Qualidade da matéria prima
-
Upload
wwwmundodacanablogspotcom -
Category
Documents
-
view
1.908 -
download
0
Transcript of Qualidade da matéria prima
“I Workshop Tecnológico sobre Produção de Etanol”
Projeto Programa de Pesquisa em Políticas Públicas
Sessão 1: “ Qualidade da matéria-prima”
Palestrante: Carlos Eduardo Vaz Rossell Pesquisador Sênior Engenheiro Químico. Mestre e Doutor em Engenharia de Alimentos, UNICAMP . Grupo Energia-Projeto Etanol (MCT/NIPE-Unicamp) Caixa Postal 6192 - CEP 13084-971 Campinas- SP Fone (0xx19) 3512-1121 e-mail: [email protected]
Debatedores: Márcia Justino R. Mutton – UNESP Jorge Horii – ESALQ/USP
1
Produção de Etanol de Cana-de-açúcar. Qualidade da matéria-prima. Introdução
As mudanças que estão acontecendo relacionadas ao esgotamento das fontes de petróleo, assim
como ao aquecimento global provocado pelo aumento das emissões de dióxido de carbono
provenientes da queima de combustíveis fósseis sinalizam para um aumento expressivo da
produção de etanol.
Ao Brasil caberá um papel importante na produção de Bioetanol. Projeções apontam para 100 a 200
bilhões de litros nos próximos 20 anos.
Atualmente predomina no Brasil entre as Usinas mais avançadas um modelo de produção
simultânea de etanol e açúcar, no qual aproximadamente 50-60% da cana moída é destinada à
fabricação de açúcar, segundo dados compilados pelo CTC (2005).
Um novo cenário com predominância da produção de álcool poderia ser traçado considerando uma
unidade padrão de 12000 toneladas de cana por dia com as características descritas na Figura 1 e
considerando como alternativas Usina com Destilaria anexa e moagem de 40% da cana para
produção de açúcar e Destilaria autônoma.
Complementando o cenário previsto consideramos também as seguintes tendências:
•••• Eliminação da despalha a fogo;
•••• Substituição gradativa do corte manual pelo mecanizado;
•••• Aumento da escala de produção.
Fig. 1. Cenários atual e projetados para a produção de etanol carburante.
35.000
70
12.000
167
2.000.000
hectaresÁrea de plantío
TCHRend. agrícola
TCDMoagem diária
diasSafra
Ton/safraMoagem
Cenários projetadosCenário atual
Álcool 1037 m³/diaÁlcool 760 m³/diaÁlcool 570 m³/dia
Áçucar 430 ton/diaÁçucar 730 ton/dia
Destilaria autônomaMoagem para açúcar 40%,
destilaria anexa
Moagem para açúcar 60%,
destilaria anexa
2
O propósito deste trabalho é discutir os pré-requisitos que devem atender as matérias primas
envolvidas na fermentação alcoólica para garantir uma performance eficiente da fermentação
alcoólica nas condições atuais e nos cenários projetados.
Matéria-prima para a produção de etanol carburante
Fazemos inicialmente uma classificação considerando a matéria-prima básica, as derivadas da
mesma, resultantes da fabricação de açúcar e etanol e as complementares.
A cana-de-açúcar é o que denominamos como matéria-prima básica, sendo que atualmente são
aproveitados exclusivamente os açúcares extraíveis da mesma.
Classificamos como matérias primas derivadas, correntes do processo com maior ou menor
conteúdo de sacarose e açúcares redutores, integrando este grupo as seguintes:
•••• Caldo misto;
•••• Caldo clarificado;
•••• Xarope;
•••• Mel final;
•••• Caldo filtrado.
Como matérias-primas complementares consideramos:
• Água de processo;
• Vinhoto;
• Águas condensadas.
Influência da contaminação bacteriana e outros fato res no processo de fermentação
alcoólica.
Desde o início do Pró-Álcool até o estágio atual o processo de fabricação de álcool em destilarias
anexas ou autônomas passou por diversas reformulações, até atingir o estágio atual.
Stupiello (1981), Rossell (1987) e outros descreveram a evolução do processo, que foi motivo de
intensas discussões durante a década de 80, com a participação dos setores de: pesquisa e
desenvolvimento, o acadêmico, os produtores de álcool e açúcar e os fornecedores de
equipamentos e companhias de engenharia vinculadas ao setor sucroalcooleiro.
Basicamente os estudos definiram a melhor opção para tratamento de caldo e para condução da
fermentação alcoólica, assim como estratégias para o controle da fermentação.
Já na década de 90 vários grupos de pesquisa e, em particular, o grupo de fermentação alcoólica
do CTC abordaram e procuraram colocar numa base mais quantitativa os fatores que influenciam o
desempenho da fermentação alcoólica e a vinculação destes com a qualidade das matérias-primas.
3
Surgiram assim estudos referentes:
•••• Ao controle operacional da fermentação alcoólica: Pereira-César (1997);
•••• Ao balanço de bactérias na fermentação alcoólica: Nolasco-Junior (1996);
•••• Aos fatores que influem na floculação: Nolasco-Junior (1993);
•••• Aos índices de controle de contaminantes: CTC (1983) e Formaggio (1999);
•••• Ao balanço de matéria em suspensão acumulada na fermentação: Nolasco-Junior (1998a);
•••• À eficiência da centrifugação na remoção de contaminantes da fermentação;
•••• À esterilização do mosto: Nolasco-Junior (1998b);
•••• À definição do tratamento físico-químico do mosto: Nolasco-Junior (1998c).
Nolasco-Junior (2005), que conduziu grande parte deste trabalho, estabelece as bases de um
tratamento físico-químico do mosto eficiente e de esterilização final do mesmo com o propósito de
controlar a infecção microbiana, a floculação e a inibição do fermento. O autor estudou a
dependência entre a qualidade da matéria prima para a fermentação e o desenvolvimento da
infecção, apontando o efeito negativo da presença de matéria em suspensão associada às
matérias-primas empregadas no mosto. Demonstra numa base quantitativa que os sólidos
suspensos no volume de controle da fermentação, sejam de natureza mineral ou orgânica, não são
rejeitados pelas centrífugas, pelo contrário, incorporam-se ao leite, tendo que ser removidos como
fundo de dorna ou sangria de fermento.
Esta massa de sólidos que se recicla na fermentação constitui um veículo de desenvolvimento das
bactérias contaminantes, promovendo floculação, formação de ácidos e metabólitos inibidores da
atividade da levedura. As bactérias do gênero Bacillus predominam neste meio, sendo responsáveis
pelo fenômeno de floculação do fermento.
Este fenômeno atinge um grau tal que nem o tratamento de choque com biocidas de efetividade
reconhecida se mostra eficaz.
A presença dos sólidos suspensos conduz à formação de incrustações nas superfícies de
aquecimento indireto quando efetuado o tratamento térmico do mosto. Nolasco-Junior avalia
possíveis tratamentos para caldo misto, caldo do filtro, xarope e mel, concluindo que um tratamento
físico-químico de calagem, fosfatação, floculação assistida por polímero e decantação específicos
para o mosto e envolvendo o tratamento simultâneo de todas as correntes que irão compor o mosto
constitui a melhor opção.
Este último é completado por uma etapa de esterilização total.
A Figura 2 exemplifica as bases deste tratamento.
Os estudos acima são a base para definir os parâmetros de qualidade das matérias-primas que
intervêm no processo.
4
Fig.2- Tratamento físico-químico do mosto
Moagem
TQ de Caldo mistop/destilaria
Aquecimento a 105ºC
Tanque de mel
Decantação
Desgaseificaçãoflash
Filtração do lodo
Fermentação
EsterilizaçãoMosto
Caldo do filtro
Caldo misto
Mel
Caldo do filtro de açúcar
Cana-de-açúcar, pré-requisitos de qualidade para fe rmentação alcoólica
Mantelatto (2006) apresenta uma extensa revisão sobre características e composição da cana-de-
açúcar. A Figura 3 mostra dados representativos desta e do caldo compilados por este autor. Um
exame da composição da cana permite concluir que, devido a sua elevada atividade de água, à
percentagem elevada de açúcares e à presença de aminoácidos e proteínas em quantidade
apreciável ela se torna um material facilmente perecível que, quando submetido à exposição a
microrganismos, sofrerá rápido ataque.
11 a 16Fibras (base seca)
10 a 16Sólidos soluveis
24 a 27Sólidos totais
73 a 76Água
% Componentes da cana
3,0 a 5,09 Corantes e outros1,0 a 3,04. Ácidos orgânicos
0,05 a 0,158. Ceras e graxas1,5 a 4,53. Ácidos inorgânicos
0,3 a 0,67. Gomas3 a 52. Sais
0,001 a 0,056.Amido2 a 41.3 Frutose
0,5 a 0,65. Proteínas2 a 41.2 Glicose
0,5 a 2,54.2 Aminoácidos70 a 911.1 Sacarose
1,1 a 3,04.1 Ácidos carboxílicos75 a 931. Áçúcares
Composição dos caldos de cana de açúcar- % sólidos s olúveis
Fig 3- Composição da cana-de-açúcar e o caldo, Mantela tto (2006)
5
Autores como Hernandez-Nodarse (1973), Stupiello (1982), Lopez (1988), Yokoya (1990) e
Gaylarde (1990) relataram a biodeterioração da cana-de-açúcar no período desde a queima (corte)
até o processamento industrial. Estes autores tipificaram os microorganismos predominantes e o
impacto negativo dos mesmos na qualidade da cana a ser processada, seja no processo de
produção de açúcar como na fermentação alcoólica. Microrganismos dos gêneros Bacillus e
Leuconostoc são apontados como os maiores responsáveis pela biodeterioração.
Os autores também comprovaram a aceleração da biodeterioração pela despalha fogo, que remove
o filme protetor de cera, excreta caldo e provoca rachaduras no caule expondo-o rapidamente à
contaminação.
Também é consenso entre os referidos autores que a cana colhida mecanicamente sofre uma
deterioração mais rápida devido ao aumento de exposição dos tecidos decorrente do retalhamento
em segmentos menores. Esta deterioração se agrava ainda mais quando a cana é submetida à
despalha a fogo.
Fatores como o contato com a terra, temperatura e umidade elevadas, chuva no período de corte e
geada agravam esta situação.
Segundo Moreira (1999), na composição do custo de produção de etanol a cana-de-açúcar
participa com aproximadamente 600% do total. Isto significa, entre outros, que em hipótese alguma
existe possibilidade de rejeição da cana que não atender aos índices de qualidade mínima
desejável.
Nesta condição, fixar índices de qualidade mais apurados e estabelecer programas de manejo da
cana compatíveis com as necessidades da fermentação sem aumentar o custo de produção da
cana se fazem prioritários.
Atualmente, o índice empregado pelas usinas para avaliar a qualidade de cana é o tempo médio
entre queima e entrega na Usina, índice este que dá uma boa representação do grau de infecção da
mesma por microorganismos.
Complementam este índice as percentagens de matéria mineral e matéria vegetal estranha,
arrastadas durante as operações de corte e carregamento. Estes últimos são indicativos do grau de
tratamento necessário para remoção de matéria em suspensão durante o processo de tratamento
de clarificação do caldo.
O tempo médio após queima, embora útil para avaliar em forma preliminar a qualidade
microbiológica da cana, pode levar a interpretações errôneas, pois não leva em conta a dispersão
em relação à média.
Lotes diferentes de cana podem ter o mesmo tempo médio de corte, mas aquele que apresentar
maior dispersão de valores em relação à média apresentará uma fração do total muito mais
contaminada, seja no teor de microorganismos, gomas ou formação de ácido. Isto é mais crítico no
caso de microorganismos no qual a multiplicação celular ocorre exponencialmente, levando a que a
fração contaminada abaixe a qualidade do lote total.
6
Atualmente, o procedimento de corte que prevalece é aquele no qual o canavial sofre previamente
despalha a fogo e em seqüência realiza-se o corte manual, carregamento e transporte. Em ordem
de importância segue o corte mecanizado, seja este com prévia queima do canavial ou
processamento da cana crua. Finalmente, uma pequena fração da cana é colhida manualmente
sem queima.
Os dados apresentados na Figura 4, correspondentes ao Controle Mutuo Agrícola e Industrial do
CTC, dados da Safra 2005 compilam os registros de 71 Usinas, sendo representativos do cenário
atual. Estes dados mostram o predomínio atual do corte manual, que atinge aproximadamente
61,4% % do total, assim como o de despalha a fogo, que, em média, atinge 73,5% da cana
processada. O tempo pós-queima até o processamento é de 46,7 horas com um desvio padrão de
14,6. Verifica-se um tempo médio de corte comparativamente elevado e uma dispersão expressiva,
sendo ambos os valores pouco favoráveis a um desempenho otimizado da fermentação alcoólica.
Fig.4- Perfil do processamento da cana das usinas e de stilarias queparticipam do Programa de Controle Mutuo, Agrícola e Industrial gerido pelo CTC.
14,6
desvio padrão (h)
25,5
colheita mecanizada, DP
(%)16,3
colheita de cana queimada, DP (%)
90,1
Tempo máximo de queima (h)87,7
colheita mecanizada, máximo (%)
100colheita de cana
queimada, máximo (%)
30,1Tempo mínimo de
queima (h)0colheita
mecanizada, mínimo (%)
12,3colheita de cana
queimada, mínimo (%)
46,7
Tempo medio de queima (h)38,6
colheita mecanizada,
media (%)73,5
colheita de cana queimada, media
(%)
Na figura 5 mostramos a tendência futura com predomínio de corte mecânico e redução gradativa
da queima. Esta situação se verifica hoje na Usina da Pedra (2006), onde prevalece o corte
mecânico, que responde por 87% da cana processada, sendo que aproximadamente 41% da
mesma é colhida sem queima.
Esta Usina, que realiza uma gestão agrícola muito avançada, apresenta tempo médio e dispersão
bem menores quando comparada com a população do estudo do CTC.
Na Figura 6 apresentamos a distribuição de freqüência nos casos de corte manual e mecanizado.
Observa-se que a fração que permanece um tempo pós-queima (pós-corte) bem acima da média é
bem mais elevada quando o corte é manual. Verifica-se também a importância de avaliar o impacto
da maior deterioração a que é submetida esta fração, que é de 5,3% para o corte manual e 1,5%
para a mecanização, sobre a qualidade final do total de cana processada.
7
2.552.67436.711167.165788.3181.560.480Total (t)
1.302.63319.65276.750605.888600.343Mecanizada Queimada (t)
913.377000913.377Mecanizada crua (t)
15.20401414.252938Manual crua (t)
32.146017.05990.401168.17845.822Manual queimada (t)
Mais de 72 h
48-72 h24-48 h0-24 hTipo de corte
Fig. 5- Distribuição de corte de cana na Usina da Pedra (Safra 2006)
87 %Corte mecanizado
13 %Corte manual
59 %Corte mec. c/queima
41 %Corte mec cru
Corte mecanizado com queima
0,0
10,0
20,0
30,0
40,0
50,0
de 0 a 24 h de 24 a 48 h de 48 a 72 h mais de 72 h
Tempo pós-queima(h)
%
Corte manual com queima
0,0
10,0
20,0
30,0
40,0
50,0
60,0
de 0 a 24 h de 24 a 48 h de 48 a 72 h mais de 72 h
tempo pós-queima (h)
%
Fig. 6- Efeitos dos procedimentos de corte e tempo de esp era na qualida de da cana
Os resultados aqui apresentados vêm a reforçar a necessidade de realização de um estudo do perfil
de biodeterioração da cana desde a pós-queima (pós-corte) até seu processamento na indústria,
considerando a determinação de índices tais como:
- Contagem de microorganismos totais;
- Bactérias formadoras de ácidos orgânicos;
- Bactérias formadoras de dextrana e outros polímeros.
Este estudo deve envolver variáveis tais como: procedimentos de corte, tipo de clima (umidade e
temperatura), solo e ainda fatores como chuva e eventualmente geadas.
8
Caldo clarificado, xarope, mel final e caldo filtra do .
Caldo clarificado.
As usinas e destilarias realizam um tratamento físico-químico para o caldo destinado à fermentação,
adaptado do processo de fabricação de açúcar e envolvendo peneiramento, dosagem de cal,
aquecimento, desgaseificação flash, adição de polímero e decantação.
Em geral, este tratamento não remove a matéria coloidal e em suspensão na medida em que o
processo de fermentação exige. Ademais, as condições operacionais e as características das
instalações do processo, moendas, esteiras de transporte, peneiras, depósitos e tubulações e
outros favorecem a multiplicação bacteriana e a formação de ácidos e gomas.
Xarope
Em geral, quando empregado o xarope é resultante do processo de fabricação de açúcar, tendo
sido submetido à sulfitação. Esta incorporação de sulfitação provoca efeitos negativos na
fermentação, provocando inibição e aumento da síntese de glicerol que reduz a conversão do
açúcar no mosto a etanol.
Mel final
O mel final proveniente da fabricação de açúcar em usinas com destilarias anexas não é fortemente
esgotado. Mesmo assim, quando os mostos são formulados com elevada proporção de mel final a
fermentação é dificultada, como citado por Owen (1948).
O mel aporta compostos indesejáveis, tais como: sulfito, ácidos orgânicos, teor elevado de sais de
cálcio e magnésio, matéria em suspensão e outros.
O emprego de mel se traduz em inibição da fermentação, teores de etanol no vinho final menores,
aumento da carga de sólidos em suspensão na fermentação e floculação do fermento.
Uma melhora da qualidade do mel para fermentação pode ser obtida por processos de clarificação.
Caldo filtrado
As Usinas enviam caldo filtrado que provém da fabricação de açúcar à fermentação. Este
procedimento é prejudicial para o desempenho da fermentação. Este caldo contém elevado teor de
microorganismos indesejáveis, de matéria orgânica coloidal e em suspensão e de matéria mineral,
que interferem negativamente na fermentação.
Este caldo deve ser tratado como proposto por Nolasco-Junior.
9
O CTC introduziu um conjunto de índices para avaliar a qualidade microbiológica e o grau de
deterioração da matéria-prima básica e das derivadas. A figura 7 apresenta estes índices e seus
valores máximos, num programa de controle operacional desenvolvido pelo CTC para auxilio no
controle de matérias-primas e processo. Índices similares foram também adotados por outros
grupos envolvidos com fermentação alcoólica.
kg/ton4Impurezas minerais
p.p.m.450Dextrana
ml/100ml1,5Poder tampão
g/l0,9Acidez
0,50DpH
5,3pH da cana
horas50Horas pós-queima
UnidadeValor máximo
Parâmetro
Fig. 7- Parâmetros para determinação da qualidade da canae as matérias primas derivadas, segundo CTC
É preciso fazer aqui uma distinção entre métodos microbiológicos diretos e métodos indiretos
rápidos.
O controle microbiológico das matérias-primas, que é mais complexo, requer maior grau de
capacitação e seus resultados são demorados, mas oferece resultados diretos do impacto da
presença dos contaminantes e da deterioração que estes provocam nas matérias-primas.
Métodos de abordagem rápida, como determinações do pH, o ∆∆∆∆pH que mede a presença de
contaminantes formadores de ácidos pela queda de pH em um determinado intervalo de tempo, a
acidez do meio, o poder tampão e teor de dextrana fornecem resultados indiretos, porém são bons
indicadores da qualidade das correntes de processo.
A determinação de matéria em suspensão é um auxiliar eficiente para controlar o grau de
tratamentos físico-químicos que deverão receber as matéria-primas.
Na última década, as destilarias foram, em geral, abandonando estas metodologias de controle por
motivos de redução de custo, sem que tenham sido estabelecidas alternativas.
Água de processo, vinhoto e águas condensadas.
Água de processo.
10
Não se tem dado a devida importância à qualidade da água empregada na diluição de mel ou
xarope e na preparação do pé cuba.
Normalmente as destilarias captam águas de superfície para emprego nas operações acima
descritas. As águas de superfície apresentam teores muito variáveis de matéria em suspensão e
coloidal e uma flora microbiana diversa associada a estas. A quantidade é muito variável
dependendo da época do ano: estiagem ou chuva.
Em casos geralmente excepcionais a fonte de água empregada pode ter elevado nível de
contaminação de resíduos de produtos químicos, provocando inibição na fermentação.
Seguindo os critérios estabelecidos por Nolasco-Junior em sua demonstração do acúmulo de
matéria em suspensão na fermentação e da necessidade de realizar tratamentos físico-químicos
nas matérias-primas para remoção desta, consideramos que a água empregada deve também
atender a um teor máximo de matéria em suspensão e teor de microorganismos.
Os processos de depuração de água são de custo comparativamente baixo e não tem sido
quantificada a relação custo beneficio da introdução dos mesmos no tratamento de água para
emprego em fermentação.
Os tratamentos de depuração de água para remoção de matéria em suspensão e teor de
microorganismos constam de três etapas:
•••• Floculação e decantação;
•••• Polimento por filtração;
•••• Desinfecção por cloração ou radiação UV.
O último aqui mencionado é inadequado, sendo que o segundo é desnecessário. O processo por
floculação e decantação seria suficiente para remover a matéria suspensa e coloidal (e a flora
microbiana associada a esta) quando ela atinge níveis que irão sobrecarregar rapidamente o teor de
matéria em suspensão no mosto.
Recomendamos controlar a qualidade da água empregada através da determinação da turbidez e
análise periódica do teor de microorganismos e da presença de substâncias químicas e metais.
Vinhoto
A recirculação de vinhoto na fermentação com o propósito de reduzir o volume total de vinhoto
produzido é controversa. A recirculação no processo Melle-Boinot para diluição de méis e xarope foi
tentada em algumas Usinas, sendo posteriormente abandonada por dificuldades operacionais,
temperatura de fermentação elevada e aumento da infecção e floculação. O processo Biostil
também foi implantado e abandonado, principalmente pela dificuldade de manter o sistema estável.
Na França, fermentações alcoólicas em destilarias empregando beterraba como matéria-prima
foram conduzidas com sucesso, segundo descreve Vassard (1982). É importante lembrar que o
processamento da beterraba e os mostos finais são bem diferentes da nossa condição operacional.
11
Seguindo também a tendência de evitar o acúmulo de material em suspensão, consideramos a
recirculação de vinhoto desvantajosa, pois recicla matéria orgânica ao processo, com o agravante
de parte da mesma provir da termólise das leveduras e servir de nutriente ativo para os
contaminantes da fermentação, como assinala Oliva-Neto (1997).
Água condensada resultante da concentração térmica do vinhoto
Embora não empregadas hoje no Brasil, convém fazer aqui referência às possibilidades de emprego
da mesma como água de diluição de xarope ou mel e para preparo do pé de cuba, levando em
conta a futura expansão da produção, custo de aplicação de vinhoto, cobrança da água e oferta por
fornecedores de equipamentos de unidades de concentração térmica do vinhoto. Decloux (2002) e
Coaullier (2006) discutem o emprego destas águas, a presença de inibidores de fermentação nas
mesmas e matéria orgânica e processos de tratamento, concluindo que a quantidade máxima de
utilização é limitada, seja pela presença de inibidores ou de matéria orgânica reciclada ao processo.
Na França, atualmente existe uma única destilaria que recicla estas águas ao processo.
Novamente o eventual emprego das mesmas dependerá do controle do nível de inibidores e
matéria orgânica presentes.
Conclusões e recomendações
A qualidade da cana é o principal fator a ser levado em conta para melhorar o desempenho da
fermentação alcoólica.
A estimação desta através do tempo entre queima e processamento (corte e processamento no
caso de cana crua) é o parâmetro mais empregado pelas Usinas e Destilarias.
Embora o mesmo forneça uma estimativa do estado de deterioração da cana a ser processada,
poderia ser melhorado mediante a introdução de estatísticas complementares.
Recomendamos o desenvolvimento de alternativas para aperfeiçoamento deste critério e uma
padronização destas metodologias.
As tendências de aumento da percentagem de cana colhida mecanicamente e de eliminação
gradativa da queima pré-corte justificam retomar realização de determinações microbiológicas
(contagem total de microorganismos, bactérias láticas, formadoras de gomas e de ácidos,
esporulados etc.). Isto irá permitir conhecer o perfil de evolução destes microorganismos versus o
tempo pós-queima (corte) em função de tipo de corte, processamento com ou sem queima, assim
como outros associados ao tipo de solo, clima: umidade e temperatura ambiente, chuva, geada.
Outros parâmetros para determinação do grau de deterioração da cana até o processamento —
citando alguns métodos rápidos como pH, ∆∆∆∆pH, presença de dextrana, acidez —, assim como
12
determinações microbiológicas (estas mais complexas e demoradas) devem ser reavaliados. O
propósito desta revisão será estabelecer a eficiência dos mesmos como índices de qualidade,
demonstrar a relação custo benefício de seu emprego e desenvolver estratégias para rotinas de
implantação.
Os parâmetros acima considerados devem ser reavaliados também como índices de controle para
matérias-primas derivadas: caldo misto, clarificado, do filtro, xarope e mel. Será conveniente uma
atuação entre os diversos grupos participantes a fim de estabelecer:
•••• Uma metodologia mínima de controle levando em conta o custo e benefício da mesma;
•••• A padronização da metodologia, validação, difusão e treinamento;
•••• Uma estratégia para implantar a mesma nas destilarias.
A presença de matéria em suspensão de natureza orgânica ou mineral prejudica a performance da
fermentação, aumentando o índice de contaminação por bactérias, a floculação do fermento e a
inibição do metabolismo da levedura de fermentação. O controle do acúmulo desta matéria em
suspensão dentro dos limites da unidade de fermentação é crítico.
Em conseqüência, torna-se necessário controlar a presença de impureza mineral arrastada com a
cana e a presença de matéria em suspensão orgânica e mineral junto às matérias-primas derivadas
e complementares.
Novamente recomendamos a padronização de uma metodologia para controle da presença de
matéria orgânica e mineral em suspensão nas matérias-primas empregadas na fermentação e nas
correntes de processo da fermentação.
13
Referências Bibliográficas CTC. Programa de Controle Mútuo Agrícola e Industrial, 2005a. Stupiello, J.P., Horii, J. Considerações sobre tratamentos de caldo de cana para fermentação alcoólica. Álcool e Açúcar, Nº3, p: 40-46, 1981a. Rossell, C. E. V. Sugarcane processing to ethanol for fuel purposes. In: Symposium on the Chemistry and Processing of Sugarcane, 1987, Lousiana. Chemistry and processing of sugarbeet and sugarcane. Amsterdam: Elsevier, 1987. p. 349-366. Pereira-César, A., R. Programa de controle operacional da fermentação alcoólica (1997), Nolasco-Junior, J., Finguerut, J. Balanço de bactérias na fermentação alcoólica, CTC, RT-764-95/96, 1996. Nolasco-Junior, J., Finguerut, J. Projeto floculação-fase I-caracterização e proposta de um índice de floculação. CTC, RT-674-93, 1993. CTC, Manual de controle microbiológico da usina de açúcar e álcool. Cadernos Copersucar, Série Industrial, 5, p. 1-10,1983. Formaggio, G ., Finguerut, J. Produção específica de ácidos orgânicos. CTC, RT-963-99/00, 1999. Nolasco-Junior, J. e colaboradores. Tratamento de caldo e incrustação no processo de esterilização do mosto, CTC, RT-827-97/98, 1998a. Nolasco-Junior, J., Finguerut, J. Esterilização de mosto-processo cip-sip, CTC, RT-835-97/98, 1998b. Nolasco-Junior, J. Desenvolvimento de processo térmico otimizado para mosto de caldo de cana na fermentação alcoólica. Dissertação de Mestrado, FEA-UNICAMP, 2005. Mantelatto, P., E . Estudo do processo de cristalização de soluções impuras de sacarose de cana-de-açúcar por resfriamento. Dissertação de Mestrado UFSCAR, São Carlos, 2005. Hernández-Nodarse , M.T. Aspectos del control microbiológico en la molida de la caña de azúcar. CubaAzúcar, oct-dic, p:1932,1973. Stupiello,J.P. Qualidade da cana-de-açúcar para a fabricação de açúcar e álcool. Açúcar e Álcool, 2, p. 28-32, 1982. López, Z.O. e colaboradores. Población Microbiana de jugos de caña no afectadas y deterioradas por haldas. Su relación con la fermentación alcohólica. Sugar y Açúcar, julio p: 33-39, 1988. Yokoya, F. Métodos para determinação da qualidade microbiológica da cana e do caldo. Relatório parcial. Fundação André Tosello, Abril, 1990. Gaylarde, C.C. , Latorre, W.C. Biodeterioration problems in the Brazilian sugarcane-alcohol industry. Biodeterioration Abstracts, nº 3, p. 219-225, 1990. Moreira, J.R ., Goldemberg, J. The alcohol program. Energy Policy, nº 27, p. 229-245, 1999. Usina da Pedra, Informações do processo, 2006. Owen, W.L. The fermentation of molasses. Sugar 43, April, p. 37-39, 1948. Vassard, O. Recyclage des vinasses de betteraves. Nd Aliment. Agric., 99. nº 7-8, p.525-528, 1982. Oliva-Neto, P., Yokoya, F. Effects of nutricional factors on growth of lactobacillus fermentum with saccharomyces cerevisiae in alcoholic fermentation. Revista de Microbiologia, 28, p. 25-31,1997. Decloux, M . e colaboradores. Interest of Electrodyalysis to reduce potassium level in vinasses. Preliminary experiments. Desalination, 146 p. 393-398, 2002. Couallier, E. e colaboradores. Recycling of Distillery Effluents in Alcoholic Fermentation: Role in Inhibition of 10 Organic Molecules. Applied Biochemistry & Biotechnology, 133(3):217-237, June 2006.