QUALIDADE MICROBIOLÓGICA DA FARINHA DE MANDIOCA … · À Fapesb pelo financiamento do Projeto de...
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE FARMÁCIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA DE ALIMENTOS
QUALIDADE MICROBIOLÓGICA DA FARINHA DE
MANDIOCA DO TIPO COPIOBA ARTESANAL E
COMERCIALIZADA EM SUPERMERCADO DURANTE O
ARMAZENAMENTO
CANDICE VIEIRA BRAGA NEGREIROS
SALVADOR – BA 2014
CANDICE VIEIRA BRAGA NEGREIROS
QUALIDADE MICROBIOLÓGICA DA FARINHA DE
MANDIOCA DO TIPO COPIOBA ARTESANAL E
COMERCIALIZADA EM SUPERMERCADO DURANTE O
ARMAZENAMENTO
Orientador (a): Profa Dra. Alaíse Gil Guimarães
Dissertação apresentada à Faculdade de Farmácia da Universidade Federal da Bahia, como parte das exigências do Programa de Pós-Graduação em Ciência de Alimentos, para obtenção do título de Mestre.
Salvador – BA 2014
Sistema de Bibliotecas da UFBA
Negreiros, Candice Vieira Braga. Qualidade microbiólogica da farinha de mandioca do tipo copioba artesanal e comercializada em supermercado durante o armazenamento / Candice Vieira Braga Negreiros. Ferreira. - 2014. 55 f.
Orientador: Profª Drª Alaíse Gil Guimarães. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Farmácia, Salvador, 2012. 2014.
1.Farinha de mandioca. 2. Segurança alimentar. 3. Alimentos - Qualidade. 4. Casa de . farinha. 5. Alimentos - Microbiologia. I. Guimarães, Alaíse Gil. II. Universidade Federal da Bahia. Faculdade de Farmácia. III. Título. CDD - 664.23 CDU - 664.71
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho: Ao meu esposo Luiz Antonio pelo amor, carinho, apoio constante e incentivo que foram essenciais para realização deste trabalho. Aos meus pais: Helena e Blitz por todos os valiosos ensinamentos e pelo amor que foram fundamentais na minha formação.
AGRADECIMENTOS
À Deus pela vida, oportunidade, inteligência e discernimento. Aos meus pais: Blitz e Helena pela educação, incentivo, amor e por apoiar em todos os momentos da minha vida. Ao meu esposo Luiz Antonio pela cumplicidade, dedicação, compreensão, amor e apoio na realização do mestrado. Às minhas irmãs Lívia e Thaís pelo carinho, amor e amizade. À profª Alaíse pela oportunidade, disponibilidade, ensinamentos e orientação durante a realização do trabalho. Obrigada pela amizade e compreensão nos momentos de dificuldade. À amiga Andréia Seixas pelos ensinamentos valiosos de microbiologia, paciência e amizade durante toda esta jornada. Aos amigos Vanessa, Adrielle, Lindanor, Margareth, Márcia, Ícaro e Luciane pela amizade, companheirismo e alegrias tornando tudo mais fácil e leve. Aos colegas Luciane, Márcio Inomata, Samantha, Andrea Lobo, Jaff Ribeiro, Ingrid, Tamires e Vânia pela disponibilidade e ensinamentos. À Capes pela concessão da bolsa de estudos. À Fapesb pelo financiamento do Projeto de Indicação Geográfica. À comunidade de Nazaré pela contribuição nas pesquisas de campo. As estagiárias pelo auxílio na execução das atividades laboratoriais: Mariana, Lorena, Jéssica, Palloma e Marcele cada uma com sua parcela de contribuição. As professoras Ryzia, Janice, Rogéria, Denise e Teresa pelo aprendizado ao longo do curso. Aos funcionários da UFBA: Sr. Manuel, Sra. Célia, Sra. Nice, Cezinha, Galindo, Gerson pelos serviços prestados ao laboratório. À todos que de alguma maneira participaram da realização deste trabalho os meus sinceros agradecimentos.
SUMÁ RIO
INTRODUÇÃO GERAL .......................................................................................... 9
OBJETIVOS ......................................................................................................... 12
OBJETIVO GERAL .............................................................................................. 12
OBJETIVOS ESPECÍFICOS ................................................................................ 12
CAPÍTULO 1: REVISÃO BIBLIOGRÁFICA .......................................................... 14
1 FARINHA DE MANDIOCA: DA MATÉRIA-PRIMA AO PRODUTO FINAL .... 14
1.1 A Mandioca................................................................................................. 14
1.2 Processo produtivo da farinha de mandioca .............................................. 16
2 NOTORIEDADE DA FARINHA DO VALE DO COPIOBA .............................. 18
2.1 Nazaré e a farinha de copioba.................................................................... 18
3 QUALIDADE MICROBIOLÓGICA DO PRODUTO ........................................ 22
3.1 Legislação .................................................................................................. 22
3.2 Bacillus cereus ........................................................................................... 23
3.3 Coliformes termotolerantes ........................................................................ 24
3.4 Salmonella spp ........................................................................................... 25
3.5 Bolores e Leveduras e Bactérias aeróbias mesófilas ................................. 26
4 SEGURANÇA SANITÁRIA ASSOCIADA À VIDA DE PRATELEIRA DO PRODUTO ........................................................................................................... 26
5 MERCADO CONSUMIDOR DA FARINHA DE MANDIOCA .......................... 29
CAPÍTULO 2: INDICADORES MICROBIOLÓGICOS DE QUALIDADE DA FARINHA DE MANDIOCA COPIOBA ARTESANAL E COMERCIALIZADA EM SUPERMERCADO DURANTE O ARMAZENAMENTO ....................................... 38
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................... 41
2 MATERIAL E MÉTODOS .............................................................................. 43
2.1 Descrição do estudo ................................................................................... 43
2.2 Amostras de farinha ................................................................................... 43
2.3 Análise das amostras ................................................................................. 44
2.4 Tratamento estatístico dos dados ............................................................... 45
3 RESULTADOS E DISCUSSÕES ................................................................... 46
4 CONCLUSÃO ................................................................................................ 52
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................. 53
RESUMO
A farinha de mandioca é um produto obtido pelo processamento da mandioca (Manihot esculenta) e muito consumido e valorizado na região Nordeste do Brasil. A Bahia merece destaque na farinha de mandioca tipo “copioba” que conquistou notoriedade perante as demais devido à qualidade sensorial superior, e tem conquistado os consumidores da região. Em geral, ela é produzida em “casas de farinha” que possuem estrutura bastante rudimentar de equipamentos e utensílios e precárias condições higiênico-sanitárias. Desta maneira, o objetivo deste trabalho foi conhecer o perfil microbiológico das farinhas de mandioca tipo copioba produzidas artesanalmente (adquiridas diretamente das casas de farinha) e as comercializadas em supermercado, durante o período de 180 dias simulando
as condições de armazenamento. Análises de coliformes a 45C, Bacillus cereus, bolores e leveduras, bactérias aeróbias mesófilas e pesquisa de Salmonella spp. foram realizadas, e os resultados comparados com a legislação vigente no Brasil. A contagem de bolores e leveduras e a de bactérias aeróbias mesófilas variou entre - o g para a maioria das amostras. Salmonella spp. não foi detectada em nenhuma das amostras pesquisadas e coliformes termotolerantes mostraram valores < o g. Bacillus cereus estavam presentes em 57% das amostras, sendo que 14,30% do total das adquiridas em supermercados estavam fora dos parâmetros exigidos pela legislação. As farinhas de mandioca de copioba apesar das condições insatisfatórias de higiene na produção apresentaram qualidade sanitária satisfatória. A etapa de torração (utilização de altas temperaturas no forno) no processo de fabricação da farinha atrelada à característica do produto de baixa atividade de água, podem ter contribuído com valores baixos de contaminação e redução do número de micro-organismos. Os testes Mann-Whitney e teste-t mostraram que os níveis de contaminação de farinha de mandioca entre as variáveis: supermercado e casas de farinha não diferiram significativamente (p > 0,05). Ao final de 180 dias de armazenamento as farinhas artesanais apresentaram qualidade microbiológica superior quando comparadas com as adquiridas em supermercado, apresentando 100% das amostras em acordo com os padrões exigidos pela legislação, enquanto que as de supermercado apresentaram 14,30% fora dos limites permitidos para Bacillus cereus. Palavras-chave: Casa de farinha. Qualidade dos alimentos. Produção artesanal. Segurança alimentar.
ABSTRACT
The cassava flour is a product made from processing cassava (Manihot esculenta) and widely consumed and valued in the Northeast region of Brazil. Bahia state has a special distinction in cassava from “copioba” sort that gained fame and notoriety when compared to others because of its superior quality, and it has conquered consumers of the region. The cassava flour is usually produced in the “House of flour” that has a rudimentary structure of equipment and utensils, and inadequate sanitary and hygienic practices. Thus, the aim of this study was to know the microbiological profile of cassava flour copioba sort made from artisanal (acquired directly from house of flour) and commercialized in supermarkets, during 180 days
simulating the storage conditions. Analysis of coliforms at 45C, Bacillus cereus, molds and yeasts, aerobic mesophilic bacteria counts have been done, and Salmonella spp. research were performed and the results were compared with present legislation of Brazil. The count of yeasts and molds and total aerobic esophilic bacteria ha results ra i fro - lo g on most samples. Salmonella was not detected in any of the samples studied and thermotolerant coliform showed alues lo g. Bacillus cereus were detected in 57% cassava flour samples, and 14,30% of the total purchased in supermarkets were higher than the maximum value allowed by the Brazilian legislation. The flour of cassava copioba despite the unsatisfactory conditions of production has satisfactory sanitary quality. The roasting stage (use of the high temperatures in the stove) in the process of manufacturing flour related to product feature low water activity, may have contributed to low levels of contamination and reduction of microorganisms. The Mann-Whitney test and t-test showed that the levels of contamination of cassava flour between the variables: “supermarket” and “artisanal” did not differ significantly (p > 0,05). The results showed that at the end of 180 days of storage the artisanal flours showed superior quality compared to those acquired in the supermarket in 100% in accordance to the standards required by legislation, while the supermarket one of the samples showed 14.30% outside the allowed limits. Keywords: House of flour. Food quality. Artisanal production. Food safety.
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INTRODUÇÃO GERAL A cultura da mandioca exerce importante papel no cenário agrícola
nacional e internacional, tanto como fonte de energia para a alimentação humana
e animal, quanto geradora de emprego e de renda, principalmente nas regiões
Norte e Nordeste do Brasil (ARAÚJO; LOPES, 2009).
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (2013)
a produção nacional da cultura de mandioca, na safra de 2012, foi de 23,4
milhões de toneladas. Dentre as regiões produtoras, a Norte e Nordeste se
destacam com 33,1% e 25,5% respectivamente. Entre os Estados com maior
destaque, a Bahia é o terceiro maior produtor com participação de 9,4% do total
nacional, ficando atrás apenas do Pará (20,5%) e Paraná (16,7%).
As regiões Norte e Nordeste do Brasil guardam uma forte semelhança
quanto ao uso da mandioca, que é destinada basicamente ao consumo humano,
através de vários produtos como: farinha, beiju, polvilho doce e muitos outros
pratos típicos extraídos da principal matéria prima que é a raiz ou as folhas
usadas nas mais diversas culinárias (PARANÁ, 2013). O processamento das
raízes acontece nas chamadas “Casas de farinhas” ou pequenas farinheiras como
são regionalmente conhecidas, dedicadas à produção de farinha de mandioca,
tanto seca quanto d’á ua (SEBRAE, 2008).
No Brasil, segundo dados do IBGE, o consumo alimentar médio per
capita de farinha de mandioca é de 11,8 g/dia. Contudo, regionalmente, esse
consumo em g/dia é de: 46,2 para a região Norte; 11,5 para a Nordeste; 0,8 para
a Sudeste; 0,2 para a Sul e 0,5 para a Centro-Oeste. Essa pesquisa mostra que a
soma do consumo das regiões Norte e Nordeste corresponde a 97,4% do total
nacional (IBGE, 2011).
Além do forte consumo e produção da região Nordeste, a Bahia
merece destaque na produção de farinha de mandioca da região do Vale do
copioba (pertencente aos municípios Nazaré, São Felipe, e Maragogipe) onde
surgiu à denominação popular farinha de copioba, designada às farinhas que se
sobressaiam em qualidade sensorial dentre os mais diversos tipos de farinhas de
mandioca existentes no mercado (SANTOS, 2003).
Muitos produtos agroalimentares se diferenciam pela sua qualidade ou
sua reputação devidas, principalmente, a sua origem (o seu lugar de produção).
10
Essas diferenças podem estar ligadas a um gosto particular, uma história, um
caráter distintivo provocado por fatores naturais (como clima, temperatura,
umidade, solo, etc.) ou humanos (um modo de produção, um saber fazer).
Ao longo dos anos, algumas cidades ou regiões ganham fama por
causa de seus produtos ou serviços. Quando qualidade e tradição se encontram
num espaço físico, a Indicação Geográfica (IG) surge como fator decisivo para
garantir a diferenciação do produto. O selo IG reconhece reputação, qualidade e
características que estão vinculadas ao local. Como resultado, comunica-se ao
mundo que determinada região se especializou e tem capacidade de produzir um
artigo diferenciado e de excelência (INPI, 2012).
Em alguns casos, como na região do vale do copioba os produtores
das casas de farinha juntamente com algumas instituições parceiras, estão se
organizando para valorizar as características atribuídas à farinha de mandioca
tipo copioba da região, mobilizando para adquirir um direito de propriedade
intelectual: a Indicação Geográfica atrelando assim, a qualidade do produto à
região que se produz.
A IG permitirá a preservação das características sensoriais do produto
bem como sua reputação e valorizá-las pelos consumidores. Dessa forma, o selo
de qualidade adquirido poderá ser utilizado como estratégia para valorização do
produto artesanal, e como consequência o aumento do valor agregado. O
consumidor por sua vez, adquire confiança no produto e tem segurança ao
comprar um produto de qualidade confiável (MAPA, 2013).
O Vale do Copioba é um dos potenciais no Estado da Bahia na busca
pelo selo de qualidade IG devido sua notoriedade conquistada na região, porém
esta característica não garante sucesso para o reconhecimento. Antes da
solicitação do pedido IG, existe uma série de requisitos que devem ser cumpridos
e essenciais para caracterização e identidade do produto, entre estes a qualidade
microbiológica, que permitirá a avaliação do mesmo no âmbito sanitário
possibilitando informações que podem ou não garantir a segurança para os
consumidores.
Em mercados e redes de supermercado de Salvador encontra-se
variedade de marcas de farinha de mandioca com denominação copioba, porém a
qualidade sanitária não é conhecida. Como ainda não existe legislação quanto à
vida de prateleira deste tipo de produto, é comum encontrar embalagens com
11
variação de 180 dias (seis meses) e 360 dias (um ano) de validade para o
produto.
Neste contexto, surgiu o interesse em conhecer e, avaliar a qualidade
microbiológica das farinhas de copioba da região do Vale do copioba (produzidas
artesanalmente) e as comercializadas em redes de supermercado, possibilitando
a comparação entre estes dois grupos e verificar a adequação das mesmas frente
aos padrões microbiológicos de qualidade exigidos pela legislação brasileira
vigente, contribuindo assim para a caracterização e conhecimento da identidade
destes produtos, bem como oferecer estes resultados para subsidiar o pedido de
Indicação Geográfica para a região.
12
OBJETIVOS OBJETIVO GERAL
Avaliar a qualidade microbiológica das farinhas de mandioca tipo
copioba produzidas artesanalmente e a compradas em supermercado, durante o
armazenamento em condições similares as de comercialização.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
1. Conhecer o perfil microbiológico das farinhas produzidas
artesanalmente e das comercializadas em supermercado;
2. Identificar o percentual de farinhas artesanais e de supermercado
que atendem aos padrões microbiológicos exigidos pela legislação brasileira
durante o armazenamento;
3. Comparar o nível de contaminação presente nas farinhas;
4. Subsidiar dados para o projeto maior de Indicação Geográfica
“Qua idade, Identidade e Notoriedade da farinha de mandioca de Nazaré das
farinhas-BA”, no qua o presente estudo está inserido.
13
ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO
Este estudo organiza-se em dois capítulos, sendo o primeiro de revisão bibliográfica, com abordagem de temas relacionados à mandioca, processo produtivo e notoriedade da farinha de mandioca de copioba na região do Vale do copioba e qualidade microbiológica deste produto.
O segundo capítulo, em forma de artigo, apresenta-se com as normas da revista escolhida para publicação. O trabalho será submetido para revista Food control com fator de impacto 2.738.
14
CAPÍTULO 1: REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
1 FARINHA DE MANDIOCA: DA MATÉRIA-PRIMA AO PRODUTO FINAL
1.1 A Mandioca
A mandioca (Manihot esculenta) é uma espécie da família
Euphorbiaceae originária da América. Dentre as espécies, a Manihot esculenta é
a única cultivada para consumo humano, podendo ser nomeada de brava ou
mansa, dependendo do teor de glicosídios cianogênicos. Esses compostos são
liberados por meio da ação de enzimas (betagalactosidase e hidroxinitriloliase) na
linamarina e têm dose letal de 0,5 a 3,5 mg kg-1 de peso vivo (DÓSEA et al.,
2010).
Entre todas as culturas, a mandioca é apontada por diversos estudos
científicos como a de mais alta produtividade de calorias, a de maior eficiência
biológica como produtora de energia e a de melhor adaptação a solos deficientes
em nutrientes (SILVA et al., 2012).
Com base nos dados da Organização das Nações Unidas para a
Agricultura e Alimentação – FAO- a produção mundial de mandioca continua em
ritmo de crescimento contínuo, passando de 99,1 milhões de toneladas em 1970
para 254 milhões de toneladas em 2012. Um dos motivos deste expressivo
crescimento é a facilidade de adaptação às mais diversas condições
edafoclimáticas de vários países, especialmente na África e na Ásia. Dentre os
países africanos de maior contribuição para aumento na produção mundial,
destaca-se a Nigéria, consagrada líder absoluta na produção mundial de
mandioca em raiz. No ano de 2012, a produção na Nigéria foi de 54 milhões de
toneladas de raiz, o que corresponde a 37% daquele continente e a 21% dos 254
milhões produzidos no mundo. O Brasil é o segundo país produtor com 9,9%, e
em terceiro está a Indonésia com 9,4% (FAO, 2013).
Após a década de 1970, houve um retrocesso nos volumes de
produção da América Latina quando a participação passou de 30% para apenas
15% sobre o total mundial. O principal responsável por esta redução foi o Brasil
que após produzir 30 milhões de toneladas, contabiliza menos de 25 milhões
durante as últimas safras. A redução na safra 2012/13 foi mais acentuada devido
à forte seca no Nordeste do país. Em 2012, o Brasil alcançou 23,4 milhões de
toneladas na produção da raiz. Os Estados do Pará, Paraná e Bahia produziram
15
juntos 46,6% (11,2 milhões de toneladas) do total nacional. O Pará é o principal
produtor de mandioca, contribuindo com 4,8 milhões de toneladas, ou seja, 20,5%
do total. Em seguida, vem o Paraná, com 4,1 milhões de toneladas (16,7%),
seguido pela Bahia, terceiro maior produtor, com 2,3 milhões de toneladas (9,4%)
(IBGE, 2013).
No mercado nacional se concentra a quase totalidade da produção em
variedades “bravas” norma mente destinadas a fins industriais, além do fabrico da
farinha, a extração da fécula ou goma ou polvilho (LIMA et al., 2007).
Em relação às formas de uso da raiz, estima-se que 70% da produção
é processada na forma de farinha, 15% é transformada em goma ou fécula, 10%
utilizada diretamente para consumo fresco e apenas 5% é destinada à
alimentação animal, especialmente dos bovinos (EMBRAPA1, 2005).
A cultura da mandioca possui uma grande vantagem na colheita, que
pode ser realizada a partir de seis meses de plantada, ou ficar no solo por mais
de três anos até o momento de sua colheita sem que apodreça. Não é preciso o
uso de sementes, a plantação é feita pelos próprios talos da planta, denominada
maniva. Por possuir grande resistência a doenças e pragas, o não uso de
agrotóxicos e pesticidas tornam os alimentos derivados da mandioca bastante
saudáveis, entretanto, quando são vulneráveis às pragas, as mais comuns
observadas são lagartas e formigas, que são combatidas com a própria
manipueira2 (SOARES, 2007).
Em contrapartida, o alimento é classificado como perecível, visto sua
impossibilidade de estocagem, pois fora da terra, a raiz de mandioca não mantém
a qualidade por mais de 48 horas devido ao elevado teor de umidade, em torno
de 60% (FERREIRA NETO et al., 2003). Desta forma, a sua utilização por
períodos mais longos se dá na obtenção de produtos desidratados, reduzindo-se
o teor de umidade para níveis que impeçam o desenvolvimento microbiano com
consequente deterioração do produto. Estes produtos desidratados são,
principalmente, os diversos tipos de farinhas de mandioca largamente empregado
na alimentação humana, ou até mesmo como substituto da farinha de trigo na
produção de pães e tortas (SOUZA et al., 2008).
1 EMBRAPA: Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
2 Líquido retirado das raízes da mandioca com alto teor de ácido cianídrico, venenoso e nocivo à
saúde humana e de animais.
16
1.2 Processo produtivo da farinha de mandioca A mandioca se faz presente em todo território brasileiro, caracterizada
por duas vertentes produtivas de transformação: as indústrias com alto nível de
tecnologia, localizadas no Centro-Sul do país, e as unidades industriais ainda
pouco tecnológicas, concentradas no Norte e Nordeste do Brasil, que são as
maiores produtoras e consumidoras de farinha de mandioca, segundo CEPEA3
(2011).
Nos Estados do Norte e Nordeste, o processamento das raízes
acontece nas chamadas Casas de Farinha, estruturas produtivas representantes
do método tradicional, ou seja, baseado na mão-de-obra familiar. No Centro-Sul,
o processamento acontece nas farinheiras, consideradas agroindústrias, com
estrutura de trabalho mais profissional (GRANÇO et al., 2005).
Segundo Ferreira Neto et al., (2004) a farinha de mandioca é o
segundo produto mais importante obtido a partir da raiz, porém não é um produto
muito valorizado, sobretudo por sua variabilidade, que pode surgir devido à
diferença de variedades ou do processamento (SOUZA et al., 2008). Essa
heterogeneidade é devida principalmente à fabricação por pequenos produtores,
cada um deles seguindo processo próprio, além de existirem muitos tipos de
farinha nas diferentes regiões do Brasil (DIAS; LEONEL, 2006).
Dentre os principais tipos fabricados e comercializados estão as
farinhas torradas, farinha de mesa e farinha d’á ua, com predomínio da primeira.
A Comissão Técnica de Normas e Padrões, do Ministério da Agricultura (BRASIL,
2011), define a farinha seca como o produto obtido das raízes de mandioca, do
gênero Manihot, submetidas a processo tecnológico adequado de fabricação e
beneficiamento.
As atuais farinhas produzidas no Estado da Bahia são farinhas secas,
finas e brancas, e com a aparência da farinha de trigo (VELTHEM; KATZ, 2012).
Em visita às casas de farinha do município de Nazaré (BA), observou-
se que o processo mais comum para fabricação de farinha de mandioca obedece
as seguintes etapas: recepção da matéria-prima, descascamento e lavagem,
ralagem, prensagem, esfarelamento, torração, peneiragem, acondicionamento e
armazenamento.
3 CEPEA: Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada
17
Figura 01: Fluxograma do processo de farinha de mandioca (OLIVEIRA; REBOUÇAS,
2008).
O processamento se inicia com a recepção das raízes de mandioca, e
é importante destacar o cuidado adequado com armazenamento para evitar
perdas por apodrecimento ou umidade em excesso.
Nas casas de farinha geralmente o descascamento é feito
manualmente utilizando facas. Nesta etapa, os cuidados com a higiene são
fundamentais para que as bactérias não iniciem o processo de proliferação. As
cascas devem ser eliminadas da área de trabalho para evitar o aparecimento de
moscas e outros insetos indesejáveis (SEBRAE, 2006).
A etapa de ralagem ou trituração consiste em transformar as raízes da
mandioca em massa. As raízes limpas devem ser levadas para o triturador
(ralador), constituído por cilindros providos de lâminas serrilhadas, a fim de
produzir uma raspa fina. A massa produzida deve ser armazenada,
temporariamente, em um tanque de alvenaria, azulejado, evitando que resíduos
fiquem aderidos às paredes do tanque (SEBRAE, 2006).
RECEPÇÃO DAS RAÍZES DE MANDIOCA
LAVAGEM E DESCASCAMENTO
RALAGEM
PRENSAGEM
ESFARELAMENTO
TORRAÇÃO
PENEIRAGEM
ACONDICIONAMENTO
ARMAZENAMENTO
Peneiragem (opcional)
18
Na prensagem, a raspa de mandioca se apresenta em média com 65%
de umidade, após esta etapa, ela perde em torno de 20% de umidade e atinge o
ponto ideal para ser submetida à torração. Historicamente, esta etapa é realizada
em prensas artesanais construídas em madeira. Ao sair da prensa, a raspa
apresenta-se na forma de blocos compactos. Por isso, antes da torração, deve-se
efetuar o esfarelamento por processo mecânico ou manual. O esfarelamento é
feito manualmente, no qual ocorre a passagem repetida de um rodo sobre a
massa prensada colocada sobre a peneira, que precisa ser limpa periodicamente
com escovas para que não haja acúmulo de crostas de massa causando
fermentação. Na torração, a massa esfarelada é levada ao forno até ficar seca,
apresentando aspecto crocante. Na maioria das casas de farinha, essa operação
é realizada em 30 minutos, com o “forneiro” mexendo a massa com o auxílio de
um rodo de madeira, de cabo longo e liso, até a secagem final da farinha
(ARAÚJO; LOPES, 2009).
O trabalho na casa de farinha é bem definido: todos participam na
raspagem, e no descascamento da mandioca, principalmente mulheres e as
famílias com suas crianças e adolescentes. A raspagem pode ser efetuada no dia
da produção de farinha ou no dia anterior. Os homens desempenham o trabalho
mais pesado da produção, ou seja, moer a mandioca, colocar a massa na prensa;
após um dia, geralmente, a massa é repassada na máquina de moer para em
seguida ir ao forno de torração, sendo depois peneirada e ensacada como farinha
de mandioca (BRANCO et al., 2012).
2 NOTORIEDADE DA FARINHA DO VALE DO COPIOBA
2.1 Nazaré e a farinha de copioba
No Brasil, historicamente, o cultivo e o uso da farinha de mandioca na
alimentação associam-se à cultura indígena, com registros desde o período do
descobrimento, incorporados aos hábitos alimentares dos portugueses e,
posteriormente, integrados também à alimentação dos negros escravizados,
passando a compor um dos elementos de identidade da cultura alimentar
brasileira (CEREDA et al., 2003; CHISTE et al., 2006).
Na Bahia, a região do Recôncavo Baiano é importante produtora de
mandioca, desde o início do século XIX. Dentre os municípios que integram essa
19
região, destaca-se Nazaré como grande produtora de farinha. A qualidade da
farinha desta cidade era tão superior às demais, que a mesma ficou conhecida
como “Nazaré das arinhas”, permanecendo atua mente como uma referência na
comercialização desse produto, principalmente pela qualidade sensorial atribuída
ao mesmo (CASTELLUCCI JUNIOR, 2008).
O município de Nazaré localiza-se no centro sul do Recôncavo às
margens do Rio Jaguaripe, com área de 253,780 km², e é caracterizado como
Mata Atlântica. Integra-se a Mesorregião Metropolitana de Salvador e a
Microrregião de Santo Antônio de Jesus, sendo limítrofe aos municípios de Muniz
Ferreira, Aratuípe, Jaguaripe, São Felipe e Maragogipe (IBGE, 2012).
Da região conhecida como Vale do copioba (pertencente aos
municípios Nazaré, São Felipe e Maragogipe) surgiu também à denominação
popular de farinha de copioba, designada às farinhas que se sobressaíam em
qualidade dentre os mais diversos tipos de farinhas de mandioca existentes no
mercado. A qua ificação “de copioba”, então, passou a ser atribuída aos produtos
que apresentam semelhante padrão de excelência (SANTOS, 2003).
Antigamente, no processo de fabricação da farinha de copioba
“ e ítima” o que a diferenciava do fluxograma básico (Fig. 01) para a produção da
farinha de mandioca “comum” eram as etapas de torração e peneiragem, nas
quais a farinha passava por três fases de torração em fornos diferentes e três
peneiragens com peneiras de crivos diferentes.
Atualmente, a farinha de copioba que é comprada em casas de farinha
não possui estas etapas adicionais, são produzidas em fornos motorizados, e não
são torradas três vezes, porém a torração é mais longa. Já na peneiragem, o que
diferencia é a utilização de uma única peneira de crivo pequeno (±1mm), onde os
“caroços” da farinha que ficaram na peneira, não são triturados e misturados
novamente na farinha. Estas características de processamento foram observadas
em visitas nas casas de farinha para o acompanhamento da produção.
Segundo o agricultor familiar Edilson Santos Santana (EBDA)4,
fabricante artesanal da tradicional farinha de copioba, em entrevista ao site da
UPB5 (2013) relata que para se obter farinha de qualidade, é necessário tomar
certos cuidados. “A mandioca deve ser arrancada no mesmo dia de sua
4 EBDA: Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola
5 UPB: União dos Municípios da Bahia
20
fabricação, e não deve ter mais de um ano e meio de p antada”, este é um
cuidado para que a mandioca mantenha o sabor original. Na casa de farinha
começa o se undo processo, a “meia raspa em”, que consiste em descascar a
mandioca, o que é feito por dois grupos, onde cada um descasca a metade de
uma raiz, sendo que o segundo deve pegar sempre na parte já descascada, para
não sujar a mandioca limpa.
Depois de descascadas, as raízes são “sevadas” (trituradas em uma
máquina), e prensadas. Na prensa (para retirar a manipueira), a massa descansa
por uma noite. Os processos seguintes são: “cessar” (peneirar), “zanzar” (pré-
secagem), e torrar. Em todo o processo, a farinha é “cessada” por três vezes,
sendo a primeira ainda crua, a segunda, depois de “zanzada” e a última, após a
torração.
Hoje, a farinha de copioba é uma designação para uma farinha mais
fina, torrada, crocante e branca (sem corantes naturais ou artificiais) de qualidade
superior, e utilizada para indicar farinhas produzidas tanto na região do Vale do
copioba e/ou de outras proveniências geográficas, quanto em embalagens de
farinhas comercializadas em mercados ou supermercados, para designar uma
farinha de melhor qualidade (BRANCO et al.,2012).
2.2 Notoriedade: um caminho para Indicação Geográfica
Notoriedade é a fama que um produto ou serviço tem em função de
suas qualidades reconhecidas pelos consumidores. Ela pode ser atrelada, por
exemplo, a uma marca, a um produtor, ou a uma região – como é o caso das IG
(Indicação Geográfica), que sempre se reportam a uma região ou localidade
(GONZÁLEZ, 2005).
No Brasil, as IG estão regulamentadas pela Lei n 9.279/1996 do
Instituto Nacional da Propriedade Intelectual (INPI), que define o que é uma IG.
Sucintamente, a IG é entendida como sendo: indicação de procedência (IP) – que
indica o nome geográfico que tenha se tornado conhecido pela produção ou
fabricação de determinado produto, ou prestação de serviço; e a denominação de
origem (DO) – que indica o nome geográfico do local que designa produto, ou
serviço, cujas qualidades ou características se devem exclusiva ou
21
essencialmente ao meio geográfico, incluído os fatores naturais e humanos
(BRASIL, 1996; INPI, 2012).
Entre as IG Brasileiras reconhecidas pelo INPI estão a do vinho do
Vale dos Vinhedos e da Carne do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional,
ambos do Rio Grande do Sul, o Café da Região do Cerrado Mineiro, e a Cachaça
Artesanal de Paraty, o que tem contribuído para aumentar o Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH) regional e o PIB destas regiões (GIUNCHETTI,
2005; TONIETTO, 2003).
Em 2009, o Vale do São Francisco conquistou o primeiro selo de
qualidade IG para frutas in natura, no qual beneficia em torno de 342 produtores
de manga e de uva de mesa de Petrolina (PE) e Juazeiro (BA), que estão
reunidos em 12 associações e cooperativas, integrantes do Univale – Conselho
da União das Associações e Cooperativas dos Produtores de Uvas de Mesa e
Mangas do Vale do Submédio São Francisco, entidade que detém o registro
(INPI, 2012).
Vale salientar que ainda não existe IG concedida para um produto
produzido na Bahia. Neste contexto, os municípios da Bahia devem adequar-se a
esta nova realidade e, para isso, a organização de produtores, a uniformização da
produção sob os critérios de qualidade, a forma de elaboração do processo
produtivo, o “marketing” local/ regional e a articulação dos processos de
comercialização são atividades que devem ser implementadas (FALCADE et al.,
1999).
Vários produtos agroalimentares se diferenciam pela sua qualidade ou
sua reputação considerando, principalmente, a sua origem (o seu lugar de
produção). Essas diferenças podem estar ligadas a um gosto particular, uma
história, um caráter distintivo provocado por fatores naturais (como clima,
temperatura, umidade, solo, etc.) ou humanos (um modo de produção, um saber
fazer). Em alguns casos, os produtores e/ou agentes de uma região se organizam
para valorizar estas características, mobilizando um direito de propriedade
intelectual: a Indicação Geográfica. A IG permite preservar essas características
ou essa reputação e valorizá-las em nível dos consumidores (VELLOSO, 2008).
Um dos potenciais na região na busca deste selo de qualidade é a
farinha de copioba de Nazaré (BA), mas primeiramente é necessário fazer o
levantamento da potencialidade para conquista de uma IG, a partir da correlação
22
com parâmetros geográficos e humanos de onde é proveniente, caracterizar e
identificar a sua identidade e notoriedade (CALDAS, 2003).
Uma das possibilidades para enfrentamento da questão é identificar os
produtores de farinha de Nazaré que atendem os critérios de qualidade exigidos
por legislação e identificar os parâmetros que caracterizam a notoriedade do
produto, conduzindo a instituição da IG/IP destas farinhas, o que agregará
qualidade e valor, desencadeando um processo que contribuirá para o aumento
do IDH6 e PIB7 local proporcionando o crescimento econômico da região
(CUENCA et al., 2005).
O reconhecimento da IG pode trazer benefícios para o produtor tanto
no reconhecimento do mesmo, quanto na valorização do seu produto tornando-o
mais competitivo, e em consequência o aumento do valor agregado. O
consumidor por sua vez, adquire confiança no produto e tem a certeza de levar
para casa um produto de qualidade confiável (MAPA, 2013).
3 QUALIDADE MICROBIOLÓGICA DO PRODUTO
3.1 Legislação
A tecnologia de fabricação da farinha é simples, mas exige alguns
cuidados no seu desenvolvimento, tais como seleção da matéria-prima, higiene e
cuidados durante o processo de fabricação, a fim de garantir qualidade ao produto
final. Muitos são os problemas encontrados no processo como: estrutura bastante
rudimentar de equipamentos e utensílios, falta de infraestrutura e precárias
condições higiênico-sanitárias, muitas vezes podendo encontrar animais
transitando na área de processamento, contribuindo para livre acesso de roedores
e insetos (OLIVEIRA; REBOUÇAS, 2008).
Geralmente, o transporte e a comercialização são realizados de forma
inadequada, expondo o produto a contaminações (CHISTÉ et al., 2007).
Outros autores enfatizam a necessidade do uso de tecnologias
modernas na produção de farinha de mandioca, ao constatarem que não há o
emprego de inovação tecnológica, pois consideram que são utilizadas apenas
“ferramentas rústicas” (MA IEL et a ., 2010).
6 IDH: Índice de Desenvolvimento Humano
7 PIB: Produto Interno Bruto
23
As contaminações microbiológicas podem ocorrer em todas as etapas
por que passam os produtos agrícolas, desde a colheita até o processamento,
embalagem, transporte, estocagem e por diversos meios, seja o solo, a água, o
ar, incluindo os diversos contatos físicos, mecânicos ou manuais. No entanto, o
desenvolvimento microbiano depende do tipo de substrato em que se constitui o
alimento, ou seja, das condições de desenvolvimento biológico que o produto
oferece, notadamente relacionado à disponibilidade de água, necessária aos
processos metabólicos (FERREIRA NETO et al., 2004).
Deste modo, verifica-se a importância da análise microbiológica de um
alimento que pode ser dirigida para investigar a presença de micro-organismos,
quantificá-los e identificá-los além de verificar as condições higiênico-sanitárias do
processo e, assim, assegurar a saúde dos consumidores (FRANCO; LANDGRAF,
2008). A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) estabelece por meio
da portaria Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) n 12 de janeiro de 2001, no
Grupo 10, os padrões microbiológicos para alimentos incluindo a farinha cujos
limites estabelecidos para coliformes a 45C, Bacillus cereus e Salmonella spp
são respectivamente, 102 UFC g-1, 3x103 UFC g-1 e ausência em 25g (BRASIL,
2001).
3.2 Bacillus cereus
O Bacillus cereus é uma bactéria que pertence à família Bacillaceae,
Gram positiva, aeróbia facultativa, esporulada e se apresenta em forma de
bastão. Estes micro-organismos estão largamente distribuídos no ambiente e
podem ser isolados em diversos tipos de alimentos (PAIVA et al., 2009).
A contaminação dos alimentos por B. cereus pode ocorrer durante o
manuseio, processamento, estocagem ou distribuição, podendo o micro-
organismo crescer e determinar a ocorrência de doenças de origem alimentar.
Essa contaminação constitui não somente uma importante causa de deterioração,
mas também está associada à ocorrência de dois tipos de síndrome devido à
ingestão de alimentos contaminados com cepas patogênicas produtoras de
toxinas, uma emética e outra diarréica (CHAVES et al., 2011).
Entre os alimentos mais frequentemente contaminados por B. cereus
estão os cereais e derivados, produtos de laticínios, carnes, alimentos
24
desidratados e especiarias (CHEN et al., 2001). Alguns estudos têm demonstrado
a habilidade do micro-organismo de se desenvolver em temperaturas de
refrigeração em vários substratos (VALERO et al., 2003).
O isolamento do micro-organismo pode ser feito a partir de
equipamentos e utensílios utilizados no pré-preparo, preparo, cocção e
distribuição dos alimentos, evidenciando que processos de limpeza e sanitização,
quando realizados de maneira inadequada, podem contribuir para que estes
locais sejam fontes de contaminação dos alimentos (MENDES et al., 2011).
A contaminação de superfícies com esporos de B. cereus é um grave
problema em plantas de processamento de alimentos, indústria de laticínios,
restaurantes e até mesmo em casas particulares. Possíveis veículos para B.
cereus na cadeia alimentar são poeira e o solo. Além disso, a germinação de
esporos de bactéria como B. cereus pode ser iniciada por meio de processos de
aquecimento, e é capaz de proliferar a temperaturas de até 60C (SUDHAUS et
al., 2014).
A resistência destes micro-organismos ao calor está associada a sua
estrutura morfológica, possuindo uma região central, onde estão os elementos
genéticos, junto com as enzimas necessárias a germinação e crescimento inicial
do esporo. A resistência fisiológica aliada à sua habilidade de produzir enzimas
que degradam diversos substratos orgânicos possibilita esta bactéria estar
amplamente distribuída no meio ambiente (Blackburn & Mcclure, 2000).
Boas práticas de higiene incluem uma sanitização adequada contra os
esporos bacterianos, importantes para melhorar a qualidade e a vida de prateleira
do alimento (ANDRE et al., 2011; SUDHAUS et al., 2012).
O consumo de alimentos contendo mais de 105 células viáveis/g de B.
cereus tem sido implicado em surtos devido a cepa emética e intoxicações
diarreicas (SALUSTIANO et al., 2009).
3.3 Coliformes termotolerantes
Os coliformes termotolerantes são um subgrupo dos coliformes totais,
que são capazes de fermentar a lactose com produção de gás quando incubado à
temperatura de 44-45C. Neste grupo, há predominância das bactérias dos
gêneros Escherichia, entretanto, algumas bactérias dos gêneros Citrobacter,
25
Klebsiella e Enterobacter também são termotolerantes que incluem cepas não
fecais (SILVA et al., 2010; WHO, 2011).
São indicadores de condições sanitárias os coliformes a 45C ou
termotolerantes em alimentos, e podem significar contaminação durante o
processamento, produção ou armazenamento, e em altas contagens podem
indicar contaminação pós-processamento, limpeza e sanitização deficientes,
matéria-prima contaminada, contaminação cruzada, tratamento térmico ineficiente
ou pode ser reflexo de falta de higiene pessoal dos manipuladores (SOUSA et al.,
2009).
Quando os manipuladores de alimentos não praticam a higiene pessoal
adequada ou não preparam alimentos corretamente, podem tornar-se veículos de
micro-organismos, através de suas mãos, cortes ou feridas, boca, pele e cabelo,
dentre outros (SILVA; GERMANO & GERMANO, 2003).
3.4 Salmonella spp
A Salmonella spp. pertence à família Enterobacteriaceae e
compreende bacilos Gram-negativos não produtores de esporos. São bactérias
anaeróbias facultativas capazes de produzir gás a partir da glicose, com exceção
da S. typhi, e são capazes de utilizar citrato como única fonte de carbono. O pH
ótimo para multiplicação da Salmonella permanece próximo de 7,0, sendo que
valores superiores a 9,0 e inferiores a 4,0 são bactericidas. Não toleram
concentrações de sais superiores a 4% e o nitrito é também inibitório, com o seu
efeito acentuado em pH ácido. A temperatura ideal para desenvolvimento de
Salmonella é 35-37C, sendo o mínimo de 7C e máxima de 47C, a atividade de
água é maior que 0,94 (JAY, 2005; SILVA; GIBBS, 2012).
A Salmonella spp. está entre os agentes patogênicos mais
frequentemente encontrados, tanto em países desenvolvidos como em
desenvolvimento, em surtos de infecção de origem alimentar. Elas são
amplamente distribuídas na natureza, sendo o trato intestinal do homem e de
animais o principal reservatório natural. Os animais domésticos (cães, gatos,
pássaros, dentre outros) podem ser portadores de Salmonella spp, representando
grande risco, principalmente para crianças (GHELARDI et al., 2002).
26
As principais fontes de infecção em países industrializados são os
produtos de origem animal, produtos como carne fresca e ovos. Nos países em
desenvolvimento, legumes, água e a veiculação entre humanos acredita-se
contribuir em maior proporção de casos humanos em relação aos países
industrializados (TAFIDA et al., 2013).
3.5 Bolores e Leveduras e Bactérias aeróbias mesófilas
Apesar de não estar incluída na legislação, a microbiota fúngica da
farinha de mandioca é constituída em sua maioria por bolores do gênero
Aspergillus e Penicillium, e os efeitos da invasão fúngica causam danos físico-
químicos e são responsáveis pela produção de micotoxinas, substâncias de
patogenicidade reconhecida para o homem e animais (FERREIRA NETO et al.,
2004).
A contagem em placas de bactérias aeróbias mesófilas é comumente
empregada para indicar a qualidade sanitária dos alimentos, sendo que altas
contagens de mesófilas indicam condições impróprias como matéria–prima
contaminada, condições inadequadas de tempo e temperatura durante o
processamento, além de indicar condições potenciais para o desenvolvimento de
patógenos (FERREIRA NETO et al., 2004; NG et al., 2013).
O Ministério da Saúde (BRASIL, 2001) não determina limites de
tolerância para contagem de bolores e leveduras e bactérias aeróbias mesófilas
para farinhas, entretanto, são considerados satisfatórios valores < 5 log10 UFC/g
(ICMSF, 1986).
De modo geral, as análises microbiológicas devem ser realizadas com
o objetivo de avaliar a qualidade microbiológica do processo produtivo e do
alimento visando diagnosticar um possível agente etiológico causador de surto de
toxinfecção alimentar. Ainda, devem avaliar o grau de contaminação por micro-
organismos deterioradores, para orientar o monitoramento, indicando medidas
corretivas em pontos críticos de controle (MESQUITA et al., 2006).
4 SEGURANÇA SANITÁRIA ASSOCIADA À VIDA DE PRATELEIRA DO PRODUTO
27
Para garantir a qualidade do produto, o processo de obtenção da
farinha deve estar sujeito às normas gerais de processamento de alimentos, que
devem ser aplicados em todas as etapas de produção, visando assegurar a
conformidade com o Padrão de Identidade e Qualidade (PIQ), expandindo a vida
útil do produto, e principalmente minimizando problemas de segurança que
possam colocar em risco a saúde do consumidor. Portanto, o PIQ estabelecido
pela Instrução Normativa n 52 de 07 de novembro de 2011 da Secretaria da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento (BRASIL, 2011) deve ser identificado
visando o atendimento aos parâmetros do padrão oficial de classificação da
farinha de mandioca, considerando os requisitos de identidade e qualidade, a
amostragem, o modo de apresentação e a rotulagem.
Quanto à marcação e rotulagem, no caso da farinha de mandioca
embalada, destinada diretamente à alimentação humana, devem conter algumas
informações imprescindíveis como: data de acondicionamento do produto: o dia,
mês e o ano em que um determinado lote de farinha de mandioca é embalado; o
grupo (sendo esta informação de responsabilidade do fabricante); a classe; o tipo;
a denominação de venda (a expressão “farinha de mandioca” se uida da marca
comercial do produto); o nome empresarial, registro no Cadastro Nacional de
Pessoal Jurídica (CNPJ) ou Cadastro Nacional de Pessoa Física (CPF), e o
endereço da empresa embaladora ou responsável pelo produto (BRASIL, 2011).
Este regulamento técnico visa esclarecer os consumidores com as informações
específicas do produto, porém não garante a segurança do mesmo.
Neste contexto, para garantir um produto confiável e de boa qualidade
microbiológica, as indústrias de alimentos devem adotar as Boas Práticas de
Fabricação (BPF) que representa uma das mais importantes ferramentas para o
alcance de níveis adequados de segurança do alimento. As BPF abrangem um
conjunto de medidas que devem ser adotadas pelas indústrias a fim de garantir a
qualidade sanitária e a conformidade dos produtos com os regulamentos técnicos.
A legislação sanitária federal por meio da Resolução - RDC n 275, de 21 de
outubro de 2002, regulamenta essas medidas em caráter geral, aplicável a todo o
tipo de indústria de alimentos e específico, voltadas às indústrias que processam
determinadas categorias de alimentos (ALVARENGA, 2006).
Nas casas de farinha da região do Vale do copioba a realidade é bem
diferente do que se espera quanto as BPF, muitos são os problemas durante todo
28
o processo de fabricação: os equipamentos e utensílios utilizados para a
produção ainda são muito rudimentares, falta infraestrutura adequada, e as
condições higiênico-sanitárias são precárias, é comum encontrar animais
transitando na área de processamento, contribuindo para livre acesso de roedores
e insetos, teias de aranha no teto da área de produção facilitando a contaminação
do produto pós-processamento e a falta de cuidado no armazenamento do
mesmo (OLIVEIRA; REBOUÇAS, 2008; BRANCO et al., 2012).
Segundo Arruda (2002), o local de armazenamento dos alimentos deve
ser fresco, ventilado e iluminado, não deve haver a presença de caixas de
inspeção sanitária, nem ralos, a fim de que os produtos sejam preservados de
contaminação por detritos e pela presença de insetos e roedores provenientes
das tubulações de esgoto. O teto deve ser isento de vazamentos, as paredes e o
piso devem ser mantidos secos, sem infiltrações ou inundações, e nos locais
onde as prateleiras forem fixas na parede, deve haver um espaçamento suficiente
entre esta e o produto de modo a permitir a ventilação, as portas devem manter-
se fechadas, e as aberturas teladas, piso não escorregadio, resistente liso,
impermeável e de fácil limpeza.
O desenvolvimento de um micro-organismo específico durante o
armazenamento depende de vários fatores, sendo os mais importantes: a carga
microbiana inicial no início do armazenamento; as propriedades físico-químicas
dos alimentos, como teor de umidade, pH e presença de conservantes; o método
de processamento utilizado na produção dos alimentos; e o seu ambiente externo,
como por exemplo as composições de gás circundantes e a temperatura de
armazenamento. A escolha do tipo de embalagem, para acondicionamento dos
produtos alimentares, é também um cuidado importante para garantir a vida útil
dos produtos, isto é, manter as suas características físicas, químicas,
microbiológicas e organolépticas pelo período de tempo requerido, evitando ou
minimizando as perdas. Esta função de conservação da embalagem é conjugada
com a tecnologia de processamento do produto: assim a embalagem para um
produto fresco, congelado, processado termicamente, desidratado ou seco, ou
com atmosfera modificada, possui requisitos diferentes (FOOD INGREDIENTS
BRASIL, 2011).
Neste contexto, Bramorski et al., (2005), consideram que a maior parte
do Brasil apresenta clima tropical e umidade relativa alta, sendo assim o cuidado
29
com os alimentos deve ser redobrado para não ocorrer o armazenamento
inadequado, pois comprometem a vida útil e aumentam os riscos de
decomposição dos produtos.
5 MERCADO CONSUMIDOR DA FARINHA DE MANDIOCA
A farinha é o principal produto obtido da mandioca, e como principal
fonte de carboidrato, ela é importante para uma significativa parcela da população
de menor poder econômico (CARDOSO et al.,1999). Caracteriza-se num alimento
de alto valor energético, possui teor elevado de amido, contêm fibras e alguns
minerais como potássio, cálcio, fósforo, sódio e ferro (SEBRAE, 2009).
Sgarbieri (1987) relata que na região Norte, a farinha é extremamente
importante para o aporte de energia (20 a 50% do total) e de ferro (30 a 40% do
total, porém de baixa biodisponibilidade) ingerido pelas populações rurais e
urbanas de baixa renda, sendo mais consumida sob a forma de beijus, mingaus e
farofas. Já no Nordeste, a farinha é bastante consumida na forma de pirão, ou
acompanhando o feijão, a carne seca, o café e a rapadura, além de fazer parte de
pratos típicos da região. Na região amazônica, esta farinha é consumida na forma
de mingaus, roscas, bolos, pudins, sorvetes, assim como acompanhando o
extrato de frutas de palmeiras denominadas açaí (CEREDA et al., 2003).
A farinha de mandioca é um alimento muito presente na cultura do
brasileiro, e seu uso é essencialmente alimentar, além dos diversos tipos
regionais, que não modificam as características originais do produto, encontram-
se duas formas: a farinha não temperada, que se destina a alimentação básica e
é consumida principalmente nas classes de renda baixa da população; e a farinha
temperada (farofa), de mercado mais restrito, mas de maior valor agregado
(ALVES; VEDOVOTO, 2003).
No Brasil, o consumo alimentar médio per capita da farinha de
mandioca é de 11,8 g/dia, determinado com base na aquisição domiciliar per
capita por grandes regiões, segundo Pesquisa de Orçamentos Familiares 2008-
2009. Contudo, regionalmente, esse consumo é de 46,2 g/dia para a região Norte;
11,5 g/dia para o Nordeste; 0,8 g/dia, para o Sudeste; 0,2 g/dia, para o Sul e 0,5
g/dia, para o Centro-Oeste. Essa pesquisa mostra que a soma do consumo das
30
regiões Norte e Nordeste corresponde a 97,4% do consumo nacional (IBGE,
2013).
Além da forte produção e consumo da região Nordeste, a Bahia
merece destaque na farinha de mandioca produzida no Vale do Copioba, pela
qual ficou historicamente reconhecida como farinha de qualidade sensorial
superior, e a cidade Nazaré-BA como sendo centro histórico de escoamento da
produção de farinha (SANTOS, 2003).
Copioba é uma designação para uma farinha mais fina, crocante e
branca (sem corantes naturais ou artificiais) de qualidade sensorial superior, e é
utilizada tanto na região do Vale do copioba quanto em todo Estado para designar
uma farinha melhor, na venda direta para atravessadores, em feiras livres, ou
mesmo em embalagens comercializadas em redes de supermercado (BRANCO
et al., 2012). Assim, este produto adquiriu notoriedade e a proveniência
geográfica tornou-se expressão que indica qualidade sensorial superior.
Dessa forma, produzir farinha na região deixa de ser apenas a
manutenção de uma cultura centenária para se transformar em excelente
negócio, capaz de atender não apenas às demandas locais do produto, mas
também proporcionar a melhoria da qualidade de vida das pessoas que se
envolvem com a atividade, criar alternativas de mercado, fortalecer o
desenvolvimento sócio econômico da região e garantir o atendimento às
necessidades atuais e futuras das gerações (ARAÚJO; LOPES, 2009).
31
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CAPÍTULO 2: INDICADORES MICROBIOLÓGICOS DE QUALIDADE DA FARINHA DE MANDIOCA COPIOBA ARTESANAL E COMERCIALIZADA EM SUPERMERCADO DURANTE O ARMAZENAMENTO INDICATORS OF THE MICROBIOLOGICAL QUALITY OF ARTISANAL AND INDUSTRIAL COPIOBA CASSAVA FLOUR DURING STORAGE Candice Vieira Braga Negreirosa, Alaíse Gil Guimarãesb, Thereza Cristina Calmon de Bittencourtc. a Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciência de Alimentos (PGALI), Faculdade de Farmácia, Universidade Federal da Bahia (UFBA). b Professora do Departamento de Ciência de Alimentos, Faculdade de Farmácia, UFBA. c Professora do Departamento de Produção Animal, Escola de Medicina Veterinária, UFBA.
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RESUMO A farinha de mandioca (Manihot esculenta) é um produto obtido pelo processamento da mandioca e muito consumido e valorizado na região Nordeste do Brasil. Em especial no Vale do copioba (BA), a farinha de mandioca copioba vem conquistando notoriedade por sua qualidade sensorial, e tornando um produto potencial na busca pelo selo de Indicação Geográfica (IG). No entanto, é em era produzido em “casas de farinha” em precárias condições hi iênico-
sanitárias. Análises de coliformes a 45C, Bacillus cereus, bolores e leveduras, contagem total de bactérias aeróbias mesófilas e pesquisa em Salmonella spp. foram realizadas em farinhas de mandioca tipo copioba produzidas artesanalmente (adquiridas diretamente das casas de farinha) e industrializadas (comercializadas em supermercado) durante o período de 180 dias simulando as condições de armazenamento, e os resultados comparados com a legislação brasileira vigente. A contagem de bolores e leveduras e a de bactérias aeróbias mes fi as totais tiveram resu tados variando entre - o g para a maioria das amostras. Salmonella não foi detectada em nenhuma das amostras pesquisadas e co iformes termoto erantes mostraram va ores o g. Bacillus cereus estavam presentes em 57% das amostras, sendo que 14,30% do total das adquiridas em supermercados estavam fora dos parâmetros exigidos pela legislação. Os testes Mann-Whitney e teste-t mostraram que os níveis de contaminação de farinha de mandioca entre as variáveis: supermercado e casas de farinha não diferiram significativamente (p > 0,05). Os resultados mostraram que ao final de 180 dias de armazenamento as amostras das farinhas artesanais apresentaram qualidade superior quando comparadas com as adquiridas em supermercado, apresentando 100% em acordo com os padrões exigidos pela legislação, enquanto que as industrializadas apresentaram 14,30% fora dos limites permitidos.
Palavras-chave: Qualidade microbiológica. Produção artesanal. Segurança alimentar. Indicação geográfica
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ABSTRACT Cassava flour is a product made from processed cassava (Manihot esculenta) and is widely consumed and valued in the northeast region of Brazil. Especially in the “Vale do copioba (BA)”, copioba cassava flour has gained notoriety for its sensory quality, and becoming a potential product in the search for the stamp Geographical Indication (GI).Cassava flour is generally produced in “Houses of flour” which uses rudimentary equipment and utensils, and has inadequate sanitary and hygienic
practices. Analysis of coliform at 45C, Bacillus cereus, molds and yeasts, Salmonella spp., and the total aerobic mesophilic bacteria count have been completed, and the results were compared compared with the prese t le islatio Brasil, ) he cou t of easts a ol s a total aerobic esophilic bacteria ha results ra i fro - lo i ost sa ples al o ella as ot etecte i a of the sa ples stu ie a ther otolera t colifor sho e alues lo Bacillus cereus was detected in 57% of the cassava flour samples, and 14,30% of the total samples purchased in supermarkets were higher than the maximum value allowed by the Brazilian legislation. The Mann-Whitney test and t-test results showed that the levels of contamination of cassava flour did not differ significantly (p > 0,05) bet ee the ariables: “super arket” a “artisa al”. After 180 days of storage the artisanal flour samples exhibited superior quality compared to those acquired in the supermarket, and artisanal samples were in 100% accordance with the standards required by legislation, while the industrialized samples were 14.30% outside the allowed limits. Keywords: Microbiological quality. Cassava flour. Artisanal production. Food safety. geographical indication.
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1 INTRODUÇÃO
Farinha de mandioca seca é um produto obtido das raízes de
mandioca, do gênero Manihot, submetidas a processo tecnológico adequado de
fabricação e beneficiamento (Brasil, 2011). No Brasil, historicamente, o cultivo e o
uso da farinha de mandioca na alimentação associam-se à cultura indígena, com
registros desde o período do descobrimento, incorporados aos hábitos
alimentares dos portugueses e, posteriormente, integrados também à alimentação
dos negros escravizados, passando a compor um dos elementos de identidade da
cultura alimentar brasileira (Cereda et al., 2003; Chisté et al., 2006).
Na região Norte, a farinha é extremamente importante para o aporte de
energia (20 a 50% do total) e de ferro (30 a 40% do total, porém de baixa
biodisponibilidade) ingerido pelas populações rurais e urbanas de baixa renda,
sendo mais consumida sob a forma de beijus, mingaus e farofas. No Nordeste
brasileiro, a farinha é bastante consumida na forma de pirão, ou acompanhando o
feijão, a carne seca, o café e a rapadura, além de fazer parte de pratos típicos. Já
na região Amazônica, esta farinha é consumida na forma de mingaus, roscas,
bolos, pudins, sorvetes, assim como acompanhando o extrato de frutas de
palmeiras denominadas açaí (Cereda et al., 2003).
Com isso, o consumo do produto nas regiões Norte e Nordeste
corresponde a 97,4% do consumo nacional (IBGE, 2013). O produto é
comercializado em mercados, feiras livres e supermercados.
Na região Nordeste, o Estado da Bahia merece destaque na produção
de farinha de mandioca da região do Vale do copioba (pertencente aos municípios
Nazaré, São Felipe, e Maragogipe) onde surgiu à denominação popular farinha de
copioba, designada às farinhas que se sobressaiam em qualidade sensorial
dentre os mais diversos tipos de farinhas de mandioca existentes no mercado
(SANTOS, 2003).
Muitos produtos agroalimentares se diferenciam pela sua qualidade ou
sua reputação devidas, principalmente, a sua origem (o seu lugar de produção).
Essas diferenças podem estar ligadas a um gosto particular, uma história, um
caráter distintivo provocado por fatores naturais (como clima, temperatura,
umidade, solo, etc.) ou humanos (um modo de produção, um saber fazer).
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Em alguns casos, como na região do vale do copioba os produtores
das casas de farinha juntamente com algumas instituições parcerias, estão se
organizando para valorizar as características atribuídas à farinha de mandioca
tipo copioba da região, mobilizando para adquirir um direito de propriedade
intelectual: a Indicação Geográfica (IG) atrelando assim, a qualidade do produto à
região que se produz.
A IG permitirá a preservação das características sensoriais do produto
bem como sua reputação e valorizá-las pelos consumidores. Dessa forma, o selo
de qualidade ao ser adquirido poderá ser utilizado como estratégia para
valorização do produto artesanal, e como consequência o aumento do valor
agregado. O consumidor por sua vez, adquire confiança no produto e tem
segurança em adquirir um produto de qualidade confiável (MAPA, 2013).
O Vale do copioba é um dos potenciais no Estado da Bahia na busca
deste selo de qualidade IG, devido à notoriedade conquistada pela farinha de
mandioca de copioba, mas primeiramente é necessário conhecer a qualidade
microbiológica destes produtos oferecidos aos consumidores, um dos requisitos
essenciais para caracterização e identidade do produto.
Neste contexto, surgiu o interesse em conhecer e, avaliar a qualidade
microbiológica das farinhas de copioba da região do Vale do copioba (produzidas
artesanalmente) e as comercializadas em redes de supermercado, possibilitando
a comparação entre estes dois grupos e verificar a adequação das mesmas frente
aos padrões microbiológicos de qualidade exigidos pela legislação brasileira
vigente, contribuindo assim para a caracterização e conhecimento da identidade
destes produtos, bem como oferecer estes resultados para subsidiar o pedido de
Indicação Geográfica para a região.
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2 MATERIAL E MÉTODOS
2.1 Descrição do estudo
Trata-se de um estudo quantitativo e qualitativo, realizado junto à
comunidade de produtores de farinha da região conhecida como Vale do Copioba
(pertencente aos municípios Nazaré, São Felipe e Maragogipe - Bahia), como
parte do projeto “Qualidade, identidade e notoriedade da farinha de mandioca de
Nazaré das Farinhas-BA: uma contribuição a Indicação Geográfica”, com objetivo
de avaliar a farinha de mandioca tipo copioba produzida artesanalmente nas
casas de farinha.
Esta pesquisa irá fornecer resultados para caracterização
microbiológica da farinha de mandioca tipo copioba do Vale do copioba,
contribuindo assim para o pedido de Indicação Geográfica da região.
Diante deste estudo, despertou-se o interesse de comparar a qualidade
microbiológica destas farinhas de mandioca produzidas artesanalmente em casas
de farinha, com as comercializadas em redes de supermercado de Salvador – BA,
durante 180 dias de armazenamento.
2.2 Amostras de farinha
Foram coletadas 42 amostras (1Kg de cada amostra) de farinha de
mandioca de copioba no total, 21 delas em diferentes casas de farinha do
município de Nazaré - BA representando as “artesanais”, e 21 foram compradas
de 10 diferentes marcas nas principais redes de supermercados da cidade de
Salvador - BA. Todas as amostras de supermercado coletadas foram do Estado
da Bahia, e estavam dentro do prazo de validade até o final do período de
armazenamento.
Considerando que existem 65 casas de farinha no Vale da copioba, foi
realizada a coleta de amostra em 21 diferentes casas de farinha (definidas por
sorteio), de forma a se obter uma representatividade em torno de 30% e seguir o
tipo de delineamento do projeto maior, no qual esse estudo está inserido, para
que o conjunto de dados possa subsidiar um pedido de IG do produto.
Como critério para compra das farinhas nas redes de supermercados,
a embalagem deveria conter informações sobre o produto de acordo com as
especificações de rotulagem determinadas pela Instrução Normativa n52 (Brasil,
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2011) como: o tipo “Copioba”, a data de acondicionamento (dia, mês, ano) e
número do lote, data de validade, ter a denominação de venda do produto (a
expressão “farinha de mandioca”) se uida da marca comercial do produto (nome
fantasia).
2.3 Análise das amostras As amostras foram coletadas no período de abril a maio de 2013 e
encaminhadas para o Laboratório de Pesquisa em Microbiologia de Alimentos da
Faculdade de Farmácia da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Foram
realizadas determinações microbiológicas para a contagem de coliformes
termotolerantes, Bacillus cereus, bolores e leveduras, contagem padrão em
placas (bactérias aeróbias mesófilas) e pesquisa de Salmonella spp, segundo a
metodologia descrita por Downes & Ito (2001). Os resultados das análises foram
comparados com os padrões exigidos pela Resolução RDC n 12 de janeiro de
2001(Brasil, 2001).
As amostras de casas de farinha do município de Nazaré - BA foram
analisadas logo após o processamento (período P0 correspondendo ao tempo
igual ao zero dia) e se repetiram durante 180 dias de armazenamento (períodos
P1, P2, P3 e P4 correspondendo a 30, 60, 120 e 180 dias, respectivamente). Para
as amostras comercializadas em Salvador - BA e coletadas em redes de
supermercado, o P0 corresponde a data da compra do produto, visto que não se
tem a informação da data de processamento do mesmo.
O armazenamento, com duração de seis meses, foi realizado à
temperatura ambiente em local arejado, em Salvador, BA, nas bancadas do
laboratório simulando as condições de supermercado.
De acordo com a metodologia de Downes e Ito (2001), 25g das
amostras foram pesadas e diluídas em 225ml de água peptonada 0,1%, e
homogeneizadas em stomacher marca ITR modelo MC1204. A seguir, foram
realizadas diluições seriadas e estas semeadas em meios específicos para cada
exame, sendo utilizado o Ágar Padrão para Contagem de bactérias mesófilas
(Difco), Ágar Dicloran Rosa de Bengala Cloranfenicol (Acumedia) para bolores e
leveduras, e para contagem de Bacillus cereus foi utilizado o meio Ágar Manitol
gema de ovo polimixina (MYP) (Acumedia). Para confirmação de Bacillus cereus
45
as colônias típicas ou suspeitas foram submetidas aos seguintes testes
bioquímicos: teste de utilização anaeróbica da glucose, teste de decomposição da
tirosina e o teste de Voges-Proskauer. O Chromocult Coliform Agar (Merck) foi
utilizado para determinar bactérias do grupo coliformes, onde as colônias
positivas para E. coli apresentam uma coloração azul-escuro a violeta, o que
facilmente a distingue de outras colônias de colifomes que têm uma cor vermelha
a salmão.
Para pesquisa de Salmonella spp seguiu-se o protocolo descrito por
Downes e Ito (2001) e por Silva et al., (2010). A pesquisa foi realizada por meio
de pré-enriquecimento, enriquecimento seletivo e por confirmação preliminar das
colônias típicas, com resultados sendo expressos como ausência ou presença do
micro-organismo em 25g de amostra. Para o pré- enriquecimento foi utilizado
Caldo Lactosado (Acumedia), enriquecimento seletivo nos Caldos Tetrationato
(Difco) e Rappaport – Vassiliadis (Acumedia) e isolamento em Ágar Entérico de
Hectoen (Difco) e Ágar Xilose Lisina Desoxicolato (Difco). Colônias típicas ou
suspeitas foram transferidas para tubos contendo Ágar Ferro Tríplice Açúcar (TSI)
(Difco) e Ágar Lisina Ferro (LIA) (Difco). Os tubos de TSI e LIA que apresentaram
reações típicas para Salmonella foram submetidos a testes bioquímicos iniciais de
Citrato, Urease, Vermelho de metila, Voges Proskauer, Fenilalanina e teste de
motilidade em Meio SIM (sulfeto indol motilidade).
2.4 Tratamento estatístico dos dados
Os resultados foram expressos em UFC/g convertidos em logaritmo
decimal e tratados pelos Testes Mann-Whitney e Teste -T, dependendo da
variação de distribuição, para determinar os níveis de contaminação de farinha de
mandioca entre as variáveis: supermercado e casas de farinha que diferiram
significativamente (p 0,05). Todas as análises estatísticas foram realizadas com
o programa SPSS versão 13.
46
A qualidade microbiológica da farinha de mandioca: dos
supermercados e artesanais, foi balizada por análises de Salmonella spp. e
contagem de: bactérias aeróbias mesófilas totais, bolores e leveduras, Bacillus
cereus e coliformes termotolerantes ao longo de 180 dias de armazenamento.
A tabela 01 mostra a contagem de bactérias aeróbias mesófilas totais e
bolores e leveduras em amostras de farinha de mandioca dos dois grupos:
supermercado e artesanal ao longo do tempo (0, 30, 60, 120 e 180 dias)
simulando condições de armazenamento.
Tabela 1 Percentual de amostras de farinha de mandioca do tipo copioba positivas para bactérias aeróbias mesófilas e bolores e leveduras nos diferentes intervalos de contagem log (UFC/g) ao longo de 180 dias de armazenamento.
Para contagem total de bactérias aeróbias mesófilas, as amostras
mostraram pequenas oscilações ao longo do tempo, mas ao final de 180 dias a
maior parte das amostras artesanais 17(81%) tiveram contagens menores que 5
log UFC/g, enquanto que 8 (oito) (38,10%) amostras adquiridas em supermercado
apresentaram um valor acima do aceitável. Os resultados variaram de 2 a 7 log
UFC/g, e a maioria das amostras em ambos os grupos tiveram uma contagem
variando entre 3 – 4 log UFC/g. Mostrando que, grande parte está dentro dos
limites aceitáveis, isto é, < 5 log UFC/g para contagem total (Mensah et al., 2002).
O não seguimento das Boas práticas de fabricação (BPF) na maioria
dos estabelecimentos produtores de farinhas de mandioca, em adição a falta de
condições de higiene, sendo comum encontrar animais transitando na área de
processamento, o livre acesso de roedores e insetos e a falta de cuidado no
Artesanal Supermercado Artesanal Supermercado
< 5 log 16 (76,2) 15 (71,40) 21 (100) 21 (100)
> 5 log 5 (23,8) 6 (28,6) - -
< 5 log 17 (81) 16 (76,2) 21 (100) 21 (100)
> 5 log 4 (19) 5 (23,8) - -
< 5 log 15 (71,4) 17 (81) 21 (100) 21 (100)
> 5 log 6 (28,6) 4 (19) - -
< 5 log 19 (90,5) 16 (76,2) 21 (100) 21 (100)
> 5 log 2 (9,5) 5 (23,8) - -
< 5 log 17 (81) 13 (61,9) 21 (100) 21 (100)
> 5 log 4 (19) 8 (38,1) - -
120
180
Frequência de amostras positivas (%)Intervalo de
contagem (UFC/g)
Tempo
(dias)
0
30
60
Bactérias aeróbias mesófilas Bolores e Leveduras
3 RESULTADOS E DISCUSSÕES
47
armazenamento podem contribuir para contaminação do produto pós-
processamento, o que pode justificar a contagem superior a 5 log UFC/g em
algumas amostras.
Apesar da diferença de resultados, as contagens deste grupo de micro-
organismos para as amostras: artesanal e de supermercado não diferiram
significativamente (p > 0,05) ao longo do período.
Bolores e Leveduras estavam presentes em contagens menores
(tabela 1) do que as bactérias aeróbias mesófilas, os valores variaram entre 2 – 5
log UFC/g entre supermercado e casas de farinha.
Ferreira Neto et al., (2004), também obtiveram valores mais baixos
para esses micro-organismos em farinhas produzidas em casas de farinha no
Estado da Paraíba, as contagens variaram de 2 – 3 log UFC/g, valores estes,
entretanto, mais altos que os obtidos por Dósea et al., (2010) que foram <log
UFC/g em farinhas produzidas no Estado de Sergipe. A baixa incidência de
bolores e leveduras nas amostras pode indicar que as farinhas torradas possuem
uma condição de baixo potencial para o desenvolvimento desses micro-
organismos (Chisté et al., 2006), isso se deve à baixa atividade de água existente
na farinha de mandioca, fato este comprovado neste estudo no qual os valores
encontrados foram na ordem de 0,31 a 0,53 ao final do tempo de
armazenamento.
Os parâmetros para contagem total de bactérias aeróbias mesófilas e
bolores e leveduras não são preconizados pela legislação brasileira, porém são
considerados satisfatórios valores < 5 log UFC/g (ICMSF, 1986). Enquanto que
para Downes & Ito (2001), os níveis microbianos em farinhas manipuladas e
processadas as populações bacterianas podem chegar a 6 log UFC/g, e para
bolores e leveduras a 4 log UFC/g.
Na África existe legislação específica para farinha de mandioca a qual
estabelece requisitos e determina valores microbiológicos para contagem total de
bactérias aeróbias mesófilas de 5 log UFC/g e bolores e leveduras 3 log UFC/g
(ARSO, 2012). A variação de parâmetros encontrados mostra a necessidade de
um padrão de qualidade e identidade (PIQ) para farinha de mandioca, com
objetivo de estabelecer requisitos que irão definir a qualidade aceitável do produto
ou processo de modo a contribuir com a segurança deste e do consumidor.
48
Em relação a determinação de coliformes a 45C (termotolerantes),
nesta pesquisa em nenhuma das amostras (artesanais e comercializadas em
supermercado) logo após a obtenção e ao longo do período de armazenamento
foram detectados. Os resultados encontrados foram < log UFC/g. Esses
resultados se mostram satisfatórios e em acordo com a legislação brasileira, que
permite para este tipo de alimento valores < 2 log UFC/g (Brasil, 2001).
Chisté et al., (2007) e Ferreira Neto et al., (2004) também não
encontraram em suas pesquisas coliformes termotolerantes nas amostras de
farinha. Pessoa et al., (2006) também compararam amostras artesanais (casas de
farinha) e supermercado no Estado do Rio Grande do Norte e os resultados foram
satisfatórios ou de acordo com a legislação brasileira em relação aos coliformes e
em acordo com presente estudo.
O baixo índice de contaminação pode ser atribuído ao processo de
torração, etapa crítica do processamento, no qual o calor utilizado para a
obtenção da farinha de mandioca (aproximadamente 110C), causa a redução
dos micro-organismos contaminantes (Leitão et al., 1988). Sant’anna & Miranda
(2004) reforçaram em seus estudos a importância da temperatura do forno de
torração, pois verificaram presença de coliformes termotolerantes em farinhas,
cujos fornos do processo de obtenção de farinha de mandioca operavam em
temperatura entre 96,8 e 97,0C.
A salmonela necessita de água disponível para seu metabolismo e
multiplicação, com limite mínimo de 0,94 (Aljarallah & Adams, 2007). Chisté et al.,
(2007) consideram a atividade de água igual a 0,60 como sendo o limite mínimo
capaz de permitir o desenvolvimento de micro-organismos, daí o fato dos
alimentos desidratados, como a farinha de mandioca, serem considerados como
microbiologicamente estáveis. E em trabalho realizado neste mesmo ano, os
autores relatam que suas amostras apresentaram atividade de água na faixa de
0,38 a 0,44.
Outro importante fator que contribui para redução deste patógeno é a
etapa de torração na fabricação da farinha onde a temperatura do forno pode
chegar a 110C. A redução do micro-organismo pelo calor depende de vários
fatores, mas está principalmente relacionado ao substrato e ao sorotipo envolvido,
abaixo de 7C, para maioria dos sorotipos não há multiplicação, sendo
49
prontamente destruídas a temperaturas acima de 55C (Aljarallah & Adams,
2007).
Neste estudo não foi encontrada a presença de Salmonella spp. em
qualquer uma das amostras, resultado este de acordo com a legislação brasileira
(Brasil, 2001), já que a presença deste patógeno em alimentos é inaceitável
devido a seu grave perigo para saúde. Chisté et al., (2006) e Ferreira Neto et al.,
(2004) em seus estudos também não encontraram Salmonella em farinha de
mandioca artesanal nos Estados do Pará e Paraíba.
Os resultados satisfatórios encontrados podem estar associados às
condições pouco favoráveis da matriz alimentícia para o desenvolvimento das
salmonelas.
Na figura 1 encontram-se os resultados da pesquisa de Bacillus cereus
em amostras de supermercado e artesanais com mediana de 2,87 log UFC/g para
supermercado e 2,45 log UFC/g para as artesanais ao final do período de
armazenamento. Estes valores podem ser correlacionados com os resultados
encontrados quando comparados com a legislação brasileira RDC n 12 de
02/01/2001, e confirmam uma qualidade microbiológica superior nas amostras
artesanais que apresentaram 100% em acordo com o padrão. Em contrapartida,
as comercializadas em supermercado ao final do período tiveram 14,30% fora dos
parâmetros exigidos pela legislação brasileira vigente (Brasil, 2001).
Fig.1. Distribuição de dados em boxplots para Bacillus cereus em amostras de farinha de mandioca do tipo copioba em Supermercado (S) e Artesanais (A) em diferentes tempos de armazenamento (dias). O teste Mann-Whitney foi utilizado para comparar as diferenças de medianas.
50
Esta diferença de resultados pode estar associada às condições das
amostras anteriores ao período de armazenamento, como manuseio,
processamento, estocagem ou distribuição (Chaves et al., 2011). Além disso, nas
artesanais o P0 (período referente ao zero dia) considerado foi à data de
fabricação do produto, enquanto que as de supermercado o tempo considerado
foi à data da compra do produto, visto que a data de fabricação era desconhecida.
Outra característica observada foi em relação ao tipo de embalagem utilizada
para acondicionamento das farinhas comerciais que são geralmente frágeis sendo
comum encontrar micro furos permitindo assim o contato do produto com
ambiente externo, e o risco de contaminação cruzada que pode ocorrer tanto no
transporte e distribuição do produto quanto durante a exposição nas gôndolas de
supermercado, visto que possíveis veículos para B. cereus na cadeia alimentar
são poeira e o solo (Sudhaus et al., 2014).
A resistência destes micro-organismos ao calor está associada a sua
estrutura morfológica, possuindo uma região central, onde estão os elementos
genéticos, junto com as enzimas necessárias a germinação e crescimento inicial
do esporo. A resistência fisiológica aliada à sua habilidade de produzir enzimas
que degradam diversos substratos orgânicos possibilita esta bactéria estar
amplamente distribuída no meio ambiente, sendo o solo seu reservatório natural
(Blackburn & Mcclure, 2000). Em virtude destas características, a contaminação
ocorre facilmente em diferentes tipos de alimentos, como cereais e derivados,
produtos de laticínios, carnes, especiarias e alimentos desidratados (Chen et al.,
2001), entre eles a farinha de mandioca.
No processo de fabricação da farinha, a temperatura de torração é alta
em torno de 97C a 110C, é manual, geralmente realizado de forma rústica e
visual sem controle automático de temperatura, o que pode provavelmente não ter
sido eficaz para eliminação de todos os esporos de B. cereus no produto.
Em estudo realizado na Nigéria, Yusuf et al., (1992) confirmaram a
presença de Bacillus cereus em 92% das amostras de farinha de mandioca.
Embora a incidência de contaminação tenha sido alta, apenas 7,3% tinham
contagens > 5 log UFC/ g. Os autores atribuíram estas altas contagens a prática
de processamento inadequada e ao método tradicional de secagem ao sol, no
qual poeira e solo seriam possíveis veículos deste tipo de contaminação.
51
De acordo com o padrão microbiológico para farinha, o Bacillus cereus
foi o único que apresentou resultados insatisfatórios. Este fato pode estar
relacionado com a característica deste gênero, na qual suas cepas são capazes
de utilizar vários carboidratos, de hidrolisar amido, são aeróbios, mesófilos e
produtores de esporos (Roy et al., 2007). A germinação de esporos de bactéria
como B. cereus pode ser iniciada por meio de processos de aquecimento, e as
células vegetativas são capazes de multiplicar a temperaturas de até 60C
(Sudhaus et al., 2014).
Chisté et al., (2006), analisaram amostras de farinha de mandioca do
grupo seca produzidas no Estado do Pará e coletadas nos principais
supermercados e feiras livres da cidade. Os autores relatam que a contagem de
B. cereus estava dentro dos padrões exigidos pela legislação. No ano seguinte,
os mesmos resultados foram reportados em farinhas de mandioca do grupo
d’a ua em Castanhal (PA) (Chisté et al., 2007), o que difere dos resultados
encontrados no presente estudo.
A maioria dos estudos tem demonstrado que a contaminação por
Bacillus cereus é de se esperar em farinha de mandioca, visto as características
deste gênero, sendo o solo habitat natural, a habilidade de degradar diversos
substratos, e ser esporulado, atreladas às condições de fabricação da farinha
possibilita o desenvolvimento deste patógeno.
52
4 CONCLUSÃO
De modo geral, embora o processo de fabricação de farinha de
mandioca tipo copioba seja rudimentar, sem as Boas práticas de fabricação
(BPF), o produto final possui qualidade microbiológica satisfatória. Ao final do
período de armazenamento, as amostras artesanais apresentaram 100% em
acordo com a legislação, enquanto que a de supermercado tiveram 14,30% fora
dos parâmetros permitidos para Bacillus cereus (Brasil, 2001).
Apesar da maior parte dos resultados se apresentarem satisfatórios,
existe o perigo microbiológico devido à presença de Bacillus cereus em algumas
amostras, o que não garante a segurança ao consumidor quanto a este tipo de
produto, visto que comumente é consumido por períodos acima de seis meses de
armazenamento.
Os dados referentes às farinhas artesanais de copioba podem ser
utilizados para subsidiar o pedido de Indicação Geográfica do projeto maior
“Qua idade, Identidade e Notoriedade da farinha de mandioca de Nazaré das
farinhas-BA”, no qua o presente estudo está inserido.
É importante ressaltar que este trabalho permitiu conhecer a real
situação sanitária em que as Casa de farinha do Vale do copioba se encontram.
Os resultados finais terem apresentado satisfatórios não é indicativo que a região
está preparada para o pedido de Indicação Geográfica, se faz necessário um
trabalho de conscientização com os fabricantes e manipuladores de farinha no
que diz respeito às condições sanitárias de instalação e as boas práticas de
fabricação da farinha.
53
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