, de forma radical, que a função da mulher não é a de ensinar, mas apenas orientar e facilitar o processo de aprendizagem e, em decorrência disso, não caberia dar ênfase à formação teórica desse profissional, pois o grande condutor do cotidiano escolar seriam os interesses e necessidades das crianças com as quais a mestra trabalha. (ARCE, A. In: Documentação oficial e o mito da educadora nata na educação infantil).

Contudo, não podemos negar que Montessori trouxe inúmeras contribuições

para a educação e principalmente para o ensino de Educação Infantil e das primeiras

séries do Ensino Fundamental principalmente por defender uma ambiente escolar que

favorece a liberdade da criança e por afirmar que as próprias crianças trazem dentro de

si o potencial criador que permite que elas mesmas conduzam o aprendizado.

1.1 A criança e a concepção de desenvolvimento

infantil

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Segundo Montessori, em seu livro intitulado A Criança, o início do século XIX

foi definido pelo rei Vittorio Emmanuele III da Itália como o século da criança. Nesse

período há o início de um movimento social a favor da infância que teve como iniciativa

e contribuição a ciência. Com o desenvolvimento da ciência, com o combate da

mortalidade infantil através da higienização a vida da criança assume um novo aspecto.

Além disso, a ciência mostrou que até então a infância terminava no momento da

conclusão da escola elementar. Com meiguice e tolerância, os princípios educativos

introduziram-se tanto nas famílias como nas escolas.

Com isso, começa-se a levar a criança em consideração e assim a pensar nela.

Cria-se coisas próprias para as crianças, ambientes, mobílias, etc. Até então a criança

era considerada um ser marginalizado pela sociedade, que todos podiam tratar sem

respeito, castigar, insultar, por força de um direito – o direito do adulto. Além disso, os

adultos pagavam desconhecidos para ficarem com as crianças em ambientes separados

dos ambientes dos adultos, elas não podiam utilizar nada nem nenhum lugar comum ao

do adulto e também não ficavam em um lugar apropriado para elas, num lugar onde elas

pudessem exercitar a atividade própria da infância.

O início da preocupação com a educação da criança tem a ver mais com um

despertar de consciência do que com à evolução das condições de vida. Não foi apenas

ao progresso à higiene infantil, mas também com a personalidade da própria criança que

se manifestou de novos aspectos.

Montessori afirma que:

É muito provável que tais alusões, quase intuições proféticas, refletissem as impressões suscitadas pela ciência que, na última década do século anterior, mostrara a criança sofredora, mortalmente atacada por moléstias infecciosas – dez vezes mais que os adultos – e revelara a criança vítima da tortura da escola. Ninguém, porém, foi capaz de prever que a criança guardasse em si própria um segredo vital que poderia desvendar os mistérios da alma humana, que trouxesse dentro de si uma incógnita indispensável para oferecer ao adulto a possibilidade de solucionar seus próprios problemas individuais e sociais. Este ponto de vista poderá transforma-se no alicerce de uma nova ciência que se dedique a pesquisar a infância, cuja influência poderá fazer-se sentir em toda a vida social do homem. (MONTESSORI, s.d, p.16)

Para Montessori a criança possui energias mentais que a torna capaz de construir

e consolidar em poucos anos, sozinha, sem professores, sem nenhum subsídio

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educativo, mesmo se deixada entregue a si mesma, todas as características da

personalidade humana.

Segundo Montessori:

A criança é um ser, fisicamente fraco, nascido com grandes possibilidades, mas praticamente sem ter desenvolvido nele um dos fatores da vida mental, é um ser que pode ser considerado “zero”, mas que, no decorrer de seus anos, já supera todos os outros seres vivos. (MONTESSORI, 1949, Prefácio).

E para Montessori esse é, realmente, um dos maiores mistérios da vida. Além

disso, Montessori com a descoberta de que a criança é dotada de uma mente capaz de

absorver (mente absorvente) provocou uma revolução no campo educacional. Assim,

compreende-se agora porque razão o primeiro período do desenvolvimento humano,

quando se forma o caráter, é o mais importante de todos.

Além disso, Montessori afirma que:

A criança é dotada de poderes desconhecidos, que podem levar a um futuro luminoso. (MONTESSORI, 1949, p.12)

... a mente absorvente da criança se orienta na direção do ambiente; e, especialmente no início da vida, deve tomar cuidados especiais para que o ambiente ofereça interesse e atrativos para esta mente que se deve dele nutrir para a própria construção. (MONTESSORI, 1949, p.113)

Por isso, para Montessori o ambiente tem um papel importante, principalmente

logo depois do nascimento da criança. O ambiente que circunda o recém-nascido é

importante para que a criança não desenvolva hábitos de regressão, se sentindo rejeitada

quando na verdade deveria se sentir atraída pelo ambiente que entrou.

Com o desenvolvimento da psicologia foi abandonada/superada a idéia de que o

indivíduo humano possui nos seus primeiros anos de vida um conteúdo bastante pobre,

que enriquece com seu crescimento, algo pequeno em desenvolvimento, algo que

aumenta, porém conservando sempre a mesma forma. A psicologia reconhece que há

vários tipos de psique e de mente nos diversos períodos da vida.

Segundo Montessori (1949, p.29) esses períodos são claramente distintos entre si

e coincidem com as várias fases do desenvolvimento físico. Os psicólogos chegaram a

dizer nessa época que o desenvolvimento é uma sucessão de nascimentos.

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Num determinado período da vida desaparece uma individualidade psíquica e

surge outra. O primeiro destes períodos vai do nascimento aos seis anos. Durante esse

período há manifestações diversas e o tipo mental continua o mesmo. De zero a seis

anos existem duas subfases distintas: a de zero a três anos revela um tipo de

mentalidade da qual o adulto não consegue se aproximar, ou seja, da qual ele não pode

exercer uma influência direta e, dessa maneira, não existe escola para estas crianças.

Para Montessori (1949, p.29) a outra subfase abrange dos três aos seis anos, na

qual o tipo mental é o mesmo, porém a criança começa a se tornar influenciável. Esse é

um período de grandes transformações no indivíduo. Por isso:

... aos seis anos o indivíduo, segundo os psicólogos da época, tornam-se suficientemente inteligente para ser admitido na escola. (MONTESSORI,1949, p.29)

Além disso, Montessori afirma que:

... a parte mais importante da vida não é aquela que corresponde aos estudos universitários, mas sim ao primeiro período, que vai desde o nascimento até os seis anos, pois é exatamente nesta fase que se forma a inteligência, o grande instrumento do homem. E não apenas a inteligência, mas também o complexo das faculdades psíquicas. (MONTESSORI, 1949, p.33)

Com os vários estudos de psicólogos sobre a vida começou-se a formar uma

tendência oposta à de que a parte mais importante da vida é aquela que corresponde aos

estudos universitários, na verdade começa-se a perceber que a parte mais importante é

aquela do primeiro período que vai do nascimento até os seis anos, pois é exatamente

nessa fase que se forma a inteligência e também o complexo das faculdades psíquicas.

Assim, a criança aos 6 anos foi considerada apta a entrar na escola, pois notou-

se que nesse período a criança sofre uma transformação, através da qual ela se torna

suficientemente amadurecida para ser admitida na escola. Aos seis anos, percebe-se que

ela consegue compreender, que consegue escutar o que está sendo dito, pois antes, era

difícil chegar até ela, pois vivia-se num plano diferente do adulto, não conseguia escutá-

lo e compreendê-lo. Caso a criança aos seis anos não pudesse se orientar, nem

caminhar, nem compreender a fala do professor, não estaria em condições de participar

da vida coletiva.

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Dessa forma, com o reconhecimento de que aos 6 anos a criança já está apta para

entrar na escola muitos estudiosos passaram a se dedicar mais ao estudo dessa faixa

etária.

Entretanto, os educadores nunca refletiram sobre o fato de que se a criança já

consegue se orientar, caminhar e compreender a fala do professor deve-se ao fato de ter

evoluído mentalmente, pois ao nascer era incapaz de tudo isso.

O período infantil é um período de criação; não existe nada no início e cerca de

um ano após o nascimento a criança conhece tudo. Segundo Montessori a criança:

...não nasce com um pouco de inteligência, um pouco de memória, um pouco de vontade, prontas a crescerem e se desenvolverem no período seguinte. (MONTESSORI, 1949, p.33)

Ao nascer a criança conta com um meio de expressão: o choro. Entretanto, isso

não se trata de desenvolvimento, mas sim de criação, que parte do zero.

Segundo Montessori (1949, p.34) a criança é dotada de outros poderes (poder de

criação) e toda a criação que realiza é algo grande e maravilhoso. A criança cria a

linguagem e também a os órgãos que a permite falar. Além disso, todo o movimento

físico é criado por ela. Tudo isso é uma conquista maravilhosa que não é produzida por

uma mente consciente, mas sim inconsciente.

Na criança não existe consciência e vontade, pois, a consciência e a vontade

deve ser criada. E este é um dos deveres da professora.

Segundo Montessori:

...o fato de a criança ter uma mente inconsciente não significa que ela tem uma mente inferior a de quem tem uma mente consciente. Uma mente inconsciente pode ser rica em inteligência. A criança realiza suas maravilhosas conquistas, a começar pelo conhecimento do ambiente, neste tipo de mente. (MONTESSORI, 1949, p.34)

A criança possui um poder de sensibilidade tão intenso que as coisas que a

circundam despertam nela um interesse e um entusiasmo que parecem penetrar na sua

própria vida. A criança assimila todas estas impressões, não com a mente, mas com a

própria vida.

Para Montessori (1949, p.35) a criança precisa de memória para recordar-se das

coisas, entretanto, a criança não possui memória, ela deve construí-la. A criança absorve

o conhecimento com sua vida psíquica diferentemente da do adulto que adquiri

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conhecimentos através da inteligência. Nos adultos as informações são despencadas

sobre suas cabeças e assim recordam e as registram em sua mente. Já na criança as

impressões penetram e a formam na mente da criança.

Segundo Montessori (1949, p.36) a criança aprende tudo inconscientemente,

passando, pouco a pouco, do inconsciente para o consciente. Para ela a criança sofre,

diferentemente do adulto, uma transformação: as informações não só penetram na sua

mente, como a formam. Encarnam-se nela. A criança cria a própria “carne mental”,

usando as coisas que se encontram no seu ambiente. Montessori chamou esse tipo de

mente de Mente Absorvente.

Outra maravilhosa conquista da criança, para Montessori, é sem dúvida o

movimento. Logo que nasce ela já faz alguns movimentos com o corpinho. E ao passar

dos meses ela começa a caminhar, mexer-se, movimentar-se pelo ambiente, fazer

algumas coisas, divertir-se, etc. A cada dia que passa ela aprende a movimentar-se mais

e também a linguagem começa a penetrar na sua mente, tudo segundo as necessidades

de sua vida. Ela aprende muitas coisas com uma rapidez surpreendente. Cada coisa que

a circunda, hábitos, costumes, religião, ela se apropria e fixam-se na sua mente de modo

estável.

Para Montessori:

Os movimentos que a criança conquista não se formam ao acaso, mas sim que vão sendo alcançados num período particular do desenvolvimento. Quando a criança começa a se mexer, a sua mente, capaz de absorver, já preparou o seu ambiente; antes que ela comece a se movimentar, já ocorreu nela um desenvolvimento psíquico inconsciente, e ao iniciar seus primeiros movimentos ela começa a ficar consciente. (MONTESSORI, 1949, p.38)

Através da experiência do ambiente, sob forma de brincadeira, a criança

examina as coisas e as impressões que recebeu na sua mente inconsciente. E através do

trabalho torna-se consciente e constrói o Homem. Segundo Montessori, a criança é

dirigida por uma força misteriosa, maravilhosamente grande, que, pouco a pouco, ela

encarna; assim se torna homem e se faz homem por meio de suas mãos, pela sua

experiência: primeiro através da diversão e, em seguida, através do trabalho. As mãos

são o instrumento da inteligência humana. Com essas experiências a criança assume

uma forma definida e, portanto, limitada, já que o conhecimento é cada vez mais

limitado pelo inconsciente e pelo subconsciente.

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A criança entra na vida e inicia o seu trabalho misterioso e pouco a pouco

assume a maravilhosa personalidade adequada a seu tempo e ambiente. Edifica a sua

mente, até que, pedaço por pedaço, chega à construção da memória, a entender, a

raciocinar.

Para Montessori (1949, p.39) aos adultos cabe não ensinar, mas sim em ajudar a

mente infantil no trabalho do seu desenvolvimento. Seria maravilhoso se fosse possível

prolongar o período em que atua na criança a mente capaz de absorver os

conhecimentos sem cansaço.

Segundo Montessori (1949, p.39) a descoberta de que a criança é dotada de uma

mente capaz de absorver provocou uma revolução no campo educacional. Agora,

compreende-se com facilidade porque razão o primeiro período do desenvolvimento

humano, quando se forma o caráter, é o mais importante de todos. Em nenhuma outra

idade da vida tem-se uma necessidade maior de ajuda inteligente como nesta e cada

obstáculo que se interponha, então, à criança diminuirá as possibilidades de

aperfeiçoamento da sua obra criativa. Por isso, o professor deve ajudar a criança não

mais porque ela é um ser pequeno e débil, mas sim porque ela é dotada de grandes

energias criativas, que são de uma natureza frágil que requer uma defesa amorosa e

inteligente para não serem feridas.

Para Montessori é preciso compreender que estas energias pertencem a uma

mente inconsciente, a qual deve se tornar consciente através do trabalho e da

experiência adquirida no ambiente. Além disso, é preciso dar conta de que a mente

infantil é diferente da do adulto, que não podemos alcançá-la com o entusiasmo verbal,

que não podemos intervir diretamente na passagem do inconsciente para o consciente.

Assim então, todo o conceito educacional precisa ser uma ajuda à vida da criança, ao

desenvolvimento psíquico do homem, e não uma imposição para que grave idéias, fatos

e palavras.

Segundo Montessori (s.d, p.24) o adulto tornou-se egocêntrico em relação à

criança; não egoísta, mas egocêntrico, pois encara tudo que se refere à criança psíquica

segundo seus próprios padrões, chegando assim a uma incompreensão cada vez mais

profunda. Com esse ponto de vista o adulto considera:

... a criança um ser vazio, que o adulto deve preencher com seu próprio esforço, um ser inerte e incapaz, pelo qual ele deve fazer tudo, um ser desprovido de orientação interior, motivo pelo qual o adulto deve guiá-lo passo a passo, do exterior. Enfim, o adulto é como que o criador da criança e considera o bem e o

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mal das ações desta do ponto de vista de suas relações com ela. O adulto é a pedra-de-toque do bem e do mal. É infalível, é o bem segundo o qual a criança deve moldar-se; tudo que na criança se afasta das características do adulto é um mal que este se apressa em corrigir. Com esta atitude que, inconscientemente, anula a personalidade da criança, o adulto age convencido de estar cheio de zelo, amor e sacrifício. (MONTESSORI, s.d, p.24)

Para Montessori, para compreender a criança e o adolescente não adianta tentar

fazer com que o adulto aprenda alguma coisa ou integre uma cultura diferente. Mas sim,

segundo Montessori:

... para tratar a criança de um modo diferente de que vem sendo tratado, para salvá-la dos conflitos que colocam em perigo sua vida psíquica, é necessário antes de tudo dar um passo fundamental, essencial do qual depende tudo: modificar o adulto. (MONTESSORI, s.d, p.23)

Além disso:

É necessário que o adulto encontre em si mesmo o erro ignorado que o impede de ver a criança. (MONTESSORI, s.d, p.23)

Para Montessori essa é a melhor maneira de se compreender a criança e o

adolescente. Sem ela é impossível ir-se adiante. É preciso que o adulto não apenas

declare amar a criança a ponto de sacrificar-se por ela, mas sim recorrer a algo mais,

além de tudo que é notório, voluntário e consciente.

Para Montessori:

Existe uma parte da alma da criança que sempre foi desconhecida e que se deve conhecer; assim deve proceder o adulto, procurando esse algo desconhecido que se esconde na alma da criança. (MONTESSORI, s.d, p.23)

Montessori acredita que só assim podemos extrair o elemento indispensável ao

progresso moral da humanidade. E para isso todos, sem exceção, devem colaborar.

Montessori afirma que:

Não é a criança física, mas a psíquica que poderá dar ao aperfeiçoamento humano um impulso dominante e poderoso. É o espírito da criança que poderá determinar qual será o verdadeiro progresso humano e, talvez, o início de uma nova civilização. (MONTESSORI, s.d, p.15)

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Daí a importância de um estudo mais aprofundado da criança e da infância.

Montessori via como primeira necessidade mostrar as verdadeiras características

da infância, dando a elas a condição de "elo entre as gerações". Atribuindo às crianças a

herança da evolução do homem e do seu papel fundamental na perpetuação e construção

da cultura.

Para Montessori a criança ao nascer é incapaz, possuindo características

naturais, que rapidamente se modificam ao entrar em contato com o ambiente. Segundo

Montessori "o ser que nasce não é apenas um corpo material (...) traz em si o padrão de

instintos psíquicos" (s.d, p.27).

Montessori considera a criança um "embrião espiritual", que desde o nascimento

possui além de vida física, vida psíquica. Ela se viu preocupada com o lado psíquico das

crianças. Além disso, utilizou-se de contribuições da psicanálise para chegar à

conclusão que era necessário cuidar muito bem dos pequenos, para que não lhes

causasse traumas em sua vida adulta, pois tudo que acontece na infância está guardado

no subconsciente, podendo vir à tona na vida adulta. Montessori afirma que: "Não é a

criança física, mas a psíquica que poderá dar ao aperfeiçoamento humano um impulso

dominante e poderoso" (s.d, p.15).

Montessori acredita que toda criança nasce com sensibilidade e potencialidade

precisando ser estimulada adequadamente através do ambiente exterior, para que possa

favorecer atividades espontâneas, concentradas, autocorretivas, contribuindo assim para

a liberdade, independência e desenvolvimento intelectual das crianças. Ela diz que essa

predisposição de construção são os chamados "períodos sensíveis":

Trata-se de sensibilidades especiais que existem nos seres em via de evolução, ou seja, nos estados infantis, as quais são passageiras e limitam-se à aquisição de uma determinada característica. Uma vez desenvolvida essa característica, a sensibilidades cessa e, assim, cada característica se estabelece com o auxílio de um impulso. (MONTESSORI, 1965, p.52).

A extrema importância dada ao ambiente que está inserida a "nova" criança, é

justamente para aproveitar o máximo este período sensível da criança que vai dos 3 aos

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6 anos de idade. Nesta fase da infância a criança possui muita sensibilidade, destacando-

se a ordem do ambiente, por exemplo. Ela gosta e necessita de ordem ao seu redor. Para

ela a ordem representa um estímulo, significando para a criança orientação, dominação

e segurança no ambiente. Possibilita à criança a capacidade de assumir o ambiente

externo, através dos sentidos. Dentro de um ambiente, por exemplo, podemos verificar

muitas vezes que objetos chamativos apenas distraem a atenção das crianças num certo

momento. Irá depender do interesse dela em relação ao objeto. Objetos menores e

discretos poderão despertá-las para pequenos detalhes interessantes e importantes para

seu desenvolvimento.

Assim, Montessori considera a criança um adulto em potencial. A criança num

ambiente apropriado, com materiais interessantes que favoreçam o crescimento e a

formação de sua personalidade, possibilitando através disto, liberdade, atividade,

espontaneidade, individualidade, dará condições para a auto-educação. Lembramos que

Maria Montessori afirma que é necessário que os adultos despertem seus sentimentos de

amor e respeito à criança, confiando no seu potencial, e considerando que ela se

desenvolve como um todo, acreditando que elas podem se autoformar.

Para explicar a concepção de desenvolvimento da criança Montessori afirma que

(s.d, p.25) só após a invenção do microscópio, pode-se observar como se forma

realmente um ser vivo e constatou-se que a origem é uma simples célula germinativa. A

célula germinativa (que resulta da fusão de duas células), possui apenas a membrana, o

protoplasma e o núcleo, como qualquer outra célula; representa simplesmente a célula

elementar em sua foram primitiva, sem qualquer tipo de diferenciação. Qualquer ser

vivo, seja vegetal ou animal, provém de uma célula primitiva.

A célula germinativa possui a propriedade de subdividir-se rapidamente – e de

fazê-lo segundo um padrão preestabelecido. Todavia, não há na célula primitiva o

mínimo vestígio material desse padrão. Apenas existem em seu interior os

cromossomos que estão relacionados à hereditariedade.

Acompanhando os primeiros estágios do desenvolvimento nos animais, vê-se a

primeira célula dividir-se em duas; depois, estas em quatro, e assim por diante, até a

formação de uma espécie de bola vazia chamada mórula, que depois se invagina em

duas camadas que deixam dentro de si uma abertura, constituindo-se assim uma

cavidade de parede dupla- a gástrula. Através de multiplicações, invaginações,

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diferenciações, continua a desenvolver-se em órgãos e tecidos um ser complexo.

Consequentemente, a célula germinativa, embora tão simples, límpida e desprovida de

qualquer padrão material, trabalha e elabora com exatíssima obediência à ordem

imaterial que traz dentro de si. O padrão só é visto através da atividade das células

infatigáveis, podendo-se distinguir apenas o trabalho já realizado. Fora deste, nada

aparece.

Nos embriões dos mamíferos – e, por conseguinte, no do homem – um dos

primeiros órgãos que aparece é o coração. Na verdade o que aparece é uma vesícula que

pulsa imediata e ordenadamente, obedecendo a um ritmo estabelecido, que ainda vai se

transformar em coração. O pulsar do coração é o movimento vital que auxilia todos os

tecidos vitais em formação, enviando-lhes os materiais necessários à vida.

Segundo Montessori (s.d, p.26) o coração realiza um trabalho oculto e

maravilhoso porque se realiza por si mesmo:

... é o próprio milagre da criação surgida do nada. As sapientíssimas células vivas nunca se enganam, encontrando em si mesmas o poder de se transformarem profundamente, seja em células cartilaginosas, seja em células nervosas ou em células de revestimento cutâneo e cada tecido assume o seu posto exato. Esta maravilha da criação, espécie de segredo do universo, é rigorosamente ocultada: a natureza envolve-a com véus e invólucros impenetráveis. E só ela pode rompê-los, ao lançar para o exterior um ser maduro, que surge no mundo como a criatura nascida. (MONTESSORI, s.d, p.27)

Segundo Montessori (s.d, p.27) quando o ser nasce ele não é apenas um corpo

material. Ele transforma-se numa espécie de célula germinativa que contém funções

psíquicas latentes, de tipo já definido. O novo corpo não funciona apenas em seus

órgãos, mas tem também outras funções: os instintos, que não podem ser contidos numa

célula, devem ser dispostos em um corpo vivo, em um ser já nascido. Assim como toda

célula germinativa traz em si o padrão do organismo sem que seja possível chegar-lhes

aos documentos, todo corpo recém-nascido, qualquer que seja a espécie a que pertença,

traz em si o padrão de instintos psíquicos, de funções que colocarão o novo ser em

contato com o meio ambiente.

Assim, quando o ser novo é formado torna-se sede de misteriosas orientações

que darão lugar aos atos, às características, ao trabalho, ou seja, às funções no ambiente

externo.

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O ambiente não deve proporcionar apenas os meios para a existência fisiológica,

mas também os requisitos necessários às tarefas que traz consigo todo ser animal, o qual

dele recebe não só a exigência de viver mas também de exercer uma função destinada a

preservar o mundo e sua harmonia. Em conseqüência, o ambiente varia para cada ser, de

acordo com a sua espécie.

A criança recém-nascida não é simplesmente um corpo pronto para funcionar,

mas constitui um embrião espiritual que possui diretrizes psíquicas latentes.

O espírito pode ser tão profundamente latente a ponto de não manifestar-se

como o instinto do animal que já está pronto a revelar-se em suas ações estabelecidas. O

fato de não ser movido por instintos-orientações fixos e determinados, como os animais,

é sinal de um fundo de liberdade de ação que requer uma elaboração especial, quase

uma criação deixada a cargo do desenvolvimento de cada indivíduo e, portanto,

imprevisível, muito mais delicada, difícil e oculta. Consequentemente existe na alma da

criança um segredo impenetrável se ela própria não o revelar à medida que elabora sua

formação. Precisamente como na segmentação da célula germinativa, na qual nada

existe senão um padrão. Todavia, um padrão que nenhum meio é capaz de revelar e que

se manifestará apenas quando forem assumindo forma os detalhes do organismo. Eis o

motivo pelo qual a criança pode fazer-nos revelações relativas ao desígnio natural do

homem.

Entretanto, devido à delicadeza que está ligada a cada criação surgida do nada, a

vida psíquica da criança necessita de uma defesa e de um ambiente análogo aos

invólucros e véus com que a natureza envolve o embrião físico.

Segundo Montessori (s.d, p.31) a criança que nasce não ingressa num ambiente

natural; mas entra no ambiente da civilização, onde se desenvolve a vida dos homens. É

um ambiente sobrenatural, construído acima da natureza e às suas expensas, pelo

impulso de obter auxílios minuciosos à vida do homem e facilitar-lhe a adaptação.

A passagem do nascimento deveria ser o menos traumatizante possível, com um

tratamento científico para o recém-nascido, pois em nenhuma outra época da vida o

homem enfrenta semelhante ocasião de luta e contraste, bem como de sofrimento

Entretanto, não é tomada nenhuma providência para facilitar essa passagem,

embora algumas pessoas achem o contrário.

Montessori (s.d, p.42) afirma que os cuidados a serem prodigalizados ao recém-

nascido deve levar muito em conta a vida psíquica. Se o recém-nascido já possui uma

vida psíquica, com maior razão a possuirá a criança em seu primeiro ano de existência e

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ainda mais tarde. O progresso atual nos cuidados à infância consiste em levar em

consideração não apenas a vida física como também a psíquica. Para Montessori a

educação deve começar desde o nascimento. É evidente que a palavra educação não é

empregada aqui no sentido de ensinamento, mas no de auxílio ao desenvolvimento

psíquico da criança.

A figura do recém-nascido é o impressionante ponto de partida: aquela criança que nasce inerte e que permanecerá inerte por longo tempo, incapaz de manter-se ereta, necessitada de cuidados como um inválido, aquela criança muda, que por muito tempo só se fará ouvir através do choro, do grito de dor, fazendo que lhe acorram como a pessoa que pede socorro. Só depois de muito tempo – meses ou um ano inteiro, talvez mais – aquele corpo se levantará e andará, deixará de ser inválido e passará a ser o corpo do homem-criança. (MONTESSORI, 1949, p.43)

Para Montessori (s.d, p.43) existe na criança um jogo de instintos, relativos não

apenas às funções digestivas, mas também às funções psíquicas, como se observa desde

o início nas crias dos mamíferos quando, rapidamente e por impulso intrínseco,

assumem características da espécie. No que diz respeito aos movimentos, parece que a

criança dispõe de possibilidades mais lentas de desenvolvimento em comparação com

os recém-nascidos de outras espécies animais. Com efeito, enquanto os órgãos

sensoriais funcionam desde o instante do nascimento – pois a criança é de imediato

sensível à luz, ao ruído, ao tato, etc – o movimento ainda é muito pouco desenvolvido.

Montessori (s.d, p.43) questiona que é impressionante que a criança nasça e se

mantenha inerte durante tanto tempo, enquanto as crias dos outros mamíferos quase de

imediato após o nascimento – ou pelo menos após brevíssimo espaço de tempo – já se

sustentam em pé, andam, procuram a mãe e se exprimem na linguagem própria da

espécie, embora de maneira ainda frágil, imperfeita e quase patética.

Segundo Montessori:

Todas as características que não sejam relativas ao funcionamento do organismo vegetativo podem ser reunidas e chamadas de características psíquicas. Ora, tais características já se encontram em todos animais desde o nascimento. (MONTESSORI, p.44)

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Segundo Montessori (s.d, p.44) há uma teoria científica que explica os

movimentos instintivos dos animais que é uma conseqüência de experiências feitas pela

espécie em épocas anteriores e transmitidas por hereditariedade. Os homens sempre

andaram eretos, sempre falaram uma linguagem articulada e estiveram prontos a dar

hereditariedade a seus descendentes. Seria absurdo pensar que logo o homem,

caracterizado e distinto de todas as demais criaturas pela grandiosidade de sua vida

psíquica, seja o único a não possuir um padrão de desenvolvimento psíquico. Deve

existir alguma verdade oculta sob tais contradições. O espírito pode ser tão

profundamente latente a ponto de não se tornar manifesto como o instinto do animal,

que já vem pronto para revelar-se em ações preestabelecidas.

O fato de não ser movido por instintos-guias fixos e determinados como os dos

animais é sinal de uma inata liberdade de ação que requer uma elaboração especial,

quase uma criação deixada a cargo do desenvolvimento de cada indivíduo e, por

conseguinte, imprevisível.

Montessori (s.d, p.45) afirma que a diferença psíquica entre o animal e o homem

é a seguinte:

... o animal é como objeto fabricado em série, cada indivíduo reproduzindo de imediato as características uniformes fixadas na raça inteira. O homem, ao contrário, é como o objeto trabalhado à mão: cada um diferente do outro, cada um possuindo um espírito criador próprio, que o transforma numa obra de arte da natureza. Mas o trabalho é lento e demorado. Antes que surjam os efeitos exteriores tem que haver um lavor íntimo que não é a reprodução de um tipo fixo, mas a criação de um tipo novo – e, consequentemente, é um enigma, um resultado de surpresa, que permanece oculto durante longo tempo, exatamente como ocorre com a obra de arte que o autor conserva na intimidade do estúdio, transfundindo-se nela antes de a expor em público. (MONTESSORI, s.d, p.45)

Segundo Montessori (s.d, p.45) o trabalho através do qual se forma a

personalidade humana é a obra oculta da encarnação. O homem inerte é um enigma. O

corpo inerte contém em si o mecanismo mais complexo dentre todos os que existem nos

seres vivos – e pertence ao homem. Este pertence a si mesmo e deve encarnar-se com o

auxílio de sua própria vontade.

A carne é denominada pela fisiologia como sendo um conjunto de órgãos

motores, ou seja, músculos voluntários. O próprio termo diz que são movidos pela

vontade e nada pode indicar melhor o fato de que o movimento está ligado à vida

psíquica. A vontade nada poderia fazer sem os órgãos, sem os seus instrumentos.

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Os órgãos do movimento são muito importantes para os animais de qualquer

espécie, pois nada poderiam fazer se lhes faltasse os órgãos do movimento. No homem

os músculos são infinitamente complexos e numerosos. Durante seu funcionamento, os

músculos se associam para executar ações complicadíssimas. Alguns exercem impulsos,

outros assumem atitude passiva, alguns são capazes apenas de efetuar uma

aproximação, outros um contato.

Uma inibição corrige um impulso e, por isso, sempre o acompanha; a um

músculo que aproxima articula-se outro que une – sem associações reais, ou seja,

grupos de músculos juntam-se em movimentos únicos e, assim, o movimento pode

complicar-se infinitamente.

Cada movimento é uma associação de ações opostas; cada modulação requer a

ação quase de um exército que atua ao mesmo tempo que um exército oposto – ambos

habilmente treinados até a perfeição.

Segundo Montessori (s.d, p.46) não se teve confiança total na natureza porque a

parte superior – construtiva e diretora – foi confiada à energia individual, uma energia

que se sobrepõe à natureza e, portanto, é supranatural. Este é o fato primordial a

considerar no homem. O espírito humano animador deve encarnar-se para atuar e abrir

caminho no mundo. Tudo isso, segundo Montessori, constitui o primeiro capítulo da

vida da criança.

Para Montessori:

A encarnação individual possui, por conseguinte, diretrizes psíquicas. (MONTESSORI, s.d, p.46)

Assim deve existir na criança uma vida psíquica que precede a vida motora e é

anterior a qualquer expressão externa, e também independente dela.

Segundo Montessori (s.d, p.46) seria um grave erro acreditar que a criança

possua músculos débeis, e por isso não se consiga manter ereta, ou que a incapacidade

de coordenar os movimentos seja inata no ser humano.

Nos recém-nascidos a força muscular é bastante evidente nos impulsos e

resistências dos membros. Um exemplo bem claro é o difícil fato da coordenação de

sugar e deglutir, já pronta quando a criança nasce.

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Para Montessori (s.d, p.47) a natureza insere na criança condições novas em

relação às dos animais recém-nascidos. Libera o campo da movimentação do

absolutismo imperativo dos instintos. Os instintos se retraem e os músculos aguardam,

fortes e obedientes, um novo comando – esperam o brado da vontade para coordenar-se

a serviço do espírito humano. Devem assumir as características não apenas de uma

espécie, mas de um indivíduo que os anima. Existem, sem dúvida, também os instintos

da espécie, que impõem as características fundamentais; sabe-se que cada criança

andará em atitude ereta e falará. Contudo, dela podem resultar variedades individuais

tão insuspeitadas a ponto de constituírem um enigma.

Entretanto, segundo Montessori:

O homem é capaz de tudo e sua aparente inércia prepara a maravilhosa surpresa da individualidade. Sua voz articulada algum dia articulará palavras: ainda não sabemos qual será seu idioma. Falará a língua que aprender em seu ambiente, com atenção, construindo os sons com esforços incalculáveis, depois as sílabas e finalmente as palavras. Será o elaborador voluntário de todas as suas funções de relacionamento com o ambiente, será o criador de um novo ser. (MONTESSORI, s.d, p.47)

Segundo Montessori, o fenômeno da criança inerte ao nascer sempre foi

constatado, entretanto não se fez nada em relação a essas constatações, apenas foram

deixados de lado.

Isso na prática da vida cotidiana resultou em muitas conseqüências que

representaram um grande perigo para a vida psíquica da criança. Uma das

conseqüências foi o fato de que levaram a pensar erroneamente que não só os músculos

– ou seja, a carne – fossem inertes, mas que a própria criança também o fosse – um ser

passivo, desprovido de vida física. E com isso o adulto atreveu-se a adquirir a convicção

errônea de ser ele quem animará a criança com seus cuidados e auxílio. Isso acabou se

tornando um dever e responsabilidade, apresentou-se como modelador da criança e

construtor da sua vida psíquica.

Segundo Montessori:

O adulto atribui-se um poder quase divino: terminou por acreditar-se o Deus da criança e viu-se a si mesmo como está na Gênesis: “Eu criei o homem à minha imagem e semelhança”. A soberba foi o primeiro pecado do homem: o fato de arvorar-se em substituto de Deus foi a causa da miséria de toda uma descendência. (MONTESSORI, s.d, p.48)

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Com isso, se a criança traz em si a chave de seu próprio enigma individual, se

possui um padrão psíquico e diretrizes de desenvolvimento, estes devem ser potenciais e

extremamente delicados nas tentativas de realização. Entretanto, a intervenção do

adulto, exaltado por seu ilusório poder, é capaz de anular tais padrões ou desviar-lhes as

realizações ocultas.

Segundo Montessori:

O adulto pode realmente cancelar o desígnio divino que remonta às origens do homem e, de geração em geração, o homem sempre crescerá deformado na sua encarnação. (MONTESSORI, s.d, p.48)

Para Montessori esse é o grande e fundamental dentre outros problemas da

humanidade. Toda questão reside em que a criança possua uma vida psíquica ativa

embora não seja capaz de manifestá-la, porque deve elaborar prolongadamente em

segredo as suas difíceis realizações.

Esse conceito segundo Montessori (s.d, p.48) sugere uma visão de uma alma

aprisionada, obscura, que procura vir à luz, nascer e crescer, e que vai paulatinamente

animando a carne inerte, chamando-a com o brado da vontade, aflorando à luz da

consciência com o esforço de um ser que nasce. E no meio ambiente aguarda-o um ser

dotado de um poder enorme, gigantesco, que o agarra e quase o esmaga.

Segundo Montessori no meio ambiente nada está preparado para receber o fato

grandioso que é encarnação de um homem, porque ninguém o vê e, por isso, ninguém o

aguarda (não existe para ele qualquer proteção, qualquer auxílio).

A criança que se encarna é um embrião espiritual que deve viver às expensas do ambiente, mas, como o embrião físico, precisa ser protegido por um ambiente exterior especial, caloroso de amor, rico de nutrição, onde tudo é feito pára acolhê-lo e anda para lhe causar obstáculos. (MONTESSORI, s.d, p.49)

Através da compreensão dessa realidade a atitude do adulto em relação à criança

deve mudar, pois a figura da criança, embrião espiritual que se está encarnando,

desperta e impõe-nos novas responsabilidades.

A encarnação efetua-se através de esforços ocultos: tudo que cerca esse trabalho

criativo constitui um drama desconhecido, que ainda não foi escrito.

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Segundo Montessori (s.d, p.49) ocorre um intercâmbio entre o indivíduo, ou

melhor, o embrião espiritual, e o ambiente; graças a este, o indivíduo se forma e se

aperfeiçoa. Esta atividade primordial, construtiva, é análoga à função da pequena

vesícula que, no embrião físico, representa o coração e que assegura o desenvolvimento

e a nutrição de todas as partes do corpo do embrião, enquanto se alimenta através dos

vasos sanguíneos da mãe, seu ambiente vital. A individualidade psíquica desenvolve-se

e organiza-se pela ação desse motor em relação com o ambiente. A criança esforça-se

por assimilar o ambiente e de tais esforços nasce a profunda unidade da sua

personalidade.

Toda essa ação lenta e gradual constitui uma contínua apropriação do

instrumento por parte do espírito, o qual deve zelar com esforço pela sua soberania a

fim de que o movimento não morra na inércia e não se automatize. O espírito deve

comandar continuamente, para que o movimento, livre do domínio de um instinto fixo,

não conduza ao caos. O exercício de tal esforço produz um desenvolvimento sempre

ativo de energia construtiva e contribui para a obra perpétua da encarnação espiritual.

Assim:

... se forma, por si mesma, a personalidade humana como o embrião e a criança se transformam no criador de homens, no Pai do homem. (MONTESSORI, s.d, p.50)

Dessa maneira, o pai atuou unicamente com o fornecimento de uma célula

invisível. A mãe, além de uma célula germinativa, proporcionou o ambiente vivo

adequado, com os requisitos necessários à proteção e ao desenvolvimento, a fim de que

a célula germinativa se seguimentasse tranquilamente por atividade própria, produzindo

o recém-nascido inerte e mudo. Quando se diz que o pai e a mãe construíram o filho,

repete-se uma expressão inexata. Na verdade, é necessário dizer que o homem foi

construído pela criança – esta é o pai do homem.

Portanto, deve-se considerar o esforço secreto da infância merecendo uma

expectativa acolhedora, pois nesse período de formação determina-se a personalidade

futura do indivíduo.

Daí nasce o dever de estudar e penetrar com profundidade científica nas

necessidades psíquicas da criança, preparando-lhe um ambiente vital.

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1.2 O professor Montessori acreditava que a educação é uma conquista da criança, pois percebeu

que já nascemos com a capacidade de ensinar a nós mesmos, se nos forem dadas as

condições.

Segundo Montessori:

O primeiro passo a ser dado pela professora montessoriana é a autopreparação. (MONTESSORI, 1949, p.297)

Isso deve ocorrer por que:

... nas escolas tradicionais a professora conhece o comportamento imediato de seus alunos e sabe que deve cuidar deles e o que fazer para instruí-los; enquanto a professora montessoriana encontra diante de si uma criança que, por assim dizer, não existe ainda.(MONTESSORI, 1949, p.297)

Para Montessori essa é a principal diferença entre a escola tradicional e a escola

montessoriana. A professora montessoriana deve se libertar de toda a idéia preconcebida

em relação ao nível que as crianças se encontram e ter fé de que a criança revelará sua

verdadeira natureza através do trabalho que lhe atrair. Esses são alguns dos primeiros

passos para a autopreparação da professora montessoriana.

Além disso, Montessori acredita que a professora deve endereçar todas as suas

energias para provocar a concentração das crianças para que assim elas mudem de um

estágio para o outro assim como ocorre numa evolução espiritual.

Para conseguir isso Montessori afirma que no primeiro estágio:

A professora passa a ser a guardiã e a curadora do ambiente, por isto, ela se concentra no ambiente ao invés de deixar distrair pela agitação das crianças. Concentra-se no ambiente porque é dele que virá a cura e a atração que polarizará a vontade das crianças. (MONTESSORI, 1949, p.298)

Montessori compara o item acima com o ambiente da casa. Montessori diz que:

Nos nossos países, onde cada mulher tem sua casa, ela torna-a o mais atraente possível para si mesma e para o marido, e ao invés de se preocupar demais com o marido ela se preocupa primeiro com a casa a fim de criar um ambiente onde

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possa florescer uma convivência normal ou construtiva; tenta tornar a casa tranqüila, cômoda e cheia de interesses diversos. As atrações fundamentais numa casa são a limpeza e a ordem: tudo em seus devidos lugares, limpo, cintilante e alegre. (MONTESSORI, 1949, p.298)

Segundo Montessori este deve ser o primeiro cuidado da mulher também na

escola. Ela deve manter a ordem e o cuidado com o material escolar para que esteja

sempre em perfeito estado, para que não falte nada, a fim de parecer sempre novo,

completo e pronto para o uso.

Montessori também afirma que a aparência da professora é muito importante.

Para Montessori:

... a professora deve estar atraente: agradável devido a uma limpeza cuidadosa, serena e cheia de dignidade.(MONTESSORI, 1949, p.298)

Além disso:

a aparência da professora é o primeiro passo de compreensão para a criança e de respeito para com ela. A professora deveria estudar seus movimentos, torná-los delicados e graciosos o máximo possível. (MONTESSORI, Mente Absorvente, 1949, p.298)

Isso deve ocorrer porque, segundo Montessori:

A criança nesta idade idealiza sua mãe; não sabemos que tipo de mãe possa ser, porém escutamos a criança dizer quando vê uma senhora bonita: “Como é linda, exatamente como a minha mãe!” Talvez a mãe não seja realmente bonita, mas o é para seu filho, e cada pessoa que ele admira é linda como a sua mãe. (MONTESSORI, Mente Absorvente, 1949, p.298)

Portanto, Montessori afirma que:

... o cuidado pessoal deve fazer parte do ambiente que circunda a criança: a professora constitui aquilo que de mais vivo existe no ambiente. A primeira tarefa da professora é, portanto, o cuidado com o ambiente, que deve preceder qualquer outro cuidado; este é um trabalho indireto e, se não for bem feito, não haverá resultados eficientes e persistentes em nenhuma área: física, mental ou espiritual. (MONTESSORI, 1949, p.298, 299)

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No segundo estágio Montessori afirma que após examinado o ambiente, como

diz no primeiro estágio, é importante que a professora se preocupe com o

comportamento da criança. Para atrair e fixar no trabalho os seres desorganizados, com

mentes confusas e incertas (as crianças) a professora montessoriana deve:

... ser sedutora,deve atrair a criança. (MONTESSORI, 1949, p. 299)

Além disso, ela deve ser:

... como a chama cujo calor ativa, vivifica e convida. (MONTESSORI, 1949, p. 299)

Montessori compara o dever da professora para com os alunos com a atitude de

um santo que procurou recolher crianças abandonadas pelas ruas, numa cidade onde os

costumes não eram dos melhores. Para isso o santo procurou fazer as crianças se

divertirem. E é isso que Montessori afirma que a professora também deve fazer. Ela

deve utilizar poesias, rimas, canções, narrativas, etc para atrair a atenção e a

concentração da criança.

Para Montessori:

A professora que encanta as crianças consegue fazê-las se interessar por vários exercícios, que mesmo não sendo muito importantes de per si, têm a vantagem de atrair a criança. A prática demonstrou que uma professora ativa atrai mais que uma outra que não o é, e todos podem ser ativos se o quiserem. Alguém poderá dizer num tom alegre: “Por que não trocamos hoje os móveis de seus lugares?” e trabalhar com as crianças, encorajando todas elas e elogiando-as também, comportando-se com agradável alegria. Ou então: “E se políssemos aquele bonito vaso de latão?” Ou ainda: “Que tal irmos para o jardim para colhermos algumas flores?” Cada ação da professora poderá se tornar para as crianças uma chamada e um convite. (MONTESSORI, 1949, p. 299, 300)

Todas as atitudes descritas acima também podem auxiliar uma criança com

comportamento inadequado, segundo Montessori.

Para ela se alguma criança que persiste molestar as outras, a coisa mais prática

será interrompê-la, mesmo sabendo que não devemos intervir quando a criança está

concentrada em alguma atividade. Nesse momento é necessário intervir, pois a

interrupção pode consistir numa exclamação qualquer ou em demonstrar em particular e

Page 35: Quem é a professora de crianças menores de 6 anos para Maria ...

35

afetuoso interesse para com a criança turbulenta. As demonstrações de afeto com a

finalidade de distrair a criança, que se multiplicam lado a lado com o multiplicar-se das

ações perturbadoras da criança, serão para ela como se fosse uma série de choques

elétricos, que com o passar do tempo terão seu efeito.

O terceiro estágio e último estágio de comportamento que a professora

montessoriana deve ter é para Montessori o momento:

... quando as crianças começam a se interessar por alguma coisa: de um modo geral se interessam por exercícios da vida prática, porque a experiência demonstra que é inútil e nocivo dar às crianças material de desenvolvimento sensorial e cultural, antes que possam se aproveitar dos benefícios que eles lhes fazem. Para introduzir este material é preciso aguardar a época em que as crianças estejam concentradas em alguma coisa; como disse, isto acontece através dos exercícios da vida prática. (MONTESSORI, 1949, p. 300)

Para Montessori quando a criança começa a se interessar por algum dos

exercícios da vida prática, o professor não deve interrompê-la, pois este interesse

responde a leis naturais e abre um ciclo de atividade.

Segundo Montessori:

A professora deverá estar muito atenta: não interferir significa não interferir de forma alguma. É então que a professora se engana com mais freqüência. A criança, que até determinado momento provocou muito tumulto, finalmente concentrou-se num trabalho; se a professora disser apenas ao passar por ela:“Muito bem!”, isto bastará para que recomece toda desgraça. É possível que a criança, durante duas semanas, não demonstre qualquer interesse por nenhum trabalho. Ainda que uma outra criança encontre dificuldade e a professora intervenha para ajudá-la, ela deixará que a professora aja e se afastará.. (MONTESSORI, 1949, p. 301)

Para Montessori o interesse das crianças não se concentra apenas no trabalho,

mas com muito maior freqüência no desejo de superar as dificuldades. Se a professora

supera a dificuldade para a criança fazendo tudo para ela a criança passará a não se

interessar mais.

Outro ponto importante é que:

Elogio, ajuda ou até mesmo um olhar apenas podem ser suficientes para interrompê-lo ou destruir a atividade. (MONTESSORI, 1949, p.301)

Page 36: Quem é a professora de crianças menores de 6 anos para Maria ...

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Para não interferir no interesse e na concentração da criança a professora

montessoriana deverá:

... tão logo que a concentração se inicia, fazer como se a criança não existisse. Poderá, é claro, ver aquilo que ela fez, com uma olhada rápida, sem deixar que ela perceba. (MONTESSORI, 1949, p.301)

Quando as crianças começam a escolher seu trabalho, podem acontecer alguns

problemas, pois acontecerá que muitas crianças desejarão o mesmo material. A

professora montessoriana não deverá interferir para solucionar o problema se não for

pedido um auxílio a ela. Ela deve deixar que as crianças resolvam sozinhas. Segundo

Montessori:

A tarefa da professora é apenas apresentar novos objetos, quando percebe que a criança exauriu toda a atividade possível com os que estavam utilizando antes. (MONTESSORI, 1949, p. 302)

A habilidade da professora para não interferir em alguns momentos sem ser

chamada não é tão fácil. Ela vai adquirindo isso somente com a prática.

Para isso a professora:

... deverá erguer-se a uma altura espiritual. A verdadeira espiritualidade é se dar conta que a ajuda também pode ser presunção. (MONTESSORI, 1949, p.302)

Além disso, mesmo que:

... a relação entre criança e professora seja no campo espiritual, a professora pode, através de seu comportamento, encontrar um bom exemplo na doméstica. Ela mantém em ordem as vassouras do patrão, porém não lhe diz como deve usá-las; prepara com cuidado a sua comida, mas não lhe manda comê-la; apresenta bem a refeição e depois desaparece. (MONTESSORI, 1949, p.299)

Segundo Montessori essa é maneira que devemos nos comportar com o espírito

ainda em formação da criança. Quando esta demonstra um desejo devemos estar prontos

para satisfazê-la. Por exemplo:

Page 37: Quem é a professora de crianças menores de 6 anos para Maria ...

37

A empregada não vai incomodar o patrão quando ele está sozinho; se, porém, é chamada por ele, apressa-se em saber o que deseja e responderá: “Sim, senhor”. Admira se lhe pedem para admirar algo e diz: “Como é lindo!”, ainda que não consiga ver beleza alguma. (MONTESSORI, 1949, p.302)

Dessa mesma maneira deve-se agir com a criança. Quando ela está fazendo um

trabalho com grande concentração, não se deve interpor, porém se mostra desejar a

aprovação, deve-se dá-la, generosamente.

Para Montessori o comportamento da professora deve corresponder às

exigências do grupo de crianças que lhe é entregue, pois assim ela poderá ver as

qualidades sociais florescerem de modo surpreendente e observará as manifestações do

espírito da criança.

Assim a professora poderá dizer de si para si:

Vi a criança como deveria ser e acabei achando-a melhor do que podia supor. (MONTESSORI, 1949, p.303)

Para isso é preciso compreender a infância, conhecer e viver o segredo da

infância, segundo Montessori. Quando as crianças manifestam o seu espírito, este

espírito se revela com amor e transforma a professora.

Para Montessori há dois níveis de amor. Um amor:

... se referindo aos cuidados, aos carinhos. (MONTESSORI, 1949, p.304)

E outro amor que não é pessoal, nem material como acima. É um amor de:

... quem serve às crianças sente estar servindo ao espírito do homem, o espírito que deve se libertar... (MONTESSORI, 1949, p.304)

Segundo Montessori o maior indício de sucesso para uma professora é quando

ela pode dizer:

Agora as crianças trabalham como se eu não existisse. (MONTESSORI, 1949, p.305)

Page 38: Quem é a professora de crianças menores de 6 anos para Maria ...

38

Antes disso ela sentia que era ela que levava as crianças de um nível inferior a

um superior; mas, agora, diante das manifestações do espírito da criança, o valor maior

que pode dar a sua contribuição está expressa nas palavras:

Ajudei esta vida a completar a sua criação. (MONTESSORI, 1949, p.305)

O professor de crianças até seis anos sabe, quando isso acontece, que ajudou a

humanidade num período essencial de sua formação.

Assim a professora, sente seu trabalho e obra terminados numa vida espiritual

pessoal satisfeita. Segundo Montessori para quem não é professor é difícil entender isto.

Muitos acham que é sacrifício, mas o que quase ninguém entende é que não se trata de sacrifício, mas de satisfação, que não é renúncia, mas sim uma vida nova na qual os valores são diferentes, onde existem verdadeiros valores de vida, antes desconhecidos. (MONTESSORI, 1949, p.305)

Para Montessori :

As crianças conduzem-nos a um nível espiritual mais elevado e solucionam os problemas do nível material. (MONTESSORI, 1949, p.307)

Montessori cita um seu livro Mente Absorvente uma espécie de um lembrete e

uma invocação para as professoras:

Ajudai-nos, ó Deus, a penetrar no segredo da criança a fim de que possamos conhecê-la, amá-la e servi-la segundo Vossas leis de justiça e segundo a Vossa divina vontade. (MONTESSORI, 1949, p.307)

Segundo Montessori a professora deve mostrar o caminho da perfeição,

fornecendo os meios e removendo os obstáculos. Algumas vezes a professora pode ser

um obstáculo, por isso exige uma certa atenção do professor.

Para Montessori o trabalho do professor só existe porque a criança não nasce

com disciplina e com isso, o trabalho do professor é discipliná-la, acabar com as

inseguranças das crianças nos obstáculos para que elas consigam ultrapassar essas

dificuldades.

Page 39: Quem é a professora de crianças menores de 6 anos para Maria ...

39

Segundo Montessori, a nossa obra de adultos não consiste em ensinar, mas sim

em ajudar a mente infantil no trabalho do seu desenvolvimento.

Para ela as energias mais elevadas que podiam guiar a criança rumo a uma paz

disciplinada e a uma sabedoria divina estão adormecidas. Cabe ao professor despertá-

las. Tudo que permanece ativo na criança é uma personalidade superficial que se exaure

a si mesma em movimentos descoordenados, em idéias vagas, coma tentativa de lutar

contra repressão dos adultos ou dela escapar.

A escola deve dar ao espírito da criança o espaço e o privilégio para se

expandirem. Ao mesmo tempo a professora deve se lembrar que a reação de defesa e

também as características inferiores que a criança adquiriu são obstáculos preventivos à

manifestação da vida espiritual e que a criança deve liberá-la pessoalmente.

Segundo Montessori (1949, p.284) a sabedoria e a disciplina estão à espera de

serem despertadas na criança. As repressões trabalharam contra ela, porém ela ainda não

se encontra inteiramente estragada e fixada nos seus desvios, e nossos esforços não

serão vãos. A escola deve dar ao espírito da criança o espaço e o privilégio para se

expandirem. Ao mesmo tempo a professora deve se lembrar que a reação de defesa e,

em geral, as características inferiores que a criança adquiriu são obstáculos preventivos

à manifestação da vida espiritual e que a criança deve liberá-la pessoalmente. Esse é o

ponto de partida da educação.

Segundo Montessori o professor para ser eficiente é preciso que tenha:

... poder de distinguir entre os dois tipos de atividade, cada uma das quais tem aparência de espontaneidade, porque em ambos os casos a criança age por vontade própria, mas que têm um significado totalmente oposto. Somente quando a professora tiver adquirido um poder de discriminação pode se tornar observadora e guia. (MONTESSORI, 1949, p.285)

Além disso, quanto à disciplina Montessori afirma que:

... este poder de distinguir o bem do mal é a luz que revela o caminho da disciplina, que conduz à perfeição. (MONTESSORI, 1949, p.285)

Para Montessori a educação:

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Não se trata de lavar a criança se estiver suja, de ajeitar ou limpar suas roupas: nós não servimos ao corpo da criança, sabemos que se a criança deve desenvolver-se, ela deve fazer estas coisas sozinhas: a base do nosso ensinamento é que a criança não seja servida neste sentido. A criança deve adquirir independência de vontade com a escolha própria e livre; independência de pensamento com o trabalho desenvolvido sozinho, sem interrupções. O conhecimento deste fato, ou seja, que o desenvolvimento da criança segue um caminho com sucessivos graus de independência deve ser o guia do nosso comportamento para com ela; devemos ajudar a criança a agir, querer e pensar sozinha. Esta é a arte do servo do espírito, uma arte que pode se expressar perfeitamente no campo da infância. (MONTESSORI, 1949, p.302, 303)

Montessori mostra a necessidade da educação a partir do nascimento e esta deve

ser um período entendido como um auxílio ao desenvolvimento dos poderes psíquicos

inatos no indivíduo humano.

A educação teria que ser uma ajuda à vida, transcender os limites do ensino e da

transmissão direta de conhecimentos, ou de idéias, de uma mente para a outra. Portanto,

o objetivo da educação deve ser o desenvolvimento das potencialidades humanas para

alcançar uma reconstrução do mundo.

Para Montessori a educação:

... não deve estar calcada sobre um programa preestabelecido, mas sim sobre o conhecimento da vida humana.(MONTESSORI, 1949, p.23)

Com isso a educação de crianças recém-nascidas conquista uma grande

importância. Mesmo que ele não pode fazer nada, que não podemos ensinar, no sentido

comum da palavra, e que só pode ser objeto de uma observação e de um estudo é

importante ressaltar que o:

... respeito do desenvolvimento psíquico da criança deve ser amplamente difundido: então, e somente assim, a educação poderá conquistar uma nova autoridade e declarar à sociedade. (MONTESSORI, 1949, p.23)

Segundo Montessori a educação:

... ao invés de continuar ignorada pela sociedade, deve conquistar uma autoridade sobre ela, e a organização social deverá adaptar-se às necessidades inerentes à nova concepção: que a vida deve ser protegida. Todos são

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convocados a colaborar, pais e mães devem assumir sua responsabilidade; porém quando a família não dispuser de possibilidades suficientes, a sociedade deve não apenas ministrar a instrução, mas também prover os meios necessários para educar as crianças. Se a educação significa cuidar do indivíduo, se a sociedade reconhece serem necessários, ao desenvolvimento da criança, determinados meios que a família não tem condições de prover, cabe à própria sociedade fazê-lo, cabe ao Estado não abandonar a criança. (MONTESSORI, 1949, p.23,24)

Portanto:

... a educação se empenhará no sentido de se impor, com autoridade, sobre a sociedade da qual tinha ficado afastada. Se é evidente que a sociedade deve exercer um controle benéfico sobre o indivíduo humano, e se também é verdade que a educação passa a ser considerada como uma ajuda à vida, este controle jamais deverá ser constrição e opressão, mas deverá oferecer um apoio físico e psíquico. Isto significa que o primeiro passo que a sociedade deverá dar será o de destinar meios mais amplos à educação. (MONTESSORI, 1949, p.23,24)

O novo caminho para a educação, segundo Montessori, é ajudar a mente nos

seus diversos processos de desenvolvimento, coadjuvar suas várias energias e reforçar

suas diversas faculdades.

SUGIRO QUE VOCE REESCREVA ESSA PARTE INCORPORANDO-A AO

ITEM CRIANCA, POIS VOCE ACABA POR DESCREVER QUESTOES DO

DESENVOLVIMENTO INFANTIL E DA CONCEPCAO DE INFANCIA DELA

MAS DO QUE FALANDO SOBRE EDUCACAO PROPRIAMENTE DITA. ENTAO

O TRABALHO FICARIA COM DOIS ITENS: CRIANCA E PROFESSOR E A

EDUCACAO APARECERIA DENTRO DOS DOIS SEM CONSTITUIR-SE EM UM

ITEM. PENSO QUE FICARA MELHOR ASSIM PARA O LEITOR.

Considerações Finais

Page 42: Quem é a professora de crianças menores de 6 anos para Maria ...

42

Segundo Saviani (1991, p.8) a Escola Nova, seguida por Montessori, possui um

caráter progressista em relação à Escola Tradicional. Ela segue a proposta burguesa e

articula os elementos progressistas em torno dos interesses dessa burguesia.

Para Saviani (1991, p.8) é dessa forma que a burguesia trava a luta pela

hegemonia procurando subordinar aos seus interessas os interessas das demais classes.

A escola, para Saviani:

... surge como um antídoto à ignorância, logo, um instrumento para equacionar o problema da marginalidade. Seu papel é difundir a instrução, transmitir os conhecimentos acumulados pela humanidade e sistematizados logicamente. O mestre-escola será o artífice dessa grande obra. A escola se organiza, pois como uma agência centrada no professor, o qual transmite, segundo uma gradação lógica, o acervo cultural aos alunos. A estes, cabe assimilar os conhecimentos que lhes são transmitidos. (SAVIANI, 1991, p.18)

Nesse tipo de teoria pedagógica (Escola Tradicional) descrito acima as

iniciativas sempre cabem ao professor e por isso o essencial é contar com um professor

razoavelmente bem preparado. Além disso, as escolas eram organizadas na forma de

classes, cada uma contando com um professor que expunha as lições de maneira que os

alunos seguissem atentamente e aplicava os exercícios que os alunos deveriam realizar

disciplinadamente.

O início desse tipo de escola foi marcado pelo entusiasmo, entretanto, sucedeu,

gradualmente, uma crescente decepção, pois essa escola não conseguiu realizar a

universalização (nem todos nela ingressavam e mesmo os que ingressavam nem sempre

eram bem sucedidos) e, além disso, nem todos os bem sucedidos conseguiram se ajustar

ao tipo de sociedade que se queria consolidar. Assim as críticas aumentam a essa teoria

da educação e a essa escola que passa a receber o nome de Escola Tradicional.

Essas críticas à pedagogia tradicional aos poucos foram dando origem a uma

outra teoria da educação. Essa outra teoria tinha a crença no poder da escola e também

em sua função de equalização social. Portanto, as esperanças de que se pudesse corrigir

a distorção expressa no fenômeno da marginalidade, através da escola, continuaram.

Aos poucos a pedagogia nova começa a efetuar a crítica da pedagogia

tradicional, apresentando uma nova maneira de interpretar a educação e implantando-as

através de experiências restritas e depois generalizando-as no âmbito dos sistemas

escolares.

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Na pedagogia nova a marginalidade deixa de ser vista predominantemente sob o

ângulo da ignorância, isto é, o não domínio de conhecimentos. O marginalizado passa a

ser o rejeitado e não mais o ignorante. O indivíduo está integrado quando se sente aceito

pelo grupo e pela sociedade e não quando é ilustrado.

É interessante ressaltar que Montessori, que foi uma representante da escola

nova, se converteu à pedagogia a partir da preocupação com os “anormais” e assim se

pretendeu generalizar procedimentos pedagógicos para o conjunto do sistema escolar.

Segundo Saviani (SAVIANI, 1991, p.19) nota-se uma espécie de

biopsicologização da sociedade, da educação e da escola. Ao conceito de “anormalidade

biológica” construído a partir da constatação de deficiências neurofisiológicas se

acrescenta o conceito de “anormalidade psíquica” detectada através dos testes de

inteligência, de personalidade etc.

Assim, segundo Saviani (SAVIANI, 1991, p.20) forja-se uma pedagogia que

advoga o tratamento diferencial a partir da “descoberta” das diferenças individuais. Eis

a “grande descoberta”; os homens são essencialmente diferentes; não se repetem; cada

indivíduo é único.

Segundo Saviani, compreende-se então que a maneira de entender a educação,

por referência à pedagogia tradicional:

... tenha deslocado o eixo da questão pedagógica do intelecto para o sentimento; do aspecto lógico para o psicológico; dos conteúdos cognitivos para os métodos ou processos pedagógicos; do professor para o aluno, do esforço para o interesse; da disciplina para a espontaneidade; do diretivismo para o não-diretivismo; da quantidade para a qualidade; de uma pedagogia de inspiração filosófica centrada na ciência da lógica para uma pedagogia de inspiração experimental baseada principalmente nas contribuições da biologia e da psicologia. Em suma, trata-se de uma teoria pedagógica que considera que o importante não é aprender, mas aprender a aprender. (SAVIANI, 1991, p.21)

Para isso era preciso passar a escola por uma sensível transformação. Ao invés

de contratar grandes professores que dominam grandes áreas do conhecimento, que

fazem os alunos assimilarem conteúdos, a escola deveria agrupar os alunos segundo

áreas de interesses decorrentes de sua atividade livre. O professor agiria como um

estimulador e orientador da aprendizagem cuja iniciativa principal caberia aos próprios

alunos. Tal aprendizagem seria uma ambiente estimulante e da relação viva que se

estabeleceria entre os alunos e entre estes e o professor.

Resumindo:

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... a feição das escolas mudaria seu aspecto sombrio, disciplinado, silencioso e de paredes opacas, assumindo um ar alegra, movimentado, barulhento e multicolorido. (SAVIANI, 1991, p.21)

Entretanto, esse tipo de escola não conseguiu alterar significativamente o

panorama organizacional dos sistemas escolares, pois, entre outros fatores, implicava

em custos mais elevados do que a escola tradicional.

Assim a Escola Nova organizou-se na forma de escolas experimentais ou como

núcleos raros destinados a pequenos grupos de elite. Entretanto, esse modelo de escola

nova foi difundido pelos educadores e acabou gerando conseqüências também para as

redes escolares que eram organizadas na forma tradicional. Essas conseqüências foram

mais negativas do que positivas, provocou o afrouxamento da disciplina e a

despreocupação com a transmissão de conhecimentos, rebaixou o nível do ensino

destinado às camadas populares. Mas, em contrapartida, a Escola Nova aprimorou a

qualidade do ensino destinado às elites.

Dessa maneira a escola nova ao invés de resolver o problema da marginalidade,

ela o agravou ainda mais.

Segundo Saviani:

... ao enfatizar a “qualidade do ensino” ela deslocou o eixo de preocupação do âmbito político (relativo à sociedade em seu conjunto) para o âmbito técnico-pedagógico (relativo ao interior da escola), cumprindo ao mesmo tempo uma dupla função: manter a escola em limites suportáveis pelos interesses dominantes e desenvolver um tipo de ensino adequado a esses interesses. (SAVIANI, 1991, p.22)

Montessori, como já foi dito, foi uma das seguidoras dos princípios do

movimento escolanovista. Por fazer parte desse movimento a pedagogia montessoriana

possui vários pontos em comum com o movimento escolanovista. Um deles é a questão

da valorização do sentimento do professor para com o aluno e não sua questão

intelectual. Montessori nas obras “Mente Absorvente” (1949) e “ A criança” (s.d)

destaca a importância do amor e atenção para com a criança. ..

Outro ponto em comum da teoria escolanovista e da pedagogia montessoriana

está relacionado à valorização do aluno e não do professor. Além disso, o professor não

deveria ter um diretivismo para sua prática pedagógica. Segundo Montessori a criança

Page 45: Quem é a professora de crianças menores de 6 anos para Maria ...

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deveria ser livre para escolher o que e quando aprender, independente do professor. A

criança não precisaria se esforçar para aprender algo que não lhe interessasse.

A pedagogia Montessoriana está baseada nesses princípios escolanovistas

visando harmonizar a interação de forças corporais e espirituais, corpo, inteligência e

vontade através de uma educação da vontade e da atenção, com o qual a criança tem

liberdade de escolher o material a ser utilizado e de proporcionar a cooperação

Outra questão é a valorização dos métodos e dos processos pedagógicos ao invés

da valorização dos conteúdos cognitivos. Segundo Montessori o professor deverá

interferir em alguma dificuldade da criança apenas quando solicitado pela própria

criança.

A qualidade da educação também deveria se sobrepor à quantidade beneficiada

por ela. A valorização de uma pedagogia de inspiração experimental baseada principalmente

nas contribuições da biologia e da psicologia ao invés de uma pedagogia de inspiração filosófica

centrada na ciência da lógica.

Resumindo há uma valorização do aprender a aprender, pois no processo de

ensino e aprendizagem o trabalho educativo não é centrado no professor, mas sim no

aluno. Ele mesmo irá construir seu conhecimento. Com isso percebe-se que há um

esvaziamento do trabalho do professor.

Segundo Saviani(1991, p.17) a pedagogia escolanovista está baseada numa

teoria não-crítica. Para Saviani no grupo das teorias não-críticas:

... a sociedade é concebida como essencialmente harmoniosa, tendendo à integração de seus membros. A marginalidade é, pois, um fenômeno acidental que afeta individualmente a um número maior ou menor de seus membros o que, no entanto, constitui um desvio, uma distorção que não só pode como deve ser corrigida. Assim a educação emerge como um instrumento de correção dessas distorções. Constitui, pois, uma força homogeneizadora que tem por função reforçar os laços sociais, promover a coesão e garantir a integração de todos os indivíduos no corpo social. Sua função coincide, pois, no limite, com a superação do fenômeno da marginalidade. Enquanto esta ainda existe, devem se intensificar os esforços educativos; quando for superada, cumpre manter os serviços educativos num nível pelo menos suficiente para impedir o reaparecimento do problema da marginalidade. Como se vê, no que respeita às relações entre educação e sociedade, concebe-se a educação com uma ampla margem de autonomia em face da sociedade evitando sua desagregação e, mais do que isso, garantindo a construção de uma sociedade igualitária. (SAVIANI, 1991, p.16)

Assim, para Saviani, o grupo de teorias não-críticas entendem que a educação é

um instrumento de equalização social, portanto, de superação da marginalidade. Além

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disso, encaram a educação como autônoma e buscam compreendê-la a partir dela

mesma.

Segundo Saviani o ideário da Escola Nova procurava:

... ao mesmo tempo evidenciar as “deficiências” da escola tradicional, dar força à idéia segundo a qual é melhor uma boa escola para poucos do que uma escola deficiente para muitos. (SAVIANI, 1991, p.22)

Ao adotar a educação como prolongamento natural do desenvolvimento da

essência divina do homem, como fez Montessori, não se reconhece o condicionamento

que a consciência do indivíduo sofre diante da vida concreta que ele leva, nem as

motivações sociais que acabam por originar as ilusões. Montessori tinha uma visão

naturalizante da infância, ou seja, uma visão essencialista e idealista, assim como a

Escola Nova.

Segundo Arce :

Vê-se a educação repetir o mesmo papel ideológico que o ideal de família burguesa, infância e maternidade; ignorando-se completamente seu papel histórico, social e político, naturalizam-se as metodologias de trabalho e o papel do professor, que não se caracteriza propriamente como um intelectual. Não por acaso Froebel já considera as mulheres como aquelas que naturalmente estariam aptas para esta função. (ARCE, 2002, p.205)

Assim, deixa de lado o saber da maior parte da população, da cultura produzida

na época, restringindo a educação ao mínimo possível de conhecimentos, usando para

isso do recurso ideológico de que o conhecimento produzido pelos filósofos e

intelectuais de nada vale, a teoria não tem valor para a prática cotidiana das pessoas, o

que vale é aprender o necessário para se viver.

Montessori, assim como Froebel e Pestalozzi contribuem para o fato acima ao

colocar a educação como uma extensão natural do desenvolvimento do homem. Com

isso, não se reconhece o condicionamento que a consciência do indivíduo sofre diante

da vida concreta que ele leva, nem as motivações sociais que acabam por originar as

ilusões

Segundo Arce (ARCE, 2002, p.206), para Suchodolski:

O tema da educação do homem como formação da sua disposição natural fundamenta-se numa ilusão perigosa. Consideram a “natureza humana” como

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ponto de orientação fixo e fundamental para o trabalho educativo. Mas o chamado homem natural não é mais que o produto da sociedade burguesa; isto é, o produto de uma fase temporal da história. O suposto amor desta educação natural pelos homens desmascara-se como reconhecimento da ordem social existente, que criou os homens, quer dizer, que determinou o conteúdo das suas necessidades, hábitos, aspirações e opiniões acerca de si próprio. Esconde, pois, o reconhecimento e a aceitação da sua “natureza” egoísta e individual que aparentemente é eterna e inata. (SUCHODOLSKI, 1976, vol. 2, p.165-166)

Montessori contribui para a descaracterização da profissão do professor, pois no

movimento escolanovista da qual fazia parte, vê-se a transmissão de conhecimentos ser

cada vez menos aquilo que define a identidade profissional do professor, tornando seu

trabalho cada vez mais próximo da maternidade mistificada do que como uma tarefa

intelectual.

Dessa maneira segundo Arce (2002, p.218) o conhecimento científico perde seu

valor, podendo o professor ter o mesmo nível de conhecimentos que seus alunos ou até

inferior, já que é deles que deverá se originar o material para ser trabalhado em sala.

Para a pedagogia montessoriana a mulher e a educação foram criadas para lidar

com o cotidiano doméstico e prover os cuidados necessários para com as crianças. Para

Arce (2002, p. 218) não se poderia encontrar melhor personagem para esta educação.

Segundo Arce:

A atividade do professor, ou melhor, da professora, aproxima-se da idéia de acompanhamento dos processos naturais, tanto que a escola para crianças menores de seis anos torna-se um jardim de crianças e a professora vira uma jardineira de crianças. (ARCE, 2002, p.218)

Dessa forma:

A profissão de professor começa a distanciar-se cada vez mais do ambiente acadêmico, da ciência e da razão, passando a ser povoada pelo irracionalismo e pelos sentimentos, pelos sentimentos estes idealizados e alienados (...) em vez da razão e da ciência a dominarem, vêem-se o sentimento, o subjetivismo e o irracionalismo desenvolverem-se. (ARCE, 2002, p.218)

Dessa maneira, nota-se que realmente está havendo uma volta histórica, pois

ainda no século XXI prescindi-se da formação de profissionais com adensamento

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48

teórico-prático em nome da busca da “tia” com dons naturais para trabalhar com as

crianças. Isso é bastante evidente nos discursos dos Referenciais Curriculares para a

Educação Infantil e no construtivismo. Há uma espécie de manual com passo-a-passo

sobre como ensinar, o que acaba seduzindo a grande maioria dos profissionais da

educação, tornando-os cada vez mais alienados e dominados pela classe dominadora.

Essas novas teorias foram sendo apropriadas pelos professores na ansiedade de

responder a uma falta de valorização do professor como indivíduo que pensa e que é

crítico. Mas, essa prática de apropriação das teorias “da moda” retira do professor a

possibilidade de uma reflexão crítica diante da realidade, ao deixar em segundo plano o

conhecimento científico e filosófico na formação e no trabalho do professor.

A prática da educação infantil, ao contrário do que afirmava Montessori, não

deve ficar restrita apenas à maturação das estruturas psíquicas das crianças e sem a

intervenção e atuação direta e intencional do professor no processo de ensino e

aprendizagem. Não se deve esperar que a criança aprenda espontaneamente, ao

contrário do que dizia Montessori. A idéia de que a criança aprende espontaneamente

acaba por valorizar ainda mais a imagem de que o professor não necessita de muitos

conhecimentos teóricos e metodológicos para a sua prática educativa.

Contrapondo-se à pedagogia montessoriana, ou seja, à pedagogia da existência

(Escola Nova) Saviani (2002, p.49) afirma que cabe ao professor garantir que o

conhecimento seja adquirido, às vezes mesmo contra a vontade da criança, que

espontaneamente não tem condições de enveredar para a realização de esforços

necessários à aquisição dos conteúdos mais ricos e sem os quais ela não terá vez, não

terá chance de participar da sociedade.

Na verdade, dessa forma, o professor estaria apenas trabalhando com

conhecimentos do senso-comum e de sua prática e não com conteúdos críticos e

intelectuais. Os conteúdos teóricos que deveriam ser valorizados se tornam inutilizáveis.

Com isso, há uma contribuição para o esvaziamento do trabalho educativo e,

consequentemente do trabalho do professor.

Através de práticas que visam o esvaziamento do trabalho do professor, a classe

dominante exerce seu poder, alienando e dominando a classe trabalhadora,e assim

reproduz seus ideais políticos e econômicos da sociedade capitalista “democrática”.

Acredito, assim como Facci (2004, p.254), que a solução não se trata de buscar

uma simples somatória, nem um meio termo entre as idéias da pedagogia da essência

(pedagogia tradicional) e a pedagogia da existência (Escola Nova). Na verdade, trata-se

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de uma superação dessas pedagogias na busca de uma nova compreensão e

possibilidade de intervenção na prática pedagógica. Entretanto, sabemos que essa não é

uma tarefa fácil.

É necessário pensar a formação do professor como um processo que promova a

sua própria humanização para além do senso comum e que, na qualidade de membro

atuante na sociedade, possa colaborar com a transformação social, a qual tem como

pressuposto a transformação da sua própria consciência.

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