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    Portugus e Mandarim:

    as lnguas portuguesa e chinesa

    como lnguas globais

    Jos RibeiRo e CastRo*

    1. CHINA E PORTUGAL: UM LONGO ABRAO ANTIGO

    O primeiro encontro entre a China e Portugal poderia ter acontecidoem frica. algo que, desde ento, j li muitas vezes. Mas a primeira vezque o conheci foi no nal dos anos 80, quando, trabalhando com RobertoCarneiro, tive que preparar um texto sobre as relaes com a China.

    Na altura, tinha comprado um livro que me fascinara e cuja leituradevorei em poucos dias: Os Descobridores, do historiador norte-americanoDaniel Boorstin (1987). Por sinal, tinha comprado o livro atrado pela ideiade ver o que diria Boorstin sobre os Descobrimentos portugueses.

    O livro muito mais do que isso: uma extraordinria viagem pelas

    extraordinrias descobertas do esprito e do conhecimento humano: otempo, a geograa, os mares certamente, o espao, a natureza, a cincia,Deus, o passado e a Histria. Mas l vm certamente e com destaque os Descobrimentos portugueses, motivo da minha curiosidade inicial. E foil que, j com mais de 30 anos de idade, li e conheci pela primeira vez asproezas e os feitos do almirante Cheng Ho (Boorstin 1987: 178)

    Quando D. Henrique, o Navegador, mandava os seus navios descer,

    palmo a palmo, a costa ocidental de frica, do outro lado do planeta

    * Deputado Assembleia da Repblica. Presidente da Comisso Parlamentar de Educa-o, Cincia e Cultura

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    navegadores chineses possuam uma marinha sem paralelo em nmero,

    percia e tecnologia. A sua grande frota j navegara para alm do mar da

    China e volta do oceano ndico, tendo chegado, pela costa oriental defrica abaixo, prpria ponta do Continente Negro.

    fascinante! Muito antes do primeiro encontro entre portugueses echineses, nos mares da China, quando, em 1513, Jorge lvares ergue opadro na ilha Ling-Ting (na foz do Rio das Prolas, entre Hong-Konge Macau), esse encontro poder-se-ia j ter dado algures no continenteafricano, talvez no Cabo das Tormentas volvido Cabo da Boa Esperana.

    Os portugueses desciam pela costa ocidental de frica e, em paralelo,

    os marinheiros de Cheng Ho faziam o mesmo pela costa oriental.O encontro poderia ter sido logo ali. Boorstin (1987: 179) conta-nostambm por que no se deu e por que coube apenas aos portugueses(e espanhis) o papel marcante nico que tivemos nessa primeiraglobalizao:

    Mas enquanto as exploraes das naus de D. Henrique foram um pr-

    logo para viagens martimas que levariam descoberta de todo um novo

    mundo e circum-navegao do globo, as mais grandiosas expedies

    chinesas da mesma era conduziram a um beco sem sada. Prefaciaram o

    catastrco isolamento dos Chineses no interior das suas prprias fron-teiras, com consequncias que ainda hoje vemos.1

    O que tornou to dramtico o Grande Isolamento de 1433 foi o facto

    de a explorao martima chinesa ter sido to espectacular. O heri,

    aquele cujo nome se tornou sinnimo de poderio naval chins, o plane-

    ador e comandante do mais notvel desses empreendimentos de grande

    alcance, foi Cheng Ho, o almirante do Tesouro Triplo, geralmente conhe-

    cido como o eunuco das Trs Pedras Preciosas, designao porventura

    derivada dos trs elementos preciosos do budismo o Buda, a Dharma

    e a Sangha ou das pedras preciosas que ele dava como presentes e

    recebia como tributo.2

    E mais frente:

    No menos extraordinria do que os prprios e extensos empreen-

    dimentos navais de Cheng Ho foi a subitaneidade com que termina-

    1 O ainda hojede Daniel Boorstin corresponde a 1983, ano em que se publicou nos

    Estados Unidos da Amrica a primeira edio do The Discoverers. Hoje, em 2013, pro-vavelmente Boorstin no escreveria j com as mesmas palavras.2 Ibidem.

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    ram. Se este Colombo chins tivesse sido seguido por um cortejo de

    Vespcios, Balboas, Magalhes, Cabots, Cortezes e Pizarros chineses,

    a histria do Mundo poderia ter sido muito diferente. Mas Cheng Hono teve sucessor e a actividade naval chinesa teve um m abrupto. As

    energias anteriormente aplicadas nas expedies passaram de repente a

    ser consumidas para impor o isolamento. A corrida europeia s colnias

    e a sua demanda de terra incgnita no tiveram correspondentes na

    histria chinesa moderna. E o esprito de explorao permaneceu alheio

    China.

    O pendor da China para a recluso era uma histria antiga. A Grande

    Muralha, que remonta Antiguidade, ao sculo III a.C., recebeu a sua

    forma presente na dinastia Ming, na era de Cheng Ho. No existe emnenhum outro lugar do Mundo nada que se lhe compare em escala ou

    em continuidade cronolgica. O esprito da Grande Muralha exprimiu-se

    de incontveis outros modos. Um foi o Grande Isolamento, quando o

    imperador proibiu os seus sbditos de irem ao estrangeiro. Os chineses

    vistos fora do seu pas estavam-no ilegalmente, e os viajantes impru-

    dentes eram castigados com a decapitao. A grande stima viagem de

    Cheng Ho3 foi a ltima da China. O seu regresso em 1433 assinalou o

    m das aventuras martimas organizadas do seu pas. Um edicto imperial

    desse mesmo ano e outros que se seguiram (1449, 1452) impunhamcastigos cada vez mais brutais aos chineses que se aventurassem a ir ao

    estrangeiro.

    A Histria foi como foi. Os chineses voltaram a casa e os portuguesescontinuaram a navegar. E seria no Oriente, j no sculo XVI, que se dariao primeiro encontro dos povos dos dois extremos da grande Eursia: oseuropeus portugueses e os asiticos chineses (1513), japoneses (1543) ecoreanos (1604).

    No tocante s relaes Portugal/China, os factos so conhecidos. Apsa descoberta do caminho martimo para a ndia, os portugueses continua-ram as exploraes para Oriente e, em 1513, Jorge lvares chegou Ilhade Ling-Ting, onde ergueu um padro a seria enterrado em 1521. E,em 1515, tambm Rafael Perestrelo chegou ao Rio da Prola. Estes terosido os primeiros contactos dos portugueses com a China. Por aqui se

    3 Dizem as fontes que esta viagem dirigida principalmente ao Sudeste Asitico (Sio, Java,

    Sumatra, Malaca, Ceilo, Calecute, etc.) ter decorrido de 1431 a 1433, comandandoCheng Ho uma imponente frota de 100 navios. Cheng Ho morreu j no regresso, emOrmuz, em 1433 segundo outros, em 1435, j em terra rme chinesa.

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    estabeleceram, na altura, os Jesutas, entre os quais S. Francisco Xavier; e,em 1553, Leonel de Sousa obtm autorizao para que os portugueses se

    pudessem xar em Canto e em Macau. Macau seria, depois, entregue aosportugueses como recompensa do auxlio por eles prestado aos chinesescontra a pirataria martima no perodo de 1557 a 1564. A administraoportuguesa de Macau durou, quatro sculos e meio, at 20 de Dezembrode 1999.

    2. FERRAMENTAS DA GLOBALIZAO

    Se pensarmos em quais so as ferramentas da globalizao, elas sosobretudo trs:

    as viagens por terra, mar e ar, permitindo e operando as trocascomerciais e culturais;

    astecnologias de comunicao e informao que so uma outraforma de viajar ou, dizendo-o melhor, de comunicar distncia;

    e o multilinguismo que nos permite comunicar e entendermo-nos.

    Quem quiser ter sucesso e vencer no contexto da globalizao temque se adestrar nos trs domnios; e tero tanto mais vantagens aquelesque consolidarem experincia, capital, posies nessas trs reas.

    Portugal est bem posicionado.Os Descobrimentos mostraram-nos historicamente como mestres

    na arte de viajar, talento que temos que continuar a cultivar no s notransporte martimo em que nos destacmos, mas tambm nos transportesterrestres e no transporte areo. Fecharmo-nos e isolarmo-nos morrer;viajar e comunicar crescer.

    Temos, alis, uma posio geogrca privilegiada para esse efeito. E,ou no tivssemos feito uma expanso martima global, todos os pasesde lngua portuguesa tm, em todos os continentes, posies geogrcasprivilegiadas do ponto de vista da comunicao externa e internacional.Este um trunfo precioso.

    No tocante s telecomunicaes e tecnologias de informao, temosregistado um bom progresso em muitos dos indicadores e, nomeadamente,no uso da internet. Dispomos de empresas agressivas e com capacidadede armao e liderana no quadro internacional. Mas importa ter sempre

    presente de que se trata de um sector estratgico fundamental, onde nopodemos descansar, lutando constantemente por atingir, defender e con-

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    solidar posies de dianteira. Notcias recentes do conta de que a lnguaportuguesa a quinta lngua mais usada na internet.4

    E, quanto ao multilinguismo, no s a nossa lngua portuguesa umadas grandes lnguas globais contemporneas, como normalmente assi-nalada a aptido dos portugueses para a aprendizagem e o uso uentede lnguas estrangeiras. Linguistas referem que esta aptido decorrer domuito variado conjunto de sons correntemente usado pelos que aprende-ram o portugus europeu como lngua materna.

    3. PORTUGUS E MANDARIM, LNGUAS GLOBAIS

    O Portugus claramente uma das grandes lnguas globais contem-porneas, sendo usualmente referido dispor de 250 milhes de falantes.

    Nem sempre temos conscincia disso e, apesar de alguns esforosnos ltimos anos, impressiona como os poderes pblicos ainda fazem topouco para o conhecimento, a promoo e a valorizao desse estatuto.A comunicao social e a sociedade em geral tambm no parecem atribuira devida importncia a este capital nacional. Mas esse facto insosmvel.

    A lngua portuguesa , como lngua ocial, a sexta5 com maior nmero

    de falantes no mundo e a terceira lngua europeia global, isto , aqueladas lnguas europeias mais falada como lngua nacional em diversos pa-ses do mundo o Portugus surge a seguir ao Ingls e ao Espanhol.A lngua portuguesa tambm a lngua mais falada no hemisfrio Sul e uma lngua falada em todos os continentes, herana de um pas queteve uma presena global na sequncia dos Descobrimentos e que aenraizou ao longo de cinco sculos por todo o mundo do sculo XVao sculo XX. E uma lngua em crescimento, no s pelo crescimento

    4 A fonte um relatrio da UIT (Unio Internacional de Telecomunicaes), datado j de2013 e reportando dados de 2011. Notcia em: Estado de S. Paulo: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,portugues-e-5-

    -lingua-mais-usada-na-web-,1031475,0.htm (acedido em 2013.08.07). Jornal de Notcias: http://www.jn.pt/blogs/nosnarede/archive/2013/05/16/portugu-

    -234-s-233-5-170-l-237-ngua-mais-falada-na-net.aspx (acedido em 2013.08.07). Correio da Manh: http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/lazer/ciencia/tecnolo-

    gia/portugues-e-5-lingua-mais-falada-na-internet (acedido em 2013.08.07).5 Embora na lista abaixo o Portugus surja em 7 lugar, atrs do Bengali, mantenho a

    meno de ser a sexta lngua mais falada no Mundo, em virtude de usar a estatsticade 250 milhes de falantes de lngua portuguesa actualmente, que aquela que grossomodo mais correntemente referida por diferentes fontes.

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    demogrco de grandes pases como Brasil e Angola, alm de outros,mas tambm por gerar curiosidade e interesse crescentes.

    So diferentes as fontes para hierarquizarmos as lnguas em nmerode falantes, fontes que fornecem resultados diversos por assentarem emmetodologias diversas ou se referirem a momentos distintos. Usando oportal das Naes Unidas onde guram centenas de diferentes verses lin-gusticas da Declarao Universal dos Direitos Humanos6, podemos esta-belecer a seguinte hierarquia das quinze lnguas mais faladas no mundo:

    1. Mandarim (Chins): 885 milhes de falantes (1990); falado comolngua nativa na sia.7

    2. Espanhol: 332 milhes de falantes (1999); falado como lngua nativana Europa, na sia, em frica e na Amrica.8

    3. Ingls: 322 milhes de falantes (1995); falado como lngua nativa naEuropa, na sia, em frica, na Amrica e na Ocenia.9

    4. Russo: 288 milhes de falantes (1995); falado como lngua nativa naEuropa e na sia.10

    5.rabe: 280 milhes de falantes; falado como lngua nativa na sia eem frica.11

    6. Bengali (Bangladesh): 196 milhes de falantes (1995); falado comolngua nativa na sia.12

    7. Portugus: 182 milhes de falantes (1995); falado como lngua nativana Europa, na sia, em frica, na Amrica e na Ocenia.13

    6 Ver: http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/SearchByLang.aspx (acedido em2013.08.07).

    7 Ver: http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.aspx?LangID=chn (acedido em2013.08.07).

    8 Ver: http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.aspx?LangID=spn (acedido em2013.08.07).

    9 Ver: http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.aspx?LangID=eng (acedido em2013.08.07).

    10 Ver: http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.aspx?LangID=rus (acedido em2013.08.07).

    11 Ver: http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.aspx?LangID=arz (acedido em2013.08.07).

    12 Ver: http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.aspx?LangID=bng (acedido em

    2013.08.07).13 Ver: http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.aspx?LangID=por (acedido em2013.08.07).

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    8. Hindi (ndia): 182 milhes de falantes; falado como lngua nativa nasia, em frica e na Ocenia.14

    9. Francs: 124 milhes de falantes (1995); falado como lngua nativa naEuropa, em frica, na Amrica e na Ocenia.15

    10. Bahasa (Indonsio): 140 milhes de falantes; falado como lnguanativa na sia.16

    11.Japons: 125 milhes de falantes (1995); falado como lngua nativana sia.17

    12.Alemo: 121 milhes de falantes (1995); falado como lngua nativana Europa.18

    13. Coreano: 75 milhes de falantes (1995); falado como lngua nativana sia.19

    14. Italiano: 63 milhes de falantes (1995); falado como lngua nativa naEuropa.20

    15.Turco: 59 milhes de falantes (1995); falado como lngua nativa naEuropa e na sia.21

    O estatuto de lngua global da lngua portuguesa no merece, por

    isto, a mais pequena dvida: das lnguas faladas em todos os continentes mesmo a segunda em nmero de falantes nativos, apenas superada pelalngua inglesa. Como disse j, tambm a lngua mais falada no hemisf-rio Sul, o que chama a ateno para o relevo que pode assumir no cadavez mais importante processo de desenvolvimento Sul/Sul.

    Assim haja estratgias que aproveitem e potenciem esse factor.

    14 Ver: http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.aspx?LangID=hnd (acedido em2013.08.07).

    15 Ver: http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.aspx?LangID=frn (acedido em2013.08.07).

    16 Ver: http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.aspx?LangID=inz (acedido em2013.08.07).

    17 Ver: http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.aspx?LangID=jpn (acedido em2013.08.07).

    18 Ver: http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.aspx?LangID=ger (acedido em2013.08.07).

    19 Ver: http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.aspx?LangID=kkn .20 Ver: http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.aspx?LangID=itn (acedido em

    2013.08.07).21 Ver: http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.aspx?LangID=trk (acedido em2013.08.07).

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    J o estatuto global do Mandarim que no seria to bvio, pois,sendo embora e largamente a lngua mais falada do Mundo, os seus

    falantes concentram-se na sia e, sobretudo, na prpria China.Todavia, a abertura da China ao exterior, a que temos assistido demodo crescente desde os anos 90, e a intensicao das trocas comerciaise das relaes empresariais com a China (incluindo Taiwan), projectamcada vez mais a lngua ocial dos chineses como uma lngua global e umalngua da globalizao, alm de elevar tambm a sua importncia cultural.

    4. TOMAR CONSCINCIA DOS RECURSOS DE PORTUGAL

    Cultivamos demasiado em Portugal o desgosto de ns prprios. Apre-ciamos lamentar uma alegada falta de recursos nacionais. Isso soa-memuito, no como uma justicao, mas como desculpa para nos entregar-mos ao conformismo e nossa prpria decadncia e declnio.

    nesse contexto que tenho desenvolvido uma teoria que designode quatro recursos e uma circunstncia, procurando pr em evidnciaquais os fundamentais recursos estratgicos do nosso pas, em que deve-ramos fazer assentar a nossa identidade econmica e uma estratgia con-

    tinuada de desenvolvimento nacional. Um desses recursos exactamentea nossa prpria lngua.

    claro que, se por falta de recursos queremos designar a falta derecursos naturais, altamente valiosos, que nos permitissem sermos ricossem grande esforo, facto que no dispomos desses recursos. Mas noh um s pas que no disponha de recursos, que deve identicar, dar aconhecer e valorizar, colocando-os no eixo estratgico do seu processode desenvolvimento. De algum modo esse conjunto de recursos integra asua identidade.

    Quanto a Portugal, os recursos estratgicos que identico so quatro:as pessoas, o territrio, a posio geogrca e a lngua. E a circunstnciada frmula quatro recursos e uma circunstncia a Europa: o contextocom referncia ao qual temos de saber valoriz-los e p-los a render.

    No caso da lngua, o nosso quarto recurso, a lngua portuguesa umrecurso fabuloso, que estamos ainda longe de apreender em todo o seuenorme potencial estratgico. Um pas que dispe de uma lngua faladapor 250 milhes de pessoas em todo o mundo e a crescer s pobrese for estpido.

    Mas o Portugus no s falado por 250 milhes e a crescer. uma lngua intercontinental, presente, como disse, como lngua ocial

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    em todos os continentes semelhana do Portugus, s o Ingls. asexta lngua mais falada do Mundo22, a terceira lngua global das lnguas

    europeias (atrs do Ingls e do Espanhol, mas frente de Francs, Alemoe Italiano) e a lngua mais falada do hemisfrio Sul. a quinta lnguamais usada na internet.

    Ora, a lngua no apenas um gadgetcultural ou um ponto poltico.A lngua um espao econmico, um espao de conhecimento aprofun-dado, de relaes mais estreitas e de cumplicidades, um espao comercialde uncia e de comunicao mais fcil. A lngua comum um poderosofactor de economia, uma ferramenta de comrcio e de servios, um capitalde conhecimento, de inovao e de partilha. emprego, capacidade

    para contratar, vantagem competitiva.O espao de lngua portuguesa um privilgio, o mais rico dos lega-

    dos da nossa Histria comum. riqueza para ns e riqueza para osoutros que partilham connosco falarmos a nossa lngua comum. E, tantona comunicao global, como na competio lingustica, uma lnguacomum ao servio do mundo e dos vrios continentes onde se enraizou.

    Temos que saber us-la cada vez melhor como ferramenta da globa-lizao, numa nova linha de armao: o Portugus, lngua da Europa; oPortugus, lngua de frica; o Portugus, lngua das Amricas; o Portu

    gus, lngua do Oriente. Isto e essa enorme diferena qualitativa naabordagem da poltica da lngua , trata-se de pr em evidncia o valor danossa lngua como lngua internacional e lngua de comunicao global; e,portanto, no s como lngua privativa de portugueses e outros lusfonos,mas como lngua dos continentes em que esto e lngua de outros povos ecidados que querem falar, comunicar e fazer comrcio com a Lusofonia.

    Dizendo de outro modo: nesta perspectiva de recurso estratgico, alngua no interessa como lngua somente de portugueses, brasileiros,angolanos, moambicanos, timorenses ou macaenses, etc.; a lngua inte-

    ressa e valoriza-se como lngua da Europa, das Amricas, de frica edo Oriente e como instrumento para que chineses, nlandeses, alemes,mexicanos, norte-americanos comuniquem e faam negcio com Portugal,Brasil, Angola, Timor, Moambique, etc.; e, nessa medida, uma lnguaque, como segunda ou terceira lngua, cada vez mais importante paraeuropeus, americanos, africanos e orientais que operam na globalizao.

    22 Como j acima indicado e embora na lista includa no texto o Portugus surja em 7lugar, atrs do Bengali, mantenho a meno de ser a sexta lngua mais falada no Mundo,

    em virtude de usar a estatstica de 250 milhes de falantes de lngua portuguesa actu-almente, que aquela que grosso modo mais correntemente referida por diferentesfontes.

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    A importncia econmica, cultural e poltica dos pases, territrios ecomunidades onde se fala o Portugus potencia esta lngua. E esta lngua

    dene um espao econmico onde domin-la, ser uente, uma assinal-vel vantagem competitiva.Por isso que, na diviso de trabalho entre lusfonos, to importante

    que cada um faa o trabalho de casa no seu prprio continente e juntodos seus vizinhos, preservando e valorizando a importncia continental dasua lngua. No nosso caso, como portugueses os lusfonos europeus ,o nosso papel armarmos o Portugus, lngua da Europa, ou seja, pro-teger, enaltecer e expandir o Portugus como lngua disposio de todosos europeus, como uma mais-valia para comunicarem nem tanto com

    Portugal, mas sobretudo com o resto do Mundo onde se fala o Portugus.Aqui, infelizmente, o nosso grau de conscincia ainda to baixo e

    a nossa determinao to fraca que, apesar de alguns esforos isolados ede portas que esto abertas, no temos sabido consolidar vantagens noquadro europeu e, a no haver mudanas efectivas na aco poltica ediplomtica, corremos o risco de perder.

    Ainda h meses, o embaixador Seixas da Costa alertava em Lisboa:No vale a pena pensar que temos possibilidade de crescer nas instituies europeias. Enquanto lngua de trabalho, o Portugus vai lentamente

    desaparecer.23 No pode ser!

    23 Seixas da Costa falava, na Academia das Cincias, em 31 de Janeiro de 2013, na confern-cia A Sociedade Civil no Plano de Aco de Braslia, organizada pelo Observatrio daLngua Portuguesa. A notcia de Seixas da Costa encontra-se no jornal PBLICO: http://www.publico.pt/cultura/jornal/portugues-vai-desaparecer-como-lingua-de-trabalho-na--ue-diz-seixas-da-costa-25990405#/0 (acedido em 2013.08.07).E, para mais sobre a Conferncia, consultar aqui: http://www.observatorio-lp.sapo.pt/pt/conferencia (acedido em 2013.08.07).Seixas da Costa, num tom aparentemente conformista, voltaria ao tema, semanas depois,

    no I Congresso Internacional da Lngua Portuguesa. Relatou a imprensa: Para Seixas daCosta, a lngua portuguesa est em regresso na Unio Europeia (UE), uma situaoque tambm comum a um conjunto de outras lnguas que se afastam das lnguasmatriciais de trabalho, o ingls, o francs e o alemo. Na UE, o portugus continua aser uma lngua ocial, utilizada nos conselhos de ministros e nos documentos ociais,mas manifestamente por uma questo de eccia vai comear a ser cada vez menosutilizada, armou o antigo secretrio de Estado dos Assuntos Europeus. Seixas daCosta, que atualmente diretor do Centro Norte-Sul do Conselho da Europa, falava no ICongresso Internacional de Lngua Portuguesa, num painel intitulado Implementao edesenvolvimento da lngua portuguesa nas organizaes internacionais, uma iniciativada Universidade Lusada e do Observatrio da Lngua Portuguesa, que decorre at

    quinta-feira em Lisboa. Depois de ter sublinhado que a expresso da lngua no quadrointernacional tem muito a ver com a expresso dos pases que a utilizam, o diplomataarmou que o Brasil de todos os pases de lngua portuguesa aquele que tem no

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    5. CONCEBER E APARELHAR O PORTUGUS COMO LNGUAGLOBAL

    Todavia, h alguns textos da Unio Europeia onde o valor do Portu-gus como lngua global expressamente armado e reconhecido e quesublinham a valia estratgia do multilinguismo na perspectiva das relaesexternas e do comrcio mundial. Enquanto fui deputado ao ParlamentoEuropeu, trabalhei para todas elas, tendo sido uma das reas em que maisme esforcei.

    Curiosamente, a primeira meno ao valor da lngua portuguesa surgenuma Resoluo do Parlamento Europeu a respeito de Macau. Tratou-se

    da Resoluo do Parlamento Europeu relativa ao Relatrio da Comisso aoConselho e ao Parlamento Europeu relativo Regio Administrativa Espe-cial de Macau, aprovada em Estrasburgo, em 8 de Abril de 2003, onde, norespectivo Considerando J, por minha proposta gura o seguinte:

    Considerando a poltica recentemente denida e posta em execuo,

    tanto pelo Governo da RAEM, como pelo Governo da Repblica Popular

    da China, de valorizar a posio de Macau como um plo privilegiado de

    relacionamento da China com todo o espao da lusofonia a nvel mun

    dial, e tendo presente que a lngua portuguesa , em nmero de falantes,

    a terceira lngua europeia de comunicao universal.24

    quadro mundial um sentido ascendente de armao. O Brasil o pas que nos podeoferecer maior esperana relativamente promoo da lngua portuguesa, apontou,acrescentando que esto a ser criadas condies para que esse pas assuma um papelde defesa da lngua que foi solitariamente assumido por Portugal durante muitos anos.Seixas da Costa, que foi embaixador de Portugal em Braslia, referiu ainda que que apossibilidade de o Brasil vir a ser membro permanente no Conselho de Segurana daONU, poder dar maior visibilidade ao portugus, mas acrescentou que tem algumas

    dvidas quanto a um consenso fcil para que haja mudanas nesse rgo das NaesUnidas. cfr. http://www.rtp.pt/noticias/index.php?article=631523&tm=4&layout=121&visual=49 (acedido em 2013.08.07).

    24 Este relatrio e o respectivo projecto de Resoluo foram apresentados por Mrio Soares,ento tambm deputado ao Parlamento Europeu. O aditamento deste pargrafo o Considerando J foi de minha iniciativa e autoria, ainda em fase de debate na comisso par-lamentar respectiva. Consultar texto integral daResoluo do Parlamento Europeu sobre orelatrio da Comisso ao Conselho e ao Parlamento Europeu: primeiro e segundo relatriosanuais da Comisso relativos Regio Administrativa Especial de Macau(COM(2001) 432 COM(2002) 445 C50619/2002 2002/2275(INI)) em: http://eur-lex.europa.eu/LexU-riServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2004:064E:0127:0130:PT:PDF (acedido em 2013.08.07) ;

    ou aqui tambm: http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?pubRef=-//EP//TEXT+TA+20030408+ITEMS+DOC+XML+V0//PT&language=PT#sdocta11 (acedido em2013.08.07).

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    100 Jos Ribeiro e Castro

    Mais tarde, j em Novembro de 2005, a Comisso Europeia publi-cou uma comunicao sobre multilinguismo, intitulada Um novo quadro

    estratgico para o multilinguismo25

    .O Parlamento Europeu analisou detidamente esta Comunicao e ela-borou um relatrio de que foi relator um deputado catalo, Joan i Mari,do qual resultaria uma importante Resoluo, aprovada em Estrasburgo,em 15 de Novembro de 2006: Resoluo do Parlamento Europeu sobreum novo quadro estratgico para o multilinguismo.26 Foi no quadro destaResoluo que foram includos, por minha proposta, trs pargrafos (doisconsiderandos e uma recomendao) chamando a ateno para a impor-tncia estratgia de algumas lnguas europeias, o que pode e deve ser

    usado em apoio da maior projeco do Portugus:E. Considerando que algumas lnguas europeias so tambm faladas em

    muitos outros pases terceiros e constituem um importante elo entre os

    povos e naes de diferentes regies do mundo,

    F. Considerando que algumas lnguas europeias se prestam particular

    mente ao estabelecimento de uma comunicao directa com outras regi

    es do mundo;

    (...)

    3. Reconhece a importncia estratgica das lnguas europeias decomunicao universalcomo veculo de comunicao e como forma

    de solidariedade, cooperao e investimento econmico e, por conse

    guinte, como uma das principais directrizes da poltica europeia

    em matria de multilinguismo;27

    Esta orientao parlamentar, na sequncia de trabalhos e dilignciasem que tambm participei, seria, alis, expressamente acolhida na sub-sequente Comunicao da Comisso ao Parlamento Europeu, ao Conse

    lho, ao Comit Econmico e Social Europeu e ao Comit das Regiesnestamatria, publicada em 18 de Setembro de 2008: Multilinguismo: uma

    25 Ver esta Comunicao da Comisso ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao ComitEconmico e Social Europeu e ao Comit das Regiesem: http://eur-lex.europa.eu/smar-tapi/cgi/sga_doc?smartapi!celexplus!prod!DocNumber&lg=pt&type_doc=COMnal&an_doc=2005&nu_doc=596 (acedido em 2013.08.07).

    26 Ver esta Resoluo do Parlamento Europeu em: http://www.europarl.europa.eu/sides/

    getDoc.do?pubRef=-//EP//TEXT+TA+P6-TA-2006-0488+0+DOC+XML+V0//PT (acedidoem 2013.08.07).27Ididem.

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    Portugus e Mandarim: as lnguas portuguesa e chinesa como lnguas globais 101

    maisvalia para a Europa e um compromisso comum28. Esta importantecomunicao cita directamente alguns daqueles trechos da Resoluo par-

    lamentar para que remete e incluiu um captulo especco sobre Dimen-so externa do multilinguismo.E o Parlamento Europeu, reagindo a esta Comunicao da Comisso

    Europeia, pronunciou-se novamente atravs de um Relatrio do deputadoVasco Graa Moura, com quem trabalhei tambm no enfoque que venhomencionando. Ao voltar a pronunciar-se sobre a matria, o ParlamentoEuropeu consolidou aquela doutrina e orientao, em nova Resoluoadoptada em Estrasburgo, em 24 de Maro de 2009: Resoluo do Parlamento Europeu sobre o multilinguismo: uma maisvalia para a Europa e

    um compromisso comum.29A Resoluo muito importante sobre diversos ngulos de abordagem

    das polticas europeias para o multilinguismo e reforou nomeadamenteas condies polticas para o trabalho estratgico que tenho defendido:

    Tendo em conta a Comunicao da Comisso, de 18 de Setembro de

    2008, intitulada Multilinguismo: uma maisvalia para a Europa e um

    compromisso comum (COM(2008)0566), bem como o documento de

    trabalho dos servios da Comisso que a acompanha (SEC(2008)2443,

    SEC(2008)2444 e SEC(2008)2445),

    (...)

    Tendo em conta a sua Resoluo de 15 de Novembro de 2006 sobre um

    novo quadro estratgico para o multilinguismo,

    (...)

    E. Considerando que algumas lnguas europeias constituem uma ponte

    fundamental nas relaes com os pases terceiros e entre povos e naes

    das mais diversas regies do mundo,

    (...)

    1. Acolhe com agrado a apresentao da comunicao da Comisso

    sobre o multilinguismo e a ateno que a mesma mereceu da parte do

    Conselho;

    28 Ver esta Comunicao da Comisso ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao ComitEconmico e Social Europeu e ao Comit das Regiesem: http://ec.europa.eu/languages/documents/2008_0566_pt.pdf (acedido em 2013.08.07). Ou tambm aqui: http://eur--lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=CELEX:52008DC0566:PT:NOT (acedido em2013.08.07).

    29

    Ver esta Resoluo do Parlamento Europeu: http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?pubRef=-//EP//TEXT+TA+P6-TA-2009-0162+0+DOC+XML+V0//pt (acedidoem 2013.08.07).

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    102 Jos Ribeiro e Castro

    2. Reitera as posies que tem tomado ao longo do tempo quanto ao mul

    tilinguismo e diversidade cultural;

    (...)4. Considera que a diversidade lingustica da Europa constitui uma

    importante maisvalia cultural e que seria errado que a Unio Europeia

    se restringisse a uma nica lngua principal;

    (...)

    39. Incita a UE a colher os dividendos inerentes s lnguas europeias nas

    suas relaes externas, e requer um maior desenvolvimento desta mais

    valia no dilogo cultural, econmico e social com o resto do mundo,

    para reforar e valorizar o papel da UE na cena internacional e beneciar pases terceiros, no esprito da poltica de desenvolvimento promo

    vida pela UE;30

    Infelizmente, os nossos dirigentes polticos e a nossa diplomacia aindano conseguiram ir mais longe do que estes passos, nem sequer extrairtodos os frutos destas portas que esto abertas.

    preciso voltar sempre ao tema, alertar e porar.

    6. O EXEMPLO DE VISO DA CHINA QUANTO LNGUAPORTUGUESA

    Lanado h pouco mais de uma dcada o Frum para a CooperaoEconmica e Comercial entre a China e os Pases de Lngua Portuguesarevela uma enorme viso da China neste domnio e um apuradssimosentido estratgico.

    Isso mesmo era j reconhecido, em Abril de 2003, na Resoluo do

    Parlamento Europeu a que z acima referncia31, bem como no Relatrioque lhe deu origem. Aqui se sublinhava, na verdade: O Governo centralde Pequim j se pronunciou rmemente a favor do papel de Macau como

    30Ibidem.31 Ver captulo anterior. E consultar a Resoluo do Parlamento Europeu sobre

    o relatrio da Comisso ao Conselho e ao Parlamento Europeu: primeiro esegundo relatrios anuais da Comisso relativos Regio Administrativa Especial de Macau, de8 de Abril de 2003, em: http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2004:064E:0127:0130:PT:PDF (acedido em 2013.08.07);

    ou aqui tambm: http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?pubRef=-//EP//TEXT+TA+20030408+ITEMS+DOC+XML+V0//PT&language=PT#sdocta11 (acedido em2013.08.07).

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    plataforma econmica e cultural entre a China continental e os pases deexpresso portuguesa. Ao mesmo tempo, Macau, em virtude da sua histria

    e dos laos ancestrais com a Europa, rene sem dvida as condies ideaispara desempenhar o papel de ponte entre a UE e a Repblica Popular daChina. Os actuais laos e acordos entre Macau e Portugal poderiam servirde possveis modelos para a futura cooperao entre a UE e Macau.32

    O Frum um mecanismo da cooperao de iniciativa ocial chinesae sem carcter poltico, mas com enorme viso e um potencial que notem deixado de se consolidar e armar cada vez mais. Tem como temachave a cooperao e o desenvolvimento econmico e tem por objec-tivo reforar a cooperao e o intercmbio econmico entre a Repblica

    Popular da China e os Pases de Lngua Portuguesa, dinamizar o papel deMacau como plataforma de ligao a esses pases e promover o desenvol-vimento dos laos entre a Repblica Popular da China, Macau e os Pasesde Lngua Portuguesa.

    Uma iniciativa simples, mas com enorme alcance. Numa palavra,estratgia.

    7. REPLICAR A VISO DA CHINA: PREPARARMONOS PARA A

    DIANTEIRA NA GLOBALIZAO

    esta mesma viso chinesa que ns temos de saber replicar. Com amesma inteligncia, com o mesmo sentido de futuro, com a mesma pora isto , com sentido e propsito estratgico.

    Temos de usar e valorizar no s a conscincia da nossa prpria ln-gua (o Portugus) como uma lngua global, mas tambm a nossa aptidopara a aprendizagem e o manejo de outras lnguas, para o multilinguismo.Temos de entender e antecipar que o Mandarim, a lngua ocial chinesa,

    uma grande lngua no s j no presente, mas sobretudo no futuro. Com ocrescimento econmico, a expanso comercial e a divulgao cultural daChina, o Mandarim ser cada vez mais uma lngua global. E ter vantagem,muita vantagem, quem souber comunicar nessa lngua.

    Devemos, portanto, investir na aprendizagem do Chins. E, assimcomo h cada vez mais chineses a aprender Portugus, deve haver cada

    32 Ver este RELATRIO do Parlamento Europeu de 31 de Maro de 2003 sobre o relatrioda Comisso ao Conselho e ao Parlamento Europeu relativo Regio Administrativa

    Especial de Macau: primeiro e segundo relatrios anuais em: http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?type=REPORT&reference=A5 -2003-0113&language=PT (ace-dido em 2013.08.07).

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    vez mais portugueses a aprenderem Mandarim. Essa procura, alis, tem--se gerado e crescido de modo natural, como compreensvel. Mas j o

    defendo como poltica pblica portuguesa, at por escrito, h alguns anos,e vejo nesses sinais do crescimento da procura espontnea uma evidnciaclara do acerto dessa linha.

    Temos de denir e incrementar polticas ociais do Governo portuguse de outras instituies que fomentem a aprendizagem da lngua chinesaentre os nossos jovens. No me rero apenas ao estudo especializado eao conhecimento da lngua e cultura chinesas para intrpretes, tradutores,estudiosos ou outros especialistas. Rero-me popularizao da apren-dizagem do Mandarim como uma formao meramente complementar: o

    advogado que fala Chins, o economista que fala Chins, o engenheiroque fala Chins, o arquitecto que fala Chins, o revisor ocial de contasque fala Chins, o gestor que fala Chins. Sendo o multilinguismo umadas ferramentas da globalizao, quanto mais portugueses falarem Chins,maior ser a nossa vantagem no quadro do mercado global.

    No sero s os jovens portugueses que falarem Chins que terocertamente emprego e carreira garantidos e t-lo-o no s em Portugalou na China; mas t-lo-o tambm em qualquer parte do Mundo (naAmrica, na frica, na Europa, etc.) onde se fazem cada vez mais negcios

    com a China e em que, portanto, o domnio e a uncia na lngua chinesa setorna cada vez uma qualicao prossional de primeira grandeza. Jovemportugus que fale Portugus, Ingls e Mandarim; ou Portugus, Francse Mandarim; Portugus, Alemo e Mandarim tem futuro assegurado, emqualquer parte de Mundo e em qualquer rea prossional que exera.

    Mas tambm a certeza de que esses jovens portugueses ascenderorapidamente a lugares de topo nas respectivas empresas ou instituies,na medida em que a qualicao especca em lngua chinesa os farrequisitar para funes directivas ou de aconselhamento e assessoria ime-

    diata da direco.E ser assim tambm que um forte movimento de portugueses a

    aprenderem e a tornarem-se uentes em Chins reverter num recursofabuloso da economia portuguesa. Isso permitir, na verdade, aosportugueses, naturalmente, colocarem-se em posio privilegiada deinformao, de conhecimento e de acesso quanto s grandes avenidas ecorrentes de relacionamento comercial e de investimento entre a Chinae a Europa, a China e frica, a China e as Amricas. E se esto a osportugueses, est a Portugal.

    O desao para os portugueses o de compreendermos esta oportu-nidade. Se proporcionalmente nos tornarmos e formos os europeus mais

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    amigos da China, se nos tornarmos e formos os europeus mais conhece-dores da cultura chinesa, se nos tornarmos e formos os europeus mais

    uentes em Mandarim, se formos tudo isso e os chineses se aperceberemdisso (como certamente se apercebero) isso ser uma vantagem espan-tosa: de conhecimento, de especialidade, de interesse e, portanto, de par-ceria e de especialidade. Em todo o Mundo. O desao sermos aquelesocidentais que mais compreendem a China, que mais gostam da China,que mais conhecem a China, que melhor falam com a China.

    Se formos capazes de o fazer, chegamos a uma posio privilegiada:o lugar de encontro de dois grandes hemisfrios da globalizao oOcidente e a China.

    No sculo XVI, zemo-lo em Macau e, por isso, durante mais de umsculo a lngua portuguesa foi a lngua veicular no Oriente ente a Chinae os ocidentais. Agora, trata-se de o continuar tambm em Macau, nalinha, alis, de inteligncia, de viso e de estratgia, em que, pelo Frum,as autoridades chinesas j manifestaram e esto a prosseguir. Mas trata--se tambm de o replicarmos em Portugal, fazendo de Portugal, nessaperspectiva, um outro Macau uma plataforma europeia de conhecimentoprivilegiado da China e de relacionamento com a China.

    Em sentido gurado, faz-lo um pouco por todo o mundo: cada por-

    tugus que for um pequeno Macau tem vantagens assinalveis na globa-lizao, em qualquer lugar que estiver. Portugal tambm, atravs dessesportugueses.

    Ns, portugueses, que somos mestres na arte de viajar e que nosadestramos muito bem nas comunicaes e tecnologias de informao,temos que ser tambm peritos e geis na outra ferramenta da globalizao:o multilinguismo. Temos que fazer viver e crescer a nossa lngua comogrande lngua global que e dominar o manejo de outras lnguas globais.

    Temos que saber antecipar para ir frente e para assumirmos a dian-

    teira. Ora, sermos uentes em Mandarim, fazer esse casamento e conso-lidar essa parceria Portugus/Mandarim e Mandarim/Portugus, mani-festamente assumir a dianteira da globalizao: abraar todo o Mundoa partir do abrao cultural das duas pontas da Eursia. viver, irradiar eampliar a metfora de Macau: lugar e gentes de cruzamento de culturas,lugar de comrcio e plo de investimento, agora por todo o Mundo.

    Podia ter sido em frica esse primeiro encontro de chineses e por-tugueses. Agora, ser em todo o lado onde houver lusfonos e chineses.