Proteção, apropriação e gestão de ativos intelectuais

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ÍNDICE ANALÍTICO

SUMÁRIO EXECUTIVO ................................................................................................... 3

PROTEÇÃO, APROPRIAÇÃO E GESTÃO DE ATIVOS INTELECTUAIS ................................................. 4

1. INTRODUÇÃO ............................................................................................... 4

2. APROPRIABILIDADE E CAPTURA DO VALOR DO CONHECIMENTO ..................................... 5

2.1. A natureza do conhecimento e suas formas de proteção ......................................... 5

2.2. Patentes e apropriação ................................................................................ 5

2.3. A não proteção como forma de geração de valor .................................................. 8

2.4. Time-to-market ......................................................................................... 8

3. GESTÃO DOS ATIVOS INTELECTUAIS ..................................................................... 9

3.1. Avaliação de novos conhecimentos ................................................................ 10

3.2. Estabelecimento de redes ........................................................................... 10

3.3. Disseminação da Cultura de Apropriação do Conhecimento .................................... 11

3.4. Estruturação da área jurídica ....................................................................... 11

3.5. Gestão do Portifólio de Propriedade Intelectual ................................................. 11

3.6. Estabelecimento de Práticas de Inteligência Tecnológica ...................................... 12

4. CONCLUSÃO ............................................................................................... 13

AUTORES ............................................................................................................... 14

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................................... 14

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SUMÁRIO EXECUTIVO

As questões relativas à proteção do conhecimento vêm ganhando cada vez mais importância na agenda de discussões de empresas que tem atividades de pesquisa e desenvolvimento como a base de seus negócios. Isso acontece uma vez que a proteção pode representar a garantia de exploração exclusiva do novo conhecimento.

No entanto o retorno financeiro de atividades de P&D pode estar relacionado não apenas com a proteção do conhecimento, mas também com outras estratégias que permitam a sua apropriação, isto é, a captura de seu valor.

A captura do valor pode ser feita pela proteção ou até mesmo pela divulgação e compartilhamento de um desenvolvimento tecnológico. Conhecer e entender os diferentes mecanismos de apropriação é o primeiro passo para a estruturação da gestão estratégica dos ativos intelectuais.

A gestão estratégica dos ativos intelectuais de uma empresa presume a atuação coordenada em 6 distintas frentes de trabalho: (1) avaliação de novos conhecimentos, (2) estabelecimento de redes, (3) disseminação da cultura de apropriação do conhecimento, (4) estruturação do departamento jurídico, (5) gestão do portifólio de propriedade intelectual e (6) o estabelecimento de práticas de inteligência tecnológica.

o A estrutura e a forma como as frentes de trabalho devem interagir tendem a ser diferentes de empresa para empresa, embora melhores resultados poderão ser alcançados com uma gestão e articulação centralizadas.

Embora ainda existam diversas questões em aberto com relação a sua implantação, é importante que a gestão estratégica dos ativos intelectuais esteja alinhada com a estratégia global de inovação da empresa.

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PROTEÇÃO, APROPRIAÇÃO E GESTÃO DE ATIVOS INTELECTUAIS

1. INTRODUÇÃO

Muitas empresas inovadoras perdem a corrida competitiva para concorrentes e imitadores de seus produtos devido à sua inabilidade de se apropriar de suas invenções, portanto capturar valor da inovação é um dos maiores desafio da empresa que investe em pesquisa e desenvolvimento (P&D).

Dentre os mecanismos de apropriação do conhecimento, a proteção de uma invenção por meio de patentes soa como a forma mais eficaz. Uma idéia patenteada tem garantia legal de que terceiros não farão uso de suas aplicações sem consentimento do seu proprietário. Mas será que proteger uma idéia e excluir seu uso por terceiros é de fato a única forma de capturar seu valor? Será que é a melhor opção? Quais outros mecanismos permitem maximizar o retorno do que foi investido em pesquisa e desenvolvimento? De quantas maneiras distintas uma empresa pode proteger seus ativos intelectuais e obter maior retorno financeiro com eles?

Na primeira parte deste artigo serão apresentados conceitos referentes à apropriação do conhecimento e a análise de casos que ilustram diferentes mecanismos de apropriação. Posteriormente, uma discussão sobre a gestão estratégica dos ativos intelectuais dentro da empresa será apresentada.

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2. APROPRIABILIDADE E CAPTURA DO VALOR DO CONHECIMENTO

A apropriabilidade de um conhecimento é a capacidade de mitigar ou impossibilitar a ação de imitadores, potencializando assim o retorno otimizado dos investimentos realizados em atividades de P&D

O termo apropriabilidade refere-se às condições ao redor de um novo conhecimento que permitem a captura de seu valor. Um dos principais objetivos de quem investe em P&D é evitar ser copiado pelos concorrentes. Nesta linha, a apropriabilidade pode ser observada como a capacidade de impossibilitar a ação de imitadores e de garantir o retorno otimizado dos investimentos em P&D. Diferentes estratégias de apropriabilidade são necessárias para se garantir retorno dos investimentos feitos no desenvolvimento de novos produtos ou processos. Os mecanismos para garantir a apropriação de um conhecimento são diversos, e incluem patentes, marcas, segredos industriais, e até mesmo o tempo de desenvolvimento e lançamento de um novo produto no mercado. Como estes mecanismos serão utilizados depende dos objetivos da empresa e da natureza dos conhecimentos envolvidos.

2.1. A natureza do conhecimento e suas formas de proteção

A natureza do capital intelectual influencia diretamente a sua proteção

Um conhecimento pode se caracterizar por uma maior dificuldade em ser

copiado se ele não puder ser observado em uso como nas inovações em

processos ou se ele é dependente de um contexto específico da empresa ou plataforma tecnológica em que está inserido para fazer sentido. Outro aspecto se refere aos conhecimentos tácitos envolvidos (aqueles que estão disseminados nas pessoas e competências da empresa de maneira não formal ou estruturada): devido à sua natureza, o conhecimento tácito é muito difícil de ser repassado, pois ele não está explícito em manuais ou protocolos, por exemplo. Assim quanto mais tácito é um conhecimento, mais difícil é a sua replicação, o que pode conferir maior proteção contra cópias. No entanto, o mesmo aspecto pode também dificultar a transferência desse conhecimento, ou ainda permitir que ele seja perdido para concorrentes através da transferência de pessoas chave.

Considerando a natureza do conhecimento, é relevante observar ao menos dois pontos: o controle sobre os recursos humanos, e as barreiras técnicas utilizadas como forma de proteção.

Os termos de confidencialidade entre empregadores e empregados, as cláusulas de não transferência para concorrentes, e até mesmo as políticas de retenção e manutenção de colaboradores por muito tempo na empresa são formas de se proteger o conhecimento gerado e garantir sua apropriação. Em especial o conhecimento tácito.

As barreiras técnicas são todos aqueles mecanismos utilizados para proteger o acesso direto ao conhecimento como, por exemplo, senhas, sistemas de criptografia ou ainda a criação de áreas com acesso restrito. Em geral as barreiras técnicas são eficazes na proteção do conhecimento explícito – aquele possível de ser registrado ou verbalizado.

2.2. Patentes e apropriação

Inicialmente, o valor das patentes residia na sua capacidade de ser uma barreira de entrada para concorrentes

Conseguindo acessar e entender a natureza do novo conhecimento é possível avaliar quais formas de proteção podem ser aplicadas e de que forma utilizá-las para garantir a exploração. Para aqueles conhecimentos que podem ser descritos e formalizados, as patentes são uma forma atrativa de proteção. Tradicionalmente as patentes desempenham um papel de proteção na estratégia do negócio através da sua capacidade legal de excluir rivais da utilização de tecnologias proprietárias. As patentes foram primariamente valorizadas como uma barreira de entrada para concorrentes, não como uma fonte de receita e lucro por si só. Um exemplo clássico da utilização de patentes para estabelecimento de um monopólio tecnológico pode ser observado no caso da Xerox.

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A Xerox teve sua origem a partir da Haloid, uma companhia de material fotográfico que investiu cerca de 14 anos, e grande parte de suas receitas, no desenvolvimento da 914, a primeira maquina de cópias xerográficas. As patentes que a empresa detinha sobre o processo de fotocópias garantiram a exploração exclusiva da tecnologia por cerca de 15 anos. Durante este período, a empresa se estabeleceu como líder absoluta do mercado, usufruindo de altas margens de retorno. Em 1975, a empresa foi obrigada a licenciar suas patentes em resposta a regulamentações antitruste americanas. Como conseqüência da perda do monopólio, a empresa viu seu market-share, margem de lucro e dominância de mercado rapidamente se desfazerem. Sua participação no mercado de copiadoras de papel, por exemplo, que em 1974 era de 85% caiu para 40% em 1985.

Há casos em que a patente não impede a entrada de concorrentes, mas dificulta o acesso a novas tecnologias e aumenta os custos de tecnologias rivais

Existem casos em que as patentes não são suficientes para garantir o monopólio de mercado, mas, ainda assim, podem ser utilizadas como ferramentas de competitividade, pois são capazes de dificultar e atrasar o acesso dos concorrentes a novas tecnologias, ou de aumentar os custos das tecnologias rivais. A Hitachi 1 é uma empresa que utiliza bem essa estratégia. Ela busca conhecer a complexidade do que se cria e a facilidade com que essas invenções podem ser copiadas. A empresa procura identificar linhas tecnológicas estratégicas e desenvolver produtos que, uma vez lançados, tenham proteção por meio de patentes que sejam capazes de garantir a ela uma participação de mercado dominante. Estes produtos não apresentam, necessariamente, grande complexidade tecnológica e poderiam ser copiados pela concorrência. No entanto, a rede de patentes que a empresa cria ao redor de cada linha temática faz com que seus rivais tenham dificuldades significativas ao tentar desenvolver tecnologias similares. Essas patentes tendem a gerar um aumento no custo das tecnologias rivais, pois aos concorrentes restam três alternativas: contornar tecnologicamente a proteção e desenvolver novas soluções, licenciar as tecnologias em questão, ou tentar medidas judiciais que permitam o uso das tecnologias.

1 Empresa de origem japonesa com atividade global. Teve origem a partir de uma loja de reparos elétricos em 1910. Hoje atua em diversos setores, produzindo desde refrigeradores até equipamentos médicos de última geração.

Emaranhados de patentes, licenças cruzadas e consórcios de patentes

Em alguns casos, principalmente em áreas com arquiteturas tecnológicascomplexas, como biotecnologia e microeletrônica, patentes de tecnologias chavespodem formar densas redes de direitos sobrepostos que constituem umaimportante barreira de entrada no mercado e podem até mesmo inviabilizar olançamento de um novo produto. Esses “emaranhados” de patentes, tambémchamados de patent thickets, podem ser causados tanto por patentes de umamesma empresa, quanto por sobreposição de patentes de proprietários distintos.A fim de contornar este problema, duas estratégias têm sido utilizadas comfreqüência: o uso de licenças cruzadas (cross licences) e a formação de consórciosde patentes (patent pools). As licenças cruzadas geralmente são baseadas na trocade PI por PI, onde duas ou mais empresas permitem que suas patentes possam serutilizadas entre si. Já os patent pools envolvem uma única entidade, nova oudetentora de algumas patentes do consórcio, que licencia as patentes de duas oumais empresas para terceiros como um pacote fechado. Um exemplo de consórciode patentes bem estruturado foi o realizado para a comercialização do sistema decompressão MPEG2. Para se atingir esse padrão de compactação e execução devídeos seria necessário utilizar patentes de muitos proprietários distintos, o quepossivelmente inviabilizaria a tecnologia. Desta forma foi estabelecido umconsórcio que envolve patentes de nove empresas e uma universidade, que sãocomercializadas de uma só vez através de um agente comum (MPEG LA).

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Há casos em que a patente deixa de ser uma ferramenta de competição para ser o objeto de valor em si

Estes exemplos mostram como a propriedade intelectual poder ser utilizada como instrumento para o estabelecimento de vantagens proprietárias no mercado e ferramentas de competitividade, em especial para empresas cujo modelo de negócio está baseado na comercialização de bens de consumo. Para outras empresas, no entanto, o grande valor que pode ser obtido está na comercialização do próprio conhecimento. Neste caso, as patentes deixam de ser tratadas como ferramentas de competição, e passam a ser os produtos em si. Um exemplo que ilustra bem esse modelo é a história da Millennium Pharmaceuticals, uma CRO localizada nos EUA.

A Millennium se destacou no setor por duas razões principais: sua plataforma para identificação de novos alvos terapêuticos e seu modelo de negócios. A plataforma desenvolvida pela Millennium permitia a rápida descoberta e validação de novos compostos e alvos terapêuticos. Isto é, permitia que rapidamente a empresa soubesse para quais problemas novos compostos poderiam ser utilizados.

O modelo de negócio desenvolvido pela Millennium definia que os conhecimentos gerados e protegidos poderiam ser divididos entre ela e a empresa contratante. De acordo com este modelo, os alvos terapêuticos que não fossem interessantes para o negócio da contratante pertenceriam à Millennium, que poderia ter uma receita adicional a partir da comercialização destas tecnologias para outras empresas. Para as contratantes, esse modelo se mostrou vantajoso por permitir a obtenção do conhecimento de interesse por um custo menor. Para a Millennium, era uma excelente oportunidade de conseguir novas receitas.

Após um tempo, a Millennium licenciou parte de sua plataforma para a Eli Lilly2. A empresa aceitou abrir mão de ser a única a utilizar a tecnologia em troca das receitas geradas pelos royalties pagos, pois acreditou que estes recursos permitiriam mais investimentos em P&D, e conseqüente manutenção da empresa na vanguarda tecnológica. A estratégia da Millennium, baseada em sua plataforma tecnológica e na gestão da propriedade intelectual gerada, possibilitou que a empresa surgida em 1993 fosse adquirida pela japonesa Takeda, em 2008, por 8.8 bilhões de dólares. A empresa, hoje, tem seu foco em pesquisas oncológicas, continua fazendo serviços em parceria, mas também possui produtos em seu nome no mercado.

Os exemplos apresentados ilustram diferentes formas de como o mecanismo de proteção através de patentes pode ser utilizado para maximizar os retornos dos investimentos em P&D. Além disso, evidenciam que este mecanismo pode ser utilizado em empresas com diferentes modelos de negócio.

2 Empresa farmacêutica americana fundada em 1876 em Indianápolis.

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Há casos em que a proteção do conhecimento como um segredo industrial é mais vantajosa do que seu patenteamento

2.3. A não proteção como forma de geração de valor

Há situações em que a geração de valor está no compartilhamento do conhecimento, e não na sua proteção

Os principais mecanismos de apropriação são baseados na proteção do conhecimento. Contudo, às vezes o uso mais eficiente dos mecanismos de apropriabilidade não está em se evitar a cópia do ativo intelectual em si, e sim no compartilhamento desse conhecimento ou na sua divulgação visando incentivar a cadeia de valor em que a empresa se insere. Por exemplo, o Google Android, sistema operacional para celulares e smartphones, tem código aberto, permitindo que qualquer pessoa desenvolva novas funcionalidades, aperfeiçoe as existentes, e as utilize em seus aparelhos. O Android não contribui diretamente para o faturamento da empresa, mas o seu objetivo é proporcionar ao usuário uma melhor experiência ao acessar seu e-mail, fazer buscas ou compras através do celular. Da mesma forma, a Google lançou seu próprio navegador de Internet, o Chrome, com a promessa de tornar mais rápida, segura e simples a visualização de páginas na internet. Conseqüentemente, deve aumentar o número de cliques em propagandas — essa sim, a importante fonte de receita da empresa uma vez que os anúncios online ainda representam 98% do faturamento. O objetivo da Google, neste caso, é aumentar de forma sistêmica a cadeia de valor em que atua, e não ganhar diretamente com os produtos que desenvolve.

2.4. Time-to-market

O retorno do investimento em P&D pode se dar também pelo rápido desenvolvimento e lançamento de produtos no mercado

O termo time-to-market se refere ao tempo entre a concepção de uma idéia e sua chegada no mercado. Este intervalo de tempo é um dos fatores mais relevantes para a competitividade e pode definir se a empresa vai ser pioneira ou seguidora em determinadas áreas tecnológicas e mercados. Ser o pioneiro em um novo mercado pode trazer vantagens significantes. Dependendo das particularidades do mercado em questão, o pioneirismo pode contribuir para a fidelização dos clientes, fortalecimento da marca e a criação de padrões que serão adotados pelos seguidores. Além disso, uma empresa também pode manter os competidores afastados pelo desenvolvimento de melhorias contínuas em seus produtos ou serviços, especialmente em setores de alta intensidade tecnológica, e de produtos com ciclo de vida reduzido. Nesses casos, a apropriação, ou a garantia do retorno do investimento em P&D, está suportada por esse pioneirismo de mercado, ou seja, o rápido desenvolvimento e lançamento de produtos é quem garante o sucesso na exploração destas inovações.

Segredos Industriais

Em alguns casos, a proteção do conhecimento como um segredo industrial é maisvantajosa do que seu patenteamento. Esta análise leva em consideração afacilidade com que rivais podem copiar a tecnologia e o tempo durante o qualacredita-se que ela pode continuar dando retorno financeiro. Isto aconteceporque as patentes garantem a exploração exclusiva da nova idéia por um períodode tempo limitado. Já o segredo pode ser explorado até que seja copiado pelosconcorrentes. Assim, as principais vantagens do segredo industrial são:

• Sua longevidade, caso protegido com os devidos cuidados, pode durar bem mais do que os 20 anos previstos para patentes.

• Sua confidencialidade – Os documentos de patentes são de acesso público, e podem ser analisados por concorrente. O que permite detectar tendências e soluções. O segredo industrial permite esconder melhor o que está sendo feito dentro da empresa.

E como as principais desvantagens podem ser apontadas:

• Risco – caso terceiros cheguem à mesma idéia a empresa perderá a exclusividade

• Controle sobre recursos humanos – deve existir uma política contratual diferenciada para todas as pessoas que tem acesso às informações consideradas sigilosas.

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3. GESTÃO DOS ATIVOS INTELECTUAIS

A gestão estratégica dos ativos intelectuais presume a atuação coordenada em 6 frentes de trabalho, todas alinhadas à estratégia global de inovação da empresa

A partir da experiência do Instituto Inovação junto aos seus clientes, da revisão da literatura referente ao tema, e de entrevistas realizadas com gestores de propriedade intelectual de grandes empresas, os autores propõem um modelo de gestão estratégica dos ativos intelectuais baseado em seis componentes (Figura1):

• Avaliação dos novos conhecimentos; • Gestão do portifólio de propriedade intelectual; • Disseminação da Cultura; • Estruturação da área Jurídica; • Gestão de Redes; • Estabelecimento de práticas de Inteligência Tecnológica.

A estrutura e a forma como essas componentes devem interagir tendem a ser diferentes de empresa para empresa, pois devem estar alinhadas com as particularidades da estratégia de inovação de cada firma. Desta forma, o investimento e a dedicação para cada uma destas linhas devem ser ajustados de acordo com a realidade da empresa, mas a gestão e a articulação destas componentes, preferencialmente, devem estar concentradas nas mãos dos gestores de inovação.

Figura 1 :: A seis componentes da gestão de ativos intelectuais

• Redação e gestão de contratos

• Litígios• Atualização quanto a

legislação e jurisprudência

• Avaliação do novo conhecimento

• Modelo de negócio para o novo conhecimento

• Estratégia de proteção• Geração direcionada de

conhecimento

Jurídica

Avaliação dos Conhecimento

Gestão Estratégica de Ativos

Intelectuais

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3.1. Avaliação de novos conhecimentos

Conhecer e entender novas oportunidades de negócio que podem ser geradas a partir dos conhecimentos é fundamental para identificar as melhores formas de explorá-las

A avaliação de novos conhecimentos é uma atividade chave no processo de apropriação do conhecimento. Entender o que é a nova oportunidade, suas aplicações e seu alinhamento com a estratégia da empresa é fundamental para identificar as melhores formas de explorá-la. De uma forma mais estruturada, esta atividade pode ser dividida em sete frentes de ação:

• Avaliar uma nova idéia procurando identificar suas aplicações e os riscos envolvidos no seu desenvolvimento;

• Analisar o seu alinhamento com os objetivos da empresa e seu potencial de gerar valor;

• Realizar buscas de anterioridade e verificar se infringe direitos proprietários de terceiros;

• Definir o melhor modelo de negócio para sua exploração; • Avaliar a facilidade com que concorrentes podem copiá-la; • Identificar quais fatores permitem melhor posicionamento para a

garantia da estratégia de geração de valor; • Definir a forma de proteção do conhecimento.

Conforme os resultados de cada uma dessas análises, decisões são tomadas com relação ao tratamento que será dado à nova idéia. Por exemplo, caso seja verificado que a idéia se aplica ao negócio da empresa, pode ser feita a busca de tecnologias similares e, caso existam, pode ser feito um estudo para ver se é mais viável internalizar o conhecimento externo, ou desenvolvê-lo internamente.

Outro ponto bastante complexo na avaliação de uma idéia é conseguir definir seu valor. O tratamento do conhecimento como um intangível capaz de ser comercializado promove a necessidade de valorar estes bens para que seja possível sua comercialização. Ainda não existe um método de valoração consolidado e universalmente aceito. Contudo, as variáveis analisadas pelos diferentes métodos costumam estar relacionadas com o mercado em que a tecnologia se insere, suas vantagens frente aos concorrentes e o grau de proteção e a garantia de exclusividade que possui.

3.2. Estabelecimento de redes

O estabelecimento de de redes de P&D permite a comunicação entre a empresa e o mundo exterior. Este processo pode acelerar o andamento das pesquisas e facilitar os processos de transferência de tecnologia

Esta componente está diretamente relacionada com empresas que operam sobre o paradigma da inovação aberta3. A internalização e externalização de conhecimentos e tecnologias através de parcerias com centros de pesquisas, universidade e com outras empresas demandam uma série de ações que devem ser tomadas para facilitar o fluxo de informações entre as entidades envolvidas. No entanto, com relação à apropriação do conhecimento, a grande dificuldade está em conseguir trocar informações sem colocar em risco os conhecimentos proprietários. A existência de canais de comunicação bem estruturados entre a área interna de pesquisa e o mundo exterior permite o fluxo de informações mais rápido, o que possibilita ganho na velocidade com que as pesquisas são realizadas. A existência de uma rede consolidada de parceiros é uma facilitadora ímpar no processo de transferência de tecnologias que não necessitam de uso exclusivo.

O sucesso das redes está na capacidade de articulação das entidades participantes e na habilidade de alinhar os objetivos das partes envolvidas.

3 O conceito de Open Innovation publicado em 2003 por Chesbrough descreve, de forma estruturada, um modelo de gestão que assume que as empresas podem e devem usar idéias e tecnologias externas para acelerar o processo de inovação, além de buscar caminhos alternativos para levar oportunidades internas ao mercado. A referência a esta obra é feita no fim deste artigo.

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3.3. Disseminação da Cultura de Apropriação do Conhecimento

A disseminação da cultura da proteção do conhecimento dentro da empresa é fundamental para o aproveitamento das novas idéias

A empresa que tem interesse em obter o retorno máximo através do uso da propriedade intelectual deve realizar esforços para que todos os seus colaboradores estejam cientes dos negócios que podem ser gerados a partir da boa gestão dos conhecimentos e dos mecanismos e das formas de capitalizá-lo. A difusão desta cultura dentro da empresa pode ser feita por meio de intervenções que irão variar, conforme a cultura da organização, e podem ser, por exemplo, palestras, estabelecimento de recompensas ou a capacitação de pessoas chaves.

Comunicar de forma eficaz os resultados obtidos com a gestão do conhecimento também auxilia a propagação e o estabelecimento desta cultura, e pode ser útil para manter o apoio da alta gestão aos esforços realizados neste sentido.

3.4. Estruturação da área jurídica

A gestão de intangíveis e as questões relativas à propriedade intelectual ainda são temas pouco explorados pelas empresas brasileiras

A área jurídica deve estar apta a lidar com temas específicos da gestão dos intangíveis, relativos às novas idéias e criações. Deve conhecer a legislação que rege a propriedade industrial, e manter-se atualizada quanto à jurisprudência relativa ao tema. Também deve possuir profundo conhecimento, e estar apta a lidar com as questões contratuais, sejam elas relativas a parcerias de P&D, acordos de confidencialidade, contratos sobre mobilidade de pessoal e de licenciamento de tecnologias.

3.5. Gestão do Portifólio de Propriedade Intelectual

O grande objetivo da gestão do portifólio de propriedade intelectual de uma empresa é a rápida tomada de decisões quanto a novas oportunidades a serem exploradas

A gestão do portfólio inclui as ações e rotinas relativas à documentação e manutenção da propriedade intelectual da empresa, tendo como objetivo manter um inventário atualizado e de fácil acesso a todo conhecimento gerado. As idéias geradas devem ser captadas e documentadas para que possam ser posteriormente analisadas. Essa comunicação de uma nova idéia costuma ser feita através de um documento chamado Comunicado de Invenção. Este documento pode ser utilizado também como uma métrica neste processo de gestão. A partir do Comunicado, começa a ser construído o histórico de determinada invenção. Este histórico contém todas as informações pertinentes a esta invenção, se foi protegida ou não, quais produtos ou processos fazem uso dos conhecimentos, quem são as pessoas envolvidas no seu desenvolvimento, entre outras.

As taxas referentes às patentes depositadas pela empresa devem ser periodicamente pagas. Uma questão chave neste ponto é avaliar quais patentes ainda estão sendo úteis para a empresa. Caso exista um rastreamento interno, é possível detectar onde estes conhecimentos estão sendo utilizados e avaliar se existe a necessidade de mantê-los protegidos. Deixar de pagar taxas para patentes que não são mais úteis é uma das formas de reduzir gastos desnecessários e aumentar a rentabilidade de projetos de P&D. Esta avaliação pode detectar também patentes que, apesar de não serem mais úteis internamente, são aplicáveis para outras empresas. Neste caso é interessante estudar quais as formas mais rentáveis de se realizar essa transferência. As receitas geradas a partir destas tecnologias licenciadas devem ser recolhidas e auditadas periodicamente. Estas rotinas são partes essenciais da gestão do portfólio de PI. A boa gestão do portfólio de PI permite a geração de dados confiáveis que poderão ser utilizados tanto nas métricas do processo, quanto nas avaliações e comunicação dos resultados obtidos com a gestão estratégica dos ativos intelectuais.

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3.6. Estabelecimento de Práticas de Inteligência Tecnológica

A inteligência tecnológica consiste na utilização de forma estratégica das informações presentes em bancos de patentes

A coleta e análise de dados contidos em documentos de patentes são uma importante fonte de informações para a inteligência tecnológica, que consiste na utilização de forma estratégica destas informações para orientar a tomada de decisões em relação ao posicionamento tecnológico e à priorização do desenvolvimento de novas tecnologias. As informações obtidas por meio dos bancos de patentes, por exemplo, podem auxiliar no entendimento do cenário tecnológico atual e no desenho de cenários futuros. Por meio de um processo sistêmico de monitoramento e análise de patentes, é possível conhecer o estado da arte em uma área tecnológica ou linha de pesquisa, identificar nichos e vazios tecnológicos, e até mesmo prever e entender as novas tendências de tecnologias. Os bancos de patentes também podem ser utilizados como instrumento de inteligência competitiva por meio da identificação e monitoramento das atividades de P&D de empresas rivais, tecnologia ou plataformas tecnológicas concorrentes, auxiliando a gestão de riscos e o incremento da competitividade das inovações.

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4. CONCLUSÃO

Em um cenário em que a inovação cada vez mais assume um posto de carro-chefe na geração de valor e sustentabilidade das empresas, a habilidade de capturar o seu valor é de primordial importância. Existem diversos mecanismos para proteger e se apropriar dos conhecimentos gerados dentro da empresa, cada um deles com características distintas. Conhecer quais são esses mecanismos e a disponibilidade de seu uso é o primeiro passo para a empresa começar a estabelecer seu modelo de gestão de ativos intelectuais ou, usando uma definição mais acadêmica, estabelecer seu regime de apropriabilidade.

O estabelecimento deste regime não é uma tarefa simples, nem de curto prazo; e não deve ser feita desatrelada dos modelos de inovação e P&D da empresa. E ainda existem diversas questões em aberto com relação à implantação da gestão de ativos intelectuais:

• Quem deve ser o responsável pela gestão dos ativos intelectuais da empresa?

• De que forma as diferentes áreas da empresa devem interagir? • Como disseminar a cultura da propriedade intelectual dentro da

firma? • Quais métricas utilizar para avaliar o desempenho da área?

Responder estas perguntas é o primeiro passo para desenhar um modelo alinhado com toda a estratégia da empresa que permita não apenas capturar de forma efetiva o valor de suas criações, mas também que sirva como ferramenta para avaliação de desempenho e alicerce na manutenção das atividades de P&D.

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AGRADECIMENTOS

Os autores do artigo agradacem as contribuições da equipe do Instituto Inovação no desenvolvimento deste trabalho, em especial a colaboração de Gustavo Mamão, Bruno Moreira, Daniel Saad, Guilherme Pereira e Bruno Knoedt.

AUTORES

Marcelo Mattioli é mestre em Engenharia Genética e Biologia Molecular e graduado em Ciências Biológicas pela UNICAMP. Realizou seu projeto de mestrado em parceria com empresas do setor de papel e celulose. Nesse período - além dos conhecimentos técnicos - desenvolveu habilidades referentes à gestão de projetos de P&D colaborativos, compartilhamento de resultados e propriedade intelectual. Atuou também como analista de propriedade intelectual da Agência de Inovação INOVA UNICAMP, onde foi responsável pela análise de tecnologias geradas por pesquisadores da UNICAMP e passíveis de serem patenteadas. Começou suas atividades no Instituto Inovação no início de 2007, onde desenvolve projetos relativos à implementação de programas de apoio à inovação e à avaliação de tecnologias junto a universidades e centros de pesquisa. Atuou em projetos com Suzano Papel&Celulose, Aracruz, Nestlé e Johnson & Johnson. Em 2008 coordenou estudo interno do Instituto Inovação que consistiu em caracterizar a gestão da propriedade intelectual em empresas brasileiras.

Eduardo Toma é graduado em Ciências Biológicas pela Unicamp com ênfase em Biologia Molecular. Atua como analista do Instituto Inovação, participando de estudos de viabilidade técnica e econômica, mapeamento de tecnologias e empresas de bases tecnológicas e projeto de diagnóstico da gestão da inovação tecnológica para clientes do setor público e privado.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Este trabalho é fruto da experiência do Instituto Inovação na criação e gestão de empresas de base tecnológica e da nossa ação em serviços de consultoria junto à universidades e empresas referência em pesquisa e desenvolvimento. A base conceitual deste artigo foi elaborada por meio de extenso estudo da literatura referente ao tema. Ao leitores interessados em aprofundamentos no assunto, destacamos os seguintes estudos:

Chesbrough, H. W. “Open Innovation: the new imperative for creating and profiting from technology”. Boston, MA: Harvard Business School Press: 2003

O livro investiga o fenômeno denominado como ―inovação aberta‖ (Open Innovation), no qual as empresas começam a perceber que a organização da pesquisa, desenvolvimento e da própria inovação pode se alavancar através da utilização de idéias e oportunidades externas. Ao mesmo tempo, a organização pode também disponibilizar para outras empresas as idéias internas que não serão aproveitadas em sua cadeia de negócios. Seu oitavo capítulo é completamente dedicado à gestão da propriedade intelectual, com especial foco na comercialização de conhecimento. Ressaltamos a ênfase dada para a mudança de visão entre usar a propriedade intelectual como ferramenta de exclusão de terceiros, e seu uso como nova fonte de receita.

Hurmelinna-Laukkanen, P. & Puumalainen, K. “Formation of the appropriability regime: strategic and practical considerations”. Innovation: management, policy & practice (9) 2–13: 2007

O artigo possui uma breve introdução sobre o conceito de regime de apropriabilidade, discutindo os diversos mecanismos que as empresas dispõem para capturar o valor gerado por suas inovações e conhecimentos. As autoras também investigam empiricamente algumas relações que se estabelecem entre os diferentes mecanismos utilizados e as estratégias de geração de valor adotadas pelas empresas.

Teece, D. J. “Capturing value from knowledge assets: The new economy, markets for know-how, and intangible assets”. California Management Review (40) 55–79: 1998

Teece foi um dos primeiros autores a investigar os fatores que influenciam a lucratividade gerada pelas inovações. Neste artigo, o autor discute importância do capital intelectual e de sua gestão para criação

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e manutenção da vantagem competitiva das empresas. Também coloca a relação que se estabelece entre a natureza do conhecimento e a propriedade intelectual nos regimes de apropriabilidade.

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