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Quarto de Hora de Oração

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Quarto de Hora de Oração

Colecção ORAÇÃO E VIDA (títulos mais recentes)

Senhor, Ensina-nos a Rezar (7ª ed.) Dário Pedroso, S.J.Quarto de Hora de Oração (3ª ed.) Henrique de OssóNatal do Meu Coração (3ª ed.) Heitor Morais, S.J.Sinfonias do Amor (3ª ed.) Dário Pedroso, S.J.Se Tu Soubesses o Dom de Deus – Ensaio sobre a oração (3ª ed.) Luís Rocha e Melo, S.J.Rezar com a Bíblia (2ª ed.) Dário Pedroso, S.J.Como Leve Pena... Orar ao Sopro do Espírito Agostinho Tavares, C.S.Sp.Mestre, Onde Moras? – Temas evangélicos acerca da oração Evaristo de Vasconcelos, S.J.A Minha Oração Predilecta Marie-MichelHoje, Senhor... Teresa OlazabalIntimidade com Deus – Rezar e cantar José H. Barros de OliveiraRezar com o Padre Arrupe Selecção e adaptação de José A. García, S.J.Ao sopro do Espírito Paulo Guerra, S.J.O Caminho do Amor Agostinho Tavares, C.S.Sp.A Oração de Jesus – Caminho para a intimidade com Deus (Por um monge da Cartuxa Scala Coeli)Começa assim a tua oração Elias Couto«Vinde ver» Paulo Guerra, S.J.

Henrique de Ossó y Cervelló

Quarto de Hora de Oração

Adaptação de

Maria Vitória Molins, s.t.j.

3ª Edição

COMPANHIA DE SANTA TERESA DE JESUS

TraduçãoTrapa de Santa Maria Marana-tha

CapaRui Ferreira

PaginaçãoEditorial A. O.

Impressão e AcabamentosTipoprado – Artes Gráficas, Lda.

Depósito Legal nº385779/14

ISBN978-972-39-0545-8

3ª ediçãoDezembro de 2014

Com todas as licenças necessárias

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APRESENTAÇÃO

Quarto de Hora de Oração de Santo Henrique de Ossó y Cervelló é o livro que alcançou o maior número de exemplares vendidos pelas Edições STJ. E é-o, porque já em vida do seu autor conseguiu ser um verdadeiro best-seller. Contribuíram para esta difusão, a sua fama de homem de oração e mestre na matéria, o estar vinculado a grupos de jovens pertencentes à Associação de Filhas de Maria e Tere-sa de Jesus, por ele fundada, e o seu entusiasmo apostólico muito conhecido, particularmente na Catalunha, Aragão e Valência. Trata-se de um ver dadeiro método de oração e de uma ajuda eficaz para quantos desejem entrar no mundo da intimidade com Deus através desse meio tão simples como eficaz de «um quarto de hora diário». Publicado, depois, pelas Edições STJ com as conve-nientes adaptações ao nosso tempo, continuou a ter o mesmo êxito de vendas. É espe cialmente querido de todos os que conhecem o carisma teresiano de Santo Enrique de Ossó. Actualmente, a colecção Azenai das Edições STJ (Espanha), compraz-se em inclui-lo entre os seus exem-plares como um livro de ouro da espiritualidade clássica.

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PRÓLOGO À EDIÇÃO RENOVADA

Monserrat, Março de 1998

Obra do sacerdote catalão, Santo Henrique de Ossó, fundador da Companhia de Santa Teresa de Jesus, foi este um dos livros de meditação mais conhecidos, sobretudo nas regiões de Catalunha, Valência e Aragão. A sua fama estendeu-se logo por toda a Espanha e América Latina, constituindo um auxiliar da oração pes-soal de muitos jovens e adultos durante a segunda metade do século XIX e primeiras décadas do XX. Santo Henrique de Ossó, grande conhecedor da es-piritualidade teresiana, sentiu a necessidade de irradiar o carisma de Teresa de Jesus, que não é outro que o da oração. E ensinou a orar a pessoas simples, crianças, jovens, ao povo de Deus, através de uma fórmula que marcou época: «Dai--me um quarto de hora de oração diária e eu prometo-vos o Céu». Uma fórmula que encerra uma grande sabedoria. A oração pessoal é, sem dúvida, o meio mais eficaz para conhecer e amar a Cristo. E esta, sim, foi a verda deira obsessão de santo Henrique de Ossó. Mas, conhe cendo as dificuldades que a maioria dos leigos encontra para arranjar tempo no meio das suas actividades e compromissos, pensou que limitar o tempo da oração seria uma ajuda e um estímu-lo. Quem não pode tirar às vinte e quatro horas do dia, pelo menos, um quarto de hora?

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E foi assim que começou com a fórmula-chave: um quarto de hora, só um quarto de hora. Primeiro, foi a ideia; depois pensou no auxiliar que ajudasse a cumprir aquilo que, para as jovens Teresianas da Arquiconfraria que acabava de fundar, se convertia num compromisso diário. Escreveu, portanto, para elas este li-vrinho: «Quarto de Hora de Oração». Tratava-se de uma série de meditações dispostas por semanas e temas. A primeira parte estava dedicada à meditação – um tanto inaciana – das chamadas «verdades eternas». Não há dúvida de que são a base de um aprofundamento na fé, muitas vezes esquecidas por nós. É bom reavivá-las com o sentido que encontramos no Evangelho, onde Jesus nos fala continuamente do Reino. Dois longos e interessantes «diálogos» com Santa Teresa constituíam a parte teórica do livro de meditações e eram qualquer coisa parecida a uma «Escola de ora ção», segundo o carisma e a experiência da Santa de Ávila. A segunda parte, muito mais longa, abrangia a medi-tação da vida de Jesus e textos do Evangelho. Havia também uma série de meditações sobre Nossa Senhora, os santos, os sacramentos…etc. Finalmente, as «Exclamações» de Santa Teresa, ora­ções belíssimas que a Santa escreveu geralmente para depois da comunhão. À maneira de apêndice, as primeiras edições ofe reciam ainda o que hoje chamaríamos um «Devocionário».

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PRÓLOGO À EDIÇÃO RENOVADA

No ano da canonização de Henrique de Ossó, e como homenagem de gratidão àquele que tem sido mestre de oração de tantas gerações através deste livro, propus-me dedicar muitas horas de esforço à adaptação da maior parte das suas meditações. Eu própria aprendi a orar com «Quarto de Hora de Oração», que foi meu livro de cabeceira durante a infância e adolescência. Tenho por ele um carinho especial. Mas, com o andar dos anos, os estudos teológicos rea lizados no seio da Igreja, tendo pelo meio, sobretudo, o Concílio Vaticano II, muitas das ideias expressas neste livro ficavam longe do que hoje constitui a espiritualidade pós-conciliar. Não se tratava de mudar algumas fórmulas da lin­guagem oitocentista. Esse esforço foi realizado há alguns anos, e é para agradecer às pessoas que o levaram a cabo. Mas já resultava insuficiente. Queríamos fazê­lo chegar ao homem do nosso tempo, numa linguagem teológica, bíblica e pastoral actualizada. Pensei, com isto, cumprir um dever de gratidão filial para com Henrique de Ossó. Creio que voltará a ser lido. E sê­lo­á com as mesmas ideias filtradas pelo que a pas­ sagem do tempo foi acrescentando, tirando ou depu rando de uma experiência de Deus sempre enriquecedora. Não pude reproduzir todas e cada uma das me dita ções. Pareceu-me que algumas podiam conter uma men sagem ininteligível para o homem actual ou achei que já estavam incluídas em meditações anteriores. Mas respeitei a maio ria delas no seu sentido mais profundo. O título de cada medi-

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tação – sempre bíblico –, a introdução e a oração final são acrescentos que procuram explicar e levar à prática o que se ensina nas reflexões da meditação correspondente. Respeitei absolutamente, transcrevendo-as sem qual -quer adaptação, a Dedicatória e a Advertência com que se iniciava o primitivo Quarto de Hora, porque me parecem de grande valor histórico. Se este livro puder voltar a ser um auxiliar e uma aju-da para todas aquelas pessoas que procuram Deus através da prática da oração pessoal, ou para grupos de orantes, sentir-me-ei plenamente satisfeita. Foi esse o único desejo que tive ao tentar «adaptar» a riqueza do pensamento de Santo Henrique de Ossó à linguagem de hoje.

Mª Vitória Molins, s.t.j.

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DEDICATÓRIA

Viva sempre em nós Jesus Cristo

Várias vezes me tendes pedido insistentemente, queridas jovens, um livrinho que, em poucas páginas, vos ajude na prática importantíssima da Oração mental e vos proporcione matéria adequada para viver provei to sa mente, todos os dias, um «Quarto de Hora de meditação» que vos prescreve, como a tarefa mais essencial, o Re gulamento da Associação Teresiana. Não vacilei um único momento em empreender este trabalho a fim de satisfazer o vosso legítimo pedido, confian-do não nas minhas pobres forças e escassas luzes, mas na graça de Jesus e na ajuda de Teresa, sua grande apaixonada, ambos Mestres de oração. No entanto, deixei o começo desta obra para estes dias de retiro e solidão em que, afastado do bulício do mundo e da confusão dos negócios, poderei consagrar-me melhor a esta ocupação. Aqui, à sombra da protecção de Teresa de Jesus, sob o tecto desta sua privilegiada casa de oração, rodeado de almas boas que se ocupam constantemente em orar, a nossa querida madre Teresa de Jesus inspirar-me-á, para provei-to espiritual comum, coisas que, sem estas cir cunstâncias, talvez nunca me tivessem lembrado. Além disso, tudo me convida a orar neste santo retiro: o cantar dos passarinhos,

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o arrulho da rola; a torrente cristalina das fontes; o sussurro ritmado das folhas nos bosques que a brisa do mar levanta ao movê-las; a paisagem desse mar tranquilo que se estende a meus pés como uma alcatifa prateada; a pureza do céu raramente turvado pelas nuvens. Tudo isto eleva sem esforço a alma à região serena do mundo da fé. Oh, se soubesses orar como deveríamos, minhas que-ridas jovens em Jesus Cristo, depressa seríamos santos! Com quanto interesse promoveríamos os interesses de Jesus! Ensinai-nos, portanto, a orar, Bom Jesus, Tu, que en-sinastes os humildes apóstolos. Nós To pedimos por Maria, por José, por Teresa de Jesus! Cada página, cada linha, cada palavra deste livro, estão consagradas a Ti. Abençoa-as, pois, Jesus, para que dêem abundantes frutos de santidade estas flores apa nhadas no jardim solitário de Teresa, durante horas de paz deliciosa. Assim seja, jovens católicas! E, desejando-vos, em Jesus, mil felicidades, juntamente com a mais preciosa de todas – o saber orar –, encomenda-se às vossas orações aquele que vos estima em Jesus

Henrique de Ossó, sacerdote

Santo Deserto de Las Palmas, dia consagrado a Santa Teresa de Jesus, 15 de Julho de 1874.

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ADVERTÊNCIA

Este livro, várias vezes chamado «precioso» pelo célebre missionário P. Mach, e que tanto fruto produz nas almas, foi consideravelmente aumentado nesta novíssima edição, a pedido de alguns amigos… Como – segundo o conselho de Santa Teresa que diz: «desapega o teu coração das criaturas, procura e encontrarás Deus», todo o fruto da oração se orienta a conhecer­nos a nós mesmos e as criaturas a fim de nos desprezarmos e conhecermos Jesus Cristo para O amar mos e torná-Lo conhecido e amado sobre todas as coisas – as três primeiras semanas tratam das verdades da via purga-tiva, enca minhadas a convencer-nos da nossa pobreza e do desprezo das coisas criadas; as seguintes giram sobretudo à volta de Jesus Cristo, que é o caminho, a Verdade e a Vida das nossas almas, o Pão vivo que desceu do Céu e que as alimenta e fortalece. E, como o pão é o alimento principal, assim a vida, a paixão, morte, ressurreição e glória de Jesus Cristo, devem ser a matéria preferida e mais habitual da nossa meditação. Finalmente, como este livro se dirige, em primeiro lugar, às jovens da Associação Teresiana e está inspira do no espírito de Maria Imaculada e Teresa de Jesus, ofere-cemos algumas meditações sobre estas duas Mães, a fim de estimular a imitação das suas virtudes, e dois diálogos deliciosos tirados à letra das obras de Santa Teresa, em que

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ela instrui uma das suas filhas sobre os pontos fundamentais da oração. Que o Céu abençoe o nosso humilde trabalho e pro-duza abundantes frutos de santidade em todos os que dele se sirvam na meditação, tal como desejamos e suplicamos a Jesus. Peço, por caridade, uma Avé Maria aos devotos da Santa, para que cresçam cada dia no conhecimento e amor do Jesus de Teresa e da Teresa de Jesus.

O Autor

Dezembro de 1884

PRIMEIRO DIÁLOGO

ENSINAMENTOS DETERESA DE JESUSSOBRE A ORAÇÃO

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Teresa de Jesus, Doutora da Igreja, é consideradacomo mestra de oração. Num diálogo imaginário,Henrique de Ossó pôs na boca da grande doutora

mística uma série de ensinamentos que podem muito bem ser um auxiliar teórico-prático para

a oração pessoal ou para uma «Escola de oração». Vamos apresentá-las com a devida adaptação

ao momento actual.

Discípulo: Madre Teresa, venho pedir-te que me en-sines a orar. Não sei fazê-lo e disseram-me que és mestra de oração. Teresa de Jesus: Muito me agrada o teu desejo de orar. Mas não foste muito acertado quanto à escolha de mestre… D: Como? A Igreja não te declarou Doutora e…? T: O verdadeiro Mestre é Aquele que me ensinou, Jesus. Se bem que, «muitas vezes, tomei como mestre o glorioso São José». D: De acordo: manter-me-ei sempre junto do Mestre e pedirei ajuda a São José; mas gostaria de ouvir as tuas palavras, a tua experiência sobre este tema da oração. T: Muito bem! Para já, há duas maneiras de orar: oração mental e oração vocal. A mental não é mais que uma consideração mediante a qual a alma, posta na presença de Deus, adverte com quem fala, o que pede e quem é quem pede e a quem pede. A vocal é a que se faz mediante a voz e a palavra. Aqui, vamos tratar unicamente da oração mental. Porque a vocal termina com a mental.

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D: Mas eu tenho ouvido muitas vezes que basta a oração vocal… E dá-me a impressão de que isso da oração mental é coisa de monges e de gente retirada do mundo. T: Repara bem: a própria oração vocal, para que seja verdadeira oração, «tem de ser pensada; porque, se uma pessoa está a rezar sem advertir com quem fala e o que está a dizer, pouco tem de oração, mesmo que mexa muito os lábios. Algumas vezes é capaz de o ser, mas quem tiver o costume de falar com Deus distraidamente é como a pessoa que numa conversa só dissesse o que lhe vem à boca…». Por isso, para rezar bem vocalmente tenho de fazê-lo mentalmente, isto é, dando-me conta do que estou a dizer. D: Mas, para dizer a verdade, eu tenho receio de me meter neste campo da oração. Sim, não sei porquê, mas tenho medo… T: Não deves fazer caso desses medos e perigos; «é caminho real e seguro para o Céu, pois Jesus, nosso mestre, foi por esse caminho, assim como os santos e escolhidos de Deus». Digo-te mais: a pessoa que não fizer oração já não há demónio que a tente: ela própria, sem se dar conta, cairá num autêntico perigo. D: Achas, então, que é preciso fazer oração? T: Sim, se quiseres viver perto de Deus. Falo-te por experiência. Ter oração é coisa que nos dá vida. Experimenta e poderás comprová-lo por uma experiência confortante. A pessoa que perseverar na oração está salva… Pouco poderá nela o tentador. D: Porquê?

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T: Porque é possível ter muitas devoções e até con-fessar-se, comungar e rezar muitas orações, e viver afastado de Deus. Mas fazer oração e continuar longe d’Ele, é im pos-sível. Por isso se encontram tantas dificuldades interiores e exteriores para fazer oração. D: Bom, quero mesmo fazer o propósito de orar dia-riamente. T: Em primeiro lugar, «deverás convencer-te, ao iniciar a oração, que começas a plantar um jardim em terra muito infrutífera e cheia de ervas daninhas. E que o fazes para agradar ao Senhor. Deus irá arrancando as ervas daninhas e plantando as boas. Por isso, com a ajuda de Deus, deves procurar que cresçam essas plantas e regá-las para que não murchem, mas venham a dar flores que exalem muito perfu me com que o Se nhor se deleite. Deste modo, Ele virá descansar no seu jar dim… Imaginemos que já está feito quando se começa a fazer oração, ou pelo menos a pessoa já se resolveu a fazê-la. Mas, agora, tens de cair na conta de que, se quiseres per severar nela e chegar a beber a água da vida eterna (e digo-te que isto é muito importante e é tudo), tens de ter uma grande e muito determinada determinação de não parar até chegar a ela, venha o que vier, aconteça o que acontecer, trabalhe-se o que se trabalhar, murmure quem murmurar. Quer se che-gue lá quer se morra pelo caminho. Ainda que o mundo se afunde. Porque são tantas as coisas que o demónio põe nos princípios para que a pessoa não comece a fazer oração, que é preciso uma grande determinação.

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D: Está bem, mas eu, se bem que fraco e pobre, estou disposto, com a ajuda de Deus, a não voltar atrás neste ca-minho da oração… T: Olha, volto a dizer-te que é muito importante come-çar com esta determinação de não deixar a oração, porque contra isto nada pode o espírito do mal que tem medo das «almas determinadas». Em contrapartida, se vê algumas de espírito indeciso e que mudam continuamente, não as deixa em paz. Para te oferecer uma comparação, é como alguém que está numa batalha, que sabe que, se o vencerem, não lhe per-doarão a vida e que, se não morrer na batalha, morrerá depois dela, ao cair prisioneiro. Então, luta com mais determinação e quer vender cara a sua vida e não teme os golpes, porque pensa que só lhe importa a vitória, e que a vida, para ele, está em vencer. D: Sim, pois eu quero vencer esta batalha, e mesmo que reconheça a minha inconstância, confio em Deus que me conforta. T: Mais outra advertência. Se bem que é verdade que esta «determinação» é muito importante. não deixes de começar o caminho da oração mesmo que te pareça que não tens essa grande determinação, porque o Senhor te irá aper feiçoando, embora não faças mais do que dar o primeiro passo. Deus ajudar-te-á a que vás perdendo o medo. Deus é tão cuidadoso que não deixa nenhum esforço nem desejo sem paga. Por isso, mesmo que depois não seguisses este caminho da oração, o pouco que tenhas andado por ele te

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dará luz para ires por outros… Além disso, o bem nunca faz mal. Portanto, começa desde hoje este «quarto de hora» de oração e não te desanimes. D: Sim, antes quero perder tudo do que a vontade e a determinação de orar. T: Pois bem, já que vejo a tua boa vontade, vou falar-te agora do fim que deves propor-te ao orar. O fim de toda a oração não pode ser outro que fazer, depois, obras em que se demonstre o amor que tens a Deus. Ou seja, crescer no amor. E portanto convém que não po-nhas o teu fito só em rezar e contemplar, porque, se depois não te exercitas nas virtudes, não crescerás no amor. Ficarás sempre anão. E Deus queira que não se trate mais do que não crescer… Porque, neste caminho, quem não cresce, mingua, porque acho impossível que o amor esteja sempre na mesma, quero dizer, sem ir crescendo sempre. Por outra parte, o proveito da oração não está em pensar muito, mas em amar muito. E este amor só se adquire determinando-se a obrar e a padecer por Deus. É este o verdadeiro fruto da oração. Por isso, toda a disposição de quem começa a orar é trabalhar e determinar--se e dispor-se a fazer e a conformar a sua vontade com a de Deus, e nisto consiste toda a perfeição que se pode alcançar na vida espiritual. D: Quer dizer que, com a oração, irei arrancando estas ervas daninhas do jardim, de que me falavas ao princípio? T: Sim, mas há mais. Deve-se ter prudência. Porque, às

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vezes, há quem, ao começar este caminho da oração, tem uma espécie de falsa humildade e corta as asas do espírito. Parece--lhes que é humildade não perceber que o Senhor lhes vai dando graças e os vai transformando. Temos de compreender que Deus nos dá tudo, sem nenhum mere cimento da nossa parte, e agradeçamos-lho muito, porque, se não reconhece-mos o que recebemos, não nos esti mu laremos a amar, e é muito verdade que, quanto mais virmos que estamos ricos, mesmo sabendo que somos pobres, mais proveito teremos, e também mais verdadeira humildade. De resto, é acobardar o espírito pensar que não somos capazes de grandes bens para os quais fomos feitos. Além disso, é impossível ter coragem para grandes coisas quem não dá conta de que é muito favorecido por Deus. D: Obrigado, Teresa de Jesus, por estas grandes lições sobre a oração e sobre as graças que Deus nos pode oferecer sem qualquer mérito da nossa parte. T: E, agora, quero também falar-te das dificuldades. Porque o Senhor deseja provar o nosso amor. Refiro-me às securas e distracções. Na oração, umas vezes sentir-te-ás muito bem e consolado, outras terás grande secura, aridez e distracção. No princípio, é normal que tenhas muito trabalho em regar essas flores de que te falava, regando-as como se tirasses água de um poço. Depois, se perseverares, já será um pouco mais fácil. Como quem começa a regar tirando a água com a nora. Mais tarde, o Senhor abrir-te-á um regato para que as regues, ou talvez te mande chuva do céu e regará

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o teu jardim ou horto sem nenhum trabalho da tua parte. O que muito importa é que, nesses princípios, não faças caso de securas nem de distracções. Começa por não te assusta-res com a cruz e verás como o Senhor te ajuda a levá-la. As distracções nascem da nossa imaginação, esta louca da casa, que importuna como uma dessas borboletas da luz, que não para nunca quieta, sempre de um lado para outro, sem poisar em nada. Às vezes, é verdade, nascem da tua infidelidade e cobardia, ou de que o teu coração está demasiado afeiçoado às criaturas e voa sempre para onde está o seu tesouro… Outras vezes, talvez se trate de indisposição corporal. Mas, se começares por não fazer muito caso de consolações ou desolações, terás andado, em grande parte, o caminho, co-meças o edifício com firme alicerce. Porque o amor de Deus não está nos gostos e ternura, mas em servi-Lo com grande rectidão, fortaleza de ânimo e humildade. D: Parece-me, Madre Teresa, que é importantíssimo isto de ter ânimo e de não se deixar levar pelas dificuldades. T: Assim é, de facto. Ânimo e confiança em Deus. Âni-mo para perseverar. Confiança para saber que sem Ele nada podemos da nossa parte. Sim, procura ter grande confiança em Deus, que Ele ajuda os forte e é amigo das almas corajo-sas, se procedem com humildade e sem qualquer confiança em si mesmas. Pedro não perdeu nada em se ter lançado ao mar, embora depois tivesse medo, porque ninguém pôde roubar-lhe a alegria de ter andado um pedaço sobre as águas, e ter recebido depois a ajuda de Jesus, que lhe deitou a mão quando se ia afundar.

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D: Estou a ver que isto da oração tem muitas difi-culdades e precisa-se de ajuda… T: Sim, e deves procurá-la numa pessoa com expe-riência. E tratar das coisas com simplicidade e franqueza de alma, para não te enganares. D: Realmente não é fácil orar. E menos ainda quando se está metido numa sociedade e num ruído que não ajudam. T: É bom, na verdade, procurar a solidão, se te for possível, como fazia o próprio Jesus. Mas não penses que só no retiro se encontra Deus. «Também entre as panelas anda o Senhor». Em qualquer sítio e num momento determinado te podes recolher no teu íntimo e, ali, falar a sós com Ele, simplesmente, sem grandes orações ou considerações. De qualquer modo, ajuda muito procurar momentos de solidão para fazer um «Quarto de hora de oração» e recolher-te. D: Isso de «recolher-me»… acho que é um exercício muito difícil, e não sei exactamente como se consegue. T: Bom, vou servir-me, como tantas vezes, de uma comparação: façamos de conta – continuando com a imagem do castelo interior que já conheces – de que estes sentimentos e potências, que eu disse que são as pessoas do castelo, se foram embora e andam com gente estranha, inimiga do bem deste castelo, durante dias e anos; mas, ao notarem a sua perdição, foram-se aproximando e já andam rondando por ali. Até que, o grande Rei, que está no centro do castelo, ao ver que têm boa vontade, deseja trazê-los a Si pela sua grande misericórdia. E, como bom pastor, com um assobio tão suave

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que eles próprios quase não ouvem, faz que conheçam a sua voz e que não andem tão perdidos, mas que voltem para a sua morada. E tem tanta força este assobio do pastor que, deixadas todas as coisas exteriores, se metem no castelo. Às vezes é preciso ajudar-se lendo algum livro. Eu fui ami ga deles, sobretudo dos Evangelhos, que sempre me ajudaram mais a recolher-me do que os livros muito bem escritos. Outras vezes, temos de inventar outros meios. É o que eu fazia. Durante muitos anos, na maior parte das vezes, à noite, antes de dormir, quando me encomendava a Deus, pensava por uns instantes nu ma passagem da oração no Horto. D: E não te cansavas de meditar sempre na mesma coisa? T: Não; penso que, por este meio, a minha alma ga-nhou muito, porque comecei a habituar-me a fazer oração diariamente, mesmo que fosse um bocadinho. D: O que me custa, na maior parte das vezes, é co-meçar a oração. Pôr-me em oração quando estou metido noutras coisas. T: É que a oração também requer preparação. Convém que saibas que orar é entrar numa relação de amizade com quem sabemos que nos ama. E tens de fazer a mesma coisa que costumas fazer quando tratas de amizade com as pes-soas. Não se consegue a intimidade sem alguns requisitos. Numa conversa, há habitualmente um cumprimento, uma pre paração, umas condições, até que se entra em intimidade e se consegue uma certa familiaridade. E isto é o que agrada

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ao Senhor: ver-Se tratado com simplicidade. Como um filho fala com o pai ou um amigo com outro. Eu até chegava às vezes a dizer-Lhe tolices ou a queixar-me a Ele… Talvez te ajude esta oração – que não é preciso que a digas exa cta-mente –, mas que pode dar-te uma ideia dos sentimentos e preces que nos preparam para a oração.

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ORAÇÃO PREPARATÓRIA

Omnipotente Deus e Senhor,meu Pai, que me amas, eu creio que, pela tua imensidade,estás presente em toda a parte,que estás aqui, dentro de mim,no íntimo do meu coração,vendo os mais ocultos pensamentos e afectos da minha alma,sem poder esconder-me do teu divino olhar.

Adoro-Te com a mais profunda humildade e reverência,desde o abismo da minha miséria e do meu nada,e peço-Te perdão de todos os meus pecados,que eu detesto com toda a minha alma,e imploro a vossa graçapara fazer com proveitoeste «quarto de hora de oração»,que ofereço para Tua maior glória.

Pai Eterno,ensina-me a orar,a fim de me conhecer e conhecer­Te,para sempre Te amare fazer-Te sempre conhecer e amar.Ámen.