prescrição em parecer do MP
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3. PRELIMINAR – DA OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA
ESTATAL.
Em face da ocorrência de um crime, ao Estado se impõe o dever de punir,
consubstanciando-se na pretensão punitiva, contudo, o não exercício do poder punitivo,
após o escoamento de determinado lapso temporal, impedirá sua atuação, consistindo,
referida abstenção estatal, em uma causa extintiva da punibilidade. Conforme ensina
Damásio de Jesus1:
“Titular do direito concreto de punir, o Estado o exerce por intermédio da ação penal, que tem por objeto direto a exigência de julgamento da própria pretensão punitiva e por objeto mediato a aplicação da sanção penal. Com o decurso do tempo sem o seu exercício, o Estado vê extinta a punibilidade e, por conseqüência, perde o direito de ver satisfeitos aqueles dois objetos do processo”.
Conquanto a defesa se manifestou sobre a ocorrência da prescrição
retroativa, caso a sentença fosse reformada a patamares de 02 anos de reclusão na pena
definitiva, há que se destacar a ocorrência de matéria prejudicial à análise do mérito
recursal, consistente na consumação da prescrição da pretensão punitiva estatal.
Esta se configura como a perda do direito de punir do Estado, em virtude
do seu não exercício por determinado lapso temporal. Neste ponto, cumpre transcrever a
lição de Cezar Roberto Bitencourt que, com maestria, elabora a sua conceituação:
“Com a ocorrência do fato delituoso nasce para o Estado o ius puniendi. Esse direito, que se denomina pretensão punitiva, não pode eternizar-se como uma espada de Dámocles pairando sobre a cabeça
1 JESUS, Damasio de. Prescrição penal, 18ª edição, São Paulo: Saraiva, 2009. p. 23.
Paulo César BusatoProcurador de Justiça 1
do indivíduo. Por isso, o Estado estabelece critérios limitadores para o exercício do direito de punir, e, levando em consideração a gravidade da conduta delituosa e da sanção correspondente, fixa lapso temporal dentro do qual o Estado estará legitimado a aplicar a sanção penal adequada. Escoado o prazo que a própria lei estabelece, observadas suas causas modificadoras, prescreve o direito estatal à punição do infrator.”2
Cediço, outrossim, que a prescrição consiste em matéria de ordem pública,
passível, portanto, de reconhecimento ex officio¸ em qualquer tempo ou grau de
jurisdição, inteligência do art. 61, do CPP – “Em qualquer fase do processo, o juiz, se
reconhecer extinta a punibilidade, deverá declará-lo de ofício”.
É o entendimento perfilhado pelos seguintes arestos, provindos das Cortes
Superiores:
Embargos declaratórios no agravo regimental no recurso extraordinário. Matéria criminal. Questões afastadas nos julgamentos anteriores. Ausência de omissão, de contradição e de obscuridade. Precedentes. Alegada prescrição da pretensão punitiva estatal. Consumação. Matéria de ordem pública que pode ser arguida e reconhecida a qualquer tempo. Artigo 61 do Código de Processo Penal. Ordem de habeas corpus concedida de ofício. Precedentes. (...) A prescrição em direito penal, em qualquer de suas modalidades, é matéria de ordem pública e, por isso, pode ser arguida e reconhecida a qualquer tempo (art. 61, do Código de Processo Penal). 4. Ordem de habeas corpus concedida, de ofício, para declarar extinta a punibilidade do embargante, em virtude da consumação da prescrição da pretensão punitiva estatal. (STF, RE 634610 AgR-ED, Relator: Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 13/03/2012, DJe-070 divulgação 10-04-2012 publicação 11-04-2012).
2 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal : parte geral I. 15º ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 809.
Paulo César BusatoProcurador de Justiça 2
PENAL. HABEAS CORPUS. CRIMES CONTRA A LEI DE LICITAÇÕES. PRESCRIÇÃO. OCORRÊNCIA. RECONHECIMENTO DE OFÍCIO. PREJUDICADAS AS DEMAIS MATÉRIAS. 1. A prescrição é matéria de ordem pública que pode ser reconhecida de ofício a qualquer tempo. 2. Transcorrido o prazo prescricional entre os marcos interruptivos do recebimento da Denúncia e da sentença condenatória, deve ser declarada a extinção da punibilidade pela ocorrência da prescrição. 3. Prejudicada a análise das demais matérias de mérito. 4. Habeas corpus concedido. (STJ, HC 239.033/PE, Rel. Ministro ADILSON VIEIRA MACABU (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RJ), QUINTA TURMA, julgado em 21/06/2012, DJe 02/08/2012)
A prescrição da pretensão punitiva apresenta-se de duas formas distintas,
a saber: pela pena em abstrato, levando-se em conta a pena máxima abstratamente
cominada ao tipo penal; e pela pena em concreto (prescrição retroativa ou
intercorrente), que se regula pela reprimenda fixada em sentença, com trânsito em
julgado para a acusação – Súmula 146, do STF: “A prescrição da ação penal regula-se pela
pena concretizada na sentença, quando não há recurso da acusação”.
No que tange à prescrição retroativa, recorremos novamente aos
ensinamentos de Cezar Roberto Bitencourt, onde menciona, inclusive, a existência de
marcos interruptivos à contagem prescricional:
“A prescrição retroativa leva em consideração a pena aplicada, in concreto, na sentença condenatória, contrariamente à prescrição in abstrato, que tem como referência o máximo de pena cominada ao delito. A prescrição retroativa (igualmente a intercorrente), como subespécie da prescrição da pretensão punitiva, constitui exceção à contagem dos prazos do art. 109. [...] Nesses termos, a prescrição retroativa pode ser considerada entre a consumação do crime e o recebimento da denúncia, ou entre este e a sentença condenatória
Paulo César BusatoProcurador de Justiça 3
(art. 110, § 2º, do CP). A pronúncia, nos crimes contra a vida, também cria um novo marco interruptivo para a prescrição retroativa.”3
Neste ínterim, tem-se, outrossim, a previsão do art. 117, do CP, que dispõe
sobre os marcos interruptivos da contagem do prazo prescricional. Na ocorrência de
quaisquer deles, o prazo recomeça do início. In verbis:
Art. 117 – O curso da prescrição interrompe-se:I – pelo recebimento da denúncia ou da queixa;II – pela pronúncia;III – pela decisão confirmatória da pronúncia;IV – pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis;V – pelo início ou continuação do cumprimento da pena;VI – pela reincidência.
A publicação da sentença ocorreu em data de 06 DE SETEMBRO DE 2011
conforme certidão constante na fl. 105 e condenou o réu a uma pena de 2 anos de 11
meses de privação de liberdade, patamar com o qual esteve de acordo o Ministério
Público, tanto que a oposição recursal partiu unicamente da defesa.
Verifica-se, pois, que o conformismo do Ministério Público de 1º Grau com
os termos da sentença condenatória, levou inexoravelmente ao reconhecimento da
prescrição, eis que, não sendo possível a reformatio in pejus em sede de recurso exclusivo
da defesa, o patamar máximo de pena para o caso concreto já foi atingido, devendo ser
ele tomado como referência para o cômputo retroativo da contagem do prazo
prescricional.
Em cotejo com o que regula o art. 109, do CP, utilizando a pena in concreto
imposta ao apelante, qual seja de 02 (dois) anos e 11 (onze) meses de reclusão, temos
que o prazo prescricional é de 08 (oito) anos, de acordo com o art. 109, inciso IV, 3 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal : parte geral I. 15º ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 814.
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conjugado com o art. 110, § 1º, ambos do CP, transcritos abaixo:
Art. 110. A prescrição depois de transitar em julgado a sentença condenatória regula-se pela pena aplicada e verifica-se nos prazos fixados no artigo anterior, as quais se aumentam de um terço, se o condenado é reincidente.§ 1º. A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, não podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa.
Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1º, do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se:IV – em 8 (oito) anos, se o máximo da pena é superior a 2 (dois) anos e não excede a 4 (quatro);
Através da análise desses dois dispositivos, concluí-se que a prescrição
ocorreria em 8 (oito) anos, começando a contar o prazo a partir da publicação da
sentença condenatória, 06 de setembro de 2011. Entretanto, conforme a cédula de
identidade, constante nas fl. 13, percebe-se que o réu era menor de 21 anos na data
dos fatos , logo, deverá ser aplicada a regra disposta no art. 115 do CP, que assim
disciplina:
Art. 115. São reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o criminoso era, ao tempo do crime, menor de 21 anos (vinte e um) anos,ou, na data da sentença, maior de 70 (setenta) anos.
Com a incidência do seguinte dispositivo, o prazo prescricional no caso em
questão é de 4 (dois) anos, que foram excedidos, uma vez que a denúncia foi recebida em
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02 de março de 2007 (fl. 49, verso), e a data da publicação da sentença ocorreu em 10 de
setembro de 2011 (fl. 105).
Deste modo, impõe-se o reconhecimento da prescrição, com a consequente
extinção da punibilidade do apelante.
Mercê do exposto, alvitra o presente parecer o reconhecimento, ex officio,
da ocorrência da prescrição da pretensão punitiva estatal, declarando-se, como disso
consectário, a extinção da punibilidade de XXXX, nos termos dos arts. 107, inciso IV, 109,
inciso V, 110, § 1º e 115, todos do Código Penal.
É o parecer!
Curitiba, 22 de janeiro de 2013.
Paulo César Busato.
Procurador de Justiça.
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