Prática de Conjunto Na Escola Regular

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1 A Prática de Conjunto na Escola Regular Weslei Flávio Rodrigues [email protected] Resumo: Este relato apresenta algumas considerações sobre experiência envolvendo atividades de prática de conjunto nas aulas de música em escola pública municipal de educação básica de Maringá – PR. Neste texto mantive o foco sobre os objetivos pretendidos com as atividades, bem como nas dificuldades encontradas para se ensinar música na escola de ensino regular. O relato apresenta também os progressos conseguidos com as aulas de música, apresentando reflexões do autor sobre sua experiência com o estágio. Palavras-chave: Estágio, Prática de Conjunto, Apreciação Musical. Introdução As experiências aqui relatadas foram realizadas durante a disciplina de Estágio Curricular Supervisionado, do Curso de Licenciatura Plena em Educação Musical da Universidade Estadual de Maringá, Paraná, na Escola Municipal Olga Aiub. O relato é baseado nas atividades desenvolvidas no primeiro semestre de 2012 com a turma do 5º ano do ensino fundamental. A turma é composta por alunos com idades entre 10 a 11 anos e nunca tiveram aulas de música. Neste relato estarão mencionadas as atividades usadas em sala, bem como as dificuldades encontradas. Os objetivos das aulas consistiram em proporcionar a apreciação ativa por meio de diversos estilos musicais e desenvolver um olhar crítico sobre a música veiculada pela mídia. Para alcançar estes objetivos, as atividades envolveram a apreciação musical, a prática de conjunto e a composição. A Prática de conjunto como proposta de ensino A proposta para o estágio foi voltada para a prática de conjunto, tendo como base o tripé: apreciação, performance e composição. Segundo Henstchke e Del Ben (2003, p. 180) as atividades de composição, execução e apreciação são aquelas que propiciam um envolvimento direto com a música, possibilitando a construção do conhecimento musical pela ação do próprio indivíduo. A apreciação foi usada constantemente, pois considerei que a partir dela, os alunos responderiam aos processos envolvidos durante a execução e a composição, fato que pude

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Prática de Conjunto

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    A Prtica de Conjunto na Escola Regular

    Weslei Flvio Rodrigues [email protected]

    Resumo: Este relato apresenta algumas consideraes sobre experincia envolvendo atividades de prtica de conjunto nas aulas de msica em escola pblica municipal de educao bsica de Maring PR. Neste texto mantive o foco sobre os objetivos pretendidos com as atividades, bem como nas dificuldades encontradas para se ensinar msica na escola de ensino regular. O relato apresenta tambm os progressos conseguidos com as aulas de msica, apresentando reflexes do autor sobre sua experincia com o estgio. Palavras-chave: Estgio, Prtica de Conjunto, Apreciao Musical.

    Introduo

    As experincias aqui relatadas foram realizadas durante a disciplina de Estgio

    Curricular Supervisionado, do Curso de Licenciatura Plena em Educao Musical da

    Universidade Estadual de Maring, Paran, na Escola Municipal Olga Aiub. O relato baseado

    nas atividades desenvolvidas no primeiro semestre de 2012 com a turma do 5 ano do

    ensino fundamental. A turma composta por alunos com idades entre 10 a 11 anos e nunca

    tiveram aulas de msica.

    Neste relato estaro mencionadas as atividades usadas em sala, bem como as

    dificuldades encontradas. Os objetivos das aulas consistiram em proporcionar a apreciao

    ativa por meio de diversos estilos musicais e desenvolver um olhar crtico sobre a msica

    veiculada pela mdia. Para alcanar estes objetivos, as atividades envolveram a apreciao

    musical, a prtica de conjunto e a composio.

    A Prtica de conjunto como proposta de ensino

    A proposta para o estgio foi voltada para a prtica de conjunto, tendo como base o

    trip: apreciao, performance e composio. Segundo Henstchke e Del Ben (2003, p. 180)

    as atividades de composio, execuo e apreciao so aquelas que propiciam um

    envolvimento direto com a msica, possibilitando a construo do conhecimento musical

    pela ao do prprio indivduo.

    A apreciao foi usada constantemente, pois considerei que a partir dela, os alunos

    responderiam aos processos envolvidos durante a execuo e a composio, fato que pude

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    constatar na experincia do estgio. Segundo Frana (2002, p. 12), a apreciao uma

    forma legtima e imprescindvel de engajamento com a msica. Atravs dela podemos

    expandir nossos horizontes musicais e nossa compreenso.

    As aulas tiveram como abordagem o cotidiano dos alunos, ou seja, tomando como

    base suas vivncias e relaes sociais, tendo como finalidade a construo do conhecimento

    partindo de suas prprias experincias, buscando fazer do aprendizado em msica algo

    prazeroso.

    No mundo do cotidiano, das impresses palpveis, o universo das coisas vividas tem um valor de ponto de partida no qual se pode incorporar todas as experincias subjetivas para alcanar, pela via transcendental, um conhecimento rigoroso e coerente (Chizzotti, 1992, p. 92).

    A performance a aplicao dos conceitos musicais absorvidos em sala de aula, tais

    como: parmetros do som, pulsao, padres rtmicos, forma musical, andamentos. De

    acordo com Reimer (1989, p. 72), os objetivos e processos do ensino da performance na

    educao musical abrangente so diferentes do ensino especializado: promover um fazer

    musical ativo e criativo, e no priorizar um alto nvel de destreza tcnica.

    A prtica de conjunto foi uma forma de integrao entre as modalidades de

    composio, apreciao e performance, possibilitando combinaes variadas no fazer

    musical, seja no formato de conjunto rtmico, instrumental, percusso corporal, ou canto

    coletivo.

    H a alegria de fazer msica junto, desde o canto em corais at a participao em um conjunto de rock: trata-se de coletivos que, ao mesmo tempo, perseguem um objetivo musical e o projeto de se constituir, de se vivificar como grupo solidrio; os participantes se rejubilam com o poder e a emoo coletivos; estruturas e regras se criam pouco a pouco e estabelecem assim sua validade; em resumo, h uma diversidade que tende unidade, na qual cada parte acha apoio nas outras e se fortalece com as outras (SNYDERS 1992, p. 88).

    A composio, que pode ser definida como a criao musical, foi estimulada e

    orientada, observando critrios como: pulsao, combinao de timbres e ritmo, visando o

    desenvolvimento musical e o despertar criativo dos alunos. Segundo Swanwick, podemos

    chamar de composio desde as mais breves e espontneas expresses das crianas, bem

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    como invenes mais longas e ensaiadas (SWANWICK, 1994, p. 84).

    As aulas

    As aulas do estgio foram organizadas de acordo com os objetivos que eu pretendia

    alcanar com os alunos, ou seja: ampliar o repertrio de escuta e despertar o prazer de ouvir

    e fazer msica.

    Os planejamentos contemplavam sempre apreciaes musicais e performances com

    instrumentos de percusso, percusso corporal e voz. A leitura da grafia musical tambm

    esteve presente em todas as aulas.

    Considerei importante desde o incio que os alunos tivessem uma noo de leitura

    rtmica. Para que isso acontecesse, em quase todos os planejamentos havia tambm

    atividades com clulas rtmicas, que aps a assimilao por parte dos alunos, eram

    acrescentadas pouco a pouco aos padres rtmicos presentes nas msicas desenvolvidas nas

    aulas. Inicialmente executados atravs de percusso corporal e depois com os instrumentos

    de percusso.

    A leitura rtmica foi vista como importante para que os alunos pudessem visualizar na

    notao tradicional o que estavam tocando, e tambm, ao mesmo tempo tivessem contato

    com uma linguagem universal que possibilitasse o dilogo musical e uma forma de registro

    de tudo o que foi executado em aula.

    A notao musical deve estar presente na aula de msica, pois proporciona a perenidade do texto musical e permite o registro para que a interpretao de uma obra *...+ possa ser corrigida, aperfeioada, e que a mesma possa ser executada por outras pessoas. [...] alm de superar, em muito, a capacidade de armazenamento individual de qualquer conhecedor (SOUZA, 2006, p. 212).

    Os instrumentos de percusso eram distribudos em naipes, os naipes organizados de

    acordo com os timbres de cada instrumento, para que desde o incio a sonoridade

    reproduzida pudesse ser agradvel e no soasse como uma baguna sonora, possibilitando

    que os alunos percebessem a gama de timbres proporcionada pelos instrumentos.

    A apreciao musical foi muito importante neste primeiro semestre, por meio dela

    consegui despertar nos alunos o interesse de conhecer outros estilos musicais, escolher

    msicas para releitura e formao de repertrio e para a extrao e aplicao dos padres

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    rtmicos apresentados nas aulas. Das apreciaes, a msica: Bola de meia, Bola de gude, da

    banda 14 Bis, foi a que mais agradou aos alunos, sendo escolhida como a msica para a

    apresentao de fim de ano. Esta msica uma as quais pude trabalhar o canto coletivo e a

    performance instrumental.

    Os desafios de fazer msica na escola de ensino regular

    Quando iniciei o estgio, a maior dificuldade encontrada foi em relao indisciplina

    dos alunos, que embora se mostrassem receptivos e dispostos em ter aulas de msica,

    tinham srias dificuldades de comportamento em aula. O que mais incomodava em relao

    indisciplina, era o fato de no respeitarem seu espao e o dos coleguinhas de sala, o que me

    levou a realizar as aulas mantendo os alunos sentados em suas carteiras durante todo o

    semestre, possibilitando que as aulas pudessem acontecer sem maiores problemas.

    Durante o primeiro semestre pude verificar na prtica, que nem sempre ,tudo ocorre

    dentro da sala como planejamos no papel, sendo necessrio perceber o que no est

    funcionando durante a aula e adaptar, ou at mesmo improvisar outras atividades para que a

    aula de msica acontea. Em outros momentos acredito que errei mesmo, que a aula no

    atingiu o objetivo esperado por causa de erros no planejamento, sendo necessrio repens-

    lo.

    Durante doze anos tive a experincia de ministrar aulas de guitarra e violo em

    conservatrio, onde o formato das aulas elaborado individualmente e no em grupo como

    acontece na escola. Esta experincia possibilitou que eu pudesse perceber quando a aula

    estava funcionando, quando os objetivos estavam sendo alcanados ou no, mas sem dvida

    alguma, as aulas em grupo de vinte ou mais alunos demandam um desgaste muito maior por

    parte do professor, pois dividir a ateno com um nmero grande de alunos e

    principalmente, conseguir prender a ateno e fazer com que mantenham o interesse nas

    aulas muito mais difcil.

    A falta de um espao adequado para que as aulas de msica aconteam, tambm

    uma das dificuldades encontradas na escola de ensino regular. Se houvessem salas

    destinadas para as aulas de msica e devidamente organizadas, acreditamos que no

    desperdiaramos tanto tempo separando e guardando instrumentos, organizando espao na

    sala convencional, considerando que a qualidade das aulas e o aproveitamento dos alunos

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    poderiam ser maiores.

    Outro fator que trouxe bastante dificuldade foi em relao localidade onde se deu o

    estgio. Por ser muito distante, tornou-se muito estressante, principalmente para os

    estagirios que vinham de outras cidades.

    Consideraes Finais

    Apesar das dificuldades relatadas, acredito que foi muito gratificante ver o que o

    ensino de msica pode trazer de transformao na vida das pessoas envolvidas, sejam estas,

    alunos, ou professores.

    Posso citar como exemplo o caso de um aluno que no incio do estgio nunca

    participava das atividades e que at mesmo quando os instrumentos musicais eram

    distribudos para a sala, ele se recusava a receber o seu. Durante quatro aulas este aluno

    ficou aptico, no era indisciplinado, mas, simplesmente no demonstrava interesse nas

    aulas de msica. Num dia, aps o encerramento da aula e depois de eu haver recolhido os

    instrumentos, ele se ofereceu para me ajudar a carreg-los at aos armrios que ficavam na

    secretaria, prontamente concordei. Enquanto eu guardava uma das bolsas com

    instrumentos, pude perceber que este aluno manuseava os instrumentos da outra bolsa,

    tentando toc-los de leve, com pouca intensidade, talvez por causa da reverberao do local.

    Considero que esta foi sua forma de explor-los e nas aulas seguintes fazia questo de

    escolher seu instrumento predileto: uma platinela. Deste dia em diante nunca mais deixou

    de participar das atividades propostas em aula.

    No decorrer do estgio, as intrigas entre os alunos e a indisciplina que ocorriam no

    incio foram desaparecendo, a convivncia melhorando e pude perceber o interesse pelas

    aulas de msica, que era demonstrado pela participao ativa dos alunos.

    Na experincia vivida, isto forma um todo: no entanto, o papel do professor ajudar os jovens a analisar este todo, a tomar conscincia de que os diversos elementos que o compem no se situam no mesmo nvel: convivncia em termos de roupa e do penteado que agradam num determinado momento e que parecero ridculos quando sarem de moda, convivncia em termos de sentir junto as emoes musicais, em que tudo isso parecido e em que tudo isto diferente? No h emoes musicais que vo mais fundo, nas quais daremos mais valor que a uma fina roupa nova? Comunicamo-nos atravs da msica que acompanha nossos flertes, mas tambm atravs dos cantos que exaltam o amor e do canto da 9 Sinfonia de Beethoven que convida a uma

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    fraternidade exigente. (SNYDERS, Georges, 1997, p. 89).

    A satisfao de poder ver crianas que nunca tiveram aulas de msica sabendo leitura

    rtmica, ficando em silncio para apreciar uma msica de contexto diferente ao que vivem e

    o melhor que isso, reproduzindo nos instrumentos musicais o que aprenderam

    imensurvel, uma sensao indescritvel, que s pode ser entendida por quem est

    envolvido com o estgio tambm.

    Como estagirio pude me convencer atravs das experincias na escola regular, sobre

    a importncia da educao musical como um meio de promover o desenvolvimento do ser

    humano atravs da comunho entre sons e silncio, instrumentos, corpo e voz, arte e

    cincia.

    Consideramos a importncia da educao musical na sociedade contempornea justificada pela funo de promover o desenvolvimento do ser humano, no por meio do adestramento e da alienao, mas por meio da conscientizao da interdependncia entre corpo e a mente, entre a razo e a sensibilidade, entre a cincia e a esttica. o caso de abrirmos espao para a liberdade da criao e da recriao do discurso musical, por meio da ao prpria do sujeito sobre o material sonoro (LOUREIRO, 2003, p. 142).

    Por constatar esta importncia e pelas experincias vividas, pelos acertos e tambm

    pelos erros, que posso dizer hoje sem sombra de dvidas que me tornei um educador

    musical.

    Referncias Bibliogrficas

    CHIZZOTTI, A. O cotidiano e as pesquisas em educao. In: Fazenda (org.): Novos enfoques

    da pesquisa educacional, 2. Ed., So Paulo: Cortez Editora, 1992, p. 85-98.

    LOUREIRO, Alcia Maria Almeida. O ensino de msica na escola fundamental. Campinas, SP:

    Papirus, 2003. - (Coleo Papirus Educao).

    REIMER, Bennet. A Philosophy of Music Education. New Jersey. Prentoe-Hall, 1970/1989.

    SOUZA, Jusamara. Sobre as mltiplas formas de ler e escrever msica. In: Ler e escrever,

    compromisso de todas as reas. Porto Alegre: UFRGS, 2006 (4 ed.)

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    SWANWICK, Keith. Ensino instrumental enquanto ensino de msica. In: Cadernos de Estudo:

    Educao Musical 4/5. So Paulo: Atravez, 1994. P. 7-13.