Projeto nova cartografia social Pescadores e Pescadoras ......tradicionais do Brasil 1 Pescadores e...

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Nova cartografia social dos povos e comunidades tradicionais do Brasil 3 Pescadores e Pescadoras Artesanais do Cânion do São Francisco Pescadores e pescadoras artesanais do Cânion do São Francisco Alagoas Bahia Sergipe SÉRIE PESCADORES E PESCADORAS ARTESANAIS DO RIO SÃO FRANCISCO

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Nova cartogra�a social dos povos e comunidades tradicionais do Brasil

1 Pescadores e pescadoras artesanais de Saramém Remanescentes do Cabeço – Foz do São Francisco, Sergipe

2 Pescadores e pescadoras artesanais do Açude Público Cocorobó – Mostrando sua cara e seus problemas – Canudos, Bahia

3 Pescadores e pescadoras artesanais do Cânion do São Francisco – Alagoas, Bahia, Sergipe

4 Pescadores e pescadoras artesanais de ResinaFoz do São Francisco – Sergipe

Projeto nova cartografia social dos povos e comunidades tradicionais do BrasilSÉRIE PESCADORES E PESCADORAS ARTESANAIS DO RIO SÃO FRANCISCO

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Pescadores e Pescadoras Artesanais do Cânion do São Francisco

Pescadores e pescadorasartesanais do Cânion

do São Francisco

AlagoasBahia

Sergipe

REALIZAÇÃO

Pescadores e Pescadoras Artesanais do Cânion São Francisco

APOIO

Colônia Z-26 – Delmiro Gouveia

SÉRIE PESCADORES E PESCADORAS ARTESANAIS DO RIO SÃO FRANCISCO

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2 Projeto Nova Cartografia Social dos Povos e Comunidades Tradicionais do Brasil

Coordenação do PNCSPCT-BAlfredo Wagner Berno de Almeida(NCSA-CESTU/UEA, PPGAS/UFAM,CNPq)Rosa Elizabeth Acevedo Marin (UNAMAZ)

Equipe de pesquisaAlzení Tomáz (CPP)Juracy Marques (NECTAS/UNEB)Ticiano Oliveira (NECTAS)

Elaboração do mapaÁlvaro Ribas (NECTAS)Ticiano Rodrigues (NECTAS)Luís Augusto Pereira Lima (NCSA/UEA)

FotografiasAlzení TomázJoão ZinclarJuracy MarquesTiciano Rodrigues

Projeto gráfico e editoraçãoErnandes Fernandes Design Casa 8

Pescadores do Cânion em conversas com a equipe do Globo Ecologia – 4 a 9 setembro 2008

CoNTaToS

Colônia dos Pescadores – Z-2657480-971 Delmiro Gouveia ALtelefone 82. 3641 2213

CPP – Conselho Pastoral dos PescadoresAvenida Beira Rio 913 Jardim Bahia48604-000 Paulo Afonso BAtelefone/fax 75. 3281 [email protected]

Participantes da Oficina de MapasAfonso Oliveira (Povoado Lagoinha), Apolônio Sales de Souza Silva (Povoado Talhado), Cícero Cordeiro dos Santos (Delmiro Golveia), Cícero Tribucio da Silva (Riacho do Talhado – Olho Dágua do Casado), Evaristo Cordeiro da Silva (Povoado Salgado), Fabio Borges Carcino (São José), Geraldo Moreira (Povoado Salgado), Hélio Pereira dos Santos (Olho D’Água do Casado), João Monteiro da Silva (Paulo Afonso), João Valério Fidelo (Povoado São Sebastião), Joel de Oliveira (Olho D’Águinha), Jorge Luiz Barbosa de Souza (Delmiro Golveia – Alagoinha), José Carlos dos Santos (Piranhas), José Filho Bié (Paulo Afonso), José Joaquim Oliveira (Povoado Lagoinha), Laércio Silva Lima (Povoado Cruz – Xingó / Piranhas), Manoel Messias Gomes (Povoado Salgado), Manoel Souza dos Santos (Olho D’Água do Casado), Maria Cineide (Riacho do Talhado – Olho D’Água do Casado), Maria Clementino da Silva (Delmiro Golveia – Povoado Salgado), Maria do Socorro da Silva (Paulo Afonso), Miguel Bernardo Gomes (Povoado Salgado), Moacir Alves dos Santos (Povoado Olho D’Águinha), Orlando Lima dos Santos (Povoado Cruz Sebastião Marcos), Delmiro Golveia (Povoado Lagoinha)

Projeto Nova Cartografia Social dos Povos e Comunidades Tradicionais do BrasilPescadores e pescadoras artesanais do Cânion do Rio São Francisco SÉRIE Pescadores e Pescadoras Artesanais do Rio São Francisco

Catalogação na fonte elaborada pela bibliotecária Rosenira Izabel de Oliveira CRB 11/529

N935 Nova Cartografia Social dos Povos e Comunidades Tradicionais do Brasil: pescadores e pescadoras artesanais do Cânion do Rio São Francisco / coordenadores, Alfredo Wagner Berno de Almeida, Rosa Elizabeth Acevedo Marin, autores, Tomaz, Alzenir. Ticiano R. A. Oliveira, Juracy Marques. – Delmiro Gouveia, Alagoas : Casa 8 Desing / UEA Edições, 2009

12 p.; il.: 25 cm. (Série Pescadores e Pescadoras Artesanais do Rio São Francisco ; 3 ) ISBN 978-85-7401-451-7

1. Comunidade de Pescadores e Pescadoras – Brejo Grande, I. Almeida, Alfredo Wagner Berno de. II. Tomaz, Alzení. III. Série.

CDU 301.185.2(814.22)

NECTaS/UNEBRua do Gangorra 503 ChesfUniversidade Estadual da Bahia48600-000 Paulo Afonso BAtelefone/fax 75. 3281 7364

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3Pescadores e pescadoras artesanais do Cânion do Rio São Francisco

IdentidadeSomos pescadores artesanais do Cânion São Francisco. Aqui é a região do Baixo. Todo mundo sabe que a gente pesca o peixe onde ele está. O peixe num fica parado, esperando que seja pes-cado, a gente vai buscar ele onde estiver. Gover-no não sabe e não conhece pescador. Laércio

Pescamos na PA IV e no Cânion e também abaixo de Xingó. Não adianta achar que existe um pon-to de pesca. Os pontos é aonde a gente faz a cabana e guarda os apetrechos. O lugar onde pescamos é toda a região do Cânion. A gente vai buscar o peixe onde ele estiver. João Monteiro

O pescador não está podendo só viver da pesca, ele tem que buscar outros meios, a gente pre-cisa da terra pra trabalhar. Nossa pescaria é de manhã e de tarde. A gente coloca a rede e pela tarde vai buscar. A maioria do povo vive das águas desse rio.

Nossa pescaria é de manhã e de tarde. A gente coloca a rede e de tarde e pela madrugada vai buscar. A maioria do povo vive das águas desse rio. Laércio

A pesca no Cânion do Baixo São FranciscoO Cânion do São Francisco é um lugar de águas profundas, de paredes longas e altas. Aqui ago-ra só se pesca tilápia, tucunaré. Nas paredes do Cânion corremos o rico de rolar uma pedra e esmagar a gente. Viver no Cânion é um perigo. afonso oliveira

Os mais velhos chamavam de “sumidouro”, por-que o rio seguia e sumia nas vistas. É tudo talhado de pedra que serve de guia pras águas. Mas, aqui nós somos pescadores do Baixo São Francisco.

A gente antes vivia nas maloca de pedra, muita gente morava nas caverna de pedra. Era quando o Rio era Baixo, tinha tanto peixe e nós vivia feliz. Hoje num tem não, só tem umas ma-locas de pedra, mesmo. Aí nós faz uma maloqui-nha de palha ou madeira, as vezes de pedra é aí que guarda os apetrechos.

Nosso lugar pode virar Monumento pra tu-rista ver e como vai ficar nós que vivemos da pescaria? A gente num vai mais poder pegar peixe aí. Esse povo do governo vem pra enrolar a gente, disseram uma vez que o pescador não ia sofrer em nada, mas, agora sabemos que se virar monumento não vamos ter o direito de pescar o peixe. E aí eles vão fazer o que com os pescadores? Vão pagar uma indenização? Se esse negócio for feito só vai beneficiar o turista. orlando Lima

Impediram a gente de pescar lá porque é lugar do Exercito fazer treinamento, impedem a gente de pescar por causa dos criatórios de tilápia. Impediram a gente de viver da pesca por causa

Pescaria no Cânion

Pescador es do Cânion

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das barragens porque desapareceu o peixe, não res-peitam pescador porque tem gente que faz a pesca predatória e a gente paga por esses. Temos dificul-dades de chegar no Rio porque os fazendeiros não deixam que a gente passe por dentro de suas roças. Até sem terra, quando chega derruba nossa cabana. Será que não temos nenhum direito? antônio Gomes

Acontece que tem lugar pra piscicultura, tem lugar pra fazendeiro, tem lugar pra turista, mas, não tem lugar pra pescador viver! Cícero

Tipos de peixe e pescaria Antigamente, quando o Rio era seco tinha muitos ti-pos de pescaria. A gente inventou o gazoim, uma es-pécie de armadilha pra pegar a tubarana. Essa inven-ção só o pescador artesanal sabe inventar. Tavinho

Na porta dos córregos o cabra pesca até cin-quenta metros de fundura com linha e só pesca mais na beira do rio, aí nas paredes. Da beira das paredes do cânion o pescador bota rede até cinquenta me-tros de distância com rede de até cinquenta metros. Mais a maioria tem rede menor.

O surubim só reproduzia no estresse, a tubarana só por época. Eu ainda me lembro. O pirá e o robalo subia uma vez por ano. Quando o rio era baixo pega-va mais peixe. Agora quando o rio encheu não tem mais como o peixe reproduzir. afonso

Curvina também não tem mais e o pitu às vezes se pega só depois da barragem de Xingó. No lugar des-se monte de espécies que tinha no rio, agora só tem mais duas espécies o tucunaré e a tilápia que são es-pécies que não é como o surubim ou a tubarana.

O robalo, camurim, tubarana e curvina eram tudo peixe do mar que se adaptava o rio. A curvina sem dente aqui era chamada de pescada, já desapareceu.

Quase todo pescador aqui usa mais o molinete, a rede e barco de remo ou de motor a gás ou a óleo.

Maloca ou rancho dos pescadores

Pesca de Anzol Gazoim – tipo de apetrecho para pegar tubarana quando o Rio era baixo no Cânion

Cânion do Baixo São Francisco

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5Pescadores e pescadoras artesanais do Cânion do Rio São Francisco

A diversidade no Cânion

Nas beiradas dessas pedras se encontra muita coisa bonita. Aqui tem arvores pra remédio que muita gente usa. Tem ameixa, quixabeira que serve pra fazer remé-dio pra pancada. Também tem pau d’arco mais aqui a gente chama de Ipê e tem quina-quina. A quina-quina amarga mais do que pereiro que também tem. Existe ainda o pau piranha, madeira nativa dessa região.

Tem muito massunim que algumas pessoas comem e tem ouriço que com o tempo agarra nas redes e rasga.

Aqui tem o gavião grande da serra. Ele é maior que o urubu, todo ano ele dar filhote. Tem muito macaco prego nesse cânion.

Quando o rio era baixo muita família de pescar vivia nas cavernas desse rio. Oi minha casa mesmo era aqui, o rio já cobriu. Quando o rio subiu eu pensava que as pedras ia cair.

Tem muita gruta aqui. Antigamente aqui tinha a Cachoeira do Lamerão, agora só tem a Toca do Sal, o pescador faz toca lá. Tem uma abelha italiana, que aqui a gente que chama de velha oropa, com mais de metro na pedra, tem tamanduá que cai da pedra querendo pegar. Nesse trecho tem muito papagaio e periquito. Tem a caverna do Pinga-Pinga, lugar de morada dos pescadores, é aí que a gente se arranja. Os turistas também vêm pra cá. As paredes desse cânion são rochas de macambira. afonso

“O Cânion é uma parede de macambira”

Gruta dos TuristasMalocas – Cavernas onde pescadores fazem rancho

Toca do Sal

Ameaça ao território pesqueiroSe o pescador faz um rancho não tem direito, porque o fazendeiro não deixa, as pisciculturas tam-bém está sendo um empecilho. A gente precisa levar pra água os apetrechos, precisa levar a caixa de isopor, o óleo do barco, a rede, o anzol e pra isso tem que ter o barraco pra guardar as coisas den-tro, aí vem o fazendeiro e diz que a gente não pode fazer a cabana. E aí? Como o cara vai viver?

Só fazendeiro tem direito? E nós? Muitos deles mandam roubar nossos apetrechos. Tem fazendeiro que não deixa nem a gente passar pelo caminho pra ir pra o rio. Ele bota uma por-teira e a gente fica a mercê dele. Pescador é jogado, desprezado. E se a gente não resgatar todo mundo pra se organizar a situação vai ficar difícil, pois, querem tirar da gente agora o direito de pescar pra fazer um Monumento Natural, só pra turista e nós somos o quê?

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Pescadores e Pescadoras Artesanais do Cânion São FranciscoAlagoas - Bahia - Sergipe

Paulo Afonso - BA

Delmiro Gouveia - AL

Olho D'Água do Casado - AL

Piranhas - ALCanindé do São Francisco - SE

Santa Brigida - BA

Água Branca - AL

SE 230

BA 210

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represa de Paulo Afons o

SE 303

AL 220

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R i o S ã o F r a n c i s c o

LegendaIdentidade / Sobrevivência

Toca do Sal

Rio da Baixa do Picos

Corrego do Vicente

Antigo CemitérioMonte Escuro

Rio da Cruz / Com. Quilombola

Baixa do Bila (P)Combo

Corrego Boa VistaAssentamento Nova Esperança

Rancho da Muricaca

Dificuldades / Conflitos / AmeaçasPiscultura do LamerãoPiscultura Malhada GrandePiscultura do Xingozinho

TurismoImagem do São FranciscoGruta do Talhado (T)

Pedra do Caboclo

Convenções cartográficas:ALAGOAS

BAHIASERGIPEHidrografiaRodovias

R Sedes municipais

Limites municipais0 1.600 3.200 4.800 6.400 8.000

MEscala : 1:160.000

Sistema Coordenadas GeográficasDatum Geodésico Horizontal - SAD 69

Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia - PNCSAMapa Situacional - Setembro 2009

Fonte:Base DNIT 2009, MMA 2008,Imagem Satélite CBERS_2B CCD2XS_20081205,Informações dos Pescadores do Cânion do RioSão Francisco.

Cartografia:Luís Augusto Pereira Lima - NCSA/UEAÁlvaro Eduardo Mascarenhas Ribas - NECTASTiciano Oliveira - NECTAS

Brasil

Bahia

Sergipe

AlagoasR i o S ã o F r a n c i s c o

Córrego do UlucúCórrego Cacamunhê

Córrego do Montenegro""Ö

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Ilha Bela

!Æ Riacho Gritador!Æ Riacho do Castanho!Æ Riacho do Talhado!Æ Riacho do Forno!Æ Riacho do Portão

!Æ Poço da CachoeiraRiacho Jardim Cordeiro!Æ

Riacho do Curibuba!Æ!8 Povoado do Lamerão!8 Povoado Bananeiras!q Estação de Captação de Água Casal

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Malhada Grande!!Canavieira

Cavaquinho!!

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Piscultura Baixa da Velha!YPiscultura Lagoa da Pedra!Y

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"®Gruta do Pinga Pinga"®

Pisicultura da empresa Netuno"¡

Piscultura do Talhado!Y

Monumento Natural - MonaPossível implantação de Piscultura"oBarragem PA IV"nBarragem de Xingó"n

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8 Projeto Nova Cartografia Social dos Povos e Comunidades Tradicionais do Brasil

Hoje, temos problemas com os sem terra que chegaram e foram derrubando nosso ran-cho. Cadê que a gente não faz como eles pra ter o direito da gente. Eles são organizados e nós não. Tem que ter união se não a gente não vai puder pescar mais nessas águas, não tem ninguém pra olhar por nós.

Essas águas é nossa vida. A gente bota uma cabana num córrego daquele, aí vem os cria-dores de peixe e instala as gaiolas e o cabra não pode mais descer pelo o córrego, tem que mudar de caminho. Me diga se assim dá certo? É como se pescador num tivesse direito ne-nhum. Me diga o que a gente tem que fazer, porque nós num somo gavião pra avoar das pedra e chegar nas águas pra pegar o peixe. Nós temo é que descer nos caminho. Cícero

Era nas cachoeiras aqui na altura de Xingozinho da Bahia e Xingó de Alagoas que iam fazer a barragem. Aí parece que não se interessaram e levaram Xingó lá pra Piranhas. Acontece que lá não conseguiram mudar o nome da barragem e ficou como Xingó. Se tivesse sido aqui num tinha mexido cum tanta gente. afonso

A falta do pescadoQuando essas águas era baixa a gente pegava de tudo. Tinha correnteza e era água perigosa.

Nós tamo deixando de ser pescador pra virar guarda de peixe.

Aqui a gente só está pescando curvina, tilápia e tucunaré. Antes das barragens, a gente tinha era tubarana, o pirá, o camarão, o pitu. Acontece que a Chesf fez isso com a gente e não se responsabi-lizou. Não tivemos nenhuma indenização. O peixe desapareceu.

Nasci e me criei nesse rio e tô vendo esse rio numa situação delicada. O rio lá pra baixo está pela cintura. O pescante é aquele que não tem piedade do rio, não tem credencial pra pescar. Nesse baixo são Francisco se tem 2 mil pecadores tem 15 mil pescante, que pratica a pesca predatória, eles não pesca o peixe, faz depredação.

Para esses pescantes não tem fiscalização. Na época do defeso o pescador pega somente seus 5 kg pra comer com a família, o pescante pega toneladas pra o mercado e o órgão fiscaliza-dor pega o pequeno com seus 5 kg, mas, não pega o pescante com a tonelada. Esse povo todo ribeirinho precisa do rio pra sobreviver.

O Rio se encontra morto e aterrado por causa das barragens, por isso, vem se acabando o pescado, o peixe não tem mais como fazer a reprodução.

No córrego do Pinga-Pinga, corre água direto na pedra, ela mina e é água boa e pura que desce todo tempo. Desde dos quinze anos que pesco do Canindé até o Salgado. Conheço tudo aqui. Hoje peguei uns mocó pra levar pra casa, pescaria não foi boa não. Esses mocó vai dá pra passar a semana. Rosivaldo

Pescadores artesanais

Barragem de Xingó – Corta o Cânion

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9Pescadores e pescadoras artesanais do Cânion do Rio São Francisco

Os perigos para o pescadorTodo pescador tem esse problema de não poder fazer o rancho na beira do rio. Tem fazendeiro que ameaça com arma e não permite que a gen-te chegue na beira da água. Pescador é chamado de ladrão. O próprio fazendeiro manda roubar os apetrechos pra depois botar culpa na gente mes-mo. O dono da terra não quer nem saber se so-mos pai de família.

Tem um monte de pescante que não tem nada haver com pescador artesanal, que chega e faz a pesca predatória e o Ibama não está nem aí. Esses pescantes atrapalham a vida de nós pescadores, eles botam fama ruim em pescador. Se houvesse fiscalização esse povo não atrapalhava a vida da gente e do rio. Se um denuncia o fazendeiro e o pescante é arriscado até perder a vida.

É muito perigoso pescar aqui. A gente bota rede nos córregos, se dormir vem uma enxurrada e leva tudo. Eu já perdi barco lá.

As paredes do cânion são mais de sessenta metros de altura e mais cento e cinquenta metro de fundura.

A pesca predatóriaEsse pessoal do Meio Ambiente não fiscaliza nada. Eles têm obrigação pra fazer e não faz. Por isso, que as coisas estão ruins. Tem pesca predatória e eles não estão nem aí. Se tivesse fiscaliza-ção retirava esses pescantes e sobrava peixe para os pescadores artesanais que tem dessa arte o seu sustento.

Agora, tem pescador artesanal que tem de pescar de arpão pra sobreviver, não são todos, mas, esses são obrigados. Hoje depois das barragens, o peixe acabou e muitos pescadores usam o arpão pra poder fazer a feira e isso não ta certo. Mas, são obrigados, só que esses o Ibama pune, mas, não pune os que usam da pesca predatória pra fazer riqueza.

Acontece que o pescar artesanal faz a pesca de arpão pra não deixar a família morrer de fome. É pra comprar comida pra seus filhos. Acontece que tem pescador que não faz esse pesca e vai se virando. Se não tivesse pesca predatória os pescadores artesanais tinha como viver.

É bom que se entenda que a pesca predatória é feita por pescantes e que uma minoria de pescador artesanal pesca de arpão pra sobreviver. No período do defeso a gente tem o seguro desemprego. Neste período o rio está com água barrenta, a água amarela e não tem pescaria de arpão por parte de pescador artesanal nenhum, ele pega somente seus 5 kg pra comer em casa com a família. Quinca

O pescador tem que fazer outras atividades pra sobreviver porque a pescaria não dá mais. Quando o rio está com água limpa muitos de nós são obrigados a fazer a pesca de arpão pra ter o que comer. Joel

Antigamente o pescador pegava uma panela de barro, colocava um piau dentro, botava farinha e tinha comida pra os filhos, hoje veja só a vida de pescador. Hoje em dia mesmo o pessoal que pesca com respeito não pode denunciar, porque corre o risco do cara tá dormindo em seu barraco e chegar

Pisciculturas particulares no Cânion

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10 Projeto Nova Cartografia Social dos Povos e Comunidades Tradicionais do Brasil

um cara e agredi-lo e, aí quem vai se responsabilizar por ele? Por isso, cabe aos órgãos competentes fazer a fiscalização, mas, eles não fazem. Acontece também que se o pescador denunciar sozinho ele pode correr risco, mas, se ele denuncia em grupo sem se identificar a coisa é diferente. Sebastião

Quem tem que tomar providencia são os órgãos competentes, mas, eles são incompetentes. O Ibama não fiscaliza aqui no Cânion, agora na represa de Xingó ele tá sempre lá. Eles alegam que não tem recurso nem pessoal. Acontece que alguns ganham diárias e quando eles chegam aqui quer pegar dinheiro da gente pra colocar combustível na lancha deles. Eles já ganham pra isso, e somos nós é que temos obrigação de pagar a eles?

Até a SEAP é um órgão que prejudica pescador. Fez as carteiras do pessoal e chega depois tudo errado. São irresponsáveis e incompetentes. Tem carteira que era pra chegar em Delmiro Gouveia e chegou foi em Petrolina. Tem pescador velho como eu e muitos aqui que tem carteira antiga e eles querem colocar como iniciante. Dá pra aceitar isso? A SEAP e o Ibama são órgãos que não cumprem seu papel devido. Não organiza documentação direito e corremos o risco de perder ainda mais o pouco que nos resta.

A pisciculturaAté os criatórios traz problema pra os pes-cadores. Quando botam os criatórios já co-meça impedindo os pescadores artesanais de passar. Quando colocam as gaiolas nas entradas dos córregos já se acham dono e impedem a gente de passar.

Eles não pagam nada pra botar gaiola, tem pegar licença com os órgãos pra puder funcionar e nenhum desses tem licença pra funcionar.

A Netuno quando chegou aqui foi logo botando corda de canto a canto no rio. Veja os que eles fizeram, quem tem motor a diesel não passa, só passa quem tem mo-tor no barco que levanta. Quando o vento dar estica a corda, quem tem barco grande

num passa é capaz de perder a hélice. A Netuno paga oitocentos reais pro engenheiro de pesca aqui em Xingozinho, e paga treze reais a diária pro pião. Damião

A gente é ameaçado, num pode nem passar por perto pra num assustar o peixe. Eu tô pescando aqui longe pra num ter confusão.

A Netuno colocou tanque rede oito vezes mais do que o permitido, embora estejam de forme irregular, nessas águas. A Netuno desenvolveu técnica e construiu plataforma para oito gaiolas, eles pegam gente pra trabalhar pra eles e forma pequenas pisciculturas, aí a ração é comprada a ela e depois a gente tem que vende o peixe pra ela. Nivaldo

A Codevasf também financia tanque rede e a prefeitura também. Eles dão os alevinos e a ra-ção. Conseguimos os alevinos pelo Instituto Xingó. Tamos produzindo mil e novecentos qui-los por mês. E tamo vendendo no mercado local. Outros vendem só pra Netuno, isso quem trabalha cum eles. Eu aqui trabalho pra associação somos vinte e uma famílias. Quando a água ta fria tem muita morte de peixe, dá uma doença aí a gente bota uma terramicina e sal pra matar as bactérias. Tem uns piscicultor que desiste, num agüenta, já saíram uns quatro. Mais tamo insistindo pra ver se dar certo. Milton

Pisciculturas da Netuno – impedindo passagem de pescadores artesanais

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11Pescadores e pescadoras artesanais do Cânion do Rio São Francisco

Setenta por cento dos custos vão tudo pra ração, a pessoa fica refém da empresa que vende a ração. O peixe de gaiola é a mesma coisa de galinha de granja.

OrganizaçãoPrecisa que crie uma lei pra esse povo vir para a Colônia. Se a gente resgate esse povo que tá desorganizado facilita porque o pescador organizado, paga por esses outros.

O pescador paga seus direitos e tem uns que não paga seus direitos, por isso, temos que resgatar esses pra eles se organizarem.

Fé e mitosNas cachoeiras que tinham aqui meu pai se purificava, rezava e depois ia pescar.

Tem uns vulto nessas pedras, de longe se ver Pa-dre Cícero, mas de perto ele se encanta.

Os pescadores fizeram a imagem de São Francis-co na Pedra, tem missa todo ano no dia quatro de outubro e tudo quanto é de pescador vem. É como se fosse a força. afonso

Caia 50 kg de corrente em cima da tampa da gela-deira. Ai meu fio, ninguém ficava... Eles iam pescar na poita, coisa de 40 metro de fundura. Quando apare-cia a Muricaca a chumbada não descia nem 2 metro. Seu afonso

O gavião grita. As pedras responde. A macambira não vai agüentar de tanto sofrimento. O pescador agüen-ta, vai embora né!

Num dar pra pescar de peito aberto. Tem lugar que num pode, faz mal pra saúde. Ou a gente se ben-ze antes de entrar nas águas ou ela vira traiçoeira.

Minha tristeza acaba quando eu fico aqui sozinho, o eco fala no meu ouvido bem baixinho e o vento so-pra, sopra tanto e diz pra eu ficar quieto, meu peito fica apertadinho. Se eu for contar as histórias que os peixe conta... Num pode é tudo segredo! Rosivaldo

Oficina de construção da Cartografia – 12 a 13 julho 2008

São Francisco no Cânion

Rancho da Muricaca – local assombrado para os pescadores do Cânion

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Nova cartogra�a social dos povos e comunidades tradicionais do Brasil

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4 Pescadores e pescadoras artesanais de ResinaFoz do São Francisco – Sergipe

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Pescadores e Pescadoras Artesanais do Cânion do São Francisco

Pescadores e pescadorasartesanais do Cânion

do São Francisco

AlagoasBahia

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REALIZAÇÃO

Pescadores e Pescadoras Artesanais do Cânion São Francisco

APOIO

Colônia Z-26 – Delmiro Gouveia

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