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Primeira Parte 1.1 - Introdução O Território do Estado da Paraíba apresenta diversidade na totalidade de seu conjunto paisagístico no que tange ao sistema natural. O que podemos verificar em sua aparência são conjuntos bem distintos em que há uma diferença principalmente entre as feições do relevo, posto que se apresenta bem distinto entre o Planalto da Borborema, os Baixos Planaltos Costeiros e as Planícies Fluviais, Flúvio-marinhas e as Planícies Costeiras. A litologia de sustentação dessas feições varia também, pois os Planaltos são marcadamente de diferentes estruturas geológicas, em que primeiro é de origem cristalina e o segundo, de Planaltos Costeiros, com sedimentos variegados em consolidação. Tanto um quanto o outro são feições do relevo, que por sua natureza perdem material devido a sua diferença altimétrica em relação às Planícies. O material retirado dos planaltos é carreado e depositado nas planícies, normalmente pelos agentes climáticos, hídricos e em muitos casos a ação antrópica torna-se também um agente auxiliar desse processo erosivo de retirada de material. A rede hidrográfica é um agente responsável pelo transporte do material sedimentar para as zonas de menor energia, principalmente as flúvio-marinhas e as costeiras, que passam a ser depósitos desses sedimentos oriundos dos planaltos do interior do continente. No caso das planícies costeiras, constituem a franja de sedimentos costeiros determinando feições como as praias que crescem, aumentando o continente ou a diminuição desses sedimentos praieiros, diminuindo a praia e conseqüentemente o continente. Esse balanço de sedimentos acaba por constituir a dinâmica nas feições morfológicas da zona costeira, e o que chama a atenção no litoral paraibano é o paralelismo estabelecido pelo escoamento fluvial dos rios determinantes da rede hidrográfica litorânea: rios Gramame, Paraíba, Miriri, Mamanguape e Camaratuba. O litoral paraibano não é muito recortado por feições diversas, pois o que mais se apresenta são enseadas com pontas em cúspide e zonas com aparência de tômbolos. As desembocaduras dos rios normalmente são feições estuarinas, algumas apresentando

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Primeira Parte 1.1 - Introdução

O Território do Estado da Paraíba apresenta diversidade na totalidade de seu

conjunto paisagístico no que tange ao sistema natural. O que podemos verificar em sua

aparência são conjuntos bem distintos em que há uma diferença principalmente entre as

feições do relevo, posto que se apresenta bem distinto entre o Planalto da Borborema, os

Baixos Planaltos Costeiros e as Planícies Fluviais, Flúvio-marinhas e as Planícies

Costeiras. A litologia de sustentação dessas feições varia também, pois os Planaltos são

marcadamente de diferentes estruturas geológicas, em que primeiro é de origem

cristalina e o segundo, de Planaltos Costeiros, com sedimentos variegados em

consolidação. Tanto um quanto o outro são feições do relevo, que por sua natureza

perdem material devido a sua diferença altimétrica em relação às Planícies. O material

retirado dos planaltos é carreado e depositado nas planícies, normalmente pelos agentes

climáticos, hídricos e em muitos casos a ação antrópica torna-se também um agente

auxiliar desse processo erosivo de retirada de material.

A rede hidrográfica é um agente responsável pelo transporte do material

sedimentar para as zonas de menor energia, principalmente as flúvio-marinhas e as

costeiras, que passam a ser depósitos desses sedimentos oriundos dos planaltos do

interior do continente. No caso das planícies costeiras, constituem a franja de

sedimentos costeiros determinando feições como as praias que crescem, aumentando o

continente ou a diminuição desses sedimentos praieiros, diminuindo a praia e

conseqüentemente o continente. Esse balanço de sedimentos acaba por constituir a

dinâmica nas feições morfológicas da zona costeira, e o que chama a atenção no litoral

paraibano é o paralelismo estabelecido pelo escoamento fluvial dos rios determinantes

da rede hidrográfica litorânea: rios Gramame, Paraíba, Miriri, Mamanguape e

Camaratuba.

O litoral paraibano não é muito recortado por feições diversas, pois o que mais

se apresenta são enseadas com pontas em cúspide e zonas com aparência de tômbolos.

As desembocaduras dos rios normalmente são feições estuarinas, algumas apresentando

ilhas formadas por sedimentos acumulados ou mesmo restingas, sendo a de Cabedelo a

principal representação dessa. Apesar de pouco recortado, o litoral acaba por apresentar

nuances que lhe permitem uma extensão linear de 147 Km, variando entre planícies e

recortes abruptos dos Baixos Planaltos que são denominados de falésias ativas(vivas,

ainda em processos de abrasão marinha) ou desativadas (mortas) desses processos por

sedimentação excessiva em sua base.

No intervalo entre a foz do rio Mamanguape e a do rio Camaratuba há uma

seqüência de enseadas e de falésias (ativas ou mortas). No entanto, na segunda enseada

em sentido norte a partir da foz do rio Mamanguape, o lugar foi ocupado inicialmente

por populações pertencentes a nação Potiguara, e posteriormente pelos traficantes de

pau-brasil no caso os franceses e também por colonos portugueses que se instalaram

nessa área e aí iniciaram o povoado que hoje é sede do Município de Baía da Traição.

Interessante observar que a cidade está localizada numa franja relativamente estreita

entre o mar e uma zona de aparência lagunar e conforme Horácio de Almeida(1966) no

início da colonização portuguesa no Brasil esse lugar era coberto por uma laguna.

A riqueza da cidade não fica apenas em suas paisagens ou praias, mas na sua

história. Terras dos índios potiguaras que até hoje habitam o local, vivendo

pacificamente com uma colônia de pescadores, gente simples que vive da pesca e das

festas como o carnaval. O turismo não é dominante, pois ainda falta infra estrutura e

mais ação dos governantes do município. Por época do carnaval a cidade é invadida

pelos veranistas que possuem praticamente a metade das casas da cidade, duplicando a

população neste período.

As praias contidas ao longo das enseadas possuem características com relativa

diferença, apesar de próximas umas das outras. Existe uma praia calma protegida por

muro natural formado por recifes com piscinas naturais, ideais para as crianças que têm

medo de praia com ondas altas e perigosas isso particularmente nos atraiu a freqüentar a

cidade no período da adolescência , devido a esse modo singular do local.

Observando a dinâmica costeira do lugar vimos que algo estava acontecendo em

relação ao contexto praieiro. A casa que utilizamos como parâmetro de observação

durante três anos, estava com seu muro de proteção, com aproximadamente um metro e

meio de altura, complemente soterrada, por causa da areia. No entanto, nos lugares mais

próximos o que se apresentava aos nossos olhos era que, aparentemente, o mar parecia

estar avançando rapidamente, mudando assim a paisagem, ou seja, falésias que antes

estavam mortas, começavam sofrer a ação marinha. Nesse sentido passamos a

questionar o porquê de tanto sedimento naquele local? e quais são os fatores

responsáveis por esse fenômeno? A partir dessa indagação, a questão que se colocou

para nós nesta pesquisa, e que se permeia todas as discussões dessa temática está em

saber Quais as condições da dinâmica costeira que estabelece a morfogênese nas

enseadas entre o estuário do rio Mamanguape e o estuário do rio Camaratuba?

Para melhor conduzir a observação foi necessário estabelecer duas afirmativas que

assim se apresentam a) - Os sedimentos originários do rio Mamanguape são um dos fatores responsáveis pela

progradação ou retrogradação das zonas praieiras nas enseadas entre o Estuário do

rio Mamanguape e do rio Camaratuba.

b) - Diversos tipos de erosão atuam nas enseadas e falésias.

Há forma preliminar, as observações que induziram ao questionamento

proponente desse trabalho permitiram determinar que na área delimitada para a

observação empírica, está ocorrendo um acentuado processo de erosão/acumulação.Essa

área requer uma investigação minuciosa para se conhecer os principais motivos

causadores dessas alterações na paisagem localizada na praia da Baia da Traição. O

estudo do litoral propõe-se buscar as causas possíveis da dinâmica e num prognóstico,

mesmo que elementar, apresentamos algumas proposições para que a sociedade que alí

habite não seja pega de surpresa pelas atividades marinhas.

Para concretizarmos a afirmação ou mesmo refutá-la, estabelecemos como

objetivo geral procurar compreender a dinâmica costeira que estabelece a

morfogênese nas enseadas entre o estuário do rio Mamanguape e o estuário do rio

Camaratuba, e especificamente:

Delimitar a área compreendida entre o estuário do rio Mamanguape e o estuário do rio Camaratuba tendo como área central a Baía da Traição; Verificar o transporte de sedimentos do rio Mamanguape; Determinar direção e sentido da dinâmica marinha: Marés, Ondas e Correntes; Verificar o perfil das praias e, por último, Determinar a geometria das falésias e verificar o grau de erosão

A partir desse elenco de objetivos e o problema estabelecido, as hipóteses

puderam ser respondidas.

1.2 - Referencial Teórico-Conceitual

Tomando como método a Análise Geográfica, não há como deixar de recorrer aos

postulados de Olivier Dolfuss que encaminha, o geógrafo “à compreensão das

modalidades de organização no espaço constituído pela superfície terrestre e pela

biosfera que o molda” (1973, p.13). Nesse raciocínio podemos situar o nosso trabalho

no sentido de pesquisar o comportamento da paisagem no litoral paraibano.

Utilizaremos também o conceito de paisagem, proposto por Tricart(1997), em se tratado

do nosso objeto de pesquisa, que é a paisagem na área costeira referente as praias na

cidade da Baía da Traição – PB. Nesse sentido procuramos identificar os sistemas

formadores da paisagem que se encontram em desequilíbrio, entendo o conceito de

paisagem como sistema aberto, o que permite uma intensa troca de energia e matéria

devido à ocorrência de uma dinâmica constante no ambiente de praia.

A concepção de análise geográfica proposta por Olivier Dolfuss, refere-se a uma

estrutura que “(...) é formada de elementos geográficos que se articulam uns com

relação aos outros” (1973, p.13). No entanto, o aprofundamento requereu a ampliação

das referências teóricas e técnicas. Para a compreensão geomorfológica do ambiente em

estudo, Teixeira Guerra foi incisivo na contribuição de técnicas para melhor

interpretação dos dados referentes à dinâmica costeira. Segundo esse autor, “Entende-se

como processos costeiros a ação de agentes que provocando erosão, transporte e

deposição de sedimentos levam a constante modificações na configuração do litoral”

(1994, p.257).

Para uma compreensão mais apurada dos processos ocasionados pela dinâmica

costeira e marinha presente na paisagem de nosso estudo, recorremos aos estudos de De

Martonne(1953) e Strahler(1994). Com essas conceituações poderemos ter uma visão

concreta dos processos e fatores que ocorrem nas relações dos diversos elementos

presentes na paisagem, considerada frágil devido à sua dinâmica, buscando resultados

onde possamos saber como planejar as necessidades que são impostas pelo ambiente ao

homem e atuar de forma coesa sobre elas.

1.3 - Método e Técnicas

O estudo da dinâmica da paisagem costeira foi favorecido pela Análise enquanto

método. Ao iniciar os trabalhos referentes à observação sistemática, visamos perceber a

paisagem através de suas partes. Desse modo, dividimos o todo em partes, e a partir

desse processo de indução analisamos do elemento complexo para o mais simples, já

que o nosso trabalho se constituiu de um estudo para verificação da dinâmica costeira

presente entre os estuários dos rios Mamanguape e Camaratuba, tendo como enfoque

principal a Baía da Traição.

Delimitada a área do estudo partimos para verificação em campo, visando a

comprovação das hipóteses levantadas. Para essa verificação fizemos uso de

ferramentas e instrumentos especializados, bem como de processos artesanais, onde

constatamos alguns resultados necessários à nossa comprovação.

Primeiramente realizamos o registro fotográfico da área em períodos diferentes,

para os quais tomamos como parâmetro a amplitude das marés. Assim sendo,

realizamos um primeiro registro em fevereiro de 2002, quando foi observado o ponto

mais alto e o ponto mais baixo da maré de sizígia. Neste período, na preamar, foram

verificados os pontos onde estavam ocorrendo erosão, bem como os pontos de

acumulação dos sedimentos. Partindo dessa observação, foram determinados dois

pontos centrais para observações posteriores, os quais denominamos de ponto de

observação A e ponto de observação B, considerando o sentido da corrente de deriva

litorânea naquele local de Norte - Sul. O ponto de observação A corresponde à Ponta da

Trincheira, onde notamos a ocorrência do processo de progradação. O ponto de

observação B corresponde a um ponto próximo ao centro da enseada, em que segundo

nossa observação, está ocorrendo o processo de erosão.

Ocorreram mais duas excursões ao campo, no mês de agosto no intervalo de uma

semana para outra. Na primeira, observamos e marcamos os melhores locais para a

coleta de dados que nos forneceram subsídios para comprovação ou refutação desses

dados decidimos por um retorno na semana seguinte, onde fizemos um levantamento

apurado da área e dos dados referentes à dinâmica costeira presente na Baía da Traição.

Os dados referentes, às coletas foram os seguintes: perfil de praia, localização pelo

GPS; dados relativos ao vento, como a velocidade e direção. Quanto às ondas coletamos

de forma artesanal a altura e velocidade; quanto à maré foram feitas observações nas

quais constatamos que a direção podia ser feita pela disposição e movimento das

embarcações ancoradas em frente à enseada, sendo feito mais um registro fotográfico

definindo os principais elementos e fatores responsáveis direta e indiretamente por

suaves modificações na enseada da Baía da Traição, dentre os quais incluem-se as

correntes marinhas, as ondas, as marés, a erosão, os recifes, os sedimentos, o clima e as

ações antrópicas. O método da análise nos fornece subsídios para que a pesquisa se

consolidasse de forma mais prática e confiável possível.

Usamos técnicas simples e avançadas, ligada ao nosso objeto de estudo, tais como

a utilização de bibliografia especializada em morfologia costeira,

Foram utilizadas cartas topográficas da SUDENE :

Cartas 1/25000, Ano 1972: Araçaji, Folha – SB, 25-Y-A-V-3-NE, Baía da Traição

Folha– SB. 25-Y-A-VI-SO, Barra de Mamanguape Folha – SB, 25-Y-A-VI-3-NO,

Guarabira Folha – SB, 25-Y-A-V-3-NO, Itapororoca Folha – SB, 25-Y-A-V-4-NO, Rio

Tinto Folha – SB, 25-Y-A-V-4-NE

Carta 1/100 000: Guarabira, Ano 1972 Folha – SB-25-Y-A-V

Carta Imagem Radar 1/250 000 Ano 1975/1976, Guarabira Folha – SB.25-Y-A,

MIR208, João Pessoa Folha – SB.25-Y-C, MIR 235

Para delimitar e localizar nossa área de estudo usamos uma imagem de satélite

SPOT e um GPS Garmin III. Para as medições dos processos costeiros usamos bóias de

isopor e trena com trinta metros, para medir o comprimento, velocidade e altura das

ondas, sendo utilizado ainda um Teodolito Nikon-NE20H para traçar o perfil de praia.

Utilizamos também um avião para um registro fotográfico aéreo, e em expedições no

campo foram utilizadas as seguintes cameras : Epson PC650 digital e as Pentax Z20

2880 e Canon EOS5000, ambas manuais. Para coleta de dados relativos ao vento, como

a velocidade e direção, utilizamos um anemômetro Wilh.Lambrecht e um anemoscopio,

conhecido popularmente como biruta. Em gabinete utilizamos estereoscópio juntamente

com as aerofotos de 1970 da área gráficos que serviram para a digitalização e confecção

de um mapa no qual encontraremos informações suficientes para o conhecimento de

como o processo da dinâmica costeira funciona.

Segunda Parte

2.1 - Caracterização fisiográfica elementar do

compartimento litorâneo em estudo

O litoral paraibano compreende modalidades geográficas de notável distinção,

considerando-se a existência de uma sucessão de formas geométricas. Nesse caso

passamos a observar que há uma alternância entre planaltos e planícies, permitindo

assim configurações diversas. Os planaltos, quando interrompidos bruscamente pela

atividade erosiva intensa da abrasão marinha, permitem uma configuração de falésias,

sendo que estas podem ainda estar em processo de atividade abrasiva pela ação do mar,

ou inativa, quando a atividade marinha não mais atinge as bases do penhasco

denominado de falésia.

A inatividade abrasiva do mar na base da falésia é decorrente de uma

progradação constante da acumulação de material sedimentar aí depositado, fazendo

com que o continente avance sobre o mar. Esse depósito sedimentar tem normalmente

sua origem na desagregação do material acarretado pelas intempéries na superfície

continental e transportada pelos rios até ao mar.

A sucessão de formas geométricas na zona costeira (ver Fig.1) tem como fonte

genética a relação de forças entre a ação abrasiva do mar e a resistência do continente, e

nesse caso há também a contribuição das atividades do homem.

Figura 1 – Formas geométricas da linha da costa.

Fonte: NAKATA(1979)

A sucessão das formas geométricas na zona costeira no litoral paraibano é

predominantemente de restingas, enseadas e pontas em forma de cúspide (ver Fig. 2).

Figura 2 – Litoral do cenário entre a foz do rio Mamanguape e Baía da Traição vista a partir de aerofoto/1970.

Estuário do rio Mamanguape

Linha de recifes

Enseada da Baía da Traição

Pontas arenosas em forma de cúspide

Tomando como lugar de observação o fenômeno contido entre os pontos que

abrigam o estuário do rio Mamanguape e o estuário do rio Camaratuba (ver Fig. 2),

podemos apontar a geometria mais freqüente na aparente sucessão de enseadas, sendo

que essas situações estendem-se sobre a planície costeira que é interrompida por falésias

ativas (ver Fig. 3).

Figura 3 – Perfil transversal da falésia inativa e a antiga laguna na Baía da Traição- Foto

Conrad Rosa -Data 09/04/02 .

Falésia

Rio Sinimbu com a calha retificada

Enseada da Baía da Traição

Maré baixa

cidade

2.2 - O rio Mamanguape, grande tributário sedimentar da zona praieira das enseadas na Baía da Traição

O rio Mamanguape tem sua nascente aproximadamente a 584m de altitude, na

Lagoa Salgada, entre a cidade de Remígio e a Vila Cepilho percorrendo até a foz 165

km. Esses dados foram retirados da Imagem de Radar, de João Pessoa e Guarabira

1/250000. A área do entorno do rio, desde a sua foz até à sua nascente tem sido

fortemente ocupada nos últimos séculos, e essa situação tem acarretado conseqüências

para os solos próximo às margens do rio, pois a ocupação sócio - econômica tem sido

caracterizada por situações tradicionais, como por exemplo o cultivo nas áreas com

declividade superior às planuras, ou seja maior que dois graus de inclinação, tais

cultivos não acompanha as curvas de nível, ocasionando assim, no período de

precipitações pluviométricas de elevada magnitude, perda acentuada de solo para o leito

do rio. Inevitavelmente o material sedimentar depositado no rio será transportado dos

níveis de maior energia para os de menor energia, nesse caso, próximo ao nível do mar.

A erosão no rio em relação ao seu perfil longitudinal será regressiva (ver Fig. 4),

pois as áreas de maior energia estarão sempre determinando o comportamento do rio de

montante para jusante. No entanto, a erosão em relação ao perfil transversal será

oportunamente determinada pelo elemento de resistência nas bordas do rio. Caso haja

vegetação, esta será um elemento responsável por essa resistência. Se esses indivíduos

foram retirados, a resistência da borda será diminuída intensamente, permitindo que o

material lateral nas margens seja retirado e conseqüentemente carreado para o interior

do rio, sendo então transportado pela turbulência.

Figura 4 – Perfil longitudinal diagramado em gradientes de declividade do rio Mamanguape

A erosão diminui de forma acentuada quando a descarga fluvial vai se

aproximando dos níveis inferiores do perfil longitudinal. Ou seja quando o rio se

aproxima do baixo curso, pois vai diminuindo sua declividade e o material sedimentar

vai sendo depositado. O rio Mamanguape tem seu baixo nível de erodibilidade a partir

do momento em que inicia sua meandrificação após o piemonte da Borborema. No

entanto, quando o rio se aproxima do mar, antes de atingir a foz estuarina, há a

formação vegetal de mangue, ainda bem distante da foz, denotando que o nível de base

refere-se à toda área onde há a população de manguezal (ver Fig. 5).

Nascente

Estuário

Alto curso

Médio curso

Baixo curso

584

58 17

Figura 5 – Área que abriga a população de manguezal no estuário do rio Mamanguape. – Imagem SPOT/1991

Observando nesse corte da imagem que traduz o litoral cenário em estudo,

percebemos com nitidez que a área referente à população de mangue (tom mais escuro

de vermelho) tem no seu interior o leito do rio Mamanguape bastante meandrificado,

sendo que, nessa área, o leito do rio já atingiu seu nível de menor energia. Como se trata

de uma área bastante extensa que adentra o continente, esse contingente permitiu

também a colonização dos indivíduos vegetais desse local. O aporte de sedimentos

passa a ser retido nesse ambiente de baixa topografia antes de se projetar para o mar,

pois, o rio conta ainda com um anteparo das forças marinhas pelo muro formado pelos

recifes diante da foz estuarina do rio.

Cidade da Baía da Traição

Estuário do rio Mamanguape

Corrente de deriva sentido norte

Recifes

Área provável de vegetação do Manguezal no estuário

Ponta da Trincheira

Os sedimentos, ao atingirem o mar, não são projetados para além dos recifes,

fato esse que também pode ser observado na imagem (ver Fig. 5), pois a corrente de

deriva, que possui sentido norte, arrasta o material sedimentar para as enseadas a jusante

da foz do rio em direção à cidade da Baía da Traição, formando nessas áreas a planície

costeira com praias bem ativas progradando ou retrogradando o ambiente continental.

Sendo esses sedimentos um dos elementos mais atuantes e responsáveis pelo equilíbrio

que sofrem as feições praieras do lugar observado, vale ainda destacar que esse material

sedimentar se origina, em muitos casos, de processos de erosão distante do mar, e que

por rolamento fluvial acaba sendo deslocado de montante do rio para jusante, sendo um

agente fomentador da progradação continental por deposição continuada nas áreas

costeiras, e no nosso caso às enseadas que sucedem à foz do rio Mamanguape até a

enseada da Baía da Traição.

Sendo a bacia hidrográfica do rio Mamanguape (ver Fig. 6) responsável pelo

fornecimento de sedimentos das enseada da Baía da Traição, lembramos que as bacias

hidrográficas são bacias naturais de erosão, ou seja, área-fonte da maioria dos

sedimentos estabelecidos na enseada da Baía da Traição. Esse processo tem início

principalmente com a erosão pluvial que ocorre nas encostas da bacia hidrográfica do

rio Mamanguape, sendo que esse processo natural é atenuado pela cobertura vegetal.

Porém, pode e tem sido alterado a partir das práticas de cultivos agrícolas,

principalmente a atividade intensa da agroindústria canavieira. Essas práticas, para

serem estabelecidas, recorrem inicialmente à retirada da cobertura vegetal nativa para

então fazer a substituição por culturas homogêneas, assim o solo acaba por ficar

desnudo também pela remoção da serrapilheira a partir desse conjunto de atividades.

Quando ocorre a precipitação pluvial de elevada magnitude, o solo exposto é

desagregado pela ação impactante da chuvas acontecendo o transporte desse do material

sedimentar que chega ao rio e por ele é transportado até ao estuário a foz do rio e daí

para o mar, sendo então nesse momento, transportado pela corrente de deriva até a

enseada da Baía da Traição, configurando as feições da paisagem local.

Figura 6 - Bacia do rio Mamanguape

2.3 - Dinâmica marinha: conjuntos e elementos que contribuem para a estrutura da feição da linha litorânea na Baía da Traição.

Os principais processos que formam a dinâmica costeira são as ondas, marés,

correntes de deriva, entre outros que ajudam a configurar as feições presentes na

paisagem em estudo. Podemos destacá-los de forma bem nítida como componentes que

atuam na área, os quais, além das principais marés, ondas e correntes, ficou evidenciado

através de excursões no local que outros elementos presente no lugar também

contribuem de forma significativas entre eles recifes, sedimentos e o vento,

considerados também elementos de participação direta no processo de erosão que

provoca a progradação ou a retrogradação continental que ocorre no cenário.

Segundo De Martonne, os movimentos dos oceanos se dão de duas espécies:

“uns as vagas e as marés – não são, em principio, deslocações de massa, mas

movimentos rítmicos ondulatórios ; pelo contrário, outros – as correntes marinhas – são

essencialmente deslocações” (DE MARTONE, 1953, p.323).

O elemento marinho mais visível e atuante para o observador leigo é a onda.

Esse elemento é denominado de movimento das águas do mar que quebram na praia em

um movimento sempre repetitivo que os olhos percebem apenas na linha de praia, sem

imaginar que sua origem é bem mais distante.Poderíamos dizer que uma onda é uma

forma de propagação de energia que corre na superfície da água, profunda e rasa. De

acordo com Strahler :

Las olas en aguas profunda Las olas de los océanos y lagos están producidas por los vientos(...)Las olas en aguas poco profundas A medida que las olas se aproximan a esta zona de escasa profundidad,llega el momento en el que el movimiento orbital de las mismas queda alterado por el rozamiento con el fondo (STRAHLER, 1989, p.330-331).

São diversas as fontes que dão origem as ondas, desde abalos sísmicos marinhos,

movimento das marés e as ondas mais comuns na costa que são produzidas pelo vento.

Uma onda pode atravessar um oceano e revelar-se quando encontra um fundo de costa

rasa que tem influência direta e proporcional quanto ao seu tamanho, no qual ela vai

apresentar a energia contida nela. Na viagem, do ponto de origem ao ponto de

arrebentação ela pode passar por uma embarcação com poucos centímetros na qual

apenas um leve balanço vai ser sentido, ao contrário de uma costa onde, com ajuda do

vento e de acordo com a velocidade, direção e o relevo marinho do ambiente dão uma

determinada configuração no tipo de onda que se forma. As ondas, conforme Turekian,

podem ser geradas :

Em um corpo de água, como uma piscina ou lago através de um dos dois procedimentos: atirando- um seixo na água, observa-se que, a partir do ponto de impacto, desenvolve-se um padrão de ondas concêntricas(...)nos oceanos processos similares atuam para originar as ondas (TUREKIAN, 1969, p.110).

O corpo de uma onda está dividido entre crista e cava, sendo a crista a parte mais

alta onde se forma uma espuma antes de se quebrar na praia, e a cava é a parte mais

funda ou inferior da onda, e para fazer a descrição da onda tomamos a altura, o

comprimento, velocidade e período. Nesse estudo, os principais tipos de onda

detectados são aquelas geradas pela ação do vento e também pelo movimento das

marés, sendo essas de pouca monta devido ao relevo marinho que apresenta sem

rugosidade e com pouca profundidade.

Ao longo da enseada na cidade da Baía da Traição, que tem seu início na Ponta

da Trincheira estende-se até a praia de Giz Branco, percebemos diferentes tipos de

ondas, isso em se tratando de tamanho, freqüência direção, entre outros elementos. A

observação está pautada em dados que foram coletados apenas em pontos específicos,

porém a medida em que aumenta a distância dos recifes, a configuração do tipo de onda

se altera. Ou seja, quanto mais ao norte da Ponta da Trincheira e dos recifes há

refração, e nesse sentido a altura e o padrão da onda se modifica, lembrado que ao norte

encontram-se também as falésias onde em alguns pontos isolados e mais avançado pro

mar existe uma suave abrasão marinha. Apenas na Praia do Giz Branco é que existem

falésias ativas.

Ao longo da enseada os obstáculos são sutis para que possam alterar a

configuração das ondas. Possivelmente os fatores atuantes como os perfis das praias que

não se alteram bruscamente, subtendendo-se que apenas a influência direta dos recifes e

das correntes marinha que atingem diretamente a costa, são os principais agentes de

alteração do comportamento das ondas.

Para veracidade das observações sobre a dinâmica marinha, foram feitas diversas

medições das ondas, considerando altura, velocidade e comprimento. A observação foi

realizada de forma amostral em termos de tempo, pois foi realizada em apenas um dia

no mês de agosto de 2002, especificamente no dia 8 às 15:40hs. Nesse dia a maré alta

estava prevista para às 16:24hs que possivelmente atingiria a altura de 2.3m, tomando

por base a Tábua de Maré do Porto de Cabedelo (ver Gráfico 1).

Gráfico 1 - mostra a diferenciação do comportamento das ondas ao atingir a costa

Foi verificado no local onde foi observada a erosão, que as ondas têm uma altura

relativamente baixas em média de 58cm, variando de 30cm a 100cm, ocorrendo picos

esporádicos de 100cm (1m). As medições foram feitas dentro do mar a partir de dois

pontos marcados com bóias dentro d’água, distando uma da outra um intervalo de 15m .

Esse intervalo permitiu também acompanhar a velocidade, ficando constatada uma

média de tempo de 4” para esse percurso, o que nos leva a inferir que uma onda de

58cm de altura em média e uma velocidade de 3.75m/s ao atingir a costa, sua energia

possivelmente agita as partículas deixando-as em suspensão na praia.

Gráfico Medição de Altura de Onda

3050

40

100

5060 60

45

95

50

020406080

100120

1º 2º 3º 4º 5º 6º 7º 8º 9º 10º

Tamanho em cm

Quando a onda chega à zona de arrebentação, ela varia o ângulo devido à

corrente de deriva litorânea e de acordo com o local onde ela vai quebrar. Logo após a

Ponta da Trincheira seguindo sentido Norte, ela atinge de frente a praia, mas ao meio da

enseada ela atinge a praia com um ângulo variado, onde se pode verificar também

através da observação de cima das falésias toda a enseada, e observando claramente o

processo de refração das ondas (ver Fig. 7) e o funcionamento desse processo atuante.

Figura 7 - Refração e direção de arrebentação na costa. Data: 27/02/02 .

Os diferentes tipos de ângulos de refração que atuam nesta costa ajudam ao

transporte de sedimentos no sentido paralelo a costa, devido à corrente de deriva

litorânea. Outro movimento marinho percebido no litoral são as marés. Estas estão

diretamente ligadas à relação da força de atração no qual a Terra e a lua exercem sobre

si influencias e as massas de água da Terra provoca esses movimentos periódicos dos

oceanos. Segundo Turekian :

Esta força resultante varia em cada ponto geográfico, à medida que a lua gira em torno da Terra, e tende a mover a superfície da Terra, modificando-a até o equilíbrio. A Terra, apesar de sua rigidez, responde sutilmente a essa força, produzindo as marés (TUREKIAN, 1969, p.109).

Seguindo as fases da lua conseqüentemente seguimos as oscilações da maré. No

entanto é conveniente salientar que as marés de altura máxima são chamadas maré de

sizígia, e tem sua presença nos períodos em que ocorrem as fases de lua cheia ou nova e

normalmente no período entre o solstício de janeiro ao equinócio de março. E o ponto

de menor oscilação é denominado de quadratura, tendo sua ocorrência nos períodos em

que a lua está no quanto minguante ou no quarto-crescente. As marés no seu ponto

maior são denominadas de preamar, e no ponto mais baixo de baixar-mar, oscilando

temporalmente entre uma e outra, em torno de 6h e 12’, por isso há marés altas diurnas

e também noturnas.

As amplitudes das marés que são a diferença entre a máxima e a mínima, podem

ser verificadas no mesmo dia. De Martonne Considerando que “a acção combinada dos

dois astros, explicar facilmente a periodicidade mensal de acordo com a rotação da lua

em torno da Terra”(DE MARTONNE ,1953, p.331).

Para interpretação do movimento desse agente pertencente à dinâmica costeira

no cenário em estudo, definimos o período de agosto de2001 a agosto de 2002 enquanto

intervalo de tempo para observar melhor o movimento senoidal das amplitudes e para

isso tomamos como base a Tábua de maré referente ao Porto de Cabedelo.

Devido à sua proximidade. Contudo levamos em conta a informação verbal do

Profº Eduardo Pazera no sentido de testar a verdade desta Tábua de marés pois, apesar

de sua relativa proximidade, podem ocorrer diferenças significativas de altura e horário

das marés em função de peculiaridades locais. O teste consiste em observar se os

horários e alturas coincidam com a base na colocação de estacas na Praia de Baía da

Traição marcando o ponto mais alto da maré e comparando com a Tábua de Cabedelo.

O balanço oscilatório das marés, juntamente com as ondas, também se reflete na

acumulação de sedimentos que ficam retidos temporariamente sobre os muros de arrimo

que foram construídos para deter o avanço do mar. Relacionandos os gráficos e as fotos,

pudemos fazer uma aproximação diagnóstica, indicando que há uma relação entre os

fatores pertinentes à dinâmica costeira atuante e o intervalo de tempo no cenário

observado.

É conveniente salientar que na construção do gráfico foram determinadas apenas

as alturas máximas e mínimas de cada mês correspondente, lembrando ainda que em

alguns meses as marés altas foram de baixa freqüência, e em outros meses a freqüência

dessa maré foi maior. Tomamos ainda como exemplo, os meses de março de 2002 e

julho de 2002, sendo registrado em março 8 dias com maré acima de 2.4m, inclusive

como a mais alta do ano que chegou a registrar 2.7m, enquanto isso em julho apenas

duas marés 2.4m (ver Gráfico 2). Essa relação, nesse período, mostra o comportamento

do fenômeno da maré.

Gráfico 2 - Demonstrativo do perfil oscilatório da maré. Fonte Tábua de Marés

O processo erosivo que ocorre na enseada da cidade da Baía da Traição

possivelmente acontece devido ao aporte negativo de sedimentos na linha de praia. Os

sedimentos são transportados pelo rio e aportam nas praias sendo responsáveis pelo

equilíbrio e estabilidade da linha de praia. Todo esse material transportado, vem do

continente e acaba sendo depositado na praia. Esses sedimentos têm origem em uma

fonte que sofre a ação do intemperismo tanto químico como o físico, o material

desagregado vai sendo transportado pelas vertentes da bacia hidrográfica e levado para

o mar pelos rios. Nesse sentido, Travassos et al adverte que:

Relação das marés no periodo de agosto de2001a2002

2,52,42,32,42,62,72,32,52,22,32,52,62,6

-1

0

1

2

3

Ago/

01

Set/0

1

Out

/01

Nov

/01

Dez

/01

Jan/

02

Fev/

02

Mar

/02

Abr/0

2

Mai

/02

Jun/

02

Jul/0

2

Ago/

02

Altu

ra e

m m

Maré AltaMaré Baixa

As praias locais, originadas por ações flúvio-marinha e pelas correntes de deriva litorânea sul-norte, influenciadas pelos Alísios de SE(...) um paredão retilíneo paralelo a costa, estende-se por mais de 5Km, de modo continuo, desde a barra de Mamanguape ate a altura da Praia de Coqueirinho na margem norte do estuário, e daí em diante continua em alinhamento descontinuo, por mais de 6KM, ate a Baía da Traição. A grande quantidade de aporte de sedimento arenosos por rios locais, como o Mamanguape, tem expressiva significação na evolução destas praias (TRAVASSOS, et al,1992, p.5).

Sabemos que os sedimentos servem de equilíbrio para as feições das praias,

assim podemos ter excesso ou falta de sedimentos. No caso essa dinâmica acaba

provocando um desequilíbrio e conseqüentemente um processo de erosão ou

progradação, já que na cidade da Baía da Traição foram detectados os dois processos na

paisagem, o que nos leva a observar sistematicamente esse processo dinâmico para

então fazer algumas inferências relativas à gestão do cenário em voga.

Em excursão ao campo com o objetivo de coletar os dados, constatamos grande

número de Rhizophora mangle, colaborando assim com o nosso estudo já que o

ambiente natural da Rhizophora mangle é ambiente estuarino e de mangue. Segundo o

Prof. Paulo Rosa em uma explicação oral presente no local do estudo, “Rhizophora

mangle estava em processo de colonização, pois fora transportada pela corrente de

deriva do estuário do rio Mamanguape”. A colonização dos indivíduos oriundos dos

manguezais fora encontrada em grande aglomerado no ponto onde está ocorrendo a

progradação (ver Fig 8, 9 e 10).

Figuras 8 e 9 - Processo de Colonização da Rhizophora mangle – Fotos Maria José - Data 02/08/02 .

Figura 10 – Canal da Ponta da Trincheira entulhado de areia local em que está ocorrendo tanto a progradação continental quanto a colonização pelos indivíduos do mangue – Foto Conrad Rosa -Data 09/04/02.

O canal que liga as correntes de deriva oriundas do estuário do rio Mamanguape

e aprisionadas entre o cordão de recifes e a enseada à montante da cidade da Baía da

Traição, está sendo entulhado pelo material oriundo desse estuário, tanto no que

concerne a sedimentos quanto à matéria orgânica e indivíduos populacionais referente à

vegetação de mangue, conforme mostra a figura 10.

Sementes germinando

No entanto, na maré alta, época em que foi feita a observação, a intensidade e a

força do vento eram bem nítidas. As casas situadas à beira mar sofrem os riscos

periódicos quando a maré em seu ponto máximo, assim como as onda, chegam a invadi-

las. Esse evento atuante de forma constante obriga os moradores a construírem muros de

arrimo devido à vulnerabilidade do local a partir da dinâmica presente dos agente

naturais.

Ainda observando os movimentos que se estabelecem na área próxima a linha da

costa, a corrente que está evidenciada em nossa área de estudo e que tem função de

transportar, acumular e retirar material aportado nas praias é a corrente de deriva

litorânea, e corre paralelamente ao lado da costa. Sua origem é devido em grande parte

pela quebra da onda que atinge a costa em um ângulo oblíquo. Onde também encontra

um fundo raso; conseqüentemente, a onda agita as partículas de sedimentos, fazendo

com que fiquem em suspensão e sejam transportados ou depositados na praia. De

acordo com a velocidade da corrente de deriva litorânea ela também pode selecionar o

material que está em suspensão.

A direção da corrente de deriva que atua em nossa área de estudo está na direção

S – N, transportando os sedimentos originários do estuário do rio Mamanguape. Esse

sedimentos vão se depositando ao longo da enseada que antecede a enseada da Baía da

Traição. Ao longo de todo esse percurso, a corrente de deriva litorânea é acompanhada

por uma linha de recifes que barra os sedimentos ao chegar na Ponta da Trincheira,

único ponto de contato da linha de recifes com o continente (ver Fig. 11). As correntes

marinhas propriamente ditas formam “uma verdadeira circulação, que modifica o estado

físico e químico da massa oceânica e cuja a influência se faz sentir ate no clima dos

continentes” (DE MARTONE, 1953, p.333).

Até agora foram referenciados os elementos pertinentes ao movimento marinho

observado de forma visível aos nossos olhos, porém, de agora em diante evidenciaremos

um elemento litólico no mar que são os recifes e estão presentes e atuantes na área em

estudo. A linha de recifes é um diferencial importante, já que está interferindo

diretamente em todo o processo de progradação e erosão da linha de costa na cidade da

Baía da Traição. Segundo Carvalho

As Formações Recifais que aparecem na sub - zona marítima, são comuns na costa paraibana, com bons exemplos nas praias de Tambaú, Bessa, Cabedelo, Barra de Mamanguape e Baía da Traição (...) Aparecem no Estado, os tipos areníticos e coralígenos (CARVALHO, 1982, p.18).

Figura 11 :Linha de Recifes: Único ponto de contato com o continente Data27/02/02.

Boa parte dos sedimentos que são lançados pelo rio Mamanguape é retida pela

linha recifal que se transforma em uma espécie de desvio natural no qual esses

sedimentos ficam retidos. Seguindo a corrente de deriva litorânea no sentido N, ficando

retida e acumulando-se nas enseadas, os recifes aparentemente têm duas funções: a

primeira é barrar as correntes marinhas, protegendo o cúspide que é a Ponta da

Trincheira e, conseqüentemente a cidade. A segunda função é canalizar boa parte dos

sedimentos que são lançados pelo rio Mamanguape para as enseadas, mas quando esses

sedimentos chegam a Ponta da Trincheira aí se acumulam, devido ao canal que é

formado pelos recifes e pelo continente, ou seja, pela Ponta da Trincheira (ver Fig. 11),

Esse canal só é rompido na maré alta.

Figura 12– Diagrama demonstrando à dinâmica costeira

Quando as marés não têm uma grande amplitude, ou seja, as de quadratura,

ocasionam uma acumulação dos sedimentos na Ponta da Trincheira ou cúspide, fazendo

com que ocorra uma déficit de sedimento na enseada a jusante dessa Ponta. No entanto,

quando ocorrem marés de grande amplitude o processo é inverso e os sedimentos

passam a ficar acumulados na enseada. Esse balanço oscilatório causado pelas marés,

correntes e ondas é bem visível durante determinado período do ano, percebendo-se

através de referenciais urbanos. Nesse caso, nos muros de arrimo das residências

instaladas à beira mar, o indicativo é que esses muros ficam soterrados em uma época

para depois aparecerem (ver Fig. 13, 14 e 15).

Figura 13 - Acumulo intenso de sedimentos- Figura 14 - Sedimentos foram transportados (Data 27/Fevereiro/02) (Data 02/Agosto/02)

Já apontamos os diversos elementos atuantes no processo da dinâmica efetiva na

zona costeira, e para completar esse elenco faz-se necessário dar destaque ao vento, pois

ele é o principal responsável pelas ondas no local. Foram feitas algumas medições em

campo para melhor qualificar o lugar, especificamente no cúspide e na Ponta da

Trincheira, locais estes em que a observação da progradação e retrogradação estavam

mais evidentes. A medição feita para verificação das rajadas de ventos não serve como

volume significativo, porém corrobora o que está definido pelas informações locais

enquanto direção e sentido. Nesse caso usamos um anemoscópio vulgarmente chamado

de biruta para verificação da direção do vento que é SE. Para medir a velocidade

usamos, de forma sistemática, um anemômetro que indicou numa primeira amostragem

valores que oscilaram de 3m/s ao pico de ate 6,5m/s durante sete minutos. Na segunda

medição já na areia da praia bem de frente a Ponta da Trincheira o anemômetro acusou

ventos de 13,5m/s até 14m/s às 12:43hs, observando que o tempo estava nublado com

pancadas de chuva.

Com esses dados verificamos que a atuação do vento é mais intensa na área da

progradação, onde possivelmente seja um dos fatores responsáveis pelo acúmulo desse

sedimento, enquanto na área da erosão o vento de 3 m/s é equivalente na tabela de

Beaufort ao número 3, ou seja, uma brisa leve indicando que o processo de erosão é

predominantemente ocasionado pela ação marinha.

Figura 15 – Perfil de Praia da Área de Erosão

2.4 - A geometria do relevo no domínio litorâneo na

Baía da Traição: falésias e o perfil das praias enquanto elos vulneráveis na dinâmica costeira.

No cenário em estudo, as falésias encontram-se em dois regimes distintos, as

ativas e inativas. Através das observações feitas em campo e pelo uso de cartas

topográficas da SUDENE Baía da Traição 1/25000-1972, constatamos que as falésias

ativas, estão sendo solapado pela ação marinha, formam verdadeiros penhascos com até

90º de inclinação (ver Fig. 15), pois são paredões íngremes com altura que varia entre

38m a 45m..

Figura 16– Falésia ativa, penhasco com declividade acentuada. Data 27/02/02.

A ocupação humana referente à cidade da Baía da Traição é relativamente

intensa na área onde a praia tem uma faixa mais larga (ver Fig. 16). Nesse ponto a

cidade fica situada entre dois domínios geográficos bem distintos, ficando ilhada sobre

uma planície costeira resultante da progradação continental, que a área de lagoa afogada

por sedimentos que ainda abrigam o rio Sinimbú (ver Fig.17 e rever Fig. 3). Essa

situação acaba por indicar que a área é relativamente frágil a impactos de realce, como

por exemplo instalações prediais de elevado porte.

90º Aproximadamente 75º

Figura 17-Faixa larga de praia.Data27/02/02Figura 18 – Cidade da Baía da Traição ilhada entre o mar e o rio Sinimbu – Foto Conrad Rosa Data 09/04/02 .

A cidade da Baia da Traição está situada numa área sobre a Planície Costeira e

entre o mar e os Baixos Planaltos Costeiros. Essa planície é o resultado da progradação

continental em que o mar veio trazendo sedimentos depositados no local. As atividades

do mar configuraram a enseada que é um arco de circunferência. No entanto, os vales

cavados pelo rio Sinimbu sobre os Baixos Planaltos, possivelmente desaguavam em

uma laguna costeira, que a partir do seu soterramento acabou transformado-se em uma

área alagada e atualmente é drenada pelo rio (Ver Fig. 18).

Figura 19 – Configurações geométricas no entorno da cidade da Baía da Traição – Foto Conrad Rosa Data 09/04/02 .

cidade

Rio Sinimbu

Cidade da Baía da Traição

Planície costeira

Possível área que abrigou uma laguna costeira

Terceira Parte 3.1 – Conclusão

Na análise geral do contexto estudado sobre a enseada da Baía da Traição e sua

morfogênese, concluímos, através de verificações feitas em campo e com levantamentos

bibliográficos onde encontramos subsídios para respondermos as hipóteses levantadas,

que o processo de erosão que está ocorrendo em determinados pontos na enseada da

Baía da Traição é o resultado da atuação da dinâmica costeira juntamente com o

principal fornecedor de sedimentos, o rio Mamanguape que, através dessa relação

fomenta o processo de erosão presente na enseada da Baía da Traição.

Evidências encontradas na enseada da Baía da Traição incluem as Rhizophora

mangle, uma planta de ambiente estuarino. O ambiente estuarino mais próximo é do rio

Mamanguape, foram encontrada em nossa área de estudo um grande número desta

planta, fixadas na altura do berma, onde podemos verificar a origem dessa planta

possivelmente é a origem dos sedimentos.

O sentido da corrente de deriva litorânea S-N juntamente com os recifes presente

no local e os faz com que os sedimentos originários do rio Mamanguape sejam

direcionados para Ponta da Trincheira onde aportam e ficam retidos, causando um

aporte negativo no restante da enseada provocando o processo de erosão.

Quando a ação da dinâmica costeira atua sobre esse ambiente de vulnerabilidade

ocorre um ciclo que podemos ver claramente em determinado período do ano, quando o

aporte de sedimentos é mais intenso chegando a cobrir muros de arrimos construídos

por moradores para impedir o avanço do mar e causar danos maiores ao patrimônio

daqueles que ali residem.

Possivelmente devido as evidencias encontradas na área de estudo temos que nos

remeter para o futuro, onde mesmo sendo um processo natural está se fomentando

mudanças significativas na paisagem local.

Lançando uma proposta mais coerente, visando uma melhor preservação da área

deve-se incluir um planejamento geoambiental, onde poderíamos obter mais subsídios

para fazermos uma análise mais aprofundada do comportamento desse ambiente a fim

de diagnosticar possíveis eventos que venham a comprometer a integridade do

patrimônio publico ou privado através de uma gestão baseada em dados sérios e

confiáveis. Desse modo, pode-se evitar a ocupação indevida em áreas de grande

vulnerabilidade, pois, geralmente, a especulação imobiliária não busca entender o

processo natural.

3.2 Bibliografia

ALMEIDA, Horácio de. Historia da Paraíba – Tomo I. João Pessoa: Imprensa Universitária, 1966 AZEVEDO, Aroldo de. Geografia Física. São Paulo: Companhia Editorial Nacional, 1958. BLOOM, Arthur L. Superfície da Terra. São Paulo: Ed. Edgard Blucher, 1970. CARVALHO, Maria Gelza R. F. de. “Estado da Paraíba”: classificação geomorfológica. João Pessoa: Ed. Universitária/UFPB, 1982. DE MARTONNE, Emmanuel .Panorama da Geografia, volume 1. Lisboa. Edições Cosmos; 1953 DOLFUSS, Olivier. A analise Geográfica – Serie Saber Atual, São Paulo: Difusora Européia do Livro,1973 GARCIA, Othon M. Comunicação em Prosa moderna. 7ed. Rio de Janeiro 1978 Ed da fundação Getulio Vargas GUERRA, Antônio José Teixeira, CUNHA, Sandra Baptista da. Geomorfologia; uma atualização de base e conceitos. Rio de Janeiro: Ed Bertrand Brasil, 1994. 458p _______, Antônio José Teixeira, CUNHA, Sandra Baptista da. Geomorfologia; exercício, técnicas e aplicação. Rio de Janeiro: Ed Bertrand Brasil, 1996. 343p _______, Antônio José Teixeira, CUNHA, Sandra Baptista da. Geomorfologia do Brasil, Rio de Janeiro: Ed Bertrand Brasil, 1998. 388p GUERRA, Antônio Texeira & GUERRA, Antônio José Texeira. Novo Dicionário geológico-geomorfológico. Rio de Janeiro: Ed. Bertrand Brasil, 1997. GUERRA, Antônio Texeira. Dicionário Geológico – Geomorfológico. Rio de Janeiro: IBGE, 1978. MARRERO, Levi. La tierra y sus recursos – una nueva geografia general visualizada. 19ª ed. Madri. Publicaciones Cultural S.A, 1975 NAKATA, Hirome, COELHO, Marcos Amorim. Geografia Geral – Serie Sinopse. 1ªed. São Paulo. Ed Moderna, 1979

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3.3 - Anexos