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1 PRÁTICAS MUSEAIS DE PRESERVAÇÃO: DIGITALIZAÇÃO DAS IMAGENS E VALORIZAÇÃO DAS MEMÓRIAS (MHIF) Carla Thaís Rodrigues Rosa 1 Centro Universitário Franciscano [email protected] Franciele Roveda Maffi 2 Museu Histórico e Cultural Irmãs Franciscanas [email protected] Roselâine Casanova Corrêa 3 Centro Universitário Franciscano [email protected] RESUMO Abrangendo os vários momentos do cotidiano e a representação da cultura material, a fotografia nos permite ‘congelar’ um fragmento do tempo em um pedaço de papel. Atualmente, este processo pode ocorrer por meio de um dispositivo eletrônico, como as câmeras digitais e os telefones celulares. Por meio destes instrumentos, se permitirá momentos que reavivam ou instigam nossas memórias. Propõe-se neste artigo, demonstrar a importância que as imagens têm para a história, sobretudo enquanto fonte primária em pesquisas de diversas áreas. Pretende-se, ainda, demonstrar a preservação de objetos e memórias no Museu Histórico e Cultural das Irmãs Franciscanas (MHIF), no município de Santa Maria (RS). Neste acervo se aplicou a metodologia de informatização das coleções imagéticas e o acesso pelos recursos digitais. Palavras-chave: Fotografia; Acervo; Preservação. INTRODUÇÃO Ao longo de sua história, o Museu Histórico e Cultural das Irmãs Franciscanas (MHIF) acumulou um acervo fotográfico significativo, pelo conteúdo representado nas imagens. Também se destacou pela importância qualitativa e diversidade de temas. 1 Acadêmica do Curso de História do Centro do Centro Universitário Franciscano. 2 Diretora Técnica do Museu Histórico e Cultural das Irmãs Franciscanas (MHIF). 3 Professora Orientadora do Curso de História do Centro Universitário Franciscano.

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PRÁTICAS MUSEAIS DE PRESERVAÇÃO:

DIGITALIZAÇÃO DAS IMAGENS E VALORIZAÇÃO DAS MEMÓRIAS

(MHIF)

Carla Thaís Rodrigues Rosa1

Centro Universitário Franciscano

[email protected]

Franciele Roveda Maffi2

Museu Histórico e Cultural Irmãs Franciscanas

[email protected]

Roselâine Casanova Corrêa 3

Centro Universitário Franciscano

[email protected]

RESUMO

Abrangendo os vários momentos do cotidiano e a representação da cultura material, a

fotografia nos permite ‘congelar’ um fragmento do tempo em um pedaço de papel.

Atualmente, este processo pode ocorrer por meio de um dispositivo eletrônico, como as

câmeras digitais e os telefones celulares. Por meio destes instrumentos, se permitirá

momentos que reavivam ou instigam nossas memórias. Propõe-se neste artigo,

demonstrar a importância que as imagens têm para a história, sobretudo enquanto fonte

primária em pesquisas de diversas áreas. Pretende-se, ainda, demonstrar a preservação

de objetos e memórias no Museu Histórico e Cultural das Irmãs Franciscanas (MHIF),

no município de Santa Maria (RS). Neste acervo se aplicou a metodologia de

informatização das coleções imagéticas e o acesso pelos recursos digitais.

Palavras-chave: Fotografia; Acervo; Preservação.

INTRODUÇÃO

Ao longo de sua história, o Museu Histórico e Cultural das Irmãs Franciscanas

(MHIF) acumulou um acervo fotográfico significativo, pelo conteúdo representado nas

imagens. Também se destacou pela importância qualitativa e diversidade de temas.

1 Acadêmica do Curso de História do Centro do Centro Universitário Franciscano. 2 Diretora Técnica do Museu Histórico e Cultural das Irmãs Franciscanas (MHIF). 3 Professora Orientadora do Curso de História do Centro Universitário Franciscano.

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Deste acervo formou-se um tripé construído pelas religiosas, que estão associados aos

eixos: educação, saúde e assistência social.

No que se refere às imagens, buscou-se registrar os lugares que acolheram a

proposta das missões franciscanas, os trabalhos executados nas áreas profissionais e as

construções arquitetônicas. Na arquitetura destacam-se prédios públicos e privados.

Neste caso, se enfatiza os empreendimentos, como: o Hospital de Caridade Dr.

Astrogildo de Azevedo4 e a Faculdade Imaculada Conceição (FIC), atualmente o prédio

que abriga as instalações do Centro Universitário Franciscano (UNIFRA). Ainda,

menciona-se a relevância da Faculdade de Enfermagem intitulada de Nossa Senhora

Medianeira (FACEM), fundada em 1955, sendo a primeira do interior do estado

dedicada à formação do enfermeiro de “alto padrão”, como era conhecido

cientificamente à época.

Para esta produção, utilizou-se como referencial teórico, Reisewitz (2004),

autora que discute conceitos do direito ambiental e patrimônio cultural, tratando-se da

preservação da memória. Esta, considerada um elo para a construção da identidade do

povo brasileiro.

Sob a organização de Silva (1999), a obra intitulada Arquivos, Patrimônio e

Memória: trajetórias e perspectivas se tornou base para as atividades do projeto, tanto

no processo de acondicionamento dos acervos - sobretudo o fotográfico - quanto às

preposições de digitalização. Corroborando com as pesquisas, Telles (1977) em sua

obra, Manual do Patrimônio Histórico, auxilia na contextualização de memória, cultura

e monumentos, em especial na significação das fotografias, em conjunto com a memória

como um bem a priori cultural e material.

Primou-se por uma metodologia de trabalho baseada em diversas pesquisas

bibliográficas e eletrônicas que sugerem ensaios sobre a importância das fotografias

como fontes primárias e a valorização da memória de um determinado grupo ou

4 Hospital de Caridade Dr. Astrogildo de Azevedo (HCAA): A fundação do Hospital ocorreu em 17 de

Julho de 1798. As obras da construção iniciaram em 1899. O precursor do processo de criação foi o

Doutor Astrogildo de Azevedo, que, com o auxílio de doações da Comunidade de Santa Maria, construiu

o complexo hospitalar. As Irmãs Franciscanas foram convidadas a fazer parte da gestão do Hospital, onde

firmaram um contrato com cláusulas estabelecidas para que pudessem desempenhar a missão junto aos

pacientes e os setores que correspondem à organização do hospital. Foi inaugurado em 07 de Setembro de

1903 com grandes festividades, e aclamação do povo da Comarca (DALPIAN; MARQUES, 2008).

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sociedade. Além disso, como construção de um bem material, sobretudo enquanto

patrimônio, o legado deixado à sociedade. Em se tratando da preservação do

patrimônio, o MHIF incentivou - por meio de sua gestão - o processo de informatização

do acervo imagético, utilizando-se de ferramentas tecnológicas, que visam prolongar a

vida útil das imagens, sem danificá-las. Preocupou-se também em não interferir na

estrutura física das coleções, contribuindo com ações museais de conservação e a

perpetuação da história religiosa da instituição.

Por meio da conservação das coleções, foi possível manter as imagens

higienizadas e preservadas no que compete à estrutura física, e foram acondicionadas

em invólucros de papel de pH neutro, bem como separadas por temáticas. A

transferência do suporte manual para o digital facilitou o acesso ao acervo e permitiu

pesquisas acadêmicas, em cursos de graduação e pós-graduação, no Centro

Universitário Franciscano e no Programa de Patrimônio Cultural da Universidade

Federal de Santa Maria (UFSM).

1. O USO DAS FOTOGRAFIAS COMO FONTES PRIMÁRIAS: ABORDAGENS

TEÓRICAS

A pesquisa por meio de imagens ainda tem sofrido resistência por parte dos

pesquisadores, em especial no campo acadêmico-científico da História. A sua utilização

como fonte primária não é de toda aceita, uma vez que, para alguns, apresenta realidade

duvidosa. Segundo Burke,

num determinado nível, [...] imagens são fontes não confiáveis, distorcendo

espelhos. Contudo, elas compensam essa desvantagem ao oferecer

substancial evidência num outro nível, de tal forma que historiadores possam

transformar um defeito em uma qualidade (2004, p. 37).

Considerando que as fotografias com o recorte temporal da segunda metade do

século XX, sofreram uma interferência externa, seja pelo viés do fotógrafo ou da pessoa

que as encomendou. De fato, as fotografias não apresentam a realidade propriamente

dita, mas por meio de suas nuances e dos questionamentos acerca da fonte imagética, é

possível problematizá-la. Assim, o historiador tem por ofício levantar informações

sobre os aspectos da vida material, do período histórico, da sociedade em geral e suas

mazelas.

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Entretanto, segundo Burke as “imagens são feitas para comunicar” (2004, p. 43),

mas não propriamente em palavras, pois elas por si só são apenas imagens mudas. É

pertinente compreender e analisar as fotografias como um documento, uma fonte de

pesquisa primária e não como um anexo ou material de apoio. Ao analisar as imagens,

considera-se relevante destacar dois estudos bases: a iconografia e iconologia.

Na perspectiva empírica do conhecimento artístico, Paiva menciona iconografia,

como [...] “uma fonte histórica das mais ricas, que traz imbutida as escolhas do produtor

e todo o contexto no qual foi concebida, idealizada, forjada ou inventada” (2015, p. 17).

Também é o estudo em que se acham reproduzido as obras desta natureza: o conjunto

de imagens relativas a um assunto determinado. Por outro, viés é considerada a análise

descritiva da representação visual de símbolos e imagens, sem levar em consideração o

valor estético que possam ter. Em contrapartida, Panofsky apud Burke, afirma que na

iconografia, “as imagens são parte de toda uma cultura e não podem ser compreendidas

sem o conhecimento prévio daquela cultura” (2004, p. 46). Cultura por definição é todo

aquele complexo que implica o conhecimento, as artes, as leis, a moral, as crenças, os

costumes e hábitos adquiridos pelo indivíduo através da família ou do convívio em

sociedade. Para Telles,

cultura significa o cultivo ou aperfeiçoamento das faculdades físicas,

intelectuais e morais do homem, tudo aquilo que representa o domínio do

homem sobre si mesmo, toda a criação do homem que alcança autonomia em

relação a seu criador. Além disso, inseriríamos outro conceito: cultura seria a

aquisição e realização de ideais de verdade, de beleza e de realização (1997,

p. 09).

Ainda nesse contexto, Panofsky apud Burke (2004), afirma que na pintura da

‘Santa Ceia’ – Leonardo da Vinci em 1495, tendo um conhecimento prévio sobre o

tema, a maioria das pessoas saberá interpretar a obra pictórica. Entretanto, o mesmo não

ocorreria com aquele indivíduo que nunca esteve em contato com histórias bíblicas.

Neste caso, a pintura representaria apenas um alegre jantar festivo. Assim, ocorre com

as fotografias quando são utilizadas como fontes de pesquisa: se faz necessário possuir

uma informação primária acerca do tema tratado, direcionando claramente as perguntas

e a sua problematização. Para Panofsky

quando se trata da representação de temas outros que relatos bíblicos ou

cenas da história ou mitologia que, normalmente, são conhecidos pela media

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das "pessoas educadas", todos nós somos bosquímanos australianos. Nesses

casos, devemos também nós, tentar nos familiarizar com aquilo que os

autores das representações liam ou sabiam. No entanto, mais uma vez,

embora o conhecimento dos temas e conceitos específicos transmitidos

através de fontes literárias seja indispensável e suficiente para uma análise

iconográfica, não garante sua exatidão. É tão impossível, para nós, fornecer

uma análise iconográfica correta aplicando, indiscriminadamente, nosso

conhecimento literário aos motivos, quanto fornecer uma descrição pré-

iconográfica certa aplicando, indiscriminadamente, nossa experiência prática

às formas (1955. p. 59).

A utilização das fotografias como fontes de pesquisas é entendida sobre um

mesmo prisma, onde os teóricos Panofsky (1955) e Mauad (2008) concordam em alguns

aspectos. Para eles, é imprescindível o conhecimento empírico do tema (as) que permeia

a imagem. É fundamental que os elementos culturais conversem com as imagens, bem

como o conhecimento literário. Entretanto, dispor destes instrumentos não garante a

certeza de uma análise propriamente correta. Porém, é papel do historiador saber

problematizar a pesquisa através de elementos culturais, literários e iconográficos. Ou

seja, é o conjunto dos três elementos que transformará a fotografia em uma fonte

histórica. Nas palavras de Mauad,

[...] a compreensão da fotografia como uma mensagem significativa que se

processa através do tempo, dialogando reiteradamente com os elementos da

cultura material que a produz, demanda, por parte do historiador, um aparato

teórico-metodológico que a crítica tradicional não habilitava, obrigando-o ao

desenvolvimento de novos questionamentos e procedimentos em perfeita

coordenação com outros saberes (2008, p. 20).

É relevante analisar as fotografias, enquanto fontes primárias nas pesquisas

historiográficas, sobretudo na construção de uma identidade cultural, daí implicam-se as

várias temáticas abordadas no acervo imagético do MHIF.

Outro ponto consiste em dominar conceitos ligados a conservação preventiva,

pois as fotografias passaram pelo tratamento adequado, sendo que ao acondicioná-las e

preservá-las se estará garantindo a integridade física da coleção do MHIF. Portanto,

adotou-se uma metodologia com base na substituição do suporte manual para o

informatizado, alcançando um total de 771 imagens digitalizadas.

2. INFORMATIZAÇÃO DO ACERVO IMAGÉTICO NO MHIF: PRÁTICAS DE

PRESERVAÇÃO MUSEAL

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As fotografias são mais do que simples fragmentos do tempo eternizados em

um papel, consistem em documentos que nos remetem à (re) significação do passado,

sob um olhar do presente e o uso como fonte para pesquisas. Então, se torna

fundamental, a definição de padrões de qualidade na organização e conservação do

acervo imagético, sobretudo o fotográfico. Corroborando a preservação, o Museu

Histórico e Cultural das Irmãs Franciscanas (MHIF), adotou uma metodologia de

escaneamento das imagens fotográficas, onde se realizou a transferência do suporte

impresso para o digital. Isso é viável em decorrência do uso de um equipamento

tecnológico, intitulado de scanner modelo Epson Perfection V550. No aparelho

digitalizou-se uma quantidade de 737 fotografias e postais (figura 01; 02 e 03).

Figura 01- Estagiária preparando

fotografia para digitalização.

Fonte: Acervo Fotográfico MHIF, 2015.

Figura 02- Processo de escaneamento

Aparelho Epson Perfection V550.

Fonte: Acervo Fotográfico MHIF, 2015.

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O processo de informatização do acervo fotográfico é definido por Dollar,

como um método apropriado que visa prever medidas de acesso. Assim, entende-se por

[...] digitalização a tecnologia que torna uma fotografia eletrônica de um

documento em papel (textos, mapas, desenhos de engenharia, e outros

semelhantes) e armazena digitalmente num sistema computacional. Após sua

conversão em imagens eletrônicas, através de um scanner, esses documentos

são indexados, comprimidos e armazenados em discos digitais ópticos (1994,

p.14).

Após o processo de digitalização, as fotografias foram armazenadas em pastas

informatizadas e catalogadas, juntamente ao servidor da instituição, na mantenedora do

Museu, a SCALIFRA-ZN5, posteriormente divididas por áreas de atuação profissional:

assistência social; educação e saúde. Com isso, evidenciam-se as diversas temáticas

registradas por meio da fotografia ao longo do trabalho de evangelização das irmãs.

5 SCALIFRA- ZN: A mantenedora de educação Sociedade Caritativa e Literária São Francisco de Assis,

iniciou no Brasil em 16 de Maio de 1872, tendo inicialmente sua primeira sede situada em Porto Alegre e

posteriormente mudando-se para São Leopoldo. Sua fundadora e primeira presidente foi Madre Ludgera

Hellwig (DALPIAN; MARQUES, 2008).

Figura 03- Fotografia digitalizada e

informatizada.

Fonte: Acervo Fotográfico – MHIF, 2015.

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Posteriormente ao processo, realizou-se a higienização mecânica e o

acondicionamento do acervo fotográfico, utilizando-se de luvas tipo látex, máscara de

pó modelo 3M, avental de mangas longas, pincéis macios, pó de borracha ralada e

swab6. Para o acondicionamento adequado, realizou-se a confecção de invólucros de pH

neutro e se revestiu as caixas do mesmo material, que corresponde a 140 de gramatura.

Sucessivamente a essa etapa, se executou o tratamento das fotografias digitalizadas com

o apoio da ferramenta tecnológica chamada photoshop®, um programa de edição de

imagens. Para a correção digital, aplicou-se o uso das ferramentas de seleção

(laço/corte) e dos recursos que o programa disponibiliza: a pintura e edição

(carimbo/nitidez)7.

A mudança do suporte manual para o digital tem por principal finalidade corrigir

as imperfeições encontradas nas imagens e reavivar a nitidez das tonalidades.

O programa de photoshop® é elemento de apoio em pesquisas historiográficas e

iconográficas, pois as fotografias, ao serem tratadas, possibilitarão uma interpretação e

acesso ao acervo pelo recurso digital. Então, o tratamento digital consiste no processo

que visa realizar o aperfeiçoamento das imagens, por meio de ajustes do contraste,

nitidez e imperfeições contidas no suporte. Em virtude deste recurso foi possível

executar o preenchimento das manchas apresentadas, permitindo um emparelhamento

da imagem na integridade. A metodologia adotada pelo MHIF facilitará o acesso do

acervo à comunidade religiosa e acadêmica, por meio da mídia digital. Evidencia-se a

importância das fotografias não somente como documento, mas sim como um legado

passado de geração para geração. Este é o caso do acervo aqui tratado (MHIF), que visa

aprimorar o campo das pesquisas e a construção da memória institucional das Irmãs

Franciscanas.

3. MEMÓRIA E PATRIMÔNIO CULTURAL: DOIS CONCEITOS EM DISCUSSÃO

6 Swab: Haste em madeira com algodão na extremidade. Costuma-se utilizar o palito de churrasco ou

talher oriental (MANUAL DE HIGIENIZAÇÃO E ACONDICIONAMENTO - SDM, 2006). 7 A ferramenta carimbo é útil para duplicar objetos ou remover defeitos em imagens. O ajuste da nitidez

melhora a definição das arestas de uma imagem, independente se vem de uma câmera ou scanner

(VIEIRA, 2003).

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Considerando as correntes filosóficas, segundo Nicola Abbagnano (apud

REISEWITZ, 2004, p. 51), o ‘bem’ “[...] é a palavra tradicional para indicar o que, na

linguagem moderna, se chama valor”. Um livro, um documento, uma carta e mesmo

uma fotografia são considerados bens; os objetos adquirem essa definição agregados ao

conjunto de valores que atribuímos a eles. No acervo imagético do MHIF, sobretudo

com as fotografias, ocorre o mesmo. Portanto, a preservação torna-se essencial, quanto à

manutenção física das coleções. Na Constituição Federal8, Art. 216, o patrimônio

cultural brasileiro é definido por

[...] bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em

conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos

diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: I

– as formas de expressão; II – os modos de criar, fazer e viver; III – as

criações científicas, artísticas e tecnológicas; IV – as obras, objetos,

documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações

artístico-culturais; V – os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico,

paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.

Com referência ao acervo fotográfico do MHIF, pode-se incluí-lo no grupo II do

artigo supracitado, uma vez que nas imagens registradas nas missões franciscanas, foi

possível compreender o trabalho das religiosas, previamente a estrutura da comunidade

cristã. As fotografias são mais que simples imagens, são comunicações. Para Foucault

(apud BURKE, 2004, p. 43), “o que vemos nunca está no que dizemos”.

No cenário teórico, as fotografias são compreendidas como imagens-documentos e

imagens-monumentos. Assim, possuem uma historicidade, na qual esboçam formas de

conhecer e imaginar. A fotografia enquanto documento, assume o papel de fonte de

pesquisa, porém torna-se monumento enquanto patrimônio histórico. No MHIF, o

acervo passa a desempenhar uma função dúbia, de imagem documento e imagem

monumento, pois a fotografia é fonte primária (documento) e patrimônio (monumento).

Quando se trata do patrimônio monumento, destaca-se no acervo a representação

dos empreendimentos arquitetônicos, as missões em nível de Brasil e internacional9, em

8 Constituição Federal5: “A constituição Federal brasileira, promulgada em cinco de outubro de 1988,

positivou o direito à preservação ambiental considerando-o essencial à sadia qualidade de vida humana e

à manutenção da vida em todas as suas formas” (REISEWITZ, 2004, p. 03).

9 Guatemala: É o 3º maior país da América Central, com área de 108,8 quilômetros quadrados. A língua

oficial é o espanhol, mas há outros dialetos maias. Com quase quarenta anos vivendo os horrores de uma

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especial no município de Santa Maria (RS), onde é evidenciado o maior legado das

Irmãs Franciscanas, desde 1903. Além disso, as trajetórias e construções de valores,

tanto no âmbito social, quanto moral, religioso e ético.

As fotografias do MHIF não poderão ser classificadas como uma simples coleção

de objetos esquecidos pelo tempo. Trata-se de um patrimônio cultural que pertence à

memória das Irmãs Franciscanas. Há, portanto, a necessidade de dispor de padrões que

prime pela qualidade na guarda do acervo. Neste caso, o acondicionamento das imagens

deve obedecer às normas de preservação museológica e arquivística, respeitando e

mantendo a historicidade. O patrimônio como conceito de identidade (s) possui relações

sociais e culturais na formação de um grupo.

Dentro da sociedade contemporânea, pesquisadores e estudiosos, vem

demonstrando constante preocupação com o tema do patrimônio Cultural, onde se

introduz uma discussão reflexiva e inserida na concepção de uma nova abordagem

acerca da problemática da preservação. Portanto, na visão de Reisewitz caracteriza-se

patrimônio

o conjunto de bens de valor cultural sobre os quais recaem um

interesse difuso. A preservação, por exemplo, de um acervo cultural

pode interessar a um número indeterminado de pessoas, esteja ele sob

gerenciamento público ou privado (2004, p.100).

Diante da argumentação apresentada pela autora, pode-se constatar que o

patrimônio é definido pelos indivíduos, dentro de um processo seletivo, o que se

caracteriza bens culturais para alguns, para outros não tem importância histórica. Neste

caso, identifica-se o descaso em relação ao patrimônio da humanidade, pela falta de

conscientização em relação à preservação e manutenção por parte do poder público e às

vezes em esfera privada.

Neste contexto, tem-se outra visão de preservação, no que se refere ao patrimônio

religioso do Museu Histórico e Cultural das Irmãs Franciscanas, é definido como um

bem, no qual permite a compreensão de uma parcela significativa do cotidiano das

guerra civil, a Guatemala foi assolada pela miséria e fome. A história e vida das missionárias na

Guatemala surgem como uma tentativa de “resgate” ao povo guatemalteco que sofreram com os reflexos

pós – guerra (DALPIAN; MARQUES, 2008).

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religiosas, inseridas no seu tempo histórico, dentro de um contexto político e social.

Considerando Araújo & Batalha,

tomando como ponto de partida a noção do que sobrevive como memória

coletiva de tempos passados não é o conjunto dos monumentos e documentos

que existiram, mas o resultado de uma escolha efetuada pelos historiadores

ou forças que operaram em cada época histórica (1999, p. 65).

Na conjuntura do saber histórico, trabalhar a memória como elemento

constitutivo de uma pesquisa é de suma relevância. Contudo, deve-se identificá-la e

compreendê-la como elemento documental, que está além da epistemologia aplicada nas

ciências do conhecimento. As lembranças são sempre coletivas, mesmo quando vividas

solitariamente: o passeio em uma cidade, ao contemplar os lugares, se lembra de

histórias contadas e revividas por outras pessoas que passaram por ali e que, de alguma

maneira, foi transmitida para outras gerações.

Memória e patrimônio remetem ao conceito da trilogia: espaço, tempo e

lembrança. Assim, para Halbwachs,

[...] é justamente a imagem do espaço que, em função de sua estabilidade, nos

dá a ilusão de não mudar pelo tempo afora e encontrar passado no presente –

mas é exatamente assim que podemos definir a memória e somente o espaço

é estável o bastante para durar sem envelhecer e sem perder nenhuma de suas

partes (2015, p. 94).

O autor se refere à imagem do espaço como uma ilusão de estabilidades sem

transformações. Acrescenta-se que no processo de pertencimento há uma identidade. O

reconhecimento não se compõe apenas do espaço. Visto com o passar da temporalidade,

inevitavelmente o modifica. Então, o historiador deverá observar durante a pesquisa,

duas medidas: o tempo cronológico e tempo espacial.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A memória no âmbito cultural visa à formação da sociedade por tratar-se de

um patrimônio. Dentro do que se acredita por patrimônio, o Museu Histórico e Cultural

das Irmãs Franciscanas de Santa Maria (MHIF), é definido como um bem patrimonial.

A atitude de guardar objetos da Irmã Elenara.... implica na preocupação em agregar

valor aos bens das religiosas franciscanas. Portanto, o museu ganha uma nova

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conotação na contemporaneidade, quando traz ao público essa leitura dinâmica da

pesquisa, exposição e da memória institucional.

O MHIF, além de preservar a história por meio do acervo iconográfico,

possibilita a formação da identidade de um grupo social. Neste caso, das Irmãs

Franciscanas, nas suas ações profissionais; nas construções arquitetônicas; na estrutura

da clausura religiosa. Assim, as vicissitudes do tempo não são capazes de apagar a

memória desta congregação, pois está presente no cotidiano das religiosas ou

materializadas no acervo do MHIF.

Então, quando se busca reviver a memória de um grupo ou sociedade,

expressado por meio do acervo fotográfico, remete-se a um passado/presente que

permite vivenciar a história, construída por indivíduos, que participam ou participaram

direta ou indiretamente dos fatos registrados. Assim, a gestão museal do MHIF tem por

premissa manter presente nas Irmãs Franciscanas, o sentimento de pertença ao contexto

religioso, durante os 180 anos da congregação. Entretanto, é uma tarefa desafiadora e

cotidiana despertar nas Religiosas Franciscanas, o sentimento de pertencimento e que

seja reavivado, quando estas estão em contato com as coleções que compõem o acervo

iconográfico do MHIF.

É fato que as memórias puderam ser transmitidas por meio das publicações

acadêmico-científicas e em eventos de âmbitos nacional/internacional. Cita-se o

ENEIMAGEM - Encontro Nacional e Internacional de Imagem, que aconteceu entre 19

e 22 de maio de 2015, na Universidade Estadual de Londrina (UEL). Neste foi

apresentada a comunicação intitulada A fotografia como recurso de valorização em

memórias e seu uso em pesquisas historiográficas, que faz menção ao trabalho

executado acerca da digitalização do acervo iconográfico em sua fase inicial.

Destaca-se no segundo semestre de 2015, a apresentação O uso das fontes

primárias nas pesquisas historiográficas: valorização da memória por meio da

informatização do acervo imagético, durante o XVI Salão de Extensão da Universidade

Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), no eixo temático que estava associado à

preservação de acervos e memória.

O projeto executado no acervo do MHIF é um recurso baseado em práticas

que atuam na preservação museal, em uma parceria entre o Curso de História do Centro

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Universitário Franciscano e o Museu Histórico e Cultural das Irmãs Franciscanas

(MHIF), vinculado ao Programa de Pós Graduação de Pesquisa e Extensão (PRPGPE).

O projeto propicia ações que incentivam a formação acadêmica do educando, aliando

teoria à prática, pois viabiliza pré-conhecimentos adquiridos nas disciplinas curriculares

ligadas a área da muselogia e ensino. Por outro viés, possibilita que o (a) bolsista realize

trabalhos vinculados a materialidade das coleções, bem como a preservação da memória

e pesquisa, inserindo-o ainda mais no ambiente acadêmico-científico.

A relevância de projetos como este, proporciona uma formação mais dinâmica

aos estudantes, sobretudo quanto à experiência que servirá como base para futuros

projetos nos âmbitos acadêmico e profissional das pessoas envolvidas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Escolha Certa. In: Arquivos, Patrimônio e Memória: trajetórias e perspectivas: São

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