PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO STRICTO SENSU MESTRADO …
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PROGRAMA DE PÓS – GRADUAÇÃO STRICTO SENSU
MESTRADO EM AMBIENTE E SAÚDE
VERÔNICA PALMIRO DA SILVA E LIMA
TABAGISMO E ESPONDILITE ANQUILOSANTE: EFEITOS NA
ATIVIDADE DA DOENÇA E NA RESPOSTA TERAPÊUTICA. DADOS
BIOBADABRASIL
Cuiabá
2021
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VERÔNICA PALMIRO DA SILVA E LIMA
TABAGISMO E ESPONDILITE ANQUILOSANTE: EFEITOS NA
ATIVIDADE DA DOENÇA E NA RESPOSTA TERAPÊUTICA. DADOS
BIOBADABRASIL
Dissertação apresentada a Universidade
de Cuiabá para obtenção do título de
Mestre em Ambiente e Saúde
Orientador: Prof. Dr. Vander Fernandes
Cuiabá
2021
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FICHA CATALOGRÁFICA
Dados internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca UNIC
L732t LIMA, Verônica Palmiro da Silva e Tabagismo e espondilite anquilosante: efeitos na atividade da doença e na resposta terapêutica. Dados BiobadaBrasil / Verônica Palmiro da Silva e Lima - Cuiabá MT, 2021 66p.: il
Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-graduação em Ensino de stricto sensu, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Ambiente e Saúde. Área concentração: Ambiente e Saúde na Amazônia Legal. Universidade de Cuiabá - UNIC, 2021 Orientador: Prof.º Dr.º Vander Fernandes 1. Espondilite Anquilosante. 2. Tabagismo. 3. Produtos Biológicos. 4. Evento
Adverso. 5. Eficácia de Tratamento. CDU: 616.24:616.72
Terezinha de Jesus de Melo Fonseca - CRB1/3261
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FOLHA DE APROVAÇÃO
VERÔNICA PALMIRO DA SILVA E LIMA
TABAGISMO E ESPONDILITE ANQUILOSANTE: EFEITOS NA ATIVIDADE DA
DOENÇA E NA RESPOSTA TERAPÊUTICA. DADOS BIOBADABRASIL
Dissertação apresentada à UNIC, no Mestrado em Ambiente e Saúde, na área de concentração:
Ambiente e Saúde na Amazônia Legal, como requisito parcial para a obtenção do Título de
Mestre conferida pela Banca Examinadora formada pelos professores:
_________________________________________
Prof. Dr. Vander Fernandes
(Orientador)
Universidade de Cuiabá
_________________________________________
Profa. Dra. Cristhiane Almeida Leite Silva
Membro interno – Universidade de Cuiabá
_________________________________________ Prof. Dr. Júlio César de Oliveira
Universidade Federal do Mato Grosso - UFMT
Cuiabá, 25 de Março de 2021.
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DEDICATÓRIA
Dedico esse trabalho aos doentes reumáticos, que caminham comigo, com bravura, na luta
diária contra o reumatismo.
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AGRADECIMENTO
Agradeço a Deus pelo milagre da vida.
À minha amada mãe Márcia, por ter me ensinado desde a infância que “o único caminho é
estudar, estudar e estudar.”
Ao meu noivo Ivan com quem compartilho de perto minhas angústias e anseios. Obrigada por
ser sempre compreensivo, paciente e estar disposto a ajudar no que for preciso.
À minha querida família, pelo apoio incondicional e por me ensinar que a beleza da vida está
nas coisas mais simples, transbordando meu coração de alegria e amor.
Ao meu orientador, Prof. Dr. Vander Fernandes, por ter compartilhado comigo seus
conhecimentos, tão imprescindíveis para a criação deste trabalho.
Aos membros da banca examinadora, por terem aceitado participar desse momento, partilhando
suas valorosas expertises e contribuindo para melhoria do estudo apresentado.
Recebam todos a minha eterna gratidão!
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RESUMO
Introdução: O tabagismo tem sido identificado como fator de risco ambiental para
desenvolvimento de doenças reumáticas e interfere na espondilite anquilosante, predispondo a
limitações de habilidades físicas funcionais com redução de mobilidade e aumento de
inflamação sistêmica, piora na progressão radiográfica axial, piora na atividade de doença,
prejuízo funcional, disfunção sexual, aumento de fadiga, sonolência, ansiedade e depressão.
Objetivos: O objetivo desse estudo é determinar os efeitos do tabagismo na atividade da doença
e na resposta terapêutica em pacientes com espondilite anquilosante. Material e métodos:
Foram selecionados pacientes com espondilite anquilosante, acima de 16 anos de idade,
cadastrados no Registro brasileiro de monitorização de terapias biológicas em doenças
reumáticas – BiobadaBrasil, incluídos desde 2010. A presença de espondilite foi definida de
acordo com os critérios classificatórios do grupo ASAS, propostos em 2009. Os pacientes
classificados com espondilite anquilosante foram avaliados em consulta médica. A avaliação
clínica foi baseada na avaliação do índice de atividade de doença Bath Ankylosing Spondylitis
Disease Activity Index (BASDAI) e na falência e/ou necessidade de troca terapêutica.
Informações sobre o tabagismo foram coletadas sob forma dicotômica, com afirmativa ou
negativa para tabagismo atual. Resultados: Entre janeiro de 2010 e janeiro de 2020, foram
catalogados 588 pacientes com espondilite anquilosante que preenchiam os critérios de inclusão
dessa pesquisa, entre os quais, 74% (439) eram do sexo masculino. A idade variou de 16 a 81
anos, com média de 48,8 (DP 12,49) anos. Entre os pacientes avaliados, 14% (83) eram
tabagistas e 86% (505) negaram o tabagismo. Ao separarmos os valores de escore BASDAI
entre os pacientes tabagistas e não tabagistas, o grupo tabagista apresentou média de valores
inferior ao grupo não tabagistas, porém, após análise comparativa, essa diferença não
demonstrou significância estatística (p 0,17). Não foi observada diferença estatisticamente
significativa na frequência de indivíduos que necessitaram trocar a terapia imunobiológica,
assim como pelos motivos da necessidade de troca, com relação ao tabagismo (p 0,767).
Conclusões: O tabagismo não se comportou como fator de risco para aumento da atividade de
doença e refratariedade ao tratamento da espondilite anquilosante.
Palavras-chave: Espondilite Anquilosante; Tabagismo; Produtos Biológicos; Evento Adverso;
Eficácia de Tratamento.
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ABSTRACT
Background/Objective: Smoking is an environmental risk factor for the development of
rheumatic diseases and interferes with ankylosing spondylitis, predisposing to limitations with
reduced mobility and increased systemic inflammation, worsening in axial radiographic
progression, sexual dysfunction, increased fatigue, drowsiness, anxiety and depression. We
aimed to determine the effects of smoking on disease activity and therapeutic response in
patients with ankylosing spondylitis. Methods: Patients with ankylosing spondylitis aged >16
years, registered in the Brazilian Registry to Monitor Biological Therapies in Rheumatic
Diseases (BiobadaBrasil) since 2010, were included. The presence of spondylitis was defined
according to the Assessment of SpondyloArthritis International Society classification criteria.
Clinical evaluation was based on the Bath Ankylosing Spondylitis Disease Activity Index
(BASDAI) and treatment failure and/or need for therapeutic changes. Information on smoking
was dichotomously collected, with affirmative or negative confirmation of current smoking.
Results: Altogether, 588 patients with ankylosing spondylitis who met the inclusion criteria
were registered between January 2010 and January 2020. Among these, 74% (n=439) were
male. Ages ranged from 16 to 81 (mean±SD: 48.8±12.49) years. Altogether, 14% (n=83) were
smokers. Smokers exhibited lower mean BASDAI scores than non-smokers, which was not
significant (p=0.17) on comparative analysis. Changes in the immunobiological therapy were
needed in 45.4% (n=267). Among these, 14.9% (n=40) were smokers. Percentage of patients
needing changes in the immunobiological therapy and reasons for these changes with respect
to smoking showed no significant difference (p=0.767). Conclusions: Smoking was not a risk
factor for increased disease activity and refractoriness to ankylosing spondylitis treatment.
Keywords: Spondylitis, Ankylosing; Smoking; Biological Products; Adverse Drug Events;
Treatment Outcome.
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Classificação de Espondiloartrite axial não radiográfica ......................................... 19
Figura 2 - Critérios de classificação para espondiloartrites axiais ........................................... 20
Figura 3 - Atualização da nomenclatura para o escore de atividade ASDAS .......................... 26
Figura 4 - Histograma demonstrando a distribuição da frequência das idades dos pacientes
com espondilite anquilosante em seguimento no BiobadaBrasil entre janeiro/2010 a
janeiro/2020 .............................................................................................................................. 52
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LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Critérios modificados de Nova York para espondilite anquilosante ....................... 18
Tabela 2 - Características dos pacientes com espondilite anquilosante em seguimento no
BiobadaBrasil entre janeiro/2010 a janeiro/2020 ..................................................................... 52
Tabela 3 - Frequências relativas e absolutas das manifestações clínicas extra-axiais dos
pacientes com espondilite anquilosante em seguimento no BiobadaBrasil entre janeiro/2010 a
janeiro/2020 .............................................................................................................................. 52
Tabela 4 - Perfil epidemiológico segundo comorbidades dos pacientes com espondilite
anquilosante registrados no BiobadaBrasil entre janeiro/2010 a janeiro/2020 ........................ 53
Tabela 5 - Associação entre tabagismo e atividade de doença dos pacientes com espondilite
anquilosante, dados coletados no momento de início do seguimento no BiobadaBrasil entre
janeiro/2010 a janeiro/2020 ...................................................................................................... 54
Tabela 6 - Frequência e análise comparativa de troca de terapia imunobiológica e motivos de
troca pela presença ou não de tabagismo dos pacientes com espondilite anquilosante em
seguimento no BiobadaBrasil entre janeiro/2010 a janeiro/2020 ............................................. 54
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LISTA DE ABREVIATURAS
AEMyPS Agência Espanhola de Medicamentos e Produtos
Sanitários
AINE Anti–Inflamatórios Não Esteroidais
ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária
AR Artrite Reumatóide
ASAS Assessment of Spondylo International Society
ASQoL Ankylosing Spondylitis Quality of Life
BASDAI Bath Ankylosing Spondylitis Disease Activity Index
BASFI Bath Ankylosing Spondylitis Functional Index
BASMI Bath Ankylosing Spondylitis Metrology Index
BASRI Bath Ankylosing Spondylitis Radiology Index
BIOBADABRASIL Registro brasileiro de monitorização de terapias
biológicas em doenças reumáticas
BIOBADASER Banco de dados dos agentes biológicos da Sociedade
Espanhola de Reumatologia
BSRBR-AS Britsh Society for Rheumatology Register for
Ankylosing Spondylitis
Anti –CCP Anticorpo Contra Peptídeo Citrulinado Cíclico
DISH Hiperostose esquelética idiopática difusa
DMCDs Drogas Modificadoras de Curso de Doença sintéticas
EA Espondilite Anquilosante
EPA Espondiloartrite
ESSG European Spondiloarthropathy Study Group
EULAR European League Against Rheumatism
EVA Escala Visual Analógica
HAQS Health Assessment Questionnaire modified for the
Spondyloarthropathies
HGU Hospital Geral Universitário
HLA-B27 Antígeno Leucocitário Humano B27
IgA Imunoglobulina A
IgG Imunoglobulina G
IL Interleucina
mSASSS Modified Stoke Ankylosing Spondylitis Spine Score
NK Natural Killers
nr – EPAax Espondiloartrite axial não radiográfica
OR Odds Ratio
PCR Proteína C Reativa
RM Ressonância Magnética
SBR Sociedade Brasileira de Reumatologia
STIR Recuperação da Inversão com T1 curto
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TC Tomografia Computadorizada
TNF Fator de Necrose Tumoral
UAA Uveíte Anterior Aguda
UNIC Universidade de Cuiabá
UPR Resposta à Proteína Desdobrada
VHS Velocidade de Hemossedimentação
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 15
2 REVISÃO DE LITERATURA .............................................................................................. 18
2.1 ESPONDILITE ANQUILOSANTE ........................................................................................... 18
2.1.1 Conceito e epidemiologia .................................................................................................................... 18 2.1.2 Classificação ......................................................................................................................................... 18 2.1.3 Manifestações clínicas ......................................................................................................................... 20 2.1.4 Fisiopatologia ....................................................................................................................................... 21 2.1.5 Manifestações laboratoriais e de imagem ........................................................................................... 23 2.1.6 Índices compostos de avaliação de atividade de doença .................................................................... 25 2.1.7 Tratamento .......................................................................................................................................... 27
2.2 BIOBADABRASIL .................................................................................................................... 29
2.2.1 Histórico ............................................................................................................................................... 29 2.2.2 Pacientes incluídos .............................................................................................................................. 31 2.2.3 Cenário atual ........................................................................................................................................ 32
2.3 TABAGISMO E ESPONDILITE ANQUILOSANTE ............................................................... 32
3 REFERÊNCIAS ................................................................................................................ 41
4 ARTIGO......................................................................................................................... 46
INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 47
MÉTODOS ....................................................................................................................................... 49
População de estudo e critérios de seleção ................................................................................................. 49 Aspectos éticos ............................................................................................................................................. 50 Coleta de dados ............................................................................................................................................ 50 Análise estatística ......................................................................................................................................... 51
RESULTADOS ................................................................................................................................. 51
DISCUSSÃO ..................................................................................................................................... 54
CONCLUSÃO .................................................................................................................................. 57
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................................. 58
ANEXO A – Aprovação do estudo pelo Comitê de Ética em Pesquisa ................................ 62
ANEXO B – Ficha de coleta de dados do BiobadaBrasil (aplicada na primeira consulta) ..... 63
ANEXO C – Comprovante de submissão do artigo científico.............................................. 65
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1 INTRODUÇÃO
As espondiloartrites soronegativas formam um grupo de doenças que se inter-
relacionam devido a características clínicas, fisiopatologia e predisposição genética
semelhantes (HOCHBERG et al., 2016). São patologias que compõe esse grupo: espondilite
anquilosante, artrite reativa, artrite associada à psoríase, artrite associada à doença inflamatória
intestinal e espondiloartrite indiferenciada. Esses distúrbios foram denominados soronegativos
porque os pacientes com essas condições geralmente apresentam testes negativos para o fator
reumatóide. Essas condições foram consideradas inter-relacionadas devido à ausência de
nódulos subcutâneos (como os encontrados na artrite reumatóide); à presença de manifestações
clínicas semelhantes, tais como o envolvimento das articulações sacroilíacas e da coluna e à
predisposição genética semelhante. A descoberta, em 1973, da forte associação entre o antígeno
leucocitário humano B27 (HLA-B27) à espondilite anquilosante e, em menor grau, aos demais
subgrupos das espondiloartrites sustentou fortemente este conceito (HOCHBERG et al., 2016).
Dentro do grupo das espondiloartrites, a espondilite anquilosante e a espondiloartrite
indiferenciada constituem as doenças mais comumente diagnosticadas (HOCHBERG et al.,
2016).
A espondilite anquilosante é uma doença crônica e inflamatória que acomete as ênteses.
O envolvimento musculoesquelético é predominantemente axial (sacroileíte e espondilite),
causando lombalgia de ritmo inflamatório (HOCHBERG et al., 2016). Pode acometer também
grandes articulações periféricas e tendões, causando entesites, dactilites e artrites que
predominam em membros inferiores (HOCHBERG et al., 2016). Pode apresentar
manifestações extra-articulares como uveíte, ileíte e/ou colite, aortite, regurgitação aórtica,
anomalias de condução cardíaca como bloqueio atrioventricular de primeiro grau, fibrose de
lobo superior pulmonar, entre outros mais raros (HOCHBERG et al., 2016). É uma doença
potencialmente debilitante, que pode causar limitação da mobilidade espinhal progressiva,
perda de funcionalidade e redução da qualidade de vida (ZHANG et al., 2015).
O diagnóstico precoce, a educação do paciente e a fisioterapia são essenciais para o
tratamento bem sucedido da espondilite anquilosante (REGEL et al., 2017). A sociedade
americana Assessment of Spondylo International Society (ASAS) publicou recomendações para
o tratamento da espondilite anquilosante (EA), que integram as recomendações da European
League Against Rheumatism (EULAR) e, segundo essas recomendações, os anti –inflamatórios
não esteroidais e os medicamentos imunobiológicos são considerados os mais importantes
agentes de terapia farmacológica, que deve ser combinado com terapia não farmacológica
16
durante todo curso da doença (REGEL et al., 2017; SEPRIANO et al., 2017; VAN DER
HEIJDE et al., 2017).
Doenças reumáticas inflamatórias se desenvolvem como consequência de uma
complexa interação entre fatores genéticos e ambientais, levando a uma resposta imune
exacerbada. O tabagismo tem sido identificado como o principal fator de risco ambiental para
essas doenças reumáticas (AYKURT KARLIBEL et al., 2019).
A relação de causalidade entre o tabagismo e doenças inflamatórias sistêmicas já está
descrito na literatura. Sabe-se que o tabagismo reduz a atividade do óxido nítrico e a
vasodilatação, causando injúria endotelial vascular. O tabagismo causa um desequilíbrio entre
mecanismos oxidativos e anti–oxidativos, aumentando a produção de citocinas pró-
inflamatórias como IL-1 ß, IL -6 e TNFα (AYKURT KARLIBEL et al., 2019). Além disso,
alguns constituintes do tabaco atuam como adjuvantes na ativação de células apresentadoras de
antígenos, ativando as imunidades inata e adaptativa (JIANG et al., 2014).
A prevalência do tabagismo nos pacientes portadores de espondilite anquilosante é alta,
podendo corresponder até 50% dos pacientes referindo tabagismo atual e/ou prévio (ZHAO et
al., 2019). Entretanto, a relação causal entre o tabagismo e a gravidade da espondilite
anquilosante é complexa. O tabagismo é muito frequentemente associado a fatores
socioeconômicos, comportamentos relacionados à saúde e comorbidades, de forma que é
essencial ajustar esses fatores quando se explora o tabagismo como um fator de risco
independente e potencialmente modificável no tratamento da espondilite anquilosante (ZHAO
et al., 2019).
Alguns autores já conseguiram produzir evidência científica de que o tabagismo
interfere na espondilite anquilosante, predispondo a limitações de habilidades físicas funcionais
com redução de mobilidade e aumento de inflamação sistêmica (CHEN et al., 2013; WARD et
al., 2005), piora na progressão radiográfica axial (PODDUBNYY et al., 2012; PODDUBNYY
et al., 2013), piora na atividade de doença e prejuízo funcional (ZHAO et al., 2017), disfunção
sexual (AYKURT KARLIBEL et al., 2019), aumento de fadiga, sonolência, ansiedade e
depressão (ZHAO et al., 2019). Em contrapartida, estudo recente comprovou que pacientes com
espondilite anquilosante e tabagistas que iniciaram a terapia anti – TNF não apresentavam
maior risco de descontinuação terapêutica do que os pacientes que nunca fumaram (ZHAO et
al., 2019).
Dessa maneira, o objetivo geral desse estudo é determinar os efeitos do tabagismo na
atividade da doença e na resposta terapêutica em pacientes com espondilite anquilosante.
Outros objetivos mais específicos seriam: definir se o tabagismo atua como um fator de risco
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para piora da atividade e gravidade da espondilite anquilosante; definir se o tabagismo atua
como fator de risco para falência à terapia imunobiológica e consequente necessidade de troca
de agente biológico dos pacientes com espondilite anquilosante e definir se o tabagismo atua
como fator de risco para incidência de efeitos adversos à terapia imunobiológica dos pacientes
com espondilite anquilosante.
Formularam-se as seguintes hipóteses científicas:
1. O tabagismo é um fator de risco para aumento de gravidade e atividade da espondilite
anquilosante.
2. O tabagismo tem relação com pior evolução terapêutica da espondilite anquilosante e
consequente falência com necessidade de troca de medicamentos da terapia
imunobiológica.
3. O tabagismo tem relação com necessidade de troca terapêutica por mais eventos
adversos ao tratamento da espondilite anquilosante.
Esse trabalho se justifica ao gerar evidência científica sobre a interferência do tabagismo
na espondilite anquilosante, de forma que médicos prescritores poderão se nortear sobre a
necessidade de indicação de interrupção do uso de tabaco como parte do programa terapêutico
não farmacológico.
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2 REVISÃO DE LITERATURA
2.1 ESPONDILITE ANQUILOSANTE
2.1.1 Conceito e epidemiologia
A espondilite anquilosante (EA) faz parte de um grupo de doenças inter-relacionadas
denominadas espondiloartrites soronegativas. Além da espondilite anquilosante, compõem esse
grupo a artrite reativa, a artrite associada à psoríase, a artrite associada à doença inflamatória
intestinal e a espondiloartrite indiferenciada. Esses distúrbios foram denominados
soronegativos porque os pacientes com essas condições geralmente apresentam testes negativos
para o fator reumatóide. Essas condições foram consideradas inter-relacionadas devido à
ausência de nódulos subcutâneos (como os encontrados na artrite reumatóide); à presença de
manifestações clínicas semelhantes, tais como o envolvimento das articulações sacroilíacas e
da coluna e à predisposição genética semelhante. A descoberta, em 1973, da forte associação
entre o antígeno leucocitário humano B27 (HLA-B27) à EA e, em menor grau, aos demais
subgrupos das espondiloartrites sustentou fortemente este conceito (HOCHBERG et al., 2016).
Estimativas de prevalência de todo o grupo de espondiloartrites na América do Norte,
na Alemanha, na França, na Grécia e na Lituânia variam de 0,3% a 1,9%, sendo tão frequente
quanto a artrite reumatóide. A incidência de EA foi descrita como aproximadamente 7,2 por
100 000 adultos nos Estados Unidos, com uma proporção masculino – feminino de 2:1 a 3:1.
Dentro do grupo das espondiloartrites, a EA e a espondiloartrite indiferenciada constituem os
dois subgrupos mais comuns (HOCHBERG et al., 2016).
2.1.2 Classificação
Os primeiros critérios para classificação de EA foram formulados em 1961 em Roma.
Desde então, suas modificações nos levaram aos critérios de Nova York, que posteriormente
foram modificados em 1984 e consideravam a necessidade de lesão estrutural radiográfica (DE
VAN DER LIDEN et al., 1984).
Tabela 1 - Critérios modificados de Nova York para espondilite anquilosante
Critérios Clínicos
1. Dor lombar e rigidez por mais de 3 meses que melhora com o exercício, mas que não
é aliviada pelo repouso;
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2. Limitação do movimento da coluna lombar tanto no plano lateral quanto frontal;
3. Limitação da expansão torácica em relação aos valores normais corrigidos para idade
e sexo;
Critério radiológico
1. Sacroileíte de grau ≥ 2 bilateralmente ou de grau 3 e 4 unilateralmente
Espondilite anquilosante definitiva
O critério radiográfico está associado a pelo menos um critério clínico.
Fonte: Adaptado de Van der Liden (1984)
Na década de 1990, foram estabelecidos dois critérios de classificação para todo o grupo
das espondiloartrites, denominados critérios Amor e critérios de classificação da European
Spondiloarthropathy Study Group (ESSG). Finalmente, após a introdução das imagens de
ressonância magnética (RM) para avaliação das articulações sacroilíacas, novos critérios de
classificação foram estabelecidos e, uma vez que a lesão estrutural definitiva não seja visível
nas radiografias, mas somente nas imagens de RM, foi proposto a denominação de
espondiloartrite axial não radiográfica (nr – EPAax) (figura 1) (RUDWAILEIT et al., 2005).
Desde então, a Assessment of Spondylo International Society (ASAS) foi desenvolvida e
validou novos critérios de classificação para espondiloartrites axiais, os quais são utilizados nos
dias atuais (figura 2) (RUDWAILEIT et al., 2009).
Figura 1 - Classificação de Espondiloartrite axial não radiográfica
Fonte: Rudwaileit (2005)
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Figura 2 - Critérios de classificação para espondiloartrites axiais
Fonte: Rudwaileit (2009)
De acordo com o sistema de classificação ASAS para espondiloartrite axial, um paciente
com dor lombar crônica e idade de início menor do que 45 anos de idade pode ser classificado
como apresentando espondiloartrite axial se a sacroileíte for aparente nas imagens de RM ou
radiográficas além de, pelo menos, mais uma manifestação clínica característica de
espondiloartrite, ou, na ausência de sacroileíte nas imagens, se houver positividade para o HLA-
B27 além da presença de, no mínimo, mais duas manifestações clínicas características
adicionais de espondiloartrite (RUDWAILEIT et al., 2009).
2.1.3 Manifestações clínicas
Dessa maneira, são manifestações clínicas comuns às espondiloartrites: dor lombar de
ritmo inflamatório, artrite predominante em articulações axiais como ombros e quadris,
oligoartrite periférica assimétrica de predomínio em membros inferiores, entesite, dactilite e
manifestações extra-articulares como uveíte, ileíte e/ou colite, aortite, regurgitação aórtica,
21
anomalias de condução cardíaca como bloqueio atrioventricular de primeiro grau, fibrose de
lobo superior pulmonar, entre outros mais raros (HOCHBERG et al., 2016).
A apresentação mais peculiar é a dor lombar de ritmo inflamatório, que se inicia
invariavelmente antes dos 45 anos de idade e é responsável por cerca de 15% de todos os tipos
de dor lombar crônica. Essa dor lombar é tipicamente silenciosa e crônica (com duração
superior à três meses), de início insidioso, geralmente nas nádegas, pior no início da manhã,
momento em que se associa a rigidez matinal com duração mínima de trinta minutos, aliviada
por exercício ou atividade (flexibilização) e/ou banho quente, agravada pelo repouso e, em
geral, melhora com o uso de anti-inflamatórios não hormonais (HOCHBERG et al., 2016).
O principal achado ao exame físico em pacientes com EA é a perda da mobilidade da
coluna, no entanto, isso pode representar um achado tardio. Podemos observar redução leve a
moderada da expansibilidade torácica, retificação de lordose lombar, cifose exagerada e
contratura do pescoço pra frente. Inflamação articular periférica ou inflamação da êntese
também podem ser observadas (HOCHBERG et al., 2016).
As ênteses, que são as regiões de inserção de um tendão, ligamento, cápsula ou fáscia
no osso, são postuladas como local inicial do processo inflamatório, dentre as quais, são mais
comumente evidenciadas entesites de membros inferiores como no calcâneo, na inserção do
tendão de Aquiles e na fáscia plantar (HOCHBERG et al., 2016).
Entre as manifestações clínicas extra-articulares, a mais comum é a uveíte, tipicamente
a uveíte anterior aguda unilateral, que está presente em 30 a 40% dos casos e tem estreita
associação com a presença do HLA-B27. A manifestação cardíaca mais comum na EA é a lesão
coronariana isquêmica, que pode ser tratada como uma complicação do potencial inflamatório
sistêmico da doença, em que altos níveis de citocinas inflamatórias circulantes são altamente
nocivas ao endotélio vascular coronariano. Além da doença cardíaca isquêmica, outras
complicações da inflamação sistêmica persistente são relatadas, como: amiloidose renal,
osteoporose e fadiga (HOCHBERG et al., 2016).
2.1.4 Fisiopatologia
Sabemos que o fator de risco mais importante para desenvolver espondiloartrite é a
presença do HLA-B27, de forma que parentes de primeiro grau de pacientes com
espondiloartrite apresentam risco quarenta vezes maior de desenvolvimento de espondiloartrite
do que a população geral. Atualmente, o papel exato do HLA-B27 na patogênese desse grupo
22
de doenças ainda é desconhecido, mas três principais hipóteses foram sugeridas (HOCHBERG
et al., 2016).
A primeira e mais lógica é a hipótese do peptídeo artritogênico. Essa hipótese está
relacionada à função apresentadora de antígenos das moléculas HLA e propõe que um peptídeo
específico seja apresentado no contexto do HLA-B27, mas não de outras moléculas HLA, sendo
apresentado para linfócitos T citotóxicos, e que essas células T citotóxicas conduziriam o
processo patológico. Esse peptídeo poderia ter-se originado em bactérias, pelo fato de que a
infecção gastrointestinal precede a artrite na subforma da artrite reativa e a demonstração prévia
de expansão clonal dos mesmos clones de células T no intestino e articulações de um paciente
com artrite reativa. Isso sugere que clones de células T específicos para antígenos bacterianos
podem recircular para articulação e, eventualmente, vir a ser estimulados em uma autorreação
cruzada por peptídeos próprios com origem, por exemplo, na cartilagem (HOCHBERG et al.,
2016).
Outra duas hipóteses alternativas foram propostas para explicar o papel do HLA-B27 na
patogênese das espondiloartrites. Essas hipóteses estão relacionadas à presença de um resíduo
de cisterna no “bolso” ß do HLA – B27 que pode produzir ligações dissulfídicas e, assim, levar
a uma organização estrutural anormal da molécula HLA-B27. A primeira hipótese propõe que
o HLA-B27 possa formar homodímeros de cadeia pesada expressos nas superfícies das células.
Esses homodímeros podem ser diretamente identificados por receptores de imunoglobulinas
natural killers (NK), levando, assim à ativação das células NK e das células T. A segunda
hipótese alternativa é a de que o HLA-B27 se dobre erroneamente sobre o retículo
endoplasmático, o que acarretaria a indução de uma resposta à proteína desdobrada (UPR) e a
subsequente ativação de um programa de resposta pró-inflamatória (HOCHBERG et al., 2016).
Embora as contribuições exatas, e não mutuamente exclusivas, desses diferentes papéis
em potencial do HLA-B27 ainda não tenham sido estabelecidas na espondiloartrite humana, é
importante observar que as interações antígeno-específicas com as células T não são centrais
em qualquer uma das hipóteses aventadas. Os efeitos diretos sobre as células NK e as células
mielóides são, portanto, compatíveis com um papel mais central para as células imunes inatas
na patogêneses das espondiloartrites. Em consequência, atualmente propôs-se que a
espondiloartrite seja uma doença autoinflamatória, e não uma doença autoimune. Uma
característica fundamental das doenças autoinflamatórias é que a inflamação crônica tecido-
específica é desencadeada por estresse celular. Esse conceito se ajusta bem ao papel das
bactérias luminais intestinais, assim como na predileção dessas doenças por tecidos submetidos
23
a intenso estresse mecânico como as articulações que sustentam peso (de membros inferiores)
e a própria êntese (HOCHBERG et al., 2016).
Percepções adicionais relativas à fisiopatologia da inflamação nas espondiloartrites
provêm de estudos genéticos e funcionais que estabeleceram como citocinas específicas pró-
inflamatórias nesse grupo de doença o fator de necrose tumoral (TNF), a interleucina 1 (IL-1),
e o eixo das citocinas IL-23/IL-17. Estudos genéticos demonstram que cerca de 80 a 95% dos
pacientes portadores de espondilite anquilosante são HLA-B27 positivo (HOCHBERG et al.,
2016).
2.1.5 Manifestações laboratoriais e de imagem
Além da evidência laboratorial da presença do HLA-B27, outros achados laboratoriais
na EA são inespecíficos e consistem em alterações comuns às doenças inflamatórias crônicas.
Podem ocorrer anemia normocítica e normocrômica ou hipocrômica, leucocitose leve, aumento
da velocidade de hemossedimentação (VHS) e da proteína C reativa (PCR) e elevações de
fosfatase alcalina e de imunoglobulina A (IgA). Níveis normais de VHS e/ou PCR não excluem
atividade de doença. Essas proteínas reagentes de fase aguda estão aumentadas em cerca de
40% a 50% dos pacientes com atividade axial da enfermidade e em, aproximadamente, 60% na
artrite periférica ativa. O aumento de IgA sérica tem alguma correlação com o aumento de VHS
e PCR, mas a fosfatase alcalina não se correlaciona nem com a atividade da doença, nem com
o tempo de evolução da mesma (HOCHBERG et al., 2016).
A presença de alterações nos exames de imagem são relevantes para o diagnóstico,
classificação, prognóstico e avaliação da atividade patológica e da lesão estrutural nos pacientes
com espondiloartrite (HOCHBERG et al., 2016).
A capacidade de diversas técnicas de imagem em detectar processos patológicos em
potencial é nitidamente diferente. Atualmente, as radiografias convencionais ainda são
consideradas o padrão de referência para a avaliação das alterações estruturais no esqueleto
axial de pacientes com espondiloartrite, embora só identifique alterações tardias. A tomografia
computadorizada (TC) é útil na detecção das alterações estruturais na articulação sacro-ilíaca,
em razão de seu grau de sensibilidade e especificidade superior à radiografia convencional, em
virtude de oferecer imagens multidimensionais com qualidade superior das estruturas
anatômicas, através de cortes em camadas da articulação sacro-ilíaca. No entanto, ambos os
métodos são incapazes de visualizar inflamação ativa. O melhor método para a detecção de
alterações inflamatórias são as imagens de ressonância magnética (RM). Para avaliação do
24
edema da medula óssea como sinal de inflamação na imagem de RM, recomendam-se as
sequências: de recuperação da inversão com T1 curto (STIR), com supressão de gordura em T2
e a sequência ponderada em T1 realizada após a administração de agente de contraste
intravenoso gadolíneo – dietilenotriamina do ácido penta-acético (HOCHBERG et al., 2016).
Na radiografia convencional, os achados típicos são esclerose, erosões ou pseudo-
alargamento das sacro-ilíacas, quadratura vertebral, calcificações discais e/ou pontes ósseas
(entesófitos e sindesmófitos). Na prática clínica, o método adotado para a quantificação das
alterações estruturais na articulação sacro-ilíaca derivam dos critérios modificados de Nova
York para a classificação da espondilite anquilosante (HOCHBERG et al., 2016).
A imagem de RM é especialmente útil na detecção do edema da medula óssea como um
sinal de osteíte no esqueleto axial de pacientes com espondiloartrite axial, além de definir
alterações estruturais típicas como sinovite, capsulite, entesite, erosões subcondrais, esclerose
subcondral, deposição periarticular de gordura, pontes e anquilose óssea (entesófitos e
sindesmófitos). De acordo com a definição da ASAS, para achados positivos de espondiloartrite
na RM de sacro-ilíaca, o sinal hiperintenso/inflamatório na medula óssea próxima à articulação
sacro-ilíaca deve, preferivelmente, estar localizado na região periarticular, e esse achado só é
considerado positivo quando mais de uma lesão está presente em um único corte ou, se houver
apenas uma lesão, essa deve se apresentar em, no mínimo, dois cortes consecutivos. De acordo
com a definição ASAS para achados positivos de espondiloartrite axial na RM de coluna, o
edema de medula óssea deve estar preferencialmente localizado nos vértices de três ou mais
corpos vertebrais (HOCHBERG et al., 2016).
O edema da medula óssea não é uma característica específica das espondiloartrites,
podendo também ocorrer em outras doenças. Os diagnósticos diferenciais mais importantes
para alterações ativas são: sacroileíte séptica, alterações degenerativas, hemangiomas,
espondilodiscites sépticas e hiperostose esquelética idiopática difusa (DISH) (HOCHBERG et
al., 2016).
A mensuração da atividade de doença em uma moléstia predominantemente axial como
a EA não é tarefa fácil. Ao contrário do que ocorre com a artrite reumatoide, a elevação de
provas inflamatórias como VHS e PCR apresenta menor correlação com a manifestação clínica
da doença. Com o objetivo de quantificar a atividade inflamatória, o prejuízo funcional e a
progressão radiográfica da doença, diversos instrumentos de avaliação foram criados. Esses
índices permitem comparar, de forma objetiva, pacientes de diferentes centros e mensurar a
25
resposta ao tratamento nos ensaios terapêuticos, além de auxiliar o médico na avaliação do
paciente em individual (TORRES & CICONELLI, 2006).
2.1.6 Índices compostos de avaliação de atividade de doença
Entre os principais instrumentos de avaliação, destacam-se:
O Bath Ankylosing Spondylitis Disease Activity Index (BASDAI) é um questionário
desenvolvido para medir a atividade da espondilite anquilosante. Provou ser válido,
reprodutível e sensível a mudanças. Consiste em seis questões que abordam domínios
relacionados à fadiga, dor na coluna, dor e sintomas articulares, dor devido ao acometimento
das ênteses, e duas questões relacionadas à qualidade e quantidade de rigidez matinal. O escore
é medido em escala visual analógica (EVA) de 0 a 10 (0 = bom; 10 = ruim). É considerado,
atualmente, um dos mais importantes instrumentos para a utilização em ensaios clínicos. Esse
teste é aplicado sempre no momento do diagnóstico, antes da medicação, quando essa é feita
num centro de infusão, ou em todas consultas com o reumatologista para verificação da eficácia
do tratamento e a atividade da doença. Um BASDAI ≥ 4 indica doença ativa e necessidade de
reavaliação terapêutica, e um BASDAI < 4 indica doença inativa (TORRES & CICONELLI,
2006).
O Bath Ankylosing Spondylitis Functional Index (BASFI) é uma medida desenvolvida
para mensuração de capacidade funcional dos doentes portadores de EA. Esse questionário
compreende 10 itens avaliando o grau de dificuldade para realização de movimentos específicos
do corpo como, por exemplo, flexionar o tronco para apanhar uma caneta no chão e ficar de pé
por 10 minutos, sem apoio e sem sentir desconforto. As respostas são pontuadas conforme a
escala visual analógica de 0 (fácil) a 100 (impossível). O cálculo do BASFI é realizado através
da média das 10 respostas (TORRES & CICONELLI, 2006).
O Bath Ankylosing Spondylitis Metrology Index (BASMI) foi um instrumento criado
para avaliar a mobilidade dos pacientes com EA. Os autores utilizaram 5 medidas para aferir
os movimentos do esqueleto axial e do quadril: a rotação cervical, a distância trago-parede, a
inclinação lombar lateral, o teste de Schober modificado (mede a flexão lombar) e a distância
intermaleolar (medida indireta da mobilidade do quadril). De acordo com o resultado de cada
medida, foram atribuídos os escores 0,1 ou 2. Portanto, o índice BASMI varia de 0 a 10,
conforme a pontuação das 5 medidas (TORRES & CICONELLI, 2006).
26
O Health Assessment Questionnaire modified for the Spondyloarthropathies (HAQS)
compreende um questionário com 25 itens relacionados ao grau de dificuldade em realizar
tarefas de vida diária como: vestir-se, comer, andar, realizar higiene pessoal, e dirigir, entre
outros. Cada resposta pode variar de 0 (sem dificuldade) a 3 (incapaz de realizar a tarefa), e a
medida final é a média entre as maiores notas das 10 categorias funcionais (TORRES &
CICONELLI, 2006).
Os escores radiográficos são os principais instrumentos utilizados para a avaliação da
progressão radiográfica do dano estrutural na doença. Na EA, 2 escores radiográficos são
considerados de maior relevância, o Bath Ankylosing Spondylitis Radiology Index (BASRI) e o
Modified Stoke Ankylosing Spondylitis Spine Score (M-SASSS). Esses escores utilizam
alterações radiográficas presentes nas radiografias de colunas cervical e lombar (M – SASSS)
além das alterações na radiografia de sacroilíacas (BASRI). São eficazes para definição de dano
estrutural já existente assim como definir progressão radiográfica (TORRES & CICONELLI,
2006).
O ASAS-endorsed disease activity score (ASDAS) foi o último escore a ser
desenvolvido, em 2009, é utilizado para mensurar a atividade de doença e inclui 3 questões do
BASDAI, além da avaliação global da atividade de doença pelo paciente (por EVA de 10 cm)
e das dosagens de provas inflamatórias (VHS ou PCR). Há uma fórmula específica para o
cálculo desse índice e foram recomendados os seguintes pontos de corte: inatividade de doença,
< 1,3, atividade leve entre 1,3 e 2,1, atividade elevada entre 2,1 e 3,5, atividade muito elevada
> 3,5 (Figura 3) (MACHADO et al., 2018).
Figura 3 - Atualização da nomenclatura para o escore de atividade ASDAS
Fonte: Machado (2018)
Todos os índices supracitados foram validados cientificamente, apresentam boa
confiabilidade e têm a função de produzir uma visão padronizada dos doentes com espondilite
anquilosante e, desse forma, permitir a análise coletiva e a comparação entre os diversos centros
especializados. No entanto, devem ser interpretados com muita cautela diante do caso
individual e nunca devem sobrepujar a impressão do médico que examina o paciente
(MACHADO et al., 2018).
27
2.1.7 Tratamento
O diagnóstico precoce, a educação do paciente e a fisioterapia são essenciais para o
tratamento bem sucedido da espondilite anquilosante (REGEL et al., 2017). Há pouco tempo,
o grupo ASAS publicou recomendações para o tratamento da espondilite anquilosante (EA),
que integram as recomendações da European League Against Rheumatism (EULAR) (REGEL
et al., 2017; SEPRIANO et al., 2017; VAN DER HEIJDE et al., 2017). Essas recomendações
podem ser resumidas em 11 afirmações objetivas, que são as seguintes:
1. Tratamento geral: o tratamento dos pacientes com EA deve ser ajustado de acordo
com manifestações atuais da doença (axiais, periféricas, extra-articulares), com o
nível dos sintomas atuais, com os indicadores prognósticos e a condição clínica geral
do paciente;
2. O monitoramento da doença deve incluir parâmetros clínicos, testes laboratoriais e
técnicas de imagem;
3. As bases do tratamento não farmacológico são orientação do paciente, prática
regular de exercício físico, com exercícios domiciliares e fisioterapia
supervisionada, associação de pacientes e grupos de autoajuda;
4. Manifestações extra-articulares como psoríase, uveíte e doença inflamatória
intestinal devem ser tratados em colaboração com os respectivos especialistas. Os
reumatologistas devem estar cientes do aumento do risco de osteoporose e doença
cardiovascular;
5. Os anti–inflamatórios não esteroidais (AINE) são recomendados como
medicamentos de primeira linha para o tratamento medicamentoso de pacientes com
EA que apresentem dor e rigidez;
6. Os analgésicos como o paracetamol e os derivados de opióides podem ser
considerados para dor residual depois que os tratamentos previamente
recomendados falharem, forem contraindicados ou mal tolerados;
7. Injeções de glicocorticoides direcionados para o local da inflamação
musculoesquelética podem ser consideradas. Porém, o uso sistêmico de
glicocorticoides para doença axial não é sustentado por evidência científica;
8. Não existem evidências de eficácia das drogas modificadoras de curso de doença
sintéticas (DMCDs), como o Metotrexate e a Sulfassalazina, no tratamento da
28
doença axial. A sulfassalazina pode ser considerada em pacientes com artrite
periférica;
9. O tratamento com imunobiológicos antifator de necrose tecidual (anti – TNF) deve
ser administrado aos pacientes com atividade de doença persistentemente elevada, a
despeito dos tratamentos convencionais. Não existem evidências que sustentem o
uso obrigatório de DMCDs antes ou em concomitância ao tratamento anti – TNF em
pacientes com doença axial. Não existem evidências que sustentem diferença de
eficácia entre os diversos inibidores de TNF no tratamento da doença axial e/ou
articular/entesal. Os imunobiológicos inibidores da interleucina 17 também estão
cientificamente comprovados em estudos de fase 3 como eficazes para o tratamento
da espondiloartrite axial entre eles o Secuquinumabe. 7
10. Deve-se considerar intervenções cirúrgicas ortopédicas como artroplastia de quadril
ou osteotomias nos casos de deformidades incapacitantes graves;
11. Se ocorrer alteração significativa no curso da doença, outras causas que não a
inflamação, como fratura espinhal, devem ser consideradas e investigadas.
Segundo as recomendações do grupo ASAS, pode-se facilmente observar que os AINEs
e os bloqueadores de TNF são considerados os mais importantes agentes de terapia
farmacológica, que deve ser combinado com terapia não farmacológica durante todo curso da
doença.
Atualmente, existem cinco principais agentes biológicos que visam o TNF-α: o
infliximabe, um anticorpo monoclonal IgG1 quimérico (1/4 murino e ¾ humano), o etanercepte,
uma proteína solúvel de fusão IgG1 recombinante do receptor 75KDa do TNF, e os anticorpos
monoclonais humanizados adalimumabe e golimumabe, assim como certolizumabe, um anti –
TNF PEGuilado livre de Fc. Todos os cinco inibidores já foram aprovados para o tratamento
da espondilite anquilosante e estão disponíveis no Brasil, nos Estados Unidos, na União
Européia e em muitas outras partes do mundo (HOCHBERG et al., 2016).
É necessário fazer algumas recomendações no que diz respeito a quais pacientes com
EA devem ser tratados com bloqueadores de TNF, especialmente aqueles com histórico de
possíveis efeitos colaterais, tendo em vista o custo relativamente alto desses medicamentos.
Desse modo, preferencialmente devem ser tratados pacientes com a melhor relação risco –
benefício. Recentemente, foi atualizada uma declaração do consenso ASAS quanto ao uso de
agentes anti – TNF em pacientes com EA. De acordo com essas recomendações, para iniciar
um tratamento anti – TNF em paciente portador de EA: um diagnóstico de EA ou nr – EPAax
29
deve ser estabelecido seguindo os critérios ASAS; esse paciente precisa apresentar insucesso
terapêutico de, no mínimo, dois AINEs e/ou sulfassalazina (quando indicada), por um período
de quatro semanas; manter atividade de doença definida através de índice BASDAI ≥ 4 e
apresentar opinião positiva de uma especialista (reumatologista) baseados nos achados de
elevação de PCR e/ou VHS e/ou exame de imagem em RM positiva (HOCHBERG et al., 2016).
Embora a EA seja uma condição crônica, pode apresentar um tratamento com curso
variável. O fator de pior prognóstico inclui doença do quadril, enquanto os riscos de progressão
incluem elevação dos marcadores inflamatórios, lesão radiográfica na coluna e tabagismo
(HOCHBERG et al., 2016).
Sendo assim, após todo o exposto acerca de definição, epidemiologia, patogênese,
associação genética, quadro clínico, manifestações radiológicas, índices de avaliação de
atividade de doença e tratamento da espondilite anquilosante, vamos agora compreender sobre
o BiobadaBrasil e em qual contexto relacionado a espondilite anquilosante esse estudo se
encaixa.
2.2 BIOBADABRASIL
2.2.1 Histórico
O tratamento com drogas modificadoras do curso da doença (DMCDs) na espondilite
anquilosante e na artrite reumatóide (AR), em monoterapia ou em combinação, permite o
controle da inflamação, do dano estrutural e do déficit funcional produzidos pela doença em
uma grande proporção de pacientes. No entanto, aproximadamente entre 20% a 30% dos
pacientes não atingem esse controle. Nestes pacientes, os antagonistas do TNF (fator de necrose
tumoral) – infliximabe, etanercepte e adalimumabe - e outras moléculas – rituximabe,
abatacepte e tocilizumabe -, que em conjunto são denominados “agentes biológicos” por
derivarem de processos biotecnológicos, têm demonstrado eficácia em ensaios clínicos, em
monoterapia ou, de preferência, em combinação com DMCDs. Estas terapias biológicas
também são eficazes em outras doenças inflamatórias crônicas, sendo algumas indicações
aprovadas, mas outras utilizadas como “uso compassivo”. A introdução no mercado destes
tratamentos trouxe como consequência uma revolução na especialidade, devido à opção
terapêutica, e também pelo custo econômico elevado (TITTON et al., 2011).
Os agentes biológicos, nas doenças reumáticas, têm como objetivo regular o
desequilíbrio celular e molecular próprio da inflamação crônica. São anticorpos monoclonais
dirigidos contra moléculas ou células implicadas na inflamação ou contra seus receptores. Estas
30
moléculas possuem mecanismos de ação, propriedades farmacocinéticas, e vias de
administração diferentes, gerando aspectos específicos na segurança de cada fármaco. Os
ensaios clínicos dos agentes biológicos demonstraram problemas leves de segurança como
reações alérgicas, especialmente quando a administração é endovenosa ou quando suas
moléculas contemplam partes não-humanizadas. Também foram observadas taxas elevadas de
infecções graves, não confirmadas em todos os estudos, por vários desses não ter poder
estatístico para demonstrar diferenças com placebo. Entretanto, a segurança de moléculas com
alvos estrategicamente eleitos para neutralizar o processo inflamatório crônico, mas com muitos
efeitos também em outros níveis, é complexa (HOCHBERG et al., 2016).
A necessidade de seguir de forma detalhada a introdução de terapias com potencial
tóxico desconhecido, como são estes moduladores imunológicos, deve ser um objetivo de saúde
pública e de fóruns diversos. A estratégia mais apropriada foi a criação de um registro de
tratamento. Este tipo de registro é fundamental para poder estabelecer a probabilidade de
ocorrência de um efeito adverso concreto fora dos ensaios clínicos (TITTON et al., 2011).
No ano de 2000, com a aprovação do primeiro agente biológico na Espanha, a Agência
Espanhola de Medicamentos e Produtos Sanitários (AEMyPS) (órgão semelhante a ANVISA
no Brasil) considerou oportuno estabelecer um estudo longitudinal tipo registro de tratamento
que proporcionaria informação sobre a segurança destes medicamentos, como complemento
dos sistemas de farmacovigilância institucionais. Este projeto foi desenvolvido com a
Sociedade Espanhola de Reumatologia e denominado de BIOBADASER (Banco de dados dos
agentes biológicos da Sociedade Espanhola de Reumatologia) (CARMONA et al., 2005). A
intenção era tornar mais homogêneos os estudos de acompanhamento similares que já haviam
sido implantados, ou que estavam em vias de serem implantados, em países vizinhos. Este
registro espanhol continua ativo e, recentemente, sua metodologia foi disponibilizada para
vários países da América Latina, o BIOBADAMÉRICA (CARMONA et al., 2005).
No Brasil, a Sociedade Brasileira de Reumatologia assumiu a responsabilidade do
projeto, denominado BiobadaBrasil, e indicou um grupo de investigadores para o
desenvolvimento do registro de terapias biológicas, de forma independente de interesses da
indústria farmacêutica. Um registro com desenho específico foi necessário enquanto a
estimativa de risco de eventos adversos era muito difícil com outros sistemas de
farmacovigilância, onde não se conhecia o denominador, nem se procurava ativamente a
ocorrência dos efeitos adversos (TITTON et al., 2011). Os ensaios clínicos não são também a
situação ideal enquanto muitas vezes o tamanho da amostra e o tempo de acompanhamento são
31
insuficientes para definir a ocorrência de eventos de baixa freqüência. O registro deveria contar
com um grupo controle adequado (como o estudo espanhol conta com a coorte EMECAR) que
permita calcular estimativa do risco de um evento em pacientes similares, e não só frente à
população geral. Sem este grupo controle, não seria possível saber se uma comorbidade
determinada é mais frequente em pacientes em tratamento com agentes biológicos ou se trata
de uma comorbidade frequente em pacientes com enfermidades reumáticas inflamatórias, que
são patologias com elevada morbidade por si só. O EMECAR (1999 -2005) é uma coorte de
788 pacientes com artrite reumatóide, selecionados aleatoriamente em 34 centros da Espanha,
iniciada antes do uso habitual dos agentes biológicos, e cujo objetivo principal era a estimativa
de incidência de comorbidades específicas em artrite reumatóide. EMECAR fornece
informações de 3.080 pacientes / ano (CARMONA et al., 2005).
No Brasil, uma coorte de pacientes com espondilite anquilosante e artrite reumatóide
sem uso de agentes biológicos, é acompanhada simultaneamente ao BiobadaBrasil como grupo
controle. Podemos dizer que a eficácia e aceitação pelos pacientes das terapias biológicas é um
fato, mas a eficiência e segurança de longo prazo em populações não-selecionadas, entretanto,
não estava suficientemente estudada. Além disso, novas moléculas com diferentes alvos
imunológicos encontram-se em estudo, e teremos brevemente um extenso arsenal terapêutico,
não só para o tratamento da EA e AR, mas para doenças inflamatórias de difícil controle
(TITTON et al., 2011).
2.2.2 Pacientes incluídos
O BiobadaBrasil é um registro de tratamento, onde os pacientes são incluídos à medida
que começam o uso de qualquer terapia biológica e permanecem em acompanhamento mesmo
após a suspensão do medicamento. Como não sabemos quais os efeitos de longo prazo destas
drogas, consideramos que os pacientes estão expostos de forma indefinida, em especial para
eventos adversos como câncer ou infecções de evolução subaguda ou crônica, sendo
acompanhados mesmo após a suspensão do medicamento. Os pacientes que entram no registro
serão avaliados a qualquer momento em que houver modificações no tratamento ou desde que
haja evento adverso. No entanto, de maneira regular, a cada seis meses para fármacos
recentemente comercializados e a cada ano para todos os agentes biológicos, será realizada uma
monitorização “in situ” com análise dos dados do documento fonte, o prontuário
(BIOBADABRASIL. Manual, 2009).
32
Esse registro é estabelecido sem data limite de observação. Concluindo, os pacientes
entram quando recebem o primeiro tratamento e são seguidos indefinidamente, mesmo após ser
suspensa a terapia biológica, para identificação de eventos adversos que possam ocorrer mesmo
após a suspensão (BIOBADABRASIL. Manual, 2009).
São incluídos todos os pacientes que:
1. Iniciem tratamento com terapia biológica nos centros participantes,
independentemente da doença reumatológica para o qual foi indicado (uso aprovado ou
compassivo).
2. Estiverem em tratamento com agentes biológicos ou tenham suspendido, por qualquer
causa, sempre e quando não haja transcorrido mais de 1 ano desde que receberam pela última
vez o tratamento, e tenha todos os dados necessários para o registro (do paciente, do tratamento
e de eventos adversos).
3. Autorizem o registro de dados de acordo com o termo de consentimento informado.
Não é critério de exclusão que o paciente esteja incluído em um estudo prévio, desde que o
tratamento utilizado pelo paciente seja conhecido (BIOBADABRASIL. Manual, 2009).
2.2.3 Cenário atual
Dessa maneira, o registro brasileiro de monitorização de terapias biológicas em doenças
reumáticas – BiobadaBrasil, um estudo de coorte multicêntrico prospectivo e de duração
indeterminada, foi implementado pela primeira vez em 26/08/2008 no Hospital das Clínicas da
Universidade Federal do Paraná, e, desde 01/06/2009, já se encontra disponível para acesso
através do site da Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR) – www.reumatologia.org.br.
Atualmente, segundo dados disponíveis no site da SBR, trinta e dois centros brasileiros
espalhados por todas as regiões do país fazem parte desse projeto, entre os quais, o Hospital
Geral Universitário (HGU), em Cuiabá, coordenado pelo Prof. Dr. Vander Fernandes.
Conforme os dados publicados no site da SBR, em outubro de 2017, esses 32 centros
participantes já incluíram 3140 pacientes, relataram 4779 tratamentos e 5513 eventos adversos.
2.3 TABAGISMO E ESPONDILITE ANQUILOSANTE
No ano de 2005, Ward M. M. e colaboradores (et col.) realizaram um corte transversal
do estudo observacional Prospective Study of Outcomes in Ankylosing Spondylitis (PSOAS),
33
um estudo originalmente desenvolvido com o objetivo principal de avaliar marcadores
genéticos e gravidade da espondilite anquilosante. Foram incluídos 326 pacientes norte-
americanos que, além de preencherem os critérios modificados de Nova York para classificação
como EA, também relatavam mais de 20 anos de duração dos sintomas persistentes. Para
avaliação de limitação funcional, utilizou-se medidas de Bath Ankylosing Spondylitis
Functional Index (BASFI) e Health Assessment Questionnaire modified for the
Spondyloarthropathies (HAQS). Os fatores de risco considerados para associação com
limitação funcional foram idade, sexo, etnia, nível educacional, tabagismo (tabagistas ativos,
ex - tabagistas e não tabagistas), carga tabágica em anos/maço, número de comorbidades
clínicas relatadas, nível de recreação física na adolescência e juventude, taxa de atividade física
ocupacional. A média de idade desses pacientes foi 55,0 ± 10,7 anos, duração média dos
sintomas da EA foi de 31,7 ± 10,2 anos. As comorbidades mais comuns foram hipertensão
arterial sistêmica (35,6%), úlcera péptica (19,3%), depressão (16%), osteoporose (12,6%) e
asma (10,1%). Na análise univariada, tanto escore de BASFI e HAQS foram maiores conforme
idade avançada, longa duração da EA, maior número de comorbidades associadas e altas taxas
de atividade física ocupacional. Pacientes que ocuparam funções laborais com necessidade de
trabalho braçal mais extenuante apresentaram maiores limitações funcionais. Tabagistas ativos
apresentaram escores BASFI e HAQs muito mais elevados do que não fumantes e/ou ex –
tabagistas (p < 0,001). Entre tabagistas ativos e ex – tabagistas, não houve associação entre os
escores de BASFI ou HAQS e a carga tabágica quantificada em anos/maço. Em análise
multivariada, o escore BASFI resultou em 11,8 pontos a mais entre os tabagistas ativos quando
comparados com não tabagistas ou ex – tabagistas (p = 0,006). Nessa mesma análise, o escore
HAQS também apresentou associação significativa com o tabagismo ativo (p = 0,005). Durante
discussão dos resultados, os autores analisam que, nesse estudo, enquanto os tabagistas ativos
apresentaram aumento de limitações funcionais, ex – tabagistas e não tabagistas apresentaram
graus de limitações funcionais semelhantes. Além disso, não houve associação com
significância estatística entre os escores BASFI ou HAQS e a carga tabágica quantificada em
anos/maço. Dessa maneira, esse grupo de autores norte-americanos sugerem que a associação
entre o tabagismo e a limitação funcional nesses pacientes não deve ser por efeito direto do
tabaco, mas, de outra maneira, o tabagismo apresenta-se como um marcador de hábitos de vida
não saudáveis e com grande associação com sedentarismo.
Poddubnyy D e col., através de um estudo de coorte publicado em 2012, conseguiram
relacionar o tabagismo com a progressão radiográfica axial. Foram selecionados 210 pacientes
com espondiloartrite axial da coorte alemã German Spondyloarthritis Inception Cohort
34
(GESPIC), 115 pacientes com espondilite anquilosante (seguiam critérios modificados de Nova
York) e 95 pacientes com espondiloartrite não radiográfica (seguiam os critérios ASAS).
Radiografias das colunas lombar e cervical e das articulações sacroilíacas foram realizadas no
início do estudo e repetidas após 2 anos de seguimento. As alterações radiográficas foram
classificadas de acordo com modified Stoke Ankylosing Spondylitis Spine Score (mSASSS), em
que recebem pontuações positivas a presença de erosões, esclerose, quadratura vertebral e
sindesmófitos. Progressão radiográfica foi definida como piora de mSASSS ≥ 2 pontos. De
acordo com essa definição, no total, 14,3% dos pacientes da coorte inteira apresentaram
progressão radiográfica. Essa taxa foi maior em pacientes com espondilite anquilosante (20%
[95% CI 13,7 – 28,2%]) comparados com pacientes com espondiloartrite não radiográfica
(7,4% [95% CI 3,6 – 14,4%]). Após análise de regressão logística univariada nos pacientes de
toda a coorte, foram identificados como fatores preditores de progressão radiográfica a presença
de sindesmófitos no início da avaliação (OR 6,29), presença de anquilose nas sacroilíacas (OR
3,14), níveis de proteína C reativa elevados (OR 2,47), níveis de velocidade de
hemossedimentação elevados (OR 4,04) e tabagismo ativo (OR 2,75). Dessa forma, 3 variáveis
foram associadas, de forma independente, à progressão radiográfica na espondiloartrite axial, e
passaram a ser consideradas fatores preditores dessa progressão, entre eles: presença de dano
radiográfico prévio, provas de atividade inflamatórias elevadas e o tabagismo.
Em 2013, em uma carta ao leitor publicada na Annals of the Rheumatic Diseases, Denis
Puddubnyy e sua equipe alemã reavaliaram aqueles dados coletados da coorte GESPIC (vide
parágrafo acima), focando agora na associação dose- dependente do tabagismo e a progressão
radiográfica axial (definida como piora de mSASSS ≥ 2 pontos em 2 anos), além da atividade
sistêmica inflamatória. Nessa nova análise de dados, a intensidade do tabagismo foi
padronizada em 3 grupos: não tabagistas, tabagistas ativos com carga tabágica moderada ≤ 10
cigarros ao dia, tabagistas ativos com carga tabágica intensa > 10 cigarros ao dia. Na análise
univariada entre os subgrupos de exposição ao tabagismo de maneira geral, houve diferença
estatisticamente significativa na progressão radiográfica ocorrida entre o grupo de tabagistas
intensos > 10 cigarros ao dia – piora de mSASSS 2,2± 4,6 unidades – e os tabagistas moderados
≤ 10 cigarros ao dia – piora de mSASSS 0,48± 1,48 unidades, com p = 0,006. Também houve
diferença significativa quando comparados o grupo de tabagistas intensos e não tabagistas
(esses últimos com piora de mSASSS 0,52± 1,71 unidades, com p = 0,001. A análise separada
de subgrupos com Espondilite Anquilosante ou espondiloartrite não radiográfica, mostrou que
as diferenças em mSASSS foram claras e estatisticamente significativas no subgrupo de
espondilite anquilosante (piora de mSASSS 3,12 ± 5,54 unidades em tabagistas intensos, 0,57
35
± 1,70 unidades em tabagistas moderados e 0,58 ± 1,78 unidades em não tabagistas – p = 0,002).
No subgrupo de espondiloartrite não radiográfica, não houve diferença clara de piora de
mSASSS após 2 anos de seguimento. Após análise de regressão logística multivariada, ajustada
no baseline para presença de sindesmófitos, nível de proteína C reativa (PCR), sexo, presença
de sacroileíte radiográfica, uso de AINEs e anti – TNFs, os fumantes intensos apresentaram
odds ratio para progressão de mSASSS ≥ 2 pontos de OR 3,48 (95% CI 1,06 a 11,42), porém p
= 0,039. Também evidenciaram relação dose – dependente entre tabagismo e níveis de PCR
mensurados a cada 6 meses durante 2 anos: 6,3 ± 6,6 mg/l em não fumantes e 12,4 ± 12,9 mg/l
em fumantes pesados, com p = 0,002. Dessa forma, em adição ao estudo prévio publicado em
2012, esse grupo alemão demonstrou também que o efeito do tabagismo na progressão
radiográfica axial da espondiloartrite axial é dose-dependente e mediada por inflamação
sistêmica acentuada nos tabagistas.
Ainda em 2012, Chun-Hsiung Chen e seu grupo de pesquisadores de Taiwan, avaliaram,
em um estudo transversal, a associação entre tabagismo e atividade de doença, habilidades
físicas funcionais como mobilidade e inflamação sistêmica em pacientes com espondilite
anquilosante. Setenta e cinco pacientes Chineses, com EA segundo critérios modificados de
Nova York de 1984, do sexo masculino, foram selecionados no Taipei Veterans General
Hospital. Esses pacientes responderam um questionário com dados demográficos, atividade de
doença, avaliação subjetiva global, habilidades funcionais e hábitos tabágicos. Inicialmente,
esses pacientes foram divididos em 2 subgrupos: tabagistas (incluindo tabagistas ativos e ex-
tabagistas) e não tabagistas. Na comparação clínica entre esses 2 subgrupos, não houve
diferença com significância estatística entre a idade de vida, idade de início e tempo de duração
da doença e taxa de envolvimento periférico. Entre os parâmetros de análise de mobilidade
física, o subgrupo de pacientes tabagistas apresentaram redução significativa nas medidas de
índice de Schober modificado (p < 0,001), grau de rotação cervical (p = 0,034), flexão lombar
lateral (p = 0,002) e expansão torácica (p = 0,016). Além disso, a distância occipto – parede e
as dosagens séricas de velocidade de hemossedimentação (VHS) foram significativamente
maiores nos pacientes tabagistas (p = 0,003 e 0,03 respectivamente). Entre os 35 pacientes
tabagistas, a intensidade e duração de tempo do tabagismo teve correlação estatisticamente
significativa com piores escores de BASFI (r 0,481, p=0,05), grau de rotação cervical (r -0,401,
p=0,031), distância dedo – chão (r 0,485, p=0,004) e distância occipto – parede (r 0,402,
p=0,021). Na análise de regressão logística multivariada, os pacientes com espondilite
anquilosante e tabagistas também apresentaram risco relativo aumentado para elevação de VHS
(OR 3.34, 1.08 a 10.34 – IC 95%) e PCR (OR 6.06, 1.23 a 29.98 – IC 95%).
36
Zhang S e col. avaliaram o efeito do tabagismo e consumo de álcool na atividade de
doença e funcionalidade física da espondilite anquilosante em 2015. Foram recrutados 425
pacientes com espondilite anquilosante do Hospital Geral Fuzhou (China). Entre eles, 81,9%
eram do sexo masculino, 78,8% apresentavam HLA – B27 positivo e 27,8% (118 pacientes)
eram tabagistas. A média de idade foi 29,2 ± 8,3 anos e o tempo médio de duração de doença
era de 7,5 ± 5,8 anos. Informações sobre o tabagismo foram coletadas no início do estudo, e
foram definidas tanto dicotomicamente entre tabagistas e não tabagistas, assim como
quantificadas em anos/maço de carga tabágica. Não fumantes foram definidos como tendo
fumado menos de 100 cigarros em toda a vida. Informações sobre ex – tabagistas ou exposição
passiva ao tabaco não foram coletadas nesse estudo. Uma análise estatística foi aplicada através
de teste Mann – Whitney u entre tabagistas e não tabagistas. Quando comparados aos não
tabagistas, os pacientes com espondilite anquilosante e fumantes apresentaram, com diferença
estatisticamente significativa, escores mais altos para BASDAI, BASFI, BASMI e piores
parâmetros de atividade e funcionalidade incluindo distância ponta de dedo-chão, avaliação
global da doença através da escala visual analógica (EVA), avaliação de dor noturna (avaliada
através de EVA), e dorsalgia com p < 0,005. Os resultados também indicaram que o tratamento
da espondilite anquilosante nos tabagistas se torna mais difícil.
Em 2017, Zhao S. e col. conseguiram comprovar que a exposição acumulada ao tabaco,
quantificada em anos-maço, está associada à atividade de doença e prejuízo funcional na
espondiloartrite não radiográfica. O estudo recrutou 238 pacientes atendidos consecutivamente
em um centro de referência terciária em um hospital do Reino Unido entre setembro de 2010 a
Dezembro de 2015. Todos os pacientes preenchiam os critérios ASAS para espondiloartrite
axial. A coorte foi predominantemente masculina (76%), com meda de idade em 46,4 anos (SD
± 13,7), tempo médio de duração dos sintomas em 17,1 anos e tempo médio de duração após
diagnóstico de 5 anos. Sessenta e oito por cento (68%) dos pacientes faziam uso de AINEs e
33% eram tratados com anti –TNF. O status do tabagismo foi categorizado em: sempre –
fumantes (ex – fumantes e/ou fumantes ativos) e não – fumantes. Para os sempre – fumantes,
uma dose acumulativa total foi calculada em anos-maço: número de cigarros fumados por dia
multiplicados pelo número de anos de tabagismo dividido por 20. No momento de avaliação,
112 (47%) pacientes eram sempre – fumantes, sendo 78 (33%) pacientes fumantes ativos. A
carga tabágica média entre os sempre – fumantes foi de 20 anos – maço. Quando comparados
os grupos não fumantes e sempre – fumantes, nenhuma diferença com significado estatístico
foi encontrada na média de idade, tempo de duração dos sintomas, presença de manifestações
extra – axiais e uso de AINEs ou anti-TNFs. No modelo de regressão multivariável linear,
37
comparados aos não fumantes, os sempre – fumantes apresentaram escores significativamente
mais altos para atividade de doença (BASDAI ß = 0,91, 95% CI 0.26; 1.55) e funcionalidade
(BASFI ß = 0,82, 95% CI 0.1; 1.53). Na exploração da carga tabágica, o grupo de sempre –
fumantes com 21 a 40 anos-maço apresentou BASDAI 1,6 pontos mais alto e escore BASFI
2,1 pontos mais alto do que o grupo com carga tabágica < 10 anos –maço. O grupo de sempre
– fumantes com carga tabágica > 40 anos –maço apresentou BASDAI 2,6 (0,42; 4,8) pontos
mais alto e escore BASFI 3,2 (0,76; 5,71) pontos mais alto do que o grupo de referência.
A primeira revisão sistemática sobre o tema só foi encontrada na literatura a partir de
2017, quando Virginia Villaverde-Garcia e seus colaboradores revisaram todos os artigos
publicados até 25 de Novembro de 2015; nas fontes MEDLINE, EMBASE e Cochrane Library
up; e que avaliavam o efeito do tabagismo no dano estrutural e piora clínica da espondilite
anquilosante. Um total de 17 artigos foram selecionados: 2 do tipo caso – controle, 11 estudos
transversais, e 4 coortes prospectivas, gerando uma soma total de 4694 pacientes. Fraca
evidência sugere efeito do tabagismo na dor, avalição subjetiva global em saúde, atividade de
doença, mobilidade física e qualidade de vida na espondilite anquilosante. Moderada a boa
evidência científica revelaram altos índices de HAQ-AS entre tabagistas. Cada unidade
adicionada no ASDAS resulta em aumento de 1,9 vs. 0,4 unidades de mSASSS/ em 2 anos em
pacientes espondilíticos tabagistas vs. espondilíticos não tabagistas. Boa evidência sugerem que
o tabagismo por si só [mSASSS ≥ 2 unidades/2 anos: OR = 2.57, 95% CI: 1.25 – 6.05, p =
0,012;] e a carga tabágica promovem progressão de dano radiográfico na espondiloartrite axial
[progressão de mSASSS em tabagistas intensos (> 10 cigarros ao dia): OR 3.57. 95% CI: 1.33
– 9.6, p = 0,012]. Dessa maneira, após revisão dos dados publicados até aquele momento, existe
forte associação entre o tabagismo dose – dependente e a progressão de dano radiográfico na
espondiloartrite axial. Espondilíticos fumantes apresentam piores índices de qualidade de vida
(HAQ-AS) quando comparados aos não fumantes. Porém, a avaliação da relação entre
tabagismo na espondiloartrite axial e dor, atividade de doença e/ou mobilidade física apresenta
nível de evidência pobre e devem ser mais bem estudados, embora o que já está descrito
caminhe para uma mesma direção: espondilíticos tabagistas são piores do que os não tabagistas.
Em 2018, um estudo prospectivo e de observação, elaborado na Turquia por Karlibel I.
A., avaliou o efeito do tabagismo na função sexual de pacientes com espondilite anquilosante.
Foram selecionados 67 pacientes do sexo masculino, com média de idade em 34 anos, que
referiam atividade sexual nas últimas 4 semanas. Pacientes com outras disfunções que
comprovadamente interferem na qualidade sexual como, por exemplo, usuários de
antidepressivos, foram excluídos da amostra. Os pacientes foram divididos em dois grupos:
38
tabagistas (grupo 1, n = 47) e não tabagistas (grupo2, n = 20), de maneira que não existiam
diferenças significativas entre os índices BASDAI, BASMI, BASFI, ASQoL, escala visual
analógica de dor e fadiga desses dois grupos. Os autores compararam o escore e as categorias
de disfunção erétil International Index of Erectile Function (IIEF-5) entre tabagistas e não
tabagistas e comprovaram que esse escore se correlaciona significativamente com BASDAI,
BASMI, BASFI, ASQoL, dor, fadiga e carga tabágica. O escore de avaliação de depressão
(Assessment of the psychological status) mostrou correlação inversa com o IIEF escore
(p<0,001 r = -o,520, P<0,001 e r = -0.508, respectivamente). Dessa maneira, esse estudo nos
mostra uma correlação negativa significativa entre função erétil e alta carga tabágica, dor,
fadiga, atividade de doença, mobilidade física, funcionalidade, qualidade de vida e depressão
em pacientes masculinos com espondilite anquilosante. Entretanto, não houve correlação entre
IIEF escores e status de tabagismo.
Ainda em 2018, Zhao S. e sua equipe britânica, de maneira semelhante à proposta dessa
tese, analisaram dados um registro prospectivo de terapia imunobiológica na espondilite
anquilosante: o Britsh Society for Rheumatology Register for Ankylosing Spondylitis (BSRBR-
AS). O objetivo ao analisar os dados desse registro de coorte foi definir se existe associação
entre o tabagismo e manifestações extra-axiais da espondilite anquilosante ou outros
marcadores de gravidade de doença como fadiga, sonolência, ansiedade e depressão. Essa
análise enfocou os dados iniciais (do baseline), em corte transversal, realizados após qualquer
exposição à terapia imunobiológica, coletados de Dezembro 2012 a Junho de 2017. Os
participantes que foram incluídos na análise preenchiam os critérios ASAS para espondiloartrite
axial e preencheram o questionário com definição do status de tabagismo em: nunca fumaram,
ex – tabagistas, tabagistas ativos leves (≤ 10 cigarros ao dia) ou tabagistas ativos pesados (> 10
cigarros ao dia). 2031 participantes foram incluídos na análise, sendo 68% do sexo masculino,
com média de idade de 49 anos e tempo médio de duração dos sintomas de 20 anos. 889 (44%)
pacientes se decretaram não fumantes, 652 (32%) eram ex–tabagistas e 490 pacientes tabagistas
ativos, sendo 199 (55%) tabagistas leves e 166 (45%) tabagistas pesados. Quando comparados
aos não fumantes, tabagistas ativos apresentaram menor risco relativo de desenvolver uveítes
[OR 0.7, 95% CI 0.5 – 0.9] e maior risco de psoríase [ORadj 1.6, 95% CI 1.1 – 2.3]. Ex –
tabagistas e tabagistas ativos apresentaram sinais de gravidade de doença maiores do que os
que nunca fumaram, com BASDAI mais alto (ß = 0.3, 95% CI 0.1 – 0.6; ß = 0.9, 95% CI 0.6 –
1.2) e BASFI mais alto (ß = 0.5, 95% CI 0.2 – 0.8; ß = 1.3, 95% CI 01.0 – 1.6), com p < 0,001.
Associações similares foram observadas para fadiga, sonolência, ansiedade e depressão com p
39
< 0,001. Durante a discussão do artigo, os autores comentam que a associação paradoxal entre
tabagismo e uveítes é interessante, mas necessitaria de investigações posteriores.
Um ano após, a mesma equipe britânica de Zhao S.S., publicaram na Annals of the
Rheumatic Diseases uma carta ao leitor tentando elucidar melhor a relação entre tabagismo e
uveíte anterior aguda (UAA). Chegou-se a pensar, hipoteticamente, que esse paradoxo era
consequente à alteração de comportamento, em que, pacientes que evoluíam com uveíte anterior
aguda mais provavelmente interrompiam o tabagismo; porém, essa hipótese ainda não
explicava o risco relativo mais alto para UAA em pacientes que nunca haviam fumado. Dessa
maneira, em um desdobramento de estudo, esse grupo reavaliou os dados do registro Britsh
Society for Rheumatology Register for Ankylosing Spondylitis (BSRBR-AS), relacionando o
número de episódios documentados de UAA e o status do tabagismo. Após ajustamento para
idade, gênero, duração dos sintomas, escore BASDAI e uso de anti–TNF, 632/2420 (26%)
pacientes com espondiloartrite axial foram diagnosticados com UAA, com variação de 0 a 15
episódios de uveíte em um 1 ano, e quando comparados ao pacientes que nunca fumaram, tanto
os tabagistas ativos (IRR 1.33; 95% CI 0.92 – 1.92) quanto os ex – tabagistas (IRR 1.19; 95%
CI 0.88 – 1.59) apresentaram incidência mais alta de UAA, porém com uma diferença
estatisticamente não significativa. Dessa maneira, conclui-se uma tendência à associação do
tabagismo com aumento de incidência de uveíte anterior aguda nos pacientes com
espondiloartrite axial.
Em 2019, esse mesmo grupo de pesquisadores liderado por Zhao S.S.; publicaram na
Arthritis Research & Therapy um novo artigo a partir da análise dos dados daquela mesma
coorte prospectiva britânica de terapia imunobiológica na espondilite anquilosante: o Britsh
Society for Rheumatology Register for Ankylosing Spondylitis (BSRBR-AS). Dessa vez, os
pesquisadores analisaram o impacto do tabagismo na descontinuação da terapia biológica anti
– TNF, analisando cada causa especificamente. Oitocentos e quarenta pacientes da coorte que
iniciaram terapia anti – TNF (Humira, Enbrel/Benepali, Cimzia e Simponi) e responderam ao
questionário de status do tabagismo (nuca fumaram/ex – tabagistas/fumantes ativos) foram
selecionados de dezembro de 2012 a junho de 2017. Entre eles, 758 pacientes foram incluídos
na análise. A terapia anti – TNF foi descontinuada em 174 pacientes (23%). A média de tempo
para essa descontinuação terapêutica foi de 6 meses (variando de 3 a 11 meses). Entre os
pacientes que suspenderam a terapia anti–TNF, 26% pararam devido a infecções, 20% devido
a outros eventos adversos e 44% descontinuaram por ineficácia ou outras razões, com nenhuma
diferença de acordo com o status do tabagismo. Trinta e quatro por cento dos pacientes eram
tabagistas ativos, 30% eram ex–tabagistas e 36% nunca haviam fumado. Tabagistas ativos eram
40
mais jovens (p < 0.001), tinham maior percentual do sexo masculino e apresentavam tendência
à pior condição social e menor nível educacional. Tabagistas ativos apresentaram PCR mais
elevado (p 0.043) e piores índices de avaliação de atividade de doença (p 0.001) e
funcionalidade no início do estudo (baseline) (p < 0.001). Concluíram então que tabagistas que
iniciaram a terapia anti – TNF não apresentavam maior risco de descontinuação terapêutica do
que os pacientes que nunca fumaram.
41
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4 ARTIGO
Tabagismo e espondilite anquilosante: efeitos na atividade da doença e na resposta terapêutica.
Dados BiobadaBrasil
RESUMO
Introdução: O tabagismo tem sido identificado como fator de risco ambiental para
desenvolvimento de doenças reumáticas e interfere na espondilite anquilosante, predispondo a
limitações de habilidades físicas funcionais com redução de mobilidade e aumento de
inflamação sistêmica, piora na progressão radiográfica axial, piora na atividade de doença,
prejuízo funcional, disfunção sexual, aumento de fadiga, sonolência, ansiedade e depressão.
Objetivos: O objetivo desse estudo é determinar os efeitos do tabagismo na atividade da doença
e na resposta terapêutica em pacientes com espondilite anquilosante. Material e métodos:
Foram selecionados pacientes com espondilite anquilosante, acima de 16 anos de idade,
cadastrados no Registro brasileiro de monitorização de terapias biológicas em doenças
reumáticas – BiobadaBrasil, incluídos desde 2010. A presença de espondilite foi definida de
acordo com os critérios classificatórios do grupo ASAS, propostos em 2009. Os pacientes
classificados com espondilite anquilosante foram avaliados em consulta médica. A avaliação
clínica foi baseada na avaliação do índice de atividade de doença Bath Ankylosing Spondylitis
Disease Activity Index (BASDAI) e na falência e/ou necessidade de troca terapêutica.
Informações sobre o tabagismo foram coletadas sob forma dicotômica, com afirmativa ou
negativa para tabagismo atual. Resultados: Entre janeiro de 2010 e janeiro de 2020, foram
catalogados 588 pacientes com espondilite anquilosante que preenchiam os critérios de inclusão
dessa pesquisa, entre os quais, 74% (439) eram do sexo masculino. A idade variou de 16 a 81
anos, com média de 48,8 (DP 12,49) anos. Entre os pacientes avaliados, 14% (83) eram
tabagistas e 86% (505) negaram o tabagismo. Ao separarmos os valores de escore BASDAI
entre os pacientes tabagistas e não tabagistas, o grupo tabagista apresentou média de valores
inferior ao grupo não tabagistas, porém, após análise comparativa, essa diferença não
demonstrou significância estatística (p 0,17). Não foi observada diferença estatisticamente
significativa na frequência de indivíduos que necessitaram trocar a terapia imunobiológica,
assim como pelos motivos da necessidade de troca, com relação ao tabagismo (p 0,767).
47
Conclusões: O tabagismo não se comportou como fator de risco para aumento da atividade de
doença e refratariedade ao tratamento da espondilite anquilosante.
Palavras-chave: Espondilite Anquilosante; Tabagismo; Produtos Biológicos; Evento Adverso;
Eficácia de Tratamento.
ABSTRACT
Background/Objective: Smoking is an environmental risk factor for the development of
rheumatic diseases and interferes with ankylosing spondylitis, predisposing to limitations with
reduced mobility and increased systemic inflammation, worsening in axial radiographic
progression, sexual dysfunction, increased fatigue, drowsiness, anxiety and depression. We
aimed to determine the effects of smoking on disease activity and therapeutic response in
patients with ankylosing spondylitis. Methods: Patients with ankylosing spondylitis aged >16
years, registered in the Brazilian Registry to Monitor Biological Therapies in Rheumatic
Diseases (BiobadaBrasil) since 2010, were included. The presence of spondylitis was defined
according to the Assessment of SpondyloArthritis International Society classification criteria.
Clinical evaluation was based on the Bath Ankylosing Spondylitis Disease Activity Index
(BASDAI) and treatment failure and/or need for therapeutic changes. Information on smoking
was dichotomously collected, with affirmative or negative confirmation of current smoking.
Results: Altogether, 588 patients with ankylosing spondylitis who met the inclusion criteria
were registered between January 2010 and January 2020. Among these, 74% (n=439) were
male. Ages ranged from 16 to 81 (mean ± SD: 48.8±12.49) years. Altogether, 14% (n=83) were
smokers. Smokers exhibited lower mean BASDAI scores than non-smokers, which was not
significant (p=0.17) on comparative analysis. Changes in the immunobiological therapy were
needed in 45.4% (n=267). Among these, 14.9% (n=40) were smokers. Percentage of patients
needing changes in the immunobiological therapy and reasons for these changes with respect
to smoking showed no significant difference (p=0.767). Conclusions: Smoking was not a risk
factor for increased disease activity and refractoriness to ankylosing spondylitis treatment.
Keywords: Spondylitis, Ankylosing; Smoking; Biological Products; Adverse Drug Events;
Treatment Outcome.
INTRODUÇÃO
48
As espondiloartrites soronegativas compõe um grupo de doenças que se inter-
relacionam devido a características clínicas, fisiopatologia e predisposição genética
semelhantes, com forte associação ao antígeno leucocitário humano B27 (HLA-B27)
(HOCHBERG et al., 2016). Dentro do grupo das espondiloartrites, a espondilite anquilosante
e a espondiloartrite indiferenciada constituem as doenças mais comumente diagnosticadas
(HOCHBERG et al., 2016).
A espondilite anquilosante é uma doença crônica e inflamatória que acomete as ênteses.
O envolvimento musculoesquelético é predominantemente axial (sacroileíte e espondilite),
causando lombalgia de ritmo inflamatório. Pode acometer também grandes articulações
periféricas e tendões, causando entesites, dactilites e artrites que predominam em membros
inferiores (HOCHBERG et al., 2016). É uma doença potencialmente debilitante, que pode
causar limitação da mobilidade espinhal progressiva, perda de funcionalidade e redução da
qualidade de vida (ZHANG et al., 2015).
A relação de causalidade entre o tabagismo e doenças inflamatórias sistêmicas já está
descrito na literatura. Sabe-se que o tabagismo reduz a atividade do óxido nítrico e a
vasodilatação, causando injúria endotelial vascular. O tabagismo causa um desequilíbrio entre
mecanismos oxidativos e anti–oxidativos, aumentando a produção de citocinas pró-
inflamatórias como IL-1 ß, IL -6 e TNFα (AYKURT KARLIBEL et al., 2019). Além disso,
alguns constituintes do tabaco atuam como adjuvantes na ativação de células apresentadoras de
antígenos, realçando as imunidades inata e adaptativa (JIANG et al., 2014).
A prevalência do tabagismo nos pacientes portadores de espondilite anquilosante é alta,
podendo corresponder até 50% dos pacientes referindo tabagismo atual e/ou prévio (ZHAO et
al., 2019). Entretanto, a relação causal entre o tabagismo e a gravidade da espondilite
anquilosante é complexa. O tabagismo é muito frequentemente associado a fatores
socioeconômicos, comportamentos relacionados à saúde e comorbidades, de forma que é
essencial ajustar esses fatores quando se explora o tabagismo como um fator de risco
independente e potencialmente modificável no tratamento da espondilite anquilosante (ZHAO
et al., 2019).
Alguns autores já conseguiram produzir evidência científica de que o tabagismo
interfere na espondilite anquilosante, predispondo a limitações de habilidades físicas funcionais
com redução de mobilidade e aumento de inflamação sistêmica (CHEN et al., 2013; WARD et
al., 2005), piora na progressão radiográfica axial (PODDUBNYY et al., 2012; PODDUBNYY
et al., 2013), piora na atividade de doença e prejuízo funcional (ZHAO et al., 2017), disfunção
sexual (AYKURT KARLIBEL et al., 2019), aumento de fadiga, sonolência, ansiedade e
49
depressão (ZHAO et al., 2019). Em contrapartida, estudo recente comprovou que pacientes com
espondilite anquilosante e tabagistas que iniciaram a terapia anti – TNF não apresentavam
maior risco de descontinuação terapêutica do que os pacientes que nunca fumaram (ZHAO et
al., 2019).
Dessa maneira, o objetivo desse estudo é determinar os efeitos do tabagismo na
atividade da doença e na resposta terapêutica em pacientes com espondilite anquilosante.
MÉTODOS
Esse estudo analisa os dados de uma coorte nacional de registro de tratamento de
pacientes reumáticos, selecionando somente aqueles com espondilite anquilosante em
seguimento pelo Registro brasileiro de monitorização de terapias biológicas em doenças
reumáticas - BiobadaBrasil.
População de estudo e critérios de seleção
A população de estudo foi composta por pacientes cadastrados no Registro brasileiro de
monitorização de terapias biológicas em doenças reumáticas – BiobadaBrasil, uma coorte
prospectiva que reúne 32 centros de todo Brasil, entre eles o Hospital Geral Universitário em
Cuiabá - MT, incluídos desde 2010 (TITTON et al., 2011).
Critérios de inclusão:
Os critérios de inclusão que foram aplicados aos pacientes pelos pesquisadores da coorte
BiobadaBrasil foram:
1. Pacientes com qualquer doença reumatológica e que tenham iniciado tratamento com
terapia biológica nos centros participantes, independentemente da doença para o qual
foi indicado (uso aprovado ou compassivo).
2. Pacientes que estavam em tratamento com agentes biológicos ou tenham suspendido,
por qualquer causa, sempre e quando não haja transcorrido mais de 1 ano desde que
receberam pela última vez o tratamento, e tenha todos os dados necessários para o
registro (do paciente, do tratamento e de eventos adversos).
3. Pacientes que autorizem o registro de dados de acordo com o termo de consentimento
informado (BIOBADABRASIL. Manual, 2009).
50
Dentro dessa enorme coorte de pacientes reumáticos, esse estudo selecionou somente
aqueles com diagnóstico de espondilite anquilosante, definidos de acordo com os critérios
classificatórios do grupo ASAS, propostos em 2009 (RUDWAILEIT et al., 2009).
Critérios de exclusão:
Foram excluídos desse estudo os pacientes que apresentavam idade inferior a 16 anos,
pacientes cadastrados no registro BiobadaBrasil mas que apresentavam diagnóstico diferente
de espondilite anquilosante e pacientes que apresentavam dados incompletos no registro.
Não é critério de exclusão que o paciente esteja incluído em um estudo prévio, desde
que o tratamento utilizado pelo paciente seja conhecido (BIOBADABRASIL. Manual, 2009).
Aspectos éticos
O Registro brasileiro de monitorização de terapias biológicas em doenças reumáticas já
foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em pesquisa da Universidade de Cuiabá
(UNIC), registro nº 074 CEP/UNIC/2009 – protocolo 2009-092 (Anexo A). Todos os pacientes
concordaram com o termo de consentimento esclarecido.
Coleta de dados
Os pacientes classificados com espondilite anquilosante foram avaliados pelo grupo de
pesquisadores do BiobadaBrasil em consulta médica, com coleta de dados demográficos,
clínicos e laboratoriais realizada somente na primeira consulta e momento de inclusão desses
doentes no registro (Anexo B).
As variáveis demográficas coletadas foram: idade e gênero. As variáveis clínicas
coletadas foram: presença de algumas manifestações clínicas extra-axiais (acometimento
articular periférico e uveíte); presença de comorbidades prévias ao registro como: cardiopatia
isquêmica, insuficiência cardíaca congestiva, insuficiência renal, neoplasias, diabetes, doença
pulmonar obstrutiva crônica, hipertensão arterial sistêmica, osteoporose, hipercolesterolemia e
infecção por vírus de hepatites B e C; tratamento atual e prévio e evento adverso ao tratamento.
A variável laboratorial coletada foi: pesquisa sérica de HLA-B27.
A avaliação clínica foi baseada na avaliação do índice de atividade de doença Bath
Ankylosing Spondylitis Disease Activity Index (BASDAI), calculado unicamente no momento
de inclusão desses pacientes na coorte.
51
Consultas seriadas e subsequentes foram realizadas pelos pesquisadores do
BiobadaBrasil, com avaliação somente da falência e necessidade de troca de terapia
imunobiológica, quais os motivos da troca de biológico e a incidência de eventos adversos ao
tratamento.
Informações sobre o tabagismo foram coletadas somente na primeira consulta sob forma
dicotômica, com afirmativa ou negativa para tabagismo atual.
Esse estudo utilizou a planilha de dados do BiobadaBrasil, selecionando os pacientes
com espondilite anquilosante.
Análise estatística
As variáveis categóricas foram apresentadas em frequências relativas e absolutas e as
numéricas em uma medida de tendência central e de dispersão. As variáveis numéricas foram
testadas quanto a sua normalidade pelo teste de Shapiro-Wilk e por não atenderem a uma
distribuição normal, foram comparadas pelo teste de Wilcoxon. Uma regressão logística
univariada foi realizada para quantificar a partir do Odds Ratio a relação de risco entre variáveis
que se mostraram significativas pelo teste de Qui-quadrado. As frequências foram comparadas
pelo teste de Qui-Quadrado.
Todos os testes foram bicaldais, aceitou-se como estatisticamente significativo valores
de p < 0,05 dentro de um intervalo de confiança de 95%. Os dados foram analisados pelo
Software IBM SPSS Versão 25.0.0
RESULTADOS
Entre janeiro de 2010 e janeiro de 2020, foram catalogados 3380 pacientes no registro
brasileiro BiobadaBrasil, todos com doenças reumáticas autoimunes, em uso de qualquer
terapia imunobiológica disponível e em seguimento em um dos 32 centros participantes. Entre
esses, 588 pacientes foram classificados com espondilite anquilosante e preenchiam os critérios
de inclusão da presente pesquisa. Entre os pacientes com espondilite anquilosante, 74% (439)
eram do sexo masculino. A idade variou de 16 a 81 anos, com média de 48,8 (DP 12,49) anos,
e a distribuição da frequência das idades é apresentada na Figura 4.
52
Figura 4 - Histograma demonstrando a distribuição da frequência das idades dos pacientes com
espondilite anquilosante em seguimento no BiobadaBrasil entre janeiro/2010 a janeiro/2020
Entre os 588 pacientes avaliados, 14% (83) eram tabagistas e 86% (505) negaram o
tabagismo. Entre os 409 pacientes testados para a presença do HLA-B27, 74% (316)
apresentaram positividade das amostras (Tabela 2).
Tabela 2 - Características dos pacientes com espondilite anquilosante em seguimento no
BiobadaBrasil entre janeiro/2010 a janeiro/2020
Variável % (n=588)
Sexo Masculino 74,7 (439)
Tabagistas 14 (83)
Não tabagistas 86 (505)
HLA-B27 74 (316)
Duzentos e quarenta e quatro pacientes apresentavam acometimento articular periférico
e 104 pacientes apresentavam uveíte. A tabela 3 apresenta as frequências relativas e absolutas
desses pacientes quanto a presença ou não do tabagismo.
Tabela 3 - Frequências relativas e absolutas das manifestações clínicas extra-axiais dos
pacientes com espondilite anquilosante em seguimento no BiobadaBrasil entre janeiro/2010 a
janeiro/2020
Manifestação Clínica Tabagismo Não Tabagismo p OR
53
% (n) % (n)
Uveíte 7,2 (6) 19,4 (98) 0,007 0,324
Artrite Periférica 36,1 (30) 42,4 (214) 0,286 -
OR: odds ratio
Foi encontrado uma frequência maior, estatisticamente significativa, daqueles que se
manifestaram com uveíte e que não eram tabagistas. A regressão logística entre tabagismo e a
presença ou não de uveíte demonstrou valor de Odds Ratio 0,324 (p = 0,01), sugerindo que o
tabagismo diminua o risco de ocorrência de uveítes.
A presença e distribuição percentual das comorbidades apresentadas pelos pacientes
com espondilite anquilosante desse estudo está descrita na Tabela 4.
Tabela 4 - Perfil epidemiológico segundo comorbidades dos pacientes com espondilite
anquilosante registrados no BiobadaBrasil entre janeiro/2010 a janeiro/2020
VARIÁVEIS N (TOTAL 588) %
HAS 116 19,72
TABAGISMO 83 14,11
HIPERCOLESTEROLEMIA 43 7,31
OSTEOPOROSE 28 4,76
DIABETES 28 4,76
CARDIOPATIA
ISQUÊMICA
5 0,85
INSUFICIÊNCIA RENAL 5 0,85
AMILOIDOSE 2 0,34
SD. SJOGREN 2 0,34
DPOC 2 0,34
CÂNCER 2 0,34
INSUFICIÊNCIA
CARDÍACA
0 0
HEPATITE B 3 0,51
HEPATITE C 2 0,34
A atividade de doença da espondilite anquilosante foi mensurada através do cálculo do
escore BASDAI realizado na primeira consulta com o paciente, no momento de introdução dos
dados desses doentes na coorte BiobadaBrasil. Ao separarmos os valores de escore BASDAI
entre os pacientes tabagistas e não tabagistas, o grupo tabagista apresentou média de valores
inferior ao grupo não tabagistas, porém, após análise comparativa, essa diferença não
demonstrou significância estatística (p 0,17) (tabela 5).
54
Tabela 5 - Associação entre tabagismo e atividade de doença dos pacientes com espondilite
anquilosante, dados coletados no momento de início do seguimento no BiobadaBrasil entre
janeiro/2010 a janeiro/2020
TABAGISMO N MÉDIA BASDAI IC 95% P
NÃO 505 5,354 5,164 5,543
0,17 SIM 83 5,007 4,574 5,474
IC: Intervalo de Confiança;
Entre os 588 pacientes avaliados, 45,4% (267) necessitaram de troca de imunobiológico
durante o tempo de seguimento. Entre esses, 14,9% (40) pacientes eram tabagistas. A tabela 6
apresenta os dados referentes ao motivo da troca terapêutica separados pelo tabagismo e a
comparação das frequências. Quando comparamos os grupos tabagista e não tabagista, não
observamos diferença estatisticamente significativa na frequência de indivíduos que
necessitaram trocar a terapia imunobiológica por qualquer motivo, nem na frequência dos
pacientes que trocaram de terapia por perda de eficácia (p 0,767) ou por efeito adverso (0,238).
Outros motivos de troca terapêutica incluíam gravidez, morte ou remissão da doença (Tabela
6).
Tabela 6 - Frequência e análise comparativa de troca de terapia imunobiológica e motivos de
troca pela presença ou não de tabagismo dos pacientes com espondilite anquilosante em
seguimento no BiobadaBrasil entre janeiro/2010 a janeiro/2020
Tabagismo
% (n)
Não Tabagismo
% (n) p
Troca de biológico 48,2 (40) 45 (227) 0,582
Troca por Efeito Adverso 12 (10) 8,1 (41) 0,238
Troca por Perda de Eficácia 16,9 (14) 18,2 (92) 0,767
DISCUSSÃO
Nessa enorme coorte brasileira, não encontramos diferença estatisticamente
significativa no escore de atividade de doença (BASDAI) e na resposta terapêutica entre os
pacientes com espondilite anquilosante tabagistas e não tabagistas.
Alguns estudos já haviam demonstrado que o tabagismo não tem impacto importante na
resposta à terapia anti – TNF (SIEPER et al., 2013; DELLYES et al., 2014; KYDD et al., 2015),
outros encontraram efeitos, aparentemente, dramáticos, com tabagistas ativos apresentando
55
metade da resposta terapêutica quando comparados aos não tabagistas (CIUREA et al., 2016;
GLINTBORG et al., 2016). Entre tantos, Zhao e colaboradores, através de estudo observacional
e longitudinal publicado em 2019, concluíram que a resposta dos pacientes portadores de
espondiloartrite axial à primeira terapia anti-TNF não se modifica de acordo com o status do
tabagismo apresentado no momento de introdução desses pacientes naquela coorte britânica. O
ponto de maior destaque nesse estudo é que os autores justificam esses resultados conflitantes
como consequência das diferenças metodológicas apresentadas entre os autores (ZHAO et al.,
2019). Exemplificando: muitas características clínicas dos pacientes se diferem de acordo com
o status do tabagismo, muitos estudos longitudinais aplicam critérios de seleção que excluem
uma proporção de pacientes do conjunto de análises e essa restrição de amostra gera viés de
seleção ao incluir ou excluir participantes com diferentes status de tabagismo ou outras
características do baseline (ZHAO et al., 2019).
Grandes coortes nacionais de registro de tratamento já foram previamente aproveitadas
para avaliações pontuais e alguns vieses também foram encontrados. Como por exemplo, em
2019, Zhao S. e sua equipe britânica, de maneira semelhante à nossa proposta, analisaram dados
de um registro prospectivo de terapia imunobiológica na espondilite anquilosante: o Britsh
Society for Rheumatology Register for Ankylosing Spondylitis (BSRBR-AS). O objetivo ao
analisar os dados desse registro de coorte foi definir se existia associação entre o tabagismo e
manifestações extra-axiais da espondilite anquilosante ou outros marcadores de gravidade de
doença como fadiga, sonolência, ansiedade e depressão. Essa análise enfocou os dados iniciais
(do baseline), em corte transversal, realizados após qualquer exposição à terapia
imunobiológica, coletados de Dezembro 2012 a Junho de 2017. Os participantes que foram
incluídos na análise preenchiam os critérios ASAS para espondiloartrite axial e preencheram o
questionário com definição do status de tabagismo em: nunca fumaram, ex – tabagistas,
tabagistas ativos leves (≤ 10 cigarros ao dia) ou tabagistas ativos pesados (> 10 cigarros ao dia).
Entre os 2031 participantes incluídos na análise, 889 (44%) pacientes se decretaram não
fumantes, 652 (32%) eram ex – tabagistas e 490 pacientes tabagistas ativos, sendo 199 (55%)
tabagistas leves e 166 (45%) tabagistas pesados. Quando comparados aos não fumantes,
tabagistas ativos apresentaram menor risco relativo de desenvolver uveítes [OR 0.7, 95% CI
0.5 – 0.9] e maior risco de psoríase [ORadj 1.6, 95% CI 1.1 – 2.3]. Ex – tabagistas e tabagistas
ativos apresentaram sinais de gravidade de doença maiores do que os que nunca fumaram, com
BASDAI e BASFI mais altos, com p < 0,001. Associações similares foram observadas para
fadiga, sonolência, ansiedade e depressão com p < 0,001. Durante a discussão do artigo, os
56
autores comentam que a associação paradoxal entre tabagismo e uveítes é interessante, mas
necessitaria de investigações posteriores (ZHAO et al., 2019).
Pouco tempo depois, a mesma equipe britânica de Zhao S.S., publicaram na Annals of
the Rheumatic Diseases uma carta ao leitor tentando elucidar melhor a relação entre tabagismo
e uveíte anterior aguda (UAA). Chegou-se a pensar, hipoteticamente, que esse paradoxo era
consequente à alteração de comportamento, em que, pacientes que evoluíam com uveíte anterior
aguda mais provavelmente interrompiam o tabagismo; porém, essa hipótese ainda não
explicava o risco relativo mais alto para UAA em pacientes que nunca haviam fumado (ZHAO
et al., 2019). Dessa maneira, em um desdobramento de estudo, esse grupo reavaliou os dados
do registro Britsh Society for Rheumatology Register for Ankylosing Spondylitis (BSRBR-AS),
relacionando o número de episódios documentados de UAA e o status do tabagismo. Após
ajustamento para idade, gênero, duração dos sintomas, escore BASDAI e uso de anti – TNF,
632/2420 (26%) pacientes com espondiloartrite axial foram diagnosticados com UAA, com
variação de 0 a 15 episódios de uveíte em um 1 ano, e quando comparados aos pacientes que
nunca fumaram, tanto os tabagistas ativos (IRR 1.33; 95% CI 0.92 – 1.92) quanto os ex –
tabagistas (IRR 1.19; 95% CI 0.88 – 1.59) apresentaram incidência mais alta de UAA, porém
com uma diferença estatisticamente não significativa. Dessa maneira, concluiu-se uma
tendência à associação do tabagismo com aumento de incidência de uveíte anterior aguda nos
pacientes com espondiloartrite axial (ZHAO et al., 2019), e percebemos então a importância da
questão metodológica dos estudos.
As referências supracitadas também nos permitem discutir nosso resultado conflitante
semelhante, em que encontramos uma frequência maior, estatisticamente significativa,
daqueles pacientes com espondilite anquilosante que se manifestaram com uveíte e que não
eram tabagistas, sugerindo que o tabagismo diminua o risco de ocorrência de uveítes. Conforme
exemplificado acima, esses achados podem ser justificados por questões metodológicas, de
forma que, nessa coorte BiobadaBrasil, não foi realizado quantificação de episódios de
uveíte/ano.
A principal limitação do nosso estudo foi a padronização dicotomizada do tabagismo
(sim/não), com ausência de quantificação de carga tabágica, e a inclusão de ex-tabagistas no
grupo não tabagista. Estudos anteriores já haviam demonstrados resultados sem significância
na análise dicotomizada que eram validados quando realizada quantificação de carga tabágica
e análise de subgrupos, evidenciando o tabagismo como fator de risco dose-dependente
(RUDWALEIT et al., 2009; VILLAVERDE-GARCÍA et al., 2017; PODDUBNYY et al.,
2013). Além disso, a ausência de avaliações lineares e periódicas de escore de atividade
57
(BASDAI) pode ter gerado um viés de confusão na definição de resposta terapêutica. Pacientes
tabagistas poderiam ter respondido de maneira menos eficaz, com menor redução do escore de
atividade BASDAI ao longo da mesma terapia imunobiológica.
Dessa maneira, nossos resultados devem ser generalizados com cautela. Enfatizamos a
importância de cessação do tabagismo para redução do alto risco de doença coronariana nos
pacientes reumáticos, assim como redução do risco de desenvolvimento de neoplasias.
CONCLUSÃO
Nessa enorme coorte, constituída por pacientes pertencentes a um banco de registro de
tratamento, o tabagismo não se comprovou como fator de risco para aumento da atividade de
doença e refratariedade ao tratamento da espondilite anquilosante. Dessa maneira, não
encontramos relação entre o tabagismo e piores índices da atividade da espondilite
anquilosante, assim como, o tabagismo não atuou como fator de risco para falência ou
incidência de efeitos adversos à terapia imunobiológica dos pacientes com espondilite
anquilosante.
58
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