PROVÉRBIOS

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SERMÃO EM PV. 1: 7 SOBRE “A LITERATURA SAPIENCIAL: PROVÉRBIOS” DO LICENCIADO HEBER BERTUCCI PARA A IGREJA PRESBITERIANA NOVE DE ABRIL INTRODUÇÃO 1. Dentro da classificação proposta por estudiosos, na Bíblia nós temos os chamados livros de sabedoria também chamados de sapienciais. Estes livros são: Jó, Provérbios e Cantares. O que estes livros têm em comum que justifica a sua classificação é a sua ênfase na sabedoria. 2. Em nosso sermão de hoje, estudaremos de forma introdutória alguns aspectos importantes do livro de Provérbios, livro que também faz parte da chamada “literatura sapiencial ou “poética”. I – O NOME “PROVÉRBIOS” 3. Na Bíblia hebraica o nome do livro de Provérbios se trata das duas primeiras palavras do livro que são: hmoål{v. ylev.miâ(misheley Shelomoh), isto é, “Provérbios de Salomão”. (Pv. 1:1). 1 É 1 Cf.: ARCHER JR., Gleason L. Merece confiança o Antigo Testamento? Tradução de Gordon Chown. 4. ed. São Paulo – SP: Vida Nova, 2004. p. 420. interessante saber que os nomes dos livros da Bíblia hebraica não eram dados como são os nossos modernos livros. Hoje, damos o nome a uma obra pelo seu conteúdo, isto é, trata-se de uma síntese do que a obra fala. No mundo hebreu geralmente uma obra era nomeada pelas suas primeiras palavras. Isso ocorria porque a escrita hebraica era junta, isto é, sem espaços entre uma palavra e outra e, para saber onde começava uma nova obra, eles tinham que decorar as primeiras palavras do livro. 4. Por exemplo, abra sua Bíblia em Êxodo 1:1. Para nós, esse livro se chama “Êxodo”, termo grego que quer dizer “saída” e que vem de uma tradução do hebraico para o grego realizada no século 3º a. C. chamada Septuaginta. Mas, no Velho testamento Hebraico o seu nome é tAmv. hL,ae ªw> (We’elleh shemôth), que, se observarmos, significa “E estes são os nomes de”, isto é, as primeiras palavras do livro. 5. Percebemos que em nossa versão portuguesa o nome do livro de Provérbios trata-se da tradução do termo hebraico para “Provérbio” que é “mashal”. Algumas pessoas afirmam que o termo “provérbio” significa apenas um dito breve que pode ter conotação satírica ou não . Desta forma os provérbios seriam apenas frases curtas que teriam um fim definido. Entretanto, o termo mashal na Bíblia vai além dessa idéia. Por exemplo, o termo pode significar uma parábola ampliada, como a que encontramos em Ez. 17: 1 – 8, que é a parábola das duas águias e da videira. No V. 2 lemos: “Filho do homem, propõe um enigma e usa de uma parábola para com a casa de Israel”. No caso dos Provérbios da Bíblia, eles são ditos de sabedoria curtos, como no caso de Pv. 14: 2: “O que anda na retidão teme ao SENHOR, mas o que anda em caminhos tortuosos, esse o despreza”, ou ditos de sabedoria cumpridos, como a seção de Pv. 1: 8 – 19 que contem um único “tratado didático”.

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SERMÃO EM PV. 1: 7 SOBRE “A LITERATURA SAPIENCIAL: PROVÉRBIOS”

DO LICENCIADO HEBER BERTUCCI PARA A IGREJA PRESBITERIANA NOVE DE ABRIL

INTRODUÇÃO

1. Dentro da classificação proposta por estudiosos, na Bíblia nós temos os chamados livros de sabedoria também chamados de sapienciais. Estes livros são: Jó, Provérbios e Cantares. O que estes livros têm em comum que justifica a sua classificação é a sua ênfase na sabedoria.

2. Em nosso sermão de hoje, estudaremos de forma introdutória alguns aspectos importantes do livro de Provérbios, livro que também faz parte da chamada “literatura sapiencial ou “poética”.

I – O NOME “PROVÉRBIOS”

3. Na Bíblia hebraica o nome do livro de Provérbios se trata das duas primeiras palavras do livro que são: hmoål{v. ylev.miâ(misheley

Shelomoh), isto é, “Provérbios de Salomão”. (Pv. 1:1). 1 É

1 Cf.: ARCHER JR., Gleason L. Merece confiança o Antigo Testamento? Tradução de Gordon Chown. 4. ed. São Paulo – SP: Vida Nova, 2004. p. 420.

interessante saber que os nomes dos livros da Bíblia hebraica não eram dados como são os nossos modernos livros. Hoje, damos o nome a uma obra pelo seu conteúdo, isto é, trata-se de uma síntese do que a obra fala. No mundo hebreu geralmente uma obra era nomeada pelas suas primeiras palavras. Isso ocorria porque a escrita hebraica era junta, isto é, sem espaços entre uma palavra e outra e, para saber onde começava uma nova obra, eles tinham que decorar as primeiras palavras do livro.

4. Por exemplo, abra sua Bíblia em Êxodo 1:1. Para nós, esse livro se chama “Êxodo”, termo grego que quer dizer “saída” e que vem de uma tradução do hebraico para o grego realizada no século 3º a. C. chamada Septuaginta. Mas, no Velho testamento Hebraico o seu nome é tAmv. hL,aeªw> (We’elleh shemôth), que, se observarmos, significa “E estes são os nomes de”, isto é, as primeiras palavras do livro.

5. Percebemos que em nossa versão portuguesa o nome do livro de Provérbios trata-se da tradução do termo hebraico para “Provérbio” que é “mashal”. Algumas pessoas afirmam que o termo “provérbio” significa apenas um dito breve que pode ter conotação satírica ou não. Desta forma os provérbios seriam apenas frases curtas que teriam um fim definido. Entretanto, o termo mashal na Bíblia vai além dessa idéia. Por exemplo, o termo pode significar uma parábola ampliada, como a que encontramos em Ez. 17: 1 – 8, que é a parábola das duas águias e da videira. No V. 2 lemos: “Filho do homem, propõe um enigma e usa de uma parábola para

com a casa de Israel”. No caso dos Provérbios da Bíblia, eles são ditos de sabedoria curtos, como no caso de Pv. 14: 2: “O que anda

na retidão teme ao SENHOR, mas o que anda em caminhos

tortuosos, esse o despreza”, ou ditos de sabedoria cumpridos, como a seção de Pv. 1: 8 – 19 que contem um único “tratado didático”.

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II – AUTOR DE PROVÉRBIOS

6. Sobre a autoria de Provérbios, podemos citar o que o próprio livro fala sobre ela: Como seu autor aparece: Salomão – Observemos Pv. 1:1 – “Provérbios de Salomão, filho de Davi, o rei

de Israel” e 10:1: “Provérbios de Salomão. O filho sábio alegra a

seu pai, mas o filho insensato é a tristeza de sua mãe.” O livro também faz referência a uma equipe redatorial da época do rei Ezequias, que transcreveram os provérbios de Salomão. Eles não chegaram a ser autores do livro de Provérbios, mas agruparam provérbios ditos por Salomão e os reuniram. Vemos isso em 25:1: “São também estes provérbios de Salomão, os quais transcreveram

os homens de Ezequias, rei de Judá.” O livro também fala de Agur, que não sabemos exatamente quem foi porque sua única referencia é neste capítulo. Observemos Pv. 30:1: Palavras de Agur, filho de

Jaque, de Massá.” E por ultimo, podemos citar o rei Lemuel em 31:1: “Palavras do rei Lemuel, de Massá, as quais lhe ensinou sua

mãe.” Este rei nós também não sabemos exatamente quem foi, mas um fato nos chama a atenção: os seus Provérbios eram frutos dos ensinos de sua mãe. Observemos que ele, já rei, provavelmente jovem ou mais velho, tinha na memória o que sua mãe lhe ensinou. Isso motiva os pais a ensinarem aos seus filhos os caminhos de Deus, pois, mesmo que um dia eles se desviem do ensino, este ficará em suas mentes o que poderá causar a sua volta a presença de Deus em tempo próximo.

7. Claro que não podemos encerrar este ponto sobre a autoria de Provérbios sem citar que o autor por excelência de Provérbios é o próprio Deus que capacitou e supervisionou a todos estes escritores.

III – O MUNDO CULTURAL DE PROVÉRBIOS

8. Um ultimo ponto que podemos ver sobre o livro de Provérbios nesta noite, trata-se do “mundo cultural de Provérbios”. Esta parte do estudo retirei do artigo do Rev. Daniel Santos, publicado na Revista Presbiteriana Fides Reformata, com o título de

“A Proposta Pedagógica de Provérbios 22:6”. 2

9. Daniel Santos começa enfatizando que muitos de nós somos tentados a sempre interpretar o livro de Provérbios à luz da cultura atual do Brasil. Mas, contra isso devemos entender que há uma grande distância cultural entre o mundo de Provérbios e a nossa cultura nacional. Essa distância se manifesta de modo claro no fato de que nós brasileiros não usamos os provérbios para corrigir os erros de nossa geração. Por exemplo, você não cita um provérbio moral, bíblico ou não para alguém que fez algo errado ao seu lado.

10. Mas, se não podemos entender de modo claro o livro de Provérbios ao olharmos para o nosso contexto cultural, então, como vamos fazê-lo? A resposta é simples: basta olhar para o contexto cultural em que Provérbios está inserido e que o compreenderemos bem melhor. É o que faremos agora:

11. O primeiro elemento cultural em que Provérbios está inserido é o contexto real e palaciano. Os ensinos proverbiais foram dados por reis que o escreveram, por exemplo, Salomão, Lemuel, a ainda aos auxiliadores do rei Ezequias. Uma curiosidade

2 Cf.: SANTOS, JR., Daniel. A proposta pedagógica de Provérbios 22.6. Fides Reformata. São Paulo – SP: Mackenzie, v. XIII, n. 1, p. 9 - 29, 2008. (Revista do Centro Presbiteriano de Pós – Graduação Andrew Jumper – CPAJ).

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é que cerca de 20 provérbios têm a palavra “rei” como parte fundamental da sabedoria proposta. “Nestes provérbios o sábio

discursa sobre o caráter do rei, a natureza de suas decisões como rei e a

maneira como devemos nos portar diante dele.” 3

12. O segundo elemento é a dependência temática que Provérbios tem de figuras populares. “Uma quantidade enorme de

instruções proverbiais lida diretamente com necessidades agrárias, rurais e

também num contexto doméstico, em vez de administrativo.” 4 Para se entender então provérbios é necessário compreender os costumes familiares daquela época. É também importante frisarmos que esse uso popular dos provérbios torna a obra mais aplicável e relevante para o cidadão comum, e não para aqueles que viviam apenas no contexto dos palácios reais. Isso quer dizer que o livro de Provérbios lida com questões que são bem comuns para todos nós, e devemos buscar na sua leitura sabedoria para resolver nossas dificuldades.

13. O terceiro elemento se trata da relação estreita que Provérbios tem com a dinâmica domiciliar. Vemos isso nas admoestações do livro. Elas são na forma de um pai para o seu filho e não na de um Rei para seu vassalo e nem de um patrão para os seus subordinados. “Waltke afirma que as muitas referências ao pai, e

especialmente à mãe, se dirigindo aos seus filhos (...) sugerem que

Salomão pretendia transmitir sua sabedoria a Israel através do lar, da

mesma maneira como Moisés disseminou a Lei através dos pais, em

3 Daniel SANTOS, JR. A proposta pedagógica de Provérbios 22.6. Fides Reformata, p. 13.

4 Ibid., p. 13.

Israel.” 5 Observemos Pv. 1:8 – “Filho meu, ouve o ensino de teu pai

e não deixes a instrução de tua mãe.” E também Dt. 6: 7 – “tu as

inculcarás a teus filhos, e delas falarás assentado em tua casa, e

andando pelo caminho, e ao deitar-te, e ao levantar-te.”

14. O quarto e ultimo elemento é tão importante quanto os outros. Ele se refere ao caráter internacional do livro de Provérbios. “Isto significa dizer que a literatura sapiencial, em geral, não

parece ter sido escrita para leitura e uso específico, dentro da sociedade

israelita, haja em vista a ausência de qualquer referência direta à Lei, à

aliança no Sinai, aos patriarcas, aos profetas, aos livros históricos ou até

mesmo ao livro de Salmos.” 6

15. É importante este caráter internacional do livro de Provérbios porque demonstra o seu caráter missiológico. Um estudo da literatura sapiencial antiga nos revela que ela estava presente em várias partes do Antigo Oriente próximo na época de Provérbios. Devemos entender que a literatura de sabedoria era o meio pelo qual Deus se fez conhecido entre as nações. O maior exemplo disse é a visita da rainha de Sabá a Salomão que, de seu país ouvira falar da sabedoria do rei de Israel. Já em Jerusalém, ela disse a Salomão, depois de observar toda a sua sabedoria e bens: “Foi verdade a palavra que a teu respeito ouvi na minha terra e a

respeito da tua sabedoria. 7 Eu, contudo, não cria naquelas

palavras, até que vim e vi com os meus próprios olhos. Eis que não

me contaram a metade: sobrepujas em sabedoria e prosperidade a

fama que ouvi. 8 Felizes os teus homens, felizes estes teus servos,

que estão sempre diante de ti e que ouvem a tua sabedoria! 9

5 Daniel SANTOS, JR. A proposta pedagógica de Provérbios 22.6. Fides Reformata, p. 15.

6 Ibid., p. 16.

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Bendito seja o SENHOR, teu Deus, que se agradou de ti para te

colocar no trono de Israel; é porque o SENHOR ama a Israel para

sempre, que te constituiu rei, para executares juízo e justiça.” (I Rs. 10: 6 – 9).

16. Este propósito das outras nações conhecerem ao Deus de Israel por sua sabedoria já era visto na lei. Em Dt. 4: 6 – 8 lemos: “ 6

Guardai-os, pois, e cumpri-os, porque isto será a vossa sabedoria e

o vosso entendimento perante os olhos dos povos que, ouvindo

todos estes estatutos, dirão: Certamente, este grande povo é gente

sábia e inteligente. 7 Pois que grande nação há que tenha deuses

tão chegados a si como o SENHOR, nosso Deus, todas as vezes que

o invocamos? 8 E que grande nação há que tenha estatutos e juízos

tão justos como toda esta lei que eu hoje vos proponho?”

Observamos com esse texto que a proposta evangelística do Antigo testamento não era a de levar a sabedoria de Israel a outras nações, mas sim, a de ser sábio aos olhos dos povos. Isso significava para Israel demonstrar o seu conhecimento da Lei de Deus.

Dado em Barra Mansa, junto da Igreja Presbiteriana Nove de Abril, no dia 10 de maio – culto matutino ao Senhor – do ano de 2009, ano de minha licenciatura.