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INTRODUÇÃO O poeta inglês John Donne (1572-1631) tem uma frase fa- mosa, que diz que “nenhum homem é uma ilha, sozinho em si mesmo”. O que ele diz em linguagem literária corresponde a um consenso entre os intelectuais das humanidades. Desde Aristóteles, com sua percepção de que “o homem é um ser social”, atentamos à realidade de que os humanos são seres cuja forma privilegiada de organização é em grupo, o que pres- supõe tanto a celebração dos valores comuns quanto a necessi- dade de conviver com as diferenças. Isso não significa que os homens não tenham, desenvolvam ou prezem sua individualidade. Todo ser humano tem suas cren- ças pessoais, seus sonhos, seus medos, suas habilidades e suas limitações. Aliás, a individualidade é exatamente isto: o conjunto de características que distingue as pessoas, garantindo-lhes a ori- ginalidade, a unicidade, a particularidade. Acontece que, embora o homem possa ser tomado como um indivíduo, isto é, como al- guém considerado isoladamente no grupo a que pertence, os va- lores individuais não podem chegar ao extremo de desprezar nosso caráter social. Afinal, individualidade não pode ser confun- dida com individualismo. Entendemos por individualismo a atitude de quem procura satisfação pessoal a qualquer custo, vivendo exclusivamente para si; trata-se de um comportamento egoísta, que nega o valor (e mesmo as vantagens) da convivência e do compartilhamento da experiência. Dessa forma, o individualismo toma o homem como “uma ilha” e, por isso, pode levar o ser humano à desagregação. Já a ideia de individualidade não se confunde com o egoísmo, uma vez que podemos viver em grupo, estabelecendo relações so- ciais, e, ao mesmo tempo, ter características que nos diferenciem das demais pessoas. Do ponto de vista lógico, todo ser humano é um indivíduo (que significa, literalmente, “o que não se divide”), pois os homens são seres unitários reais, que podem ser reconhecidos por meio da experiência. Existem várias disciplinas que se interessam, em maior ou menor grau, pelo estudo do indivíduo, como a Psicolo- gia, a Biologia ou a Filosofia. Para nós, neste curso, importa o es- tudo da sociedade. ORIGENS DA SOCIOLOGIA Podemos rearranjar a citação de Aristóteles e concluir que o homem, embora tenha sua individualidade, vive em sociedade. Como se vê, o conceito de sociedade é bastante abrangente, pois pode designar tanto um grupo muito amplo — como a so- ciedade do século XXI — quanto agrupamentos mais específicos — como a sociedade cristã medieval. Desde a Antiguidade Clássica, principalmente com Aristó- teles, vários intelectuais se interessam pelo estudo da socieda- de. Porém, até meados do século XIX, não existia ainda uma ciência da sociedade. Foi precisamente durante o Oitocentos (1701-1800), sob os eflúvios libertários da Revolução Fran- cesa e as transformações tecnológicas da Revolução Industrial, entre a consolidação do capitalismo e o acirramento da luta de classes, em meio à independência das colônias americanas e ao fim da escravidão, que surgiu a Sociologia. Montesquieu (1689-1755), Saint-Simon (1760-1825), Au- guste Comte (1798-1857) e Alexis de Tocqueville (1805-1859), entre outros, foram os precursores do pensamento sociológico moderno, pois suas obras buscavam investigar e explicar a vida social. Porém, só alguns anos mais tarde a Sociologia iria emergir como ciência, já na segunda metade do século XIX, quando o posi- tivismo, o evolucionismo social e o determinismo ganharam força, como era esperado numa época em que a ciência era vista como o modo superior de compreensão do mundo (característica do cientificismo, com sua pretendida verdade imparcial e benefícios utilitários). MARX, WEBER E DURKHEIM Três pensadores podem ser considerados os pais da Sociolo- gia: Karl Marx (1818-1883), Max Weber (1864-1920) e Émile Durkheim (1858-1917). Eles deram dimensão científica à disci- plina e começaram a estudar, de modo mais sistemático, as formas de organização e as regras de funcionamento das sociedades hu- manas, procurando determinar as normas que regem as relações sociais. Esses procedimentos implicavam a análise das instituições e dos comportamentos sociais, bem como da ideologia, da cultura e das relações de trabalho que se construíam no mundo capitalista. Sociedade é um agrupamento de pessoas que formam uma coletividade, uma comunidade, ou seja, é um conjunto de indivíduos que vivem num determinado momento e num determinado lugar, que seguem as mesmas normas e têm va- lores semelhantes. SISTEMA ANGLO DE ENSINO 850092110 1 ANGLO VESTIBULARES Atividade 1 RELAÇÕES SOCIAIS E IDENTIDADE 850092010 Sociologia10-SP Autor: Eduardo CalBucci e Jucenir Rocha

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INTRODUÇÃOO poeta inglês John Donne (1572-1631) tem uma frase fa-

mosa, que diz que “nenhum homem é uma ilha, sozinho em simesmo”. O que ele diz em linguagem literária corresponde a umconsenso entre os intelectuais das humanidades.

Desde Aristóteles, com sua percepção de que “o homem é umser social”, atentamos à realidade de que os humanos são serescuja forma privilegiada de organização é em grupo, o que pres-supõe tanto a celebração dos valores comuns quanto a necessi-dade de conviver com as diferenças.

Isso não significa que os homens não tenham, desenvolvamou prezem sua individualidade. Todo ser humano tem suas cren-ças pessoais, seus sonhos, seus medos, suas habilidades e suaslimitações. Aliás, a individualidade é exatamente isto: o conjuntode características que distingue as pessoas, garantindo-lhes a ori-ginalidade, a unicidade, a particularidade. Acontece que, embora ohomem possa ser tomado como um indivíduo, isto é, como al-guém considerado isoladamente no grupo a que pertence, os va-lores individuais não podem chegar ao extremo de desprezarnosso caráter social. Afinal, individualidade não pode ser confun-dida com individualismo.

Entendemos por individualismo a atitude de quem procurasatisfação pessoal a qualquer custo, vivendo exclusivamente parasi; trata-se de um comportamento egoísta, que nega o valor (emesmo as vantagens) da convivência e do compartilhamento daexperiência. Dessa forma, o individualismo toma o homem como“uma ilha” e, por isso, pode levar o ser humano à desagregação.Já a ideia de individualidade não se confunde com o egoísmo, umavez que podemos viver em grupo, estabelecendo relações so-ciais, e, ao mesmo tempo, ter características que nos diferenciemdas demais pessoas.

Do ponto de vista lógico, todo ser humano é um indivíduo(que significa, literalmente, “o que não se divide”), pois os homenssão seres unitários reais, que podem ser reconhecidos por meio daexperiência. Existem várias disciplinas que se interessam, emmaior ou menor grau, pelo estudo do indivíduo, como a Psicolo-gia, a Biologia ou a Filosofia. Para nós, neste curso, importa o es-tudo da sociedade.

ORIGENS DA SOCIOLOGIAPodemos rearranjar a citação de Aristóteles e concluir que o

homem, embora tenha sua individualidade, vive em sociedade.

Como se vê, o conceito de sociedade é bastante abrangente,pois pode designar tanto um grupo muito amplo — como a so-ciedade do século XXI — quanto agrupamentos mais específicos —como a sociedade cristã medieval.

Desde a Antiguidade Clássica, principalmente com Aristó-teles, vários intelectuais se interessam pelo estudo da socieda-de. Porém, até meados do século XIX, não existia ainda umaciência da sociedade. Foi precisamente durante o Oitocentos(1701-1800), sob os eflúvios libertários da Revolução Fran-cesa e as transformações tecnológicas da Revolução Industrial,entre a consolidação do capitalismo e o acirramento da luta declasses, em meio à independência das colônias americanas e aofim da escravidão, que surgiu a Sociologia.

Montesquieu (1689-1755), Saint-Simon (1760-1825), Au-guste Comte (1798-1857) e Alexis de Tocqueville (1805-1859),entre outros, foram os precursores do pensamento sociológicomoderno, pois suas obras buscavam investigar e explicar a vidasocial. Porém, só alguns anos mais tarde a Sociologia iria emergircomo ciência, já na segunda metade do século XIX, quando o posi-tivismo, o evolucionismo social e o determinismo ganharamforça, como era esperado numa época em que a ciência era vistacomo o modo superior de compreensão do mundo (característicado cientificismo, com sua pretendida verdade imparcial e benefíciosutilitários).

MARX, WEBER E DURKHEIMTrês pensadores podem ser considerados os pais da Sociolo-

gia: Karl Marx (1818-1883), Max Weber (1864-1920) e ÉmileDurkheim (1858-1917). Eles deram dimensão científica à disci-plina e começaram a estudar, de modo mais sistemático, as formasde organização e as regras de funcionamento das sociedades hu-manas, procurando determinar as normas que regem as relaçõessociais. Esses procedimentos implicavam a análise das instituiçõese dos comportamentos sociais, bem como da ideologia, da culturae das relações de trabalho que se construíam no mundo capitalista.

Sociedade é um agrupamento de pessoas que formamuma coletividade, uma comunidade, ou seja, é um conjuntode indivíduos que vivem num determinado momento e numdeterminado lugar, que seguem as mesmas normas e têm va-lores semelhantes.

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Atividade 1RELAÇÕES SOCIAIS E IDENTIDADE

850092010

Sociologia10-SP

Autor:Eduardo CalBucci e Jucenir Rocha

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Mas a Sociologia, em sua tarefa de estudar os indivíduos emgrupo, em sociedade, como seres sociais que somos, é mais doque uma ciência. Além de procurar compreender (com rigor demétodos e técnicas de investigação) a sociedade moderna, ossociólogos muitas vezes demonstraram desejo de intervir na or-dem social, de maneira que as reflexões científicas se mistu-raram às intenções práticas. Nada mais previsível. Já que vive-mos numa sociedade multifacetada, em que há valores diver-gentes e choque de interesses, era de esperar que os sociólogosnão se comportassem como “técnicos que dissecam cadáveres”.A sociedade é um organismo vivo, complexo, que se modifica con-tinuamente (e do qual o sociólogo é um componente vivo e inter-dependente); por isso, para compreendê-la, muitas vezes é pre-ciso posicionar-se dentro dela, no olho do furacão.

IDENTIDADE E ALTERIDADE:O NASCIMENTO DA ANTROPOLOGIA

No século XIX, na mesma época em que a Sociologia surgiacomo disciplina das ciências humanas, apareceram pesquisadoresinteressados pelo modo de vida, pelos costumes, pelas crenças degrupos sociais que viviam longe da Europa ocidental.

Segundo esses pesquisadores, para conhecer “o homem”,não bastava estudar a sociedade europeia (considerada, equivo-cadamente, um todo coeso e uniforme); seria preciso analisaragrupamentos sociais formados por não europeus, preferencial-mente aqueles com hábitos bastante diversos dos moradores deParis, Londres ou Milão. Assim se deu o nascimento da Antro-pologia.

Com efeito, do ponto de vista biológico, todos os homenssão iguais e pertencem a uma mesma espécie (biologicamente,não existem “raças” humanas — nossas características genéti-cas são todas de uma mesma “raça” ou, mais propriamente, damesma espécie). Porém, do ponto de vista antropológico, cadaagrupamento humano tem a sua cultura e as suas particularida-des. Foi por isso que os primeiros antropólogos, reconhecendoessas diferenças, resolveram estudar sociedades não europeias,cujas culturas eram menos conhecidas e, desse modo (mais dis-tanciado e menos contaminado, com menos pressuposições epreconceitos), permitiriam melhor desenvolvimento das pesqui-sas que se iniciavam.

A Antropologia é a ciência da diferença, da alteridade. Alte-ridade se opõe a identidade — o radical alter significa, em latim,“outro”. Portanto, se o “eu” define a identidade, o “outro” carac-teriza a alteridade. A relação entre cada membro de uma mesmacultura é de “identidade”; a relação entre membros de culturasdiferentes é de “alteridade” — sobre esses universos transita apesquisa da Antropologia.

Muitas vezes, para fazer parte de um grupo social — deum Estado, de uma etnia ou de uma religião — e, assim, afir-mar uma identidade, é preciso dialogar com a alteridade. Issoporque fazer parte de uma cultura é não fazer parte de outra.Aos antropólogos, não cabe somente estudar os conflitos quepodem advir daí, mas sim analisar as condições em que se esta-belecem os laços de identidade e as relações de alteridade.

No mundo globalizado, parece haver uma tendência de uni-formização de valores e crenças: a cultura de massas igualariatodos os homens, levando-os a pensar de um mesmo modo. Mas

isso não é verdade. Sob essa aparente padronização cultural está,por exemplo, o desejo de vários grupos em afirmar suas identida-des: são mulheres, gays, negros, índios, imigrantes lutando porespaço em nossa aldeia global.

Em meio à igualdade jurídica do Iluminismo, à igualdadeeconômica do socialismo e à padronização de valores do capita-lismo globalizado, sempre há grupos sociais que procuram se dis-tinguir dos demais.

Aliás, os conceitos de maioria e minoria são extremamen-te úteis para esse tipo de análise. Seria muito fácil defini-los naperspectiva numérica. Acontece que, às vezes, uma maioria nu-mérica tem menos força do que uma minoria. Veja-se o casodas mulheres: embora dados estatísticos mostrem que há maismulheres do que homens no Brasil, elas ocupam menos cargospúblicos e recebem salários menores do que os homens. Emcontrapartida, há certas classes profissionais — como é o casodos médicos ou dos advogados — que, apesar de serem mino-ria numérica no mercado de trabalho, têm um enorme prestí-gio social, o que significa um alto poder de mobilização na defe-sa de seus interesses. Outras profissões, estatisticamente maisrepresentativas, não têm tanta expressividade social.

Para Durkheim, o comportamento dominante (isto é, dogrupo social de maior prestígio e força, independente de se tra-tar de maioria numérica) pode associar-se ao princípio da nor-malidade. Para esse sociólogo, os fenômenos sociais, assim co-mo os biológicos, dividem-se em dois grandes grupos: os quese repetem e são habituais para todo o grupo; e os que sãoexcepcionais, incidindo sobre uma minoria. Essa análise dos fa-tos sociais permitiria chegar a um “tipo médio”, que nasce dajunção entre esses dois grupos de fenômenos. Esse tipo médiofoi definido por Durkheim como “o ser esquemático que resul-taria da união, num mesmo ser, numa espécie de individuali-dade abstrata, das características mais frequentes da espécie edas formas mais frequentes dessas características”.

Exercício(UEL) A Sociologia é uma ciência moderna que surge e sedesenvolve juntamente com o avanço do capitalismo. Nessesentido, reflete suas principais transformações e procuradesvendar os dilemas sociais por ele produzidos. Sobre aemergência da sociologia, considere as afirmativas a seguir.I. A Sociologia tem como principal referência a explicação

teológica sobre os problemas sociais decorrentes da indus-trialização, tais como a pobreza, a desigualdade social e aconcentração populacional nos centros urbanos.

II. A Sociologia é produto da Revolução Industrial, sendo cha-mada de “ciência da crise” por refletir sobre a transforma-ção de formas tradicionais de existência social e as mu-danças decorrentes da urbanização e da industrialização.

III. A emergência da Sociologia só pode ser compreendida sefor observada sua correspondência com o cientificismoeuropeu e com a crença no poder da razão e da obser-vação enquanto recursos de produção do conhecimento.

IV. A Sociologia surge como uma tentativa de romper comas técnicas e métodos das ciências naturais, na análise dosproblemas sociais decorrentes das reminiscências domodo de produção feudal.

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Estão corretas apenas as afirmativas:a) I e III.b) II e III.c) II e IV.d) I, II e IV.e) I, III e IV.

• Resolva o exercício a seguir.

(UEL) O texto a seguir refere-se à situação dos apátridas* na 2ª-Guerra Mundial.

O que era sem precedentes não era a perda do lar, mas aimpossibilidade de encontrar um novo lar. De súbito revelou-se não existir lugar algum na terra aonde os emigrantes pu-dessem se dirigir sem as mais severas restrições, nenhum paísao qual pudessem ser assimilados, nenhum território em quepudessem fundar uma nova comunidade própria. [...] A cala-midade dos que não têm direitos não decorre do fato de teremsido privados da vida, da liberdade ou da procura da felicidade,nem da igualdade perante a lei ou da liberdade de opinião —fórmulas que se destinavam a resolver problemas dentro decertas comunidades — mas do fato de já não pertencerem aqualquer comunidade. [...] A privação fundamental dos direi-tos humanos manifesta-se, primeiro e acima de tudo, na pri-vação de um lugar no mundo que torne a opinião significati-va e a ação eficaz. Algo mais fundamental do que a liberdadee a justiça, que são os direitos do cidadão, está em jogo quan-do deixa de ser natural que um homem pertença à comu-nidade em que nasceu.

ARENDT, Hannah. Origens do totalitarismo:antissemitismo, imperialismo, totalitarismo.

São Paulo: Companhia das Letras, 1989. p. 227, 229, 230.

Com base no texto, é correto afirmar:a) Obter o reconhecimento por uma comunidade é condição básica

para o gozo de direitos.b) A condição em que se encontra o apátrida é igual à condição

de escravo.c) Ser privado da vida é menos importante que ser privado da li-

berdade.d) Ao apátrida é garantida ressonância às suas opiniões mais sig-

nificativas.e) Ser um apátrida é ser reconhecido como um indivíduo com

direitos fora de seu país de origem.

• Resolva os exercícios a seguir.

1. (UEL) Leia o texto a seguir:

[...] Em toda parte renasce e se revigora o mau-olhado,a política do julgamento adverso à primeira vista, por meiodo qual os países ricos se defendem contra aqueles queprocedem de países que entraram no índex político da sele-ção natural: virtude humana é o dinheiro, uma virtude de-

tergente que branqueia quem vem do mundo subdesenvol-vido. Na verdade, o migrante entra no país de destino pelaporta de saída, modo de permitir-se permanecer como se es-tivesse todo o tempo da permanência a caminho da saída,algo que concretamente ocorre com os muitos que na Ale-manha ou nos Estados Unidos aguardam na prisão a depor-tação. [...] Estamos em face de uma multiplicação de recursosideológicos para barrar a entrada de migrantes nos países dedestino. Até 11 de setembro [de 2001] funcionava o estereó-tipo de traficante (uma cara de índio latino-americano eraperfeita para barrar passageiros no desembarque) e o estereó-tipo de desemprego (a condição de jovem tem sido perfeitapara discriminar) ou o estereótipo de prostituta (jovem e mu-lher vinda do Terceiro Mundo), e terrorista (cara de árabe oubarbudo ou mesmo de bigode à moda do Oriente Médio).Agora, estamos vivendo o momento mais interessante dereelaboração dos estereótipos, com o predomínio do temor aoterrorista sobre os estereótipos usados até aqui. Registros edenúncias dos últimos meses indicam que o novo estereótipoabrange também pessoas com aparência de ricas [...]. [...] Defato, os aeroportos internacionais dos países ricos tornaram-se o teatro do medo e da intimidação. [...] O critério da discri-minação visual do migrante nem mesmo pode detectar suaprincipal motivação para migrar que é hoje o trabalho. [...] Osagentes do mau-olhado portuário e aeroportuário não po-dem ver esse conteúdo substancialmente específico da mi-gração por um motivo simples: os migrantes são pessoas queem boa parte já foram socializadas no mesmo registro socio-lógico daqueles que devem e esperam barrá-los. São expres-sões da sociedade moderna que se difundem através da globa-lização. As medidas de segurança nacional voltadas para ainterdição1 do acesso de migrantes aos países ricos são o co-rolário2 da globalização em seus efeitos não só econômicos,mas também culturais e sociais.

MARTINS, J. de S. Segurança nacional e insegurançatrabalhista: os migrantes na encruzilhada.

In: Caderno de Direito — FESO.Teresópolis, ano V, n. 7, 2º- semestre/2004, p. 113-127.

De acordo com o texto, é correto afirmar que depois do 11 de setem-bro de 2001a) a globalização continuou ampliando as fronteiras entre os povos

ricos e pobres, diversificando os processos de migrações.b) os processos de migrações puderam ser harmonizados em

função da desburocratização nos aeroportos dos países ricos.c) os mecanismos de segurança, nas fronteiras dos países ricos,

foram amenizados como tática para detectar os terroristas e im-pedir suas ações.

d) a entrada de pessoas ricas nos países ricos, oriundas dos paísespobres, tem sido facilitada como estratégia de atração de divisasde capital.

e) os estereótipos e as formas de discriminação foram ampliadosno processo de migração de pessoas dos países pobres paraos países ricos.

2. (UEL) A formação cultural do Brasil tem como eixo central a misci-genação. Alguns autores, como Gilberto Freyre, destacaram que amistura de raças/etnias europeias, africanas e indígenas configura-ram nossos hábitos, valores, hierarquias, estilos de vida, manifesta-

1 Interdição: proibição.2 Corolário: conclusão; a “verdade” que resulta de um argumen-

to ou processo.

Tarefa Complementar

* Apátrida: aquele(a) que foi destituído de sua nacionalidade;sem pátria.

Tarefa Mínima

ORIENTAÇÃO DE ESTUDO

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ções artísticas, enfim a maioria das dimensões da nossa vida social,política, econômica e cultural. Entretanto, outros pensadores con-sideravam-na um aspecto negativo em nossa formação e tentaramressaltar as origens europeias de algumas regiões, como o intelec-tual paranaense Wilson Martins afirmou:

Assim é o Paraná. Território que, do ponto de vista socio-lógico, acrescentou ao Brasil uma nova dimensão, a de umacivilização original com pedaços de todas as outras. Sem es-cravidão, sem negro, sem português e sem índio, dir-se-ia quea sua definição não é brasileira. Inimigo dos gestos espetacu-lares e das expansões temperamentais, despojado de adornos,sua história é a de uma construção modesta e sólida e tão pro-fundamente brasileira que pôde, sem alardes, impor o predo-mínio de uma ideia nacional a tantas culturas antagônicas. Eque pôde, numa experiência magnífica, harmonizá-la entre si,num exemplo de fraternidade humana a que não ascendeu aprópria Europa, de onde elas provieram. Assim é o Paraná.

MARTINS, W. Um Brasil diferente: ensaio sobre fenômenos deaculturação no Paraná. 2 ed. São Paulo:

Editora T. A. Queiroz, 1989. p. 446.

O preconceito em relação às origens africanas e indígenas criouuma ambiguidade de autoafirmação dos indivíduos em relação àssuas origens. Assinale a alternativa em que a árvore genealógicarelatada por um indivíduo evidencia esse sentimento de ambigui-dade em relação à formação social brasileira.a) “Meu avô paterno, filho de italianos, casou-se com uma filha de

índios do interior de Minas Gerais; meu avô materno, filho de por-tuguês casado com uma negra, casou-se com uma filha de por-

tugueses. Apesar de saber que sou fruto de uma mistura, depen-dendo do lugar em que estou, destaco uma dessas descendên-cias: na maioria das vezes, digo que descendo de portuguesese/ou italianos; raramente digo que descendo de negros e índios,quando o faço é porque terei alguma vantagem.”

b) “Meu avô paterno, filho de negros, casou-se com uma filha deíndios do Paraná; meu avô materno, filho de português casadocom uma espanhola, casou-se com uma filha de italianos. Sem-pre destaco que sou brasileiro acima de tudo, pois descendo denegros, índios e europeus. Essa afirmação ajuda-me a obter van-tagens em diferentes lugares, pois a identidade brasileira temsido assumida com clareza pelo estado e pelo povo ao longo dahistória.”

c) “Meus avós maternos são filhos de italianos e os avós paternossão filhos de imigrantes alemães. Eu casei com uma negra, meusfilhos serão, predominantemente, brancos. Tenho orgulho dessadescendência que é predominante nas diferentes regiões doBrasil. Costumo destacar que o Brasil é diferente, é branco e ne-gro e eu descendo de famílias italianas e alemãs, assim comomeu filho. Esse traço cultural revela a grandeza do país e a firmezade nossa identidade cultural.”

d) “Meu avô paterno, filho de índios do Paraná, casou-se comuma filha de índios do Rio Grande do Sul; meu avô materno,filho de negros, casou-se com uma filha de negros. Gosto deafirmar que sou brasileira, pois índios, portugueses e negrosformam a nossa identidade nacional.”

e) “Meu avô paterno, filho de poloneses, casou-se com uma filhade índios do Paraná; meu avô materno, filho de ucranianos,casou-se com uma filha de poloneses. Como sou paranaense,costumo destacar que o Paraná tem miscigenação semelhanteàs das outras regiões do Brasil: aqui temos índios, europeus enegros.”

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INTRODUÇÃOQuando nascemos já encontramos um mundo pronto, com

suas leis, suas regras de funcionamento, os padrões de comporta-mento institucionalizados e as normas de conduta a serem se-guidas. Querendo ou não, de modo inconsciente ou não, acabamospautando nosso modo de agir por essas regras, seja para referen-dá-las, seja para discordar delas.

Muitas vezes, por influência da família, da religião, da escola,dos hábitos de nossos amigos, acabamos vestindo “máscaras so-ciais”, comportando-nos segundo modelos aceitos pelos demais,pois sabemos que nossas atitudes estão sempre sendo julgadas —muitas vezes, é dessa forma que reagimos ao sentimento de ne-cessidade de adequação aos valores estabelecidos.

Isso significa que estamos sempre sujeitos a coerções so-ciais, isto é, a aceitar valores que podem não ser compatíveis comnossas opiniões e crenças pessoais. Esses valores preestabelecidos,em última instância, poderiam ser bem diferentes, se cada um pu-desse escolhê-los de acordo com sua vontade.

O FATO SOCIALA noção de coerção social é a base para entendermos um

dos conceitos mais relevantes da Sociologia moderna: o de fatosocial, proposto por Durkheim em sua obra As regras do mé-todo sociológico.

Seria impossível que os sociólogos estudassem todos os fe-nômenos, todos os acontecimentos, todos os pormenores davida em sociedade. Na tentativa de limitar o raio de alcance daSociologia, especificando-lhe os objetos de estudo, Durkheimpropôs que os sociólogos se debruçassem sobre os fatos so-ciais, da mesma forma que os astrônomos o fazem com os astroscelestes e os zoólogos, com os animais.

A apreensão de um fato social passa pela observação darealidade. É observando-a e analisando-a que o sociólogo identi-fica o fato social, que pode ser inicialmente definido como tudoaquilo que exerce uma força de coerção sobre os indivíduos.

Essa força coercitiva é exterior, e não interior. Ela é social,e não psicológica. Assim, a Sociologia não se interessa peloshábitos individuais ou hereditários que nos impõem crenças oupráticas, mas sim pela pressão “que exerce a consciência de umgrupo sobre a consciência de seus membros” — de acordo comas palavras de Durkheim.

Quando se usa a expressão “consciência de um grupo”, “cons-ciência coletiva”, ou algo do gênero, é preciso ter em mente asociedade como uma síntese, e não como mera soma das ações evalores individuais. É por isso que a mentalidade de um grupo édiferente da mentalidade dos membros que o compõem.

Portanto o fato social é caracterizado pela coercitividade(uma vez que atua sobre as pessoas, até certa medida moldan-do-lhes as atitudes e pensamentos) e, ao mesmo tempo, pelaexterioridade (já que tem existência própria, sendo exterioraos indivíduos). Para os sociólogos, as representações coleti-vas interessam mais do que os estados individuais de consciên-

cia. Além disso, só é fato social aquilo que é genérico, que serepete e que tem, de alguma maneira, aceitação coletiva.

ALIENAÇÃO E TRANSGRESSÃOO conceito de fato social pode passar a impressão de que os

indivíduos estão sempre fadados a respeitar um padrão de com-portamento, uma norma de conduta, uma lei, uma ideologia, quelhes são impostos sem que haja a possibilidade de discordar de suaforça coercitiva. Isso não é verdade.

Todos reconhecemos o peso que a estrutura familiar, a esco-la, a religião, os partidos políticos ou os meios de comunicaçãoexercem sobre cada um de nós. Mas isso não significa que a acei-tação desses valores seja sempre caracterizada pela passividade.Quando isso acontece, o indivíduo sucumbe às pressões sociais,sem sequer refletir sobre o modo como a consciência coletiva con-tribuiu para delimitar suas ações e seu modo de pensar, estamosdiante de um caso de alienação.

Mas há situações em que o sujeito se recusa a aceitar ascoerções sociais (e, quando isso se dá de forma consciente, assu-me todos os riscos que essa postura pode acarretar), acreditandoser necessário romper com a ordem vigente, o que pressupõe acriação de novas formas de representações coletivas. Quando issoocorre, temos a transgressão.

INSTITUIÇÕES SOCIAISA coerção social é uma característica fundamental da vida em

sociedade. Isso porque os comportamentos humanos têm umatendência contínua à padronização, à uniformização. Dependendoda situação, lidar com essas coerções pode ser mais ou menos difí-cil, mas é inegável que elas sempre influenciam as condutas indi-viduais.

Muitas vezes, o responsável por essa padronização, por essauniformização são as instituições sociais. Em sentido geral, insti-tuição é qualquer forma de organização que reúna pessoas comobjetivos comuns, como uma escola, um hospital ou uma empre-sa. Também se emprega o termo “instituição” para designar enti-dades mais amplas, como o governo, o sistema educacional ou aIgreja. Já em sentido estrito, dentro do universo sociológico e deacordo com a proposta dos pesquisadores Peter L. Berger eBrigitte Berger, a instituição social pode ser definida como umpadrão de controle, ou seja, uma programação da conduta,do comportamento individual imposta pela sociedade.

Nesse sentido, também as instituições possuem uma reali-dade exterior aos indivíduos, na medida em que elas existemindependente da vontade isolada de cada um deles, até porquetêm história própria: normalmente, as instituições já existiam antesde o indivíduo nascer e permanecerão existindo após sua morte.Desse modo, as instituições acumulam contribuições e caracterís-ticas de várias gerações e vão tornando-se forças cada vez maispoderosas, que moldam o jeito de ser das pessoas.

A exterioridade e a coercitividade das instituições sociaismostram, de um lado, que elas existem ainda que à revelia das

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Atividade 2INSTITUIÇÕES SOCIAIS E COERÇÃO

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crenças e dos desejos das pessoas e, de outro, que elas inevitavel-mente influem nos comportamentos individuais. Isso ocorre por-que as instituições, com o passar do tempo, adquirem uma espé-cie de autoridade, a ponto de o sujeito que desrespeita as regrasestabelecidas por elas poder ser punido. Assim, o Estado mandapara a cadeia o homicida, a Igreja Católica excomunga o infiel, aescola suspende o aluno malcomportado, a loja de roupas de gri-fe trata com desdém o cliente vestido de modo despojado.

As punições podem variar do simples olhar de reprovação atéa prisão, passando ainda pela ridicularização pública e pela segre-gação social. Em casos de comunidades mais intolerantes, assanções podem chegar a espancamentos e até mesmo à morte.Em todas essas situações, só pode haver sanções, só pode haverpunições, ou melhor, elas só podem ser aceitas pela coletividade,se se reconhece a autoridade da instituição que as aplica. Assim,além da família, que garante a proteção das crianças, incapazes desobreviver sozinhas, há inúmeras outras instituições que (com suaautoridade) são fundamentais para a manutenção e estabilizaçãodas relações sociais.

A PROPRIEDADE PRIVADA COMOINSTITUIÇÃO SOCIAL

Adotando a perspectiva econômica de análise, há uma institui-ção social fundamental para a sociedade capitalista contemporânea:a propriedade privada dos meios de produção*. Ela é a base daestrutura de classes da sociedade atual, e sua autoridade é tama-nha que a grande parte das leis é feita para garanti-la.

Mas, se não houvesse a propriedade privada, se tudo fossede todos, será que a vida em sociedade seria possível? Se cadahomem seguisse apenas seus desejos e suas crenças pessoais,se não houvesse fronteiras claras entre países, estados e ci-dades, se cada canto do planeta pertencesse à coletividade, seráque o mundo seria mais justo?

São perguntas difíceis de responder. Com rigor, aliás, nemcabe à Sociologia respondê-las. Seu principal interesse não éapontar como a sociedade poderia ser, mas sim como ela é. E,sendo assim, a propriedade privada — ainda que possa ser con-siderada responsável pelo aumento das desigualdades e das in-justiças entre os homens — é uma instituição social que merecetoda a atenção dos sociólogos.

Ainda é preciso lembrar que as instituições sociais sãofenômenos históricos e, como tais, podem sofrer mudanças eaté mesmo deixar de existir. A Igreja ou o Exército já tiveram,no Brasil, mais importância do que têm hoje. Já a propriedadeprivada continua sendo um dos pilares da sociedade capitalista.

Num mundo de globalização, em que se formam comunidadesna internet, em que pessoas de países diferentes podem conversaron-line, em que a velocidade da informação contribui para mu-danças de comportamento, as instituições sociais também se modi-ficam, muitas vezes se reestruturando e se redefinindo.

O que precisa ficar claro é que essas mudanças ocorrem —e ocorrem muito — não por vontades individuais, mas sim porprocessos coletivos.

Exercício(UEL) Um jovem que havia ingressado recentemente na uni-versidade foi convidado para uma festa de recepção de calou-ros. No convite distribuído pelos veteranos não havia infor-mação sobre o traje apropriado para a festa. O calouro, ima-ginando que a festa seria normal, compareceu vestido comtraje social. Ao entrar na festa, em que todos estavam trajan-do roupas esportivas, causou estranheza, provocando risos,cochichos com comentários maldosos, olhares de espanto ede admiração. O calouro não estava vestido de acordo com ogrupo e sentiu as represálias sobre o seu comportamento. Asregras que regem o comportamento e as maneiras de se con-duzir em sociedade podem ser denominadas, segundo ÉmileDurkheim (1858-1917), como fato social.

Considere as afirmativas abaixo sobre as características dofato social para Émile Durkheim.

I. O fato social é todo fenômeno que ocorre ocasionalmen-te na sociedade.

II. O fato social caracteriza-se por exercer um poder decoerção sobre as consciências individuais.

III. O fato social é exterior ao indivíduo e apresenta-se ge-neralizado na coletividade.

IV. O fato social expressa o predomínio do ser individual so-bre o ser social.

Assinale a alternativa correta.a) Apenas as afirmativas I e II são corretas.b) Apenas as afirmativas I e IV são corretas.c) Apenas as afirmativas II e III são corretas.d) Apenas as afirmativas I, III e IV são corretas.e) Apenas as afirmativas I, II e IV são corretas.

• Resolva o exercício a seguir.

(PUC-PR) “O verdadeiro fundador da sociedade civil foi o primeiroque, tendo cercado um terreno, lembrou-se de dizer ‘isto é meu’e encontrou pessoas suficientemente simples para acreditá-lo.”Levando em conta a principal ideia que Rousseau quer transmitircom essa afirmação, assinale a alternativa VERDADEIRA.a) A propriedade privada, já existente antes da sociedade civil,

trouxe a possibilidade de melhor organização entre os indiví-duos e, consequentemente, facilitou sua convivência.

b) A propriedade privada é um direito natural fundado pelo trabalho.c) A expressão “isto é meu” da frase de Rousseau quer mostrar

que naturalmente o homem anseia por propriedade privada.d) A sociedade civil tem a origem na propriedade privada que, junto

consigo, trouxe os principais problemas entre os homens.e) O fundador da sociedade civil era um pensador grego que tinha

grande capacidade de persuasão.

• Resolva os exercícios a seguir.

Tarefa Complementar

Tarefa Mínima

ORIENTAÇÃO DE ESTUDO

* Meio de produção, como estudaremos adiante, é todo instrumentoou recurso natural, como a terra, usado na produção; a posse dosmeios de produção pode ser coletiva ou privada.

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Page 7: Pre Vestibular Soc

1. (UEL-adaptada) Leia os depoimentos a seguir:

Sou um ser livre, penso apenas com minhas ideias, daminha cabeça, faço só o que desejo, sou única, independente,autônoma. Não sigo o que me obrigam e pronto! Acredito quecom a força dos meus pensamentos poderei realizar todos osmeus sonhos, e o meu esforço ajuda a sociedade a progredir.

Jovem estudante e trabalhadora em uma loja de shopping

Sou um ser social, o que penso veio da minha família, dosmeus amigos e parentes, gostaria de fazer o que desejo, mas édifícil! Às vezes faço o que quero, mas na maioria das vezes sigomeu grupo, meus amigos, minha religião, minha família, a esco-la, sei lá... Sinto que dependo disso tudo e gostaria muito deser livre, mas não sou!

Jovem estudante em uma escola pública quetrabalha em empregos temporários

Sinto que às vezes consigo fazer as coisas que desejo,como ir a raves, mesmo que minha mãe não permita ou con-corde. Em outros momentos faço o que me mandam e achoque deve ser assim mesmo. É legal a gente viver segundo asregras e ao mesmo tempo poder mudá-las. Nas raves existemregras, muita gente não percebe, mas há toda uma estrutura,segurança, taxas, etc. Então, sinto que sou livre, posso escolhercoisas, mas com alguns limites.

Jovem estudante e office boy

Assinale a alternativa que expressa, respectivamente, as explica-ções sociológicas sobre a relação entre indivíduo e sociedade pre-sentes nas falasa) Solidariedade mecânica, fundada no funcionalismo de É. Durkheim;

individualismo metodológico, fundado na teoria política liberal; teo-ria da consciência de classe, fundada em K. Marx.

b) Teoria da consciência de classe, fundada em K. Marx; sociolo-gia compreensiva, fundada no conceito de ação social e suas ti-pologias, de M. Weber; teoria organicista de Spencer.

c) Individualismo, fundado no liberalismo de vários autores dos sécu-los XVIII a XX; funcionalismo, fundado no conceito de consciênciacoletiva de É. Durkheim; sociologia compreensiva, fundada noconceito de ação social e suas tipologias de M. Weber.

d) Sociologia compreensiva, fundada no conceito de ação social esuas tipologias de M. Weber; teoria da consciência de classe,fundada em K. Marx; funcionalismo, fundado no conceito dos trêsestados de Auguste Comte.

e) Corporativismo positivista, fundado em Auguste Comte; individua-lismo, fundado no liberalismo de vários autores dos séculos XVIIIa XX; teoria da consciência de classe, fundada em K. Marx.

2. (UEL) Antonio Candido, crítico literário com formação em Sociolo-gia, assim escreve sobre as formas de solidariedade na vida socialrural do interior do estado de São Paulo (1948-1954):

Na sociedade caipira a sua manifestação mais importanteé o mutirão, cuja origem tem sido objeto de discussões. Qual-quer que ela seja, todavia, é prática tradicional. (...) Consisteessencialmente na reunião de vizinhos, convocados por umdeles, a fim de ajudá-lo a efetuar determinado trabalho: derru-bada, roçada, plantio, limpa, colheita, malhação, construção decasa, fiação, etc. Geralmente os vizinhos são convocados e obeneficiário lhes oferece alimento e uma festa, que encerra otrabalho. (...) Um velho caipira me contou que no mutirão nãohá obrigação para com as pessoas, e sim para com Deus, poramor de quem serve o próximo; por isso a ninguém é dado re-cusar auxílio pedido.

CANDIDO, A. Os parceiros do Rio Bonito. 9. ed.São Paulo: Livraria Duas Cidades; Editora 34, 2001. p. 87-89.

Com base no texto e nos estudos de Émile Durkheim sobre solida-riedade, assinale a alternativa que define a forma de solidariedadeque prevalece no caso citado.a) A produção rural desenvolveu o mutirão como forma de soli-

dariedade racional baseada no cálculo econômico do lucro.b) A solidariedade tradicional que aparece na sociedade caipira,

estimulada pelo mutirão, fundamenta-se no modelo de organi-zação do trabalho industrial.

c) A produção rural recorre ao mutirão como uma forma de soli-dariedade orgânica, sustentada na especialização das tarefas ena remuneração equivalente à qualificação profissional.

d) O mutirão pode ser caracterizado como uma forma de solida-riedade mecânica, pois se baseia na identidade por vizinhançae nos valores religiosos do grupo social.

e) O mutirão garante o assalariamento da vizinhança, fortalecendoa solidariedade rural.

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INTRODUÇÃO

Historicamente, com o surgimento da propriedade privada,a exploração do trabalho de um homem por outros homenstornou-se mais evidente, e dois grupos começaram a se delinearcom maior clareza: o grupo dos “explorados” e o dos “explora-dores”. Mas que visão de mundo estaria na base dessa divisão?

Na evolução social dos homens, sempre foi comum a di-visão dos membros de uma mesma sociedade em grupos, cadaum com sua função, seus direitos e seus deveres. Gregário* pornatureza e necessidade, o homem organizou seu trabalho cole-tivo para produzir os bens indispensáveis à sua sobrevivência.Da divisão sexual do trabalho, os grupos tribais evoluíram parauma divisão social do trabalho e conheceram, então, a possibili-dade de dominar outros grupos ou tribos. Foi assim que asdiferenças étnicas, o controle de territórios definidos e a domi-nação de sociedades rivais geraram o mito do etnocentrismo.

De acordo com uma visão etnocêntrica de mundo, o grupoétnico ou a nação a que se pertence seriam socialmente maisimportantes do que os demais. Em sua origem, o etnocentris-mo partia da ideia, disseminada entre certos grupos tribais, deser o seu grupo o único realmente humano ou, pelo menos, ogrupo do qual teria se originado a espécie humana. Daí para aconcepção de serem todos os demais grupos inferiores ou ina-cabados na evolução da espécie foi só um passo.

O etnocentrismo está na base, por exemplo, da concepçãoeurocêntrica que encontramos na expansão colonizadora ocor-rida a partir do século XV, com as Grandes Navegações. Os eu-ropeus convenceram-se de que tinham uma missão salvadorada humanidade, a qual realizariam no processo de dominaçãodos povos africanos, americanos e orientais, buscando desman-telar as culturas desses povos e substituí-las pela visão de mun-do cristã dos brancos da Europa.

ORDEM ECONÔMICA, ORDEM SOCIAL EORDEM POLÍTICA

À medida que a humanidade foi se organizando em socie-dades mais amplas que as comunidades tribais, a estratifica-ção social se intensificou. Por estratificação social, entende-se“a divisão da sociedade em grupos, camadas ou classes em queos indivíduos são hierarquizados, classificados segundo catego-rias ditas superiores e inferiores”. Dentro de um sistema deestratificação, pode haver mais ou menos mobilidade social.

O conceito de classe social é um dos mais polêmicos emtoda a história da Sociologia. De fato, muitos pesquisadoresprocuram estabelecer critérios objetivos para a definição dascamadas em que se divide a sociedade contemporânea. É muitocomum que a definição das classes sociais se dê a partir da ren-da de que dispõem os seus componentes.

Surgem, então, análises com três, cinco ou mais classes, damais rica à mais pobre. O problema é que aquilo que algunsconsideram “classe média” pode não ser o mesmo para outrosanalistas da mesma sociedade. Além disso, há a dificuldade decomparar, por exemplo, a estratificação social no campo e nascidades de um mesmo país.

Na busca por critérios mais objetivos de análise da estratifi-cação social, um dos maiores teóricos da Sociologia, o já citado MaxWeber, propôs uma visão de estrutura social distinguindo três di-mensões: a ordem econômica, a ordem social e a ordem polí-tica. A ordem econômica dividiria a sociedade em classes; a social,em status ou estamentos; e a política, em partidos.

Com base nesse ponto de vista, em cada sociedade nãohaveria apenas uma estratificação, mas várias superpostas. Asclasses seriam identificadas pela posse de bens, por rendimen-tos financeiros e pela capacidade de consumo dos indivíduos. Osestamentos definiriam o prestígio social de um grupo de indi-víduos e seu poder de influência em determinado campo de ati-vidade, o que inclui grupos como clubes ou entidades como aigreja, independente da classe a que se pertença. No plano po-lítico, a estratificação estaria condicionada às formas de partici-pação junto ao poder local.

CONSCIÊNCIA DE CLASSE ECONSCIÊNCIA DE STATUS

Essa leitura que Weber faz da realidade social nos leva à di-ferença entre consciência de classe e consciência de estamen-to (ou de status). A questão da consciência que os indivíduos po-dem adquirir de sua condição de classe será mais bem tratadapelos teóricos marxistas. Weber preocupa-se mais com a consciên-cia de status, que sempre estaria presente nos membros do es-tamento. Os militares ou religiosos, por exemplo, veem-se comodetentores de prestígio e honra, o que os distinguiria dos civis ouleigos. Têm orgulho disso e criam rituais para reforçar a consciên-cia de seu status.

Sociedades da Antiguidade e da Europa medieval conheceramestratificações muito rígidas. Ainda hoje, na sociedade indiana,verifica-se uma forma bastante fechada de estamentos: as castas.Nesses casos, os grupos de status adotam estilos de vida e con-venções coletivas que são impostos a todos os seus membros.Pode-se mesmo chegar à obrigatoriedade dos matrimônios endo-gâmicos, isto é, os casamentos que só podem ocorrer entre ele-mentos do mesmo estamento. As distinções estamentais incluemconvenções, leis e rituais como os da cavalaria medieval ou da ma-çonaria, que podem apontar para o fechamento étnico e religiosoda comunidade.

No caso das castas indianas, o estamento se dá a partir dalinhagem hereditária do grupo. Não só os casamentos são en-dogâmicos, como se admite frequentemente o casamento de umhomem com várias mulheres, desde que pertencentes à mesmacasta. A rigidez de comportamento implica regras de comensali-dade (isto é, de hábitos e rituais para as refeições): a casta deter-

* Gregário é o ser com tendência a viver em grupo(s) (de suaprópria espécie).

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Atividade 3CASTAS, ESTAMENTOS E CLASSES SOCIAIS

Page 9: Pre Vestibular Soc

mina que alimentos seus membros podem ou devem ingerir, comquem é permitido ou proibido comer certos alimentos, com quegrupos os indivíduos podem fumar e até mesmo quem pode sero barbeiro dos membros da casta. Criam-se tabus, proibições narelação com outras castas, como no caso dos brâmanes hindus,casta superior em relação aos xátrias e vaixás (intermediários) eaos sudras e párias (inferiores). Um eventual contato físico entreessas castas deve ser seguido de rituais de purificação do corpo eda alma, sob pena de castigos, já que os brâmanes são considera-dos os “limpos”, enquanto os párias seriam os “imundos”.

Fazendo uma relação entre a consciência de estamento e aquestão do etnocentrismo, lembremos que não raras vezes o fe-chamento da comunidade em si mesma pode gerar a concepçãode um “povo escolhido pelos deuses” para o cumprimento de umamissão na Terra, como etnia superior da humanidade. Não seriaexagero enxergar nisso a semente do que viria a ser chamado ra-cismo, ou seja, a postura de discriminação para com indivíduosou grupos considerados “raças” inferiores.

WEBER E O CONCEITO DE DOMINAÇÃOPara Weber, a dominação corresponde a “um estado de coisas

pelo qual uma vontade manifesta (mandato) do dominador ou dosdominadores influi sobre os atos de outros (do dominado ou dosdominados), de tal modo que, em um grau socialmente relevante,estes atos têm lugar como se os dominados tivessem adotado porsi mesmos e como máxima de sua ação o conteúdo do mandato(obediência)”. É importante ressaltar, para a análise desse tipo desituação, o aspecto da submissão assumida pelos dominados, comose fosse sua a vontade de se comportar como submissos.

Daí, Weber enxerga três motivos de submissão ou princípiosde autoridade na dominação: os motivos racionais, os tradicio-nais e os afetivos. Tais motivos gerariam, então, três tipos de do-minação legitimada socialmente: a legal, a tradicional e a caris-mática.

Os motivos racionais da submissão podem advir da conside-ração de interesses, vantagens ou inconvenientes pensados poraquele que obedece. Aos servos dos feudos, interessava a pro-teção militar dos senhores feudais. A dominação legal está calca-da na fé no estatuto legal que, por exemplo, os atuais servidorespúblicos têm no Estado que os emprega.

Os motivos tradicionais dependem da força dos costumesarraigados e passados de geração a geração pelo hábito cego; é aforça do “ontem eterno” que, por exemplo, levava ao conformis-mo e mantinha a dominação dos príncipes da Europa no passadoou dos chamados “coronéis” sertanejos do Brasil dos séculos XIXe XX.

Os motivos afetivos de submissão movem a dominação caris-mática, pela admiração pessoal no líder ou herói, seja este o pro-feta, o senhor guerreiro ou o político demagogo, e frequentemen-te se misturam com outros motivos e tipos de dominação e desubmissão.

Exercício(UEL) Em 1840, o francês Alexis de Tocqueville (1805-1859),autor de A democracia na América, impressionado com o queviu em viagem aos Estados Unidos, escreveu que nos EUA, “aqualquer momento, um serviçal pode se tornar um senhor”.

Por sua vez, o escritor brasileiro Luis Fernando Verissimo,autor de O analista de Bagé, disse em 1999, ao se referir àsituação social no Brasil: “Tem gente se agarrando a postepara não cair na escala social e sequestrando elevador parasubir na vida”.

As citações anteriores se referem diretamente a qual fenô-meno social?a) Ao da estratificação, que diz respeito a uma forma de

organização que se estrutura por meio da divisão dasociedade em estratos ou camadas sociais distintas, con-forme algum tipo de critério estabelecido.

b) Ao de status social, que diz respeito a um conjunto dedireitos e deveres que marcam e diferenciam a posiçãode uma pessoa em suas relações com as outras.

c) Ao dos papéis sociais, que se refere ao conjunto de com-portamentos que os grupos e a sociedade em geral espe-ram que os indivíduos cumpram de acordo com o statusque possuem.

d) Ao da mobilidade social, que se refere ao movimento, àmudança de lugar de indivíduos ou grupos num deter-minado sistema de estratificação.

e) Ao da massificação, que remete à homogeneização dascondutas, das reações, desejos e necessidades dos indiví-duos, sujeitando-os às ideias e objetos veiculados pelos sis-temas midiáticos.

• Resolva o exercício a seguir.

(UNIMEP) Na obra Manifesto do Partido Comunista, de Marx eEngels, escrita em 1847, lemos:

A história de todas as sociedades que existiram aténossos dias tem sido a história da luta de classes (...). A so-ciedade burguesa moderna, que brotou das ruínas da socie-dade feudal, não aboliu os antagonismos de classes. Não fezsenão substituir velhas classes, velhas condições de opressão,velhas formas de luta por outras novas.

MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manifesto do Partido Comunista.São Paulo: Ched Editorial, 1980.

Marx e Engels trabalham neste texto com o conceito sociológicode classe social. Escolha, dentre as alternativas abaixo, aquela queexpressa melhor esse conceito.a) grupo ou camada de uma determinada sociedade que se carac-

teriza pelo papel que desempenha no processo econômico deprodução.

b) grupo ou camada de uma determinada sociedade que se carac-teriza pelo papel que desempenha no processo sexual de pro-criação.

c) indivíduo externo a uma determinada sociedade que se carac-teriza pelo papel que desempenha no processo econômico deprodução.

d) grupo ou camada de uma determinada sociedade que se carac-teriza pelo papel que desempenha no processo social de lazere recreação.

e) indivíduo participante de uma determinada sociedade que secaracteriza pelo papel que desempenha no processo econômi-co de produção.

Tarefa Mínima

ORIENTAÇÃO DE ESTUDO

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Page 10: Pre Vestibular Soc

• Resolva os exercícios a seguir.

1. (UEL) Max Weber, sociólogo alemão, conceituou três tipos ideaisde dominação: dominação legal, dominação tradicional e domi-nação carismática. São tipos ideais porque são construções con-ceituais que o investigador utiliza para fazer aproximações entre ateoria e o mundo empírico.

Leia a seguir o trecho da Carta testamento de Getúlio Vargas:

Sigo o destino que é imposto. Depois de decênios de do-mínio e espoliação dos grupos econômicos e financeiros inter-nacionais, fiz-me chefe de uma revolução e venci. Iniciei o tra-balho de libertação e instaurei o regime de liberdade social.Tive de renunciar. Voltei ao governo nos braços do povo.

VARGAS, G. Carta testamento. Disponível em:http://www.cpdoc.fgv.br/dhbd/verbetes_htm/5458_53.asp.

Acesso em: 17 nov. 2007.

Com base nos conhecimentos sobre os tipos ideais de dominaçãoe levando em consideração o texto citado e as características his-tóricas e políticas do período, assinale a única alternativa que apre-senta a configuração correta do tipo de dominação exercida porGetúlio Vargas.a) Dominação carismática e tradicional.b) Dominação tradicional que se opõe à dominação carismática.c) Dominação tradicional e legal.d) Dominação legal e carismática.e) Dominação legal que reforça a dominação tradicional.

2. (UEL) Considere os acontecimentos relatados a seguir.

O advogado criminalista S. Holmes está indignado com a deci-são da delegada Mary Watson, que declarou que o inquérito sobre amorte do publicitário J. Jamenson “será conduzido em sigilo” pelapolícia. Jamenson caiu, na madrugada de ontem, do apartamento doempresário T. H. Lawrence, do 9º- andar de um prédio localizado naVieira Souto, avenida beira-mar no nobre bairro de Ipanema. O em-presário afirma que a queda foi acidental, mas, por enquanto, a polí-cia não descarta as hipóteses de suicídio ou homicídio. Para Holmes,a decisão de manter o inquérito em sigilo só ocorreu “porque osenvolvidos pertencem à elite carioca”. Segundo ele, no artigo 20 doCódigo de Processo Penal, é dito que todos os inquéritos são sigi-losos, “mas quando se trata de gente pobre, a polícia divulga tudo”. Adelegada Watson nega que o sigilo esteja relacionado “à posiçãosocial dos envolvidos”. Mas, segundo ela, porque “há casos em que oassédio da imprensa dificulta a investigação”.

De acordo com a crítica levantada pelo advogado S. Holmes, o even-to revelaria a presença de ao menos três situações que afetam asrelações sociais e a justiça no Brasil.Assinale a alternativa que indica corretamente quais seriam essassituações.a) Isonomia da lei; igualdade de cidadania entre as classes; dis-

criminação social.b) Imparcialidade da justiça; exibicionismo das elites; favoreci-

mento às castas superiores.c) Igualdade formal perante a lei; comprometimento da justiça por

causa do assédio da imprensa; discriminação étnica.d) Lentidão da justiça; reconhecimento da diferença e da autono-

mia entre as classes sociais; preconceito de gênero.e) Parcialidade da justiça; privilégio dos grupos sociais dominantes;

preconceito de classe.

Tarefa Complementar

INTRODUÇÃOEm português, a palavra trabalho tem origem no vocábulo

latino tripalium, que designava um antigo instrumento de tortu-ra, o que sugere que a ideia de trabalho pode remeter as ideiasde esforço, fadiga ou sacrifício. Mas em que sentido esse termocostuma ser empregado na Sociologia?

A DEFINIÇÃO DE TRABALHOEsta questão já foi discutida por inúmeros pensadores. Para

ficar com uma definição clássica, os alemães Karl Marx e FriedrichEngels entendiam o trabalho como “um processo entre o homeme a natureza, durante o qual o homem, mediante sua própria ativi-dade, medeia, regula e controla o intercâmbio de substâncias entreele e a natureza”.

Nesse sentido, o trabalho apresenta-se como atividade racionalque, num processo contínuo, transforma o meio natural em quevivem os homens. Difere, por exemplo, do “trabalho” executadopelas formigas no armazenamento de alimentos, pelas abelhas nafabricação dos favos de mel e pelas aranhas na confecção de suasteias, uma vez que, no caso dos animais, essas atividades não se-riam planejadas, mas uma herança genética. O trabalho do homemé, antes de tudo, um ato de criação, mesmo quando repetido infini-tamente. Para realizá-lo, cada indivíduo precisa aprendê-lo, já quenão nasce com as informações necessárias para sua execução.

FORMAS DE DIVISÃO DO TRABALHOToda a evolução da humanidade foi marcada pelo trabalho,

seja na luta pela sobrevivência, seja na luta pelo domínio dosrecursos naturais.

Por volta de 10.000 a.C. aproximadamente, quando a pedralascada deu lugar a instrumentos de pedra polida, os gruposhumanos aprenderam a cultivar vegetais e a domesticar animais, oque lhes permitiu a fixação em territórios delimitados. A sedenta-rização permitiu o desenvolvimento da agricultura e, posterior-mente, o domínio do fogo, com que o homem ingressaria na idadedos metais. Além disso, a vida sedentária foi responsável pelaprimeira divisão do trabalho: os homens cuidavam da caça e asmulheres, da casa (principalmente, das crianças e dos velhos). Essadivisão sexual do trabalho nas tribos gerou a noção de pro-priedade sobre os objetos necessários para cada atividade: oshomens tinham suas armas e as mulheres possuíam seus uten-sílios artesanais. Já o uso da terra, das canoas e, por vezes, dascavernas ou cabanas era comum.

Em seguida, o ser humano passou a domesticar animais, for-mando os primeiros rebanhos, que eram mais do que suficientespara a alimentação do grupo. O consumo de carne e leite emabundância fortaleceu a espécie. Nesse momento, nasceu a ideia deque a terra em que os homens plantavam e criavam seus animaistambém lhes pertencia. E com a noção de propriedade, a divisão

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Atividade 4MODOS DE PRODUÇÃO E FORMAÇÕES SOCIAIS

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sexual do trabalho evoluiu para a primeira grande divisão socialdo trabalho, em que uns cuidavam das plantações e dos animaise outros comandavam as atividades do grupo.

Do desenvolvimento da agricultura para a fundição do ferro epara a escrita foi apenas um passo rumo à civilização. Não deixa deser curioso chamar de “civilização” a era que trouxe as guerras. Odomínio das fontes de alimento gerou a propriedade e, em poucotempo, o excedente de produtos, ou seja, a produção para alémdas necessidades dos indivíduos. Desse modo, nasceu uma camadade homens que podia se dar ao luxo do ócio permanente e quecomeçou a acumular riquezas. Além disso, com as disputas por ter-ritórios, essa “elite” que surgia passou a escravizar seus semelhan-tes, fazendo-os trabalhar para si. As civilizações da Antiguidade co-nheceram assim os primeiros impérios, consolidando-se a noção depoder.

As transformações posteriores mais importantes que o traba-lho permitiu e vivenciou se deveram ao relacionamento entre clas-ses sociais, até o advento da burguesia e do capitalismo. A Revolu-ção Comercial gerou as Grandes Navegações dos séculos XV e XVI;no século XVIII, a Revolução Industrial criou a máquina a vapor; noXIX, a eletricidade, as ferrovias, o telefone e o telégrafo marcarama chamada Segunda Revolução Industrial; no XX, com o avião e aTerceira Onda da Revolução Tecnológica, a informatização da pro-dução e das comunicações acelerou as transformações sociais.

O CONCEITO DE ECONOMIANosso interesse agora se voltará para a análise das várias

formas de organização social criadas pelos homens até que sechegasse ao capitalismo ou, como alguns sociólogos preferemclassificar, à sociedade industrial contemporânea.

Os homens sempre desenvolveram atividades voltadas parao suprimento das necessidades básicas do grupo. Eis a gênesedo trabalho e da produção de bens que garantem a sobre-vivência coletiva. É verdade que, no caso das sociedades mo-dernas, o interesse não é apenas sobreviver, mas também obterlucros financeiros e acumular riquezas. Talvez daí tenha surgi-do a expressão “fazer economia” com o sentido de poupar, gas-tar pouco e guardar para o futuro.

Convencionou-se chamar de econômicas as atividades pormeio das quais os indivíduos trabalham para produzir alimen-tos, roupas, armas ou ferramentas. São essas atividades que,posteriormente, permitem-nos praticar ações militares, religio-sas, artísticas ou políticas. O estudo sistematizado dessas ques-tões gerou a Economia Política, ramo das ciências humanasvoltado à análise das ações destinadas à produção, distribuiçãoe consumo dos bens que propiciam o desenvolvimento dassociedades.

Aliás, a Política e a Economia — que, assim como a Socio-logia, são “filhas da [disciplina] História” — viriam a compor,ao lado da Geografia e da Antropologia, o conjunto das atuaisciências sociais.

Mas, afinal de contas, o que é economia?Se tomarmos economia como o conjunto de práticas que

satisfazem nossas necessidades, poderíamos incluir nesse gru-po atividades de lazer, que não são exatamente econômicas.Max Weber entende economia como a “administração de recur-sos raros ou dos meios destinados a atingir determinados fins”.Essa definição parece adequada, sobretudo, às sociedades de-

senvolvidas, nas quais o dinheiro é um meio para a satisfaçãode desejos e necessidades. Já nas sociedades primitivas, fica di-fícil identificar as escolhas racionais para a administração dosrecursos econômicos. Porém, mesmo nessas comunidades, asesferas da produção, circulação e consumo dos bens estão pre-sentes. E tudo isso sempre mediado pelo trabalho.

MEIOS DE PRODUÇÃO E FORÇAS PRODUTIVASA evolução das trocas, do escambo direto ao comércio me-

diado pela moeda, desempenhou papel preponderante no processode transformação dos sistemas de produção e circulação de bens.

Foi com a Revolução Comercial, na transição do feudalismomedieval para o capitalismo mercantil, que da prática da econo-mia começou a surgir a ciência da Economia. Posteriormente, aRevolução Industrial deu grande impulso à evolução do pensa-mento econômico, que viria a culminar, já no século XX, no desafiode planejar o desenvolvimento.

Foram propostos, então, conceitos como forças produtivas,estrutura econômica, sistemas de produção e capital. Umdos mais importantes é o de meio de produção: como vimos,todo e qualquer utensílio ou recurso natural, como a terra, queseja usado na produção. A posse dos meios de produção pode sercoletiva ou privada e, em certos casos, como no da escravidão, opróprio homem foi um meio de produção, podendo até mesmoser comercializado.

O ser humano se relaciona com o meio natural e o transfor-ma de acordo com seus interesses. Isso ocorre através dos meiosde produção, aproveitados da natureza ou criados pelo homem.Ao transformar a natureza por meio do trabalho, o homememprega sua energia pessoal e coletiva (a força de trabalho) egera o resultado (o produto).

Os grupos sociais empregam sua força de trabalho no manu-seio dos meios de produção e estabelecem, assim, relações sociaisde produção. Esse processo define o que chamamos de forçasprodutivas da sociedade. As forças produtivas nascem da combi-nação dos vários elementos que estão envolvidos no processo dotrabalho (energia humana, terra, ferramentas, máquinas, etc.) eque são empregados em determinadas relações de produção (pro-priedade coletiva ou privada da terra) estabelecidas pelos indiví-duos (divididos em classes sociais ou não).

Os homens já se organizaram de várias maneiras diferentespara permitir a sobrevivência coletiva e desenvolver-se. O escra-vismo na Antiguidade, o feudalismo na Europa medieval e o capi-talismo em marcha nas eras moderna e contemporânea são apon-tados como os principais tipos de organização da sociedade, pelomenos no mundo ocidental. Esses tipos de organização dasociedade se associam ao que Marx e Engels denominaram mo-dos de produção (hoje, esse conceito é corrente mesmo entreteóricos não marxistas).

Considerando a variedade de formas como as sociedades seorganizaram pelo mundo afora, Marx referiu-se ainda a outrosmodos de produção, como o asiático, que esteve presente, porexemplo, nas civilizações existentes na América pré-colombiana.

O conceito marxista de modo de produção é uma construçãoteórica, formada com base em observações históricas e útil paraanalisar tanto o tipo de civilização em que vivia Marx, no séculoXIX, quanto o mundo de hoje. Esse conceito se aproxima do ideal-tipo de Max Weber, ou seja, trata-se de um conceito que procura

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reunir as características sempre presentes nas sociedades, aindaque com variantes, conforme a região e a época.

Quando dizemos produção, a primeira ideia que vem à cabeçaé a de bens materiais. No entanto, além dos bens que lhes per-mitem sobreviver, os homens produzem também obras de arte,religiões, política e leis. Sobretudo, produzem ideias e, por meiodelas, interpretam toda a realidade à sua volta. É essa ampla pro-dução que diferencia o ser humano dos demais seres vivos.Conclui-se, portanto, que o conceito de modo de produção é bas-tante amplo e inclui até mesmo as relações sociais, em todos osníveis que compõem a organização da vida em sociedade.

INFRAESTRUTURA E SUPERESTRUTURAMarx identifica nos modos de produção de todas as socie-

dades uma infraestrutura de base econômica. E chama de su-perestrutura o “espaço social” onde se dão as relações nãoeconômicas, mas vitais para a máquina social funcionar. Nesse“espaço” são produzidos os sistemas educacionais ou jurídicos,as concepções religiosas, filosóficas e políticas, os códigos mo-rais, as tendências artísticas e os conhecimentos científicos, ouseja, toda a produção humana que não tem forma material masé imprescindível ao funcionamento da sociedade.

Para a análise dos processos de transformação histórica dassociedades, essa teoria aponta a economia como determinanteem última instância dos grandes fenômenos sociais, uma vezque por meio dela são definidas as classes sociais e as formas dedominação de classe. Diante das críticas, já em sua época, ao queseria uma visão economicista da história, Marx buscou explicar oque significava a economia ser determinante em última instância darealidade social.

Para ele, a luta de classes não está restrita à infraestruturado modo de produção, mas se dá também em todos os níveis dasuperestrutura. As lutas políticas no âmbito do Estado seriamreflexos da luta de classes, assim como as expressões artísti-cas, as políticas de ensino ou de esportes, as ideologias nortea-doras do Direito e até as atividades religiosas.

Tudo isso definiria os campos de confronto das visõesantagônicas, opostas — das classes dominantes e das oprimi-das. A luta de classes, cuja origem está na base econômica, pro-jeta-se permanentemente em toda a sociedade. Assim, nenhumnível da infra ou da superestrutura teriam, necessariamente,maior ou menor importância.

Se os homens é que fazem sua história, mas não comoquerem e sim dentro das condições herdadas das gerações pre-cedentes, a produção intelectual e as expressões da cultura de-sempenham aí um papel importantíssimo. A visão de mundo oua ideologia predominante num dado modo de produção tendea ser, em situações normais, a ideologia das classes dominantes.Estas estão continuamente preocupadas em construir explica-ções úteis na manutenção da sociedade como está ou lhe con-vém. A reprodução, a perpetuação das relações de produção in-clui a reprodução contínua da visão de mundo predominante.Todos nós passamos, desde os primeiros momentos de vida,pelo aprendizado sobre “como é o mundo lá fora”. Chamamosde socialização essa absorção de ideias que influenciam nossomodo de pensar a vida social e os fenômenos políticos. E a fa-mília é, normalmente, a instituição responsável por nossa socia-lização primária, ou seja, por aqueles valores e princípios adqui-

ridos desde a infância e que serão a base para outras socializa-ções (secundárias, posteriores). Vivem-se socializações secun-dárias na escola, no trabalho, nas igrejas, nos quartéis milita-res, nos clubes esportivos, etc.

MODOS DE PRODUÇÃO E FORMAÇÕES SOCIAISJá dissemos que o conceito de modo de produção é um

modelo teórico construído para auxiliar a análise das diversasformas de civilização. Quando Marx o pensou, visava decifrar ocapitalismo de seu tempo, sobretudo na Europa, e tomou aInglaterra como expressão mais evoluída do modo capitalista deprodução. Ao comparar suas conclusões com o estágio capita-lista de outras nações, como a França, a Rússia e o futuro im-pério alemão, notou a necessidade de adaptar o modelo teóricoà realidade econômica, política e social com que ia deparando.

Na tentativa de explicar as particularidades que o modo deprodução capitalista assumia em cada canto do planeta, osmarxistas desenvolveram o conceito de formação social, quepode ser definido como uma totalidade social concreta, históri-ca e geograficamente determinada, isto é, uma organizaçãosocial que pode abranger um só país ou vários (como é o casodos países latino-americanos, que apresentaram característicassemelhantes em certos períodos históricos).

O modo de produção capitalista que Marx enxergou naInglaterra sob orientação liberal é bem diferente, por exemplo,da versão nazista que a Alemanha conheceria no século se-guinte. Hoje também observamos que as formações sociais ca-pitalistas que se desenvolvem há mais tempo são bastante di-ferentes das mais recentes.

Um fenômeno recorrente nas formações sociais é que caracte-rísticas de outros modos de produção coexistem com o modo pre-dominante. Onde quer que o capitalismo se implante, sua expan-são tenderia a eliminar todas as relações pré-capitalistas existentes.A realidade, entretanto, teima em contrariar a teoria. É muito difí-cil aceitar a existência de um modo de produção em estado puro.O Brasil imperial, por exemplo, conheceu a transição da escravidãopara o trabalho assalariado como força motriz da economia, numlongo processo de convivência conflituosa de características pré-capitalistas com outras já tipicamente capitalistas. Ainda hoje en-contramos pelo país relações de produção próximas da semis-servidão, ou a sobrevivência do trabalho artesanal autônomo.

Exercício(UEL) “Três grandes dimensões fundamentam o vínculo social.Primeiro, a complementaridade e a troca: a divisão do traba-lho social cria diferenças com base na complementaridade, oque permite aumentar as trocas. Em segundo lugar, o senti-mento de pertença à humanidade que nos leva a reforçar nos-sos vínculos com os outros seres humanos: força da linhagem,do vínculo sexual e familiar; afirmação de um destino comumda humanidade por grandes sistemas religiosos e metafísicos.Por fim, o fato de viver junto, de partilhar uma mesma coti-dianidade; a proximidade surge então como produtora do vín-culo social e o camponês sedentário como o ser social porexcelência.”

BOURDIN, Alain. A questão local. Rio de Janeiro: DP&A, 2001. p. 28.

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Com base no texto e nos conhecimentos sobre o tema, écorreto afirmar:a) A divisão do trabalho social na sociedade contemporâ-

nea desagrega os vínculos sociais.b) Os sistemas religiosos e metafísicos são fatores de isola-

mento social, por resultarem de criações subjetivas dos in-divíduos.

c) O cotidiano das pequenas cidades e do mundo campe-sino favorece a criação de vínculos sociais.

d) Pela ausência da cotidianidade, as grandes metrópoles dei-xaram de ser lugares de complementaridade e de trocas.

e) O forte sentimento de pertencer à humanidade desman-tela a noção de comunidade e minimiza o papel da afeti-vidade nas relações sociais.

• Resolva o exercício a seguir.

(UFPA) Os mecanismos de exclusão social são múltiplos, e seusmodos de manifestação, diversos. As formas de exclusão relacio-nam-se entre si e podem agregar-se ou contradizerem-se.I. Atualmente no Brasil, os jovens, as mulheres, os migrantes e os

idosos que estão em ocupação de trabalho precário são seg-mentos sociais considerados excluídos.

II. As formas de trabalho escravo são a negação dos direitos civise políticos e constituem formas de exclusão social.

III. Os processos de inovação tecnológica e de improdutividade nomundo do trabalho, nas últimas décadas no Brasil, têm contri-buído para diminuir a exclusão social.

IV. A divisão sexual do trabalho é uma das bases sobre as quais sedá a organização socioeconômica da produção e, ao mesmotempo, representa uma das formas de exclusão social.

V. A exclusão social somente ocorre quando um grupo social nãose identifica como excluído e está plenamente integrado nomercado de trabalho e na vida social.

Estão corretas somente as afirmações:a) II, III e V. d) I, II e IV.b) I, II e III. e) II, IV e V.c) III, IV e V.

• Resolva os exercícios a seguir.

1. (UEL) Segundo Braverman:

O mais antigo princípio inovador do modo capitalista deprodução foi a divisão manufatureira do trabalho [...]. A di-visão do trabalho na indústria capitalista não é de modo al-gum idêntica ao fenômeno da distribuição de tarefas, ofíciosou especialidades da produção [...].

BRAVERMAN, H. Trabalho e capital monopolista. Tradução Nathanael C. Caixeiro. Rio de Janeiro: Zahar, 1981. p. 70.

O que difere a divisão do trabalho na indústria capitalista das formasde distribuição anteriores do trabalho?a) A formação de associações de ofício que criaram o trabalho as-

salariado e a padronização de processos industriais.b) A realização de atividades produtivas sob a forma de unidades

de famílias e mestres, o que aumenta a produtividade do traba-lho e a independência individual de cada trabalhador.

c) O exercício de atividades produtivas por meio da divisão do tra-balho por idade e gênero, o que leva à exclusão das mulheres domercado de trabalho.

d) O controle do ritmo e da distribuição da produção pelo trabalhador,o que resulta em mais riqueza para essa parcela da sociedade.

e) A subdivisão do trabalho de cada especialidade produtiva em ope-rações limitadas, o que conduz ao aumento da produtividade e àalienação do trabalhador.

2. (UEL) Leia os textos que seguem. O primeiro é de autoria do pen-sador alemão Karl Marx (1818-1883) e foi publicado pela primeiravez em 1867. O segundo integra um caderno especial sobre traba-lho infantil, do jornal Folha de S.Paulo publicado em 1997.

(...) Tornando supérflua a força muscular, a maquinariapermite o emprego de trabalhadores sem força muscular oucom desenvolvimento físico incompleto, mas com membrosmais flexíveis. Por isso, a primeira preocupação do capitalista,ao empregar a maquinaria, foi a de utilizar o trabalho dasmulheres e das crianças. (...) [Entretanto,] a queda surpreen-dente e vertical no número de meninos [empregados nas fá-bricas] com menos de 13 anos [de idade], que frequentementeaparece nas estatísticas inglesas dos últimos 20 anos, foi, emgrande parte, segundo o depoimento dos inspetores de fábri-ca, resultante de atestados médicos que aumentavam a idadedas crianças para satisfazer a ânsia de exploração do capita-lista e a necessidade de traficância dos pais.

MARX, K. O capital: crítica da Economia Política. 19. ed.Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. Livro I, v.1, p. 451 e 454.

A Constituição brasileira de 1988 proíbe qualquer tipo detrabalho para menores de 14 anos. (...) Apesar da proibiçãoconstitucional, não existe até hoje uma punição criminal paraquem desobedece à legislação. O empregador que contratamenores de 14 anos está sujeito apenas a multas. “As multassão, na maioria das vezes, irrisórias, permanecendo na casados R$500”, afirmou o procurador do trabalho Lélio BentesCorrêa. Além de não sofrer sanção penal, os empregadoresmuitas vezes se livram das multas trabalhistas devido a umabrecha da própria Constituição. O artigo 7º-, inciso XXXIII,proíbe “qualquer trabalho” a menores de 14 anos, mas abreuma exceção — “salvo na condição de aprendiz”.

Folha de S.Paulo, 1º- maio 1997. Caderno Especial “Infância roubada — trabalho infantil”.

Com base nos textos, é correto afirmar:a) Graças às críticas e aos embates questionando o trabalho in-

fantil durante o século XIX, na Inglaterra, o Brasil pôde, no finaldo século XX, comemorar a erradicação do trabalho infantil.

b) Em decorrência do desenvolvimento da maquinaria, foi possíveldiminuir a quantidade de trabalho humano, dificultando o empre-go do trabalho infantil nas indústrias desde o século XIX, na In-glaterra, e nos dias atuais, no Brasil.

c) A legislação proibindo o trabalho infantil na Inglaterra do século XIXe a legislação atual brasileira são instrumentos suficientes paraproteger as crianças contra a ambição de lucro do capitalista.

d) O trabalho infantil foi erradicado na Inglaterra, no século XIX, atra-vés das ações de fiscalização dos inspetores nas fábricas, exem-plo que foi seguido no Brasil no século XX.

e) O desenvolvimento da maquinaria na produção capitalista potencia-lizou, no século XIX, o emprego do trabalho infantil. Naquele con-texto, a legislação de proteção à criança pôde ser burlada, o queainda se verifica, de certa maneira, no Brasil do final do século XX.

Tarefa Complementar

Tarefa Mínima

ORIENTAÇÃO DE ESTUDO

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INTRODUÇÃOAfinal, o que é capitalismo? Uma definição de dicionário

seria: “modo de produção em que o capital, sob suas diferentesformas, é o principal meio de produção”. Meio de produção emodo de produção já sabemos o que é. Mas capital, o queseria?

CAPITAL E CAPITALISMOCapital normalmente designa um bem possuído por um indi-

víduo, como seu patrimônio. Pode ser uma quantia em dinheiro,uma aplicação em banco sob a forma de ações ou, ainda, um meiofísico de produção, como a terra, por exemplo. Do ponto de vistados empresários capitalistas, capital é qualquer tipo de bem quepossa se tornar fonte de renda. Uma casa, por exemplo, ou mesmoum conhecimento especializado pode ser capital porque são bensque podem gerar renda ao proprietário.

Daí podem-se concluir duas coisas:1) que o capital existe em toda e qualquer sociedade, em qual-

quer tempo ou lugar;2) que objetos inanimados podem ser produtivos e gerar renda

por si próprios.

A teoria marxista discorda dessas conclusões. O argumento éo seguinte: embora o capital tenha surgido antes das relações capi-talistas de produção, ele é inerente ao modo de produção capita-lista, porque jamais uma coisa seria capaz de gerar renda por si só.Na verdade, o capital seria uma relação social que toma a formade uma coisa. Se são os homens com seu trabalho que geram ri-quezas, o capital é, antes de mais nada, a relação entre seres hu-manos que se transforma em bens materiais. Nas palavras deMarx:

Ou seja, o capital não é simplesmente um conjunto de meiosde produção; esses é que foram transformados em capital aoserem apropriados por uma classe social (a burguesia) e em-pregados com a finalidade de gerar rendas.

Para os marxistas, o capitalismo se apresenta como um modode produção baseado fundamentalmente na propriedade privadados meios de produção. Assim, de um lado, há uma burguesiacapitalista, na condição de classe dominante e detentora dosmeios de produção; de outro, o proletariado, como classe domi-nada, a quem resta o trabalho assalariado. Sobre essa infraestru-tura econômica ergue-se a superestrutura do Estado nacional, quedetém o poder de governo sobre a sociedade e que encarna a ideo-logia da igualdade jurídica (ou seja, igualdade perante as leis) entreos indivíduos.

A MAIS-VALIANuma de suas obras mais importantes, O capital — crítica

da Economia Política, Marx expõe o que para ele é o mecanis-mo de funcionamento do modo capitalista de produção. Assim,decifra a fonte da acumulação do capital que permitiu ao capi-talismo expandir-se por todo o planeta e promover uma revo-lução tecnológica sem precedentes na história da humanidade.É a denominada teoria da mais-valia.

Os trabalhadores produzem utilizando os meios de produçãopertencentes ao patrão; este, em troca, paga-lhes um salário emdinheiro, depois de vender as mercadorias produzidas. Essa vendaé necessária para que ele reponha as matérias-primas e as ferra-mentas e possa reiniciar o processo. Com seu salário, os emprega-dos compram os bens necessários para sua sobrevivência e de suafamília. Aparentemente, estamos diante de uma troca justa. Mas,se nenhum dos lados está sendo privilegiado, de onde viria ariqueza dos capitalistas e a pobreza dos proletários?

Os capitalistas respondem que enriquecem devido aos lucrosobtidos com as vendas, uma vez que o mercado necessita de bens(que possuem preços variáveis). No entanto, se o patrão pagasseos empregados por todas as mercadorias produzidas por elesnuma jornada de trabalho, ele teria que abrir mão dos lucrospara poder adquirir novas matérias-primas, repor as máquinas epagar os impostos e as demais despesas da empresa. E o capita-lismo simplesmente não existiria.

Onde se esconde, então, a origem do capital acumulado? Olucro de mercado existe, é verdade; mas não é ele que gera ocapital. Os preços variam conforme as necessidades das pessoase a oferta das mercadorias. Mas o que determina o valor deuma mercadoria? Sempre lembrando que a força de trabalhovendida ao patrão pelo trabalhador também é uma mercadoria,acompanhemos com atenção o raciocínio de Marx:

1) O valor de uma mercadoria é determinado pelo tempo de tra-balho socialmente necessário para produzi-la. O que isso signifi-ca? Que podemos medir os valores de objetos diferentes troca-dos entre os indivíduos comparando o tempo necessário paraproduzi-los. Para isso, há que diferenciar o valor de uso e ovalor de troca das coisas. O valor de uso de um objeto é de in-teresse pessoal e não é levado em conta para a análise econômi-ca, pois ele pode valer muito para uma pessoa e não valer coisaalguma para outra. O ouro mesmo, tão valorizado em certassociedades, pode significar nada em outras. Chamamos aqui devalor, então, o valor de troca das mercadorias. E mercadoriasdiferentes são trocadas como equivalentes. Basta reconhecer odinheiro como equivalente universal, a moeda que se troca porqualquer outra coisa. Se coisas diferentes se apresentam nomercado como equivalentes, é porque todas têm em comum otempo que se gasta para produzi-las. E o tempo, diferente paraa produção de um automóvel e de um submarino, por exem-plo, pode ser medido e comparado. Quer dizer, então, que a camisa produzida por um alfaiate experiente “vale” menos que

(...) o capital não é uma coisa, mas uma relação de produçãodefinida, pertencente a uma formação histórica particular dasociedade, que se configura em uma coisa e lhe empresta umcaráter social específico.

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Atividade 5O MODO DE PRODUÇÃO CAPITALISTA

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a de um alfaiate novato, pois leva mais tempo para ser feita?Claro que não. Por isso, a teoria usa a expressão tempo social-mente necessário, ou seja, no estágio de desenvolvimento emque se encontra a sociedade, é possível saber qual o tempomédio que se leva para a confecção de camisas, para a fabri-cação de pneus, etc. É esse tempo social de trabalho que deveser tomado como medida do valor. O tempo gasto para pro-duzir um automóvel não é exclusivamente o da montagem finaldas peças, mas todo o tempo necessário para a extração demetais, o desenvolvimento de projetos de engenharia, a fabri-cação das peças e a montagem final. Ora, se a força de traba-lho na sociedade capitalista também é mercadoria, mede-se seuvalor pelo tempo de trabalho social necessário para a sua pro-dução e reprodução.

2) O valor da força de trabalho é, assim como o de qualqueroutra mercadoria, determinado pelo tempo de trabalho socialdespendido para a sua produção e reprodução, isto é, para amanutenção do trabalhador em condições de produzir e demanter os filhos que vão substituí-lo um dia no mercado de tra-balho. Na massa de salários pagos pelo patrão, está incorpora-do o valor social da produção de alimentos, vestimentas, mo-radias, transportes, etc. necessários aos trabalhadores. É poresse valor que os patrões pagam os salários e compram as jor-nadas de trabalho (horas trabalhadas no dia) dos seus empre-gados. Lembrando que, para os marxistas, como o capital éuma relação social e não uma soma de riquezas, a finalidadeúltima da produção capitalista é o valor de troca, e não a satis-fação do consumo.

3) A mais-valia é o valor a mais produzido pelos trabalha-dores além daquele pago pelo patrão no salário. Explica-se:quando o capitalista contrata um empregado, ele comprasua jornada de trabalho pelo valor determinado no mercado.Acontece que os homens não precisam trabalhar todos osdias, o dia todo, para produzir o equivalente ao que recebe-rão como salário ao final, por exemplo, de um mês. Oavanço tecnológico permite, já desde os primórdios da Revo-lução Industrial, que se trabalhe apenas umas tantas horasdiárias, conforme a sociedade. Mas o patrão “compra” todaa jornada de trabalho. E ela se compõe de um tempo de tra-balho necessário, que é pago, e de um tempo de sobre-trabalho, que não é pago e gera a mais-valia (aquele valorque o trabalhador produz a mais, para além do que recebeem troca). Por exemplo, considere-se que o valor da forçade trabalho de um operário de certa fábrica correspondahoje a quatro horas diárias. E que a sua jornada na fábricaseja de dez horas. Isto quer dizer que o trabalhador produziu ocorrespondente ao seu salário nas primeiras quatro horas; eque nas seis horas restantes ele produziu de graça para a em-presa. Neste caso, a mais-valia foi produzida durante o tempode sobretrabalho de seis horas. Observe este outro exemplo:imagine que o salário de um trabalhador seja o correspondentea 16 horas de trabalho por mês. E que, em 30 dias ele tenhatrabalhado rigorosamente 8 horas por dia. São 240 horas deprodução. A empresa precisa de 88 horas de produção — o queequivale a 11 dias de trabalho — para repor matérias-primas epagar as demais despesas. Neste caso, em um mês, o traba-

lhador produziu o necessário para o patrão pagar o seu salárioem dois dias (ou 16 horas) e produziu a mais-valia de que a em-presa se apropriou gratuitamente em 17 dias (ou 136 horas).Se essa empresa fosse uma fábrica de computadores que pro-duz um computador por hora, em 30 dias seriam 240 com-putadores. O empresário precisou vender 16 deles para pagaros empregados, outros 88 para cobrir as despesas de produ-ção; 136 foram produzidos de graça pelo sobretrabalho.

LIBERALISMO ECONÔMICOAssim como a Sociologia, a Economia Política surgiu durante

o século XVIII, em meio às transformações socioeconômicas gera-das pela Revolução Industrial. Os primeiros economistas procu-ravam explicar a questão do desenvolvimento a partir das “leis na-turais” da chamada Economia Clássica, que eram vistas como fixase eternas, e nem boas ou más. Adam Smith, David Ricardo, JamesMill, John Stuart Mill e outros entendiam que o bem-estar da so-ciedade está ligado ao do indivíduo. Com liberdade a todos paraganharem o mais que puderem, toda a sociedade melhoraria.

Era a doutrina do “laissez-faire, laissez-passer” (que, ao péda letra, significa: “deixai fazer, deixai passar”), que combatia ospontos de vista econômicos do chamado Antigo Regime. Enquantoa já envelhecida burguesia mercantil, aliada aos regimes absolutis-tas europeus, defendia os princípios do mercantilismo de mono-pólio, uma nova facção industrial de capitalistas se fortalecia. Paraeles, eram os monopólios comerciais, o pacto colonial (de explo-ração dos recursos das colônias americanas, africanas e asiáticaspelos impérios europeus), o intervencionismo do Estado (como ocontrole dos fluxos comerciais) e o metalismo (fixação do valor damoeda pela quantidade de ouro equivalente) que haviam impul-sionado o crescimento econômico no passado — mas passado erapassado. Era chegada a hora do grande salto, e o que antes haviaacelerado a economia agora era um freio e deveria ser superado.“Abaixo o mercantilismo!” e “Abaixo os monopólios!” eram as pa-lavras de ordem.

O novo papel do governo de cada nação seria o de preservara paz e proteger a propriedade. Manter os mercados abertos e alivre concorrência entre as empresas. Nada de regulamentar oshorários de trabalho ou os salários dos trabalhadores. Nada de ad-mitir os monopólios dos capitalistas para elevar preços ou as pres-sões dos sindicatos para elevar salários. Tudo isso seriam gravesviolações das leis “naturais” do mercado — que teriam graves con-sequências para a sociedade. Para essa mentalidade, o Estado nãodeveria intervir na economia em qualquer hipótese. Mesmo emcasos de crise, o mecanismo da oferta e da procura (demanda)de mercadorias agiria como se fosse uma “mão invisível”, regulan-do as relações econômicas, regendo o mercado e restabelecendo anormalidade.

DO LIBERALISMO AO IMPERIALISMOAs últimas décadas dos anos 1800 acompanharam a explosão

tecnológica no segundo tempo da Revolução Industrial e gozaramo esplendor cultural da chamada Belle Époque. Era o mundo dassiderúrgicas, das ferrovias, do petróleo, dos motores a combustão,dos telégrafos e dos telefones. A partir de 1870, houve ainda umamudança no modo capitalista de produção: a livre concorrência deulugar aos grandes monopólios.

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A indústria monopolista permitiu um grande desenvolvimentodas forças produtivas. O problema eram os mercados. As naçõesricas adotavam tarifas protetoras. Dentro das indústrias, a capaci-dade de produzir superava a capacidade do mercado de consumir.Onde encontrar novos mercados? A resposta: nas colônias. E umaexpansão neocolonialista voltou-se para a África, a Ásia, a Oceaniae a América Latina. A diferença fundamental dessa nova partilha doplaneta, se comparada com a expansão ultramarina dos séculos XVe XVI, é que os capitais excedentes eram investidos nas colônias enos países de fora da Europa, que precisavam de ferrovias, eletri-cidade, telefones, telégrafos, gás. Era um negócio altamente lucra-tivo, nascido da aliança entre industriais e banqueiros. O mundoentrava na idade do capital financeiro. E do imperialismo.

Os analistas concordam em identificar quatro manifestaçõesdo imperialismo, ou capitalismo monopolista:1) o monopólio, produto da concentração da produção num grau

elevado, que deu origem aos primeiros grandes trustes, hojechamados de multinacionais, e cartéis (acordos, entre empre-sas, de partilha da produção e dos mercados);

2) a luta pela conquista das fontes de matérias-primas, sobretudocarvão e minérios para a siderurgia;

3) a união dos capitais industrial e financeiro promovida pelosgrandes bancos interessados nos monopólios;

4) os conglomerados gigantes do capital industrial-financeiro, quesubstituíram as grandes empresas mercantilistas e passaram aexportar capitais para suas respectivas esferas de influência.

HEGEMONIA NEOLIBERAL:A FORMAÇÃO DO “PENSAMENTO ÚNICO”

Na década de 1990, uma ampla discussão sobre a conjunturaeconômica, realizada entre as “celebridades” do mundo capitalista,dentre elas os economistas das principais instituições financeiras,produziu o chamado Consenso de Washington. Nele, o econo-mista John Williamsom sintetizou o que seria a estratégia deajustamento econômico para a “nova ordem” que se anunciava.Seus princípios mais importantes são:• a estabilização financeira, conseguida às custas de um rígido

controle da inflação, e por meio da austeridade fiscal e da res-trição de gastos públicos;

• a privatização de empresas estatais;• a flexibilização de direitos trabalhistas, com a revogação de

leis e a negociação direta entre capital (patrões) e trabalho(operários).

• a desregulamentação de mercados, com o incentivo ao livrefluxo de capitais e a liberalização do comércio.

Em síntese, o neoliberalismo era uma nova versão do pensa-mento liberal, rotulada Estado mínimo.

NEOLIBERALISMO, GLOBALIZAÇÃO EDESEMPREGO

No mundo globalizado, muitas vezes, o que vale para “uns”(os ricos ou desenvolvidos) costuma não valer para “outros” (ospobres ou subdesenvolvidos). Exemplo disso é a política protecio-nista adotada pelos EUA (e por outras nações desenvolvidas): im-

põem-se barreiras a importações de produtos de certos setores eà realização de atividades econômicas estrangeiras em seu terri-tório. Ao mesmo tempo, defende-se o não protecionismo para “osoutros”, como ocorre na tentativa de implantação da Área de LivreComércio das Américas (ALCA). Já em países de capitalismo subor-dinado, antes chamados de Terceiro Mundo, os neoliberais sebatem por mercados abertos e pelo comércio mais livre possível.

Diante das posturas do Estado nesta conjuntura, o ideólogoitaliano Norberto Bobbio chamou-o de Estado mínimo e forte:propõe-se a interferir o menos possível nos mercados e nas polí-ticas sociais, mas assume a política repressiva diante das reaçõescontra o aumento do desemprego, da pobreza, das desigualda-des, da criminalidade, da violência, entre outros. É o que o soció-logo francês Löic Wacquant chamou de Estado penal. O progra-ma “tolerância zero” (contra o crime) em Nova York, o aumentoda população carcerária e a xenofobia em alta nos países euro-peus seriam algumas de suas faces.

Dentre os muitos problemas vividos pela sociedade globaliza-da, certamente o desemprego é um dos mais preocupantes. Em Ohorror econômico, a ensaísta francesa Viviane Forrester denunciao desemprego programado — disfarçado, por exemplo, em “pro-gramas de demissões voluntárias” —, que, em suas palavras,“desestruturam vidas e famílias inteiras, e relegam grande parte dapopulação mundial ao subemprego e à marginalização”.

CAPITALISMO MONOPOLISTA DE ESTADOO sonho de Adam Smith, para quem a livre concorrência tra-

ria o progresso econômico e o Estado seria o guardião da paz e dapropriedade para garantir a prosperidade de todos, deu lugar aocapitalismo monopolista de Estado. Nessa fase, o Estado as-cendeu como força econômica significativa e diretamente envolvidana acumulação do capital. O mundo tornou-se o palco da atuaçãodo Estado alinhado com o capital monopolista, com as empresasgigantes e com os grandes grupos financeiros em oposição a todasas outras classes. O Estado voltou a intervir na economia levandoem conta não o interesse geral, mas o interesse do capital mono-polista.

Novas análises, nessa época, detectaram outra característicaimportante do modo de produção capitalista em evolução: os pro-cessos de concentração e centralização do capital. De acordo como senso comum, pode parecer que concentração e centralizaçãosignificam a mesma coisa. Os sociólogos e economistas, no en-tanto, fazem uma leve distinção entre essas duas ideias. A concen-tração do capital implica a produção e a acumulação de capital emescalas cada vez mais ampliadas. Isso vai destruindo a livre concor-rência ou, quando menos, restringindo-a aos grandes trustes mul-tinacionais. As médias empresas tendem a absorver as pequenas, eas grandes empresas tendem a incorporar as médias. Quem podemais, concorre menos e monopoliza mais. Simultaneamente, dá-sea centralização do capital: cada vez mais capital se concentra nasmãos de cada vez menos capitalistas. A concorrência desequilibra-da entre gigantes, médios e pequenos e as facilidades do crédito,que beneficiam quem mais tem, facilitam a crescente centralizaçãoda propriedade dos capitais. Daí a importância do Estado comoregulador desse processo, apesar da aparência de neutralidade quepossa apresentar.

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Exercício(UEL)

A casa não é destinada a morar, o tecido não é dispostoa vestir,

O pão ainda é destinado a alimentar: ele tem de darlucro.

Mas se a produção apenas é consumida, e não é tam-bém vendida

Porque o salário dos produtores é muito baixo — quandoé aumentado

Já não vale mais a pena mandar produzir mercadoria —,por que

Alugar mãos? Elas têm de fazer coisas maiores no bancode fábrica

Do que alimentar seu dono e os seus, se é que se querque haja

Lucro! Apenas: para onde com a mercadoria? A boalógica diz:

Lã e trigo, café e frutas e peixes e porcos, tudo juntoÉ sacrifício ao fogo, a fim de aquentar o deus do lucro!Montanhas de maquinaria, ferramentas de exércitos

em trabalho,Estaleiros, altos-fornos, lanifícios, minas e moinhos:Tudo quebrado e, para amolecer o deus do lucro, sacri-

ficado!De fato, seu deus do lucro está tomado pela cegueiraAs vítimasEle não vê.[...] As leis da economia se revelamComo a lei da gravidade, quando a casa cai em estrondosSobre as nossas cabeças. Em pânico, a burguesia ator-

mentadaDespedaça os próprios bens e desvaira com seus restosPelo mundo afora em busca de novos e maiores mer-

cados.(E pensando evitar a peste alguém apenas a carrega

consigo, empestandoTambém os recantos onde se refugia!) Em novas e maio-

res crisesA burguesia volta atônita a si. Mas os miseráveis, exér-

citos gigantesQue ela, planejadamente, mas sem planos, arrasta con-

sigo,Atirando-os a saunas e depois de volta a estradas geladas,Começaram a entender que o mundo burguês tem seus

dias contadosPor se mostrar pequeno demais para comportar a riqueza

que ele próprio criou.BRECHT, Bertolt. “O manifesto”. Crítica marxista,

São Paulo, n. 16, p. 116, mar. 2003.

Os versos anteriores fazem parte de um poema inacabado deBrecht (1898-1956), numa tentativa de versificar O mani-festo do Partido Comunista de Karl Marx (1818-1883) eFriedrich Engels (1820-1895). De acordo com o poema ecom os conhecimentos da teoria de Marx sobre o capitalismo,

é correto afirmar que, na sociedade burguesa, as crises eco-nômicas e políticas, a concentração de renda, a pobreza e afome são:a) Oriundos da inveja que sentem os miseráveis por aqueles

que conseguiram enriquecer.b) Frutos da má gestão das políticas públicas.c) Inerentes a esse modo de produção e a essa formação so-

cial.d) Frutos do egoísmo próprio ao homem e que poderiam

ser resolvidos com políticas emergenciais.e) Fenômenos característicos das sociedades humanas desde

as suas origens.

• Resolva os exercícios a seguir.

1. (UEL) A expansão da produção capitalista, nos três primeiros quartosdo século XX, esteve assentada principalmente no modelo de organi-zação fordista. A partir do anos 1970, esse modelo sofreu significa-tivas alterações, decorrentes da dificuldade de enfrentar, através deganhos de produtividade, a crise que atingiu o sistema capitalista. Im-pôs-se ao universo da produção a necessidade de profunda reestru-turação econômica, expressa pela introdução de novas tecnologias,flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho,dos produtos e dos padrões de consumo. Tais mudanças foram vistaspor alguns como ruptura, e, por outros, como continuidade do mode-lo fordista. De qualquer maneira, o mundo do trabalho real do séculoXXI já não é mais o mesmo.

Sobre os impactos concretos que afetaram a produção e o traba-lho no Brasil, no quadro das transformações comentadas no texto,é correto afirmar que houve:a) consolidação do assalariamento regulamentado, através da ex-

pansão do emprego com carteira registrada para a totalidadedos trabalhadores.

b) fortalecimento do poder de negociação dos sindicatos e eleva-ção contínua da renda dos trabalhadores.

c) extinção por inteiro das formas antigas de divisão do trabalhobaseada na separação entre concepção e execução, em decor-rência da alta qualificação intelectual dos trabalhadores.

d) expansão de formas alternativas de organização do trabalho (traba-lho informal, doméstico, temporário, por hora e subcontratação)em detrimento do assalariamento tradicional.

e) redução drástica das jornadas de trabalho e ampliação do tempode lazer desfrutado pelos trabalhadores.

2. (UEL) Sobre a exploração do trabalho no capitalismo, segundo ateoria de Karl Marx (1818-1883), é correto afirmar:a) A lei da hora extra explica como os proprietários dos meios de pro-

dução se apropriam das horas não pagas ao trabalhador, obtendomaior excedente no processo de produção das mercadorias.

b) A lei da mais-valia consiste nas horas extras trabalhadas após ohorário contratado, que não são pagas ao trabalhador pelos pro-prietários dos meios de produção.

c) A lei da mais-valia explica como o proprietário dos meios de pro-dução extrai e se apropria do excedente produzido pelo traba-lhador, pagando-lhe apenas por uma parte das horas trabalhadas.

d) A lei da mais-valia é a garantia de que o trabalhador receberá ovalor real do que produziu durante a jornada de trabalho.

e) As horas extras trabalhadas após o expediente constituem-se naessência do processo de produção de excedentes e da apropria-ção das mercadorias pelo proprietário dos meios de produção.

Tarefa Mínima

ORIENTAÇÃO DE ESTUDO

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3. (UNEB) No contexto da Nova Ordem Mundial da década de 1990,entende-se por neoliberalismo um conjunto de princípios teóricose ações práticas que preconizam:a) Privatização dos setores da economia ainda sob o controle es-

tatal / Liberalização dos fluxos comerciais e de capitais.b) Ampliação das funções estratégicas do Estado / Privatização

das empresas estatais.c) Redefinição dos papéis do Estado / Nacionalização das empre-

sas multinacionais.d) Redução do tamanho do Estado / Rígido controle governamen-

tal dos mercados financeiros.e) Crescimento da intervenção estatal na esfera da produção / Es-

tatização das empresas privadas.

• Resolva os exercícios a seguir.

1. (UEL) “No tempo em que os sindicatos eram fortes, os trabalhado-res podiam se queixar do excesso de velocidade na linha de pro-dução e do índice de acidentes sem medo de serem despedidos.Agora, apenas um terço dos funcionários da IBP [empresa alimen-tícia norte-americana] pertence a algum sindicato. A maioria dosnão sindicalizados é imigrante recente; vários estão no país ilegal-mente; e no geral podem ser despedidos sem aviso prévio sejaqual for o motivo. Não é um arranjo que encoraje ninguém a fazerqueixa. [...] A velocidade das linhas de produção e o baixo custotrabalhista das fábricas não sindicalizadas da IBP são agora o pa-drão de toda indústria.”

SCHLOSSER, Eric. País fast-food. São Paulo: Ática, 2002. p. 221.

No texto, o autor aborda a universalização, no campo industrial, dosempregados do tipo Mcjobs ("MacEmprego"), comuns em empresasde fast-food. Assinale a alternativa que apresenta somente caracterís-ticas desse tipo de emprego.a) Alta remuneração da força de trabalho, adequada à especializa-

ção exigida pelo processo de produção automatizado.b) Alta informalidade relacionada a um ambiente de estabilidade

e solidariedade no espaço da empresa.c) Baixa automatização num sistema de grande responsabilidade

e de pequena divisão do trabalho.d) Altas taxas de sindicalização entre os trabalhadores aliadas a

grandes oportunidades de avanço na carreira.e) Baixa qualificação do trabalhador acompanhada de má remu-

neração do trabalho e alta rotatividade.

2. (UFABC) Leia a manchete:

Boia-fria ganha bem, diz usineiroProdutores de cana rechaçam comparação com escra-

vidão e dizem que remuneração está acima da médiaFolha de S.Paulo, 3 jul. 2007.

Sobre a figura do boia-fria no campo brasileiro, são feitas as se-guintes afirmações:

I. A maior parte desses trabalhadores vive na periferia das cidadese, por trabalhar somente nos períodos de colheita, está à margemdo trabalho formal.

II. Dos trabalhadores rurais, estes são os menos afetados pela meca-nização da agricultura, o que lhes garante emprego durante todoo ano.

III. A busca de maior produtividade e, consequentemente, de salário,impõe longas jornadas de trabalho diário a esse trabalhador.

Está correto somente o que se afirma ema) I.b) II.c) I e II.d) I e III.e) II e III.

3. (UEL) “Depois de viajar nas alturas durante toda a campanha eleitoraldo ano passado e resistir bravamente em alta durante o começo dogoverno Lula, o dólar finalmente começou a voltar a seu valor de equi-líbrio, aquele em que reflete as condições econômicas do país semos sustos especulativos das eleições e outros terremotos emocionaisque os mercados usam com maestria para obter lucros.”

“O dólar baixa a crista”. Veja, São Paulo, v. 36, n. 17, p. 108, 30 abr. 2003.

O texto expressa fenômenos típicos da sociedade capitalista: feti-chismo e alienação. Sobre esses fenômenos, considere as seguin-tes afirmativas.

I. Na situação apresentada, integram um processo que sujeita ocapital financeiro a um comportamento racional cuja consequên-cia é a alocação ótima de recursos.

II. São fenômenos sociais nos quais as mercadorias e o capital apa-recem às pessoas como possuidoras de vida própria.

III. São fenômenos que, na situação apresentada, revelam a insen-sibilidade dos agentes econômicos às influências da esfera po-lítica e aos eventos de caráter psicossocial.

IV. São fenômenos nos quais os homens, a exemplo da situaçãoapresentada, não se reconhecem nas obras que criaram e dei-xam-se governar por elas.

Assinale a alternativa em que as afirmativas sintetizam de formacorreta as análises sobre esses fenômenos.a) I e II. d) I, III, IV.b) I e III. e) II, III, IV.c) II e IV.

4. (UEL) “No capitalismo, os trabalhadores produzem todos os objetosexistentes no mercado, isto é, todas as mercadorias; após havê-lasproduzido, entregam-nas aos proprietários dos meios de produção,mediante um salário; os proprietários dos meios de produção vendemas mercadorias aos comerciantes, que as colocam no mercado deconsumo; e os trabalhadores ou produtores dessas mercadorias,quando vão ao mercado de consumo, não conseguem comprá-las.[...] Embora os diferentes trabalhadores saibam que produziram asdiferentes mercadorias, não percebem que, como classe social, pro-duziram todas elas, isto é, que os produtores de tecidos, roupas, ali-mentos [...] são membros da mesma classe social. Os trabalhadoresse veem como indivíduos isolados [...], não se reconhecem como pro-dutores da riqueza e das coisas.”

CHAUÍ, M. Convite à Filosofia. 13 ed. São Paulo: Ática, 2004, p. 387.

Com base no texto e nos conhecimentos sobre alienação ideoló-gica, considere as afirmativas a seguir:a) A consciência de classe para os trabalhadores resulta da von-

tade de cada trabalhador em superar a situação de exploraçãoem que se encontra sob o capitalismo.

b) É no mercado que a exploração do trabalhador torna-se explícita,favorecendo a formação de ideologia de classe.

c) A ideologia da produção capitalista constitui-se de imagens eideias que levam os indivíduos a compreenderem a essênciadas relações sociais de produção.

d) As mercadorias apresentam-se de forma a explicitar as relaçõesde classe e o vínculo entre o trabalhador e o produto realizado.

e) O processo de não identificação do trabalhador com o produtode seu trabalho é o que se chama alienação. A ideologia liga-sea este processo, ocultando as relações sociais que estruturama sociedade.

Tarefa Complementar

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INTRODUÇÃOEm nosso cotidiano, o termo política assume diversos signi-

ficados. Falamos em política econômica governamental, políticaeducacional do município, política interna da empresa, política exte-rior nacional, política sindical. Além disso, geralmente associamosessa palavra às manobras, fraudes e escândalos que envolvem aprática política em geral.

No dicionário Houaiss, o verbete política inclui definiçõescomo as que seguem:• arte ou ciência da organização, direção e administração de na-

ções ou Estados; aplicação desta arte aos negócios internos danação (política interna) ou aos negócios externos (política exter-na); ciência política;

• arte de guiar ou influenciar o modo de governo pela organi-zação de um partido, pela influência da opinião pública, pelaaliciação de eleitores;

• conjunto de opiniões e/ou simpatias de uma pessoa com relaçãoà arte ou ciência política, a uma doutrina ou ação política;

• habilidade no relacionar-se com os outros tendo em vista aobtenção de resultados desejados.

Diante da amplitude do conceito, surge a seguinte dúvida:o que seria política para os estudiosos da sociedade? Ou ainda:podemos falar na existência de uma ciência política?

A CIÊNCIA POLÍTICANum sentido amplo, podemos entender política como a orga-

nização de pessoas para atingir um determinado objetivo. Numsentido mais estrito, Max Weber escreveu, em A política como vo-cação: “Entenderemos por política apenas a direção do agrupa-mento político hoje denominado ‘Estado’ ou a influência que seexerce em tal sentido”. O sociólogo analisa a política nos nossostempos, preocupando-se com o que acontece no plano do Estadoe, fora dele, com as articulações das pessoas para influenciar asações do Estado.

Aceita-se generalizadamente como fim último da política aconquista do poder do Estado, entendendo-se poder como o mo-nopólio do exercício do direito e da força. Tiveram poder político osenhor do feudo e o monarca absoluto; hoje esse poder é exerci-do, por exemplo, pelo Parlamento nacional, que elabora leis e im-põe normas de conduta aos indivíduos de uma sociedade.

Mas, para alguns, não se deve definir a política pelos seus fins.Isso porque esses podem variar de acordo com os interesses degrupos ou classes em dado momento histórico. Em tempos delutas sociais e civis, por exemplo, o fim da atividade política prova-velmente será o restabelecimento da unidade do Estado, da paz eda ordem pública. Já em tempos de paz interna e externa, essaatividade estará voltada para a garantia do bem-estar e da pros-peridade. Da mesma forma, tempos de opressão da população porum governo despótico serão marcados pela luta por direitos civis epolíticos; e tempos de domínio por uma potência estrangeira, pelaluta pela independência nacional.

Toda essa complexidade levou Karl Mannheim (1893-1947),sociólogo alemão de linha weberiana, a questionar a real possibili-dade de uma ciência política, que seria praticamente inviável, devi-do à dificuldade de estabelecer um método diante da interaçãoquase aleatória de forças e fatores em jogo. A pergunta que surgeé: como formular leis gerais para a análise científica das atividadespolíticas se as regras do jogo mudam constantemente?

POLÍTICA, POVO E NAÇÃOUma reflexão mais detida sobre o que vem a ser política le-

va-nos, necessariamente, a examinar dois outros conceitos, ex-tremamente controvertidos e bastante recorrentes no discursopolítico contemporâneo: os conceitos de povo e de nação.

Fala-se tanto em povo; mas, afinal, o que é povo?Como conceito político, encontramos a ideia de “povo” já na

Roma antiga. Em sua fase republicana, o governo romano com-punha-se do Senado dos patres (ou patrícios), representantesdas famílias gentílicas (nobres), enquanto o populus (isto é, ogrupo dos plebeus) era representado por seus tribunos. Os de-mais povos — que tinham sido incorporados ao Império e eramconsiderados bárbaros —, quando aceitavam a posição de sub-missão, formavam o populus romanus. Na Idade Média, o feu-dalismo trouxe uma nova estratificação, com o surgimento dosburgos ou comunas de base popular. Ali o chamado povo seorganizava nas corporações de ofício. Eram os mestres arte-sãos, pequenos homens de negócios, comerciantes e uma amplafaixa de trabalhadores sem participação decisória.

Foi então que brotou um interesse romântico pelo povo,verificável tanto na literatura quanto na historiografia: passou-sea identificar o Estado com a nação e a considerar o povo comopossível sujeito de ações políticas. Desde que Portugal se formoucomo o primeiro Estado nacional da Era Moderna, o povo é iden-tificado como a população sem as heranças de nobreza. Ca-mada social, portanto, que incluía tanto os primeiros trabalha-dores livres dos laços de servidão quanto os mercadores da bur-guesia emergente.

Foi no século XIX, contudo, em plena era industrial na Eu-ropa com suas profundas transformações socioeconômicas, quese consolidou a imagem do povo como contingente da maioriaempobrecida. Não por acaso, lá surgiam os primeiros partidospolíticos populares da História.

Somente a partir da consolidação de Portugal se pode falar nocaráter nacional dos Estados modernos, uma vez que as formasanteriores do Estado, desde a Antiguidade, eram estruturas apro-priadas pelas castas ou estamentos dominantes, com base no prin-cípio da superioridade “natural” ou “divina” dos aristocratas enobres senhores, em que não havia a igualdade jurídica dos cida-dãos. O Estado nacional moderno se coloca como entidade neutradiante de uma sociedade composta por homens iguais perante a leie não dividida, por laços de sangue, em grupos inferiores e supe-riores. Com o Estado moderno, nascia a ideia de nação.

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Atividade 6ESTADO E PODER POLÍTICO

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Mas, afinal, o que é nação?É corrente a ideia de nação como forma historicamente

constituída de uma comunidade humana. Sua principal carac-terística é a existência de condições materiais de vida comunsaos seus integrantes, que habitam um território demarcado,falam o mesmo idioma e compartilham determinadas manifes-tações culturais. Enfim, a nação é uma ampla forma de comu-nidade, que se originou a partir do nascimento e do desenvolvi-mento do capitalismo. Sua base econômica foi a consolidaçãodos vínculos econômicos entre as regiões do que se convencio-nou chamar de país e a unificação dos mercados locais nummercado nacional único, acionado por uma só moeda.

Aparentemente, essa descrição “ideal” de nação satisfaz aopesquisador. Quando posta à prova diante da realidade concreta,no entanto, afloram os problemas desse modelo. O termo “nação”ganhou projeção nos discursos políticos durante a Revolução Fran-cesa, mas de forma vaga e imprecisa. Podia sugerir a ideia de co-munidade política identificada com o Estado, nos termos vistosanteriormente, mas também incluía uma noção mais genérica,como a de nação europeia, nação africana, árabe ou eslava. Issoporque, na Idade Média europeia, as pessoas não se identificavamcomo inglesas, francesas ou alemãs. O indivíduo via-se, em pri-meiro lugar, como cristão; depois, como castelhano, borgonhês oumilanês; e, por último, como ibérico, francês ou italiano. Somentea partir da centralização do poder político em Portugal, com oreconhecimento de um só senhor — o Rei —, a unificação do exér-cito real e o estabelecimento de uma moeda comum, podemos vis-lumbrar os embriões do Estado moderno centralizado.

O QUE É PODER?Nas reflexões sobre política, povo, nação e nacionalismo, es-

barramos inúmeras vezes nos conceitos de Estado e de poder,fundamentais à realidade política, sobretudo nas sociedades capi-talistas.

O poder político pertence a quem estabelece as leis e as nor-mas de conduta de um agrupamento humano, obrigando os indi-víduos a cumpri-las. No sentido especificamente sociológico, poderé a capacidade de determinar o comportamento dos outros. Assim,à Sociologia interessa o poder do homem sobre outro homem —que, portanto, deve ser considerado não só sujeito, mas tambémobjeto do poder.

Com efeito, o poder não é apenas a posse de uma coisa; é,antes de tudo, uma relação social. Não se pode dizer que um indi-víduo ou um grupo de pessoas é poderoso se, de outra parte, nãohouver um indivíduo ou grupo disposto a se comportar comoaqueles desejam. A posse de dinheiro, por exemplo, pode levaralguém a controlar a conduta de outros; mas se estes se recusarema aceitar a coação, mesmo que para isso precisem rejeitar elevadaquantia em dinheiro, tal poder econômico não existe.

Ainda assim, o exercício do poder como relação social de-pende da posse de alguns recursos, como riqueza, força, infor-mação, conhecimento (como o do médico, o do professor, etc.),prestígio, legitimidade, popularidade, amizade, entre outros.Mas isso não basta; é preciso também ter habilidade para queesses recursos sejam transformados em poder.

A máxima de Maquiavel (“a essência do poder é a violência”)não nega a hipótese de que existem modos diversos de exercíciodo poder. Para além da violência, pode-se recorrer à persuasão,

à manipulação de interesses, a promessas de recompensa, ao ali-ciamento. Observando esses modos de exercício do poder, reco-nhecemos que há pessoas e instituições mais ou menos pode-rosas. Então, seria possível medir o poder? Sim, mas para issohá que levar em conta os seguintes critérios:

1) a probabilidade de que o comportamento desejado serealize: quanto maior a probabilidade, maior o poder;

2) o número de indivíduos submetidos ao poder: pode che-gar a bilhões de pessoas ou não passar de um indivíduo;

3) a esfera de exercício do poder: o diretor de uma escola in-fantil e o comandante de um quartel atuam em áreas diferen-tes, o que faz com que suas decisões tenham consequênciasdistintas;

4) o grau de modificação do comportamento: levar alguém amudar de time de futebol ou de religião pode ser mais difícilque convencê-lo a comprar uma certa marca de automóvel;

5) o grau de restrição a comportamentos alternativos.

O poder está disseminado em todas as esferas da vida social:das famílias às empresas e às relações de classes; dos sindicatose partidos ao governo da nação. Mas é no campo da políticaque ele ganha maior destaque.

Uma tipologia moderna das formas de poder identifica opoder econômico (agente organizador das forças produtivas),o poder ideológico (em que se dá a organização do consensosocial) e o poder político (responsável por organizar a coação,ou seja, as imposições físicas e morais).

O poder econômico se baseia na posse de bens que, numasituação de escassez, pode induzir quem deles necessita a certoscomportamentos. A posse dos meios de produção é a fonte prin-cipal desse poder, em que ocorre a troca da força de trabalhopor salário, no caso das formações capitalistas.

O poder ideológico decorre da influência de ideias formu-ladas para persuadir, como ocorre com a propaganda e compessoas investidas de certa autoridade sobre o grupo social.

Por fim, o poder político, que se baseia no monopólio douso da violência, é o poder coator das instituições públicas, comoos aparatos judicial, policial e militar.

Saliente-se que todas essas formas de poder mantêm socie-dades de desiguais, sejam ricos e pobres, sábios e ignorantes,fortes e fracos; em suma, superiores e inferiores.

O QUE É O ESTADO?Inicialmente, o Estado pode ser entendido como a instituição

social que detém o poder de governo, ou seja, o monopólio dodireito e da força sobre o povo ou os povos de uma nação. Osconceitos de povo, nação e poder associam-se necessariamenteao de Estado; além disso, na configuração do Estado nacionalmoderno, o território definido e as marcas culturais têm papelrelevante.

Quando o filósofo alemão Friedrich Hegel (1770-1831)escreveu os Princípios da Filosofia do Direito, afirmou que oEstado é a materialização do interesse geral da sociedade e estásupostamente acima dos interesses particulares. Somente o Es-tado seria capaz de superar a divisão entre ele próprio e a so-ciedade civil, bem como o abismo entre o indivíduo (como pes-soa privada) e o cidadão (como homem político, cuja atuação e

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interesse é o do espaço público). Marx rebateria essa ideia coma Crítica da Filosofia do Direito de Hegel; na análise marxista,o Estado não representa o interesse geral, mas defende os in-teresses da propriedade privada. O remédio contra isso estariana radicalização da democracia e na consequente emancipaçãopolítica do homem. Porém, ainda segundo Marx, a emanci-pação política não é suficiente para a emancipação humana, quesó seria alcançada com a reorganização completa da sociedade,incluindo a abolição da propriedade privada. Como se vê, polê-micas não faltam quando o tema é o Estado.

Mas de onde veio esta entidade que parece pairar sobre nos-sas cabeças como um ente sobrenatural e poderoso que podemudar a vida de qualquer um de nós? Não é sem razão que o filó-sofo materialista inglês Thomas Hobbes o chamou de “Leviatã”,equiparando-o ao monstro mitológico organizador do caos primi-tivo; ou que, inspirado nos Estados totalitários surgidos no sécu-lo XX, o escritor George Orwell (autor de 1984) tenha criado afigura do “Grande Irmão” (“Big Brother”) como representação doEstado que nos vigia vinte e quatro horas por dia, em qualquerlugar que estejamos.

Em A origem da família, da propriedade privada e do estado,de 1894, o pensador alemão Friedrich Engels, parceiro de Marxem algumas obras, escreveu uma das melhores reflexões sobre asorigens históricas do Estado:

FORMAS DE GOVERNOO exercício da política nas diversas épocas e ambientes his-

tóricos resultou na criação de tipos variados de governo, quenão devem ser confundidos com a noção de Estado, nem coma ideia de regime político. Quanto à forma de governo, umEstado pode ser monárquico ou republicano.

Um Estado republicano, por sua vez, pode ser conduzidopor regimes fascistas ou liberais. Os regimes liberais republica-nos costumam alternar periodicamente seus governos, enquantoos fascistas podem durar muitos anos sob um só governo.

A monarquia, como o termo sugere (mono, “um só”), é oEstado conduzido pelo governo de uma só pessoa (monarca),que possui poderes vitalícios e, quase sempre, o direito de trans-missão hereditária da soberania. Assim, é uma situação com fortecentralização do poder político.

Durante o século XIX, o avanço liberal e as revoluções ge-raram a monarquia constitucional. Existente até hoje, esse re-gime, que impõe ao rei a obediência à lei, pode ser ainda centra-lista ou parlamentarista. Na versão centralista, o rei reina e gover-na, mas dentro dos limites constitucionais. Na parlamentarista, orei é o chefe de Estado, enquanto o primeiro-ministro é o chefede governo. O partido da maioria é incumbido pelo chefe de Estadode formar o gabinete de governo e indicar o primeiro-ministro. Oparlamentarismo monárquico tem origem britânica, mas ins-pirou as versões escandinavas (Dinamarca, Suécia e Noruega).Espanha, Holanda, Bélgica e até o Japão também o adotam.

Outra importante forma de governo é a república. Trata-seda maneira de governar mais comum atualmente e a mais iden-tificada com as ideias de modernidade e representatividade.Originada do latim res publica, que quer dizer “coisa pública”,denomina a organização em que o chefe de Estado tem acesso aopoder por eleição popular, direta ou indireta, e governa por umperíodo de tempo predeterminado.

Em uma república, a chefia do Estado pode ser exercida poruma só pessoa ou por um colegiado (ou comitê de governo),como ocorre na Suíça. Nos países republicanos, o chefe de go-verno pode ser o presidente (república presidencialista) ouum primeiro-ministro (república parlamentarista).

No primeiro caso, o presidente da república é o chefe deEstado e de governo; ele é eleito por sufrágio universal direto*,como ocorre no Brasil, ou em colégios eleitorais, como nos Es-tados Unidos; o presidente tem o poder de nomear ou demitirministros e secretários, além de representar a nação nas rela-ções internacionais e estabelecer, subordinado à aprovação doSenado, tratados com nações estrangeiras. Tem mandato fixocuja duração é variável (quatro anos no Brasil e nos EstadosUnidos, sete anos na França, etc.), muitas vezes com direito àreeleição. O Parlamento ou Congresso Nacional, normalmente,não pode ser dissolvido por ele, mas o presidente pode sofrerimpeachment (impedimento de mandato) em casos de delitocomprovado.

Já no caso da república parlamentarista, a chefia de Estadocabe ao presidente e a chefia de governo, ao primeiro-ministro.Trata-se de um sistema parecido com a monarquia parlamen-tarista, ocorrendo em países como Portugal ou Rússia.

(…) na constituição grega da época heroica vemos, aindacheia de vigor, a antiga organização gentílica, mas já observamosigualmente o começo da sua decadência: o direito paterno, comherança dos haveres pelos filhos, facilitando a acumulação dasriquezas na família e tornando esta um poder contrário à gens[clã ou grupo de famílias de origem comum]; a diferenciação deriquezas, repercutindo sobre a constituição social pela formaçãodos primeiros rudimentos de uma nobreza hereditária e de umamonarquia; a escravidão, a princípio restrita aos prisioneiros deguerra, desenvolvendo-se depois no sentido da escravização demembros da própria tribo e até da própria gens; a degeneraçãoda velha guerra entre as tribos na busca sistemática, por terra epor mar, de gado, escravos e bens que podiam ser capturados,captura que chegou a ser uma fonte regular de enriquecimento.Resumindo: a riqueza passa a ser valorizada e respeitada comobem supremo e as antigas instituições da gens são pervertidaspara justificar-se a aquisição de riquezas pelo roubo e pela vio-lência. Faltava apenas uma coisa: uma instituição que não sóassegurasse as novas riquezas individuais contra as tradições co-munistas da constituição gentílica, que não só consagrasse apropriedade privada, antes tão pouco estimada, e fizesse dessaconsagração santificadora o objetivo mais elevado da comuni-dade humana, mas também imprimisse o selo geral do reconhe-cimento da sociedade às novas formas de aquisição da proprie-dade, que se desenvolviam umas sobre as outras — a acumula-ção, portanto, cada vez mais acelerada, das riquezas —; uma ins-tituição que, em uma palavra, não só perpetuasse a nascente di-visão da sociedade em classes, mas também o direito de a classepossuidora explorar a não possuidora e o domínio da primeirasobre a segunda. E essa instituição nasceu. Inventou-se o Estado.

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Outro conceito importante no estudo da organização doEstado contemporâneo é o de federalismo. O termo remete àconcepção do Estado organizado com base na autonomia de suasrepartições territoriais internas, que são chamadas de províncias,estados ou departamentos. Todas elas estão reunidas num EstadoNacional Federativo e reconhecem, portanto, um governo centralda União. Apesar disso, preservam sua autonomia política e admi-nistrativa tanto em relação às outras províncias como em relaçãoao poder central. Têm seus ordenamentos jurídicos próprios, afi-nados, é claro, com os preceitos da Constituição Federal, em queestão estabelecidos os seus princípios governamentais, administra-tivos, tributários, de segurança, etc. Este tipo de Estado — quepode ser republicano ou monárquico — contrapõe-se ao Estadounitário ou centralista.

DIVISÃO DOS PODERESAs teorias do Estado liberal (desde os filósofos Locke, Montes-

quieu e Kant, século 1700) sempre estabeleceram uma forte re-lação entre a Constituição Nacional e a divisão dos poderes de go-verno. A Declaração dos direitos do homem e do cidadão de 1789,por exemplo, diz no artigo 16º-: “Toda sociedade em que não forassegurada a garantia dos direitos e determinada a separação dospoderes não tem Constituição”.

O pensador francês Jacques Montesquieu, autor da teoriados três poderes, afirmou em sua obra O espírito das leis, de1748: “Tudo estaria perdido se uma só pessoa ou um só corpo denotáveis, de nobres ou de povo, exercesse estes três poderes: o defazer as leis, o de executar as decisões públicas e o de punir os deli-tos e contendas entre os particulares”.

Sendo assim, o Legislativo se incumbiria então “de fazer asleis”; o Executivo, “de executar as decisões públicas”; o Judi-ciário, “de punir os delitos e contendas entre os particulares”.

Já o filósofo alemão Immanuel Kant defendia a separação ra-dical entre os três poderes, com total autonomia entre eles, ideiaque influenciou a Constituição francesa de 1791, na qual as leis, osdecretos e as sentenças ficavam sob responsabilidade, respectiva-mente, do Legislativo, do Executivo e do Judiciário. Kant defendeuainda a existência de um “poder neutro”, do qual estaria investi-do o rei e que teria a exclusiva função de observar a harmoniaentre os três poderes (cada um operando no seu âmbito específi-co) e de resolver os desencontros e conflitos, mas sem participarnas suas funções específicas. Nascia aí a ideia do poder mode-rador, que foi aplicada de modo deturpado na época do Impériono Brasil, sob Dom Pedro II.

Exercício(UEL) “Sendo, portanto, um príncipe obrigado a bem servir-se da natureza da besta, deve dela tirar as qualidades da ra-posa e do leão, pois este não tem defesa alguma contra oslaços, e a raposa, contra os lobos. Precisa, pois, ser raposapara conhecer os laços e leão para aterrorizar os lobos. Os quese fizerem unicamente de leões não serão bem-sucedidos. (...)

E há de se entender o seguinte: que um príncipe, e especial-mente um príncipe novo, não pode observar todas as coisas aque são obrigados os homens considerados bons, sendo fre-quentemente forçado, para manter o governo, a agir contra acaridade, a fé, a humanidade, a religião.”

MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe. 2. ed. São Paulo:Abril Cultural, 1979. p. 74-75.

A partir das metáforas propostas por Nicolau Maquiavel, pen-sador italiano renascentista, considere as afirmativas sobre anoção do poder próprio ao governante.

I. A sabedoria e o uso da força fundamentam o poder.II. O poder encontra seu fundamento na bondade e na cari-

dade.III. A sobrevivência do poder depende das virtudes da fé e

da religião.IV. Os fins podem justificar os meios, para resolver confli-

tos na disputa pelo poder.

Estão de acordo com o pensamento de Maquiavel apenasas afirmativas:a) I e II.b) I e III.c) I e IV.d) II e III.e) III e IV.

• Resolva os exercícios a seguir.

1. (UFSJ-adaptada) “É verdade que nas democracias o povo parecefazer o que quer; mas a liberdade política não consiste nisso. NumEstado, isto é, numa sociedade em que há leis, a liberdade não podeconsistir senão em poder fazer o que se deve querer e em não serconstrangido a fazer o que não se deve desejar.Deve-se ter sempre em mente o que é independência e o que éliberdade. A liberdade é o direito de fazer tudo o que as leis permi-tem; se um cidadão pudesse fazer tudo o que elas proíbem, nãoteria mais liberdade, porque os outros também teriam tal poder.”

MONTESQUIEU, Charles. “Do espírito das leis”. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1973. p. 155-156.

De acordo com Montesquieu,a) a liberdade consiste em fazer tudo que as leis proíbem.b) a liberdade consiste no direito de fazer tudo o que as leis permi-

tem.c) na democracia, ser livre é fazer o que se quer.d) fazer tudo o que as leis proíbem é agir com liberdade.e) liberdade é não precisar seguir as leis.

2. (Mackenzie) A federação é uma forma de Estado coletiva, consi-derada a mais desejável na medida em que procura: a) unificar os interesses da nação através da pessoa do Presidente.b) resguardar os interesses regionais pela autonomia concedida

aos Estados.c) deter a liberdade dos governadores a fim de prevalecer as reso-

luções do governo federal.d) estabelecer autoridade ampla para as Assembleias Legislativas,

mas controlar ativamente o governo central.e) restaurar o equilíbrio político do país concentrando todas as de-

cisões no governo central.

Tarefa Mínima

ORIENTAÇÃO DE ESTUDO

* Sufrágio: voto. Universal: sem exclusão por sexo, classe, instru-ção, etc. Direito: o eleitor vota diretamente naqueles que o re-presentarão durante o governo.

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• Resolva os exercícios a seguir.

1. (UEL) Em O Príncipe, Maquiavel (1469-1527) formulou ideias e con-ceitos que firmaram a sua reputação de o fundador da Ciência Políticamoderna. Dentre elas, pode-se citar os aspectos relacionados àsações políticas dos governantes e à dominação das massas. Para ele,a política deveria ser compreendida pelo governante como uma esferaindependente dos pressupostos religiosos que até então a impreg-navam. Ao propor a autonomia da política (esfera da vida pública e daação dos dirigentes políticos) sobre a ética (esfera da vida privada e daconduta moral dos indivíduos), é legítimo afirmar que Maquiavel nãodeixou, entretanto, de reconhecer e valorizar a religião como umaimportante dimensão da vida em sociedade. Segundo Maquiavel, areligião dos súditos deveria ser objeto de análise atenta por parte dogovernante.

Sobre a relação entre política e religião, de acordo com Maquiavel,é correto afirmar:a) A religião deve ser cultivada pelo governante para garantir que

ele seja mais amado do que temido.b) Por se constituírem em personagens importantes na vida políti-

ca de uma comunidade, os líderes religiosos devem formularas ações a serem executadas pelos príncipes.

c) O sentimento religioso dos súditos é um valor moral e, portan-to, deverá ser combatido pelo príncipe, uma vez que conduz aofanatismo e prejudica a estabilidade do Estado.

d) A religião dos súditos é sempre um instrumento útil nas mãosdo príncipe, o qual deve aparentar ser virtuoso em matéria reli-giosa.

e) O dirigente político deve se esforçar para tornar-se, também, odirigente religioso de seu povo, rompendo, assim, com o pre-ceito do Estado laico.

2. (UFSJ-adaptada) “O motivo que leva os homens a entrarem em socie-dade é a preservação da propriedade; e o objetivo para o qual esco-lhem e autorizam um poder legislativo é tornar possível a existênciade leis e regras estabelecidas como guarda e proteção às proprie-

dades de todos os membros da sociedade, a fim de limitar o poder e moderar o domínio de cada parte e de cada membro da comunidade;pois não se poderá nunca supor seja vontade da sociedade que o le-gislativo possua o poder de destruir o que todos intentam assegu-rar-se entrando em sociedade e para o que o povo se submeteu a le-gisladores por ele mesmo criados. Sempre que os legisladores ten-tam tirar e destruir a propriedade do povo, ou reduzi-lo à escravidãosob poder arbitrário, entra em estado de guerra com ele, que ficaassim absolvido de qualquer obediência, mas abandonado ao refúgiocomum que Deus providenciou para todos os homens contra a forçae violência. Sempre que, portanto, o legislativo transgredir esta regrafundamental da sociedade, e por ambição, temor, loucura ou corrup-ção, procurar apoderar-se ou entregar às mãos de terceiros o poderabsoluto sobre a vida, liberdade e propriedade do povo perde, poresta infração ao encargo, o poder que o povo lhe entregou para finscompletamente diferentes, fazendo-o voltar ao povo, que tem o direi-to de retomar a liberdade originária e, pela instituição de novo legisla-tivo, conforme achar conveniente, prover à própria segurança e garan-tia, o que constitui o objetivo da sociedade.”

LOCKE, John. “Segundo tratado sobre o governo”. Os Pensadores. Tradução de E. Jacy Monteiro. 3. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1983. p. 121.

Analise as afirmativas abaixo:I. a presença da propriedade originou a organização da socie-

dade;II. o Poder Legislativo pode tirar e destruir a propriedade;

III. o Legislativo perde o poder quando transgride as regras da so-ciedade;

IV. o Poder Legislativo cria leis e regras para proteger as proprie-dades;

V. o Poder Legislativo tem poder absoluto sobre a vida, liberdadee propriedade.

Estão CORRETAS as afirmativas:a) I, II e V.b) II, IV e V.c) I, III e IV.d) II, III e IV.e) I, II, III e IV.

Tarefa Complementar

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Atividade 7PARTIDOS POLÍTICOS E DEMOCRACIA

INTRODUÇÃOEscolher seus líderes foi a primeira prática política dos ho-

mens. Das mais simples votações realizadas nas tribos aos sis-temas eleitorais de hoje, percorreu-se um longo caminho, cujoresultado é um quadro bastante complexo, do qual participampartidos políticos, ideologias, classes antagônicas e diferentessistemas eleitorais.

PARTIDOS POLÍTICOSOs partidos políticos nasceram da necessidade sentida

por alguns grupos de se organizar para vencer eleições. Nas so-ciedades de classes, não tardou a surgirem partidos identifica-dos com ideologias dominantes ou em oposição a elas. Mas oque é exatamente um partido político?

No século XVIII, o pensador e estadista irlandês EdmundBurke propôs uma das primeiras definições de partido político:

Naquela época, a ideia ainda embrionária de partido geravaassociações ou confrarias, voltadas à atuação política, massem as estruturas, os regimentos e as ideologias dos partidos dehoje. Max Weber também elaborou uma importante definição departido:

associação (…) que visa a um fim deliberado, seja ele “objetivo”,como a realização de um plano com intuitos materiais ou ideais,seja “pessoal”, isto é, destinado a obter benefícios, poder e, con-sequentemente, glória para os chefes e sequazes, ou então vol-tado para todos esses objetivos conjuntamente.

grupo de homens unidos para a promoção, por meio de seuesforço conjunto, do interesse nacional, com base em algumprincípio determinado com o qual todos concordam.

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O que diferencia aquelas organizações pré-partidárias (comoas corporações de ofício, os sindicatos e as sociedades secretas) dospartidos, nas definições de Burke e Weber, são o “interesse nacio-nal” e o “poder”. O desenvolvimento das estruturas políticas do Es-tado e das organizações da sociedade civil no século XVIII deu-seno mesmo momento em que se reconhecia ao povo o direito departicipação. Não é coincidência, portanto, os partidos terem apa-recido primeiro nos países que adotaram governos representativos(ou seja, escolhidos por aqueles que deveriam representar os elei-tores, a população). Grandes transformações socioeconômicas aba-lavam a ordem tradicional e ameaçavam as relações de poder.Emergiam grupos que lutavam pela ampliação dos espaços departicipação nas esferas dirigentes ou propunham a reestruturaçãosociopolítica da sociedade.

No século XIX, os partidos políticos começaram a tomar a for-ma que conhecemos hoje. A participação na vida partidária sempredependeu da conjuntura histórica e do grupo social que é a base dopartido. As pessoas podem se inscrever no partido e contribuir fi-nanceiramente com ele, frequentar suas reuniões e atividades, mo-bilizar grupos sociais ou categorias profissionais, participar dascampanhas eleitorais, etc. Mas podem também, simplesmente,acompanhar de fora sua atuação e votar. Quanto mais intensa aparticipação nas bases e instâncias partidárias, maior o grau dequestionamento às decisões dos dirigentes. E quanto menos inten-sa a participação, maior a tendência de a organização cair em mãosde líderes elitistas. Este fenômeno é muito comum nos partidoscontemporâneos mais elitistas. Já os partidos de massa (e, particu-larmente, os partidos de esquerda) costumam conviver com maio-res questionamentos por parte de seus militantes.

ELEIÇÕESAlém dos partidos, compõem o quadro político os sistemas

eleitorais, que legitimam as escolhas do povo, permitindo que osvotos dos eleitores sejam transformados em mandatos, tanto paraas chefias do Poder Executivo como para as cadeiras do PoderLegislativo, de acordo com a legislação eleitoral que rege a votação.A lei determina se o voto é obrigatório ou optativo, quais os cri-térios para as candidaturas e as regras de propaganda eleitoral,além de regulamentar ou não a divulgação de pesquisas e os gas-tos de campanhas.

O sistema de maioria simples, cuja origem remonta à Câ-mara dos Comuns no Parlamento medieval do Reino Unido, é bas-tante difundido, em razão justamente de sua simplicidade. Foi ado-tado em países como EUA, Canadá, Índia, Paquistão, entre outros.Para as eleições ao Parlamento, por exemplo, o território é dividi-do em distritos (ou circunscrições eleitorais) e os partidos políti-cos apresentam apenas um candidato por distrito. O candidatomais votado é eleito.

Visando a corrigir distorções, surgiram ideias como as eleiçõesem dois turnos. No sistema em dois turnos para deputados par-lamentares, adotado na França, por exemplo, se nenhum dos can-didatos obtiver 50% dos votos, os dois mais votados concorremnum segundo turno.

Nas eleições para o Executivo (Presidência da República, go-vernos estaduais e municipais), têm sido utilizados os sistemasmajoritários, em dois turnos ou por maioria simples. As pressões

por maior representatividade têm levado cada vez mais países deregimes democráticos a adotarem o sistema de dois turnos, sobre-tudo para a Presidência do Executivo Nacional.

Nas eleições para o Legislativo no Brasil (em que se escolhemdeputados federais, estaduais e vereadores municipais), frequen-temente se ouvem críticas ao fato de candidatos de partidos maisfortes não serem eleitos apesar de receberem número relativa-mente elevado de votos, enquanto outros, pertencentes a partidosmenores, vencem com votação menos expressiva. Isso acontecequando o sistema eleitoral é proporcional, porque ele busca ga-rantir a correspondência entre os votos dados, as cadeiras recebi-das e a representação das minorias.

No Brasil, as eleições para deputados e vereadores ocorremda seguinte maneira: somam-se os votos válidos; depois, divide-seesse total pelo número de cadeiras disponíveis no Parlamento;obtém-se, assim, uma quota mínima de votos por cadeira, chama-da de coeficiente eleitoral, que os partidos devem atingir paraassumir uma cadeira (cada quota corresponde a uma cadeira). Opartido que tiver, portanto, uma votação abaixo da quota mínimaestá excluído da representação. Finalmente, é só dividir os votosde cada partido pela quota e distribuir as cadeiras proporcional-mente.

Independente do sistema escolhido, pelo menos cinco ques-tões sempre estão presentes nas discussões sobre os sistemaseleitorais, quando o problema é a representatividade (ou seja, atéque ponto as vontades da maioria, das minorias e de cada cidadãopodem se fazer representar no poder político):1) a igualdade eleitoral dos cidadãos;2) o grau de representatividade;3) a capacidade de eleger governos majoritários;4) a relação entre representados e representantes;5) o grau de escolha permitido aos eleitores.

A DEMOCRACIAQuem nunca ouviu dizer que a democracia é “o governo

do povo, pelo povo e para o povo”? Talvez essa concepção sedeva à etimologia da palavra, que veio do grego dem(o)- (povo)+ -cracia (poder).

No entanto uma análise mais cuidadosa da realidade políti-ca mostra que os conceitos de democracia são mais complexosdo que parecem à primeira vista. Isso vale também para a suaantítese, a ditadura, que comporta várias definições.

A teoria contemporânea sobre a democracia fundamenta-se em três tradições do pensamento político: a chamada teoriaclássica aristotélica, a teoria romano-medieval e a teoriamoderna, pensada a partir de Maquiavel.

Aristóteles identifica três formas de governo: 1) a democra-cia, como governo do povo, de todos os cidadãos membros dapólis (cidade); 2) a monarquia, que é o governo de um só; 3) aaristocracia, o governo feito por poucos ou pelos “melhores”. Emseguida, ele mostra que cada uma dessas formas de governo apre-senta formas puras, em que o detentor do poder governa tendocomo objetivo o interesse geral da sociedade, e formas corrup-tas, nas quais o governante administra apenas visando ao interessepróprio.

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A teoria romano-medieval — que pode ser considerada a raizdo pensamento democrático — baseava-se na ideia de soberaniapopular: o poder supremo deriva do povo e se torna representati-vo, ou deriva do príncipe e é delegado aos inferiores. Cabe ao povoo direito de legislar, diretamente ou por representantes, e conferiro poder de governar ao príncipe.

Na teoria moderna, iniciada por Maquiavel, temos a con-cepção segundo a qual as formas históricas de governo sãoduas: a monarquia e a república. A democracia, assim comoa aristocracia, seria uma forma de república. Mas foi no séculoXIX, após o turbilhão ideológico do Iluminismo e da RevoluçãoFrancesa, que a polêmica tomou corpo e a democracia foi criti-cada por parte dos adeptos tanto do liberalismo quanto do so-cialismo em ascensão.

Do lado liberal, uma contribuição crítica relevante veio naconcepção do Estado elaborada pelo político francês BenjaminConstant, que afirma que os modernos cidadãos devem desen-volver a liberdade individual em relação ao Estado. Para ele, agarantia dos direitos civis e da liberdade política (ou seja, a li-berdade de pensamento, de reunião, de imprensa, de religião,de ir e vir) seria a única forma compatível de democracia como Estado liberal.

Segundo essa perspectiva, a democracia representativaou parlamentar é apresentada como modelo ideal de governo.Nela, o dever de fazer leis é de um corpo de representanteseleitos pelos cidadãos, e não do povo todo reunido em assem-bleia — o que seria impossível nas estruturas sociais modernas.

O desenvolvimento da democracia nos regimes representa-tivos segue em duas direções:a) o alargamento gradual do voto: inicialmente restrito a uns

poucos, de acordo com critérios como renda, cultura e sexo,estende-se a todos sem distinções de qualquer espécie (su-frágio universal);

b) a multiplicação dos órgãos representativos: de uma câmara le-gislativa única surgem duas nacionais (das quais são exemplos oSenado e a Câmara dos Deputados); depois, criam-se órgãos lo-cais (como as assembleias estaduais e as câmaras municipais),até se chegar, na passagem da monarquia à república, à eleiçãodo chefe de Estado.

Na teoria política contemporânea, define-se democracia comoum regime político que apresenta, necessariamente, as seguin-tes características:1) o Parlamento ou Congresso, órgão legislativo máximo da na-

ção, deve ser eleito, direta ou indiretamente, pelo povo;2) outras instituições, como os governos locais e a chefia do

Estado (no caso das repúblicas), também devem ser condu-zidas por dirigentes eleitos;

3) todos os cidadãos maiores de idade, sem distinção de raça,sexo, religião ou renda, devem ser eleitores;

4) todos os eleitores devem ter voto igual (de mesmo valor);5) todos os eleitores devem votar livremente, tendo acesso ao

debate entre partidos, para que possam formar sua opinião;6) o voto deve ser livre e o eleitor deve ter condições de escolher

entre reais alternativas, ou seja, não é democrática qualquereleição de lista única ou bloqueada;

7) tanto para as eleições dos representantes legislativos comodos órgãos de poder executivo, vale o princípio da maiorianumérica, aceitos os vários critérios estabelecidos pelos sis-temas eleitorais, com possibilidade de serem mudados;

8) nenhuma decisão tomada pela maioria deve limitar os direi-tos da minoria.

Os teóricos fazem ainda uma distinção entre democraciaformal e democracia substancial. Simplificadamente, diz-seque a democracia formal é um governo “do povo”, enquanto ademocracia substancial é “para o povo”. Na democracia formal,apesar de o povo poder votar, é uma minoria que, detendo opoder econômico, tem influência real no poder político e, comisso, é favorecida; por outro lado, mesmo uma ditadura políti-ca (como em períodos revolucionários nos quais a democraciaformal é impossível) pode favorecer o interesse da maioria doscidadãos.

A DITADURAComo já dissemos, a antítese da democracia é a ditadura.

Esse conceito aparentemente simples adquire, à luz da CiênciaPolítica, contornos complexos. Na verdade, há ditaduras e di-taduras. No Brasil, por exemplo, o Estado Novo de Vargas(1937-1945) e o regime militar (1964-1985) foram ambosautoritários e, não obstante, profundamente diferentes. É co-mum as pessoas colocarem no mesmo plano os Estados totali-tários da Alemanha de Hitler e da União Soviética de Stálin. Arealidade, novamente, contraria essa visão.

O termo “ditadura” tem origem na dictatura da RepúblicaRomana (509 a.C.-27 a.C.). Também chamada ditadura cons-titucional, era uma medida extraordinária, para situações deemergência, como guerras externas ou rebeliões internas. O dita-dor era nomeado pelos cônsules (magistrados supremos) após suaaprovação pelo Senado. Tinha amplos poderes: possuía totalautoridade no comando militar, seus decretos tinham valor de lei,suas sentenças penais eram inapeláveis e ele não se submetia aostribunos. Em contrapartida, não podia revogar ou mudar a Cons-tituição, nem declarar guerra, criar novos impostos ou nova juris-dição civil. Além disso, uma dictatura não podia passar de seismeses. Essa medida inspirou, na atualidade, a criação de dispositi-vos como a lei marcial, o estado de emergência e o estado de sítio,períodos previstos na Constituição em que direitos de cidadaniasão momentaneamente suspensos em face de uma crise enfrenta-da pelo Estado.

A Convenção Francesa de 1793, por sua vez, fundou a dita-dura revolucionária, na qual o poder, que não era autorizadopela Constituição nem por ela limitado, impunha-se pelas armas,não para superar uma crise parcial, mas para formar um novoregime. Nesse caso, o poder não se concentrava em um só ho-mem, mas era exercido por um grupo (a convenção — assembleiaou partido).

Há diferenças, portanto, no emprego do termo “ditadura”: aditadura romana tem conotação positiva, de defesa da ordem constituída diante de grave ameaça; a ditadura revolucionária podeser vista tanto como positiva, pois instaura um governo provisórioque prepararia o caminho de uma sociedade mais justa, quanto

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como negativa, pois não conhece limites nem controles quaisquer;já a ditadura contemporânea (as formas assumidas contempo-raneamente) tem uma imagem negativa, de regime antidemo-crático.

A questão é que existiram ou existem outros regimes anti-democráticos que não são designados como ditaduras. São oscasos da tirania na Antiga Grécia, do absolutismo na Europa, dosdespotismos no Oriente e das autocracias em geral (regimes auto-ritários e de poder ilimitado).

Basicamente são três as características presentes numa dita-dura, como a vemos hoje:1) a concentração do poder e seu caráter ilimitado;2) a entrada de amplos estratos populares na política;3) a precariedade das regras de sucessão ao poder.

Exercício(UEL-adaptada) “Uma esfera pública não-estatal, conformerezam todas as inspirações teóricas que mostram o trânsitotenso para uma democracia real em um mundo globalizado,tem todo o direito a se produzir como espaço público ativodesde que suas práticas e presença tenham uma interlocuçãocom o contexto político da sociedade e do Estado, o que impli-ca em que sejam também espaço inovador de circulação deideias e de experiências de participação democrática. As insti-tuições voltadas à filantropia empresarial falham precisamenteneste aspecto: externamente, evitam incorporar-se ao debatesobre as decisões governamentais, e sua presença diante doEstado aparece apenas pelo lado tradicionalíssimo de pressãopor seus interesses econômicos e financeiros, não escondidosem sua demanda de ser intermediárias de recursos públicos.Internamente, diante de sua clientela específica, o modo defuncionamento de sua ação social também reproduz algomuito tradicional: transforma cidadãos designados como su-jeitos de direitos em receptores de favores e generosidade, e,desse ângulo, a diferença com o velho modo de se fazer cari-dade repousa na excelência dos programas adotados e nocompromisso de quem os cria.”

PAOLI, M. C. Empresas e responsabilidade social:os enredamentos da cidadania no Brasil.

In: SOUZA SANTOS, B. [Orgs.]. Democratizar a democracia.Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. p. 413.

Com base no texto e nos conhecimentos sobre cidadania eprogramas sociais das empresas, é correto afirmar:a) Os programas sociais das empresas constituem-se em

espaço público ativo, pois, por meio de programas filan-trópicos, usurpam os papéis do Estado.

b) As empresas se engajam em programas de responsabi-lidade social visando a consolidar uma justa distribuiçãode renda no país.

c) Os programas sociais desenvolvidos pelas empresas sãoconstruídos democraticamente, pois são elaborados noprocesso de interlocução com a sociedade e com o Es-tado.

d) Ao mesmo tempo em que buscam garantir acesso às be-nesses do Estado, as empresas distanciam-se, em seus pro-gramas sociais, da construção de uma cidadania fundadana participação democrática.

e) O desenvolvimento de programas sociais pelas empresas,especialmente na década de 1990, expressou a generosi-dade como característica inerente ao povo brasileiro.

• Resolva os exercícios a seguir.

1. Seguindo o exemplo de recente enquete, realizada em Portugal, queapontou o ditador Oliveira Salazar como melhor representante dopovo português, o jornal Folha de S.Paulo divulgou, em 1º- de abril de2007, sua enquete em que 200 personalidades apontaram GetúlioVargas como “o” brasileiro. Em 2º- lugar destacou-se o ex-presidenteJuscelino Kubitschek, em 3º- lugar o escritor Machado de Assis, se-guido de Rui Barbosa, Tiradentes, Santos Dumont, José Bonifácio,Tom Jobim, D. Pedro II, Oscar Niemeyer e outros. Curiosidade à par-te, escolhas como essas ocorridas em Portugal e no Brasil podemser interpretadas como:a) Resultado sobretudo da divulgação pela mídia dos trabalhos de

políticos e obras artísticas.b) Eficiência do ensino escolar brasileiro no enfoque da cultura na-

cional.c) Preferências populares por personalidades representativas das

elites dominantes.d) Identificação de setores expressivos da sociedade com políti-

cas autoritárias ou trabalhistas de caráter populista.e) Protestos velados da massa popular contra lideranças partidá-

rias conservadoras.

2. (UEL) Ato contra o custo de vida na Praça da Sé em São Paulo, que-bra-quebras de trens de passageiros nos grandes centros urbanos,criação dos Conselhos de Condição Feminina, organização de lutaspor creche, acampamento de trabalhadores sem-terra em frenteao Palácio do Governo na capital gaúcha, ressurgimento das SABs(Sociedades Amigos de Bairro) nas periferias das metrópoles, fó-runs e congressos de estudantes. Esses acontecimentos altera-ram a rotina das cidades brasileiras entre a segunda metade dos anos1970 e a primeira metade dos anos 1980. Esses eventos ocorridosconcomitantemente sinalizam o surgimento de um fenômeno quemarcou a história recente do país. Qual é esse fenômeno?a) Restrição do quadro partidário brasileiro a partir do enfraqueci-

mento da ditadura militar instalada em 1964.b) Surgimento de novos movimentos sociais caracterizados pela

autonomia política em relação ao Estado, aos partidos e aos sin-dicatos.

c) Mobilização da sociedade civil em defesa da família, da proprie-dade privada e da ordem moral.

d) Resistência organizada dos setores populares às reformas e ajus-tes estruturais neoliberais, implantados pelos governos militares.

e) Aparecimento de um sindicalismo subordinado ao Estado e aospatrões.

• Resolva os exercícios a seguir.

Tarefa Complementar

Tarefa Mínima

ORIENTAÇÃO DE ESTUDO

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1. (PUC-RJ) As alternativas abaixo relacionam características impor-tantes dos populismos surgidos na América Latina ao longo da pri-meira metade do século XX, com EXCEÇÃO de uma:a) O Estado populista era via de regra centralizador, com poderes

ampliados o suficiente para interferir no crescimento econômi-co, na provisão de serviços sociais para os necessitados e nagarantia de patronagem para seus seguidores.

b) A expansão e mobilização de setores médios urbanos foramacompanhadas, no período, de demandas por reformas eleitoraise por novos partidos políticos, resultando em críticas violentasaos privilégios das antigas elites políticas.

c) Os golpes que se seguiram às crises oligárquicas, nos anos 30,envolveram diretamente os militares, tornando-os, invariavelmen-te, os interlocutores de maior peso no jogo da política populista,os responsáveis diretos pela mobilização política das massas.

d) O colapso das dominações oligárquicas e a disputa entre osimperialismos europeu e norte-americano abriram novas possibi-lidades à reorganização do aparelho estatal no continente latino-americano, propiciando o surgimento dos governos populistas.

e) Impregnados de ideias nacionalistas e inspirados parcialmente nocorporativismo, os governos populistas contribuíram para valorizara imagem do líder carismático no controle de um Estado “forte”.

2. (UEL) O escritor Frei Betto assim se refere ao movimento feminista:

O movimento feminista organizado surgiu nos EUA, nasegunda metade dos anos 60. Logo, expandiu-se pelos paísesdo Ocidente, propugnando a libertação da mulher, e não ape-nas emancipação. Qual a diferença? Emancipar-se é equipa-rar-se ao homem em direitos jurídicos, políticos e econômi-cos. Corresponde à busca de igualdade. Libertar-se é querer irmais adiante, marcar a diferença, realçar as condições que re-gem a alteridade nas relações de gênero, de modo a afirmara mulher como indivíduo autônomo, independente, dotadode plenitude humana e tão sujeito frente ao homem quantoo homem frente à mulher.

FREI BETTO. “Marcas de baton”. Caros Amigos, ano V,n. 54, set. 2001, p. 16.

Na visão do autor, a ideia de libertação da mulher difere da ideia deemancipação e pressupõe uma concepção de política entendida comoa) domínio e violência. d) convivência entre diferentes.b) luta entre os gêneros. e) afirmação da desigualdade.c) exercício de hierarquia.

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INTRODUÇÃOEvolução, ao pé da letra, significa mudança. Dessa forma,

pode-se dizer que a humanidade está sempre evoluindo, pois estásempre mudando. Acontece que, de tempos em tempos, mu-danças bruscas e profundas fazem as sociedades mudarem dras-ticamente de rumo: são as revoluções. Para uns, como os posi-tivistas e os adeptos da atual socialdemocracia, o tempo das revo-luções violentas já passou. As transformações inevitáveis na vidasocial continuarão, mas de forma “civilizada”, e será possível àhumanidade superar seus grandes problemas de forma pacífica egradativa. Já outros, como os marxistas, insistem em ver o ca-minho das rupturas drásticas como o único a percorrer, até queos homens “saiam de sua pré-história”, deixando de explorar unsaos outros. Muito já falamos sobre o marxismo; agora, vamoscompreender melhor o que é positivismo.

O POSITIVISMOEm fins do século XIX, muitos cobravam da recém-nascida

Sociologia resultados práticos de suas reflexões sobre os proble-mas da sociedade. A essa altura, sobretudo na França, intensifi-cavam-se as crises econômicas e as lutas de classes. A contestaçãoao capitalismo estava na ordem do dia, e a burguesia enfrentavaa “anarquia política”. Nesse contexto, a crença de que uma novaciência poderia introduzir uma “higiene” na sociedade e, por meiodela, reorganizá-la gerou uma Sociologia com interesses práticos.

Para Auguste Comte, em particular, a Sociologia deveriaorientar-se no sentido de conhecer e estabelecer as leis imutáveisda vida social, sem qualquer consideração crítica ou discussão sobrea realidade existente, deixando de lado, por exemplo, questõescomo igualdade, justiça, liberdade e outras.

Comte não assumiu a faceta progressista de seu mestre,Saint-Simon. Mais conservador, via a Europa mergulhada no caossocial e rejeitava as ideias religiosas como adequadas para orien-tar a conduta dos homens e a reorganização da sociedade. Mastambém atacou ferozmente as ideias dos iluministas, a quem cha-mava de “doutores em guilhotina”, com seus princípios radicaisque Comte considerava o “veneno da desintegração social”. Assim,o positivismo vinha substituir as concepções teológica e metafísi-ca, que ele via como superadas pela História. Para atingir a coesãoe o equilíbrio na sociedade, seria necessário restabelecer a ordemnas ideias e conhecimentos, criando uma crença comum a todosos homens. Desse modo, a Filosofia estava reduzida a mera disci-plina auxiliar das ciências, com a função de refletir sobre os méto-dos e os resultados alcançados por elas. Seria uma espécie de lógi-ca da ciência acima do materialismo e do idealismo.

Assim a verdadeira filosofia deveria proceder de forma “posi-tiva” diante da realidade — o contrário da filosofia do século XVIII,que para Comte era “negativa”, pois apenas contestava as institui-ções que ameaçavam a liberdade dos homens. O espírito positivode sua filosofia não tinha caráter destrutivo, e sim a preocupaçãode organizar a sociedade. O advento da Sociologia e do positivismorepresentava, para ele, o coroamento da evolução do conhecimen-to científico. Depois da Matemática, da Astronomia, da Física, daQuímica e da Biologia, faltava fundar a “física social”, caracteriza-da por subordinar a imaginação e a argumentação à observação.

O positivismo pretendia também a reconciliação da “ordem”com o “progresso”. Para Comte, enquanto os conservadores pos-tulam a ordem, em detrimento do progresso, e os revolucionáriosvalorizam o progresso, mas desprezam a ordem, os positivistas osreconciliariam. A ordem é o ponto de partida para a construção danova sociedade.

Atividade 8EVOLUÇÃO E REVOLUÇÃO

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O sociólogo Émile Durkheim foi influenciado pelo pensamen-to positivista e também esteve constantemente preocupado com aordem social. Discordava das teses socialistas de sua época, e suasideias eram uma tentativa de resposta a elas. Criticava principal-mente a formulação das origens econômicas das crises, preferindovê-las como resultado da fragilidade da moral que orientava osindivíduos.

SOCIEDADE E REVOLUÇÃOO termo “revolução” tem largo uso nas ciências sociais e no

senso comum. Falamos da Revolução Neolítica na Pré-História,da Revolução Industrial, da Revolução Francesa, da RevoluçãoRussa, da revolução sexual e da revolução tecnológica de nossotempo. Mas o que este termo significa exatamente?

No plano social e, sobretudo, político, pode-se definir revo-lução como a tentativa de derrubar as autoridades políticas exis-tentes por meios violentos e de as substituir, a fim de efetuarprofundas mudanças nas relações políticas, no ordenamentojurídico-constitucional e na esfera socioeconômica.

Muitas vezes, rebeliões ou revoltas são chamadas de revo-lução, mas elas são isentas de motivações ideológicas e não visamà subversão total da ordem constituída. Visam à satisfação imedia-ta de reivindicações políticas e econômicas, sem romper os limi-tes da estrutura socioeconômica. Exemplos disso são os golpes deEstado, que normalmente se constituem apenas na tentativa desubstituição das autoridades políticas dentro do quadro institu-cional, sem mudar quase nada dos mecanismos políticos e socioe-conômicos. A revolta costuma ser um levante popular e o golpede Estado é um motim levado a efeito por um pequeno grupo per-tencente às elites. Claro que uma revolução pode começar por umgolpe de Estado, como foi o caso da Revolução Bolchevique de1917, mas empregaremos o termo revolução para designar umfenômeno mais amplo que rebeliões armadas e golpes de Estadocom objetivos imediatos.

Mesmo assim, ainda existe muita polêmica entre os autoressobre a classificação das revoluções.

Alguns consideram apenas as grandes revoluções e enfatizamas mudanças que elas provocaram nas estruturas socioeconômicase políticas da sociedade. Nesta lista estariam certamente a re-volução americana de 1776, a francesa de 1789, a russa de 1917e a chinesa de 1949 e, talvez, a mexicana, a cubana e a argelina.

Há outra escola de autores que considera apenas a maneirapela qual a mudança foi efetuada, não interessando a naturezadessa mudança, nem tampouco sua extensão. Para estes, uma re-volução é, por definição, mudança violenta e ilegal.

Outros teóricos consideram a alteração de valores sociais eculturais a característica decisiva e talvez a mais importante de umarevolução. Uma grande revolução seria aquela em que a recons-tituição do Estado promoveria a substituição de um universo cul-tural por outro. Seria a mudança interna rápida, fundamental eviolenta dos valores dominantes que sedimentam uma sociedade.

Quando se fala em mudanças sociais, deve-se discutir um as-pecto de suma importância: a questão da legalidade e da legi-timidade. A legalidade refere-se a mudanças feitas dentro dasregras constitucionais ou tradicionais. Já a legitimidade é um con-ceito aberto, que abrange a legalidade. Nem tudo que é legal élegítimo; e há o que é legítimo, mas ilegal. Um instrumento legalcomo o Ato Institucional nº- 5, de 1968, não era legítimo aos olhos

de amplos setores da sociedade brasileira. Por outro lado, o divór-cio foi durante gerações aceito pela sociedade (legítimo) e, noentanto, não era legal no Brasil até 1977.

A REVOLUÇÃO SOCIALISTAÉ socialista a revolução que pretende promover radicais trans-

formações na sociedade, visando à substituição do capitalismopelo socialismo. Este processo substituiria as relações de produçãobaseadas no domínio e na subjugação de classe (e na propriedadeprivada) por relações de colaboração e ajuda mútua, com o obje-tivo de liquidar todo tipo de exploração do homem pelo homem.A revolução socialista tem um caráter criador, por procurar reno-var as condições para o desenvolvimento das forças produtivas epara a construção da nova sociedade. Mas não existem fórmulasgerais de funcionamento do novo modo de produção. No marxis-mo, está sistematizada apenas sua primeira etapa: a transição aocomunismo como ditadura do proletariado.

A Nova Política Econômica (NEP), proposta por Lênin, e aevolução da União Soviética e da China levantaram outras teses.As principais tratam:1) da possibilidade e da necessidade de a revolução ocorrer em

um só país ou em várias nações, dada a coexistência de paísescom sistemas socioeconômicos e políticos diferentes;

2) da hegemonia do proletariado e da transformação da revolu-ção democrático-burguesa em socialista;

3) dos vínculos entre as lutas dos operários dos países maisdesenvolvidos e os movimentos de libertação nacional dospaíses coloniais;

4) da combinação dos fatores objetivos e subjetivos envolvi-dos na situação revolucionária;

5) da diversidade de formas da revolução socialista.

Assim, os princípios da revolução socialista são delineados:• pelo estabelecimento da ditadura do proletariado;• pela aliança entre a classe operária e o campesinato (os tra-

balhadores do campo);• pela liquidação da propriedade capitalista;• pela transformação socialista da agricultura;• pelo desenvolvimento planificado da economia nacional;• pela revolução cultural;• pela defesa do internacionalismo proletário (ou seja, a supe-

ração dos limites e preconceitos nacionalistas e o entendi-mento da classe trabalhadora como universal).

Essa revolução pode ser pacífica ou violenta, dependendodo grau de resistência da burguesia dominante ao movimentopopular.

Para o marxismo, a Revolução é a locomotiva da História. Masela não ocorre sem as condições objetivas, ou seja, sem o estopimda Revolução, que são as contradições entre as forças produtivas eas relações sociais, de um lado, e a organização do poder político,de outro. Em termos práticos, essa oportunidade se daria quandoo desenvolvimento de novas formas e meios de produção entras-sem em confronto com as superestruturas (a mentalidade, as insti-tuições) políticas, as quais se tornariam obstáculos às mudanças.

O mundo depara hoje com um amontoado de incerteza quan-to ao futuro. O desenvolvimento econômico capitalista usa tec-nologias avançadas de produção (como a automação e informati-

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zação) que levam à exclusão crescente de trabalhadores do mer-cado de trabalho. As economias socialistas, por sua vez, se mos-traram incapazes de resolver problemas do homem enquanto con-sumidor e produtor. Acirram-se as diferenças entre países ricos esubdesenvolvidos, assim como as contradições entre o homem eo meio ambiente. Depressão econômica, diminuição da legitimi-dade e crise de representatividade são bons combustíveis para arevolução. Enquanto isso, a alternativa que se apresenta são re-formas. A questão é: os espaços para reformas ainda são amplosno capitalismo ou seu alcance estaria se esgotando? Para alguns,as reformas podem ser como cavalos de Troia da revolução nointerior do capitalismo.

Apenas um século separou a convocação dos Estados Gerais(na França da violenta repressão) à Comuna de Paris. Ou seja, aburguesia começou a viver bem cedo um grande dilema: como seruma classe economicamente revolucionária e politicamente rea-cionária? Veja-se: em menos de um século, o homem começou avoar e pôde chegar à Lua; esse extraordinário avanço se deveu aodinamismo capitalista — o mesmo capitalismo, porém, que não écapaz de superar a miséria de milhões de seres humanos e quecombate os que se levantam contra a exploração do homem pelohomem.

As situações revolucionárias não se criam ao sabor da von-tade, ou, como disse Lênin, “não se produzem por encomenda”.Seguindo essa análise, enquanto a guerra civil é latente, a trans-formação revolucionária se equaciona por dentro da ordem,como um processo de alargamento da sociedade burguesa; quan-do a guerra civil se torna aberta, a transformação se dá contra aordem, envolvendo a conquista do poder e a desagregação dasociedade burguesa.

O sociólogo Florestan Fernandes assim resumiu a questão: sea revolução socialista desemboca no comunismo, então este seriaum subproduto do período de transição e a negação do socialis-mo? Não. A revolução proletária não se esgotaria na substituiçãode uma classe dominante por outra, como aconteceu nas revolu-ções burguesas. Para os marxistas, o proletariado tem a incum-bência histórica de ser ainda mais revolucionário depois da con-quista do poder. A burguesia não levou sua revolução até o fimporque, para concretizar os ideais de liberdade, igualdade e frater-nidade, teria que negar a si própria como classe dominante. Oproletariado poderia negar a si próprio e eliminar a exploração declasse. “Então a humanidade poderá contar com uma civilizaçãona qual ‘as evoluções sociais’ deixarão de ser ‘revoluções polí-ticas’”, como frisou a célebre frase de Karl Marx.

Exercício(UNIMEP-adaptado) “Uma vez desaparecidos os antagonis-mos de classes no curso do desenvolvimento e sendo concen-trada toda a produção propriamente falando nas mãos dosindivíduos associados, o poder público perderá seu caráterpolítico. O poder político é poder organizado de uma classepara a opressão de outra. Se o proletariado, em sua luta con-tra a burguesia, se constitui forçosamente em classe; se seconverte por uma revolução em classe dominante, e destróiviolentamente as antigas relações de produção, destrói junta-mente com essas relações de produção as condições dos anta-

gonismos entre as classes e as classes em geral e, com isso,sua própria dominação como classe. Em lugar da antiga so-ciedade burguesa, com suas classes e antagonismo de classes,surge uma associação onde o livre desenvolvimento de cadaum é a condição do livre desenvolvimento de todos.”

MARX, Karl & ENGELS, Friedrich. Manifesto do Partido Comunista.São Paulo: Ched Editorial, 1980, p. 38.

O texto de Marx e Engels afirma que uma sociedade fundadana livre associação dos indivíduos, sem exploração e, portan-to, sem antagonismos de classes, significaria o fim do caráterpolítico do poder público, uma vez que o político estaria, his-toricamente, a serviço da dominação.

A esse tipo de sociedade, Marx e Engels denominarama) capitalismo transnacional.b) comunismo.c) socialismo.d) socialismo utópico.e) socialismo científico.

• Resolva os exercícios a seguir.

1. (UEL) Leia a seguir uma declaração sobre as atuais consequênciasdo processo de globalização, feita pelo Exército Zapatista deLibertação Nacional (EZLN), movimento revolucionário que surgiuem 1994 na região de Chiapas, no México.

O mundo do dinheiro, o mundo deles, governa a partirdas bolsas de valores. A especulação é hoje a principal fontede enriquecimento. [...] Já não é necessário o trabalho paraproduzir riqueza, agora só se precisa de especulação. [...] Aglobalização dos mercados significa eliminar fronteiras para aespeculação e o crime, e multiplicá-las para os seres humanos.Os países são obrigados a eliminar suas fronteiras com o exte-rior para facilitar a circulação do dinheiro, porém se multi-plicam as fronteiras internas. [...] O neoliberalismo não trans-forma os países em um só, transforma os países em muitospaíses. [...] Quanto mais o neoliberalismo avança como sistemamundial, mais crescem o armamento e o número de efetivosdos exércitos e polícias nacionais. Também aumenta o númerode presos, desaparecidos e assassinados nos diversos países.

Comando Geral do EZLN. Segunda declaración de la realidad.In: DI FELICE, Massimo; MUÑOZ, Cristobal [Orgs.].

A revolução invencível. São Paulo: Boitempo, 1998. p. 178-179.

Com base no texto e nos conhecimentos sobre o tema, é corretoafirmar que o EZLN:a) Incentiva o neoliberalismo porque este assegura que um país se

transforme interna e vantajosamente em muitos outros países.b) Apoia a globalização porque ela faz com que os países eliminem

suas fronteiras territoriais.c) Entende que a eliminação de fronteiras que limitam a circulação

monetária favorece a equânime distribuição das riquezas.d) Defende uma resistência ao processo de globalização, o qual faz

proliferar dentro dos países as fronteiras internas de classes,etnias, culturas, etc.

e) Entende que o modelo socioeconômico neoliberal é gerador depaz social e consolidador de direitos civis.

Tarefa Mínima

ORIENTAÇÃO DE ESTUDO

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2. (UEL-adaptada) É comum ouvir avaliações sobre a década 1990-1999da economia brasileira como tendo sido regida pelas ideias neolibe-rais. Nessas análises, o neoliberalismo é entendido como uma teoriaeconômica baseada na crença de que o crescimento e a moderniza-ção da economia derivam de uma redução da intervenção do Estadona vida social e da garantia do livre funcionamento do mercado.

Sobre a aplicação, na prática, do modelo neoliberal no Brasil dos anos1990, é correto afirmar que houve:a) fortalecimento do processo de estatização dos serviços sociais e

enfraquecimento do terceiro setor, sobretudo das ONGs (Organi-zação Não Governamentais).

b) adoção do nacionalismo econômico em favor da indústria do paíse do comércio interno.

c) êxito na implementação de políticas estatais de garantia do plenoemprego.

d) adoção de medidas estatais de estímulo à sindicalização dos tra-balhadores.

e) abertura da economia brasileira para o mercado internacional e pri-vatização de empresas estatais.

• Resolva os exercícios a seguir.

1. (UEL-adaptada) Diversos movimentos sociais emergiram nos anos1990, no Brasil e na América Latina (Movimento dos Sem-Terra, Za-patistas, Piqueteros, entre outros). Apesar de suas diferenças políti-cas, sociais e ideológicas, esses movimentos combatem o caráterconcentrador de riqueza praticado por governos que se apoiam empolíticas econômicas de estabilização monetária apresentadas, comoanti-inflacionárias, e que dão primazia ao pagamento da dívida exter-na por meio do superávit primário. Tais políticas econômicas são tam-bém denominadas:a) Nacional-desenvolvimentistas, por priorizarem o desenvolvimento

da indústria de capital nacional em detrimento dos investimentosestrangeiros.

b) De bem-estar social, por priorizarem o estabelecimento de umgrande pacto social entre as classes e os grupos sociais nacio-nais, como forma de gerir responsavelmente o fundo público.

c) Neoliberais, pois, em nome do desenvolvimento do país, priori-zam os interesses econômicos e políticos de frações sociais liga-das ao capital financeiro nacional e internacional.

d) Nacional-populistas, pois, como no governo de João Goulart, vol-tam-se para a ampliação dos direitos sociais e trabalhistas, be-neficiando milhões de trabalhadores em condições precáriasde trabalho.

e) De Planificação Estatal, uma vez que se encontram estruturadasem torno do princípio de crescer para redistribuir, opondo, assim,o Estado Nacional ao livre-comércio global.

2. (UEL-adaptada) Leia o texto a seguir:

Como argumentaram com muita propriedade diversoscríticos na tradição sociológica [...], as nações e os estadosnacionais não interagem simplesmente entre si; sob as con-dições modernas, eles formam — ou tendem a formar — ummundo, isto é, um contexto global com os seus próprios pro-cessos e mecanismos de integração. A forma nacional de inte-gração, dessa forma, desenvolve-se e funciona em conexãoíntima e num conflito mais ou menos acentuado com a formaglobal. [...] Para apreender a sua relevância em relação à aná-lise do nacionalismo, é necessário ter em mente que a globali-zação de modo algum é sinônimo de homogeneização [...].Pelo contrário, ela deve ser entendida como uma nova estru-tura de diferenciação.

ARNASON, J. P. Nacionalismo, globalização e modernidade.In: FEATHERSTONE, M. [Orgs.] Cultura global: nacionalização,globalização e modernidade. Petrópolis: Vozes, 1994. p. 238.

De acordo com o texto, é correto afirmar:a) Os Estados Nacionais possuem total autonomia quanto à globali-

zação, por isso não sofrem reflexos deste processo, garantindo ahomogeneidade, a simetria e unidade contra as distinções.

b) A globalização é um processo que atinge e subverte todos os Es-tados Nacionais, que tendem ao desaparecimento como constru-ção política moderna de regulação das relações sociais locais.

c) Apesar da resistência dos Estados Nacionais, a globalização re-sulta em homogeneização severa em todos os países que atinge.

d) Em virtude da presença dos Estados Nacionais, a tendência dehomogeneização própria à globalização deve ser relativizada, poismuitas vezes, ao invés de uma homogeneização, ela acaba porpromover novas formas de diferenciação.

e) Inexiste relação entre globalização e Estados Nacionais, pois estesúltimos se preservam por meio de mecanismos de defesa autócto-nes e totalitários.

3. (UNIMEP) No Manifesto do Partido Comunista, texto de 1847, Marx eEngels escreveram que “as armas que a burguesia utilizou para abatero feudalismo voltam-se hoje contra a própria burguesia. A burguesia,porém, não forjou somente as armas que lhes darão morte; produziutambém os homens que manejarão essas armas — os operários mo-dernos, os proletários”.A afirmação acima evidencia a perspectiva filosófica adotada por Marxe Engels, uma concepção que está centrada na história e no movi-mento.Essa concepção filosófica ficou conhecida comoa) empirismo dialético. d) materialismo dialético.b) materialismo mecânico. e) empirismo crítico.c) idealismo transcendental.

Tarefa Complementar

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INTRODUÇÃOEnquanto a Sociologia pode ser definida como “ciência da so-

ciedade”, a Antropologia se configura como “ciência do homem”.Dessa forma, crenças religiosas, formas de organização política,costumes, manifestações artísticas, estrutura familiar, idiomas, re-lações com outros grupos sociais, tudo isso forma o objeto de es-tudo do antropólogo.

Um conceito pode resumir esse objeto de estudo: o de cul-tura. Essa palavra, em sua origem usada para designar o proces-so de “cultivar a terra” — daí falarmos, por exemplo, em “culturade grãos” —, foi passando por sucessivas ampliações de sentido,até que chegou aos significados que conhecemos hoje.

Se encontramos uma pessoa com vasto conhecimento sobreliteratura, cinema, artes plásticas, música, costumamos dizer queela tem muita cultura, já que esse termo pode definir, de acordocom o Dicionário Houaiss, “o cabedal de conhecimentos, a ilus-tração, o saber de uma pessoa”. Em outra perspectiva, quandodizemos que um governo precisa investir mais em cultura, que-remos dizer que é necessário valorizar o “complexo de atividades,instituições, padrões sociais ligados à criação e difusão das belas-artes, ciências humanas e afins” — e eis outra acepção atual dapalavra, ainda segundo o Houaiss.

Para a Antropologia, porém, o conceito de cultura é maisamplo do que essas acepções. A cultura não está associada apenasa elementos concretos, materiais; ela também remete a formasabstratas de pensamento, aos símbolos por meio dos quais cadahomem compreende e avalia tudo o que ocorre à sua volta. Comodisse o antropólogo Denys Cuche: “Se todas as ‘populações’ hu-manas possuem a mesma carga genética, elas se diferenciam porsuas escolhas culturais, cada uma inventando soluções para osproblemas que lhe são colocados”. Essas escolhas culturais nãosão — é importante que se diga — racionais ou intencionais. Elassão resultado do acúmulo de experiências de várias gerações epodem alterar-se conforme as necessidades do grupo.

O EUROCENTRISMO: CULTURA E CIVILIZAÇÃONos primórdios da Antropologia, o eurocentrismo do século

XIX impedia os pesquisadores de compreender, de fato, as socie-dades não europeias. Por influência do evolucionismo, havia umatendência de tomar essas sociedades como estágios menos desen-volvidos do capitalismo, de modo que, um dia, elas deixariam deser sociedades “simples” ou “primitivas”, para se tornarem tão“complexas” e “sofisticadas” quanto as da Europa ocidental. Eracomo se o desenvolvimento humano só se desse em uma direção.

Na verdade, a esta altura, o conceito de cultura se misturavacom o de civilização. Analisando a ideologia eurocêntrica domi-nante dos séculos XVIII e XIX, o antropólogo Denys Cuche afirma:“A civilização é então definida como um processo de melhoria dasinstituições, da legislação, da educação. A civilização é um movi-mento longe de estar acabado, que é preciso apoiar e que afeta asociedade como um todo, começando pelo Estado, que deve se

liberar de tudo o que é ainda irracional em seu funcionamento.Finalmente, a civilização pode e deve se estender a todos os povosque compõem a humanidade. Se alguns povos estão mais avança-dos que outros nesse movimento, se alguns (a França particular-mente) estão tão avançados que já podem ser considerados como‘civilizados’, todos os povos, mesmo os mais ‘selvagens’, têmvocação para entrar no mesmo movimento de civilização, e osmais avançados têm o dever de ajudar os mais atrasados a dimi-nuir essa defasagem”.

Essa visão, posteriormente, foi superada pelos antropólogos,que questionaram o procedimento de tomar a própria culturacomo referencial para a análise de outras.

UNIDADE NA DIVERSIDADENão existem culturas inferiores ou superiores. Existem cultu-

ras diferentes. O que talvez aproxime todos os grupos humanosseja a busca pela identidade cultural, e isso pressupõe a afirmaçãodas diferenças, das especificidades, das particularidades de uma co-munidade. Assim, há uma unidade na diversidade: a unidadeentre as culturas se dá exatamente pela sua procura constante peladiversidade. Em outras palavras: o que nos iguala é o fato de ser-mos diferentes e de lutarmos pela afirmação dessa diferença.

Mas o fato de vivermos num mundo de diferenças não nosimpede de encontrar elementos culturais praticamente universais.É verdade que o modo como esses elementos universais se con-cretizam em cada cultura é bastante diverso. Vejamos o caso dareligiosidade, por exemplo: a maioria dos povos estudados pelosantropólogos cultiva alguma forma de prática religiosa. Emboraessas práticas variem de cultura para cultura, é inegável que todaselas têm a mesma finalidade: aproximar o ser humano de umarealidade transcendente, que ele acredita existir.

Durante algum tempo, sobretudo na virada do século XIXpara o XX, aceitou-se a validade de uma teoria pseudocientíficachamada determinismo. Os deterministas defendiam que o com-portamento humano era condicionado exclusivamente por trêsfatores: a raça, o meio e o momento histórico. Os homens não se-riam bem indivíduos, mas um produto da etnia a que pertencem,da região em que vivem e da época em que nasceram. Não have-ria vontade; não haveria transgressão; não haveria surpresa —tudo ocorreria como foi predeterminado por fatores que nãopoderíamos controlar.

As teorias deterministas, a despeito da inconsistência de seusprincípios, serviram para emprestar credibilidade a toda sorte depreconceitos: do arianismo às crenças pueris de que as pessoassão mais preguiçosas em países tropicais. Trata-se de uma formasofisticada de os grupos que detêm o poder assumirem uma pos-tura de superioridade em relação a outros grupos, por eles conde-nados a uma inferioridade inexorável.

Atualmente, como aponta muito bem o antropólogo Roquede Barros Laraia, as diferenças entre os agrupamentos humanos“não podem ser explicadas em termos das limitações que lhes sãoimpostas pelo seu aparato biológico ou pelo seu meio ambiente.

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Atividade 9CULTURA, CONHECIMENTO E PODER

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A grande qualidade da espécie humana foi a de romper com suaspróprias limitações (…). Tudo isso porque difere dos outros ani-mais por ser o único que possui cultura”.

É certo que o “aparato biológico” ou o “meio ambiente”podem influenciar na conduta humana. Mas não se trata de umdeterminismo absoluto, excludente de tantos outros fatores. Atéporque o que mais influi em nosso comportamento é a cultura,que consiste num conjunto de valores e crenças vivos, dinâmicos,do qual o indivíduo participa ativamente. Os homens são, aomesmo tempo, construídos por sua cultura e construtores dela.

PADRONIZAÇÃO CULTURALQuando admitimos que a cultura interfere diretamente em

nossa conduta, ainda que de um modo não determinista, aceita-mos também que pessoas pertencentes a um mesmo grupo se-guem os mesmos padrões culturais, uma vez que estão sujeitasàs mesmas coerções.

O Dicionário de Sociologia de Emílio Willems define os padrõesculturais como

Assim, a padronização é inevitável, pois é uma consequêncianatural do fato de as pessoas pertencerem a um mesmo grupo. Aafirmação da identidade cultural passa pela existência de umpadrão de conduta. No entanto, ela é perigosa, na medida em quepode tornar-se uma regra a ser seguida, e uma regra exclusiva eexcludente. Tomada como imposição, a padronização pode levaraos etnocentrismos, pois os “diferentes” (ou seja, aqueles que nãoseguem as normas preestabelecidas) podem ser tachados de infe-riores. Além disso, um povo mais forte que outro — econômicaou militarmente — pode tentar impor seus padrões culturais comoforma de aumentar seu raio de dominação.

No mundo de hoje, embora ainda ocorram guerras, as im-posições culturais ocorrem de modo mais sutil. Por meio do cine-ma, da música, da imprensa e do poder do capital, por exemplo,os Estados Unidos conseguiram tornar o american way of life, ojeito americano de viver, popular em diversos países. A própriaglobalização, ao diminuir as fronteiras culturais por meio das faci-lidades de acesso à informação, possibilitando cada vez mais inter-câmbios entre povos distantes, gera uma forma de padronizaçãocultural.

Sempre interessou aos detentores dos meios de produção nomundo capitalista ampliar os mercados consumidores. Para a in-dústria de massa, um passo facilitador para isso é justamentefazer com que as pessoas se tornem todas iguais, tenham os mes-mos gostos, as mesmas crenças e os mesmos valores. Em outraspalavras, uma cultura altamente padronizada é garantia de aumen-to dos lucros daqueles que detêm os meios de produção. Mas issonão quer dizer que as pessoas se submetam passivamente a esseprocesso de padronização cultural: embora não seja tarefa fácil, ospovos geralmente buscam modos de resistir à dominação.

CULTURA E CONHECIMENTOÉ comum que as pessoas entendam cultura no seu sentido

mais popular, ou seja, como a ilustração, a instrução que uma pes-soa tem: “culto” seria aquele que tem conhecimentos sobre arte,estuda música clássica, fala mais de um idioma ou compreende omundo da política. No sentido mais técnico — do modo como apalavra é usada na Antropologia —, a cultura é o elemento quedefine a identidade de um grupo social. Se cada povo tem a suaidentidade, é preciso lembrar que os membros de cada grupo vãoincorporando-a naturalmente, muitas vezes sem terem consciên-cia disso.

Seja pela família, seja pela escola, seja pela língua que fala-mos, à medida que crescemos e nos socializamos vamos adqui-rindo uma maneira de pensar e agir que não é exatamente indi-vidual, já que as demais pessoas do grupo também têm visões demundo parecidas. É isso que define a cultura. Como o mundo estáem constante mudança, os valores também mudam, as crençastambém mudam, a cultura também muda. Os padrões culturais sealteram à medida que os indivíduos começam a se comportar demaneira diferente. O que é natural.

Muitas das mudanças culturais estão associadas à noção deconhecimento. Entre os vários sentidos desse termo, um é maisimportante para nós: “o conjunto das informações e princípiosarmazenados” pelos povos ou por toda a humanidade. Aconteceque o conhecimento humano é altamente dinâmico: a eletricidade,os automóveis, os aviões, as bombas nucleares, os computadores— só para ficar com invenções recentes — provam isso. E umaparte importante da cultura advém do conhecimento.

Por isso, as informações a que temos acesso e os princípiosque seguimos (melhor dizendo: o conhecimento que possuímos)também ajudam a definir nossa identidade. Portanto, os homenssão, ao mesmo tempo, produtos e produtores de sua cultura e deseu conhecimento. Ter cultura ou ter conhecimento não é domi-nar um número predeterminado de informações. A cultura e o co-nhecimento estão sempre sendo construídos e, por isso, são aves-sos a qualquer forma de sistematização estática e eterna. Até por-que são criações coletivas. Não é apenas o indivíduo, mas todo ogrupo social que os produz.

Dentro de cada cultura, existem certos conhecimentos quecostumam ser mais valorizados do que outros. Por exemplo, nacultura ocidental — sobretudo urbana —, aquilo que se aprendenuma universidade para exercer a medicina ou o direito configuraum tipo de Saber (com letra maiúscula mesmo), desejado pelagrande parte dos indivíduos. No entanto, pessoas que nunca che-garam ao ensino superior podem possuir outros saberes (comocozinhar ou dirigir um trem) igualmente importantes para a vidasocial. E qual a relação entre essas formas de conhecimento?

Quando se fala em Saber, vem à cabeça a ideia de um tipode conhecimento institucionalizado, aceito por grande parte dogrupo como indiscutível. É claro que isso só ocorre porque esseconhecimento é referendado, aprovado pelas elites sociais. Porisso, para as classes dominantes, que detêm o Saber (definido porelas mesmas), é muito fácil fazer uma distinção entre o “culto” eo “inculto” — o que, na verdade, pressupõe a distinção entre do-minadores e dominados, entre as elites e o povo. Tudo é, pois,uma relação de poder. Impõe-se o Saber, como se ele fosse válidopara todos.

formas relativamente homogêneas e socialmente aceitas depensamentos, sentimentos e ações, assim como objetos mate-riais que lhes são correlatos. Um padrão cultural resulta deinteração social e exerce função de conservar uma forma deorganização social.

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Um exemplo de Saber é, novamente, tudo aquilo que seaprende nas universidades. De uma maneira geral, ninguém des-merece a cultura profissional, o conhecimento, os anos de estudode um médico, de um engenheiro, de um advogado ou de um pro-fessor, afinal, todos eles, em algum grau, são portadores do quepoderíamos chamar de cultura científica.

Especialmente na sociedade brasileira, chegar à academia éum desejo praticamente unânime, como se frequentar um cursosuperior fosse garantia de entrar no seleto território das elites.Penetrar no mundo da ciência seria, ainda, conhecer a “verdade”das coisas. Mas o fato é que a ciência muitas vezes se engana.Quantas vezes, mesmo após pesquisas detalhadas da indústria far-macêutica, descobre-se que um determinado medicamento trazmenos benefícios às pessoas do que se imaginava? Quantos insti-tutos de pesquisa eleitoral, valendo-se de modelos estatísticos com-plexos, falham nas suas previsões? Quantas teorias econômicas,quando aplicadas no mundo real, simplesmente não funcionamcomo se esperava?

Por outro lado, não se pode dizer que a cultura científica, porestar sujeita a equívocos, não serve para nada. Nem tanto ao céu,nem tanto à terra.

Exercício(UEL-adaptado) O etnocentrismo pode ser definido como uma“atitude emocionalmente condicionada que leva a considerar ejulgar sociedades culturalmente diversas com critérios forneci-dos por sua própria cultura. Assim, compreende-se a tendên-cia para menosprezar ou odiar culturas cujos padrões se afas-tam ou divergem dos da cultura do observador que exterio-riza a atitude etnocêntrica. (...) Preconceito racial, nacionalis-mo, preconceito de classe ou de profissão, intolerância reli-giosa são algumas formas de etnocentrismo”.

WILLEMS, E. Dicionário de Sociologia. Porto Alegre:Editora Globo, 1970. p. 125.

Com base no texto e em seus conhecimentos de Sociologia,assinale a alternativa cujo discurso revela uma atitude etno-cêntrica:a) A existência de culturas subdesenvolvidas relaciona-se à

presença, em sua formação, de etnias de tipo incivilizado.b) Os povos indígenas possuem um acúmulo de saberes que

podem influenciar as formas de conhecimentos ocidentais.c) Os critérios de julgamento das culturas diferentes devem

primar pela tolerância e pela compreensão dos valores, dalógica e da dinâmica próprios a cada uma delas.

d) As culturas podem conviver de forma democrática, dada ainexistência de relações de superioridade e inferioridadeentre elas.

e) O encontro entre diferentes culturas propicia a humaniza-ção das relações sociais, a partir do aprendizado sobre asdiferentes visões de mundo.

• Resolva os exercícios a seguir.

1. (UEL-adaptada) O pensamento científico, além de autodefinir-se, tam-bém classifica e conceitua outras formas de pensamento. Por exem-plo, é possível encontrar a definição de pensamento mítico comoaquele que “vai reunindo as experiências, as narrativas, os relatos, atécompor um mito geral. Com esses materiais heterogêneos produz aexplicação sobre a origem e a forma das coisas, suas funções e suasfinalidades, os poderes divinos sobre a natureza e sobre os humanos”.

CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 2000. p. 161.

Assinale a alternativa cuja afirmação está de acordo com a definiçãode pensamento mítico dada acima.a) “Acredito em coincidência e essa [a transferência do local do jogo]

é uma vantagem a mais para nós nesta final. Foi lá que conquis-tamos nosso primeiro título” (declaração da capitã do time devôlei do Vasco da Gama ao comemorar a transferência da partidacontra o Flamengo para um ginásio de sua preferência).

b) “Considero a sexta-feira 13 um dia ‘nebuloso’. Para mim, o poderda mente é forte e aquelas pessoas que pensam negativamentepodem atrair má sorte. Não creio que ocorram coisas ruins paramim, mas prefiro me precaver com patuás e incensos” (estu-dante, 24 anos).

c) “Não temo o desemprego, quem com Deus está, tudo pode”(depoimento de um candidato a emprego de gari no Rio de Ja-neiro, disputando uma vaga com outros 40 mil candidatos).

d) “Viemos em busca da ‘Terra sem males’, atrás do ‘Éden’. Esta-mos atrás do ‘Paraíso’ sonhado por nossos ancestrais e ele seencontra por essas regiões” (explicação dada por líder guaranidiante do questionamento sobre a instalação de grupos indígenasem áreas de mata atlântica protegidas por lei).

e) “As principais causas da exclusão educacional apontadas pelocenso do IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística],além do trabalho infantil, são a pobreza, a distância entre a esco-la e a residência, a distorção idade-série e até o tráfico de drogas”(divulgação na imprensa de dados do IBGE sobre educação).

2. (UEL) Leia o texto a seguir, escrito por Max Weber (1864-1920), quereflete sobre a relação entre ciência social e verdade:

[...] nos é também impossível abraçar inteiramente asequência de todos os eventos físicos e mentais no espaço eno tempo, assim como esgotar integralmente o mínimo ele-mento do real. De um lado, nosso conhecimento não é umareprodução do real, porque ele pode somente transpô-lo,reconstruí-lo com a ajuda de conceitos; de outra parte, ne-nhum conceito e nem também a totalidade dos conceitos sãoperfeitamente adequados ao objeto ou ao mundo que eles seesforçam em explicar e compreender. Entre conceito e reali-dade existe um hiato intransponível. Disso resulta que todoconhecimento, inclusive a ciência, implica uma seleção, se-guindo a orientação de nossa curiosidade e a significação quedamos a isto que tentamos aprender.

Traduzido de: FREUND, Julien. Max Weber. Paris: PUF, 1969. p. 33.

Com base no texto e nos conhecimentos sobre o tema, é corretoafirmar que, para Weber:a) A ciência social, por tratar de um objeto cujas causas são infinitas,

ao invés de buscar compreendê-lo, deve limitar-se a descreversua aparência.

b) A ciência social revela a infinitude das variáveis envolvidas na ge-ração dos fatos sociais e permite a elaboração teórica totalizan-te a seu respeito.

c) O conhecimento nas ciências sociais pode estabelecer parcial-mente as conexões internas de um objeto, portanto, é limitadopara abordá-lo em sua plenitude.

d) Alguns fenômenos sociais podem ser analisados cientificamen-te na sua totalidade porque são menos complexos do que outrosnas conexões internas de suas causas.

e) O obstáculo para a ciência social estabelecer um conhecimentototalizante do objeto é o fato de desconsiderar contribuições deáreas como a biologia e a psicologia, que tratam dos eventos físi-cos e mentais.

Tarefa Mínima

ORIENTAÇÃO DE ESTUDO

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Page 34: Pre Vestibular Soc

• Resolva os exercícios a seguir.

1. (UEL) “No início quis a morte do mito, como a razão quis a supres-são do irracional, visto como obstáculo a uma verdadeira com-preensão do mundo, dando início assim a uma guerra interminá-vel contra o pensamento mítico. Valéry glorificou esta luta destrui-dora contra as ‘coisas vagas’: ‘Aquilo que deixa de ser, por ser poucopreciso, é um mito; basta o rigor do olhar e os golpes múltiplos econvergentes das questões e interrogações categóricas, armas doespírito ativo, para se ver os mitos morrerem’. O mito por sua veztrabalha duro para se manter e, por meio de suas metamorfoses,está presente em todos os espaços. Do mesmo modo, a ciênciaatual busca menos sua erradicação que seu confinamento [domito]. Quando a ciência traça seus próprios limites, ela reserva aomito — e ao sonho — o lugar que lhe é próprio.”

BALANDIER, Georges. A desordem: elogio do movimento.Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997. p. 17.

Com base no texto, é correto afirmar:a) Pelo fato de ser destituído de significado social, o mito está au-

sente dos espaços sociais contemporâneos.b) A delimitação da área de atuação do saber científico implica a

constituição de um lugar próprio para o mito.c) A morte e o extermínio do mito no Ocidente decorrem de su-

pervalorização e consequente predomínio da razão.d) Na modernidade, o pensamento mítico é crucial para a compreen-

são científica do mundo.e O pensamento mítico se disseminou porque se pauta em con-

ceitos e categorias.

2. (UEL) “Pela exploração do mercado mundial a burguesia imprime umcaráter cosmopolita à produção e ao consumo em todos os países.Para desespero dos reacionários, ela retirou à indústria sua base na-cional. As velhas indústrias nacionais foram destruídas e continuam asê-lo diariamente. (...) Em lugar das antigas necessidades satisfeitaspelos produtos nacionais, nascem novas necessidades, que recla-mam para sua satisfação os produtos das regiões mais longínquas edos climas mais diversos. Em lugar do antigo isolamento de regiõese nações que se bastavam a si próprias, desenvolve-se um intercâm-bio universal, uma universal interdependência das nações. E isso serefere tanto à produção material como à produção intelectual. (...) De-vido ao rápido aperfeiçoamento dos instrumentos de produção e aoconstante progresso dos meios de comunicação, a burguesia arrastapara a torrente da civilização mesmo as nações mais bárbaras.”

MARX, K. & ENGELS, F. Manifesto do Partido Comunista.São Paulo: Global, 1981. p. 24-25.

Com base no texto de Karl Marx e Friedrich Engels, publicado pelaprimeira vez em 1848, assinale a alternativa correta.a) Desde o início, a expansão do modo burguês de produção fica

restrita às fronteiras de cada país, pois o capitalista é conser-vador quanto às inovações tecnológicas.

b) O processo de universalização é uma tendência do capitalismodesde sua origem, já que a burguesia precisa de novos mercados,de novas mercadorias e de condições mais vantajosas de pro-dução.

c) A expansão do modo capitalista de produção em escala mundialencontrou empecilhos na mentalidade burguesa apegada aosmétodos tradicionais de organização do trabalho.

d) Na maioria dos países não europeus, a universalização do capitalencontrou barreiras alfandegárias que impediram sua expansão.

e) A dificuldade de comunicação entre os países, devido ao baixoíndice de progresso tecnológico, adiou para o século XX a univer-salização do modo capitalista de produção.

Tarefa Complementar

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INTRODUÇÃOMarilena Chauí, em sua obra Cidadania cultural: o direito à

cultura, mais especificamente no capítulo “Direito à memória”, fazum breve histórico sobre os significados que o termo “cultura” foiadquirindo ao longo do tempo nas ciências humanas. Num dadomomento, ela afirma que a palavra:

Considerar a cultura como o território da “transformaçãoracional” acaba sendo uma forma de reconhecer a racionalidadehumana, em oposição à irracionalidade das outras espécies quevivem no planeta. Se o homo sapiens sapiens (nome científico quehoje se dá à espécie humana) é racional, ele tem cultura, e vice-versa. Por isso, não se pode admitir a existência de cultura entrecachorros, babuínos ou samambaias.

Na verdade, no processo de hominização, os seres humanosadquiriram, como mostra o professor e arqueólogo Ulpiano Be-zerra de Menezes, duas capacidades cognitivas — a abstração e aarticulação — muito ligadas ao desenvolvimento de nossa caixacraniana. Com essas capacidades, os homens puderam englobarfenômenos particulares em “categorias de eventos”, o que lhes deu“a possibilidade de previsão, de projeto, de programação”.

A QUESTÃO DA MEMÓRIAAinda de acordo com Menezes, a memória exerce um papel

fundamental nesse processo de desenvolvimento da capacidaderacional do homem, pois “ainda que eu fosse capaz de abstrair earticular, sem memória teria que recomeçar as respostas adequa-das a cada novo impulso”.

Porém, nem isso basta, uma vez que a memória, a priori, éindividual. Quem permite que a memória se torne coletiva é a lin-guagem. Menezes afirma: “É a linguagem que permite que a me-mória seja um veículo de socialização das experiências individuais.As capacidades de abstração e de articulação, portanto, não mor-rem no nível individual. No indivíduo, elas têm continuidade, maspodem também se transmitir a uma comunidade de pessoas”.

passou a significar a relação que os humanos, socialmente orga-nizados, estabelecem com o tempo e com o espaço, com osoutros humanos e com a natureza, relações que se transformame variam em condições temporais e sociais determinadas. Agora,cultura torna-se sinônimo de história. [...] [Ela é o reino] datransformação racional; portanto, é a relação dos humanos como tempo e no tempo.

Atividade 10CULTURA, MEMÓRIA E MÍDIA

Page 35: Pre Vestibular Soc

O francês Maurice Halbwachs (1877-1945) — herdeiro datradição sociológica de Durkheim e um dos maiores estudiosos doassunto — também vê a memória como um processo de socializa-ção. Para ele, e como já vimos anteriormente, os fatos sociais sãomais importantes do que eventos particularizados. O que interessaà Sociologia é o que se repete. Daí vem a noção de uma memóriacoletiva, compartilhada pelos indivíduos por meio da linguagem.

A MEMÓRIA A SERVIÇO DO PODERO filósofo alemão Walter Benjamin (1892-1940), num famo-

so artigo intitulado “O narrador”, discute o valor oralidade para asociedade contemporânea. Ele afirma categoricamente que “a artede narrar caminha para o fim”. E justifica-se: “Torna-se cada vezmais raro o encontro com pessoas que sabem narrar alguma coisadireito. (…) É como se uma faculdade, que nos parecia inaliená-vel, a mais garantida entre as coisas seguras, nos fosse retirada. Ouseja: a de trocar experiências”.

Benjamin, ao falar sobre “a arte de narrar”, não está pensan-do na literatura escrita. Para ele, as narrativas legítimas são asorais. Eis suas palavras: “A experiência que anda de boca em bocaé a fonte onde beberam todos os narradores. E, entre os queescreveram histórias, os grandes são aqueles cuja escrita menos sedistingue do discurso dos inúmeros narradores anônimos”.

Se a arte de narrar (de trocar experiências com a espontanei-dade da língua falada) caminha realmente para o fim, isso se devesobretudo ao fato de as relações entre as culturas, no mundo glo-balizado, serem assimétricas, o que permite a dominação cultural.Assim, a memória coletiva de uns sobrepõe-se à de outros, porvezes excluindo-as ou relegando-as à extinção, num processo queinclui a perda da espontaneidade e o isolamento.

Os grupos mais influentes na sociedade impõem sua memóriaaos demais. Um museu, em última instância, expõe uma culturaoficial, a cultura da classe dominante — ou seja, daqueles quedetêm o poder político ou econômico e, por isso, podem celebrarsua memória de modo mais efetivo.

Portanto, se deixamos de contar histórias e de valorizar nossaidentidade, isso pode ser resultado da “massificação imposta àsociedade como um todo”, que despreza, faz tábula rasa da diver-sidade cultural da humanidade, impondo ao universo da memória(como disse a professora Maria Lucia Montes) “os jogos de poderque acontecem na vida em sociedade”.

MÍDIA E MASSIFICAÇÃOAtualmente, esses “jogos de poder que acontecem na vida em

sociedade” estão muito ligados ao universo da mídia, ou seja, aouniverso dos meios de comunicação, que estrategicamente assu-mem a manutenção de parte de nossa memória coletiva.

Durante grande parte da história da humanidade, para queduas pessoas se comunicassem era preciso que elas estivessemlado a lado, face a face. Eventualmente, sinais de fumaça ou pin-turas nas paredes, por exemplo, permitiam a comunicação à dis-tância. Com a invenção da escrita e, posteriormente, da prensa, atransmissão de informações tornou-se menos dependente de umcontato direto entre as pessoas.

Mas o fato é que nunca como no século XX a possibilidade denos comunicarmos à distância desenvolveu-se tanto. O rádio, otelefone, a televisão, o cinema, a imprensa, a publicidade, os com-

putadores, a internet, os celulares, o mundo digital, todos esses re-cursos ou surgiram ou se popularizam no século passado. Assim,a ideia de um “meio” (mídia), de um “elemento intermediário” quepermite a comunicação em larga escala, ganhou a força.

A palavra mídia passou então a ser utilizada para designar,segundo o Houaiss, “todo suporte de difusão da informação queconstitui um meio intermediário de expressão capaz de transmitirmensagens”. Quando dizemos que vivemos numa sociedademidiática, referimo-nos ao fato de que, no mundo atual, mais doque em qualquer outra época, a mídia tem um papel fundamentalnos processos de interação social.

Em nossa sociedade, continuam a existir meios de comuni-cação social interpessoais, como as conversas entre amigos ou osdiálogos públicos e privados — que, por seu caráter multifaceta-do e particular, pouco interessam à pesquisa sociológica. Importa-nos estudar, sobretudo, os mass media, isto é, os meios de co-municação de massa. A existência de uma “cultura de massa”como concebemos hoje, em que impera a padronização cultural(e, por extensão, a tentativa de unir todos os indivíduos do plane-ta no mesmo grupo de consumidores), só é possível porque exis-tem meios que permitem a transmissão em grande escala das in-formações consideradas mais relevantes.

Uma das características desses meios, segundo Delson Ferrei-ra, é que “o número de pessoas que expressam uma opinião ésempre muito menor do que o das que recebem”. Daí vem sua de-finição de massa:

Theodor Adorno e Max Horkheimer, dois dos principais filóso-fos da chamada Escola de Frankfurt, já haviam falado sobre esseparadoxo da sociedade massificada, em que há “poucos centros deprodução e uma recepção difusa”, de tal modo que fica fácil supor— pensando em termos econômico-culturais — que as assime-trias* entre a classe dominante (os “centros de produção”) e a clas-se trabalhadora (a “recepção difusa”) geram a dominação cultural.

A reificação e a alienação ganham aqui grande importância.Como já mostramos em aulas anteriores, na sociedade capitalistacontemporânea, tudo é tratado como coisa, como produto, comomercadoria (e isso é reificação) e o homem não recebe todos os be-nefícios do próprio trabalho, nem tampouco percebe seu alcance(alienação).

A cultura de massa que surge numa época assim não pode-ria, portanto, deixar de ter uma dimensão reificada e alienada.O professor Teixeira Coelho afirma:

* Assimetria: grande diferença; disparidade; desnivelamento.

Nesse quadro, também a cultura — feita em série, indus-trialmente, para o grande número — passa a ser vista não comoinstrumento de livre expressão, crítica e conhecimento, mascomo produto trocável por dinheiro e que deve ser consumidocomo se consome qualquer outra coisa.

uma coleção abstrata de indivíduos que viveriam a receberimpressões e opiniões já formadas, antes construídas e depoisveiculadas pelos meios de comunicação de massa. No sentidodessas definições, o termo massificar refere-se à ação de orien-tar e/ou influenciar indivíduos e grupos por meio desse tipo decomunicação social.

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Exercício(UEL) “[...] uma grande marca enaltece — acrescenta ummaior sentido de propósito à experiência, seja o desafio dedar o melhor de si nos esportes e nos exercícios físicos oua afirmação de que a xícara de café que você bebe real-mente importa. [...] Segundo o velho paradigma, tudo oque o marketing vendia era um produto. De acordo com onovo modelo, contudo, o produto sempre é secundário aoverdadeiro produto, a marca, e a venda de uma marca ad-quire um componente adicional que só pode ser descritocomo espiritual.O efeito desse processo pode ser observado na fala de um em-presário da Internet comentando sua decisão de tatuar o logoda Nike em seu umbigo: ‘Acordo toda manhã, pulo para o chu-veiro, olho o símbolo e ele me sacode para o dia. É para melembrar a cada dia de como tenho que agir, isto é, just do it’.”

KLEIN, Naomi. Sem logo: a tirania das marcas em um planeta vendido.Rio de Janeiro: Record, 2002, p. 45-76.

Com base no texto e em seus conhecimentos sobre ideolo-gia, é correto afirmar:a) A atual tendência do capitalismo globalizado é produzir

marcas que estimulam a conscientização em detrimentodos processos de alienação.

b) O capitalismo globalizado, ao tornar o ser humano desi-deologizado, aproximou-se dos ideais marxistas quantoao ideal humano.

c) Graças às marcas e à influência da mídia, em sua atuaçãoeducativa, as pessoas tornaram-se menos sujeitas ao con-sumo.

d) O trabalho ideológico em torno das marcas solucionou ascrises vividas desde a década de 1970 pelo capital oligo-pólico.

e) Por meio da ideologia associada à mundialização do ca-pital, ampliou-se o fetichismo das mercadorias, o qual sereflete na resposta social às marcas.

• Resolva os exercícios a seguir.

1. (UEL) Na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) foi implan-tado, no exame vestibular, o sistema de cotas raciais, que desenca-deou uma série de discussões sobre a validade de tal medida, bemcomo sobre a existência ou não do racismo no Brasil, tema que per-manece como uma das grandes questões das Ciências Sociais nopaís. Roger Bastide e Florestan Fernandes, escrevendo sobre a escra-vidão, revelam traços essenciais do racismo à brasileira, observandoque:

Negro equivalia a indivíduo privado de autonomia e liber-dade; escravo correspondia (em particular do século XVIII emdiante) a indivíduo de cor. Daí a dupla proibição, que pesavasobre o negro e o mulato: o acesso a papéis sociais que pres-supunham regalias e direitos lhes era simultaneamente veda-do pela “condição social” e pela “cor”.

BASTIDE, R.; FERNANDES, F. Brancos e negros em São Paulo.2. ed. São Paulo: Nacional, 1959. p. 113-114.

Com base no texto e nos conhecimentos sobre a questão racial noBrasil, é correto afirmar:a) O racismo é produto de ações sociais isoladas desconectadas

dos conflitos ocorridos entre os grupos étnicos.b) A escravatura amena e a democracia nas relações étnicas leva-

ram à elaboração de um “racismo brando”. c) As oportunidades sociais estão abertas a todos que se esforçam

e elas independem da “cor” do indivíduo.d) Nas relações sociais a “cor” da pessoa é tomada como símbolo

da posição social.e) O comportamento racista vai deixando de existir, paulatinamente,

a partir da abolição dos escravos.

2. (FUVEST) “A imprensa, que sempre esteve alinhada às grandes cau-sas da cidadania, está convicta de que o próximo passo para a con-solidação da democracia em nosso país passa pelo restabeleci-mento imediato da ordem pública.”

Manifesto “Basta à violência”, de 16/08/06, das associações de jornais,de editores de revista e das emissoras de rádio e televisão.

Com base no texto, pode-se afirmar que, no Brasil, como no restodo Ocidente, “as grandes causas da cidadania” e a “consolidaçãoda democracia”a) surgiram, fortuitamente, em decorrência da ação de grandes

estadistas devotados à causa dos direitos do homem.b) apareceram, simultaneamente, em decorrência do impacto pro-

vocado pela Revolução Francesa sobre praticamente todos ospaíses.

c) derivaram, respectivamente, do absolutismo, que transformou ossúditos em cidadãos, e do liberalismo, que garantiu os direitospolíticos.

d) caminharam juntas e, em geral, na seguinte ordem: primeiro, aigualdade jurídica; depois, os direitos políticos; e, por último, osdireitos sociais.

e) decorreram dos ideais socialistas e das lutas dos trabalhadorespara conquistar, primeiro, os direitos sociais e, depois, os direi-tos políticos.

• Resolva os exercícios a seguir.

1. (UEL) “A legislação penal do fim do século XIX determinava: a ociosi-dade era considerada ‘crime’ e, como tal, punida. Reconhecida e legi-timada abertamente, a prática da repressão aos desempregados esubempregados — os pobres — ficava clara no discurso dos respon-sáveis pela segurança pública e pela ordem nas cidades. O controlesocial dessas camadas deveria ser realizado de forma rígida. SidneyChalhoub afirma que os legisladores brasileiros utilizam o termo ‘clas-ses perigosas’ como sinônimo de ‘classes pobres’, e isso significadizer que o fato de ser pobre o torna automaticamente perigoso à so-ciedade [...]. A existência do crime, da vagabundagem e da ociosidadejustificava o discurso de exclusão e perseguição policial às camadaspobres e despossuídas.”

PEDROSO, Regina Célia. Violência e cidadania no Brasil:500 anos de exclusão. São Paulo: Ática, 2002. p. 24.

O texto acima discute a configuração das classes sociais no Brasil,tomando como referência as questões da cidadania e da violência.Com base no texto e nos conhecimentos sobre o tema, é corretoafirmar que, no final do século XIX, no Brasil:a) A ação dos poderes públicos no trato da questão social estava

centrada na supressão dos desníveis entre as classes sociais,condição básica para a emergência do Brasil industrializado.

b) A herança colonial da estrutura social brasileira conduzia o po-der estatal a reconhecer como legítimas as lutas das classespopulares no questionamento da estrutura política oligárquicavigente.

c) O combate às “classes perigosas” obrigava os poderes públi-cos à implementação de políticas de geração e distribuição derenda, reduzindo, assim, a influência do Partido Comunista Bra-sileiro junto aos pobres.

Tarefa Complementar

Tarefa Mínima

ORIENTAÇÃO DE ESTUDO

SISTEMA ANGLO DE ENSINO 850092110 36 ANGLO VESTIBULARES

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d) O desemprego e a criminalidade referidos às classes populareseram vistos pelos poderes públicos menos como questão so-cial e mais como questão de polícia, dentro de uma concepçãorestritiva de cidadania.

e) A repressão policial restringia-se aos desempregados e subem-pregados, pois os trabalhadores assalariados eram protegidospor uma legislação trabalhista que garantia, por exemplo, apo-sentadoria e descanso remunerado.

2. (UEL-adaptada) Na Inglaterra do século XVII, puritanismo era o nomedado ao policiamento exercido por uma seita religiosa sobre o com-portamento alheio, especialmente em relação à sexualidade. O neo-puritanismo, por sua vez, não tem relação com religião [...] sua cen-sura se pauta por uma visão estereotipada e generalizante de bomsenso. O neopuritanismo consiste em uma pressão social contem-porânea para que o indivíduo seja correto, competente e bem-sucedi-do em todas as esferas da vida.

Adaptado de: QUINTANILHA, Leandro. “Tudo o que se faz é ilegal,imoral ou engorda”. In: Folha de Londrina,

Londrina, 27 nov. 2005. Especial, p.16.

Com base no texto e nos conhecimentos sobre o tema, considereas afirmativas a seguir.

I. O neopuritanismo propaga um padrão comportamental que au-xilia a reprodução da lógica mercantil capitalista, portanto a re-produção das relações sociais de produção.

II. A ruptura do neopuritanismo com a religião conduziu seus se-guidores a combater a censura na sociedade atual.

III. O neopuritanismo, em função de suas origens, tem alimentadoos fundamentalismos das seitas religiosas orientais e ocidentais.

IV. Uma das diretrizes gerais do neopuritanismo é a criação de for-mas de controle social fundadas em consensos, com base emvalores sociais hegemônicos.

Estão corretas apenas as afirmativas:a) I e II.b) I e IV.c) III e IV.d) I, II e III.e) II, III e IV.

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INTRODUÇÃO

Num artigo sobre a cultura brasileira intitulado “Plural, masnão caótica”, o professor e crítico literário Alfredo Bosi propõe umamaneira bastante interessante de avaliar nossa cultura. Ele mostraque, durante algum tempo, a busca pela identidade nacional tenta-va apontar uma única linha mestra da nossa cultura, como se estafosse unitária, coesa, com valor universal. Bosi então afirma:

Essa pluralidade advém de vários fatores. Em primeirolugar, como em qualquer outro país, misturam-se no Brasil ele-mentos da cultura popular e da erudita, da cultura de massa eda cultura “de raiz”. Além disso, pela dimensão territorial, é deesperar que haja regionalismos espalhados pelo país. Outrofator importante é a miscigenação étnica, que, aliada à chega-da de imigrantes em vários momentos de nossa história, tornaa cultura brasileira um mosaico de tradições, de hábitos, decrenças, de valores. Sobre isso, diz Bosi:

Mas não pense que essa pluralidade leva ao caos. A plurali-dade da cultura brasileira é, isso sim, comprovação de sua diver-sidade, enquanto (de novo nas palavras de Bosi) a “impressão decaos e nonsense ficará por conta do estilo de show alucinantemontado por essa gigantesca fábrica de sombras e revérberoschamada civilização de massa”.

INDÚSTRIA CULTURAL NO BRASILAinda que o capitalismo brasileiro seja tardio em relação ao

das nações desenvolvidas, o Brasil também já convive plenamenteem uma cultura de massa. Na sociedade midiática, a transmissãode informações, as trocas culturais e os debates sociais ocorremsobretudo pelos meios de comunicação. No século XXI, com a popu-larização dos computadores pessoais, o número de pessoas comacesso à internet tem crescido vertiginosamente. Dessa forma, arede mundial se tornou fundamental para a compreensão dos ca-minhos que segue a cultura de massa em épocas de globalização.

De acordo com uma pesquisa do instituto Ibope/NetRatings,havia, no começo de 2008, 21,1 milhões de internautas residen-ciais ativos no Brasil. O número cresce se levarmos em conside-ração que o país possui cerca de 40 milhões de pessoas (com 16anos ou mais) que acessam a internet não só em casa, mas tam-bém no trabalho, na escola ou em lan houses. O que mais impres-sionou na pesquisa foi o fato de o brasileiro ficar, em média, 23horas e 12 minutos por mês na frente do computador. Com essetempo médio de navegação, o Brasil está à frente da França (21horas e 38 minutos), dos Estados Unidos (20 horas e 39 minutos)e da Austrália (19 horas e 13 minutos).

Entretanto a internet ainda está longe de desbancar a tele-visão. Segundo o IBGE, em 2005, o PNAD (Pesquisa Nacional porAmostra de Domicílio) mostrou que há 162,9 milhões de pessoasque moram em domicílios com televisão colorida, o que corres-

Há imbricações de velhas culturas ibéricas, indígenas e afri-canas, todas elas também polimorfas, pois já traziam um teorconsiderável de fusão no momento do contato interétnico. E háoutros casamentos, mais recentes, de culturas migrantes, querexternas (italiana, alemã, síria, judaica, japonesa…), quer internas(nordestina, paulista, gaúcha), que penetraram fundo em nossocotidiano material e moral. Sem esquecer a presença norte-ame-ricana, que vem representando, desde a Segunda GuerraMundial, uma fonte privilegiada no mercado de bens simbólicos.

(…) não existe uma cultura brasileira homogênea, matriz dosnossos comportamentos e dos nossos discursos. Ao contrário: aadmissão do seu caráter plural é um passo decisivo para com-preendê-la como um “efeito de sentido”, resultado de um pro-cesso de múltiplas interações e oposições no tempo e no espaço.

Atividade 11INDÚSTRIA CULTURAL E DIVERSIDADE NO BRASIL

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ponde a quase 90% da população brasileira. Comparando, espantasaber que apenas 123,2 milhões de brasileiros moram em casascom rede de esgoto — assim, é possível supor que cerca de 40 mi-lhões de pessoas têm tevê a cores em casa, mas não têm acesso asaneamento básico.

O poder de penetração da televisão é, portanto, muito alto.Nem se compara, por exemplo, com o dos jornais. Em 2007, aFolha de S.Paulo, o maior jornal comercial do país, teve uma tira-gem média pouco superior a 300 mil exemplares por dia, de acor-do com o IVC (Instituto Verificador de Circulação), totalizando pou-co mais de dois milhões de jornais por semana. Só como parâmetrode comparação, o jornal evangélico Folha Universal, publicação se-manal da Igreja Universal do Reino de Deus, detém a maior tira-gem absoluta do país: 2,3 milhões de exemplares.

Um aspecto fundamental para entender o funcionamento daindústria cultural nos meios de comunicação é saber que elesvivem principalmente da publicidade. Teixeira Coelho afirma que:

Além da dependência em relação à publicidade, os meios decomunicação brasileiros ainda sofrem com a dependência tecno-lógica e informativa. Em seus estudos, o jornalista e professorJosé Marques Melo mostra que 75% das emissoras de televisão“importaram recursos técnicos diretamente dos EUA”. Além disso,emissoras regionais e jornais de cidades pequenas costumam re-produzir notícias de agências (nacionais ou internacionais), deixan-do de lado a produção de reportagens que, de fato, interessem àpopulação daquela região. Trata-se, pois, de uma forma de “colo-nialismo cultural”.

Nesse universo, os livros surgem como uma possibilidade deresistir à dominação cultural. É claro que nem todos os livros àvenda fogem à lógica da indústria cultural: há autores que tudofazem apenas para vender, assim como editoras especializadas emlançar obras para o grande público. Mas o fato é que uma bibliote-ca ou uma livraria oferecem opções de escolha mais amplas queos jornais impressos, o rádio ou a televisão. Mas o brasileiro aindalê pouco: 1,3 livro por ano, segundo a pesquisa “Retratos da Lei-tura no Brasil”, feita pelo Ibope em 2007 com pessoas que nãoestão mais na escola. Já os estudantes leem 7,2 livros por ano.Desses, 5,5 são didáticos ou indicados pela escola; apenas 1,7 élido por escolha própria.

Outros dados da pesquisa que merecem destaque são:

• 46% dos estudantes do país dizem não frequentar bibliotecas;• o Brasil possui 36 milhões de compradores de livros e, entre

eles, a média é de 5,9 exemplares adquiridos por ano;• 67% dos entrevistados afirmaram que sabem da existência

de uma biblioteca pública em sua cidade, mas 73% declara-ram que não costumam usar o serviço;

• 8% dos brasileiros, cerca de 15 milhões de pessoas, não têmnenhum livro em casa.

A LUTA CONTRA A INDÚSTRIA CULTURAL:O ENRAIZAMENTO

Num mundo de grandes mídias e poucos livros, em que o nú-mero de produtores culturais é muito menor que o de receptorese em que as informações em larga escala solapam a diversidade,há uma constante luta de certas comunidades para manter seuscostumes, suas tradições, seus valores. É o enraizamento.

A filósofa francesa Simone Weil o define como “a necessidademais importante e mais desconhecida da alma humana e uma dasmais difíceis de definir. O ser humano tem uma raiz por sua par-ticipação real, ativa e natural na existência de uma coletividade queconserva vivos certos tesouros do passado e certos pressentimen-tos do futuro”.

A professora de Psicologia social Ecléa Bosi salienta que o en-raizamento não pressupõe xenofobia ou coisa do gênero. Não setrata de “isolar um meio social de influências externas”, até por-que isso seria impossível. O enraizamento é uma forma de prote-ger uma cultura de ser dominada e destruída sumariamente, comoaconteceu com os índios em várias partes do continente ameri-cano. A professora acredita que a “conquista colonial causa desen-raizamento e morte com a supressão brutal das tradições. A con-quista militar, também. Mas a dominação econômica de uma re-gião sobre outra no interior de um país causa a mesma doença.Age como conquista colonial e militar ao mesmo tempo, destruin-do raízes, tornando os nativos estrangeiros em sua própria terra”.

É instigante essa ideia de pessoas se sentirem estrangeiras emseu próprio país. Isso pode acontecer (e acontece) quando o indiví-duo participa de um universo cultural diferente daquele “vendido”pelos meios de comunicação. É certo que podemos creditar issoao mundo globalizado, como se fosse impossível reverter esse qua-dro de padronização. Mas é igualmente certo que há diversas or-ganizações (governamentais e não governamentais) que se esfor-çam para garantir a preservação da diversidade cultural.

A CONTRACULTURA COMO FORMADE RESISTÊNCIA

Na contramão da indústria cultural, encontramos ainda a con-tracultura. Esse termo, surgido nos anos 60, designa a posturadaqueles que acreditam no poder transformador da cultura popu-lar e das criações particulares e espontâneas, e em sua capacidadede transgressão. A contracultura nasce como reação, sobretudo, àcultura de massa, ao consumismo capitalista e à padronização cul-tural imposta pelas classes dominantes.

A definição de contracultura do Dicionário Houaiss é interes-sante: “subcultura que rejeita e questiona valores e práticas da cul-tura dominante da qual faz parte”. O termo subcultura indicaque a contracultura só existe como negação, como rejeição dos va-lores institucionalizados. Além disso, ela só existe porque reconhe-ce esses valores institucionalizados, ainda que seja para refutá-los.

A Beat generation (ao pé da letra, “Geração perdida”) nos Es-tados Unidos, o Maio de 68 na França, a Primavera de Praga naantiga Tchecoslováquia e o movimento hippie, que tanto influen-ciaram o comportamento dos jovens brasileiros da época, podemser considerados exemplos de contracultura. Trata-se de movi-mentos minimamente organizados e estruturados, que passam afuncionar como uma alternativa à cultura dominante, negando a

os jornais brasileiros têm na publicidade mais de 80% do seu fa-turamento, enquanto TVs e rádios dela dependem em 100% — eboa parcela dessa publicidade, especialmente para os jornais,vem de órgãos dos governos municipal, estadual e federal, o querevela de imediato a grande dependência desses veículos emrelação a seus anunciantes “comerciais” ou “ideológicos”.

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dominação exercida pela burguesia ou pelas elites intelectuais eexprimindo as aspirações e os sonhos de uma parte da populaçãoque não se sente representada pelo establishment (ou seja, pelaordem ideológica, pelas pessoas e valores estabelecidos, vistoscomo socialmente distintos).

O espírito contestador da contracultura encontra solo fértilsobretudo nos jovens, que, de um modo geral, mostram-se maisdispostos a transgredir as normas sociais impostas pela padro-nização cultural, o que tem reflexos sobre a maneira de vestir, oshábitos sexuais, os gostos musicais, as gírias utilizadas, etc.

Não deixa de ser interessante que a cultura dominante, quan-do não pode mais fechar os olhos para esse espírito contestadordos jovens, acabe apropriando-se dele. Assim, o estilo de roupausado por punks ou hippies passa a ser “vendido” em lojas de grife;o rap, a música de protesto dos negros oprimidos nos EstadosUnidos, embala as elites em casas noturnas da moda; o grafite viraobra artística exibida em museus. Eis um fenômeno curioso de acul-turação, em que a contracultura é absorvida pelo poder estabe-lecido.

Exercício(UEL) “A indústria cultural vende Cultura. Para vendê-la, deveseduzir e agradar o consumidor. Para seduzi-lo e agradá-lo,não pode chocá-lo, provocá-lo, fazê-lo pensar, fazê-lo ter in-formações novas que perturbem, mas deve devolver-lhe, comnova aparência, o que ele sabe, já viu, já fez. A ‘média’ é osenso comum cristalizado que a indústria cultural devolve comcara de coisa nova [...]. Dessa maneira, um conjunto de pro-gramas e publicações que poderiam ter verdadeiro significadocultural tornam-se o contrário da Cultura e de sua democrati-zação, pois se dirigem a um público transformado em massainculta, infantil, desinformada e passiva.”

CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. 7. ed. São Paulo:Ática, 2000. p. 330-333.

Com base no texto e nos conhecimentos sobre meios decomunicação e indústria cultural, considere as afirmativas aseguir.

I. Por terem massificado seu público por meio da indús-tria cultural, os meios de comunicação vendem produ-tos homogeneizados.

II. Os meios de comunicação vendem produtos culturaisdestituídos de matizes ideológicos e políticos.

III. No contexto da indústria cultural, por meio de proces-sos de alienação de seu público, os meios de comuni-cação recriam o senso comum enquanto novidade.

IV. Os produtos culturais com efetiva capacidade de demo-cratização da cultura perdem sua força em função dopoder da indústria cultural na sociedade atual.

Estão corretas apenas as afirmativas:a) I e II.b) I e III.c) II e IV.d) I, III e IV.e) II, III e IV.

• Resolva os exercícios a seguir.

1. (UEL) Segundo Adorno e Horkheimer, “a indústria cultural pode seufanar de ter levado a cabo com energia e de ter erigido em princípioa transferência muitas vezes desejada da arte para a esfera do con-sumo, de ter despido a diversão de suas ingenuidades inoportunas ede ter aperfeiçoado o feitio das mercadorias”.

ADORNO, T.; HORKHEIMER, M. Dialética do esclarecimento.Tradução de Guido Antonio de Almeida. Rio de Janeiro: Zahar,

1985. p. 126.

Com base nessa passagem e nos conhecimentos sobre indústriacultural em Adorno e Horkheimer, é correto afirmar:a) A indústria cultural excita nossos desejos com nomes e imagens

cheios de brilho a fim de que possamos, por contraste, criticarnosso cinzento cotidiano.

b) A fusão entre cultura e entretenimento é uma forma de valorizara cultura e espiritualizar espontaneamente a diversão.

c) A diversão permite aos indivíduos um momento de ruptura comas condições do trabalho sob o capitalismo tardio.

d) Os consumidores têm suas necessidades produzidas, dirigidase disciplinadas mais firmemente quanto mais se consolida a in-dústria cultural.

e) A indústria cultural procura evitar que a arte séria seja absorvidapela arte leve.

2. (UEL) “Art. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dosdireitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiaráe incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais.§1º- O Estado protegerá as manifestações das culturas populares,indígenas e afro-brasileiras e das de outros grupos participantes doprocesso civilizatório nacional.”

BRASIL. Constituição [1988]. Constituição da República Federativado Brasil. 31 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 134.

É correto afirmar que no artigo transcrito a Constituição Federala) reconhece a existência da diversidade cultural e da pluralidade

étnica no país.b) impõe restrições para o exercício da interculturalidade.c) propõe um modelo para apresentação de projetos culturais.d) orienta o processo de homogeneização e padronização cultural.e) estimula o investimento estatal que visa evitar o hibridismo cul-

tural.

• Resolva os exercícios a seguir.

1. (UEL) Leia o texto a seguir.

[...] Como observam os pesquisadores do Instituto deEstudos Avançados da Cultura da Universidade de Virgínia, osexecutivos globais que entrevistaram “vivem trabalhando nummundo feito de viagens entre os principais centros metropo-litanos globais — Tóquio, Nova York, Londres e Los Angeles.Passam não menos do que um terço de seu tempo no exterior.Quando no exterior, a maioria dos entrevistados tende a in-teragir e socializar com outros globalizados... Onde quer quevão, hotéis, restaurantes, academias de ginásticas, escritóriose aeroportos são virtualmente idênticos. Num certo sentidohabitam uma bolha sociocultural isolada das diferenças maisásperas entre diferentes culturas nacionais... São certamentecosmopolitas, mas de maneira limitada e isolada”. [...] A mes-mice é a característica mais notável, e a identidade cosmo-

Tarefa Complementar

Tarefa Mínima

ORIENTAÇÃO DE ESTUDO

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polita é feita precisamente da uniformidade mundial dos pas-satempos e da semelhança global dos alojamentos cosmo-politas, e isso constrói e sustenta sua sucessão coletiva em re-lação à diversidade dos nativos. Dentro de muitas ilhas do ar-quipélago cosmopolita, o público é homogêneo, as regras deadmissão são estrita e meticulosamente (ainda que de modoinformal) impostas, os padrões de conduta precisos e exigen-tes, demandando conformidade incondicional. Como todas as“comunidades cercadas”, a probabilidade de encontrar umestrangeiro genuíno e de enfrentar um genuíno desafio cul-tural é reduzida ao mínimo inevitável; os estranhos que nãopodem ser fisicamente removidos por causa do teor indispen-sável dos serviços que prestam ao isolamento e autoconten-tação ilusória das ilhas cosmopolitas são culturalmente elimi-nados — jogados para o fundo “invisível” e “tido como certo”.

BAUMAN, Zygmunt. Comunidade: a busca por segurança atual. Rio de Janeiro: Zahar, 2003. p. 53-55.

De acordo com o texto, é correto afirmar que a globalização estimuloua) a disseminação do cosmopolitismo, que rompe as fronteiras

étnicas, quando todos são viajantes.b) um novo tipo de cosmopolitismo, que reforça o etnocentrismo

de classe e de origem étnica.c) a interação entre as culturas nativas, as classes e as etnias, alar-

gando o cosmopolitismo dos viajantes de negócio.d) o desenvolvimento da alteridade através de uma cultura cos-

mopolita dos viajantes de negócios.e) a emergência de um novo tipo de viajantes de negócios, envol-

vidos com as comunidades e culturas nativas dos países ondese hospedam.

2. (UEL-adaptada) As relações amorosas, após os anos de 1960/1980,tenderam a facilitar os contatos feitos e desfeitos imediatamente,gerando uma gama de possibilidades de parceiros e experimentosde prazer. Essa forma de contato amoroso tem sido denominadapelos jovens de “ficar”. Assim, em uma festa pode-se “ficar” comvários parceiros ou durante um tempo “ir ficando” em diferentessituações, sem que isso se configure em compromisso, namoroou outra modalidade institucional de relação. Os processos sociaisque provocaram as mudanças nas relações amorosas, bem comosuas consequências para o indivíduo e para a sociedade, têm sidoproblematizados por vários cientistas sociais.

Assinale a alternativa em que o texto explica o sentido das relaçõesamorosas descritas acima.

a) “Hoje as artes de expressão não são as únicas que se propõemàs mulheres; muitas delas tentam atividades criadoras. A situaçãoda mulher predispõe-na a procurar uma salvação na literatura e naarte. Vivendo à margem do mundo masculino, não o apreende emsua figura universal e sim através de uma visão singular; ele é,para ela, não um conjunto de utensílios e conceitos e sim umafonte de sensações e emoções; ela interessa-se pelas qualidadesdas coisas no que têm de gratuito e secreto [...].”

BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo. 5 ed.São Paulo: Nova Fronteira, 1980. p. 473.

b) “Hoje, no entanto, existe uma renovação, o que significa dizer queos cientistas, quando chegam através do seu conhecimento aesses problemas fundamentais, tentam por si próprios compreen-dê-los e fazem um apelo à sua própria reflexão. Nos próximosanos, por exemplo, após as experiências do Aspecto, a discussãosobre o espaço e sobre o tempo — problemas filosóficos — vaiser retomada.”

MORIN, Edgar. A inteligência da complexidade. 2. ed.São Paulo: Petrópolis, 2000. p. 37.

c) “Nova era demográfica de declínio populacional não catastróficapode estar alvorecendo. Fome, epidemias, enchentes, vulcões eguerras cobraram seu preço no passado, mas que grandes popu-lações não se reproduzam, por escolha individual, é uma mu-dança histórica notável. Na Europa Ocidental, esse padrão estáse estabelecendo em tempos de paz, sob condições de grandeprosperidade, embora sejam ainda visíveis oscilações conjuntu-rais, significativas na depressão escandinava do início dos anosde 1990.”

THERBORN, Göran. Sexo e poder. São Paulo: Contexto, 2006. p. 446.

d) “É assim numa cultura consumista como a nossa, que favore-ce o produto para o uso imediato, o prazer passageiro, a satis-fação instantânea, resultados que não exijam esforços prolon-gados, receitas testadas, garantias de seguro total e devoluçãodo dinheiro. A promessa de aprender a arte de amar é a oferta(falsa, enganosa, mas que se deseja ardentemente que sejaverdadeira) de construir a ‘experiência amorosa’ à semelhançade outras mercadorias, que fascinam e seduzem exibindo to-das essas características e prometem desejo sem ansiedade,esforço sem suor e resultados sem esforço.”

BAUMAN, Zygmunt. Amor líquido. Rio de Janeiro: Zahar, 2004. p. 21-22.

e) “Viver na grande metrópole significa enfrentar a violência queela produz, expande e exalta, no mesmo pacote em que gerae acalenta as criações mais sublimes da cultura. [...] Nessesentido, talvez a primeira violência de que somos vítima, já noinício do dia, é o jornalismo, sempre muito sequioso de retratare reportar, nos mínimos detalhes, o que de mais contundentee chocante a humanidade produziu no dia anterior [...].”

NAFFAH NETO, A. Violência e ressentimento. In: CARDOSO, I. et al [Orgs.]. Utopia e mal-estar na cultura. São Paulo: Hucitec, 1997. p. 99.

3. (UEL) Leia, a seguir, texto sobre o significado do Zapatismo.

Marcos é gay em São Francisco, negro na África do sul,asiático na Europa, chicano em San Isidoro, anarquista naEspanha, palestino em Israel, indígena nas ruas de San Cris-tóbal... judeu na Alemanha... feminista nos partidos políticos,comunista no pós-Guerra Fria... pacifista na Bósnia... artistasem galeria, nem portfólio, dona de casa sábado à noite emqualquer colônia de qualquer cidade de qualquer México...machista no movimento feminista, mulher sozinha no metrôàs 10 da noite... camponês sem terra, editor marginal, operáriodesempregado, médico sem lugar para trabalhar, estudantenão conformista, dissidente no neoliberalismo, escritor semlivros nem leitores e, seguramente, zapatista no sudeste mexi-cano.

CECEÑA, A. E. Pela humanidade e contra o neoliberalismo: linhas cen-trais do discurso zapatista. In: SEOANE, J.; TADDEI, E. [Orgs.].

Resistências mundiais, de Seattle a Porto Alegre. Petrópolis: Vozes,2001. p. 187-188.

Com base no texto e nos conhecimentos sobre o tema, é corretoafirmar que o zapatismo é um movimento:a) Que atua internacionalmente em diversas frentes voltadas à

emancipação dos Estados Nacionais.b) Fundado na contraposição a qualquer forma de opressão.c) Moderno porque visa à ruptura com os tradicionais preceitos

de esquerda.d) Que organiza os desempregados do mundo inteiro visando à

conquista do poder estatal.e) Que visa a armar a população para um enfrentamento bélico

com o poderoso vizinho do Norte.

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INTRODUÇÃOA palavra “erudito” vem do latim eruditus, usada para desig-

nar “aquele que obteve instrução”, que é “conhecedor, sábio”. Nomundo capitalista, obtêm instrução, sobretudo, os membros dasclasses dominantes. Daí a conclusão de que a cultura erudita é acultura das elites, imposta ao restante da sociedade como sinôni-mo de “bom gosto”, de “alto nível”, de “requinte”, de “sofisticação”.

Não há transgressão na cultura erudita. Ao contrário, existeuma tentativa de manutenção do status quo, dos valores consagra-dos que garantem o reconhecimento social. Mesmo quem não per-tence ao grupo dos “eruditos” (ou seja, a maior parte da popu-lação) costuma valorizar essa cultura. É como se o fato de ir a con-certos ou conhecer os grandes nomes da Filosofia pudesse levar osujeito a ascender socialmente. Assim, o desejo pela cultura eru-dita apenas esconderia o desejo da ascensão social.

A CULTURA POPULAR E A CULTURA DE MASSAMas há outro tipo de cultura, como aponta o pesquisador cul-

tural e urbanista Antonio Augusto Arantes, que existe “em con-traste ao saber culto dominante”. Trata-se da cultura popular. Oprofessor e sociólogo Waldenyr Caldas vai mais longe, afirmandoque ela “se realiza fora do universo acadêmico e das instituiçõescientíficas”. Talvez por isso seu raio de alcance seja tão amplo. Defato, ainda de acordo com Arantes, a cultura popular:

No primeiro caso, considera-se a cultura popular como anegação do Saber ou, pelo menos, como a valorização de sa-beres diferentes daqueles celebrados pela ciência ou pelas uni-versidades. O popular é o que está nas ruas, nos pontos deônibus, nos bancos de praça, nas plantações de cana, no sertão.Nem sempre essa forma de cultura está compendiada noslivros. Muito dela é transmitida oralmente.

No segundo caso, atribui-se à cultura popular um papeltransformador na sociedade, como se ela pudesse “desmontaro senso comum social”, nas palavras de Marilena Chauí. A cul-tura erudita precisaria ser combatida, da mesma forma que asclasses que a produziram. Dessa maneira, a justiça social come-çaria com a celebração da cultura popular, numa busca de novosparadigmas, novos juízos de valor, novos gostos, diferentes da-quilo que se vê habitualmente na sociedade. A revolução socialseria, assim, iniciada pela via cultural.

Por outro lado, dentro da cultura popular podemos ainda re-conhecer a existência da cultura de massa. Por meio dela, certosobjetos culturais — que podem até originar-se da cultura erudita— são transformados em mercadorias para consumo em grandeescala, como se fossem um sabonete ou um aparelho de DVD.

CULTURA POPULAR E FOLCLORESão extremamente ricas as manifestações da cultura popu-

lar no Brasil. Principalmente a cultura dita “de raiz”, mais autên-tica — pois menos influenciada pela padronização imposta pelasociedade capitalista —, assume muitas nuances diferentes aolongo de nosso vasto território.

Dentro do amplo universo em que se constitui a culturapopular, podemos dar destaque ao que chamamos de folclore.Nascido da junção de duas palavras inglesas — folk (“povo”,“nação”, “raça”) e lore (“ensinamento”, “instrução”, “lição”) —,esse termo foi criado na Inglaterra para designar a “sabedoriapopular”, em oposição à cultura erudita. Aos poucos, passou-sea empregar a palavra em outros idiomas.

Atualmente, chamamos de folclore, de acordo com o Dicio-nário Houaiss, o “conjunto de costumes, lendas, provérbios, ma-nifestações artísticas em geral, preservado, através da tradiçãooral, por um povo ou grupo populacional”. Assim, toda manifes-tação folclórica pode ser considerada parte da cultura popular, masnem toda cultura popular é folclórica.

O folclore é a memória cultural mais remota de um povo.Transmitidas de geração para geração, oralmente, por centenas eaté milhares de anos, essas tradições (que envolvem narrativaspopulares, lendas, pratos típicos, danças, festas, rituais religiosos,expressões artísticas) fazem parte de uma espécie de “inconscientecoletivo” de um país, de uma região. A questão é: como fazer(principalmente numa sociedade em que tudo parece estar fadadoao descarte, à banalização) para que essas tradições não se trans-formem em “verbete de dicionário” e para que continuem a fazerparte da dinâmica cultural da sociedade?

CULTURA BRASILEIRA “TIPO EXPORTAÇÃO”Pensemos num prato típico brasileiro (como a feijoada) ou nu-

ma festa (como a de São João). É difícil imaginar que algum bra-sileiro — salvo em condições de extrema exclusão — nunca tenhaprovado feijoada ou nunca tenha ido a uma festa junina. Ninguémprecisa de uma aula, de um livro ou de um programa de televisãopara conhecer essas manifestações, que podem ser consideradassímbolos de nossa cultura e ajudam a construir a identidadenacional.

No entanto, embora as tradições de uma cultura existam inde-pendentemente da sociedade midiática, a verdade é que a ideolo-gia dominante costuma se apropriar delas, transformando-as emproduto de consumo. Assim, na maior parte das vezes, a indústriacultura age de modo a transformar o que era uma tradição em umestereótipo, um produto padronizado — daí se falar em cultura“tipo exportação” ou, popularmente, em cultura “para inglês ver”.Trata-se de um fenômeno comum no mundo capitalista.

Quando uma determinada manifestação cultural, ainda quenão tenha se originado das classes dominantes, passa a fazer parteda memória coletiva e não há como desprezá-la, as elites socioeco-nômicas se apoderam dela e passam a tratá-la como mercadoria.Isso explica a exploração que o turismo, por exemplo, faz da cul-

remete (…) a um amplo espectro de concepções e pontos de vistaque vão desde a negação (implícita ou explícita) de que os fatospor ela identificados contenham alguma forma de “saber”, até oextremo de atribuir-lhes o papel de resistência contra a domi-nação de classe.

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Atividade 12BRASIL: DA CULTURA POPULAR AO POP

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tura popular: uma manifestação cultural viva, alicerce de uma iden-tidade, transforma-se em possibilidade de lucro. Não se pode negaro valor de iniciativas para a valorização e a divulgação da culturanacional — das quais a atividade turística pode ser um exemplo.Entretanto, deve-se atentar para que essas mesmas iniciativas nãoresultem na mercantilização da cultura popular, restringindo-a ape-nas ao objetivo de agradar ao “grande público”, e tirando dela apossibilidade de reinventar-se.

O CARNAVAL A SERVIÇO DAINDÚSTRIA CULTURAL

Praticamente todos concordam que o carnaval — cujas ori-gens remontam à Antiguidade clássica — parece ter se abrasi-leirado ao longo dos séculos, transformando-se na mais emble-mática manifestação cultural brasileira. Das escolas de samba doRio de Janeiro aos bonecos de Olinda, passando pelos trios elétri-cos de Salvador e pelas festas de rua de tantas outras cidades, ocarnaval brasileiro é internacionalmente conhecido e, ao lado dofutebol, contribuiu para a construção de uma imagem de país.

Sem negar a riqueza do carnaval brasileiro, em toda sua diver-sidade e vitalidade, deve-se questionar até que ponto essa manifes-tação cultural não tem sido “engolida” pelo sistema capitalista.Senão vejamos: o espírito do carnaval sempre foi a liberdade. Emsua origem e por séculos, durante a festa o que ocorria era a anu-lação das fronteiras de classe, de etnia, de idade — a isso se chamacarnavalização; no carnaval, as pessoas se tornam, simultanea-mente, espectadoras e artistas; não há regras, não há padrões aserem seguidos, não há coerções sociais — trata-se de um breveperíodo em que, momentaneamente, “tudo” é permitido.

Nos morros do Rio ou nas ruas de Salvador, por exemplo, ocarnaval sempre foi uma festa do povo. Hoje, porém, há horáriospara os desfiles, paga-se — e paga-se caro — para participar deles.Muitos, por falta de recursos, ficam apenas na posição de espec-tadores. Em Salvador, ou em outras cidades que aderiram às mi-caretas — ou carnaval fora de época —, só pode “correr” atrás dostrios quem está devidamente uniformizado. Não fica difícil perce-ber que a festa transformou-se num verdadeiro negócio, movimen-tando milhões de reais por ano. Nesse contexto há pouco espaçopara a liberdade e, principalmente, para a participação popular.

Pode-se argumentar que essa espetacularização do carnavalé benéfica para nossa cultura, pois o fato de ela se tornar cada vezmais conhecida poderia, em tese, servir para reforçar nossa iden-tidade. Porém, quando a sociedade de consumo incorpora a culturapopular (e isso tem ocorrido sistematicamente), esta acaba porperder sua autenticidade e legitimidade.

O sociólogo Carlos Nelson Coutinho aponta que “a generaliza-ção da ‘lógica’ capitalista e monopolista no plano da cultura provo-ca um espontâneo privilegiamento do valor de troca sobre o valorde uso dos objetos culturais, o que abre caminho para a criação edifusão de uma pseudocultura de massa que, transmitindo valoresalienados, serve como instrumento de manipulação das consciên-cias a serviço da reprodução do existente”.

Portanto, ao contrário do que se poderia imaginar numaprimeira análise, a exploração midiática do carnaval não é umaforma de democratização da cultura. Ao contrário disso, ela des-caracteriza a festa popular, que perde sua essência libertária,tornando-se “reprodução do existente”, e não mais produção deuma maneira particular de ver a realidade.

O BRASIL POPApesar de podermos apontar, como já fizemos acima, os

aspectos negativos da cultura de massa no Brasil, se conside-ramos que é impossível deixar de reconhecer sua existência nomundo contemporâneo, seria o caso de também apontar algu-mas particularidades positivas da cultura pop brasileira.

Já dissemos que, muitas vezes, a dominação econômica de umpaís por outro gera efeitos sobre a cultura. Veja-se o caso do cine-ma de Hollywood, que divulga os valores norte-americanos (o american way of life) por todo o planeta, transformando os seusatores em celebridades mundiais. Com a música, ocorre fenômenosemelhante: uma grande banda americana ou inglesa lança umdisco novo, e este rapidamente “vira febre” em muitos países.

No Brasil, porém, as coisas não são bem assim. Por incrívelque pareça, há uma cultura de massa nacional que chega a ri-valizar com a estrangeira.

No “Relatório do Desenvolvimento Humano 2004”, da ONU,numa passagem intitulada “Globalização e escolha cultural”, afir-ma-se:

Já no caso do Brasil, dos três filmes mais vistos na história docinema brasileiro, ao lado de Tubarão (1975) e de Titanic, está onacional Dona Flor e seus dois maridos, baseado no romance ho-mônimo de Jorge Amado. Dona Flor ficou à frente de clássicos docinema de entretenimento como O exorcista (1973), ET — o ex-traterrestre (1982) ou Ghost (1990). Mesmo filmes como Os Tra-palhões nas minas do Rei Salomão (1977) e Os Saltimbancos Tra-palhões (1981) levaram mais gente ao cinema do que fenômenosmundiais como Super-Homem (1978) e O Rei Leão (1994).

Na música, verifica-se fenômeno semelhante. Embora sejamuito difícil precisar quais são os discos mais vendidos de todos ostempos, uma vez que as gravadoras nem sempre divulgam essesdados oficialmente, números anteriores à “institucionalização” dapirataria de CDs mostram que nenhum disco estrangeiro chegaperto dos quatro maiores sucessos brasileiros:

O disco mais popular de todos os tempos no mundo (Thriller,lançado em 1982 por Michael Jackson) teria vendido, segundonúmeros extraoficiais, “apenas” um milhão de cópias no Brasil.

1º- Músicas para louvar o Senhor (1998), do Padre MarceloRossi: 3.228.468 cópias

2º- Xou da Xuxa 3 (1988): 3.216.000 cópias

3º- Leandro e Leonardo (1990): 3.145.814 cópias

4º- Só Pra Contrariar (1997): 2.984.384 cópiasFonte: Associação Brasileira de Produtores de Disco e Gravadoras.

De cada dez pessoas que saem de casa para ir ao cinema nomundo inteiro, 8,5 verão um filme dos Estados Unidos. De cadadez habitantes do planeta Terra, um assistiu à produção norte-americana Titanic (1997), o filme mais visto de todos os tempos.De cada US$10 que são gastos numa bilheteria de qualquerlugar do globo, US$3,5 vão para Hollywood.

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Exercício(UEL) Leia a letra da canção.

Tinha eu 14 anos de idade quando meu pai me chamouPerguntou-me se eu queria estudar filosofiaMedicina ou engenhariaTinha eu que ser doutorMas a minha aspiração era ter um violãoPara me tornar sambistaEle então me aconselhou:“Sambista não tem valor nesta terra de doutor”E eu, doutor, o meu pai tinha razãoVejo um samba ser vendido, o sambista esquecidoO seu verdadeiro autorEu estou necessitado, mas meu samba encabuladoEu não vendo não senhor!

Canção “14 anos”, de Paulinho da Viola,do álbum Na madrugada, 1966.

De acordo com a letra da canção, assinale a alternativa cor-reta.a) O sambista vê na comercialização do samba, ou seja, na

sua mutação em mercadoria, um processo que valorizamais o criador que a coisa produzida.

b) Os termos “sambista” e “doutor” servem para qualificare/ou desqualificar os indivíduos na rigorosa hierarquiasocial vigente no Brasil.

c) A filosofia, enquanto conhecimento humanístico voltadoà crítica social, é desqualificada em relação aos conhe-cimentos direcionados às profissões liberais.

d) Para o sambista, o valor objetivo da música como merca-doria, medido pelo reconhecimento econômico, é mais re-levante do que sua condição de criação artística subjetiva.

e) A expressão “terra de doutor” está relacionada à dissemi-nação generalizada dos cursos superiores no Brasil, res-ponsáveis por uma elevação do nível cultural dos setorespopulares.

• Resolva os exercícios a seguir.

1. (UEL-adaptada) Considere as afirmativas sobre os movimentos cul-turais do século XX.

I. O movimento hippie realizou uma crítica à sociedade de consu-mo, ao modelo industrial de produção e à ideologia do sucessoindividual a qualquer preço.

II. Jovens rebeldes russos, influenciados pelo movimento de guerri-lha latino-americana de inspiração guevarista, iniciaram a Glasnoste a Perestroica.

III. Estudantes e operários em Paris, no ano de 1968, realizaram umarevolta criativa e espontânea, contestando o sistema político tra-dicional.

IV. O movimento da Jovem Guarda no Brasil foi criado para comba-ter os efeitos contestadores da Tropicália, disseminando o lema“Brasil ame-o, ou deixe-o”.

Assinale a alternativa que contém todas as afirmativas corretas.a) I e III. d) I, II e IV.b) I e IV. e) II, III e IV.c) II e III.

2. (UEL) “A falta de coesão em nossa vida social não representa, assim,um fenômeno moderno. E é por isso que erram profundamente aque-les que imaginam na volta à tradição, a certa tradição, a única defesapossível contra nossa desordem. Os mandamentos e as ordenaçõesque elaboram esses eruditos são, em verdade, criações engenhosasde espírito, destacadas do mundo e contrárias a ele. Nossa anarquia,nossa incapacidade de organização sólida não representam, a seu ver,mais do que uma ausência da única ordem que lhes parece neces-sária e eficaz. Se a considerarmos bem, a hierarquia que exaltam éque precisa de tal anarquia para se justificar e ganhar prestígio.”

HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo:Companhia das Letras, 1995. p. 33.

Caio Prado Júnior, Gilberto Freyre e Sérgio Buarque de Holanda sãointelectuais da chamada “Geração de 30”, primeiro momento da So-ciologia no Brasil como atividade autônoma, voltada para o conheci-mento sistemático e metódico da sociedade. Sobre as preocupaçõescaracterísticas dessa geração, considere as afirmativas a seguir.

I. Critica o processo de modernização e defende a preservaçãodas raízes rurais como o caminho mais desejável para a ordeme o progresso da sociedade brasileira.

II. Promove a desmistificação da retórica liberal vigente e a denún-cia da visão hierárquica e autoritária das elites brasileiras.

III. Exalta a produção intelectual erudita e escolástica dos bacha-réis como instrumento de transformação social.

IV. Faz a defesa do cientificismo como instrumento de compreen-são e explicação da sociedade brasileira.

Estão corretas apenas as afirmativas:a) I e III.b) I e IV.c) II e IV.d) I, II e III.e) II, III e IV.

3. (UEL-adaptada) Falando sobre a violência dos arrastões nas praias ca-riocas, Paulo Sérgio Pinheiro diz: “A síndrome da militarização avança.Além dos morros, as praias são agora territórios a ocupar militar-mente. A proposta do cerco das praias é tão absurda que talvez, como choque que se seguirá a essas propostas delirantes, caminhemospara uma melhor compreensão de um apartheid* que durante dé-cadas foi dissimulado no Rio de Janeiro. Em outubro de 1993, exata-mente como em 1992, novamente os jovens não brancos dos subúr-bios, numa delirante demonstração, ocupam o playground quase cen-tenário dos brancos e das classes médias: a invasão e ocupação daspraias pelos jovens negros e suburbanos, que querem se tornarvisíveis, geram o pânico na Zona Sul do Rio de Janeiro. Antonio Can-dido, recentemente, dizia que a ameaça da violência e do crime talvezconsiga gerar aquele instante de consciência e desencadeie as refor-mas que mais de meio século de revolução e protesto operário nãoconseguiram realizar aqui.”

ARAÚJO, Ângela M. C. [org.]. Trabalho, cultura e cidadania. São Paulo: Escrita, 1997. p. 208.

De acordo com o texto, é correto afirmar:a) A certeza da impunidade leva os jovens dos subúrbios à invasão

das praias da Zona Sul carioca.b) Os arrastões nas praias da Zona Sul, praticados pelos jovens

dos subúrbios, são exemplos de superação do apartheid social.c) As praias são cobiçadas como locais de exibicionismo pelos

jovens do subúrbio carioca.d) A violência, representada pela invasão das praias por jovens dos

subúrbios e pela presença do exército, é um fenômeno que podeestimular a reflexão e a ação sobre as desigualdades sociais.

e) A militarização das praias poderia ser a solução para eliminar oapartheid social, abrindo esse espaço de lazer aos jovens dossubúrbios.

* Apartheid: originalmente o termo se referia à segregação, aoisolamento entre as populações negras e a minoria branca naÁfrica do Sul, segregação estabelecida de forma oficial, lega-lizada.

Tarefa Mínima

ORIENTAÇÃO DE ESTUDO

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Page 44: Pre Vestibular Soc

• Resolva os exercícios a seguir.

1. (UEL) O texto que segue é do poeta cearense Antonio Gonçalves daSilva, o Patativa do Assaré, cantor do drama dos caboclos nordestinose dos pobres do Brasil.

Brasi de cima e Brasi de baxo

Meu compadre Zé Fulô,Meu amigo e companhero,Faz quage um ano que eu touNeste Rio de Janero;Eu saí do CaririMaginando que isto aquiEra uma terra de sorte,Mas fique sabendo tuQue a miséria aqui do SuÉ esta mesma do Norte.

Tudo o que procuro acho.Eu pude vê neste crima,Que tem o Brasi de BaxoE tem o Brasi de Cima.Brasi de Baxo, coitado!É um pobre abandonado;O de Cima tem cartazUm do otro é bem deferente:Brasi de Cima é pra frente,Brasi de Baxo é pra trás.

Aqui no Brasi de Cima,Não há dô nem indigença.Reina o mais soave crimaDe riqueza e de opulença;Só se fala de progresso, Riqueza e novo processoDe grandeza e produção.Porém, no Brasi de BaxoSofre a feme e sofre o machoA mais dura privação.

Patativa do Assaré. Cante lá que eu canto cá. 11. ed. Petrópolis: Vozes, 1978. p. 271-272.

Segundo a interpretação do poeta sobre o problema da pobreza, écorreto afirmar:a) A pobreza atinge principalmente os moradores da região Nor-

deste, chamada por ele de “Brasi de baxo”.b) Na origem da pobreza está o domínio do acaso e do azar, predo-

minando a riqueza em regiões privilegiadas como o Rio de Janeiro.c) A pobreza deve-se às diferenças de características pessoais (físi-

cas, psíquicas e raciais, entre outras) que existem entre os brasi-leiros do sul e os do norte.

d) No Brasil, a pobreza atinge tanto a população nordestina como ado sul do país, dividindo os brasileiros em duas categorias de pes-soas.

e) A pobreza no Nordeste e na região Sul do país decorre do mauaproveitamento dos seus recursos naturais e humanos.

2. (ENEM) Os textos referem-se à integração do índio à chamada civi-lização brasileira.

I. “Mais uma vez, nós, os povos indígenas, somos vítimas de umpensamento que separa e que tenta nos eliminar cultural, social efisicamente. A justificativa é a de que somos apenas 250 mil pes-soas e o Brasil não pode suportar esse ônus. (...) É preciso conge-

lar essas ideias colonizadoras, porque elas são irreais e hipócritase também genocidas. (...) Nós, índios, queremos falar, mas quere-mos ser escutados na nossa língua, nos nossos costumes.”Marcos Terena, presidente do Comitê Intertribal Articulador dos Direitos Indígenas

na ONU e fundador das Nações Indígenas. Folha de S.Paulo, 31 ago. de 1994.

II. “O Brasil não terá índios no final do século XXI. (...) E por queisso? Pela razão muito simples que consiste no fato de o índiobrasileiro não ser distinto das demais comunidades primitivasque existiram no mundo. A história não é outra coisa senão umprocesso civilizatório, que conduz o homem, por conta própriaou por difusão da cultura, a passar do paleolítico ao neolítico edo neolítico a um estágio civilizatório.”

Hélio Jaguaribe, cientista político. Folha de S.Paulo, 2 set. 1994.

Pode-se afirmar, segundo os textos, que:a) tanto Terena quanto Jaguaribe propõem ideias inadequadas, pois

o primeiro deseja a aculturação feita pela “civilização branca”, e osegundo, o confinamento de tribos.

b) Terena quer transformar o Brasil numa terra só de índios, poispretende mudar até mesmo a língua do país, enquanto a ideiade Jaguaribe é anticonstitucional, pois fere o direito à identi-dade cultural dos índios.

c) Terena compreende que a melhor solução é que os brancosaprendam a língua tupi para entender melhor o que dizem osíndios. Jaguaribe é de opinião que, até o final do século XXI, sejafeita uma limpeza étnica no Brasil.

d) Terena defende que a sociedade brasileira deve respeitar a culturados índios e Jaguaribe acredita na inevitabilidade do processo deaculturação dos índios e de sua incorporação à sociedade bra-sileira.

e) Terena propõe que a integração indígena deve ser lenta, gradativae progressiva, e Jaguaribe propõe que essa integração resulte dedecisão autônoma das comunidades indígenas.

3. (ENEM) A questão étnica no Brasil tem provocado diferentes ati-tudes:

I. Instituiu-se o "Dia Nacional da Consciência Negra" em 20 denovembro, ao invés da tradicional celebração do 13 de maio.Essa nova data é o aniversário da morte de Zumbi, que hojesimboliza a crítica à segregação e à exclusão social.

II. Um turista estrangeiro que veio ao Brasil, no carnaval, afirmouque nunca viu tanta convivência harmoniosa entre as diversasetnias.

Também sobre essa questão, estudiosos fazem diferentes reflexões:

Entre nós [brasileiros], (...) a separação imposta pelo siste-ma de produção foi a mais fluida possível. Permitiu constantemobilidade de classe para classe e até de uma raça para outra.Esse amor, acima de preconceitos de raça e de convenções declasse, do branco pela cabocla, pela cunhã, pela índia (...) agiupoderosamente na formação do Brasil, adoçando-o.

Gilberto Freyre. O mundo que o português criou.

[Porém] o fato é que ainda hoje a miscigenação não fazparte de um processo de integração das “raças” em condiçõesde igualdade social. O resultado foi que (...) ainda são pouconumerosos os segmentos da “população de cor” que con-seguiram se integrar, efetivamente, na sociedade competitiva.

Florestan Fernandes. O negro no mundo dos brancos.

Considerando as atitudes expostas em I e II e os pontos de vistados estudiosos, é correto aproximara) a posição de Gilberto Freyre e a de Florestan Fernandes igual-

mente às duas atitudes.b) a posição de Gilberto Freyre à atitude I e a de Florestan Fernan-

des à atitude II.c) a posição de Florestan Fernandes à atitude I e a de Gilberto Freyre

à atitude II.d) somente a posição de Gilberto Freyre a ambas as atitudes.e) somente a posição de Florestan Fernandes a ambas as atitudes.

Tarefa Complementar

SISTEMA ANGLO DE ENSINO 850092110 44 ANGLO VESTIBULARES

Page 45: Pre Vestibular Soc

Atividade 1

A

Atividade 2

D

Atividade 3

A

Atividade 4

D

Atividade 5

1. D

2. C

3. A

Atividade 6

1. B

2. B

Atividade 7

1. D

2. B

Atividade 8

1. D

2. E

Atividade 9

1. D

2. C

Atividade 10

1. D

2. D

Atividade 11

1. D

2. A

Atividade 12

1. A

2. C

3. D

Atividade 1

1. E

2. A

Atividade 2

1. C

2. D

Atividade 3

1. D

2. E

Atividade 4

1. E

2. E

Atividade 5

1. E

2. D

3. C

4. E

Atividade 6

1. D

2. C

Atividade 7

1. C

2. D

Atividade 8

1. C

2. D

3. D

Atividade 9

1. B

2. B

Atividade 10

1. D

2. B

Atividade 11

1. A

2. D

3. B

Atividade 12

1. D

2. D

3. C

Respostas das Tarefas ComplementaresRespostas das Tarefas Mínimas

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