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ANEXO II - JUSTIFICATIVAS Projeto Rede de Gestão Integrada de Informações Territoriais Brasília, 18 de abril de 2013.

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ANEXO II - JUSTIFICATIVAS

Projeto Rede de Gestão Integrada de Informações Territoriais

Brasília, 18 de abril de 2013.

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SUMÁRIO

Projeto de Gestão de

Informações Territoriais

1 JUSTIFICATIVAS...........................................................................................................3

1.1 A TRIBUTAÇÃO SOBRE O PATRIMÔNIO E A RENDA NO BRASIL......................................3 1.2 O REGISTRO IMOBILIÁRIO BRASILEIRO.......................................................................6 1.3 AS FORMAS ARCAICAS DE INVESTIGAÇÃO PATRIMONIAL ......ERRO! I NDICADOR NÃO DEFINIDO . 1.4 A JANELA DE OPORTUNIDADE.....................................................................................9 1.5 A COMPETÊNCIA PARA REGULAMENTAR ..................................................................14 1.6 FUNÇÃO PÚBLICA - ACERVO PÚBLICO.......................................................................15 1.7 O SISTEMA DE REGISTRO ELETRÔNICO.....................................................................18 1.8 O SISTEMA NACIONAL DE GESTÃO DE INFORMAÇÕES TERRITORIAIS........................19 1.9 O ÍNDICE DE PREÇOS DE IMÓVEIS DO IBGE ..............................................................23

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1 Justificativas

1.1 A tributação sobre o patrimônio e a renda no Br asil

Recente estudo da Coordenação-Geral de Estudos, Previsão e Análise da Receita Federal denominado “Carga Tributária no Brasil – 2010 (Análise por Tributo e Bases de Incidência)” analisou o fluxo de recursos financeiros recebidos pelo Estado e a distribuição relativa da carga tributária no Brasil em categorias de bases de incidência.

Os dados mostram uma profunda concentração nos tributos sobre bens e serviços, que representam 48,57% da receita tributária total em 2010, enquanto os tributos sobre o patrimônio imobiliário, incluindo as transferências patrimoniais (IPTU, ITR, ITBI e ITCD), representam apenas 1,84% da receita tributária total.

Em termos financeiros, os tributos sobre patrimônio imobiliário urbano e rural e respectivas transferências alcançam apenas 0,61% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil, o que representa 22,6 bilhões de reais.

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No total, a tributação sobre propriedade, incluindo a de veículos automotores (IPVA), tem percentual relativo à receita tributária total de 3,52% (dados de 2010). Comparativamente às estatísticas de outros países divulgadas no âmbito da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), a proporção relativa de tributos sobre o patrimônio no Brasil está abaixo da média internacional.

O mesmo acontece com os tributos sobre a renda. Aqui o percentual de tributação sobre a renda é de 18,40%, enquanto a média internacional situa-se em 37%.

Somando-se os dados de patrimônio e renda chegamos a um interessante gráfico comparativo, ressalvando que aqui não se trata de comparar o Brasil com países desenvolvidos e sim de média internacional de países no âmbito da OCDE, ou seja, há países com profundas desigualdades socais e tributação altamente distorcida sendo considerados na média. Mesmo assim, o Brasil se destaca no cenário internacional com uma tributação altamente regressiva, que somente aprofunda e reforça a concentração de renda e a desigualdade social.

Não obstante as limitações analíticas de uma comparação como essa, considerando as diferença sociais, econômicas e culturais entre os países, salta aos olhos que o Brasil tem uma situação inversa à média dos países da OCDE.

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Mal comparando, os Estados Unidos, por exemplo, tributam três vezes mais que o Brasil o patrimônio e renda e três vezes menos os bens e serviços.

Em outra frente de análise, levando-se em conta apenas a arrecadação de IPTU e ITBI, duas das três principais fontes de receita direta dos municípios, ambos pertencentes à categoria de impostos sobre propriedade, entende-se por que a grande maioria dos municípios têm uma enorme dependência dos repasses da União e não conseguem subsistir com sua própria arrecadação: IPTU e ITBI juntos e mais o ITR, que o município pode optar por fiscalizar e arrecadar, não chegam a 0,6% do PIB. E nos Estados Federativos, o ITCD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos) tem arrecadação irrelevante.

Pode-se extrair do estudo que a tributação sobre a renda no Brasil recai mais fortemente sobre as pessoas jurídicas, o que afeta negativamente a competitividade das empresas. Sabe-se que a tributação da renda nas pessoas físicas é mais equânime do que nas pessoas jurídicas e com efeito econômico menos deletério. No entanto, o nível de tributação da renda das pessoas físicas é baixo se comparado aos países desenvolvidos, não pela alíquota, nem base de cálculo, provavelmente pela sonegação fiscal.

Não há novidades nesses dados. Todos sabem qual é a situação desejável que devemos almejar. O que poucos têm é uma solução factível para essa situação sem esbarrar no federalismo e sem aumentar a carga tributária nominal.

Temos uma solução real e imediata para reverter essa situação, sem alterar nenhuma alíquota, nem base de cálculo de tributo, muito menos alterar as competências tributárias de cada esfera de governo.

Na realidade não é preciso sequer alteração de lei, apenas regulamentar uma lei existente, de 2009.

Nosso diagnóstico é preciso, vai direto ao ponto, sem evasivas ou subterfúgios. A base do problema da tributação do patrimônio e, em parte, sobre a renda, está em um fato bastante conhecido internacionalmente: o Brasil não tem um cadastro imobiliário.

De fato, 35 países desenvolvidos do mundo, entre eles Alemanha, França, Espanha, Portugal e Canadá, têm infra-estrutura de administração centralizada de cadastros de imóveis urbanos e rurais, isto é, possuem cadastros territoriais eficientes com mecanismos de avaliação de imóveis. O Brasil está entre os 159 países que não dispõem de informações e por consequência não conseguem gerenciar suas terras e seus recursos. E o núcleo de um sistema de gestão territorial é o inventário legal das propriedades que estamos a propor.

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1.2 O Registro Imobiliário Brasileiro

No sistema registral brasileiro são necessários dois atos para aquisição da propriedade. O primeiro ato é a declaração formal da vontade oriunda do negócio jurídico que origina o título registrável (escritura pública, formal de partilha, mandado judicial e demais títulos registráveis elencados no art. 221 da Lei 6.015, de 1973). Para perfazer a transmissão da propriedade, porém, é preciso um segundo ato: levar o título a registro no Serviço de Registro de Imóveis da respectiva circunscrição.

Por esse sistema, ainda que haja negócio jurídico de transferência da propriedade do imóvel, permanece o alienante como proprietário enquanto o título não for levado a registro.

O sistema de registro imobiliário do Brasil tem presunção relativa de veracidade, diversamente do sistema alemão, que goza de presunção absoluta e considerado o mais

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perfeito por todos os especialistas na matéria. O motivo da presunção relativa é que não há uma boa correspondência do registro com a realidade fática no Brasil.

Na Alemanha, os sistemas de registro e cadastro são perfeitamente interligados e sincronizados. No Brasil, não há cadastro de imóveis e os registros são feitos em papel, em moldes não muito diferentes, na essência, de como era praticado no século XIX, com a primeira Lei de Terras do Brasil1, de 1850, com uma descrição sem rigor científico, por meio da qual é improvável definir com precisão a localização e o polígono de fechamento dos imóveis.

Algumas transformações de fato ocorreram desde então, mas sem alterar esse quadro. A partir da Lei 1.237, de 24/09/1864, por exemplo, a tradição da coisa foi substituída pela transcrição do título, fundando o princípio de que a transmissão do imóvel só se operava pela via do Registro.

As Leis 4.827, de 1924 e o Decreto 4.857, de 1939, estabeleceram registro em caráter geral pelo sistema pessoal, ou seja, os registros eram efetuados levando-se em consideração as pessoas e não os imóveis.

A Lei de Registros Públicos (LRP) - Lei 6.015, de 1973, em vigor desde 1º de janeiro de 1976, introduziu o fólio real em substituição ao sistema pessoal, no qual cada imóvel representa uma folha, uma matrícula, contendo sua descrição e todas suas alterações. Essa lei teve, entre outros méritos, o de preparar o terreno para a modernização do Registro Público Brasileiro que, quase 40 anos depois, ainda não aconteceu.

Segundo Nicolau Balbino Filho2, cogitou-se adotar o sistema alemão de presunção absoluta no ordenamento pátrio:

"Chegou-se, porém, à conclusão de que tal idéia era inviável, porque nos faltavam condições básicas, fundamentais: o sistema alemão assenta um cadastro perfeito de propriedade imóvel, conjugado com ótima organização de livros de registro, de modo que estes retratam com fidelidade o imóvel transcrito, em dizendo, ainda, com segurança, quem é o proprietário”.

Desde então, o legislador vem dando alguns passos no intuito de conferir maior precisão à descrição dos imóveis e garantir maior segurança jurídica.

A Lei 10.267, de 28 de agosto de 2001, foi o primeiro grande passo com essa orientação. Referido diploma alterou a LRP exigindo, quanto à identificação dos imóveis rurais, as coordenadas dos vértices definidores dos limites do s imóveis rurais, georreferenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro e com precisão posicional a ser fixada pelo INCRA ; a troca de informações entre os Serviços de Registros de Imóveis e INCRA e a previsão para implantação do Cadastro Nacional de Imóveis Rurais, CNIR, ora

1 Com a Lei 601, de 18/09/1850, regulamentada em 1854, a posse passou a ser legitimada desde que levada a registro nas paróquias da igreja católica. O chamado “Registro do Vigário” tinha um efeito meramente declaratório. As terras que não foram registradas foram havidas como devolvidas ao Estado Brasileiro, donde a origem do termo “terras devolutas”. 2 Registro de Imóveis, 14ª Edição, São Paulo, Ed. Saraiva, 2009, pág. 34.

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em fase de desenvolvimento conjunto entre a Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) e o Incra.

Mais adiante, a Lei 10.931/2004 permitiu a retificação administrativa para adequar os registros à realidade, com a possibilidade de a retificação administrativa ser feita diretamente no Serviço de Registro de Imóveis, opcionalmente à apreciação judicial. E foi mais além, prevendo até mesmo a retificação de ofício, nos casos constantes do inciso I do art. 213 da LRP.

Nos ensinamentos de Walter Ceneviva3:

"No primeiro lustro do século XXI, chegado o trigésimo aniversário da LRP, ampliaram-se efeitos observados no século anterior, com a extensão da retificabilidade admitida e o aumento da distância entre o sistema alemão e o brasileiro. A lógica da estrutura registral, suportada sobre a matrícula, foi alterada. Em matéria de política legislativa constatou-se que a novidade matricial, a contar de 1976, não foi suficiente para regularizar a propriedade imobiliária nacional, em termos de sua anotação formal em serviços aos quais esta foi atribuída. As mudanças e a modernização daquele ano não esgotaram os trabalho de renovação dos registros imobiliários nacionais. A ampliação da reformabilidade, o afastamento da exclusiva interferência judicial, permitida a administrativa, foram exemplos da novidade. Dadas as condições territoriais do Brasil, a aplicação dos a rts. 212 a 214, com a reforma de 2004, destinou-se a dois efeitos: busca a adequação entre a realidade física do imóvel e a realidade do registr o, com os titulares de direito que lhes correspondem, as palavras e número s que o caracterizam ".

A Lei 11.977, de 7 de julho de 2009, conhecida como Lei Minha Casa, Minha Vida, previu a regularização fundiária urbana, alterando a LRP em mais uma tentativa de aproximar o sistema registral da realidade, assim como proporcionar titulação e registro aos assentamentos irregulares, o que representa um importante instrumento para viabilização da regularização e aprimoramento cadastral dos imóveis urbanos brasileiros.

Mas a inovação mais importante desse diploma legal foi a criação do Sistema de Registro Eletrônico com protocolos definidos para a construção de um sistema informatizado atendendo aos requisitos da Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP e à arquitetura e-PING (Padrões de Interoperabilidade de Governo Eletrônico), incluindo a recepção de títulos.

Uma vez implementado o Sistema de Registro Eletrônico, os serviços de registros públicos, incluindo o Serviço de Registro de Imóveis, disponibilizarão ao Poder Executivo Federal, por meio eletrônico e sem ônus, o acesso às informações constantes de seus bancos de dados, conforme regulamento.

Todo esse capítulo sobre o Sistema de Registro Eletrônico ainda pende de regulamentação. E essa regulamentação é precisamente o objeto desse projeto.

3 Lei de Registros Públicos Comentada. 20 Edição, Editora Saraiva, 2010, pág. 416.

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1.3 A Janela de Oportunidade

Nas duas últimas décadas, enquanto Municípios, Estados Federativos, União e o sistema financeiro evoluíram em cadastros totalmente informatizados, a atividade notarial e registral continuou presa ao sistema anacrônico de escrituração em papel, organizada em livros, arquivados nos Ofícios de Registros de Imóveis de cada circunscrição.

A matrícula do imóvel é um número sequencial determinado localmente em cada serventia, sem consistência e unicidade, sem interligação nacional. Os títulos aquisitivos normalmente apresentam descrição do imóvel imprecisa, que não corresponde à realidade fática e não raro há problemas de sobreposição de áreas. E a falta de interligação entre os serviços notariais e registrais permite toda sorte de fraudes no registro e transmissão de propriedades, facilitando a lavagem de dinheiro e gerando insegurança jurídica.

Embora os serviços notariais e de registro sejam exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público (logo, todos os

livros de registros e de notas são acervo público, de propriedade do Estado), o próprio Poder Público não tem acesso direto a essas informações. O motivo é a limitação do meio, o papel. Estamos presos, assim, a um modelo de requisição em que a Receita Federal, o

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Poder Judiciário, o Ministério Público, a Polícia Federal, a CGU e as Prefeituras Municipais têm que oficiar individualmente os serviços registrais e notariais a fornecerem informações.

Dois dos métodos mais comuns de lavagem de dinheiro como a aquisição de imóveis em nome de laranjas e a compra e venda de imóveis por valores fictícios somente são detectados (e parcialmente) após uma longa, profunda e onerosa investigação. Para fazer um levantamento patrimonial incompleto de um único cidadão seria preciso oficiar milhares de cartórios em todo o país a fornecerem informações em papel.

Essa informação a conta-gotas tem um alto custo para o Estado, para o sistema financeiro e também para as serventias extrajudiciais, que necessitam atender diariamente uma enorme quantidade de requisições do poder público.

Esse arcaísmo impede a formação de uma base de consulta e cruzamento de dados. Um modelo totalmente incompatível com um moderno sistema de gestão territorial e de valoração de imóveis, que agregue camadas de informações jurídicas, fundiárias, fiscais, físicas, de infra-estrutura, com imagens georreferenciadas, permitindo o gerenciamento territorial em um banco de dados espacial, tal como ocorre nos países desenvolvidos.

Ou seja, é uma informação estática, singular, de uso específico, não mais possível de coexistir com as necessidades e a dinâmica do Estado atual.

Assinala-se que o Brasil é um dos países mais atrasados do mundo em cadastro imobiliário, até mesmo comparado aos nossos vizinhos na América do Sul como Costa Rica e Uruguai. Países desenvolvidos como França, Alemanha, Espanha, Holanda, têm cadastros imobiliários centralizados, altamente evoluídos.

Temos nesse momento uma rara oportunidade para modificarmos esse modelo que impede a evolução do Estado e atravanca a economia como um todo. Trata-se da regulamentação da Lei 11.977, de 7 de julho de 2009, que instituiu o registro eletrônico de imóveis, em seu capítulo II.

CAPÍTULO II

DO REGISTRO ELETRÔNICO E DAS CUSTAS E EMOLUMENTOS

Art. 37. Os serviços de registros públicos de que trata a Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973, observados os prazos e condições previstas em regulamento, instituirão sistema de registro eletrônico.

Art. 38. Os documentos eletrônicos apresentados aos serviços de registros públicos ou por eles expedidos deverão atender aos requisitos da Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP e à arquitetura e-PING (Padrões de Interoperabilidade de Governo Eletrônico), conforme regulamento.

Parágrafo único. Os serviços de registros públicos disponibilizarão serviços de recepção de títulos e de fornecimento de informações e certidões em meio eletrônico.

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Art. 39. Os atos registrais praticados a partir da vigência da Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973 , serão inseridos no sistema de registro eletrônico, no prazo de até 5 (cinco) anos a contar da publicação desta Lei.

Parágrafo único. Os atos praticados e os documentos arquivados anteriormente à vigência da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, deverão ser inseridos no sistema eletrônico.

Art. 40. Serão definidos em regulamento os requisitos quanto a cópias de segurança de documentos e de livros escriturados de forma eletrônica.

Art. 41. A partir da implementação do sistema de registro eletrônico de que trata o art. 37, os serviços de registros públicos disponibilizarão ao Poder Executivo federal, por meio eletrônico e sem ônus, o acesso às informações constantes de seus bancos de dados, conforme regulamento.

A lei prevê a criação do sistema de registro eletrônico com protocolos definidos para a construção de um sistema informatizado atendendo aos requisitos da Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP e à arquitetura e-PING (Padrões de Interoperabilidade de Governo Eletrônico), incluindo a recepção de títulos. Estabelece ainda que os serviços de registros públicos deverão disponibilizar ao Poder Executivo Federal, por meio eletrônico e sem ônus, o acesso às informações constantes de seus bancos de dados. Como a lei remete todos os detalhes ao regulamento, há espaço para se criar um novo paradigma.

Pela Lei em apreço, a partir de cinco anos a contar de sua publicação, ou seja, até 07/07/2014, todos os atos registrais praticados a partir da vigência da Lei de Registros Públicos (a partir de 1976), serão inseridos no sistema de registro eletrônico. E os registros anteriores ao sistema de fólio real (anteriores a 1976) também deverão ser inseridos no sistema em prazo a ser estabelecido pelo decreto.

O que ora se desenha por iniciativa do Instituto dos Registradores do Brasil (IRIB) e da Associação dos Registradores de Imóveis de São Paulo (Arisp), que criaram um sistema de circularização informatizada para atender as requisições do Poder Público, é apenas uma continuidade do modelo de requisição, só que agora em meio eletrônico. Mudou-se o meio, do papel para o eletrônico, conservando a forma outrora limitada pelo papel, com o acesso a um banco de dados light, contendo apenas os CPF e CNPJ de proprietários, sem os dados de registros e de averbações.

Não se trata aqui de retirar o mérito do sistema criado pela ARISP, que foi uma iniciativa independente diante da falta de regulamentação da lei. Esse modelo, entretanto, além de incompatível com o texto legal que prevê o acesso a todas as informações do registro, em tudo imita o arquétipo do papel, com as requisições individuais, inclusive com a imagem digital da matrícula, em lugar da informação eletrônica estruturada. Entre todos os modelos possíveis que se afiguram ao registro eletrônico, o de requisição é o menos indicado, o de mais alto custo e o de menor inteligência aplicada que, por fim, mantém o status quo ante, com um aparente avanço, sem atender às necessidades do Estado, da sociedade e à própria previsão legal.

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No artigo “A Microfilmagem, a Informática e os Serviços Notariais e Registrais Brasileiros”, o eminente registrador Sérgio Jacomino já havia discorrido sobre o registro eletrônico com uma interessante metáfora:

“Contudo, estejamos atentos para que o resultado não venha a ser, meramente, a reprodução de um meio por um outro — e a história das transformações tecnológicas é rica de curiosos e pitorescos exemplos de como um modelo antecessor tende a conformar o sucessor. Quanto tempo levou até que o rádio fosse compreendido como algo maior do que o "telégrafo sem fios"? (como originalmente foi batizado). Quanto tempo levou o cinema para descobrir que suas amplas possibilidades somente poderiam ser descortinadas e plenamente utilizadas se se desprendesse de seu modelo anterior, o teatro? E a TV, com seus amplos recursos em face do cinema? Obviamente que a tradição e a permanência são aspectos relevantes e indiscutíveis, cujo valor e importância não se questiona. Mas, a "matrícula digital" como querem alguns, ou o "fólio eletrônico", como o denominam outros, deverá ser uma entidade substancialmente nova, incorporando níveis de consulta diferenciados, interfaces com bancos de dados do próprio cartório (indicadores) e prefeituras, croquis, plantas, fotos etc. além de permitir acessos singularizados, com instalação de terminais no balcão do Registro, acesso aos bancos de dados da Serventia via modem, fax etc. Tudo controlado por sistemas.”

E ele segue, no mesmo artigo, com muita propriedade, contestando a validade de apenas digitalizar a matrícula:

“Se propõe agora aos registradores brasileiros a digitalização das matrículas para que, uma vez digitalizadas, possam ser pesquisadas através de um mecanismo que "localiza" a informação desejada, funcionando como recurso de precisão na recuperação de informações relevantes para o registro. Falam desses recursos como se estes representassem uma espécie de panacéia na hiperespecialização dos indicadores pessoal e real, podendo recuperar, adicionalmente, outras informações, como desejasse o consulente.

Ora, o armazenamento das matrículas em discos ópticos é, vamos dizer assim, um bis in idem, uma duplicação conceitual e sistematicamente equivocada, representa a constituição, bastante onerosa aliás, de um meta-fólio real — de notória ilegalidade, se utilizado como forma de substituição da ficha. É, em suma, uma estrutura de armazenamento desnecessariamente complexa, levando-nos a pensar que também aqui a história se repete como farsa... A única utilidade que vislumbramos para esse arquivo é, como já se referiu García García, uma cópia para meros efeitos de conservação em caso de sinistro, com a diferença de que o registrador de Barcelona indicava a regulação de uma cópia em microfilme, coisa que já fazemos corriqueiramente em nossos registros prediais. (52)”

E conclui:

“Portanto, a "matrícula digital", se concebida como simples conversão especular da matrícula original, é mais um truque para encanto dos

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desavisados do que um verdadeiro avanço no sentido da informatização de área tão crítica em um registro imobiliário.”

O poder público lida com gerenciamento de dados. Necessita de informações em massa para cruzar dados e construir um sistema de gestão de informações territoriais.

É necessária a criação de um novo modelo condizente com as potencialidades do meio eletrônico e com as necessidades de eficiência do Estado brasileiro, sem retirar qualquer prerrogativa ou função dos notários e registradores.

O caput do art. 236 da Constituição da República expressa que “...os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público...”, o que resulta na obrigatoriedade de que seja exercido em caráter privado, sendo vedada a atuação direta do Estado. É preciso deixar claro que o acesso à informação pelo Poder Executivo Federal em nosso projeto de regulamentação não significará a concorrência do Estado, nem sua atuação direta, sendo vedado, em qualquer hipótese o fornecimento de informações registrais ao público ou o fornecimento de certidões a quem quer que seja, prerrogativa que é exclusiva dos notários e registradores, que recebem emolumentos pelo fornecimento dessas informações.

A fonte primordial de todos os receios dos registradores é que a informação é pública, mas não é gratuita. Jamais os dados poderão ser disponibilizados ao público e tampouco uma base de informações governamental poderia fornecer certidões a quem quer que fosse, uma vez que isso significaria a Administração Pública praticar atos e atribuições que são constitucionalmente reservadas aos registradores.

Há, entretanto, uma maneira bastante inteligente e simples de se criar um acesso seguro pelo poder executivo a todas as informações contidas no banco de dados dos serviços registrais (e quiçá dos serviços notariais, se a lei for aprimorada no futuro ou for complementada por resolução do CNJ) sem ferir nenhuma atribuição dos registradores - aliás, pelo contrário, criando uma poderosa ferramenta que irá fortalecer sobremaneira a posição deles – e, sobretudo, sem transbordar os limites legais.

De fato, as funções notarial e registral sairão fortalecidas com o novo modelo, bastando lembrar que se estima hoje em mais de 50% o número de possuidores de imóveis que têm somente a escritura ou o contrato de compra e venda e não levaram o título a registro. Se, no entanto, o serviço de registro público permanecer preso ao modelo existente, com a simples conversão do conteúdo das matrículas em imagens digitalizadas, pode ocorrer exatamente o contrário, pois a despeito das informações geradas por esse sistema, o Poder Público necessitará implementar um cadastro nacional de imóveis.

O ideal é que isso seja feito de maneira a integrar o registro e o cadastro. Entretanto, se o cadastro nacional de imóveis que o Poder Público necessitaria construir estiver desvinculado da informação registral, ele acabaria por tornar-se fonte primária de consultas por entes privados, como os integrantes do Sistema Financeiro, enfraquecendo o sistema registral. Fato semelhante ocorreu com o CPF, que, com todas as suas deficiências, acabou

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prevalecendo sobre a identidade (RG) devido ao seu caráter central e pela facilidade de consultas.

Nesse sentido, a Resolução nº 4.088, de 24 de maio de 2012, do Banco Central do Brasil, que centraliza o registro de garantias constituídas sobre veículos automotores ou imóveis em operações de crédito ou de arrendamento mercantil, representa um sinal claro de fadiga desse modelo anacrônico de requisição às serventias extrajudiciais.

Tal fato não irá ocorrer se registro e cadastro trabalharem de forma integrada.

A regulamentação do Sistema de Registro Eletrônico previsto na Lei 11.977, de 2009, oferece assim uma oportunidade para avançarmos em direção a um sistema verdadeiro de interoperabilidade, com um número de identificação unívoco do imóvel que permita conectar as informações jurídicas dos imóveis com as informações físicas, geográficas, econômicas e fiscais disponíveis nos cadastros de imóveis urbanos dos municípios (Cadastros Territoriais Multifinalitários - CTM) e no Cadastro Nacional de Imóveis Rurais (CNIR).

O projeto prevê a criação de uma chave de conexão para viabilizar o processo automatizado de cruzamento de dados com as informações trabalhadas pela Administração Pública Federal. Esta chave deve ser um identificador único para cada imóvel (em linguagem de banco de dados, chamamos de chave primária) para que as tabelas de diferentes bancos de dados possam se relacionar com integridade referencial.

Esse passo simples trará um extraordinário benefício à sociedade e permitirá que os diversos órgãos do Poder Executivo Federal possam efetivamente obter as informações de maneira consistente, direta e massiva, por meio de acesso a um banco de dados centralizado, evitando-se o burocrático e primitivo modelo de requisições.

1.4 A Competência para Regulamentar

O poder de regulamentar leis federais está consignado como atribuição do Presidente da República no art. 84, IV, da Constituição, que estabelece competir-lhe privativamente, entre outras atribuições, expedir decretos e regulamentos para a fiel execução da lei. Essa competência não admite nenhum tipo de delegação aos subordinados do chefe do Poder Executivo ou a outros poderes.

Lívia Marcela Benício Ribeiro4, advogada especialista em direito processual civil, coloca essa questão muito claramente no artigo “O Poder Regulamentar”, um texto bastante lúcido e objetivo:

“Apoiando-se na lição de Diógenes Gasparini, podemos dizer que a natureza da atividade regulamentar é originária. Isto porque executar os comandos legais é função inerente ao Poder Executivo, e, para isso ser possível, é necessário o desenvolvimento dos preceitos legais, função esta

4 RIBEIRO, Lívia Marcela Benício. O poder regulamentar. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1064, 31 maio 2006 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/8431>. Acesso em: 29 jun. 2012

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atribuída constitucionalmente ao Executivo. Por este motivo, afirma o autor, que mesmo na ausência de disposição legal ou constitucional, essa atribuição é do Poder Executivo, porque decorre de sua própria função.

Corroborando com (sic) este entendimento, Eros Roberto Grau afirma que a função normativa regulamentar é própria do Poder Executivo, sendo que "essa atribuição [regulamentar] conferida ao Executivo pelo Legislativo consubstancia permissão para o exercício de função que é própria do Executivo [...]". 5

A autora conclui com propriedade, alertando para a inconstitucionalidade de um regulamento ser proferido por autoridade incompetente:

“A primeira limitação formal refere-se à autoridade competente para editar regulamento. Em nosso país, o poder regulamentar é outorgado expressamente ao chefe do Poder Executivo, de forma indelegável, consoante se depreende da análise do parágrafo único do artigo 84, da Lei Maior. "Se o ato decorre de qualquer outra autoridade, já não mais corresponde à idéia constitucional de regulamento"6.Destarte, o regulamento só será válido quando editado pela autoridade competente.

Cumpre recordar a precisa lição de Vanessa Vieira de Mello, ao afirmar que se outras autoridades exercessem função regulamentar, estaríamos diante de uma inconstitucionalidade material, tendo em vista a indelegabilidade desta função.7”

1.5 Função pública - Acervo público

Antes de adentrarmos na proposta do novo paradigma do registro eletrônico - moldado a explorar todo o potencial que o novo meio propicia, oferecendo serviços e ferramentas sonhadas pelos registradores mas que eles não têm meios e nem recursos para construir e outrossim impossíveis de serem efetivadas no modelo de requisição eletrônica, que nada mais é que a imagem especular do sistema em papel - é preciso clarear alguns aspectos jurídicos, de forma a delinear os contornos exatos do que estamos a propor.

O caput do art. 236 da Constituição da República expressa que “...os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público...”, o que resulta na obrigatoriedade de que seja exercido em caráter privado, sendo vedada a atuação direta do Estado. É preciso deixar claro essa questão, pois o acesso a informação em nosso projeto de regulamentação não significará a concorrência do Estado nem sua atuação direta, sendo vedado em qualquer hipótese o fornecimento pela União de informações registrais ao público ou o fornecimento de certidões a quem quer que seja.

5 GRAU, Eros Roberto. O Direito Posto e o Direito Pressuposto. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 250. 6 GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 271 7 MELLO, Vanessa Vieira de. Regime Jurídico da Competência Regulamentar. São Paulo: Dialética, 2001. p. 68.

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Por outro lado, aos notários e registradores não cabe, a pretexto de proteger suas atribuições que foram delegadas pelo próprio Estado, opor-se às necessidades prementes desse mesmo Estado de construir um sistema de informações sobre seu território, que seja eficiente e dinâmico. Acima de tudo e como fim último está o interesse público.

Segundo Luís Paulo Aliende Ribeiro,

“A entrega, pelo Estado, de tais incumbências a atores privados impõe ao Poder Público o dever de concomitante intervenção e de que venha a ocupar uma posição institucional de garante da persecução do interesse público. Cabe, pois, ao Estado, nessas atividades em que exonerado da execução direta ou exclusiva, o dever geral de assegurar ou garantir que os atores privados cumpram as incumbências que lhes são cometidas para se alcançarem os resultados pretendidos: satisfação do interesse público e das necessidades da coletividade.

“Diante disso, desenvolve o Estado uma tarefa de supervisão e regulação das atuações privadas, de forma a evitar uma “...ação privada desregulada...” e na busca de uma “...auto-regulação privada publicamente regulada.”

O instrumento de que dispõe o Estado para essa atuação de garantia é a regulação. E essa é feita unilateralmente, seja em forma de leis e respectivos decretos regulamentares, seja em forma de atos normativos expedidos pelo Poder Judiciário, a quem compete fiscalizar e, em última análise, complementar a lei na regulação da atividade dos notários e registradores.

Essa acepção coincide com o voto do eminente ministro Carlos Ayres Brito, em julgamento de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (3.131-1 MT), tratando especificamente dos registradores:

“III- a delegação que lhes timbra a funcionalidade não se traduz, por nenhuma forma, em cláusulas contratuais. Ao revés, exprime-se em estatuições unilateralmente ditadas pelo Estado, valendo-se este de comandos veiculados por leis e respectivos atos regulamentares...”

Desnecessário discorrer mais sobre o fato de que a função do registrador é uma delegação do poder público, tal a clareza do texto constitucional, e o papel regulador que o Estado deve exercer unilateralmente para que o serviço alcance a satisfação do interesse público e das necessidades de eficiência do Estado.

Mas há algo mais importante que é preciso se ter em mente ao regulamentar o Registro Eletrônico: todos os atos, documentos e títulos produzidos e os registros e averbações efetuados, todo o acervo resultante do serviço notarial e registral, não é propriedade dos notários e registradores. Trata-se de um acervo público, pertencente ao Poder Público. O que a Constituição da República de 1988 estatui como privado é o exercício dos serviços notariais e de registro.

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Isso fica claro quando ocorre a retomada pelo Estado da delegação outorgada ao particular nos casos previstos em lei e quando da nova outorga (Lei 8.935, de 1994, art. 39)8. Ao extinguir a delegação ao notário ou ao registrador, este pode levar consigo todos os seus bens particulares. Mas os livros de registro, pastas, papéis bem como, se houver, o hardware e software onde estão arquivados os atos notariais e registrais, estes permanecem no cartório porque não pertencem a eles. Não são propriedade particular do oficial de registro ou do notário, e sim propriedade do Estado, do poder delegante.

O mesmo acontece em concursos de “remoção”, em que o notário ou registrador tem a oportunidade de mudar de serventia. Ele não leva consigo os livros ou os arquivos eletrônicos contendo os registros e notas. O novo delegado recebe do Estado o acervo público correspondente à delegação, conforme muito bem discorre Luis Paulo Aliende Ribeiro no livro “Regulação da Função Pública Notarial e de Registro”, separando o que é bem privado do delegado da função pública e o que constitui o acervo público:

Com relação ao patrimônio do delegado, verifica-se, em razão do regime híbrido mencionado, que ao lado dos seus bens particulares, dos quais dispõe nos termos da lei civil, existem bens que em razão da sua condição de prestador de serviço público estão vinculados à prestação de serviço e, por tal razão, submetidos a regime de direito público na categoria de bens públicos. Nesse sentido, quanto à concessão, cf. DI PIETRO. Ob. cit. pp. 108-109 e quanto às notas e registros o parecer aprovado no referido subitem, em que se destacou que: “Pastas e papéis, adquiridos no dia a dia da atividade registraria, sofrem, com a escrituração e utilização, afetação pública, destacando-se do mobiliário e demais equipamentos que permanecem como propriedade privada do notário, do registrador ou de quem, excepcionalmente, venha a ser designado para essa função. Permite, a hipótese apresentada, independentemente da questão posta, pertinente ao ressarcimento monetário do anterior delegado ou interino, a lembrança de que não somente o meio físico em papel, pastas ou invólucros plásticos transparentes se incorporam, automaticamente e no dia a dia, ao acervo público que não comporta apropriação pelo particular, mas também, caso tenha sido esta a opção do titular ou responsável pela delegação, todo e qualquer sistema operacional ou programa informatizado que, implantado como meio para o funcionamento dinâmico e eficiente dos registros, foi afetado pela natureza da função pública que não somente informa, mas justifica a existência das atividades notariais e de registro. Esse meio em que implementados os registros, físicos ou digital, há de ser sempre, sem ressalvas ou empecilhos, transferido para o novo Delegado ou responsável designado, ressalvada, sempre, se cabível, a discussão judicial referente a ressarcimento ou indenização.”

8 Lei nº 8935, de 1994: Art. 39. Extinguir-se-á a delegação a notário ou a oficial de registro por: I – morte; II – aposentadoria facultativa; III – invalidez; IV – renúncia; V – perda, nos termos do art. 35; VI – descumprimento, comprovado, da gratuidade estabelecida na Lei nº 9.534, de 10 de dezembro de 1997 (Inciso incluído pela Lei nº 9.812, de 10 de agosto de 1999).

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Enquanto existirem livros, o oficial de registro e o notário serão os responsáveis pela sua guarda e gestão. Evidentemente o Estado não pode movê-los, retirá-los da serventia, pois são necessários ao funcionamento do serviço. No meio eletrônico, porém, com a adoção do Sistema de Registro Eletrônico, as serventias continuam a manter a gestão dos dados, mas nada mais obsta (e não faria sentido algum) que o Estado não possa ter sua própria cópia para atender suas necessidades exclusivas e para garantir a segurança dos dados, sem que isso signifique adentrar em qualquer prerrogativa exclusiva dos notários e registradores.

O argumento de que o princípio da privacidade tem efeito preponderante não se aplica ao caso, porque o dado destina-se a uso exclusivo do Poder Público, ele pertence ao Poder Público e não será disponibilizado fora do âmbito do Poder Público justamente para preservar in totum as atribuições dos delegados desse serviço, que recebem emolumentos pela prestação de informações ao público.

1.6 O Sistema de Registro Eletrônico

O serviço notarial e registral continuará funcionando com suas atribuições intocadas e cada qual com seu próprio banco de dados. Mas os bancos de dados dos serviços registrais (e por meio de resolução do CNJ, também dos notariais) serão replicados em um repositório nacional usando um mecanismo semelhante ao da Nota Fiscal Eletrônica (NF-e) do Sistema Público de Escrituração Digital (Sped). A cada novo registro ou averbação, a serventia extrajudicial insere os dados no repositório nacional por meio de uma requisição com certificação digital via web service, cujo acesso, além das serventias, somente poderá ser efetuado pelo CNJ, pelas Corregedorias dos Tribunais de Justiça dos Estados e pelo Poder Executivo Federal.

Os documentos eletrônicos assinados digitalmente pelos notários e registradores serão remetidos à base de dados centralizada, encapsulados em uma VPN (Rede Privada Virtual)

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ou via https9. O recebimento de cada registro é certificado com recibo de entrega para assegurar a consistência da replicação da base e também com efeito de informação fiscal às corregedorias dos Tribunais de Justiça e ao CNJ.

Cada imóvel receberá um identificador unívoco em âmbito nacional na forma de um código numérico. Este identificador do imóvel será a chave primária que permitirá a interligação, com integridade referencial, das informações de registro com as informações de cadastros de imóveis urbanos e rurais, bem como com as declarações de bens de pessoas físicas e jurídicas.

O modelo proposto se aplica aos oficiais de registro de imóveis, em relação aos registros e averbações; aos notários, em relação às escrituras públicas de compra e venda; e aos oficiais de registro de títulos e documentos, em relação às operações de compra e venda celebradas por instrumento particular.

Dessa forma o Sistema de Gestão de Informações Territoriais servirá duplamente como:

1. Uma réplica dinâmica e centralizada dos dados de todos os serviços notariais e de registros de imóveis, por meio da qual será possível a conexão dos diversos órgãos do poder público federal e os cadastros de imóveis urbanos e rurais;

2. Uma cópia de segurança nacional, assegurando o direito à propriedade previsto no art. 5º, XXII, da Constituição Federal mesmo em uma situação de completa destruição dos dados de uma serventia em razão, por exemplo, de casos fortuitos ou de força maior.

1.7 O Sistema Nacional de Gestão de Informações Ter ritoriais

As informações extraídas deste repositório nacional serão arquivadas em camadas separadas (objetos) em um banco de dados espacial:

� A camada do registro e averbação, equivalente ao livro nº 2, do Registro Geral (Lei 6.015, de 1973, art. 173, II, com redação dada pela Lei nº 6.216, de 1975);

� A camada dos títulos registráveis, como a escritura pública de compra e venda, o formal de partilha, o mandado judicial e

9 Protocolo http com uma camada adicional de segurança que permite transmissão de dados por meio de conexão criptografada com verificação de autenticidade do servidor e do cliente por meio de certificados digitais

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demais títulos registráveis elencados no art. 221 da Lei 6.015, de 1973;

� A camada de dados físicos e geográficos georreferenciados dos imóveis urbanos e rurais, oriunda respectivamente dos cadastros de imóveis urbanos dos municípios e do Cadastro Nacional de Imóveis Rurais (CNIR), permitindo a visualização direta do imóvel e a comparação do universo jurídico descrito nos registros dos imóveis com o universo real, proveniente de levantamento aerofotogramétrico georreferenciado e outras técnicas de alta precisão, como o modelo digital de superfície obtido com perfilamento a laser (aplicado por algumas prefeituras como a de Belo Horizonte, Joinville e Porto Alegre em seu cadastro territorial);

Georreferenciamento com levantamento aerofotogramétrico e perfilamento a laser.

� A camada de zoneamento urbano, dos planos diretores e plantas de loteamento aprovadas nas prefeituras, permitindo a comparação do real em relação ao que está aprovado na prefeitura;

� A camada de dados fiscais de imóveis urbanos (ITBI e IPTU), e de imóveis rurais (ITR);

� A camada de valor declarado na declaração de bens do Imposto de Renda de Pessoa Física (a ser modificada para contemplar o identificador único do imóvel) e Jurídica (a ser criada);

� Camadas temáticas para gestão do território nacional incluindo planejamento urbano, de infra-estrutura, saneamento básico, mapeamento de áreas de risco, transportes, saúde, educação, habitação, segurança, defesa nacional, controle ambiental, entre outras.

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Os dados físicos, georreferenciais e de valoração dos imóveis urbanos (ITBI e IPTU), bem como informações sobre obras, licença de construção e o habite-se (que serão utilizados para aferição dos recolhimentos da Contribuição Previdenciária respectiva), serão alimentados pelas prefeituras em modo Interoperável, por meio de convênios.

Os dados dos imóveis rurais, por sua vez, serão obtidos por meio de ligação direta com o Cadastro Nacional de Imóveis Rurais (CNIR) que está sendo construído pela RFB e pelo INCRA.

Essa ligação com o CNIR permitirá a correlação, com total consistência, dos dados jurídicos do registro de imóveis com os dados físicos e cartográficos do imóvel rural (área, coordenadas georreferenciais de polígono e parcelas), fundiários (posse), fiscais (como o valor da terra nua pelo ITR), ambientais (área de proteção permanente e área de reserva legal, permitindo a comparação entre área real de reserva e o que está averbada) e dados econômicos de uso e produção.

Por meio de consultas a este banco de dados, órgãos como a Receita Federal, a PGFN, o Ministério Público, a Polícia Federal, a Controladoria-Geral da União, a Secretaria de Patrimônio da União, entre outros da administração pública federal, poderão utilizar os dados em suas aplicações específicas e criar suas próprias camadas de visualização.

O Sistema de Gestão de Informações Territoriais será, assim, um banco de dados de gestão do território nacional pela Administração Pública Federal em uma concepção multifinalitária. Constituirá o inventário oficial e sistemático do território nacional, desenvolvido com

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tecnologia de banco de dados apropriada para Sistemas de Informações Geográficas (SIG), com a finalidade de aprimoramento do registro, de regularização fundiária, de permitir o exercício pacífico do direito de propriedade, de propiciar a segurança jurídica e de proteger o mercado imobiliário e os investimentos a ele inerentes.

Imagem obtida por perfilamento a laser feito em alguns municípios brasileiros. É quase uma radiografia do imóvel.

O Sistema de Gestão de Informações Territoriais integrará informações jurídicas de imóveis, constantes dos registros eletrônicos, com informações cadastrais provenientes do Cadastro Nacional de Imóveis Rurais (CNIR), dos Cadastros Territoriais Multifinalitários dos Municípios (CTM), obtidas por meio de convênio ou acordo de cooperação, e das informações fiscais e fundiárias relativas a imóveis urbanos e rurais.

Os dados registrais e cadastrais serão relacionados entre si por meio do identificador único do imóvel e por meio dele o Sistema de Gestão de Informações Territoriais será conectado aos sistemas da Receita Federal, do INCRA, da Secretaria de Patrimônio da União, do IBGE, Polícia Federal, Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, além de outros órgãos ou instituições do Poder Executivo Federal.

O projeto é dividido em 9 fases e o resultado será um cadastro com informações essenciais de todos os imóveis e lotes do país, urbanos e rurais, residenciais, comerciais e industriais, de qualquer valor, com seus respectivos proprietários e titulares de posse identificados por meio do CPF e CNPJ e todo o histórico de transações relacionadas, tudo isso ligado a um banco de imagens georreferenciadas, permitindo o perfeito delineamento do contorno da propriedade, bem como das seguintes informações:

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� Nos imóveis urbanos a área construída, o projeto aprovado e o uso da propriedade, o valor do ITBI e IPTU e as informações sobre Licença de Obras e “Habite-se” para efeito de cálculo da contribuição previdenciária;

� Nos imóveis rurais, informações de interesse fiscal (DITR, VTN), fundiário (posse), econômico e ambiental como as áreas de reserva legal, de preservação permanente e de exploração agropecuária, benfeitorias e áreas de risco ambiental.

1.8 O Índice de Preços de Imóveis do IBGE

O Decreto nº 7.565, de 15 de setembro de 2011, determinou ao IBGE a criação do Índice de Preços de Imóveis no Brasil :

Art. 1o A Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE deverá adotar as providências que se fizerem necessárias para a criação e divulgação do índice de preços de imóveis no Brasil.

Parágrafo único. Caberá ao IBGE a definição da metodologia de cálculo do índice de preços de imóveis, bem como a adoção das demais providências necessárias para implementação, manutenção e contínuo aprimoramento do referido índice.

Art. 2o O IBGE poderá firmar parceria com a Caixa Econômica Federal para que esta forneça, respeitadas as exigências de sigilo e confidencialidade a que se sujeita, informações e conhecimentos técnicos necessários à criação e manutenção do índice.

Parágrafo único. O IBGE, visando ao contínuo aprimoramento do índice de preços de imóveis, poderá firmar parcerias com outras instituições financeiras ou agentes de mercado.

Art. 3o O IBGE definirá cronograma para a criação e implementação do índice de preços de imóveis.

Em reunião com o IBGE para discussão sobre a formação deste índice de preços, mostramos que o Sistema de Gestão de Informações Territoriais é uma ferramenta sem precedentes para a criação deste índice, uma vez que as informações fiscais, cadastrais e registrais relativas a valoração de imóveis estarão consolidadas no sistema de gestão.

A consolidação das informações fiscais dos Municípios (IPTU, ITBI), dos Estados (ITCD) e da União (DITR, Declarações de Bens do Imposto sobre a Renda e DIMOB, Declaração de Informação sobre Atividades Imobiliárias) com os dados registrais permitirá ao Sistema de Gestão de Informações Territoriais subsidiar o IBGE no cálculo deste índice, que poderá criar uma camada temática integrando essas informações às avaliações de financiamento de imóveis da CEF e do BB para criar um completo sistema de valoração de imóveis.

Como veremos adiante, o sistema de valoração de imóveis funcionará melhor se vinculado a uma autorização para reavaliação de bens na DIRPF.