QUALIDADE DE VIDA EM CRIANÇAS COM DISTÚRBIOS … de Machado... · das tonsilas palatinas foi...
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QUALIDADE DE VIDA EM CRIANAS COM DISTRBIOS
RESPIRATRIOS DO SONO
Dissertao de Mestrado
Amaury de Machado Gomes
Salvador - Bahia
Brasil
2011
ii
QUALIDADE DE VIDA EM CRIANAS COM DISTRBIOS
RESPIRATRIOS DO SONO
Dissertao apresentada ao curso de Ps-
Graduao em Medicina e Sade
Humana da Escola Bahiana de Medicina
e Sade Pblica como requisito para
obteno do ttulo de Mestre em
Medicina e Sade Humana.
Autor: Amaury de Machado Gomes
Orientadora: Prof. Dra. Manuela
Garcia Lima
Salvador Bahia
2011
iii
Qualidade de vida em crianas com distrbios respiratrios do sono
Dissertao de Mestrado
Amaury de Machado Gomes
Folha de Aprovao
Comisso Examinadora
Manuela Garcia Lima
Doutora em Sade Pblica pelo Instituto de Sade Coletiva, UFBA.
Mrcia Lurdes de Cacia Pradella-Hallinan
Doutora em Cincias pela Universidade Federal de So Paulo,
UNIFESP.
Antonio de Souza Andrade Filho
Doutor em Medicina pela Universidade Federal Fluminense.
Regina Terse Trindade Ramos
Doutora em Medicina e Sade Humana pela Escola Bahiana de
Medicina e Sade Pblica.
Salvador-Bahia
2011
iv
INSTITUIES ENVOLVIDAS
EBMSP - Escola Bahiana de Medicina e Sade Pblica
FBDC - Fundao Bahiana para Desenvolvimento das Cincias
INOOA - Instituto de Otorrinolaringologia Otorrinos Associados
v
EQUIPE
Amaury de Machado Gomes Otorrinolaringologista, Mestrando.
Manuela Garcia Lima Professora Doutora em Sade Pblica pela Universidade Federal da
Bahia (UFBA), Brasil Orientadora.
Mrcia Pradella-Hallinan Professora Doutora em Cincias pela Universidade Federal de So
Paulo (UNIFESP), Brasil Co-orientadora.
Otvio Marambaia dos Santos Professor da Escola Bahiana de Medicina e Sade Pblica
(EBMSP), Coordenador do Estgio de Otorrinolaringologia do Inooa.
Kleber Pimentel Professor da Escola Bahiana de Medicina e Sade Pblica (EBMSP),
Mestre em Medicina Interna.
Pablo Pinillos Marambaia Preceptor da Residncia Inooa.
Ana Carolina Mendona Otorrinolaringologista Inooa .
Leonardo Marques Gomes Mdico.
vi
AGRADECIMENTOS
Agradeo primeiramente a DEUS por esse momento.
Expresso a minha gratido:
Aos meus pais, pelos ensinamentos de vida.
Ivete, esposa e amiga e aos filhos, Andr e Leonardo pela compreenso e apoio
demonstrados.
Ao mdico e amigo Otvio Marambaia, pelo apoio, estmulo, encorajamento e
aconselhamento.
Ao mdico Kleber Pimentel, pelo apoio incondicional, competncia e ajuda fundamental.
Professora Manuela Garcia, pela confiana demonstrada e sbias orientaes nesta
dissertao.
Doutora Mrcia Pradella-Hallinan, pela relevante contribuio neste estudo.
Aos professores da Ps-Graduao em Medicina e Sade Humana pelos ensinamentos.
Aos mdicos Pablo Marambaia, Ana Carolina Mendona, Leonardo Gomes e estagirios do
Inooa pela colaborao.
Aos colegas da Ps-Graduao pela cooperao.
Ctia, Cludia e Urnia e demais colaboradores do Inooa pela ateno e cuidados
dispensados as crianas.
Aos pacientes e seus pais, pela cooperao e participao neste trabalho.
Ao Inooa, por proporcionar a estrutura e apoio integral pesquisa.
SUMRIO
LISTA DE TABELAS E GRFICOS ...................................................................................................... 3
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ................................................................................................ 4
I. RESUMO .................................................................................................................................... 5
II. INTRODUO ........................................................................................................................... 6
III. REVISO DA LITERATURA ......................................................................................................... 9
III.1 CONCEITOS BSICOS E EPIDEMIOLOGIA ..................................................................... 9
III.1.1 FISIOPATOLOGIA DA SAOS ..................................................................................... 10
III.1.2 REPERCUSSES CLNICAS DA SAOS ........................................................................... 12
III.1.3 DIAGNSTICO DA SAOS ......................................................................................... 16
III.1.3.1 Diagnstico clnico ......................................................................................... 16
III.2 TRATAMENTO DA SAOS ............................................................................................ 20
III.2.1 TRATAMENTO CIRRGICO .............................................................................................. 20
III.2.2 TRATAMENTO CLNICO ........................................................................................... 21
II.3 QUALIDADE DE VIDA .................................................................................................. 21
III.3.1 AVALIAO DA QUALIDADE DE VIDA EM CRIANAS COM DISTRBIOS RESPIRATRIOS DO SONO 24
IV. OBJETIVOS ............................................................................................................................ 34
IV.1 PRIMRIO .................................................................................................................. 34
IV.2 SECUNDRIO ............................................................................................................. 34
V. JUSTIFICATIVA ........................................................................................................................ 35
VI. CASUSTICA, MATERIAL E MTODOS. ..................................................................................... 36
VI.1 DESENHO DO ESTUDO E POPULAO ESTUDADA ................................................... 36
VI.2 CRITRIOS DE AMOSTRAGEM ................................................................................... 36
VI.2.1 CRITRIOS DE INCLUSO ......................................................................................... 36
VI.2.2 CRITRIOS DE EXCLUSO ........................................................................................ 37
VI.3 INSTRUMENTOS ........................................................................................................ 37
VI.3.1 FICHA PARA COLETA DE DADOS CLNICOS .................................................................... 37
VI.3.2 QUESTIONRIO PADRO - LABORATRIO DE SONO....................................................... 38
VI.3.3 QUESTIONRIO OSA-18 ........................................................................................ 38
VI.3.4 QUESTIONRIO PARA COLETA DE DADOS CLNICOS ....................................................... 39
VI.3.5 VIDEONASOFIBROLARINGOSCOPIA ............................................................................ 39
VI.3.6 AVALIAO ANTROPOMTRICA ................................................................................ 40
VI.3.7 CLASSIFICAO NUTRICIONAL .................................................................................. 40
2
VI.3.8 AVALIAO POLISSONOGRFICA ............................................................................... 41
VI.4 VARIVEIS ANALISADAS ............................................................................................ 45
VI.5 ANLISE ESTATSTICA, DESCRIO E TRATAMENTO DAS VARIVEIS....................... 45
VI 5.1 HIPTESES .............................................................................................................. 45
VI.6 CLCULO AMOSTRAL ................................................................................................ 46
VI.6.1 JUSTIFICATIVA PARA USO DE PREVALNCIA DE 25% ....................................................... 46
VI.7 ASPECTOS TICOS ..................................................................................................... 47
VII. RESULTADOS ........................................................................................................................ 48
VIII. DISCUSSO .......................................................................................................................... 58
IX. LIMITAES E PERSPECTIVAS ................................................................................................. 66
X. CONCLUSO ........................................................................................................................... 68
XI. ABSTRACT ............................................................................................................................. 69
XII. REFERNCIAS ........................................................................................................................ 70
XIII. ANEXOS ............................................................................................................................... 77
ANEXO A FICHA PARA COLETA DE DADOS CLNICOS .................................................................. 78
ANEXO B QUESTIONRIO PADRO - LABORATRIO DE SONO ................................................... 80
ANEXO C ( OSA-18) ................................................................................................................... 84
ANEXO D QUESTIONRIO PARA COLETA DE DADOS CLNICOS ................................................... 86
ANEXO E TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ................................................... 88
ANEXO F COMIT DE TICA E PESQUISA .................................................................................... 89
3
LISTA DE TABELAS E GRFICOS
Grfico 1 Frequncia dos sintomas presentes na avaliao basal das crianas atendidas entre
agosto de 2008 e maro de 2009. ............................................................................................ 48
Grfico 2 Impacto na qualidade de vida das crianas segundo o OSA-18 basal das crianas
atendidas entre agosto de 2008 e maro de 2009. ................................................................... 51
Grfico 3 Frequncia simples de cada categoria de distrbio obstrutivo do sono
diagnosticada por polissonografia realizadas nas crianas atendidas entre agosto de 2008 a
maro de 2009.......................................................................................................................... 51
Tabela 1 Caractersticas sociodemogrficas da populao estudada entre agosto de 2008 a
maro de 2009.......................................................................................................................... 52
Tabela 2 Caractersticas sociodemogrficas e antropomtricas das crianas atendidas entre
agosto de 2008 a maro de 2009............................................................................................. 52
Tabela 3 Achados do exame otorrinolaringolgico (ORL) de crianas com apneia e ronco
primrio atendidas entre agosto de 2008 a maro de 2009...................................................... 53
Tabela 4 Frequncia dos escores mdios dos domnios e do escore total do OSA-18 das
crianas com apneia e ronco primrio atendidas entre agosto de 2008 a maro de 2009 (mdia
desvio padro)....................................................................................................................... 53
Grfico 4 Frequncia do grau de impacto na qualidade de vida segundo o OSA-18 nas
crianas com SAOS e com RP atendidas entre agosto de 2008 a maro de 2009 (p=0,18). Qui
Quadrado.................................................................................................................................. 54
Tabela 5 Escores mdios do OSA-18 por grau de obstruo farngea e palatina das criancas
atendidas entre agosto de 2008 a maro de 2009..................................................................... 54
Tabela 6 Correlao entre o grau de obstruo farngea e palatina com os domnios e o
escore total do OSA-18 nas crianas atendidas entre agosto de 2008 a maro de 2009.......... 55
Tabela 7 Frequncia dos sintomas referidos entre crianas com SAOS e RP (%) atendidas
entre agosto de 2008 a maro de 2009..................................................................................... 56
Tabela 8 Variveis polissonogrficas em crianas com SAOS e RP atendidas entre agosto
de 2008 a maro de 2009......................................................................................................... 56
4
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CBCL: The Child Behavior Check-list
CHQ-PF28: The Child Health Questionaire-PF 28
CPAP: Presso positiva contnua em via area
DOS: Distrbio obstrutivo do sono
DRS: Distrbio respiratrio do sono
HAT: Hipertrofia adenotonsilar
IA: ndice de apneia
IAH: ndice de apneia e hipopneia
IDR: ndice de distrbio respiratrio
IH: ndice de hipopneia
IMC: ndice de massa corprea
MOS: Escore de oximetria McGill
OSA-18: Francos Pediatric Obstructive Sleep Apnea Questionnaire
OSD-6: 6-item Health-related Instrument
PedsQL: Pediatric Quality of life Inventory
PSQ: Pediatric Sleep Questionaire
PSG: Polissonografia
QV: Qualidade de vida
RP: Ronco primrio
SAOS: Sndrome da apneia obstrutiva do sono
SF-36: Medical Outcome Study Short Form-36
SRVAS: Sindrome da resistncia das vias areas superiores
SpO2: Saturao de O2 da hemoglobina
TAHSI: The Tonsil e Adenoid Health Status Instrument
5
I. RESUMO
Introduo: Crianas podem apresentar distrbios respiratrios do sono (DRS), que incluem
o Ronco Primrio (RP) e a Sndrome da Apneia Obstrutiva do Sono (SAOS). O padro ouro
para diagnstico a polissonografia (PSG) e a principal causa a hipertrofia adenotonsilar
(HAT), sendo a adenotonsilectomia o tratamento mais adequado. Os DRS levam a inmeras
complicaes e repercusses na qualidade de vida (QV) e para avali-la so utilizados
questionrios com respostas dos pais ou cuidadores responsveis. Objetivos: avaliar a
qualidade de vida de crianas com DRS, comparar crianas com Sndrome da Apneia
Obstrutiva do Sono (SAOS) e sem apneia (RP) e identificar qual ou quais os domnios do
questionrio OSA-18 esto mais comprometidos. Casustica, material e mtodos: estudo
transversal com amostragem consecutiva de demanda espontnea em crianas com histria de
roncos e/ou apneia, com hiperplasia das tonsilas palatinas ou adenoides. O grau de obstruo
das tonsilas palatinas foi identificado pela classificao de Brodsky e das tonsilas farngeas
(adenoide) foi aferido pela videonasofibrolaringoscopia, sendo a qualidade de vida avaliada
pelo questionrio OSA-18. O diagnstico de SAOS e RP foi realizado atravs da PSG.
Resultados: participaram 59 crianas com mdia de idade entre 6,72,26 anos. O escore
mdio do OSA-18 foi 77,913,22 e os domnios mais prevalentes foram: preocupao dos
responsveis (21,84,25),perturbao do sono(18,85,19) e sofrimento
fsico(17,35,00). O impacto foi pequeno em 6 crianas (10,2%), moderado em 33 (55,9%) e
grande em 20 (33,9%). RP foi encontrado em 44 crianas (74,6%), SAOS em 15 (25,6%);
sendo graus: leve 6 crianas (10,2%), moderado em 1 (1,7%) e acentuado em 8 (13,6%).
SAOS tem o domnio sofrimento fsico mais afetado que RP (p=0,04). Houve ausncia de
correlao entre o escore OSA-18 e o grau de obstruo farngea (r= 0,18; p=0,17) e palatina
(r= 0,04; p=0,74). No houve diferena entre o escore OSA-18 e os grupos RP, SAOS leve,
moderada e acentuada (p=0,07). O IA (r=0,22; p=0,08) e o IAH (r=0,14; p=0,26) no se
correlacionaram com OSA-18. Concluso: Os DRS causaram impacto de moderado a grande
na QV e os domnios mais afetados foram: preocupao dos responsveis, perturbao do
sono e sofrimento fsico. As crianas portadoras de SAOS tiveram o domnio sofrimento
fsico mais afetado que RP. O escore do OSA-18 no se correlacionou com RP, SAOS, IA,
IAH.
Palavras-chave: 1. Qualidade de vida; 2. Crianas; 3. Apneia do sono; 4. Ronco; 5. Distrbio
respiratrio do sono.
6
II. INTRODUO
Os distrbios respiratrios do sono (DRS) so relativamente frequentes na populao
infantil e incluem o ronco primrio (RP), a sndrome da resistncia das vias areas superiores
(SRVAS) e a sndrome de apneia obstrutiva do sono (SAOS).
O RP definido como um rudo respiratrio, mas a arquitetura do sono, a ventilao
alveolar e saturao sangunea de oxignio mantm-se normais. Isto frequente na infncia e
afeta de 7% a 9% das crianas de um a dez anos.1
A sndrome da resistncia das vias areas superiores (SRVAS) caracteriza-se por
aumento da resistncia das vias areas ao esforo respiratrio, com ronco noturno, despertares
breves e fragmentao do sono, porm sem reduo significativa do fluxo areo ou
dessaturao da oxihemoglobina. Sua prevalncia na infncia ainda desconhecida.2
A sndrome de apneia obstrutiva do sono (SAOS) em crianas uma desordem
respiratria durante o sono caracterizada por obstruo parcial prolongada das vias areas
superiores e/ou obstruo completa intermitente (apneia obstrutiva), que prejudicam a
ventilao normal durante o sono e os padres de sono normal. A prevalncia na infncia
varia de 0,7 a 3 % em diferentes estudos epidemiolgicos e o pico de incidncia observado
nos pr-escolares, sendo a hipertrofia adenotonsilar a principal causa.3
A criana com SAOS tambm pode apresentar hipoventilao obstrutiva, situao
em que, por vrios minutos, ocorrem roncos contnuos e movimento paradoxal de caixa
torcica, sem apneias, sendo que o melhor meio para detectar esses eventos atravs da
medida de gs carbnico exalado (ETCO2).4
A SAOS pode ter consequncias graves como
cor pulmonale, retardo do crescimento pndero-estatural, alteraes do comportamento,
prejuzo do aprendizado e comprometimento de outras funes cognitivas da criana5.
7
Os DRS tambm podem afetar a qualidade de vida (QV) dos seus portadores. Silva e
Leite6 citam o conceito de QV como uma percepo nica e pessoal relacionada ao estado de
sade e/ou aspectos no mdicos da vida, podendo ser medida atravs da determinao de
opinies de indivduos (pacientes) com o uso de instrumentos especficos. A QV das crianas
uma rea emergente de pesquisa. Nos ltimos anos em pases desenvolvidos, sobretudo nos
Estados Unidos, tm aumentado o interesse sobre a relao existente entre QV e DRS.6
Em um estudo foram avaliadas 61 crianas com SAOS, diagnosticadas atravs de
polissonografia realizada aps uma noite de privao do sono. Destas obteve-se um impacto
pequeno na QV em 20 crianas (33%), moderado em 19 (31%) e grande em 22 (36%).7
Stewart et al.,8-10
em 2000 e 2001, publicaram trs estudos sobre a validao do
questionrio de avaliao de QV, o Child Health Questionaire PF28 (CHP-PF28) especfico
para crianas com doena adenotonsilar e demonstraram o impacto desta doena. Concluram
que este questionrio poderia ajudar especialistas e pediatras a avaliarem rotinas e protocolos
e assegurarem melhoria na qualidade de vida das crianas afetadas.
Outros estudos internacionais demonstram que os DRS tm impacto negativo
significante na qualidade de vida das crianas portadoras de hipertrofia adenotonsilar com
melhora aps adenotonsilectomia11-22
.
No Brasil, Silva e Leite23
publicaram o primeiro estudo de QV em crianas com DRS
utlizando o instrumento OSA-18, baseado na publicao de Franco et al.7
Foram avaliadas 48
crianas prospectivamente com quadro clnico de DRS e indicao para adenoidectomia e/ou
adenotonsilectomia. Eles concluram que DRS apresentam impacto relevante na qualidade de
vida e que melhoram aps o tratamento cirrgico23
.
8
Outros autores nacionais avaliaram QV em crianas com hipertrofia adenotonsilar e
DRS, utilizando os questionrios de avaliao OSA-18 e OSA-6, concluindo que h uma
melhora na QV dessas crianas aps adenotonsilectomia24-27
. Nenhum dos artigos nacionais
citados utilizou o padro ouro para diagnstico da SAOS, a polissonografia (PSG) em
laboratrio de sono.
9
III. REVISO DA LITERATURA
III.1 CONCEITOS BSICOS E EPIDEMIOLOGIA
Crianas em idade pr-escolar podem apresentar vrios distrbios respiratrios
obstrutivos durante o sono: ronco primrio (RP), sndrome da resistncia das vias areas
superiores (SRVAS), hipoventilao obstrutiva, sndrome de apneia obstrutiva do sono
(SAOS)28
. Nas crianas, a SAOS se caracteriza por um continuum que vai desde o ronco
primrio, passando pela resistncia aumentada das vias areas superiores at a SAOS
propriamente dita e difere dos padres vistos nos adultos, no que diz respeito sua
fisiopatologia, ao quadro clnico, diagnstico e tratamento29
.
O ronco primrio definido como a presena de um rudo respiratrio, causado por
uma vibrao nas estruturas das vias area superiores (VAS), mas a arquitetura do sono,
ventilao alveolar e saturao sangunea de oxignio encontram-se normais. A prevalncia
de 7-9% em crianas de um a dez anos1. Petry et al.
30, aps estudarem 1011 crianas de 9 a 14
anos de idade e aplicarem um questionrio com sintomas de DRS, encontraram prevalncia de
27% para ronco habitual. Outros estudos
31,32 relatam prevalncia de 12% nesta faixa etria.
A sndrome da resistncia das vias areas superiores (SRVAS) caracteriza-se por
aumento da resistncia das VAS ao fluxo inspiratrio, com ronco noturno, despertares breves
e fragmentao do sono, porm sem reduo significativa do fluxo areo ou dessaturao da
oxihemoglobina. Sua prevalncia na infncia ainda desconhecida2,5
.
A sndrome de apneia obstrutiva do sono (SAOS) em crianas uma desordem
respiratria durante o sono caracterizada por obstruo parcial prolongada das vias areas
superiores e/ou obstruo completa intermitente (apneia obstrutiva) que prejudicam a
ventilao normal durante o sono e os padres de sono normal. Esta ocorre desde o perodo
10
neonatal at a adolescncia; contudo, mais comum em crianas em idade pr-escolar,
sobretudo entre dois aos seis anos de idade, e no h predominncia entre os sexos. A
prevalncia de SAOS na infncia varia de 0,7 a 3 % em diferentes estudos3,5,32,33
.
III.1.1 FISIOPATOLOGIA DA SAOS
A SAOS uma condio sria durante a infncia e sua fisiopatologia ainda pouco
entendida18
.
Em condies fisiolgicas, as VAS mantm-se permeveis graas a fatores
anatmicos e funcionais. Na criana a SAOS possui etiologia multifatorial e ocorre devido a
fatores estruturais e neuromotores. O sono modifica a funo e o controle do sistema
respiratrio por reduo do estmulo respiratrio e h hipotonia dos msculos intercostais e
dilatadores das VAS. Estas modificaes alteram significantemente as vias areas superiores e
a troca de gases em crianas normais e ainda aquelas com doenas respiratrias ou de sistema
nervoso. Uma minoria delas, com obstruo de vias areas severa, apresenta respirao
ruidosa mesmo quando acordadas.
Na SAOS, as vias areas superiores em crianas apresentam aumento de tnus
neuromotor farngeo, em especial do msculo genioglosso, originando um padro
predominante de obstruo parcial e persistente de vias areas superiores, alm da hipercapnia
e da hipxia (chamado de hipoventilao obstrutiva). O msculo genioglosso promove a
protruso da lngua, evitando que ela se mova em direo parede posterior da orofaringe em
condies normais. O hbito de respirao bucal promove uma rotao da mandbula em
direo dorso caudal, alterando a posio do msculo genioglosso e reduzindo a capacidade
de protruso da lngua. Um padro adequado de resposta em VAS ocorre em resposta a
estmulos como hipxia e hipercapnia, compensando parcialmente o aumento da resistncia
11
de vias areas evitando o colapso destas. Os perodos prolongados e ininterruptos de
hipoventilao obstrutiva acontecem devido ao aumento do limiar dos despertares em resposta
SAOS. Os despertares e apneias cclicas so mais comuns em adultos 5,33
.
Essa sndrome difere no tocante fisiopatologia, ao quadro clnico, diagnstico e
tratamento em se tratando de sua ocorrncia em crianas e adolescentes ou no caso de adultos.
O esqueleto craniofacial o arcabouo que protege as VAS. Anormalidades como atresia
coanal, hipoplasia mandibular, deformidade da base do crnio, alteraes de limites sseos do
rinofaringe podem levar SAOS. A alterao mais comum nas crianas com SAOS a
hipertrofia adenotonsilar, que acontece principalmente dos trs aos oito anos.
Acredita-se que a SAOS em crianas esteja associada a uma combinao de
hipertrofia adenotonsilar e tnus muscular da via area alterado. Entretanto, deve-se ressaltar
que a intensidade da SAOS no proporcional ao tamanho das tonsilas e quando
normotrficas, no excluem a SAOS, pois nem todas as crianas com hipertrofia
adenotonsilar tm apneia; a maioria delas, durante a viglia, no apresenta obstruo
respiratria, quando o tnus muscular maior e muitas delas aps adenotonsilectomia voltam
a ter SAOS na adolescncia5,34-40
.
A prevalncia de sobrepeso e obesidade em crianas e adolescentes tem aumentado
nas ltimas duas dcadas em todo o mundo. Por exemplo, a prevalncia duplicou em crianas
entre 6 e 11 anos de idade e triplicou entre 12 e 17 anos nos Estados Unidos, entre 1980 a
2000. Tal fato evidenciou que crianas obesas podem ter aumentado o risco para SAOS.
Certamente, a proporo de DRS aumentou em obesos37
. Redline et al.
38, examinando fatores
de risco para DRS em crianas de 2 a 18 anos, encontraram risco entre crianas obesas
aumentado em 4 a 5 vezes. As sndromes genticas, especialmente aquelas relacionadas com
o tero mdio da face (como a Sndrome de Alpert), micrognatia (como a Sndrome de Pierre-
Robin), as anomalias da base do crnio (com a Sndrome de Arnold-Chiari) ou obstruo
12
nasal (como a Sndrome de Charge) so as causas mais comuns de SAOS em lactentes33
. A
obstruo nasal grave por rinite, tumores ou plipos volumosos pode tambm levar
respirao bucal e SAOS5.
III.1.2 REPERCUSSES CLNICAS DA SAOS
III.1.2.1 Sistema cardiovascular
Os DRS esto associados de forma significativa com nveis elevados da presso
sangunea em crianas de 5 a 12 anos de idade41
. Em adultos, hipertenso arterial uma
complicao de SAOS, porm na criana no est bem estudada sistematicamente. Diante
disto, Marcus et al.42
estudaram 75 crianas com suspeita de SAOS e submeteu-as
polissonografia com medidas seriadas da presso arterial. Comparou 41 crianas com SAOS e
26 com ronco primrio. Concluram que crianas com SAOS tm presso sangunea diastlica
elevada comparadas com crianas portadoras de RP, e que o grau de elevao da presso
sangunea tem relao com a severidade da SAOS e o grau de obesidade das crianas. Os
autores recomendam medidas da presso arterial em todas as crianas com SAOS.
Amin et al.43
publicaram estudo com crianas entre 7 e 13 anos de idade, roncadoras,
com hipertrofia das tonsilas farngeas e palatinas e as comparou com controles. Todas as 140
crianas se submeteram polissonografia noturna, monitorizao ambulatorial da presso
arterial durante 24 horas, ecocardiografia e actigrafia. Este ltimo um exame realizado com
um equipamento preso ao pulso do paciente denominado actgrafo, que registra a atividade
motora corporal, ou seja, o aumento da atividade durante o estado de viglia e reduo durante
o sono4. Os autores concluram que a presso arterial sistlica diurna e noturna, presso
13
arterial diastlica e presso arterial mdia foram fatores preditivos para mudanas na
espessura da parede ventricular esquerda. Portanto, distrbios respiratrios do sono em
crianas que so saudveis esto associados a um pico de aumento matinal da presso arterial.
A associao entre o remodelamento ventricular esquerdo e a presso arterial de 24 horas
destaca o papel dos distrbios respiratrios do sono no aumento da morbidade
cardiovascular43
.
As alteraes morfolgicas e funcionais cardacas encontradas no ventrculo direito e
ventrculo esquerdo sugerem que, em crianas, a obstruo respiratria durante o sono pode
levar a repercusses cardiovasculares. Estas anormalidades podem expor essas crianas a um
maior risco anestsico e cirrgico44
.
Por outro lado, no intuito de estimar o risco de presso sangunea elevada em
crianas com distrbio respiratrio do sono, Zintzaras e Kaditis45
, publicaram uma metanlise
com estudos de coorte publicados nos quais investigaram esta relao. Dos 66 ttulos
publicados no PubMed e revisados, 12 deles foram considerados relevantes. Porm, nestes
chegou-se concluso que no existem evidncias de elevao da presso arterial,
especialmente a sistlica em crianas com distrbio severo respiratrio durante o sono.
Contudo, h que se fazer a ressalva de que os trabalhos selecionados apresentavam nmero
pequeno de casos e critrios de incluso heterogneos. Destarte, avalia-se ser necessrio
ampliar o foco desses estudos, sobretudo com maior rigor metodolgico.
J no Brasil, Granzotto et al.46
estudaram 45 crianas com DRS e encontraram boa
correlao entre o tamanho da tonsila palatina (T/P) aferido atravs de radiografia lateral do
pescoo, com ponto de corte identificado pela curva ROC de 0,66 e a presso da artria
pulmonar medida por ecocardiografia com Dopller (r=0,624; p0,66 (p
14
Arritmias, bradicardias podem estar presentes em crianas com SAOS. Em estudo
com 70 crianas e adolescentes, Guilleminault et al.47
compararam um grupo com SAOS
secundria a um problema mdico e outro com SAOS primria. Os referidos autores
encontraram em todos os participantes, arritmia sinusal em associao com apneias repetidas
durante o sono. Notaram tambm bloqueio atrioventricular do segundo grau em 28% das
crianas com SAOS. Paradas sinusais entre 2,5 a 9 segundos foram notadas em 52%, bloqueio
atrioventricular em 28% e taquicardia atrial paroxstica em 16% dos casos, alm de elevao
da presso arterial.
Hipertenso pulmonar decorrente de hipercapnia e a hipoxemia recorrentes podem
ocasionar o aumento da sobrecarga de trabalho do ventrculo direito que, com o tempo, pode
levar essa criana a desenvolver insuficincia cardaca congestiva e cor pulmonale33
.
III.1.2.2 Crescimento e metabolismo
Crianas com SAOS podem apresentar consequncias clnicas significantes, como
retardo do crescimento pndero-estatural e existem basicamente trs teorias que tentam
explic-los; so estas: a) reduo da produo de hormnio de crescimento (GH), b) reduo
do aporte calrico pela anorexia/disfagia nas crianas com hipertrofia adenotonsilar; c) maior
gasto de energia pelo esforo respiratrio. Mesmo em crianas com roncos, que no
preenchem os critrios da presena de SAOS, h evidncias de diminuio do crescimento e,
com frequncia, h decrscimo da protena ligadora 3 do IGF (fator de crescimento smile a
insulina do tipo I). Isso sugere que o roncar, ocasionando a fragmentao do sono, afeta a
liberao do GH. Aps adenotonsilectomia ocorre a recuperao do crescimento da criana
afetada e, havendo resoluo da SAOS, no ocorre dficit residual somtico5,23,48,49
.
15
De la Eva et al.50
avaliaram a ligao entre SAOS, resistncia insulina e
dislipidemia em 62 crianas e adolescentes obesos, aps polissonografia e exames
metablicos. Observaram alterao da glicemia em jejum em 7 crianas (11%) e correlao
entre a severidade da SAOS e nvel de insulina.
III.1.2.3 Funes cognitivas
As principais consequncias de SAOS em crianas incluem distrbios
comportamentais, dficit de aprendizado, hiperatividade, reduo da ateno, ansiedade,
depresso, hipersonolncia diurna (em crianas mais velhas) e prejuzo do crescimento
somtico13,33,39,51,52,53
. Mais de 25% dos pais de crianas com SAOS descrevem hiperatividade
e problemas comportamentais. Altos ndices de DRS tm sido demonstrados em crianas com
problemas de comportamento48
. Cerca de 30% das crianas com hipertrofia adenotonsilar tm
alteraes de comportamento como agressividade e hiperatividade. A prevalncia de ronco
noturno habitual em 143 crianas com transtorno de dficit de ateno e hiperatividade
(TDAH) foi de 30% 5.
Uema et al.52,53
encontraram alta prevalncia (25%) de comportamento anormal em
crianas e piores resultados no teste de aprendizagem e memria (Teste de Rey),
principalmente em relao ao grupo com RP quando comparado com SAOS. J o teste de
ateno no apresentou diferena entre eles. Gozal54
demonstrou que crianas com problemas
de aprendizado escolar tm a incidncia de SAOS seis vezes maior do que na populao
peditrica geral.
Outro dado que merece ser ressaltado que apesar da sonolncia excessiva diurna ser
comum entre os adultos com SAOS, esta tem baixa prevalncia entre as crianas, sendo mais
frequente a hiperatividade36,48
.
16
III.1.3 DIAGNSTICO DA SAOS
III.1.3.1 Diagnstico clnico
A histria clnica e o exame fsico continuam sendo os mais utilizados para
diagnosticar a maioria das crianas com DRS e estes associados tm validade apenas como
triagem, na identificao de quais so os pacientes que necessitam de investigao adicional.
Estas ferramentas tm baixa sensibilidade (35%) e especificidade (39%), portanto no so
preditivas para SAOS55
.
Valera et al.56
avaliaram 267 crianas com quadro clnico de SAOS, que foram
divididos em dois grupos pr-escolares (menores que 6 anos ) e escolares (maiores que 6
anos). Em seguida foram alocados em trs subgrupos adicionais, de acordo com a hipertrofia
tonsilar, e comparados aos achados da polissonografia de noite inteira. Eles concluram que a
histria clnica de ronco e apneia e os achados polissonogrficos apresentaram fraca
correlao. Tambm no encontraram correlao entre o grau de obstruo e os achados
polissonogrficos em crianas mais velhas.
Brietzke et al.57
realizaram reviso sistemtica para avaliar a acurcia da histria
clnica e do exame fsico no diagnstico de SAOS na infncia. Foram analisados 12 artigos
com nvel de excelncia de bom a excelente e concluram que histria clnica e exame fsico
no so suficientes para discriminar RP e SAOS na infncia.
Na anamnese das crianas com SAOS importante inquirir aos genitores ou
cuidadores sobre sintomas como roncos noturnos habituais (> 4 vezes/semana), pausas
respiratrias, dificuldade para respirar, sono agitado, sudorese noturna e respirao bucal.
Outros sinais tambm podem ser observados como: sudorese profusa, cianose/palidez, rinite,
enurese, hbito de dormir em posio de hiperextenso cervical, sonolncia diurna excessiva,
17
alteraes de comportamento e dficit de aprendizado5,29,33,48
. O principal sintoma da SAOS
o ronco, presente em quase todas as crianas afetadas, porm a sua intensidade no est
relacionada gravidade do quadro29,33
. Em crianas mais novas, especialmente lactentes, o
ronco mais sutil, e os sintomas podem ser apenas o de dificuldade de alimentao, com tosse
e movimentos durante a mesma33
.
Diante do exposto, cabe sinalizar para o profissional especial ateno ao exame
fsico, no sentido de observar a graduao das tonsilas palatinas, identificao da situao
pndero-estatural do paciente, sinais de respirador bucal, formato craniofacial (face ovalada e
longa, mento curto e estreito, retro posio da mandbula, palato alto e arqueado, palato mole
alongado), abertura orofarngea classificada pela escala de Malampatti35
, inspeo do nariz,
rinoscopia anterior e avaliao cardiolgica em busca de sinais sugestivos de sobrecarga de
ventrculo direito e de hipertenso arterial sistmica29,33,48,55
.
III.1.3.2 Exames complementares
Um hemograma pode apresentar anemia e, mais raramente, na srie vermelha, pode-
se verificar policitemia devido hipoxemia noturna. As dosagens de bicarbonato srico,
ferritina e ferro srico podem ser teis. Eletrocardiograma e ecocardiograma podem estar
indicados quando houver suspeita de cor pulmonale. A radiografia lateral da regio cervical
das VAS (radiografia de cavum) avalia o grau de obstruo promovido pelas tonsilas
farngeas (adenoide) e palatinas. Atualmente, a nasofibroscopia, exame de grande utilidade,
para avaliar as VAS, permite ao otorrinolaringologista diagnosticar desvios septais,
hipertrofia das conchas nasais e da adenoide, alteraes dinmicas da respirao e da
deglutio. Na suspeita de malformaes ou massas do sistema nervoso central h indicao
para o uso de ressonncia nuclear magntica ou tomografia computadorizada5,33,55
.
18
A polissonografia realizada em laboratrio de sono considerada o melhor mtodo de
diagnstico (padro ouro) e pode ser realizada em qualquer faixa etria, sendo especialmente
recomendada para se diferenciar SAOS de RP, apneias centrais, convulses noturnas e
narcolepsia, alm de avaliar a severidade da SAOS, o risco de complicaes no ps-operatrio
imediato e o seguimento ps-tratamento. O exame constitui-se de uma monitorizao no
invasiva de diversos parmetros e deve ser realizado em sono espontneo e noturno29,33
.
H inmeras diferenas no registro da SAOS na polissonografia de crianas e dos
adultos. A maioria dos despertares, apneia e hipopneia obstrutiva da criana ocorre no sono
REM58
e elas sofrem uma dessaturao significativa da hemoglobina, mesmo nas apneias de
curta durao, j que seu metabolismo e consumo de oxignio so maiores do que os dos
adultos. As crianas com SAOS podem tambm apresentar uma obstruo parcial demorada
das VAS, chamada de hipoventilao obstrutiva58
. Esta se caracteriza por ronco contnuo por
vrios minutos e movimento paradoxal de caixa torcica, sem apneias. A melhor forma de se
detectar esses eventos por meio da medida de gs carbnico exalado (ETCO2) que se
apresenta aumentado devido dificuldade de ventilao4.
O diagnstico polissonogrfico de SAOS feito quando o ndice de apneia obstrutiva
for > 1 evento/hora de sono associado dessaturao da oxihemoglobina ( 53 mmHg considerados alterados. Recentemente, a
Academia Americana de Medicina do Sono, em sua publicao sobre o escore do sono e dos
eventos associados, recomendou a utilizao do percentual de tempo com CO2 > 50 mmHgn
(aferido por capnografia ou PaCO2 transcutneo) superior a 25% do tempo total de sono como
critrio para hipoventilao. Em adolescentes, a partir dos 13 anos, pode ser utilizado o
mesmo critrio dos adultos (IAH 5 eventos/h)12
.
19
Outros mtodos de avaliao como a polissonografia diurna, gravao em vdeo,
pulso-oximetria noturna apresentam baixa especificidade, subestimam a severidade do quadro
e no excluem a SAOS 5,29,33,51,59
. Um estudo transversal estudou 349 crianas com quadro de
DRS e, aps PSG, encontrou SAOS em 210 (60%). Estas tambm realizaram pulsoximetria.
Brouillette et al.51
concluram que um resultado negativo da pulsoximetria no descarta
SAOS.
Na infncia, a probabilidade de ausncia de diagnstico de distrbios obstrutivos do
sono maior do que nos adultos, porque os sinais e sintomas so diferentes e menos
reconhecidos nas crianas. Na impossibilidade de realizar polissonografia, autores
desenvolveram questionrios para identificar DRS nas crianas e sintomas complexos,
incluindo ronco, sonolncia diurna e distrbios de comportamento referidos.
Chervin et al.60
aplicaram o questionrio Pediatric Sleep Questionnaire (PSQ) aos
pais de 162 crianas entre 2 e 18 anos e concluram que este um instrumento vlido e
confivel, principalmente em situaes de pesquisa clnica nas quais no se dispe da
polissonografia, mas ainda no recomenda o seu uso para a prtica clnica. J Preutthipan et
al.61
estudaram 65 crianas com SAOS e, aps os pais completarem um questionrio sobre as
dificuldades respiratrias durante o sono, concluram que a polissonografia ainda necessria
para determinar o grau de severidade da obstruo.
20
III.2 TRATAMENTO DA SAOS
III.2.1 TRATAMENTO CIRRGICO
Diferentemente do adulto, o tratamento mais indicado da SAOS na infncia, que tem
como principal causa a hipertrofia de adenoide e/ou de tonsilas palatinas, o tratamento
cirrgico adenotonsilectomia. A histria direcionada e o exame fsico seguido de
tonsilectomia e adenoidectomia so efetivos na melhoria das sequelas fsicas e da qualidade
de vida nas crianas afetadas, assim como h melhora do sono e do comportamento29,33,48,53,62
.
A SAOS pode levar a significantes sequelas e a adenotonsilectomia permite sua cura em 75-
100% das crianas com hipertrofia adenotonsilar, sendo a primeira linha de tratamento para
SAOS62
.
Arrate et al.63
publicaram um estudo que tinha por objetivo avaliar o efeito da
adenotonsilectomia na saturao de O2 medida por oximetria de pulso noturna em 27 crianas
com suspeita de DRS e encontraram melhora significativa no ndice de dessaturao de
oxignio ps-operatrio quando comparado com o pr-operatrio.
As complicaes no ps-operatrio imediato de adenotonsilectomia em crianas com
SAOS incluem edema pulmonar e insuficincia respiratria secundria obstruo das VAS e
exigem cuidado ps-operatrio intensivo. Essas complicaes so mais comuns quando a
cirurgia est associada a fatores de risco, tais como: idade menor que trs anos, ndice de
distrbio respiratrio maior que 10/hora, saturao mnima menor que 70%, dificuldade
moderada de ganho pndero-estatural, doenas isoladas, sndrome de Down, doenas
neuromusculares, cor pulmonale, histria de prematuridade, uvulopalatofaringoplastia
associada no mesmo tempo cirrgico, infeco respiratria recente e obesidade33,48
.
21
Outras cirurgias (como traqueostomia, uvulopalatofaringoplastia, avanamento de
mandbula e reduo da lngua) podem ser indicadas em casos especficos, como sndromes
genticas, doenas neuromusculares, desordens crnio faciais e paralisia cerebral5,29,33
.
fundamental o acompanhamento do paciente aps a cirurgia, uma vez que pode haver
recorrncia da obstruo64
.
III.2.2 TRATAMENTO CLNICO
Nos casos em que a adenotonsilectomia no esteja indicada, ou em outras condies
particulares que se associam patognese da SAOS, como malformaes cranianas, o
Continuous Positive Airway Pressure nasal (CPAP) est indicado. Este, no geral, bem
tolerado pela maioria das crianas (cerca de 80 a 86% delas), aps um perodo de treinamento
do paciente e de familiares. Na ltima dcada, o CPAP tem sido utilizado de forma crescente
em crianas, como alternativa segura a cirurgias de vias reas superiores ou traqueostomia.
Contudo, a traqueostomia ainda pode ser necessria, caso outras medidas se mostrem
ineficazes. Tratamento da obesidade, controle da rinite, corticosteroides nasais, medidas de
higiene do sono, terapia ortodntica e/ou fonoaudiolgica so tambm importantes na
abordagem das crianas com SAOS5,33,48
.
II.3 QUALIDADE DE VIDA
Tornou-se lugar-comum, no mbito do setor sade, repetir, com algumas variantes, a
seguinte frase: sade no ausncia de doena, sade qualidade de vida. Por mais correta
que esteja, tal afirmativa costuma ser vazia de significado e, frequentemente, revela a
22
dificuldade que os profissionais da rea tm de encontrar algum sentido terico e
epistemolgico fora do marco referencial do sistema mdico que, sem dvida, domina a
reflexo e a prtica do campo da sade pblica65
.
De acordo com Zietlhofer citado por Silva e Leite6, em artigo de reviso, qualidade
de vida (QV) uma percepo nica e pessoal relacionada ao estado de sade e/ou aspectos
no mdicos da vida, podendo ser medida atravs da determinao de opinies de indivduos
com o uso de instrumentos especficos. No um conceito definido de maneira uniforme.
Velarde-Jurado e Avila-Figuero66
discutem os aspectos metodolgicos necessrios
para avaliar a consistncia, validade, as escalas de medio de qualidade de vida. Definem
qualidade de vida como um fenmeno que afeta tanto a doena quanto os efeitos adversos do
tratamento, destacando a importncia da sua avaliao e a dificuldade de quantific-la
objetivamente. As medies podem se basear em pesquisas diretas de pacientes, com
referncia ao aparecimento da doena, seu diagnstico e mudanas nos sintomas, ao longo do
tempo, e os componentes mais importantes so o bem-estar subjetivo e a satisfao com
diferentes aspectos da vida, funcionamento objetivo nos papis sociais e condies de vida
ambiental.
Em virtude da qualidade de vida estar fundamentada em medies gerais com carga
de subjetividade, so requeridos mtodos de avaliao vlidos, reprodutveis e confiveis. Os
instrumentos para medir a qualidade de vida, disponveis atualmente, constituem uma
ferramenta complementar para aferir a resposta ao tratamento. Estes tm sido avaliados em
funo da sua capacidade de discriminao, discrio e predio da QV. Em geral, esto
disponveis no idioma ingls; portanto, sua aplicao em pases de outra lngua requer
mtodos de traduo vlidos, e ainda a conscincia de que tais ferramentas so adequadas ao
contexto social, razo pela qual o pesquisador deve estar seguro de que os domnios
explorados sejam apropriados populao alvo66
.
23
Moyer et al.67
conduziram uma reviso sistemtica sobre qualidade de vida com
especial ateno para instrumentos desenvolvidos especificamente para SAOS. Discorrem
sobre os instrumentos existentes para avaliao de QV e caractersticas. Estes so
classificados em duas categorias bsicas: os genricos e os especficos. Os genricos so
apropriados para diversos grupos de indivduos, servindo para comparar diferentes problemas;
porm, so pouco sensveis e tm finalidade descritiva encontrando-se neste grupo o Medical
Outcome Study Short Form-36 (SF-36). J os instrumentos especficos se baseiam em
caractersticas especiais de uma determinada doena, sobretudo, para avaliar as mudanas
fsicas e efeitos do tratamento atravs do tempo e nos do maior capacidade de discriminao
e predio, alm de serem mais focados na rea de interesse que os genricos e teis para
ensaios clnicos.
Apesar dos instrumentos genricos permitirem fazer estudo cruzado, falta-lhes a
sensibilidade necessria para detectar diferenas entre os pacientes com a mesma doena. Os
instrumentos especficos podem se distinguir pelo diagnstico, tratamento, pela populao de
pacientes, pelas funes ou pelos sintomas. Esses instrumentos so mais susceptveis a
capturar diferenas nos resultados de tratamentos diferentes para uma mesma doena67.
A qualidade de vida das crianas uma rea emergente de pesquisa com potencial para
relacionar a efetividade clnica do tratamento e a satisfao das famlias com os cuidados
prestados. Podemos citar como exemplo o estudo feito por Silva e Leite23
em 2005. Os referidos
autores publicaram artigo de reviso com pesquisa em literatura nas bases de dados
MEDLINE, LILACS e SCIELO de 1985 a 2005 e com os descritores referentes ao tema em
portugus e sua traduo para o ingls. Concluram que os distrbios respiratrios do sono
acometem um percentual significante da populao peditrica, afetam de maneira marcante a
qualidade de vida e o comportamento destas crianas e apresentam melhora importante destes
comprometimentos aps o tratamento cirrgico6.
24
III.3.1 AVALIAO DA QUALIDADE DE VIDA EM CRIANAS COM DISTRBIOS RESPIRATRIOS
DO SONO
O impacto na qualidade de vida de vida em crianas com DRS portadoras de
hipertrofias das tonsilas farngeas e palatinas, vem sendo estudado mais amide nos ltimos
anos, aumentando o interesse sobre a relao existente entre alteraes da qualidade de vida e
os distrbios obstrutivos do sono. No entanto, existem poucos estudos sobre QV das crianas,
neste particular, sobretudo, em se tratando da dificuldade de se aferir tais dados. Deste modo,
como soluo, so utilizados questionrios com respostas dos pais ou cuidadores responsveis
para avaliao23
.
Franco et al.7, no intuito de reconhecer o impacto da SAOS na qualidade de vida das
crianas e averiguar quais se beneficiavam com a cirurgia de adenotonsilectomia, publicaram
estudo original no ano de 2000 que envolveu uma amostragem de 61 crianas com at 12 anos
de idade, apresentando sintomas obstrutivos do sono. O exame fsico da cabea e pescoo
constou de classificao do grau de obstruo determinado pelas tonsilas palatinas de acordo
com o dimetro luminal da faringe. O tamanho da tonsila farngea (adenoide) foi baseado no
percentual de obstruo das coanas, atravs da endoscopia nasal com fibra ptica. O IMC foi
estratificado em trs categorias: obeso, sobrepeso e normal. Todas as crianas se submeteram
polissonografia diurna (NAP study) baseado no protocolo da instituio. Os exames foram
realizados aps uma noite de privao do sono com polissongrafo porttil de cinco canais,
com durao aproximada de 90 minutos e os resultados interpretados pelo diretor da
Instituio. O ndice de distrbio respiratrio (IDR), isto , o nmero de apneias obstrutivas e
hipopneia por hora, foi interpretado como: normal ou SAOS leve (IDR
25
mais conveniente, mais rpido e ter alta acurcia para determinar a gravidade da SAOS
baseado em estudo de Man e Kang (1995).
Os cuidadores primrios completaram um questionrio com 20 itens denominado
OSA-20. A pesquisa validou o instrumento denominado Francos Pediatric Obstructive Sleep
Apnea Questionnaire (OSA-18) e eliminaram dois itens do OSA-20 que no apresentaram
boa correlao7. Este instrumento OSA-18 tem seu foco nos problemas fsicos, limitaes
funcionais e emocionais consequentes da doena e um instrumento vlido e confivel de
medida de QV6. O questionrio consiste de 18 itens agrupados em cinco domnios, cujos itens
so pontuados em escala ordinal de 1 a 7 pontos descritos a seguir:
1. nenhuma vez
2. quase nenhuma vez
3. poucas vezes
4. algumas vezes,
5. vrias vezes
6. a maioria das vezes
7. todas as vezes
Assim, os domnios do OSA-18 podem obter as seguintes pontuaes:
a) distrbio do sono (4 itens com escores variando de 4 a 28 pontos)
b) sofrimento fsico (4 itens com escores variando de 4 a 28 pontos)
c) sofrimento emocional (3 itens com escores variando de 3 a 21 pontos)
d) problemas diurnos (3 itens com escores variando de 3 a 21 pontos)
e) preocupaes dos pais ou responsveis (4 itens com escores variando de 4 a 28
pontos).
O total de escores do OSA-18 pode variar de 18 a 126 pontos e categorizados em trs
grupos, conforme o impacto na qualidade de vida: pequeno menor que 60; moderado entre
60 e 80; e grande acima de 80; ou seja, quanto mais frequente cada item do domnio, maior
o escore final e maior repercusso negativa na qualidade de vida. Pontuaes elevadas no
escore significam pior qualidade de vida. Este instrumento contempla ainda uma taxa global
26
relacionada com a qualidade de vida, atravs de uma escala de zero a 10 pontos atribudos
pelo cuidador, onde 0 (zero) corresponde pior qualidade e 10 (dez) melhor qualidade
possvel. Ficou demonstrado, nesse estudo, que 33% da amostra apresentaram pequeno
impacto na qualidade de vida, 31% impacto moderado e 36% impacto grande. A relao entre
o escore OSA-18 e o IDR manteve-se significante quando ajustada para o tamanho das
tonsilas palatina e adenoide, ndice de massa corprea e idade das crianas7.
Vrios autores tm publicado trabalhos sobre o tema com o uso de outros
questionrios de avaliao da QV em crianas. Stewart et al 8,9,10
, em 2000 e 2001, publicaram
trs estudos sobre outro questionrio de avaliao de QV especfico para crianas com
hipertrofia adenotonsilar, demonstrando o impacto desta doena, sobretudo, relacionado aos
pais. Eles validaram o questionrio CHP-PF28 (The Child Health Questionaire PF-28) e
concluram que este um instrumento vlido, confivel e sensvel nas seis subescalas
distintas. Tambm poderia ajudar especialistas e pediatras a avaliarem seus protocolos de
atendimento.
Flanary12
, em 2003, utilizou o CHP-PF28 e o OSA-18 em 55 pacientes com DRS e
idade entre 2 e 16 anos submetidos adenotonsilectomia. Foram comparados 30 dias antes e
180 dias aps a cirurgia. Concluram que a qualidade de vida destas crianas com distrbios
obstrutivos do sono e hiperplasia adenotonsilar melhorou, em longo prazo, aps interveno
cirrgica; contudo, os instrumentos utilizados para avaliar a qualidade de vida geral, apesar de
evidenciarem melhora fsica, no demonstraram melhoras psicossociais.
J Goldstein et al.13
utilizaram dois instrumentos: o CHQ-PF28 (The Child Health
Questionaire-PF28) e o TAHSI (The Tonsil e Adenoid Health Status Instrument) em 92
crianas com tonsilite crnica e avaliaram 6 meses e 1 ano, aps tonsilectomia. As crianas
apresentaram melhora em todas subescalas do TAHSI, incluindo via area e respirao,
infeces, comportamento (p
27
percepo geral da sade, funcionamento fsico, impacto nos pais e nas atividades familiares.
Concluram que h melhora do ndice global de qualidade de vida em crianas aps 6 meses e
1 ano da interveno cirrgica.
Em outro estudo, estes mesmos autores22
, utilizaram o CBCL (The Child Behavior
Check-list) juntamente com o OSA-18 em 64 crianas com distrbio respiratrio do sono ou
recorrentes tonsilites, antes e trs meses aps adenotonsilectomia. Ao final do estudo houve
melhora do comportamento e dificuldades emocionais, mudanas nos escores para os
domnios distrbio de sono, preocupao dos responsveis e sofrimento fsico no ps-
cirrgico, no sendo encontrada correlao entre o gnero e a situao econmica.
De Serres et al.11
, em estudo prospectivo com 100 crianas entre 2 a 12 anos, com
sintomas de DRS decorrentes de hipertrofia adenotonsilar, validaram outro questionrio,
tambm de fcil aplicao, respondido de igual maneira pelos pais e/ou responsveis,
denominado OSD-6 (6-item Heath-related Instrument), aplicado antes e aps 4 ou 5 semanas
da adenotonsilectomia. A polissonografia foi obtida em 6 (6,2%) e gravao do sono em
vdeo em 30 crianas (30,9%). Os pesquisadores concluram que este instrumento confivel,
de fcil aplicao e vlido para detectar mudanas nas crianas com DRS aps
adenotonsilectomia.
Silva e Leite6, em reviso de literatura sobre qualidade de vida e distrbios
obstrutivos do sono em crianas, referem que, em 2002, De Serres et al. realizaram estudo
complementar com 101 crianas, concluindo que adenotonsilectomia produzia uma grande
melhora, pelo menos a curto prazo, na qualidade de vida das crianas com DRS.
Sohn e Rosenfeld14
, em estudo de coorte com 69 crianas com DRS, compararam a
qualidade de vida aplicando simultaneamente o OSD-6 e OSA-18, antes e aps tonsilectomia
ou adenoidectomia com melhora da qualidade de vida. Aps validarem o OSA-18 como
instrumento evolutivo, concluram que este de fcil aplicao e adequado para situaes
28
onde se deseja avaliar a evoluo do paciente, podendo ser usado pelos mdicos na rotina
clnica diria e em servios de sade.
Crabtree et al.15
, em 2004, publicaram estudo com 85 crianas entre 8 a 12 anos de
idade roncadoras com suspeita de distrbio respiratrio do sono e as comparou com 35
controles. Utilizaram os questionrios para avaliao de depresso o Children's Depression
Inventory e outro para qualidade de vida denominado Pediatric Quality of life Inventory
(PedsQL) respondido pelos pais. As crianas foram encaminhadas a um centro de medicina
do sono e subdivididas de acordo com o IMC, idade e gnero. Os autores concluram que
aquelas com suspeita de distrbio respiratrio do sono, independente da severidade do IAH e
presena de obesidade, tiveram pior qualidade de vida e mais sintomas depressivos que
crianas no roncadoras.
Tran et al.16
avaliaram 42 crianas com SAOS confirmada por polissonografia,
comparadas com 41 controles. Os pais completaram os instrumentos OSA-18 e o CBCL
(Child Behavior Checklist) antes e trs meses aps adenotonsilectomia. Os autores
encontraram dificuldades emocionais e de comportamento naquelas com SAOS, com melhora
significante de escores de qualidade de vida comparado aos controles aps o tratamento
cirrgico. Para os pacientes com SAOS no houve correlao significante entre o escore total
inicial do OSA-18 e o IAH pr-operatrio comparados com controles (r=0,27; p=0,09), mas
foi encontrada correlao entre a mudana do escore total aps adenotonsilectomia com IAH
(r=0,35).
Baldassari et al.17
publicaram a primeira metanlise para examinar dados de SAOS
peditrica e qualidade de vida comparando escores de QV em crianas com SAOS e sadias,
escores de QV entre crianas com SAOS e doenas crnicas e avaliao da QV aps
adenotonsilectomia a curto e longo prazo. Para tanto, identificaram 19 estudos de QV com
SAOS peditrica; destes excluram 9 e, ento, 10 artigos foram avaliados. O total do estudo
29
incluiu 1470 crianas, sendo 562 com SAOS e 815 sadias, utilizando o CHQ e OSA-18.
Concluram que SAOS tem impacto significante na qualidade de vida de crianas e que estas
melhoram aps adenotonsilectomia, tanto a curto como a longo prazo.
Michel et al.17
, no ano de 2004, publicaram trs estudos. No primeiro, avaliaram o
questionrio OSA-18 em crianas com hipertrofia adenotonsilar (HAT) e SAOS severa, com
polissonografia noturna no pr e ps-operatrio de adenotonsilectomia e encontraram reduo
do escore total do OSA-18 e do IAH no ps-operatrio, apesar de pacientes com IAH maior
que 20 eventos/hora no normalizarem a polissonografia.
Em um segundo estudo realizado em 2004, esses mesmos autores68
, aps avaliarem
60 crianas, 72% do gnero masculino e 50% com idade inferior a 6 anos, encontraram mdia
do escore total do OSA-18 de 71,4 pontos antes da cirurgia e 35,8 pontos aps
adenotonsilectomia. O domnio do OSA-18 com maior mudana foi o perturbao do sono
e no houve correlao entre o escore total pr-cirrgico do OSA-18 e o IAH.
Em um terceiro estudo, os autores19
avaliaram prospectivamente 34 crianas com
SAOS documentada por polissonografia em que os cuidadores completaram o OSA-18 antes
da cirurgia, aps 7 meses e entre 9 e 24 meses. Relataram melhora em longo prazo na
qualidade de vida aps adenotonsilectomia, porm esta mais pronunciada em curto prazo.
Em 2005 Mitchell e Kelly20
publicaram um estudo cujos objetivos eram avaliar a
relao entre QV e a severidade dos distrbios respiratrios do sono (DRS) e comparar as
mudanas na QV, aps adenotonsilectomia em crianas com SAOS e DRS. Para isso
compararam 43 crianas com SAOS e 18 sem apneia, denominado DRS leve, aps
polissonografia. Ao final do estudo, observaram nos dois grupos escores elevados, tanto
escore total quanto os dos domnios do OSA-18 e melhora significativa nestes escores no ps-
operatrio.
30
Em 2007, Mitchell69
publicou estudo prospectivo com 79 crianas entre 3 a 14 anos,
com diagnstico de SAOS. Os pais responderam o OSA-18 e as crianas se submeteram
polissonografia no pr-operatrio e 6 meses aps adenotonsilectomia. O autor inferiu que a
adenotonsilectomia para crianas portadoras de SAOS resultou em melhora acentuada dos
parmetros respiratrios na polissonografia e de todos os domnios do OSA-18 e houve
mudana mais evidente no domnio perturbao do sono. O domnio que apresentou
resultados menos significantes foi o sofrimento emocional. Ficou evidenciado neste estudo
fraca correlao entre o escore total do OSA-18 e o IAH, tanto no pr-operatrio (r=0,28)
quanto no ps-operatrio (r=0,16).
Constantin et al.70
publicaram estudo transversal no qual propuseram determinar se o
OSA-18 tinha acurcia para determinar SAOS moderada ou severa. Para tanto, avaliaram 334
crianas com suspeita de SAOS, entre dois e dez anos de idade, utilizando oximetria noturna
de pulso atravs de um escore que utiliza o nmero de dessaturaes abaixo de 90% e o
nmero de agrupamentos de dessaturao, denominado escore de McGill (MOS). Ao final do
estudo os autores encontraram sensibilidade de 40% e valor preditivo negativo de 73%.
Concluram que o OSA-18 tem pouca sensibilidade para identificar SAOS moderada e severa.
No Brasil, os poucos trabalhos relativos QV em crianas com DRS so referidos a
seguir. Silva e Leite23
publicaram o primeiro estudo com uso do OSA-18 no municpio de
Fortaleza, Cear (Brasil) baseado na publicao de Franco et al 7. Os autores avaliaram 48
crianas prospectivamente, com idade inferior a 12 anos, com quadro clnico de distrbio
respiratrio do sono e indicao para adenoidectomia e/ou adenotonsilectomia. Foi aplicado o
questionrio OSA-18 adaptado para o portugus com o uso da tcnica de back-translation,
aos pais ou cuidadores primrios, antes e com, pelo menos, 30 dias aps o tratamento
cirrgico. A idade mdia encontrada foi 5,93 anos, a mdia do escore total basal foi de 82,83
(grande impacto) e de 34,3 (pequeno impacto) no ps-operatrio (p
31
basal do OSA-18 foi classificado como de pequeno impacto na qualidade de vida das crianas
em 1 (2,1%), moderado em 24 (50%) e grande em 23 (47,9%) e o domnio do OSA-18 que
apresentou escore mdio basal mais elevado foi o preocupao dos responsveis, seguido de
perturbao do sono e sofrimento fsico. J o que apresentou maior diferena antes e aps
o tratamento cirrgico foi o perturbaes do sono, seguido de preocupao dos
responsveis23
. O domnio que apresentou menor diferena foi problemas diurnos. Todas
estas diferenas do escore total e dos domnios foram significantes (p=0,000). O grau de
obstruo pelas tonsilas palatinas da orofaringe encontrado nas crianas neste estudo, foram
grau III em 22 (45,8%) e grau IV em 5 (31,3%) e o grau de obstruo coanal promovida pela
tonsila farngea (adenoide) foi classificada como acentuada (> 70%) em 36 crianas (74,9%).
Silva e Leite23
concluram que o DRS apresenta impacto relevante na qualidade de vida com
melhora significativa aps o tratamento cirrgico.
Lima Jnior et al.24
publicaram a continuidade do estudo de Silva e Leite23
e
avaliaram em longo prazo a QV com aplicao do questionrio OSA-18 aos pais com, pelo
menos, 11 meses aps o tratamento cirrgico. Dos 48 pacientes que compareceram na
primeira avaliao ps-operatria , 34 crianas (70,8%) compareceram para o seguimento sem
diferena estatstica entre a avaliao ps-operatria inicial e tardia. Concluram que a
melhora da qualidade de vida se mantm em longo prazo, no havendo diferena significativa
entre as avaliaes ps-operatrias (p>0,05) e que o OSA-18 uma ferramenta til na
avaliao da QV antes e aps adenoidectomia /adenotonsilectomia.
Nascimento et al.25
, em 2007, publicaram estudo prospectivo envolvendo a
participao de 48 crianas entre 3 e 13 anos, portadoras de hiperplasia de tonsilas farngeas,
com grau de obstruo maior que 80% e palatinas grau III e IV, sem polissonografia noturna.
O instrumento utilizado na avaliao da qualidade de vida escolhido foi o OSA-18,
respondido pelos pais ou responsveis 24 horas antes da adenoidectomia ou
32
adenotonsilectomia e aps 30 dias do procedimento cirrgico. Foi encontrada diferena
estatstica entre o pr e ps-cirrgico (p
33
Outro estudo26
nacional de avaliao de QV em crianas com DRS foi publicado no
ano de 2009, o qual avaliou o impacto da adenotonsilectomia em crianas atendidas em
ambulatrio com idade de 3 a 15 anos e uso do OSD-6 antes e 30 dias aps a interveno
cirrgica. Participaram 75 crianas com indicao de adenotonsilectomia por hiperplasia de
tonsila farngea maior que 50% da nasofaringe obtida a partir de radiografia do cavum, e
aumento das tonsilas palatinas (grau III ou IV). O domnio que prevaleceu no pr-operatrio
foi preocupao dos pais com o ronco (78%), seguido de sofrimento fsico (43%). Os
autores encontraram reduo dos escores no ps-operatrio e correlao entre o grau de
obstruo das tonsilas farngeas e palatinas e os domnios sofrimento fsico, distrbios do
sono e preocupao dos pais.
34
IV. OBJETIVOS
IV.1 PRIMRIO
Avaliar a Qualidade de Vida (QV) de crianas com Distrbios Respiratrios do Sono
(DRS).
IV.2 SECUNDRIO
Comparar a qualidade de vida de crianas portadoras de Sndrome de Apneia
Obstrutiva do Sono (SAOS) com crianas sem apneia (RP).
Identificar quais domnios do OSA-18 esto mais comprometidos.
35
V. JUSTIFICATIVA
O Distrbio Respiratrio do Sono prevalente na infncia tendo como causa mais
comum a hipertrofia adenotonsilar. Esta, alm de causar consequncias clnicas importantes,
quando no tratados, compromete a QV das crianas de maneira significativa.23
A QV avaliada subjetivamente atravs de instrumentos respondidos pelos pais ou
cuidadores das crianas e, dentre estes, se destaca o questionrio OSA-18, bastante utilizado
por autores internacionais e timidamente em nosso pas. Os estudos nacionais com avaliao
de QV em portadores de DRS na infncia publicados at o presente, com aplicao do
instrumento OSA-18 antes e aps adenotonsilectomia, encontraram reduo dos escores do
OSA-18, traduzindo melhora significativa da qualidade de vida destas crianas23-25
.
Entretanto, em todos eles no se estabeleceu a severidade do DRS que se d atravs da PSG
noturna em laboratrio de sono, considerado padro ouro para o diagnstico diferencial entre
SAOS e RP5.
Este estudo se justifica por avaliar a QV, realizar o diagnstico precoce e assim
reduzir as consequncias cardiovasculares, metablicas e neurocognitivas possibilitando uma
interveno precoce no tratamento e melhor ajustando estas crianas ao convvio social,
familiar e escolar. Em nosso meio um trabalho pioneiro neste tema.
36
VI. CASUSTICA, MATERIAL E MTODOS.
VI.1 DESENHO DO ESTUDO E POPULAO ESTUDADA
Foi realizado um estudo transversal em crianas de baixa condio social, de 3 a 12
anos. A amostra foi selecionada por demanda espontnea sequencial no ambulatrio do
respirador bucal, em um centro de referncia em otorrinolaringologia em Salvador-BA
Instituto de Otorrinolaringologia Otorrinos Associados (Inooa) , no perodo de agosto de
2008 a maro de 2009.
VI.2 CRITRIOS DE AMOSTRAGEM
VI.2.1 CRITRIOS DE INCLUSO
crianas de ambos os sexos com idade entre 3 a 12 anos;
histria de roncos e/ou apneia h mais de 4 meses;
portadores de hiperplasia das tonsilas palatinas ou adenoides ao exame fsico;
realizao da polissonografia de noite inteira (PSG);
assinatura do Termo Livre de Consentimento Esclarecido (TLCE). (Anexo E)
37
VI.2.2 CRITRIOS DE EXCLUSO
crianas com malformaes craniofaciais;
crianas com distrbios psiquitricos, comportamentais e com alteraes no
desenvolvimento psicomotor;
crianas em uso de medicaes que atuam no SNC;
crianas imunocomprometidas;
crianas j submetidas adenotonsilectomia.
VI.3 INSTRUMENTOS
VI.3.1 FICHA PARA COLETA DE DADOS CLNICOS
Os dados da criana e do cuidador primrio (pai ou responsvel) foram coletados em
formulrio com dados clnicos e sociodemogrficos (Anexo A). A idade foi medida em anos
completos, de acordo com a data de nascimento. A varivel raa foi autodefinida conforme os
censos demogrficos, adotando a cor da pele como referncia. Outras variveis como: tempo
de queixa de distrbio do sono em anos completos, sintomas referidos, se a criana dorme em
quarto separado e o grau de escolaridade do cuidador primrio foi tambm coletado.
38
VI.3.2 QUESTIONRIO PADRO - LABORATRIO DE SONO
Outro questionrio padro do laboratrio de sono (Anexo B), adaptado de Bruni et
al.28
foi aplicado na noite do exame previamente polissonografia (PSG) contendo dados
sobre o distrbio do sono. Ambos os questionrios foram aplicados ao mesmo responsvel
cuidador primrio (pai ou responsvel).
VI.3.3 QUESTIONRIO OSA-18
O questionrio OSA-18 (Anexo C) foi aplicado aos pais ou cuidadores primrios e
utilizado para avaliar a qualidade de vida. Este instrumento, validado por Franco et al.7 foi
adaptado ao portugus do Brasil no ano de 2006 por Silva e Leite23
, atravs da tcnica de
back-translation, obtendo conformidade exata com os termos utilizados no documento
original.
Este instrumento consiste de 18 itens agrupados em cinco domnios, cujos itens so
pontuados em escala ordinal de 1 a 7 pontos. O total de escores do OSA-18 pode variar de 18
a 126 pontos e categorizados em trs grupos, conforme o impacto na qualidade de vida:
pequeno (menor que 60); moderado (entre 60 e 80); grande (acima de 80); ou seja, quanto
mais frequente cada item dos domnios, maior o escore final e maior repercusso negativa na
qualidade de vida. Este instrumento contempla ainda uma taxa global relacionada com a
qualidade de vida, atravs de uma escala de 0 (zero) a 10 (dez) pontos atribudos pelo pai ou
cuidador, onde 0 (zero) corresponde pior qualidade de vida e 10 (dez) melhor qualidade de
vida possvel. Foram realizadas comparaes do escore total, dos 5 domnios do OSA-18, da
taxa global de QV com a varivel sexo, idade, tempo de queixa, sintomas, dados do exame
fsico, SAOS e RP.
39
VI.3.4 QUESTIONRIO PARA COLETA DE DADOS CLNICOS
O exame fsico (Anexo D) consistiu de exame da cavidade oral, rinoscopia anterior,
otoscopia e videonasofibrolaringoscopia. Estes foram realizados pelo investigador principal.
O exame da cavidade oral identificou a posio do palato e a base da lngua utilizando a
classificao de Mallampati modificada.35
O paciente foi colocado em posio sentada, em
abertura bucal mxima e lngua relaxada, observando a dimenso exposta da orofaringe,
sendo classificado de I a IV, de acordo com a visualizao maior ou menor do palato mole em
relao base da lngua.35
A oroscopia identificou o tamanho das tonsilas palatinas, de acordo
com a classificao de Brodsky72
que contempla o grau de obstruo: I (tonsilas palatinas
ocupam at 25% do espao orofarngeo); II (tonsilas palatinas que ocupam entre 26 e 50% do
espao orofarngeo); III (tonsilas palatinas que ocupam entre 51 e 75% do espao
orofarngeo); e IV (tonsilas palatinas que ocupam mais de 75% do espao orofarngeo). Os
graus III e IV foram considerados tonsilas obstrutivas.56
VI.3.5 VIDEONASOFIBROLARINGOSCOPIA
A videonasofibrolaringoscopia avaliou o grau de obstruo promovido pelas
adenoides classificadas em grau I (at 25%), II (26 a 50%), III (51 a 75%) e IV (> 75%).7 Este
exame foi realizado pelo investigador principal com a criana em viglia acompanhada dos
pais ou responsveis, na posio sentada, em cadeira adequada para a sua realizao, sem uso
de medicao. Realizado introduo do aparelho de fibra ptica flexvel atravs da cavidade
nasal direita e depois esquerda e exame das vias areas superiores (cavidades nasais,
nasofaringe, orofaringe, hipofaringe e laringe). Para este fim, foi utilizado o endoscpio
flexvel Machidda (modelo ENT P III, 3,2 mm de dimetro) acoplado a uma fonte de luz de
40
250 W Endoview, microcmera filmadora (Toshiba CCD IKCU 44A), monitor Sony
(mod.KU 1441B), videocassete Sony (mod. SLV 40BR).
VI.3.6 AVALIAO ANTROPOMTRICA
Para a avaliao antropomtrica foi feito o registro de peso e altura, utilizando-se
uma balana de preciso mecnica, com capacidade mxima de 150 Kg, mnima de 2,5 Kg e
rgua antropomtrica de 200 cm acoplada balana.
VI.3.7 CLASSIFICAO NUTRICIONAL
A classificao nutricional das crianas foi realizada comparando-se as medidas de
peso e altura com os grficos de crescimento do National Center for Health Statistic
(NCHS)73
e os grficos da OMS (www.who.int). Estas foram ento convertidas para o escore
Z (desvios-padro) de ndice de massa corprea e estatura/idade e peso/estatura, baseados em
idade e gnero utilizando-se o programa EPI-INFO, verso 6, com a anlise do estado
nutricional.
Os pontos de corte adotados foram:
Escore Z Peso/Estatura (P/E)
< -2 escores z (peso baixo para a estatura)
-2 a -1 escore z (risco nutricional)
-1 a +1 escore z (eutrofia)
+1 a +2 escore z (sobrepeso)
> + 2 escore z (obesidade)
41
Escore Z Estatura/Idade (E/I)
< -2 escore z (retardo de crescimento linear)
-2 a -1 escore z (risco nutricional)
-1 a +1 escore z (eutrofia)
+1 a +2 escore z
> +2 escore z
Para obesidade e sobrepeso foi utilizado o ndice de massa corprea (IMC) percentil
>85 a < 95 para sobrepeso e percentil > 95 para obesidade.74
Os indivduos foram divididos
em obesos e no obesos e comparados com qualidade de vida representados pelo escore total
do OSA-18 e com sndrome da apneia obstrutiva do sono (SAOS) e ronco primrio (RP)
determinados pela polissonografia (PSG).
VI.3.8 AVALIAO POLISSONOGRFICA
O diagnstico de RP ou SAOS foi obtido atravs de polissonografia de noite inteira
em laboratrio de sono, onde a criana dormia em quarto escuro e silencioso, com ambiente
refrigerado (tipo split), em sono espontneo, sem nenhuma sedao, acompanhada pelo
cuidador responsvel, que respondeu previamente a um questionrio padro de distrbios do
sono (Anexo B). Todos os participantes da pesquisa foram orientados a evitar o uso de
estimulantes (caf, chocolate, refrigerantes) no dia do exame.
O equipamento computadorizado utilizado foi o Alice 3 Healthdyne Respironics 16
canais contendo: eletroencefalograma (C3/A2), (C4/A2), (O1/A2), O2/A1), eletromiograma
submentoniano e tibial, eletrooculograma direito e esquerdo sendo empregado para a
colocao dos eletrodos, o sistema internacional 10-20, fluxo de ar oro-nasal, atravs de
42
termistor nasal (Thermistor Airflow Sensor, 6210), cintas para registro de esforo abdominal e
torcico, microfone para captao de ronco adaptado na regio do pescoo, saturao arterial
de oxignio (SpO2) avaliada atravs de oxmetro de pulso (Heathdyne Technologies
Oximeter), frequncia e ritmo cardaco atravs de eletrocardiografia e sensor de posio no
leito. A arquitetura do sono foi avaliada por tcnica padro e proporo do tempo gasto em
cada estgio de sono e foi expressa em percentual do tempo total de sono.3
A apneia central foi definida por ausncia de fluxo areo oro nasal, medido por
termistor nasal, na ausncia de esforo respiratrio, e foram quantificadas aquelas com
durao maior ou igual a 10 segundos. A apneia obstrutiva foi definida por ausncia de fluxo
areo oro nasal medido por termistor nasal, com presena de movimentos do trax e abdmen
por, pelo menos, dois ciclos respiratrios. A apneia mista foi definida como aquela com
componente central e obstrutivo, em qualquer ordem, e com componente central durando 3
segundos. Hipopneia foi definida por reduo de 50% da amplitude do fluxo areo oro nasal
medido pelo termistor associada dessaturao da oxihemoglobina >3%, ou SpO2
43
Estgios de sono 1, 2, 3, 4, REM definem a arquitetura do sono e foram
representados em percentual;
Eficincia do sono consiste na porcentagem do TTS (tempo total de sono) sobre o
tempo de registro;
Latncia do sono foi definida como o intervalo entre o desligar das luzes e o
primeiro minuto no estgio 1 do sono;
Latncia do sono REM foi definida como o intervalo entre o incio do sono e o
primeiro perodo do sono REM;
ndice total de microdespertares correspondeu ao nmero de microdespertares
dividido pelo nmero total de horas de sono.
ndice de dessaturao de oxignio todas as dessaturaes de oxignio > 3% a
partir da SpO2 basal/hora de sono, medido por oximetria de pulso;
IH (ndice de hipopneia) nmero de hipopneias por hora de sono registrado;
Saturao de O2 na viglia saturao da oxihemoglobina basal, medida por
oximetria de pulso;
Saturao de O2 REM saturao media de O2 no estgio REM, medida por
oximetria de pulso.
Saturao de O2 NREM saturao mdia de O2 nos estgios NREM, medida por
oximetria de pulso.
44
As variveis respiratrias da PSG analisadas para a classificao dos eventos foram:
ndice de apneia (IA) nmero de apneias obstrutivas e mistas com durao mnima
de dois ciclos respiratrios expresso em eventos por hora (considerando para clculo o
tempo total de sono).
ndice de apneia e hipopneia (IAH): somatria do nmero de apneias obstrutivas e
mistas e hipopneias obstrutivas expresso em eventos por hora (considerando para
clculo o tempo total de sono). Considera-se anormal nas crianas o IAH 1/hora. O
IAH tambm denominado ndice de distrbio respiratrio (IDR), sendo que a esse
ndice se adiciona para seu clculo, os RERAs (da sigla inglesa Respiratory Effort-
Related Arousals despertar relacionado ao esforo respiratrio).
Nadir de saturao de O2 (nadir da SpO2) saturao mnima de oxignio durante
o estudo do sono medida por oxmetro de pulso. Valores menores que 90% costumam
estar associados com distrbios ventilatrios do sono, centrais ou obstrutivos.
Todas as variveis foram apresentadas sob a forma de mdia e/ou mediana. Todos os
exames foram analisados por mdico com experincia em exames de crianas obedecendo
classificao dos eventos aos critrios peditricos da American Thoracic Society.3
Os indivduos foram divididos em roncadores primrios (sem apneia), quando
apresentavam IA1. As crianas
com SAOS foram subdivididas em SAOS leve (1
45
VI.4 VARIVEIS ANALISADAS
A qualidade de vida foi avaliada atravs do escore do questionrio OSA-18,
enquanto o DRS foi avaliado atravs do IA, IAH, nadir SpO2.
J as variveis secundrias foram: sexo, idade, cor da pele, tempo dos sintomas,
sintomas presentes de distrbio obstrutivo do sono, grau de obstruo, dados de exame fsico,
dados sociodemogrficos.
VI.5 ANLISE ESTATSTICA, DESCRIO E TRATAMENTO DAS VARIVEIS
VI 5.1 HIPTESES
Hiptese nula (Ho): A qualidade de vida em crianas com sndrome de apneia
obstrutiva do sono (SAOS) igual de crianas com ronco primrio (RP);
Hiptese alternativa (Ha): A qualidade de vida em crianas com sndrome de apneia
obstrutiva do sono (SAOS) mais comprometida do que em crianas com ronco
primrio (RP).
Para a construo do banco de dados e anlise estatstica utilizou-se o programa
Statistical Package for the Social Sciences (SPSS Chicago-IL, verso 11.0) e Epi Info
verso 6. As variveis contnuas foram apresentadas sob a forma de mdia e desvio padro.
As variveis categricas foram expressas como propores (frequncia relativa). Para a
comparao entre duas amostras independentes foi utilizado o teste t de Student ou Mann-
Whitney, caso a distribuio fosse considerada no normal. Foram feitas comparaes do
escore geral e dos escores de cada domnio entre os dois grupos. Para a anlise de trs ou mais
grupos, foi utilizada a anlise de varincia one way ANOVA para a distribuio normal ou
46
Kruskal-Wallis; para o complemento o teste de Tukey para a primeira ou teste de Mann-
Whitney para mltiplas comparaes 2 a 2 aps o Kruskal-Wallis.
Para o estudo das variveis categricas, foi utilizado o teste Qui Quadrado de
Pearson e Exato de Fischer se no atendessem aos pr-requisitos do primeiro. Os testes foram
bicaudais com um nvel de significncia de 5%.
A correlao de Spearmann foi utilizada para as seguintes variveis: grau de
obstruo palatina e farngea, escore total do OSA-18 e os cinco domnios, ndice de Apneia
(IA), ndice de Apneia-Hipopneia (IAH).
VI.6 CLCULO AMOSTRAL
Para o clculo do tamanho amostral considerou-se uma prevalncia de apneia do
sono entre crianas roncadoras de 25%, intervalo de confiana de 95% e diferena mxima
aceitvel de 15%, sendo ento necessrios 33 pacientes. Todavia, como se pretendia fazer
comparaes, este tamanho foi dobrado. O clculo foi realizado no programa PEPI (Computer
Program For Epidemiologists) Version 4.04x.
VI.6.1 JUSTIFICATIVA PARA USO DE PREVALNCIA DE 25%
A prevalncia de SAOS em crianas com sintomas de DRS diagnosticadas por
polissonografia noturna em diversos estudos publicados varivel e pode chegar a 70% 63
.
Carrol et al.76
, aps estudarem 83 crianas com idade entre 5 a 15 anos, com histria clnica
de DRS, encontraram 35 portadoras de SAOS (42%).
47
Valera et al.,56
ao estudarem crianas com idade entre 1 e 13 anos e histria clnica
de ronco e apneia, encontraram SAOS em 30,5% naquelas portadoras de tonsilas e adenides
no obstrutivas. Izu et al.77
, em estudo nacional, avaliaram retrospectivamente 248 crianas
respiradoras orais entre 0 e 13 anos e encontraram prevalncia de SAOS em 104 delas (42%).
Mitchell e Kelly20
avaliaram prospectivamente 61 crianas entre 3 e 18 anos com histria de
DRS e, aps PSG, encontraram SAOS em 43 crianas (70,5%). Em nosso estudo foi utilizada
uma prevalncia inferior encontrada em estudos anteriores.
VI.7 ASPECTOS TICOS
Este estudo foi realizado em ambulatrio do respirador bucal, em um centro de
referncia em Otorrinolaringologia do Instituto de Otorrinolaringologia Otorrinos Associados
Ltda (Inooa) localizado no municpio de Salvador (Bahia).
Todos os pais ou responsveis das crianas que foram convidados a participar da
pesquisa assinaram o Termo Livre de Consentimento Esclarecido (TCLE) (Anexo E).
O estudo foi aprovado pelo Comit de tica da Fundao Bahiana para
Desenvolvimento das Cincias-FBDC, sob protocolo nmero 34/2008 (Anexo F).
48
VII. RESULTADOS
Foram examinadas 110 crianas, no perodo de agosto de 2008 a maro de 2009.
Destas, 63 aceitaram participar do estudo, das quais 4 no realizaram polissonografia. A
populao alvo foi de 59 crianas, sendo 55,9% (n= 33) do sexo feminino. A idade mdia, no
momento da incluso do estudo, foi de 6,772,26 anos. Quanto cor da pele 10 pais (16,9%)
autodefiniram as crianas como brancas, 43 (72,9%) pardas e 6 (10,2%) pretas, predominando
no brancas 49 (83,1%).
Por informao dos cuidadores, o tempo mdio de queixa dos sintomas de distrbios
do sono das crianas na incluso do estudo foi de 3,94 1,77 anos. Todos os participantes
includos no estudo foram roncadores 59 (100%) e os sintomas referidos com mais frequncia
esto descritos no Grfico 1.
Grfico 1 Frequncia dos sintomas presentes na avaliao basal das crianas atendidas entre agosto de 2008 a
maro de 2009.
(%)
n=59
11,9
23,7
30,5
33,9
69,5
76,3
78
79,2
85,4
91,7
93,8
100
100
Sonolncia
Baixo desenvolvimento fsico
Dficit de aprendizado
Enurese
Apnia
Sialorria
Sudorese
Hiperatividade
IVAS de repetio
Sono Agitado
Obstruo nasal
Respiradores bucais
Roncos
49
Foram ainda referidos no momento da incluso: otites de repetio em 12 crianas
(20,3%), rinorreia frequente em 32 crianas (54,2%), espirros frequentes em 28 crianas
(47,5%), espirros por poeira em 23 crianas (39%), espirros por mudanas climticas em 25
crianas (42,4%), espirros por outras causas em 13 crianas (22%) e 4 (6,8%) dos cuidadores
no souberam informar com preciso. Entre os antecedentes patolgicos, os mais encontrados
foram: tonsilites de repetio em 23 crianas (39%), pneumonia em 7 crianas (11,9 %) e
asma em 5 crianas (8,5%).
Ao exame fsico otorrinolaringolgico encontramos predomnio dos graus III e IV,
tanto para o grau de obstruo promovido pelas tonsilas palatinas, quanto para as tonsilas
farngeas (adenoide) discriminadas a seguir:
Tonsilas palatinas
Grau II: 14 (23,7%);
Grau III: 28 (47,5%);
Grau IV: 17 (28,8%).
Tonsilas farngeas
Grau I: 1 (1,7%);
Grau II: 16 (27,1%);
Grau III: 29 (49,2%);
Grau IV: 13 (22%).
Outro dado do exame fsico, a classificao de Malampati, apresentou predomnio da
classe I encontrado em 54 crianas (91,5%). Na rinoscopia anterior encontramos hipertrofia dos
cornetos nasais em 21 crianas (35,6%) e desvio septal em 5 (8,5%). O exame otoscpico foi
normal em 43 crianas (72,9%), alterado por rolha de cermen em 12 (20,4%) e membrana
timpnica opacificada em 4 (6,7%). Ndulos vocais foram detectados em 8 crianas (13,6%)
pela videonasolaringoscopia, no sendo encontrada predominncia de sexo, com 50% para cada
um.
50
Em relao ao ambiente familiar, 32 (54,2 %) crianas dormiam no mesmo quarto
que o cuidador primrio e 54 (91,5%) destas dormiam entre 9 e 11 horas por dia. Em relao
escolaridade, 27 crianas (45,8%) cursavam creche/pr-escola