Problematizando o instrumento visita domiciliar

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Problematizando o instrumento visita domiciliar Problematizing the home visit Cristine Jaques Ribeiro 1 ___________________________________________________________ Resumo: O presente artigo pretende apresentar a análise da autora sobre o instrumento visita domiciliar. Esta análise surge como resultado das experiências vividas no campo da formação profissional como docente e, em especial, na disciplina de Oficina Profissional, que instiga os acadêmicos a trocar experiências e a posicionar-se frente à intervenção profissional. O texto convida a problematizar o uso do instrumento como legitimação de um poder imposto, bem como reinvenção do seu sentido para a conexão de práticas coletivas e criativas entre visitantes e visitados. Palavras-chave: visita domiciliar; prática profissional; coletivo; reinvenção. Introdução Considera-se a visita domiciliar um instrumento profissional e, consequentemente, este é utilizado por diferentes áreas do conhecimento, tornando a sua existência mais frequente na vida das multidões. No entanto, enquanto instrumento de análise, pouco se tem encontrado em termos de produções que problematizem o modo como é utilizado no cotidiano profissional do Serviço Social, bem como analisem como ele ressoa na vida da população (CERTAU, 1998). Assim, o presente texto surge das experiências vividas pela autora na docência, assim como nos diferentes espaços acadêmicos do curso de graduação em Serviço Social, na Universidade Católica de Pelotas, no ensino junto à prática pedagógica de orientação em estágio curricular, buscando problematizar o sistema de ensino no cotidiano da prática profissional através dos encontros de supervisão acadêmica, orientação de trabalhos de conclusão de curso e nas discussões em sala de aula e, em especial, na disciplina de Oficina Profissional em Serviço Social, na qual os acadêmicos são convidados a trocar experiências e a posicionar-se frente às diferentes realidades do cotidiano profissional. É recorrente a manifestação dos acadêmicos em questionar a falta de um debate maior sobre a visita domiciliar e a preocupação em tal instrumento se tornar equipamento de punição (FOUCAULT, 2000) frente às histórias de vida que o Serviço Social encontra em seus processos de trabalho. Para fundamentar a discussão, busca-se, então, dialogar a partir de um movimento desterritorializante e através de uma escrita cujo 1 Assistente Social, Mestra e Doutora em Serviço Social pela PUCRS, Professora do Curso de Serviço Social da Universidade Católica de Pelotas. [email protected] .

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Problematizando o instrumento visita domiciliar

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  • Problematizando o instrumento visita domiciliar

    Problematizing the home visit

    Cristine Jaques Ribeiro1

    ___________________________________________________________

    Resumo: O presente artigo pretende apresentar a anlise da autora sobre o instrumento visita domiciliar. Esta anlise surge como resultado das experincias vividas no campo da formao profissional como docente e, em especial, na disciplina de Oficina Profissional, que instiga os acadmicos a trocar experincias e a posicionar-se frente interveno profissional. O texto convida a problematizar o uso do instrumento como legitimao de um poder imposto, bem como reinveno do seu sentido para a conexo de prticas coletivas e criativas entre visitantes e visitados. Palavras-chave: visita domiciliar; prtica profissional; coletivo; reinveno.

    Introduo

    Considera-se a visita domiciliar um instrumento profissional e, consequentemente, este utilizado por diferentes reas do conhecimento, tornando a sua existncia mais frequente na vida das multides. No entanto, enquanto instrumento de anlise, pouco se tem encontrado em termos de produes que problematizem o modo como utilizado no cotidiano profissional do Servio Social, bem como analisem como ele ressoa na vida da populao (CERTAU, 1998).

    Assim, o presente texto surge das experincias vividas pela autora na docncia, assim como nos diferentes espaos acadmicos do curso de graduao em Servio Social, na Universidade Catlica de Pelotas, no ensino junto prtica pedaggica de orientao em estgio curricular, buscando problematizar o sistema de ensino no cotidiano da prtica profissional atravs dos encontros de superviso acadmica, orientao de trabalhos de concluso de curso e nas discusses em sala de aula e, em especial, na disciplina de Oficina Profissional em Servio Social, na qual os acadmicos so convidados a trocar experincias e a posicionar-se frente s diferentes realidades do cotidiano profissional.

    recorrente a manifestao dos acadmicos em questionar a falta de um debate maior sobre a visita domiciliar e a preocupao em tal instrumento se tornar equipamento de punio (FOUCAULT, 2000) frente s histrias de vida que o Servio Social encontra em seus processos de trabalho.

    Para fundamentar a discusso, busca-se, ento, dialogar a partir de um movimento desterritorializante e atravs de uma escrita cujo

    1 Assistente Social, Mestra e Doutora em Servio Social pela PUCRS, Professora do Curso de Servio Social da Universidade Catlica de Pelotas. [email protected].

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    objetivo ampliar o olhar profissional, propiciando o alargamento deste tema como temtica social e objeto de anlise cientfica.

    A visita domiciliar - um instrumento de poder

    Considerando, hoje, que a sociedade est cada vez mais produzindo sistemas semiticos plagiados pela economia capitalista, possvel afirmar que os instrumentos profissionais fortalecem os cdigos sociais de poder que, constantemente, reproduzem padres de comportamentos policiais na vida heterognea da populao, tornando imperativa a imposio de uma modelizao homogeneizante2.

    Contudo, sabemos que, quando nos aproximamos, a partir da visita domiciliar, no espao de convivncias das famlias, a quem supostamente vamos atender, recorrente o risco de impor um modelo de vida desconsiderando os arranjos familiares, as histrias, as concepes do viver que podem ultrapassar os sistemas semiticos impostos, pois oferecem, em suas narrativas, um outro olhar de existncia que necessita ser considerado (GUATTARI, 1987).

    Portanto, problematizar a visita domiciliar enquanto instrumento profissional no apenas olh-la como ferramenta, mas, antes, analisar o efeito de seu discurso a partir de uma poltica simblica dos estabelecimentos institucionalizados e de suas praticas institudas (BAREMBLITT, 1998). No se trata aqui, porm, de negar a validade desse instrumento, e sim de instigar a anlise, pois, com esse instrumento, podem ser criadas condies, segundo Flix Guattari, [...] que permitam aos indivduos adquirir meios de expresso relativamente autnomos... (1987, p.55).

    Os espaos de formao profissional propiciam a produo de um conhecimento que pretende ser coletivo. Para tanto, tencionar discusses em sala de aula, por exemplo, poder exercitar a anlise sobre as prticas profissionais que esto cotidianamente sendo construdas e legitimadas pelos cdigos de verdades manifestadas nos discursos de interveno tica. No entanto, cabe questionar qual o sentido construdo sobre a categoria tica, quando, no discurso profissional, podem ser encontrados modelos estigmatizantes para a populao? (GOFFMAN, 1998).

    2 Encontra-se na obra de Jacques Donzelot uma pesquisa relevante sobre a construo do social e nesta se inclui, especialmente, o modo como as diversas profisses vo produzir instrumentos para reproduzir prticas hierarquizantes. Essa afirmao legitima-se j no prefcio, com os comentrios do filsofo francs Gilles Deleuze, quando se refere apropriao tambm da psicanlise com o social, no menos impositiva, mas com diferenas operacionais distintas: No que o psicanalista seja um trabalhador social, tal como resultou das outras linhas. Pelo contrrio, muita coisa o distingue do trabalhador social: ele no vem em casa, no verifica o que se diz, no invoca nenhuma coero. Mas [...] seu papel foi de fazer flutuar as normas pblicas e os princpios privados, as percias e as confisses, os testes e as lembranas, graas a todo um jogo de deslocamentos, condensaes, simbolizaes... (DONZELOT, 1986, pp. 6-7).

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    A visita domiciliar, como instrumento impositivo, carrega o discurso higienista3 sobre os modos de vida da populao atravs de uma prtica policialesca. O modo punitivo expressa-se j no planejamento das visitas quando h, em determinados momentos, reproduo de discursos como: preciso pegar de surpresa o usurio. Essa postura profissional supe que h algo escondido que a populao no deseja apresentar. Contudo, se construmos relaes que pretendem garantir os direitos sociais, bem como denunciar as excluses produzidas pela sociedade, no seria tico instigar a populao a participar como cidado de direito? E a garantia dessa participao no poderia comear na micropoltica da visita domiciliar, pois, o direito de saber e decidir frente aos acontecimentos implicaria relaes tranversalizantes entre populao e profissionais? (GUATTARI & ROLNIK, 2000).

    Sendo a visita domiciliar caracterizada como instrumento profissional, cotidianamente se torna uma das ferramentas para construir a concepo do social e das paisagens desenhadas de modo coletivo. Assim, na tentativa de delinear um mapa de atuao e de atendimento profissional frente s diferentes realidades encontradas pelo profissional de Servio Social e com a preocupao de incluir cada vez mais a populao nos programas sociais fruto da conquista dos direitos sociais, resvalamos na fragilizao do prprio atendimento.

    Mas qual fragilizao est sendo referida? A fragilizao em tornar a prtica profissional uma prtica punitiva, permeada por dogmas morais institudos socialmente que, na histria linear, eram acompanhados do inqurito, com o objetivo de intimidar, inspecionar e fiscalizar os modos de viver da populao, fruto do desejo da ordem estabelecida. A reproduo dos preconceitos raciais, os estigmas que marcam as escolhas sexuais, o controle sobre as escolhas dos modos de viver frente aos diferentes arranjos familiares, a legitimao da subalternizao do pobre, a institucionalizao, os crceres sutis, articulados a partir das armadilhas maquinadas pelo prprio sistema capitalista, ainda podem ser reproduzidos nos dias de hoje.

    H profissionais que usam a visita domiciliar para realizar uma busca de coisas, como provas que atestem alguma situao. A impresso que fica a de a visita domiciliar terminar no momento em que se encontrar a coisa procurada. Imagine que situao desagradvel: voc visitado e o profissional nem olha para voc, pergunta coisas sem dialogar com voc! Infelizmente h quem faa isso nas visitas(...) (AMARO, 2000, p. 199).

    3 A populao torna-se objeto de investigao e, mais, de vigilncia e interveno. Fica novamente posta em destaque a questo do corpo dos indivduos e da populao sobre o qual novas regras passaram a se impor. A infncia e a famlia, nesse sentido, foram alvos privilegiados: ambas se tornaram instituies reguladas por normas cada vez mais rgidas segundo as quais o corpo limpo e bem cuidado da criana era de responsabilidade da famlia. Sobre ambos a polcia mdica intervinha com dispositivos de controle social atravs, principalmente, da higiene do corpo (BARROS, 2007, PP. 52).

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    O poder bio-poltico (NEGRI ; HARDT, 2001) que se instaura na gerao da vida dos coletivos docilmente adestrado atravs de diferentes ferramentas de imposio social. Tal imposio social poder reproduzir a coero das famlias por intermdio da visita domiciliar, uma vez que o profissional vai at a casa de cada famlia para codificar a linguagem (PCHEUX, 2006) emitida no dilogo coletivo, transformando a sua aproximao em construo de normas de conduta que precisam ser reguladas e adaptadas socialmente4.

    Codificar a linguagem torn-la verdade inquestionvel (FOUCAULT, 2001). isso que queremos? isso que o profissional busca legitimar em sua atuao frente aos atendimentos domiciliares? Pois bem, a valorao moral j conhecida de longa data, contudo, quando encaminhamos a populao segundo a valorao moral (NIETZCHE, 2006), enclausuramos as possibilidades de transformao que podem ser construdas coletivamente, ou seja, quando afirmamos, a partir da visita domiciliar, que a famlia produzimos um perfil desejado dentro dos moldes da sociedade casta. Portanto, a capacidade da famlia em no ser se torna inviabilizada. No entanto, possvel concordar que a famlia naquele momento, mas que poder no ser em outro. Essa ltima afirmao liberta a famlia do modelo pr-estabelecido e da regulao imposta pela sociedade capitalista.

    Desse modo, quando reconhecemos uma realidade de atendimento por intermdio da visita domiciliar, no negamos as informaes encontradas, mas ampliamos o olhar profissional que um olhar tico-poltico que reconhece o potencial da famlia/grupo encontrado. Um exemplo o tema violncia domstica no cotidiano da prtica do Assistente Social, contudo, corremos o risco de intervir pautados nas reprodues de preconceitos que j determinaram o crime, o criminoso e seu encarceramento como soluo para proteo da sociedade. No entanto, a violncia uma produo social, e no um ato individual, pois, se h violncia domstica, esta foi construda num processo coletivo e, portanto, legitimado por este.

    Outro exemplo:

    (...) em nossa atividade no Servio Social, quantas vezes fazemos uma visita domiciliar de onde voltamos com informaes sobre as condies de moradia, sobre quantas pessoas vivem na casa, quanto ganham, mas no temos nenhuma informao sobre o modo de vida das pessoas, no sabemos como vivem a sua vida, quais suas experincias sociais e que significado atribuem a isso. [...] Se queremos conhecer modos de vida, temos que conhecer as pessoas (MARTINELLI, 1999, p. 20,22).

    4 Essa afirmao resulta dos debates e das trocas de experincias vivenciadas junto aos acadmicos nos diferentes espaos da formao profissional em Servio Social. Cabe aqui questionar: ser que a Teoria Funcionalista na prtica profissional do Servio Social perdeu sua fora? Ou est vestida com outra roupagem? Certo que nossos princpios negam tal interveno, e ela ainda sobrevive no adestramento dos corpos por intermdio de um discurso conservador imperativo.

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    Assim, reconhecer que a famlia poder ser outra significa propiciar espaos de trocas de conhecimento para que os componentes possam participar e ver-se num outro processo, que aqui nomeamos como processo molecular5.

    No entanto, o capitalismo vai criar mecanismos de controle6 dos corpos das multides e, dentre estas, est a populao atendida pelo Servio Social. E o controle vai fortalecer-se pelas imagens reproduzidas pelos diferentes meios de comunicao social que so veiculados nos diferentes espaos de convivncia profissional, tornando recorrentes discursos como: pobreza no sujeira, ento limpe sua casa; o pai usa drogas, ento o filho tambm vai usar; a me prostituta, a filha tambm ser. O fato que no se negam essas possibilidades, mas tornar signo tais realidades impor j, de antemo, a escolha de como a populao vai viver sem, antes, deixar que ela prpria possa produzir outros caminhos e outros modos de viver.

    Ainda pertinente afirmar que a fragilidade frente visita domiciliar tambm acontece na necessidade profissional de interpretar a realidade, considerando-a absoluta e tornando representativo o que no . Ou seja, existe algo por trs daquilo que apresentado e precisa ser analisado, ser? As diferentes histrias de vida, os diferentes olhares dessas histrias e os diversos modos de conviver em grupo, em famlia, coletivamente, desconstroem imagens cristalizadas sobre a vida da populao. Dessa forma, as realidades apresentam-se no dito e tambm no no dito, mas o fato que elas existem. Basta que o profissional se abra para perceber o que est em sua frente, na tentativa de no criar mitos e smbolos constitudos e caracterizados pelas prticas preconceituosas, que teimam impedir a manifestao das vidas encontradas na visita domiciliar.

    Mais uma questo importante que pode impedir uma visita domiciliar profissional tranversalizante (BAREMBLITT, 1991) a concepo de cultura que se tenta construir. Entende-se, aqui, como cultura um conjunto de modelos, normas e regras construdas sobre determinadas realidades. A questo quem construiu os modelos? Quando feito algum tipo de anlise atravs do encontro com determinas famlias, em seus espaos de moradia, seria criativo no reproduzirmos as nossas concepes sobre como deve-se agir e, antes, construir juntos as possibilidades de existncia, j que:

    5 O processo molecular aqui relacionado ao conceito de revoluo molecular criado pelo autor Flix Guattari que diz respeito a uma prtica poltica que compe a superfcie de produo, ou seja, um processo agenciado por acontecimentos coletivos, nmades e desejantes.

    6 A poltica no vive o meio-dia, como quis Zaratustra de Nietzche. Ela progride na sombra, uma sombra ampliada que se apresenta contemporaneamente poupando os cidados dos efeitos distorcidos da luz do sol, como um terapeuta para o mundo do escravo liberto da caverna platnica. Exige que sigamos servos voluntrios; quer-nos domesticados, participando de um mundo de possvel controle para os conflitos como ativistas dos direitos civis, polticos e sociais, normalizados e dispostos pela disciplina e pelo controle eletrnico (PASSETI, 2003, pp. 13).

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    No se trata [para ela] de transmitir mensagens, de investir imagens como suporte de identificao ou padres formais como esteio de procedimento de modelizao, mas catalisar operadores existenciais suscetveis de adquirir consistncia e persistncia (GUATTARI, 1992, pp. 31).

    Dessa maneira, com as questes j manifestadas, possvel afirmar que a visita domiciliar se torna um instrumento de poder profissional, mas que tambm, sendo aproximado dos modos de viver da populao, pode exercitar seu poder (FOUCAULT, 1995), no legitimando uma relao autoritria e dogmtica, mas um processo coletivo que consegue garantir o exerccio micropoltico desse poder.

    [...] o assistente social, como sujeito, est em jogo de poder-saber e se pe no s como sujeito da comunicao, mas como aquele que dirige e influencia reciprocamente. Nesse jogo estratgico, o assistente social, alm de dispor de um saber (conhecimento especifico) materializado em tcnicas, instrumentais que orientam metodologias de ao, etc., portador de uma tica que orienta, inegavelmente, sua interveno profissional (BRASIL, 2001, p. 167).

    Portanto, sendo o Assistente Social um profissional que intervm no cotidiano da vida da populao/multido, ele necessita passar de um olhar moral normativo para um olhar tico. Olhar tico, aqui considerado na relao com outro, na produo da vida, etc., ou seja, um olhar que reconhece uma outra esttica, a esttica da existncia.

    A esttica da existncia a tica que questiona a prpria existncia, uma dimenso racional referida capacidade que o sujeito tem de julgar e fazer escolhas, e, dessa maneira, no se submeter passivamente s normas e s convenes que nos governam. Diramos que uma tica do desafio: tentem nos colonizar. o que definimos como trabalho esttico do sujeito consigo mesmo e com os outros, fato que nos leva a falar de uma poltica da arte de viver que supera o mero individualismo para se centrar nos corolrios ticos de uma poltica de organizao da sociedade. (BRASIL, 2001, p. 167)

    Visitantes e visitados: conexes possveis

    Passemos, ento, para um outro olhar do instrumento, isto , para sua prpria reinveno. Reinventar o sentido de visita domiciliar, como instrumento profissional, retir-lo do lugar absoluto, construindo novos objetivos possveis. Assim, possvel desconstruir o sentido da prpria prtica, quando buscamos criar linhas capazes de aproximar o profissional do mundo vivido.

    A aproximao profissional, aqui, ter o sentido de conexes possveis (DELEUZE; GUATTARI, 2004), ou seja, a visita domiciliar propiciar encontros que considerem a diferena como necessria num

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    processo de transformao social, pois no h exerccio autnomo do poder se no reinventarmos o olhar sobre o prprio poder. Mas o olhar reinventado acontece na acolhida da diferena, pois existir diferir7.

    Consequentemente, possvel reconhecer os modelos epistemolgicos construdos durantes as diferentes histrias da formao profissional e o constante risco de dissociar teoria e prtica, por parte dos profissionais Assistentes Sociais, por exemplo. Contudo, a visita domiciliar pode possibilitar a desconstruo do processo linear e homogneo, conservado pelos paradigmas tradicionais da profisso no encontro entre professor, acadmicos, profissionais e populao, tornando o espao do cotidiano um espao de re-encantamento com um outro modo de viver a profisso. Esse outro modo se manifesta num criar que se constitui no processo em que a criana ou o adulto convive com o outro e, ao conviver com o outro, transforma-se espontaneamente... (MATURANA, 2005, pp.29).

    Desse modo, o processo de construo coletiva de uma outra educao, a partir de prticas pedaggicas que instigam o re-encantamento profissional junto com a populao, tornar possvel o rompimento com as hierarquias do conhecimento, reconhecendo um saber heterogneo vibrtil.

    Para que essa proposta se efetue, os diversos espaos da formao profissional necessitam ser considerados como espaos de produo do conhecimento coletivo constante, no exerccio da alteridade, do cuidado, da ateno cartogrfica e na acolhida das multiplicidades como categorias tericas importantes na perspectiva de uma formao libertadora, na tentativa de romper cotidianamente com outras categorias tericas que teimam em reproduzir-se na prtica profissional atravs do preconceito, da excluso social e na reproduo de estigmas que disciplinam os corpos envolvidos, como bem lembra Michel Foucault em suas diversas obras.

    A implicao dos acadmicos frente aos modos de viver encontrados por intermdio da visita domiciliar agencia outras prticas profissionais capazes de desconstruir lugares territorializantes. O social transforma-se num movimento do vir a ser, escapando dos modelos, dos perfis e dos roteiros profissionais pr-estabelecidos, pois os significados constitudos pela linguagem do senso comum, existente, inclusive, na linguagem acadmica, so desconstrudos no encontro com as diferentes histrias de vida.

    A escuta sensvel e a acolhida ao diferente so potencializadas pela orientao de um tipo de prtica que busca abrir-se no cotidiano para as multiplicidades, extraindo a vida que ainda resiste s imposies do sistema capitalista. Portanto, no se trata de perder o rigor cientifico, mas antes de no coloc-lo em lugar privilegiado. Reconhecer a narrativa coletiva (BENJAMIM, 1996) poder permitir um contar mediante

    7 Expresso utilizada pelo socilogo Gabriel Tarde em sua obra: Monadologia e Sociologia, referenciada por Tiago Seixas Themudo no cabealho: Existir diferir, e, de certa forma, a diferena a dimenso substancial das coisas, aquilo que elas tm de mais comum .

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    diferentes olhares capazes de transformar o seu prprio viver. Assim, o diferente, aqui, so os coletivos que esto em constante mutao.

    Consequentemente, o instrumento visita domiciliar contribuir para desconstruir rtulos acerca da vida da populao encontrada, pois propicia aproximao com outros mundos, outras histrias, outros olhares que no contar coletivo, constroem um outro modo de viver e de existir, antes no perceptvel aos campos institucionalizados.

    Transformar a realidade na perspectiva apresentada ser resultado de um processo coletivo desejante, j que a aceitao do diferente resistir aos padres sociais impostos reproduzidos junto s famlias hoje atendidas pelo Servio Social. Ento, os novos arranjos familiares sero reconhecidos, como tambm, seus direitos de existncia, que so desenhados por seus diversos modos de se manifestar e a se incluem, por exemplo, a prpria homossexualidade a qual ainda sofre coeres, mesmo com toda a defesa dos direitos humanos no mundo.

    Portanto, a acolhida das trajetrias e a busca da resoluo dos possveis problemas sero percebidas pelo profissional que permite o pouso prtico movido por uma ateno sensvel (KASTRUP, 2007), para perceber a capacidade que existe na populao de construir suas prprias linhas de superao frente s imposies do sistema capitalista. Ou seja, no se trata de negar o uso do instrumento profissional, mas sim de faz-lo coerentemente com aquilo pelo qual a profisso tanto luta, que no reproduzir subalternos no sistema. E isso se inclui na prpria relao construda profissionalmente.

    Visitantes e visitados se conectam, e a conexo acontece quando se potencializa uma escuta sensvel, um olhar atento, um despertar curioso para a vida que se manifesta cotidianamente nos diferentes mundos das multides que encontramos (RIBEIRO, 2007, p. 115). Dessa forma, o instrumento se reinventa, perdendo um possvel propsito vigiador, como se reinventa tambm seu modo de operar quando o espao do habitar ultrapassa o espao material da casa permitindo encontros entre visitantes e visitados onde os saberes se permitem conectar. Por que no sentados numa pedra com a proteo da sombra de uma rvore? Pois no o lugar propriamente que vai garantir o contar verdadeiro de como vivemos, mas sim o modo como conduzimos o instrumento para a produo de um dilogo que supere dificuldades e garanta qualidade de vida.

    Criar outros instrumentos profissionais bem como re-criar os de uso habitual, como a visita domiciliar, depende da pr-disposio dos profissionais e da populao. Ou seja, quando os profissionais criam outros modos de dialogar que no apenas aqueles que acontecem com o nico objetivo de preencher formulrios, por exemplo, e quando a populao rompe com seu lugar docilizado, possvel construir novas conexes que busquem criar outras prticas frente opresso cotidiana.

    O que se registra aqui, que o potencial coletivo cria ferramentas de viver no cotidiano. Um exemplo ocorre quando a populao constri junto seu prprio caminhar, abandonando o lugar de receptor das migalhas oferecidas por polticas assistencialistas e torna-se ator de suas

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    prprias prticas, bem como quando o profissional abandona o lugar de porta-voz para permitir que a voz da populao atendida possa se manifestar, pois ela j existe, basta querer ouvir.

    Assim, este texto quer problematizar o instrumento visita domiciliar, questionando a sua finalidade, ou seja, para que serve? Qual o propsito? Para instituir? Para vigiar? Para punir? Para adestrar? Para rotular? Para perseguir? Ou para criar prticas capazes de acolher a diferena? Prticas que instiguem processos autnomos? Prticas autorizadas pela participao do coletivo em seus encaminhamentos? Prtica que produzem um sentido sobre a categoria tica, que o de denunciar a moral homogeneizante que impe modos de conduta, de bom comportamento, de controle sobre a sexualidade dos corpos envolvidos,isto , prticas que denunciem um controle punitivo sobre a vida? Prticas que questionem os lugares hierarquizantes que decidem quem pode, ou no, falar sobre qualquer coisa? Prticas que escancarem o saber existente em lugares onde, muitas vezes, negligenciado?

    Abolir o castigo reproduzido pelas prticas profissionais, atravs de seus diversos instrumentos de interveno, deveria ser uma constante nas prticas que denunciam explorao, opresso, marginalizao, discriminao, entre outros substantivos encontrados na sociedade hoje. Mas, como bem lembra Leal: No teremos que nos submeter a uma forma, afinal seremos inventores do percurso (2004, p. 28). Enfim, no se trata de acabar com instrumento profissional, mas de reinvent-lo num sentido capaz de produzir encontros e saberes autnomo na formao de profissionais de Servio Social e da populao.

    Reconhecer que a visita domiciliar no um instrumento natural, mas uma produo das prticas profissionais. Da, evidencia-se a importncia de poder problematiz-la, com o intuito de modific-la, a fim de propor cotidianamente a qualificao da prtica do Assistente Social. Produzir a demanda desse instrumento apostar em prticas ocupadas com a competncia, e no com apenas o desempenho de funes. Portanto, problematizar a visita domiciliar como visita profissional poder rever a interveno nas suas diferentes facetas e esse exerccio feito pela escolha poltico-tica construda entre visitantes e visitados:

    Toda escolha tem uma histria, melhor seria talvez dizer que toda escolha uma histria porque ela produzida por um conjunto de foras que faz irromper, em um dado momento, a si mesma como escolha. Em verdade, se nos pensamos colhidos neste campo de foras, a escolha se faz, nos constitui ao mesmo tempo que a constitumos como escolha. (BARROS, 2007, pp. 317).

    A afirmao acima se autoriza na perspectiva de que, quando o profissional utiliza o instrumento, visita domiciliar, h implicao da relao que se conecta num campo de foras e de saberes coletivos. Essa busca profissional desenha-se num paradigma poltico-tico-esttico (GUATTARI, 1992), rompendo com a perspectiva individualista, harmoniosa e adaptativa que tenta ainda se arrastar no campo da prtica

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    do Assistente Social. Desse modo, defende-se que a visita domiciliar pode torna-se dispositivo do encontro entre visitados e visitantes, para opor-se pragmtica esmagadora dos seres em grupo, pois se arrisca a experimentar processos de conquista coletiva.

    Reinventar o instrumento8 retir-lo de uma perspectiva invasora para fazer proliferarem dimenses capazes de considerar as singularizaes que pulsam em cada espao do habitar revisitado pelos visitantes e visitados, uma vez que o desafio ser de perspectiva, ou seja, daquilo que se deseja propor e criar como prtica profissional.

    A visita domiciliar um instrumento intermedirio, um dispositivo que pode irromper territrios cristalizados, verdades institudas, escapando dos saberes constitudos para produzir saberes constituintes, produzindo conexes entre o cotidiano da vida familiar, por exemplo, e as expectativas dessa famlia.

    As famlias visitadas no so homogneas. Ento, o que interessa na visita domiciliar o que o instrumento dispara/agencia, e no o que regula. Assim, o instrumento no deve ser harmonizador, equilibrante, estabilizador, mas sim um dispositivo que proporcione gerar processos coletivos criativos.

    O que se pe em questo na Visita Domiciliar a possibilidade do desvio, desviar-se dos atravessamentos institudos pela moral da homogeneidade.

    importante afirmar que a interveno profissional nessa perspectiva ter a preocupao de implicar-se, ou seja, a implicao movimentar-se contra a cpia/modelo, reconhecendo a potncia existente nos diferentes modos de vida encontrados pela visita domiciliar. Reconhecer, na visita domiciliar a possibilidade de encontros que podem proliferar-se na dimenso criativa de seus agentes essencial.

    possvel conhecer uma famlia reconhecendo que suas praticas se do num constante processo de deslocamento, ou seja, (...) um deslocamento fundamental de referncia para o indivduo se deu quando esta passou da terra, de sua comunidade imediata, para fbrica (BARROS, 2007, PP. 43). Portanto, num constante processo de desterritorializao deixamos de ser a cada cotidiano, deslocamos das

    8 Aqui vale relacionar a perspectiva da visita domiciliar com o que autora Maria Lucia Martinelli afirma sobre a perspectiva dos sujeitos que participam do processo de pesquisa, em sua obra Pesquisa Qualitativa um instigante desafio: Como pensam sua problemtica? Que significados atribuem as suas experincias? (...) no s a minha viso de pesquisador em relao ao problema, mas tambm o que o sujeito tem a me dizer a respeito. Como no estamos procurando medidas estatsticas, mas sim tratando de nos aproximar de significados, de vivncias, no trabalhamos com amostras aleatrias, ao contrrio, temos a possibilidade de compor intencionalmente o grupo de sujeitos com os quais vamos realizar nossa pesquisa. (...) Quanto mais emoo colocarmos nas nossas pesquisas, mais vida elas tero (1999, pp. 20, 21, 22, 24 e 26). Portanto, ainda Martinelli faz uma apologia ao verso de Ceclia Meirelles sobre a vida: A pesquisa s possvel reinventada (1999, PP. 19). E afirmo, aqui, que o instrumento de interveno visita domiciliar s possvel reinventado.

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    identidades cristalizadas em nossos corpos nmades, j que possvel recusar os modelos de referncia para um vir a ser, um devir famlia.

    Enfim, possvel, no instrumento visita domiciliar, criar dispositivos de manifestao que rompam com a idia da vigilncia e da interveno policialesca, desconstruindo prticas profissionais que tenham o objetivo de fiscalizar os modos de viver das famlias por intermdio das concepes do certo-errado, limpo-sujo, bem-mal.

    Abstract: This article presents an analysis of the home visit as an instrument of intervention. It is the result of the authors experiences during professional teacher training and, in particular, during the Professional Workshop course where students were encouraged to exchange experiences and take a stand as regards professional intervention. The text invites the reader to discuss the use of the home visit as a means of legitimization of an imposed power, and to reinvent its meaning for the connection between collective and creative practices between visited visitors and visited. Words Key: Home visit; professional practice; collective; reinvention.

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