Prisioneiros do Estigma: Representações Sociais Sobre ...
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Universidade Estadual do Ceará
Lucita Cunha Matos
PRISIONEIROS DO ESTIGMA: REPRESENTAÇÕES
SOCIAIS SOBRE ADOLESCENTE INFRATOR
Fortaleza – Ceará
2004
M425p Matos, Lucita Cunha. Prisioneiros do estigma: representações sociais sobre adolescente infrator / Lucita Cunha Matos. – 2004.148p. Orientadora: Profa. Dra. Maria Lúcia Duarte Pereira. Projeto de Dissertação (Mestrado em Saúde da Criança e do Adolescente) – Universidade Estadual do Ceará, Centro de Ciências da Saúde. 1. Adolescente. 2. Representações sociais. 3. Estigma. I. Universidade Estadual do Ceará, Centro de Ciências da Saúde.CDD:155.5
Universidade Estadual do Ceará
Lucita Cunha Matos
PRISIONEIROS DO ESTIGMA: REPRESENTAÇÕES
SOCIAIS SOBRE ADOLESCENTE INFRATOR
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado Profissional
em Saúde da Criança e do Adolescente, da Universidade
Estadual do Ceará, como requisito parcial para obtenção do
grau de Mestre em Saúde da Criança e do Adolescente.
Orientadora: Profª Drª Maria Lúcia Duarte Pereira
Fortaleza – Ceará
2004
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
MESTRADO PROFISSIONAL EM SAÚDE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
Título do Trabalho: Prisioneiros do estigma: representações sociais sobre
adolescente infrator
Autora: Lucita Cunha Matos
Defesa em: _____/____/_____
Banca Examinadora
_________________________________________
Profª Drª Maria Lúcia Duarte Pereira – Orientadora
_________________________________________
Profª Drª Antônia Silva Paredes Moreira - UFPB
_________________________________________
Profª Drª Sheva Maia da Nóbrega - UFPE
Dedico este trabalho aos meus filhos Camille e Thiago.
Que os anos jamais lhes roubem a sensibilidade com
que hoje olham para os muitos adolescentes que
percorrem os tortuosos descaminhos da vida e que
jamais desistam do compromisso com a construção de
um mundo mais justo.
AGRADECIMENTOS
À Profª Drª Maria Lúcia Duarte Pereira, orientadora e amiga, pela
dedicada atenção a mim dispensada na elaboração deste trabalho.
À Profª Drª Sheva Maia da Nóbrega que, com extrema competência,
emprestou valiosa contribuição às reflexões aqui empreendidas.
À Walhirtes Frota de Albuquerque, amiga querida, pelo incentivo e
confiança.
À Mirlânia Sâmara Maciel, pelo apoio incondicional à realização deste
trabalho.
Aos muitos colegas de trabalho, que gentilmente colaboraram para o
processo de coleta de dados e, em especial, à Mônica Araújo Gomes, por
sua incansável disposição para partilhar idéias.
Aos adolescentes e mães, sujeitos deste estudo, por dividirem comigo
fragmentos de sua vida.
RESUMO
A crescente participação de adolescentes no mundo do crime transformou-se em fenômeno contemporâneo de grandes proporções, sendo resultante do complexo quadro da violência que impregna o cotidiano das relações humanas em todo o mundo. A partir de então, a sociedade mobilizou-se para compreender este fenômeno e elegeu a categoria “adolescente infrator” para nela acomodar as suas explicações e organizar o modo de se posicionar perante a nova realidade. O presente estudo teve por objetivo apreender as representações sociais sobre adolescente infrator, elaboradas por adolescentes autores de homicídios ou latrocínios, privados de liberdade por sentença judicial, e por mães de adolescentes infratores, recortando do contexto social mais amplo um grupo de sujeitos que têm sua vida diretamente vinculada a esse objeto de investigação. Trata-se de um estudo de campo de tipo exploratório, com abordagem quantitativa e qualitativa, tendo por base a teoria das representações sociais. A pesquisa foi realizada em três centros de internação para adolescentes, coordenados pela Secretaria de Ação Social, localizados em Fortaleza-Ceará. Os instrumentos utilizados para a coleta de dados foram: Teste de Associação Livre de Palavras, aplicado a 112 sujeitos, e entrevista semi-estruturada, aplicada a 32 sujeitos. Os dados coletados no teste foram processados no soft Tri-Deux Mots e as entrevistas, submetidas à análise de conteúdo temática. Os resultados dessa análise apontaram seis categorias (caracterização do adolescente, caracterização do adolescente infrator, causas para o ingresso no mundo do crime, percepção do eu, perspectivas de mudança e expressões subjetivas) e sinalizaram representações sociais coincidentes entre os grupos, expondo sentimentos ambivalentes, reveladores do processo de incorporação do estigma na construção do autoconceito.
Palavras-chave: Adolescente infrator. Estigma. Representação social.
ABSTRACT
The increasing participation of teenagers in the world of crime has become a contemporary phenomenon of great proportions resulting from the complex violence situation that impregnates the day-to-day of the human relations all over the world. From that point, the society started to do something in order to understand this phenomenon and elected the “violator teenager” category for it to accommodate its explanations and organize the way of placing itself before the new reality. The present study has as an objective to apprehend the social representations about the violator teenager elaborated by the adolescents who commit crimes or armed robberies, deprived of freedom due to judicial sentence and by mothers of violator teenagers, abstracting from the more ample social context a group of subjects that have their lives directly connected to the investigation objective. This an exploratory field study with a quantitative and qualitative approach, having as a base the theory of the social representations. The research was performed in three centers of confinement for adolescents, coordinated by the Social Action State Secretary located in Fortaleza, Ceará. The tools used for collecting the data were: Test of Free Association of Words applied for 112 subjects and a semi-structured interview applied for 32 subjects. The collected data during the test were processed using the software Tri-Deux-Mots and the interviews were pointed six categories (Characterization of the teenager, Characterization of the Violator Teenager, Causes for Entering the World of Crime, Perception of the “I”, Perspectives of Changes and Subjective Expressions) and signaled social representations coinciding within the groups, exposing ambivalent feelings revealing a process of incorporation of the stigma in the construction of the self-concept.
Key-words: Violator Teenager. Stigma. Social Representation.
SUMÁRIO
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS..........................................................................12
LISTA DE FIGURAS, QUADROS E TABELAS..............................................................13
APRESENTAÇÃO................................................................................................13
CAPÍTULO 1.......................................................................................................18
DO FENÔMENO AO OBJETO: O RECORTE DE UMA SUBJETIVIDADE.......19
CAPÍTULO 2........................................................................................................34
REFERENCIAL TEÓRICO...................................................................................35
2.1 SOBRE A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS........................................35
2.2 SOBRE A FUNÇÃO DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS.......................................39
2.3 SOBRE O PROCESSO DE FORMAÇÃO DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS......42
CAPÍTULO 3........................................................................................................47
CAMINHO METODOLÓGICO..............................................................................48
3.1 NATUREZA DO ESTUDO........................................................................................48
3.2 O CAMPO DE ESTUDO...........................................................................................49
3.3 OS SUJEITOS.........................................................................................................51
3.4 OS INSTRUMENTOS...............................................................................................52
3.5 PROCEDIMENTOS PARA COLETA DE DADOS...................................................55
3.6 ANÁLISE E TRATAMENTO DOS DADOS..............................................................57
3.6.1 Análise de conteúdo................................................................................................573.6.2 Análise Fatorial de Correspondência.......................................................................65
CAPÍTULO 4........................................................................................................68
CONSTRUÇÃO DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SOBRE ADOLESCENTE INFRATOR............................................................................................................69
4.1 A CONSTRUÇÃO DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SOBRE ADOLESCENTE INFRATOR A PARTIR DA ANÁLISE DE CONTEÚDO..................................................71
4.1.1 Descrições sobre adolescente.................................................................................71 4.1.2 Descrições sobre Adolescente Infrator...................................................................78 4.1.3 Causas do Ingresso no Mundo do Crime...............................................................83 4.1.4 Perspectiva de mudança......................................................................................914.1.4 Percepção do eu...................................................................................................98 4.1.6 Expressões subjetivas.........................................................................................106
4.2 A CONSTRUÇÃO DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SOBRE ADOLESCENTE INFRATOR A PARTIR DA ANÁLISE FATORIAL DE CORRESPONDÊNCIA..............110
CAPÍTULO 5......................................................................................................118
CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................119
REFERÊNCIAS..................................................................................................124
ANEXOS.............................................................................................................130
COMPORTAMENTAIS.................................................................................................140
Mães..............................................................................................................................140
VIVENCIAIS.................................................................................................................140
Adolescentes................................................................................................................140
Mães..............................................................................................................................140COMPORTAMENTAIS...................................................................................................141Adolescentes..................................................................................................................141Mães..............................................................................................................................141VIVENCIAIS...................................................................................................................141Adolescentes..................................................................................................................141Mães..............................................................................................................................141SOCIOINTERACIONAIS................................................................................................142Adolescentes..................................................................................................................142 Mães...............................................142FAMILIARES..................................................................................................................142Adolescentes..................................................................................................................142
PSICOLÓGICAS.........................................................................................................143
Adolescentes................................................................................................................143
Mães..............................................................................................................................143
SOCIOECONÔMICAS.................................................................................................143
Adolescentes................................................................................................................143
Mães..............................................................................................................................143
PESSOAL....................................................................................................................144
Adolescentes................................................................................................................144
Mães..............................................................................................................................144
SOCIAL........................................................................................................................144
Adolescentes................................................................................................................144
Mães..............................................................................................................................144
FAMILIAR.....................................................................................................................145
Adolescentes................................................................................................................145
Mães..............................................................................................................................145
INSTITUCIONAL..........................................................................................................145
Adolescentes................................................................................................................145
Mães..............................................................................................................................145
ESPIRITUAL................................................................................................................145
Adolescentes................................................................................................................145
Mães..............................................................................................................................145
AUTOPERCEPÇÃO.....................................................................................................146
Adolescentes................................................................................................................146
IDEALIZADA..................................................................................................................146
HETEROPERCEPÇÃO................................................................................................147
Adolescentes................................................................................................................147
Mães..............................................................................................................................147
SENTIMENTOS...........................................................................................................148
Adolescentes................................................................................................................148
Mães..............................................................................................................................148
PENSAMENTOS..........................................................................................................148
Adolescentes................................................................................................................148
Mães..............................................................................................................................149
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AFC – Análise Fatorial de Correspondência
CONEP – Conselho Nacional de Saúde sobre Pesquisas envolvendo Seres
Humanos
CPF – Contribuição por Fator
ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente
FEBEMCE – Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor do Ceará
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ONU – Organização das Nações Unidas
RS – Representação Social
SAS – Secretaria da Ação Social
TRS – Teoria das Representações Sociais
UNESCO – Organização Educacional Científica e Cultural das Nações Unidas
UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância
LISTA DE FIGURAS, QUADROS E TABELAS
Figura 1 – Plano de análise............................................................................................59
Figura 2 – Descrições sobre adolescente......................................................................62
Figura 3 – Descrições sobre adolescente infrator..........................................................63
Figura 4 – Causas do ingresso no mundo do crime.......................................................63
Figura 5 – Percepção do eu...........................................................................................64
Figura 6 – Perspectiva de mudança...............................................................................64
Figura 7 – Expressões subjetivas...................................................................................65
Quadro 1 – Perfil dos sujeitos segundo as variáveis sociodemográficas........................52
Quadro 2 – Distribuição das categorias e subcategorias simbólicas sobre adolescente infrator............................................................................................................................61
................................................................................................................................140
Tabela 2 – Distribuição das freqüências, percentuais e qui-quadrado da categoria descrições sobre adolescente infrator e subcategorias, segundo o grupo de adolescentes autores de atos infracionais e mães.........................................................79
Tabela 3 – Distribuição das freqüências, percentuais e qui-quadrado da categoria causas do ingresso no mundo do crime e subcategorias, segundo o grupo de adolescentes autores de atos infracionais e mães.........................................................84
Tabela 4 – Distribuição das freqüências, percentuais e qui-quadrado da categoria perspectiva de mudança e subcategorias, segundo o grupo de adolescente autores de atos infracionais e de mães............................................................................................92
Tabela 5 – Distribuição das freqüências, percentuais e qui-quadrado da categoria percepção do eu e subcategorias, segundo o grupo de adolescentes autores de atos infracionais e de mães...................................................................................................99
Tabela 6 – Distribuição das freqüências, percentuais e qui-quadrado da categoria expressões subjetivas e subcategorias, segundo o grupo de adolescente autores de atos infracionais e de mães..........................................................................................107
Tabela 7 – Freqüência de palavras evocadas pelos grupos de adolescentes e de mães......................................................................................................................................113
Coabitou o homem com Eva, sua mulher. Esta concebeu e deu à luz a Caim. Então disse: adquiri um varão com o auxílio do SENHOR.Depois deu à luz a Abel, seu irmão. Abel foi pastor de ovelhas, e Caim, lavrador.
Aconteceu que no fim de uns tempos trouxe Caim do fruto da terra uma oferta ao SENHOR. Abel, por sua vez, trouxe das primícias do seu rebanho, e da gordura deste. Agradou-se o SENHOR de Abel e de sua oferta; ao passo que de Caim e de sua oferta não se agradou. Irou-se, pois, sobremaneira Caim, e descaiu-lhe o semblante.
Então lhe disse o SENHOR: Por que andas irado? E por que descaiu o teu semblante? Se procederes bem, não é certo que serás aceito? Se, todavia, procederes mal, eis que o pecado jaz à porta; o seu desejo será contra ti, mas a ti cumpre dominá-lo.
Disse Caim a Abel, seu irmão: Vamos ao campo. Estando eles no campo, sucedeu que se levantou Caim contra Abel, seu irmão, e o matou. Disse o SENHOR a Caim: Onde está Abel, teu irmão? Ele respondeu: Não sei. Acaso sou eu tutor de meu irmão? E disse Deus: Que fizeste? A voz do sangue do teu irmão clama da terra a mim.
És agora, pois, maldito por sobre a terra cuja boca se abriu para receber de tuas mãos o sangue de teu irmão. Quando lavrares o solo não te dará ele a sua força; serás fugitivo e errante pela terra. Então disse Caim ao SENHOR: É tamanho o meu castigo, que já não posso suportá-lo.
Eis que hoje me lanças da face da terra, e da tua presença hei de esconder-me; serei fugitivo e errante pela terra; quem comigo se encontrar me matará. O SENHOR, porém, lhe disse: Assim qualquer que matar a Caim será vingado sete vezes. E pôs o SENHOR um sinal em Caim para que o não ferisse de morte quem quer que o encontrasse.Retirou-se Caim da presença do SENHOR, e habitou na terra de Node, ao Oriente do Éden.
Livro de Gêneses, cap. 4, 1-16
APRESENTAÇÃO
Estamos construindo um mundo cada vez mais violento; exercitamos no
cotidiano a violência. Tratamos sem carinho o nosso planeta e não nos importamos
com a sua mutilação; tratamos sem carinho os nossos irmãos, nossos semelhantes
e não nos importamos com a sua dor. Estamos nos acostumando à violência que
não mais nos indigna ou sequer nos surpreende.
Os nossos adolescentes são os filhos do mundo. Estão aprendendo a
lição que não ousamos escrever de forma diferente e nem nos damos conta de que
precisamos fazê-lo. O preço que pagamos é alto. Estamos de luto pelo crescente
número de jovens em todo o mundo que adentram o mundo do crime e dele muitas
vezes não podem sair. Estes ocultam-se por detrás da máscara de marginais,
endurecem o olhar, a expressão do rosto, sufocam a sensibilidade de tal forma que
já não parece possível se perceberem e serem percebidos de outro modo. Mas, se
nos dispusermos a olhar seus olhos, a escutar sua alma, procurando esgarçar as
fronteiras do que está posto, poderemos, talvez, descortinar novos horizontes e
convidá-los a fazer o mesmo.
Em 1982, recém-formada em Psicologia, ingressei no mundo do trabalho
na extinta Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor do Ceará – FEBEMCE – que
desenvolvia a política social de assistência a crianças e adolescentes caracterizados
como carentes, perdidos, abandonados e infratores. Ainda regidos pelo antigo
Código de Menores, já deparávamos naquela época com garotos e garotas que
praticavam a violência e que eram retirados do convívio sociofamiliar e recolhidos
em unidades estaduais de privação de liberdade. O fato é que esses adolescentes,
chamados “menores”, eram em número pequeno e só alguns deles cometiam atos
muito graves como homicídio ou latrocínio.
14
Muitas indagações surgidas da prática profissional como psicóloga de
uma instituição pública voltada para a área social suscitaram o interesse de
investigar os fatores subjacentes ao ingresso do adolescente no mundo do crime,
em busca de respostas que poderiam estar não somente no saber das ciências, mas
também sendo gestadas no imaginário dos sujeitos que vivenciam essa realidade,
através de suas relações no mundo.
As representações sociais enprenham o contexto social e são patrimônio
comum dos seus vários atores, constituindo-se um conhecimento partilhado a partir
do qual os sentimentos e comportamentos são organizados. O aumento do número
de jovens autores de atos infracionais fez nascer a representação social adolescente
infrator. Assim, a compreensão e a socialização do fenômeno passam a servir de
base para orientar a comunicação dos homens. Apoiar este estudo na Teoria das
Representações Sociais torna possível perceber os sujeitos sociais no emaranhado
do mundo significante, construído na teia relacional da história humana. As
considerações que serão feitas a partir de seus resultados certamente ampliarão o
conhecimento na área das representações sociais sobre adolescente autor de ato
infracional.
Este trabalho encontra-se dividido em cinco capítulos. O primeiro aborda
a violência de um modo geral e ajusta o foco para o fenômeno do ingresso do
adolescente no mundo do crime, realidade que a sociedade científica e leiga busca
compreender. O capítulo aborda, ainda, dados sobre a situação do adolescente
envolvido com a prática infracional, no país e no estado, discutindo o processo de
construção de sua identidade marginal. O segundo capítulo faz considerações gerais
sobre a Teoria das Representações Sociais, suas funções e processos de formação,
incluindo reflexões sobre a representação social de adolescente infrator e suas
interfaces em cada um desses momentos. O terceiro capítulo discorre sobre a
metodologia do estudo, situa a sua natureza e o campo de pesquisa e descreve os
sujeitos e os procedimentos a serem adotados para a sua realização. O quarto
capítulo apresenta a elaboração das representações sociais feitas pelos sujeitos,
primeiramente a partir da descrição e análise dos resultados das entrevistas e, em
seguida, por meio dos resultados do Teste de Associação Livre de Palavras. As
respostas referenciadas pelos grupos foram consideradas à luz da Teoria das
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Representações Sociais e relacionadas a conteúdos teóricos que ampliaram a sua
análise. O quinto capítulo contempla questionamentos sobre os resultados do
trabalho e a sua aplicabilidade.
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Não haverá pré-disposições; haverá disposições, isto é, capacidades disponíveis
para viver a história e capacidades disponíveis para deformar o registro da
história, tornando-a estória.
Não haverá, na mente do homem, virtude ou pecado original.
Ninguém herdará dos ancestrais sua estória, pois a construção da própria estória
será o fator humano do homem. Que não falte à mente do homem nenhum
instrumento e nenhuma ferramenta para construir a estória sobre a história:
nenhuma magia lhe seja negada, desde inocentes devaneios até a criação do
inexistente.
Di Loreto
CAPÍTULO 1
DO FENÔMENO AO OBJETO: O RECORTE DE UMA SUBJETIVIDADE
A história da humanidade, ao longo do tempo, tem marcas de sentimentos
como ódio, solidariedade, ambição, generosidade, assim como, de uma gama
infinita de ações imersas na dimensão ora explícita, ora inconsciente do desejo. De
tal forma o homem recria a sua realidade que, embora o longo caminho trilhado se
faça parecer perdido tamanha a sua vastidão, um fio condutor jamais rompido
garante a nossa irmandade. Parece haver uma memória sensorial biológica que nos
dá a sensação de que partilhamos atitudes e emoções comuns desde o início dos
tempos e que carregamos no rosto um pouco de todos os outros humanos.
A violência não é uma invenção da contemporaneidade. Para além dos
estudos científicos que informam sobre os infindáveis conflitos humanos e disputas
por bens materiais ou simbólicos, a própria narrativa bíblica também fala do primeiro
homicídio da humanidade, praticado por Caim contra seu irmão Abel. Movido por
sentimento misto de inveja e raiva, Caim cometeu o assassinato pelo qual recebeu a
maldição de Deus e o transmitiu como legado aos seus descendentes. A versão
bíblica desse fratricídio põe por terra a utopia de um mundo de homens apenas
amorosos e solidários e autoriza a possibilidade de sua natureza também cruel.
Se, para a sobrevivência da espécie, o homem necessita estabelecer
pactos de cooperação – o fato inconteste de estarmos nos multiplicando a cada dia
prova isso – as trocas interacionais também estão inevitavelmente sujeitas aos
conflitos a ela inerentes. A agressividade faz parte da condição humana, vez que
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possibilita ao organismo a sua defesa. Gaiarsa (1993) destacou essa importância,
dando ênfase não apenas ao lado concreto da conservação da vida, mas ao fato de
que, pela agressividade, podemos investir na conquista de nossos ideais, naquilo
que identificamos como significativo para o nosso crescimento e amadurecimento.
Por outro lado, é oportuno questionar: o que motiva o homem a adotar
comportamentos destrutivos, a ser predador de si próprio? Na verdade, nenhuma
explicação linear poderia dar conta de sua abrangência multifatorial. Se recortes
podem ser feitos para compreender a violência focalizando prismas biológicos,
psicológicos ou sociais, ainda assim não seria possível fazer uma ruptura entre as
dimensões individuais e relacionais para localizá-la. A violência parece atravessar o
homem-corpo e o corpo social, alinhavando-os em suas fissuras, lançando no ar o
questionamento sobre os limites de seu território.
Inúmeros são os caminhos que têm sido percorridos para a compreensão
desse fenômeno no intuito de se chegar a uma identificação dos fatores que, pelo
menos em parte, expliquem a violência que aí está posta. Estudiosos de várias
áreas vêm contribuindo nesse sentido, agregando a esse esforço coletivo o saber
particular de suas ciências. Assim sendo, psicólogos, psicanalistas, sociólogos,
antropólogos, neurofisiologistas, filósofos, cientistas políticos, entre outros,
participam da inesgotável busca de tornar a violência um fenômeno compreensível e
passível de sofrer interferência.
A psicanálise trouxe importante contribuição para a compreensão do
psiquismo humano. Freud (1997) afirmou que o homem tem uma tendência natural à
agressão, o que acabaria pondo em risco a integridade e a existência da civilização.
Diante da impossibilidade de anulação dessa força destrutiva, ao invés de dirigi-la
contra o semelhante, aos homens cabe canalizá-la para outros focos, de modo que
seja investida de forma positiva nos objetos do seu mundo. Esse mecanismo de
controle do instinto agressivo cria a condição para a convivência dos homens,
mantidos sob um permanente estado de tensão, o que exige um elevado gasto de
energia por parte de todos. Segundo enfatizou Freud (1997, p. 67).
20
o elemento de verdade por trás disso tudo, elemento que as pessoas estão tão dispostas a repudiar, é que os homens não são criaturas gentis que desejam ser amadas e que, no máximo, podem defender-se quando atacadas; pelo contrário, são criaturas entre cujos dotes instintivos deve-se levar em conta uma poderosa cota de agressividade.
Assim, na teoria psicanalítica, o sonho de uma sociedade pacífica, de
uma aldeia global onde todos partilhem a vida fraternalmente, expresso na poesia de
canções que emocionam gerações, é uma utopia. É certo que a humanidade tem
conseguido fazer predominar o espírito de convivência e realizações entre os
humanos, entretanto, jamais conseguirá, com êxito, silenciar os demônios que
aguardam irrequietos a oportunidade de emergir por entre as fendas de seus
superegos. Enquanto a psicanálise prevê a imortalidade da violência, os homens
continuam sonhando com o amor e a harmonia em suas relações e, igualmente,
imortalizando a esperança de que conseguirão construir um mundo de paz.
Apesar de a disposição agressiva poder ser pensada como instintiva, o
mesmo não se pode dizer da violência. Esta é construída no cotidiano da vida,
ensinada pelos nossos pares e com eles aprendida, ou melhor, é a transformação
da agressividade em sua face mais escura. Para Costa (1999, p. 31), a violência “é o
emprego desejado da agressividade, com fins destrutivos”. O reconhecimento dessa
dimensão genuinamente humana do desejo e do prazer com o sofrimento alheio,
quer como autores, quer como espectadores, exige de nós bem mais que uma
postura crítica mas coloca-nos diante da responsabilidade individual pelo destino do
nosso mundo.
Se o recuo no tempo nos faz conhecedores de que a violência nasceu
com o homem, então por que nossa inclinação para apontá-la como um dos
fenômenos sociais mais perturbadores da atualidade? Cabe aqui atentar para o fato
de que hoje vivemos num planeta extremamente populoso, segundo a Organização
das Nações Unidas – ONU (IBGE,2000), com mais de 6 bilhões de pessoas,
população esta que aumenta anualmente em 75 milhões, sendo que a metade tem
menos de 25 anos de idade. É no século XX que acontece a explosão demográfica,
principalmente nos países do terceiro mundo. No Brasil, as estatísticas do Instituto
21
Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (2000) sobre a população revelaram um
país com quase 170.000.000 de pessoas.
Além disso, aprendemos a divulgar informações com uma velocidade
jamais imaginada, o que nos deixa atualizados em relação a todos os feitos
humanos em todos os lugares, no quase exato momento em que ocorrem. As
notícias sobre as conquistas de nossos semelhantes nos unem num sentimento
positivo de orgulho, mas as notícias sobre a violência cotidiana nos deixam a
assustadora sensação de que temos uma incapacidade de cuidar de nossa vida e
do nosso habitat. Amargamos a sensação de que somos uma sociedade cruel que
se compraz com a destruição e o sofrimento do outro. Para Gauer (2001, p.14) essa
situação traz “como resultado um estado geral de indiferença, na qual o bem e o mal
expostos ao olhar, sem intermediação, tornam-se um simples dado do cotidiano,
entre tantos outros, e talvez não o menos incômodo”.
A violência em rede que ora testemunhamos sugere ainda a análise de
outros componentes, partindo da premissa de que a nova ordem social decorrente
da revolução digital que sucedeu a modernidade trouxe profundas mudanças na
visão de mundo e no comportamento dos homens. Os alicerces erguidos pela
sociedade moderna, ancorados na concepção da ordem e da disciplina e que
objetivavam estabilizar o desequilíbrio gerado pela revolução industrial, ruíram.
Entramos na era da velocidade. Em um curto espaço de tempo, tivemos
que ajustar o ritmo de nossa vida às transformações radicais introduzidas no
efêmero social. A sociedade pós-moderna cunhou para si a marca da transgressão.
Transgredimos todas as conhecidas e estáveis fronteiras temporais e geográficas e,
ao rompermos essas barreiras seculares, ampliamos o nosso desejo inquieto de
poder e liberdade, embora tenhamos de pagar um preço alto por essa conquista. O
usufruto desse prazer nos fez também acuados pelo medo e insegurança diante do
desconhecido que se descortinou, convindo avaliar os reflexos de toda essa
angústia do homem pós-moderno que ainda não incorporou os novos referenciais da
vida contemporânea.
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Nessa reflexão, certamente não podemos deixar de considerar a
globalização da economia e os seus significativos impactos na formação da
subjetividade social do homem. A falta de oportunidades de emprego, o
empobrecimento das populações, o acirramento das desigualdades sociais fazem
parte dessa macroestrutura que passa, por sua vez, a afetar os próprios sujeitos, na
sua individualidade, na sua forma de pensar e sentir a vida. Esse quadro, acima de
tudo, tem se agravado com o sério problema das drogas, aqui entendido desde o
uso abusivo até o tráfico.
Silva (2001, p.38), em sua análise sobre a violência, insistiu na
impossibilidade de se apreender a sua essência em razão da existência de suas
múltiplas e difusas camadas constitutivas. Na tentativa de definir seus contornos,
afirmou que
um complexo simbólico e social só se torna inteligível quando as explicações para entendê-lo e as propostas para resolvê-lo não são isoladas analiticamente, mas integradas compreensivamente ao próprio objeto constituído. O conjunto de tais versões agrega necessariamente novas propriedades ao objeto, tornando inócua e ingênua toda tentativa de isolamento do fenômeno em suas manifestações estruturais. É exatamenteno interior contraditório de suas multiplicidades interpretativas que o complexo se esclarece em suas propriedades multi – facetadas e permite identificar as múltiplas causas que o condicionam.
Conceituar a violência é tarefa complexa uma vez que o seu significado é
uma construção social modelado pela linguagem na qual estamos todos
mergulhados. Se o ato em si é tão antigo quando o próprio homem a sua conotação
simbólica é relativamente recente. Escobar (2003, p.192) procurou definir a
violência, extraindo-a do território da agressividade e destacou o desequilíbrio das
forças empregadas pelos sujeitos envolvidos, tanto no nível físico quanto no
psicológico, afirmando que
podemos falar, portanto, de uma ação que leva à coisificação do sujeito humano, um assujeitamento do ser ou de seres que desta forma perdem visibilidade enquanto sujeitos iguais nos seus direitos e demarcados por suas singulares diferenças.
Como fenômeno do mundo moderno e globalizado, a violência é hoje um
modo de relação, um modelo educativo, perpetuado e ensinado pelos próprios
atores sociais, nos seus diversos ciclos de vida. Além de mobilizar as pessoas em
23
torno de tragédias cotidianas, é cantada em músicas populares e maquiada pelos
programas televisivos, despertando risos e aplausos de uma platéia meio
anestesiada e pouco questionadora. Mello (2002) chamou a atenção para a relação
entre vida urbana, violência e representação das identidades dos sujeitos, afirmando
que a distribuição geográfica dos ricos e pobres na cidade, exibindo entre si luxo e
miséria, incomodando uns aos outros e tendo acesso desigual aos objetos de desejo
ofertados, influencia profundamente a forma como cada grupo se percebe. O fosso
existente entre os ideais democráticos e essa violência estrutural impregnada nas
relações sociais, que naturaliza o direito de cidadania para apenas alguns, contribui
para a distorção dos olhares que entre si trocam ricos e pobres. O segmento pobre,
tido como inferior, arrasta outros adjetivos como diferente e perigoso, designações
tomadas, nesse caso, como sinônimas.
Tem-se por certo que a violência em nossos dias não é particularidade do
mundo adulto. No meio desse turbilhão mundano, a juventude, aberta às novas
aprendizagens e emoções, cercada pela sedução das drogas, tem sido atingida em
cheio. O preocupante aumento do consumo de drogas e o paralelo crescimento do
número de adolescentes no mundo do crime parecem haver se tornado uma
questão de abrangência planetária. No Brasil, a gritante desigualdade social e o
aumento de sua população infanto-juvenil pobre trouxeram como conseqüência, a
partir da década de 80, a invasão da esfera pública por crianças e adolescentes que
passaram a demarcar novos territórios de socialização, mostrando cabalmente que o
lar não conseguia cumprir a sua missão de domesticar os cidadãos do futuro.
Violados em seus direitos fundamentais, foram batizados pelo estigma de “menores
de rua“, o que abriu para a sociedade um fértil campo simbólico. Essa denominação,
tida a partir de então como uma categoria analítica no discurso científico, facilitou a
instalação de toda sorte de práticas, consubstanciadas na exploração desses
menores pelos adultos.
O estigma comportava uma longa lista de vocábulos (pivetes, prostitutas,
vagabundos, marginais) que acabavam por direcionar para a minoria explorada a
responsabilidade pela sua existência, ocultando, estrategicamente, seu mecanismo
de produção. O estigma provoca uma demarcação clara de espaços, hierarquizando
as relações através das práticas discursivas que o sustentam. Segundo Foucault
24
(1999, p.164), “a formação dos discursos e a genealogia do saber devem ser
analisados a partir não dos tipos de consciência, das modalidades de percepção ou
das formas de ideologia, mas das táticas e estratégias de poder“. A fronteira entre o
exercício do poder e a violência é tênue. Se, de uma forma escancarada, alguns
“menores de rua” ingressaram na marginalidade, reescrevendo e reafirmando seu
autoconceito estigmatizado – que em última instância é o único viés que lhes
confirma como pessoas – por outro lado, um novo fenômeno se desenrolava,
protegido pelo silêncio da classe social favorecida: o fato de que um grande número
de adolescentes considerados ricos passavam a cometer atos infracionais graves
cada vez com mais freqüência. E assim, a violência praticada por adolescentes
deixava exposta a dura realidade do país.
Volpi (2002) apresentou uma pesquisa quantitativa sobre o perfil do
adolescente brasileiro privado de liberdade, no período de outubro de 1995 a abril de
1996, envolvendo vinte e seis estados e o Distrito Federal, realizada pelo Movimento
Nacional de Meninos e Meninas de Rua/DF, com apoio do UNICEF. Os resultados
informaram que 73,3% do universo pesquisado era procedente de famílias que
tinham uma renda de até dois salários mínimos; 82,8% encontravam-se na faixa
etária de 15 a 18 anos; 94,8% eram do sexo masculino; 15,4% eram analfabetos;
53% eram usuários de drogas; 42% eram procedentes das capitais. Segundo essa
pesquisa, o roubo foi a prática infracional que mais ocasionou a privação de
liberdade, correspondendo a um percentual de 33,4%, contra um percentual de
19,1% de atos praticados contra a pessoa humana.
Godoy (2002) fez referência no jornal O Estado de São Paulo a um
estudo feito pela Secretaria de Segurança Pública de São Paulo sobre os principais
crimes cometidos exclusivamente por menores de idade, nessa capital, em 2001. O
estudo destacou que, sozinhos, eles foram responsáveis por 2,7% do total de crimes
registrados pela Polícia Civil, com participação importante na estatística de
homicídios e latrocínios, respondendo por 4,8% do total dos casos. Ainda com
relação ao mesmo ano, a Polícia Militar paulista informou que foram registrados
29.107 casos qualificados de atos infracionais praticados por menores de idade, em
um total de quatro milhões de ocorrências atendidas no estado.
25
Em relação ao Estado do Ceará, no que tange à violência praticada por
adolescentes, constata-se que o perfil do autor de ato infracional não se distancia do
perfil do adolescente brasileiro nessa condição, o que se comprova nos diferentes
estudos realizados. O crescimento da capital cearense tem sido grande nos últimos
anos e a condição de miséria da maioria de seus habitantes se expande em igual
medida. A urbanização de seus espaços e o fortalecimento do turismo têm atraído
não só o turista, mas também um elevado número de famílias pobres das zonas
rurais. A lacuna nas políticas sociais básicas – habitação, trabalho, educação,
saúde, lazer, etc – e a proliferação de favelas têm tido como conseqüências graves
a elevação dos níveis de violência de um modo geral e a facilitação do ingresso do
adolescente cearense no mundo do crime.
A transcrição numérica da realidade cearense nessa área pode ser
melhor compreendida a partir dos dados estatísticos1 do ano de 2003, relativos ao
adolescente envolvido com a prática infracional. Foram encaminhados para a
Unidade de Recepção Luís Barros Montenegro da Secretaria da Ação Social 1875
adolescentes acusados da prática de ato infracional, dos quais 1444 encontravam-
se na faixa etária de 15 a 17 anos, o que correspondeu a um percentual de 77%
desse universo. Vale ressaltar, ainda, que os adolescentes dessa faixa de idade
foram responsáveis por 84 crimes que culminaram com a morte da vítima.
A violência extrema, como expressão da ação humana, revela a visão de
mundo e de homem que banaliza a vida e elimina a ética como suporte para as
relações pessoais. A consolidação do padrão relacional centrado na violência que
parece naturalizado no mundo moderno é hoje o modelo de educação de uma
sociedade que, apesar de perpetuá-lo, recrimina-o e exige a sua erradicação.
Verificamos, com base nesses dados, que a quase totalidade dos
adolescentes atendidos eram do sexo masculino, perfazendo um total de 90,6%.
Podemos buscar na construção dos papéis de gênero uma das explicações para
esse fato. A agressividade é eleita para compor a identidade masculina sendo,
diretamente, associada à violência. O resultado desse movimento culturalmente
1 Unidade de Recepção Luís B. Montenegro/SAS – Estatística anual
26
construído, amparado pelos parâmetros da competitividade e sucesso, é a formação
de homens condenados a ser violentos porque retiraram da agressividade seu
conteúdo positivo.
A realidade institucional mostra que a quase totalidade dos adolescentes
privados de liberdade pertencem à classe social menos favorecida, embora existam
registros de garotos sentenciados com medida de internação, provenientes de
famílias com boa condição financeira. Igualmente é verdade que um número
significativo deles são procedentes de famílias cujos pais biológicos não vivem
juntos e a mãe assume um papel expressivo quanto à responsabilidade financeira
da casa. O enfraquecimento ou a ausência da figura paterna na vida desse
adolescente e o maior espaço que a figura materna passa a ocupar na sua vida
parecem explicar a maior aproximação desta no seu acompanhamento durante o
período de internação.
Apesar de ainda ser o adulto o maior responsável pelo cometimento da
violência, os destaques da imprensa para a realidade acima descrita e os enfoques
errôneos feitos pela mesma sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente estão
contribuindo sobremaneira para a formação de uma atitude de revolta social para
com o “adolescente infrator” e para a imagem que tem sido elaborada sobre ele e
por ele próprio. De tal forma essa situação se consolida no imaginário social que,
apesar de a realidade numérica informar que o adolescente é muito mais vítima do
que autor de violência, o mito de sua periculosidade e impunidade tem se
sobreposto aos fatos. A população credita ao adolescente uma elevada parcela dos
crimes praticados no país, deixando de se indignar com o índice elevado da
violência a que é submetido.
Estudo sobre violência, realizado pela UNESCO, relativo aos anos de
1979 a 1996, constatou que é significativamente superior o percentual de mortes por
homicídios e outras violências entre jovens de 15 a 24 anos, se considerada a
população em geral. Em relação aos dados colhidos por esse estudo, Waiselfisz
(1998, p.37) informou que “no país, em 1996, 35% das mortes de jovens tiveram sua
origem em homicídios e outras violências, quando para o conjunto das idades essa
taxa foi de 6,4%. Nesse campo adquiriram trágica relevância as regiões Sudeste e
27
Nordeste, onde 40.3 e 33,1% dos jovens, respectivamente, morreram por essa
causa”.
Além da violência concreta, física, que muitas vezes ceifa a vida de
muitos adolescentes brasileiros, podemos voltar o pensamento para a violência
difusa, não nomeada, mas estampada no rosto do país, aquela que é fruto da nossa
gritante desigualdade social. Brandão (2000) acrescentou a essas considerações
uma reflexão sobre o processo de vitimização indireta a que estão submetidos os
adolescentes, em decorrência de a sua condição de exclusão social oferecer uma
baixa proteção contra seu ingresso no mundo do crime. Assim sendo, seu trabalho
mostrou que um elevado número de adolescentes internados na Febem de São
Paulo tinha baixa escolaridade (apenas 2,7% estavam acima da 8ª série) e que um
expressivo número de adolescentes negros eram pertencentes a famílias com renda
mensal inferior às médias do município.
Segundo o pesquisador, o número de internos na Febem de São Paulo
em 1995 era de 2104, chegando a 3968 em 1999, o que representou cerca de 53%
dos adolescentes internados no país. Avançando na análise dessa violência
estrutural que se abate sobre aqueles de baixo poder aquisitivo, Brandão levantou a
hipótese de que esse crescente numérico registrado também pode ser devido, entre
outras causas, ao reduzido número de procuradores que o Poder Judiciário
disponibiliza para a defesa dos adolescentes.
O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, promulgado em 1990,
reconhece como adolescente toda pessoa que se encontra no intervalo etário entre
12 e 18 anos, podendo, excepcionalmente, ser aplicado a pessoas entre 18 e 21
anos de idade. Por essa razão, somente a partir do limite mínimo de 12 anos,
poderá uma pessoa estar sujeita a uma medida privativa de liberdade. Essa medida
só é determinada diante do cometimento de ato infracional grave correspondente a
outro definido como crime no mundo adulto. Após essa sentença judicial, o
sentenciado poderá passar até três anos em uma unidade fechada, período que
chega a corresponder à metade de sua adolescência.
28
Uma instituição cerceadora da liberdade e detentora do controle do corpo
já tem por si só o peso da definição daqueles que abriga. Embora as diretrizes legais
exijam que as unidades de atendimento ao adolescente infrator sejam espaços
educativos e facilitadores do seu desenvolvimento (Brasil, 1990), estas, em geral,
são a face concreta e cruel do poder. Segundo Foucault (1999, p.73), a sua
existência é a prova da “dominação serena do Bem sobre o Mal, da ordem sobre a
desordem”. O contato com o adolescente que se encontra privado de liberdade por
prática de ato infracional revela nas entrelinhas o seu auto-retrato, cujo processo de
elaboração se dá de forma inconsciente.
Uma grande inquietação de todos aqueles que trabalham com esses
adolescentes é a reincidência. É difícil entender por que a opressão de um centro
educacional, a solidão, as dores experienciadas, os inúmeros planos de fuga e,
finalmente, a tão esperada alegria pela conquista da liberdade, não são suficientes
para afastar a escolha de retornar ao mesmo lugar e por que o adolescente comete
novas infrações graves, expondo-se ao risco tangível da volta. As razões podem ser
complexas, mas há algo que certamente é parte intrínseca desse retorno: a
autodefinição. O autoconceito, quando está alicerçado sobre um estigma, parece
recair sobre a pessoa como uma profecia negra, minando-lhe a crença em suas
potencialidades, levando-a à exaustão e, finalmente, à desistência de se “redimir”
perante o outro. A auto-estima atingida poderá esmagar o homem que, muitas
vezes, para evitar isso, transforma a sua identidade negativa em força propulsora
para sua vida.
A identidade marginal adquire um valor invertido, motivo de orgulho e
reconhecimento do jovem entre seus pares, ao mesmo tempo em que se transforma
em cárcere dentro do qual ele abdica de suas esperanças de libertação. Watzlawick
(1967, p.76) ressaltou que “as pessoas, no nível de relação, não comunicam sobre
os fatos situados fora de suas relações, mas oferecem-se mutuamente definições
dessa relação e, por implicação, delas próprias”. Segundo o autor, a percepção que
uma pessoa tem de outra e a forma como ela a expressa influenciará a
autopercepção. Esse é um processo dinâmico e contínuo que se estabelece em
todas as trocas relacionais, além de ser um elemento estruturante de toda definição
de eu em nível coletivo e individual.
29
A sociedade, pressionada por esse crescente de violência e acuada
diante de seus jovens infratores, tem passado a desacreditar neles, também
formando sobre eles um conceito negativo que lhes é transmitido ininterruptamente.
Assim, esses adolescentes estão condenados, até por si próprios, a se movimentar
nos limites de um estigma perverso cada vez mais difícil de romper. Quando se
estigmatiza alguém, estabelece-se uma linha separatória entre ele e os demais,
ditos normais. Vejam-se as palavras de Goffman (1988, p.15) a esse respeito:
“acreditamos que alguém com um estigma não seja completamente humano“.
O cotidiano desse trabalho nos fez testemunhar uma série de aspectos
que são indicativos do funcionamento dessa identidade marginal. Além do elevado
número de adolescentes que reincidem na prática infracional, verificamos que os
apelidos com os quais são batizados também traduzem esse autoconceito. A quase
totalidade dos apelidos são de cunho depreciativo, absolutamente distintos daqueles
com os quais são apelidados os adolescentes de classe social mais favorecida.
Verificamos também que seus corpos são tatuados com imagens e palavras que
destacam o tema violência e morte. Assim, fica expresso na linguagem verbal e não-
verbal de cada jovem que cometeu ato infracional a denominação de infrator.
Quando um adolescente pratica um ato infracional, o que passa a ser
considerado não é mais a sua ação, que tem um sentido circunstancial, mas ele
próprio, rotulado pela ação que o adjetivará a partir de então. Esse movimento se
fará no sutil contorno entre as esferas do ESTAR e do SER e terá conseqüências
importantes em sua vida. O grande desafio de um adolescente privado de liberdade
passa a ser, em primeira instância, a desconstrução do estigma que sobre ele pesa
para que possa em seguida resignificar sua identidade negativa. O espaço relacional
é o espaço da comunicação. Através da linguagem, os homens expressam
pensamentos, percepções e sentimentos sobre si próprios e sobre a realidade que
os envolve, tornando possível a elaboração das representações sociais,
conhecimento comum que possibilita aos grupos a criação de laços identificatórios, a
partir da visão de mundo que partilham e que lhes orienta e justifica a conduta.
Adolescente infrator é uma das representações sociais criadas para
responder ao fenômeno crescente do ingresso do adolescente no mundo do crime.
30
Na condição de sistema de valores, idéias e práticas, essa representação permite
aos homens a construção da alteridade, ou seja, daquilo que passam a definir como
diferente de si. Trata-se, pois, de um emaranhado simbólico que vai além do
concreto para adentrar as dimensões psicológica, social e cultural dos grupos,
contendo em seu bojo a articulação entre a realidade e a lenda, a racionalidade e a
emoção dos homens.
Nesse processo de mesclagem entre o individual e o coletivo que recorta
de cada um o consciente e o inconsciente, torna-se possível a elaboração de
símbolos que servirão de base para que os sujeitos sociais signifiquem o mundo e
possam apreendê-lo, ao mesmo tempo em que nele descobrem seu território e o
lugar do outro. Jodelet (2001, p.22) procurou simplificar o complexo que existe na
definição das representações sociais, sintetizando-a como “uma forma de
conhecimento, socialmente elaborada e partilhada, com um objetivo prático, e que
contribui para a construção de uma realidade comum a um conjunto social“.
O fato de o Brasil possuir um avançado instrumento jurídico na área dos
direitos da criança e do adolescente tem provocado um crescente interesse por esse
segmento da população em diversos ramos do conhecimento, tais como o direito, a
psicologia, a pedagogia, a sociologia, entre tantos. O ECA foi gestado em um tempo
que testemunha a marcha dos adolescentes brasileiros no território do crime, o que
é, no mínimo, um convite a uma pausa para reflexão. Em paralelo, o correspondente
aprofundamento no estudo das representações sociais por pesquisadores brasileiros
tem oportunizado a realização de um espesso número de pesquisas amparadas por
esse referencial teórico que elegem como objetos de investigação o adolescente
infrator, seus familiares ou educadores (ALVES e OLIVEIRA, 2003; LIMA et al, 2003;
GOMES et al, 2003; BARROS e GONTIÉS, 2003; ESPÍNDULA e SANTOS, 2003).
Estudos dessa natureza vêm tornando possível ampliar o entendimento de como
esses atores sociais elaboraram sua compreensão sobre temáticas relacionadas aos
adolescentes envolvidos com a prática infracional, produzida no campo dos
encontros humanos e mediada pelo complexo sistema midiático de informações.
Em relação, portanto, à produção e circulação da representação social de
adolescente infrator, a mídia tem exercido esse papel com merecido destaque
31
através da imprensa falada e escrita, na medida em que anuncia estatísticas,
comentários e imagens sobre o jovem autor de ato infracional, apoiada na própria
realidade do aumento de sua participação no mundo do crime. A circulação dessa
representação dá vazão a uma elaborada teoria de causalidade que muitas vezes
adentra o campo moralista do senso comum, deixando de fora a leitura crítica de
seu mecanismo de elaboração. Por oportuno, convém aqui indagar: Qual a idéia que
infratores e suas mães têm sobre as causas geradoras de um “adolescente
infrator”? Até que ponto ambos os grupos consideram possível que o adolescente
que cometeu ato infracional seja capaz de elaborar um projeto de vida que não
perpasse pela infracionalidade?
As indagações acima podem ser agrupadas em torno de
questionamentos mais amplos, cujas respostas sejam buscadas na seara das
ciências. Nesse sentido, elegemos como objetivo desse estudo apreender as
representações sociais sobre “adolescente infrator” elaboradas por
adolescentes infratores e suas mães, assim como verificar a importância
dessas representações nos espaços comunicacionais e como diretriz para
seus comportamentos.
Destacamos a relevância deste trabalho à medida que poderá ser
utilizado como instrumento pedagógico para se trabalhar com adolescentes, vez que
sugere pistas para uma reflexão crítica sobre o processo de formação das
representações sociais, levando em conta a possibilidade de sua desconstrução,
razão por que constitui um caminho para a transformação dos atores sociais.
Ressalte-se ainda que poderá contribuir para a orientação de programas oficiais
voltados a adolescentes que cometem atos infracionais, possibilitando a
conscientização dos atores institucionais sobre as conseqüências do estigma na
formação da personalidade.
32
Uma, e apenas uma capacidade será negada ao homem: a de ser inconseqüente.
Portanto, não lhe será facultada a capacidade de fazer desaparecer os efeitos e as
conseqüências das magias. Haverá sempre um débito a ser pago pela mente, e / ou
pelo corpo, e / ou pelos outros homens.
A estória será construída sobre o enredo da história: será a sua versão trágica ou
sua versão cômica, mas será sempre a sua versão. Não será, portanto, o homem,
produto mecânico e automático, nem de sua particular história, nem da História.
Quando a construção da história for insuportavelmente dolorosa, vazia ou
vergonhosa, os afastamentos poderão ser tão extremos que a estória resultante
costuma chamar-se insana.
Di Loreto.
CAPÍTULO 2
REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 SOBRE A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
Este estudo terá como eixo central de suas reflexões a Teoria das
Representações Sociais formulada por Serge Moscovici (1978), com o intuito de
contribuir para uma maior compreensão da problemática do adolescente autor de
ato infracional. A escolha desse referencial teórico se deu em razão de estarmos
lidando nesse estudo com a dimensão simbólica elaborada pelos atores sociais nos
espaços comunicacionais e por ser esta, em tese, determinante de suas atitudes nos
aspectos afetivo, cognitivo e comportamental.
A violência praticada por adolescentes é, na verdade, o fenômeno aqui
estudado, sendo dele recortado um aspecto específico para se constituir como tema
de investigação. Em razão de sua amplitude, o fenômeno é impalpável, podendo ser
apreendido apenas parcialmente, a partir da delimitação de seus múltiplos aspectos
submetidos ao controle da investigação. O objeto de representação social deste
estudo será o adolescente infrator, dada a importância que essa temática vem
adquirindo no contexto cultural do mundo inteiro, o que tem lhe dado uma
significativa espessura social.
No final do séc. XIX, Durkheim escreveu o livro O Suicídio, no qual
reconhecia o crescente da força individual sobre o todo social, em razão do
desmonte do feudalismo, que se deu após a Revolução Industrial. Apesar dessa
35
constatação, no século seguinte, o autor elaborou o conceito de representação
coletiva, situando-o como um conhecimento comum, gestado socialmente, que
possibilita uma forma homogênea de pensamento e comportamento entre os grupos
humanos. Permaneceu fiel à concepção da primazia do coletivo sobre o indivíduo,
provavelmente em razão de viver em uma época de predominância dos referenciais
positivistas das ciências psicológica e social, quando qualquer abordagem do
homem e do ambiente social passava por uma vertente explicativa mecanicista.
O seu pensamento sofreu forte influência da perspectiva dicotômica que
fazia uma nítida demarcação entre pessoa e sociedade. Para ele, a sociedade era
entendida como um ente vivo, capaz de sentimentos e idéias próprias e, por esse
prisma, capaz de fazer valer a sua verdade sobre as verdades menores de cada
homem. Conforme Durkheim (1978, p.79),
as representações coletivas traduzem a maneira como o grupo se pensa nas suas relações com os objetos que o afetam. Para compreender como a sociedade se representa a si própria e ao mundo que a rodeia, precisamos considerar a natureza da sociedade e não a dos indivíduos.
Na separação que fez entre as representações coletivas e as individuais,
o sociólogo procurou demarcar os campos da sociologia e da psicologia, voltando
seu interesse para a primeira, porquanto acreditava ser possível analisar e
compreender a realidade social à luz da objetividade científica. Apesar de suas
idéias terem adormecido silenciosas por algumas décadas, Durkheim contribuiu, de
forma significativa, para o estabelecimento das relações entre a sociologia e a
psicologia social.
Moscovici (2001), reconhecendo a importância do pensamento do
sociólogo atrás mencionado para o estudo da relação entre o conhecimento do
senso comum e o comportamento humano, passou a considerar que, na gênese
dessa teoria, seria possível buscar uma nova verdade para a ciência dos homens. A
sua percepção do mundo moderno, caracterizado pelo dinamismo de constantes
mudanças, foi decisiva para a leitura crítica que fez das idéias de Durkheim sobre as
36
representações coletivas, elaborando, a partir de então, o conceito de
representações sociais.
Para Moscovici (2003, p.49), as representações sociais são “fenômenos
específicos que estão relacionados com um modo particular de compreender e de se
comunicar – um modo que cria tanto a realidade como o senso comum”. No
contínuo processo das trocas interacionais, os sujeitos sociais vão produzindo
práticas cotidianas que estruturam a formação de valores e comportamentos,
através dos quais cada indivíduo apreende o mundo e o significa. Assinalou com
isso o poder do homem sobre seu mundo, enfatizando seu potencial criador e
transformador e sua capacidade de participar ativamente da construção da história.
O autor pensou nas representações sociais como um fenômeno social
tecido pelo homem, sendo que, ao mesmo tempo em que o antecede, o sucede no
curso da história, renovando-se como uma criação contínua, portadora das marcas
de todos os outros saberes que procuram explicar as indagações humanas. Nesse
sentido, estamos “condenados” a produzir e reproduzir representações, uma vez que
estamos inscritos no ambiente sociocultural de uma dada sociedade, no seu
substrato lingüístico, na rede de signos e símbolos eleitos para ver, sentir e interagir
com o mundo. Cotejando as dimensões psicológica e social das representações,
Moscovici (2003, p.211) afirmou que
elas possuem um aspecto impessoal, no sentido de pertencer a todos; elas são a representação de outros, pertencentes a outras pessoas ou a outro grupo; e elas são uma representação pessoal, percebida afetivamente como pertencente ao ego.
De acordo com Farr (1995, p.44), “a teoria de Moscovici é freqüentemente
classificada, com muita propriedade, como uma forma sociológica da Psicologia
Social”. O estreito intercâmbio estabelecido por Moscovici entre as duas ciências
nos aspectos individual e social, zonas indivisíveis na produção do saber popular,
serviu para abrir um novo campo de estudos interdisciplinares dentro da Psicologia
Social, constituindo-se hoje uma referência teórica para um grande número de
trabalhos desenvolvidos por psicólogos nas áreas das relações sociais,
37
comunicação, linguagem, difusão de saberes, entre outras. O processo de
transformação de representação coletiva em social traduz, certamente, o próprio
caminho da humanidade. Além das fronteiras que delineiam uma verdade defendida,
faísca algo que não é particularidade de um determinado autor, mas faz parte do
legado atemporal do homem para o homem. É assim no campo científico, filosófico,
religioso e artístico.
Jodelet (2001, p.22) reconheceu a complexidade de elementos que se
agregam na composição das representações sociais e criou uma definição que
procura dar conta de sua totalidade, afirmando que
como fenômenos cognitivos, envolvem a pertença social dos indivíduos com as implicações afetivas e normativas, com as interiorizações de experiências, práticas, modelos de condutas e pensamento, socialmente inculcados ou transmitidos pela comunicação social, que a ela estão ligados.
As representações sociais articulam a realidade externa e interna do
sujeito, estando por essa razão prenhes das emoções através das quais ele
consegue perceber o mundo e lhe atribuir sentidos de verdade. Assim sendo,
podemos destacar a sua dupla natureza: como sociais, são a produção consensual
dos humanos; como restrita aos afetos individuais, são testemunho da sua
capacidade de recriação da realidade.
O cometimento de ato infracional por adolescentes passou a exigir um
olhar especial dos estudiosos, uma vez que, pela sua magnitude, encontra-se hoje
nas representações não só dos diversos segmentos sociais, mas também nas dos
próprios adolescentes denominados infratores e de seus familiares mais próximos.
O ingresso do adolescente no mundo do crime e a criação da representação social
de “adolescente infrator” obrigaram a sociedade a elaborar um conhecimento sobre
o problema em si, na tentativa de compreendê-lo e assim poder conviver com a sua
concretude. A sua realidade toma forma emergindo da pluralidade do social ao
mesmo tempo em que se materializa, fazendo a travessia pela subjetividade do
homem,ou seja, penetrando na fronteira dos afetos, dos desejos e das ilusões.
38
2.2 SOBRE A FUNÇÃO DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
Moscovici (2001, p.63), ao falar das representações sociais nas
sociedades modernas, afirmou que elas ocuparam a lacuna dos mitos e lendas.
Durante um longo intervalo de tempo, esses saberes ofereceram aos povos as
explicações para a origem da vida e do universo, sendo transmitidos por aqueles a
quem era conferido o direito de fazê-lo. A contemporaneidade dispõe de uma
poderosa tecnologia para a produção e transmissão do conhecimento. Se por um
lado a ciência supera a cada dia seus próprios limites, reelaborando as noções de
verdade já estabelecidas, por outro, a dinâmica da comunicação, cada vez mais
ousada e criativa, dilata os contornos da linguagem humana, permitindo à
imaginação um vôo inimaginável.
Nóbrega (1990) citou as duas grandes funções atribuídas por Moscovici
em 1961 às representações sociais, que justificavam a sua importância para a vida
social: função do saber e função de orientação. Os homens precisam fazer uma
leitura comum da complexa realidade social, tendo uma certeza razoável de que a
compreendem e podem lidar com ela. De outra forma, não seria suportável viver a
vida, em razão de que seriam invadidos pela angústia do estranhamento frente aos
estímulos recebidos. As representações sociais funcionam, pois, como um anteparo
protetor, permitindo aos homens que elaborem um saber comum por meio do qual
explicam os fatos com que deparam no cotidiano. A explicação da realidade dá
sentido ao mundo e, estando posta aos olhos de todos, os homens não podem
aguardar que aqueles legitimados a proclamar a verdade o façam, para,
posteriormente, apenas aceitarem-na. Eles precisam da verdade, imediatamente,
razão pela qual se antecipam na sua gestação e a partilham. É nesse sentido que
podemos pensar a função do saber das representações sociais.
De acordo com Abric (1998), a função de orientação da conduta está
relacionada ao complexo cognitivo que envolve a formação das representações
sociais. Nesse sentido, a sociedade organiza o seu conjunto de valores que lhe
permite um horizonte de pensamentos, sentimentos e comportamentos a serem
adotados diante da realidade.
39
O autor acrescentou mais duas funções às representações sociais: a
identitária e a justificadora. Em relação à primeira, trabalhou a idéia de que as
representações sociais mobilizam o sentido de pertença, vital para todos os homens.
As duas funções, inicialmente propostas por Moscovici, conduzem à terceira, à
medida que a partilha de explicações da realidade e do sistema de valores que
orientam as práticas permite a criação de laços grupais que identificam os grupos e
seus membros. A propósito da função justificadora, pode-se afirmar que, se através
das representações sociais, os indivíduos podem antecipar sua ação sobre a
realidade, da mesma forma, podem justificá-la após realizada. Nesse sentido, Abric
(1998, p.30) assinalou que “a representação tem por função preservar e justificar a
diferenciação social, e ela pode estereotipar as relações entre os grupos, contribuir
para a discriminação ou para a manutenção da distância social entre eles”.
Cabe aqui um parêntese para tratar dos estereótipos e da forma como
interferem nas relações intergrupais. Schulze (1996, p.114) os incluiu num amplo
processo de categorização, afirmando que “este processo tem, como sua principal
função, simplificar ou tornar sistemática a abundante e complexa quantidade de
informações que o organismo humano recebe do ambiente”. Dessa forma, a
categorização se presta à demarcação dos territórios grupais e fornece diretrizes de
como os homens devem agir uns com os outros.
Os estereótipos, se atrelados a preconceitos, intensificam o nível de
conflito entre esses espaços, enrijecendo as fronteiras que os separam, criando para
cada grupo um sistema de valores próprios e produzindo a formação de uma
identidade grupal. A categorização de uma pessoa por um estigma está imersa
nessa reflexão sobre as representações sociais. Assim, a imputação de um estigma
será feita mediante toda a incorporação já realizada das estruturas do mundo social
– nesse sentido, um produto delas – e também contribuirá para o reforço e
manutenção dessas estruturas, sendo, por esse ângulo, produtora da
representação. O indivíduo estigmatizado tenderá a incorporar à sua identidade a
mesma crença que o outro tem dele. Segundo Goffman (1988, p.16),
40
os seus sentimentos mais profundos sobre o que ele é podem confundir a sua sensação de ser uma pessoa normal, um ser humano como qualquer outro, uma criatura, portanto, que merece um destino agradável e uma oportunidade legítima .
Estereótipos e estigmas contribuem para intensificar conflitos e polarizar
os grupos sociais, delineando a alteridade. Esse “outro” negativo adquire uma
importância fundamental nas sociedades humanas, pois funciona como o lugar no
qual podemos depositar aquilo que não aceitamos em nós ou que não queremos
para nós. Possibilita-nos, pois, usufruir a sensação de consciência tranqüila de que
somos homens de bem. A partir do que está sendo aqui discutido sobre as
representações sociais e suas funções e, em especial, a essa referência aos
desdobramentos da função justificadora, entendemos que as representações sociais
sobre o adolescente que cometeu ato infracional e a que ele próprio forma de si
mesmo estarão evidentes em todos os discursos lingüísticos, atitudes e expressões
corporais a ele relacionados e por ele assumidos.
Moscovici (1996) assinalou que todas as pessoas e grupos sociais
buscam o reconhecimento de sua existência e, mais que isso, buscam a aprovação
e o bem-querer. A grande questão é que, quando pessoas ou grupos se tornam
transparentes como minorias sociais, perdem as chances de aprovação e afeto
pelas maiorias. Ainda assim, muitas vezes, correm os riscos inerentes a essa
desqualificação, construindo forças ativas e estratégicas, tirando disso proveito
próprio. Em razão da descrença que sobre elas se abate, as minorias aprendem a
criar couraças resistentes que as habilitam a conviver com essas situações de
desconforto, passando a ignorar sua falta de crédito e apreciação.
Vale lembrar que a representação que delimita os grupos pelo
estabelecimento da alteridade acontece ao mesmo tempo nos diferentes espaços
que se criam. A partir disso, cada uma dessas funções citadas será posta em
movimento paralelo. Cada grupo se instrumentalizará com seus próprios recursos,
construindo seus confins e seu pertencimento, percebendo a si e ao outro com o
olhar que tomaram por empréstimo do substrato cognitivo-afetivo do tecido social
que já está, por sua vez, modelado pela contribuição individual subjetiva de cada
sujeito. A compreensão de como o adolescente autor de ato infracional e sua mãe
41
elaboram a representação “adolescente infrator” permitirá melhor entender os seus
processos comunicacionais, os seus comportamentos e o seu movimento dentro do
palco das minorias.
2.3 SOBRE O PROCESSO DE FORMAÇÃO DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
Ao criar a sua teoria sobre o saber do senso comum, Moscovici (2003)
também se ocupou em analisar a forma como as representações sociais se
estruturam, concebendo duas etapas gerais nesse processo: objetivação e
ancoragem. Essas etapas, na verdade, não estão separadas ou hierarquizadas, mas
articuladas, sendo estudadas individualmente apenas com fins didáticos. Envolvem
os aspectos figurativo e simbólico, a articulação entre as dimensões psicológica e
social, o esforço e a necessidade humana de lidar com o real, o concreto, o familiar,
de modo a dar sentido ao mundo. Na possibilidade de desmembramento desses
processos, poderíamos caracterizar a objetivação como o processo de formação de
imagens, no qual o sujeito dá corpo visual ao que lhe é abstrato; relativamente à
ancoragem, podemos caracterizá-la como o processo de tornar familiar o
desconhecido, no qual o sujeito integra o novo ao sistema cognitivo já existente.
Vala (2000, p.465) discorreu sobre a objetivação e as fases de construção
seletiva, esquematização e naturalização, destacando que o sujeito apreende do
conteúdo teórico do objeto alguns elementos para relacioná-los com os outros,
agregando-os em um sistema de imagens antes de atribuir ao objeto o caráter de
natural, guardando uma relativa coerência. Segundo suas palavras, “não só o
abstrato se torna concreto através da sua expressão em imagens e metáforas, como
o que era percepção se torna realidade, tornando equivalente a realidade e os
conceitos".
É esse um desenho mental que fazemos, metaforicamente, da realidade
externa que nos circunda, em nossa incansável tentativa de internalizar o que é
palpável no mundo. Em relação à ancoragem, Vala lembrou que esta pode,
42
igualmente, ser considerada anterior ou posterior à objetivação, enfatizando a
articulação dialética que as mantém unidas. Justificando a posição anterior da
ancoragem, o autor ressalta que, à medida que o sujeito não se encontra inserido
em um vazio mental, mas contaminado pelo seu universo simbólico, antes de
desenhar o esquema icônico do objeto, já o faz ancorado em esquemas conceituais
já consolidados em seu meio. No que tange à posição posterior, o autor a situou
como etapa subseqüente ao movimento do sujeito de construir sua estrutura
imagética para, em seguida, ancorá-la na bagagem conceitual já existente no seu
contexto social. Jovchelovitch (2000, p.82) enriqueceu a compreensão desses
processos que estão na gênese das representações sociais afirmando que
Objetivar é condensar significados - diferentes que podem ser ameaçadores, ou indizíveis – para fazê-los familiares, domesticados. Ao assim fazer, sujeitos sociais ancoram o desconhecido em uma realidade já institucionalizada e deslocam a geografia de significados estabelecidos que as sociedades lutam para perpetuar.
Objetivando e ancorando, os sujeitos fazem investimentos simbólicos
sobre os fenômenos emergentes do seu contexto social, favorecendo o intercâmbio
entre o senso comum e a ciência, dada a porosidade de suas fronteiras. Pela
comunicação interpessoal e intergrupal, fazem circular as representações que
conseguem elaborar sobre a novidade, saciados pela sensação de dominação do
desconhecido. Apesar de não se dar conta, o homem é o criador da realidade que
não existe em si, mas guarda consistência e significado pela tradução que lhe é
dada, no inesgotável processo comunicacional das criaturas sociais.
Quando Vala (2000) fez referência à ancoragem das representações
sociais no sistema de comunicação, citando a difusão, a propagação e a
propaganda como as formas pelas quais circulam, igualmente ressaltou o caráter
consensual, hegemônico ou polêmico que assumem a partir de então. Pela difusão,
as mensagens são lançadas sem vínculo entre o emissor e o receptor, atingindo
vários públicos e suscitando pontos de vista variados, o que possibilita a formação
de opiniões.
43
Pela propagação, as mensagens, já estruturadas, são dirigidas a um
grupo específico como argumento de defesa da idéia, possibilitando a formação de
atitudes em relação a determinado fenômeno e a antecipação do comportamento, de
modo a manter o vínculo entre emissor e receptor. Pela propaganda, a mensagem
circula, gerando conflitos, separando grupos e atribuindo-lhes uma identidade
positiva ou negativa. É nesse trâmite que se dá a formação de estereótipos não
como uma categoria criada pelo grupo, mas para ele.
Vala (2000, p.493) comentou ainda o crescente papel da televisão na
estruturação do caráter hegemônico de determinadas representações sociais e a
forma como essa modalidade de pressão influencia os comportamentos humanos.
Em sua visão, “a expressão do audiovisual mergulhou-nos num mundo de rostos,
imagens e símbolos, nos quais se inscrevem as idéias mais abstratas, conferindo-
lhes a materialidade de que necessitam para viver, reproduzir-se e tornar-se
realidade”.
A televisão, como o meio de comunicação de massa mais popular,
incrustrada no seio de milhares de lares, veicula para uma infinidade de
telespectadores o rosto da violência praticada por adolescentes. Esse fenômeno
adquire, então, uma face material para a qual convergirão significações emocionais
da população e sobre a qual se formará uma teia de argumentações que ajudarão
na sua descrição, na explicação de suas causas e no modelo de conduta esperada
para fazer-lhe frente.
Se as explicações de causalidade encontradas são de natureza
individual, entendemos que isso influenciará as opiniões e atitudes sociais no
tocante à defesa da redução da maioridade penal e o conseqüente encarceramento
do adolescente no quase limite da infância, manifestadas pelo regozijo frente às
torturas infligidas aos adolescentes por policiais ou populares. Ressalte-se que já
ganha corpo na sociedade a defesa da prisão perpétua ou pena de morte como
crença de que aí reside a eliminação do problema. Se, por outro lado, as pessoas
ancoram as explicações sobre o fenômeno em causas sociais, adotam atitudes e
condutas diferentes daquelas, numa flagrante mudança de ótica. Segue, a esse
respeito, o pensamento de Vala (2000, p.481):
44
Ora, quando os indivíduos se questionam sobre fenômenos sociais como a pobreza, o desemprego, a saúde, a violência ou o insucesso escolar, acionam as teorias que coletivamente construíram sobre estes mesmos fenômenos, e é no quadro dessas teorias que procuram e estruturam as explicações.
Marchon (2003), em uma reflexão sobre a violência dos dias atuais,
dentro de uma leitura psicanalítica que articula o registro do inconsciente com o
comportamento manifesto, observou que a nossa iniqüidade social custa caro.
Fabricamos miséria, corrupção e violência e internalizamos a culpa pela nossa
insanidade. Nos confins do interior humano, o reflexo da responsabilidade pelas
raízes sociais da violência conduz a uma postura que às vezes oscila entre a
crueldade e a impunidade. Somos seres cruéis quando nos esmeramos em tratar
desumanamente os humanos, nossos irmãos. Construímos cárceres indignos para
prender os violentos e não volvemos nosso olhar para os que ali se contorcem. Por
outro lado, somos negligentes quando aceitamos tacitamente a impunidade como se
desejássemos conceder-lhes a liberdade, para sermos castigados pelo medo que
nos provoca a sua soltura. Afirmou Marchon (2003, p.50) que
Como nós sabemos que temos estas culpas, doentiamente deixamos milhares de criminosos sem punição e permitimos que os que são presos possam fugir com a maior facilidade. Não há como escapar de nossa responsabilidade pessoal pelo que acontece no mundo social de que participamos.
A partir do que foi abordado acima sobre as representações sociais,
podemos destacar como eixo fundamental de sua definição o fato de que consistem
no saber do senso comum, intimamente ligado à comunicação. Se um determinado
fato social ganha consistência, os sujeitos sociais tecem a sua própria teoria sobre
ele, orientados por um modelo de pensamento prático. Esse pensamento lhes
permitirá edificar um substrato comum, a partir do qual poderão compreendê-lo,
dominá-lo e se posicionar. Para usar a expressão weberiana, os grupos constroem
uma “visão de mundo” que aplaca a angústia frente ao novo, tornando-o familiar,
fortalecendo laços entre os indivíduos e demarcando suas fronteiras.
45
O que é então a verdade? Uma multidão movente de metáforas, de metonímias,
de antropomorfismos, em resumo, um conjunto de relações poética e
retoricamente erguidas, transpostas, enfeitadas, e que, depois de um longo uso,
parecem a um povo firmes, canoniais e constrangedoras: as verdades são ilusões
que nós esquecemos que o são, metáforas que foram usadas e que perderam a sua
força sensível, moedas que perderam seu cunho e que a partir de então entram
em consideração, já não como moeda, mas apenas como metal.
Nietzsche
CAPÍTULO 3
CAMINHO METODOLÓGICO
3.1 NATUREZA DO ESTUDO
Realizar-se-á um estudo de campo exploratório, de caráter quantitativo e
qualitativo, embasado no referencial teórico das representações sociais, atribuindo-
se absoluta prioridade ao discurso dos sujeitos como fonte de informação para a
análise das representações que elaboram.
Respeitante a estudo exploratório, cite-se a posição de Gil (1999, p.43):
“as pesquisas exploratórias têm como principal finalidade desenvolver, esclarecer e
modificar conceitos e idéias, tendo em vista, a formulação de problemas mais
precisos ou hipóteses pesquisáveis para estudos posteriores”.
A importância dos aspectos quantitativos e qualitativos do estudo reside
na incompletude de cada um deles, em separado. Minayo (2000) destacou que
esses aspectos não são excludentes, mas, ao contrário, a sua composição
complementar amplia a riqueza dos dados. Se a pretensão de desvelar a verdade é
o anseio de todo pesquisador e se igualmente ele sabe ser verdadeira a ilusão de
sua busca, que também procure naquilo que se manifesta o não dito, ou seja, o
oculto do aparente, deixando o concreto ser atravessado pela subjetividade, não
esquecendo o rigor que qualquer trabalho científico exige.
48
3.2 O CAMPO DE ESTUDO
Este estudo foi desenvolvido em três centros educacionais destinados ao
atendimento de adolescentes privados de liberdade por sentença judicial, sendo um
feminino e dois masculinos, todos eles vinculados à Secretaria da Ação Social da
cidade de Fortaleza – Ceará. A escolha desses campos deu-se em razão de ser
esta secretaria o órgão estadual que tem a responsabilidade legal pela
implementção das medidas socioeducativas privativas e restritivas de liberdade,
pautando suas ações nos parâmetros legais preconizados pelo Estatuto da Criança
e do Adolescente – ECA (BRASIL, 1990).
As ações institucionais voltadas para esse adolescente procuram atender
integralmente o art. 124 do ECA que trata do resguardo de seus direitos enquanto
interno, assim como procuram priorizar o enfoque na pedagogia da presença que,
segundo Costa (1997), tem no acompanhamento construtivo, aberto e solidário do
educador ao educando sua finalidade primeira.
Em Fortaleza, a rede de unidades para atendimento ao adolescente em
conflito com a lei é formada por oito unidades, sendo uma de recepção, para
adolescentes de ambos os sexos, uma de semiliberdade masculina, cinco de
internação masculina e uma unidade feminina para atender as medidas privativas e
restritivas de liberdade. Além da separação por sexo, as unidades se destinguem
pela natureza do atendimento prestado, faixa etária dos internos e gravidade do ato
infracional praticado.
Cada uma das cinco unidades de internação masculina tem capacidade
para 60 internos, entretanto, a maioria delas atende uma média de 100 rapazes, o
que traduz, numericamente, o índice acentuado de adolescentes que adentraram o
mundo da criminalidade. A unidade feminina, com capacidade para 30 garotas,
atende cerca de 25 adolescentes mensalmente, realidade que reitera a diferença
significativa na relação entre sexo e prática infracional.
49
As unidades masculinas escolhidas para a realização do estudo foram o
Centro Educacional Cardeal Aloísio Lorscheider e o Centro Educacional São Miguel,
eleitos pela Secretaria da Ação Social – SAS – para o atendimento ao adolescente a
partir de 16 anos, autor de ato infracional mais grave e de compleição física mais
robusta. Em razão da natureza do ato infracional praticado, os internos dessas
unidades permanecem um tempo mais longo privados de liberdade, sendo, portanto,
nesses centros que se encontra a quase totalidade dos adolescentes e jovens
adultos autores de homicídio e latrocínio. A unidade feminina foi o Centro
Educacional Aldaci Barbosa Mota que atende garotas de 12 a 21 anos. À época da
realização deste estudo, contava com 5 internas autoras de homicídio ou latrocínio.
Os adolescentes privados de liberdade vivem em unidades nas quais
dividem espaços de alimentação, lazer, escolaridade, dormida, higienização e
recepção de visitas. O acesso ao ambiente social externo obedece à rigorosa
apreciação e autorização da direção, equipe técnica ou Juiz da Infância e Juventude.
Da mesma forma que em outras instituições dessa natureza, a vida é dirigida por
regras que priorizam o coletivo em detrimento do individual, a fim de que a ordem
possa ser mantida. Os espaços físicos internos das unidades masculinas são
dotados de grades de ferro, fechadas a cadeado, além de serem cercados por
muros altos, onde, estrategicamente, há guaritas ocupadas por policiais.
Goffman (1992), abordando a questão das “instituições totais”, incluiu os
presídios nessa categoria e procurou descrever atributos comuns que as distinguem
das demais instituições sociais. Nas instituições fechadas, os homens vivem em
grupos numerosos, tornando-se, em conseqüência disso, seres transparentes, uma
vez que não são percebidos na sua individualidade. A padronização das atividades
cotidianas e a fiscalização sistemática do interno passam a fazer parte do penoso
processo de tortura a que terá de se submeter. Segundo o autor, “a barreira que as
instituições totais colocam entre o internado e o mundo externo assinala a primeira
mutilação do eu” (GOFFMAN, 1992, p.24).
A reconhecida consideração de ser o adolescente um ser em
desenvolvimento e, portanto, com direito a uma abordagem educativa sobreposta ao
aspecto punitivo, mesmo quando sentenciado com privação de liberdade, tem sido
50
explicitada legalmente a partir da exigência de que as unidades de internação se
distanciem do modelo secular das instituições totais. Para tanto, os referidos centros
contam com profissionais das áreas de serviço social, pedagogia, psicologia,
medicina, enfermagem e odontologia, além de uma equipe de apoio que trabalha em
regime diuturno, de modo a acompanhar o adolescente, ininterruptamente. Durante
o dia, os adolescentes participam de atividades de escolarização, através de
convênio firmado entre a Secretaria de Ação Social e a Secretaria de Educação, de
oficinas profissionalizantes, e ainda de atividades lúdicas, culturais, espirituais,
dispondo também de atendimento individual e grupal.
3.3 OS SUJEITOS
Fizeram parte deste estudo adolescentes privados de liberdade por
sentença judicial, internados nos três centros retromencionados, todos sob a
responsabilidade da SAS, os quais compõem o grupo A, e mães de adolescentes
na mesma situação, também internos nesses três centros, que passaram a compor
o grupo B. Os critérios de inclusão na constituição destes grupos foram assim
definidos:
Grupo A
• Estar privado de liberdade por cometimento de homicídio ou latrocínio.
• Ter entre 16 e 21 anos.
• Aceitar participar da pesquisa, com assinatura do consentimento livre e
esclarecido de acordo com a Resolução nº196/96 do Conselho
Nacional de Saúde, seção Pesquisas Envolvendo Seres Humanos
(Brasil, 1998).
Grupo B
• Ser mãe de adolescente privado de liberdade por sentença judicial em
um dos três centros já citados.
51
• Aceitar participar da pesquisa, com assinatura do consentimento livre e
esclarecido de acordo com a Resolução nº196/96 do Conselho
Nacional de Saúde, seção Pesquisas Envolvendo Seres Humanos
(Brasil, 1998).
O Teste de Associação Livre de Palavras foi realizado em uma amostra
de 112 sujeitos, sendo 56 adolescentes e 56 mães. A entrevista semi-estruturada foi
realizada com 16 adolescentes e 16 mães, sendo esse recorte de 32 sujeitos
determinado pela saturação teórica das informações colhidas. A coleta de dados foi
realizada em um intervalo de 2 meses. O Quadro 1 abaixo expõe o perfil
sociodemográfico dos sujeitos da amostra.
Quadro 1 – Perfil dos sujeitos segundo as variáveis sociodemográficas.
Sujeitos Adolescentes MãesTotal
Variáveis F % F %
Sexo
• Masculino 51 91 - - 51• Feminino 5 9 56 100 61Idade• 16-18 47 84 - - 47• 18-21 9 16 - - 9• > 21 - - 56 100 56
Escolaridade
• Analfabeto 7 12,5 14 25 21• Fundamental 44 78,5 39 69,7 83• Ensino Médio 5 9 3 5,3 8
3.4 OS INSTRUMENTOS
52
A escolha dos instrumentos para a coleta de dados é fundamental para a
construção do objeto de pesquisa que conduzirá às representações sociais. Sobre
essa etapa, Sá (1996, p. 100 -101) comenta que
um primeiro problema que se coloca a todo pesquisador, mesmo que não advertido nesses termos, diz respeito à coleta de dados. Embora tal atividade tenha obrigatoriamente que ser complementada pelo tratamento ou análise dos dados, parece oportuno enfatizar sua importância na construção do objeto, bem como sua dependência em relação a eleições teórico-conceituais prévias.
Este estudo foi desenvolvido a partir de uma abordagem metodológica
múltipla, priorizando instrumentos que favorecessem a interação entre pesquisador e
sujeitos e viabilizassem a expressão de seus conteúdos cognitivos, atitudinais e
afetivos. Os instrumentos selecionados foram o Teste de Associação Livre de
Palavras, a entrevista semi-estruturada e a observação assistemática. O uso
combinado desses três instrumentos objetivou tornar possível a leitura e apreensão
do objeto investigado pela análise qualitativa e quantitativa do material expresso.
Teste de Associação Livre de Palavras
O Teste de Associação Livre de Palavras tem adquirido importância
crescente no campo de pesquisas em ciências sociais e humanas, dada a sua
funcionalidade como instrumento de investigação dos elementos que dão
configuração ao objeto da representação. A liberdade de expressão favorecida por
essa técnica cria um terreno favorável às projeções do sujeito, oferendo ao
pesquisador uma base de informações que dão acesso ao fenômeno
representacional. As respostas evocadas devem ser entendidas além de sua
simples significação vocabular. Moscovici (2003, p. 100) ressaltou que
nós reagimos a um estímulo à medida em que, ao menos parcialmente, nós o objetivamos e o recriamos, no momento de sua constituição. O objeto ao qual nós respondemos pode assumir diversos aspectos e o aspecto específico que ele realmente assume depende da resposta que nós associamos a ele antes de defini-lo.
53
O presente estudo utilizou a expressão “adolescente infrator” como
estímulo indutor, sendo solicitado a cada sujeito que respondesse à seguinte
questão: Quais as quatro primeiras palavras que lhe vêm à mente quando eu falo a
expressão adolescente infrator? As respostas a essa pergunta foram registradas na
ordem em que foram proferidas. A partir disso, foi construído um dicionário com 448
respostas que variaram entre palavras e expressões evocadas pelos sujeitos.
Os dados fornecidos pelo teste e processados pelo software Tri-Deux-
Mots tornaram possível, no aspecto quantitativo, uma representação gráfica das
variáveis fixas (grupo de adolescentes e de mães, idade e escolaridade) e variáveis
de opiniões (respostas evocadas). No aspecto qualitativo, através da técnica da
análise fatorial de correspondência, os dados retratados no território gráfico puderam
ser compreendidos pela leitura dos espaços que entre si estabeleceram essas
variáveis.
Na ocasião da realização desse levantamento de dados, os três centros
educacionais escolhidos contavam com um total de 56 adolescentes privados de
liberdade por homicídio ou latrocínio, tendo sido aplicado o teste em 100% desse
universo. Após a conclusão dessa etapa, aplicou-se o teste a igual número de mães
que visitavam seus filhos durante as internações.
Entrevista Semi-estruturada
As entrevistas foram feitas em etapa posterior à aplicação do Teste de
Associação Livre de Palavras, sendo estruturadas em torno de questões que
procuraram desnudar elementos do universo subjetivo dos sujeitos, invariavelmente
impregnados do colorido cognitivo e afetivo de suas vivências. Embora a pergunta
central tenha sido Para você o que é adolescente infrator? uma outra pergunta sobre
“adolescente” a antecedeu, com o objetivo de facilitar o ingresso do sujeito na
temática investigada.
54
Sá (1998) esclareceu que a quantidade de entrevistas necessárias a uma
investigação sobre o conteúdo representacional não deve ser determinada a priori.
Ao longo da coleta dos dados, o pesquisador facilmente identificará o momento em
que os temas expressos pelos sujeitos começarão a se repetir, o que sinalizará o
limite do número de entrevistas.
Observação Assistemática
Podemos considerá-la como uma observação sem validação quantitativa
que consistiu em observações espontâneas de aspectos considerados significativos
ao longo do procedimento de coleta de dados.
3.5 PROCEDIMENTOS PARA COLETA DE DADOS
O Teste de Associação Livre de Palavras foi o primeiro instrumento
utilizado na etapa de coleta de dados. O contato com cada adolescente foi feito
seguindo as normas de segurança das unidades onde se encontravam. Nas
internações masculinas, cada adolescente foi levado até a sala reservada para a
entrevista por um funcionário de plantão que aguardava no corredor a conclusão da
aplicação do teste. O cuidado e o estado de alerta do funcionário estiveram
diretamente relacionados a sua responsabilidade em evitar fuga ou violência por
parte do adolescente.
Na internação feminina, a geografia dos espaços e o baixo número de
internas tornaram menos necessários os protocolos de segurança. As adolescentes
circulam com mais liberdade na unidade e têm considerável acesso aos
funcionários. A aplicação do teste prescindiu, pois, de maiores tensões no contato
com as adolescentes. Após a conclusão da aplicação do teste aos cinqüenta e seis
55
adolescentes, foi iniciada a aplicação desse instrumento às mães, nas próprias
unidades, por ocasião de suas visitas aos filhos.
A etapa seguinte, realização das entrevistas, também transcorreu da
mesma forma anteriormente descrita. Os adolescentes convidados para ser
entrevistados foram escolhidos conforme a facilidade de expressão e comunicação
que demostraram na oportunidade da aplicação do teste. As mães entrevistadas
foram aquelas que, no dia da visita, aceitaram participar do estudo. As entrevistas
foram todas gravadas, não tendo sido definido tempo para a sua duração. Vale
salientar que as mães entrevistadas não foram as mesmas que responderam ao
teste, ao contrário do procedimento adotado com os adolescentes, dada a
dificuldade em garantir as mesmas mães para as entrevistas em virtude de algumas
delas residirem no interior do estado ou em bairros afastados, o que impediria a
conclusão do estudo no tempo previsto para a sua realização.
Todos os adolescentes responderam às perguntas de forma
descontraída, expressando contentamento por estarem sendo entrevistados e
demonstraram interesse em escutar a gravação de seus pensamentos. Tanto a
entonação da voz quanto as palavras utilizadas em seus discursos guardam estreita
semelhança entre si. Muitas palavras são pronunciadas pela metade e coladas à
palavra seguinte, dando a impressão de que formam uma espécie de dialeto próprio
que soa incompreensível a ouvidos leigos. As mães falaram com mais emoção e,
quando perguntadas sobre o significado de ter um filho adolescente infrator,seus
discursos se interromperam pela dor e pelo choro. Todas elas registraram
fragmentos de suas idéias e vivências gestadas na dureza de seu cotidiano de
mulher sofrida.
Os dados de identificação sociodemográfica coletados nas entrevistas
contextualizaram os sujeitos atores desse estudo. As suas expressões, anotadas em
diário de campo, traduziram sua linguagem analógica, fonte rica de informações
complementares ao conteúdo verbal gravado.
56
3.6 ANÁLISE E TRATAMENTO DOS DADOS
Os diferentes instrumentos utilizados no presente estudo forneceram uma
variedade de dados que passaram a requerer a elaboração de um plano para tornar
viável seu tratamento e análise. Para tanto, foram selecionadas a técnica de análise
fatorial de correspondência e a de análise de conteúdo que passam a ser
apresentadas a partir de algumas considerações teóricas.
3.6.1 Análise de conteúdo
Bardin (1977) fez um apurado levantamento cronológico sobre a história
da técnica de análise de conteúdo e localizou sua origem nos Estados Unidos, no
início do século XX, contextualizando seu crescimento na área das comunicações,
atrelada às diretrizes de objetividade da psicologia comportamental.
O reconhecimento dessa técnica investigativa fê-la adentrar as ciências
políticas, literárias e psicológicas para, a partir de então, expandir-se a outros
domínios do conhecimento, exigindo cada vez mais empenho dos estudiosos na
elaboração de sua definição. Esse avanço foi fruto do período pós-guerra, quando
a abordagem qualitativa dos fenômenos forçou a ruptura entre objetividade e
ciência.
Desde a sua concepção, a análise de conteúdo foi sempre empregada
com a intenção de objetivar e sistematizar o conteúdo da comunicação, de forma a
assegurar o rigor científico ao material que não se encontra no território do
concreto. Bardin (1977, p.42) trabalhou a idéia de ser análise de conteúdo um
conjunto de técnicas e sobre ela fez a seguinte declaração:
Pertencem, pois, ao domínio da análise de conteúdo, todas as iniciativas que, a partir de um conjunto de técnicas parciais, mas complementares consistam na explicitação e sistematização do conteúdo das mensagens e da expressão deste conteúdo, com o contributo de índices passíveis ou não de quantificação, a partir de um conjunto de técnicas que, embora parciais, são complementares.
57
O estudo em questão lançou mão da análise de conteúdo para percorrer
o terreno discursivo dos sujeitos, objetivando fazer inferências sobre suas
mensagens inventariadas e sistematizadas. Para tanto, foram catalogadas as
seguintes etapas operacionais: constituição do corpus, composição das unidades
de análise, inventário, categorização, tratamento dos dados e descrição das
categorias. Através dessa técnica, o pesquisador transpõe a barreira daquilo que
foi objetivamente expresso pelo pensamento verbal e vasculha o que se deixou
ocultar.
58
Figura 1 – Plano de análise
PLANO DE ANÁLISE
CORPUS
2. UNIDADES DE ANÁLISE
3. INVENTÁRIO
4. CATEGORIZAÇÃO
5. DESCRIÇÃO DAS CATEGORIAS
6. TRATAMENTRO DOS DADOS
7. RS SOBRE ADOLESCENTE INFRATOR
59
1. Constituição do corpus
O corpus é formado por todo o material sobre o qual se debruçará o
pesquisador. Neste estudo, foi constituído por 112 Testes de Associação Livre de
Palavras e 32 entrevistas, ambos os instrumentos aplicados aos grupos de
adolescentes e mães.
2. Composição das unidades de análise
As unidades de análise escolhidas foram a frase e o parágrafo que
corresponderam, respectivamente, às unidades de registro e de contexto. Essas
unidades são frações de sentido extraídas do conteúdo a ser investigado e definidas
pelo pesquisador, com vistas a viabilizar a quantificação e o estudo avaliativo do
material produzido.
3. Constituição do inventário
O inventário é o corpus decomposto em unidades de análise, modelo de
reordenamento do material de estudo que favorece uma maior visibilidade de seu
conteúdo para que se proceda ao agrupamento dessas unidades em subcategorias
e categorias simbólicas.
4. Categorização
Uma categoria é um aglomerado de respostas com a mesma significação
denominadas por um título que expressa o conceito central daquele conjunto de
idéias. Cada categoria é formada por um conjunto de subcategorias e esse processo
de fusão de palavras torna possível a sua relevância estatística. Segundo Vala
(1999, p.111), “o que importa ao analista são os conceitos, e a passagem dos
indicadores aos conceitos é, portanto, uma operação de atribuição do sentido, cuja
validade importará controlar¨.
Neste estudo, o mesmo conjunto de categorias foi definido para os dois
grupos estudados, a fim de tornar possível a análise comparativa das
60
representações sociais. O quadro 2 mostra a classificação das categorias e
subcategorias selecionadas e a quantificação de suas unidades de análise.
Quadro 2 – Distribuição das categorias e subcategorias simbólicas sobre adolescente infrator
CATEGORIAS SUBCATEGORIAS
Nº DE
UNIDADES DE
ANÁLISETOTAL
1.Descrições sobre adolescente • Comportamentais
• Vivenciais
137
16
153
2. Descrições sobre adolescente
infrator
• Comportamentais
• Vivenciais
117
26 143
3. Causas do ingresso no mundo
do crime
• Sociointeracionais
• Familiares
• Psicológicas
• Socioeconômicas
134
83
70
45
332
4. Percepção do eu • Autopercepção
• Heteropercepção
• Idealizada
221
188
76
485
5. Perspectiva de mudança • Pessoal
• Social
• Institucional
• Familiar
• Espiritual
124
109
37
25
13
308
6. Expressões subjetivas • Sentimentos
• Pensamentos
117
66
183
61
5. Descrição das categorias
As respostas que emergiram das entrevistas realizadas, recortadas em
1604 unidades de análise temática, tornaram possível a definição de um conjunto de
seis categorias e dezoito subcategorias.
• Categoria 1 – Descrições sobre adolescente
Esta categoria abrange 153 unidades de análise temática que revelam as
descrições sobre adolescente elaboradas pelos sujeitos entrevistados, agrupadas
em duas subcategorias: comportamentais e vivenciais.
Figura 2 – Descrições sobre adolescente
• Categoria 2 – Descrições sobre adolescente infrator
Esta categoria abrange 143 unidades de análise temática que revelam as
descrições sobre adolescente infrator elaboradas pelos sujeitos entrevistados,
agrupadas em duas subcategorias: comportamentais e vivenciais.
DESCRIÇÕES SOBRE ADOLESCENTE
COMPORTAMENTAIS VIVENCIAIS
62
Figura 3 – Descrições sobre adolescente infrator
• Categoria 3 – Causas do ingresso no mundo de crime
Esta categoria abrange 332 unidades de análise temática por meio das
quais os sujeitos apontam as suas versões sobre os fatores que favorecem a
entrada do adolescente no mundo do crime. As respostas emitidas foram agrupadas
em 4 subcategorias: sociointeracionais, familiares, psicológicas, socioeconômicas.
Figura 4 – Causas do ingresso no mundo do crime
• Categoria 4 – Percepção do Eu
Esta categoria abrange 485 unidades de análise temática em que os
sujeitos expressam como se percebem, como acreditam serem percebidos e como
gostariam de ser. Estão contidas nessa categoria três subcategorias a saber:
autopercepção, idealizada e heteropercepção.
CAUSAS DO INGRESSO NO MUNDO DO CRIME
SOCIOECONÔMICAS PSICOLÓGICAS
SOCIOINTERACIONAIS FAMILIARES
DESCRIÇÕES SOBRE ADOLESCENTE INFRATOR
COMPORTAMENTAIS VIVENCIAIS
63
Figura 5 – Percepção do eu
• Categoria 5 – Perspectiva de mudança
Esta categoria abrange 308 unidades de análise temática que mostram as
alternativas pensadas pelos sujeitos, capazes de interromper o ciclo da reiteração da
prática infracional e o conseqüente abandono do mundo do crime. É formada por
cinco subcategorias: pessoal, social, institucional, familiar e espiritual.
Figura 6 – Perspectiva de mudança
• Categoria 6 – Expressões subjetivas
Esta categoria é formada por 183 unidades de análise temática nas quais
os sujeitos elaboram pensamentos e sentimentos em torno de suas experiências
relativas à infracionalidade.
PERCEPÇÃO DO EU
AUTOPERCEPÇÃO HETEROPERCEPÇÃOIDEALIZADA
PERSPECTIVA DE MUDANÇA
PESSOAL ESPIRITUALFAMILIAR
SOCIALINSTITUCIONAL
64
Figura 7 – Expressões subjetivas
6. Tratamento dos dados
Os dados levantados pelo estudo, submetidos ao tratamento estatístico,
com indicação de freqüência das unidades de análise, cálculos percentuais e qui-
quadrado, serviram para constatar semelhanças ou diferenças das RS sobre
adolescente infrator entre os dois grupos, possibilitando a análise e as inferências
quantitativas e qualitativas dos dados.
3.6.2 Análise Fatorial de Correspondência
A Análise Fatorial de Correspondência – AFC – é uma das técnicas de
análise fatorial por meio da qual um conjunto de dados estatísticos é submetido a
uma análise descritiva. O seu grau de confiabilidade, conquistado ao longo de
quase meio século de existência, tem lhe rendido indicações para sua utilização em
estudos com vários tipos de dados (questões abertas ou não) e, em especial, tem
sido largamente utilizada em pesquisa sobre representação social.
Segundo Deschamps (2003), essa técnica torna possível ao pesquisador
formar uma idéia geral dos dados levantados, a partir das descrições que vai
fazendo relativas às ligações entre as variáveis qualitativas. O leque de
combinações que vai sendo montado entre as variáveis imprime um caráter
exploratório à técnica, permitindo uma maior aproximação do pesquisador ao
conjunto de informações recolhidas.
EXPRESSÕES SUBJETIVAS
SENTIMENTOS PENSAMENTOS
65
A organização de uma tabela de freqüência ou tabela de contingência, em
que as variáveis independentes e a produção léxica dos sujeitos estão distribuídas
em colunas e linhas, dá flexibilidade ao cruzamento das informações e maior
riqueza à interpretação dos resultados. A freqüência das modalidades mais
evocadas contribui para a construção dos eixos que compõem o plano fatorial.
A representação gráfica dos resultados aparece disposta no Plano
Fatorial com dois eixos que, por convenção, são denominados F1 (horizontal) e F2
(vertical), cada um deles formado por dois pólos. Igualmente por convenção,
atribui-se a denominação de negativo ao lado esquerdo de F1 e inferior de F2 e de
positivo, o lado direito de F1 e superior de F2. A AFC permite interpretar os dados,
porquanto ressalta as ligações de aproximação e distanciamento existentes entre
diferentes grupos de sujeitos, a partir de suas respostas agrupadas nos espaços
fatorais distintos e opostos de F1 e F2.
66
O UNIVERSO não é uma idéia minha.
A minha idéia do UNIVERSO é que é uma idéia minha.
A noite não acontece pelos meus olhos.
A minha idéia da noite é que anoitece por meus olhos.
Fora de eu pensar e de haver quaisquer pensamentos,
a noite acontece concretamente
e o fulgor das estrelas existe como se tivesse peso.
Fernando Pessoa
CAPÍTULO 4
CONSTRUÇÃO DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SOBRE ADOLESCENTE INFRATOR
É parte integrante do homem a necessidade de expressão e de
relacionamento. A comunicação não pode ser separada da vida, tendo passado, ao
longo dos tempos, por um processo de evolução até chegar à linguagem oral que foi
a primeira forma organizada da comunicação humana. Pela linguagem, os homens
se definem como seres sociais e individuais e assim o fazem em relação a seus
pares; pela linguagem falada e escrita, produzem e reproduzem mensagens através
dos meios de comunicação, interpretam e modificam a realidade que os envolve.
Diferentemente do animal, o homem introduz em sua comunicação a força de suas
emoções de tal modo que a linguagem não é somente a linguagem dos signos, mas
também, e com igual poder, a linguagem dos significados.
Cada sociedade constrói para si um vasto sistema de códigos de
comunicação que funciona como diretriz para a percepção e interpretação da
realidade. De forma mais reduzida, cada grupo social igualmente cria seus próprios
códigos, responsáveis pela demarcação das fronteiras que favorecem o sentido de
pertencimento e identidade. Ficam, dessa maneira, delimitados os territórios
subjetivos nos quais os membros dos grupos se reconhecem como seres iguais e
definem entre si o familiar e o estranho, criando a confortável e vital sensação de
sua legitimidade social. Nesse inevitável processo de formação de minorias, cada
segmento vai construindo sua linguagem particular que, por sua vez, incide no
estabelecimento dos valores e comportamentos.
69
Quando se pertence a uma minoria qualificada negativamente pelo
conjunto mais amplo, a pressão para o seu aniquilamento provoca uma força reativa
que acaba por criar um campo de poder capaz de garantir a sobrevivência dos
grupos. Os grupos falam, escutam, sentem e vêem a si a ao outro através de um
prisma comum, mediado por uma linguagem idiossincrática. Essas minorias não
qualificadas são formadas por seres transparentes que não conseguem ter
visibilidade, razão por que precisam lançar mão de estratégias para marcar sua
presença na história. Necessitam, pois, fazer barulho para serem ouvidos, embora,
muitas vezes, sua voz só seja reconhecida dentro dos índices estatísticos que mais
ainda reforçam o seu menor valor.
O adolescente que comete ato infracional pertence a essa categoria de
seres desprezíveis que lutam contra o anonimato e, ao expressar a sua
subjetividade por meio de atividades criminosas, acentua os contornos do espaço
reservado a sua existência. Em cada lado da fronteira, os sujeitos tecem universos
representacionais. Segundo Mello (2002, p. 133), “há uma troca de olhares, mas a
reciprocidade deles está carregada de significados diferentes“. Eis por que deixar
falar as minorias é ouvir os seus olhares e entender de que forma as suas
experiências são geradoras de representações sociais.
Ao deparar com o desconhecido, o homem necessita dominá-lo para
aplacar a sensação de angústia que o invade. É através desse processo de
apreensão do desconhecido que tem início a formação das representações sociais,
um saber socialmente partilhado. Sobre as representações sociais, Jovchelovitch
(2000, p. 81) assinalou que “elas expressam por excelência o espaço do sujeito, em
sua relação com a alteridade do mundo, lutando para dar sentido, interpretar e
construir os espaços nos quais se encontra”.
A partir desse referencial teórico, o presente capítulo procurou investigar
as representações sociais sobre adolescente infrator, elaboradas por adolescentes
autores de atos infracionais e por suas mães, identificando nesse conhecimento do
senso comum as suas interfaces com as ciências jurídica, psicológica e social. Ainda
considerando o leque do conhecimento leigo teorizado, foi possível vislumbrar os
matizes das singularidades das vivências dos sujeitos.
70
Para conhecer esses matizes, fez-se necessária a leitura dos seus
discursos que denunciam o modo pelo qual entendem, interpretam e transformam
esse fenômeno psicossocial das representações sociais. A linguagem torna possível
a codificação dos mundos concreto e abstrato dos sujeitos sociais, razão pela qual
constitui-se em importante instrumento de acesso às representações sociais.
4.1 A CONSTRUÇÃO DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SOBRE ADOLESCENTE INFRATOR A PARTIR DA ANÁLISE DE CONTEÚDO
A exploração do material produzido pelos sujeitos resultante da aplicação
das entrevistas foi feita a partir da utilização da técnica de análise de conteúdo, o
que possibilitou a emersão de 6 categorias e 18 subcategorias, apresentadas a
seguir.
4.1.1 Descrições sobre adolescente
A primeira investigação feita junto aos sujeitos procurou apreender as
suas descrições sobre o ser adolescente, introduzindo a temática desvinculada de
conceitos prévios. Nesse sentido, a focalização inicial no ser adolescente pretendeu
desconectar as ligações que porventura existam entre os conceitos de adolescente e
infrator. Verificou-se pelas respostas evocadas que as descrições priorizaram
aspectos gerais relacionados a seu comportamento e a suas vivências.
71
Tabela 1 – Distribuição das freqüências, percentuais e qui-quadrado da categoria
descrições sobre adolescente e subcategorias, segundo o grupo de adolescentes
autores de atos infracionais e mães.
SUJEITOS ADOLESCENTES MÃES TOTAL X2
SUBCATEGORIAS F % f % f % Comportamentais
Vivenciais
72 98.63
01 1.37
65 81.25
15 18.75
137 89.54
16 10.46
0,35
12,25TOTAL 73 100 80 100 153 100
p < 0,01
A Tabela 1 sinalizou que ambos os grupos fizeram referências aos
aspectos comportamentais como os mais significativos para descrever o
adolescente, mostrando freqüências superiores a 80%. O valor do qui-quadrado de
0.35 indicou não existir diferença estatística significativa no número de unidades
temáticas expressas pelos grupos. Em relação à subcategoria vivenciais, verifica-se
uma diferença importante no percentual das evocações. O elevado valor do qui-
quadrado (12.25), para um nível de significância de 5%, assinala a contribuição
quase integral das mães nas respostas.
O adolescente como sujeito universal não existe. Existe sim um ser que,
em dado momento da vida, vivencia um complexo processo de desenvolvimento e
mudanças. O desenvolvimento cognitivo e a organização da personalidade se
integram às vivências do corpo e marcam a adolescência como uma etapa
experienciada por todos, embora de maneira diferente por cada indivíduo. Assim, os
processos da adolescência não podem ser considerados universais, pois essa etapa
recebe o imprint do contexto histórico onde acontece.
.
A seguir, serão recortados os diferentes significados de adolescente,
elaborados por jovens que cometeram homicídio e latrocínio e por mães de
adolescentes autores de ato infracional grave. Vale ressaltar que nas duas
subcategorias eleitas para a análise ficaram evidenciadas diferenças significativas
nas representações de cada um dos grupos.
Descrições sobre adolescente ancoradas em aspectos comportamentais
72
As descrições sobre adolescente, expressas a partir dos elementos
apreendidos pela entrevista, foram relacionadas, fundamentalmente, a seu
comportamento, qualificado através dos seguintes aspectos: jovialidade,
impulsividade/desobediência, inexperiência, situação de risco/conduta infracional.
Apesar de a descoberta da vida ser uma tarefa excitante, os temporais da
adolescência não são uma invenção do vazio. Gunther (1999, p.89), comentando o
fato de que os adolescentes comumente deparam com a constatação de que o seu
poder é uma falácia, assim se expressou:
É como se a natureza descarregasse nos adolescentes os apetrechos da idade adulta, mas a sociedade não os ensinasse a lidar com as novidades, com as transformações. Assim, no caminho para a idade adulta, os jovens vivenciam dúvidas, desilusão, solidão.
Efetivamente, a adolescência não é um período conturbado tão-somente
em razão das transformações físicas e psicológicas durante o qual o adolescente
luta com o mundo interno e externo para formar a sua identidade. Na verdade, o
novo ciclo vital que se descortina no final da infância sinaliza a chegada a um
território de conquistas.
As fissuras nos contornos que demarcam as relações do adolescente com
o universo familiar vão se alargando. Os amigos acenam com novos e promissores
relacionamentos e a participação em grupo pode suscitar uma nova imagem ideal de
si. Através das alianças com os grupos de amigos, o adolescente procura afirmar-se
e essa sensação de estar no mundo como protagonista de sua história pode
funcionar como uma mola propulsora da jovialidade.
Os adolescentes que participaram deste estudo materializaram em suas
falas as considerações teóricas acima levantadas, conceituando o adolescente por
meio de descrições que agregaram a sua jovialidade ao conturbado estado
emocional que vivenciam.
• Adolescente pra mim é uma pessoa sempre alegre. A gente vai conhecendo as coisas novas.
73
• É um rapaz amigo, alegre, namorador. • Adolescente é liberdade, curtir a vida lá fora. É saber
brincar. Ter várias amizades. Adolescente é saber viver. • É uma pessoa confusa. Um cara confuso. É outras coisas
mais pior.
Entretanto, os elementos sociocognitivos que compõem essa
representação social também adentraram o terreno da idealização, quando os
sujeitos desconsideraram sua própria condição de infrator e as especificidades
relativas a essa condição. Convém ressaltar que os adolescentes que ingressam no
mundo do crime tendem a abandonar a escola e a introduzir a droga em seus
hábitos de vida, o que imprime um estado de euforia não correspondente à alegria
genuína, mas sim a uma falsa sensação de liberdade.
• Adolescente pra mim é uma pessoa estudiosa.• É liberdade.• Eu acho que adolescente é um rapaz respeitador. • É uma pessoa humilde. • Uma pessoa que crê na palavra de Deus. • Não fazer coisa errada. • Adolescente é uma pessoa normal, igual aos outros.• Adolescente é não com drogas ou violência.
Em relação à jovialidade, vale destacar que nenhuma mãe fez qualquer
referência a esse aspecto nas suas descrições sobre o adolescente. É bastante
provável que esse fato seja devido a uma imediata associação entre adolescente e
adolescente infrator, experiência dolorosa da qual participam diretamente. Mesmo
aquelas mães de outros adolescentes não infratores – o que poderia possibilitar uma
visão positiva do adolescente – tenderam a fazer a mesma associação. Assim,
nenhum traço da jovialidade do adolescente ficou em seu registro de memória. Essa
lacuna foi preenchida com imagens de adolescentes educados, responsáveis e
sérios, sempre muito distantes do filho real que conseguiram criar.
• Adolescente é estudar.• Adolescente é ser mais educado, saber se comportar. • Adolescente é saber conviver com os outros.
74
• Adolescente tem que ser mais calmo. Tem que ser um menino bom. Tem que ser um menino pensativo.
A travessia para a vida adulta é um caminho de construção da identidade.
Faz parte desse processo a busca da singularidade e a tentativa de diferenciação
dos pais, intento que adquire uma importância relevante para o adolescente. A
contestação passa a fazer parte do seu repertório comportamental, podendo
transformar-se em desobediência. É, portanto, uma das causas de a adolescência
ser rotulada uma fase difícil, terreno fértil para as afiadas culpabilizações trocadas
entre pais e filhos.
O adolescente também está sedento de usufruir a vida que se desvela
diante de seus olhos. Para ele, a construção de um plano para o futuro é incogitável,
haja vista que o presente é o concreto e, como ele ainda não elaborou o imediatismo
que o marcava na infância, o seu investimento está voltado para o aqui e o agora.
Esses aspectos estiveram presentes na concepção colhida sobre adolescente,
ampliando novos aspectos de sua representação social. Referências sobre a
impulsividade e a autonomia traduziram o sentido de independência, desafio e
inconseqüência atribuídos ao adolescente, traduzidas em imagens de um sujeito
arrogante e imperioso, de alguém que reivindica para si a verdade dos fatos.
• Ele faz seus atos sem pensar. • Adolescente é uma pessoa impulsiva, não pensa antes de fazer as
coisas. Nunca pensa nas conseqüências. Não pensa no futuro, pensa só naquele momento.
• O adolescente quer se sentir o dono da razão. Ele não segue conselho de pai nem de mãe. Faz o que vem na cabeça. Quer se sentir já adulto, quer ser dono de si.
Vale destacar que os adolescentes entrevistados, ao descreverem o
sujeito adolescente com as mesmas características que adiante atribuem ao infrator,
deixam vislumbrar a vinculação que estabelecem entre os dois conceitos e reiteram
a identidade dúbia com a qual convivem. O adjetivo infrator que qualifica o
substantivo adolescente passa a ser compreendido, ele também, como um
substantivo que dá novo sentido ao eu.
75
As mães também apresentaram o adolescente como um sujeito impulsivo
e desobediente, entretanto, suas falas contêm traços distintos das anteriores. Na
confluência entre as esferas conceitual e vivencial, a concepção sobre adolescente
expressa pelas mães está impregnada das opiniões que têm de seus filhos.
Algumas de suas respostas deixam entrever os seus sentimentos de mágoa e
cansaço, somados ao ressentimento por sentir que a família que construíram foi
colocada em plano secundário e pelo grande pesar de não mais conseguir impor ao
filho a sua autoridade.
• Adolescente acha que é o dono da vida deles. Faz o que bem dá na cabeça. A gente dá muito conselho e ele não aceita, ele só diz não.
• Eles não tão nem aí com a vida, só pensa neles. Não pensa na família, nos pais. A mãe fala e eles não tão nem aí.
• Eles não querem mais saber da mãe. Eles acha que os amigos é que é a vida deles.
• Adolescente é uma pessoa muito trabalhoso.
A metamorfose para a fase adulta é inegavelmente um processo de
amadurecimento. Significa dizer que o adolescente que se pretende adulto
comporta-se ainda, em muitos momentos, como criança. Essa realidade ficou
registrada nas narrativas dos sujeitos desse estudo que fizeram descrições sobre
adolescente em bases de justificativa, compreensão e perdão. Assim, é possível
apreender no grupo de adolescentes que a imaturidade a ele e por ele atribuída tem
uma intenção justificadora de sua conduta, da mesma forma que as mães
entrevistadas, ao descrevê-la, oferecem explicações para o comportamento rebelde
do jovem, o que facilita compreendê-lo e prepara o terreno para o perdão.
Adolescentes O adolescente é uma pessoa inexperiente. Depois ele se arrepende do que faz / Ele é uma pessoa ainda criança, infantil.
Mães O adolescente é totalmente uma criança. É uma pessoa que ainda não pensa como os adultos. Não formou completamente a sua mente / Eles são pessoas que não tem ainda o juízo pronto /Eles ainda não conseguem saber o que é bom e o que é ruim.
76
A contaminação do pensado pelo vivido chamou a atenção quando,
diante da indagação sobre o que é adolescente, as mães buscaram associações
diretas com a conduta infracional ou com a situação de risco. Esta associação é
fruto direto de sua experiência e traduz o passo em falso e não percebido que é
dado em direção ao estigma. A fusão desses conteúdos alicerça o modo de sentir e
agir em relação a esse sujeito. Por outro lado, a relação feita entre comportamento
de risco (estar nas ruas) e conduta infracional faz parte das representações sociais
da sociedade que comunga com a idéia de que “menino de rua” é marginal.
• Os adolescentes são pessoas que só pensam do lado errado. Eles fazem muita coisa errada mesmo, começam a furtar e usar droga.
• É aquele que rouba. Se mistura com os ladrões que manda ele roubar. Usa arma.
• O adolescente é aquele que rouba pai de família. Só faz o que não presta.
• É aquele que anda nas ruas e se mistura com quem não é pra se misturar. Anda pelo meio do mundo com amigos que não serve.
Segundo Centurião (2001), apesar de nem todas as crianças e
adolescentes que vivem em situação de rua estarem envolvidas com a
criminalidade, existe uma elevada chance de que trilhem esse caminho caso
permaneçam nessa situação, fato que favorece a confluência das representações
anteriormente mencionadas.
Vale ressaltar, ainda, que os adolescentes, em alguns momentos,
relacionaram adolescente e adolescência. A mesma constatação foi feita por
Albuquerque (2003) em seu estudo sobre as representações sociais de
adolescentes grávidas sobre gravidez. Os adolescentes deste estudo, procuraram
positivar o comportamento do adolescente diferenciando-o, defensivamente, da
conduta infratora que adotam quando do ingresso no mundo das drogas.
• Adolescência é uma coisa que tem de ser valorizada. Coisas boa como a escola, a família. É uma fase muito legal.
• Adolescência é estar na flor da idade, é viver cada instante. É viver a vida.
Essa descrição projetada no território do não-eu resguarda o sujeito de
uma tomada de consciência que poderia desnudar o eu real.
Descrições sobre adolescente ancoradas em aspectos vivenciais
Nessa subcategoria os grupos elaboraram suas descrições a partir de
aspectos vivenciais do adolescente. A idéia do adolescente como um ser vulnerável
foi trazida apenas pelas mães. As imagens do adolescente como uma criança foram
transportadas para a infância do filho, incluindo recordações sobre a dureza de sua
vida e as lacunas afetivas que foram cavadas pelas necessidades vividas,
demonstrando o entendimento de que a solidão experimentada pelo filho tornaram-
no um ser exposto às influências daqueles que ocuparam os espaços vazios. A
consciência e a culpa pelo abandono que impuseram ao filho são fotografadas nas
representações tecidas.
• Adolescente é uma pessoa que precisa de amor e carinho. Precisa de educação dos pais e também da escola.
• Adolescente é uma criança sofrida. Uma criança criada totalmente só, sem a companhia do pai e com pouca companhia da mãe. Ele precisa de muita compreensão dos pais.Ele faz o que os outros botarem na memória dele
Vê-se que a idéia genérica de adolescente está impregnada dos matizes
de sua vida vez que as representações sociais de um objeto social contém a
subjetividade dos sujeitos.
4.1.2 Descrições sobre Adolescente Infrator
A segunda investigação feita junto aos sujeitos introduziu diretamente o
tema de interesse desse estudo, procurando, nesse momento, apreender como
representam o adolescente que comete ato infracional por meio da verbalização do
desenho mental internalizado. Verificou-se pelas respostas que os sujeitos
descreveram o adolescente infrator com foco, novamente, em aspectos
comportamentais e vivenciais.
Tabela 2 – Distribuição das freqüências, percentuais e qui-quadrado da categoria descrições sobre adolescente infrator e subcategorias, segundo o grupo de adolescentes autores de atos infracionais e mães.
Sujeitos Adolescentes Mães Total
X2Subcategorias F % F % F %
Comportamentais
Vivenciais
68 80
17 20
48 80
12 20
116 80
29 20
3.44
0.86Total 85 100 60 100 145 100p < 0,01
A Tabela 2 mostrou que ambos os grupos destacaram aspectos do
comportamento como os mais significativos para descrever o adolescente infrator e,
apesar do número diferente de unidades temáticas expressas pelos grupos, as
freqüências foram elevadas e coincidentes em 80%. A seguir, serão recortados os
significados de adolescente infrator elaborados por adolescentes que cometeram
homicídio ou latrocínio e por mães de adolescentes autores de ato infracional grave.
Descrições sobre adolescente infrator ancoradas em aspectos
comportamentais
O Estatuto da Criança e do Adolescente considera ato infracional grave
toda conduta que corresponde ao crime ou contravenção penal. A partir dessa
prática, o adolescente apreendido pela polícia ingressa no sistema socioeducativo,
apenas sendo privado de liberdade quando a Justiça não dispuser de medida mais
adequada.
Na descrição do adolescente infrator baseada em aspectos
comportamentais, verificou-se que adolescentes e mães incluíram em seus
discursos termos da linguagem jurídica sobre a prática infracional. É possível
identificar nessas falas uma diferença de posicionamento implícita no conteúdo das
mensagens. No primeiro caso, o adolescente infrator foi associado diretamente ao
ato infracional ; já no segundo, os sujeitos emitiram um juízo de valor sobre o
adolescente infrator quando descreveram o seu comportamento.
Adolescentes Adolescente infrator é aquele que comete delitos. / É aquele que rouba, usa drogas. / É aquele que mata. / É uma adolescente que comete crimes. / Infrator é essas coisas que a gente comete. / Uma pessoa que comete alguma coisa grave. / É uma pessoa que não respeita as pessoas.
Adolescentes Considero um ladrão. / Procura fazer coisa errada em vez de viver numa boa. / É o adolescente que comete um erro. Faz um bocado de putaria. Se mete em negócio de vagabundagem com coisas que não é pra fazer. / É aquele que só faz besteira. / Acho ele uma máquina destruidora.
Mães É esses que roubam, assaltam e matam as pessoas. / É aquele que usa muita droga. / É o jovem que entra no mundo do crime. / É aquele que bole nas coisas dos outros. Não tem respeito pelas pessoas do mundo. / É aquele que mata um pai de família.
Mães É aquele que só procura o lado errado. /Aqueles que vivem fazendo maldade. / É uma pessoa perversa. Se envolve com coisas que não prestam pra nada. Só se mete em confusão sem motivo. / É essas pessoas que não quer nada com a vida.
A apresentação do adolescente infrator contém a autodescrição. As
definições que formam sobre si próprio, emergidas das representações que circulam
no meio social, são objetivadas de forma espontânea. A imagem de uma “máquina
destruidora” para falar de uma pessoa está prenhe de todos os repúdios que a
sociedade alimenta sobre o jovem que cometeu um ato de transgressão às leis.
Essas definições convertidas em imagens (“O adolescente infrator é um ladrão, uma
pessoa que só faz besteira”) também comportam uma noção de imobilidade,
atreladas mais à condição de ser do que de estar.
O adolescente infrator também foi apresentado como uma pessoa
desobediente, sendo que essa desobediência adquiriu significados diferentes entre
os grupos. Para os adolescentes, o ato esteve relacionado às leis, ao passo que,
para as mães, restringiu-se à desobediência aos pais. O enfraquecimento da
autoridade dos pais, em paralelo ao recrudescimento do espírito de autonomia do
adolescente, nega àqueles a legitimidade do poder de imposição de normas, base
de confronto necessária à construção de limites. Nesse vazio de cobranças que se
cria, o adolescente avança, adentrando muitas vezes o campo da transgressão das
regras de convivência social. É quando o juiz, na condição de autoridade legitimada,
julgará sua conduta, num explícito demonstrativo da hierarquia do poder. Por ser o
juiz a autoridade real da qual o adolescente não pode escapar, a desobediência à lei
adquire concretude. Aos pais, cabe o lamento da sua impotência perante a rebeldia
do filho, recuados à posição de espectadores dessa trajetória.
Adolescentes Infrator é aquele que não vai corretamente com a lei. Não vai direito nas leis. / É aquele que erra e paga numa unidade dessas. / Infrator é a pessoa que despreza as leis. / É aquele que não anda no caminho das leis. Não vai pelo caminho certo.
Mães É aquele que não obedece pai nem mãe. / É desobediente. / É aquele que não entende pai nem mãe nem ninguém. / Infrator é aquele que não escuta conselho. / É aquele que faz as coisas que o mundo velho manda (amigos).
A percepção do adolescente infrator como uma pessoa impulsiva foi
elaborada por eles próprios, uma vez que apenas em uma das respostas do grupo
de mães esteve presente.
• É a pessoa que não pára pra pensar. • Infrator é uma pessoa que falta pensamento. • É aquele que age por impulso. Faz coisa errada e não pode voltar
atrás. Procura logo um caminho que dê tudo mais fácil.
Um olhar mais demorado sobre esses depoimentos torna possível
identificar na conduta transgressora uma interseção dos aspectos do
comportamento imediatista da criança com o comportamento desafiador do
adolescente. A utilização desse recurso discursivo acaba por justificar e naturalizar
a transgressão, poupando o sujeito de um confronto direto com sua autocrítica.
Descrições sobre adolescente infrator ancoradas em aspectos vivenciais
Na descrição do adolescente infrator baseada em aspectos vivenciais,
uma outra versão desse adolescente, apresentada não mais através de seu
comportamento e sim de sua história, desvelou uma nova faceta de sua imagem.
Um adolescente tatuado pelas faltas da vida, a quem foram negadas oportunidades
sociais e familiares, emergiu nas falas dos sujeitos entrevistados, como registros de
uma experiência cujas marcas não ficaram para trás.
Ambos os grupos reconheceram a ausência da família, mais
especificamente dos pais no cuidado dos filhos, como um fator relevante para
desencadear o comportamento transgressor futuro do adolescente. A precariedade
desse cuidado tanto pode estar relacionada à ausência quanto à inadequação da
conduta paterna, um drama que se torna mais severo quando se trata de família de
baixa renda, em que o enfrentamento dos problemas cotidianos, na maioria das
vezes, é bem mais difícil e as alternativas de compensação que os filhos podem
encontrar, mais escassas. Mercy et al (2003, p.33) destacaram que o
“monitoramento e a supervisão deficientes em relação à criança por parte dos pais e
o uso de punições severas para disciplinar as crianças são fortes prognósticos de
violência durante a adolescência e fase adulta“.
Adolescentes Adolescente infrator é uma pessoa que não tem apoio familiar. Uma pessoa que não tem o diálogo com alguém pra lhe explicar o que é certo e o que é errado. / É uma criança que tem de ter o cuidado do pai e da mãe. / É o cara que não teve uma chance na vida. Uma pessoa que não tem escola nem amigos.
Mães É esses que não têm apoio dos pais. Ele não tem apoio da família nem dos irmãos. / É uma pessoa que não tem um acompanhamento, não tem uma instrução familiar. / É aquele que não é acompanhado desde pequeno. Se você ensinar, ele não vai fazer coisa errada.
O adolescente infrator parido dessas vivências é uma pessoa rebelde e
sofrida. É lembrado também como uma criança, provavelmente pela compreensão
que os sujeitos construíram de que o abandono do qual foi vítima não lhe ofereceu
suporte para ultrapassar a etapa da infância.
Adolescentes Adolescente infrator é uma pessoa que se encontra com um vazio. / Uma pessoa com um problema que não sabe como resolver. / Uma pessoa que na sua infância passou por muitos problemas.
Mães Um infrator é aquele que é revoltado com a vida. Um cara perdido. Uma criança que não pensa.
A descrição de adolescente infrator comporta em seu interior os próprios
sujeitos com suas dores, os seus conflitos, além de suas crenças de causalidade do
fenômeno. Ao se referir ao processo de ancoragem, Moscovici (2003, p.61)
imprimiu-lhe uma qualidade icônica afirmando que “é quase como que ancorar um
bote perdido em um dos boxes (pontos sinalizadores) de nosso espaço social”.
4.1.3 Causas do Ingresso no Mundo do Crime
A terceira investigação procurou apreender a compreensão dos sujeitos
no que tange aos fatores determinantes para o ingresso do adolescente no mundo
do crime, através de uma indagação que os convidou a encontrar explicações para
essa realidade. O grande número das explicações dadas abrangeu os mundos
interno e externo do adolescente infrator, esforço empreendido pelos sujeitos para
dar conta do complexo multifatorial que desenha a trajetória da conduta infracional.
A relação entre fatores individuais e contextuais que influenciam o
comportamento humano compôs o quadro de razões que os sujeitos modelaram em
busca da definição da verdade. Assim, as quatro subcategorias nomeadas para
retratar o pensamento dos dois grupos entrevistados condensaram as explicações
diversas contidas em suas respostas, visão que a Tabela 3 apresenta, transcrita
numericamente
Tabela 3 – Distribuição das freqüências, percentuais e qui-quadrado da categoria causas do ingresso no mundo do crime e subcategorias, segundo o grupo de adolescentes autores de atos infracionais e mães.
Sujeitos Adolescentes Mães Total
X2
Subcategoria F % F % F %Sociointeracionais 81 42,87 53 37,07 134 40,37 5,85Familiares 40 21,16 43 30,07 83 25,00 0,10Psicológicas 39 20,63 31 21,68 70 21,08 0,91
Socioeconômicas29 15,34 16 11,18 45 13,55 3,75
Total 189 100 143 100 332 100p < 0,01
Na subcategoria Sociointeracionais, adolescentes e mães destacaram a
importância da influência exercida pelos amigos, ampliada pela experiência de vida
nas ruas e pelas muitas circunstâncias a ela relacionadas, fazendo uma relação
direta entre uso de drogas e prática infracional. Na subcategoria Familiares, os
sujeitos citaram o ambiente familiar, suas crises relacionais e lacunas afetivas como
fonte dos conflitos vividos pelos adolescentes, atribuindo a esses fatores a razão do
desapego ao lar, saída para a rua e ingresso no mundo do crime. Na subcategoria
Psicológicas, os grupos ancoraram as explicações para o comportamento anti-
social do adolescente em fatores que levam em conta características psicológicas e
comportamentais. Já na subcategoria Socioeconômicas, vincularam as suas
justificativas aos fatores sociais mais amplos que influenciam o seu comportamento,
diretamente relacionados as suas carências sociais e financeiras.
A leitura da Tabela 3 demonstra que ambos os grupos apontaram os
fatores sociointeracionais como os que mais influenciam o ingresso no mundo do
crime e o valor do qui-quadrado (5.85) informa que foram os adolescentes que mais
contribuíram nas respostas. Os fatores familiares e psicológicos apresentaram uma
diferença estatística menos significativa nas respostas dos grupos, o que pode ser
confirmado pelos valores do qui-quadrado (0.10 e 0.91). Mães e adolescentes
procuraram considerar fatores amplos e importantes na determinação do
envolvimento do adolescente com a criminalidade, extraindo de sua história de vida
e dos saberes eruditos circulantes as suas explicações. De um modo geral,
creditaram aos fatores socioeconômicos o menor peso nessa determinação.
Sposato (2001, p.41), comentando as falhas do sistema socioeducativo e
os resultados de uma pesquisa junto a adolescentes acusados da autoria de atos
infracionais na cidade de São Paulo, abrangendo dados relativos à escolaridade,
procedência e renda, afirmou:
Talvez seja justamente essa exclusão social e jurídica a principal causa para o envolvimento com o crime, e não fatores pessoais e comportamentais dos jovens, como se procurou afirmar também historicamente através da medicina, psiquiatria e pedagogia.
Considerados todos esses pontos, em seguida, serão apresentadas as
representações dos grupos pela descrição mais detalhada de cada uma das
subcategorias.
Causas para o ingresso no mundo do crime ancoradas em fatores
sociointeracionais
Nesta subcategoria os sujeitos elaboraram suas explicações para o
ingresso do adolescente na criminalidade, creditando aos fatores sociointeracionais
a cota mais elevada. Na adolescência a vinculação ao grupo de amigos adquire
grande significado para os jovens em razão de seu interesse de se diferenciar da
família. Famílias agregadoras certamente oferecem um suporte mais seguro para
que o adolescente adentre os grupos de iguais e retorne ao seu grupo doméstico,
vivenciando os conteúdos de cada espaço sem perder as referências positivas de
cada um deles. Quando, por razões múltiplas, a família não mais se configura como
um lugar acolhedor, o adolescente não faz o caminho de volta, ficando muito mais
vulnerável às influências dos grupos.
A convivência com os amigos pode ser considerada bastante positiva na
adolescência e fortalece todo o processo de socialização já iniciado na infância.
Entretanto, a convivência com amigos delinqüentes ou mesmo com aqueles que
estão em situação de risco iminente para a delinqüência (abandono escolar, uso de
drogas, porte de arma) pode ter efeitos deletérios sobre o adolescente.
Um outro aspecto também importante a ser considerado como definidor
do ingresso do adolescente no mundo do crime é a presença de adultos
delinqüentes no seu grupo de convivência. Estes, na maioria das vezes, passam a
exercer uma influência mais marcante no grupo, legitimando a soberania da idade
no status do poder. Dessa posição de autoridade emana a imposição de normas e a
obediência ao líder passa a ser uma questão de sobrevivência. Referendando essa
realidade, os grupos aqui estudados reconheceram a força do adulto, chegando a
isentar o adolescente de sua responsabilidade pelos seus atos.
Adolescentes Às vezes é quase porque foi obrigado a fazer aquilo. / Eu acho que é porque ele pega corda dos mais grande. / É os outros que manda e ele faz. Muitos de menor tá aqui preso por causa disso. Tá de inocente mesmo.
Mães Tem muito de maior que bota a criança na perdição. Mesmo que eles não queira os de maior incentiva. / Os de maior pega as crianças inocentes e joga no crime. / O meu entrou aqui sem dever. Esse meu diz que matou, mas não fez isso. Tá aqui de inocente.
As respostas dos grupos estudados, no que tange à investigação da
causalidade, contêm diversas considerações, com destaque especial para um
elemento comum de suas experiências: a rua. Como amplo espaço de socialização
dos adolescentes, esta comporta todos os demais elementos que,agregados, são
determinantes da prática infracional .
Adolescentes Amizades é o que mais influi .Se envolve com colegas que não são amigos./ A rua é muito importante. Aí, entra no crime que não é pra entrar. Aí vai provar uma coisa que ainda não é provada. Um sujeito atravessou minha vida que se transformou num inferno./Muitos de maior bota os menor de laranja. Cometi muita besteira por influência de amigos./ Devido às minhas companhias eu roubei e matei.
Mães Se ele andar de turminha nunca dá certo. Só faz coisa errada. Só os amigos que faz a cabeça deles./ Muitos não procura amizades com pessoas ótimas. A gente fala pra eles saírem das ruas mas eles cresce
no meio dos amigos/. Porque eles se acompanha dos de maior que manda eles fazer o que não é pra fazer.
As drogas se agregam aos elementos rua e amizades acima
mencionados, passando a fazer parte desse importante tripé explicativo para a
prática infracional. O uso de drogas, hoje parte da rotina de muitos adolescentes,
pode facilmente transformar-se em uso abusivo, o que, somado aos fatores já
mencionados, pode configurar-se como um passo definitivo em direção à
criminalidade. Um outro indicador que se agrega a esse cenário é o fato de que,
cada vez mais cedo, os jovens vêm tendo acesso a armas de fogo, combinação
perigosa e de impacto nas estatísticas referentes à prática infracional.
Adolescentes Tudo começa pelas drogas. Começa a beber. Aí eles passam a ser infratores. Assassinar, roubar, fazer lesões sérias. / Uma pessoa drogada faz qualquer ato infracional. A droga é o fim da vida de uma pessoa. Você se prostitui. / Fui se degradando aos poucos.
Mães Muita droga. / Outra coisa é a droga. / Depois que ele usa droga não sabe mais o que fazer. Começa a usar droga e aí vai.
Os adolescentes que participaram deste estudo conceberam o
adolescente infrator como um usuário de drogas, estabelecendo uma associação
estreita entre drogas e infração. A experiência do trabalho com adolescentes
privados de liberdade revela que o contato com as drogas é fato comum em sua
vida. No ambiente doméstico, já se desenham as primeiras lições que em seguida
serão reforçadas pelo ambiente social mais próximo. As mães fizeram pouca
referência às drogas como causa do ingresso no mundo do crime. Assim, não
comprometeram esta realidade de suas casas com a cadeia sucessiva de eventos
que pode ser deflagrada a partir daí, tendo em vista que o uso de drogas por parte
dos pais, freqüentemente, está acompanhado pela violência doméstica, sendo esta
um estímulo inexorável à permanência de crianças e adolescentes na rua.
Causas para o ingresso no mundo do crime ancoradas em fatores
familiares
O ambiente familiar é um fator preponderante para o desenvolvimento dos
filhos e influi decisivamente no comportamento dos adolescentes. Um baixo nível de
coesão familiar e a presença dos conflitos constantes entre pais e filhos afetam
sensivelmente o comportamento social e emocional deste últimos.
Adolescentes e mães visualizaram um conjunto similar de vivências
familiares que, segundo suas percepções, culminam com o ingresso do adolescente
no mundo crime. Certo é que, no perfil de uma família, muitas outras se enquadram.
A desarmonia das relações que obscurecem e eliminam o lugar do afeto; as
separações dos casais que dão lugar a novos e, às vezes, não desejados rearranjos
familiares; as muitas ausências dos pais relacionadas por vezes a motivos evidentes
e justificados, outras não, mas que igualmente cavam um vazio real; a inevitável
desobediência da juventude, eterna medição de forças e geradora de desconforto
em ambos os lados; a rua, eleita pelos adolescentes como um espaço de
convivência e aprendizagem são fatores reconhecidamente desagregadores.
Adolescentes Mais é a criação dos pais, os problemas. Eles não convive bem no mesmo habitat. O cara precisa de apoio e não tem. Aí fica mais revoltado. / Às vezes o pai é alcoólatra e a mãe também. / Pais separados não tão ali encaminhando pra ele estudar.
Mães No caso do meu filho, eu não podia cuidar dele. Vivia trabalhando e ele mais na rua. / Se for bem preparada a estrutura familiar, nada vai acontecer. / Quando falta apoio acontece muita coisa ruim na vida deles. Até por falta de carinho dos pais. E assim eles vão se soltando.
Adolescentes Só quer que seja suas opiniões. Ele só quer ser o centro. Ele é o ego. Não sabe aceitar as pessoas como tem de ser. / Ele se torna uma pessoa rígida e não aceita crítica positiva. É só a vontade dele. Tudo tem de ser da minha forma.
Mães Eu procurava tirar da rua e ele não aceitava. / A gente aconselha mas ele faz errado de novo. Porque eles não ouvem nossos conselhos. / Eles começam a entrar no mundo da marginalização. Exatamente porque não obedece os pais. Isso gera incompreensão, tudo isso de ruim.
Mais uma vez, é possível verificar a ênfase dada pelas mães à
desobediência dos filhos e ao descaso com os conselhos paternos, itens apontados
como motivo importante para o ingresso dos jovens no mundo do crime, questão
que já havia sido destacada quando descreveram o adolescente infrator.
Causas para o ingresso no mundo do crime ancoradas em fatores
psicológicos
A referência a fatores psicológicos como explicação para a entrada no
mundo da criminalidade demonstrou o esforço que os sujeitos realizaram para
compreender o fenômeno abordado. Os elementos utilizados para dar conta da
problemática (prazer, natureza humana, demônio, impulsividade) simplificaram a
questão e deixaram ao cargo de outros saberes o desvelamento de novos
determinantes. Para os adolescentes, os motivos pessoais estiveram relacionados
ao prazer/desejo, alcançados através da conduta anti-social. Quando se referiram às
razões que lhes escapam ao controle, os adolescentes consideraram o
comportamento anti-social como algo intrínseco à fase da adolescência.
• Outros entra só por aventura. Outros faz por gostar. Tem vontade. Dá prazer fazer aquilo. Quando prova se acostuma. Aí vai até continuar. Rouba, mata. Faz porque quer aparecer, pra ficar mais respeitado.
• Errar a gente erra, porque errar é humano. Isso é uma fase que a gente passa na vida. Eu acho que é coisa do mundo mesmo. É da vida. O que eu fiz é porque antes eu não pensava. A gente faz isso por fraqueza da cabeça.
As mães ofereceram explicações relacionadas ora à natureza humana,
ora a sua religiosidade, insistindo na isenção de culpa do filho infrator e colocando-o,
por meio da inversão de papéis, na condição de vítima.
• Às vezes ele já tem aquela sina de fazer o mal. É da natureza deles. Às vezes não é nem que eles queira fazer. É porque o demônio chama. Porque pro diabo, tudo é fácil.
• Às vezes a pessoa obriga eles a fazer. Quando eles mata, às vezes é a pessoa que insiste. A própria pessoa que morre insiste. Insiste até ele fazer o que não era pra fazer. Exatamente porque o adolescente não tem juízo na cabeça.
O comportamento humano é muito complexo e resultante da interação de
fatores biológicos, psicológicos e sociais. O discurso científico esclarece, de forma
elaborada e fundamentada em estudos e pesquisas, os elementos que determinam
a conduta anti-social do adolescente, relacionando-a a cada um dos componentes
da dimensão biopsicossocial, em separado ou a partir de suas interconexões. Na
mesma direção, em relação aos fatores biológicos, Mercy et al (2002) fizeram
referência a estudos sobre danos neurológicos associados à gravidez e ao parto que
podem levar ao comportamento violento, assim como Ballone (2003) destacou o
transtorno de conduta na psiquiatria da infância e adolescência como responsável
pela prática de atividades delituosas. Por fim, Winnicott (1994) enfatizou aspectos
psicodinâmicos, afirmando que crianças submetidas à privação de afetos podem
desenvolver comportamentos anti-sociais.
A literatura internacional aborda o tema do comportamento anti-social,
levando em consideração aspectos legais e psíquicos. De uma forma ou outra, esse
conhecimento circula no espaço social, sendo apropriado pelo cidadão leigo que
procura atribuir-lhe um tom de familiaridade e elabora as mais diversas
interpretações da realidade.
Causas para o ingresso no mundo do crime ancoradas em fatores
socioeconômicos
O crescimento econômico, em movimento inverso à distribuição de renda,
gera a expansão do empobrecimento de camadas significativas da população. A
instalação de políticas de proteção social como paliativo para a pobreza e não como
estratégia de enfrentamento dessa condição produz um sentimento latente de
tensão e revolta que tenderá a se manifestar de uma forma explícita ou não. A
realidade nacional apresenta ainda a existência de um clima generalizado de
corrupção e impunidade, e as muitas interconexões que são formadas a partir daí
repercutem no comportamento dos adolescentes brasileiros.
Os sujeitos deste estudo visualizaram o adolescente infrator como
membro de uma família que vivencia dificuldades financeiras e que, por conseguinte,
não consegue prover as necessidades do filho. O resultado é que a perspectiva
sedutora de dinheiro por meios ilícitos ganha consistência. Atente-se para o fato de
que o padrão consumista que cria o desejo por uma busca de acumulação infinita de
bens materiais, ao lado da dura realidade de um mundo cada vez com menos
empregos, encarrega-se de inviabilizar o direito de sonhar para grande parte da
população. O adolescente, desacreditado de esperar pela família, decide ele próprio
modificar sua realidade.
Adolescentes Muitos entra por necessidade, por causa da condição financeira. Quer uma roupa. Quer curtir. A mãe e o pai não tem como ajudar. Aí ele vai e rouba e até mesmo comete latrocínio.
Mães Ele sente querer as coisas e a gente não poder dar. A gente vive num meio muito baixo./ O mundo do crime é mais fácil do que arranjar emprego. Não precisa de sacrifício nem suor. Corre frouxo./ O crime não precisa de diploma.
Os sujeitos também entenderam que a ociosidade do adolescente é um
indicativo para a criminalidade. Reportaram-se à falta de escola e emprego, mas
nenhum dos sujeitos levou em consideração o desemprego dos pais, o que, na
verdade, lhes mina a condição de prover suas famílias.
Adolescente Tudo influi pro cara entrar nessa vida. Falta emprego. Deixei de estudar. As vezes um infrator comete atos infracionais porque falta alguma coisa. Tem que arrumar escola.
Mãe Não tem emprego pra esses adolescentes. Se tivesse emprego eles botaria a cabeça no lugar. Se você não tiver o 2º grau não se emprega.
O crescente populacional, em descompasso com a capacidade de
empregabilidade do mercado, faz com que o investimento das políticas públicas em
profissionalização acabe por cair no vazio. Enfatize-se que o suporte financeiro das
famílias das classes mais favorecidas evita que o adolescente dependa do mercado
de trabalho muito cedo, razão por que, apesar de outros conflitos que possam
vivenciar, permanecem nas suas casas.
4.1.4 Perspectiva de mudança
A quarta investigação explorou a percepção dos sujeitos sobre a
possibilidade de o adolescente infrator mudar de vida. Os grupos identificaram cinco
opções nesse sentido que incluíram tanto o esforço individual de mudança quanto as
redes ampliadas de apoio, constituídas pela família, instituição socioeducativa e
sociedade, ainda considerando em menor proporção, a ajuda espiritual.
Nessa categoria, os sujeitos registraram as suas crenças e descrenças na
mudança, procurando demonstrar os meios que vislumbram necessários para tanto.
A mudança nesse caso é, na verdade, mais complexa do que lhes possa parecer.
Deixar de ser infrator é bem mais do que abandonar o mundo do crime; é também
mostrar a si próprio e ao outro ser capaz de romper com o carimbo da identidade
marginal. Ao sair da argumentação teórica para a prática, a mudança envolve mais
que as receitas simplificadas atreladas ao poder da boa vontade ou oportunidades
externas. As subcategorias nomeadas agruparam as respostas dos grupos,
apresentadas na Tabela 4, da qual consta um panorama numérico geral dessas
representações.
Tabela 4 – Distribuição das freqüências, percentuais e qui-quadrado da categoria perspectiva de mudança e subcategorias, segundo o grupo de adolescente autores de atos infracionais e de mães.
Sujeitos Adolescentes Mães Total
X2
Subcategorias F % F % F %Pessoal 69 43,12 55 37,17 124 40,26 1,58Social 56 35,00 53 35,81 109 35,40 0,08Familiar 15 9,38 10 6,75 25 8,11 1,00Institucional 19 11,88 18 12,17 37 12,00 0,02Espiritual 1 0,62 12 8,10 13 4,23 9,30Total 160 100 148 100 308 100
p < 0,01
Nessa categoria, de um modo geral, as respostas numéricas dos sujeitos,
podem ser visualizadas em dois blocos que demonstram o valor que eles atribuíram
a cada uma das opções de mudança de comportamento. No primeiro bloco, e com
um número similar de respostas e percentuais mais elevados, estão as
subcategorias Pessoal e Social, sendo que o valor do qui-quadrado nesta segunda
assinala que não existiu diferença estatística importante nas respostas.
O segundo bloco apresentou um número baixo de respostas nas
subcategorias Institucional, Familiar e Espiritual. O valor do qui-quadrado (0.02)
para a subcategoria Familiar informou, do mesmo modo, que a diferença estatística
entre as respostas dos dois grupos foi insignificante. A última subcategoria teve uma
freqüência total de respostas de 4.23, contando com uma contribuição quase integral
do grupo de mães, confirmada pelo qui-quadrado de 9.30.
A compreensão que os sujeitos elaboraram sobre a perspectiva de
mudança de vida de um adolescente infrator, quando se reportam à interferência
externa, foi alicerçada no grande eixo da confiança. Quando, por outro lado,
acreditaram na mudança a partir de uma perspectiva pessoal, deram ênfase ao
esforço individual alicerçado no desejo. Na apresentação das subcategorias, serão
feitas considerações mais detalhadas sobre estas representações.
Perspectiva de mudança ancorada na esfera pessoal
Na compreensão dos grupos entrevistados, um adolescente infrator pode
abandonar o mundo do crime se assim o desejar, ficando essa mudança
condicionada à opção por novos hábitos de vida. Corroborando essa premissa,
acreditaram ser fundamental o afastamento das ruas, das drogas e das amizades
com pessoas delinqüentes e a adoção de uma postura responsável que envolve o
investimento no estudo, na busca de emprego e até na formação de uma família
para si próprio. As mães associaram também a mudança à disposição do
adolescente para obedecer aos pais, aspecto ao qual sempre retornam.
Acreditam que a obediência do filho é condição primordial para a sua
mudança. As condições de vida das famílias de baixa renda impõem aos pais
maiores limitações de cumprir a tarefa de educar a prole. A dificuldade em ocupar o
espaço de provedor dos filhos e o esgarçamento dos vínculos dela decorrentes,
entre outros fatores, torna-se um grande obstáculo para a garantia da legitimidade
da autoridade paterna, o que incide diretamente na questão da obediência.
Adolescentes Todo mundo pode mudar, assim queira. Basta ter força de vontade. Erguer a cabeça. / Primeiro lugar, dizer não às drogas.
Arrumar um emprego. Formar família. Casar. Ter filhos. Ter responsabilidade./ Deve isolar as más amizades. Ganhar dinheiro sem roubar. Depende dele, sozinho.
Mães Depende só dele mesmo . Ele não querendo, nada feito. / Ele querendo, pode ser alguém na vida. Pode até ser um doutor. / Saindo das ruas. Indo trabalhar. Procurando escola. Não usar mais drogas. / Se ele obedecer os conselhos dos pais vai pensar mais e ser um rapaz direitinho. / Deve obedecer os pais. É esse o caminho.
A mudança nasce do desejo, este condição sine qua non para que aquela
aconteça. A questão é que, quando o adolescente adentra o mundo do crime, uma
gama de numerosos fatores contribuíram para que essa situação fosse instalada, os
quais não surgiram de imediato, mas se agregaram na história do sujeito ao longo
do tempo.
Até que o adolescente se afaste de casa para a rua, adote os colegas
como pontos de referência, envolva-se com drogas e abandone a escola, uma série
de comprometimentos existiram como determinantes de sua conduta e motivadores
do seu desejo. Assim, mudar o comportamento não é somente uma questão de
simples força de vontade. Além disso, a busca de novas oportunidades de
socialização, tais como a escola pública e o emprego, na maioria das vezes inexiste,
extrapola o empenho individual pela mudança, porque coloca o adolescente frente
às lacunas das políticas públicas do país.
Nas unidades da SAS, que atendem adolescentes em conflito com a lei,
não existem estatísticas referentes ao número de adolescentes que já são pais e
mães, embora o cotidiano do trabalho informe que esse número é elevado e até
mesmo que muitos desses jovens vivem com companheiros(as) dentro de suas
próprias famílias. Esse dado está contido nas respostas dos adolescentes
entrevistados que assinalaram como alternativa para o abandono do mundo do
crime a construção de uma família para si, o que em seu entendimento significa
assumir responsabilidade. A conseqüência desse equívoco tem sido a reedição de
suas próprias histórias em muitas crianças que cedo passam a ser órfãos de pais
vivos.
Perspectiva de mudança ancorada na esfera social
Quando os sujeitos vincularam a mudança do adolescente a fatores
externos, estenderam a toda a sociedade a responsabilidade, destacando a
confiança como a base para essa transformação. Além de oportunidades mais
especificas como escola e emprego, reconheceram igualmente importantes outros
itens menos concretos que traduziriam essa credibilidade.
Adolescentes A pessoa tem que dar uma chance ao menor. Se ninguém confia nele, ele não muda. / A pessoa deve dar uma força, dar uma oferta. / Quando o menor tem alguém que confia nele isso mexe com ele. / A pessoa ter errado não quer dizer que não vai mais mudar. Dar oportunidade como escola e emprego.
Mães O apoio para o adolescente serve muito. Se ele tiver trabalho e estudo não vai ter tempo para fazer besteira./ Muito conselho. Tem que partir da sociedade. Mostrando o caminho. / Todos devemos ajudar o adolescente. / Se as autoridades estender a mão amiga ele sai dessa.
Os adolescentes marginalizados pela condição de infratores fazem parte
de uma minoria social desacreditada e odiada, indigna de qualquer voto de
confiança. Moscovici (1996) destacou a necessidade imanente ao ser humano de
ser visível e admirado, anseios presentes em todas as relações interpessoais e
sociais. Sentir-se querido é importante e justifica a busca de aprovação social.
Entretanto, a pessoa pode ser detestada e sobreviver nessa condição, ainda tirando
vantagens dessa rejeição.
Perspectiva de mudança ancorada na esfera institucional
Mães e adolescentes destacaram o sistema socioeducativo como a
terceira opção mais importante para a mudança, ressaltando o cotidiano do trabalho
como elemento facilitador desse processo. A ênfase na profissionalização e no
atendimento dispensado pelos profissionais configurara-se como pontos de
relevância para os grupos.
Adolescentes Se tiver o trabalho de uma unidade como esta. / Aqui tenho todo apoio. Setor técnico. Psicólogo. Principalmente as palestras. Às vezes, até remédio. / Eu tô preso aqui mas tirei proveito. Eles tão proporcionando um curso profissionalizante pra mim. Quando ele sair já sai com idéias boas. / Pra mudar, basta cair numa FEBEM.
Mães A mão amiga é também essa onde eles estão. Os cursos que eles tão fazendo. Quando sair já sai com a vida melhor. / Os funcionários tiram ele do crime conversando. / Muitas coisas que eles não vê na rua, vê aqui dentro.
Vale registar que, além dos ganhos auferidos na internação, as mães
assinalaram um outro aspecto positivo relacionado à importância do castigo. Embora
em seus discursos anteriores não tenham validado a punição como um caminho
para a mudança, fizeram aqui essa associação, expressando nas entrelinhas o alívio
por alguém ter imposto ao filho o castigo que ela própria não conseguiu impor.
É muito importante que ele sofra um pouquinho. Se tiver numa unidade pagando seu crime ele vai refletir e deixar essa vida. Aí ele merece um voto de confiança. Fora, ele não pagou pelo que fez.
O cerceamento da liberdade significa estar submetido às regras
institucionais que concedem pouco espaço para as transgressões. Os adolescentes
internados não dispõem do poder de escolha, necessitando incorporar a seus
hábitos a nova rotina que lhe é apresentada. A privação da liberdade é uma
experiência de padronização da vida. O adolescente obriga-se a freqüentar salas de
aula, realizar atividades domésticas, ouvir conselhos ou repreensões e a ser punido.
Sujeita-se a viver um novo ritmo que, para alguns, em alguns momentos, pode ser
experienciado com uma conotação positiva.
Perspectiva de mudança ancorada na esfera familiar
Esta subcategoria sinalizou a percepção dos grupos em relação à
influência da família para a saída do adolescente do mundo do crime. Mães e
adolescentes assinalaram ser o apoio da família menos expressivo que os demais
fatores anteriormente citados. Entretanto, destacaram a importância da presença
amorosa dos pais na vida dos filhos e de sua confiança neles.
Adolescentes A maioria das vezes é os pais. Apoio da família. Não ficar contra ele quando ele errou. Tem que chegar e conversar. ( ) A família precisa ajudar. Quando ele sair vai se recuperar.
Mães A mãe sempre tem um coração mais seguro naquele filho. ( ) A mãe tem confiança nele. Que ele vai em frente( ) Tem que partir de casa. Eu visito e aconselho ele.
A condição de estar privado da liberdade também acaba por criar entre
família e adolescente um vínculo de proximidade. O direito legal à visita dos
familiares é assegurado na internação e passa a fazer parte da rotina do
adolescente. Nos dias e horários regrados, famílias e filhos experienciam um
encontro que, muitas vezes, jamais fizera parte de sua vida. As visitas passam a
fazer parte das expectativas do adolescente, adquirindo valor considerável. No
confinamento, mães e filhos estarão frente a frente para se olhar e ouvir-se, o que
faz surgir a oportunidade para as confidências, os conselhos, as repreensões, as
declarações de amor.
A prática desse trabalho com adolescentes também mostra que as mães
e muitas vezes as avós são as pessoas mais presentes nesse período de
internação, caracterizando-se como frágeis figuras de autoridade feminina que
procuram a todo custo vencer a prova que a vida lhes reservou.
Perspectiva de mudança ancorada na esfera espiritual
Esta subcategoria revelou a concepção de mudança do adolescente por
inspiração divina.
Se ele entrasse no caminho de Deus isso não acontecia./ Tudo Deus mandará. Tirar os maus pensamentos da cabeça dele. Muitos peleja pra corrigir a perdição mas só Deus é que muda essas coisas./ Nada pra Deus é impossível. Quem tem Deus tudo pode.
Nesse ponto do questionamento, coube às mães quase a totalidade das
respostas. Defenderam o poder da fé e a força de Deus para a transformação do
adolescente, reiterando que não bastaria aos adolescentes apenas querer
mudar,mas, antes de tudo, aceitar Jesus para que essa mudança fosse operada.
4.1.4 Percepção do eu
Durante muito tempo, o paradigma cartesiano inspirou a produção do
conhecimento científico, influenciando o modo de pensar e compreender a vida. A
separação indivíduo/sociedade foi conseqüência desse referencial, razão pela qual a
psicologia não incluía a dimensão cultural na constituição do sujeito humano. A
concepção de um sujeito distinto do social e a definição de identidade pessoal como
conjunto de caracteres próprios de uma pessoa traziam embutida a lógica desse
pensamento. A palavra identidade, que comportava a noção de semelhança,
implicava, a partir de uma idéia de imutabilidade, um sujeito sempre igual a si
próprio. Sawaia (2002) alertou para a importância de se pensar identidade como
uma categoria política que torna possível a padronização dos cidadãos, a partir de
suas relações de poder.
A compreensão da interligação dos níveis individual e social, que tem
orientado a produção do conhecimento das ciências psicológica e social, tem
expandido esse sentido de estabilidade de um perfil do eu até a noção de
subjetividade, atravessando os contornos do indivíduo e do sujeito para mergulhar
de forma integral no universo da cultura. Em relação a essa temática, Rey (2003,
p.241) enfatizou que “a subjetividade individual mostra os processos de subjetivação
associados à experiência social do sujeito concreto, assim como as formas de
organização desta experiência por meio do curso da história do sujeito”. Ainda sobre
o assunto, Araújo (2002, p.81) afirmou que “contemporaneamente, a subjetividade é
compreendida como o modo de organizar as experiências do cotidiano, os universos
de sensações e representações”.
A quinta investigação deste estudo deteve-se no terreno da construção da
subjetividade do sujeito, zona porosa pela qual transitam os conteúdos de natureza
individual e coletiva, atrelados às dimensões simbólica, histórica e cultural,
produtores de significação e sentido, simultaneamente, para a vida social e para os
indivíduos que dela fazem parte e a constituem. Considerando, pois, a importância
da subjetividade individual materializada na percepção do eu, a exploração de
conteúdos representacionais, parte dessa subcategoria, procurou apreender do
grupo de adolescentes a maneira como vêem a si próprios, como gostariam de ser
vistos e como acreditam estar sendo vistos.
Na subcategoria Autopercepção, os adolescentes procuraram descrever a si
próprios, confirmando as características percebidas como qualidades ou defeitos e
valorando seu comportamento e a sua satisfação pessoal. O número de evocações
dessa subcategoria foi bastante elevado em comparação às demais, o que garantiu
um percentual de 55.9% das respostas. A subcategoria Idealizada registrou o
número mais baixo de respostas, correspondendo ao percentual de 19,24%. Os
adolescentes informaram seus projetos de vida a partir das mudanças que
pretendem empreender, deixando registrado um modo de ser que não conseguiram
alcançar. A subcategoria Heteropercepção expressou a apreensão dos sujeitos
sobre o conceito que as pessoas têm de um adolescente que comete atos
infracionais, traduzido em uma imagem negativa captada através das falas e gestos
das pessoas, assim como de seus pensamentos expressos pelos meios da
comunicação. Todas as respostas das mães foram condensadas nessa
subcategoria, devendo o valor do qui-quadrado ser compreendido a partir desse
dado. Vale ressaltar, ainda, que o número de respostas dessa subcategoria nos dois
grupos foi quase similar, corroborado pelo qui-quadrado de 0.34. A Tabela 5
apresentará o agrupamento das respostas fornecidas.
Tabela 5 – Distribuição das freqüências, percentuais e qui-quadrado da categoria percepção do eu e subcategorias, segundo o grupo de adolescentes autores de atos infracionais e de mães.
Sujeitos Adolescentes Mães Total
X2Subcategorias F % F % F %
Autopercepção 221 55,9 - - 221 45,57 221
Idealizada 76 19,24 - - 76 15,67 76
Heteropercepção 98 24,81 90 100 188 38,76 0,34
Total 395 100 90 100 485 100p < 0,01
Autopercepção
Nesta subcategoria, adolescentes que cometeram homicídio e latrocínio,
privados de liberdade e, portanto, oficialmente declarados infratores, evocaram dois
campos simultâneos: adolescente e infrator. Essa confluência torna permeável a
linha separatória entre ambos de tal forma que a distinção vai se tornando turva e a
identificação dos campos passa a ser uma questão tida como natural pelos sujeitos.
Assim, os adolescentes detiveram-se em descrever a sua forma de ser, sentir e
comportar-se, em paralelo à afirmação de sua identidade marginal, uma colagem
imperceptível, mas com poder de decretar uma sentença para o futuro.
• Meu jeito é esse. Sou uma pessoa simples. • Eu me acho uma pessoa caridosa. Sou também humilde.
Sou órfã. Não sou falsa como falam. Não guardo rancor nem maldade no coração. Falo as coisas sem pensar.
• Eu tenho um homicídio. Sou uma infratora, infelizmente. Qualquer coisa eu choro. Só que drogada eu fico violenta.
• Nós somos menor infratores. Gostaria de ser difrente. Só que eu já tô seguindo meu caminho.
Essa percepção que o adolescente tem de si, atrelada a uma
inalterabilidade da condição atual de infrator, ajusta-se à expectativa declarada
socialmente de que não é uma pessoa de crédito e que pertence, portanto, à
categoria daqueles que não têm mais jeito. A Teoria das Representações Sociais, ao
abordar como estas se formam no espaço social, configura-se como verdade do
senso comum, oferecendo a explicação de como essa verdade torna-se um
elemento de sentido para o adolescente e para o grupo mais amplo. Ainda nas
palavras de Rey (2003, p.126),
A realidade aparece para as pessoas por meio das RS e dos diferentes discursos que formam o tecido social, mediante os quais os sujeitos individuais, implicados em um determinado espaço social, configuram o sentido subjetivo das diferentes esferas de suas vidas, e produzem significações em relação a si mesmos e aos outros.
Outro aspecto importante na autodescrição dos sujeitos entrevistados foi
a contradição explícita presente em suas falas e em seus comportamentos.
• Eu sou um elemento calmo. Penso muito antes de agir. Nunca usei drogas. Não gosto dessas coisas de marginalidade.
• Sou boa. Meu jeito é criar amizade. Nada de violência. • Sou tranqüilo. Sou uma pessoa comum. O que eu queria ser eu já tô
fortemente.• Tenho um temperamento esquentado. Eu drogada as coisas nem me
dói. • Eu sou um infrator. Fiz mal aos outros. • Meu jeito mesmo é todo calado. Mas não deixo ninguém mexer
comigo. • Gostaria de ser diferente. Eu me acho um pouco estranho. Eu sou um
cara tatuado e com passagem em Febem.
A longa lista dos adjetivos utilizados pelos sujeitos para qualificar a si
próprios – calmo, ponderado, sensível, sincero, bom, humilde, correto, educado,
estudioso, maduro, dócil, amigo, alegre, simpático, legal, caridoso, interativo,
comportado, adulto, esportivo, tranqüilo, sem maldade, brincalhão, feliz, querido,
simples, pessoa que vale a pena - poderia levar à conclusão de que estão satisfeitos
consigo próprios. Entretanto, o ingresso no mundo do crime, que envolve o uso
abusivo de drogas e a prática reiterada de violação dos direitos alheios, sinaliza um
desajuste entre as características pessoais e a conduta real que, apesar disso,
encontram-se entrelaçadas.
A descrição de si também ganhou consistência quando foi feita a partir de
comparações grupais
• Eu sou como todo mundo. Eu me comparo como uma pessoa normal
• Sou uma pessoa comum. Só não sou comum porque já usei droga, roubei e cometi um homicídio.
O não envolvimento no crime foi lembrado pelos sujeitos como um critério
para definir a inclusão/exclusão no ou do grupo das pessoas comuns/normais, o que
auxilia o sombreamento da linha que demarca o lugar de cada um na sociedade.
Idealizada
Quando os adolescentes foram convidados a pensar na pessoa que não
são, mas que gostariam de ser, reportaram-se aos seus sonhos e às insatisfações
consigo mesmos e com sua vida, o que os levou a se comparar com os outros,
considerados por eles mais valorosos.
• Eu gostaria de ser diferente. Não quero mais a mesma vida. Não viver correndo da polícia. Não viver matando os outros por aí.
• Não quero mais agir pela emoção. Nunca mais entro nessa vida de usar droga.
• Se eu pudesse mudaria minha vida toda. Queria ser um cara comum que nem os outros. Ser normal como as outras pessoas.
Novamente, os sujeitos associam as pessoas comuns/normais àquelas
que não praticam atos infracionais e que lhes servem de parâmetros para uma
pretensão de mudança. Os projetos de mudança também incluíram referência a
escola, trabalho e casamento. Esses aspectos foram concebidos como ingredientes
que garantem um suporte para o afastamento do mundo do crime e a receita para a
conquista do lugar ao lado dos normais/comuns.
• Quando eu me soltar vou arrumar logo a minha escola e um trabalho. Arrumar uma mulher para mim.
• Quando eu sair lá fora vou me casar. Vou me dedicar a minha esposa e ao meu filho. Quero terminar meus estudos .
A idéia de ocupação e responsabilidade é tida como impedidora da
prática infracional, estando o casamento e a paternidade incluídos neste patamar. A
família esteve incluída nos projetos de mudança e os adolescentes a ela se referiam
tanto no sentido de um resgate de vínculos quanto de uma parceria financeira para o
sustento do grupo.
• Quero levar uma vida normal com a minha família, quando eu sair lá fora. Ajudar meu pai e minha mãe. Quero ir pra perto do meu pai e da minha mãe.
A realidade dos adolescentes dos centros de internação é a de uma
família biológica desfeita, sendo a mãe a pessoa que mais comumente está próxima
ao filho. Apesar disso, a família evocada é a família nuclear, sobreposta à família
real, formada por toda a variedade de arranjos nos quais, na maioria das vezes, o
pai biológico já não está presente. O sonho da liberdade é o sonho imediato de sair
do centro educacional.
• Só quero mesmo sair daqui. Espero que minha liberdade chegue logo. Tudo que eu quero é ser livre. Liberdade.
A falta de um sistema informatizado no estado, capaz de apresentar
fidedignamente dados sobre a reincidência na prática infracional, não reduz a
veracidade da afirmação de que esses números são bastante elevados. Dados
isolados da Unidade de Recepção de Adolescentes em Conflito com a Lei, em
Fortaleza, apontam que cerca de 50% dos que ingressaram no sistema
socioeducativo em 2003 eram reincidentes. O suspiro pela liberdade tem fôlego
curto. O entrelaçamento de todas as complexas questões que fazem parte da vida
desse adolescente e a incorporação dessa identidade marginal, gestada pelas RS
que compõem o universo simbólico do tecido social, contribuem pata mantê-lo nessa
condição.
Heteropercepção
No espaço social, os indivíduos se constituem em sujeitos. Nele, se
encontram uma infinidade de histórias coletivas diferentes. Mas esse espaço é
também uma realidade invisível na qual se organizam as representações sociais de
seus atores. Nas palavras de Bourdieu (2004, p.48-49),
Os seres aparentes, diretamente visíveis, quer se trate de indivíduos quer de grupos, existem e subsistem na e pela diferença, isto é, enquanto ocupam posições relativas em um espaço de relações que, ainda que invisível e sempre difícil de expressar empiricamente, é a realidade mais real (ens realissimum, como dizia a escolástica) e o princípio real dos comportamentos dos indivíduos e dos grupos.
Esse também é um espaço tribal no qual os sujeitos se diferenciam e se
agrupam em classes, de forma a se sentirem nitidamente diferentes dos integrantes
das classes outras, mais próximas ou distantes. Esses ambientes simbólicos são
engendrados a partir da medição de forças antagônicas dos sujeitos que neles
habitam. No mundo social, construído pelos sujeitos, que comporta um universo de
relacionamentos e de significados, transitam a linguagem e as imagens,
componentes de um imaginário grupal do qual os atores sociais não escapam.
Nessa subcategoria, as RS de adolescente infrator, catalisadas pela fusão
da fala e imagem, ganham corporeidade de tal forma nítida que tornam possível a
quase visualização do ser que povoa a mente dos sujeitos sociais de todas as tribos.
Adolescentes Uma pessoa desprezível, criminosa./ As pessoas vê como um monstro. Ladrão. Acha que a gente é perigoso./ Faz aquilo é por prazer. / Quando vê a gente na rua diz olha o vagabundo./ Pra sociedade é marginal. Fumador de maconha./ Pensam logo que é um matador.
Mães Quando as pessoas vê um adolescente mal vestido ou sujo vai logo guardando a bolsa. Dizem que é marginal. / O filho dela é um ladrão/ Acha que eles são um bicho. /Pensam que eles são um bando de monstros. / As pessoas têm medo deles.
A concepção de adolescente infrator, elaborada por ambos os grupos,
apontou um tipo de pessoa que não merece voto de confiança pelo fato de que
jamais mudará de vida.
Adolescentes As pessoas pensa que ele nunca muda. Aquele menino ali não tem mais jeito. Ele não merece confiança./Desconfiam sempre/.Como passa muito na televisão, acha que ele vai sempre roubar aquela pessoa./ Pensam que ele vai ser assim pra sempre.
Mães Muitos pensa que aquilo ali não muda mais. Dali pra pior./ O povo diz que eles não quer nada de confiança. Pensa que todos são iguais. A qualquer momento podem cometer o mesmo erro.Acha que não tem como se recuperar. Principalmente a alta sociedade.
A mídia, presente na vida social de forma sofisticada, transformou-se em
um potente canal de construção da própria realidade, formador de RS. Os canais de
comunicação exibem a cara e a alma do adolescente infrator, mediando as emoções
e reforçando as identidades grupais. Considerando ser as RS uma produção
subjetiva desvencilhada do sentido puramente cognitivo do conhecimento, os
conteúdos representacionais são mobilizadores de emoções . A representação
social de adolescente infrator carrega uma carga emocional significativa que provoca
sentimentos frente a ela.
Adolescentes As pessoas não sabe respeitar./ Deixa ele aí mesmo. O pessoal quase não gosta./ Não tem vontade de dar conselho, só critica.
Mães A maioria só pensa em deixar na prisão direto./ Muitas não querem nada de melhor pro adolescente. / Pensam que eles não têm direito a nada. Querem logo matar o menor.
Vale ressaltar que os sentimentos provocados pelo jovem envolvido com
a prática infracional são naturalmente negativos. Entretanto, essa negatividade não
se esgota no simples movimento de repúdio, mas vai além. Parece existir nesse
imaginário social um desejo perverso de vingança não saciado, motivo pelo qual não
basta a privação de liberdade como sansão. A sociedade que deveria estar torcendo
pelos frutos positivos dessa medida disciplinar acomoda-se na posição crítica e
desesperançosa. Na verdade, a crítica do seu olhar não está voltada para as
lacunas das políticas públicas, para as falhas da organização do sistema
socioeducativo ou para outras questões mais sutis, de natureza subjetiva, que se
aglomeram nessa engrenagem produtora de violência. O desfecho da raiva
produzida pelo sentimento de impotência encontra nesse adolescente um alvo
material que passa a ser sentenciado dessa vez à prisão perpétua na categoria dos
marginais.
Joffe (1995, p.318), discutindo o processo formativo das RS que fazem
parte da construção das identidades grupais, assinalou a tendência humana de
identificar um “culpado” para receber as projeções daquilo que não é suportado pelo
sujeito. Para ela, a projeção do inaceitável no outro estabelece a demarcação dos
territórios do bem e do mal:
E aqui é importante que se diga: as representações sociais que constroem o “outro” como aberração têm conseqüência para a prática. Elas permitem que esse “outro” seja maltratado e discriminado: a subordinação daquelas pessoas, cujos sistemas de valores, práticas e identidades são diferentes, passa a ser apenas um desdobramento justo de uma lei considerada “natural”.
O adolescente infrator representa um lado palpável da ameaçadora
violência das cidades, reiterando também nossa própria capacidade de ser cruel. Ele
é o lado negro da sociedade do qual supomos não fazer parte, embora, por
caminhos menos explícitos, revele a nossa incompetência social de cuidar de nossa
juventude. Movidos pela emotividade, podemos projetar nele a nossa raiva, o nosso
medo, a nossa dor. Podemos até desejar a sua morte real ou executá-la
simbolicamente pela estigmatização.
Na fala dos adolescentes, mesmo quando fizeram alusão a si próprios
como infratores, em nenhum momento utilizaram os adjetivos evocados pela
sociedade para defini-los, todos portadores de extremo repúdio, tais como criminoso,
marginal, desprezível, monstro, bicho, vagabundo, ladrão, perigoso, fumador de
maconha, matador. Castells (2000) falou que minorias estigmatizadas desenvolvem
uma “identidade de resistência” como forma de enfrentar a opressão e a
desvalorização das maiorias dominantes. Essa estratégia de sobrevivência e
legitimidade de sua existência demanda uma coesão interna do grupo marginalizado
que incorpora o discurso que o desqualifica, dando-lhe uma nova conotação com a
qual passa a interagir no espaço social.
4.1.6 Expressões subjetivas
A sexta investigação buscou apreender sentimentos e pensamentos
relativos à experiência da infracionalidade, na percepção dos adolescentes e das
mães. As opiniões expressas pelos sujeitos abrangeram a família, a conduta
infracional, a internação e a discriminação social. Os sentimentos relacionados ao
sofrimento vivido pela família a partir da experiência em foco foram trazidos pelos
grupos como os mais significativos.
Tabela 6 – Distribuição das freqüências, percentuais e qui-quadrado da categoria expressões subjetivas e subcategorias, segundo o grupo de adolescente autores de atos infracionais e de mães.
Sujeitos Adolescentes Mães Total
X2
Subcategorias F % F % F %
Sentimentos 20 31,25 90 76,27 110 60,4444,54
Pensamentos 44 68,75 28 23,73 72 39,563,55
Total 64 100 118 100 182 100
p < 0,01
A tabela 6 apresentou o panorama numérico das respostas, as diferenças
entre os grupos em cada subcategoria e o valor do qui-quadrado correspondente.
Na subcategoria relativa aos sentimentos expressos, as mães contribuíram com a
maioria das respostas, razão pela qual o qui-quadrado apresentou o elevado valor
de 44.54. Ao contrário desta, na subcategoria relativa aos pensamentos,
prevaleceram as respostas dos adolescentes.
Vale ressaltar que o número de respostas (90) das mães na subcategoria
Sentimentos foi sensivelmente superior às demais respostas, em razão de a
entrevista ter provocado nelas uma resposta específica sobre seus sentimentos. As
demais evocações, tanto das mães quanto dos adolescentes, foram apreendidas do
conteúdo de suas entrevistas, através das elaborações discursivas e linguagem não-
verbal a elas associadas.
Sentimentos
Nesta subcategoria, os sujeitos representaram a experiência da
infracionalidade como geradora de sofrimento, cujo alvo principal é sempre a família.
Adolescentes A família muitos vezes se sente incapaz de ajudar e sofre./ Eu mesmo gostaria que minha mãe fosse mais feliz. Ela diz que pensa em mim todo dia e nem consegue comer direito./ Porque aqui, ave maria, é muito ruim viver aqui dentro.
Mães É uma coisa muito horrível para a família./ Quase eu não acreditava que o meu filho ia ser um menor desses. Quando eu penso nessa arrumação meu coração dói. / Não suporto ver ele nessa vida./ Foi como se eu tivesse levado uma facada. É muito doloroso, muito magoado.
Um dado que chama a atenção no trabalho com adolescentes
institucionalizados é o fato de que, nos abrigos, as visitas de familiares se dão com
bem menos freqüência que nas unidades de privação de liberdade. O filho rebelde,
castigado pela privação de liberdade por mau comportamento, reflete também o
resultado de suas vivências familiares. Perante ele, a família se obriga a reconhecer
suas culpas, incompetências e impotência, realidades e fantasias. Acompanhá-lo é
registrar o seu empenho e sacrifício, é resgatar suas esperanças, é purgar os seus
pecados.
Pensamentos
Nessa subcategoria, os sujeitos deram voz a seus pensamentos,
externando as suas opiniões sobre a experiência vivenciada. A vida dos internos
em um centro educacional é regrada pelos códigos e pactos que devem ser
rapidamente compreendidos por todos os que nele ingressam. Essa linguagem que
se desenrola paralela ao discurso institucional já existe na chegada de um novo
interno e permanecerá após o seu desligamento. Viver com uma razoável margem
de segurança implica procurar obedecer às regras de convivência, estando atento
para não violá-las. Esse esforço deixa os adolescentes com a certeza cabal da
impossibilidade de fazer amigos em uma instituição dessa natureza.
Na internação qualquer coisa pode acontecer a todo momento./ Aqui o nêgo tem que ser irmão. O nego tá tudo no mesmo barco./ Não tem ninguém melhor do que ninguém. / Amigo mesmo a gente só tem o pai e a mãe da gente.
A vida em um centro educacional é totalmente diferente daquela que
levavam. As regras institucionais determinam o movimento coletivo dos corpos. O
dia é rigidamente fracionado para a execução das atividades previstas, a fim de que
a experiência contenha o caráter sancionatório e disciplinador.
Aqui a gente tem tempo pra pensar muito. Pensa como arranjar um emprego lá fora. / Na internação o cara fica sem usar droga. Só comendo e dormindo. Estudando. Trabalhando, também. / Se você sair daqui e não mudar não muda nunca mais.
As mães não fazem uma idéia exata do que experienciam seus filhos em
uma internação. Intuem que o modelo atual não é o ideal, mas não fundamentam
sua crítica. Voltam a abordar suas dificuldades para criar os filhos e de fazê-los
obedientes, mas defendem que apenas a Deus ou à Justiça cabe o julgamento de
sua conduta.
• Eles fazendo essas coisas e vindo pra um colégio desses, não leva vantagem em nada. Aqui eles colocam todos num canto só. Eu acho isso muito errado. Toda a sociedade é culpada de tudo isso.
• Antigamente era fácil lutar com os filhos adolescentes. Hoje, filho não obedece mais não. A mãe precisa trabalhar.
• A gente só pode ser julgada por Deus. Na terra só quem julga é o Juiz.
Ficam em aberto grandes questões aqui colocadas pelo grupo. Por
exemplo: Como a medida de internação poderá contribuir para a mudança do
adolescente, considerando que a resposta social é muito mais lenta do que o
número cada vez maior de adolescentes envolvidos com a violência? Como
reestruturar os modelos de atendimento em massa? Como as famílias pobres
poderão cuidar de sua prole sem os riscos da desagregação? Como os pais
aprenderão a ser autoridade para os filhos equacionando obediência e liberdade
individual? Poderá a sociedade aceitar a privação de liberdade como medida
extrema e suficiente para a punição ou lhe parecerá natural a pena de morte e o
tratamento desumano dado aos “condenados”?
4.2 A CONSTRUÇÃO DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SOBRE ADOLESCENTE INFRATOR A PARTIR DA ANÁLISE FATORIAL DE CORRESPONDÊNCIA
A exploração do material produzido pelos sujeitos quando da aplicação do
Teste de Associação Livre de Palavras foi feita a partir da utilização da técnica de
Análise Fatorial de Correspondência, tendo como base o programa Tri-Deux-Mots
(versão 2.2), Cibois (1998). Os dados coletados e lançados no programa foram
distribuídos graficamente sobre dois eixos, tornando possível a leitura e a
interpretação das representações entre os grupos e dentro deles.
O plano fatorial apresentou dois aglomerados de palavras dispostas sobre
o Fator 1, opondo-se em campos distintos, que traduziram as representações sociais
sobre adolescentes infrator, elaboradas pelos dois grupos de sujeitos entrevistados.
No eixo negativo (esquerdo), estão aglutinadas as representações das mães e no
eixo positivo (direito), as dos adolescentes.
Plano Fatorial dos Eixos 1 e 2 das Representações Sociais sobre Adolescente Infrator
F2_____________________________________________________________Discriminado ³ Pagar ³ ³³ ANALFABETO Desprezo ³ ³ ³ Trabalhar ³ ³ ³ ³ ³ ³ ³ Faz sem pensar ³ Faz o que dá na cabeça Nós aqui ³ ³ ³ ³ Desobediente ³ Pessoa ruim Preso Sem compaixão Sem orientação____MÃES______________+__________ADOLESCENTES________________³ F1Inocente Desobedece a autoridade ³ ³ Danado ³ ³ Família sofre Meu filho Más companhias Febem ³ Mãe sofre ³ ³ ³ ³ ³ ³ Carente ³ ³ ³ ³ ³ ³ ³ ³ ³ ³ ³ ³ ³ ³ 18-21 anos ³ ³ ³ ____________________________________________________________________Briga___
Legenda:Variáveis fixas
Sujeitos Idade EscolaridadeAdolescentes 16 – 18 Analfabeto
Mães 18 – 21 Fundamental>21 Ensino médio
O exame desse gráfico com as indicações de Contribuição por Fator –
CPF demonstrou que, para as mães, adolescente infrator significa ”Faz o que dá na
cabeça” (CPF= 102), “Mãe sofre” (CPF = 94), “Desobediente” (CPF = 76), “Pessoa
ruim” (CPF = 75), “Danado” (CPF = 73), “Sem orientação” (CPF = 62), “Inocente”
(CPF =37), “Meu filho” (CPF =30). Para os adolescentes, adolescente infrator
significa “FEBEM” (CPF = 59), “Sem compaixão” (CPF = 44), “Família sofre” (CPF =
41), “Faz sem pensar” (CPF = 40), “Preso” (CPF = 38), “Nós aqui” (CPF = 31),
“Desobedece à autoridade” (CPF = 39).
Os dados apresentados na Tabela 7 demonstraram a freqüência das
palavras produzidas pelos grupos e sinalizaram a correlação entre suas
representações, que abordaram temas comuns relacionados à impulsividade,
desobediência, sofrimento familiar, natureza má, privação de liberdade, inocência e
carência de orientação. Vale ressaltar que este resultado corroborou o da análise de
conteúdo realizada a partir das entrevistas, quando os sujeitos significaram estas
evocações através de suas produções discursivas.
Apesar da correspondência de conteúdos, os sujeitos utilizaram-se de
palavras diferentes para traduzi-los, o que contribuiu para reduzir a freqüência das
evocações que apareceram na tabela. É possível observar que a representação
social de adolescente infrator elaborada pelos sujeitos que vivenciam diretamente
esta realidade é correspondente na maior parte de seus aspectos, apresentando
especificidades por grupos, em outros.
Tabela 7 – Freqüência de palavras evocadas pelos grupos de adolescentes e de mães.
ADOLESCENTES % MÃES %Preso 17,8 Desobediente 20,5Desobedece à autoridade 8,0 Mãe sofre 15,1FEBEM 7,1 Faz o que dá na cabeça 14,2Faz sem pensar 5,3 Danado 10,7Sem compaixão 5,3 Pessoa ruim 10,7Família sofre 5,3 Sem orientação 8,9Nós aqui 4,4 Inocente 5,3
Meu filho 4,4
Conforme já abordado anteriormente, quando da análise das entrevistas,
prevaleceu também na associação livre de palavras a idéia de um adolescente
infrator como uma pessoa impulsiva que desafia as regras de conduta social. Vale
salientar, contudo, que a linguagem não verbal que atravessou essa descrição
imagética apresentou um conteúdo diferenciado nos grupos, apesar da utilização de
termos similares. Assim, quando o grupo de adolescentes falou “Faz sem pensar”,
descreveu o adolescente como um jovem que age sem ponderação ou racionalidade
e que não mede ou se importa com as conseqüências de seus atos. A expressão
empregada pelas mães “Faz o que dá na cabeça”, apesar de conter a conotação
acima, agrega a esta descrição a idéia de desobediência como justificativa para a
conduta infracional.
A percepção materna da desobediência tem, prioritariamente, um foco
doméstico, sendo o adolescente infrator aquele que desconsidera os conselhos
paternos. Para os adolescentes, a desobediência está projetada no meio social,
sendo a lei personalizada em uma figura de autoridade. A referência à
desobediência, seja em relação a qualquer desses aspectos, acusa uma falha, a
partir da infância, na introjeção dos limites que devem ser adquiridos nas relações
com as figuras parentais, o que favorece a expansão do comportamento
transgressor na adolescência. O vazio da autoridade, quando internalizado, deflagra
o movimento de desafio às leis, domésticas e sociais e gera uma incansável busca
dos limites de que os adolescentes foram poupados e um clamor pela punição da
qual são supostamente merecedores.
A complexidade explicativa do ingresso do adolescente no mundo do
crime esteve presente no conteúdo representacional das mães que procuraram
ancorar suas explicações na bagagem sociocognitiva disponível em sua realidade,
assim como em suas próprias experiências subjetivas. Assim, o adolescente infrator
foi percebido ora como uma pessoa desobediente/danado, ora como um jovem sem
orientação.
No primeiro caso, existe uma compreensão subjacente de
responsabilidade individual do adolescente por sua conduta infratora; já no segundo,
a representação traz embutida a culpabilidade familiar, uma vez que, para as mães,
a falta de orientação esteve associada à ausência de diálogo e de atenção
paterna/materna. Apesar de essa representação social de adolescente infrator
reportar-se à esfera relacional, o foco unidirecional da culpa deixa de fora um
extenso feixe explicativo para o fenômeno da delinqüência juvenil.
O esforço na busca da compreensão das inúmeras razões para a conduta
anti-social do adolescente evidenciou-se ainda nas discordâncias representacionais
dos grupos, quando, por exemplo, as mães apontaram o adolescente infrator ora
como uma pessoa inocente, ora como uma pessoa ruim. A ingenuidade relacionada
à fragilidade/imaturidade também esteve presente em suas falas, quando, por
ocasião das entrevistas, referiram-se ao adolescente infrator como uma criança. Ao
mesmo tempo, o adolescente infrator foi descrito pelos grupos como uma pessoa de
índole má, capaz de comprazer-se com a perversidade.
Essa percepção encontra eco na representação social mais ampla,
produzida pela mídia e que tem estruturado uma postura de raiva e pouca
sensibilidade social frente a uma crescente parcela da juventude pobre brasileira. A
percepção do adolescente infrator como um “jovem perverso” minimiza o
comprometimento social de se discutir a questão de forma mais aprofundada para
encontrar alternativas de como enfrentá-la. A culpa simplifica os fatos, imprimindo-
lhes uma conotação de unilateralidade e a conseqüência disso passa a ser uma
percepção naturalizada da realidade de tal forma que a sua leitura com outras lentes
exige esforço daquele que se dispõe a fazê-la.
Nesse sentido, mães e adolescentes acabaram por incorporar em suas
representações essa idéia difundida no espaço social, mesclando a elas as
expressões de suas experiências de vida. Os sujeitos entrevistados não apenas
projetaram o adolescente infrator no mundo externo, mas também absorveram-no
como parte de suas vivências (“Nós aqui” / “Meu filho”), elaborando a interface
dessa realidade individual com a realidade sociocultural, uma vez que o processo de
significação se desenrola a partir dos processos interacionais constitutivos/
constituintes da subjetividade social.
A evocação livre de palavras associadas ao adolescente infrator também
apresentou o sofrimento familiar já registrado na entrevista com os grupos. A idéia
de sofrimento esteve diretamente voltada para a família/mãe, envolvendo tanto a
dor/raiva do filho, quanto o sofrimento de desgosto/vergonha causado por ele.
A privação de liberdade, materializada na idéia de FEBEM, esteve
presente nas narrativas dos adolescentes, figurando como aspecto importante em
sua composição. Assim, os sujeitos fizeram uma associação entre conduta
infracional e privação de liberdade, elaborando uma relação de conseqüência entre
estas. A denominação de FEBEMCE – Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor
do Ceará – foi extinta em 1999, quando todas as ações realizadas por essa
fundação foram absorvidas pela atual Secretaria da Ação Social. Entretanto, cinco
anos passados, permanece no imaginário social do adolescente cearense a antiga
denominação. Isso se justifica não apenas pelo fato de a FEBEM ainda existir em
alguns estados brasileiros e ser noticiada na mídia em diversos episódios de
rebeliões, como também em razão de o reordenamento institucional no Ceará ainda
não ter conseguido romper o modelo de atendimento massificado, presente nas
antigas unidades para “recuperação de menores”.
Em relação ao Fator 2, visualizado no Plano Fatorial como o eixo vertical
azul, verificou-se que um número menor de palavras encontra-se disperso nos
espaços superior e inferior, merecendo destaque as representações “carente” (CPF
=191), “más companhias” (CPF = 29) e “trabalhar” (CPF = 57), assinaladas pelos
dois grupos entrevistados.
A primeira delas fez uma referência descritiva ao sujeito em sua
individualidade; a segunda referiu-se ao sujeito no mundo, enfatizando os vínculos
sociais apontados como indutores para o seu ingresso na criminalidade e a terceira
representação apontou para uma lacuna de vínculos, sinalizando uma solução viável
para a resolução de sua problemática.
Vale destacar que a palavra com maior freqüência (48,2%) no Teste de
Associação Livre de Palavras e que, por conseguinte, configurou-se como forte
representação dos grupos foi “coisa errada”, apesar de não ter aparecido no Plano
Fatorial. Isso é indicativo de que os sujeitos fizeram uma associação imediata do
adolescente infrator à prática infracional, antecipando-a a outros posicionamentos
emotivos e a todas as outras evocações já registradas que priorizaram a imagem de
um adolescente rebelde, desprotegido, inocente ou perverso.
Em virtude de as representações sociais extrapolarem a dimensão do
psiquismo individual para imergirem na subjetividade do espaço social e, assim, se
constituírem como saber do senso comum, a representação dos grupos que vincula
o sujeito ao ato amplia-se, com o propósito de aglutinar o universo simbólico, afetivo,
cultural e psicossocial, dando-lhe novos contornos. A utilização do Teste de
Associação Livre de Palavras em conjunto com a entrevista semi-estruturada para a
apreensão das RS de adolescente infrator ofereceu um campo de visualização
semântico mais ampliado, favorecendo tanto a corroboração de dados quanto a
emersão de novos elementos que se agregaram aos demais, o que facilitou e
enriqueceu a investigação do objeto deste estudo.
Caminhante, são tuas pegadas o caminho, e nada mais.
Caminhante, não há caminho, o caminho se faz ao andar.
Ao andar, se faz o caminho e, ao voltar a vista atrás,
Vê-se a senda que nunca se voltará a pisar.
Caminhante, não há caminho, há apenas sulcos no mar.
Antônio Machado.
CAPÍTULO 5
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo percorreu a área onde as idéias partilhadas e
trespassadas pelas paixões constroem o conhecimento cotidiano da vida humana.
As representações sociais que povoam o mundo falam dos sujeitos sociais, de suas
histórias individual e coletiva. Este estudo adentrou o terreno inculto das minorias
sociais, de lá extraindo o seu objeto de investigação e para lá retornando na eleição
de seus grupos de sujeitos.
Os resultados deste estudo foram enriquecidos pela utilização de uma
abordagem de multimétodos, o que favoreceu a complementação de informações,
corroborando as muitas possibilidades de vínculos entre as ciências sociais, dos
fenômenos psíquicos, da saúde e da educação.
Os resultados alcançados revelam a existência de conceitos figurativos
entre adolescente e infrator de tal forma fusionados que os sujeitos não mais se
dão conta dessa confluência, apesar de ser esta uma condição que favorece a
demarcação de uma “identidade marginal”.
A caracterização de “adolescente” está impregnada da conotação de
“infrator”, de modo que o conteúdo dessa produção discursiva traduz o nível de
proximidade entre sujeito e objeto. A caracterização de “adolescente infrator”, além
do conteúdo descritivo, traz marcas depreciativas embutidas na linguagem verbal e
não-verbal dos sujeitos. A representação social de adolescente infrator emerge
sobre pólos distintos que, contudo, se entrelaçam na encruzilhada da subjetividade
individual e social.
No pólo descritivo, os sujeitos não escapam à descrição do
comportamento anti-social, realidade sobre a qual sedimentam as suas concepções
de certo e errado, bom e mau, e que também fornece o referencial que lhes informa
a condição de infracionalidade. Igualmente procuram se amparar no viés descritivo
para representar o adolescente infrator, partindo de características que agregam
recortes do conhecimento pensado e do conhecimento vivido. Assim, falam de
características pessoais nas quais se reconhecem e de outras comuns a todos os
adolescentes, pelas quais procuram justificar sua conduta.
Um outro pólo no qual se enraíza essa representação social é o terreno
minado da estigmatização que comporta a dimensão das emoções e dá cor aos
olhares, pensamentos e gestos dos sujeitos do mundo. A acusação explícita que
carrega reescreve a versão explicativa anterior sobre a prática de atos infracionais e,
de forma inflexível, encurrala o sujeito nas amarras que passam a justificar a
inversão da violência, dessa vez, contra ele próprio.
Os sujeitos oscilam entre a imagem de um adolescente infrator impulsivo/
desobediente ou carente/monstro, exprimindo a dinâmica paradoxal por meio da
qual procuram compreender o comportamento anti-social do adolescente. Esses
pares de qualidades expõem os eixos justificador e acusativo que tanto absolvem o
sujeito quanto o arrastam para o banco dos réus.
Sentimentos contraditórios, permeados pelo prazer das aventuras
perigosas, pelo medo gerador de submissão aos amigos ou às drogas, pela angústia
dos vazios que marcam sua vida, pelo repúdio ou comunhão inconsciente com os
estigmas que os nomeiam como pessoas, são reveladores da trajetória rumo ao
mundo da criminalidade.
A ambivalência incrustada no território dos afetos e expressa nas suas
falas revela-se também nas explicações buscadas para ancorar as causas da
conduta anti-social. Por vezes, os sujeitos assumem a responsabilidade dos fatos,
mas lhes imprimem, defensivamente, uma certa dose de leveza; por vezes, a
projeção defensiva da responsabilidade sobre os objetos externos exime mais
claramente o comprometimento pessoal com as escolhas e coloca o sujeito na
condição de vitimado. O apelo subjacente a esse posicionamento intenta justificar o
comportamento e inverter a imagem negativa.
Existe uma estreita relação entre representação social e causalidade. As
pessoas organizam explicações para descrever os fatos da vida e as partilham no
cotidiano, procedendo à sua interpretação do mundo. A ligação entre causa e efeito,
ancorada em aspectos psicoafetivos e sociorrelacionais, justifica o comportamento
social, estruturando o conhecimento do senso comum e tornando a realidade menos
misteriosa e mais familiar. Os sujeitos deste estudo são procedentes do mesmo
contexto sociocultural e têm um vínculo considerável com o objeto de investigação
escolhido, sendo suas representações coincidentes em muitos aspectos. No
processo de objetivação, imprimem concretude ao objeto e revelam facetas não
representadas por outros sujeitos sociais. Segundo Moscovici (2003, p.71), “a
materialização de uma abstração é uma das características mais misteriosas do
pensamento e da fala”.
Esta pesquisa buscou apreender as representações sociais sobre
adolescente infrator e verificar até que ponto se revestem de importância nas trocas
interativas dos sujeitos. De pronto, foi possível observar que as representações
esgarçam percepções e sentimentos dos sujeitos que, se por um lado, trazem à tona
o universo das subjetividades individuais, por outro, exibem a demarcação dos
espaços sociais nos quais minorias e maiorias constroem, em meio a um duelo por
vezes silencioso e sutil ou mesmo violento e ruidoso, as suas visões de mundo,
(re)apresentando e (re)criando as suas versões da vida.
Nenhuma representação social é vazia de significado afetivo. A
representação de adolescente infrator resultante deste estudo, elaborada por
adolescentes infratores e mães, está eivada de conteúdos afetivos e cognitivos de
suas histórias, assim como comporta os preconceitos que habitam os ambientes
sociais nos quais os sujeitos se movimentam.
Assim, considerando que a representação pessoal constitui-se solo sobre
o qual se consolida o autoconceito, ergue-se nos arredores desse sujeito um cárcere
sem grades dentro do qual desenha sua subjetividade. Os profissionais que
trabalham com esse adolescente e suas famílias nas diversas áreas estão
igualmente submersos nesse ambiente social, geograficamente dividido, ajudando-
os a construir as representações sociais a serem assimiladas, com base no
inesgotável processo da comunicação humana. Muitas vezes, encontram-se
também eles aprisionados pelo estigma que impregna o ar, razão por que contribuir
de forma significativa para a consolidação ou não do preconceito dependerá do seu
nível de consciência ou interesse.
A mídia é poderosa e repleta de interesses específicos a partir dos quais
direciona os discursos sonoros e imagéticos que ditam as verdades de um povo.
Assim sendo, sua correnteza veloz e ruidosa procurará abafar a voz das minorias
que passam a desenvolver estratégias para não sucumbir a sua passagem.
A existência de adolescentes como protagonistas do mundo do crime é
uma questão geradora de controvertidos sentimentos na platéia dos cidadãos que
não se sentem personagens de um mesmo espetáculo social. Sentimentos
extremistas de pena, medo ou raiva servem de substrato para a defesa de
posicionamentos limitados, relacionados à percepção da causalidade do fenômeno.
A visão crítica permite compreender a estreita ligação entre a prática de atos
infracionais e o contexto social, tornando possível a luta pela garantia de direitos e
inclusão social se sobrepor a atitudes passionais.
Programas de qualificação que comportem as considerações aqui
levantadas voltados aos profissionais das diversas áreas, pública e privada, que
atuam junto a adolescentes, sejam estes pertencentes ou não às camadas
pauperizadas, por certo favorecerão posições mais maduras sobre todas as
questões pertinentes ao tema, incluindo a proposta de rebaixamento da idade penal.
A teoria das representações sociais fornece embasamento para a leitura
do conhecimento circulante nos espaços sociais, abre frestas nos pilares sobre os
quais se assenta a percepção da realidade naturalizada e ajuda a refletir sobre como
as pessoas compreendem e constroem a sua subjetividade num dado cenário. Este
trabalho pretende adubar o terreno dessas reflexões, a partir do esquadrinhamento
do objeto de investigação e, assim, sugerir novas possibilidades de se pensar o
fazer profissional.
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ANEXOS
Anexo I
BANCO DE DADOS – MÃE
231CAREN MACOM MUDAR DESPR*232DESOB SEMOR ESTUD SEORA*231DESOB PRUIM DESPR DANAD*232MEUFI DESOB COIER FDCAB*232MASOF ROUBA DROGA PRUIM*232MEUFI MASOF PRESO MORTE*232MACOM COIER INOCE PRUIM*232ROUBA DROGA MATAR FDCAB*232MEUFI ESTUD MUDAR DESOB*231COIER ESTUD TRABA FDCAB*232DANAD DANAD DANAD FDCAB*232INOCE PRUIM INOCE INOCE*232CAREN TRABA COIER DESOB*231ESTUD DESOB DESOB COEIR*232DANAD PRUIM MUDAR MUDAR*231PRUIM FDCAB MACOM ROUBA*232CAREN CAREN MACOM DROGA*232COIER DROGA DANAD SEPAZ*231MATAR COIER PRUIM VIOLE*233DESOB CAREN COIER DROGA*232VIOLE FDESE PRESO MORTE*232MEUFI MASOF DANAD MASOF*232FDCAB FDCAB DROGA MACOM*231MUDAR TRABA COIER MUDAR*232MEUFI DANAD DANAD DANAD*232COIER DESOB DESOB DANAD*232COIER JUIZ PSICO PROMO*232ROUBA PRUIM FDCAB PRESO*232COIER PAGAR PRESO CAREN*233COIER MACOM MACOM MUDAR*231COIER COIER COIER DESAU*231DESOB INOCE COIER FDCAB*231FDCAB MACOM SEMOR SEMOR*232MASOF PRUIM PRUIM MASOF*232MASOF SEPAZ MATAR CAREN*232SEMOR SEMOR SEORA INOCE*232MASOF MASOF APANH CAREN*232DANAD DESOB DESOB DESOB*233MASOF MASOF MASOF MASOF*231COIER DESOB DESOB MACOM*232DROGA ROUBA MATAR COIER*232SEMOR CAREN SEMOR PAGAR*232COIER DROGA DESOB ESTUD*231 FDCAB MASOF COIER FDCAB*231ROUBA MACOM DROGA PRESO*231COIER MENOR ROUBA MATAR*232COIER CAREN SEMOR DESOB*232ROUBA PRUIM ROUBA PRUIM*232COIER MATAR ROUBA COIER*232CAREN CAREN SEMOR FDCAB*232FDCAB FDCAB FDCAB ARREP*232MASOF DROGA DESOB MASOF*232COIER ESTUD SEMOR FDESE*232MASOF SAUDA APANH ARREP*232ESTUD CAREN DESOB DROGA*232COIER MUDAR MUDAR MUDAR
Anexo II
BANCO DE DADOS - ADOLESCENTE
122COIER ROUBA MATA DESAU*112COIER VIOLE ARREP PRESO*112DISCR NQNAD COIER FQUER*112PRESO COIER ROUBA DESAU*112FSPEN FQUER MORTE NFVON*112ROUBA MORTE PRESO FALEI*112COIER FSPEN SAUDA SAUDA*112COIER PRESO DROGA FUGIR*112MACOM DESOB FQUER DROGA*112COIER DESOB MACOM DROGA*112ROUBA DESAU PRESO FASOF*112COIER ARREP MUDAR FSPEN*122DESUN BRIGA MUDAR FEBEM*123CAREN DROGA MACOM MACOM*122FASOF BRIGA BRIGA CAREN*122MACOM FQUER DROGA CAREN*122COIER DEJUS COIER ROUBA*122INJUS CAREN CAREN CAREN*122DROGA MACOM MORTE ROUBA*113DEJUS PRESO SAUDA PRESO*112MUDAR MUDAR ESTUD AJMAE*112COIER ROUBAR DROGA MACOM*113COIER MENOR MUDAR COIER*113 PRESO FEBEM DESAU INIMI*112FSPEN PRESO DESAU FDEUS*112COIER DROGA CAREN CAREN*113DROGA FEBEM MACOM SEMCO*112DROGA VIOLE ROUBA COIER*112ROUBA CAREN MATAR PRESO*112MACOM DROGA MACOM ROUBA*112SEMCO DROGA DROGA COEIR*121NOSAQ COIER PRESO MUDAR*112FSPEN COEIR DROGA MATAR*112COIER FEBEM DESPR ESTUD*111PAGAR TRABA ESTUD AJMAE*112NOSAQ COIER FASOF ROUBA*112COIER MUDAR MUDAR MORTE*112SEMCO CAREN SEMCO INIMI*112COIER MUDAR ESTUD PRESO*112NOSAQ COIER MUDAR DESOB*112ROUBA PROBL DIFIN DROGA*112MUDAR DESPR FASOF ARREP*112ROUBA COIER FEBEM SEMCO*112NOSAQ ESTUD TRABA AJMAE*112VIOLE FEBEM DESAU SEMCO*112COIER SERHU FASOF FASOF*112DISCR COEIR DEJUS DROGA*112DESAU DROGA MACOM COIER*112PRESO SAUDA CAREN COIER*111ROUBA DROGA MATAR DROGA*111COIER FSPEN PAGAR MUDAR*112FEBEM BRIGA AUDIE FEBEM*111NOSAQ COIER PAGAR MUDAR*111COIER DISCR DISCR DISCR*111PRESO PAGAR CURTI DESPR*112ROUBA PRESO APANH DESAU*
Anexo III
TRI-DEUX Version 2.2 Analyse des ‚carts … l'ind‚pendance - mars 1995 Renseignements Ph.Cibois UFR Sciences sociales Paris V 12 rue Cujas - 75005 PARIS Programme ANECAR
Le nombre total de lignes du tableau est de 34 Le nombre total de colonnes du tableau est de 8 Le nombre de lignes suppl‚mentaires est de 0 Le nombre de colonnes suppl‚mentaires est de 0 Le nombre de lignes actives est de 34 Le nombre de colonnes actives est de 8
M‚moire disponible avant dimensionnement 470592 M‚moire restante aprŠs dim. fichiers secondaires 468678 M‚moire restante aprŠs dim. fichier principal 467590
AFC : Analyse des correspondances*********************************
Le phi-deux est de : 0.367360
Pr‚cision minimum (5 chiffres significatifs)
Le nombre de facteurs … extraire est de 5
Facteur 1
Valeur propre = 0.252950Pourcentage du total = 68.9
Facteur 2
Valeur propre = 0.057888Pourcentage du total = 15.8
Facteur 3
Valeur propre = 0.031162Pourcentage du total = 8.5
Facteur 4
Valeur propre = 0.025361
Pourcentage du total = 6.9
Facteur 5
Valeur propre = 0.000000Pourcentage du total = 0.0
Coordonn‚es factorielles (F= ) et contributions pour le facteur (CPF)Lignes du tableau*---*------*----*------*----*------*----*------*----*------*----*ACT. F=1 CPF F=2 CPF F=3 CPF F=4 CPF F=5 CPF*---*------*----*------*----*------*----*------*----*------*----*ARRE 195 2 -18 0 -141 8 381 70 -0 6 ARREP BRIG 805 25 -1058 188 898 252 -161 10 -0 20 BRIGA CARE -43 0 -435 191 143 38 -25 1 -0 3 CAREN COEI 422 7 277 13 -11 0 178 12 -0 10 COEIR COIE 48 1 77 13 23 2 -55 15 -0 0 COIER DANA -793 73 -115 7 -34 1 221 56 0 67 DANAD DESA 668 39 -31 0 -96 7 35 1 -0 17 DESAU DES1 -587 76 87 7 -3 0 3 0 0 49 DESOB DES2 151 1 583 71 206 17 -157 12 -0 0 DESPR DISC 806 31 703 104 166 11 -101 5 -0 12 DISCR DROG 250 18 -98 12 -79 14 38 4 -0 31 DROGA ESTU -123 2 177 16 22 0 131 20 0 2 ESTUD FASO 840 41 -155 6 60 2 305 53 -0 8 FASOF FDCA -814 102 177 21 134 23 -40 3 0 60 FDCAB FEBE 876 59 -179 11 -340 72 -108 9 -0 59 FEBEM FQUE 835 27 -284 14 179 10 238 22 -0 31 FQUER FSPE 837 40 269 18 -84 3 288 48 -0 23 FSPEN INOC -799 37 -32 0 14 0 146 12 0 47 INOCE MACO 74 1 -180 29 -46 3 -420 356 -0 1 MACOM MASO -759 94 -222 35 -368 180 -177 51 0 223 MASOF MAT1 -266 6 235 21 78 4 44 2 0 7 MATAR MEUF -787 30 -199 8 -82 3 296 42 0 16 MEUFI MORT 294 5 -256 17 92 4 257 38 -0 14 MORTE MUD1 167 6 80 6 25 1 -100 21 -0 13 MUDAR NOSA 809 31 194 8 338 45 -81 3 -0 34 NOSAQ PAGA 256 4 670 113 238 26 -208 25 0 1 PAGAR PRES 447 38 47 2 -201 63 -40 3 -0 51 PRESO PRUI -805 75 52 1 62 4 72 6 0 47 PRUIM ROUB 148 5 -50 2 137 35 129 39 -0 0 ROUBA SAUD 550 15 -28 0 -432 73 52 1 -0 11 SAUDA SEMC 872 44 44 0 -407 77 140 11 -0 20 SEMCO SEM1 -802 62 1 0 33 1 117 13 0 111 SEMOR TRAB -176 1 523 57 225 20 -186 17 0 5 TRABA VIOL 180 2 182 7 -25 0 201 19 -0 1 VIOLE *---*------*----*------*----*------*----*------*----*------*----** * *1000* *1000* *1000* *1000* *1000*
*---*------*----*------*----*------*----*------*----*------*----*
Modalit‚s en colonne*---*------*----*------*----*------*----*------*----*------*----*ACT. F=1 CPF F=2 CPF F=3 CPF F=4 CPF F=5 CPF*---*------*----*------*----*------*----*------*----*------*----*0151 630 255 10 0 18 2 2 0 0 259 0152 -597 241 -9 0 -17 2 -2 0 -0 279 0161 644 224 189 84 -104 47 63 21 0 154 0162 556 32 -928 386 657 360 -318 104 0 23 0163 -597 241 -9 0 -17 2 -2 0 -0 279 0171 -102 3 598 406 296 185 -284 209 -0 3 0172 7 0 -125 66 -9 1 145 201 -0 2 0173 214 4 -377 58 -730 402 -708 465 0 2 *---*------*----*------*----*------*----*------*----*------*----** * *1000* *1000* *1000* *1000* *1000**---*------*----*------*----*------*----*------*----*------*----*
Fin normale du programme
Anexo IV TRI-DEUX Version 2.2 IMPortation des MOTs d'un fichier de questions ouvertes ou de mots associ‚s … un stimulus - janvier 1995 Renseignements Ph.Cibois UFR Sciences sociales Paris V 12 rue Cujas - 75005 PARIS Programme IMPMOT
Le fichier de sortie mots courts tri‚s est lucita.DAT et servira d'entr‚e pour TABMOTLe fichier de position en sortie sera lucita.POS et servira d'entr‚e pour TABMOTLe fichier d'impression est lucita.IMPPosition de fin des caract‚ristiques 3 Nombre de lignes maximum par individu 1 Le stimulus est le mˆme pour tous les motsNombre de lignes lues en entr‚e 112 Nombre de mots ‚crits en sortie 448 Nombre de mots de longueur sup‚rieure … 10 = 0 seuls les 10 premiers sont ‚t‚ imprim‚s D‚coupage en mots termin‚Tri termin‚Les mots sont mis en 4 caractŠresImpression de la liste des motsAJMAE AJMA 3 APANH APAN 3 ARREP ARRE 5 AUDIE AUDI 1 BRIGA BRIG 4 CAREN CARE 24 COEIR COEI 4 COIER COIE 54 CURTI CURT 1 DANAD DANA 12 DEJUS DEJU 3 DESAU DESA 9 DESOB DES1 23 DESPR DES2 5 DESUN DES3 1 DIFIN DIFI 1 DISCR DISC 5 DROGA DROG 30 ESTUD ESTU 12 FALEI FALE 1 FASOF FASO 6 FDCAB FDCA 16 FDESE FDES 2 FDEUS FDE1 1 FEBEM FEBE 8 FQUER FQUE 4 FSPEN FSPE 6 FUGIR FUGI 1 INIMI INIM 2 INJUS INJU 1 INOCE INOC 6 JUIZ JUIZ 1 MACOM MACO 21 MASOF MASO 17 MATA MATA 1 MATAR MAT1 9 MENOR MENO 2 MEUFI MEUF 5 MORTE MORT 6 MUDA MUDA 1 MUDAR MUD1 22 NFVON NFVO 1 NOSAQ NOSA 5 NQNAD NQNA 1 PAGAR PAGA 6 PRESO PRES 20 PROBL PROB 1 PROMO PRO1 1 PRUIM PRUI 12 PSICO PSIC 1 ROUBA ROUB 24 ROUBAR ROU1 1 SAUDA SAUD 5 SEMCO SEMC 6 SEMOR SEM1 10 SEORA SEOR 2 SEPAZ SEPA 2 SERHU SERH 1 TRABA TRAB 5 VIOLE VIOL 5 Nombre de mots entr‚s 448 Nombre de mots diff‚rents 60
Impression des tris … plat
Question 015 Position 15 Code-max. 2Tot. 1 2 448 224 224 100 50.0 50.0
Question 016 Position 16 Code-max. 3Tot. 1 2 3 448 188 36 224 100 42.0 8.0 50.0
Question 017 Position 17 Code-max. 3Tot. 1 2 3 448 84 332 32 100 18.8 74.1 7.1
Anexo V
COLETA DE DADOS - ADOLESCENTES
Teste de Associação Livre de Palavras
Diga quatro palavras que lhe venham à mente quando digo a expressão
adolescente infrator.
Dados sociodemográficos
Idade: ___________________
Escolaridade:_______________________
Entrevista semi-estruturada
• O que é um adolescente para você? O que é adolescente infrator para você? Porque um adolescente entra no mundo do crime? Você acha que ele pode mudar de vida? Como? Você acha que um adolescente infrator merece confiança? Por que? O que as pessoas pensam sobre um adolescente infrator? Fale um pouco sobre você. Come é o seu jeito. Você está satisfeito com o jeito como você é? Como você gostaria de ser?
Observação assistemática
Linguagem não verbal
Anexo VI
COLETA DE DADOS - MÃES
Teste de Associação Livre de Palavras
Diga quatro palavras que lhe venham à mente quando digo a expressão
adolescente infrator.
Dados sociodemográficos
Idade: ___________________
Escolaridade:________________________
Entrevista semi-estruturada
O que é adolescente para você? O que é um adolescente infrator para você? Porque um adolescente entra no mundo do crime? Você acha que ele pode mudar de vida? Como? Você acha que um adolescente infrator merece confiança? Por que? O que as pessoas pensam sobre um adolescente infrator? O que é para você ter um filho adolescente infrator?
Observação assistemática
Linguagem não verbal.
Anexo VII
a) Distribuição das unidades de análise temáticas sobre DESCRIÇÕES SOBRE ADOLESCENTE
COMPORTAMENTAIS
Adolescentes
“ Adolescente é uma pessoa impulsiva ( ) Não pensa antes de fazer as coisas ( ) Não pensa nas conseqüências ( ) Não pensa no futuro ( ) Pensa só no momento ( ) Faz seus atos sem pensar ( ) Prejudica as pessoas ( ) Sempre alegre ( ) Humilde ( ) Não com drogas ou violência ( ) Quer se sentir o dono da razão ( )Não segue conselho dos pais ( ) Quer se sentir adulto ( ) Dono de si ( ) Faz o que vem na cabeça ( ) Não pensa nas conseqüências ( ) É estudioso ( ) É saber viver ( ) Não fazer coisa errada ( ) Crer na palavra de Deus ( ) É viver ( ) É liberdade ( ) Não resolve suas coisas ( ) Não pode ser independente ( ) Tem que dar informação ( ) Satisfação ( ) Dizer o vai fazer ( ) Pedir autorização ( )É viver cada dia ( ) É conhecer as coisas ( ) É viver livre ( ) Quando ficar maior não faz mais o mesmo ( ) Quando ficar maior já é adulto ( ) Faz outras coisas mais pior ( ) É uma pessoa menor( ) É arrumar escola ( ) Arrumar trabalho ( )Fazer a vida ( ) O jovem ( ) Irresponsável ( ) Faz sem pensar ( ) Pessoa normal ( ) Igual a pessoa normal ( ) Tem várias amizades ( ) Liberdade( ) Tem responsabilidade que não é pra ter ( ) Respeitador( ) Estudioso ( ) Amigo ( ) Alegre ( ) Namorador ( ) Normal ( ) Estudar ( )Saber brincar ( ) Inexperiente ( ) Criança ( ) Infantil ( ) Se arrepende ( )Vive o instante ( ) Age por impulso ( ) É viver uma fase boa ( ) Conhece as coisas ( ) Quando ficar maior muda ( ) Faz coisas pior ( ) Pessoa menor ( ) Irresponsável ( ) É o começo de uma vida ( )Tá na flor da idade ( ) Fase muito legal ( ) Adolescência é uma coisa que tem de ser valorizada ( ) Coisas boa como a escola ( ) Como a família ¨
Mães
“ Adolescente é estudar ( ) Deixar de andar nas ruas ( ) Acha que é dono da vida deles ( ) Faz o que dá na cabeça ( ) Deixar as amizades ruins( ) Não pensa direito ( ) Não atende conselhos ( ) Os outros chama e ele vai ( ) Só pensa do lado errado ( ) É totalmente uma criança ( ) Não tá nem aí com a vida ( ) Só pensa neles ( ) Não pensa na família ( ) Não pensa nos pais ( ) Faz coisa errada ( ) Anda no mundo ( ) Começa a furtar ( ) Usa droga ( ) Não tão nem aí pra família ( ) Não escuta nem o pessoal da rua ( ) Ser mais educado ( )Se comportar ( ) Saber conviver ( ) Aprender mais do mundo ( ) Não tem juízo pronto ( ) Faz coisa errada sem precisão ( ) Faz o que os outros botar na memória dele ( ) Não tem a mente formada ( ) Não pensa como adulto ( ) Faz sem pensar ( ) Tem que ser mais calmo ( ) Tem que ser um menino bom ( ) Tem que ser pensativo ( ) Não fazer coisa ruim ( ) Anda nas ruas ( ) Rouba pai de família ( ) Se mistura com quem não presta ( ) Não quer conselhos ( ) Se mistura com os ladrões velhos ( ) Usa arma (( ) Faz o que não presta ( ) Desobediente ( ) Trabalhoso ( ) Não obedece a mãe ( ) Acha que os amigos é a vida deles ( ) Não quer saber de mãe ( ) Nem de pai ( ) Não pensa em nada ( ) Quando quer fazer faz ( ) Não sabe o que é bom e ruim ( ) Pessoa crescendo ( ) Cresce pra ser homem ( ) Não é só ter 18 anos ( ) Adolescente vai até 20 anos ( ) Quando tem 20 anos sabe pensar ( ) É o jovem na adolescência ( ) Complicado ( ) Não tem noção das coisas ( ) É desespero ( ) Dá preocupação ( ) É difícil ( ) Dá desgosto ( ) Jovem ( ) Faz o erro”
VIVENCIAIS
Adolescentes
“É uma pessoa confusa “
Mães
” Criança que precisa de amor ( ) Precisa de educação dos pais ( ) Criança sofrida ( ) Criado só ( ) Sem a companhia do pai ( ) Com pouca companhia da mãe ( ) Não formou a mente ( ) É um menino despreparado ( ) Precisa de compreensão ( ) Precisa de carinho ( ) Criança despreparada ( ) Pessoa com problema ( ) Precisa de escola ( ) Rapaz com problema na família ( ) Tem uma carência “
b) Distribuição das unidades de análise temáticas sobre DESCRIÇÕES SOBRE ADOLESCENTE INFRATOR
COMPORTAMENTAISAdolescentes “Infrator é uma pessoa que comete coisas erradas ( ) Não respeita a lei ( ) Usa droga ( ) Vai por esse caminho ai ( ) Considerado um ladrão ( ) Um cara que entra no mundo do crime( ) Não obedece os pais ( ) Procura fazer coisa errada ( ) Rouba sempre ( ) Usa muita droga ( ) Age por impulso ( ) Não vai pelo caminho certo ( ) Procura caminho mais fácil ( ) Um caminho que tem as drogas( ) Pessoa manipulada pelos amigos ( ) Pessoa manipulada pelas drogas ( ) Pessoa diferente ( )E aquele que faz coisa errada ( ) Vive roubando ( ) Faz baderna no meio da rua ( ) Faz sem precisão ( ) não respeita ninguém ( ) não respeita nem a família ( ) Faz muita coisa grave ( ) faz coisa grave ( ) É tipo uma maquina ( ) Maquina destruidora ( ) Destroi as coisas ( ) E quando a gente erra ( ) Quando a gente erra e paga ( ) Agente A gente não tem amigo ( ) É aquele que não vai corretamente com a lei ( ) Não anda correto com as leis ( ) Aquele que mata ( ) Aquele que rouba ( ) faz um bocado de putaria ( ) É essas coisas que a gente comete ( ) Quem mexe nas coisas dos outros ( ) faz o que não e para fazer ( ) Se mete em vagabundagem ( ) E um adolescente que comete erro ( ) Tá numa unidade pagando ( ) falta pensamento ( ) Não para pensa ( ) Ele só faz coisa errada ( ) Mata e rouba ( ) conhece o mundo do crime ( ) É crime ( ) É rouba É matar ( ) É se drogar ( ) Vive no crime ( ) vive roubando ( ) Comete delitos ( ) É aquele que cometeu delito ( ) Não anda no caminho certo ( ) Não anda na lei ( ) Não sabe respeitar uns aos outros ( ) Pessoa de estilo de vida diferente ( ) Faz muita besteira ( ) Não respeita a lei ( ) Rouba ( ) Mata ( ) Usa droga ( ) é um adolescente mimado ( ) Possuído pela droga ( ) Possuído pelo álcool¨ .
Mães
Esses que só procura o lado errado ( ) Eles roubam ( ) Eles matam ( ) Faz coisa que não é pra fazer ( ) Faz assalto ( ) Usa droga ( ) É esses que tão preso ( ) Bole nas coisas ( ) Faz coisa mim ( ) Negócio de droga ( ) Faz o erro e se prejudica ( ) bole no alheio ( ) Não tem amor pelas pessoas ( ) Faz diz o bem ( ) Só faz o mal ( ) Eles pensa que vão ser melhor no futuro ( ) Tem outro que não pensa nisso ( ) Faz maldade ( ) Faz o mal ( )Mata pai de família ( ) Faz o que o mundo velho manda ( ) Vive no mundo das drogas ( ) Rouba ( ) assalta ( ) Não pensa ( ) Uma criança sem pensa ( ) É não fazer o errado ( )É não usar drogas ( ) E não mexer com os outros ( ) Aquele que mata ( ) Jovem que entra no mundo do crime ( ) Se envolve com coisa errada ( ) Drogas ( ) Roubo ( ) Confusão ( ) Pessoa malvada ( ) Perversa ( ) Tem o pensamento no mundo da lua ( ) Mesmo não usadores de drogas ( ) Não obedece pai e mãe ( ) É um louco ( ) Não entende pai nem mãe ( ) Não obedece ninguém ( ) O futuro e o cemitério ( ) Cadeia ( ) Não quer nada na vida ( ) Erro ( ) Desobediente ¨.
VIVENCIAISAdolescentes ” Um cara que não teve uma chance na vida ( ) Que nem nos aqui não teve chance na vida( ) E uma pessoa que se encontra comum vazio ( ) E uma pessoa que tem um problema ( ) Tem problema e não sabe como resolver ( ) E uma pessoa com muitos problemas ( ) E uma pessoa que na infância passou por problemas ( ) Tem um vazio ( ) Não tem apoio familiar ( ) Não tem escola ( ) Pessoa sem apoio ( ) Tem que ter o cuidado do pai e da mãe ( ) Não tem o dialogo de ninguém ( ) Pra lhe explicar o certo ( ) E uma pessoa com muitos problemas ( ) Tem uma carência ( ) É aquela sem carinhos dos pais ” .
Mães
“ Pessoa revoltada com a vida ( ) Não tem amor por deus ( ) É aquela que e perdida ( ) Não tem uma estrutura mental boa Não tem acompanhamento ( ) Não tem instrução familiar ( ) Não e acompanhada desde pequena ( ) Se ensina ele não faz errado ( ) Não tem apoio dos pais ( ) Dos irmãos ( ) Da família ( ) É uma criança só ¨.
c) Distribuição das unidades de análise temáticas sobre CAUSAS DO INGRESSO NO MUNDO DO CRIME
SOCIOINTERACIONAISAdolescentes “Uso do drogas( ) Fui perdido pelas drogas( ) Me tornei um dependente químico( ) Não valorizava minha juventude( ) Iludido por droga( ) Manipulado pelas drogas( ) A pessoa conhece coisas novas( ) Tudo é euforia( ) No começo tudo é bom( ) Era só as drogas( ) Era tudo pra mim( ) Aí surgiram os problemas( ) Perdi o controle( ) Fui degradando aos poucos( ) Manipulação da mente( ) Se envolvi com colegas errados( ) Colegas que me colocou no roubo( ) Má influência de más amizades( ) Aí mata só porque é de menor( ) Muita droga( ) Acaba se envolvendo( ) Pessoas usuárias( ) Acaba se destruindo com drogas( ) Principalmente por isso( ) Elas influenciam o erro( ) Eu acho que elas influem tudo( ) Muitas vezes pelos amigos( ) Drogas( ) Bebidas( ) Amizades é o que mais influi ( ) Tem muita droga solta( ) Acho que os colegas( ) Companhias erradas( ) A rua( 0 O amigo chama e ele vai( ) Ele muito doido vai e faz( ) Os maior faz os de menor laranja( ) Muitos tá aqui por isso( ) As gangues( ) Aí entra no crime( ) É obrigado a fazer( ) Pega corda( ) Os outros manda( ) Pega corda dos maior( ) Vai provar de uma coisa nova( ) Um sujeito atravessou minha vida( ) Se transformou num inferno( ) Eu acho as drogas( ) Droga faz tudo na vida( ) O roubo( ) As companhias( ) Através das drogas( ) Amizades( ) Maus amigos( ) Começa a beber( ) Amigos da rua( ) Provocação( ) O cara é convidado( ) Droga causa violência( ) Ele passa a ser infrator( ) Se entrega às drogas( ) Influência( ) Só isso mesmo( ) Curiosidade( ) Convite( ) Vontade de conhecer o novo( ) Nossos amigos( ) O começo é as drogas( ) Quando tá dragada não sabe o que faz( ) Drogada faz tudo( ) Assassinar( ) Assaltar( ) Faz lesões( ) A droga não leva a nada( ) Só pro buraco( ) Você se prostitui( ) A droga é o fim da vida( ) Os companheiros( ) Por isso eu tô nessa( ) Matei e fui presa( ) Tudo acontece na rua”
Mães
“ É pelas companhias( ) O meu foi pelas amizades( ) Se acompanhar com más amizades( ) As amizades que se envolve( ) Cresce no meio de amigos( ) Os outros é que incentiva( ) Os amigos têm coisa mais prática( ) Aí ele faz também( ) Muitas amizades ruim no nosso meio( ) Os de maior usa os menor( ) Os de maior incentiva( ) Muita droga( ) Outra coisa é a droga( ) Depois que usa não sabe o que faz( ) Pelas amizades( ) Não procura amizades com pessoas ótimas( ) Só procura o lado errado( ) Os amigos que convive( ) Bota na cabeça dele o que não é pra fazer( ) Os amigos( ) As drogas( ) Pessoas erradas( ) A rua( ) Os amigos da rua( ) Por viver dessa maneira na rua( ) Se junta com amigos pra fazer besteira( ) Companhias( ) Más companhias( ) Influência de amigos( ) Os de maior pega as crianças inocentes( ) Tudo é a rua( ) Se acompanha dos de maior( ) Os de maior manda( ) Os amigos ruins( ) Tem muito amigo que bota ele na perdição( ) O meu entrou sem dever( ) O meu diz que matou mas é inocente( ) Tá aqui sem dever( ) Foi o amigo dele( ) Tá preso de graça ( ) Só as más companhias( ) Começa a se envolver com eles( ) Influência ruim( ) Os amigos faz a cabeça deles( ) Os amigos dão conselhos ruins( ) Só entendem os amigos( ) Ele se influencia pra fazer o ruim( ) Tudo é influência negativa”
FAMILIARESAdolescentes
“ Depende do pai e da mãe( ) Não dão bom exemplo( ) Ele cresce pra seguir esse exemplo( ) Porque os pais não dão conselho( ) Não encaminha os filhos( ) Não ensina o certo( ) Não ensina a ser humilde( ) Pai e mãe são usuários( ) Mais é a relação dos pais”
Mães
“ Eu procurava tirar e ele não aceitava( ) Não aceitava conselhos( ) Depende da criação( ) Afasta os conselhos( ) A gente aconselha mas ele faz errado de novo( ) Não ouve conselhos( ) Não atende ninguém( ) Os pais tentam e eles não querem( ) Eles entra no mundo da marginalização( ) Eu não podia cuidar dele( ) Vivia no trabalho e ele na rua( ) Depende de casa( ) Pais separados( ) Eles se soltam depois( ) Ele cai na vida depois( ) Não escuta conselhos da mãe( ) Se ouvisse a mãe não errava( ) A gente peleja e eles não querem( ) Eles não tão nem aí( ) Falta de carinho dos pais( ) Desobediência( ) Não aceita os pais( ) Se aborrece com conselhos( ) Aí pronto( ) Não aceita nossas idéias( ) Não ouve ninguém de casa( ) Tudo gera incompreensão( ) A pessoa acaba fazendo( )Mnem sabe porque( ) Gera tudo de ruim( ) Pega no alheio( ) Agride os outros( ) Falta de apoio familiar( ) Os pais não ensinam eles( ) A estrutura familiar não é boa( ) Nada de bom acontece em casa( ) Falta acompanhamento( ) Eles mata( ) Rouba( ) Usa droga( ) Não tem uma pessoa pra apoiar em casa”
PSICOLÓGICAS
Adolescentes
“Outros é porque quer aparecer( ) Pra ficar respeitado( ) Porque não sabe pensar direito( ) Errar a gente erra porque errar é humano( ) Todo ser humano tem o direito de errar( ) Todo homem erra( ) O cara entra sem saber porque( ) Mesmo sabendo que é errado( ) O cara é inseguro( ) Maus pensamentos( ) Maus sentimentos( ) Desconfiança( ) Todo mundo falha( ) Do jeito que eu errei sem nem saber direito( ) Qualquer pessoa pode errar( ) Isso é só uma fase( ) Por fraqueza da cabeça( ) É da vida( ) É do mundo( ) Faz parte da idade( ) Doidice( ) Dá uma doida na cabeça( ) Um jogo da cabeça( ) O cara gosta desse negócio( ) Por aventura( ) Faz por gostar( ) Tem vontade( ) Dá prazer fazer( ) Sente prazer( ) Erro humano( ) Costume( ) Faz porque quer( ) Rouba e mata( ) Vai preso( ) Fraqueza do espírito( ) Se faz é porque quer( ) Não sei exato( ) Não pensa nas consequências da vida( ) O cara nem sabe porque faz”
Mães“ Faz porque dá na cabeça( ) Porque não sabe pensar( ) Não sabe defender suas idéias( ) Natureza de fazer o mal( ) O demônio chama( ) O demônio acusa( ) Pro diabo tudo é fácil( ) O diabo bota isso na cabeça deles( ) O diabo acusa pra ele fazer o que não deve( ) Não tem juízo( ) Não pensa( ) Falta juízo na cabeça( ) Não quer pensar( ) Revolta( ) Não tem precisão e faz( ) Faz maldade porque quer( ) É confuso( ) Pega no alheio( ) Ataca pai de família( ) Briga( ) Bate( ) Não precisa disso e ele faz( ) Tem sina de fazer o mal( ) É a natureza dele( ) Mesmo que não queira fazer( ) A pessoa as vezes obriga ele a fazer( ) A própria pessoa insiste( ) Insiste até ele fazer o mal( ) Natureza do demônio( ) Maldade( ) Ele se obriga e faz”
SOCIOECONÔMICAS
Adolescentes
“Tem uns que entra por necessidade( ) Falta emprego( ) Falta tudo( ) Por causa da condição financeira( ) Quer uma roupa( ) Quer curtir( ) A mãe e o pai não tem dinheiro pra ajudar( ) Até quer ajudar mas não tem como( ) Aí ele rouba( ) Não tem escola( ) Dificuldade financeira( ) Tudo isso influi( ) Não tem dinheiro e faz( ) Em casa não tem nada( ) Porque o mundo é sem trabalho( ) Falta muita coisa( ) Não tem condição aí vai( ) Não tem de onde ter dinheiro( ) Tem que ter escola( ) Trabalho( ) Pra não se envolver( ) Quando se soltar tem de ter escola( ) Tem de ter trabalho( ) Se não tiver ele faz de novo( ) Só por precisão( ) Faz besteira por precisão( ) Tenta roubar de novo( ) Comete até homicídio( ) Quando a mãe não dá dinheiro”.
Mães“ A gente ele querer as coisas e a gente não poder dá( ) Não tem emprego pra esses adolescentes( ) Se tivesse emprego eles botaria a cabeça no lugar( ) Não tem trabalho( ) O mundo do crime é mais fácil( ) Emprego é muito difícil( ) Sem o segundo grau não se emprega( ) O crime não precisa de diploma( ) No crime o dinheiro é fácil( ) Corre frouxo( ) Não precisa sacrifício nem suor( ) Coisa ruim é só o que tem a nossa volta( )O meio é baixo( ) Nosso meio social”
d) Distribuição das unidades de análise temáticas sobre PERSPECTIVA DE MUDANÇA
PESSOAL
Adolescentes
“ Se tiver força de vontade( ) Basta querer( ) Dizer não às drogas( ) Muita força de vontade( ) Só se ele quiser( ) Tem que querer mudar( ) Vontade própria( ) É só querer( ) Erguer a cabeça( ) Depende da pessoa( ) Muita vontade( ) Estudar( ) Ser uma pessoa boa( ) Arranjar emprego( ) Formar uma família( ) Tem que partir de le( ) Depende dele( ) Procurar um meio de vida( ) Casar( ) Ter responsabilidade( ) Batalhar( ) Isolar as más companhias( ) As drogas( ) Não fazer mal aos outros( ) Deixando os a,igos( ) Escutando os pais( ) Deixando as drogas( ) Procurar trabalho( ) Ganhar dinheiro sem roubar( ) Decidir que vai mudar( ) Depende só dele( ) Não depende de ninguém mais( ) Se tiver capacidade( ) Sozinho( ) Ele muda só( ) Depende do que ele faz( ) Se ele fizer por onde, muda( ) Se quiser mostrar, pode( ) Fazer o que é certo( ) Fazer coisas boas( ) Assim ele muda( ) Só depende dele( ) Se ele diz eu vou conseguir isso( ) Só eu consigo isso( ) Não praticar o erro( ) Andar sempre na linha( ) Se ele quiser de verdade( ) Se não fizer mais coisa errada( ) Depende de ter consciência( ) Deixar as coisas pra trás( )A boa vontade dele( ) Tem toda possibilidade( ) Basta ele decidir( ) Deve se afastar de tudo( ) Decidir mudar( ) A maneira é deixar as drogas( ) Deixar os maus amigos( ) Andar só( ) Sair dos grupos( ) Só basta ele querer( ) Força de vontade é a razão( ) Abandonar as drogas( ) Ficar sozinho( ) Depende do esforço dele( ) Basta ele querer ser direito( ) Querer é tudo( ) Depende só de mim( ) O próprio cara tem o poder”
Mães“ Se ficar um rapaz direito( ) Trabalhador( ) Estudioso( ) Se cuidar da sua família( ) Depende só dele( ) Se ele quiser, muda( ) Se fizer esforço( ) É só ele querer mudar demais( ) Se quiser vai estudar( ) Vai ser obediente( ) Andar no caminho direitinho( ) Todo mundo pode mudar( ) Se for obediente( ) Se obedecer a família( ) Ele larga dessa vida( ) Se ele é obediente merece confiança( ) Se ele atender a família, muda( ) Pode, ele querendo( ) O meu já está decidindo( ) Aí ele vai mudar( ) É só eles querer( ) Saindo da rua( ) Indo trabalhar( ) Procurar escola( ) Deixar as drogas( ) Se ele se ajeitar( ) Se recuperar( ) Se for um menino que escute( ) Assim ele queira( ) Ele querendo pode ser alguém( ) Pode até ser doutor( ) Ele pode mudar de vida( ) Querendo( ) Basta resolver( ) Querendo vai em frente( ) Depende deles( ) Só ele pode( ) Deve se aconselhar( ) Pensar mais( ) Querer mesmo mudar( ) Assim ele bote na cabeça( ) Se quiser obedecer( ) Colocar na cabeça que vai mudar( ) Querendo, sim( ) Depende muito dele( ) Quando ele quer mesmo( ) Quando ele entende querer( ) Ele não querendo, nada feito( ) Se ele entender mudar, ele muda( ) Depende da vontade de cada um( ) Só isso é o bastante( ) Ele vai ver que essa vida é sem futuro( ) Vai procurar coisa melhor( ) Procurar o caminho certo( ) Deixar esse caminho errado”
SOCIAL
Adolescentes
“A sociedade deve confiar( ) O pessoal deve confiar( ) Apostar na gente( ) Fazer um futuro pra gente( ) Dar força( ) Se ninguém confia nele, ele não muda( ) Compreensão( ) A gente tem que ter crédito( ) Tem que ter confiança( ) É sempre bom confiar( ) Aos poucos a pessoa muda( ) Basta dar uma chance( ) Todos merecem chance( ) A pessoa deve acreditar nele( ) Nós merecemos chance( ) Todos devem fazer isso( ) Tendo uma pessoa pra explicar as coisas( ) Dar ajuda( ) Dar uma força( ) Dar apoio( ) O menor precisa de chance( ) A pessoa deve dar seu voto( ) Olhar que ele mudou( ) Acreditar( ) A sociedade deve incentivar( ) Dar uma oferta( ) Ele vai e responde bem( ) Se a pessoa confia isso mexo com o menor( ) Ele se esforça mais( ) Quer agradar aquela pessoa( ) Se a pessoa depositar confiança( ) Ele percebe a mudança( ) Todo mundo quer confiança( ) Todo mundo se ajeita( ) As pessoas devem crer no menor( ) Isso é muito importante( ) As pessoas devem depositar fé( ) Se não, ele não muda( ) Tendo alguém que apoie( ) Dando uma condição( ) Dando estudo( ) Depende de todos( ) Dar chance pro infrator( ) Dar emprego( ) Dar oportunidades( ) Não adianta só eu querer( ) Não deixar ele passar fome( ) Com oiportunidade ele muda( ) Tem que apostar( ) Isso é tudo( ) Só dando crédito( ) Ele se esforça com a confiança( ) Alguém tem de confiar( ) Se não, ele fica igual( ) Todo mundo é digno de confiança( ) Se eu ficar só trancado, não mudo”
Mães“Tudo no mundo tem sua vez( ) Seu voto de confiança( ) A gente deve dar sempre confiança( ) Por mais errado que ele seja( ) Eu penso que isso faz ele mudar( ) Tem que ter chance( ) O apoio pra ele serve
muito( ) Tendo trabalho pra ele( ) Ele não fica pensando besteira( ) Se tiver estudando( ) Se aprender um curso( ) Não tem tempo pra bobagem( ) Hoje os empregos são poucos( ) O adolescente tem de ter formatura( ) Depende da sociedade acreditar nele( ) Todos têm direito a uma chance( ) Merece mais chance da sociedade( ) Merece confiança do povo( ) Muito conselho das pessoas( ) Muita conversa( ) Ele é um ser humano( ) Primeiro, ele é um adolescente( ) A sociedade deve fazer por ele( ) Deve dar chance( ) Confiança( ) As pessoas conversando( ) Orientando( ) Mostrando o caminho( ) Merece uma oportunidade( ) Toda pessoa merece fé( ) Receber conselhos de todos( ) O governo dando mais chances( ) Estudo e trabalho( ) Se ele tiver um estudo melhor( ) Conversar com os profissionais( ) Depende das pessoas( ) Todos têm que ajudar( ) Devemos cuidar do adolescente( ) Ajuda das pessoas( ) Um empurrãozinho( ) Uma força( ) As pessoas devem fazer sua parte( ) Se as autoridades estendem a mão amiga( ) Dar emprego( ) Dar oportunidade( ) Muitas escolas( ) Todos merecem sua vez( ) Merecem nova chance( ) Não devemos perder a confiança( ) A gente tem que estender a mão( ) Se a gente não confiar, é pior( ) A sociedade deve dar apoio( ) Deve dar uma veizinha”
FAMILIAR
Adolescentes
“Apoio da família( ) Compreensão dos pais( ) Ajuda( ) Ajuda dos pais( ) Os pais apoiando( ) É preciso a família olhar o menor( ) Não ficar contra ele( ) Conversar com ele( ) A conversa é importante( ) É o melhor caminho( ) A confiança dos pais( ) Eles confiando é bom( ) Quando ele sair vai se recuperar( ) A família torce pelo filho( ) Os pais acompanhando o filho”
Mães“ Se os pais não acompanhar, é difícil( ) A mãe tem um coração mais seguro naquele filho( ) Tem confiança nele( ) Que ele vai fazer direitinho( ) Que ele vai em frente( ) A mãe luta pelo filho( ) Ter muita compreensão da família( ) Tem de partir de casa( ) Eu confio no meu filho( ) Eu aconselho ele”
INSTITUCIONAL
Adolescentes
“Com o trabalho das unidades( ) Apoio da unidade( ) Setor técnico( ) As palestras, principalmente( ) Psicóloga( ) Os técnicos da unidade( ) Às vezes até remédio( ) Pra mudar basta cair numa Febem( ) A Febem ajuda o menor( ) Aprende a pensar( ) A ajuda vem desse lado( ) Ficar refletindo( ) Ouvir os conselhos( ) Tirar proveito de estar preso( ) Curso profissionalizante( ) Formar outras idéias( ) Idéias boas( ) Quando sair, tá mudado ( ) Não erra mais”Mães“Se for bem acompanhado muda( ) Se ficar numa unidade, pagando( ) Se for acompanhado por uma equipe ( ) Se tiver pagando seu crime( ) Tem que ter bom acompanhamento( ) Aprender uma profissão na unidade ( ) Assim, ele muda( ) Deve pagar pelo que fez( ) Sofrer um pouquinho( ) Isso é importante( ) Ele vai refletir e mudar( ) Muitos sai com a vida melhor( ) Eles têm coisas boas aqui que a rua não dá( ) Os coordenadores ajudam( ) Cuidam deles( ) Os funcionários tiram eles do crime, conversando( ) A mão amiga é também essas casas( ) Os cursos que ele faz aqui”
ESPIRITUAL
Adolescentes
“Nada é impossível pra Deus”
Mães
“ Só pelo poder de Deus( ) Em primeiro lugar está Jesus( ) Nada pra Deus é impossível( ) Se tiver Deus no coração, ele muda( ) Quem tem Deus tudo pode( ) Se entrar no caminho de Deus( ) Ouvir a palavra de Deus( ) Rezar pelos maus pensamentos( ) Tudo Deus mandará( ) Só Deus muda tudo( ) Só Deus corrige a perdição( ) Deus está em primeiro lugar”
e) Distribuição das unidades de análise temáticas sobre PERCEPÇÃO DO EU
AUTOPERCEPÇÃO
Adolescentes
“Sou tranquilo( ) Pessoa tranquila( ) Alegre( ) Comum( ) Já usei droga( ) Roubei( ) Fiz muitas coisas( ) Me comparo com uma pessoa normal( ) Não fumo cigarro( ) Sou igual a todos( ) Não uso drogas( ) Sou da paz( ) Não gosto de polícia( ) Não gosto de maldade( ) Não gosto de violência( ) Sou envolvido com droga( ) Gosto da vida calma( ) Gosto da alegria( ) Gosto da liberdade( ) Sou esquentado( ) Não tenho muito apoio da família( ) Do meu pai( ) As vezes não mereço confiança( ) Sou carente( ) Gosto da minha mãe( ) Gosto da liberdade( ) Eu não bebo( ) Gosto de brincar( ) Me acho legal( ) Gosto de conversar( ) Sou ambicioso( ) Gosto das minhas coisas( ) Não quero mudar( ) Não mereço confiança( )Eu devia ter mais juízo( ) Sou mais cabeça( ) Tenho um filho( ) Sou mais crânio( ) Sou um cara amigo( ) Legal( ) Sou amigo( ) Não procuro confusão( ) Sincero( ) Caridoso( ) Tento ajudar os outros( ) O que eu quero ser já tô fortemente( ) Não tenho mais nada pra mudar( ) Eu me identifico como infrator( ) Sou maduro( ) Amadureci( ) Tenho um problema( ) Não ajo mais por impulso( ) Sou simples( ) Sou de uma família simples( ) Uma família caridosa( ) Já fui dependente químico( ) Não completei os estudos( ) Entrei no mundo das drogas( ) Não preciso mais de droga( ) Tenho um vazio( ) Sei me fazer feliz( ) Vou conforme a necessidade( ) Sou amigo( ) Legal( ) Faço amigos( ) Não brigo( ) Procuro amizades( ) Ajudo os outros( ) Não tem mais pra mudar( ) Já sou como quero( ) Já sou a pessoa certa( ) Estou mudado( ) Infrator( ) Sou um infrator( ) Sou um elemento calmo( ) Não faço mal a ninguém( ) Sou humilde( ) Gosto do certo( ) Não dou valor coisa errada( ) Gosto de ajudar( ) Gosto de mim( ) Minha família gosta de mim( ) Estou mudado( ) Sou um ser humano( ) Tenho tatuagem( ) Passagem pela Febem( ) Tenho outra mente( ) Tenho outros pensamentos( ) Sou maior de idade( ) Eu vivo trancado( ) Sofrendo( ) Sou namorador( ) Brincalhão( ) Sou pensativo( ) Não sou drogado( ) Não sou usuário( ) Pensativo( ) Meu jeito é calmo( ) Penso muito antes de agir( ) Tenho um jeito esquentado( ) Não consigo me controlar( ) Faço e depois me arrependo( ) Tenho um homicídio( ) Sou preso( ) Antes eu era rebelde( ) Tinha vida desgraçada( ) Hoje sou calmo( ) Paciente( ) No meu normal sou sensível( ) Qualquer coisa eu choro( ) Eu drogada sou violenta( ) Chata( ) No consciente sou legal( ) Qualquer coisa me magôo( ) Droga, nada me dói( ) Sou impulsiva( ) Faço sem pensar( ) Não sou falsa( ) Falo sem pensar( ) Não vejo as consequências( ) Mereço confiança( ) De verdade( ) Sou mãe( ) Sou uma infratora( ) Não uso droga( ) Sou boa( ) Órfã( ) Humilde( ) Sensível( ) Não tenho maldade( ) Não guardo rancor( ) Não gosto de marginalidade( ) Não uso álcool( ) Tive educação boa( ) Sou educada( ) Estudiosa( ) Sou madura( ) Ninguém reclama de mim( ) Sou satisfeita comigo( ) Todos gostam de mim( ) Sei entrar e sair( ) Ninguém tem rancor de mim( ) Entro em união com todos( ) Sou querida( ) Amo meus irmãos( ) Sou uma pessoa que vale a pena( ) Não quero mudar( ) Sou legal( ) Sou simpática( ) Não faço mal aos outros( ) Não pego droga( ) Bebo pouco( ) Me dou bem com todos( ) Sou legal( ) Meu jeito é criar amigos( ) Falo com todos( ) Sou todo calado( ) Não dou papo( ) Pensativo( ) Gosto de refletir( ) Tô satisfeito comigo( ) Sou sempre igual( ) O povo me acha legal( ) Desobediente( ) Preso( ) Tô sem liberdade( ) Sem família( ) Sou infrator( ) Nós somos infratores( ) Sou menor de idade( ) Sou trabalhador( ) Já fumei maconha( ) Hoje mais não( ) Sou gente fina( ) Gosto de mim( ) Muito sensível( ) Gosto de estudar( ) Ia pra aula todo dia( ) Não fazia coisa errada( ) Me arrependo do que fiz( ) Arrependida( ) Sou calmo( ) Sou mais eu( ) Calmo( ) Penso muito( ) Pensativo( ) Me arrependo muito( ) Sou simpático( ) Faço coisas boas( ) Sou capaz de ser bom( ) Sou simples( ) Sou um adolescente( ) Sou a minha vida( ) Os meus crimes( ) Mas eu mereço fé( ) Estou mudado( ) Cometi um crime( ) Sou comportado( ) Nada de violência( ) Só na paz( ) Não deixo ninguém mexer comigo( ) Não gosto de briga( ) Fiz o errado( ) Sou um estranho( ) Me sinto outra pessoa( ) Só que já tô seguindo meu caminho( ) Sou infrator( ) Adulto( ) As vezes sou calmo( ) Só na minha( ) Não gosto de confusão( ) Rezo todo dia( ) Meu jeito é assim( ) Dou valor jogar bola( ) Ir pra escola( ) Já mudei demais( ) Eu era diferente( ) Agora sou outro( ) Sou mais eu”
IDEALIZADA“Pretendo mudar de vida( ) Terminar meus estudos( ) Trabalhar( ) Renovar minha vida( ) Gostaria de ser estudiosa( ) Trabalhadora( ) Ganhar a vida com dignidade( ) Ser digna( ) Não queria ser impulsiva( ) Queria pensar mais( ) Vou melhorar( ) Quero casar( ) Me dedicar a minha esposa( ) Meu trabalho( ) Minha família( ) Quero ser livre( ) Mudar( ) Casar( ) Cuidar do meu filho( ) Ser diferente( ) Quero pensar menos( ) Ser obediente( ) Obedecer pai e mãe( ) Deixar os maus pensamentos( ) Gostaria de ser mais alegre( ) Ganhar dinheiro suado( ) Dignamente( ) Ajudar minha mãe( ) Só ajudar ela( ) Não quero mais roubar( ) Não fazer coisa errada( ) Nem usar droga( ) Quero ficar melhor( ) Não fazer mais besteira( ) Não errar de novo( ) Quero ser certo( ) Gostaria de mudar( ) Vou procurar escola( ) Trabalho( ) Arrumar uma mulher( ) Ajudar meu pai e minha mãe( ) Quero minha liberdade( ) Quero ir pra perto do meu pai e minha mãe( ) Quero ser livre( ) Peço a Deus ser livre( ) Tô tentando ser diferente( ) Aliás, quero ser( ) Ser normal( ) Pra cá não volto mais( ) Nunca mais vou roubar( ) Nem usar droga( ) Vou voltar pra escola( ) Pegar um pouco a palavra de
Deus( ) Quero ser comum( ) Igual aos outros( ) Não vou mais vacilar( ) Tenho muitos objetivos( ) Quero pôr em prática( ) Mudar a vida( ) Não quero ser mais desobediente( ) Não vou errar( ) Vou praticar o que aprendi( ) Pretendo ser livre( ) Trabalhar( ) Levar uma vida normal( ) Diferente( ) Ser outro( ) Um cara igual a todos( ) Estudar muito( ) Trabalhar bastante( ) Não correr da polícia( ) Não matar os outros( ) Nem roubar( ) Gostaria de ser mais bom( ) Quero só fazer o certo( ) Ser obediente”
HETEROPERCEPÇÃO
Adolescentes
“As pessoas pensam que ele nunca muda( ) Que ele só quer fazer o mal( ) Não pensam o que passa na cabeça dele( ) Pensam que ele só pensa o ruim( ) Não pensa que a gente sofre( ) Vê como um monstro( ) Marginal( ) Vagabundo( ) Não confia( ) Não respeita( ) Vagabundo( ) Ladrão( ) Por onde a pessoa passa, comenta( ) Já foi presidiário( ) Nunca respeita( ) Pensa que não muda mais( ) Não tem mais jeito( ) Deixa ele aí mesmo( ) Não acredita( ) Pensa só besteira( ) Vê como perigoso( ) Acha muita coisa( ) Mal visto pela sociedade( ) Vê como ladrão( ) Desconfia( ) Mal visto pela polícia( ) O cara tá ali porque quer( ) Não gosta de ninguém( ) Faz aquilo por prazer( ) Quase não gosta( ) Chama a gente de vagabundo( ) Quando vê a gente na rua, fala( ) Sai de perto( ) Não confia( ) Tem medo( ) Não gosta( ) O menor é isso e isso outro( ) Que pode fazer qualquer coisa( ) Besteira( ) É marginal( ) Como sai na televisão( ) Ladrão( ) Fumador de maconha( ) Matador( ) Não mereçe confiança( ) Senão ele rouba de novo( ) Sai de perto( ) Vê como monstro( ) Preconceito( ) Olham diferente( ) Eu me sinto até mal( ) Pensa que ele não muda( ) Não merece mais chance( ) Critica ele( ) Não ajuda( ) Discriminam( ) Falam mal( ) Acha que é dependente( ) Comete delitos( ) Olha diferente( ) Muita discriminação( ) Pensa que vai ser sempre ruim( ) Permanecer no erro( ) Não tem jeito( ) Não ligam pra infância dele( ) A sociedade discrimina( ) O mundo também( ) Infrator( ) Não liga( ) Não se importa( ) Pensa o pior possível( ) Pra sociedade tanto faz( ) Acha bom que ele vá preso( ) Não tá nem vendo( ) Pensa o pior do elemento( ) Vagabundo( ) Não tem crédito( ) Merece morrer( ) Não acredita( ) Pensa que é ruim( ) Monstros( ) Só pensa besteira( ) Não aceita( ) Não gosta( ) Imagina coisas ruins( ) Não bota fé( ) Não quer por perto( ) Pensa que é perigoso( ) Sem coração( ) Sem amor( ) Quer o mal pra ele( ) Evita ele( ) Vê como monstro( ) Marginal( ) Merece a morte( ) Tem medo dele( ) Não aposta nele”
Mães“ Eu não confio no que eu não conheço( ) Só pensam coisa errada( ) Fulano é filho de fulano( ) Fulano faz aquilo( ) Só pensa maldade( ) Não dão força( ) Ninguém apoia( ) Critica( ) O filho dela faz aquilo( ) Pensa que ele faz errado( ) Rouba( ) Assalta( ) Mata( ) Discriminam( ) Não têm direito a nada( ) Discriminam as crianças( ) Que ele só faz o erro( ) Querem agredir o menor( ) Não dão confiança( ) Não aceita( ) Não apostam( ) Pensam que ele só erra( ) Não quer por perto( ) Pensa que ele só faz o mal( ) Tem medo( ) Tem cuidado( ) Sai de perto( ) Rouba as coisas( ) Não deseja nada de bom pra ele( ) Uma pessoa qualquer( ) Querem fazer o mal( ) Bando de monstros( ) Não merece direito a nada( ) Querem colocar ele no xadrez( ) Querem logo matar ele( ) Não aceita( ) Teme( ) Não quer confiar( ) Não tem merecimento( ) Menino perdido( ) Critica( ) Difícil( ) Não quer saber( ) Tem medo( ) Acha traiçoeiro( ) Pode atacar( ) Malha( ) Malda( ) Julga( ) Bichos( ) Principalmente a alta sociedade( ) Marginal( ) Fica julgando( ) O filho dela é ladrão( ) Condenam( ) A mãe não liga( ) Todo mundo me olha( ) Diz coisas ruins( ) Coisas más( ) Diz que é marginal( ) Pensa o que não é( ) Pensa coisa errada( ) Bota o nome dele em todo canto( ) Só pensa mal( ) Quer que ele fique preso direto( ) Trancado( ) Acha que ele não se recupera( ) Não aposta mais( ) Que todos são iguais( ) Todos ruins( ) Torce pra ele morrer( ) Diz que ele só anda no erro( ) Seu caminho deve ser a morte( ) Só diz isso( ) Medo( ) Quando vê um adolescente mal vestido e sujo, guarda logo a bolsa( ) Guarda as coisas( ) Muito medo( ) Pensa assim( ) Não gosta( ) Não quer ver( ) Que não muda nunca( ) Eles não mudam( ) Dali pra pior( ) Muita raiva( ) Não sabe a reação dele( ) Vagabundo( ) Monstro¨.
f) Distribuição das unidades de análise temáticas sobre EXPRESSÕES SUBJETIVAS
SENTIMENTOS
Adolescentes
“Gostaria que minha mãe fosse mais feliz( ) Me sinto egoísta( ) Minha família sofre( ) Eu sofro aqui( ) As pessoas que gostam de mim sofrendo( ) É ruim viver aqui( ) É ruim viver preso( ) Eu sinto viver a metade da minha adolescência preso( ) Eu sofro por estar punido( ) É muito ruim isto( ) Eu me emociono com a minha mãe( ) Eu tenho saudade dela( ) Ela pensa em mim e nem come direito( ) O menor fica com mais raiva( ) O menor fica doidinho( ) Fica cheio de raiva( ) Fica cheio de dor( ) Porque aqui, ave maria, é muito ruim( ) É muito triste ser infrator( ) A família muitas vezes se sente incapaz de ajudar e sofre”
Mães“Eu acho triste ver um adolescente drogado( ) É uma tristeza( ) Doloroso( ) Muita dor( ) É muito difícil pra mim( ) Sofro muito com isso( ) Faço sacrifício pra acompanhar ele aqui( ) É horrível ver ele preso( ) Eu sofro( ) As mães sofrem( ) Os pais sofrem quando vêem o filho na pior( ) Esse menino sempre foi muito trabalhoso( ) Estou cansada de lutar com ele( ) Ele nunca obedece( ) Cansaço( ) Eu sinto pesado( ) É um peso( ) Eu estou pra morrer( ) Eu canso de tentar( ) É muito pesado mesmo( ) Pra mim é uma tristeza( ) Um sofrimento( ) Desde que aconteceu isso eu vivo assim( ) Esse é meu maior sofrimento( ) A minha dor( ) Uma dor grande( ) Só sabe quem passa o mesmo( ) Hoje eu tô sofrendo e ele também( ) Ele sabe que eu tô sofrendo( ) A gente fica magoada( ) A mãe fica sentida( ) Nem sabe mais o que faz( ) Eu cansei de dar lição a ele( ) A mãe leva culpa( ) Se sente culpada( ) Eu não tenho culpa se ele é assim( ) Tenho é vergonha( ) Muita vergonha( ) A pessoa fica angustisada( ) Preocupada( ) A pessoa fica doente( ) Triste( ) Tanto amor eu dei pra ele( ) Uma peça rara que saiu de dentro de mim( ) Foi um golpe( ) Um choque maior do mundo( ) Como se eu tivesse levado uma facada( ) A polícia quase mata meu filho( ) Foi um choque horrível( ) É a maior dor( ) Pra mim e pra todas as mães daqui( ) Preocupada( ) Muita preocupação( ) Sofrimento vivo( ) Muito magoado( ) Pra mim é o fim( ) Um golpe miserável( ) Não suporto ver ele nessa vida( ) É uma cruz que carrego( ) Os pais sofrem demais( ) Tá sendo muito difícil( ) Uma dureza de vida( ) Acho isso uma dor( ) Nunca imaginei andar por certos cantos( ) Tô lutando muito( ) Orando( ) Peço ajuda de Deus( ) Me dê força( ) Eu me sinto mal( ) A vida ficou pior pra nós( ) Esse prejuízo me faz sofrer( ) É um martírio( ) Meu maior desgosto( ) Meu coração dói com essa arrumação( ) É muito ruim passar por isso( ) As coisas tá muito difícil( ) É ruim demais( ) Nós não temos paz( ) Me falta paz( ) Me falta alegria( ) Quase não acredito que meu filho ia ser um menor desses( ) Eu sofro todo dia( ) Ninguém sabe o tanto( ) Só Deus tem misericórdia de nós( ) É uma coisa horrível pra família( ) Minha família sofre( ) Porque a família também sofre( ) É muita vergonha( ) Humilhação”
PENSAMENTOS
Adolescentes
“Ninguém é obrigado ser o mesmo( ) A gente muda o modo de pensar( ) Negócio de confusão leva ninguém a nada( ) O nêgo tá tudo no mesmo barco( ) Aqui o nêgo tem que ser irmão( ) Amigo é o pai e a mãe da gente( ) Ninguém é diferente de ninguém( ) Ninguém é mais que ninguém( ) Ninguém sabe mais que ninguém( ) Não concordo com a discriminação( ) Tem muita droga no mundo( ) Muito infrator tá aqui de inocente( ) Não sei o que pode acontecer daqui pra frente( ) Na liberdade o cara deve refletir( ) Não vale a pena usar droga( ) Ato infracional é uma coisa negativa( ) O mundo do crime não leva ninguém a nada( ) A pessoa tem valor( ) Ato infracional é viver no mundo das drogas( ) Tem muitos fora que era pra tá qui( ) Tem muitos aqui que era pra tá lá fora( ) É preciso procurar emprego( ) O mundo é mais de adolescentes do que de adultos( ) O adolescente devia ter mais paz( ) Deixar as drogas( ) Se unir à família( ) Se você sair daqui e não mudar, não muda nunca( ) Aquilo que a gente faz atinge muito nosso futuro( )Muitas vezes prejudica( ) Com experiência vai aprendendo( ) Se não aprender o mundo ensina( ) Acho que 6 meses não ajeita ninguém( ) 2 anos é tempo suficiente pro adolescente se erguer( ) Erguer a cabeça e mudar de vida( ) Na internação, qualquer coisa pode acontecer a todo momento( ) Não tem ninguém melhor do que ninguém( ) Aqui a gente tem tempo pra pensar muito( ) Pensa como arranjar um emprego lá fora( ) Na internação o cara fica sem usar droga( ) Só comendo e dormindo( ) Estudando( ) Trabalhando também( ) Eles ensinam a pessoa a pensar a sua vida( ) Muitos aprendem a lição”
Mães
“ É importante que eles mudem( ) O diálogo é importante( ) Antigamente era fácil lutar com os filhos( ) Hoje filho não obedece mais( ) As mães lutam pra educar os filhos( ) Muitos têm lugar de pai e mãe( ) As mães sempre educam seus filhos( ) Eu tenho 9 filhos( ) Eu respondo por pai e mãe( ) A mãe precisa trabalhar( ) As mães dão conselho pro bem( ) A mãe sempre quer o bem do filho( ) Muitos filhos mudam( ) As vezes a mãe cria o filho sem pai( ) A gente só pode ser julgada por Deus( ) Na terra só quem pode julgar é o Juiz( ) Como ser humano a gente é um pedaço de carne( ) Não pode julgar os outros( ) Esse mundo não tem o que dar pro adolescente( ) Se o mundo novo não der o mundo velho não dá( ) Aqui eles misturam todos os adolescentes( ) Eles colocam todos num canto só( ) Não separam os maior dos menor( ) Tirar a vida de uma pessoa é crime( ) Crime merece castigo( ) Muitos adolescentes erram( ) Eles fazendo essas coisas e vindo pra um colégio desses não leva vantagem( ) Toda sociedade é culpada de tudo isso”