Profa . Janice Gonçalves (Departamento de História – UDESC) 11 de maio de 2011

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Memória e Oralidade Narrar, transmitir, preservar: sobre a construção social de memórias e da história no mundo contemporâneo. Profa . Janice Gonçalves (Departamento de História – UDESC) 11 de maio de 2011 14º. Encontro Regional do PROLER (Blumenau, 9 a 12 de maio de 2011): - PowerPoint PPT Presentation

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  • Memria e OralidadeNarrar, transmitir, preservar: sobre a construo social de memrias e da histria no mundo contemporneo

    Profa. Janice Gonalves (Departamento de Histria UDESC)

    11 de maio de 2011

    14. Encontro Regionaldo PROLER (Blumenau, 9 a 12 de maio de 2011):Literatura: dos fios da memria s tessituras imaginrias

  • O olho e o ouvido Leitura e escrita (ver).Oralidade, fala (ouvir).Como relacionar a escrita e a escuta?

  • O olho e o ouvido: convergncias e dilogos Narrativas: formas de ficcionalizao do (nosso) mundo/de (outros) mundos.

    Fico palavra derivada do verbo latim fingo (cujo particpio passado fictus), que originalmente significava modelar e que passou tambm a significar imaginar, criar, representar.

  • O olho e o ouvido: convergncias e dilogos

    Muitas narrativas nascem orais e posteriormente ganham a forma escrita.

  • O olho e o ouvido: convergncias e dilogos

    Passagem do oral para o escrito: introduo, na dimenso oral, de mudanas que so prprias do cdigo da escrita.

  • O olho e o ouvido: convergncias e dilogos Pordenone: Zanussi (REX).

    Portelli (2010, p.70): [...] pouco provvel que, na ausncia de recursos rtmico-menmnicos (como o canto, a rima ou os que eram utilizados para declamar a escalao dos times de futebol), uma lista desse tipo seja enunciada sem preposies ou predicados.

  • O olho e o ouvido: convergncias e dilogos

    Algumas das marcas da oralidade: a repetio, a hesitao, as pausas, as frases no terminadas.

  • O olho e o ouvido: convergncias e dilogos

    Transcrio: procurar equilibrar fidedignidade, inteligibilidade, dimenso tica.

  • O olho e o ouvido: convergncias e dilogos

    Para quem narramos, e por qu?

  • O olho e o ouvido: convergncias e dilogos Histria oral: dilogo entre quem pergunta e quem responde, no qual cada um dos lados possui sua prpria agenda ou pauta.

  • O olho e o ouvido: convergncias e dilogos

    O oral e o escrito tambm se encontram na fundamental funo de transmisso cultural.

  • O olho e o ouvido: convergncias e dilogos Nas sociedades ditas simples os legados so fundamentalmente os ensinamentos contidos em narrativas mticas.

    Tais narrativas so, geralmente, insistentemente lembradas ao coletivo por uma espcie de portador de memria.

  • O olho e o ouvido: convergncias e dilogos Nas sociedades ditas complexas, mais fortemente marcadas pela mudana, as narrativas multiplicam-se, conforme digam respeito trajetria dos indivduos ou s dos grupos aos quais esses indivduos pertenam, ou com os quais se identifiquem.

  • Oralidade, memria e histria Relaes entre a histria (como campo disciplinar) e a oralidade comearam muito prximas (na Antiguidade clssica), se distanciaram (sobretudo no sculo XIX, com a profissionalizao do campo historiogrfico) e depois voltaram a se aproximar (em especial na segunda metade do sculo XX).

  • Oralidade, memria e histria Os acontecimentos traumticos do sculo XX e o interesse pela vida e pelo ponto de vista das pessoas comuns, para a histria, fizeram com que proliferassem, nas ltimas dcadas, projetos de Histria Oral, amplificados pela expanso de mecanismos de registro e disseminao de depoimentos.

  • Experincias: Histria oral e escola Trabalhos como esse provocam os estudantes a refletir sobre o fato de fazerem parte da histria de suafamlia, da escola e da comunidade em que vivem e, aos poucos, perceber suainsero no pas e no mundo.

    Artigo publicado em 2003 na revista Nova Escola (e disponvel no stio eletrnico da revista: < http://revistaescola.abril.com.br/historia/fundamentos/passado-nao-esta-livros-historia-423062.shtml>

  • Experincias: Histria oral e escola Ao considerar como principal fonte de pesquisa as pessoas, verifica-se que a transmisso da histria se d na comunicao entre o entrevistado e a turma. Portanto, possvel aprimorar em classe o dilogo, a disposio de ouvir, a linguagem no-verbal de gestos e posturas e a elaborao de perguntas conforme o universo do entrevistado e o objetivo do trabalho. [grifos meus]Artigo publicado em 2003 na revista Nova Escola (e disponvel no stio eletrnico da revista: < http://revistaescola.abril.com.br/historia/fundamentos/passado-nao-esta-livros-historia-423062.shtml>

  • Museu da Pessoa (www.museudapessoa.net)

  • Museu da Pessoa (www.museudapessoa.net)

  • Experincias: Histria oral e escola [...] os alunos podem perceber que aHistria no uma narrativa fria acerca de algumas pessoas importantes e fatos polticos e econmicos, mas um conjunto de narrativas articuladas e que podem ser compreendidas a partir de sua riqueza e de sua diversidade. Isto possibilita que criem vnculos com as pessoas e com as histrias narradas e ainda se sintam parte da comunidade cujas histrias so acolhidas pela escola, valorizadas e preservadas.[grifos meus]Zilda Kessel (coordenadora dos projetos educativos do Museu da Pessoa).

  • Museu da Pessoa (www.museudapessoa.net)

  • Young People and the Second World War Project, no Reino Unido:http://www.spartacus.schoolnet.co.uk/2WWproject.htm

  • Experincias: Histria oral e escola Young People and the Second World War Project Os temas sugeridos para abordagem na entrevista indicam questes de abordagem delicada, envolvendo situaes de violncia, medo e privao: a experincia de ser bombardeado ou a situao de evacuao de uma determinada rea; o relacionamento com grupos armados e movimentos de resistncia; o racionamento de comida; o impacto da guerra na famlia.

  • Experincias: Histria oral e escola Young People and the Second World War Project

  • Experincias: Histria oral e escola Young People and the Second World War Project Percebe-se a nfase maior na entrevista como mecanismo de obteno de informaes e registros relativos Segunda Guerra Mundial.

  • Experincias: Histria oral e escola Young People and the Second World War Project No explicita nenhuma preocupao em problematizar as relaes passado-presente implicadas nos depoimentos concedidos.

  • Voices from Past, nos EUA:

  • Experincias: Histria oral e escola Voices from Past, nos EUAAtravs do processo de entrevistas, a histria registrada a partir da experincia em primeira mo das pessoas que a viveram. [...] Naturalmente, facetas da histria so continuamente iluminadas pela luz dos mnimos detalhes na vida de uma pessoa. A histria oral uma importante chave ou ferramenta nesse processo de iluminao. [grifos meus]

  • Experincias: Histria oral e escola Voices from Past, nos EUAIndica-se que a Histria Oral a utilizada com a inteno de superar a percepo de uma Histria descarnada, distante das pessoas comuns. Destaca-se que a Histria Oral permite tomar contato com parte da multiplicidade de percepes e experincias coletivas e individuais dos processos histricos. Tende-se a sugerir que os depoimentos coletados so a Histria (e no uma perspectiva acerca dela).

  • Experincias: Histria oral e escola Voices from Past, nos EUAAs entrevistas so compreendidas como mecanismos para documentar as experincias que as pessoas tiveram durante a guerra. No se aborda a questo da distncia a ser considerada entre a experincia vivida e a narrativa da experincia o testemunho como sua necessria reelaborao.

  • Experincias: Histria oral e escola

  • From Memory, Nova Zelndia>

  • Experincias: Histria oral e escola From Memory, Nova ZelndiaTrecho da entrevista de Haddon Donald: .

    Trecho da entrevista de Big Flint sobre sua captura na Grcia:

  • Experincias: Histria oral e escola

  • Experincias: Histria oral e escola

  • Experincias: Histria oral e escola From Memory, Nova Zelndia[...] registra as vozes dos neozelandeses que serviram ao seu pas no tempo da guerra: soldados, marinheiros, pilotos de avio, enfermeiras e milhares de outras pessoas em seus lares e atravs dos mares. Esses neozelandeses comuns tm estrias extraordinrias para contar estrias humanas e pessoais da guerra. [grifos meus]

  • Experincias: Histria oral e escola From Memory, Nova ZelndiaAs recomendaes do guia incluem cuidados ticos gerais, escorados no Cdigo de tica da Associao Nacional de Histria Oral da Nova Zelndia.Referem-se tambm, de forma especial, s circunstncias de um projeto de histria oral com veteranos de guerra j idosos.

  • Experincias: Histria oral e escola From Memory, Nova ZelndiaA aluso aos cuidados quanto s intensas emoes suscitadas pelas lembranas de guerra permitem refletir igualmente acerca do contedo dos silncios, dos no-ditos, das interdies que necessariamente marcam o trabalho de memria dos sobreviventes de uma guerra.

  • Em resumo!

    As narrativas orais, tanto quanto as escritas, so exerccios de fico, que moldam vivncias e perspectivas acerca do que nos cerca, do que vivemos e do que poderemos viver.

  • Em resumo!

    Tambm de forma similar s narrativas escritas, as narrativas orais podem ser de vrios gneros, dependendo do narrador, do que narra e das circunstncias em que narra (sendo importante ficar atento a isso).

  • Em resumo!

    Diferentemente da narrativa escrita, a narrativa oral nascida de uma situao de entrevista dialgica, e no podemos esquecer que quem pergunta ajuda a moldar a narrativa.

  • Em resumo! Conforme o lugar social ocupado pelo indivduo entrevistado, sua narrativa pode reforar uma dada memria, contest-la, neg-la ou deturp-la. Para que tenhamos clareza disso, fundamental, do ponto de vista do conhecimento histrico, articular os depoimentos a outras fontes.

  • Em resumo! Projetos de histria oral no espao escolar no envolvem apenas aspectos cognitivos: podem contribuir para reforar a auto-estima, sensibilizar para o respeito diversidade e para o exerccio do dilogo.

  • Em resumo! Projetos de histria oral no espao escolar podem tambm contribuir para chamar a ateno para a complexidade dos processos histricos e desenvolver o esprito investigativo.

  • Em resumo! As narrativas orais acerca de algo vivido no so meramente informaes brutas acerca do que aconteceu, mas reelaboraes, no presente, acerca dessas vivncias, e que podem at entrar em disputa com outras memrias consolidadas. importante estimular reflexes acerca desse processo de reelaborao, no reduzindo as entrevistas apenas coleta de dados.

  • Em resumo! O entrevistado dono de seu depoimento: ele deve autorizar o que ser tornado pblico ou no, e esse aspecto tico incontornvel.

  • Em resumo! A possibilidade de dar forma escrita ao oral, atravs da transcrio, necessariamente introduzir mudanas na narrativa (mudanas que no so nem boas nem ms em si mesmas). Para encontrar um bom equilbrio nessas mudanas operadas pela transcrio, cabe buscar garantir, tanto quanto possvel, ao texto da transcrio, fidedignidade, inteligibilidade e respeito ao depoente (no que se refere tica).

  • Em resumo! Respeitar o direito do depoente de dar a forma final do depoimento (ou autoriz-la) no significa ficar impedido de discordar dele e de apontar incongruncias em sua narrativa.

    ***

  • Historiadores e documentos TUCDIDES:(aproximadamente 455-404 a.C.) Histria da Guerra do Peloponeso (I, XXII)"I. Tucdides de Atenas escreveu a guerra dos peloponsios e atenienses, como a fizeram uns contra os outros. Comeou a narrao logo a partir da ecloso da guerra, tendo prognosticado que ela haveria de ganhar grandes propores e que seria mais digna de meno do que as j travadas, porque verificava que, ao entrar em luta, uns e outros estavam no auge de todos os seus recursos e porque via o restante do povo helnico enfileirando-se de um e de outro lado, uns imediatamente, outros pelo menos em projeto. 2. Esta comoo foi a maior para os helenos e para uma parcela dos povos brbaros e, pode-se mesmo dizer, atingiu a maior parte da humanidade. De fato, os acontecimentos anteriores e os mais antigos ainda, dado o recuo do tempo, era-me impossvel estabelec-los com clareza, mas, pelos indcios, a partir dos quais, num exame de longo alcance, cheguei a uma convico, julgo que no foram importantes, nem quanto s guerras nem quanto ao mais. [...]

  • Historiadores e documentosXXII. 2. E, quanto s aes que foram praticadas na guerra, decidi registrar no as que conhecia por uma informao casual, nem segundo conjectura minha, mas somente aquelas que eu prprio presenciara e depois de ter pesquisado a fundo sobre cada uma junto de outros, com a maior exatido possvel. 3. Muito penoso era o trabalho de pesquisa, porque as testemunhas de cada uma dessas aes no diziam o mesmo sobre os mesmos fatos, mas falavam sobre a simpatia por uma ou por outra parte ou segundo as lembranas que guardavam. 4. E para o auditrio o carter no fabuloso dos fatos narrados parecer talvez menos atraente; mas se todos quantos querem examinar o que h de claro nos acontecimentos passados e nos que um dia, dado o seu carter humano, viro a ser semelhantes ou anlogos, virem sua utilidade, ser o bastante. Constituem mais uma aquisio para sempre que uma pea para um auditrio do momento."

    Fonte: TUCDIDES, Histria da Guerra do Peloponeso. So Paulo: Martins Fontes, 1999. p.3 e p.31.

  • Historiadores e documentosARISTTELES (384-322a.C.): Potica (9, 1451 a 36 - b11)" claro, a partir do que foi dito, que no obra do poeta dizer o que aconteceu, mas o que poderia acontecer e o possvel conforme o verossmil ou o necessrio. Portanto, o historiador e o poeta no diferem por falar em metros ou sem eles (pois as obras de Herdoto poderiam ser metrificadas e no seriam menos histria com metro ou sem ele), mas diferem nisto: no dizer um o que aconteceu, o outro o que poderia acontecer. Por isso tambm a poesia algo mais filosfico e mais srio que a histria: pois a poesia diz sobretudo o que respeita ao geral, a histria o que respeita ao particular. O que respeita ao geral a quais homens acontece dizer ou fazer quais coisas conforme o verossmil ou o necessrio e a isso que visa a poesia, mesmo atribuindo nomes s personagens; enquanto o que respeita ao particular o que fez ou sofreu Alcibades."

    Fonte: HARTOG, Franois (org.). A Histria de Homero a Santo Agostinho. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2001. p.107.

  • Historiadores e documentosPOLBIO (aproximadamente 210-130 a.C.) : Histrias.

    "(2, 56: 11-12) Os fins da histria e da tragdia no so idnticos, mas contrrios: nesta, preciso, atravs de discursos absolutamente crveis, aturdir e fascinar os ouvintes no tempo presente; naquela, preciso, atravs de aes e discursos verdadeiros, para todo o tempo, instruir e convencer quem deseja aprender. Isso porque, no primeiro caso, prevalece o crvel, ainda que se trate de mentira, visando iluso dos espectadores; no segundo, o verdadeiro, visando ao proveito de quem gosta de aprender.

  • Historiadores e documentosPOLBIO (aproximadamente 210-130 a.C.) : Histrias.(12, 27-28) Pois ns temos, por natureza, como que dois instrumentos com os quais tudo aprendemos e investigamos, a audio e a vista, sendo muito mais verdadeira a vista, conforme Herclito, pois os olhos so testemunhas mais exatas que os ouvidos. Timeu, dos dois caminhos, lanou-se pelo mais agradvel, embora pior para a investigao. Com efeito, afastou-se completamente do que se transmite pela vista, trocando-o pelo transmitido pela audio: sendo esta como que bipartida, tomou a parte transmitida pelas obras dos memorialistas e deu as costas, indiferentemente, parte que exige inquirio [...]. A razo dessa escolha pode-se facilmente entender: que, atravs dos livros, muitas coisas podem ser investigadas sem risco e sem sofrimento, caso se tenha a inteno de abordar alguma cidade que disponha de um vasto registro de memrias ou de uma biblioteca nos arredores. [...]

  • Historiadores e documentosPOLBIO (aproximadamente 210-130 a.C.) : Histrias.[...] os assuntos da histria s iro bem quando os homens de ao se ocuparem em escrever histrias no incidentalmente como hoje, mas por julgarem que se trata do que h de mais necessrio e de mais belo para eles, consagrando-se a isso, sem distrao, enquanto durar sua vida ou ento quando os que se ocupam em escrever considerarem que a experincia tirada das prprias aes necessria para a histria. Antes disso, no ter fim a ignorncia dos historiadores, dentre os quais se destaca Timeu: apesar de no demonstrar a mnima precauo, de ter passado a vida num nico lugar, como estrangeiro, de ter como que deliberadamente recusado toda atividade nos domnios da ao guerreira e poltica, bem como todo sentimento pessoal que provm da viagem e da observao, no sei como pode ter a fama de encabear o pomposo cortejo dos historiadores.

    Fonte: HARTOG, Franois (org.). A Histria de Homero a Santo Agostinho. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2001. p.119-125.

  • Historiadores e documentosLUCIANO (aproximadamente 119-175.): Como se deve escrever a histria (41, 44-45, 47, 49-50, 61)[...] do mesmo modo que admitimos que o historiador deve ter como objetivos a franqueza e a verdade, assim tambm o primeiro e nico objetivo de sua linguagem explicar claramente os fatos e faz-los aparecer em plena luz, sem empregar termos impenetrveis e fora do comum (tampouco esses termos que se usam em feiras e botequins), mas tais que a maioria compreenda e os cultos elogiem. [...] Quanto aos prprios fatos, no se devem ajuntar ao acaso, mas preciso, ao preo de mil penas e sofrimentos, comprov-los e, sobretudo se so atuais, presenci-los. Caso isso no seja possvel, deve-se confiar em que os expe[m] com mais integridade, aquelas pessoas que parecem que no amputariam ou acrescentariam algo aos acontecimentos por compaixo ou hostilidade. Ento, deve-se ser tambm hbil para visar e dispor o que mais convincente.

    Fonte: HARTOG, Franois (org.). A Histria de Homero a Santo Agostinho. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2001. p.225-231.

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