Escola Municipal Marechal Deodoro Prof: Lidiana Chaikoski ...
PRIMEIRAS AÇÕES DO MINISTÉRIO DA...
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CAPÍTULO DOIS
PRIMEIRAS AÇÕES DO MINISTÉRIO DA AGRICULTURA
A criação da Subestação Experimental de Inseminação Artificial pelo Governo
do Estado de São Paulo em 9-11-1938 foi o estímulo para que o Ministério da
Agricultura resolvesse fomentar a inseminação artificial no Brasil para o
melhoramento zootécnico dos rebanhos. Em 1941 aquele órgão federal delegou à
Estação Experimental do Instituto de Biologia Animal (IBA)1 em Deodoro, RJ, os
estudos relativos à aplicação da inseminação artificial em todas as espécies
domésticas de interesse econômico, de pequeno, médio e grande porte2.
O diretor do Instituto de Biologia Animal era o veterinário Argemiro de
Oliveira, adepto do método de inseminação artificial e que prestou inestimável
apoio aos trabalhos entregues ao veterinário João Ferreira Barreto, responsável
pela Estação Experimental, auxiliado pelo veterinário Antônio Mies Filho. A
Estação Experimental do IBA deu início aos trabalhos experimentais de
inseminação artificial e da fisiologia da reprodução em 1942.
Os Departamentos de Produção Animal dos governos estaduais criaram
seções destinadas ao desenvolvimento de trabalho semelhante ao realizado pelo
Ministério da Agricultura em nível federal e os pioneiros foram os Estados de
Minas Gerais e do Rio Grande do Sul. Na estação Experimental de Deodoro foram
desenvolvidas pesquisas relativas à inseminação artificial e aos problemas
reprodutivos das espécies domésticas e os primeiros ensaios versaram sobre
inseminação artificial e ovulação experimental na coelha3. Os primeiros trabalhos
de transporte de sêmen de coelho foram efetuados por Barreto e Mies Filho,
1 O Instituto de Biologia Animal foi criado pelo Decreto nº 23.047, de 8-8-1933, subordinado à
Diretoria Geral de Pesquisas Científicas do Ministério da Agricultura. O objetivo era investigar em
todo o país as doenças que devastavam os animais domésticos, bem como promover cursos de
especialização para os médicos veterinários diplomados por escolas do Brasil. Em 1934, com a
criação do Departamento Nacional de Produção Animal, aquele órgão ficou subordinado a esse
departamento (DNPA). 2 Mies Filho, A.; J.F. Barreto. Noções sobre Reprodução dos Animais e Inseminação Artificial.
Rio de Janeiro, Ministério da Agricultura, 1949, 334p. 3 Mies Filho, A.; J.F. Barreto. Inseminação Artificial no Coelho. Bol. Ins. Art., v.1, n.2, p. 129-136,
dezembro de 1944.
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quando colheram e processaram sêmen por gelatinização em Belo Horizonte e
transportaram por via férrea para inseminação de coelhas na criação da Estação
Experimental do IBA em Deodoro, RJ.
Figura 11. Seção de Biologia Animal Aplicada do Instituto de Biologia Animal (IBA) do
Ministério da Agricultura, localizado em Deodoro, RJ. Fonte: Bol. Ins. Art., n.3-4, v.4-5, 1947.
Em 1942, foi realizado o primeiro experimento de transporte de sêmen
bovino refrigerado a longa distância. O veterinário do Ministério da Agricultura e
pioneiro da inseminação artificial em Pernambuco, José Wanderley Braga coletou e
processou o sêmen de um touro em Recife e enviou por avião de linha comercial
até a Estação Experimental de Deodoro, RJ, onde foi avaliado e o relatório enviado
ao Ministro da Agricultura. Segundo o relatório assinado por João Ferreira Barreto,
as condições de vitalidade do sêmen estavam ótimas, apesar dos problemas
enfrentados durante o transporte4. Graças a este trabalho pioneiro foram
efetuadas remessas de sêmen refrigerado de touros alojados no Posto de
Inseminação Artificial do Km 47, para vários estados utilizando as diversas vias de
transporte. Postos localizados em Aracaju e Fortaleza recebiam sêmen refrigerado
4 Braga, José W. Uma Demonstração Prática da Possibilidade de Transporte de Sêmen
Conservado. Bol. Sec. Agr. Ind. Com. Pernambuco, IX, p.7-12, 1942.
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via aérea. Regiões mais próximas ao Rio de Janeiro recebiam o sêmen por via
férrea e em veículos do próprio Ministério da Agricultura.
PRIMEIROS TRABALHOS PRÁTICOS EM OVINOS
Em 1942, por iniciativa própria o criador Fernando Chagas Riet instalou um
posto de inseminação artificial em ovinos na sua Estância Camoaty, em
Uruguaiana, RS. Foi o primeiro posto particular de inseminação em ovinos do país
e para executar os trabalhos ele contratou um técnico estrangeiro, o veterinário
uruguaio Julio Riet, professor da Faculdade de Veterinária de Montevidéu, que
tinha experiência na aplicação da técnica naquele país5. Foi o início da prática de
inseminação artificial em grande escala em ovinos no Brasil e, em 1943, Riet
utilizou como doador de sêmen um carneiro grande campeão da raça Merino
Australiano que fora adquirido na Exposição de Palermo, na Argentina.
Devido a uma forte seca que atingiu a região naquele ano, foram empregados
somente 17 dias de trabalho em 1.056 ovelhas, mesmo assim foram obtidos 530
cordeiros. Seu esforço foi coroado de êxito quando em outubro de 1945, na
Exposição Internacional de Animais realizada em Uruguaiana, obteve o primeiro
campeão carneiro Merino Australiano oriundo de inseminação artificial. O
proprietário da Estância Camoaty fez a seguinte declaração ao Ministério da
Agricultura, sobre o uso da inseminação artificial:
“Graças à inseminação artificial, os rebanhos da nossa estância tem
progredido de tal forma, que nos orgulhamos pelo fato de nossa produção
de lã sempre obter na Cooperativa de Lãs, os preços mais altos que se
pagam no estado. Os nossos carneiros, que apresentamos anualmente nas
exposições promovidas pela Associação de Criadores de Ovinos do Rio
Grande do Sul, a ARCO, têm obtido sempre os prêmios de campeões e
prêmios conjuntos, como na Exposição de Bagé, no ano de 1949 e na
última exposição de Porto Alegre, - e todos são produtos de inseminação
artificial”6.
5 Inseminação Artificial na Estância Camoatí, R. G. do Sul. Bol. Ins. Art., v.1, n.1, p.105, julho-
setembro de 1944. 6 Mies Filho & Barreto, p. VI-VII, 1949.
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Graças ao trabalho pioneiro de Fernando Chagas Riet, outros criadores
implantaram postos de inseminação em suas propriedades. Em 1944, o conhecido
diplomata e político brasileiro João Batista Luzardo, inseminava em torno de 2.200
ovelhas em sua Estância São Pedro em Uruguaiana. Também em 1944, a Estância
Vila Carlota de propriedade de Maria Riet D’Arriaga e Filho, situada próxima a
Estância Camoaty, contratou o veterinário uruguaio Anildo Supparo que inseminou
1.445 ovelhas naquela propriedade. No ano seguinte eram 1.660 ovelhas
inseminadas pelo mesmo técnico uruguaio. Em 1945, Supparo conheceu o médico
veterinário João Ferreira Barreto, que estava executando trabalho experimental
sobre inseminação de ovinos na Estância Camoaty7.
Figura 12. Carneiro Merino Australiano “Camoaty 037”, Campeão da Exposição Internacional
de Uruguaiana, realizada em outubro de 1945, de propriedade de Fernando Chagas Riet e
fruto da inseminação artificial. Fonte: Bol. Ins. Art., n.1, v.3, 1945.
Com a criação das Cooperativas de Lãs nos principais municípios produtores
de ovinos do RS, os criadores se organizaram e passaram a obter melhores preços
pela produção, ocorrendo um estimulo para o uso da inseminação artificial no
7 Notas e Comentários. Breve Reseña de los Trabajos de Inseminación Artificial, Realizados
en La Estância “Vila Carlota”, Propriedad de La Sra. Maria Riet D’Arriaga e Hijos, Situada en
el Município de Uruguaiana, 3er. Distrito. Bol. Ins. Art., v.1, n.3, p.114-116, 1945.
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melhoramento zootécnico, onde mais tarde as próprias cooperativas fomentavam
a aquisição de carneiros8, com a orientação técnica da ARCO.
Em 1949, no RS nasciam milhares de cordeiros de inseminação artificial
graças ao trabalho dos próprios criadores. Algumas fazendas chegavam a
inseminar mais de duas mil ovelhas por estação reprodutiva. O Dr. Antônio Saint
Pastous de Freitas, médico e criador no município de Alegrete, RS, enviou carta ao
Ministério da Agricultura, expondo seus comentários a respeito dos resultados que
obteve no rebanho de ovinos na Fazenda Posto Velho com esse método:
“Iniciamos a inseminação há três anos passados, partindo de um rebanho
comum, de cruza merino-australiano. Nos dois primeiros meses foram
inseminadas 2.600 ovelhas, do que resultou uma produção de 2.012
cordeiros. No corrente ano, foram inseminadas 1.500 ovelhas; acrescida
essa produção às dos anos anteriores, estaremos com um rebanho já
produto exclusivo da inseminação, com todas as vantagens desse método
de padronização racial. Da primeira produção correspondente ao ano de
1949, foram selecionados pelo Dr. Caio Poester 50 carneiros e 90
borregas, para início de formação de um plantel padronizado. Esta é a
valiosa opinião do Dr. Poester sobre os produtos de inseminação nos dois
primeiros anos: as características raciais e o tipo de lã revelam acentuada
preponderância das qualidades do reprodutor”9.
PRIMEIROS CURSOS DE INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL
Em 1943, foi realizado o primeiro curso de inseminação artificial no Brasil,
para técnicos do Ministério da Agricultura e de outras instituições públicas. O
curso foi criado através da Portaria no. 752 de 9-9-1942 e mais tarde foi instalado
nas suas 24 unidades didáticas. Tinha a duração de três meses, com aulas teóricas,
além de estágios práticos e envolvia todos os aspectos científicos do processo
reprodutivo para a aplicação da técnica da inseminação artificial10.
8 Notas e Comentários. Entrevista do Embaixador Batista Luzardo, Sobre os Trabalhos de
Inseminação Artificial Realizados no Rio Grande do Sul. Bol. Ins. Art., v.1, n.3, p.111-114, 1945. 9 Mies Filho & Barreto, p. VI, 1949. 10 Notas e Comentários – Curso de Inseminação Artificial. Bol. Ins. Art., v.1, n.1, p.93-96, 1944.
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Era necessário capacitar mão de obra auxiliar em número suficiente para
poder expandir a técnica e o primeiro curso para capacitação de inseminadores
práticos foi realizado no ano
de 1944 na Fazenda
Experimental Cinco Cruzes,
em Bagé, RS, pertencente ao
Ministério da Agricultura. O
curso teve a duração de
quatro semanas, com aulas
teóricas e práticas e foi
ministrado pelo veterinário
Antônio Mies Filho para um
grupo de cinco alunos11.
Entre os anos de 1942 e 1949,
o Ministério da Agricultura ministrou 24 cursos de inseminação artificial para 318
alunos, distribuídos nos seguintes módulos: 7 cursos avulsos para técnicos de nível
superior com 74 alunos, realizados no Rio de Janeiro; 11 cursos avulsos práticos
com 182 alunos realizados no Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul; 4
cursos rápidos para treinamento de inseminadores de bovinos com 24 alunos
realizados em Minas Gerais e Rio Grande do Sul e 2 cursos avulsos para
inseminadores práticos de ovinos, com 38 alunos, administrados no Rio Grande do
Sul12. Todos os cursos foram ministrados por veterinários do Ministério da
Agricultura.
PRIMEIRO POSTO OFICIAL DE INSEMINAÇÃO EM OVINOS
Em 1943 foi instalado o primeiro posto oficial de inseminação artificial em
ovinos do Brasil na Fazenda Experimental Cinco Cruzes em Bagé, RS, pertencente à
Divisão de Fomento da Produção Animal do Ministério da Agricultura. Foi à base
para a expansão da inseminação artificial em ovinos nos rebanhos gaúchos. João
11 Bol. Ins. Art., v.1, n.1, p.93-96, 1944. 12 Mies Filho & Barreto, p. 295-296, 1949.
Figura 13. Antiga Fazenda Experimental Cinco Cruzes,
hoje Embrapa Pecuária Sul, Bagé, RS. Fonte da
imagem: arquivo do autor.
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Ferreira Barreto, encarregado dos primeiros trabalhos na Estação Experimental,
identificou o outono como a estação mais favorável para a reprodução na espécie
ovina e verificou também o efeito prejudicial do calor sobre a produção de sêmen
dos carneiros13. Foram inseminadas 140 ovelhas com 70% de prenhêz.
Figura 14. Instalações para inseminação artificial construídas na antiga Fazenda
Experimental Cinco Cruzes hoje Embrapa Pecuária Sul, utilizadas em 1944. As instalações
ainda existem, apesar de depreciadas. Fonte: acervo da Embrapa Pecuária Sul, Bagé, RS.
Na segunda temporada de inseminação artificial realizada naquela estação
experimental, entre os meses de janeiro e março de 1944, foram inseminadas
1.452 ovelhas sob a coordenação de Antônio Mies Filho. Estes trabalhos foram
realizados graças a um grupo de criadores do município de Bagé que cedeu seus
animais para a realização da inseminação14. Mies Filho contou com a colaboração
de Francisco Alves da Rocha, inspetor chefe da Fazenda Experimental de Criação e
inventor de uma seringa semiautomática para aplicação do sêmen.
Um grave surto de febre aftosa prejudicou o andamento dos trabalhos.
Mesmo assim foi obtido um índice de nascimentos de 57,9% sobre 1.280 ovelhas
controladas. Muitas observações inéditas de interesse técnico e científico foram
13 Mies Filho, A. Dados Históricos da Inseminação Artificial no Brasil. Rev. Bras. Repr. Anim., v.1,
n.1, p.11-22, 1977. 14 Criadores que cederam animais para o trabalho em 1944: Francisco Murat Porto, Mario Suñe, Dr.
Nunes Vieira, José Silveira, João Lima, Antônio Romero, José Gomes Filho, Cel. Antonio Tavares,
Francisco P. Pereira e Cândido Franco. Fonte: Bol. Ins. Art., v.1, n.1, p. 128, 1944
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feitas naquele momento, como a ocorrência de cios em ovelhas gestantes. Outras
observações efetuadas foram o efeito da Febre Aftosa sobre a espermatogênese,
com a presença de sangue no sêmen (hemospermia), a degeneração testicular
grave com quadro de completa azoospermia e o acompanhamento da curva de
recuperação do quadro espermático até a sua completa cura.
A partir de 1945, os trabalhos estenderam-se às fazendas particulares e
naquele ano foram organizados 7 postos com 5.987 ovelhas inseminadas. Em 1946
e 1947 o número de postos particulares subiu para 25 e 33, com 25.987 e 36.015
ovelhas inseminadas, respectivamente, chegando a 45 postos e 32.463 ovelhas
inseminadas em 1948 e 62 postos e 48.000 ovelhas inseminadas em 194915. Os
principais municípios gaúchos a desenvolverem a inseminação artificial em ovinos
e que possuíam os maiores rebanhos foram Uruguaiana, Bagé, Livramento,
Alegrete, Dom Pedrito e Santa Vitória do Palmar.
Tabela 1. Número de propriedades atendidas e ovelhas inseminadas – Período 1944 a 1972.
Temporada Número de propriedades
atendidas Número de ovelhas
inseminadas
1944 4 7.168
1949 61 50.000
1965 336 331.623
1972 450 519.306 Fonte: Mies Filho, p.13, 1977.
REGULAMENTAÇÃO DA INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL
Em 1945, foi elaborado um anteprojeto pelos técnicos da Estação
Experimental de Deodoro, RJ, denominado “Regulamento da Aplicação da
inseminação Artificial como Processo de Melhoramento dos Animais Domésticos”,
para regulamentar a prática da inseminação artificial no Brasil, seguindo o modelo
de outros países que já haviam feito isso, como Inglaterra e Itália. Após passar pela
avaliação dos órgãos federais, estaduais e de associações de classe, o documento
serviu de base para o Decreto no. 39.795 de 16-9-1956 que deu autoridade aquele
instrumento, regulamentando a aplicação da inseminação artificial nos animais
domésticos. Os direitos já assegurados na legislação brasileira foram ampliados e
15 Mies Filho & Barreto, p. 299-300, 1949.
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consolidados em 23-10-1968 através da Lei no 5.517, que regulamentou a
profissão do médico veterinário e criou o Conselho Federal e os Conselhos
Estaduais de Medicina Veterinária. No seu Artigo 5º, Letra I, aquela lei confere
exclusivamente ao médico veterinário todas as atribuições relativas ao ensino,
direção, controle e orientação dos serviços de inseminação artificial e de
reprodução animal16. A aplicação do sêmen pode ser realizada por inseminador
prático desde que supervisionado por um médico veterinário capacitado.
REESTRUTURAÇÃO DO SERVIÇO OFICIAL DE I. A.
Em 1946, a Estação Experimental do IBA em Deodoro, RJ, passou por uma
reestruturação e mudou o nome para Seção de Biologia Animal Aplicada (SBAA).
Aquela unidade experimental já possuía doze veterinários experientes em
reprodução animal e cinco auxiliares técnicos, que executavam trabalhos à nível de
laboratório e de campo, com excelência.
Em 1947, as atividades e todo o acervo da Estação Experimental de Deodoro,
foram transferidos para o Instituto de Zootecnia (IZ) do Ministério da Agricultura
localizado no Km 47 da antiga Rodovia Rio-São Paulo17. O Instituto de Zootecnia
tinha pouco tempo de atividade e era dirigido pelo veterinário João Ferreira
Barreto. Sob a responsabilidade do IZ foram promovidos muitos cursos para
técnicos e práticos com o objetivo de expandir a inseminação artificial no Brasil.
Em novembro de 1948, o IZ recebeu quatro touros holandeses importados
originários da Holanda, sendo dois da variedade preta e branca e dois da variedade
vermelha e branca. Estes touros eram mantidos em galpões com temperatura
controlada por ar refrigerado e afastados de carrapatos para evitar a premunição
contra tristeza parasitária bovina. Eles serviram por um bom tempo como
doadores de sêmen para os vários postos de inseminação mantidos pelo Ministério
da Agricultura. Muitos trabalhos experimentais sobre coleta e tecnologia de sêmen
foram realizados com esses reprodutores alojados no Km 47.
16 Mies Filho, A. Reprodução dos Animais - Inseminação Artificial. 2 volumes, Porto Alegre,
Sulina, p. 711, 1987. 17 O Instituto de Zootecnia foi criado pelo Decreto-Lei nº 8.547 de 03 de janeiro de 1946,
subordinado ao Departamento Nacional de Produção Animal (DNPA) do Ministério da Agricultura,
no Km 47 da Rodovia Rio-São Paulo.
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Diversos postos para inseminação de bovinos foram instalados pelo país,
mediante convênios entre Ministério da Agricultura e os órgãos de fomento dos
Estados. O Ministério da Agricultura dava suporte financeiro aos projetos e aos
Estados cabia a estruturação física dos postos e a execução dos trabalhos técnicos.
Esta fase foi muito importante para a expansão da técnica em bovinos e ovinos,
sendo um trabalho gratuito oferecido aos produtores. Cada posto era chefiado por
um veterinário e estava equipado com todo o material necessário para análise e
processamento de sêmen, inclusive geladeira, microscópio e um veículo Jeep Willys
para transporte de pessoal. Em ovinos, o suporte era mais intenso, pois além da
mão de obra para execução dos trabalhos, das instalações e dos materiais para a
prática da inseminação artificial os fazendeiros recebiam também os reprodutores.
Em 1949, foi criado o Serviço de Fisiopatologia da Reprodução e Inseminação
Artificial do Ministério da Agricultura (SFPRIA), localizado no Instituto de
Zootecnia, no Km 47. As suas principais dependências eram:
A) Seção de Inseminação Artificial (IA), encarregada do estudo e do ensino da
inseminação artificial que envolvia além do Ministério da Agricultura também
órgãos estaduais de fomento, universidades e associações de classe conveniadas. O
Ministério da Agricultura fornecia toda a estrutura física para o funcionamento dos
postos de IA, inclusive reprodutores.
B) Laboratório de Fisiopatologia da Reprodução, encarregado do estudo da
fisiologia e da patologia reprodutiva, bem como da tecnologia de sêmen.
C) Estações Experimentais, localizadas no interior do Brasil e responsáveis pelos
estudos da reprodução. A primeira em Juparanã, RJ, para estudar a reprodução de
asininos e suínos; a segunda em Uberaba, MG, para estudar a reprodução de
zebuínos e a última em Bagé, RS, para estudar a reprodução de ovinos18.
Em 1952, eram mais de 20 postos de inseminação espalhados por todo o país,
incluídos os postos estaduais conveniados com o Ministério da Agricultura,
conforme Quadro 119. A atividade do SFPRIA, tomando por base o ano de 1953,
alcançou os seguintes números de fêmeas inseminadas por espécie: bovinos –
21.307; ovinos – 119.414; equinos – 885 e caprinos – 192.
18 Mies Filho, p. 14, 1977. 19 Idem, p. 15-16.
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Quadro 1: Relação das dependências do SFPRIA, no ano de 1952. Fonte: Mies Filho, 1977.
Chefe do Serviço: Antônio Mies Filho – Km 47, Nova Iguaçu
Substituto: Clóvis Batista Nascimento – Km 47, Nova Iguaçu
1. Seção de Inseminação Artificial – Km 47, Nova Iguaçu
Chefe: Clóvis Batista Nascimento
1.1. Centro de Estudo e Ensino da Inseminação Artificial – Km 47, Nova Iguaçu
1.2. Postos de Inseminação Artificial:
a) Aracaju, SE – Chefe: Tennysson Araújo Aragão
b) Belo Horizonte, MG – Chefe: Gustavo do Valle
c) Blumenau, SC - Chefe: Armando Costa
d) Cajueiro do Itapemirim, ES – Chefe: Luigi Spano
e) Distrito Federal – Chefe: Francisco Beltrão Martins
f) Fortaleza, CE – Chefe: Pedro Alcântara
g) Indaial, SC – Chefe: Raymond Jondet
h) Juiz de Fora, MG – Chefe: Clóvis Nascimento
i) Km 47, Nova Iguaçu – Chefe: Juliana Hubinger Tokarnia
j) Pelotas, RS – Chefe: José Adolfo Lourenço Lisboa
k) Porto Alegre, RS – Chefe: Ruben Roehe
l) Quatis, RJ – Chefe: Antônio Karapiperis
m) Recife, PE – Chefe: Valdi Moreira Martins
n) São Paulo, SP – Chefe: Noé Masotti
o) Salvador, BA – Chefe: Alberto Ferreira Faria
p) Soure (Ilha do Marajó), PA – estava em organização na época por Hugo Cruz
Mascarenhas
2. Laboratório de Fisiopatologia da Reprodução – Km 47
Chefe: Hugo Cruz Mascarenhas
Substituto: Augusto José Rosa
3. Estações de Fisiopatologia da Reprodução:
a) Uberaba, MG – Chefe: Paulo Pinto Brown
b) Juparanã (Ex-Desengano), RJ – Chefe: Lino Custódio de Almeida e Silva
c) Bagé, RS – Chefe: Auvanir de Almeida Ramos
Responsável pelo Boletim do SFPRIA: Lincoln Gripp de Moraes
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INTERCÂMBIO CIENTÍFICO
O intercâmbio científico internacional começou em 1948 quando o
veterinário Hugo Cruz Mascarenhas participou do I Congresso Internacional de
Inseminação Artificial e Reprodução Animal (ICAR) em Milão, Itália. Em 1952, o
veterinário Antônio Mies Filho participou do II Congresso Internacional de
Inseminação Artificial e Reprodução Animal ocorrido em Copenhague, Suécia.
Também em 1952 três ilustres cientistas visitaram o Brasil a convite do
Ministério da Agricultura. Primeiro o Prof. Telesforo Bonadonna, do Instituto
Lázaro Spalanzani de Milão, Itália, que chegou ao país em outubro e visitou varias
instituições de ensino e pesquisa nos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro. Em São
Paulo proferiu palestra no auditório do Instituto Biológico e foi homenageado pela
Sociedade Paulista de Medicina Veterinária. No Rio de Janeiro visitou o Instituto de
Zootecnia no Km 47 e proferiu palestra no Salão Nobre da Universidade Rural,
sobre a situação da reprodução animal e da inseminação artificial na Europa.
O Dr. Allan S. Parkes, do Instituto de Pesquisas Médicas de Mill Hill,
Inglaterra, visitou o Rio de Janeiro onde pronunciou duas conferencias, no Salão
Nobre da Universidade Rural e no Auditório do Serviço de Informação Agrícola do
Ministério da Agricultura, sobre a descoberta da congelação de sêmen feita na
Inglaterra em 1949. Ambas as palestras foram ilustradas por filmes que
demonstravam a técnica de congelação de sêmen desenvolvida pela sua equipe de
pesquisadores. Ele estabeleceu as condições para a futura visita do Dr. Christopher
Polge ao Brasil para demonstrar a técnica de congelação do sêmen.
E o Dr. Douglas H. K. Lee, climatologista, consultor da FAO e professor da John
Hopkins University, após participar da II Reunião Interamericana de Produção
Animal em Bauru, SP, em dezembro, visitou a Ilha de Marajó para conhecer o
sistema de produção pecuária daquela região, acompanhado pelos veterinários do
Ministério da Agricultura Hugo Cruz Mascarenhas e Mário Dias Teixeira.
Ainda em 1952, o veterinário francês Raymond Jondet foi convidado pelo
governo brasileiro para trabalhar na Estação Experimental de Indaial, SC20, por
mais de dois anos, onde desenvolveu importantes trabalhos de valor prático sobre
20 Mies Filho, p.17, 1977.
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a inseminação artificial de bovinos naquele estado, transferindo-se mais tarde para
o posto de Monte Aprazível em São Paulo.
Em agosto de 1953, Christopher Polge, um dos cientistas britânicos que
tinham desenvolvido as técnicas de congelação de sêmen bovino, visitou o Brasil a
convite do Ministério da Agricultura. Dr. Polge fez demonstrações da técnica de
congelação de sêmen no Rio de Janeiro e em Santa Catarina e pronunciou
conferências sobre o assunto em São Paulo e no Rio Grande do Sul. Naquela
oportunidade o serviço oficial do Ministério da Agricultura (SFPRIA) adquiriu
equipamentos e se preparou para a visita do Dr. Polge, aproveitando para instalar
o primeiro banco de sêmen congelado da América do Sul. O sêmen era embalado
em ampolas de vidro comum de 1,2 mL, fechadas a fogo e armazenado em gavetas
metálicas cheias de álcool mantidas a 79º C negativos, mediante blocos de gelo
seco colocados na parte superior da estrutura de armazenagem.
Figura 15. Dr. Christopher Polge demonstrando o método de avaliação do sêmen bovino
congelado para o Dr. Raymond Jondet em Indaial, SC, Brasil em 1953. Os ensinamentos de
Polge foram muito importantes para o desenvolvimento da inseminação no Brasil. Fonte:
Sara Wilmot, 200721.
21 Wilmot, Sara. From ‘Public Service’ of Artificial Insemination: Animal Breeding Science and
Reproductive Research Early Twentieth-Century Britain. Studies in History and Philosophy of
Biological and Biomedical Sciences, Part C, 38:411-41, 2007.
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TRABALHOS PIONEIROS COM SÊMEN BOVINO CONGELADO
Em 1954, Antonio Mies Filho e Augusto José Rosa publicaram os resultados
do primeiro trabalho com sêmen bovino congelado no Brasil, em 24 vacas
inseminadas com 54,2% de prenhêz na primeira inseminação22. O sêmen foi
congelado em ampolas de vidro de acordo com a técnica original de Polge, em gelo
seco e álcool, de touros pertencentes ao Posto de Inseminação Artificial de Indaial,
SC e utilizado em vacas do Núcleo Colonial do Piranema, RJ. Os trabalhos de
inseminação foram realizados pela Dra. Juliana Hubinger Tokarnia e o primeiro
bezerro nasceu em 16 de maio de 1954. Foi o primeiro bezerro produto de sêmen
congelado nascido no Brasil.
Ainda naquele ano o serviço oficial recebeu a primeira importação de sêmen
congelado da Inglaterra, para uso experimental. Também em 1954, o serviço oficial
exportou as primeiras ampolas de sêmen, em caráter experimental. O sêmen foi
coletado de touros zebuínos na Estação Experimental de Uberaba, MG e se
destinou ao uso em vacas no Paraguai a pedido do Dr. John M. Halpin da USOM
(United States Operations Mission), agência americana de ajuda a países em
desenvolvimento.
INTERESSE ESTRANGEIRO POR INSTRUMENTAL BRASILEIRO
Mies Filho cita o interesse de outros países pelos instrumentais de uso na
inseminação artificial, desenvolvidos no Brasil. A Estação de Pesquisas Agrícolas
de Rehovot, Israel recebeu um estojo completo de inseminação de ovinos, enviado
pelo SFPRIA e a pedido do Dr. H. T. Carroll, técnico da FAO, foi enviado para a
Austrália um aparelho de eletro-ejaculação bipolar para ovinos adaptado por
Mascarenhas e Gomes23.
22 Mies Filho, A.; Augusto José Rosa. Normas Práticas para a Congelação de Sêmen no Brasil. Bol.
Ins. Art., v.6, 5-24, 1954. 23 Mascarenhas, H.; W.V. Gomes. Contribuição ao Estudo da Eletro-Ejaculação em Ovinos e
Caprinos. Aplicação da Corrente Contínua ao Eletródio Bipolar. II Congr. Int. Vet. Zootec.,
Madri, 1951.
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A VISITA DO DR. DAVID E. BARTLETT AO BRASIL
Em 1958, o Brasil recebeu por quatro meses a visita
do Dr. David E. Bartlett, veterinário da American
Breeders Service (ABS), graças a um convênio entre
o Departamento de Agricultura Americano (USDA)
e o governo Brasileiro. A ABS foi a primeira
empresa no mundo a usar o nitrogênio líquido para
conservação do sêmen congelado. Segundo o
relatório do Dr. Bartlett, o Brasil naquela época
contava com aproximadamente 15 centros de
coleta de sêmen e eram inseminadas de 25 a 35 mil
vacas por ano. Era utilizado espéculo de metal ou de
vidro e seringa dosadora para a aplicação do sêmen
via vaginal na inseminação artificial e conhecimentos sobre touros provados e o
controle de doenças venéreas ainda era precário. Foi necessário ensinar a técnica
de fixação da cérvice por via retal e como utilizar o sêmen congelado para futuros
instrutores de inseminação artificial.
Ele procurou transmitir
informações sobre o que era
feito nos Estados Unidos a
respeito da inseminação
artificial, melhoramento
genético e controle de doenças.
O uso do nitrogênio líquido
ainda não era comum e Dr.
Bartlett demonstrou que era
possível obtê-lo a partir das
indústrias de oxigênio líquido.
Foi difícil convencer os
empresários do ramo que eles
poderiam vender o novo
Figura 16. Dr. David E.
Bartlett, *1917 - †2014.
Imagem da ABS Global, Inc.
Figura 17. Primeiro botijão com sêmen congelado
enviado ao Brasil, em 1958. Fonte: Enos J. Perry,
1960 (The Artificial Insemination of Farm Animal,
Third Revised Edition, Rutgers University Press).
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16
produto e que tinham um mercado potencial pela frente. Convites foram feitos aos
centros de IA, universidades, laboratórios de controle de doenças e cooperativas
locais de fazendeiros para visitarem e conhecerem o que era feito nos Estados
Unidos sobre as novas tecnologias reprodutivas. Dr. Bartlett seguiu depois para a
Argentina, Chile e Peru onde procurou mostrar como era obtido o nitrogênio
líquido e discursou em universidades sobre o uso da inseminação artificial, sêmen
congelado, testes de progênie e controle de doenças24. Em 1958, o Brasil importou
o primeiro botijão com sêmen armazenado em nitrogênio líquido, graças aos
esforços do Dr. Bartlett. Foram importadas as primeiras 78 doses de sêmen de
touros da raça Holandesa, diretamente da ABS, nos Estados Unidos.
COMUNICAÇÕES DE DOENÇAS LIGADAS À REPRODUÇÃO
As primeiras comunicações de doenças ligadas à reprodução e que
interferiam nos resultados de fertilidade foram feitas pelos veterinários Raymundo
Cunha e Jorge Lessa Motta Reis25 em 1944, sobre a Treponemose em coelhos. Este
trabalho foi realizado na Estação Experimental de Deodoro, RJ e a “Sífilis Leporina”
como era conhecida foi erradicada do plantel graças à inseminação artificial.
Em 1947, Di Primio, Gloss &
Roehe citado por Ruben Roehe26,
identificaram pela primeira vez no
Brasil a presença do
Tritrichomonas foetus em bovinos
holandeses doadores de sêmen
em três de quatro propriedades
avaliadas no município de
Montenegro, próximas a Porto
Alegre, RS. Em 1952, D’Apice e
Mello27 verificaram pela primeira
24 Buschner, F. On Solid Rock: 50 Years of ABS. American Breeders Service, 1991. 25 Cunha, R; J.L.M. Reis. Treponemose dos Coelho. Bol. Ins. Art., v.1, n.2, p.153-156, 1944. 26 Roehe, Ruben. Tricomonose Bovina. Bol. Dir. Prod. Anim., Porto Alegre, v.4, n.6, p.21-26, 1948. 27 D’Apice, M; M.J. Mello. Ocorrência de Trichicomoniase bovina em São Paulo. Nota Prévia, Rev.
Soc. Paul. Med. Vet., VI Reunião de Med. Vet., 74, dezembro, 1952.
Figura 18. Fotografia do Tritrichomonas foetus
(Riedmüller, 1928). Fonte: Universidade de
Minnesota – SVM - Estados Unidos.
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17
no Estado de São Paulo a presença do Trichomonas foetus. Mais tarde, em 1953,
Mário Rubens de Mello28 identificou o parasita em bovinos na Baixada Fluminense,
RJ. Posteriormente um inquérito epidemiológico efetuado por Mello29, revelou que
o parasita estava presente em todo o território pesquisado, que compreendia o Rio
de Janeiro, Espírito Santo, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Bahia e
Fernando de Noronha, quando examinou 343 touros pelo método de pesquisa
direta do parasita, com a frequência de 9% de animais infectados. Graças a esses
levantamentos epidemiológicos, o Ministério da Agricultura passou a utilizar a
inseminação artificial como método de controle nos rebanhos contaminados, com
resultados favoráveis surpreendentes. Em 1955, Rabello30 identificou a
Tricomonose em touros utilizados na inseminação artificial no Estado de São Paulo
e em 1963, Megale31 registrou os primeiros bovinos infectados em Minas Gerais.
Em 1968, João Floriano Casagrande encontrou 21,6% de rebanhos afetados pela
Tricomonose Bovina e, após cultura de esmegma prepucial, 15% dos touros
examinados portavam o protozoário32.
Em 1956, o veterinário Mário D’Apice33 identificou pela primeira vez no
Brasil, no Estado de São Paulo, o Campylobacter fetus como agente de aborto, a
partir de material do estômago de feto abortado. O agente ainda era conhecido
como Vibrio fetus e a doença era chamada de Vibriose. Esta doença foi bem
investigada no Rio Grande do Sul em 1960, com o levantamento epidemiológico de
rebanhos, pela técnica de muco-aglutinação em fêmeas realizada por Mies Filho34,
28 Mello, M.R. Meio Prático para o Diagnóstico da Tricomonose Bovina. Bol. Soc. Bras. Med. Vet.,
Rio de Janeiro, v.21, p.11-19, 1953. 29 Mello, M. R. Dados sobre a incidência de Tricomonose Bovina em alguns Estados do Brasil.
Boletim. Inseminação. Artificial, v.6, p.16-23, 1954. 30 Rabello, E.X. Incidência de Trichomonas foetus Riedmuller 1928 em Touros Usados para
Inseminação Artificial no Estado de São Paulo. Rev. Fac. Med. Vet. São Paulo, v.5, n.3, p. 539-548,
1955. 31 Megale, F. Identificação do Trichomonas foetus em Bovinos em Minas Gerais (comunicação
científica). Arq. Esc. Vet. UFMG, Belo Horizonte, v.15, p.405, 1963. 32 Mies Filho, p.718, 1987. 33 DÁpice, Mário. Ocorrência do Aborto no Estado de São Paulo Devido ao Vibrio fetus.
Biológico, v.22, p.15-18, 1956. 34 Mies Filho, A. Incidência da vibriose bovina em alguns rebanhos leiteiros no Rio Grande do
Sul. Revista da Faculdade de Agronomia e Veterinária da UFRGS, Porto Alegre, v.3, p.195-199, 1960.
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com 27% de incidência do agente. Mais tarde em 1963, Mies Filho35 verificou a
patogenia do Campilobacter fetus fetus pela primeira vez no Brasil. Graças aos
esforços dos veterinários do Ministério da Agricultura, e das Escolas Federais de
Veterinária do Rio Grande do Sul (UFRGS) e de Minas Gerais (UFMG) foi possível
estudar a patogenia e a distribuição desta doença em vários estados do Brasil. Em
1967, Casagrande encontrou alta incidência de Campilobacteriose no rebanho
bovino de Minas Gerais, onde 65,6% dos rebanhos examinados apresentavam a
doença e 23,2% dos animais testados eram reagente a prova de muco
aglutinação36. No Rio Grande do Sul Mies Filho37 (1969) encontrou situação
semelhante onde 63,6% dos rebanhos tinham a doença enquanto 27% dos animais
examinados eram reagentes ao teste para o Campilobacter.
Em 1964, Mies Filho38 comunicou a existência da epididimite ovina no Brasil,
causada por Brucella ovis. Esta comunicação foi feita à 3ª Reunião Anual da
Sociedade Veterinária do Rio Grande do Sul. Posteriormente Ramos e
colaboradores39 realizaram um levantamento epidemiológico da epididimite ovina
naquele estado, em 1966.
Em 1948, Uriel Franco Rocha40, estudou o efeito da inseminação artificial
sobre a fertilidade de vacas reagentes ao teste sorológico para Brucelose. Em um
rebanho de 2.500 vacas, no município de Olímpia, Estado de São Paulo, 278
reagiram positivamente ao teste de brucelose pelo método da soro-aglutinação
rápida em placa, com antígeno corado. Destas últimas foram mantidas 154 vacas,
em pastos isolados e aquelas que não emprenharam pela monta natural, foram
inseminadas posteriormente. O resultado final de gestação foi de 65,6%, sendo
35 Mies Filho, A. Vibriose Bovina. Evolução de um Foco no Rio Grande do Sul. Rev. Fac. Vet.
UFRGS, v.6, p73-83, 1963. 36 Mies Filho, p.718, 1987. 37 Idem. 38 Mies Filho, A. Epididimite Ovina no Rio Grande do Sul. III Reunião Anual da SOVERGS, 1964. 39 Ramos, A.A.; A. Mies Filho; J.A.P. Schenk; L.D. Vasconcelos; O.T.G. Prado; J.C.T. Fernandes; H.
Blobel. Epididimite Ovina. Levantamento Clínico no Rio Grande do Sul. Pesq. Agropec. Bras.,
v.1, p.211-213, 1966. 40 Rocha, U.F. Controle da Fecundidade em 154 Vacas Zebu, Portadoras de Brucelose.
Comparação entre Cobertura Natural e Inseminação Artificial. Rev. Fac. Med. Vet. S. Paulo, vol.
3, fase., 4, p.327-330, 1948.
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31,8% devido à inseminação, mostrando o efeito positivo da técnica sobre a
fertilidade de vacas reagentes a Brucelose.
Os prejuízos causados pelo vírus da Febre Aftosa sobre a produção seminal
do carneiro foram observados pela primeira vez no Brasil por Mies Filho41, em
1944. Segundo o autor ocorre uma esterilidade temporária com azoospermia e às
vezes, ejaculados sanguinolento, sendo necessário até dois meses para que o
animal se recupere totalmente. Quanto à fertilidade da fêmea ovina, Riet42 também
em 1944, cita que o surto da doença no inicio da estação reprodutiva causou uma
queda muito acentuada na fertilidade, mesmo utilizando sêmen de ótima qualidade
durante a inseminação artificial, com apenas 26,6% de parições. Em bovinos, Mies
Filho43 em 1964, constatou a baixa fertilidade provocada pelo vírus da Aftosa, em
novilhas inseminadas pouco tempo antes de irromper a infecção em rebanho
leiteiro localizado no município de Viamão, RS.
VETERINÁRIA PIONEIRA
Em 1952, a veterinária Juliana Hubinger Tokarnia, assumiu a direção da
Estação Experimental do Km 47 e a dirigiu por mais de um ano. Ela foi a primeira
veterinária a trabalhar com inseminação artificial em nosso país. Tokarnia também
foi responsável pela primeira aplicação de sêmen congelado no Brasil em 1953, no
estado do Rio de Janeiro. Coube a esta pioneira identificar pela primeira vez o
Tritrichomonas foetus em bovinos no Rio de Janeiro também em 1953. Ela faleceu
num acidente automobilístico durante suas atividades profissionais em 195444.
AS COOPERATIVAS PIONEIRAS
Em 1956 foi criada em Pelotas, RS, a Cooperativa Sulina de Inseminação
Artificial (COSULIA). Seguindo o modelo da pioneira, outras cooperativas foram
criadas no Rio Grande do Sul como a Cooperativa Pedritense de Inseminação 41 Mies Filho, A. Vírus Aftoso e Esterilidade nos Carneiros. Bol. Soc. Med. Vet., v.13, 219-222,
1944. 42 Riet, F.C. Inseminação Artificial. Trabalhos de Observação Realizados na “Estância
Camoaty”. Bol. Insem. Art., v.1, n.2, p.137-144, 1944. 43 Mies Filho, A. Interferência da Febre Aftosa na Reprodução dos Bovinos. Ver. Fac. Vet. UFRGS,
n.6, p.139-142, 1964. 44 Mies Filho, p. 17-18, 1977.
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Artificial (COPEDIA) em Dom Pedrito, em 3-3-1959 e a Cooperativa Santanense de
Inseminação Artificial (COSIAL) em Livramento em 1960. O jornal Correio da
Manhã45 na edição de 26-8-1958 anunciava que o Instituto de Zootecnia do
Ministério da Agricultura, através do seu Serviço de Inseminação Artificial,
aplicaria pela primeira vez em grande escala no Brasil, sêmen congelado
importado dos Estados Unidos. O trabalho seria realizado em colaboração com a
COSULIA, sediada em Pelotas, RS, através de convênio. O alvo principal eram os
rebanhos leiteiros abrangidos pelo atendimento técnico daquela cooperativa de
inseminação artificial, na região Fronteira Sul e Litoral Sul do RS.
A COPEDIA foi criada por 6 produtores rurais, e seu primeiro veterinário foi o
Dr. Nei Almeida Rosa, funcionário do Ministério da Agricultura. A COSIAL foi criada
por um grupo de 21 criadores. Cada um forneceu 20 vacas, para o primeiro posto
de inseminação em gado de corte no RS, com uso de sêmen congelado, realizado na
Estância São Leandro. Mais tarde, foi criada a Cooperativa de Inseminação Artificial
de São Gabriel (CIASGA), em São Gabriel, RS. Todas as cooperativas tiveram a
supervisão do médico veterinário Sérgio Falcão Padilha, técnico da Secretaria da
Agricultura do RS e responsável pelo Serviço de Inseminação Artificial (SIA).
Uma das primeiras cooperativas criadas em Minas Gerais, na década de 1960,
foi a Cooperativa Sul-Mineira de Inseminação Artificial, em São Gonçalo do Sapucaí,
sob a orientação do veterinário João Floriano Casagrande. Em 1966, o criador Ciro
Siqueira da Fazenda da Vargem, cliente da cooperativa, iniciou o seu programa de
melhoramento genético através da inseminação artificial. Em 1982, ela foi
incorporada pela Cooperativa Agropecuária de São Gonçalo do Sapucaí Ltda., hoje
Cooperativa Agropecuária do Vale do Sapucaí Ltda., onde funcionava um
laboratório de análises de doenças, um departamento veterinário, um serviço de
coleta e exame de sêmen e onde também eram realizados cursos e treinamentos
para práticos inseminadores46.
45 Jornal Correio da Manhã, 26-8-1958, página 4, 2º Caderno, Rio de Janeiro. 46 Severo, Neimar. História da Inseminação Artificial no Brasil. Rev. Bras. Reprod. Anim., Belo
Horizonte, v.39, n.1, p17-21, 2015. www.cbra.org.br
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INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL COM SÊMEN REFRIGERADO OVINO
A inseminação artificial com sêmen refrigerado em ovinos foi utilizada por
alguns técnicos desde cedo. Mies Filho foi pioneiro no uso do sêmen refrigerado
em ovinos. Em 1965 no Rio Grande do Sul o veterinário Sérgio Falcão Padilha
utilizou um diluente tipo IVT (Illinois Variable Temperature) para conservação do
sêmen refrigerado a +5ºC alcançando um índice de fertilidade de 45,2% na raça
Merino Australiano enquanto com sêmen fresco obteve um índice de 53,6%. Na
raça Corriedale obteve índices de 86,9% com sêmen refrigerado e 78,7% com
sêmen fresco, segundo informações de Durán del Campo47.
TRABALHOS PIONEIROS COM SÊMEN CONGELADO OVINO
Em 1955, Araújo publicou o primeiro resultado de fertilidade do sêmen
ovino congelado em ampolas48. A congelação foi realizada no laboratório do
SFPRIA no Km 47 e as inseminações efetuadas em ovelhas da Estação
Experimental Cinco Cruzes, de Bagé, RS. Ele obteve 31,2% de não retorno ao cio.
Em 1965, Mies Filho e Rasch citado por Mies Filho49 alcançaram 5% de parição
trabalhando com 400 ovelhas inseminadas com sêmen congelado. Posteriormente
Dutra e colaboradores50 trabalhando com sêmen ovino congelado na forma de
pellets obtiveram índices de 26% e 30% de nascimento com uma e duas
inseminações no mesmo cio, respectivamente.
CENTRAL DE INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL DA FMVZ-USP
A Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade de São Paulo (USP)
tinha uma bem instalada Central de Inseminação Artificial na capital, no Campus
do Butantã, conveniada com o Ministério da Agricultura e com um serviço pioneiro
de distribuição de sêmen refrigerado aos criadores paulista, tendo como seu
47 Duran Del campo, A. Anatomia, Fisiologia, de la Reproducción e Inseminación Artificial em
Ovinos. Ed. Hemisfério Sur, Montevideo, s/d. 48 Araujo, P.G. Verificação da fertilidade do sêmen congelado de carneiro conservado a -79o C.
Boletim de Inseminação Artificial, Ministério da Agricultura, v.7, p.5-10, 1955. 49 Mies Filho, p.513, 1987. 50 Dutra, J; A. Mies Filho; A. Selaive; IA. Costa. Congelação de Sêmen Ovino. Nota Prévia. Arq. Fac.
Vet. UFRGS, v.7, p.29-32, 1979.
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responsável o veterinário Noé Masotti. A Central iniciou suas atividades em maio
de 1952 e foi desativada em 1958, transferindo suas atividades para o Instituto de
Zootecnia e Indústria Pecuária da FMV/USP, em Pirassununga reiniciando os
trabalhos em 16-2-1959, onde mais tarde foi extinta.
Outro serviço de excelência foi proporcionado pelo Departamento de
Produção da Secretaria da Agricultura de São Paulo, através do posto de
inseminação artificial no Parque Fernando Costa, na capital paulista, depois
transferido para o Instituto de Zootecnia em Nova Odessa, SP, onde foi
desativado51. Em Itapetininga, SP, a Divisão de Fomento da Produção Animal
mantinha um bem montado Centro de Inseminação Artificial, que atendia a região
abrangida por aquele município com sêmen de touros leiteiros das raças Pardo
Suíço e Holandesa, inclusive com animais importados.
O PLANO NACIONAL DE INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL
O Ministério da Agricultura através do SFPRIA, prosseguiu com os trabalhos
de execução do programa de inseminação artificial até 1962, graças a sua rede de
Postos e Estações Experimentais espalhadas pelo Brasil. A seguir uma nova ordem
administrativa extinguiu o SFPRAI e criou o Setor de Inseminação Artificial (SIA)
subordinado ao Instituto de Pesquisa Agropecuária do Centro-Sul, RJ, reduzindo
consideravelmente as atividades e extinguindo as Estações Experimentais no
interior, que foram as disseminadoras da inseminação artificial no país.
Em 1964 foi dado um novo sentido à aplicação da inseminação artificial, com
a execução do Plano Nacional de Inseminação Artificial (PLANIART), que contava
então com uma tecnologia mais adequada às necessidades do país, pela
possibilidade do emprego do sêmen congelado; a ampla política de importação de
material genético e a maior conscientização dos fazendeiros. A técnica de
inseminação artificial pela fixação da cérvice por via retal e o uso de botijões de
nitrogênio líquido para conservação e transporte do sêmen abriu um novo
horizonte para a reprodução de bovinos no Brasil.
51 Grunert, E; E.H. Birgel; W.G. Vale; E.H. Birgel Jr. Patologia e Clínica da Reprodução dos Animais
Domésticos – Ginecologia. Varela, São Paulo, 2005, 551p.
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Enquanto se dava especial atenção às doenças da reprodução, a política de
aplicação da inseminação foi modificada e buscou-se atender aqueles criadores
que tinham maiores recursos econômicos e que podiam retribuir a ação
governamental com uma resposta mais efetiva. Os resultados deste trabalho foram
tão evidentes que beneficiaram também os criadores de animais de elite, que
passaram a usufruir dos benefícios da inseminação artificial nos seus rebanhos,
comercializando reprodutores oriundos desta técnica52.
Em 1968, através de uma nova reforma administrativa, o Ministério da
Agricultura criou a Divisão de Fisiopatologia da Reprodução e Inseminação
Artificial (DIFRIA), com suas unidades estaduais e passou a se preocupar mais com
a orientação e a fiscalização do que com o fomento da técnica. Nesse período foi
seu diretor o médico veterinário Luis Carlos O. da Veiga Soares.
Em 1978, novamente o Ministério da Agricultura passou por uma nova
reforma administrativa e a DIFRIA foi sucedida pela Divisão de Fiscalização de
Materiais de Multiplicação Animal (DFIMA), subordinado à Secretaria de
Fiscalização Agropecuária (SEFIS), que era um órgão da Secretaria Nacional de
Defesa Agropecuária. Para fiscalizar a atividade de inseminação artificial a DFIMA
contava com um corpo técnico formado por veterinários sediados em unidades
estaduais em 16 estados da federação, além do Distrito Federal.
52 Mies Filho, p.715-716, 1987.