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Aspectos gerais sobre o tema ............................................................................................................... 2
O papel das agências de regulação no setor do saneamento básico ................................................. 4
Reserva legal e natureza de autarquia especial .................................................................................. 8
Agências municipais, estaduais e consorciadas: qual o melhor modelo regulatório? ................... 10
As agências reguladoras constituídas sob a forma de consórcio público ....................................... 15
Da criação ao funcionamento: como dar vida às agências de regulação? ....................................... 20
Recomendação (Guia) ......................................................................................................................... 25
Referências bibliográficas ................................................................................................................... 28
Produto: Requisitos legais de constituição e
funcionamento de uma agência de regulação (I-05 e I-06)
Aspectos gerais sobre o tema
Um dos principais avanços trazidos em 2007 pelo marco regulatório do setor do
saneamento diz respeito à divisão de atribuições no campo do planejamento, prestação e
regulação dos serviços. Antes do advento da Lei nº 11.445/2007 preponderava o modelo
baseado na concentração de atribuições no prestador de serviços, que se autorregulava e
autofiscalizava.
Tal cenário advém da própria dinâmica imposta na década de 70 pelo PLANASA,
centralizado na figura dos prestadores de serviços (concessionárias estadias e autarquias
municipais de água e esgoto), alinhado ao desinteresse da sociedade brasileira em relação
ao tema (cidadão, órgãos de controle e fiscalização, classe política, Poder Judiciário, entre
outros atores). Retrato disso era a quase absoluta desinformação dos municípios em
relação aos indicadores econômico-financeiros e de qualidade e eficiência dos serviços
de abastecimento de água, esgotamento sanitário, manejo dos resíduos sólidos urbanos,
drenagem pluvial e limpeza urbana, atuais vetores do saneamento básico (art. 2º, I, da Lei
nº 1.1.445/2007).
Em suma, os serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário eram
“problema” dos prestadores de serviços, principalmente naqueles municípios atendidos
pelas concessionárias estaduais, sem a efetiva participação do Poder Executivo
municipal.
Por isso o grande avanço trazido ao setor com a Lei nº 11.445/2007, que deixou
clara a separação entre os diferentes papéis exercidos pelos diversos atores do
saneamento. As atividades de planejamento, regulação e prestação dos serviços foram
devidamente diferenciadas no novo marco regulatório setorial, de forma a distinguir as
competências e funções executadas pelos titulares dos serviços, pelos prestadores e pelas
entidades de regulação. Atualmente, o setor de saneamento básico, e especialmente os
serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário, possui regramento jurídico
minimamente apto ao devido planejamento, regulação e prestação dos serviços.
Nesse sentido, a Lei nº 11.445/2007 trouxe um importante elemento na
conjuntura do saneamento básico: a regulação dos serviços, mediante entidade
devidamente constituída para tal desiderato.
A atividade de regulação pode ser compreendida como sendo a função
administrativa desempenhada pelo Poder Público para normatizar, controlar e fiscalizar
as atividades econômicas ou a prestação de serviços públicos por particulares. As
atividades de regulação são geralmente exercidas por agências independentes, sob a
forma de autarquias especiais, que gozam de autonomia administrativa, orçamentária e
decisória (art. 21 da Lei nº 11.445/2007).
Nesse cenário regulatório relativamente consolidado no Brasil, em que inúmeros
setores da economia já sofrem regulação estatal (energia elétrica, petróleo, saúde,
aviação, entre outras), os serviços públicos de saneamento básico também passam a
contar com a regulação estatal, no intuito de melhor discipliná-los, em especial diante do
seu regime de monopólio natural. Nesse sentido, dispõe a Lei nº 11.445/2007:
Art. 9º O titular dos serviços formulará a respectiva política pública de saneamento básico, devendo, para tanto:
III - definir a entidade responsável pela regulação e pela fiscalização dos serviços públicos de saneamento básico e os procedimentos para a sua
atuação, observado o disposto no § 5º do art. 8º-A; 1
Resta claro, assim, que o marco legal do saneamento básico exigiu que os serviços
públicos sejam prestados sob o ambiente regulatório, isto é, mediante a existência de
entidade pública criada especificamente para o fim de regular os serviços públicos
ofertados ao cidadão, na busca da sua adequada prestação2.
E importante destacar que a regulação deverá ser inserida em todo o território
nacional, de modo a abranger os 5.570 municípios brasileiros, nos quais os serviços
públicos são ofertados por diferentes prestadores de serviços públicos (prestadores
privados e públicos), o que acarretará, mesmo que em diferentes níveis de controle e
regulação, a existência de entidades públicas (agências de regulação) responsáveis pela
regulação e fiscalização dos serviços públicos de saneamento básico.
1 Redação dada pela Medida Provisória nº 844, de 6 de julho de 2018. A alteração promovida não impôs significativa alteração em relação ao texto original. 2 Vale lembrar o conceito de serviço público adequado trazido pela Lei nº 8.987/1995, que regra a concessão e permissão de serviço público no Brasil: Art. 6º, § 1º - Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas.
O papel das agências de regulação no setor do saneamento básico
Mesmo passados mais de dez anos da vigência da Lei nº 11.445/2007, pode-se
afirmar as agências reguladoras do setor ainda se encontram em forte processo de
estruturação e normatização. São raras as agências, hoje, que dispõem de corpo técnico
qualificado e suficiente para a completa regulação econômica das concessionárias
estaduais3.
Assim, é fundamental que se estabeleça, de forma clara, quais são as atribuições
e responsabilidades da entidade reguladora no setor do saneamento. O art. 22 da Lei nº
11.445/2007 prevê quatro objetivos centrais da regulação do setor de saneamento
básico:
a) estabelecer padrões e normas para a adequada prestação dos serviços e para
a satisfação dos usuários;
b) garantir o cumprimento das condições e metas estabelecidas;
c) prevenir e reprimir o abuso do poder econômico, ressalvada a competência
dos órgãos integrantes do sistema brasileiro de defesa da concorrência;
d) definir tarifas que assegurem tanto o equilíbrio econômico e financeiro dos
contratos quanto a modicidade tarifária, mediante mecanismos que induzam a eficiência e
eficácia dos serviços e que permitam o compartilhamento dos ganhos de produtividade com
os usuários.4
O legislador bem regrou os objetivos da regulação no setor do saneamento. O
papel de normatização revela-se inerente à regulação dos serviços, onde a agência
estabelecerá uma série de regras5 para a prestação dos serviços públicos, a exemplo dos
prazos para o atendimento das queixas ou reclamações relativas aos serviços; do regime,
estrutura e níveis tarifários; dos procedimentos e prazos para o reajuste e a revisão
tarifária; da medição, faturamento e cobrança de serviços; do monitoramento dos custos;
3 Por exemplo, desconhece-se entidade reguladora que audite e certifique os investimentos realizados pelo concessionário, nos termos do art. 42, § 2º da Lei nº 11.445/2007. 4 Interessante observar a alteração produzida pela Medida Provisória nº 844, de 6 de julho de 2018 no inciso IV do art. 22 da referida Lei do Saneamento Básico. Anteriormente, o texto aduzia em “apropriação social dos ganhos de produtividade”, passando a mencionar “compartilhamento dos ganhos”, em nítida modificação da forma com que os excedentes de produtividade devem ser distribuídos na relação prestacional. A partir do novo texto introduzido pela MP nº 844/2018, os ganhos de produtividade podem ser compartilhados (divididos) entre o prestador dos serviços e os usuários, em lógica mais compatível com o mercado. 5 Tema ainda polêmico no Direito Administrativo, o poder de normatização das agências de regulação foi disciplinado no art. 30 do Decreto federal nº 7.217/2010, que especificou as matérias que devem ser disciplinadas por lei e aquelas que podem ser regradas por atos administrativos da própria agência.
da avaliação da eficiência e eficácia dos serviços prestados e dos subsídios tarifários e não
tarifários. São normas de natureza técnica, econômica e social da prestação dos serviços
e que se encontram exemplificadas no art. 23 da Lei nº 11.445/2007.
Na prática, as agências reguladoras do setor do saneamento estão em processo
inicial de normatização dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário,
sendo baixo o grau de normatização do setor. Algumas agências (a exemplo da ARCE,
ADASA, ARSAE e ARSESP) já dispõe de parâmetros normativos relacionados à
certificação dos ativos, ao plano de contas e à implantação de contabilidade regulatória
para as concessionárias estaduais de saneamento, a fim de melhor contabilização e
gerenciamento da composição tarifária praticada. Quanto aos serviços de manejo dos
resíduos sólidos urbanos e drenagem pluvial, são praticamente inexistentes as
experiências concretas de regulação dos serviços, justamente pela concentração de
esforços das agências da normatização dos serviços de abastecimento de água e
esgotamento sanitário.
Ainda, é papel das agências de regulação garantir o cumprimento das metas e
condições estabelecidas nos Planos Municipais de Saneamento Básico e nos contratos
administrativos celebrados. Aliás, esta incumbência encontra-se expressa no art. 20,
parágrafo único da Lei nº 11.445/2007, que dispõe ser incumbência da “entidade
reguladora e fiscalizadora dos serviços a verificação do cumprimento dos planos de
saneamento por parte dos prestadores de serviços, na forma das disposições legais,
regulamentares e contratuais.” Portanto, cabe às agências de regulação impor o efetivo
atendimento das metas, dos prazos e dos investimentos previstos tanto no Plano
Municipal de Saneamento Básico quanto nos contratos, sendo fundamental para a
regulação do setor a existência de tais instrumentos.
Outro objetivo a ser alcançado pela atividade regulatória é a prevenção e
repreensão do abuso do poder econômico, ou seja, definir o padrão tarifário que reflita a
real equação dos investimentos, do custo dos serviços e da margem de lucro do prestador
de serviços. Em suma, é responsabilidade da regulação zelar pelo justo preço público
(tarifa) cobrado pela prestação dos serviços, em respeito ao princípio da modicidade
tarifária. Aliás, a modicidade tarifária não pode ser confundida com tarifas baixas. Este é
um erro inadmissível no estudo tarifário. A modicidade tarifária deve ser compreendida
como o menor valor a ser pago pelos usuários para (i) a manutenção e prestação dos
serviços públicos ofertados, (ii) a ampliação e modernização das estruturas e
equipamentos necessários e, por fim, (iii) a remuneração do prestador dos serviços
públicos. Assim, o princípio da modicidade tarifária deve ser analisado sob a ótica da
integralidade, atualidade, continuidade e universalidade dos serviços públicos, prismas
do saneamento básico (art. 1º, da Lei federal n. 11.445/2007).
Por fim, também é atribuição da agência de regulação a interpretação e a fixação
de critérios para a fiel execução dos contratos, dos serviços e para a correta
administração de subsídios (art. 25, § 2º, da Lei nº 11.445/2007). Imputa-se à agência
reguladora, desta forma, o papel de “árbitro contratual”, pois cabe a mesma a importante
missão de interpretar e analisar a execução dos contratos, equacionado eventuais
controvérsias entre o contratante (Poder Público) e o contratado (prestador dos
serviços)6.
Tal competência restou ainda mais clara através da previsão constante da
Medida Provisória nº 844, de 6 de julho de 20187, na qual imputa à Agência Nacional de
Águas (ANA) a possibilidade de, em caráter voluntário e mediante acordo das partes,
atuar como entidade mediadora e arbitral nos conflitos entre os entes da Federação ou
entre estes e as suas agências de regulação ou prestadoras de serviços públicos (art. 4º-
A, § 4º, da Lei nº 9.984/20008). Dessa forma, e a depender da legislação de criação de
cada agência de regulação, nada obsta que as agências de regulação possam exercer juízo
6 Juarez Freitas elucida bem a questão: “Mais do que nunca, avulta a importância do redesenho institucional dos que desempenham o indelegável mister regulador, com real independência (notadamente, no presente estudo, das autarquias regulatórias, sem que se confundam com o Poder Executivo e, portanto, dotadas de efetiva autonomia orçamentária, financeira e administrativa), uma vez que precisam atuar como “terceiros” nas relações com o governo, inclusive para o cumprimento de relevantes funções de arbitragem pública e de implementação dos estímulos à observância voluntária – compliance – das “regras do jogo”. Assim, numa espécie de superação parcial do esquema clássico de poderes, as autarquias reguladoras independentes desempenham atribuições estatais indelegáveis, não no campo propriamente da formulação das políticas públicas, mas ao implementá-las com imparcialidade, eficiência e eficácia. (Novo modelo de direito da regulação e desafios pós-crise global. In: GALVÃO JUNIOR, Alceu de Castro (Coord.); XIMENES, Marfisa Maria de Aguiar Ferreira (Coord.). Regulação: Normatização da prestação de serviços de água e esgoto. vol II. Fortaleza: Expressão Gráfica e Editora, 2009. 7 A Medida Provisória n. 844/2018 ainda está em análise no Congresso Nacional, sendo incerta sua conversão em lei, nos termos do previsto no art. 62 da Constituição. 8 Art. 4º-A, § 4º, da Lei nº 9.984/2000. A ANA disponibilizará, em caráter voluntário e sujeito à concordância entre as partes, ação mediadora e arbitral aos Municípios, aos Estados e ao Distrito Federal, nos conflitos entre estes ou entre eles e as suas agências reguladoras e prestadoras de serviços de saneamento básico.
de mediação e solução de conflitos no setor do saneamento básico, posto que
consentâneo com a própria concepção da regulação dos serviços públicos9.
9 Sobre o tema: SUNDFELD, Carlos Ari. Agências Reguladoras e os Novos Valores e Conflitos. Anais da XVII Conferência Nacional dos Advogados; ARAGÃO, Alexandre dos Santos. Agências reguladoras e a evolução do Direito Administrativo Econômico. 3ª ed. Forense: Rio de Janeiro, 2013. p. 338 e ss.; ABREU DALLARI, Adilson. Arbitragem na Concessão de Serviço Público. Revista de Informação Legislativa do Senado Federal – RIL, 128/63-67.
Reserva legal e natureza de autarquia especial
É assente na doutrina que a regulação dos serviços deve se dar por meio de
entidade constituída pelo Poder Público e submetida ao regime de direito público, com
atributos e prerrogativas especiais, que permitam o desempenho das suas funções com
independência decisória e autonomia administrativa, orçamentária e financeira. Daí
falar-se que as agências reguladoras são autarquias em regime especial, criadas com a
finalidade de disciplinar e controlar certas atividades de alta relevância para a sociedade10.
Como autarquia, a constituição das agências de regulação deve obediência ao preceito
inserido no inciso XIX do art. 37 da Constituição11, que prevê lei especifica para a criação das
autarquias. Portanto, a concepção das agências de regulação está adstrita ao princípio da reserva
legal; somente após a publicação da lei especial de criação é que as mesmas adquirem
personalidade jurídica (criação propriamente dita), passando a existirem para todos os efeitos
legais.
E o regime especial dessas autarquias é consubstanciado pelo reconhecimento de uma
autonomia reforçada12, isto é, um conjunto de regras que permitem a mesma ser dotada de
independência decisória. Essa situação faz com que as decisões expedidas pelas agências de
regulação não sejam aptas ao oferecimento de recurso hierárquico impróprio ao Chefe do Poder
Executivo ou qualquer outro agente político, confirmando, assim, o regime jurídico especial
dessas autarquias no ordenamento jurídico. Dessa maneira, é intrínseco à atividade regulatória
que seus atos e suas decisões não possam ser reformadas, revogadas ou anuladas por
autoridades estranhas aos quadros funcionais da agência de regulação. Assim, a independência
funcional das agências de regulação deve ser assegurada a todo custo, bem sua autonomia
administrativa, orçamentária e financeira, a permitir que seus dirigentes possam desempenhar
suas atribuições com estabilidade, tecnicidade e segurança.
A Lei nº 11.445/2007 agasalha esse entendimento, ao dispor da seguinte
maneira:
10 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 25ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 169-170. 11 Art. 37, XIX - somente por lei específica poderá ser criada autarquia e autorizada a instituição de empresa pública, de sociedade de economia mista e de fundação, cabendo à lei complementar, neste último caso, definir as áreas de sua atuação; 12 Expressão adotada por Alexandre Santos do Aragão (Agências reguladoras e a evolução do Direito Administrativo Econômico. 3ª ed. Forense: Rio de Janeiro, 2013. p. 351).
Art. 21. O exercício da função de regulação atenderá aos seguintes princípios:
I - independência decisória, incluindo autonomia administrativa, orçamentária e financeira da entidade reguladora;
II - transparência, tecnicidade, celeridade e objetividade das decisões.
Dessa maneira, a criação de agência reguladora, inclusive no setor do
saneamento básico, deve primar pela observância de alguns requisitos específicos,
intrínsecos à necessidade de proporcionar mais segurança, estabilidade e tecnicidade às
decisões e ações dos agentes responsáveis pela regulação das atividades econômicas ou
da prestação de serviços públicos. Por isso a necessidade de lei de criação da agência de
regulação prever a existência de mandados para seus dirigentes, afastando a exoneração
ad nutum desses agentes públicos13, inclusive estabelecendo processos complexos para a
nomeação desses dirigentes, a exemplo da necessidade de prévia aprovação de seus
nomes pelo respectivo Poder Legislativo.
Dessa forma, a lei de criação da agência de regulação deve disciplinar e regrar as
situações envolvendo as competências e prerrogativas da entidade, as fontes de receitas
(incluindo a instituição de taxa de regulação), o quadro de servidores públicos da agência,
o mandado e a forma de nomeação dos seus dirigentes, os limites do poder normativo, as
penalidades aplicáveis pela agências, entre outros assuntos correlatos ao funcionamento
da entidade regulatória.
13 ARAGÃO, Alexandre dos Santos. Agências reguladoras e a evolução do Direito Administrativo Econômico. 3ª ed. Forense: Rio de Janeiro, 2013. p. 333.
Agências municipais, estaduais e consorciadas: qual o melhor modelo regulatório?
A Lei nº 11.445/2007 assim dispõe, quando elenca as atribuições do titular dos
serviços:
Art. 9º O titular dos serviços formulará a respectiva política pública de saneamento básico, devendo, para tanto:
III - definir a entidade responsável pela regulação e pela fiscalização dos serviços públicos de saneamento básico e os procedimentos para a sua atuação, observado o disposto no § 5º do art. 8º-A;
................
Art. 8º-A. Os Municípios e o Distrito Federal são os titulares dos serviços públicos de saneamento básico.
§ 5º Os serviços públicos de saneamento básico nas regiões metropolitanas, nas aglomerações urbanas e nas microrregiões serão fiscalizados e regulados por entidade reguladora estadual, distrital, regional ou intermunicipal, que observará os princípios estabelecidos no art. 21. 14
Portanto, cabe ao ente titular dos serviços (em regra, os municípios) a definição
do órgão público responsável pela regulação e fiscalização dos serviços públicos, salvo
nas regiões onde há interesse comum na prestação total ou parcial dos serviços públicos
de saneamento básico (em qualquer das suas vertentes), situação em que a titularidade
será exercida pelo colegiado interfederativo no âmbito das regiões metropolitanas,
aglomerações urbanas ou microrregiões; ou por instrumentos de gestão associada de
serviços públicos (convênios de cooperação ou consórcios públicos)15.
As Diretrizes Nacionais de Saneamento Básico permitem diferentes modelagens
jurídicas para a regulação do saneamento básico. Poderá o titular dos serviços constituir
entidade reguladora própria ou delegar tal mister para entidades constituídas por outros
entes Federativos (a exemplo das agências de regulação criadas pelos estados da
Federação), desde que previamente autorizado por lei. É o que se observa no art. 8º da
Lei nº 11.445/2007, ratificado de maneira ainda mais clara pelo Decreto federal nº
7.217/2010, que assim dispõe:
14 Redação dada pela Medida Provisória nº 844, de 6 de julho de 2018. A redação original do art. 9º da Lei nº 11.445/2007 não diverge significativamente do novo texto legal. Da mesma forma é a redação dada ao § 5º do art. 8-A da referida lei setorial, que apenas reconhece na lei uma interpretação já consolidada no setor, no sentido da possibilidade das agências de regulação, no âmbito das regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, serem constituídas no âmbito estadual, regional ou através de consórcio público intermunicipal. 15 É o que estabelece o novo art. 8º-A da Lei nº 11.445/2007, inserido pela Medida Provisória nº 844, de 6 de julho de 2018, em harmonia com a deliberação dada pelo Supremo Tribunal Federal na ADIN nº 1.842/RJ.
Art. 31. As atividades administrativas de regulação, inclusive organização, e de fiscalização dos serviços de saneamento básico poderão ser executadas pelo titular: I - diretamente, mediante órgão ou entidade de sua administração direta ou indireta, inclusive consórcio público do qual participe; ou II - mediante delegação, por meio de convênio de cooperação, a órgão ou entidade de outro ente da Federação ou a consórcio público do qual não participe, instituído para gestão associada de serviços públicos. § 1º O exercício das atividades administrativas de regulação de serviços públicos de saneamento básico poderá se dar por consórcio público constituído para essa finalidade ou ser delegado pelos titulares, explicitando, no ato de delegação, o prazo de delegação, a forma de atuação e a abrangência das atividades a ser desempenhadas pelas partes envolvidas.
Assim, a regulação dos serviços pode dar-se através de autarquia criada pelo
próprio titular dos serviços (ente municipal ou distrital) ou ser delegado para agência
pertencente a outros entes da Federação. Ainda, poderá o ente titular delegar a funções
de regulação e fiscalização para agência constituída sob a forma de consórcio público de
direito público, nos termos do art. 241 da Constituição. Em qualquer dos casos deverá a
entidade de regulação ser criada em respeito aos princípios inerentes à natureza jurídica
das agências de regulação, em especial da independência decisória e a autonomia
administrativa, orçamentária e financeira, dispondo seus dirigentes de mandato
(impossibilidade de exoneração ad nutum).
Segundo recentes dados levantados pela Associação Brasileira de Agências de
Regulação (ABAR), existem 50 agências de regulação com competência no saneamento
básico, sendo 23 com abrangência estadual, 24 de âmbito municipal e quatro em formato
de consórcios públicos intermunicipais. Segue ilustração do mapa das agências de
regulação no país, conforme dados da ABAR, nos diversos setores da economia e dos
serviços públicos16:
16 Associação Brasileira de Agências de Regulação (ABAR). Desenvolvimento do Brasil: o papel da regulação. Brasília, 2018. p. 40.
Mais recentemente, a Medida Provisória nº 844, de 6 de julho de 2018 atribuiu à
Agência Nacional de Águas (ANA) a competência para estabelecer normativos de
referência nacional para o setor do saneamento básico, além de outras atribuições
complementares à regulação propriamente dita dos serviços públicos, de titularidade em
regra municipal (vide art. 8º-A da Lei nº 11.445/2007).
Importa destacar que inexiste um melhor modelo regulatório. Todos são aptos
ao sucesso e fracasso, a depender de como fora concebido, gerido e estruturado.
Entidades reguladoras marcadas pelo fisiologismo ou que não dispõe de receitas e
pessoal apropriado para os seus fins está fadada ao fracasso, independentemente do
modelo jurídico adotado (agência municipal, estadual, federal ou consorciada).
Cada modelo dispõe de características peculiares, ou seja, pontos fortes e fracos
que, em tese, a identificam no cenário do saneamento básico no Brasil.
As agências municipais têm como ponto forte a proximidade dos serviços a
serem regulados, o que certamente permite controle mais efetivo e dinâmico dos
problemas locais. Mas esta proximidade também acarreta numa maior tendência à
interferência política na sua atuação, somada ao fato da maior dificuldade de
estruturação técnica e maior custo per capita da regulação (ao menos em tese). Isto tudo
irá depender muito das especificidades locais. Veja-se que a realidade do município de
São Paulo/SP (mais de 12 milhões de habitantes17) é absolutamente distinta da do
município de Serra da Saudade/MG (com apenas 786 habitantes18).
Por sua vez, as agências estaduais têm como ponto forte a tendência de maior
capacidade de apresentar bons quadros técnicos, capazes de, a baixo custo per capita,
desempenhar as inúmeras atribuições inerentes à regulação dos serviços públicos. Como
ponto fraco possuem justamente a proximidade política e administrativa com as
concessionárias estaduais de água e esgoto, responsáveis pela prestação dos serviços nas
principais cidades brasileiras e ainda carentes da efetiva regulação e fiscalização pelos
serviços ofertados à população.
Em suma, as agências estaduais e municipais possuem como ponto crítico
comum (sempre em tese) a dificuldade da manutenção da independência decisória frente
à tomada de decisões que possam acarretar prejuízos (políticos e administrativos) aos
gestores públicos locais e/ou estaduais.
Os consórcios públicos intermunicipais19 mostram-se como um modelo
híbrido entre as agências municipais e estaduais. De um lado, não estão tão distantes da
realidade dos municípios que a compõe; de outro, não há em tese a interferência de um
17 Conforme Estimativas da População Residente no Brasil e Unidades da Federação com data de referência em 1º de julho de 2018. Disponível em: ftp://ftp.ibge.gov.br/Estimativas_de_Populacao/Estimativas_2018/estimativa_dou_2018.pdf. Acessado em 24/9/2018. 18 Conforme Estimativas da População Residente no Brasil e Unidades da Federação com data de referência em 1º de julho de 2018. Disponível em: ftp://ftp.ibge.gov.br/Estimativas_de_Populacao/Estimativas_2018/estimativa_dou_2018.pdf. Acessado em 24/9/2018. 19 Aqui somente abordaremos os consórcios públicos formados por municípios, apesar de ser possível a estruturação de consórcios com a participação de estados ou da própria União, vide o exemplo da Autoridade Pública Olímpica (APO).
grupo político-partidário, frente a disparidade de diferentes gestores públicos
representantes dos municípios que compõe o consórcio público. Cabe à realidade jurídica
e política de concepção do consórcio público revelar se a agência consorciada dispõe de
efetiva independência decisória e estrutura técnica apta à regulação dos serviços. De
qualquer forma, os consórcios intermunicipais mostram‐se como instrumento de
efetivação das atividades de regulação, uma vez que possibilitam o agrupamento de
forças e recursos na implementação de uma entidade com todas as características das
agências reguladoras.
Compreende-se benéfica para o setor do saneamento essa multiplicação de
diferentes modelos regulatórios no país, especialmente para que não haja supremacia de
um modelo em detrimento de outro. Ademais, o Brasil possui realidades regionais muitos
díspares, como é o caso do Norte do país, onde as sedes dos municípios estão
distantemente localizadas, dificultando a implementação do modelo de regulação
consorciado (que pressupõe ampla interação entre os entes consorciados).
O certo é que a legislação nacional dá guarida a distintos modelos regulatórios,
todos aptos, repita-se, ao sucesso ou fracasso. Portanto, a adequada regulação dos
serviços públicos carece da (i) boa escolha dos dirigentes das entidades de regulação
(afastamento do fisiologismo político-partidário), (ii) de receitas próprias para custeio
das obrigações intrínsecas à regulação dos serviços, (iii) da criação de uma estrutura
técnica compatível com as demandas existentes (pessoal capacitado nas diferentes áreas
do conhecimento) e (iv) de condições legais para o exercício dos poderes de
normatização, fiscalização e penalização, que perpassa pela devida concepção da lei de
criação da entidade regulatória.
As agências reguladoras constituídas sob a forma de consórcio público
Como alhures afirmado, a regulação dos serviços públicos pode ser
instrumentalizada através de um consórcio público de direito público, criado com a
vestimenta de agência reguladora (autarquia em regime especial), em perfeita harmonia
com a ordem constitucional (art. 241 da CF) e da legal (Leis nº 11.107/2005 e
11.445/2007).
No Brasil, tal situação já é realidade. São quatro os exemplos de regulação por meio
de consórcio público. É o caso, em Santa Catarina, da Agência Reguladora Intermunicipal
de Saneamento (ARIS), composta por 180 municípios catarinenses; e da Agência
Intermunicipal de Regulação do Médio Vale do Itajaí (AGIR), composta por 14 municípios
catarinenses. No estado de São Paulo, tem-se a Agência Reguladora ARES PCJ, composta
por 55 municípios. Mais recentemente fora criado o Consórcio Intermunicipal de
Saneamento Básico da Região Central (CISAB-RC), composto por 22 municípios
consorciados do estado de Minas Gerais20.
A criação dos consórcios públicos é atividade complexa. Diferentemente das
autarquias, que são criadas por lei num processo de descentralização de poder e
atribuições do ente da Federação que a institui, no âmbito dos consórcios públicos tem-
se um processo coletivo de descentralização, no qual cada ente consorciado transfere
parcela de competência para a constituição de entidade interfederativa, de natureza
contratual.
Daí a cautela necessária para o prévio planejamento da concepção do consórcio
público, inclusive para fins de identificar se esse é de fato o melhor modelo jurídico e
federativo para satisfação do interesse público de cada ente da Federação envolvido. Dito
de forma direta, a criação de consórcio público é atividade complexa e requer acurada
atenção dos gestores públicos quanto à sua viabilidade política, jurídica e financeira.
20 Diferentemente do que ocorre com as agências de regulação ARIS, AGIR e ARES-PCJ, o consórcio público CISAB-RC inseriu em seu Protocolo de Intenções funções múltiplas no que toca o saneamento básico, podendo planejar, regular, fiscalizar e prestar os serviços públicos, o que denota imprecisão na concepção do consórcio, em especial diante da impossibilidade da conjugação, na mesma pessoa jurídica, das atribuições de regulação e prestação dos serviços públicos, o que desvirtua a independência decisória da entidade reguladora.
Para a formação de qualquer consórcio público, é fundamental que sejam
observadas as regras previstas na Lei nº 11.107/2005.
O primeiro documento a ser constituído para a formação de qualquer consórcio
público é o protocolo de intenções. Trata-se de contrato preliminar subscrito pelos entes
da Federação que objetivam a constituição de consórcio público para consecução de
interesse comum. Assim, o protocolo de intenções não é convênio ou simples acordo
plurilateral prévio, mas, sim, contrato preliminar, na definição dada pelo Decreto federal
nº 6.017/2007 (art. 2º, III), que deve ser submetido à ratificação por lei na Casa
Legislativa dos entes consorciados, podendo ser aprovado com ressalvas (art. 5º, § 2º da
Lei nº 11.107/2005).
Deverá constar do protocolo de intenções, sem prejuízo das demais matérias
arroladas pelo art. 4º da Lei nº 11.107/2005, a denominação, a finalidade, as
competências legais, o prazo de duração e a sede do consórcio, assim como a identificação
dos entes da Federação consorciados e a área de atuação do consórcio. O protocolo de
intenções ainda deverá dispor sobre a natureza do consórcio público (no caso do
exercício da regulação, deverá ser adotado o regime jurídico de direito público), assim
como o número, as formas de provimento e a remuneração dos agentes públicos, bem
como, se do interesse dos entes consorciados, os casos de contratação por tempo
determinado para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público.
Subscrito o protocolo de intenções pelos entes consorciados, deverá este ser
encaminhado em anexo ao projeto de lei (ordinária) para sua ratificação junto à
respectiva Casa Legislativa. A ratificação do protocolo de intenções pelo Poder
Legislativo, nesse contexto, autoriza o chefe do Poder Executivo a celebrar o contrato de
consórcio público nos moldes referendados pela Casa Legislativa, isto é, conforme
cláusulas aprovadas (ratificadas) do protocolo de intenções apreciado pelo parlamento.
Por isso que, enquanto não ratificado o protocolo de intenções, faz-se impossível a
celebração do contrato de consórcio público.
A celebração do contrato de consórcio público está condicionada à prévia
ratificação do protocolo de intenções por lei de cada ente federativo interessado no
consorciamento. Portanto, o conteúdo do contrato de consórcio público encontra seus
limites no que fora aprovado pelo Poder Legislativo quando do encaminhamento do
protocolo de intenções pelo chefe do Poder Executivo, mediante projeto de lei de
ratificação.
Ratificado o protocolo de intenções nas Casas Legislativas dos entes
interessados, resta autorizada a celebração do contrato de consórcio público. As matérias
a serem ventiladas no contrato de consórcio público são aquelas especificadas no art. 4º
da Lei federal nº 11.107/2005, isto é, as mesmas elencadas para formação do protocolo
de intenções. Por isso, reforça-se ser o contrato de consórcio público mero reflexo (total
ou parcial) do protocolo de intenções, nos limites de eventual ratificação com ressalvas.
Autoriza a Lei dos Consórcios Públicos que apenas parte dos entes da Federação
subscritores do protocolo de intenções celebrem o contrato de consórcio público, sem
prejuízo de que os demais venham a integrá-lo posteriormente (art. 5º, § 1º da Lei nº
11.107/2005). Caso a ratificação ocorrer após dois anos da primeira subscrição do
protocolo de intenções, o consorciamento dependerá da homologação dos demais
subscritores ou, caso já constituído o consórcio, de decisão da assembleia geral.
Ao lado da figura do contrato de consórcio público, a Lei dos Consórcios Públicos
prevê a figura do contrato de programa para regrar as obrigações estabelecidas entre
entes da Federação ou entre estes e o consórcio público no âmbito da gestão associada
de serviços públicos, em que haja a prestação de serviços públicos ou a transferência total
ou parcial de encargos, serviços, pessoal ou de bens necessários à continuidade dos
serviços transferidos. O art. 13, caput da Lei nº 11.107/2005 é taxativo em condicionar a
validade dessas obrigações à prévia celebração do contrato de programa.
Assim, o contrato de programa pode ser compreendido como o instrumento pelo
qual devem ser constituídas e reguladas as obrigações que um ente da Federação,
inclusive sua administração indireta, tenha para com outro ente da Federação, ou para
com consórcio público, no âmbito da prestação de serviços públicos por meio de
cooperação federativa (art. 2º, XVI do Decreto federal nº 6.107/2007).
Enquanto que as obrigações são em regra disciplinadas por meio de contrato de
programa, estabelece a Lei dos Consórcios Públicos que compete ao contrato de rateio
dispor sobre o repasse de verbas pecuniárias entre os entes consorciados e o consórcio
público, para custeio deste. Aliás, o texto de lei é taxativo ao estabelecer que os entes
consorciados somente entregarão recursos ao consórcio público mediante contrato de
rateio (art. 8º, caput da Lei federal nº 11.107/2005).
A dinâmica dos consórcios públicos pode ser sintetizada no seguinte gráfico:
Contrato de
programa
Novos
consorciados
Atendimento das
disposições estatuárias(ratificação, carência etc)
Consórcio
Público
Contrato do Consórcio
(Estatuto)
Contrato de rateio(formalizado em cada exercício)
Aprovação dos
consorciados
Ratificação
por Lei
Protocolo de
intenções
Criação da pessoa
jurídica do Consórcio
Delimitação dos
serviços executados
pelo consórcio
Especificações quanto ao
repasse de recursos
financeiros ao consórcio
Como conclusão, vê-se que o funcionamento dos consórcios públicos não é
simples e requer cuidados especiais por parte dos gestores públicos, desde sua concepção
inicial até sua operacionalização21. É fundamental que seus documentos de criação
estejam compatíveis com a legislação de regência e com os próprios princípios inerentes
à regulação dos serviços públicos, a exemplo do que ocorre no setor do saneamento
básico (art. 21 da Lei nº 11.445/2007).
21 A Secretaria do Tesouro Nacional (STN) disciplinou regras próprias a serem observadas pelos consórcios públicos e pelos entes da Federação consorciados no âmbito da contabilização das receitas e despesas (vide Portaria/STN nº 274, de 13 de maio de 2016 e Instruções de Procedimentos Contábeis (IPC) n. 10 – Contabilização de Consórcios Públicos).
Da criação ao funcionamento: como dar vida às agências de regulação?
A criação de uma agência de regulação é tarefa que demanda amplo e prévio
planejamento por parte dos entes da Federação. É preciso que a Administração averigue,
no mínimo, (i) os serviços que serão objetos de regulação (possibilidade de criação de
agências reguladoras multisetoriais, especialmente no âmbito municipal), (ii) a demanda
e complexidade que será exigida dessa agência, (iii) a possibilidade de gestão associada
desses serviços (convênios de cooperação ou consórcios públicos), permitindo maior
ganho de escala e cooperação federativa, (iv) o custo desses serviços e as fontes de receita
disponíveis para satisfazer a autonomia financeira da entidade, (v) a possibilidade de
cessão de pessoal dos quadros da Administração e a necessidade de realização de
concurso público, (vi) o tempo necessário para a formação de equipe técnica capacitada
e apta ao exercício funcional, inclusive diante do cenário local e regional (vii) as
experiências existentes no país e no exterior, para a devida alocação dos riscos
regulatórios e (viii) os impactos que a regulação desses serviços ensejarão na sociedade,
inclusive se onerarão o custo dos serviços públicos prestados à sociedade. São temas
intrinsicamente correlatos à atividade regulatória e que carecem de prévio planejamento
por parte dos gestores públicos responsáveis pela tomada de decisão.
Por isso, a minuta do projeto de lei de criação de qualquer agência de regulação
deve ser produto de intenso debate técnico pelas diferentes áreas da Administração
Pública, na busca de restarem contempladas todas as matérias e demandas inseridas na
regulação dos serviços públicos. Não se olvida que existem inúmeros modelos de projetos
de lei à disposição dos interessados, inclusive no setor de saneamento básico, nos seus
diferentes modelos regulatórios (agências municipais, estaduais e consorciadas).
Entretanto, a criação de uma agência de regulação, como acima exemplificado, não pode
dar-se de maneira abrupta, sem que sejam avaliados e ponderados, repita-se, os
elementos político-administrativos, jurídicos e financeiros em torno da constituição de
uma agência de regulação. E esse alerta mostra-se sensível especialmente para os
pequenos e médios municípios, que por vezes carecem das adequadas condições para a
criação de agência reguladora no setor do saneamento básico, principalmente devido aos
altos custos necessários para a manutenção das equipes técnicas desse tipo de entidade
pública (profissionais capacitados no mínimo nas áreas da economia, direito, engenharia
civil e/ou sanitária e contabilidade), o que acarreta em demasiado impacto no custo dos
serviços prestados à sociedade (impacto tarifário ou mesmo oneração geral à sociedade).
Exemplo da carência de melhor técnica na formação das agências reguladoras no
setor do saneamento diz respeito à carência de adequada previsão das penalidades a
serem aplicadas no exercício das funções públicas regulatórias. É comum no setor que as
agências não tenham disciplinado em suas leis de criação o rol de infrações e sanções
passível de imputação aos prestadores de serviços, estabelecendo os elementos mínimos
necessários para resguardar os princípios da legalidade e tipicidade administrativa.
Nesse caso, a falta de atenção quando da constituição legal da agência de regulação
redundará em prejuízo ao seu funcionamento, posto que seu poder sancionatório restará
prejudicado (vide art. 30, I, “a”, do Decreto federal n. 7.217/201022).
Assim, a fase preliminar de criação das agências de regulação é complexa e
precisa ser devidamente ponderada pela Administração. Atropelos nesse processo
provavelmente acarretarão em modelos imperfeitos e suscetíveis ao fracasso, pois não
devidamente planejados frente à realidade administrativa, jurídica e financeira e do ente
da Federação.
Criada a agência de regulação, faz-se necessária sua devida estruturação, que
passa, inevitavelmente, pela formação de quadros técnicos capacitados e permanentes,
compatíveis com a demanda regulatória imposta à agência. Para tanto, é fundamental que
as receitas auferidas pela entidade regulatória seja compatível com tais encargos.
Quadros técnicos mal remunerados e sem constante capacitação não conseguirão efetivar
atividades regulatórias adequadas frente aos desafios do setor, sendo muito provável a
ocorrência da captura técnica por parte do prestador de serviços. Agentes públicos
capacitados, mas mal remunerados, são atraídos pelo mercado. Agentes públicos
desqualificados, mesmo que bem remunerados, não conseguem vencer os argumentos
apresentados pelos profissionais qualificados contratados pelos prestados de serviços.
Em suma, o sucesso da regulação passa, necessariamente, pela formação de bons quadros
técnicos, constantemente capacitados e remunerados em consonância com os padrões do
mercado.
22 Art. 30. As normas de regulação dos serviços serão editadas: I - por legislação do titular, no que se refere: a) aos direitos e obrigações dos usuários e prestadores, bem como às penalidades a que estarão sujeitos;
Também de extrema relevância é a nomeação dos agentes públicos responsáveis
pelos cargos de direção da agência. É preciso que tais nomeações sejam calcadas na
tecnicidade, na experiência e no profissionalismo, evitando-se interferências político-
partidárias nessas nomeações e o loteamento partidário das agências, justamente porque
o modelo da regulação pressupõe a independência decisória e o alto nível técnico nas
suas deliberações. Certamente este é um problema central na conjuntura atual da
regulação no país, em todos os níveis da Federação23.
Outro ponto relevante para o sucesso das agências de regulação é a criação de
uma agenda regulatória. Trata-se da efetivação do planejamento das ações a serem
realizadas e dos objetivos a serem alcançados pela agência em curto, médio e longo
prazos, estabelecendo-se, por exemplo, quais os temas serão objeto de normatização. Em
suma, é fundamental que haja uma agenda regulatória, proporcionando transparência e
estabilidade na regulação setorial. Isso é de extrema relevância para o setor do
saneamento básico, carente, ainda, da normatização de grande parte dos assuntos sob
competência das agências de regulação24. É fundamental que a evolução das atividades e
dos normativos regulatórios seja devidamente sopesado pelos prestados de serviços, isto
e, que a sociedade e o mercado não sejam surpreendidos por “guinadas” ou “sobressaltos”
regulatórios. Por isso a relevância da criação de uma agenda regulatória, na qual os
diferentes atores da sociedade possam compreender os trabalhos a serem desenvolvidos
por cada agência de regulação.
Outro ponto que merece reflexão diz respeito à necessidade das agências de
regulação buscarem interação com a sociedade. Deveras, a proteção ao interesse público
(interesse geral da sociedade) é um dos pressupostos de existência da regulação dos
23 É emblemática a ilustração produzida pela Associação Brasileira de Agências de Regulação (ABAR) na sua revista destinada aos candidatos ao pleito eleitoral de 2018, intitulada de Desenvolvimento do Brasil: o papel da regulação. Brasília (2018. p. 8). Constam reproduções de matérias jornalísticas dos últimos anos denunciando o loteamento político-partidário das agências de regulação nos diferentes níveis da Federação, o que explica a baixa produtividade, eficiência e relevância de inúmeras agências de regulação para a sociedade brasileira. Esse cenário é absolutamente incompatível com os princípios inerentes à República, à Administração Pública e à regulação. 24 Conforme pesquisa realizada no âmbito do Ministério das Cidades, dos 41 temas regulatórios previstos no âmbito da Lei nº 11.445/2007, a agência que mais atendeu integralmente cada tema a ser regulado foi a Agência Reguladora do Estado de São Paulo (ARSESP), com 23 temas atendidos dentre os 41 listados. Das 23 agências pesquisadas, 20 não conseguiram cumprir com sequer metade do conteúdo normativo exigido pelo marco regulatório de 2007. (Ministério da Cidades. Série Apoio e Acompanhamento da Regulação do Saneamento Básico. Relatório IV – Contribuições para o aprimoramento da atividade regulatória. p. 10/11). No mesmo sentido caminham os estudos promovidos pela Associação Brasileira de Agências de Regulação - ABAR (Saneamento Básico: Regulação 2015. Brasília: Ellite Gráfica e Editora, 2015).
serviços. De pouco adiante a constituição de uma agência de regulação se ela não interage
com a sociedade, ou seja, dispõe de mecanismos para satisfazer o interesse geral da
sociedade e individual dos usuários. Esse é um problema central das agências de
regulação no setor do saneamento básico, que sofrem de déficit democrático. Por se
tratarem de estruturas ainda recentes e de menor escala em relação às agências nacionais
(como a ANEEL, ANS ou ANATEL), ainda é insipiente a interação entre as agências
reguladoras do saneamento básico e os usuários dos serviços regulados, assim como é
baixa a participação da sociedade nos processos de consulta e audiência pública
promovidas pelas agências de regulação. Daí a necessidade da adoção de políticas que
permitam aproximar a agência de regulação dos usuários, da sociedade civil organizada
e dos demais órgãos públicos, permitindo que a regulação esteja seja compreendida e
compartilhada pelos diferentes atores em torno do saneamento básico.
Eis, por fim, mais um ponto importante para o sucesso da regulação: a constante
busca de experiências exitosas no país e no estrangeiro. Muita coisa boa já fora realizada
no Brasil e no exterior em relação à regulação dos serviços, inclusive na área do
saneamento básico. Isso precisa ser replicado em cada agência, dentro das
condicionantes e realidades locais e regionais. É preciso que os dirigentes e demais
agentes públicos estejam abertos ao diálogo, participem de entidades setoriais (a
Associação Brasileira de Agências de Regulação – ABAR é um bom exemplo disso), cursos,
seminários, eventos, enfim, que conheçam a realidade da regulação, no intuito de adotar
boas ideias e práticas desenvolvidas, ou abandonar aquelas que já se mostraram
ineficientes e incompatíveis com os objetivos da regulação.
Conclui-se, assim, que dar vida à regulação não é tarefa simples e rápida. As
atividades envoltas às agências de regulação são complexas e exigem muito
planejamento, conhecimento do setor regulado e dedicação dos seus dirigentes. Trata-se
da implementação de politica pública de Estado, de longo prazo, inserida na atuação do
Estado frente a interesses da maior relevância para a sociedade: controle e fiscalização da
prestação dos serviços públicos.
Recomendação (Guia)
Escopo: Requisitos legais de constituição e funcionamento de uma agência
de regulação (I-05 e I-06)
Versão: 0 Data: 1º/10/2018
Objetivos:
Especificar as condições legais de criação e funcionamento das agências de
regulação no setor do saneamento básico, nos seus diferentes modelos
atualmente concebidos.
Principais usos:
A observância da legalidade é condição sine qua non para que as agências de
regulação possam expedir atos e desenvolver atividades lícitas, destinando-se,
assim, a satisfazer os princípios e as regras jurídicas vigentes no ordenamento
jurídico brasileiro, o que requer atenção e cuidado dos gestores públicos quando
da concepção e criação de uma agência de regulação.
Conceitos:
Regulação: todo e qualquer ato, normativo ou não, que discipline ou organize um
determinado serviço público, incluindo suas características, padrões de
qualidade, impacto sócio-ambiental, direitos e obrigações dos usuários e dos
responsáveis por sua oferta ou prestação e fixação e revisão do valor de tarifas e
outros preços públicos;
Agência de regulação: pessoa jurídica de direito público, de natureza autárquica,
constituída por um ou mais entes da Federação, com competências próprias de
natureza regulatória e detentora de independência decisória, e que não acumule
funções de prestador dos serviços regulados;
Princípio da legalidade administrativa: norma jurídica destinada ao poder
público, que tem como objetivo assegurar que a Administração Pública e seus
agentes somente atuem em observância da reserva legal, isto é, nos estritos
termos autorizados por lei.
Consórcio público: pessoa jurídica formada exclusivamente por entes da
Federação, na forma da Lei nº 11.107/2005, para estabelecer relações de
cooperação federativa, inclusive a realização de objetivos de interesse comum,
constituída como associação pública, com personalidade jurídica de direito
público e natureza autárquica, ou como pessoa jurídica de direito privado sem fins
econômicos;
Gestão associada de serviços públicos: exercício das atividades de planejamento,
regulação ou fiscalização de serviços públicos por meio de consórcio público ou
de convênio de cooperação entre entes federados, acompanhadas ou não da
prestação de serviços públicos ou da transferência total ou parcial de encargos,
serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos.
Principais vantagens e desvantagens:
Ao estabelecer os requisitos legais para a constituição de uma agência de
regulação, busca-se evitar que essas entidades sejam criadas com vícios de
legalidade, a contaminar os trabalhos de regulação e fiscalização dos serviços
públicos. Como o processo de concepção e criação de agências de regulação no
formato de consórcio público é mais complexo, exigindo atenção redobrada da
Administração Pública, é fundamental que existam cartilhas e materiais aptos a
auxiliar os gestores públicos na tomada de decisão de qual o modelo regulatório
adotar, e os passos e orientações necessários para a efetiva implementação da
regulação.
Como desvantagem, o uso de modelos, guias e manuais não podem dispensar o
trabalho das equipes técnicas qualificadas para a estruturação de uma agência de
regulação, desde a fase de diagnóstico à sua efetiva operacionalização, sob pena
de adoção de modelos que não se encaixam frente à realidade jurídica, financeira
e administrativa do titular dos serviços.
Premissas:
O estudo tem como premissa básica e central o cumprimento do ordenamento
jurídico, incluindo o respeito aos precedentes judiciais e a doutrina especializada,
sem prejuízo da análise das experiências já consolidadas no país.
Principais Referências:
ARAGÃO, Alexandre Santos de. Agências reguladoras e a evolução do direito administrativo econômico. 3ª ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2013. MEDAUAR, Odete; OLIVEIRA, Gustavo Justino de. Consórcios públicos:
comentários à Lei 11.107/2005. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.
GALVÃO JÚNIOR, Alceu de Castro; et al. (Org.). Regulação do Saneamento Básico. Barueri: Manole, 2013.
Principais Diretrizes:
ANÁLISE DA LEGISLAÇÃO NACIONAL
As orientações têm como ponto de partida a Constituição Federal, que prevê a
constituição de pessoas jurídicas pela Administração Pública (art. 37, XIX),
passando pela análise da legislação infraconstitucional, dos precedentes judiciais
e da orientação doutrinária relacionada à legalidade das agências de regulação.
DIFERENTES ARRANJOS JURÍDICOS DA REGULAÇÃO DO SANEAMENTO
Importante a abordagem dos diferentes modelos de regulação dos serviços
previstos na legislação, diante da possibilidade da criação de agências de
regulação sob o formato de consórcios públicos de direito público, que detém
natureza de autarquia interfederativa. Da mesma forma, relevante a abordagem
da legalidade de atuação das agências reguladoras em favor de outro ente da
Federação da qual pertence, situação esta muito comum em relação às agências
reguladoras estaduais, que acabam por exercer a atividade regulatória de
competência municipal mediante convênios de cooperação.
REQUISITOS ESPECÍFICOS DA LEI N. 11.445/2007
O marco regulatório do saneamento traz inúmeras regras inerentes à atividade
regulatória e à forma de atuação das agências de regulação, que devem ser
observadas quando da sua constituição pelos entes da Federação.
EXPERIÊNCIAS CONSOLIDADAS NO BRASIL
Acredita-se relevante a abordagem das experiências atualmente consolidadas no
Brasil no campo da regulação dos serviços de saneamento básico, em todos os
níveis e regiões da Federação.
Referências bibliográficas
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE AGÊNCIAS DE REGULAÇÃO (ABAR). Saneamento Básico: Regulação 2015. Brasília: Ellite Gráfica e Editora, 2015. _________. Desenvolvimento do Brasil: o papel da regulação. Brasília, 2018. ARAGÃO, Alexandre Santos de. Agências reguladoras e a evolução do direito administrativo econômico. 3ª ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2013. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 25ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Consórcios públicos. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2013. DALLARI, Adilson Abreu. Arbitragem na Concessão de Serviço Público. Revista de Informação Legislativa do Senado Federal – RIL, 128/63-67. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2014. GALVÃO JUNIOR, Alceu de Castro (Coord.); XIMENES, Marfisa Maria de Aguiar Ferreira (Coord.). Regulação: Normatização da prestação de serviços de água e esgoto. vol I e II. Fortaleza: Expressão Gráfica e Editora, 2009. FREITAS, Juarez. Novo modelo de direito da regulação e desafios pós-crise global. In:
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