Press Review page - ulisboa.pt · agnósticos e ateus. Francisco Mei- ... dade o papel dos...
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DEIXARASLEIS, PÔRMÃOS À TERRA
REPORTAGEM. A MISSÃO PAIS. INICIATIVA CATÓLICA UNIVERSITÁRIA FOI CRIADA HÁ 15 ANOS
Trocaram as férias por uma semana em Vieira de Leiria.Plantaram árvores e até foram trolhas. Por Ana catarina André
A paisagem é negra. As ár-vores que ainda restamdos incêndios de 15 de
Outubro - que devasta-ram 86% do pinhal de Leiria - fi
caram despidas pelas chamas. Nomeio da aridez avistam-se 58 T--shirts azul-turquesa. São jovensda Taculdade de Direito, da Uni-versidade de Lisboa, que aprovei-taram a pausa entre semestres
pata plantar pinheiros e sobreiros,sob orientação do ICNF (Institutoda Conservação da Natureza e das
Florestas). Teresa Calhciros. de 24
anos, e Manuel Mendes, de 19, são
os chefes do grupo que faz parteda Missão País. um projecto de
universitários católicos, existenteem Portugal há 15 anos. "Tendo emconta o que aconteceu, disponibilizámo-nos a ajudar. Esta é apenasuma parte do que estamos a fazeresta semana, em Vieira de Leiria[uma das vilas que ficou cercada
pelo fogo o ano passado]. Tambémvisitamos idosos, ajudamos na es-cola e estamos presentes na co-munidade", diz Manuel.
Durante uma semana por ano, cer-ca de 58 estudantes de uma faculda-de instalam-se numa vila ou aldeia
para "fazer o que for preciso". "Ape-sar de ter uma vertente de volunta-riado - estamos presentes nos lares,
nas escolas, visitamos quem está
mais sozinho -, é sobretudo um pro-jecto cristão. Temos missa todos os
dias, oração da manhã e da noite e
um padre sempre presente", explicaMafalda Ivo de Carvalho, responsá-vel nacional pela Missão País, acres-centando que o projecto já chegou a43 faculdades do País. "São mais de3.000 universitários de Lisboa, Por-
to, Coimbra e Évora."No terreno, situado nas imedia-
ções de Vieira de Leiria, misturam--se também outros voluntários da
região, como Fernanda Pessoa, de
72 anos, botins escuros, bata verdee enxada em punho. "A primeiravez que vi isto assim, as lágrimasescorreram me pela cara", conta àSÁBADO a reformada, que traba-lhou no Pinhal do Rei entre os 11 e
os 18 anos. "Éramos 30 mulheres a
limpar a mata. Agora não se vê nin-guém", conta. Ao seu lado, uma
universitária tenta plantar uma ár-vore. "Ó filha", diz, carinhosamente,"tens que pôr o pinheiro mais fundo
para pegar bem". Já com a raiz de-baixo do solo, pede-lhe que se afas-te, e pisa o terreno que circunda aplanta, enquanto explica: "Tens deir calcando bem."
Este é o quarto ano que os alunos
da Faculdade de Direito estão emmissão em Vieira de Leiria. "Normal-mente ficamos apenas três anos numsítio, mas no fim da última missão o
padre Miguel [Sottomayor], que nos
acompanha, pediu-nos para voltar:ainda havia muito a fazer. Depois,com os incêndios, tornou-se maisevidente", diz a chefe, Teresa Calhei-ros. O grupo deste ano esteve dividi-do entre três lares e uma escola -havia também a "comunidade detrolhas" (cinco estudantes ajudarama recuperar e a limpar uma casa an-tiga) e a do teatro (que preparou uma
peça para apresentar à população,inspirada no tema do ano A Paz Es-
teja em Tua Casa).
Por terem tantos interessados emparticipar nesta iniciativa, em 2015
abriram mais um grupo de missão
na faculdade. Nos últimos anos, aafluência ao site, no dia de aberturade inscrições (em meados de De-zembro), tem sido tanta que a pági-na fica bloqueada. "No Técnico,onde há quatro missões [e cerca de240 lugares], as vagas ficaram
preenchidas em 5 minutos", contaMafalda Ivo de Carvalho. "Infeliz-mente, fica sempre gente de fora."
O cartaz feio que convenceu 20Criada em Portugal há 15 anos, a
Missão País surgiu na Faculdade de
Economia, da Universidade Novade Lisboa, por iniciativa de um es-tudante de Gestão de 19 anos. "Per-cebi que Deus estava fora da uni-versidade e isso preocupava-me.Além disso, interessava-me reflectirsobre o modo como a fé influencia-ria a minha vida profissional", re-corda Alberto Fernandes. O
A par dasmissões
surgiram nasuniversidadesnúcleos de es-
tudantes católi-
cos; neste mo-mento são 22
"NO TÉCNI-CO, ONDE
HÁ QUATROMISSÕES [ECERCA DE240 LUGA-
RES], ASVAGAS FICA-RAM PREEN-CHIDAS EM 5
MINUTOS"
Ref lorestação do pinhalDepois de o ICNF lhes ter pedido queplantassem sobreiros junto às casas,
os participantes da Missão País
puseram pinheiro-bravo num terrenonas imediações de Vieira de Leiria
O Com base na experiência que játinha tido em missões familiares(destinadas a casais com filhos,mas semelhantes ã actual estruturada Missão Pais), falou com o padreDiogo Mendes Barata. O sacerdotedo Movimento Apostólico deSchocnstatt (movimento marianofundado na Alemanha, com san-tuário no Restelo, em Lisboa) acei-tou de imediato a ideia de replicaro conceito na universidade, à se-melhança do que já se fazia noChile. "Avançámos com a ideia,sem noção de que se transformarianum projecto desta dimensão. Nãotínhamos quaisquer dotes artísticos
e, para divulgar a missão, fizemosuma folha A 4com umas letras pre-tas", recorda. No cartaz constavam
apenas a data da missão, o local(Coruche) e o lema: Onde estiver o
teu tesouro, aí estará também o teu
coração. "Espalhámos vários pa-péis pela universidade. Até senti
vergonha a colar alguns - estavamfeios", diz Alberto Fernandes, quehoje vive em Boston, nos Estados
Unidos, onde é director financeirode uma empresa de retalho.
Para essa primeira missão, apare-ceram 20 universitários. "Sur-
preendeu-me que só tivesse apare-cido gente que não nos conhecia.Além de visitas a idosos e do traba-lho com a população, alguns mis-sionários participaram, a semanatoda, num programa de uma rádiolocal [na Rádio Voz do Sorraial."
No ano seguinte, em 2004, já ha-via mais duas missões, uma naUniversidade Católica e outra noInstituto Superior Técnico. "Surgeminiciativas dos estudantes. Não so-mos nós, estrutura nacional da Mis-
são País, que decide isso", explicaMafalda Ivo de Carvalho.
Em 2012, perante o boom do
projecto, criou-se um conselhoconsultivo para assegurar uma ex-pansão sustentável. Alberto Fer-nandes fez parte desse grupo ini-cial. "Era preciso preparar o pro-jecto para os próximos 10 a 15
anos: pensar na estrutura, nos va-lores, no sistema de inscrições, nadivisão de tarefas, ete", explica o
gestor, hoje com 34 anos.
Vinte anos sem sair de casaNem todos os estudantes queparticipam na Missão País se assu-mem como católicos. Também há
agnósticos e ateus. Francisco Mei-reles, de 24 anos, está â fazer mis-sões pela quarta vez, em Vieira deLeiria. "Quando vim, em 2015, nãoacreditava em Deus. Aceitei o de-safio de um amigo na perspectivade ajudar os outros. Era-me difícilaceitar o transcendente, porqueisso significava não controlartodos os aspectos da vida", conta."Além disso, achava ridículo queos meus colegas viessem felizesdas missões."
Acabou por perceber, depois, quea "atenção que deu aos outros" foimais importante para si do que paraeles. "Descobri que afinal tinha fé.
Não sou tão praticante, mas tenho
relação com Deus", diz Francisco."Crentes e menos crentes, trazem
todos muitas perguntas", diz o
padre Miguel Sottomayor, de 44anos. "Se Deus existe mesmo, por-que é que não prova? Qual é o meupapel no mundo? Como se explicao sofrimento? Alguns sabem bas-
tante de Filosofia", garante.Além do impacto em cada um
dos alunos, a missão centra se nacomunidade. No lar da paróquia,no centro de Vieira de Leiria, Rosa,de 94 anos, resume com simplici-dade o papel dos universitários nainstituição. "Gosto muito de con-versar com os meninos." O que fa-zem a semana inteira? "O mesmoque eu: almoçam, fazem Jogos e
lancham como eu."Para outros idosos, isolados em
casa, o papel dos missionários é
mais consciente. "No primeiro ano,na actividade do porta-a-porta [em
que se visita gente da terra], um
grupo conversou com uma viúva,
que não falava com ninguém",conta Miguel Sottomayor, dizendo
que a idosa entretanto retomou avida social, graças aos estudantes."Percebemos que aquela senhoraesteve 20 anos sem sair de casa.
Não tinha motivos para viver." O
NEMTODOS OS
ESTUDANTESSE ASSUMEM
COMOCATÓLICOS.TAMBÉM HÁAGNÓSTICOS
E ATEUS
93vilas,
aldeias ecidades
portuguesasjá receberama Missão País,desde 2003.
O projectodecorre foradas grandes
cidades
OAlém da
participação dosuniversitários,
a reflorestação,no Pinhal de
Leiria, contoucom voluntários
da região
ONo lar da paróquiade Vieira de Leiria
estiveram oitouniversitários
De cá para EspanhaA Misión País é semelhanteao projecto português
A Missão Pais chegou a Ma-drid em 2014. "Antes disso, al-
guns espanhóis vieram fazermissões a Portugal", conta Ma-falda Ivo de Carvalho, responsá-vel nacional. Depois, estiveramem formação com os organiza-dores portugueses, para perce-ber como operacionalizar o
projecto. "Actualmente há setemissões em Madrid."