Por Um Cinema Pós

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 Por um cinema pós-industrial  Notas para um de bate  por Cezar Migliorin Os últimos anos têm nos deixado claro que há algo importante acontecend o nesse cinema brasileiro que no esconde mais o rótulo da cer!e"a nas cenas de bar# $m %esti!ais& as salas esto lotadas& debates longos com centenas de participantes& e muitos e muitos %ilmes que circulam no 'rasil (e no mundo) em %esti!ais& mostras& d!ds& cineclubes& camel*s& internet - e muito raramente em shoppings# + o mesmo tempo& quando o debate sobre %omento e distribui,o aparece& a questo gira em torno de como implementar uma indústria& como %azer a passagem desse cinema apara o !erdadeiro  pro%issionalismo# Por !ezes& cineastas mais experientes dizem apenas. /ocês podem %azer esses %ilmes colaborati!os e 0 margem da indústria agora& mas logo tero que entrar no sistema# $m 1iraden tes& este ano& Cacá 2iegues dizia. + economia no cinema 3 muito %rágil& de repente tudo pode acabar#  +lgo parece estranho nesses dois momentos# Por uma lado esse cinema existe& se reno!a ano a ano& circula& conta com centenas de t3cnicos&  público& tem boas cr4ticas e reconhecimento em %esti!a is nacionais e inte rnacionais# Por outro& há um discurso que atra!essa o debate& para o qual isso 3 insu%iciente. eles  precisam da indú stria# Para entend er essa esquiz o%renia que diz que  o que existe deve deixar de ser como é para existir & 3 preciso algumas pala!ras sobre o capitalismo& sobre o que %oi a indústria no s3culo 55 e o que signi%ica %alar em indústria ho"e# A era industrial  No %inal do s3cu lo 55 inicia-se uma m udan,a decis i!a no capitalismo # + indústria& que há dois s3culos domina!a a gera,o de !alor& deixa de ter o lugar hegem*nico# 6embremos de maneira rápida. a indústria trabalha dentro de paradigmas claros para que trans%orma,o da mat3ria em produto %uncione de %orma ideal# 7 necessário colocar os su"eitos em uma linha de montagem em que suas capacidad es sub"eti!as e criati!as se"am deixadas de lado - o que no signi%ica dizer que na indústria no ha"a criati!idade (como em Tempos  Modernos, de Charles Chaplin - %oto)# 7  preciso que& no limite& entre pro"eto e  produto no ha "a altera,o e qu e tudo %uncione em absoluta pre!isibilidade# Para a indústria& 3 necessária uma pol4tica de escassez& em que as cópias so reguladas8 um no!o produto signi%ica mais mat3ria-  prima e tempo de lin ha de montage m em opera,o8 logo & custo# 2entro da lógica industrial& a organiza, o dos su"eitos em classe esta!a dada por uma  posi,o eco n*mica , claro& mas tamb3m simbólica& ou se"a. que lugar o su"eito tem na ordem est3tica& que lugar ele tem na indústria9 $m outros termos. que direito e que  possibilidades de experiências s ens4!eis e sub "eti!as o su"eito tem n esse proces so de trans%orma,o da mat3ria-prima em bens industriais& em produtos9 +ssim& na indústria

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Por um cinema pós-industrial Notas para um debate por Cezar Migliorin

Os últimos anos têm nos deixado claro que há algo importante acontecendo nesse

cinema brasileiro que no esconde mais o rótulo da cer!e"a nas cenas de bar# $m%esti!ais& as salas esto lotadas& debates longos com centenas de participantes& e hámuitos e muitos %ilmes que circulam no 'rasil (e no mundo) em %esti!ais& mostras& d!ds&cineclubes& camel*s& internet - e muito raramente em shoppings# +o mesmo tempo&quando o debate sobre %omento e distribui,o aparece& a questo gira em torno de comoimplementar uma indústria& como %azer a passagem desse cinema apara o !erdadeiro

 pro%issionalismo#

Por !ezes& cineastas mais experientes dizem apenas. /ocês podem %azer esses %ilmescolaborati!os e 0 margem da indústria agora& mas logo tero que entrar no sistema# $m1iradentes& este ano& Cacá 2iegues dizia. + economia no cinema 3 muito %rágil& de

repente tudo pode acabar# +lgo parece estranho nesses dois momentos# Por uma ladoesse cinema existe& se reno!a ano a ano& circula& conta com centenas de t3cnicos&

 público& tem boas cr4ticas e reconhecimento em %esti!ais nacionais e internacionais# Poroutro& há um discurso que atra!essa o debate& para o qual isso 3 insu%iciente. eles

 precisam da indústria# Para entender essa esquizo%renia que diz que o que existe deve

deixar de ser como é para existir & 3 preciso algumas pala!ras sobre o capitalismo& sobreo que %oi a indústria no s3culo 55 e o que signi%ica %alar em indústria ho"e#

A era industrial

 No %inal do s3culo 55 inicia-se uma mudan,a decisi!a no capitalismo# + indústria& quehá dois s3culos domina!a a gera,o de !alor& deixa de ter o lugar hegem*nico#

6embremos de maneira rápida. a indústriatrabalha dentro de paradigmas claros paraque trans%orma,o da mat3ria em produto%uncione de %orma ideal# 7 necessáriocolocar os su"eitos em uma linha demontagem em que suas capacidadessub"eti!as e criati!as se"am deixadas de lado- o que no signi%ica dizer que na indústria

no ha"a criati!idade (como em Tempos Modernos, de Charles Chaplin - %oto)# 7 preciso que& no limite& entre pro"eto e produto no ha"a altera,o e que tudo

%uncione em absoluta pre!isibilidade# Para a indústria& 3 necessária uma pol4tica deescassez& em que as cópias so reguladas8 um no!o produto signi%ica mais mat3ria-

 prima e tempo de linha de montagem em opera,o8 logo& custo#

2entro da lógica industrial& a organiza,o dos su"eitos em classe esta!a dada por uma posi,o econ*mica, claro& mas tamb3m simbólica& ou se"a. que lugar o su"eito tem naordem est3tica& que lugar ele tem na indústria9 $m outros termos. que direito e que

 possibilidades de experiências sens4!eis e sub"eti!as o su"eito tem nesse processo detrans%orma,o da mat3ria-prima em bens industriais& em produtos9 +ssim& na indústria

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há dois lugares claros a serem ocupados. aqueles que so proprietários dos meios de produ,o e aqueles que operam sem os meios - os trabalhadores# $nquanto& na ponta dacadeia produti!a& o dono do capital opera mimetizando o próprio capital - desgarrado&em %luxo& sem lugar de%inido - o trabalhador !i!e no espa,o %echado& no saláriode%inido& no gesto repetiti!o& no carto de ponto# No 3 só a %alta de dinheiro que o

a%asta do capital& mas todo o campo simbólico# +ssim& mais do que um sistema de produ,o& a indústria 3 um regime discursi!o e est3tico que opera no sens4!el& no diz4!ele no !is4!el#

:esumindo. na era industrial o trabalhador no opera criati!amente& está distante dosmeios de produ,o e de!e ser colocado em uma linha marcada pela pre!isibilidade do

 processo# Os meios de produ,o so marcados pela escassez e as classes soorganizadas pelas possibilidades econ*micas e sens4!eis.

A era pós-indústrial

O que acontece na atual %ase do capitalismo 3 um deslocamento do lugar do !alor com%ortes implica,;es nas rela,;es que os poderes estabelecero com os !i!os& com anatureza da mercadoria& com a di!iso de classes e com os meios de produ,o# Nocapitalismo pós-industrial (imaterial& cogniti!o) no 3 mais no produto<mat3ria que seencontra o centro do !alor& mas no conhecimento& na %orma de se organizar e modularuma inteligência coleti!a# Para se produzir !alor no se depende apenas da %or,a detrabalho %4sica dos indi!4duos& mas da força de invenção (6azzarato) das !idas# Oucomo escre!eu o =ann Moulier 'outang o centro de gra!idade da acumula,ocapitalista mudou e a centralidade do !alor 3 imaterial#

 Ni>e& ?aceboo>& @oogle& %ranquias comerciais8 so exemplos desse no!o capitalismo

em que o problema 3 achar meios de gerir e %uncionalizar aquilo que escapa& oconhecimento& as potências de !ida e cria,o# Mais do que criar ob"etos& 3 preciso criarmundos que esses ob"etos habitem# O problema do capitalismo passa a ser& ento& nomais como organizar a massa em uma linha pre!is4!el& mas como capitalizar a produ,ogratuita e in%inita das !idas mesmo8 a inteligência e a criati!idade da popula,o que&quanto mais conectada& mais mat3ria-prima imaterial e gratuita produz# Nesse caso& 3

 preciso liberar para produzir !alor# 2esregrar para adiante regular# Na indústria& ossu"eitos so organizados no tempo e no espa,o para trabalharem no roteiro da linha demontagem8 na era pós-industrial& trata-se de gerir o descontrole (+gamben)#

 Neste estágio do capitalismo& as %ormas de !ida e as produ,;es sub"eti!as ganharam um papel absolutamente di!erso# +ndr3 @orz& em seu li!ro L'immateriel (ABB)& explicaessa mudan,a de !etor da seguinte maneira. 1ornando-se a base de uma produ,o de!alor %undada na ino!a,o& a comunica,o e a impro!isa,o cont4nua& o trabalhoimaterial tende %inalmente a se con%undir com um trabalho de produ,o de si (@O:D&ABB& p# AB)# 1rabalho e in!en,o de si tornam-se um mesmo gesto a ser disputado

 pelos mais di!ersos poderes# 2emandados em suas %or,as de in!en,o& os su"eitos no podem estar mais presos a uma linha de montagem em que suas potências criati!as sodeixadas de lado& nem podem estar presos 0 pre!isibilidade e 0 passagem ideal do

 pro"eto ao produto# O !alor na pós-indústria passa assim a se %azer na administra,o doexcesso da cria,o& que 3 social#

O ?aceboo> 3 um ótimo exemplo# Euanto mais acesso& quanto mais %luxo de pessoas&mais !alor se produz# Mais outdoors podem ser colocados& mais dados podem ser

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negociados& mais a rede pode !aler na bolsa# Na indústria& o !alor está no produto - seum possui& o outro no# O !alor está na restri,o ao acesso# Na era pós-industrial& o!alor se multiplica por compartilhamento8 quanto mais circula,o& quanto mais pessoasen!ol!idas e in!en,o& mais conhecimento e mais !alor#

O cinema pós-industrial

Fe no mundo contemporGneo o !alor e os su"eitos no têm mais a indústria como paradigma& tal passagem& ou sobreposi,o& de uma %orma de cria,o de !alor a outra %azcom que o cinema contemporGneo estabele,a %ortes diálogos com essa con%igura,o -que nem 3 to no!a assim& mas que no deixa de nos surpreender em seusdesdobramentos& exigindo ainda que os agentes sociais recoloquem os problemas de%omento& produ,o e distribui,o sob no!as composi,;es. + manuten,o eexclusi!idade do modelo industrial no campo do cinema& mesmo que apenas no n4!elretórico& 3 %undamental para excluir dos debates (e das pol4ticas públicas) uma massa de

 produtores& espectadores e criadores que operam em um sistema pós-industrial# O

trabalho que se con%unde com a !ida pode ser estimulado em sua %or,a dissensual edemocratizante ou apenas ser parasitado# 7 certo que aqui no se trata de dizer que umaera 3 melhor que outra& estamos& nos dois casos& no interior do capitalismo# $ntretanto&se no atentarmos para a singularidade do contemporGneo& no saberemos escolher asarmas e as estrat3gias para que as possibilidades de cria,o e circula,o do cinematenham a %or,a e a di!ersidade que queremos#

1 - Abundância X Escassez

Ou!imos ho"e& quase como um mantra& uma %orte de%esa da no,o de indústriasculturais e indústrias criati!as# 1ais perspecti!as mantêm a ordem est3tica e pol4tica daindústria e do produto# Hma organiza,o excludente e proprietária# Nosso desa%io 3

 pensar em uma outra natureza da mercadoria em um contexto pós-industrial# O cinemaindustrial era pautado pela escassez& o pós-industrial pela abundGncia# O que temos !istoem todo o pa4s 3 uma produ,o que !em %azendo uso de uma capacidade materialinstalada em que a escassez no pauta mais as rela,;es de produ,o#

+ssim& a declara,o de Cacá 2iegues (%otocedida pela Hni!erso Produ,o) na últimaMostra de 1iradentes& de que a economiano cinema 3 muito %rágil e de repente tudo

 pode acabar %az pleno sentido na eraindustrial& mas no 3 uma !erdade ho"e# Naindústria& poucos detêm os meios& muitos sedespem de suas potências criati!as e amassa consome# O que acontece ho"e 3 queessa multido que 3 consumidora e

 produtora& dispersa e incontrolá!el& no pode e no de!e ter a indústria como norte# Ou se"a& o que ela produz e consome ganha!alor na circula,o e no acesso abundante em um ambiente em que os meios t3cnicos&criati!os e de acesso esto dispon4!eis# Fem uma pol4tica de estado& ela pode diminuir&mas no 3 destrut4!el& como o cinema %oi um dia# Fem uma pol4tica de estado& alguns

sero le!ados 0 indústria e %uncionalizados& como se uma outra presen,a social docinema no %osse poss4!el#

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$m termos de produ,o& o que 3 no!o 3 a rela,o do cinema com o capitalismo# 7 essano!a rela,o que estamos aqui pensando# Euando a discusso passa a ser pautada pelaindústria isso traz uma est3tica que despreza a in%inidade produti!a contemporGnea eque dese"a no!amente organizar uma cadeia hierarquizada& do set aos meios de

distribui,o.

2 - A distribuição

 Nesse no!o cenário de abundGncia de meios& a distribui,o digital e acentrada ganha protagonismo& ha"a !isto a importGncia que os %esti!ais& cineclubes e mostras tem ho"e#+ abundGncia está ainda na %acilidade das trocas de arqui!os e cópias# Os %esti!ais decinema e os cineclubes ho"e têm grande di%iculdade em o%icializar o número deespectadores dos %ilmes& assim& a carreira de um %ilme que %oi !isto em IBB cineclubes eIB %esti!ais& centenas de Pontos de Cultura& salas de aula e baixado JB mil !ezes 3 iguala zero# Nada melhor para aqueles que pregam que as !erbas públicas de!em ir apenas

 para os %ilmes em sala& %requentemente com menos público que aqueles que passam aolargo das salas de shopping#

 No há como escapar a uma certa ob!iedade. a participa,o do estado na produ,o decinema 3 historicamente de%icitária em termos %inanceiros# Fe assumirmos que o papelno passa pela tentati!a de enquadrarmos certos pro"etos a uma expectati!a de retornoecon*mico& mas cumprindo seu papel social e simbólico como princ4pio e o lucro comoum a mais& seria poss4!el in!erter o "ogo# Ou se"a& %azer com que uma parte da produ,oti!esse os espa,os alternati!os& como os acima citados& como %oco& e as salas de cinemacomo um e!entual desdobramento dessa pol4tica de distribui,o# $ssa proposta noretira a necessidade de os agentes públicos e pri!ados estarem na briga pelos espa,osinstitucionais e pelo mercado %ormal& certamente %undamentais# $ntretanto& o %oco nacarreira comercial dos %ilmes tem desconsiderado as no!as %ormas de acesso& como seelas %ossem& simplesmente& peri%3ricas& residuais# No so8 elas constituem ho"e a

 produ,o e a trans%ormam por dentro# Na era industrial se pergunta!a com quantascópias um %ilme %oi lan,ado# Ko"e essa pergunta ser!e apenas para uma parcela m4nimada produ,o& aquela que& "ustamente& %az todo es%or,o para restringir o número decópias#

3 - A esttica das e!uipes

O cinema industrial 3 pautado pela lógica da linha de montagem# ?otógra%o %otogra%a&diretor dirige& e assim por diante# O cinema pós-industrial se constitui com uma outraest3tica do set e das produtoras# @rupos e coleti!os substituem as produtorashierarquizadas& com pouca ou nenhumasepara,o entre os que pensam e os queexecutam.O que temos !isto nos %ilmesre%lete no!as organiza,;es de trabalho "ádistantes do modelo industrial# ?ilmesrealizados por L diretores& como 3 o casodos dois últimos longas realizados por @utoParente& Pedro 2iógenes& :icardo e 6uiz

Pretti ( Estrada Para Ythaca e s Monstros&na %oto ao lado)# ?ilmes realizados com um

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diretor e mais diretores na equipe t3cnica& como 3 o caso de céu so!re os m!ros&de F3rgio 'orges ou de s "esidentes& de 1iago Mata Machado# Ou ainda& 

 #esassosse$o % &ilme das Maravilhas& coordenado por ?elipe 'ragan,a e MarinaMeliande& e dirigido por JL pessoas de di!ersas partes do pa4s& uma experiência de

 produ,o colaborati!a#

O mesmo acontece com as produtoras que organizam seminários para discutir cinema&est3tica e pol4tica& %azendo a pesquisa e a realiza,o caminharem "untas# $m di!ersas

 partes do pa4s existem coleti!os que esto constantemente in!entando %ormas dedesierarquizar a produ,o& se"a pelo embaralhamento das equipes& se"a na rela,omesmo que estabelecem com atores e personagens& em %ilmes como s monstros (@utoParente& Pedro 2iógenes& :icardo e 6uiz Pretti)& céu so!re os m!ros (F3rgio'orges)& s "esidentes (1iago Mata Machado& (venida )rasilia &ormosa (@abrielMascaro)& Morro do *éu (@usta!o Fpolidoro)& Pacific (Marcelo Pedroso)& Estrada

 Para Ythaca (@uto Parente& Pedro 2iógenes& :icardo e 6uiz Pretti)& entre muitos outros#$xplicitando& nas escrituras cinematográ%icas& uma importante crise de um modelo#

O descon%orto com o modelo industrial 3 algo que está nos %ilmes& na organiza,o dossets& na dimenso processual das obras que com %requência têm re"eitado a ideia decontinuidade entre pro"eto e produto& como na lógica industrial# Fe pensarmos emalguns importantes cineastas contemporGneos& como Pedro Costa& +bbas iarostami&$duardo Coutinho& Miguel @omes& +pichatpong eerasetha>ul& ia-Dhange->e& todoseles teriam s3rios problemas para apro!ar pro"etos e terem suas contas aceitas na grandemaioria dos editais brasileiros& uma !ez que trabalham o %ilme dentro de um processo deconstru,o em que o pro"eto 3 composto de inten,;es& encontros& per%ormances&compartilhamentos - e no de roteiro e realiza,o& como pre!ê a lógica industrial#

7 certo que muitos desses realizadores so %ortemente !inculados 0 tradi,o do cinemamoderno& assim como grande parte do que temos !isto no cinema contemporGneo

 brasileiro8 entretanto& a produ,o atual parece no ter a indústria ou o chamado cinemacomercial como um oponente# 1rata-se& antes& de uma intensidade que atra!essa todas as%rentes - produ,o& distribui,o e escrituras - e que se %or"a distante do modeloindustrial# 1odas as tentati!as de trazê-lo para dentro do modelo !igente - aquele em queo %ilme de!e ser uma realiza,o do roteiro e o diretor de!e %azer& entre outras coisas&uma exposi,o oral do pro"eto diante de uma banca para captar recursos - so& antes detudo& %ormas para se destruir uma parte da potência do que existe ho"e# ?ormas deaprisionar um sistema de in!en,o e cria,o adaptado 0s no!as condi,;es materiais esimbólicas do mundo#

Hma das maneiras de isolar a produ,o contemporGnea 3 associar o pós-industrial como amador& sobretudo pela %or,a que os coleti!os !êm assumindo e& tamb3m& pelos%requentes %alas de cineastas e produtores que %azem questo de %risar os la,os a%eti!osque atra!essam as obras e equipes# Pós-industrial no 3 nem amador nem um passo paraa industrializa,o8 3 o cinema brasileiro contemporGneo que incorpora um tipo detrabalho di%erente daquele da indústria# Euando o debate 3 pautado pela lógicaindustrial& parece ha!er um claro interesse em apontar para o cinema %eito ho"e comoum cinema no pro%issional& %eito por "o!ens e no!atos& no percebendo& ou %echando osolhos& para uma maneira de operar a !ida e o trabalho como um processo de cria,o eno como pe,a de uma engrenagem# No atual estágio do capitalismo& em que as !idasmesmo so as principais produtoras de !alor& a separa,o entre amador e pro%issional

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 passou a ser bastante tênue& interessando sobretudo 0queles que pretendem gerir eorganizar as %or,as da multido#

" - O papel da #ni$ersidade

Os principais cursos de cinema do pa4s possuem um curr4culo organizado em termosindustriais# Pega-se o %ilme& di!ide-o em !árias partes - montagem& %otogra%ia& roteiro&dire,o de arte - e no %inal se coloca tudo "unto para o produto %inal& o %ilme# Euandoum cinema pós-indústrial ocupa o espa,o que !em ocupando& tamb3m na uni!ersidade

 precisamos nos rein!entar dando aten,o 0s %ormas como os cineastas esto trabalhandoho"e# 2e certa maneira& cinema e pesquisa se tornaram coisas cont4guas# + Mostra de1iradentes 3 um exemplo. pesquisadores& cr4ticos e cineastas ocupam um mesmo espa,oe %requentemente passam de uma %un,o a outra# Parece ser um desa%io ho"e dauni!ersidade a in!en,o de meios para dar conta& pedagógica e politicamente& dessa%orma de %azer cinema para qual no estamos preparados ainda e que !emtrans%ormando o cinema como um todo& das %ormas de produ,o at3 as escrituras

%4lmicas#

% - &ercado

+ existência desse cinema pós-industrialsigni%ica que ele estará sempre separado domercado ou dos meios con!encionais dedistribui,o e produ,o9 2e %orma alguma8toda a pol4tica de inser,o dessas obras nomercado nacional e internacional no podeser deixada de lado# Pós-industrial no 3

 pós-mercado. 1rata-se de uma outraengenharia de produ,o# Hm %ilme que

ganha o ?esti!al de 'ras4lia& como *éu +o!re os m!ros (%oto)& de F3rgio 'orges& ouum %ilme que está no importante %esti!al de :otterdam& ambos esto tamb3m nomercado# Mais do que isso. no ser industrial no signi%ica no ter possibilidadescomercias& mesmo que no tradicional com3rcio das salas de shopping#

7 certo que muitos desses %ilmes no alcan,am seus públicos por %alta de uma pol4ticaque democratize o acesso 0s salas& uma briga histórica& importante e que continuará aser %eita# 1rata-se de uma tenso no interior do mercado %ormal ao qual muitas dessas

obras podem e de!em ser incorporadas# $ntretanto& no so esses espa,os tradicionaisque traro !alor e legitimidade para as obras# 7 e!idente ainda que estamos diante daobsolescência da cli!agem centro-peri%eria t4pica da era fordist a (Cocco& p#)# +ssimcomo& nesse cinema& ?ortaleza& :eci%e& :io de aneiro& Fo Paulo& Porto +legre e 'eloKorizonte so partes de um mesmo processo& 3 o próprio pa4s que tem diante de si ascondi,;es dadas para uma presen,a internacional em que o 'rasil no se coloca maiscomo mo de obra ou %ornecedor de mat3ria-prima apenas& mas como potência damultido que se materializa nessas obras#

' - A presença do estado

Chegamos a um ponto crucial. a presen,a do estado no incenti!o da ati!idadecinematográ%ica# O incenti!o ao cinema pós-industrial de!e ser deslocado de pro"etos

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 para processos# No estamos diante de %ilmes industriais& %echados ao descontrole dos processos# Káuma !elocidade de produ,o& uma garantia de meios "á instalados e uma est3ticamesmo& distante dos roteiros que a indústria exige& que nos demanda no!as %ormas de

 presen,a estatal se dese"armos potencializar essas produ,;es& esses processos# Fe na era

industrial os primeiros longas precisa!am de muito dinheiro para serem produzidos&ho"e !emos cineastas partindo para o terceiro longa-metragem sem nunca ter tidodinheiro público# 1al!ez de!êssemos pensar em sistemas de bolsas de produ,o paracoleti!os e grupos& para produtoras que instauram processos# 'olsas que se"am dadas a

 partir da produ,o "á realizada e no da apresenta,o de um pro"eto# 1emos !áriosexemplos de cineastas e produtoras com expresso nacional e internacional e grandecircula,o %ora do circuito shopping# No seria isso o su%iciente para que essas

 produtoras recebessem %inanciamentos com o compromisso de entregar pelo menos umou dois longas metragens para distribui,o em 1/& Programadora 'rasil& abertas paradonload  e exibi,o em salas9

Muito mais do que apontar solu,;es& coisa que os cineastas e coleti!os certamentesabero %azer com mais propriedade& o que pretendemos aqui 3 assinalar a existência deuma produ,o cinematográ%ica& que continuará a existir independente das a,;es estatais&mas que pode ser potencializada com es%or,os que di%erem daqueles tradicionalmentecoerentes com as práticas industrias# + preocupa,o principal com esses processos 3como potencializar o que existe sem que se o%ere,a mais do mesmo& como potencializaruma produ,o que soube se in!entar em meio a condi,;es no!as& longe da lógicaindustrial# O papel do estado ho"e 3 potencializar o descontrole#

Q +grade,o o +ndr3 'rasil& a Carla Maia& o :icardo 1argino& o ?ábio +ndrade e o@iuseppe Cocco pelas contribui,;es nas atentas leituras do texto#

(e)erencias importantes para esse te*to+

COCCO& @iuseppe# Mundo)ra-. devir%mundo do )rasil e o devir%)rasil do mundo#:io de aneiro. $d# :ecord& ABBR#'O61+NFS& 6uc e CKS+P$66O& T!e# Le nouvel esprit du capitalisme# Paris.7ditions @allimard& JRRR#ULp#2$6$HD$& @# Post%scriptum so!re as sociedades de controle# Sn Con!ersa,;es# :io deaneiro. $ditora L& JRRA#6+DD+:+1O& Maurizio# (s "evoluç/es do *apitalismo# :io de aneiro. :ecord# ABBV#FSMON2ON @ilbert# L0individuation ps1chique et collective# Paris. +ubier#

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