Liderança - Despertando seu Líder Interior - Por Julio Pascoal
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO … · e novos debates na área, inquietando...
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
ALTIMARY APARECIDA CEPÊRA
EDUCAÇÃO INFANTIL E FORMAÇÃO PROFISSIONAL DOCENTE: UM ESTUDO SOBRE O PROGRAMA PEC – FORMAÇÃO
UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS NO ESTADO DE SÃO PAULO
SÃO PAULO
2006
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
ALTIMARY APARECIDA CEPÊRA
EDUCAÇÃO INFANTIL E FORMAÇÃO PROFISSIONAL DOCENTE: UM ESTUDO SOBRE O PROGRAMA PEC – FORMAÇÃO
UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS NO ESTADO DE SÃO PAULO
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação: Currículo, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência para obtenção do título de Mestre em Educação, sob a orientação da Profª. Drª. Marina Graziela Feldmann.
SÃO PAULO
2006
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
ALTIMARY APARECIDA CEPÊRA
EDUCAÇÃO INFANTIL E FORMAÇÃO PROFISSIONAL DOCENTE: UM ESTUDO SOBRE O PROGRAMA PEC – FORMAÇÃO
UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS NO ESTADO DE SÃO PAULO
Este exemplar corresponde à redação final da
Dissertação de Mestrado para obtenção de Grau de
Mestre em Educação, da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, para o processo de defesa
de Altimary Aparecida Cepêra, aprovada pela
Comissão Julgadora em ___/___/_____.
Assinatura: ______________________________________
__
BANCA EXAMINADORA:
____________________________________________ Orientador(a): Profª. Drª. Marina Graziela Feldmann. ____________________________________________ Titular: ____________________________________________ Titular:
2006
AGRADECIMENTOS Aos meus pais Abílio Cepêra e Maria de Lourdes da Silva Cepêra, “in memoriam”, que, embora ausentes, sempre serão presença em minha vida; Ao grande amor da minha vida, Mário Franco, companheiro e amigo de todas as horas, que me estimula a caminhar todos os dias de minha vida, não medindo esforços para que eu continue a estudar.
À Profª. Drª. Marina Graziela Feldmann pela orientação competente, amiga e
confiante que muito contribuiu para a realização deste trabalho;
À Profª. Drª. Maria Ângela Barbato Carneiro, pela confiança depositada, pelas orientações, diretrizes científicas e incentivo;
À Profª. Drª. Lucila Maria Pesce de Oliveira, pela confiança, competência,
orientações e incentivo;
Às minhas colegas e professoras da Faculdade de Educação da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, que comigo convivem diariamente e que
muito me incentivaram, apoiaram e me deram força para concluir deste trabalho:
Maria Otilia J.M. Martins; Ms. Marinella Binda Rossetti, Ms. Mônica Frabizi Valenzi
Mendes e Drª. Hyrla Leal;
À minha querida amiga Maria Enokida, que sempre me deu muita força, apoio e
amor, pelo seu incentivo, pela sua presença acolhedora nos momentos mais
difíceis;
A toda a equipe da EMEI Professora Irene Favret Lopes que sempre colaborou e
me incentivou a desenvolver este trabalho, permitindo-me repensar a formação
profissional dos docentes da educação infantil;
À Dra. Maria Fernanda C.F. Barca, minha querida médica, que me ajudou nos
momentos mais difíceis a me reerguer e continuar a caminhar;
Ao meu querido amigo Caio Domeneguetti, que me ajudou num dos momentos
mais importantes da minha vida a lutar pelo que considerava correto, por seu
amor, carinho e amizade;
À minha querida sobrinha Halika Groke, que sempre me incentivou a lutar pelos
meus ideais e jamais desistir dos meus propósitos.
Ao Doutor Vitor Luiz de Salles Freire, brilhante advogado, amigo de todas as
horas, que me deu muito apoio nos momentos mais difíceis;
Aos meus familiares e amigos que me manifestaram sempre seu apoio e
confiança.
A retórica neoliberal atribui um
papel estratégico à educação: tornar a escola um meio de transmissão dos seus princípios doutrinários, na difusão desses princípios, por meio de uma educação que preconiza o treinamento e o adestramento de seus profissionais docentes e dos discentes em processo de formação, os quais, sem o estímulo à reflexão crítica da realidade, reproduzem o fazer técnico.
Adriane G. da Silva
RESUMO
A presente dissertação de mestrado tem como objetivo inicial discutir questões relacionadas à formação profissional de professores da educação infantil no sentido de compreender como se deu a implementação do programa PEC – Formação Universitária Municípios no estado de São Paulo. Nesse intuito, procurou-se inicialmente conhecer a legislação pertinente a esse respeito, a qual subsidiou esta pesquisa. Além da preocupação em apreender a legislação, efetivou-se diversas leituras no intento de revisar a literatura existente, que serviu de embasamento para a discussão do tema. Diante de algumas leis, planos, resoluções e outros documentos, procurou-se conhecer a história da educação infantil, os direitos e fundamentos legais dos profissionais que nela atuam no que respeita a sua formação continuada, tendo em vista desenvolver o estudo sobre
este programa, que tem como objetivo a formação de professores em exercício, constituindo-se em um programa especial de formação de professores de 1ª a 4ª séries do ensino fundamental e da educação infantil. Partiu-se do princípio de que a formação continuada é uma necessidade, porém, entende-se a priori que uma formação contundente requer um tempo hábil para que os profissionais construam a práxis necessária para atuar de maneira compromissada e competente. Neste sentido, buscou-se compreender o processo histórico e da formação profissional dos professores da educação infantil, iniciando-se esse processo a partir de um resgate sucinto da trajetória de vida da autora deste estudo. Em seguida procedeu-se um exame de alguns aspectos históricos da educação infantil, apresentando-se alguns tópicos, os quais se afiguram extremamente importantes para a melhor compreensão e estudo da matéria. Dando-se continuidade ao estudo fez-se uma incursão pelas Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 4024/61, 5692/71, 9394/96), além do exame da Constituição Federal de 1988 e do Referencial Curricular Nacional de Educação Infantil, no intuito de demonstrar o processo constitutivo do atendimento da educação infantil. Identificou-se também, nos mesmos ordenamentos legais, o tratamento dado ao professor que atua nesse nível educacional, a partir do auxílio de alguns teóricos que abordam o assunto, especialmente no que respeita a formação profissional dos docentes da educação infantil. Na seqüência, apresentou-se o Programa PEC – Formação Universitária Municípios, desenvolvido nos anos 2003 e 2004 na rede municipal de São Paulo, possibilitando nas Considerações Finais a discussão deste Programa, tendo-se como pano de fundo as crescentes exigências impostas pelos “novos tempos” em relação à questão da formação continuada, associadas às questões neoliberais específicas de um país “em desenvolvimento” como o Brasil. Faz-se necessário informar que não se teve a pretensão de abordar a totalidade dessas questões, intentou-se, tão somente, apontá-las como relacionais. Assim, espera-se que esta pesquisa sirva de orientação para outros pesquisadores na área da educação infantil e que a mesma, diferentemente de se tornar mais uma produção nas prateleiras da academia, suscite novas discussões e novos debates na área, inquietando alguns e, em outros, despertando “novos olhares” em direção a uma realidade mais crítica, social, política e educacional. PALAVRAS-CHAVE: Educação Infantil; Formação Profissional Docente; Formação Continuada; PEC – Formação Universitária Municípios.
ABSTRACT The primary purpose of this Master´s Thesis is to discuss questions related
to the early childhood teachers´ professional education in the sense of understanding how the PEC – University Education in Municipalities program took place in the state of São Paulo. With this aim in mind, a study was initially conducted on the related laws in order to guide this research. In addition to understanding the laws, several readings were effected to revise the existing literature that served as basis to discuss the theme. Owing to some laws, plans, resolutions and other documents, the history of early childhood education was studied, together with rights and legal grounds of the professionals who operate in this segment, as regards to their continuous formation to develop the study about the program whose objective is the education of active teachers by developing a special teachers background program addressed to teachers teaching from the first to the fourth grades of the Elementary School and Early Childhood. The principle adopted in this study is that a continuous education is a need, however, it
is understood beforehand that having a good background so that professionals are able to develop the required elements to operate in an engaged and competent fashion is time-consuming. In this regard, emphasis is paced on the understanding of the historic process and on the early childhood teachers professional background. Which process started with a brief account of the life of the author of this study. Then, some historical aspects of early childhood education were examined, covering some topics considered extremely important for the understanding and the study of the subject. The study proceeded with the examination of the Laws of Guidelines and Bases of National Education (Law 4024/61, 5692/71, 9394/96), not to mention the 1988 Federal Constitution and the Early Childhood National Curricula Reference with the purpose of showing of provision of early childhood education. The treatment given to the teacher operating in this educational level was identified in the same legal system, starting from the helf of some theorists who approach the matter, specially regarding the professional background of teachers working with early childhood students. Subsequently, PEC - University Education in Municipalities ´ Program was presented, as developed in the years 2003 and 2004 in the municipalities of São Paulo, leading to the Final Consideration of the discussion of this Program considered in light of the growing requirements imposed by the “new times” vis-à-vis the question of continuous education, coupled with the neoliberal questions specific of a developing country such as Brazil´s. It is worth mentioning that this study did not intend to cover the totality of these questions, but only to pinpoint them as as interrelated. Therefore, it is expected that this research may serve as a guide to other researches dealing with early childhood education and that instead of becoming one more work on the academic shelve it may leaden the area to new discussions and new debates in arising some people´s consciousness and bringing about “new insights” towards a more critical, social, political and educational reality.
KEY WORDS: Children´s Education, Teachers´ Professional Education; Continuous Education; PEC – University Education in Municipalities
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 13 CAPÍTULO I: O PROCESSO DA PESQUISA 20 1.1 TEMA 20 1.2 QUESTÕES NORTEADORAS DA PESQUISA 20 1.3 OBJETIVOS 23 1.3.1 OBJETIVO GERAL 23 1.3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS 23 1.4 METODOLOGIA 24 1.5 ORIGEM DA DISSERTAÇÃO: MINHA HISTÓRIA COMO PONTO DE PARTIDA 25 CAPÍTULO II: ASPECTOS HISTÓRICOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL 32
2.1 ALGUMAS QUESTÕES PRELIMINARES 32 2.2 ASPECTOS HISTÓRICOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL 38 2.3 HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL 61 CAPÍTULO III: EDUCAÇÃO INFANTIL E FORMAÇÃO PROFISSIONAL DOCENTE: ABORDANDO A LEGISLAÇÃO
72
3.1 EDUCAÇÃO INFANTIL E A LDB 4024/61 74 3.2 EDUCAÇÃO INFANTIL E A LDB 5692/71 80 3.3 EDUCAÇÃO INFANTIL E A CF/88 88 3.4 EDUCAÇÃO INFANTIL E A LDB 9394/96 92 3.5 REFERENCIAL CURRICULAR NACIONAL PARA EDUCAÇÃO INFANTIL (RCNEI) 101 CAPÍTULO IV: PROGRAMA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA – PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS
105
4.1 O PROGRAMA PEC - FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS E O CONTEXTO DE SUA REALIZAÇÃO NA PERSPECTIVA DE SEUS MENTORES
105
4.2 A PROPOSTA DO PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS 108 4.3 PRINCÍPIOS EDUCACIONAIS, POLÍTICO-INSTITUCIONAIS E PEDAGÓGICOS 110 4.3.1 O EXERCÍCIO DA DOCÊNCIA ESCOLAR DEVE SER A REFERÊNCIA DA ORGANIZAÇÃO INSTITUCIONAL E PEDAGÓGICA DO PROGRAMA DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES
111
4.3.2 OS PROFESSORES SÃO AGENTES FUNDAMENTAIS NA IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS EDUCACIONAIS
112
4.3.3 AS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA O ENSINO FUNDAMENTAL, O REFERENCIAL CURRICULAR NACIONAL PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL E OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS DEVEM SER TOMADOS COMO REFERÊNCIA NA FORMAÇÃO DO PROFESSOR MULTIDISCIPLINAR
113
4.3.4 A CONSTRUÇÃO DE COMPETÊNCIAS DEVE SER O EIXO ORGANIZADOR DO CURRÍCULO
113
4.3.5 A COERÊNCIA ENTRE A FORMAÇÃO DO PROFESSOR E A PRÁTICA DE ATUAÇÃO QUE DELE SE ESPERA DEVE PAUTAR TODAS AS ATIVIDADES QUE SERÃO DESENVOLVIDAS DURANTE O PROGRAMA
115
4.3.6 O DOMÍNIO DOS OBJETOS SOCIAIS DO CONHECIMENTO E SUA TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA DEVEM SER PRIORIZADOS
116
4.3.7 A DIMENSÃO DA PESQUISA NA FORMAÇÃO DO PROFESSOR DEVE GARANTIR O DESENVOLVIMENTO DE UMA POSTURA DE INVESTIGADOR QUE LEVE À REFLEXÃO SOBRE SUA AÇÃO COTIDIANA
117
4.4 OBJETIVOS E METODOLOGIA 117 4.5 PROPOSTA DE AVALIAÇÃO 121 4.6 PROPOSTA CURRICULAR: ESTRUTURA E ORGANIZAÇÃO 124 4.7 ASPECTOS DA INFRAESTRUTURA PROPOSTA 124 4.8 INSTITUIÇÕES PARTICIPANTES NA EXECUÇÃO DO PROGRAMA 133 4.9 ORGANIZAÇÃO CURRICULAR: UNIDADES TEMÁTICAS TRANSVERSAIS 136 CONSIDERAÇÕES FINAIS 142
REFERÊNCIAS 161 REFERÊNCIAS COMPLEMENTARES 171
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1: ESTRUTURA DE FUNCIONAMENTO DO PROGRAMA PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS
121
FIGURA 2: DESENHO INSTITUCIONAL DO PROGRAMA PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS
134
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1: ESTRUTURA DE FUNCIONAMENTO DOS MÓDULOS E DOS EIXOS TEMÁTICOS DO PROGRAMA PEC - FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS
124
QUADRO 2: ESTRUTURA DAS VIVÊNCIAS EDUCADORAS SUGERIDAS PELO PROGRAMA PEC - FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS
125
QUADRO 3: ESTRUTURA DAS OFICINAS CULTURAIS INDICADAS PELO PROGRAMA PEC - FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS
126
QUADRO 4: ESTRUTURA DAS ATIVIDADES DE MEMÓRIAS INDICADAS PELO PROGRAMA PEC - FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS
127
QUADRO 5: ESTRUTURA CURRICULAR DO PEC - FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS RELACIONADA AOS CONTEÚDOS DE POLÍTICAS PÚBLICAS
138
QUADRO 6: ESTRUTURA CURRICULAR DO PEC - FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS RELACIONADA AOS CONTEÚDOS DE POSSIBILIDADES TECNOLÓGICAS
140
LISTA DE FOTOGRAFIAS
FOTO 1: FOTO ILUSTRATIVA DA SALA DE VIDEOCONFERÊNCIA 129
FOTO 2: FOTO ILUSTRATIVA DO AMBIENTE DE APRENDIZAGEM ON-LINE 130
FOTO 3: FOTO ILUSTRATIVA DO AMBIENTE DE APRENDIZAGEM OFF-LINE 131
FOTO 4: FOTO ILUSTRATIVA DA SALA DE GERAÇÃO 132
LISTA DE ABREVEATURAS E SIGLAS
BIRD – Banco de Pesquisa e Desenvolvimento BM – Banco Mundial CEE - Conselho Estadual de Educação CFE – Conselho Federal de Educação
CNE – Conselho Nacional de Educação COEDI – Coordenação Geral de Educação Infantil COEPRE – Coordenação de Educação Pré-escolar DNCr – Departamento Nacional da Criança DCNs – Diretrizes Curriculares Nacionais EB – Educação Básica EI – Educação Infantil EMEI – Escola Municipal de Educação Infantil FDE – Fundação para o Desenvolvimento da Educação FUNDEF – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas ISE – Institutos Superiores de Educação LBA – Legião Brasileira de Assistência LDB – Lei de Diretrizes e Bases MEC – Ministério da Educação e Cultura OCs – Oficinas Culturais PEC – Programa de Educação Continuada PIB – Produto Interno Bruto PUC-SP – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo RCNEI – Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil TCC – Trabalho de Conclusão do Curso TCs – Teleconferências TMs – Trabalhos Monitorados SEC – Secretaria de Educação e Cultura SEE – Secretaria de Estado de Educação SEF – Secretaria de Ensino Fundamental UNDIME – União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância USP – Universidade de São Paulo VCs - Videoconferências VEs – Vivências Educadoras
11
INTRODUÇÃO
A presente dissertação de mestrado, constitutiva do processo avaliativo do
Curso de Mestrado em Educação, do Programa de Educação: Currículo,
orientado pela Profª. Drª. Marina Graziela Feldmann tem como objetivo inicial
discutir questões relacionadas à formação profissional de professores de
educação infantil no sentido de compreender como se deu a implementação do
programa PEC – Formação Universitária Municípios no estado de São Paulo, no
intuito de além de ampliar os conhecimentos desta pesquisadora a respeito do
assunto, propiciar a esse segmento, especialmente aos profissionais com os
quais se mantém contato profissional, um repensar relacionado à temática em
questão.
Sabe-se, da necessidade de educadores e profissionais de educação dar-
se um aporte teórico-prático contínuo. É de conhecimento público também que,
diante da formação precária e fragilizada das últimas décadas, especialmente
com o advento do neoliberalismo e da globalização, necessita-se buscar o
conhecimento capaz de habilitar os profissionais na sua atuação, no seu dia a dia
profissional. Trata-se de buscar a fundamentação teórico-prática imprescindível a
todo profissional, não aquela do aprender a aprender, tampouco a do saber fazer,
mas a práxis numa perspectiva de realidade concreta, sem se escamotear nem
encobrir essa realidade, mas descortinando-a e dessa forma produzir melhorias
para o coletivo social, para àqueles que nos cercam, para a humanidade.
Não se tem a pretensão de resolver os problemas da humanidade,
tampouco se pretende transformar o mundo, mas busca-se, tão somente, imprimir
12
transformações na própria realidade e, se nessa caminhada se contribuir para a
mudança, transformação do exercício profissional em práxis, ter-se-á cumprido
com o papel de educadora.
Neste sentido, espera-se que este trabalho de pesquisa possa contribuir no
sentido de ampliar olhares e oferecer debates aos interessados no assunto, ou
aos que abordam a questão, especialmente aqueles profissionais, pares, com os
quais se trabalha, tendo-se em vista a melhoria da atuação profissional do
coletivo.
A consciência da necessidade de aprofundar teoricamente a temática em
questão revela-se complexa, pois, considera-se, à semelhança de Marx que “todo
começo é difícil; [e] isso vale para qualquer ciência” (MARX, 1983, p. 11) e essa é
uma realidade a qual se tem vivenciado, uma vez que se pretende compreender o
processo de formação do profissional da educação infantil.
A precária formação acadêmico-profissional que os brasileiros são
expostos, especialmente no que respeita a maioria dos profissionais da educação,
e em especial os da educação infantil, requer estudos aprofundados e críticos
para seu desvelamento, nesse sentido têm-se urgência e necessidade de buscar
os saberes os quais historicamente foram negados ou foram ofertados a grupos
diferenciados, mormente ao profissional da educação infantil, o qual, ainda hoje é
visto como um profissional que requer pouca qualificação, no início de sua
formação inicial ou na sua formação continuada. Entretanto, há quem apesar
disso busque se qualificar, almejando absorver conhecimentos que possibilitem
compreender os meandros da educação brasileira a partir da formação
continuada seja, por meio de especialização, seja a partir da pós-graduação, e
assim em diante.
13
Essa contínua busca, entretanto, não se dá ao acaso, tampouco é objeto
de interesse de todos. Os motivos para isso são inúmeros e variados, seja pela
falta de tempo, seja pelas poucas condições econômicas, seja pelo não
investimento do governo na formação de professores, ou por tantos outros
motivos. Sabe-se, contudo, que o princípio de tudo está na formação, a qual se
inicia na infância, ou seja, na educação do sujeito social, voltada para a
compreensão do real.
Apesar de se compreender que a educação infantil é a etapa inicial da
formação desse sujeito social, tem-se no Brasil um descaso em relação a essa
fase da educação e, em conseqüência, com os profissionais que nela atuam.
Nesta perspectiva, considera-se de suma importância abordar este tema, pois
como se afirmou anteriormente, este trabalho também se constitui como parte do
processo de formação acadêmico-profissional desta pesquisadora.
Como iniciante nesse processo de busca e de formação continuada, não se
tem a pretensão de oferecer modelos de atuação profissional para os
profissionais que abordam o tema, tampouco para os que atuam na educação
infantil, mas buscam-se, a partir do exame do tema e do auxílio de alguns autores
estudiosos do assunto, produção teórica e prática, explicitações a
questionamentos que se faz sobre a formação do profissional docente da
educação infantil.
Após algumas leituras e a apropriação de algum aporte teórico, a partir da
revisão de literatura a respeito da temática, e compreendendo o nível de formação
dos professores de educação infantil, por meio de contato com profissionais que
atuam na área, uma questão que emergiu no início do processo de elaboração
14
desta pesquisa, relaciona-se às ações do Estado para a formação continuada de
professores.
A partir dessa questão, pensou-se sobre a ação municipal em relação às
medidas para a implementação da formação profissional continuada dos docentes
da rede municipal de São Paulo. Buscou-se identificar as ações efetivas
executadas pelo município a respeito da formação profissional. Nessa ocasião,
tomou-se conhecimento de um programa de formação de professores, executado
em alguns municípios do estado de São Paulo e, diante de inúmeras dúvidas,
optou-se por fazer um estudo sobre o mesmo.
Nesse intuito, procurou-se inicialmente conhecer a legislação pertinente a
esse respeito, a qual subsidiou esta pesquisa. Além da preocupação em
apreender a legislação, efetivou-se diversas leituras no intento de revisar a
literatura existente, que serviu de embasamento para a discussão do tema. Assim
se iniciou o processo de elaboração dessa monografia.
Diante de algumas leis, planos, resoluções e outros documentos, procurou-
se conhecer a história da educação infantil, os direitos e fundamentos legais dos
profissionais que nela atuam no que respeita a sua formação continuada, tendo
em vista desenvolver um estudo sobre o Programa de Educação Continuada –
PEC – Formação Universitária Municípios, que tem como objetivo a formação de
professores em exercício, constituindo-se em um programa especial de formação
de professores de 1ª a 4ª séries do ensino fundamental e da educação infantil.
Partiu-se do princípio de que a formação continuada é uma necessidade,
porém, entende-se a priori que uma formação contundente requer um tempo hábil
para que os profissionais construam a práxis necessária para atuar de maneira
compromissada e competente. Neste sentido, enveredar na apropriação de
15
conhecimentos e analisá-los criticamente é o papel de todo pesquisador, o qual
também cabe a esta pesquisadora. Pretende-se, assim, seguir esse caminho.
Nesta perspectiva, estruturou-se esta dissertação em quatro capítulos
indicados a seguir, além desta introdução, das considerações finais e das
referências.
No CAPÍTULO I: O PROCESSO DA PESQUISA apresenta-se o processo
desencadeador desta monografia de dissertação de mestrado, o qual se deu ao
ingressar no Programa de Educação: Currículo. No processo de realização de
diversos cursos foram-se identificando as etapas desta pesquisa, tais como: o
tema; as questões norteadoras do estudo; os objetivos (geral e específicos)
orientadores; a metodologia e a origem da dissertação, trabalhada por meio de
um resgate sucinto da trajetória de vida desta pesquisadora e que desencadeou o
desejo em desenvolver este trabalho.
No CAPÍTULO II: ASPECTOS HISTÓRICOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL
têm-se como objetivo abordar alguns aspectos históricos da educação infantil,
perpassando-se por questões consideradas como essenciais para a discussão do
assunto. Neste sentido, optou-se por discorrer inicialmente algumas
considerações preliminares, passando-se à história da educação infantil e, na
seqüência, apresentam-se alguns tópicos, os quais se afiguram extremamente
importantes para a melhor compreensão e estudo da matéria.
No CAPÍTULO III: EDUCAÇÃO INFANTIL E FORMAÇÃO PROFISSIONAL
DOCENTE: ABORDANDO A LEGISLAÇÃO, faz-se uma incursão pelas Leis de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 4024/61, 5692/71, 9394/96, além
da Constituição Federal de 1988 e do Referencial Curricular Nacional de
Educação Infantil no intuito de demonstrar o processo constitutivo do atendimento
16
da educação infantil, educação de crianças de 0 a 6 anos. Identifica-se também,
nos mesmos ordenamentos legais, o tratamento dado ao professor que atua
nesse nível educacional, a partir do auxílio de alguns teóricos que abordam o
assunto, especialmente no que respeita a formação profissional dos docentes da
educação infantil.
No CAPÍTULO IV: O PROGRAMA DE FORMAÇÃO CONTINUADA – PEC
– FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, apresenta-se o Programa PEC –
Formação Universitária Municípios e fazem-se considerações sobre o programa
especial de formação de professores das redes públicas municipais do estado de
São Paulo.
Nas CONSIDERAÇÕES FINAIS, serão discutidos os resultados e análises
da pesquisa documental bibliográfica. Nesta etapa do trabalho serão
consideradas as crescentes exigências impostas pelos novos tempos em relação
à questão da formação continuada, especialmente no que respeita ao projeto
PEC – Formação Universitária Municípios.
Essas e outras questões, além das específicas de um país de terceiro
mundo – Brasil, relacionam-se diretamente com este trabalho. Apesar de não se
ter a pretensão de abordar a totalidade dessas questões, intenta-se, tão somente,
apontá-las como relacionais. Assim, espera-se que esta pesquisa sirva de
orientação para outros pesquisadores na área da educação infantil e que a
mesma, diferentemente de se tornar mais uma produção nas prateleiras da
academia, suscite novas discussões e novos debates na área, inquietando alguns
17
e, em outros, despertando “novos olhares”1 em direção a uma realidade mais
crítica, social, política e educacional.
CAPÍTULO I
O PROCESSO DA PESQUISA
Neste capítulo apresenta-se o processo desencadeador desta dissertação
de mestrado, desenvolvida no Programa de Educação: Currículo. No processo de
realização de diversos cursos foi-se identificando as etapas desta pesquisa, tais
como: o tema; as questões norteadoras do estudo; os objetivos orientadores da
mesma; a metodologia e a origem da dissertação, trabalhada por meio de um
resgate sucinto da trajetória de vida desta pesquisadora e que desencadeou o
desejo em desenvolver este trabalho. A seguir, apresentam-se suas etapas.
1.1 TEMA
EDUCAÇÃO INFANTIL E FORMAÇÃO PROFISSIONAL DOCENTE: UM
ESTUDO SOBRE O PROGRAMA PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA
MUNICÍPIOS, NO ESTADO DE SÃO PAULO.
1.2 QUESTÕES NORTEADORAS DA PESQUISA
A educação infantil, desde a Constituição Federal de 1988, tem se
constituído como tema de relevância, uma vez que passou ser responsabilidade e
1 Grifos da autora.
18
dever do Estado, o qual a integrou no sistema nacional de educação (CF/88, 208,
IV). A partir da LDB N. 9394/96 a educação de crianças na faixa etária de 0 a 6
anos passou a fazer parte da legislação ao ser considerada à etapa inicial da
educação básica. Apesar de não se constituir em uma área nova, esse fato
suscitou um interesse diversificado na mesma, ampliando a atenção de
pesquisadores e profissionais atuantes nela.
A amplitude de pesquisadores interessados no estudo da educação infantil
fez surgir uma gama de pesquisas na área, a partir dos mais variados enfoques.
Alguns relacionados à questão da criança no espaço escolar, outros direcionados
à questão do método educacional, outros voltados à formação do professor, ou à
formação continuada, além de tantos outros. Juntamente com essas
investigações, surgiram formas diferenciadas de análise, algumas muito críticas,
outras nem tanto, somando-se às pesquisas já existentes2.
Neste trabalho, buscou-se apresentar a educação infantil a partir da
formação profissional de seus professores, especificamente por meio de um
estudo documental, bibliográfico e descritivo da educação infantil, perpassando
por três questões fundamentais: um resgate da sua história, um estudo da sua
documentação e por último um exame do programa PEC – Formação
Universitária Municípios, desenvolvido no Estado de São Paulo.
2 Ver a esse respeito: SAVIANI, D. A Nova Lei da Educação: LDB trajetória limites e perspectivas. 3. ed. Campinas, SP: Autores Associados, 1997.; KUHLMANN JR., M. Infância e educação infantil uma abordagem histórica. Porto Alegre: Edição, 1998.; KISHIMOTO, T. M. A Política de formação profissional para a educação infantil: Pedagogia e Normal Superior. Educação & Sociedade. n. 68. Campinas, 1999.; GOULART, A. e PALHARES, M. S. (Orgs.). Educação infantil pós-LDB: rumos e desafios. 2. ed. Campinas, SP: Autores Associados – FE/UNICAMP; São Carlos, SP: Editora da UFSCar; Florianópolis, SC: Editora da UFSC, 2000.; GHIRALDELLI JR. P. (Org.). Infância, educação e neoliberalismo. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2000.
19
Um dos motivos que suscitou este estudo diz respeito ao exercício desta
pesquisadora no campo educacional, atualmente na gestão de uma EMEI,
possibilitando o acesso a inúmeros profissionais que atuam na área, assim como
à realidade vivenciada pelos mesmos, inclusive convivendo-se com alguns que
fizeram parte do programa em questão.
Neste sentido, a questão fundante deste trabalho tem relação a interesses
particulares, ou seja, têm-se o desejo de compreender como se deu o processo
de formação profissional dos docentes da educação infantil. Essa questão
suscitou outra mais específica, relacionada ao exame do projeto PEC – Formação
Universitária Municípios, em que se buscou compreender se este programa,
desenvolvido no Estado de São Paulo, representa a tão almejada formação
superior dos profissionais da educação infantil3, constituindo-se em um real
avanço no que respeita à formação profissional desses docentes. A partir desta
questão examinou-se o documento à medida que o mesmo representa as
diretrizes políticas para a formação dos docentes da educação infantil no
município de São Paulo. Buscou-se também, após a compreensão mais
aprofundada desse documento, esclarecer aos profissionais, com os quais se
atua, sobre as políticas de formação implementadas nos municípios paulistanos
no intuito de ampliar a discussão e contribuir criticamente com a formação desses
profissionais.
A partir dessas questões, outras norteadoras, voltadas para o estudo deste
programa e da realidade ao qual está vinculado, foram formuladas, quais sejam:
Por que um curso de formação de professores por meio de videoconferências e
3 Segundo o documento do PEC - Formação Universitária Municípios (2003, p. 13) o programa tem como objetivo oferecer um programa superior especial de licenciatura plena aos docentes das redes municipais paulistas da Educação Infantil e de 1ª e 4ª séries do Ensino Fundamental.
20
teleconferências? Por que um curso de formação de professores separado dos
cursos de formação superior - dos cursos de pedagogia? E por fim, por que um
curso com duração de dois anos, para profissionais que necessitam de tanta
formação? Estas questões nortearam esta pesquisa e subsidiaram o processo de
formação continuada desta pesquisadora.
1.3 OBJETIVOS
1.3.1 OBJETIVO GERAL
Analisar o Programa de Educação Continuada – PEC – Formação
Universitária Municípios, implementado em diversos municípios de São Paulo nos
anos 2003 e 2004, a fim de investigar se o mesmo representa uma real
contribuição no que respeita à formação profissional dos docentes da educação
infantil.
1.3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Desenvolver uma revisão da literatura sobre a educação infantil como
forma de subsidiar a compreensão do tema e a leitura crítica e interpretativa do
mesmo;
Pesquisar em bibliotecas, nos sites da internet e em órgãos oficiais
documentos legais sobre a educação infantil, no intuito de auxiliar a
compreensão histórica da educação infantil;
Selecionar autores, a partir de um estudo bibliográfico, os quais abordem
temas voltados à educação infantil, e, em especial, ao assunto da formação
profissional dos docentes da educação infantil;
Realizar um estudo crítico - interpretativo sobre o programa de educação
21
continuada - PEC – Formação Universitária Municípios, a partir do estudo
documental do mesmo.
1.4 METODOLOGIA
A partir da definição dos objetivos constatou-se a necessidade de se definir
procedimentos que viabilizassem a execução desta pesquisa. Optou-se por
desenvolver um estudo bibliográfico, documental, descritivo, haja vista que se
buscou apreender a história da educação infantil como subsídio para
compreender a formação profissional dos docentes da área. Esse processo inicial
de apreensão de massa crítica foi fundamental para se proceder ao estudo,
delimitado na investigação do Programa de Educação Continuada – PEC –
Formação Universitária Municípios, dos Municípios paulistanos, realizado nos
anos 2003 e 2004. O objetivo almejado era proceder a uma análise do programa
para compreender se o mesmo representa uma real contribuição no que respeita
à formação profissional dos docentes da educação infantil.
Para alcançar esse fim, partiu-se de uma pesquisa bibliográfica, a qual
subsidiou o aprofundamento teórico do tema da formação profissional na
educação infantil, assim como auxiliou a compreensão de questões relacionadas
à revisão da literatura no que respeita ao histórico da educação infantil e ao
aspecto referente à sua legislação específica.
A apropriação teórica em relação ao histórico e à legislação foi essencial
para se dar início ao estudo. Após o aprofundamento dessas etapas, buscou-se a
apropriação do documento PEC – Formação Universitária Municípios.
Concomitantemente ao levantamento do material bibliográfico, o qual foi
selecionado por meio de uma leitura analítica e interpretativa, buscou-se
22
estabelecer os nexos entre o objeto de estudo e os textos selecionados.
Posteriormente, fizeram-se observações sobre o material consultado,
considerando a sua importância em função do trabalho elaborado. Em um
segundo momento, analisou-se criticamente esse material, relacionando-o ao
tema e aos objetivos de pesquisa. Esses procedimentos contribuíram na análise
do programa PEC – Formação Universitária Municípios, uma vez que subsidiaram
a compreensão e a leitura crítica do programa, no que respeita ao entendimento
dos meandros ideológicos impregnados na documentação e que representam
interesses mascarados em propostas grandiosas.
Após esse processo de exploração documental, seleção bibliográfica,
sistematização de leituras e análises interpretativas a respeito da temática
educação infantil e formação profissional docente, elaborou-se a etapa da
pesquisa referente à análise do programa objeto deste estudo, o qual
desencadeou o processo deste trabalho, definindo-se, no processo de sua
elaboração, os itens abordados e discutidos para sua consecutiva redação,
resultando nesta monografia de dissertação de mestrado.
1.5 ORIGEM DA DISSERTAÇÃO: MINHA HISTÓRIA COMO PONTO DE
PARTIDA
O objetivo deste tópico no trabalho é o de situar, a partir de uma etapa de
nossa história de vida4, como se deu o processo constitutivo desta pesquisa, pois
nossa vivência certamente foi a responsável pelos caminhos que se trilhou e que
se estar a trilhar. Identificar esse percurso significa remontar as nossas origens,
4 A intenção desta nota é esclarecer ao leitor que este item, em algumas passagens, foi redigido em 1ª. Pessoa do plural, haja vista tratar-se de parte da história de vida desta pesquisadora.
23
uma vez que elas são fundamentais no que respeita aos objetivos que nos
impomos em nossa atuação profissional, os quais perpassam o trabalho que
atualmente desenvolvemos como gestora de uma EMEI.
A origem deste trabalho, na verdade, remonta os anos 70,
especificamente ao ano de nossa formação em pedagogia, no final da década.
Como docente da educação, há vinte e oito anos, com experiência no ensino
da rede pública e privada, considera-se um privilégio ter atuado em todos os
níveis da educação. Nossa experiência teve início na educação básica,
passando-se pela educação infantil, ensino fundamental, médio, e, atualmente,
leciona-se no ensino superior, em cursos de licenciatura e pedagogia.
O processo dessa caminhada não foi fácil, mas com alguns sacrifícios
aliou-se à experiência docente uma outra, a experiência técnica, de especialista
em educação. Adquiriu-se essa formação profissional, a partir do exercício em
alguns cargos e funções, desempenhando-se os seguintes cargos/função:
Gestora de uma EMEI (função atual); Coordenadora Pedagógica, na mesma
EMEI a qual se é gestora; Diretora de Escola Pública; Supervisora em Escolas de
Educação Infantil e Ensino Fundamental. Todas essas funções realizadas na rede
pública do Município de São Paulo.
Em 1981, iniciou-se a atuação na função de educadora da rede pública
paulistana, e em 1991, em razão de aprovação em concurso público, passou-se à
condição de efetiva, como diretora de Escola.
O trabalho desenvolvido na rede pública de São Paulo, mais
especificamente na Zona Leste paulistana, foi sempre muito desejado. Apesar de
todas as dificuldades relacionadas às condições de trabalho, haja vista se estar
em uma Zona com altos índices de violência, em nenhum momento se pensou em
24
sair dessa região. Sabe-se que essa área, composta pelos bairros de Vila Maria,
Itaquera, Vila Matilde, Guaianases, Tatuapé, São Miguel, Arthur Alvim, São
Mateus e Cidade Tiradentes, além de violenta é bastante carente, talvez esse
tenha sido o motivo que nos instigou a desenvolver nossas atividades
profissionais nela.
Essa realidade, precária e carente, apresentou-se como estimuladora,
uma vez que a mesma exigia mais formação, constituindo-se, na verdade,
como fonte de motivação para adquirirmos mais e mais conhecimentos.
Nosso desconhecimento em algumas atividades, carências da formação
inicial, sinalizava-nos para a contínua busca de conhecimentos, resultando em
uma necessidade pessoal de querer aprender sempre e, ao mesmo tempo, de
rever nossas práticas.
Compreendendo-se, à semelhança de Lorca que o caminho se faz a
caminhar, tem-se como meta a busca contínua de apreensão de saber. Sabe-se,
contudo, que não há teoria sem prática, portanto a práxis é o que se objetiva.
Coerente com nossos procedimentos e ações, voltados para a busca
incessante de saber, de conhecer novas realidades, de vivenciar novas
experiências, de enfrentar desafios, apesar de todos os receios. Sabe-se, porém,
que nem sempre se está preparado para os problemas que surgem no dia a dia
profissional. Diante disso, e sabedoras de que o caminho se faz a caminhar,
resolvemos adotar uma postura consciente e responsável por onde atuamos.
Assumiu-se o papel de educadora, compreendendo-se este de forma ativa -
participativa, ou seja, passou-se a atuar a partir de uma atitude profissional
compromissada com o coletivo com o qual se trabalha, buscando-se melhorias
para esse grupo e neste sentido agir, dialogar e contribuir para a superação das
adversidades.
25
Freitas (2002) afirma que o educador deve assumir uma posição definida
em termos políticos - sociais, assumindo sua condição de sujeito social que, numa
sociedade de classes precisa definir a si próprio a sua compreensão teórica –
filosófica, político – ideológica de mundo. Dessa forma, esse sujeito passa a
definir o que pretende e como deseja atuar no mundo, assumindo riscos e os
enfrentando, porém se o fizer coletivamente, certamente transporá as pedras do
caminho com maior facilidade.
Dessa forma, buscou-se administrar os problemas com a participação do
coletivo da escola em que se atua. Procurou-se reunir professores e a
coordenação pedagógica, responsável diretamente pela orientação das atividades
executadas, a fim de discutir os problemas e solucioná-los. Entretanto, percebeu-
se que as necessidades, as vivências, as experiências e as expectativas de cada
professor são diversificadas e únicas.
Essas reuniões permitiram ainda compreender que as formações são
diferenciadas, detectando-se que alguns são muito comprometidos, interessados
e preocupados com a defasagem de seus conhecimentos, outros nem tanto,
rejeitando toda atividade relacionada à apreensão de saber.
Aprendeu-se muito com isso e, à medida do possível, tenta-se desenvolver
e estimular a todos, a fim de que aproveitem todas as oportunidades que surjam
para melhorar sua formação profissional, através de leitura de livros, jornais e
revistas periódicas, visitas a exposições e museus, cinema, teatro, ou ainda por
meio de viagens de estudo, conferências, palestras, colóquios, etc.
Sabe-se, contudo, que as dificuldades desses profissionais são inúmeras,
seja pela desvalorização associada à baixa remuneração salarial, seja pela falta
de formação inicial e continuada – quase sempre em conseqüência da ausência
26
de incentivo financeiro público, seja pela estressante jornada de trabalho - na
maioria das vezes dupla, ou ainda pelas carências sócio-econômicas. Enfim,
pode-se identificar diversas causas que levam os professores a se acomodarem.
É comum também haver professores que não se percebem como
profissionais. Esses, quase sempre, só participam das atividades quando as
mesmas são obrigatórias e quando são oferecidas pela Secretaria Municipal de
Educação. Percebeu-se na escola na qual se atua que alguns desses professores
haviam se infantilizado, falando quase sempre no diminutivo, pareciam apresentar
comportamentos próprios do mundo infantil, tais como: choravam muito quando
desagradados; batiam as portas e saiam da sala de reunião quando suas idéias
não eram aceitas; deixavam de se comunicar com os colegas que não
compartilhavam de suas idéias, ou que, eventualmente, delas discordavam.
Nesse processo de contínua aprendizagem, resolveu-se pesquisar sobre
essa diversidade e percebeu-se que o problema não seria tão simples de
solucionar, pois não se formam sujeitos a partir de modelos “prontos e acabados”5
para serem absorvidos, tampouco se formam sujeitos sociais críticos a partir do
uso de técnicas para serem reproduzidas. Talvez esse modelo, que é
amplamente divulgado e utilizado na formação de professores da educação
infantil, não seja adequado quando se pretende formar sujeitos sociais críticos
participativos de sua realidade e que utilizem seus saberes, seus conhecimentos,
no sentido de promover a formação de outros sujeitos sociais.
5 Entende-se por modelos “prontos e acabados” aqueles que se encontram concluídos, totalmente finalizados, fechados, padronizados, incapazes de absorverem qualquer alteração em seu processo de implementação, devendo, portanto, serem somente reproduzidos. Diz-se que um projeto está pronto e acabado quando ele não admite qualquer alteração no processo de sua execução, portanto, nesta perspectiva, tem-se um projeto tradicional, fixo e irreal, haja vista que a realidade é movimento, é mudança contínua, uma vez que ela depende das múltiplas determinações do real.
27
Nos dias de hoje é comum se encontrar modelos de implementação do
fazer técnico, considerando-se isto como uma revolução. Àqueles que pouco ou
nada sabem, talvez, essa proposta lhes caiba, certamente por não
compreenderem a fundo o que representam tais propostas, entretanto, há quem
duvide desses fazeres técnicos do tipo “aprender a aprender”6, ou “aprender a
fazer”7, considerando-os como adaptações rudes de formações importadas de
países de primeiro mundo.
Apesar de se estar em pleno século XXI, os problemas do século passado
permanecem na educação, com a agravante de se ampliarem progressivamente
pela implementação de políticas neoliberais no campo educacional, tanto no que
respeita à educação infantil quanto à formação de professores. Esse é o caso
quando se percebe que as atitudes permanecem, haja vista a adoção de modelos
que outros países utilizam, ou ainda, quando tais modelos representam, segundo
organismos internacionais como o Banco Mundial8, a pseudo-solução para os
problemas educacionais brasileiros.
A partir dessa reflexão inicial e na busca incessante de alternativas para a
solução de problemas do dia a dia profissional, tomou-se conhecimento do
programa PEC - Formação Universitária Municípios, realizado entre 2003 e 2004,
à semelhança do PEC - Formação Universitária, desenvolvido entre 2001 e 2002
pela Secretaria de Estado de Educação, para professores da rede estadual
paulista.
6 Ver a esse respeito DUARTE, N. Vygotsky e o “aprender a aprender”: crítica às apropriações neoliberais e pós-modernas da teoria vigotskiana. 2. ed. rev. e ampl. Campinas, SP: Autores Associados, 2001. 7 Ibidem. 8 A esse respeito ver TOMMASI, L. D.; WARDE, M. J.; HADDAD, S. (Orgs.). O Banco Mundial e as políticas educacionais. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1998.
28
Desse conhecimento, fez-se a opção em pesquisar essa experiência,
realizada em diversos municípios de São Paulo entre os anos 2003 e 2004,
selecionando este programa como o objeto desta pesquisa. Trata-se de um
assunto que tanto se relaciona com a atividade profissional da pesquisadora, pois
se atua como gestora de uma EMEI, quanto também é instigante. Espera-se,
portanto, que este estudo possa contribuir também para a formação de outros
profissionais atuantes na área, ou ainda àqueles que a pesquisem e debatam o
assunto.
No capítulo seguinte, Capítulo II: ASPECTOS HISTÓRICOS DA
EDUCAÇÃO INFANTIL apresentar-se-ão, conforme identifica o título, alguns
aspetos relacionados à educação infantil, situando-se aspetos históricos e
questões relacionadas à formação profissional do docente que atua na área.
CAPÍTULO II
ASPECTOS HISTÓRICOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL
Neste capítulo tem-se como objetivo abordar alguns aspectos históricos da
educação infantil, perpassando-se por questões consideradas como essenciais
para a discussão do assunto. Neste sentido, optou-se por discorrer inicialmente
algumas considerações preliminares, passando-se à história da educação infantil
e, na seqüência, apresentam-se alguns tópicos, os quais se afiguram
extremamente importantes para a melhor compreensão e estudo da matéria.
2.1 ALGUMAS QUESTÕES PRELIMINARES
29
O século passado registrou significativo esforço de estudiosos e
pesquisadores em produzirem estudos sobre a Educação Infantil no contexto da
sociedade brasileira. Tais estudos resgatam aspectos significantes acerca da
institucionalização da área da educação infantil e de como a mesma foi
incorporada no Plano Nacional de Educação.
Conforme sinaliza Moreira Leite (1997), a infância transformou-se em
questão central para o Estado no final do século XX. Paralelamente, alguns
setores da sociedade civil, tais como: legisladores, educadores, organizações
não governamentais, além de Organismos Internacionais, voltaram também
sua atenção para o assunto, antes considerado de somenos importância no
campo educacional, por não haver sido, até então, objeto de uma melhor
avaliação no que concerne à sua importância para a formação e consolidação
da cidadania. Como resultado principal, vê-se que o Estado passou a traçar
políticas públicas para atender as necessidades postas por este segmento
social. Tal fato ocorreu em função da infância ter perdido o seu caráter
romântico, passando a fazer parte das estatísticas oficias sobre violência,
marginalidade infantil, mortalidade infantil e outras mazelas sociais.
Apesar do Brasil possuir significativa arrecadação tributária,
apresentando um Produto Interno Bruto (PIB) com valores bastante elevados,
estudos realizados com a finalidade de mensurar os índices de qualidade de
vida da população vêm demonstrando que o país é recordista em
desigualdades sociais. A distribuição de renda apresenta-se concentrada em
um número muito pequeno de famílias, localizadas especialmente nas regiões
sul e sudeste do país. Os altos números apresentados pelo PIB, se avaliados
sob a ótica do social, evidenciam que o crescimento econômico se dá somente
para uma parcela da população, uma vez que a renda média dos 10% mais
ricos da população é aproximadamente 30 vezes maior que a renda média dos
40% mais pobres (BANCO MUNDIAL, 1998a). Em decorrência, embora
30
contando com um PIB considerável, tal resultado de caráter meramente
financeiro e contábil, configura-se como um dado localizado, aparente, não
representativo do crescimento e bem estar social, uma vez que a maioria da
população possui renda individual bastante reduzida.
Estudos voltados para o assunto apontam para a necessidade de se
adotar um planejamento econômico e social que priorize o atendimento à
população carente, como forma de minimizar os problemas decorrentes da má
distribuição de renda que afetam o país, atingindo especialmente os mais
carentes, e neste contexto, a infância. Essa realidade amplamente conhecida e
divulgada, embora não seja nova, está a requerer ações efetivas e eficazes que
visem minimizar a atual conjuntura vigente no Brasil.
O Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial do Banco Mundial (2003)
aponta como uma das soluções possíveis, a criação de mecanismos que
possibilitem que a sociedade civil, por meio de seus empresários, melhore os
padrões de vida da população carente, oferecendo “[...] oportunidades e
incentivos para investir de maneira produtiva, criar empregos, crescer e dessa
forma contribuir para o crescimento e redução da pobreza” (BANCO MUNDIAL,
2003: VII). O referido Relatório trata a pobreza e a desigualdade como um dos
principais desafios a ser enfrentado pelos chamados países “em
desenvolvimento”9, sinalizando para a necessidade de serem adotadas diretrizes
para a efetivação de políticas públicas tendentes a equacionar os problemas
delas decorrentes.
O Relatório assinala que a situação é crítica nos países “em
desenvolvimento”10, demonstrando receios da comunidade global, propondo,
dessa forma, medidas para a minoração da miséria nesses países, com a
9 Grifos da autora. 10 Grifos da autora.
31
intenção de tornar o mundo “mais inclusivo, equilibrado e pacífico” (BANCO
MUNDIAL, 2005, p. VII). A passagem a seguir identifica essa preocupação:
A ampliação de oportunidades para as pessoas nos países em desenvolvimento é uma preocupação premente tanto para os governos como para a comunidade global. Quase a metade da população do mundo vive com menos de US$2 por dia e 1,1 bilhão sobrevive com extrema dificuldade, com menos de US$1 por dia. O desemprego entre os jovens é mais do que o dobro da taxa média em todas as regiões e o crescimento da população adicionará quase dois bilhões de pessoas nos próximos 30 anos. A melhoria do clima de investimento nos países em desenvolvimento é essencial para proporcionar empregos e oportunidades para os jovens, criando assim um mundo mais inclusivo, equilibrado e pacífico. (BANCO MUNDIAL, 2005: VII).
Entretanto, diferentemente do que assinala o documento, percebe-se que a
verdadeira “missão”11 a que intenta o Banco Mundial, salvo melhor juízo, é a
descentralização do governo, a partir da implantação de sua política neoliberal, de
vez que, descentralizando-o também promove sua redução, deixando nas mãos
da sociedade civil competitiva a alocação de recursos sem a mediação estatal.
Percebe-se, assim, que o objetivo do Banco Mundial é, na verdade, introjetar nas
funções públicas os valores e critérios do mercado, os quais também devem ser
introjetados nas políticas públicas para a educação, a qual faz parte à educação
infantil.
Neste contexto o Banco Mundial apresenta suas considerações e
“preocupações”12 com a educação infantil, na medida em que considera que a
formação do cidadão se dá a partir da infância, compreendendo a faixa de 0 a 6
anos. Nesse particular, enfatiza a necessidade de investimento, público e privado,
propugnando que devem os governos investir na educação, especialmente nessa
11 O conceito “missão” foi utilizado a partir da categoria “vocação” proposta por Weber, o qual entende vocação como meio de ação racionalizada para construção de um “tipo ideal” weberiano. Para melhor compreensão desse conceito, utilizado no texto, ver WEBER, M. A ética protestante e o espírito do capitalismo. São Paulo: Pioneira, 1976. 12 Grifos da Autora.
32
fase, visando, em última instância, um futuro mais promissor, mais produtivo para
o país.
Como estratégia, o Banco Mundial orienta que se deve investir nas
pessoas e atribuir-lhes poder, para que aproveitem as oportunidades. Nessa linha
de orientações analisa os países “em desenvolvimento”13 e aponta as estatísticas
que retratam a exclusão social. Em seguida, sugere a implementação de ações
que revertam o quadro excludente.
Não se pode negar que a realidade brasileira é crítica, porém a leitura
do referido Banco é tendenciosa, uma vez que não evidencia que o capital, a
política neoliberal e globalizante são os principais fatores responsáveis pela
produção e acirramento dessa crise.
No que se refere à questão educacional, as estatísticas apontam que ainda
há no Brasil um contingente de aproximadamente 20 milhões de analfabetos. Este
dado, por si só, retrata o país e evidencia as desigualdades nele recorrentes,
demarcadas pelas elites que o governam, nesses mais de 500 anos de história.
No campo da educação infantil esse retrato não é diferente. Como
resultado, verifica-se que além da carência de espaços públicos para essa faixa
da população, o Estado se desobrigou de seu financiamento a partir da vigência
da Lei N. 9.424, aprovada em 26 de dezembro de 199614, passando a ter
responsabilidade direta apenas no que concerne ao ensino fundamental. Verifica-
se ainda que com a vinculação de parte da receita de impostos ao número de
alunos matriculados no ensino regular, os municípios passaram a promover o
ensino fundamental em detrimento da educação infantil, uma vez que para tal
13 Grifos da Autora. 14 Essa Lei regulamentou o FUNDEF – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério.
33
segmento não havia esse incentivo. A partir de então foram fechadas em diversos
municípios inúmeras pré-escolas, no afã de obter verbas com matrículas de
alunos no ensino fundamental, não sendo incomum constatar-se a existência de
alunos matriculados no ensino fundamental, com idade para cursar a última etapa
da pré-escola.
Esse crescimento desordenado de alunos por sala de aula contribuiu para
o agravamento da precária qualidade da educação, além de piorar as condições
de trabalho dos docentes. O mesmo aconteceu com a educação infantil, a qual
historicamente foi destinada à infância pobre, a partir tão somente de políticas de
cunho assistencialista15.
Mas, se não há verbas, não há investimento, tampouco profissionais
qualificados para o exercício da função, apesar de em tempos passados não se
ter cogitado, de início, acerca da necessidade de serem estabelecidos e
normatizados parâmetros e critérios mínimos que definissem o domínio e as
habilidades necessárias para a atuação no campo da educação infantil.
Kuhlmann Jr. (2001a) ao pesquisar sobre as trajetórias das concepções de
educação infantil sinaliza que essa educação se legitimou como meio agregador
da família bem como instrumento para a libertação da mulher do jugo das
obrigações domésticas e, ao mesmo tempo, como superação dos limites da
estrutura familiar, constituindo-se dessa forma como mediadora de conflitos
sociais.
A partir desse estudo, o autor resgata a história da institucionalização
da educação infantil e assinala que o seu surgimento no Brasil se deu em
15 Ver a esse respeito KRAMER, S. A política do pré-escolar no Brasil: a arte do disfarce. 3. ed. Rio de Janeiro: Dois Pontos, 1987.
34
meados do século XX, ou seja, a partir dos anos 30. Enfatiza ainda que a luta
pela pré-escola pública, democrática se confunde com a luta pela
transformação política e social mais ampla da sociedade brasileira, associando
reivindicações da educação infantil com as relacionadas a melhores condições
de trabalho docente.
Sob essa perspectiva Moreira Leite (1997) ressalta que os estudos sobre a
condição da infância, independentemente da crise social, ou da busca de
entendimento a respeito do comportamento infantil, surgem no bojo de um projeto
de escolarização não dissociado das mudanças ocorridas na sociedade, voltadas
particularmente para o mundo do trabalho, o qual a partir da globalização e das
políticas neoliberais, requeridas e orientadas por organismos internacionais como
o Banco Mundial e a UNESCO, exige da sociedade uma educação globalizada
universal.
A forma como se deu a expansão e o atendimento da educação infantil
no Brasil, foram marcados pela ausência de investimentos técnicos e
financeiros, necessários ao seu desenvolvimento. Conhecer e refletir sobre
essa história é o objetivo deste capítulo, na medida em que um exame
minucioso da situação da infância no país permitirá compreender as políticas
delineadas pelo Estado para esta área. Os itens a seguir apresentam uma
análise histórica do surgimento da educação infantil e, em seguida, retoma-se
o debate da história da educação infantil e seus desdobramentos no contexto
da sociedade brasileira.
2.2 ASPECTOS HISTÓRICOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL
Um conjunto de ações políticas, econômicas e sociais ocorridas no mundo
mercantil acabou por determinar transformações significativas no processo de
35
produção no interior da sociedade capitalista. Precisamente entre os séculos XV e
XVI, oportunidade em que se assistia a ascensão da burguesia mercantil, a
formação das monarquias nacionais, a afirmação da cultura renascentista e a
ruptura da unidade cristã na Europa Ocidental.
Com efeito, a extensão das fronteiras comercial do século XVI, contribuiu
para a expansão da sociedade e do mundo capitalista. Novos fundamentos
sociais, morais, econômicos, culturais e políticos passaram a ser exigência do
novo contexto do mundo moderno.
A sociedade moderna superou valores e modos de vidas dos séculos
passados, com isso permitiu a emergência de novas relações sociais e de um
novo homem. Este novo homem, dotado de características urbanas, representou
em sua singularidade uma visão antropocêntrica e racionalista16, resgatada da
antiguidade greco-romana, visão que se chocava com a postura teocêntrica e
dogmática, defendida pelo poder clerical na Idade Média.
Neste processo vislumbra-se emergir uma nova classe social, a burguesia,
classe que após atravessar um processo de expansão e consolidação, passou a
reivindicar direitos e propugnar por uma forma mais digna de vida. Para tanto, não
mais bastava a seus integrantes obter uma educação dogmática, era preciso
recorrer a uma educação que lhes desse condições de dominar a natureza e as
relações sociais.
16 Segundo Japiassú e Marcondes (1996) o termo “moderno [...] se opõe a clássico, tradicional. Considera-se que, do ponto de vista histórico, a filosofia moderna inicia-se com Descartes e Francis Bacon, caracterizando-se por sua ruptura com o pensamento medieval [...]. O pensamento moderno valoriza o indivíduo, a consciência, a subjetividade, a experiência e a atividade crítica, em oposição às instituições, à hierarquia, ao sistema e à aceitação dos dogmas e verdades estabelecidas, que caracterizam a ordem social medieval e o pensamento escolástico”. (JAPIASSÚ e MARCONDES, 1996, p. 185).
36
É nesse contexto que a educação passou a ser considerada uma
estratégia necessária para que os grupos hegemônicos mantivessem o status
quo, assistindo-se, paradoxalmente, no seio da referida classe social crítica a
consolidação dos valores da sociedade capitalista.
Os valores do capitalismo refletem-se no interior do pensamento
educacional e a educação passa a ser vista como atividade formadora do novo
homem, responsável por uma “nova ordem social”17.
No desenvolvimento deste processo duas posições se apresentam: a
primeira, fundamentada na escolástica18, defende a manutenção da estrutura
social e as prerrogativas da igreja, posição que se reflete no campo
educacional com a reorganização de suas escolas, de modo a garantir uma
educação religiosa e a instrução em disciplinas eclesiásticas; a segunda
posição procede à crítica a estrutura social vigente, e exige uma instrução
mais democrática, alicerçada em princípios humanistas19 e modernos.
A literatura especializada de fins do século XIX e inicio do século XX,
destinadas aos cursos de formação do magistério (cursos complementares,
cursos normais, institutos de educação e outros) registram o tratamento que as
crianças receberam no mundo e no Brasil, sob as mais variadas formas.
Todavia, a fundação destes estudos remonta as contribuições dos movimentos
coletivos existentes no interior dos séculos XVI ao século XVII.
Ariès (1978) estudioso pesquisador da temática foi pioneiro ao considerar
algumas características históricas da infância, situando-a como produto da
17 Grifos da Autora. 18 A esse respeito ver Japiassú e Marcondes (1996, p. 87), em que apresentam tanto o conceito de escolástica quanto os períodos de sua influência no pensamento ocidental medieval e moderno. 19 Japiassú e Marcondes (1996) apresentam o humanismo como um “movimento intelectual que surgiu no Renascimento. Lutando contra a esclerose da filosofia escolástica e aproveitando-se de um melhor conhecimento da civilização greco-latina, os humanistas [...] se esforçaram por mostrar a dignidade do espírito humano e inauguraram um movimento de confiança na razão e no espírito crítico” (JAPIASSÚ e MARCONDES, 1996 p. 132).
37
história moderna. Para ele a "paparicação da infância" se dá a partir do século
XVI e XVII, com o mercantilismo, na Europa, quando se altera o sentimento e as
relações frente à infância, modificado conforme a própria estrutura social. Assim
se expressa Áries:
Esse sentimento da infância pode ser ainda melhor percebido através das reações
críticas que provocou no fim do século XVI e, sobretudo, no século XVII. Algumas
pessoas rabugentas consideram insuportável a atenção que se dispensava então às
crianças: sentimento novo também, como que o negativo da infância a que chamamos
‘paparicação’. Essa irritação é a base da hostilidade de Montaigne: ‘Não posso conceber
essa paixão que faz com que as pessoas beijem as crianças recém-nascidas, que não têm
ainda nem um movimento na alma, nem forma reconhecível no corpo pela qual se
possam tornar amáveis, e nunca permiti de boa vontade que elas fossem alimentadas na
minha frente’. Ele não admite a idéia de se amar as crianças ‘como passatempo, como
se fossem macacos’, nem de se achar graça em seus sapateados, brincadeiras e bobagens
pueris. (ARIÈS, 1978, p. 159).
Conforme se pode observar nos registros de Ariès (1978), a criança, nos
séculos XVI e XVII, embora vista com indiferença, é percebida com
necessidades diferentes dos adultos. O autor evidencia como se efetivaram as
transformações do sentimento de infância e de família no contexto da
sociedade moderna. Informa que no século XVII tudo o que se referia às
crianças e à família tornou-se um assunto sério e digno de atenção.
Conforme afirma Ariès (1978) esses comportamentos da sociedade em
relação à criança acabam por desencadear posições divergentes no interior da
sociedade civil. “A partir do século XVII, as pessoas começaram a se defender
38
contra uma sociedade cujo convívio constante foi inspirado e marcado pelos
valores da educação, reputação e fortuna” (ARIÉS, 1978, p. 274).
Neste processo histórico as relações no interior da família com a criança
modificam-se, cabendo à mesma orientar a criança para uma vida em sociedade.
A família deixa de ser uma instituição de direito privado e passa assumir uma
função moral. Preparar a criança para a vida é dever moral. Como decorrência, a
aprendizagem tradicional, doméstica vai aos poucos sendo substituída pelo saber
construído no espaço escolar. “A família e a escola retiraram juntas a criança da
sociedade dos adultos” (ARIÉS, 1978, p. 277).
Transformaram-se as atitudes sociais de "paparicação", em "moralização",
e a reputação será uma marca necessária para a construção do futuro do homem,
compreendendo desde a seleção dos amigos até os assuntos a serem discutidos
em púbico, constituindo-se em elemento balizador para a formação de uma nova
moral social que por sua vez se constituiu mediante a apreensão de fundamentos
de orientação dos modos clássicos de inserção das crianças na sociedade.
Encontra-se em Rousseau (1979), na obra Emílio, uma referência sobre o
papel da infância. Ela é vista como depositária das esperanças da sociedade
futura que permanece no horizonte. Segundo Cerizara (1990), Rousseau foi um
polêmico em sua época, contrapondo-se as tese dos filósofos racionalistas, à
idéia do pecado original da igreja católica, ao sistema político social e educacional
do século XVIII e ao deslocar a análise para o social, buscando a explicação dos
fatos a partir da essência, mediante a utilização da observação. O ser humano
passa a ser visto por Rousseau (1979) como produto do social. A tal raciocínio
contrapõem-se os racionalistas, para os quais a natureza é concebida como fonte
de conhecimento exterior ao sujeito humano.
39
O século XVIII é marcado também pelo adultocentrismo, em que a
criança é considerada como miniatura e tratada sob a perspectiva do adulto,
não havendo distinção entre infância, adolescência e maturidade, o que
implicava, em última análise, em desvalorização ou negação da infância.
Rousseau (1979) critica os costumes sociais da época problematizando a
educação familiar e a escolar e dando ênfase à especificidade da infância
enquanto etapa de desenvolvimento humano. Ao mesmo tempo sinalizava a
importância do sentimento, da sensibilidade no processo educativo, numa
atitude quiçá inovadora.
Para Rousseau (1979) a infância tem uma função preponderante na
formação do homem, pois a mesma representa um momento essencial no seu
desenvolvimento. Neste sentido, considera que:
A infância tem maneiras de ver, de pensar, de sentir que lhe são próprias; nada menos sensato do que querer substituí-las pelas nossas; e seria o mesmo que exigir que uma criança tivesse cinco pés de altura como juízo aos dez anos. [...] Tratai vosso aluno segundo a idade (ROUSSEAU, 1979, p. 75-6).
Segundo o autor nesta fase o homem está abandonado a si mesmo,
situação que o persegue desde o nascimento; está mergulhado no individualismo,
em que o ser humano reconhece como guia o seu sentimento interior. Conforme
sinaliza o autor, a infância do homem é um momento privilegiado para a
elaboração de projetos formativos. Considera, ainda, que a formação dar-se-ia em
situações reais de aprendizagem, além de enfatizar a amizade e a convivência
como elementos imprescindíveis à formação moral do homem. Os sentidos e os
sentimentos são considerados como verdadeiros instrumentos do conhecimento.
Segundo esse filósofo, a educação começa com o nascimento do
homem; antes de falar, antes de compreender, ele se instrui. Afirma que a
experiência adianta-se às lições, que há uma relação entre sensibilidade e
40
razão no processo de conhecimento e que nas crianças o desenvolvimento da
razão está associado ao desenvolvimento do corpo, dos sentidos e das
experiências vividas.
Em sua obra, “Emílio”, escrita entre 1757 a 1760, Rousseau (1979) expõe
os princípios de uma educação conforme a natureza. A obra é composta por cinco
livros que correspondem à evolução natural da criança.
Em seu livro I - até aos 02 anos, Rousseau enfatiza que a educação
consiste em impedir todas as instituições de desfigurar a natureza humana. Ele
elabora um aluno imaginário e ele, como o preceptor o conduzirá do
nascimento ao casamento. Emílio será de inteligência média, rico e nobre.
Destaca o autor que a primeira educação deve obedecer à natureza
favorecendo o desabrochar físico: liberdade de locomoção, liberdade de entrar em
contato com o mundo pelos sentidos e descobrir o calor e o frio. Defende a idéia
de defender a criança de sentimentos estranhos à natureza, como espírito de
dominação. Nessa fase, enfatiza a importância da mãe, que favorece o
desenvolvimento da afetividade e o psicológico da criança.
No Livro II - Dos 02 aos 12 anos, reconhece que a criança ainda não está
pronta para desenvolver o raciocínio, devendo-se impulsioná-la à prática de
esportes, o que lhe possibilitará estabelecer as primeiras noções de conduta
moral.
No Livro III – Dos 12 aos 15 anos, Rousseau considera que (nesse
momento) a criança está pronta para o desenvolvimento da educação intelectual
e técnica, e o desenvolvimento de trabalhos manuais servirão à reflexão e a
meditação. Defende a idéia da Educação fundamentada na observação da
natureza.
41
No Livro IV – Dos 15 aos 20, propugna pela necessidade de preparar o
aluno (Emilio), para o estudo da sociedade, da moral e dos valores religiosos,
considerando fundamental desenvolver no homem a capacidade de refutar a
ambição, e adotar uma conduta competente, franca, reservada e agradável. Em
sua obra inaugura uma forma própria de pensar a educação da "criança da
natureza" que proporciona que a mesma evolua espontaneamente.
E, por último, no Livro V, argumenta sobre a condição da educação
feminina, a qual, em seu entender, deve estar alicerçada nos valores da
maternidade.
Pode-se perceber que Rousseau (1979) considera importante o papel do
educador na condução das crianças sob orientação das "leis naturais", pois
entende ser a criança o homem de amanhã, daí sua preocupação em formar a
criança para o futuro, para a realização de uma sociedade harmoniosa e
equilibrada. Assim defende um método de ensino que respeite à natureza
humana, ou seja, um ensino que compreenda a criança como criança e não como
um adulto em miniatura, de modo que se possa despertá-la para a vida a partir de
uma pedagogia nova, baseada no estudo e observação da natureza, inclusive a
humana.
Aproximadamente dois séculos depois que Rousseau defendeu sua
concepção sobre a educação, outro estudioso no campo educacional Freinet, em
um contexto marcado pelo pós-guerra, irá resgatar a esperança na criança, como
elemento capaz de fazer frente à corrupção adulta.
Para Freinet (1978 apud FREINET, 1979) pela educação, será possível
construir um novo amanhã, desde que as intervenções educativas se pautem nas
"virtualidades humanas". Para o autor, tais virtualidades estão originalmente
42
presentes na infância (criação, invenção, empreendimento, liberdade e
cooperação), e potencialmente, possibilitarão a construção de uma nova
sociedade. Inaugura-se aí o socialismo humanista.
Apesar de Freinet20 ter sido um dos educadores modernos que mais se
preocupou em vincular a escola à vida concreta dos alunos, sendo também o
pioneiro em exaltar a necessidade do respeito às condições sociais da criança e
das diferenças daí decorrentes, não logra escapar ao conflito tradicional da
intervenção pedagógica, cedendo à ideologia da preservação da infância e à
proposta de manter as crianças afastadas da participação no mundo adulto.
Todavia, à luz de tal concepção, mesmo tendo a criança encontrado um
espaço particular no mundo social, mais do que participar dele, torna-se
depositária das projeções da sociedade. Como, então, preservá-la na liberdade
e na independência em suas realizações? Projetando na infância seus anseios,
a sociedade acaba por manter-se contraditória em seus projetos educativos,
calcados em alguns momentos na preservação de uma infância idealizada, em
outros, no enquadramento em um mundo adulto.
Abraçando a temática da educação infantil, Campanella (1973), em sua
obra “Cidade do Sol”, critica o ensino servil da gramática e da lógica
aristotélica e defende a importância das crianças aprenderem ciências,
geografia, os costumes e as histórias pintadas nas paredes das cidades,
demonstrando já em seu tempo, uma preocupação com a educação da criança
desde a mais tenra idade (CAMPANELLA, 1973).
Ao se revisitar a história da educação, encontram-se outros filósofos que
expressam suas concepções sobre educação, e em particular sobre a educação
20 Ver a esse respeito: FREINET, C. A educação pelo trabalho. Lisboa, Presença, 1974; Idem. Para uma escola do povo. Lisboa: Presença, 1973.; FREINET, E. O itinerário de Célestin Freinet. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1979.
43
infantil. Comenius (1592 – 1657), autor de uma das mais significativas obras para
a educação, intitulada “Didática Magna” (1985), apresenta-a organizada em
quatro períodos, nos quais identifica os principais estágios presentes na formação
e desenvolvimento do homem: a infância, puerícia, adolescência e juventude,
cada um com duração de seis anos.
Em sua proposta educativa Comenius, elabora um plano para a escola
materna e atribui aos pais à tarefa da educação das crianças antes dos sete anos.
Compara o ser humano com a natureza, afirmando que:
Todos os ramos principais que uma árvore virá a ter, ela os faz despontar do seu tronco, logo nos primeiros anos, de tal maneira que, depois apenas é necessário que eles cresçam e se desenvolvam. Do mesmo modo, todas as coisas que queremos instruir um homem para utilidade de toda a vida deverão lhes ser plantadas logo nesta primeira escola. (COMENIUS, 1985, p. 75).
A participação da família na instrução das crianças é, segundo o autor, de
fundamental importância para a construção de uma sociedade harmônica.
Os aspectos históricos sinalizados até o momento evidenciam que a
infância tem permanecido como "a mais duradoura das utopias concebidas pela
modernidade", só sendo repensada mais contemporaneamente, como afirma
Calligaris (1994):
Como tantos outros ideais imaginados nos últimos 200 anos, o do mundo maravilhoso das crianças também entra em crise na era pós-industrial e pós-moderna. [...] Este tempo de separação da vida adulta, protegido pelo amor parental, miticamente feliz, surgiu em nossa cultura há apenas dois séculos, quando o individualismo triunfou no ocidente (CALLIGARIS, 1994, p. 6-4).
Entretanto, deve ser observado que, historicamente, a situação social da
infância sofreu gradativas alterações, deixando de ser encarada apenas como um
momento mágico, ideal e idolatrado, passando a ser estudada em seus mais
trágicos contornos: a violência, o abandono, o consumo infantil, etc., delineando
44
um outro lado do mundo infantil dos sonhos da humanidade, transformando-o
"numa caricatura perversa do próprio mundo adulto" (CALLIGARIS, 1994, p. 6-4).
Outro filósofo que trouxe uma contribuição significativa para a educação da
infância foi Pestalozzi (1746-1827)21, considerado o educador da humanidade, e
que sob a influência das idéias de Rousseau defendia uma formação, também
natural ao homem, mas situando-o em sua realidade histórica. Pestalozzi
organizou um sistema pedagógico que tinha como centro a intuição, considerada
o fundamento básico para atingir o conhecimento e ao mesmo tempo prover a
infância do domínio do saber. Pelo conteúdo e conjunto de suas idéias, Pestalozzi
é considerado um dos precursores da nova educação.
Ressaltou o autor que a educação se fundamenta na arte de conduzir as
crianças de intuições superficiais e fragmentárias a intuições sempre mais claras
e distintas. Sua contribuição, segundo Manacorda (1995), foi de grande valia para
a estruturação do pensamento educacional do século XIX. Seus procedimentos
de análise são considerados os fundamentos da nova pedagogia, tendo
informado o corpo teórico apropriado pelo ramo do conhecimento abraçado pela
psicologia infantil.
Apesar de tais avanços, cumpre ser ressaltado que, projetando na
infância seus anseios, a sociedade acaba por manter-se contraditória em seus
projetos educativos calcados em alguns momentos na preservação de uma
infância idealizada, em outros, no enquadramento em um mundo adulto.
No Brasil a Educação Infantil tem em seu nascedouro a herança de
pensadores europeus que são considerados os precursores dos estudos na área.
É oferecida como complementação à ação da família e com objetivos de 21 A esse respeito ver ARCE, A. A pedagogia na “Era das revoluções”: uma análise do pensamento de Pestalozzi e Froebel. Campinas, SP: Autores Associados, 2002.
45
proporcionar condições adequadas de desenvolvimento físico, emocional,
cognitivo e social da criança. O próprio aparecimento da pré-escola no Brasil se
deu sob as bases da herança dos precursores europeus, que inauguraram uma
tradição na forma de pensar e apresentar proposições para a educação da
criança nos “jardins de infância”, diferenciadas das proposições dos modelos
escolares.
O modelo minuciosamente proposto por Froebel (apud ARCE, 2002),
orientou muitas das experiências pioneiras no Brasil, a exemplo do “Jardim de
Infância Caetano de Campos”, tal como sinaliza o estudo de Kuhlmann Jr.
(2001b).
Modelos como o de Montessori e Décroly22, também integraram grande
parte das práticas que proliferaram entre nós com o aparecimento das pré-
escolas nos âmbitos públicos e privados, mesmo já na década de sessenta.
Porém, como já foi dito anteriormente, estes modelos, influenciados por uma
Psicologia do Desenvolvimento, marcaram uma intervenção pautada na
padronização.
Neste sentido, não se diferenciaram da escola tradicional, ao constituírem
práticas de homogeneização. Apesar de suscitarem a busca de uma pedagogia
para a criança na pré-escola mantiveram as mesmas intenções disciplinadoras
com vistas ao enquadramento social, mediante práticas e atividades que se
propunham mais adequadas a pouca idade das crianças.
O novo, em relação a esta tradição, apresenta-se através de uma produção
recente que resulta de influências teóricas e contextuais antes não colocadas.
22 Ver a esse respeito FREITAS, M. C. de. (Org.). História Social da Infância no Brasil. São Paulo: Cortez, 1997; MANACORDA, M. A. História da Educação: da antiguidade aos nossos dias. 4. ed. São Paulo: Cortez, 1995.
46
Mudam as formas de fazer e de pensar a educação da criança de 0 a 6 anos, que
passa a se dar em instituições educativas, estabelecendo-se como um novo
objeto das Ciências Humanas e Sociais. A identificação da construção de uma
Pedagogia da Educação Infantil, como um campo particular do conhecimento
pedagógico, revelada pela trajetória das pesquisas recentes analisadas situa-se
inicialmente também no âmbito da Pedagogia. Desta forma, nos interessa discutir
a sua própria delimitação como campo científico.
No século XIX, Manacorda (1995) destaca a figura de Fröebel (1782 –
1852), educador protestante alemão que desenvolveu teorias arraigadas em
pressupostos idealistas e inspiradas no amor à criança e à natureza. Foi
notadamente reconhecido pela criação dos “Kindergartens” (jardins de infância),
para os quais destacava ser importante cultivar as almas infantis. Para isso,
pregava ser fundamental preservar a atividade infantil, através da qual a criança
adquire o conhecimento e se relaciona com o mundo. Considerado como o
clássico da primeira infância, Fröebel (apud ARCE, 2002) fez suas primeiras
incursões no campo educativo, utilizando-se da fundamentação teórica
pestalozziana. Posteriormente, organizou suas idéias educacionais em vários
livros.
Essas idéias, segundo Fröebel, tiveram uma aplicação prática na primeira
infância, mas ele também considerava que elas se estendiam em todos os níveis
educacionais, pois entendia que o conhecimento se dava através da aplicação do
seguinte axioma: “exteriorizar o interior, interiorizar o exterior, unificar ambos”.
Esta era segundo ele a fórmula geral do homem. Considerava, portanto, que os
objetos exteriores excitam o homem para que os conheça, em sua essência e em
suas relações; para ele o homem está dotado de sentidos, isto é, de instrumentos
47
com os quais pode interiorizar as coisas que o rodeiam. Mas nenhuma coisa pode
ser mais conhecida senão quando comparada com os seus opostos e
encontradas suas semelhanças, que classificou como o “ponto de
união/intersecção”. Para o autor, tanto mais perfeito será o conhecimento de um
objeto, quanto melhor se realiza a comparação com o seu oposto e a unificação
dos dois.
Concomitantemente às suas produções teóricas, Fröebel concretizou o
seu projeto educativo com a criação do chamado “Kindergarten” (Jardim de
infância), em 1837, em Blankenburg, na Alemanha.
Desde então, todos os estabelecimentos criados para crianças pequenas
passaram a receber essa denominação. Para alguns autores, Fröebel é, ao
mesmo tempo, o máximo teórico do jogo e o seu mais ilustre realizador
prático. Ao compreender o aspecto educativo do brinquedo ou das atividades
lúdicas, Fröebel enfatizou seu papel ativo no processo de desenvolvimento na
infância, isto é, destacou a auto-atividade como o caminho mais viável para
determinação de um processo educacional.
Foi no final do século XIX e no decorrer do século XX, que aconteceram,
na Europa e nos Estados Unidos, mudanças significativas no campo educacional.
As escolas laicas marcaram a ruptura do domínio da Igreja sobre a educação,
reafirmando a hegemonia da burguesia liberal.
A escola experimentou nesse momento um movimento de renovação
pedagógica, denominado “movimento das escolas novas”. Pode-se dizer que
esse movimento foi resultante de toda uma mudança que já estava ocorrendo no
processo econômico - produtivo, gerando por via de conseqüência, importantes
mudanças sociais. Essas, por sua vez, exigiam a criação de um novo sistema de
instrução.
48
Nesse contexto destaca-se Décroly (apud ZABALA, 2002) que,
inicialmente, desenvolveu suas atividades educativas junto a crianças anormais.
Sua proposta de trabalho estava alicerçada nas atividades individual e coletiva da
criança, sustentadas em princípios da psicologia.
Inicialmente, suas experiências foram concretizadas em sua própria
residência, onde pôde observar, mais diretamente, o desenvolvimento infantil.
Em um momento posterior, optou por desenvolver sua proposta educativa
junto às crianças normais, criando uma escola em Bruxelas, denominada
“L’ermitage”. O trabalho desenvolvido por ele nessa escola, serviu de
referencial para que as autoridades belgas o adotassem como modelo oficial
nas escolas públicas. Sua preocupação, ao expor sua proposta, era a de
substituir o ensino formalista, baseado no estudo dos tradicionais livros de
textos, por uma educação diretamente voltada para os interesses e
necessidades das crianças.
O “Sistema Décroly” estava baseado em imperativos e em princípios
aplicáveis a uma nova escola, desenhada com o propósito de substituir e superar
a escola tradicional. Considerando a finalidade de seu sistema, pode-se afirmar
que ele o organizou com vistas a sobrepujar as deficiências do sistema educativo
que vigorava na época, criando novas possibilidades educativas.
Ao propor o programa, Décroly buscou definir suas características e os
domínios que o conhecimento deveria atingir, a fim de demonstrar sua real
dimensão e a referência do movimento do ato de ensinar e do de aprender. Em
conseqüência disso, concluiu que era mais importante que a criança se
conhecesse, e a partir daí conhecer o meio em que vive. Foi em função dessas
conclusões e das características acima citadas que apresentou o seu programa
de ensino sobre educação infantil, concebendo em primeiro lugar “a criança e
suas necessidades” e em segundo “a criança e seu meio”. Ao elaborar tal
49
programa, Décroly preocupou-se com a forma como ele deveria ser abordado,
partindo do princípio de que a melhor alternativa para abordá-lo seria fazer
uso de uma visão critica.
A sistematização de estudos no campo da educação infantil leva-se a
constatar, mais uma vez, a atualidade do pensamento de Décroly, estimulando a
se buscar, cada vez mais, um aprofundamento sobre suas contribuições, para
que se possa difundir a riqueza de seu pensamento.
Décroly propôs que o ensino fosse desenvolvido a partir dos “Centros
de interesse”. Partir do interesse da criança significa respeitar o seu
desenvolvimento e suas necessidades, além de desenvolver uma proposta
educativa que considere o seu universo real e respeite seus desejos. A
dinâmica desse trabalho vai exigir novas estratégias como a “observação,
associação e a expressão”. Finalmente, a utilização de tais técnicas contribuirá
para que a criança realize plenamente suas atividades.
Outro estudioso que contribuiu para a construção de um projeto infantil de
escola foi Dewey (1859 – 1952)23, reconhecido como teórico da escola ativa e
considerado um progressista dos mais importantes da educação americana. Em
sua abordagem sobre educação considerou que o método científico deveria
subsidiar o trabalho em sala de aula, de tal maneira que o conhecimento fosse
trabalhado socialmente de forma experimental. Dewey ressaltou a infância como
momento fundamental na vida do homem, partindo do princípio de que o caminho
mais viável para o “aprender” é o “fazer”. Essa dimensão dada ao aprender
possibilitou uma cisão entre o aprender e o fazer, incentivando a reprodução do
23 Ver a esse respeito: DEWEY, J. Democracia e educação. Tradução Godofredo Rangel e Anísio Teixeira. 3. ed. São Paulo: Nacional, 1959. Idem. Liberalismo, liberdade e cultura. Tradução Anísio Teixeira. São Paulo: Nacional, 1970.; FREITAS, M. C. de. (Org.). Historia Social da Infância no Brasil. São Paulo: Cortez, 1997.; MANACORDA, M. A. História da educação: da antiguidade aos nossos dias. 4. ed. São Paulo: Cortez, 1995.
50
fazer por ele mesmo, de maneira pragmática, simplificada e simplista do ato de
aprender. Essa nova forma de compreender o ato de aprender influenciou
profissionais de todas as áreas, especialmente o professor, o qual entendeu que
não mais lhe cabia a responsabilidade pelo conhecimento integral, mas cabia ao
aluno a apreensão do fazer.
Uma das conseqüências do escolanovismo deweyano pode ser encontrado
hoje em um grande número de escolas infantis, o “método de projetos”. Esse
modelo foi implantado experimentalmente em uma escola da Universidade de
Chicago, em que o autor buscou implementar novos procedimentos didáticos, a
fim de controlar os impulsos da ação.
Percebe-se em Dewey o estímulo ao fazer técnico, o qual foi amplamente
divulgado no Brasil a partir da década de 50. Esse modelo, nos dias de hoje, vem
sendo revisitado e defendido sob uma nova roupagem – a das competências. Tais
competências são veiculadas como forma de solucionar a falta de qualificação e
de formação do profissional que atua na área educacional. Nesta direção
encontram-se inúmeros trabalhos e projetos, via de regra financiados pelo
governo federal, os quais intentam imputar ao professor essa nova “revisitação”
do escolanovismo, a qual se denomina neste trabalho de “neoescolanovismo”.
Ainda no campo da educação infantil, porém voltado para a área da
psicologia, surgem as idéias de Montessori (1870 – 1952)24. Montessori
aprofundou seus estudos em filosofia e psicologia. Seu envolvimento com a
educação da criança data de 1907, quando fundou em Roma a primeira “Case dei
24 Ver a esse respeito FREITAS, M. C. de (Org.). Historia Social da Infância no Brasil. São Paulo: Cortez, 1997.; MONTESSORI, M. A criança. Tradução Adilla Ribeiro. Rio de Janeiro: Portugália, (1969).; Idem. A Formação do homem. Tradução: Hauptmann e Eunice Arroxelas. Rio de Janeiro: Portugália, (197_?).
51
Bambini” para abrigar, aproximadamente, cinqüenta crianças carentes, filhas de
desempregados.
Nessa casa-escola, Montessori realizou várias experiências que deram
sustentação ao seu método, fundamentado numa concepção biológica de
crescimento e desenvolvimento. Por ser médica, preocupou-se com o biológico,
não deixando de lado, contudo, o aspecto psicológico, e tampouco o social.
Considerou assim como prioritário, a personalidade humana e não um método de
educação. Pugnou pela defesa da criança, o reconhecimento científico de sua
natureza, a proclamação social de seus direitos, como elementos a serem
observados, que deveriam substituir os falhos modos de conceber a educação.
Outra contribuição importante para o desenvolvimento da educação infantil
foi acrescida por Célestin Freinet (1896 – 1966)25. Considerado um educador
revolucionário, o cultivo na educação do aspecto social foi um dos grandes feitos
desse educador francês. Suas técnicas (texto impresso, a correspondência
escolar, texto livre, a livre expressão, o aula-passeio, o livro da vida) faziam
sentido num contexto de atividades significativas, que possibilitassem às crianças
sentirem-se sujeitos do processo pessoal de aquisição de conhecimentos. Freinet
entendia que o dinamismo, a ação é que estimulavam as crianças a buscar esse
conhecimento, multiplicando seus esforços em busca de uma satisfação interior.
Jean Piaget (1896 – 1980)26, também integra o rol dos educadores que
se destacam por sua importante contribuição teórica. Criador, de uma
25 A esse respeito consultar: FREINET, C. Para uma escola do povo. Lisboa: Presença, 1973.; Idem. A educação pelo trabalho. Lisboa: Presença, 1974.; FREINET, E. O itinerário de Célestin Freinet. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1979.; SAMPAIO, R. M. W. F. Freinet: evolução histórica e atualidades. São Paulo: Scipione, 1989. 26 Ver a esse respeito MOREIRA LEITE, M. L. A infância no século XIX segundo memórias e livros de viagem. In: FREITAS, M. C. de (Org.). Historia Social da Infância no Brasil. São Paulo: Cortez, 1997.; PIAGET, J. A epistemologia genética. São Paulo: Abril Cultural, 1983. (Os Pensadores)
52
epistemologia genética, sempre esteve preocupado em investigar como se
dava a construção do conhecimento no campo social, afetivo, biofisiológico e
cognitivo, mais especificamente. A complexidade e a extensão de sua obra
levou esta pesquisadora a optar por evidenciar aspectos que estão mais
diretamente ligados à educação, numa perspectiva de ensaio.
Piaget baseou-se na idéia da criança “pesquisadora/exploradora” que
constrói o seu próprio conhecimento pela experiência. Deu ênfase ao processo de
interação “indivíduo-ambiente”, procurando compreender os mecanismos mentais
que o indivíduo utiliza para captar o mundo.
Moreira Leite (1997) considera os estudos de Claparède, Piaget, Köeler e
Wertheimer como estudos de primeira linha sobre comportamento inteligente e
desenvolvimento psicológico da criança. Os estudos se concentravam em
descrever e caracterizar o comportamento inteligente.
Piaget se preocupou em fornecer fatos, considerando que os educadores
estão em condições de encontrar por si mesmos novos métodos pedagógicos.
Partindo, portanto, dessas investigações é que Piaget elaborou a sua
epistemologia genética, com o intuito de construir um método capaz de oferecer
os controles e, sobretudo, de retornar às fontes, e, portanto, à gênese mesmo dos
conhecimentos de que a epistemologia tradicional apenas conhece os estados
superiores, isto é, certas resultantes. O que se propõe à epistemologia genética é,
pois, por a descoberto as raízes das diversas variedades de conhecimento, desde
as suas formas mais elementares, e seguir sua evolução até os níveis seguintes,
até, inclusive, o pensamento científico. Piaget desenvolveu estudos que lhe
possibilitaram constatar, experimentalmente, como se processa a aquisição do
53
conhecimento, evidenciando que o conhecimento é mutável ao longo das diversas
fases da vida humana.
Vygotsky (1896 – 1934)27 envolveu-se com a infância por meio de
alguns estudos que lhe permitiram compreender o comportamento humano.
Justificou que a necessidade do estudo da criança reside no fato de ela estar
no centro da pré-história do desenvolvimento cultural, devido ao surgimento
do uso de instrumentos da fala. Para isso dedicou-se ao estudo da “pedologia”
(ciência da criança, voltada para o estudo do desenvolvimento humano),
articulando os aspectos psicológicos, antropológicos e biológicos. O caminho
trilhado por Vygotsky baseou-se nas contribuições de Marx, buscando sempre
compreender o homem em processos constantes de interação social. Vale
ressaltar que o interesse por questões educacionais, diferentemente do
ocorrido com Piaget, sempre esteve presente em sua obra, sendo considerado
por muitos, como responsável pela elaboração de uma teoria de educação,
enquanto atividade sócio-historicamente determinada. Suas preocupações
foram direcionadas para o entendimento das origens sociais e das bases
culturais do desenvolvimento individual, tendo como pressuposto
fundamental que tais processos psicológicos superiores se desenvolvem nas
crianças por meio da imersão cultural nas práticas das sociedades, pela
aquisição dos símbolos e instrumentos tecnológicos da sociedade e pela
educação em todas as suas formas.
Vygotsky considerou a necessidade da criança estar inserida em um
contexto sócio-histórico, o qual é determinante de seu desenvolvimento e ao
mesmo tempo é modificado por ela. O ser humano constitui-se como tal, na sua
27 Ver a esse respeito: OLIVEIRA, M. K. Vygotsky e o processo de formação de conceitos. In: Piaget, Vygotsky, Wallon: teorias psicogenéticas em discussão. São Paulo: Summus, 1992.; Idem et al. Piaget - Vygotsky: novas contribuições para o debate. São Paulo: Ática, 1995.; REGO. Teresa Cristina. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. São Paulo: Vozes, 1995.; VYGOTSKY, l. S. Obras escogidas. I, II e III. Madrid: Visor, 1994.
54
relação com o outro social e com o meio. Para Vygotsky, o jogo tem importância
fundamental no desenvolvimento das funções psicológicas superiores na criança
pré-escolar, favorecendo o processo de criar situações imaginárias.
Os postulados básicos da teoria de Vygotsky deram destaque à mudança
em quatro níveis históricos – filogênico (desenvolvimento das espécies); histórico
(história dos seres humanos); ontogênico (história individual das crianças); e,
micro genético (desenvolvimento de processos psicológicos particulares), que
entendeu como imprescindíveis para que uma teoria do desenvolvimento humano
fosse elaborada consistentemente. Esses níveis foram considerados por ele e
seus colaboradores, na proposição de suas teorias, na escola sócio-histórica.
Aplicá-los ao problema do desenvolvimento cognitivo e da escolarização formal,
permitiu compreendê-los de forma mais aprofundada.
Conforme se busca registrar no presente trabalho, a literatura mostra as
enormes diferenças de tratamento e expectativas em relação à criança. Ariès
(1978) estuda a situação da criança na Europa. DeI Priore (2002) estuda as
crianças do Período Colonial à República dos anos 30; o trabalho de Jordão
(1979) focaliza o destaque da criança como tema na obra de pintores
brasileiros no período de 1830 a 1978; Sousa (1989) mostra as imagens que
professores têm da criança pré-escolar; o conceito de infância e historicidade
é tratado por Oliveira (1989); Kishimoto (1988; 2001) analisa o significado, a
natureza, a fundamentação pedagógica e a evolução dos estabelecimentos
destinados à infância paulista no período de 1877 a 1940 e caracteriza a
imagem da criança dos tempos do engenho de açúcar e seu brincar. As
construções que hoje temos da infância são, portanto, relativamente recentes e
são características de uma sociedade industrial e ocidental.
55
Conforme tentamos evidenciar neste capítulo, a história da infância
como objeto da educação e a construção do seu conceito passou por várias
transformações. Ariès (1978) mostra que a infância, tal como a conhecemos
agora, é conceito construído em grande parte nos últimos 300 anos, por várias
vertentes: arte, educação, moral, religiosidade, vestuário, jogos, brincadeiras e
leituras.
Charlot (1979), a partir dos estudos de Ariès e considerando os fatos
históricos, sinaliza que a visão moderna de infância é determinada
socialmente pela organização do modo de produção capitalista. Ao fazer uma
análise da imagem da criança nos sistemas pedagógicos da escola tradicional
e nova, evidencia que a compreensão de infância e da criança está apoiada na
idéia da natureza infantil, não na condição de ser criança, socialmente
determinada por fatores biológicos, sociais e psicológicos.
Na sociedade atual, em alguns aspectos, há uma aproximação maior das
crianças aos adultos, em outros, o distanciamento é maior, o que torna difícil
prever os futuros padrões de uma nova sociabilidade. Presentemente os
períodos de educação são mais longos, o que torna as crianças dependentes
por mais tempo; por outro lado, a distância intelectual entre um adulto
educado e uma criança é tão grande que só sistemas educacionais mais
complexos poderão auxiliar a criança a superá-lo. O mundo técnico, cada vez
mais sofisticado na atividade de trabalho adulto, e a expansão da educação
têm contribuído para reforçar as diferenças intelectuais que sempre existiram
entre crianças e adultos.
As crianças freqüentam as instituições educacionais mais cedo, não
partilham ou não deveriam partilhar do trabalho adulto. Não há mais a formalidade
de tratamento de outras épocas. Atualmente é comum observarmos crianças
tratando o adulto pelo nome próprio.
56
Essas constatações afiguram-se importantes, na medida em que se
verifica que entender a criança como "sujeito", é atribuir importância aos
processos internos da própria descoberta de mundo da criança, sem os quais o
ambiente torna-se substancialmente ineficaz. Deve-se rejeitar a concepção
meramente "acumuladora" da aprendizagem, pois a mesma é produzida por
instrumentos racionais de produção do atual estágio da sociedade moderna.
A sociedade moderna gasta mais tempo com a educação do jovem,
visando formá-lo como mão-de-obra especializada para o mercado capitalista, o
que prolonga a fase da adolescência, em que o sujeito não é nem criança nem
adulto.
Pensar a construção de uma escola ativa e dinâmica supõe uma educação
desinibidora e simultaneamente contextualizada do ponto de vista social e
cultural, fatores relevantes para o processo educativo que busque a construção
de um novo ser social28.
2.3 HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL
Neste item pretende-se apresentar algumas das concepções que
dominaram as políticas públicas no Brasil, desde o período colonial até o período
atual, direcionadas para as crianças de 0 a 6 anos em nosso país.
Durante o processo de colonização brasileira algumas poucas crianças
embarcaram nos navios portugueses com destino ao Brasil, vindas, em sua
maioria, como mão-de-obra, recrutadas junto às famílias pobres que viam nelas
um meio de aumentar a renda. Essas crianças eram embarcadas como grumetes, 28 A esse respeito ver: FREIRE, P. Educação e mudança. 15. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989.; Idem. Política e educação: ensaios. São Paulo: Cortez, 1993.; Idem. Pedagogia da autonomia. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.
57
pajens, serviçais em geral, para serem explorados enquanto durasse sua curta
vida. Vinham também algumas meninas adolescentes, “as órfãs” (DEL PRIORE,
2002), com idade entre 12 e 16 anos, para servir de esposas aos membros da
baixa nobreza portuguesa estabelecidos na Colônia.
A viagem de travessia era extremamente difícil para todos que nela se
aventuravam, porém, era ainda pior para as crianças, devido às precárias
condições de higiene e insalubridade. Além de ter que resistir à fome e às
doenças, os pequenos eram obrigados a submeter-se aos abusos sexuais
perpetrados pela tripulação. Poucos sobreviveram a essas terríveis condições, e
aqueles que conseguiram chegar vivos não o lograram sem traumas.
Os poucos sobreviventes que chegavam à nova terra eram desde logo
inseridos na vida dura de trabalho dos adultos. Não havia lugar para aqueles que
não fossem fortes o suficiente para trabalhar na produção agrícola, pois não havia
outros serviços braçais. Como se vê, o sentimento de infância, nascente na
Europa, ainda não havia atravessado o Atlântico.
Em 1549 chegou ao Brasil a Companhia de Jesus, com a missão de
expandir o cristianismo e conquistar novos adeptos para a Igreja de Roma, sob o
comando do padre Manoel da Nóbrega, conforme assinala Del Priore.
No entanto, mais importante, no que diz respeito à infância brasileira e aos jesuítas foi a elaboração, também quinhentista e européia, dos primeiros modelos ideológicos sobre a criança. A Igreja católica nesse período responsabilizava-se particularmente pela disseminação de suas imagens que embora desvinculadas da vida das crianças comuns da época, ajudaram a alterar a maneira pela qual os adultos as “pensavam” e acompanhavam seus passos (DEL PRIORE, 2002, p. 11-12).
Partindo da convicção que nas crianças seria mais fácil imprimir seus
caracteres de fé e moral cristã, os jesuítas pouco a pouco orientaram seus
esforços no sentido de realizarem a formação da juventude e da infância nos
58
valores da Companhia e nas letras, preocupando-se não apenas com o ensino,
mas principalmente, com o enquadramento moral da juventude. Sendo os únicos
educadores de profissão que contavam com o apoio do Rei na colônia, coube aos
jesuítas, além da catequese dos índios, promoverem a educação dos filhos dos
colonos. Seu Plano de Estudos publicado em 1599, o Ratio Studiorum, previa
uma bifurcação, dirigindo o índio ao ensino profissionalizante agrícola – levando
em consideração que eles não se haviam adequado à formação sacerdotal
católica. Para o filho do colonizador, entretanto, havia o caminho de uma
educação humanista, com possibilidade de continuação dos estudos na Europa. A
educação na Colônia ficou a cargo da Companhia de Jesus até sua expulsão em
1759, foram conseqüentemente, quase duzentos anos que deixaram marcas
profundas no sistema educacional brasileiro.
De qualquer forma, a educação oferecida pelos jesuítas não era dirigida às
crianças menores, mas para aqueles que já haviam superado a fase crítica e
sobrevivido às doenças e precárias condições de vida. Só a partir do século XVIII
tivemos uma atuação mais direcionada aos “pequeninos”.
A primeira instituição de atendimento à infância no Brasil, que temos
notícia, foi a “Casa dos Expostos”, criada em 1739, para abrigar crianças
abandonadas ou enjeitadas, em sua imensa maioria filhos de escravos que não
podiam ser criados por suas mães, para não atrapalhar a produção, pois os
escravos eram considerados “coisas”, não podiam ter família.
Após a promulgação da Lei do Ventre Livre, em 1871, ampliaram-se o
número de instituições e abrigos para esse tipo de atendimento, sendo criadas
instituições de caráter filantrópico e religioso. Del Priore (2002) apresenta alguns
números como exemplos ilustrativos do contexto em que se inicia o cuidado com
59
a infância no Brasil, numa colônia mercantilista com modo de produção
escravocrata:
Durante os séculos XVIII e XIX, a Roda recebeu 42.200 enjeitados, sendo procurada por pessoas pobres que não tinham recursos para criar seus filhos, por mulheres da elite que não podiam assumir um filho ilegítimo ou adulterino e, também, por senhores que abandonavam crianças escravas e alugavam suas mães como amas-de-leite (DEL PRIORE, 2002, p. 67).
São inúmeros os relatos sobre as péssimas condições em que eram
atendidas as crianças na “Casa da Roda”, chegando ao índice de 70% de
mortalidade entre os “pequenos”. Havia desde desvio de verbas, destinadas a
alimentar as crianças, até a venda destas como escravas, passando pela
ausência de encaminhamento para uma instituição de ensino quando na idade
adequada.
Era um verdadeiro abandono, uma vez que tratavam as crianças como
escravas e a pouca atenção dispensada servia apenas para desviar a visão da
sociedade para os “párias”. Ocorre que as denúncias se tornaram tão
contundentes que, no final do século XIX, começaram a surgir outras instituições,
propondo-se como alternativa à “Casa dos Expostos”, no intuito de prestar um
melhor atendimento a esses “desvalidos”, por meio de propostas de
encaminhamento das crianças para o “mundo do trabalho”. Essas instituições
geralmente eram apadrinhadas por figuras eminentes da sociedade colonial,
como, por exemplo, o Asilo Agrícola Santa Isabel, gerido pela Associação
Protetora da Infância Desamparada, presidida pelo Conde D’Eu.
Próximo ao final do século XIX, nos primeiros anos da República, surgiu
outras iniciativas, porém de ordem higienista, direcionadas ao combate da
alarmante mortalidade infantil, atribuída à falta de educação das famílias.
Somente nos primeiros anos do século XX é que se iniciou uma mudança, pois
60
esse quadro de atendimento começou a se ampliar, quando tiveram início
diversas medidas governamentais, as quais atribuíam grande importância ao
atendimento da criança, apontando-a como solução para os problemas sociais e
como forma de renovação dos direitos humanitários.
No início do século passado, o atendimento às crianças de 0 a 6 anos
consistia, basicamente, em ações de caráter médico, com poucas iniciativas,
especialmente no que respeita às questões educacionais. Sua concepção
pautava-se no conceito abstrato de criança e de infância, porém nesse período se
iniciou a alinhavar um projeto que visava preparar a criança para o futuro, em que
a educação passou a ser vista como redentora dos problemas historicamente
produzidos.
Na década de 1930 houve mudanças marcantes na estrutura política e
econômica, as quais se destacaram algumas mais relevantes, haja vista que não
se tem a pretensão de esgotar o assunto:
- Substituição do modelo econômico de monocultura latifundiária;
- Diversificação da produção e fomento do início da indústria nacional,
fortalecendo novos grupos econômicos e políticos;
- Crescimento do setor industrial, acarretando o fenômeno da urbanização
e a ampliação da classe média.
Essas mudanças propiciaram, naquele período, o surgimento de diversas
propostas de atendimento à infância. Era uma causa que se consolidava nas
iniciativas particulares e começava a despertar o interesse público, dentro de uma
visão de patriotismo desenvolvimentista. A esse respeito Del Priore (2002) afirma
que:
61
A tônica do atendimento proposto era médica: via-se na medicina preventiva uma maneira de remediar e socorrer a criança e sua família, genericamente concebida como família moderna, que era considerada o foco do problema (DEL PRIORE, 2002, p. 59).
O Estado começava a centralizar a direção das intervenções no
atendimento à criança, oferecendo alianças aos grupos particulares na divisão
dos custos, especialmente instituições filantrópicas de caráter religioso. Iniciava-
se o discurso de falta de verbas, conclamando ao setor privado a sua efetiva
participação e, em contrapartida, ofereceu-se redução de impostos, assim como
verbas para os empreendedores.
Depreende-se disso que o governo, já naquela época, apesar de
proclamar o discurso da função pública de prover o atendimento de saúde e
educação para todos, não tinha a intenção de fazê-lo, uma vez que se
desobrigava disso ao delegar responsabilidades ao setor privado,
especialmente os ditos “sem fins lucrativos”.
Verifica-se que os discursos permanecem os mesmos, apesar de períodos
diferentes, não havendo alteração significativa, nem no discurso do governo, nem
no que se refere ao atendimento à infância, de sorte que, embora reafirme e
proclame sua obrigação em relação ao atendimento dessas crianças, nega a
efetiva ação.
Percebe-se, portanto, que o Estado imprimiu uma tendência
assistencialista e paternalista à proteção da infância brasileira, na medida em que
o atendimento de suas demandas não se constituiu em direito, emanado da
condição de cidadania plena, sendo encarado quase que como uma espécie de
favor. Kramer (1991) cita um exemplo marcante dessa política, configurada no
trabalho desenvolvido pela Legião Brasileira de Assistência – LBA, criada em
1942, tendo como objetivo principal:
62
[...] congregar brasileiros de boa vontade e promover por todas as formas de serviços de assistência social, prestados diretamente ou em colaboração com o poder público e as instituições privadas, tendo em vista principalmente: proteger a maternidade e a infância, dando ênfase especial ao amparo total à família do convocado (KRAMER, 1991, p. 71).
A concepção que orientou o trabalho da LBA enfatizava a pré-escola como
solução preventiva para os problemas de baixo rendimento escolar no 1º grau,
buscando fornecer também a complementação alimentar, assim como cuidados
com a saúde e higiene da criança.
O pressuposto teórico do caráter compensatório da educação pré-escolar
veio a ser reforçado na década de 1960, com a entrada da UNICEF29 no cenário.
O referido organismo, apesar de recomendar em seus documentos linhas de
intervenção bastante diversificadas, tendo em vista a melhoria das condições de
vida da criança, não como valor a ser defendido “per si”, mas como elemento
possibilitador do desenvolvimento da sociedade, utiliza-se de mecanismos
compensatórios, ofertando unicamente a instrumentalização, considerando esta
como meio de superação às carências decorrentes de suas condições de vida.
Kramer (1987) identifica essa linha compensatória a partir da intervenção
direta do governo, mediante a atuação do COEPRE – Coordenadoria de
Educação Pré-Escolar, órgão do MEC criado em 1975, o qual apresentava em um
dos seus documentos as seguintes orientações:
Se pretendemos desenvolver a educação pré-escolar atendendo crianças carentes, o objetivo principal poderá ser o de desenvolver a educação compensatória que lhes permita superar deficiências ocasionadas pelas condições sociais, nutricionais e culturais em que viveram até então. Tal educação lhes possibilitaria iniciar a aprendizagem formal em igualdade de condições com as demais crianças, oriundas de meios mais favorecidos (KRAMER, 1987, p. 90).
29 A sigla UNICEF significa - Fundo das Nações Unidas para a infância.
63
A leitura dos documentos permite considerar que o atendimento a
infância se constituiu por uma rede sobreposta, e que o problema é tratado de
forma fragmentada e isolada, ora sob o viés da saúde, ora a partir do bem
estar da família, ora da educação. A infância sempre esteve presente nos
discursos do Estado, mas sempre como causa e não como conseqüência dos
problemas sociais. Com isso, desloca-se o problema para a criança e sua
família, retirando-o da estrutura da sociedade de classes.
No Brasil, o processo político implementado nos últimos vinte anos
impactou várias áreas da política social, dentre elas a educação.
Paralelamente, houve uma significativa alteração na legislação pátria que
regula a matéria, iniciada na década de 80, dentre as quais se considera
importante destacar algumas que tratam da Educação Infantil.
Até a Constituição de 1988 não havia referência na carta magna à
Educação Infantil. Isto porque Constituições Federais anteriores trataram o
atendimento da vida infantil sob a ótica do amparo e da assistência, e não como
direito essencial e inalienável do cidadão, no âmbito de uma sociedade
organizada. Só a partir de 1988 o atendimento à infância foi regulado pelo
legislador originário como um “Direito da Criança e um Dever do Estado”.
Nesse aspecto, a Constituição Federal (1988) e a Lei de Diretrizes e Bases
da Educação – LDB (1996) reconheceram a criança de 0 e 6 anos como sujeito
de direito, entre os quais se encontra a Educação. Em decorrência, a Educação
Infantil passou a integrar a Educação Básica, embora sem caráter obrigatório.
Entretanto, a exemplo do que ocorre com outras questões sociais, verifica-se o
reconhecimento do direito, sem que o Estado implemente de fato, uma política de
ação que o viabilize.
64
Ressalte-se que mais importante que o simples discurso, que reconhece
uma cidadania plena ao indivíduo desde sua mais tenra idade, é sair de fato, de
uma visão abstrata de criança e implementar ações concretas que resgatem a
criança enquanto ser humano, cidadão e sujeito social e histórico.
Com a inclusão da Educação Infantil na Educação Básica, inserindo-se
dentre um dos níveis do ensino pátrio, é primordial refletir sobre as
conseqüências que tal mudança trouxe para o perfil do profissional que atua
neste campo. Regulamentada pela LDB, a formação dos profissionais suscita
diversas discussões, visto que a lei se limita a tratar do professor de modo
limitado, precário e superficial, deixando de lado os demais agentes
educativos, hoje incorporados ao cotidiano das instituições de atendimento à
infância, tais como os monitores, crecheiros, recreacionistas, etc.
Outra questão relevante, a qual merece exame mais detalhado em
momento oportuno, refere-se à discrepância existente entre a legislação e a
política educacional implementada no país, de vez a primeira afirma que a Creche
é parte do sistema escolar e a segunda define Creche como instituição educativa
sem caráter escolar. Ou seja, a lei determina o caráter escolar, enquanto os
documentos dos órgãos responsáveis pela aplicação da política enfatizam que
sua função centra-se no binômio educar-cuidar.
Apesar de tais distorções, é necessário reconhecer que ocorreram no país,
ganhos reais nos últimos 30 anos, com a ampliação no número de crianças
atendidas em equipamentos de educação infantil. Dados apontados por Kramer
(1987: 94) assinalam que em 1975 o percentual de crianças menores de 7 anos
matriculadas na educação infantil era de 3,51% das 21 milhões de crianças então
existentes. Já no ano de 2000 esse percentual chegou a quase 30%, das pouco
mais de 21 milhões existentes naquele ano. É, portanto, necessário reconhecer o
65
avanço, mas é também preciso manter a nitidez do grande desafio que será
chegar aos 100%, sem falar nos agravantes, pois se sabe que esse atendimento
se concentra nos grandes centros urbanos e que mais de 40% do mesmo é
realizado pela rede privada, conforme dados do Banco Mundial (2005).
Os desafios são de grandes dimensões, haja vista a demanda
populacional, na sua maioria carente, que aguarda que o Estado assuma a sua
responsabilidade em oferecer vagas suficientes para todas as crianças em idade
escolar. Espera-se ainda, que os governantes assumam essa responsabilidade,
pois delegá-la à sociedade civil significa relegar à própria sorte um grande número
de brasileiros, que necessitam como sujeitos sociais, receber um ensino de
qualidade, em um espaço físico digno de ser freqüentado por crianças em
processo de educação e formação cultural.
Prosseguindo a abordagem de tão importante tema, no capítulo seguinte,
intitulado EDUCAÇÃO INFANTIL E FORMAÇÃO PROFISSIONAL DOCENTE:
ABORDANDO A LEGISLAÇÃO, serão abordados aspectos relativos à legislação
aplicada à educação infantil, perpassando pela formação do profissional docente
que atua na área.
CAPÍTULO III
EDUCAÇÃO INFANTIL E FORMAÇÃO PROFISSIONAL DOCENTE:
ABORDANDO A LEGISLAÇÃO
A sociedade humana está assentada na história. Como toda sociedade, a
capitalista também possui características próprias de seu lugar e de seu tempo,
situadas no tempo e no espaço, pois a história, produzida por homens e mulheres
66
de seu tempo, projeta o amanhã. Sujeitos fazem parte de uma era e ela é parte
deles coletivamente. As experiências e vivências do passado produzem e
projetam o futuro. Um século que se inicia trás consigo os séculos que lhes
antecederam.
A história, ainda que não se perceba, é presente e passado, pois, como
afirma Hobsbawm (1995) vive-se “[...] numa espécie de presente contínuo, sem
qualquer relação orgânica com o passado público da época em que [se] vive”
(HOBSBAWM, 1995, p. 13). O passado é indestrutível e por esse motivo
permanece vivo produzindo mudanças. Buscar compreender as mudanças
produzidas em uma determinada época possibilita compreender o presente, pois
tais mudanças produzem novas realidades assim como requerem novas formas
de atuar e agir.
Mudanças não surgem ao acaso, mas são produzidas por homens e
mulheres que constroem e produzem suas realidades e nesse processo criam as
sociedades. Entretanto, a vida em sociedade é regida por ordenamentos e
normas, as quais se constituem em enunciados, que não podem ser ignorados,
pois representam armas poderosas capazes de alienar e, ao invés de produzirem
mudanças para a emancipação humana podem se constituir em mecanismos de
perpetuação e reprodução da dominação e exploração do homem.
As instituições hierárquicas da era Industrial, que nos últimos quatrocentos
anos, assumiram relevância capaz de influenciar, a nível global, a vida política,
social e comercial, mostram-se cada vez menos capazes de atingir os objetivos
para os quais foram criadas, embora continuem a expandir-se, gerando profundas
diferenças sociais e mundiais, levando-nos a questionar seriamente se seus
67
conceitos são os mais adequados à administração e solução dos problemas
sociais e ambientais ora vivenciados.
Para que se possa compreender o presente e influenciar o futuro é
essencial que se domine quatro perspectivas: como as coisas foram; como são;
como podem ser e como devem ser, e cumpre que esse “dever ser” seja
entendido não no sentido compulsório, mas no sentido de uma condição
eticamente melhor.Tal visão de “dever ser” não poderá ser obtida mediante o
mero estudo dos dados, da informação e do conhecimento, mas através dos
domínios da compreensão e da sabedoria operados pela filosofia, a teologia e o
direito, em seu aspecto jus filosófico e material.
Em decorrência, para se analisar de forma crítica a educação infantil,
educação da criança de 0 a 6 anos de idade dentro de uma determinada
sociedade, torna-se necessário estudar e compreender o que estabelece o
ordenamento jurídico ali vigente, a partir da análise dos enunciados legais que a
regulam, visando obter um embasamento não apenas racional, objetivo e
mecanicista, mas também conceitual e crítico capaz de avaliar, julgar e conceber
novas e melhores formas, capazes de atender aos interesses sociais.
Neste estudo, não se pretende abordar a legislação pátria de maneira
exaustiva, face à exigüidade do tempo disponível, mas busca-se identificar como
o legislador concebeu e definiu seus preceitos, uma vez que o ordenamento
jurídico e as diretrizes normativas são obrigatórios no contexto da sociedade, e
revelam de que forma o conhecimento será transmitido, a partir dos conceitos
esposados pelo legislador, não apenas acerca da educação como e sua
conseqüente prática, mas do tratamento jurídico legal dado ao professor.
68
Partindo assim para a análise da base legal que informa a matéria, em
nosso país, pretende-se, neste capítulo, fazer uma incursão pela Constituição
Federal de 1988 – CF/88, pelas Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
– Lei 4024/61, Lei 5692/71, Lei 9394/96, e pelo Referencial Curricular Nacional
para a Educação Infantil - RCNEI, no intuito de apresentar algumas questões
relacionadas ao processo constitutivo do atendimento da educação infantil
(educação de crianças de 0 a 6 anos).
Tem-se também como intenção identificar, nos mesmos ordenamentos
legais, o tratamento dado ao professor que atua nesse nível educacional, a partir
do auxílio de alguns teóricos que abordam o assunto, especialmente no que
respeita a formação profissional dos docentes da educação infantil. A seguir
apresenta-se a discussão desses itens.
3.1 EDUCAÇÃO INFANTIL E A LDB 4024/61
A Lei 4024, promulgada em 20 de dezembro de 1960, foi a primeira lei
brasileira a fixar as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em cumprimento ao
preceito inserido na Constituição Federal de 1946, que delegou à União a
competência de legislar sobre as diretrizes educacionais em âmbito nacional. No
título VI “Da Educação de Grau Primário”, equivalente às séries iniciais do ensino
fundamental, foram inseridos dois artigos relativos à educação pré-primária,
direcionados às crianças com idade inferior a sete anos, conforme identificados a
seguir:
69
Art. 25. A educação pré-primária destina-se aos menores até sete anos, e será ministrada em escolas maternais ou jardins de infância (BRASIL, LDB 4024/61, tit. VI, cap. I, art. 25); Art. 26. As empresas que tenham a seu serviço mães de menores de sete anos serão estimuladas a organizar e manter, por iniciativa própria ou em cooperação com poderes públicos, instituições de educação pré-primária (BRASIL, LDB 4024/61, tit. VI, cap. I, art. 26).
A Lei estabeleceu que os menores até sete anos recebessem educação
em “escolas maternais e jardins de infância”, denominação essa que, a partir da
promulgação do mencionado diploma legal, passou a ter cunho nacional (GOHN,
1992; KUHLMANN, 2000a). Além disso, estimulou (mas não tornou obrigatório),
que fossem organizadas e mantidas pelas empresas, creches destinadas aos
filhos de suas trabalhadoras, com idade inferior a sete anos, por iniciativa própria
ou em cooperação com os poderes públicos. Tal Lei, além de não criar a
obrigatoriedade desse atendimento, também não estabeleceu as modalidades em
que o mesmo deveria se proporcionado, se em “creches, escolas maternais ou
jardins de infâncias”, e tampouco identificou a faixa etária e os períodos do
mesmo, o que resultou em inúmeras críticas, além de tratar a educação infantil de
forma parcial (de vez que não a regulou em sua integralidade) e generalizante de
vez que não regulou seus aspectos particulares. Neste sentido, Gohn (1992)
assinala que:
[...] a lei tratou a educação pré-primária de forma generalizante. Todo atendimento anterior ao primário foi caracterizado como “pré”, englobando o maternal e o jardim. Ela não legislou nada de específico, apenas nomeou uma categoria. [...] Nela não havia obrigatoriedade, apenas sugeriu-se uma orientação através dos termos “serão estimuladas” (GOHN, 1992, p. 68).
Segundo Kulhmann (2000a) a LDB 4024/61, ao incluir na “educação
primária” crianças com idade inferior a sete anos induziu o intérprete a adotar a
70
idéia de que o “jardim de infância” foi criado para ser incorporado ao sistema de
“educação primária”, ou seja, a lei abriu uma brecha legal, estabelecendo a
possibilidade de ser a educação para essa faixa etária, orientada a partir do
modelo da “educação primária”. Assim, apesar desse segmento da educação ser
caracterizado pelo mencionado diploma legal como uma “modalidade de
educação”, isso não garantiu a obrigatoriedade de criação de projetos específicos
para essa faixa etária.
A ausência de normatização no âmbito da mencionada lei, acerca da
obrigatoriedade de implantação pelo governo, de projetos específicos para a
educação “pré-primária”, abriu espaço para uma atuação mais efetiva dos
profissionais da saúde, que, organizados no Departamento Nacional da Criança –
DNCr, desde sua criação, ocupavam-se das creches e pré-escolas. A partir de
1967 o referido Departamento propôs a execução de um plano, intitulado “Plano
de Assistência ao Pré-escolar”, por meio de um programa de caráter emergencial
denominado “Centro de Recreação”30, que tinha como objetivo atender crianças
de baixa renda, a exemplo de um modelo divulgado pelo UNICEF31.
Os “Centros de Recreações”32, em função de suas precárias condições de
funcionamento (recursos técnicos, materiais e humanos), se utilizavam de
estratégias alternativas para seu funcionamento, fazendo uso de espaços físicos
ociosos, tais como as igrejas, usando sucata como material pedagógico, e mão-
30 A esse respeito ver KULHMANN JR, Educando a infância brasileira. In: LOPES, E. M. T., et al. 500 Anos de Educação no Brasil. Belo Horizonte: Editora Autêntica, 2000a, p. 446 a 496. 31 O UNICEF (KULHMANN, 2002a, p. 484), desde os fins dos anos 50, desenvolveu projetos educacionais e em 1965 promoveu a Conferência Latino-Americana sobre a Infância e a Juventude no Desenvolvimento Nacional, conhecidos como sistema dual. 32 Segundo KULHMANN (2000a, p. 489) a idéia era simplificar as exigências básicas para uma instituição educacional e implantar um modelo simplificado, de baixo custo.
71
obra voluntária33.
Conforme assinala KULHMANN (2000a), a formação profissional dos
responsáveis pela implantação e execução do projeto não era levada em
consideração, pois segundo relata este autor,
[...] o pessoal seria recrutado entre “as pessoas de boa vontade”, à base de voluntariado, reservando-se o pagamento para alguns técnicos necessários à supervisão e coordenação dos serviços, cujos encargos seriam de maior responsabilidade (KULHMANN, 2000a, p. 489).
Na ausência de um modelo para ser utilizado nacionalmente, haja vista a
omissão do Estado, o modelo, inicialmente adotado em São Paulo, passou a ser
difundido em nível nacional. Caracterizava-se o mesmo pela presença de um
duplo sistema de atendimento, isto é, “escolas maternais e creches”
preferencialmente em período integral, destinadas à parcela mais pobre da
população, e “jardins de infância e pré-escolas” em meio período, destinadas aos
mais favorecidos.
Depreende-se assim que a LDB 4024/61, apesar de normatizar a educação
pré-primária, não se constituiu em instrumento eficaz para que o Estado a
implementasse efetivamente. A criação e a implantação dos projetos destinados
às crianças da educação “pré-primária” se deram, nesse período, no âmbito da
saúde.
Kishimoto (1988), ao estudar os primórdios da educação infantil no Estado
de São Paulo, identifica esse duplo sistema:
[...] a prática usual dos paulistas permite a criação de dois sistemas de educação infantil, tendo como critério a classe social
33 Idem.
72
de seus alunos: escolas maternais, para filhos de operários, com características assistenciais, ficando implícita a ausência de fundamentação froebeliana, e jardins de infância, como instituições tipicamente froebelianas, para as classes mais abastadas (KISHIMOTO, 1988, p. 39).
Ao se observar atentamente a história da educação infantil em nosso país,
percebe-se que as escolas maternais e as creches foram “criadas para atender as
crianças pobres e as mães trabalhadoras, e desde o início apresentaram-se como
primordialmente educacionais” (KUHLMANN, 2001: p. 5), educavam, porém, para
a submissão, papel adequado à classe pobre. Os pioneiros dessas instituições
tinham na religião, na higienização e na correção da infância pobre, a motivação
básica para a sua criação.
O trabalho com crianças de 4 a 6 anos, realizado em meio período, sob
orientação froebeliana e mais tarde montessoriana, também era realizado nas
creches de período integral, porém adaptado para possuir como base a finalidade
educativa, a qual era determinada a partir da classe social das crianças, prática
freqüente desde o final do século XIX.
No que respeita à qualificação das mulheres que atuavam diretamente com
as crianças nas creches, Kuhlmann (2000a) enfatiza que: “[...] em geral não
possuíam qualquer qualificação, [entretanto] é de se supor que muitas das que
participavam ativamente da supervisão, da coordenação e da programação das
instituições fossem professoras [...]” (KUHLMANN, 2000a, p. 479).
Em relação à formação dos docentes a LDB 4024/61, em seu Artigo 34,
dispunha que esse nível era “[...] ministrado em dois ciclos, o ginasial e o colegial,
[abrangendo], entre outros, os cursos secundários, técnicos e de formação de
73
professores para ensino primário e pré-primário” (BRASIL, LBD 4024/61, tit. VII,
cap. I, art. 34). Em seu art. 53, dispunha que:
A formação de docentes para o ensino primário far-se-á: a) em escola normal, de grau ginasial no mínimo de quatro séries anuais onde, além das disciplinas obrigatórias do curso secundário ginasial, será ministrada preparação pedagógica; b) em escola normal de grau colegial, de três séries anuais, no mínimo, em prosseguimento ao vetado grau ginasial (BRASIL, LDB 4024/61, tit. VII, cap. III, art. 53).
Observa-se que essa lei não dispôs sobre a formação dos docentes que
atuavam no “pré-primário”, deduzindo-se que, no período, não houve quaisquer
exigências para a atuação docente nas “creches, escolas maternais e jardins de
infância”. Infere-se disso que o legislador considerou desnecessária a formação
profissional para as referidos trabalhadoras, (naquela época apenas mulheres),
reforçando a hipótese de que a função de professora de crianças do pré-primário
(0 a 6 anos) poderia ser exercida por mulheres voluntárias. Não houve, portanto,
preocupação do legislador em relação aos preceitos legais que normatizassem
essa atuação, nem quaisquer exigências de caráter técnico-educacional.
Em síntese, o Estado desobrigou-se do atendimento desse nível de
educação e da formação dos docentes que atuavam com essas crianças,
incentivando empresas, igrejas e outras entidades a prestar tal atendimento,
tendo como justificativa a racionalização dos custos.
A LDB 4024/61, ao dar pouca ênfase à educação das crianças e pouca
atenção à formação específica de seus profissionais, incentivou a continuidade
dos dois sistemas historicamente estabelecidos para Educação Infantil, tornando
o terreno propício para a interveniência de instituições multilaterais,
especialmente a UNICEF e no início da década de 70 a UNESCO.
74
Esses organismos internacionais, a partir de seus estudos das realidades
locais, especialmente nos países “em desenvolvimento”, influenciaram as políticas
sociais, educacionais, culturais, adotadas nos referidos países. Como assinala
Rosemberg (2002b), à falta de “acervo disponível localmente”, de conhecimentos
e contra – propostas, acabaram as mesmas se estabelecendo, influenciando
significativamente tanto a expansão da educação infantil, quanto à formação dos
profissionais docentes que nela atuam.
3.2 EDUCAÇÃO INFANTIL E A LDB 5692/71
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 5692, promulgada
em 11 de agosto de 1971, fixou diretrizes e bases para o ensino de primeiro e
segundo graus. Em seu Capítulo II, art. 19, parágrafos 1 e 2°, dispuseram sobre o
Ensino de 1º Grau, sinalizando para o ingresso de crianças com idade inferior aos
sete anos:
§ 1º As normas de cada sistema disporão sobre a possibilidade de ingresso no ensino de primeiro grau de alunos com menos de sete anos de idade (BRASIL, LDB 5692/71, cap. II, art. 19); § 2º Os sistemas de ensino velarão para que as crianças de idade inferior a sete anos recebam conveniente educação em escolas maternais, jardins de infância e instituições equivalentes (BRASIL, LDB 5692/71, cap. II, art. 19).
Verifica-se que no mesmo artigo o legislador regula duas hipóteses: uma a
respeito da possibilidade de ingresso no ensino de “primeiro grau” de crianças de
idade inferior a sete anos, e outra estabelecendo que os sistemas de ensino
velarão para que as crianças com idade inferior a sete anos recebam uma
educação “conveniente” em instituições próprias “escolas maternais, jardins de
infância e equivalentes”, mantendo, dessa forma, as denominações constantes na
LDB 4024/61.Tal dispositivo, além de vago, carecia ainda de auto-executoriedade,
deixando a cargo do legislador ordinário ou do administrador da política
75
educacional sua posterior regulamentação, sem contudo, fixar prazo para que tal
ocorresse, como se verifica de seu enunciado, que prescreve que “as normas
disporão” e “os sistemas de ensino velarão”.
Referido dispositivo legal padece ainda de falha no que concerne ao
conceito adotado pelo legislador para a criança com menos de sete anos: ora ela
é tratada como aluno/a, independente de sua idade (quando trata da possibilidade
de seu ingresso no “ensino fundamental”); ora é tratada como criança, quando se
refere a sua educação no âmbito das “escolas maternais e jardins de infância”.
Essas duas formas de atender a criança indicam que o legislador a compreendia
como um ser passivo no interior da sociedade, sem atentar para sua natureza
jurídico legal de cidadã, apta a gozar dos direitos de cidadania que lhes são
conferidos pelo ordenamento jurídico pátrio, dentre os quais o de receber do
Estado, educação gratuita e de qualidade.
A LDB 5692/71, a exemplo das orientações da LDB 4024/61, também
estimulava (mas não compelia) as empresas a ofertarem educação para crianças
menores de sete anos, conforme preconizava o art. 61 a seguir:
Os sistemas de ensino estimularão as empresas que tenham em seus serviços mães de menores de sete anos a organizar e manter, diretamente ou em cooperação, inclusive com o Poder Público, educação que preceda o ensino fundamental (BRASIL, LDB 5692/71, art. 61).
Kuhlmann (2000a) destaca que a LDB 5692/71, substitutiva da LDB
4024/61, apresentava um texto evasivo quanto à caracterização desse nível
educacional. A esse respeito enfatiza que o texto legal apresenta significados
dúbios e exemplifica isso a partir do conceito “velar”, entendido por este autor
como o papel das instituições a ser viabilizado pelos profissionais que nela
76
atuavam. Neste sentido, caberia às empresas criar espaços substitutos do lar,
bem como equipá-los com profissionais que, em tese, teriam a responsabilidade
de cuidar ou velar pelas crianças. Não havia, contudo, obrigatoriedade legal nem
sanção pelo não atendimento, ou por seu atendimento em discordância com os
preceitos legais, que por dúbios, prestavam-se a diferentes interpretações:
O verbo “velar” porta muitas significações: da origem latina, velare tem o sentido de cobrir com véu, ofuscar, disfarçar, dissimular, acautelar-se, livrar-se; da origem latina vigilare, na intenção da lei, quer dizer interessar-se, proteger, patrocinar. Neste último caso, a palavra vem da idéia de vigiar (KUHLMANN, 2000, p. 490).
A lei, segundo este autor, além das inúmeras falhas já apontadas neste
estudo, estabeleceu o papel do professor pré-escolar como àquele que vigia e
cuida, sendo sua função junto às crianças abaixo de sete anos definida pelo
controle do comportamento destas, em detrimento de uma educação para a
emancipação do ser humano.
Quanto à formação do profissional para atuar na educação infantil, a LDB
5692/71, em seu Art. 30, estabeleceu a formação mínima para o exercício do
magistério, tratando apenas das habilitações específicas para atuar no primeiro e
segundo graus. Somente em 1974 foi cogitada, embora não regulamentada
legalmente, formação específica para o professor do ensino pré-escolar, em
decorrência da “Indicação 45 do Conselho Federal de Educação”34, na qual se
indicava que fosse ampliada nos cursos de formação de professores a oferta de
habilitação para o ensino pré-escolar.
34 Esta indicação é um anexo do Parecer N. 2.018/74, que trata da educação pré-escolar, sua finalidade e necessidade de expansão, justificadas na compensação, uma vez que “a desnutrição e a carência cultural vêm devorando as potencialidades acumuladas na população de faixa etária entre zero e seis anos” (BRASIL/CFE, 1974, p. 44).
77
Gohn (1992), em relação a essa questão, considera que essa indicação
atribuía à pré-escola a compensação das defasagens dos “escolares” do 1 º Grau.
A esse respeito Rosemberg (1992) enfatiza que no Brasil a função compensatória
da Educação Infantil fundamentou-se em um modelo de pré-escola de massa,
orientado pela UNESCO no início da década de 70, por meio dos trabalhos da
“Comissão Faure”35. Neste sentido, Rosemberg assinala a evidente similaridade
entre a proposta da UNESCO e a elaborada pelo MEC, por meio de pareceres
normativos36.
O caráter compensatório atribuído à Educação Infantil e a limitada
formação de seus profissionais, pode ser observado no Parecer CFE N. 1600/75,
que estabelece os conteúdos da habilitação para atuar na pré-escola. A criação
da habilitação para a educação infantil e indicação de seus conteúdos deveu-se a
constatação pelo CFE da formação inadequada de seus professores, conforme
passagem do parecer:
[...] pouquíssimos professores em exercício junto a pré-escolares possuem formação adequada, uma vez que os currículos dos antigos normais não enfatizam necessariamente a importância e a didática para atender crianças abaixo de sete anos (BRASIL/CFE, 1975, p. 44).
Esse parecer confirmou a educação pré-escolar como preparatória para os
níveis posteriores, estabelecendo como requisitos para formação de seus
profissionais os conteúdos relativos à habilitação em nível médio. A formação,
35 Essa comissão, organizada por Edgar Faure, elaborou um relatório em 1972, denominado “Apprendre à etre”. Nesse relatório defendia-se uma educação pré-escolar compensatória e de baixo custo e foi utilizado como referência na elaboração dos Pareceres que tratavam da educação das crianças de 0 a 6 anos. 36 Ver a esse respeito BRASIL, CFE Parecer 1600/75 de 09/05/75 que dispõe sobre a habilitação em nível de 2º. Grau para o Magistério pré-escolar. In: BRASIL, MEC/SE de 1º e 2º. Graus/SER. Legislação e Normas da Educação Pré-escolar. Brasília, DF, 1979.
78
segundo os pareceres do CFE, deveria oferecer ao professor a aquisição de
conhecimentos nos moldes abaixo destacados:
[...] características físicas do pré-escolar (como o desenvolvimento muscular, a coordenação auditiva - motora - visual), condições de saúde sócio-emocionais (como egocentrismo, gregarismo, frustração, necessidade de expressão) e mentais (a exploração, a comunicação, a dificuldade natural de abstrair e de se localizar no tempo e no espaço) (BRASIL/CFE, 1975, p. 44).
Dessa forma, caberia à pré-escola a função corretiva e preventiva do
fracasso escolar, preparando as crianças às etapas futuras da sua educação e
adaptando-as ao modelo escolar, compensando suas carências e habilitando-as
para a alfabetização e etapas seguintes da escolarização37.
O Parecer 1600/75 sugeriu que a formação do professor de educação
infantil deveria ocorrer em nível superior, visto que o “[...] sucesso da criança pré-
escolar depende de sua professora. [...] Necessariamente será um especialista,
situação já prevista na lei de ensino. A realidade brasileira mostra, entretanto, que
durante muitos anos teremos ainda o professor formado em nível de 2º Grau”
(BRASIL, CFE, 1975, p. 43). Contraditoriamente, o mesmo Parecer estabelece nos
conteúdos da formação do professor de educação infantil em nível médio, que o
nível superior seria o ideal, porém determina o perfil do professor em formação de
nível médio:
A professora de pré-escolares deve preencher os requisitos de formação especializada e atualização constante, além de ter reservas físicas e equilíbrio emocional que lhe possibilitam enfrentar um trabalho que, para ser realizado, é difícil (BRASIL/CFE, 1975, p. 44).
Essas orientações destinavam-se à formação do professor de crianças de
4 a 6 anos. Observa-se que o documento não fazia referência às crianças
37 Esta habilitação era desenvolvida em um ano, após os três anos de preparação para as séries iniciais.
79
menores de 4 anos.
Kuhlmann (2000) assinala que a Lei 5692/71 retomou a “proposta de
assistência científica”38, isolando as crianças pobres em instituições que se
fundamentavam por uma “pedagogia da submissão”, a semelhança das
instituições assistencialistas do final do século XIX que discriminavam as crianças
pobres, tratando-as como inferiores em relação às crianças da elite.
Verifica-se que esses procedimentos segregadores foram reutilizados nas
décadas de 70 e 80, instalando práticas assistencialistas e compensatórias nas
instituições de educação infantil. Essas práticas, na medida do possível,
procuravam suprir com baixo custo às carências sociais e culturais decorrentes de
sua condição de classe, preparando-as para permanecerem e se possível
desenvolverem-se na escolaridade obrigatória.
Segundo Souza (1991), a década de 70 adotou metodologias que
possibilitaram atender um grande contingente de crianças a baixo custo. Assim, a
partir de 1974 - 1975 o “[...] pré-escolar começou a receber uma atenção especial
dentro do nosso sistema de educação, o que pode ser comprovado pelos diversos
pareceres do Conselho Federal de Educação nesse biênio, e a criação, em 1975,
da Coordenação de Educação Pré-escolar (COEPRE), ligada ao MEC” (SOUZA,
1991, p. 38).
Souza e Kramer (1991) observam que a pré-escola, ao mesmo tempo em
que era considerada necessária, não recebia verbas para viabilizá-la, fato este
contraditório com o modelo compensatório do 1º grau, o qual exigia atenção 38 Segundo Kuhlmann (2000, p. 490), “A assistência científica surge no final do século XIX, nela enfatiza-se a filantropia (organização racional da assistência) em substituição à caridade (emoção, simpatia, piedade), com vistas a melhorar as condições físicas e morais das populações”.
80
semelhante à escola obrigatória, assim como professores habilitados, onerosos
para o Estado. Esse modelo compensatório da escola de 1° grau foi objeto de
inúmeras críticas, especialmente no âmbito acadêmico, que contrapunha a ele a
proposta de educação infantil com objetivos próprios, tendo por base o discurso
do respeito à cultura local. O novo discurso dos teóricos – do respeito à cultura
local – apesar de seus avanços, mantinha a justificativa do baixo custo desse
nível de ensino para os pobres. Os programas de baixo custo tiveram uma grande
expansão no âmbito do MEC, especialmente a partir da criação da Coordenação
de Educação Pré-escolar (COEPRE) em 1975.
Na década de 80, percebe-se a expansão de novos programas
compensatórios de baixo custo. Em 1981 foi lançado o Programa Nacional de
Educação Pré-escolar, constituindo-se no “programa prioritário do MEC e do
Mobral”; cuja finalidade era a expansão “da pré-escola a baixo custo em grandes
espaços ociosos, onde seriam atendidas de 100 a 120 crianças, utilizando-se de
mães voluntárias como mão-de-obra” (SOUZA e KRAMER, 1991, p. 65).
Assim, nas instituições destinadas a atender a população de baixa renda,
nos programas de educação compensatória, geralmente denominadas “centros
de recreação”, atuavam como educadoras majoritariamente mulheres com baixa
remuneração ou voluntárias, apoiadas por baixo investimento público. A
orientação do poder público era recrutar mães da comunidade. Neste sentido a
formação requerida relacionava-se de maneira inversa à idade da criança e suas
condições sócio-econômicas, uma vez que quanto mais nova ou mais pobre a
criança, menor formação exigida, cabendo a essas “educadoras” as tarefas de
recrear, alimentar e limpar, atuando como “mães de todas as crianças”.
81
Essa realidade pode ser comprovada a partir da orientação encontrada em
textos editados pelo MEC, intitulados “Textos sobre educação pré-escolar”, nos
quais havia incentivos ao professor leigo de pré-escola para atuar com as
crianças pobres, como identificado por Arce (1981) a seguir:
Não precisamos transformar as mães em professoras. Elas precisam ser e continuar como mães, cumprindo seu papel maternal, sendo responsáveis últimas pelos filhos. É importante que elas dotem o grupo de 100 crianças que se congregam todos os dias nessa área livre, da sensação de estarem numa família, pais, filhos, muitos irmãos e amigos (BRASIL/MEC, 1981 apud ARCE, 2001a, p. 177).
Para Arce (2001a), o encaminhamento indicado pelo MEC se baseava no
princípio da mãe como “educadora nata”, pela necessidade de expansão do pré-
escolar a baixo custo. Esta autora reitera que para ser educadora na pré-escola,
segundo a lógica do MEC, basta ser “[...] uma mulher mãe, possuidora de
conhecimentos da psicologia do desenvolvimento, nutrição e saúde, que exerça
função de orientadora, facilitadora e/ou auxiliar, não necessitando ser
especializada na área [...]” (ARCE, 2001a, p. 180).
Os programas compensatórios, as políticas oficiais de massa do “pré-
escolar” e a ausência de investimentos na formação dos professores foram as
principais marcas da política educacional para a educação infantil sob o impacto
da Lei 5692/71, alvos de críticas, por sugerirem modelos discriminatórios.
Souza e Kramer (1991) assinalam que a 5692/71 suscitou inúmeras críticas
no meio acadêmico, especialmente por parte dos movimentos de professores,
que reivindicaram melhores condições de trabalho, salários e formação, em suma,
uma “pré-escola de qualidade comprometida com o trabalho pedagógico sério e
82
que conduzisse a criança para o início do seu processo de escolarização”
(SOUZA; KRAMER, 1991, p. 70).
Depreende-se, portanto, que se requereram o direito não apenas ao
acesso, mas também ao conhecimento, criando as condições necessárias a um
repensar das funções da educação infantil e do processo de formação de seus
profissionais. Um debate que, direta e indiretamente, se fez presente na
Constituição de 1988.
3.3 EDUCAÇÃO INFANTIL E A CF/88
A Constituição de 1988 constitui-se em um marco para a educação infantil
ao estabelecer a criança como “sujeito” de direito à educação, cabendo ao Estado
e à família garanti-la, além de proclamar o rompimento com os modelos de
assistência e de educação estabelecidos anteriormente.
A Magna carta dispõe acerca da Educação Infantil em diversos artigos e de
forma diferenciada, ora com direito, ora como dever, ora como atendimento, ou
ainda como assistência, podendo-se inferir que embora se constitua em inegável
avanço, encerra ainda algumas ambigüidades.
Em seu Capítulo II, ao tratar dos Direitos Sociais, estabelece em seu artigo
6°, como direito social a educação, ressaltando ainda em seu art. 7o, inciso XXV,
como direitos sociais dos trabalhadores urbanos e rurais, a “assistência gratuita
aos filhos e dependentes desde o nascimento até seis anos de idade em creches
e pré-escolas” (BRASIL, CF/88, cap. II, art. 7o, XXV).
83
No capítulo. III, na Seção I - “Da Educação”, o legislador constitucional
estabelece no artigo 205, que a educação, direito de todos e dever do Estado e
da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade,
dispondo, no art. 208, IV, que o dever do Estado com a educação será efetivado
mediante a garantia de “atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero
a seis anos de idade” (BRASIL, CF/88, tit. VIII, cap. III, art. 208, IV). Neste mesmo
título, no art. 211, dispõe sobre a organização e financiamento dos sistemas de
ensino, estabelecendo que os “os Municípios atuarão prioritariamente no ensino
fundamental e na educação infantil” (BRASIL, CF/88, tit. VIII, cap. III, art. 211, 2º).
A lei maior estabeleceu assim a quem cabe viabilizar, prioritariamente, essa etapa
da educação.
A CF/88, ao tratar em seu art. 203 da “assistência social”, determina como
um de seus objetivos, “a proteção à família, à maternidade, à infância, à
adolescência e à velhice” (BRASIL, CF/1988, tit. VIII, cap.II, art.203, I). Dessa
forma, da análise pura e simples da letra da lei poderia ser inferido que compete
ao Estado, encarado sob o ponto de vista de seu viés assistencial, proteger a
infância necessitada e não educá-la. Sob tal ângulo, a luta pelo direito à educação
infantil poderia ser incluída na política de proteção, o que não parece correto, e
nem se configura como a melhor interpretação do texto constitucional, cuja
exegese deve ser efetuada levando-se em consideração o bem maior que o
legislador pretendeu proteger.
No capítulo III - “Da Educação, Da Cultura e Do Desporto”, art. 208, IV, a
educação infantil é tratada mediante garantia de “atendimento em creche e pré-
escola às crianças de zero a seis anos de idade” (BRASIL, CF/988, cap. III,
84
art.208, IV). Entretanto o legislador não foi totalmente feliz ao regular a
matéria,pois o fez de forma vaga, deixando-a a posterior critério do legislador
ordinário, possibilitando ainda inúmeras interpretações. Garantia de atendimento
não implica, necessariamente, em “educar”; tampouco significa “cuidar”, mas
atender, o que significa dizer etimologicamente “dar ou prestar atenção; tomar em
consideração; levar em conta; considerar; atentar; observar; notar; acolher; etc.”
(FERREIRA, 1986, p.191). Assim, embora ressaltando-se que não compete ao
legislador originário esgotar a matéria, do ponto de vista legal, vez que o assunto
deverá ser obrigatoriamente regulado através de lei ordinária, e regulamentado
através de decreto, cumprindo a hierarquia de leis existentes em nosso
ordenamento jurídico, a utilização de termos vagos no texto constitucional
possibilita a coexistência de inúmeros programas e diversas finalidades, assim
como possibilita a atuação de qualquer profissional nesse nível de ensino, uma
vez que o “atender” pode ser interpretado de maneira ambígua.
Outra questão importante em relação à Constituição de 1988, refere-se ao
caput do art. 205, o qual assinala que a educação é direito de todos e dever do
Estado e da família, devendo ser promovida com a colaboração da sociedade.
Dessa forma, a responsabilidade do atendimento à criança deixa de ser uma
tarefa exclusiva do Estado, passando a compartilhá-la com a família e com a
sociedade, identificando-se aí uma orientação no texto constitucional que aciona e
inclui outras instâncias sociais, visando minimizar e desconcentrar as obrigações
e responsabilidades do Estado, delegando – as, de certa forma, à sociedade civil.
No que se refere ao ensino, o art. 206, V, a CF/88 dispõe sobre a
“valorização dos profissionais do ensino, garantidos, na forma da lei, planos de
85
carreira para o magistério público, com piso salarial profissional e ingresso
exclusivamente por concurso público de provas e títulos” (BRASIL, CF/88, tit. VIII,
cap. III, art. 206, inciso V). Da análise do referido dispositivo constitucional
verifica-se que o mesmo não é casuístico, e nem poderia ser. Entretanto, em face
da inexistência de legislação ordinária acerca da matéria não se cogita em aí
incluir “a profissional” que atuava em creches e pré-escolas, que continua ao
desabrigo da lei.
Embora haja a inclusão desse nível educacional no Sistema Nacional de
Educação, o texto constitucional prioriza o Ensino Fundamental. Na “Seção I - Da
Educação”, apesar do legislador dispor sobre “o atendimento em creches e pré-
escolas às crianças de zero a seis anos de idade” (CF/88, art. 208, IV),
contraditoriamente, afirma no inciso I sua obrigatoriedade e gratuidade na oferta
exclusiva do ensino fundamental. Vê-se, portanto, a exclusão e a desobrigação na
oferta de vagas para as crianças de zero a seis anos de idade, contradizendo-se
dessa forma o caput do art. 205, o qual expressa que a educação é direito de
todos e dever do Estado.
Verifica-se que a CF/88 dispõe da oferta, porém não esclarece como
promoveria o acesso, tampouco reconhece a “trabalhadora” das creches e pré-
escolas como profissional da educação, a ela não estendendo os direitos
expressos na lei no que respeita à sua atuação, ao seu ingresso no serviço
público, à sua remuneração, em suma, obstaculizando-lhe o direito de ser
reconhecida como profissional da educação.
Considera-se que a CF/88, embora disponha sobre o atendimento das
crianças de zero a seis anos de idade, manteve uma visão
86
assistencialista/filantrópica, a semelhança da LDB 5692/71, constituindo-se este
fato como um complicador, haja vista que ela representa a lei máxima do país,
portanto balizadora de inúmeras leis e documentos regulamentadores da
educação nacional.
Somente no ano de 1996 foi promulgada no país uma nova legislação
dirigida à educação nacional - a LBD 9394/96, a qual será discutida no item a
seguir.
3.4 EDUCAÇÃO INFANTIL E A LDB 9394/96
A Lei de Diretrizes e Bases 9.394/96 dá forma legal ao estabelecido sobre
a educação na Constituição de 1988. A partir desta LDB, a educação infantil e a
formação de seus profissionais passam a ser pensadas no âmbito da educação
básica.
A LDB 9394/96, após um longo processo de construção em que a
sociedade organizada participou amplamente, culminou na aprovação de um
projeto, gestado no MEC, diferentemente do proveniente da Câmara e com um
novo eixo orientador, ao qual teve o Senador Darcy Ribeiro como seu relator. Este
novo projeto desfigurou o projeto inicial e comprometeu o processo democrático
que deu inicio à sua elaboração, desrespeitando a sociedade civil e o Fórum
Nacional em Defesa da Escola Pública, pois não contemplou a maioria das
propostas elaboradas pelos mesmos. Das alterações realizadas, duas devem ser
destacadas: a primeira, relacionada à “[...] diminuição das responsabilidades do
Estado com relação à educação; [e a segunda relacionada ao] cerceamento da
87
sociedade civil em participar das decisões sobre o ensino, num nítido retrocesso
do processo de aperfeiçoamento democrático das políticas brasileiras” (GROSSI,
1998, p. 7).
No que respeita às bandeiras de luta dos educadores, especialmente
àquelas expressas nos documentos de suas organizações, as mesmas foram
incorporadas de forma re-significada:
[...] capacitação de professores foi traduzida como profissionalização; participação da sociedade civil como articulação com empresários e ONGs; descentralização como desconcentração da responsabilidade do Estado; autonomia como liberdade de captação de recursos; igualdade como eqüidade; cidadania crítica como cidadania produtiva; formação do cidadão como atendimento ao cliente; melhoria da qualidade como adequação ao mercado e, finalmente, o aluno foi transformado em consumidor (SHIROMA et al. 2000, p. 52).
A pressão e a luta dos movimentos sociais e dos educadores colaboraram
para que algumas das propostas iniciais fossem contempladas pela nova LDB
9394/96, dentre elas as que tratam dos profissionais da Educação Infantil como
docentes, dando início a uma nova fase para esse nível educacional.
A LDB, pela primeira vez na história das legislações brasileiras proclamou
a Educação Infantil como direito das crianças de 0 a 6 anos e dever do Estado.
Estabeleceu também os objetivos e as orientações gerais para a educação
básica, especificando-os em cada nível – educação infantil, ensino fundamental,
ensino médio. As orientações estabelecidas nessa LDB para a educação básica,
especialmente ao que se refere à Educação Infantil e à formação de seus
professores serão discutidas a seguir.
Na Seção II – Da Educação Infantil, composta por três artigos (atrs. 29. 30
e 31), a lei estabelece, em consonância com a Educação Básica (EB), que esse
88
nível de educação, primeira etapa da EB, “tem como finalidade o desenvolvimento
integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico,
intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade”
(BRASIL, LDB 9394/96, tit. V, cap. II, art. 29).
Observa-se que a finalidade expressa no texto legal acaba por estabelecer
a função do professor de Educação Infantil, devendo desenvolver a criança na
creche e na pré-escola e complementar a educação dada pela família e pela
comunidade. Percebe-se que a finalidade definida na lei tem função de
desenvolvimento e complementaridade para a educação infantil, porém tais
funções, se entendidas conforme seus significados na língua vernácula,
possibilitam interpretações fragmentadas, capazes de influenciar a formação de
professores de maneira invertida, diferentemente da desejada pelas organizações
representativas dos profissionais da educação, as quais entendem a educação do
sujeito de maneira integral e não fragmentada.
A LDB 9394/96 estabelece que educação infantil seja oferecida em: “I –
creches, ou entidades equivalentes, para crianças de até três anos de idade; II –
pré-escolas, para as crianças de quatro a seis anos de idade” (BRASIL, LDB
9394/96, tit. V, cap. II, art. 30), entretanto, apesar da oferta de atendimento às
crianças de 0 a 6 anos de idade, limita e retrai a ação estatal ao negar a todos os
brasileiros, em especial à educação infantil, o direito à educação, fato este
facilmente verificável em seu art. 32, que define a obrigatoriedade do ensino
fundamental. Percebe-se aí uma clara contradição e uma regressão expressa aos
direitos sociais e constitucionais, apresentados na Carta Magna do país, a qual
dispõe sobre a obrigatoriedade do Estado com a educação.
89
Outra questão importante para alguns críticos da LDB 9394/96, diz respeito
à idéia de que a criança deve deter capacidades e adquirir potencialidades, numa
visão de concepção produtivista de educação, em que a criança é compreendida
não como um sujeito social, mas como uma mercadoria capaz de adquirir bens
(educação = mercadoria) e reproduzir valores (ideologias) que atendam às
necessidades pessoais e do mercado capitalista (mercadoria), em um futuro
próximo. Neste sentido, a educação está vinculada à idéia de preparação para o
trabalho (instrução-educação), revelando plena sintonia com o projeto neoliberal,
o qual compreende a criança não mais como um sujeito, mas como mercadoria
que consome mercadoria.
A lei, ao proclamar a criança como sujeito de direitos, confere-lhe a
condição de sujeito com necessidades a serem supridas, tais como educação e
cuidados, e, ainda com potenciais, os quais devem ser estimulados. Nessa
perspectiva a criança deve ser trabalhada para exercer sua função social, sua
cidadania, sua função de sujeito – consumidor em desenvolvimento. A LDB,
assim, adapta à Educação Infantil às leis do mercado e da concepção neoliberal,
nas quais o ser humano (criança) é visto como consumidor, ao adquirir bens -
cliente da educação, e como mercadoria, ao ser objeto de interesse do capital
e/ou força de trabalho em potencial. Nessa perspectiva de análise, depreende-se
que Estado neoliberal, ao investir na educação infantil, buscará obter como
retorno a adaptação do cliente à nova estrutura social globalizada, reproduzindo
seus interesses na sociedade.
Segundo Rosemberg (2002a), é o Banco Mundial que traz para a educação
infantil a concepção de “desenvolvimento infantil”, o que, para a autora, provoca
90
uma “alteração de concepção, pois programas para desenvolvimento infantil
podem ser implantados pelas mães, por visitadoras domiciliares, no contexto da
casa, da rua, da brinquedoteca, sob a responsabilidade de qualquer instância
administrativa” (ROSEMBERG, 2002a, p. 66). Tais supostos são coerentes com o
estabelecimento da educação infantil como “complemento”, uma vez que
complementar, pode ter como referência maior de trabalho a ação da família e da
comunidade. Baseando-se ainda na idéia de que as famílias e as comunidades
são essencialmente boas, como se houvesse apenas um modelo de família e
comunidade, sem considerar que no âmbito dessas duas instâncias existem
aspectos que podem ser trazidos e coletivizados nas instituições e questões a
serem revistas, como preconceitos, violência, etc.
Pode-se também questionar a concepção de complementaridade presentes
nos supostos recomendados pelo Banco Mundial, pois apenas algumas crianças
possuem esse direito, uma vez que a educação infantil não é obrigatória. A família
e a comunidade de classe pobre, detentoras de escassos recursos materiais,
provavelmente, não terão acesso a uma instituição de educação infantil com
característica de complementaridade. Pode-se inferir que, sob o propósito do
desenvolvimento infantil e da complementaridade, aliados ao principio da
flexibilidade, diretriz geral da LDB 9394/96 (CURRY, 1998), sem a devida
problematização, estar-se-ia possibilitando, sob nova roupagem, a manutenção
do histórico sistema dual da educação infantil também no âmbito do sistema de
ensino.
A LDB 9394/96, ao tratar “Do Direito à Educação e do Dever de Educar”,
estabelece que as crianças com sete anos ou mais têm o direito ao “ensino
91
obrigatório”; que as crianças com necessidades especiais têm direito à “educação
especializada” e ao “atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças
de zero a seis anos de idade” (BRASIL, LDB 9394/96, tit. III, art. 4). O direito à
educação é transformado na educação infantil em direito a “atendimento gratuito”.
Isso permite inferir que essa troca (trocar educação por atendimento) representa
uma forma de eximir o Estado de seu dever de viabilizar uma educação que leve
em conta a criança, olvidando-se o fato de que para educá-la necessita-se
obrigatoriamente, de espaços adequados, além de profissionais habilitados e
qualificados.
A nova LDB estabelece que a formação dos profissionais da educação
“visa atender aos objetivos dos diferentes níveis de ensino e às características de
cada fase do desenvolvimento do educando” (BRASIL, 1996, tit. VI, art. 61). O
centro da atuação são os objetivos estabelecidos para cada etapa conforme o
objetivo da educação infantil, a função docente nessa fase é atender e
desenvolver. Para atender a esses objetivos, pode-se inferir que não há
necessidade de uma formação apurada.
A LDB 9394/96 trata os docentes, de forma geral, como docentes da
educação básica, o que leva ao entendimento de que, ao estabelecer a
incumbência dos docentes da educação básica, inclui na mesma o professor da
educação infantil, o qual passa a ter como função:
I - participar da elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento de ensino; II - elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a proposta pedagógica do estabelecimento de ensino; III - zelar pela aprendizagem dos alunos; IV- estabelecer estratégias de recuperação para alunos de menor rendimento; V - ministrar dias letivos e horas-aula estabelecidos, além de participar integralmente dos períodos dedicados ao planejamento, à avaliação e ao desenvolvimento profissional; VI - colaborar com
92
atividades de articulação da escola com as famílias e a comunidade (BRASIL, LDB 9394/96, tit IV, art. 13,)39
Nascimento (2000) alerta, à luz do que sugere a LDB, para o perigo de se
preparar professores para a educação infantil sem se levar em conta o educar e
cuidar, pois para a autora, a função do professor da educação básica restringe-se
ao ensino fundamental e médio. Corre-se o risco, dessa forma, de se definir o
fazer do professor de educação infantil à imagem e semelhança dos profissionais
dos demais níveis de ensino, o que poderia possibilitar, no caso da educação
infantil, ao ensino de conteúdos do ensino fundamental de forma simplificada.
A preocupação proposta por Nascimento (2000) é justificável pelo fato de
se dispensar o mesmo tratamento a dois níveis distintos de ensino e
particularmente, quanto à formação dos profissionais que neles atuam. Indica-se
também um maior ganho para os profissionais da educação infantil – o
estabelecimento de um nível mínimo de formação para o exercício, eis que o
art.62 do mencionado diploma legal estabelece que sua formação “[...] far-se-á
em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em
universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação
mínima para o exercício do magistério na Educação Infantil e nas quatro primeiras
séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal”
(BRASIL, LDB 9394/96, tit. VI, art. 62).40.
O que parece ser um ganho, uma aparente conquista para o professor de
Educação Infantil num primeiro momento – o estabelecimento da formação “em
39 Grifos da autora. 40 Grifos da autora.
93
nível superior” se desfaz, entretanto, pela hierarquização de níveis/cursos e
instituições, cabendo ao professor de Educação Infantil e Séries Iniciais os níveis
e instituições do grau mais baixo da hierarquia.
Para Brzezinski (2001), a manutenção do nível mais baixo de formação
para os professores das crianças menores causa “perplexidade”, pois “[...] as
investigações sobre desenvolvimento infantil comprovam a necessidade de
profissionais mais bem preparados, com formação mais aprofundada para
atenderem a faixa etária não afeta a abstrações” (BRZEZINSKI, 2001, p. 159).
Considerando as considerações de Nascimento (2000) e o
encaminhamento mais amplo da formação dos professores, constata-se que essa
contradição foi construída, com a inclusão da formação do professor de Educação
Infantil no âmbito da formação para a educação básica, sem que fossem levados
em conta os encaminhamentos e discussões quanto à especificidade da docência
na área, nem os trabalhos desenvolvidos nesse sentido no âmbito do COEDI. Há
que se perguntar como retomar essa questão articulando os estudos da área da
Educação Infantil quanto à especificidade de seu professor, com os
encaminhamentos para a formação dos professores para os demais níveis de
ensino.
Quando se analisa, na LDB 9394/96, o lócus de formação dos professores,
observa-se que, no artigo 63, os Institutos Superiores de Educação (ISE) são
criados como locais destinados à formação em nível superior, destinados aos
docentes que atuam na educação infantil e nas primeiras séries do ensino
fundamental. Aguiar (2001) lembra que os ISE somente apareceram como lócus
de formação quando foi interrompido o processo democrático e “somente com a
94
interrupção da trajetória do projeto da Câmara, com a entrada em cena do
substitutivo do senador Darcy Ribeiro é que esses institutos emergiram”
(AGUIAR, 2001, p. 201).
Para Silva (1998) “essa grande diversidade de possibilidades de formação
dos professores da educação básica tenderá a dificultar ainda mais a construção
da identidade profissional do magistério” (SILVA, 1998, p. 100). Permanece a
formação mínima indicada na LEI 5692/71, na qual o nível superior também era
indicado como ideal. Estaria o tamanho das crianças com as quais atuam esses
docentes influenciando na determinação do nível mais baixo para sua formação?
A exigência de um nível mínimo inferior para os profissionais que atuam com as
crianças abaixo de 10 anos, pode significar que essas crianças têm menos direito
que os maiores a profissionais qualificados?
Para os professores leigos que atuam especialmente nas creches pode ser
considerado um ganho, pois lhes garante um nível mínimo para sua formação.
Para a formação do professor de educação infantil como categoria profissional o
não estabelecimento do nível superior como mínimo e sua retirada do âmbito das
universidades foi uma perda, quanto à qualidade e possibilidade de
reconhecimento da categoria.
Para Minto e Muranaka (2002), a LDB 9394/96 aparentemente apresenta
uma evolução quanto à formação dos profissionais para a Educação Infantil ao
denominá-los docentes, porém sua formação é negligenciada ao ser estabelecido
o nível médio na modalidade Normal como exigência mínima para o acesso à
carreira. Esse fator é reforçado pelo fato de que a formação em nível superior,
encontrar-se prevista sob a forma de habilitação no curso Normal Superior no
95
interior dos Institutos Superiores de Educação. Para os autores, isso é uma forma
de aligeiramento e de baixar os custos.
A partir dessas novas orientações legais, a formação desses profissionais
passa a ser foco de maior atenção e preocupação nos discursos do meio
científico e dos órgãos oficiais em nível federal, estadual e municipal. Segundo
Kishimoto (1999), “a formação de profissionais de educação infantil começa a ser
discutida com maior vigor após a Lei 9394/96” (KISHIMOTO, 1999, p. 63).
A ênfase na formação se fazia necessária e vinha sendo reivindicada como
direito do professor, pois o quadro nacional apresentava que, “[...] em 1994, 40%
dos professores que atuavam na educação infantil não haviam completado o
ensino fundamental” (ROSEMBERG, 1994, p.62).
Já os dados de 1996, conforme levantamento realizado MEC/INEP/SEEC
(BRASIL/MEC/SEF, 1998a, vol. I, p. 40), indicam 7,38% dos professores com o
ensino fundamental incompleto e 8,69% com apenas o ensino fundamental
completo.
Após a LDB, tem início uma fase de elaboração de muitos documentos
indicando como deverá ser a formação dos professores de Educação Infantil no
âmbito da educação básica. Tais documentos tratam do aspecto específico da
formação, e estabelecem o lócus e as diretrizes curriculares para a formação dos
professores da educação básica, incluindo a formação para a docência na
educação infantil. Entre os documentos institucionais, destaca-se o Referencial
Curricular Nacional para Educação Infantil - RCNEI, tratado a seguir.
96
3.5 REFERENCIAL CURRICULAR NACIONAL PARA EDUCAÇÃO INFANTIL
(RCNEI)
O RCNEI, à semelhança dos PCNs é um referencial elaborado pelo MEC
com o objetivo de “normatizar” ou “uniformizar” o “ensino” na Educação Infantil.
Sua publicação trouxe mais polêmicas para uma área na qual os profissionais
vinham construindo, através de um longo processo de discussão, uma linha de
ação própria, partindo de referenciais específicos, cavando seu próprio espaço e
definindo seu perfil dentro do sistema educacional.
Esses profissionais mantiveram a preocupação em garantir a sua
especificidade, procurando não reproduzir nas pré-escolas e creches, a mesma
realidade do ensino de primeiro grau e buscado sair do espaço de “preparação
para” onde se tentou colocar a Educação Infantil. A recente normatização
institucional acaba por tolher estas e outras questões que vinham sendo
discutidas, surgindo como uma proposta asséptica, acima das polêmicas e
calando-as.
Contraditoriamente, apesar de não apontar qual seria o profissional apto
para atuar nesse segmento educacional, o RCNEI (1998) pressupõe um
profissional altamente qualificado, capaz de trabalhar interdisciplinarmente, visto
que propõe a “[...] integração de vários campos do conhecimento e a cooperação
de profissionais de diferentes áreas” (BRASIL, RCNEI, Vol. I, p. 41). Isso se
afigura uma contradição, pois, o trabalho cotidiano da Educação Infantil é
desenvolvido por profissionais de escolaridade diversificada, da qual apenas uma
minoria tem formação específica e um percentual ainda menor cursou o nível
superior (conforme exigido pela LDB), sabendo-se também que os profissionais
97
com mais anos de escolaridade encontram-se em regiões economicamente mais
ricas do país.
Além da tarefa de integrar o cuidado e a educação nas propostas de
formação docente na Educação Infantil, é premente aparelhar o enorme
contingente de profissionais leigos ou sem formação específica para exercer a
docência junto às crianças menores de 6 anos.
Os desafios relativos à formação de professores de educação infantil, são
tão grandes quanto a necessidade de investimentos e de ampliação do
atendimento. Passando à análise dos objetivos declarados frente à realidade das
ações aplicadas, percebe-se que a política que vem sendo efetivada para
educação infantil é bem diferente daquela apresentada nas intenções.
Em fevereiro de 1998 a versão preliminar do documento foi encaminhada a
vários profissionais ligados à área da educação infantil para emissão de parecer,
a ser devolvido ao MEC. Por conta de vários percalços, os “pareceristas”
solicitaram tempo maior para o aprofundamento dos parâmetros propostos à
Educação Infantil, haja vista não haver consenso quanto à necessidade de haver
um referencial curricular para a referida área da educação.
Em outubro de 1998 a versão final do RCNEI foi divulgada sem que os
apelos dos pareceristas, por mais tempo para debates e discussões fossem
atendidos, revelando o quanto foi prematura a elaboração do referido documento,
uma vez que ainda persiste a necessidade de um amadurecimento da área,
inclusive para saber se cabe dentro da especificidade da educação infantil um
documento denominado Referencial Curricular, em função dos sentidos que o
98
termo “currículo” carrega41.
Dentro desse contexto, o RCNEI deve ser compreendido como um material
institucional, entre outros, que serve de bases referenciais para os processos de
formação de professores em curso, transformando-os em “pacotes de formação”
previstos nos ordenamentos e recomendações legais. São documentos que
procuraram referenciar o papel do MEC em cumprir com sua tarefa de subsidiar
os sistemas de ensino com relação à formação de seus profissionais em termos
de diretrizes e parâmetros.
Dando-se continuidade ao trabalho, apresentar-se-á a seguir o programa
PEC Formação Universitária Municípios, implantado em São Paulo nos anos 2003
e 2004, a partir do documento que o norteia, tendo por base algumas das
legislações analisadas neste capítulo.
CAPÍTULO IV
PROGRAMA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA − PEC –
FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS
Este capítulo visa a apresentar o Programa PEC – Formação Universitária
Municípios (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003), buscando
identificar sua estrutura e organização, no intuito de viabilizar a análise e
interpretação do mesmo. O objetivo principal é apresentar aos leitores e
41 Ver a esse respeito CERISARA, A. B. A produção acadêmica na área de educação infantil a partir da análise de pareceres sobre o referencial curricular nacional da educação infantil. In: GOULART, A. L. e PALHARES, M. S. Educação Infantil pós-LDB: rumos e desafios, 2. ed. Campinas: Editora Autores Associados, 2000.
99
estudiosos do tema o desenho educacional e político-pedagógico que norteou a
execução do programa de formação de professores das redes públicas municipais
do Estado de São Paulo, implementado nos anos 2003 e 2004, propiciando
formar a base cognitiva para a execução de futura análise crítica de seu desenho
e implementação.
Neste intuito, este capítulo foi subdividido em itens, apresentados a seguir.
4.1 O PROGRAMA PEC − FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS E
O CONSTEXTO DE SUA REALIZAÇÃO NA PERSPECTIVA DE SEUS
MENTORES
O Programa PEC – Formação Universitária Municípios originou-se do
Programa PEC – Formação Universitária, desenvolvido nos anos 2001 e 2002
pela Secretaria de Estado de Educação de São Paulo, como resposta às
exigências legais de capacitação para os professores efetivos em exercício na
rede pública de ensino, com formação em curso normal ou na habilitação do
magistério, no nível médio.
O Programa PEC – Formação Universitária, desenvolvido pelo Conselho
Estadual de Educação de São Paulo42 foi considerado pela Secretaria como um
42 A Deliberação do CEE N. 12/2001, dispôs sobre o Programa Especial de Formação Pedagógica Superior, dirigido aos professores efetivos da rede pública, regulamentando a autorização para a oferta, oferecida por Universidade ou por Instituições de Ensino Superior, jurisdicionadas ao Conselho Estadual de Educação, que ministrem cursos autorizados de licenciatura plena. Além disso, essa deliberação regulamentou e instruiu o pedido de autorização para a promoção do curso, contendo todo o processo de elaboração e execução, tais como: o período e a carga horária referente ao projeto pedagógico do curso; as atividades específicas a serem desenvolvidas nos mesmos; o plano de formação para a docência escolar; o cronograma e relacionamento de todas as disciplinas e demais atividades, compreendidas de títulos, ementas, cargas horárias, bibliografia básica, metodologia de trabalho e formas de avaliação; a relação de professores e suas respectivas qualificações, assim como o número previsto de horas de trabalho nas atividades do curso; a indicação do coordenador do curso, com titulação mínima de mestre. A Deliberação
100
sucesso, havendo graduado, segundo dados da Secretaria, cerca de 6.500
professores da rede estadual paulista.
Em função de seu incontestável êxito, o mencionado programa despertou a
atenção das instâncias municipais que, numa tentativa de antecipar o
cumprimento das exigências estabelecidas pela LDB 9394/96 (que requerem a
formação de profissionais de educação para a educação básica em cursos de
graduação em pedagogia ou em nível de pós-graduação), buscaram o apoio do
Estado, visando sua implementação na esfera Municipal.
Paralelamente, para atender as exigências legais e qualificar os
professores da rede municipal de São Paulo, a União Nacional dos Dirigentes
Municipais de Educação - Seção São Paulo (UNDIME), na qualidade de
representante dos Dirigentes Municipais paulistas, buscou obter a parceria e o
envolvimento do Estado, no intuito de oferecer aos municípios a mesma
oportunidade ofertada aos professores da rede estadual, mediante a viabilização
do PEC - Formação Universitária Municípios. Em decorrência de tais diretivas, foi
firmado um convênio entre a UNDIME e a Fundação para o Desenvolvimento da
Educação – FDE, com o apoio da Secretaria de Estado da Educação, e duas
Universidades paulistas: USP e PUC-SP.
O Programa Especial – PEC – Formação Universitária Municípios foi
desenvolvido à semelhança do Programa PEC – Formação Universitária,
utilizando-se da mesma estrutura e da quase totalidade de material impresso
deste último, porém foram necessárias algumas adaptações e acréscimos, a fim
também dispôs sobre o diploma dos concluintes, identificado na mesma como “equivalente” à licenciatura plena, para fins de docência e de continuação de estudos.
101
de contemplar as duas formações em nível superior de professores: a de
Educação Infantil e a de 1ª à 4ª séries do Ensino Fundamental que tinham apenas
titulação em magistério em nível médio.
A implementação desse programa atendeu também à exigência
estabelecida na Constituição Federal de 1988, que em seu Art. 30, inciso VI,
conferiu aos municípios a competência de "[...] manter, com a cooperação técnica
e financeira da União e do Estado, programas de educação pré-escolar e de
Ensino Fundamental" (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988, p. 38).
Assim, já no seu nascedouro, o Programa ora em análise representou a
observância de duas exigências legais: a primeira, relacionada à submissão e
adequação aos ditames da Constituição Federal de 1988; e a segunda, dirigida ao
processo de municipalização dos retro mencionados níveis da Educação Básica,
colocando “[...] como desafio para os municípios a formação de quadros que
assumissem o Ensino Fundamental e que fossem capazes de promover uma
educação de qualidade” (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS,
2003, p. 5).
4.2 A PROPOSTA DO PEC-FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS
O programa especial PEC - Formação Universitária Municípios tomou
como referências os marcos da política educacional ditados pela Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional e pelas Diretrizes Curriculares Nacionais do
Ensino Fundamental, as Recomendações dos Parâmetros Curriculares Nacionais
e os dispositivos expedidos pelos Conselhos Nacional e Estadual de Educação,
relativos à formação de professores para a Educação Básica, articulados com os
102
princípios e diretrizes da política educacional da Secretaria da Educação do
Estado de São Paulo. O fundamento legal do PEC - Formação Universitária
Municípios é o Art. 81 da LDB 9394/96, que estabelece: "É permitida a
organização de programas ou instituições de ensino experimentais, desde que
obedecidas às disponibilidades desta lei”.
Ainda sob o aspecto legal, verifica-se que a realização do referido curso
especial de formação superior atendeu também aos preceitos legais da Lei
9394/96, que em seu título VI - Dos Profissionais da Educação, Arts. 62 e 63
dispõe sobre a formação dos profissionais da educação básica, da qual a
educação infantil e as primeiras séries do ensino fundamental fazem parte. Dessa
forma, constata-se que o Programa PEC – Formação Universitária Municípios
além de respaldado em interesses ideológicos que subsidiaram sua realização,
conforme a seguir detalharemos, ateve-se à legislação em vigor acerca da
matéria.
Do exame dos documentos do referido programa, observa-se que toma
como referência os marcos da política educacional, ditados por diversos
documentos legais, tais como: a CF/88, a LDB N. 9394/96, as Diretrizes
Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental, as recomendações dos
Parâmetros Curriculares Nacionais e os dispositivos expedidos pelos Conselhos
Nacional da Educação – Resolução CNE 12/2003 e Estadual de Educação –
Deliberações CEE N. 12/2001 e N. 13/2001, relativas à formação de professores
para a Educação Básica, além de apresentar-se em conformidade com as
orientações do Banco Mundial, consubstanciadas nas propostas para educação
dos países em desenvolvimento. Tais orientações, expedidas “com vistas a influir
103
sobre as mudanças nas despesas e nas políticas das autoridades nacionais.”
(CORAGGIO,1998, p. 75), foram adotadas a partir da utilização de uma
metodologia que, segundo os fundamentos do programa, visa o aprimoramento e
a qualificação do profissional da educação infantil e das séries iniciais do Ensino
Fundamental, privilegiando o uso de tecnologias avançadas de comunicação e
informação como suporte adequado para as ações pedagógicas na rede oficial de
ensino.
No processo de municipalização destes níveis da Educação Básica,
colocou-se como desafio para os municípios a formação de quadros que
assumissem o Ensino Fundamental e que fossem capazes de promover uma
educação de qualidade. Nessa direção, a promoção de políticas públicas de
educação, voltadas à valorização profissional e formação do magistério, tornou-se
uma preocupação constante dos poderes públicos municipais.
O desenvolvimento de ações de formação docente em exercício,
centralizadas ou descentralizadas, passou a fazer parte do cotidiano das redes
municipais. Entre estas ações, a formação dos professores da Educação Infantil e
dos anos iniciais do Ensino Fundamental em nível superior, que é preconizada
pela nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9394/96), também
passou a ser considerada, com o intuito de dar continuidade às ações de
valorização profissional do magistério dos municípios paulistas.
4.3 PRINCÍPIOS EDUCACIONAIS, POLÍTICO-INSTITUCIONAIS E
PEDAGÓGICOS
104
O Programa PEC Formação Universitária foi elaborado, a partir de sete
princípios norteadores, identificados abaixo:
Exercício da docência como referência da organização institucional e
pedagógica;
Professores como agentes fundamentais para implementação de
políticas educacionais;
Diretrizes, referências e parâmetros curriculares nacionais para a
Educação Infantil e Ensino Fundamental como referência na formação
multidisciplinar dos professores;
Construção de competências como eixo organizador do currículo;
Coerência entre a formação e a prática do professor;
Domínio de objetos sociais do conhecimento e sua transposição didática;
Pesquisa como elemento de fundamental na formação dos professores.
A seguir, descrevem-se estes princípios, na forma como foram concebidos
pelo Programa.
4.3.1 O exercício da docência escolar deve ser a referência da organização institucional e pedagógica do Programa de formação de professores
Tal princípio objetivou situar o processo de formação de professores no
contexto de sua história de trabalho nas escolas da rede oficial pública de ensino,
com atividades realizadas em um quadro institucional próximo, articulado e
105
permeável às necessidades e características do sistema de ensino público e à
forma de operação de suas unidades escolares, e organizadas em propostas
pedagógicas que contemplem a variedade das situações escolares nas quais os
professores realizam seu ofício.
Segundo o documento, do ponto de vista institucional, o princípio norteou-
se na indicação do CEE N. 07/2000 que se baseia no pressuposto pelo qual a
variedade das situações escolares deve ser o ponto de partida para formulação
de propostas, fundando-se no reconhecimento da especificidade do exercício do
magistério enquanto profissão diferenciada. A referida Resolução reconhece que
o exercício do magistério somente se torna possível no espaço institucional da
escola, haja vista que esta é concebida como o núcleo das preocupações
teóricas, além de constituir-se no espaço de realização das atividades práticas
nos processos sistematizados de formação de professores, e na qual o
profissional possa ser instigado a enfrentar as mudanças contemporâneas que se
fazem presentes no espaço escolar.
Desta forma, o Programa, a partir do princípio delineado, propôs um desenho
curricular baseado na relação entre as vivências educadoras e o contexto escolar,
enquanto “[...] momentos privilegiados de produção didático-pedagógica, de
sínteses parciais e avaliação dos conteúdos trabalhados ao longo do Programa”
(PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003, p. 07).
4.3.2 Os professores são agentes fundamentais na implementação de políticas educacionais
É o princípio delineado pelo Programa que relacionou o processo de
formação dos professores à composição de sua identidade profissional inserida
106
no contexto do projeto pedagógico de cada escola, mas associado
institucionalmente aos princípios que orientam a reforma da Educação Básica do
país. Assim, a partir deste princípio, o PEC – Formação Universitária Municípios,
pretendeu contribuir ao “[...] esclarecimento, a sensibilização e a mobilização dos
professores na garantia dos aspectos centrais desta política, especialmente, nas
suas decorrências e implicações no centro do processo educativo” (PEC –
FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003, p. 08).
O significado prático deste princípio desvela-se no projeto pedagógico; de
tal sorte, a construção curricular baseada no conteúdo enquanto meio à produção
das aprendizagens; as novas práticas da avaliação pautadas na regulação da
aprendizagem e a introdução da progressão continuada - constituem-se em
conteúdos permanentes e fundamentais no processo de formação contínua dos
professores.
4.3.3 As Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental, o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil e os Parâmetros Curriculares Nacionais devem ser tomados como referência na formação do professor multidisciplinar
Tal princípio preconiza a docência escolar como o eixo estruturador
curricular, considerando o estudo aprofundado dos conteúdos curriculares
desenvolvidos na educação infantil e no ensino de 1ª a 4ª séries como um
aspecto central da formação dos professores. O programa referenciou o estudo
dos conteúdos na análise sistematizada das “Diretrizes Curriculares Nacionais
para o Ensino Fundamental”, no “Referencial Curricular Nacional para a Educação
Infantil” e nos “Parâmetros Curriculares Nacionais”, todos eles documentos
107
reconhecidos como referências na discussão curricular, disseminados na
comunidade educacional.
4.3.4 A construção de competências deve ser o eixo organizador do currículo
O projeto concebeu o conceito de competências a partir de Perrenoud
(1998 apud PROGRAMA PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS,
2003, p. 9), que conceitua competência como a capacidade de mobilização de
recursos necessários ao enfrentamento, com eficácia, às situações complexas e
inéditas ao educando. A partir de tal premissa o programa assumiu que o ponto
de partida e de chegada da formação do professor é a sua atuação profissional no
contexto da instituição escolar, nos marcos de seu plano de desenvolvimento
institucional, com destaque para o seu projeto pedagógico.
A sistemática curricular no Programa PEC – Formação Universitária
Municípios (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003) tomou
como base as seguintes competências de referência, que norteariam o
monitoramento e a avaliação no programa:
Problematizar, explicitar e debater situações contextualizadas, relacionando
práticas e vivências socioculturais com os conteúdos, os métodos e as técnicas;
Reconstruir a unidade e a complexidade da existência docente com as suas
diversas implicações presentes na valorização do conhecimento em construção;
Compartilhar a reflexão pessoal crítica em grupos de âmbitos diversos para
permitir mudanças de práticas, atitudes e revisão de valores;
108
Participar de processos de investigação e intervenção com outros docentes
e alunos, utilizando métodos diversos;
Favorecer a pluralidade e valorizar a diversidade no sentido de trabalhar
conceitos em contextos diversificados, a partir de novas perspectivas e
referenciais;
Ler, interpretar e atuar na sociedade, a partir dos sinais de mudança do
mundo contemporâneo;
Orientar suas escolhas e decisões metodológicas e didáticas por princípios
éticos, políticos e estéticos e por pressupostos epistemológicos coerentes;
Compreender e atuar sobre os processos de ensinar, aprender e avaliar na
escola;
Organizar formas mais ativas, interessantes e significativas de
aprendizagem;
Solucionar problemas concretos da prática docente e da dinâmica escolar;
Desenvolver trabalho coletivo em interação com alunos, pais, comunidade e
outros profissionais da escola e fora desta;
Sistematizar e socializar a reflexão sobre a prática docente.
As competências assinaladas no Programa sintetizaram as
recomendações dos documentos institucionais existentes acerca da matéria,
indicando a necessidade de serem as mesmas adotadas nos de cursos de
109
formação de professores, como instrumento para a atuação multidisciplinar dos
referidos profissionais.
4.3.5 A coerência entre a formação do professor e a prática de atuação que dele se espera deve pautar todas as atividades que serão desenvolvidas durante o Programa
Por este princípio, o documento indicou que a prática docente dos
alunos-professores do PEC – Formação Universitária Municípios, seria
problematizada no novo contexto de formação, buscando sua adequação aos
pressupostos recomendados pelas diretrizes normativas e institucionais
vigentes no país, evidenciando a necessidade de perseguir coerência absoluta
entre teoria e prática, no exercício de tal atividade. Segundo as diretrizes do
Programa, esta coerência parte dos seguintes pressupostos: Simetria entre a formação e o exercício profissional;
Contextualização da aprendizagem do professor;
Papel central do tratamento a ser dado aos conteúdos;
Ênfase em processos de avaliação.
4.3.6 O domínio dos objetos sociais do conhecimento e sua transposição didática devem ser priorizados
Quanto a este princípio, o Programa, pautado nas diretrizes e normas
legais, objetivou priorizar o domínio dos objetos sociais do conhecimento e sua
transposição didática pelos professores, em torno do exercício de novas
experiências nas quais, segundo o documento, sejam “convidados a conhecer
com profundidade e transformar os saberes socialmente construídos em objetos
de ensino e de aprendizagem escolar” (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA
MUNICÍPIOS, 2003, p. 11).
110
A profundidade dos conhecimentos referentes às áreas curriculares foi
concebida como fundamental e indispensável no processo de formação dos
professores, segundo o Programa, no sentido de que possa o professor, ter
autonomia de planejamento. O documento considerou explicitamente esta
autonomia como característica distintiva e essencial.
Os princípios do domínio dos objetos e da transposição didática foram
reconhecidos no documento como fundamentais na relação entre saberes,
currículo e ciência. Para o programa, os saberes curriculares e os saberes
científicos, ainda que não equivalentes, não são plenamente distintos, posto que
os currículos de formação e da escola se operam na transposição didática
proposta por Chevallard (1997 apud PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA
MUNICÍPIOS, 2003), no processo de transformação da cultura em objeto de
ensino e de aprendizagem escolar, pelo qual ocorre a articulação dos diversos
saberes das variadas áreas, com o objetivo de se construir um ”conhecimento
menos fragmentado” (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003,
p. 12).
4.3.7 A dimensão da pesquisa na formação do professor deve garantir o desenvolvimento de uma postura de investigador que leve à reflexão sobre sua ação cotidiana
O princípio da dimensão da pesquisa no Programa PEC – Formação
Universitária Municípios, objetivou oferecer situações e experiências de
investigação aos professores, na expectativa de “ampliar as competências
orientadas à investigação docente” (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA
MUNICÍPIOS, 2003, p. 12), através do desenvolvimento de atividades baseadas
em procedimentos de pesquisa científica.
111
O Programa ressaltou que os processos de investigação e descoberta
devem estar conectados aos referenciais teóricos de diferentes ciências nas mais
diversas áreas do conhecimento que compõem a matriz curricular. Assim,
evidenciou que para o professor se desenvolver como pesquisador, os resultados
do que produzir deverá ser socializado através de mecanismos e instrumentos
midiáticos e interativos.
4.4 OBJETIVOS E METODOLOGIA
O Programa foi oficialmente intitulado como Programa Especial de
Formação de Professores de Educação Infantil e de 1ª a 4ª séries do Ensino
Fundamental e, baseado no Artigo 81 da LDB43, teve como objetivo geral,
oferecer aos professores de redes municipais paulistas atuantes “em creches,
pré-escolas e nos anos iniciais do Ensino Fundamental e que possuem formação
em Nível Médio” (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003, p.
13), por meio de instrumentos de tecnologia avançada em comunicação e
informação, um programa superior especial de licenciatura plena, com
organização curricular que garantisse a ampliação e o aprofundamento dos
conhecimentos sobre os conteúdos de ensino em torno de construção de
competências, “fornecendo diploma correspondente expedido pelas instituições
de ensino superior, contratadas para este fim” (PEC – FORMAÇÃO
UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003, p. 13).
Para a consecução do objetivo geral, o Programa indicou objetivos
específicos no sentido de possibilitar os meios necessários para:
43 BRASIL. Lei N. 9394/96, de 20/12/1996.
112
Habilitar professores efetivos de Educação Infantil e de 1ª a 4ª séries do
Ensino Fundamental de redes municipais, visando à melhoria de sua atuação na
rede oficial de ensino.
Possibilitar a experimentação e avaliação pela comunidade acadêmica
paulista, mediante mídias interativas organizadas e monitoradas pela UNDIME,
FDE, USP e PUC-SP.
Ampliar as referências teórico-conceituais, possibilitando a produção e
criação de opções mais significativas de aprendizagens no cotidiano escolar.
Do ponto de vista metodológico, a proposta foi apresentada na perspectiva
de um programa presencial, apoiado em mídias interativas e organizado sob o
formato de 4 módulos que sistematizaram seus referenciais teóricos, através de
temas e unidades presentes na estrutura escolar.
Seu funcionamento previu a articulação entre 5 modalidades de atividades,
que segundo o documento do Programa, fornecem consistência à proposta
pedagógica, a saber: Videoconferências (VCs), Teleconferências (TCs) e
Trabalhos Monitorados (TMs)44.
Cada módulo contou com VCs e TCs que forneceram o suporte teórico-
conceitual, por meio de aulas, palestras e dinâmicas de trabalho presencial virtual.
Antecedendo-os ou sucedendo-os, ocorreu o desenvolvimento de TMs orientados
por sessões on-line, off-line e de suporte.
44 As VCs ocorrem duas vezes por semana, com duração de 04 horas cada, e são ministradas por docentes Mestres e Doutores indicados pelas Universidades; as TCs, mensalmente, com duração de cerca de 3 horas, ministradas por convidados indicados pelas Universidades; os TMs, com carga horária de 16 horas semanais, abrangem atividades on-line, sessões off-line e sessões de suporte supervisionadas por tutores e assistentes indicados pelas Universidades (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003).
113
Os TMs objetivaram desdobrar os temas trabalhados nas aulas por
videoconferência e nas palestras e debates por teleconferências e abrangeram,
segundo o Programa, momentos de “simulação de prática, questionamentos para
reflexão docente, desenvolvimento de sistematizações através do método
científico e avaliação contínua, compreendendo produções diversas por par dos
alunos-professores” (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003,
p. 14). As sessões off-line foram orientadas por tutores e as on-line por meio da
interação entre alunos-professores e assistentes virtuais45, enquanto que as TMs
de suporte, a cargo do próprio aluno-professor, dentro ou fora do ambiente
educacional do Programa.
As modalidades propostas no Programa se complementaram com outros 4
tipos de atividades: Vivências Educadoras (VEs), Oficinas Culturais (OCs), Escrita
de Memórias e Desenvolvimento de Pesquisa e Escrita de Monografia sob forma
de Trabalho de Conclusão do Curso (TCC)46.
As VEs se desenvolveram durante o desenvolvimento integral do
Programa, com ênfases diversas e objetivaram ampliar a relação entre o aluno-
professor com o universo da sala de aula, escola e comunidade. Esta associação,
segundo o documento, se referencia no princípio da articulação entre a teoria e a
prática dos profissionais.
45 Os tutores são de um por turma de 40 cursistas o atendimento das sessões on-line é realizado na proporção de um assistente por até 60 cursistas por sessões. Ressalte-se que a interação entre alunos e professores com os assistentes virtuais, via intranet, é somente possível por meio de protocolos de trabalho previamente estabelecidos (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003). 46 As VEs são atividades que ocorrem sob a supervisão dos tutores e/ou orientadores, com carga horária variada; As OCs, sob a supervisão dos tutores também com carga horária variada, assim como a Escrita de Memórias; Os TCCs, sob a supervisão dos orientadores acadêmicos, indicados pelas Universidades (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003).
114
As OCs foram previstas paralelamente ao desenvolvimento dos módulos
interativos e objetivaram ampliar o que o Programa caracteriza como universo
cultural dos alunos-professores quanto aos usos da leitura e da escrita.
A Escrita de Memórias intentou relacionar o aluno-professor entre o novo
conhecimento aprendido e experiências vividas anteriormente, onde estes
conhecimentos estiveram presentes, “quer no seu papel de aluno, quer no de
professor” (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003, p. 15).
Os TCCs, programados previamente no currículo, segundo o Programa
destinaram-se a ser realizados individualmente, orientados por 01 orientador
acadêmico (docente ou assistente), supervisionando esta prática para cada grupo
de 40 alunos. O documento ressalta que, a critério das Universidades, um
professor poderia atender mais de um grupo.
A figura a seguir representa a estrutura de funcionamento do Programa.
FIGURA 1
ESTRUTURA DE FUNCIONAMENTO DO PROGRAMA PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS
115
Fonte: Programa de Educação Continuada / PEC – Formação Universitária Municípios, 2003.
4.5 PROPOSTA DE AVALIAÇÃO
O documento sugeriu a avaliação do Programa por níveis.
O primeiro nível refere-se ao Programa e a seu impacto no contexto da
prática educativa dos alunos-professores nas escolas em que exercem docência.
Para este nível avaliativo, o Programa indicou que deveria ser realizado por uma
agência especializada, com reconhecida competência na área, a ser contratada
pela FDE.
O segundo nível de avaliação refere-se às aprendizagens dos alunos-
professores no transcorrer do Programa frente aos objetivos de formação
propostos. Deste nível, conforme informado pelo documento, “dependem tanto as
conclusões sobre o crescimento de cada aluno-professor como as decisões sobre
116
sua certificação” (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003, p.
16).
À semelhança do ocorrido com a orientação, a concepção de avaliação se
alinhou com a perspectiva de desenvolvimento de competências profissionais.
Pretendeu-se assim, avaliar a capacidade de acionamento dos instrumentos
qualitativos, diagnosticando o uso funcional e contextualizado dos conhecimentos,
segundo os pressupostos legais do MEC para a formação inicial de professores
de Educação Básica em cursos de nível superior (MEC, 2000, apud PEC –
FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003). Sendo assim, o Programa
previu que a avaliação deveria levar em conta “a adequação das situações de
ensino propostas e a participação dos diferentes educadores e atores sociais
envolvidos, inclusive de representantes das escolas nas quais os professores
exercem sua docência” (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS,
2003, p. 17).
Os instrumentos propostos foram indicados como referenciais diagnósticos
para identificação e análise de situações educativas complexas e/ou problemas
em uma dada realidade; elaboração de projetos para resolver problemas
identificados em um contexto observado, a partir da elaboração de uma rotina de
trabalho semanal, levando-se em consideração: indicadores oferecidos pelo
formador, definição de intervenções adequadas e alternativas às que fossem
consideradas inadequadas, planejamento de situações didáticas consoantes com
um modelo teórico estudado, reflexão escrita sobre aspectos estudados e
estabelecimento de prioridades de investimento em relação à própria formação.
117
O documento indicou uma avaliação inicial que tomasse por referência os
objetivos de formação propostos e a caracterização dos alunos-professores,
levando-se em consideração as suas expectativas frente ao Programa. Esta
avaliação diagnóstica foi indicada como orientadora do encaminhamento a
abordagem dada aos conteúdos propostos.
Após esta avaliação diagnóstica, o Programa propôs a construção de uma
sistemática de avaliação processual que visou apreender as diferentes
aprendizagens e sustentar as escolhas de encaminhamento das situações de
ensino e de aprendizagem. O documento indicou que esta avaliação deveria
envolver diferentes protagonistas, com utilização de diferentes procedimentos
avaliativos.
O terceiro passo seria o da avaliação dos produtos, das sínteses parciais e
finais do Programa, dos estudos independentes e da síntese elaboradora, que,
conforme definido no documento, “devem ser realizados, sempre que possível,
numa dimensão coletiva, envolvendo os alunos-professores, os docentes do
Programa e as comunidades escolares” (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA
MUNICÍPIOS, 2003, p. 17).
O documento ressaltou que estes três momentos deveriam ser realizados e
articulados de forma explícita, como forma de possibilitar a reflexão sistemática
dos alunos-professores em relação à prática docente.
Tomando por base as concepções propostas de avaliação que permeiam o
documento – diagnóstica, processual, permanente e contínua – o Programa
sustentou sua avaliação na experiência do professor-aluno e do aluno-professor,
118
que vivencia um conteúdo com o qual apreenderá princípios e métodos de
avaliação de aprendizagem a aplicar na sala de aula.
4.6 PROPOSTA CURRICULAR: ESTRUTURA E ORGANIZAÇÃO
O Programa foi concebido com diferentes modalidades de atividades
desenvolvidas ao longo dos módulos interativos. O quadro a seguir, expressa
de que forma foi efetuada a distribuição nos eixos temáticos.
QUADRO 1 ESTRUTURA DE FUNCIONAMENTO DOS MÓDULOS E DOS EIXOS TEMÁTICOS DO PROGRAMA PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS
MÓDULO EIXO TEMÁTICO CARGA HORÁRIA
Módulo introdutório Capacitação em informática
44 horas
Módulo 1 O PEC - Formação Universitária Municípios e as dimensões experiencial, reflexiva e ética do trabalho do professor
150 horas
Módulo 2 Formação para a docência escolar: cenário político-educacional atual, conteúdos e didáticas das áreas curriculares
1252 horas
Módulo 3 Currículo: Espaço e tempo de decisão coletiva 98 horas Oficinas Culturais
140 horas
TOTAL 1684 horas
Fonte: Programa de Educação Continuada / PEC – Formação Universitária Municípios, 2003.
Quanto às outras modalidades de atividades, o Programa sugeriu o
desenvolvimento de atividades complementares paralelamente à sua execução
Foram previstas pelo Programa onze Vivências Educadoras, com cargas horárias
diferenciadas, totalizando cerca de 140 horas de trabalho no programa e 360
horas de aplicação na sua comunidade escolar (pratica de ensino).
O quadro a seguir representa a estrutura os eixos e as vivências sugeridas
no Programa.
119
QUADRO 2 ESTRUTURA DAS VIVÊNCIAS EDUCADORAS SUGERIDAS PELO PROGRAMA PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS MODALIDADE DE ATIVIDADE EIXOS TEMÁTICOS
1. Diagnóstico inicial da realidade escolar. 2. Ampliação do conhecimento da realidade escolar, a partir
da analise de critérios e dados de avaliação externa e interna da escola.
3. Análise de projetos e/ou ações de recuperação e reforço. 4. Análise de práticas de letramento e alfabetização e
elaboração de um projeto de trabalho, seu desenvolvimento e avaliação.
5. planejando um projeto de trabalho e/ou programação referente a algum conteúdo da área de língua portuguesa, desenvolvimento do mesmo e avaliação.
6. observação e analise de proposta curricular de Matemática junto a uma escola, envolvendo direção, coordenação, professor e alunos.
7. Ampliação do conhecimento da realidade escolar, a partir de referencias teóricos e procedimentos de análise trabalhados nos temas 6 e 7, objetivando a investigação das relações existentes entre a escola investigada e seu entorno.
8. Ampliação do conhecimento da realidade escolar, a partir de referencias teóricos e procedimentos de análise trabalhados nos temas 8 e 9, objetivando a investigação das relações existentes entre a escola investigada e seu entorno.
9. Observação e análise de uma escola de Educação Infantil ou de Ensino Fundamental, Envolvendo direção, coordenação, professor e alunos.
10. Elaboração de um projeto de trabalho a partir da analise dos dados colhidos nas vivências anteriores (em especial, 1, 2, 3, 7, 8)
VIVÊNCIAS EDUCADORAS (Proposta preliminar)
11. Seminários de Formação (Socialização dos resultados das pesquisas realizadas).
Fonte: Programa de Educação Continuada / PEC – Formação Universitária Municípios, 2003.
Em relação às Oficinas Culturais, o programa previu o desenvolvimento de
atividades paralelas aos temas e unidades dos módulos, com carga horária
prevista para 140 horas, subdivida em três blocos articulados aos pressupostos
metodológicos da proposta curricular, visando à ampliação cultural do aluno-
professor.
Estas atividades deveriam ser articuladas em torno de oficinas que
estimulassem a produção de textos e a utilização de linguagens diversas nos
120
campos da arte e da literatura. O quadro a seguir, representa a estrutura das
atividades sugeridas no Programa.
QUADRO 3 ESTRUTURA DAS ATIVIDADES DAS OFICINAS CULTURAIS INDICADAS PELO PROGRAMA PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS MODALIDADE DE ATIVIDADE EIXOS TEMÁTICOS
BLOCO 1 1. Lendo e produzindo textos acadêmicos
2. Produção de monografias
3. Metodologia de Pesquisa
BLOCO 2 4. Leituras: histórias de encontros
5. Literatura
6. Cinema e teatro
7. Dança e musica
8. Artes visuais
BLOCO 3 9. Literatura: o professor leitor e formador de leitores
10. Contar histórias e letramento
11. As diferentes linguagens no ensino
OFICINAS CULTURAIS (Proposta Preliminar)
12. Produção de texto
Fonte: Programa de Educação Continuada / PEC – Formação Universitária Municípios, 2003.
Em relação às Memórias, foi previsto pelo programa o desenvolvimento de
atividades baseadas em relatos autobiográficos, nos quais o aluno-professor
registrasse sua aprendizagem, seus desafios e acertos.
Estas atividades apresentam caráter investigativo, uma vez que os
registros “permitem, ao aluno-professor, retomar e analisar o seu percurso
docente, anterior, e atual e a evolução dos seus dilemas/situações-problema”
(PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003, p. 20), previstas em
121
11 momentos, com carga horária total de 72 horas, desenvolvidas ao longo do
Programa.
O quadro a seguir, representa a composição destas atividades de
Memórias, conforme a sugestão proposta pelo Programa.
QUADRO 4
ESTRUTURA DAS ATIVIDADES DE MEMÓRIA INDICADAS PELO PROGRAMA PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS
MODALIDADE DE ATIVIDADE EIXOS TEMÁTICOS 1. Lembranças do tempo de aluno-criança
2. Um olhar na escola e um olhar sobre escola
3. A avaliação da aprendizagem do aluno-professor
4. Um inventario do ano letivo concluído
5. Projetos para um novo ano letivo
6. Aprendizagem e avaliação
7. Referente ao Tema 4 – Língua Portuguesa
8. Referente ao Tema 5 – Matemática
9. Referente ao Tema 6 – Natureza, Ciências, Meio Ambiente e
saúde e ao Tema 7 – Espaço, tempo e cultura: história,
geografia, pluralidade e ética
10. Referente ao tema 8 – Arte e Educação e ao Tema 9: Corpo,
movimento, sexualidade e saúde
MEMÓRIAS
11. Identidade Profissional
Fonte: Programa de Educação Continuada / PEC – Formação Universitária Municípios, 2003.
Para a realização destas atividades, o Programa propôs a distribuição de
3300 horas, concluída em 24 meses, a partir da seguinte divisão:
Desenvolvimento dos Módulos Interativos – 1.684 horas (incluindo-se as
Oficinas Culturais).
Atividades complementares – 456 horas (planejamento e avaliação das
vivências, escrita de memórias, desenvolvimento de trabalhos de pesquisa).
122
Vivências educadoras na escola – 360 horas (prática de ensino).
Reconhecimento do exercício profissional – 800 horas (associado ao
trabalho desenvolvido nas atividades complementares).
O Programa estabeleceu carga horária semanal de até 28 horas, a partir
da seguinte distribuição, considerando o trabalho monitorado com cerca de 16
horas.
Videoconferência – 08 horas.
Teleconferência – 03 horas.
4.7 ASPECTOS DA INFRAESTRUTURA PROPOSTA
O PEC – Formação Universitária Municípios estruturou nos espaços
escolares de intervenção do Programa, ambientes e equipamentos, nas
unidades escolhidas para abrigar esta infra-estrutura. Em situações especiais,
os municípios optaram por montar uma infra-estrutura própria, interligando-se
à Rede PEC do Estado. A videoconferência e o ambiente de aprendizagem
off-line foram eleitos enquanto equipamentos de mídia e interativos para dar
conta do suporte logístico-estrutural do Programa.
A videoconferência (VC) foi compreendida no Programa como
tecnologia midiática e interativa, utilizada para transmitir, simultaneamente,
aulas para até 04 salas de recepção em diferentes locais, a partir de um estúdio
de geração.
123
A sala de aula de videoconferência foi prevista com capacidade para 40
alunos, devendo possuir um equipamento de videoconferência, um televisor
de 33’’, um televisor de 29’’, uma câmera documental, videocassete e
computador multimídia. Esta sala deveria ser também utilizada como sala de
recepção de teleconferência e para atender “à capacidade de alunos dos
ambientes de aprendizagem, foram montadas salas extras para receber as
teleconferências” (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS,
2003, p. 24). Para sua montagem foram adquiridos e instalados equipamentos
necessários para a interação midiática, tais como: antenas parabólicas,
aparelho para captação do sinal do satélite, receptor/decodificador digital,
estabilizadores, amplificador de sinal, divisor de freqüência, televisores, rack
ou gaiola de proteção para televisor, amplificador de som e caixas acústicas.
Segue uma foto ilustrativa da sala de videoconferência, conforme se
apresenta no documento. FOTO 1
FOTO ILUSTRATIVA DA SALA DE VIDEOCONFERÊNCIA
Fonte: Programa PEC - Formação Universitária Municípios – 2003
124
Em relação ao Ambiente de Aprendizagem on-line, o Programa
prescreveu a constituição de um espaço de interação na perspectiva de um
ambiente virtual de aprendizagem, destinado ao trabalho monitorado com o
aluno-professor.
Para a realização das atividades on-line foram construídos laboratórios
de aprendizagem nas unidades de ensino, com 20 computadores interligados
em rede e conectados a intranet / PEC - Formação Universitária Municípios e
também à internet, destinado ao trabalho monitorado on-line.
Segue uma foto ilustrativa do ambiente de aprendizagem on-line,
apresentado no documento.
FOTO 2 FOTO ILUSTRATIVA DO AMBIENTE DE APRENDIZAGEM ON-LINE
Fonte: Programa PEC Formação Universitária Municípios – 2003
125
O Ambiente de aprendizagem off-line foi concebido enquanto espaço
midiático-interativo, com “sala-ambiente de estudos, destinada às sessões de
suporte para trabalhos em pequenos grupos ou individuais” (PEC – FORMAÇÃO
UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003, p. 23).
Para a sala-ambiente, o Programa prescreveu a necessidade de que
contivesse uma minibiblioteca com o acervo das referências bibliográficas do
Programa – PEC Formação Universitária Municípios, junto aos equipamentos de
apoio.
O documento ressaltou, conforme determinam os pressupostos de sua
concepção de interação midiática, que a sala-ambiente também deveria estar
equipada para a realização de atividades em grupo, para a promoção das
Memórias e das produções de textos.
Segue, conforme apresenta o documento, uma foto que ilustra a sala-
ambiente de aprendizagem off-line.
FOTO 3 FOTO ILUSTRATIVA DO AMBIENTE DE APRENDIZAGEM OFF-LINE
126
Fonte: Programa PEC Formação Universitária Municípios – 2003
No sentido de garantir a transmissão dos programas midiáticos-interativos,
foram construídas “salas de geração de videoconferência, constituindo-se de um
pequeno estúdio [...] com equipamento de videoconferência, um televisor de 33”,
câmera documental, videocassete, computador multimídia e pódio integrador de
mídia e sistema de som” (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003, p.
24).
Segue uma foto ilustrativa, conforme indicação no documento do
Programa, da sala de geração das videoconferências.
FOTO 4 FOTO ILUSTRATIVA DA SALA DE GERAÇÃO
127
Fonte: Programa PEC Formação Universitária Municípios – 2003
4.8 INSTITUIÇÕES PARTICIPANTES NA EXECUÇÃO DO PROGRAMA
As instituições partícipes do Programa foram responsáveis pelo
detalhamento e desenvolvimento da proposta de formação, sendo denominadas
no documento do PEC – Formação Universitária Municípios como equipe
pedagógica.
As instituições que compuseram a equipe pedagógica, conforme indica o
documento foram: Universidade Estadual de São Paulo (USP), Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e a União Nacional dos Dirigentes
Municipais de Educação – seccional São Paulo (UNDIME).
128
Para a execução pedagógica, o Programa prescreveu às instituições
partícipes, a criação de uma instância articuladora entre os atores envolvidos no
processo, por meio de um “Comitê Gestor, coordenado pelo FDE e com a
participação de representantes da UNDIME e das Universidades” (PEC –
FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003, p. 25) com as seguintes
atribuições institucionais:
UNDIME – a participação no processo de acompanhamento do projeto
final do Programa em conjunto com as Universidades, a partir, “da Proposta
Básica do Programa, projeto este que contém as diretrizes gerais que serviram de
referência ao desenvolvimento do projeto final, [...] os eixos temáticos e
ementários, [...] as estratégias e a metodologia de funcionamento” (PEC –
FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003, p. 25).
UNIVERSIDADES – atender aos detalhes pedagógicos, conforme
indicado no documento “do projeto final desenvolvido para a primeira edição do
Programa (edição especial) com as adaptações que se fizerem necessárias [...], e
que envolveu o desenvolvimento do conteúdo, as estratégias e metodologias
adotadas” (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003, p. 25);
elaboração de material pedagógico e a responsabilidade pela docência,
supervisão, avaliação e certificação dos participantes.
Na ilustração abaixo, vemos o desenho institucional do Programa,
conforme se apresenta no documento:
FIGURA 2 DESENHO INSTITUCIONAL DO PROGRAMA PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS
129
Coordenação geral:- do planejamento - da integração das equipes - da sintonia conteúdo proposta dos eixos
temáticos da proposta básica; - da produção dos materiais de apoio; - da logística.
UNDIME: - Acompanhamento do
desenvolvimento da proposta básica do programa;
- Acompanhamento da metodologia e estratégias de funcionamento do programa.
UNIVERSIDADES- Detalhamento pedagógico do
conteúdo, das estratégias e metodologias;
- Definição de equipes e elaboração de materiais;
- Docência, avaliação e certificação.
Fonte: Programa de Educação Continuada / PEC – Formação Universitária Municípios, 2003.
As funções previstas pelo Programa para os responsáveis pelas ações
pedagógicas, assumiram perfis coerentes com seus objetivos, identificados no
documento (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003, p. 27).
A seguir apresentar-se-ão sinteticamente estas funções, no intuito de dar
visibilidade às mesmas:
Coordenação Acadêmica:
Responsável pelo trâmite interno do Programa, constituindo-se de um
Coordenador Geral e três vices-Coordenadores, integrantes do Comitê Gestor.
Docentes:
Professores das Universidades e/ou de Instituições de Ensino Superior,
com títulos de Mestres ou Doutores. Coube a eles a autoria dos módulos,
130
cumprindo-lhes ministrar videoconferências e trabalhar de forma integrada com os
assistentes e tutores.
Professores-assistentes:
Indicados pelos docentes das Universidades podendo ser mestrandos,
Mestres ou Doutores, sem necessariamente ter vínculos com as Universidades
partícipes, mas supervisionados por um docente das Universidades. Coube-lhes
interagir com os alunos em atividades articuladas nas videoconferências, sem
contato presencial com os mesmos, trabalhando simultaneamente em Programas
por circuito.
O Programa ressalvou que cada videoconferência ministrada pelo
Professor-assistente deveria ser “destinada a grupos de 160 a 200 alunos-
professores, subdivididos em turmas de cerca de 40 alunos” (PEC – FORMAÇÃO
UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003, p. 26).
Tutores:
Graduados e selecionados pelas Universidades, devendo fazer parte do
quadro das Universidades e/ou Instituições de Ensino Superior, e ser
supervisionados pelos docentes. Deveriam possuir experiência de atuação na
rede, e acompanhar todas as atividades dos alunos, encaminhando relatórios
bimestrais das turmas. O Programa indicou o número de 01 tutor para cada turma
(PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003, p. 27).
Orientadores Acadêmicos:
131
Professores das Universidades e/ou Instituições de Ensino Superior, com
títulos de Mestres ou Doutores. Sua função foi de acompanhamento de grupo de
alunos, com o número de 40 para cada Orientador, sendo responsáveis pelas
leituras das Memórias, pelos suportes nas elaborações de TCCs e pela
centralização dos dados das avaliações dos alunos-professores. Suas relações
com os alunos poderiam ser presenciais ou virtuais, por videoconferência ou
internet. O Programa prescreveu 01 orientador acadêmico para cada grupo de 40
alunos (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003, p. 24).
4.9 ORGANIZAÇÃO CURRICULAR: UNIDADES TEMÁTICAS
TRANSVERSAIS
O Anexo I do Programa (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA
MUNICÍPIOS/EMENTÁRIO, 2003) apresentou um ementário como referência, que
sintetiza a organização curricular seqüenciada de conteúdos distribuídos em
Módulos, Temas e Unidades. Há no documento a descrição de cada módulo com
textos de introdução, o recorte conceitual com os respectivos conteúdos, temas,
unidades e ementário de considerações acerca da orientação filosófico-
pedagógica do Programa.
Nesta organização curricular, duas temáticas transversais permearam os conteúdos e as
atividades pedagógicas: Políticas Públicas Educacionais e Possibilidades Tecnológicas
Educacionais.
Em relação às Políticas Públicas Educacionais, do ponto de vista dos
princípios educacionais, o Programa relacionou a orientação filosófico-pedagógica
ao direcionamento político-institucional das instituições partícipes e do próprio
132
Estado. Neste caso, às políticas educacionais do Estado de São Paulo47. Tal
direcionamento, não obstante as preocupações com a reflexão dos alunos-
professores assinalada no documento do Programa quanto à realidade
educacional do País, do Estado e dos Municípios, conclamou-os a, através das
discussões geradas nos módulos, contribuir para implementar medidas que
objetivassem melhorar a qualidade de ensino e à redução da seletividade,
considerando “[...] as possibilidades efetivas e imediatas de ação, levando em
conta o contexto educacional [...] responsabilidade da qual nenhum profissional
comprometido com a educação pública deste País pode se eximir” (PEC –
FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS/EMENTÁRIO, 2003, p. 3).
A temática transversal das políticas públicas se fez presente no Módulo 2
da organização curricular, intitulado “Formação para a docência escolar: cenário
político-educacional atual, conteúdo e didática das áreas curriculares” (PEC –
FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS/EMENTÁRIO, 2003, p. 9), com a
carga horária de 1.252 horas. Para sua consecução, tomou como referência que
os conhecimentos são construídos em processos sociais relativos às diferentes
áreas, fundamentais às ações e decisões educacionais.
Desta forma, o Programa concebeu a organização curricular como ação
propiciadora de apropriação de conceitos pelos alunos-professores, no sentido de
que devam “se apropriar mais efetivamente dos conteúdos das diferentes áreas
curriculares para quem possam pensar com mais autonomia e adequação no seu
ensino/aprendizagem” (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS/ EMENTÁRIO, 2003,
p.9).
47 Uma das unidades temáticas diz respeito à reforma educacional brasileira e às políticas educacionais do Estado de São Paulo (PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS, 2003).
133
O quadro a seguir, representa de que forma o tema transversal das
políticas públicas permeou o desenho curricular, conforme se apresenta no
documento.
QUADRO 5 ESTRUTURA CURRICULAR DO PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS RELACIONADA AOS CONTEÚDOS DE POLÍTICAS PÚBLICAS
MÓDULO 2 – PROGRAMA
TEMAS UNIDADES .. EMENTAS
1.1 Revolução tecnológica e currículo
O cenário das mudanças sociais na nova sociedade da informação e os conseqüentes questionamentos realizados ao lugar social da Educação. Trata-se de problematizar as novas formas de difusão sistemática do conhecimento com a explosão da tecnologia da informação. - A construção deste cenário sociopolítico e econômico permitira introduzir o estudo das diferentes respostas de diversos sistemas escolares, concretizados nas chamadas reformas educacionais, e das curriculares para Educação Básica. - Educação Infantil: pressões para a escolarização precoce.
1.2 Diferentes contextos e tendências das reformas educacionais
- As principais tendências das novas políticas educacionais em diversos países (Espanha, Portugal, Chile, Argentina, México, entre outros), das conseqüentes reformas de sistemas educacionais e suas implicações nas proposições curriculares para creches, pré-escolas e escolas. É importante problematizar uma das idéias hegemônicas de desenvolvimento, que supõe ser a Educação o eixo motor de um processo de transformação produtiva com equidade. Outro aspecto relevante é a tentativa da elaboração de um currículo tradicional, que rompa com o isolamento da escola em relação às sociedades nas quais está inserida. - A reorganização das redes Estadual e Municipal de ensino e o processo de municipalização como parte da descentralização e do fortalecimento da autonomia das instituições educacionais, que é um forte traço das reformas educacionais do final do século XX. - políticas públicas para a Educação Infantil no Brasil e em outros países. Metas de qualidade. O embate entre a educação e a assistência nas discussões em Educação Infantil.
1.3 A reforma educacional em curso no país e a organização curricular: diretrizes, RCNEI, PCN e projetos alternativos
Análise das principais medidas políticas relativas ás mudanças curriculares, sobretudo os parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental, os Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil e a Indicação do Conselho Estadual da Educação de São Paulo n. 08/2001 – que dispõe a respeito das diretrizes curriculares para o Ensino Fundamental no sistema de ensino do Estado de São Paulo. Espera-se que, com essa análise, o aluno-professor possa identificar e contextualizar a proposta de organização curricular no âmbito da reforma educacional em curso no país. - A legislação para a Educação Infantil. Trata-se de conhecer os avanços na regulamentação deste nível de ensino, identificando os desafios para o alcance das propostas. - Financiamento da educação Infantil.
1. Reformas educacionais e mudanças curriculares (C. horária: 144 h)
1.4 O PNLD e a política estadual do livro didático
- análise do uso que os alunos-professores fazem do livro didático e introdução da discussão sobre os critérios de avaliação utilizados pelo PNLD – que será aprofundada nos temas 4,5,6 e 7 -, visando a uma maior autonomia de escolha e análise pelo professor. Os princípios e a organização do processo de escolha do livro didático na rede publica do Estado de São Paulo: a autonomia das escolas, a participação dos professores, a proposta dos Módulos que agrupam os livros de ficção e não-ficção, a feira virtual desenvolvida pelo SEE. Os impactos da avaliação de livro didático no mercado editorial e nas escolhas dos professores, associados às propostas de mudança curricular, deverão ser tematizados, como forma de contextualizar a discussão e permitir a síntese dos conteúdos trabalhados neste Tema.
Fonte: Programa de Educação Continuada / PEC – Formação Universitária Municípios/Ementário, 2003.
134
Junto à temática transversal das políticas públicas, o Programa ressaltou a
temática das novas possibilidades tecnológicas, com seus significados e impactos
na realidade educacional. Neste sentido, propôs a democratização do acesso às
novas tecnologias nas atividades curriculares e nas atividades de suporte,
consideradas desafiadoras à escola pública atual, de sua estrutura funcional à
gestão.
O Programa problematizou o papel do professor diante das modificações
tecnológicas contemporâneas, chamando atenção aos desafios por eles
enfrentados como profissionais agentes do processo educacional, evitando o que
o documento denominou de “modismos tecnológico-revolucionários que, por
vezes, se expressam numa visão de eficácia da educação escolar como única
‘redentora’ das desigualdades do nosso contexto social” (PEC – FORMAÇÃO
UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS/EMENTÁRIO, 2003, p. 4).
Ao fazer incursões acerca das possibilidades tecnológicas educacionais e
seus impactos, o Programa propôs aos professores o seu uso experimental, de
forma reflexiva incorporando-as ao ambiente educacional, contemplando uma das
finalidades da formação dos alunos-professores previstas no documento: “refletir
e sistematizar sua experiência com o uso das mídias interativas e de
comunicação ao longo do PEC – Formação Universitária Municípios, no sentido
de tornar-se mais autônomo na gestão de sua própria formação” (PEC –
FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS/EMENTÁRIO, 2003, p. 04).
O quadro a seguir, representa de que forma o tema transversal das
possibilidades educacionais esteve presente no desenho curricular, conforme se
infere do exame do Módulo Introdutório do Programa:
135
QUADRO 6 ESTRUTURA CURRICULAR DO PEC – FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA MUNICÍPIOS RELACIONADA AOS CONTEÚDOS DE POSSIBILIDADES TECNOLÓGICAS
MÓDULO INTRODUTÓRIO TEMAS UNIDADES
1.1 Windows 98 – principais características do ambiente 1.2 Criação de arquivos.
1. Conceitos Básicos de Informática (c. horária: 8 h)
1.3 Painel de controle – windows explorer / gerenciamento básico de arquivos e pastas
2. Recursos para formatação básica de um texto (c. horária: 12 h)
2.1 Word 2000 básico – apresentação de telas, ajuda, formatações básicas, mover e copiar textos, localizar e substituir palavras, corretor ortográfico, bordas e sombreamento, tabela etc. 3.1 Principais conceitos e serviços. 3.2 Navegação e uso do browser 3.3 Mecanismos de busca 3.4 Recursos de pesquisa
3. Internet (c. horária: 12 h)
3.5 Conceitos de correio eletrônico e download 4. Learningspace (c. horária: 8 h)
4.1 Principais características do ambiente de aprendizagem do trabalho monitorado On-line
1.4 Prometeus (c. horária: 4 h)
5.1 Navegação e exploração dos recursos da ferramenta: de comunicação e interação e de pesquisa e inserção de conteúdos.
Fonte: Programa de Educação Continuada / PEC – Formação Universitária Municípios/Ementário, 2003.
A etapa seguinte do Programa apresentou detalhadamente o ementário
das disciplinas do Programa PEC – Formação Universitária Municípios. Esta
pesquisa, não procedeu a sua análise, haja vista não ter sido concebido como
objeto do presente trabalho, o referido procedimento, de vez que não se constitui
em trabalho de campo.
Cumpre destacar que a metodologia que orientou o presente trabalho,
apresentada em sua introdução, não pretendeu desenvolver um trabalho de
campo, contrapondo-se o ementário das disciplinas com sua implementação
prática no decorrer do curso, de vez que para que fosse possível efetivar a
referida tarefa seria necessário fazer contatos com os alunos-professores, etapa
136
não realizada por esta pesquisadora, tendo em vista o tempo-limite para
apresentação deste trabalho de pesquisa.
Ressalvado estes esclarecimentos, passaremos à etapa seguinte em que
serão apresentadas as Considerações Finais desta pesquisa, e na qual serão
apresentadas de forma que se pretende lúcida e comprometida com a realidade,
as análises desta pesquisadora em relação ao documento apresentado neste
capítulo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As considerações apresentadas a seguir são resultantes do processo que
desencadeou o desenvolvimento desta dissertação de mestrado. O objetivo inicial
que a suscitou, relacionado às questões da formação profissional de professores
de Educação Infantil, tendo como foco compreender como se deu a
implementação do programa PEC – Formação Universitária Municípios no estado
de São Paulo, foi alcançado. Para se percorrer esse processo necessitou-se
absorver um conhecimento que subsidiou a elaboração deste material, o qual se
considerou de grande importância na formação desta pesquisadora. Esse aporte
teórico imprimiu um “olhar” mais crítico à realidade social, especialmente em
relação à Educação Infantil e à formação profissional dos professores que atuam
nesse nível educacional.
Essa apreensão não se deu de forma tranqüila e natural, mas foi produzida
por intermédio de um processo conflituoso de apropriação da realidade material,
intermediada pelos percalços da vida real, por meio de contradições, negações e
137
materializações do trabalho intelectual, mediado pela própria realidade material.
Neste sentido, considera-se importante ressaltar que algumas pretensões iniciais
não foram concretizadas, a exemplo a pesquisa de campo sugerida no decorrer
da qualificação com os alunos-professores do programa PEC – Formação
Universitária Município, haja vista o limite de tempo e as dificuldades no processo
para sua realização.
No que respeita às demais pretensões desta pesquisa, alcançou seus
objetivos, em particular os derivados e desencadeados pelo objetivo inicial, os
quais buscaram empreender os estudos que possibilitaram a produção dos
capítulos presentes nesta dissertação. Cabe ainda ressaltar que o exame do
Programa PEC – Formação Universitária Municípios possibilitou uma nova visão a
esta pesquisadora, uma vez que o mesmo permitiu desvelar os reais interesses
que permeiam as atuais formações continuadas de professores, mormente as
formações em exercício, tais como a do Programa em questão.
A esse respeito, pode-se dizer que as questões formuladas no início do
trabalho (Por que um curso com duração de dois anos, para profissionais que
necessitam de tanta formação? Por que um curso de formação de professores –
Normal Superior – separado dos cursos de formação superior - dos cursos de
pedagogia? Por que um curso de formação de professores por meio de
videoconferências e teleconferências?) foram esclarecidas, suscitando o
surgimento de outras, as quais serão objeto de novos estudos.
No que respeita às questões enumeradas acima, algumas considerações
são pertinentes. A primeira questão – por que um curso com duração de dois
anos, para profissionais que necessitam de tanta formação? – pôde ser
138
respondida tomando-se por base o que estabelece a Constituição de 1988 e
posterior análise da nova LDB (LDB 9394/96) que dispõe sobre a formação dos
professores que atuam nos diferentes níveis de ensino, neste caso em particular
na Educação Infantil, observando-se as disposições das organizações
internacionais representadas pelo Banco Mundial quanto aos princípios que
devem reger a educação dos “paises em desenvolvimento”. Antes de expor o que
tratam a LDB e a CF/88 fez-se, no capítulo II, uma breve consideração acerca do
histórico da Educação Infantil no Brasil.
No Brasil a Educação Infantil teve em sua gênese a herança de
pensadores europeus considerados precursores dos estudos na área. O próprio
aparecimento da pré-escola no Brasil se deu sob as bases da herança dos
precursores europeus, que inauguraram uma tradição na forma de pensar e
apresentar proposições para a educação da criança nos “jardins de infância”,
diferenciadas das proposições dos modelos escolares. Assim, a Educação Infantil
foi oferecida para complementar à ação da família e com objetivos de
proporcionar condições adequadas de desenvolvimento físico, emocional,
cognitivo e social da criança.
No decorrer desse processo, o Estado procurou imprimir uma tendência
assistencialista e paternalista à proteção da infância brasileira, haja vista que o
atendimento de suas demandas não se constituiu em direito, emanado da
condição de cidadania plena, mas como uma espécie de favor, propugnando
princípios de boa vontade aos voluntários recrutados à missão de ensinar, sem
preocupação com políticas de formação de professores.
139
A partir dessa tendência, nas décadas de 60 e 70, as políticas assistenciais
- filantrópicas à Educação Infantil passaram a se fundamentar no pressuposto da
compensação às crianças oriundas das famílias de baixa renda, na perspectiva
da expansão de projetos de educação “pré-escolar” de massa, orientados pelas
políticas compensatórias delineadas pela UNICEF e UNESCO. Esses organismos
utilizaram-se desses mecanismos compensatórios, ofertados como instrumentos
de superação às carências decorrentes das condições de vida dessas crianças e
de suas famílias, como alternativa para superação das deficiências de
aprendizagem.
Depreende-se que nesse período a política do Estado para a Educação
Infantil assentava-se no atendimento à infância no interior de uma rede
sobreposta de ações, de maneira indefinida, ora sob o viés da saúde, ora do bem
estar da família e ora sob a tutela educacional. O problema da infância, tratado de
forma fragmentada e isolada, apresentava-se nos discursos do Estado como
causa e não como conseqüência dos problemas sociais, deslocando-se o
problema para a criança e sua família, retirando-o da estrutura da sociedade de
classes.
No que respeita à formação de professores e à atuação docente, verifica-
se que na década de 60 não houve qualquer exigência para atuação profissional
do professor da chamada educação “pré-primária” (creches, escolas maternais e
jardins de infância), denotando-se um descaso do Estado em relação a esse nível
de ensino, assim como à formação profissional “pré-primária”. A orientação estatal
era omissa em relação a esse ensino, daí considerar que o mesmo poderia ser
oferecido por empresas, igrejas e outras entidades da sociedade civil, podendo
140
ser desempenhado por qualquer pessoa, geralmente mulheres voluntárias numa
perspectiva assistencialista.
Em relação à formação profissional da Educação Infantil, na década de 70,
o Estado estabeleceu em lei (Lei 5692/71, art. 30) a formação mínima para o
exercício do magistério de 1o e 2o graus. Entretanto, somente a partir de 1974
houve a inclusão da oferta de habilitação de ensino “pré-escolar” nos cursos de
formação de professores. Apesar dessa inclusão e do atendimento ofertado,
manteve-se o caráter compensatório da década anterior, atribuído à Educação
Infantil e à formação de seus profissionais.
Na década de 80 o Estado manteve a Educação Infantil sob as mesmas
práticas assistencialistas e compensatórias, buscando suprir com baixos custos
as carências sociais e culturais das famílias de baixa renda, preparando as
crianças por meio de uma escolaridade obrigatória, porém sem objetivos de
permanência e de continuidade em outros níveis de ensino. Em relação à
formação dos professores, foram mantidos os princípios compensatórios e
assistencialistas, associados à promoção de programas do governo federal,
mediante políticas de redução de custos, atendimentos de massa e inculcação
ideológica.
Tomando-se por base o histórico da Educação Infantil no Brasil e o papel
do Estado, percebe-se que sua preocupação com a formação de professores se
instituiu legalmente a partir da década de 90 com a LDB 9394/96, respondendo
em parte os objetivos deste estudo quanto à necessidade de elaboração de
políticas de formação superior como a preconizada pelo PEC – Formação
Universitária Municípios. No sentido de analisar a sustentação legal desta
141
questão, no Capítulo III abordou-se a legislação nacional quanto à relação entre
Educação Infantil e formação profissional docente.
Nesse capítulo, fizeram-se algumas considerações acerca da legislação
educacional no Brasil (Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei
4024/61, Lei 5692/71, Lei 9394/96; Constituição Federal de 1988 – CF/88 e o
Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil – RCNEI), em que se
objetivou verificar o processo de constituição do atendimento à Educação Infantil
e, por conseguinte, como esses ordenamentos se referem aos profissionais desse
nível de educação. Este capítulo auxiliou a elucidar uma das questões enunciadas
no início do trabalho, a qual intenta compreender por que um curso de formação
de professores – Normal Superior – separado dos cursos de formação superior.
A esse respeito pôde-se compreender que o atendimento às crianças de 0
a 6 anos de idade somente passou a fazer parte das obrigações do sistema
educacional, vigorando nas leis brasileiras, a partir da promulgação da
Constituição de 1988. Esta Constituição determinou, em seu artigo 208, que o
dever do Estado com a educação e especificamente com a Educação Infantil
seria efetivado mediante a garantia de atendimento em creches e pré-escolas às
crianças de 0 a 6 anos (BRASIL, CF/88, art. 208, IV). Apesar desta determinação,
a recomendação legal pouco mobilizou os sistemas de ensino a buscarem órgãos
ligados à área da assistência social com o intuito de garantir o disposto no artigo
supracitado.
Essa situação passou a ser contornada com a publicação da LDB em 1996,
que em seu artigo 29 decreta: “A Educação Infantil, primeira etapa da educação
básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos
142
de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social,
complementando a ação da família e da comunidade” (BRASIL, LDB 9394/96, art.
29). A LDB, dessa forma passou a incorporar os sistemas de ensino, detendo a
total responsabilidade pela Educação Infantil.
Outra determinação da LDB foi o estabelecimento da autonomia dos
sistemas estaduais e municipais de ensino, bem como das responsabilidades de
cada um deles. Nesse contexto, a Educação Infantil ficou a cargo da esfera
municipal e à esfera federal restou a responsabilidade de definir as diretrizes para
a educação em colaboração com os estados e os municípios.
A LDB, ao incluir a faixa de 0 a 6 anos no capítulo que dispõe sobre a
educação básica, preconizou o não assistencialismo ao atendimento dessas
crianças, vinculando a pré-escola às secretarias de educação, retirando do bem
estar social tal responsabilidade. Esta prerrogativa legal gerou, dessa forma, a
necessidade de se ter profissionais com formação específica na área de
Educação Infantil, em detrimento dos profissionais sem habilitação que atuavam
no âmbito do trabalho assistencialista.
Com a promulgação das leis acima referidas observa-se a obrigatoriedade
do Estado em oferecer instituições para essa faixa etária, desvelando-se assim a
necessidade premente de reformas institucionais e de formação dos profissionais
que atuam na Educação Infantil.
Do ponto vista institucional, verifica-se que a formação desse profissional
passou a ser discutida em âmbito nacional e com maior ênfase após a
promulgação da lei 9394/96 que trata da formação básica dos professores da
143
Educação Infantil, deliberando que “[...] somente serão admitidos professores
habilitados em nível superior ou formados por treinamento em serviço” (BRASIL,
LDB 9394/96, art. 87, § 4°). Considerando que o aludido artigo fazia parte das
disposições transitórias, o governo federal editou o Decreto N. 3276/99 dispondo
sobre a formação dos professores da Educação Infantil e dos anos iniciais do
Ensino Fundamental. Diante de uma forte pressão dos profissionais de educação
que contestaram o caráter de “exclusividade” da formação em cursos normais
superiores, o governo editou um novo decreto (BRASIL, DECRETO N.
3554/2000) no qual substituiu a palavra “exclusivamente” por “preferencialmente”,
possibilitando a formação no nível superior da Pedagogia em Licenciatura Plena.
Percebe-se que a LDB além de atender as recomendações dos
organismos internacionais, a exemplo do Banco Mundial (WORLD BANK, 2003),
possibilitou o aligeiramento da formação de professores nesses níveis, assim
como regulamentou a redução de custos para tais níveis de ensino. A esse
respeito, a mesma LDB, em seu título VI – Dos Profissionais da Educação – (art.
62, 63) dispõe sobre a formação destes docentes nas Universidades e Institutos
Superiores de Educação, inclusive mediante o curso normal superior, a realizar a
capacitação dos professores em exercício, utilizando-se para isso de recursos da
educação à distância.
Assim surgiram os cursos normais superiores deliberados pela LDB, tal
qual o Programa PEC – Formação Universitária Municípios, os quais, com uma
carga horária reduzida de dois anos e um discurso ideológico de valorização e
profissionalização do magistério, submetem-se às políticas neoliberais impostas
pelos organismos internacionais, retirando dos professores a formação
144
universitária com profunda reflexão sobre os processos educativos e substituindo
por uma formação técnico-profissionalizante aligeirada, sem espaço para a
reflexão crítica da realidade social, reduzindo o papel desse profissional à mera
execução de tarefas pedagógicas, restrito à concepção do “aprender a aprender”,
“aprender a fazer” e “aprender a ser”.
Um exemplo das questões assinaladas acima pode ser comprovado nas
atividades desenvolvidas no PEC – Formação Universitária Municípios, após
realização de videoconferência chamada “Escola e Sociedade da Informação e do
Conhecimento” a qual propõe na atividade 1 que os alunos-professores discutam
em grupos e construam cartazes sobre as mesmas. O teor das questões reflete a
reprodução do texto lido o qual enfatiza que a sociedade do conhecimento reitera
o novo paradigma educacional que entende o conhecimento como uma
apropriação individual que se constrói em cada pessoa à custa de informações,
mas, sobretudo, de experiências, vivências reais que se articulam aos elementos
de informação, em que o aprender fica no centro das preocupações e a
aprendizagem ganha novo significado. Nesse sentido, a escola tem o papel
importante a desempenhar como transmissora de informações, apropriadas e
selecionadas individualmente pelo educando a fim de que tornem o conhecimento
produtivo48.
A LDB N. 9394/96 procurou incorporar, ainda que parcialmente, algumas
reivindicações dos educadores, dentre as quais a disposição sobre a atuação dos 48 Para fins de esclarecimento: o exemplo identificado do texto é proveniente de um material adquirido por esta pesquisadora no final da realização deste trabalho. Como anunciado no início da dissertação, em função das dificuldades na coleta de material, não se objetivou desenvolver uma leitura crítica do material didático trabalhado no PEC – Formação Universitária Municípios com os alunos-professores, contudo considerou-se importante comentar um dos textos que se teve acesso, uma vez que este, à semelhança de outros quatro lidos por esta pesquisadora, representam, de modo fiel, o objetivo ideológico do Programa em questão.
145
profissionais da Educação Infantil como docentes, porém estas foram adequadas
segundo os interesses do Estado neoliberal, cuja principal característica se
assenta na redução do papel do Estado no provimento de suas funções sociais,
dentre as quais às relacionadas à educação, o que se verificou no abismo entre a
forma como a Educação Infantil é trabalhada e como está proclamada nas leis,
notadamente ao papel do Estado quanto a sua manutenção.
A partir da década de 90, a política educacional foi desenvolvida no Brasil,
com base nas diretrizes traçadas pela política do Banco Mundial para os “países
em desenvolvimento”. O Relatório Delors (1996), elaborado para a UNESCO pela
Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI, apontou as premissas
sobre os procedimentos dos processos educacionais, partindo do princípio de que
seria mais importante adquirir a capacidade de adaptação às mudanças no
sistema produtivo, do que o conhecimento produzido histórica e socialmente,
deduzindo-se que a importância do papel da educação no capitalismo
contemporâneo seria limitada às expectativas do trabalhador quanto à
socialização do conhecimento, que por sua vez deveria ser um conhecimento
técnico, inteiramente voltado para a formação técnica-profissional. Dessa forma, o
processo histórico de reformas, vivenciado pela educação brasileira, tomando-se
por bases essas recomendações, encontrava sua expressão maior em uma
opção que é de cunho neoliberal.
A legislação educacional no Brasil com base nas recomendações do
Relatório Delors (1996) e da LDB 9394/96 passou a delegar ao Estado a função
de coordenação de políticas educacionais e não de execução, como determinava
a Constituição de 1988. O Estado nessa conjuntura, defensor de uma política
146
neoliberal e orientado por organismos internacionais, desobriga-se da educação,
descentralizando suas responsabilidades. É neste contexto que a formação
modular à distância, com ampla utilização da mídia e de novas tecnologias,
emerge e norteia as políticas para formação de professores da Educação Infantil
no Brasil, a exemplo do Programa examinado neste estudo.
Esta política se configura como uma nova concepção de formação que
surge no cenário nacional, em decorrência da adoção de um novo paradigma, o
do conhecimento como informação, conforme os pressupostos neoliberais em
vigor. A suposta exigência de que os profissionais dessa área da educação
deveriam ter o nível superior até 2007, caso contrário perderiam o emprego,
constituiu-se em uma das principais justificativas para implementação de
programas especiais que possibilitassem o ingresso de tais profissionais no
ensino superior, como exemplo o Programa PEC – Formação Universitária
Municípios, objeto de estudo desta pesquisa, que trouxe como resultado, à
semelhança do que consideram alguns autores discutidos no trabalho, o
fortalecimento de uma concepção de formação superior pautada na separação
entre o ensino acadêmico-científico, fundada na articulação entre ensino-
pesquisa-extensão, e o ensino propedêutico-tecnicista de uma “universidade de
ensino”.
O PEC – Formação Universitária Municípios interpõe o modelo tecnicista
destinado aos alunos-professores com uma proposta de formação que se
configura como treino técnico-profissional destes educadores, com base em uma
perspectiva pragmática, reprodutivista e produtivista, valendo-se de sua
fundamentação em um modelo econômico gerado pela nova ordem mundial.
147
Tomando-se por base este referencial, procurou-se dar conta da terceira questão
norteadora deste estudo: Por que um curso de formação de professores por meio
de videoconferências e teleconferências?
Esta questão pôde ser parcialmente compreendida a partir do exame da
questão anterior, a qual entende que a formação orientada por um modelo de
educação básica tem seu alicerce calcado nas orientações do Banco Mundial que
entre outras recomendações enfatiza a “formação em exercício” e a “educação à
distância”, em detrimento da formação inicial e em termos de modalidades
presenciais. Essa ênfase indica que esse tipo de capacitação possibilita a
massificação da formação dos profissionais da educação com menos custos ao
Estado, tendo em vista a melhoria da qualidade da educação por meio de uma
educação com fins instrumentais. As modalidades à distância são consideradas
mais efetivas em termos de custos do que as modalidades presenciais, daí as
orientações para os “países em desenvolvimento”, a exemplo o Brasil.
O discurso do Banco Mundial chega a apelar ao embuste de que o sujeito
mais bem educado terá melhores oportunidades no mercado de trabalho e se
utiliza, para defender suas propostas, de estratégias informacionais e midiáticas
estabelecidas por mídias interativas, na perspectiva da educação à distância.
Certamente, concorda-se que a educação pode possibilitar melhores condições
de produtividade e de inserção no mercado de trabalho com o uso desses
recursos, entretanto, nada se pode dizer de que tais condições sejam suficientes
para esse fim, haja vista que o capital é por essência excludente, resultando disso
que o trabalhador estará continuamente concorrendo com outros para obtenção
de vagas nos postos de trabalho, e o salário torna-se um fator de negociação para
148
esse fim.
No Capítulo IV, ao se descrever o documento norteador do Programa PEC
– Formação Universitária Municípios, verificou-se que o Programa privilegiou o
uso de tecnologias avançadas de comunicação e informação como suporte
adequado às estratégias pedagógicas de ensino, como forma de promover uma
educação de “qualidade”, voltada à valorização do profissional e à formação do
magistério público municipal. Seus princípios, com o uso desses recursos, visam
à apreensão e o domínio de competências compatíveis com uma formação de
qualidade, entretanto, do ponto de vista do exame do material ao qual se teve
acesso, percebeu-se seu caráter instrumental, orientando os alunos-professores a
seguirem um modelo curricular baseado na relação entre vivências educadoras e
o contexto escolar, associado aos princípios teóricos e ideológicos do projeto de
educação neoliberal que orientam atualmente a reforma da Educação Básica do
país.
Percebe-se, ainda, no exame dos princípios norteadores do Programa, que
o mesmo pautou-se nos documentos legais, referências na discussão curricular
brasileira, tais como: as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino
Fundamental, o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil e os
Parâmetros Curriculares Nacionais. Estas diretrizes legais assentam-se na defesa
da descentralização dos sistemas que, ao padronizar e ao mesmo tempo adaptar
os desenhos curriculares às realidades locais, subordinam-se às premissas
básicas do Banco Mundial para a América Latina, em que se prioriza a educação
básica e cujo foco é a educação escolar restrita à aprendizagem de habilidades
cognitivas básicas.
149
As novas necessidades de aprendizagem apresentadas no Programa
sugerem a apreensão de habilidades práticas pautadas na ação e reprodução de
tarefas, as quais devem ser compartilhadas com outros, tomando-se por base a
construção de competências acionadas para a aquisição de atitudes desejáveis,
as quais devem ser trabalhadas pela educação a partir do desenvolvimento de
habilidades e da apropriação de conhecimentos. Tais competências devem ser
direcionadas ao ensino como processo educativo que tem função social,
propondo-se como “missão” à organização e orientação do processo de formação
e desenvolvimento dos alunos.
A sistemática curricular do PEC – Formação Universitária Municípios
baseou-se em competências de referência que nortearam o monitoramento e a
avaliação do Programa, a saber: a incorporação da tecnologia na aprendizagem,
o favorecimento dos alunos nas decisões, o estímulo à aprendizagem ativa e
participação em projetos, o favorecimento do tempo para o desenvolvimento
profissional dos professores e a participação da comunidade escolar em termos
de prestação de serviços e desenvolvimento de projetos.
Estas competências, incorporadas ao exercício de habilidades associadas
ao uso de recursos midiáticos e interativos, estão claramente identificadas no
Programa valendo-se do acionamento de habilidades necessárias para superação
de desafios, tomando por base os princípios do “aprender a aprender” que,
apesar do que apregoam os fundamentos do texto-base do Programa, acabam
por retirar dos alunos-professores o exercício da individualidade, da autonomia,
da liberdade e da criatividade. Pelo desenvolvimento padronizado das atividades
propostas aos alunos-professores, revigora-se o esvaziamento do trabalho
150
educativo escolar, transformando-o num processo sem conteúdo, centrado no
cotidiano imediato dos alunos-professores, voltado à satisfação de necessidades
imediatas e pragmáticas.
Dessa forma, o PEC – Formação Universitária Municípios desenvolveu, à
luz das competências adotadas, o princípio de que é mais importante o aluno
aprender a aplicação de técnicas no exercício da prática do que adquirir o
conhecimento científico já elaborado e sistematizado. Se oculta em seus códigos
uma concepção tecnicista na qual o aluno-professor só poderia adquirir o método
científico de investigação, por meio de uma atividade autônoma, à semelhança do
que sugeria a escola nova propugnada por Dewey no século passado, posto que,
a partir dos referenciais do Programa, é mais importante construir o método do
conhecimento do que o conhecimento em si.
O exercício das atividades indicadas no Programa PEC – Formação
Universitária, a partir do exame dos módulos apresentados no Capítulo IV,
reforçam a prioridade da técnica e da reflexão acrítica da realidade social, em
torno de pressupostos de aprendizagens que estimulam o “fazer”, a “ação”, a
“contextualização ahistórica”, a “resolução de problemas” e a “construção de
significados”. O aprender “as reformas educacionais e os fundamentos
psicopedagógicos”, bem como a “identificação dos conceitos de informática e dos
recursos”, são enfatizados em detrimento da “apreensão”, “compreensão”,
“análise crítica” dos problemas. As “sínteses” são estimuladas como avaliação do
produto, nas quais os alunos-professores fazem registros, escrevendo o que
aprenderam nas suas “emoções e descobertas”.
151
Após o exame do Programa PEC – Formação Universitária Municípios,
respondidas as questões norteadoras deste trabalho, depreende-se que este
Programa, à semelhança de outros realizados no país, constitui-se como “Curso
de Formação Superior” para profissionais da Educação Infantil, haja vista a
legislação que o ampara, entretanto, no que respeita a uma formação desejada
pelos profissionais que atuam nesse nível de ensino, o mesmo não representa a
formação ideal.
Compreende-se que um Programa pautado no “aprender a aprender”, na
repetição de tarefas, no tecnicismo, nos princípios da identificação de
competências e habilidades, que não percebem os alunos-professores na sua
reflexão crítica, que reproduz a lógica da alienação do trabalhador em relação à
análise crítica da realidade social, que é enfatizado sob a forma de atividades
semipresenciais e não-presenciais, não se constitui como avanço real à formação
profissional dos docentes que atuam na Educação Infantil no município de São
Paulo ou em qualquer outro município do país.
Apesar das discussões e participação dos segmentos ligados à educação e
à sociedade civil no processo de concepção do Programa em São Paulo, suas
linhas norteadoras foram determinadas pela ótica das diretrizes legais e
institucionais que, seguindo as orientações do Banco Mundial e da ordem
neoliberal, introjetaram na educação uma concepção mercadológica. Esta
concepção, obviamente articulada ou mesmo mediada pelas reformas
educacionais conduzidas pelo Estado neoliberal brasileiro nestes últimos dez
anos, ofereceu sustentação ideológica ao projeto que criou o curso normal
superior para a formação de professores da Educação Básica, à semelhança do
152
Programa PEC – Formação Universitária Municípios em questão.
Nesta proposta de formação, os alunos-professores são formados em um
curso de 3.300 horas, concluído em 24 meses, dos quais 1.616 correspondem às
atividades semipresenciais sob forma de atividades complementares, vivências
educadoras e oficinas culturais, e 1.684 horas desenvolvidos em Módulos
Interativos, considerando-se nestes as atividades de Teleconferências e
Videoconferências.
Levando-se em consideração às 1.616 horas de atividades semipresenciais
e as de Teleconferências e Videoconferências, deduz-se que o PEC – Formação
Universitária Municípios tem na sua estrutura pouco mais de 1.000 horas de
atividades presenciais nos dois anos de sua realização, assinalando que no
interior de suas características, as aulas seguem o sistema semipresencial, com o
uso de mídia e tecnologia moderna e o conteúdo totalmente apostilado; ou seja,
aligeiramento e modulação à distância, a exemplo dos cursos de educação à
distância não-presenciais.
Esse encaminhamento, bem como a distribuição de sua carga horária, tem
por base o princípio do aligeiramento da formação, pois ao invés de capitalizar a
experiência prática do aluno-professor desafiando-o a aprofundar a reflexão
crítica, entende que esta seja substituível pela vivência, desarticulando a teoria da
prática sob o falacioso argumento do “aprender a aprender”, baseado no princípio
de que “quem faz não precisa pensar o fazer”. Aliado a esse modelo, a retirada da
formação destes profissionais, como previsto no PEC – Formação Universitária
Municípios, dos espaços acadêmicos dos cursos de pedagogia nas universidades
também implicou na separação entre “formação profissional” e “formação
153
universitária”, impondo-se o PEC – Formação Universitária Municípios como
curso de “certificação” e “treinamento”, diferentemente de uma formação sólida e
consistente aos profissionais da Educação Infantil.
Nesse sentido, a proposta de formação prevista no PEC – Formação
Universitária Municípios em São Paulo, apresenta pouca exigência do nível de
formação dos alunos-professores e provoca o isolamento dos mesmos em
relação aos demais profissionais nas universidades em seus cursos de formação,
com conseqüências possíveis em seu ofício, tais como: preconceitos, baixos
salários, poucas expectativas de profissionalização e baixa identidade do
profissional.
As questões norteadoras deste trabalho e a busca por seus
esclarecimentos permitiram a esta pesquisadora entender que as novas
condições impostas pelo capital, especialmente àquelas que dizem respeito à
expansão da escolarização, o papel reduzido do Estado – Estado Mínimo, a
delegação de responsabilidades à sociedade civil no intuito de prover recursos
para expandir a educação e formar os seus profissionais, têm direcionado as
políticas públicas a promoverem a massificação e intensificação da formação dos
professores, valendo-se de um modelo técnico-profissional instrumental,
objetivando a regulação e o controle do trabalho docente.
Pode-se inferir com base no exame das questões que permeiam este
estudo que a formação dos professores, em especial a de Educação Infantil,
encontra-se comprometida pelo desenvolvimento de diretrizes legais que
privilegiam o aligeiramento e o rebaixamento da formação, valendo-se de cursos
com carga horária reduzida, privilegiando a formação descompromissada com a
154
pesquisa e com uma sólida formação crítico-política da realidade social,
deslocando a formação para instituições que privilegiam a avaliação de
desempenho e de competências vinculadas ao “saber fazer” e ao “como fazer”, ao
invés de uma educação em sua totalidade epistemológica.
Conclui-se que, a capacitação em exercício como a proposta pelo PEC –
Formação Universitária Municípios é uma estratégia paliativa de solução à má
formação inicial do sistema escolar existente. Uma contraproposta a esse modelo
de formação pode se fundar na formação efetivamente presencial, aproveitando-
se de profissionais qualificados e competentes da pedagogia no processo
formativo, posto que a formação presencial garante o domínio de conteúdos,
variável fundamental no desempenho docente. A formação em exercício,
enfaticamente semipresencial, além de reduzir o tempo de contato do professor
com o aluno, compromete as suas atividades docentes. Na verdade, não se está
defendendo uma formação presencial em detrimento da formação em exercício,
mas a complementaridade entre essas duas modalidades com objetivos de
melhoria na qualidade de educação e conseqüentemente a qualidade do
profissional docente em exercício.
Considera-se necessário, repensar as ações ultimamente implementadas
na Educação Infantil no intuito de retomar a luta historicamente assumida pelos
educadores em busca de uma formação profissional de qualidade para a infância
e aos profissionais que nela atuam, valorizando-se desta forma o magistério em
seu sentido mais pleno.
Conclui-se, portanto, que este trabalho possibilitou a esta pesquisadora
reflexões intensas, levando-a a repensar o seu próprio exercício profissional-
155
acadêmico. Faz-se necessário também informar que não se teve pretensão em
abordar a totalidade das questões que permeiam a discussão deste assunto,
intentando-se tão-somente, apontá-las como relacionais. Assim, espera-se que
esta pesquisa sirva de orientação para outros pesquisadores na área da
Educação Infantil e que a mesma, diferentemente de se tornar mais uma
produção nas prateleiras da academia, suscite novas discussões e novos debates
na área, inquietando alguns, em outros, despertando “novos olhares” em direção
a uma realidade mais crítica, social, política e educacional.
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