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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO CONTINUADA
CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM PODER LEGISLATIVO
O VETO E AS RELAÇÕES DE PODER ENTRE EXECUTIVO E LEGISLATIVO
Cássio Marques Viana
Maria Cristina da Silva Azevedo
Vanessa Aparecida Silva
BELO HORIZONTE
JULHO DE 2009PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO CONTINUADA
CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM PODER LEGISLATIVO
O VETO E AS RELAÇÕES DE PODER ENTRE EXECUTIVO E LEGISLATIVO
Monografia de conclusão de curso de especialização ministrado pelo Instituto de Educação Continuada da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, em parceria com a Escola do Legislativo da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, apresentada como requisito parcial para a obtenção do Título de Especialista em Poder Legislativo.
Orientadora: Profa. Natália de Miranda Freire.
Cássio Marques Viana
Maria Cristina da Silva Azevedo
Vanessa Aparecida Silva
BELO HORIZONTE
JULHO DE 2009
Agradecemos, sobretudo, a Deus, pelas oportunidades
que nos concede ao longo de nossa caminhada.
Agradecemos também à Assembleia Legislativa de
Minas Gerais e à Câmara Municipal de Camanducaia,
que nos proporcionaram o suporte necessário para a
conclusão do curso e a elaboração desta monografia.
“Uma instituição é como uma canção; não é formada
por sons individuais, mas pelas relações entre eles.”
(Peter Drucker)
RESUMO
Este trabalho faz um estudo do veto, sua evolução histórica e características,
objetivando identificar quais fatores concorrem para possibilitar sua ocorrência. Partimos do
princípio de que o veto é parte do processo legislativo, no qual os Poderes Executivo e
Legislativo são protagonistas e se relacionam. A qualidade dessa relação influencia a
atividade legislativa como um todo, possibilitando, com isso, que, além dos fatores endógenos
ao processo legislativo, também fatores exógenos possam influenciá-lo. O universo de análise
é composto pelos vetos apresentados pelo Governador Aécio Neves no período de 2003-2006.
São observadas algumas variáveis, divididas em dois grupos: no primeiro estão aquelas
ligadas diretamente aos projetos e seus respectivos processos de tramitação, e no segundo
estão as referentes ao contexto político e às relações de poder entre o Executivo e o
Legislativo. Concluímos que o Executivo é o Poder mais bem equipado para a definição da
agenda e para a produção legislativa no Brasil, pois possui os recursos constitucionais à sua
disposição, com o complemento da coalizão partidária, que lhe confere o apoio das maiorias,
além de contar com seu poder de veto. Ainda assim, o Legislativo é um Poder que interfere
constantemente no processo decisório, tornando a relação entre esses dois Poderes marcada
pelas negociações e pela reciprocidade estratégica alicerçada na realização de acordos
mútuos. A conclusão final é de que os fatores que influenciam a ocorrência de vetos estão
diretamente ligados com a qualidade da relação entre os Poderes Legislativo e Executivo, que,
através de negociações, buscam o equilíbrio e a promoção dos interesses recíprocos.
ÍNDICE DE QUADROS E TABELAS
Quadro 1: Texto integral do artigo que dispões sobre o veto na Constituição Brasileira....... 19
Quadro 2: Texto integral dos arts. 10 e 11 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados ...................................................................................................................................................36
Quadro 3: Texto integral do artigo do Regimento Interno da Câmara dos Deputados que trata da tramitação de matéria urgente ........................................................................................... 48
Quadro 4: Trechos dos arts. 66 e 68 da Constituição do Estado de Minas Gerais, que tratam da iniciativa privativa do Governador ........................................................................................ 62
Quadro 5: Texto dos arts. 272 a 274 do Regimento Interno da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, que tratam da tramitação em regime de urgência ........................................... 66
Quadro 6: Texto integral do art. 70 da Constituição do Estado de Minas Gerais, que disciplina o uso do veto .............................................................................................. .......... 68
Figura 1. Fluxograma do processo legislativo brasileiro ....................................................... 13
Tabela 1: Trajetória constitucional do veto no Brasil....................... .................................... 20
Tabela 2: A Disciplina Legislativa na Câmara dos Deputados .............. ................................ 37
Tabela 3: Ranking de popularidade dos Governadores brasileiros ......................................... 57
Tabela 4: Votação final dos candidatos a Governador em Minas Gerais ............................. 58
Tabela 5: Coligações mais votadas nas eleições para Governador em Minas Gerais para o mandato 2003-2006 .............................................................................................. 58
Tabela 6: Deputados eleitos pela coligação vencedora para a Legislatura 2003-2006 .......... 59
Tabela 7: Deputados eleitos pela coligação concorrente para a Legislatura 2003-2006 ....... 60
Tabela 8: Quantidade de vetos por Poder de origem ............................................................. 69
Tabela 9: Situação do veto por Poder de origem ................................................................... 70
Tabela 10: Vetos totais e parciais por Poder de origem da proposta ..................................... 71
Tabela 11: Tipo de veto por situação ..................................................................................... 71
17
Tabela 12: A ocorrência de emendas em projetos vetados ................................................... 72Tabela 13: Os vetos rejeitados ............................................................................................... 72
Tabela 14: O partido dos parlamentares autores de projetos com veto rejeitado ................... 74
Tabela 15: O partido dos autores de projetos vetados iniciados no Legislativo .................... 75
Tabela 16: Vetos apresentados por tema e origem da proposta ............................................. 76
Tabela 17: Vetos parciais e totais por tema da proposta ................ ........................................ 77
Tabela 18: Vetos parciais e totais apresentados por ano no mandato 2003-2006 ................... 77
Tabela 19: Vetos ocorridos em 2003 a projetos apresentados no mandato anterior ............... 78
Gráfico 1: Popularidade do Governador Aécio Neves ........................................................... 56
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 9
2 O VETO COMO INSTITUTO JURÍDICO
2.1 Conceito .......................................................................................................................... 11
2.2 Origem............................................................................................................................. 14
2.3 Panorama histórico do veto nas Constituições brasileiras ......................................... 16
2.4 Classificação ................................................................................................................... 21
2.4.1 Quanto à extensão ........................................................................................................ 21
2.4.2 Quanto à matéria .......................................................................................................... 21
2.5 Efeitos do veto no processo legislativo........................................................................... 23
2.6 Natureza legislativa ou executiva................................................................................... 24
3 AS RELAÇÕES DE PODER ENTRE EXECUTIVO E LEGISLATIVO
3.1 O veto e a separação dos Poderes ................................................................................ 26
3.2 Veto players e processo decisório ................................................................................. 27
3.3 A formação das coalizões partidárias .......................................................................... 32
3.4 A disciplina das coalizões partidárias .......................................................................... 34
3.5 A formação dos gabinetes no Executivo e seu impacto nas votações legislativas .... 38
3.6 O poder de agenda do Chefe do Executivo ................................................................ 39
3.7 Poder de agenda versus poder de veto ......................................................................... 41
4 FATORES ENDÓGENOS E EXÓGENOS AO PROCESSO LEGISLATIVO
LIGADOS À OCORRÊNCIA DE VETOS
4.1 Fatores endógenos ........................................................................................................ 42
4.1.1 A origem do projeto ...................................................................................................... 42
4.1.2 O tema do projeto ........................................................................................................ 43
4.1.3 A incorporação de emendas aos projetos originais ................................................... 44
4.1.4 A tramitação em regime de urgência ......................................................................... 46
4.1.5 As votações nominais ................................................................................................. 48
4.2 Fatores exógenos ........................................................................................................... 49
4.2.1 O tamanho da coalizão partidária .............................................................................. 50
4.2.2 A disciplina da coalizão partidária ............................................................................. 51
4.2.3 A aprovação popular do Chefe do Executivo .............................................................. 52
4.2.4 O partido do autor do projeto ....................................................................................... 53
4.2.5 O calendário eleitoral ................................................................................................... 53
5 ANÁLISE DO PERFIL DO GOVERNADOR MINEIRO E DA OCORRÊNCIA
DE VETOS NA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DE MINAS GERAIS NO
PERÍODO 2003-2006
5.1 A popularidade do Governador .................................................................................... 55
5.2 O tamanho e a disciplina da coalizão governista ........................................................ 57
5.3 A Constituição do Estado de Minas Gerais ................................................................. 62
5.3.1 O poder de decreto do Governador .............................................................................. 62
5.3.2 A iniciativa privativa do Governador .......................................................................... 62
5.4 O Regimento Interno da Assembleia Legislativa de Minas Gerais
5.4.1 O Colégio de Líderes .................................................................................................... 63
5.4.2 As Comissões Permanentes ......................................................................................... 64
5.4.3 O regime de urgência ................................................................................................... 65
5.4.4 A inserção de emendas .................................................................................................. 66
5.4.5 O processo de votação .................................................................................................. 67
5.5 O poder de veto do Governador ................................................................................... 68
6 CONCLUSÃO.................................................................................................................... 80
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................................. 83
1 INTRODUÇÃO
Esta monografia tem como objetivo analisar quais fatores influenciam a ocorrência de
vetos. Como o veto surge a partir da interação entre Executivo e Legislativo, então, além dos
fatores endógenos ao processo legislativo, também fatores exógenos, inerentes ao contexto
político, embasados na cooperação ou no conflito entre os Poderes, podem possibilitar sua
ocorrência.
A causa explícita do veto é a inconstitucionalidade da proposta ou sua discrepância
com o interesse público. A inconstitucionalidade é razão do veto quando o Chefe do
Executivo identifica no projeto matéria em desacordo com as normas constitucionais.
Contudo, na realidade, o que ocorre, nos demais casos, são razões de veto ligadas a diferentes
pontos de vista sobre o conteúdo da matéria, dada a subjetividade do denominado “interesse
público”.
Os vetos podem ser produtos de negociações mal-sucedidas, que ocorrem quando há
interesses conflitantes entre os Poderes. Portanto, seu uso é uma forma de o Executivo
controlar a produção legislativa, especialmente quando conta com pouco apoio parlamentar e
não consegue influenciar o andamento dos trabalhos legislativos em favor de seus projetos.
Para viabilizar este trabalho, tendo em vista que as informações técnicas referentes ao
veto são encontradas basicamente em livros e documentos, a coleta de dados foi feita a partir
de pesquisa bibliográfica e pesquisa documental. A pesquisa bibliográfica deu-se em livros,
artigos e textos que tratam do tema. A pesquisa documental e quantitativa valeu-se de
informações colhidas no banco de dados da Assembleia Legislativa de Minas Gerais.
Inicialmente, fizemos uma introdução sobre o instituto do veto, passando pelo
conceito, origem, evolução histórica, tipologia e suas características nas Constituições
brasileiras, de 1891 a 1988. Em seguida, analisamos o contexto contemporâneo do uso do
veto e das relações entre os Poderes Executivo e Legislativo: veto players, coalizões
partidárias, poder de agenda do Chefe do Executivo e disciplina legislativa.
Descrevemos os principais fatores endógenos e exógenos ao processo legislativo que
podem influenciar a ocorrência de vetos. A partir dos dados colhidos, analisamos uma
amostra dos vetos ocorridos na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, no período de 2003-
2006, durante o governo Aécio Neves. Para chegarmos aos resultados pretendidos,
totalizamos as proposições de veto, dividindo-as em várias linhas de análise. Paralelamente,
traçamos um perfil do governo no período, analisando a coligação que o elegeu, o tamanho da
bancada partidária e a produção legislativa.
O Governador Aécio Neves, que dispõe de grandes recursos de poder, além de alto
índice de popularidade, promove a cooperação dos legisladores à sua agenda do governo,
tendo em vista que sua influência sobre a iniciativa legislativa cria incentivos para que os
legisladores se juntem ao governo, em apoio à sua agenda.
A partir da análise dos dados colhidos e do estudo da bibliografia levantada,
concluímos que a ocorrência de vetos tem estreita relação com o poder de origem do projeto,
sua autoria, seu tema e a época em que é apresentado. Por fim, ficou evidenciado que a
Assembleia Legislativa de Minas Gerais, no período analisado, não foi um obstáculo à agenda
do Governador.
2 O VETO COMO INSTITUTO JURÍDICO
2.1 CONCEITO
A palavra veto, substantivada do verbo latino vetare, conjugado na 1ª pessoa do
singular do presente do indicativo, que significa proibir, impedir, opor-se, foi usada pela
primeira vez na obra de Tito Lívio1.
Modernamente, tornou-se o termo próprio do Direito Constitucional para conceituar o
instituto jurídico através do qual o Executivo se opõe à entrada em vigor de um projeto de lei
já aprovado na Casa Legislativa. Trata-se da recusa do Chefe do Executivo em sancionar um
projeto de lei. “O instituto do veto repousa num próprio sistema de equilíbrio de poderes, o
que Montesquieu já tinha reconhecido no Espírito das Leis”. (FERREIRA apud
RODRIGUES, 1993, p.35).
O veto é parte importante do arranjo institucional conhecido como “freios e
contrapesos2”, e tem como finalidade permitir que o Executivo interaja com o Legislativo,
possibilitando-lhe condições de análise objetiva da atividade legislativa, promovendo a
concorrência que é responsável por manter o equilíbrio de forças dentro do sistema de
separação de poderes, uma das pilastras do Constitucionalismo brasileiro.
O veto confere ao Chefe do Executivo o direito de refrear as ações dos legisladores,
impedindo que entrem em vigor medidas inconstitucionais, insensatas, deficientes ou
prejudiciais, estimulando, dessa forma, uma reflexão mais profunda acerca de uma matéria. O
poder de veto foi conferido ao Chefe do Executivo para que este não se tornasse um mero
executor de leis, dando-lhe a possibilidade de intervir no processo legislativo.
1 Titus Livius, conhecido em português como Tito Lívio, nascido em Pádua, na Itália, em 59 a.C., é autor da obra intitulada “Ab urbe condita Libri” (“Desde a fundação da cidade”), composta por 142 livros, dos quais apenas 35 chegaram até nós, onde é contada a história de Roma, desde a sua fundação até o ano 9 a.C. Esta obra tornou-se um clássico que influenciou a historiografia produzida até o século XVIII, atingindo grandes pensadores, como Maquiavel, Aléxis de Tocqueville e Montesquieu.2 Montesquieu, partindo da teoria da tripartição dos Poderes vislumbrada por Aristóteles, contribuiu para seu aperfeiçoamento com o denominado sistema de freios e contrapesos (checks and balances), instituído a fim de que um Poder evite as demasias de outro, num equilíbrio de forças.
O veto produz o efeito de revisão na atividade legislativa, possibilitando aos
legisladores rejeitá-lo ou mantê-lo, após o reexame de todo o projeto de lei (ou da parte
vetada) à luz das razões apresentadas pelo Chefe do Executivo.
O veto tem, igualmente, a finalidade de estabelecer para o corpo legislativo um freio salutar, destinado a resguardar a Nação contra os efeitos das facções, da precipitação ou do impulso contrário ao interesse público e bastante forte para influenciar a maioria do Congresso. (MAXIMILIANO apud RODRIGUES, 1993).
Para RODRIGUES (1993, p. 37), “o veto é o poder de desaprovação total ou parcial
exercido pelo Poder Executivo sobre o projeto de lei emanado do Poder Legislativo. É,
portanto, a antítese da sanção”.
O veto no Direito Brasileiro é suspensivo ou superável, não sendo, pois, um ato de deliberação negativa, do qual resulta a rejeição definitiva do projeto de lei, decorrência do denominado veto absoluto, sendo ato de recusa, ensejando o reexame do projeto de lei pelo próprio Legislativo, que poderá aprová-lo por maioria qualificada. (FERREIRA FILHO apud por Rodrigues, 1993).
O veto absoluto, que consagra as ditaduras e caracteriza-se pela rejeição definitiva de
um projeto de lei, nunca foi adotado pelas Constituições brasileiras. Foi defendido tão-
somente pela província do Rio Grande na Assembleia Constituinte de 1823.
No nosso atual texto constitucional, o prazo para interposição do veto é fatal e
improrrogável, de 15 dias úteis, e sua transgressão implica a sanção do projeto de lei (o
silêncio importa sanção). O prazo para a comunicação das razões do veto é de 48 horas.
O veto é sempre supressivo. Através dele somente é possível retirar do projeto a parte
impertinente (veto parcial) ou rejeitar todo o projeto (veto total). Não é possível, através do
veto, adicionar nada ao texto do projeto, nem mesmo substituir a parte vetada por outra
pretendida pelo Executivo.
O veto não permite arrependimento, visto que, uma vez protocolado na Casa
Legislativa, não pode ser retirado ou mesmo modificado, nem tampouco ser transformado de
veto total para veto parcial, ou vice-versa.
Outra consequência do veto é que, sendo ele acatado pela Casa Legislativa, a matéria
do projeto somente poderá ser reapresentada na mesma Sessão Legislativa anual, por proposta
da maioria dos membros daquela Casa, da mesma forma que ocorre com os projetos de lei
rejeitados.
A seguir apresentamos um fluxograma do processo legislativo brasileiro, a fim de
destacar o momento em que ocorre o veto e seu impacto em tal processo.
Figura 1. Fluxograma do processo legislativo brasileiro.
Fonte: Moya (2005, p.50).
2.2 ORIGEM
O veto tem sua origem entre os hititas3, uma avançada civilização que criou um
Império na Ásia Menor, segundo Rodrigues (1993). A civilização hitita possuía uma
Assembleia, denominada “Pankus4”, composta pela nobreza, com poderes de eleger e aceitar
a indicação do rei, julgar seus atos, intervir nas controvérsias e questões de sua vida particular
e até o destituir.
Dos hititas, a noção de veto foi passada aos gregos, que exerciam sua soberania
diretamente nas assembleias e nos tribunais, ou indiretamente, através dos magistrados, aos
quais ela era momentaneamente delegada. Uma lei poderia ser anulada se fosse rejeitada em
consulta popular, num método semelhante ao referendo.
Dos gregos, os romanos herdaram as bases de sua civilização e, também, a ideia de
veto. Georges Perrot, citado por Ernesto Rodrigues (1993, p. 16), afirma que “Roma sempre
teve a glória de haver estudado o povo ateniense com proficiência e o imitado
respeitosamente, tendo em vista que os gregos, depois dos etruscos, foram os mestres dos
romanos em todos os setores do conhecimento humano”.
Em Roma, as origens do veto remontam aos primeiros tempos da República
implantada pela Revolução de 509 a.C., que extinguiu a Realeza. “A magistratura figurava
entre os órgãos do novo Estado, e era representada pelo Consulado, exercido por dois
cônsules, que se revezavam mensalmente e se regiam pelo princípio da colegialidade,
destinado a evitar o abuso do poder soberano e o perigo da tirania”. (RODRIGUES, 1993,
p.18).
O veto, em Roma, manifestou-se, inicialmente, na intercessão (intercessio)5, que
permitia a um cônsul anular ou paralisar as decisões de um colega ou de um magistrado 3 Civilização ligada ao mesmo complexo linguístico e, possivelmente, à mesma origem étnica dos europeus e hindus, e de origens culturais iguais às dos gregos, romanos, celtas, germanos, eslavos e indianos. Segundo Ernesto Rodrigues, é no avançado regime político desta civilização, a monarquia constitucional parlamentarista, e na sua Assembleia, denominada “Pankus”, que o veto encontra sua origem mais remota. 4 Essa Assembleia constitui-se em uma concepção de poder totalmente estranha às outras monarquias do Antigo Oriente nas quais reina o Absolutismo. O poder real é por ela limitado. Em todos os assuntos muito graves, o rei está obrigado a recorrer a ela, única com autoridade para decidir a respeito. O “Pankus” algumas vezes funcionava como corte de justiça, proferindo sentenças e as executando. A composição ideal do “Pankus” compreendia os filhos, irmãos, parentes, descendentes de 2ª linha e os guerreiros do Monarca. 5 A intercessão (intercessio) foi concebida como um freio ao exercício arbitrário do Poder Público, sendo no Direito romano o instrumento constitucional mais eficaz contra o abuso do poder, tanto no Direito Público quanto no Direito Privado.
inferior. A intercessio caracterizava-se como um veto absoluto, pois tornava definitivamente
sem força de lei a norma aprovada. Mais tarde, a luta entre plebeus e patrícios levou à criação
de dois novos órgãos de decisão na sociedade romana, o Tribunato e a Edilidade, tendo cada
um deles dois membros que se destinavam a defender os direitos da plebe.
Ao Tribunato e à Edilidade foi dada uma arma poderosa – a intercessão (intercessio),
anteriormente possuída pelos cônsules. Nos moldes da intercessio consular, a intercessio
tribunícia podia ser usada por um tribuno contra outro, mas não podia ser usada para paralisar
outra intercessio.
A intercessão (intercessio) dava aos tribunos6 poderes iguais ou superiores aos dos Magistrados do Estado, mas tinha caráter meramente negativo ou proibitivo: era um veto, uma simples cassação, diferindo muito do atual instituto jurídico, pois, na época, a intercessio não tinha caráter de interferência no processo legislativo”. (Rodrigues,1993, p.22)
Os tribunos não estavam sujeitos à autoridade dos Magistrados. Ao instituir o
Tribunato, o povo romano outorgou-lhes, por lei, a inviolabilidade e santificou-a com um
juramento (lex sagrata) (lei sagrada)7, punindo com pena de morte os atentados contra ela. A
autoridade dos tribunos era tida como potestas sacrosancta (poder sagrado), enquanto a
autoridade dos Magistrados, conferida tão-somente por lei, era potestas legitima (poder
legítimo).
Como herança de uma civilização a outra, de Roma, o vetou passou à Inglaterra, tendo
se constituído numa prerrogativa da Coroa, embora aí caindo em desuso, devido ao fato de
que, se o Parlamento aprovava o que era proposto pelo monarca, não havia por que este
combater suas próprias medidas. O Parlamento tinha apenas o controle formal sobre a
produção de leis, que eram geralmente propostas pelo rei e por ele aprovadas para tornarem-se
efetivas, tornando praticamente desnecessário o recurso do veto.
Na Idade Moderna registra-se uma nova concepção de veto:
“De prerrogativa pessoal, inerente ao Chefe de Estado, que dele usou arbitrariamente, ao sabor de seus interesses e caprichos, o veto transformou-se em elemento de equilíbrio dos Poderes, quando não se assinala pelo desuso, como
6 Os Tribunos representavam os plebeus (povo) e tinham como objetivo impedir usurpações e outros atos violentos inspirados pelos patrícios (nobres) e executados pelos Cônsules.7 A lei era considerada sagrada porque o povo fazia acompanhar seu voto de um juramento solene.
aconteceu nos países em que o Parlamento conseguiu prevalecer sobre o Executivo e o Judiciário”. (RODRIGUES, 1993, p.30).
Posteriormente, o veto, já com características de instituto jurídico de governo
presidencialista, apareceu nos Estados Unidos, onde se desenvolveu e aperfeiçoou,
constituindo-se num freio ao exercício arbitrário do poder público, semelhante à intercessio
romana.
Da Constituição Americana de 1787, o veto foi transplantado para outros povos, como
todos os demais países das Américas e da Europa. Hoje, o veto existe em todos os regimes
presidencialistas, bem como em algumas repúblicas parlamentaristas, a exemplo da França,
embora com alguns aspectos diferenciados.
2.3 PANORAMA HISTÓRICO DO VETO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS
Sendo o veto um poder característico do Governo Presidencialista, faremos um breve
relato de sua evolução, no Brasil, a partir da Constituição de 1891. Vale ressaltar, porém, que
o veto já era mencionado como “recusa de consentimento”8 do imperador na Carta
Constitucional do Império, de 1824, outorgada ao povo brasileiro pelo Imperador D. Pedro I.
Entretanto, a discussão a respeito do veto não iniciou com a nossa primeira
Constituição. Essa questão também estava presente nos debates da Assembleia Constituinte
de 18239, onde o veto era considerado peça importante para o equilíbrio da produção
legislativa.
Sempre houve algum tipo de poder de veto no Brasil, mesmo no período imperial. As
regras para seu exercício eram alteradas a cada mudança constitucional, sendo constante,
contudo, sua característica de veto suspensivo, ou seja, sempre poderia ser rejeitado pelos
legisladores. Embora, no período colonial, essa rejeição fosse praticamente impossível,
8 O Imperador recusava o Decreto enviado pela Câmara através da seguinte fórmula prescrita na Constituição de 1824: “O Imperador quer meditar sobre o Decreto, para a seu tempo se resolver”, ao que era respondido pela Câmara: “louva a Sua Majestade Imperial o interesse que tem pela Nação”.9 A Assembleia Constituinte de 1823 tratou da divisão dos poderes e da organização do sistema legislativo, onde representantes da maioria das províncias sustentaram que tanto a sanção quanto o veto suspensivo eram direitos do Imperador (apenas a província rio-grandense defendia a adoção do veto absoluto), ficando definido que ao soberano caberia consentir ou recusar os decretos.
quando a justificativa para um veto podia ser apenas a vontade do imperador e o seu silêncio
era entendido como recusa tácita.
Com a Constituição de 1891, a primeira Republicana, o Brasil passou do campo
europeu de influências políticas, ideológicas e jurídicas para o campo norte-americano. Mas
essa mudança de área de influências é anterior à queda do regime monárquico, visto notarem-
se já os primeiros movimentos visando à nossa emancipação política, como a Inconfidência
Mineira10, em 1798, e a Revolução Pernambucana11, de 1817.
A nossa primeira Carta Republicana, que teve a redação final do então Ministro da
Fazenda, Ruy Barbosa, era também conhecida como a “Constituição de Petrópolis” e, ainda
sem falar em veto, estabelecia a “negativa de sanção”, a ser exercida pelo Presidente da
República. Na reforma desta Constituição, em 1926, tal poder de recusa foi mantido, já com o
título de veto, com a inovação de se instituir, no Brasil, o veto parcial.
A inovação do veto parcial permitia que este incidisse sobre qualquer parte do projeto,
até mesmo uma palavra, fornecendo-lhe amplitude e flexibilidade, o que o fortaleceu.
Possibilitou, contudo, abusos condenáveis, visto que a possibilidade de vetar até mesmo
palavras isoladas poderia desfigurar o sentido original do projeto de lei aprovado.
A Constituição de 1934 manteve o veto, total e parcial, estabeleceu sua votação
secreta e modificou o quorum, que passou a exigir a votação da maioria absoluta dos
membros das Câmaras, em separado.
O golpe político de 1937 implantou no Brasil o regime ditatorial, modificando a Carta
Política, e o prazo concedido ao Presidente da República para vetar um projeto de lei foi
ampliado de 10 para 30 dias. Restabeleceu a exigência de dois terços dos votos para a rejeição
de um veto e fez com que eles voltassem a ser nominais.
10 Os Inconfidentes pretendiam eliminar a dominação portuguesa das Minas Gerais, estabelecendo ali um país livre. Não havia a intenção de libertar toda a colônia brasileira, pois naquele momento uma identidade nacional ainda não havia se formado. A forma de governo escolhida foi o estabelecimento de uma República, inspirada pelas ideias iluministas da França e pela então recente independência norte-americana.11 A Revolução Pernambucana de 1817 visava à divulgação das ideias liberais e de independência, estimulando as camadas populares de Pernambuco na organização do movimento. Os objetivos eram a independência do Brasil, a proclamação da República e a expulsão dos portugueses que monopolizavam o comércio da região.
A Constituição de 1946 marcou a volta do Brasil ao regime democrático e manteve o
poder de veto, simplificando o processo de apreciação do veto, que passou a ser discutido e
votado pelo Congresso, em sessão conjunta das duas Câmaras, com o quorum de 2/3 dos
congressistas presentes. O prazo para a interposição do veto voltou a ser de 10 dias e a
votação tornou a ser secreta.
A Emenda Constitucional n° 4, de 1961, instituiu no Brasil o sistema parlamentar de
governo e manteve o poder de veto, embora alterando o quorum para aprovação, que passou a
ser de 3/5 dos deputados e senadores presentes, em sessão conjunta das duas Câmaras. Esta
disposição foi revogada pela Emenda Constitucional n° 6, em 1963, que restabeleceu o
sistema presidencial de governo e as regras referentes ao veto contidas da Constituição de
1946.
A Emenda Constitucional n° 17, de 1965, regulamentou o uso do veto parcial,
definindo que ele abrangeria texto integral de artigo, parágrafo, inciso, item ou alínea.
Na Carta Constitucional de 1967 também estava figurado o veto. Seu texto foi alterado
pela Emenda Constitucional n° 1, de 1969, e o veto foi inscrito nas duas modalidades já
conhecidas no nosso Direito Constitucional, total e parcial. Neste texto, o veto foi
condicionado à inconstitucionalidade ou à contrariedade do interesse público. O prazo para o
Presidente da República manifestar-se sobre o projeto de lei passou a ser de 15 dias úteis, e de
48 horas para comunicar ao presidente do Senado os motivos do veto.
A Constituição de 1988 devolveu ao Brasil sua condição de verdadeiro Estado
Democrático de Direito, e manteve em seu texto o instituto jurídico do veto, total e parcial,
condicionando-o à inconstitucionalidade e à contrariedade ao interesse público. Manteve o
prazo de 15 dias úteis para seu exercício por parte do Presidente da República, bem como o
prazo de 48 horas para comunicação ao Presidente do Senado dos motivos do veto.
Explicitou, ainda, que o veto parcial abrangerá texto integral de artigo, parágrafo, inciso ou
alínea.
A atual Constituição estabelece que o veto deve ser apreciado em sessão conjunta,
dentro de 30 dias a contar de seu recebimento, só podendo ser rejeitado pelo voto da maioria
absoluta dos deputados e senadores, em escrutínio secreto. Sua apreciação é considerada
matéria urgente, pois, de acordo com o § 6° do art. 66 do dispositivo constitucional, esgotado
sem deliberação o prazo de 30 dias, o veto será posto na ordem do dia da sessão imediata,
sobrestadas as demais proposições, até sua votação final.
Sendo o veto rejeitado, o projeto de lei é restabelecido em sua integridade,
transformando-se em lei, devendo ser enviado, para promulgação, ao Presidente da República.
Finalmente, o § 7º do art. 66 estabelece que, se a lei não for promulgada dentro do
prazo de 48 horas pelo Presidente da República, o Presidente do Senado o fará, e, se este não
o fizer em igual prazo, caberá ao Vice-Presidente do Senado fazê-lo.
Quadro 1: Texto integral do artigo sobre o veto na Constituição Brasileira
Art. 66 - A Casa na qual tenha sido concluída a votação enviará o projeto de lei ao Presidente da República, que, aquiescendo, o sancionará.
§ 1° - Se o Presidente da República considerar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao interesse público, vetá-lo-á total ou parcialmente, no prazo de quinze dias úteis, contados da data do recebimento, e comunicará, dentro de quarenta e oito horas, ao Presidente do Senado Federal os motivos do veto.
§ 2° - O veto parcial somente abrangerá texto integral de artigo, de parágrafo, de inciso ou de alínea.§ 3° - Decorrido o prazo de quinze dias, o silêncio do Presidente da República importará sanção.§ 4° - O veto será apreciado em sessão conjunta, dentro de trinta dias a contar de seu recebimento, só
podendo ser rejeitado pelo voto da maioria absoluta dos Deputados e Senadores, em escrutínio secreto.§ 5° - Se o veto não for mantido, será o projeto enviado, para promulgação, ao Presidente da
República.§ 6° - Esgotado sem deliberação o prazo estabelecido no § 4°, o veto será colocado na ordem do dia
da sessão imediata, sobrestadas as demais proposições, até sua votação final.§ 7° - Se a lei não for promulgada dentro de quarenta e oito horas pelo Presidente da República, nos
casos dos §§ 3° e 5°, o Presidente do Senado a promulgará, e, se este não o fizer em igual prazo, caberá ao Vice-Presidente do Senado fazê-lo.
A seguir apresentamos uma tabela com o resumo da trajetória constitucional do veto
no Brasil.
22
2.4 CLASSIFICAÇÃO
2.4.1 Quanto à Extensão
A Constituição Brasileira concebeu o veto e classificou-o, quanto à sua extensão, em
duas espécies: o total e o parcial. O veto total abrange todo o projeto de lei e o veto parcial
atinge um ou vários dispositivos, ou seja, artigos, parágrafos, incisos ou alíneas.
“A regulamentação do veto parcial tem o efeito prático de evitar que ele incida apenas
sobre parte, período ou palavra do artigo, parágrafo, inciso, item, número ou alínea,
truncando, assim, o entendimento das demais partes vetadas” (MAGALHÃES apud
RODRIGUES, 1981, p.26). Essa limitação tem como finalidade evitar que se deturpe o
sentido original de um projeto de lei, como o que poderia ocorrer, por exemplo, na
transformação de uma proposição negativa em afirmativa pela rejeição do advérbio.
A vantagem do veto parcial é que ele evita que se sacrifiquem projetos de lei
interessantes por conta da disposição de um artigo, parágrafo, inciso ou alínea. O Chefe do
Executivo pode usá-lo para ajustar a matéria regulamentada ao seu programa de governo,
evitando que bons projetos se percam totalmente devido a interesses políticos.
“Na prática constitucional brasileira, desde que o Presidente da República não
especifique a parte ou as partes do projeto de lei por ele vetadas, terá ele deixado de usar o
veto parcial, para usar o veto total”. (RODRIGUES, 1981, p.33).
2.4.2 Quanto à Matéria
23
Em razão de sua matéria, o veto classifica-se em dois tipos: os fundamentados em
motivos de ordem constitucional e os embasados em razões de conveniência ou interesse
público. Essa motivação do veto possibilita o debate político dos legisladores no momento de
sua apreciação.
“A inconstitucionalidade é um motivo estritamente jurídico, a incompatibilidade com a lei mais alta. E a inconveniência, um motivo estritamente político, envolvendo uma apreciação de vantagens e desvantagens. O veto por inconveniência apresenta o Presidente como defensor do interesse público, enquanto o veto por inconstitucionalidade o releva como guardião da ordem jurídica”. (FERREIRA FILHO apud RODRIGUES, 1981).
O veto por inconstitucionalidade pode ser definido como um controle preventivo da
constitucionalidade das leis exercido pelo Poder Executivo na fase de tramitação do projeto de
lei. Já o veto por contrariedade ao interesse público “pode ter efeito político, transformando-
se numa arma poderosa, nas mãos do seu manipulador. Tal efeito pode, também, ser-lhe
contrário, acarretando-lhe perda de prestígio e derrota política”. (RODRIGUES, 1981, p.37).
Vale ressaltar que, mesmo sendo caracterizado como ato político exercido com certa
margem de liberdade, uma vez que o interesse público pode ser interpretado de maneiras
subjetivas e diversas, o veto por razões de conveniência e interesse público deve manter,
sempre, as balizas legais para a sua prática.
As causas explícitas e imediatas do veto fazem referência a duas dimensões: ou o projeto é inconstitucional ou não atende aos interesses da sociedade, nação, cidadãos, etc. Contudo, essas causas tão caras a quem emite o veto e o defende, não podem ser assumidas como verdades quando consideramos o jogo político. É claro que muitos projetos são unanimemente considerados como portadores de componentes inconstitucionais. De qualquer maneira, alguns podem ser consensualmente tomados como prejudiciais à coletividade nacional. No entanto, a maior parte das vezes, o que realmente subsiste são diferentes pontos de vista sobre qual deve ser o conteúdo substantivo do projeto em questão. O veto encerra uma dinâmica que combina a institucionalidade das regras de decisão com os diferentes pontos de vista dos atores políticos habilitados a participar da cena legislativa. (grifo nosso) (GROHMAN, 2003, p.3)
A obrigatoriedade de tais fundamentos exige que os motivos do veto sejam expostos
formalmente na mensagem enviada ao Legislativo, o que é chamado de motivação,
significando que o veto deve ocorrer numa realidade narrada e justificada para poder gerar
efeitos jurídicos e possibilitar o controle legítimo pelos legisladores, quando da sua análise.
Em outras palavras, além de motivo, que é pressuposto de fato, o veto deve ter motivação, que
é a exposição das circunstâncias que determinaram sua prática.
24
2.5 EFEITOS DO VETO NO PROCESSO LEGISLATIVO
Todo projeto de lei, depois de aprovado na Casa Legislativa, é submetido à apreciação
do Chefe do Executivo, que pode sancioná-lo para em seguida promulgá-lo em forma de lei,
ou então, vetá-lo para depois enviar este veto à apreciação do Legislativo. O Executivo pode
inclusive vetar projetos de sua própria autoria, tendo em vista que o texto pode conter falhas
só percebidas mais tarde, no exame do projeto já aprovado pelo Legislativo, o que pode
ocorrer mais facilmente, por exemplo, quando um projeto é elaborado por uma Secretaria sem
o conhecimento de outra. Também pode ocorrer a necessidade de o Executivo modificar o
projeto original por alteração do programa de governo para atender a uma situação urgente de
interesse público ou a negociações feitas com os legisladores.
A oposição do veto é feita através de mensagem do Presidente da República ao
Presidente do Senado Federal, informando os dispositivos do projeto de lei vetados e as
razões que o levaram a tomar tal medida.
A tramitação do projeto de lei não é encerrada até que o veto seja apreciado. Nesta
etapa já não cabem emendas. O Legislativo pode manter o veto e tornar sem eficácia jurídica
o projeto originalmente aprovado, ou pode derrubá-lo e promover a entrada em vigor do
projeto de lei, encaminhando-o ao Chefe do Executivo para a promulgação.
No caso de veto total, o projeto de lei é submetido inteiramente ao reexame dos
legisladores. Porém, em se tratando de veto parcial, o reexame atinge somente a parte
recusada, enquanto a parte não vetada é sancionada e publicada, para sua entrada em vigor.
Para FERREIRA FILHO citado por RODRIGUES (1981, p. 36), há vantagens e
desvantagens, estas graves, na imediata entrada em vigor da parte não vetada. Aquele autor
pondera ser vantajoso que as normas legais fixadas pelo Legislativo e sancionadas pelo
Executivo entrem imediatamente em vigor. Adverte, porém, contra os malefícios dessa prática
que pode resultar, no caso de rejeição do veto parcial, na existência de dois textos legais
25
diferentes: o anterior à rejeição do veto e o posterior a ela, sendo, por vezes, este publicado
como se fosse outra lei, com outra numeração, o que gera insegurança jurídica.
A praxe, porém, é que o veto parcial suspenda a vigência de uma parte do projeto de
lei, que será restabelecida no caso de rejeição do veto, passando a vigorar com a lei já
sancionada, sendo a ela reintegrada.
BARBALHO U. C. citado por RODRIGUES (1981) considera o veto como um
impedimento à obra legislativa e opõe-se ao veto parcial por considerá-lo uma emenda
supressiva de alguns dispositivos do projeto de lei, que pode vir a desfigurá-lo.
O governo teria, deste modo, a escolha dos dispositivos que lhe agradassem, só prevalecendo, afinal, os que ele preferisse; a lei seria, então, não aquilo estabelecido pelo legislador, mas o que fosse do desejo do Executivo, o qual só poria em uso a parte não vetada, ficando o restante à espera de deliberação posterior, e quebrado, destarte, o elo de dependência das disposições, muitas das quais se inutilizariam com a execução separada das outras partes. (BARBALHO U. C. apud RODRIGUES, 1981, pp. 40-41).
“Constitui, evidentemente, um abuso, o emprego do veto como arma pessoal e política
do Presidente da República, visando interesses subalternos seus, de grupos ou mesmo de seu
partido”. (FREITAS apud RODRIGUES, 1981).
2.6 NATUREZA LEGISLATIVA OU EXECUTIVA
Há controvérsia a respeito do caráter legislativo ou executivo do veto, na opinião dos
autores estudiosos do tema, embora a maioria deles incline-se em favor de sua natureza
legislativa, enquanto a minoria opine pela sua natureza executiva.
Dentre os autores que perfilham a natureza legislativa do veto, estão Pinto Ferreira12 e
Alcino Pinto Falcão13, que justificam ser o veto uma maneira do Poder Executivo evitar as
demasias do Poder Legislativo. Acreditam que a sanção e o veto integram a primeira fase do
processo legislativo, decorrendo, daí, o caráter legislativo do veto.
12 FERREIRA apud RODRIGUES (1993).13 FALCÃO apud RODRIGUES (1993).
26
RODRIGUES (1993, p. 56) defende a natureza executiva do veto, argumentando que,
tal qual a sanção, o veto é prerrogativa e poder do Chefe do Executivo, logo, de caráter
executivo. A seu lado está ALECRIM14, citado por aquele autor, entendendo que o poder de
veto acha-se incluído, expressamente, no art. 84, inciso V da Constituição Federal, entre as
atribuições privativas do Presidente, caracterizando, dessa forma, seu caráter propriamente
executivo. Observa, ainda, que, se o veto é uma negativa sobre uma proposição afirmativa do
Legislativo, torna-se intuitivo tratar-se de dois poderes diferentes.
Face ao exposto e posicionando-nos acerca da questão, talvez uma evidência definitiva
de que o veto possua caráter legislativo é o fato de estar estabelecido na seção destinada ao
processo legislativo (Seção VIII – Do Processo Legislativo; Subseção III – Das Leis). Na
elaboração das leis, o veto e a sanção estão entre os atos do processo de sua formação, o que
nos leva a concluir, portanto, que o Chefe do Executivo participa da formação da lei.
14 ALECRIM apud RODRIGUES (1993).
27
3 AS RELAÇÕES DE PODER ENTRE EXECUTIVO E LEGISLATIVO15
3.1 O veto e a separação dos Poderes
Segundo a teoria de Montesquieu, para que exista um governo equilibrado, o Poder
que tem a faculdade de legislar não deve ter a faculdade de vetar; e o Poder que tem a
faculdade de vetar deve estar impedido de legislar. Provavelmente Montesquieu se
preocuparia ao perceber, nos dias atuais, que o chefe do Poder Executivo manteve seu poder
de veto e se tornou o principal propositor de leis, principalmente nos regimes presidencialistas
latino-americanos, incluindo o Brasil.
Montesquieu defende a necessidade do bicameralismo afirmando: “Num Estado, há sempre pessoas dignificadas pelo nascimento, pelas riquezas ou pelas honrarias; mas, se se confundissem com o povo e só tivessem, como os outros, um voto, a liberdade comum seria sua escravidão e não teriam nenhum interesse em defendê-la, porque a maioria das resoluções seria contra elas. A participação que tomam na legislação deve ser, portanto, proporcional às outras vantagens que têm no Estado, o que acontecerá se formarem um corpo que tenha o direito de sustar as iniciativas do povo, tal como o povo tem o direito de sustar as deles.” Madison defende a separação dos poderes da seguinte maneira: "traçar de tal maneira a construção do governo que todas as suas diferentes partes possam reter-se umas às outras nos seus lugares respectivos". (TSEBELIS, 1995)
Ainda dentro de sua teoria de separação de poderes, Montesquieu advertiu a respeito
das finanças públicas. Observou o pensador que, como o Poder Executivo não faz parte do
ramo Legislativo a não ser por sua capacidade de vetar, também não deve participar dos
debates sobre os negócios públicos. Isso porque, com sua prerrogativa de veto, ele pode
recusar os projetos julgados inviáveis. Porém, se tiver a possibilidade de propor legislação a
respeito de gastos públicos, tornar-se-á o legislador mais importante da atividade legislativa.
Mais uma vez as ideias do pensador levantam questionamentos a respeito do nosso arranjo
institucional.
15 As relações de poder entre Executivo e Legislativo, tratadas ao longo do texto, geralmente fazem referência ao governo federal, mas encaixam-se perfeitamente ao governo estadual, que inclusive será objeto de estudo desta monografia.
28
O fato é que o presidente brasileiro é influente no campo legislativo porque a
Constituição de 1988 assim o estabeleceu (LIMONGI, 2006). A ele foram concedidas
importantes prerrogativas: o monopólio da iniciativa legislativa em áreas essenciais, como
orçamento e tributação, a solicitação de urgência para seus projetos, o poder de veto, o poder
de decreto, os mecanismos de delegação, o poder de nomear e demitir ministros livremente, a
possibilidade de edição de medidas provisórias, com imediata força de lei, entre outros fatores
que o tornam um legislador de elevada importância, o ator com mais força no cenário político.
As medidas provisórias devem ser imediatamente submetidas ao Congresso, e caso não sejam convertidas em lei no prazo de trinta dias, perdem eficácia. Embora o Artigo 62 da Constituição estabeleça que as medidas provisórias somente podem ser editadas em matérias de urgência e relevância, na realidade elas converteram-se no instrumento político mais usado pelos presidentes, principalmente para implementar decisões de política econômica. (AMORIM NETO, 2000)
Com essa diversidade de recursos à disposição, verifica-se uma hegemonia do
Executivo, que pode apresentar sua proposta de governo através da iniciativa legislativa e
vetar os projetos que destoem de seu interesse. Contudo, todas as suas prerrogativas são
submetidas à apreciação do Legislativo.
A rigor, nos Estados contemporâneos, e essa não é característica isolada do Brasil, pode-se dizer que o Executivo conseguiu mais representatividade do que o Legislativo. Aqui mais ainda, por conta do presidencialismo, pois, quando é o eleitorado que escolhe diretamente o governante, neste fundem-se as expectativas e as esperanças populares, num grau que jamais a eleição de um deputado poderá igualar (FERREIRA FILHO apud MORAES, 2001).
A Constituição de 1988 redefiniu as atribuições desses dois Poderes, ampliando
também a capacidade de influência do Legislativo sobre a produção de leis, ao mesmo tempo
em que o transformou em fiscal dos atos do Executivo. O resultado disso é que o Executivo,
Poder dotado de fortes recursos para impulsionar suas políticas públicas, necessita, para
implementá-las, da promoção de negociação com os legisladores, estabelecendo canais de
comunicação com sua base parlamentar através dos partidos que a compõem, por meio da
formação de uma coalizão partidária que dê o apoio necessário à sustentação de seu governo.
3.2 Veto players e processo decisório
29
Na definição de TSEBELIS (1995), veto player é um ator individual ou coletivo cuja
concordância é necessária para uma mudança no status quo. O veto player, originado da ideia
de pesos e contrapesos, pode ser institucional, quando a Constituição concede a um ator
singular ou coletivo essa qualidade, ou partidário, quando é gerado pelo entrosamento dos
partidos políticos, dentro de um veto player institucional.
Assim, veto players institucionais são aqueles especificados pela Constituição, e veto
players partidários são especificados, de maneira endógena, pelos partidos que integram uma
coalizão de governo. Tsebelis qualifica como veto players partidários aqueles que são
gerados dentro dos veto players institucionais devido ao jogo político. Nesse sentido, a
Câmara dos Deputados é um veto player institucional e os partidos e as coalizões são veto
players partidários.
O Presidente da República é um veto player institucional e singular, pois o poder de
veto é exercido por uma só pessoa. O Senado e a Câmara dos Deputados são veto players
institucionais e coletivos, visto que o exercício do poder de veto dessas Casas é resultado da
interação de vários atores individuais. No bicameralismo brasileiro, o Senado e a Câmara
agem como veto players ao rejeitar um projeto originado e aprovado pela outra Casa.
GUEDES (2007) afirma que o desenho institucional de um país pode levar à formação
de vários veto players, o que pode criar impasses. Cada veto player, com seus recursos e
interesses, procura maximizar a sua satisfação, enfrentando a restrição imposta pela limitação
dos recursos disponíveis. No confronto com outros veto players, também possuidores de
recursos e interesses, surgem as instituições, e são elas que permitem aos atores interagirem
em um ambiente mais estável, com maior informação e maior predição com relação ao
comportamento alheio. É nesse ambiente institucional que eles poderão permutar seus
recursos e buscar a realização de seus interesses.
Tsebelis criou também o conceito de winset do status quo, que é definido como o
conjunto de políticas que podem substituir o atual status quo. O winset do status quo diminui
quando é grande a quantidade de veto players e há distância ideológica entre eles, gerando a
estabilidade política16 e diminuindo a possibilidade de mudanças significativas.
16 Tsebelis define estabilidade política como a impossibilidade de mudanças significativas no status quo.
30
Às vezes a estabilidade política pode ser desejável, às vezes mudanças políticas podem ser necessárias. O ponto de vista, diz Tsebelis, dependerá da posição do status quo. As instituições, diz ele, são “pegajosas” (sticky) e estão locadas em algum ponto no continuum estabilidade-mudança. As instituições que permitem mudanças podem levar também à alteração de um status quo desejável; as instituições que promovem a estabilidade, por sua vez, podem tornar difícil a alteração de um status quo indesejável (Tsebelis, 2000, p. 443). Assim, a escolha do desenho institucional deve ser vista como um investimento (Tsebelis, 1998), cercada de incertezas e com efeitos a curto e longo prazos. (GUEDES, 2007).
As instituições estão localizadas em algum ponto entre maior possibilidade de
mudança e maior estabilidade. As instituições que promovem a estabilidade farão com que a
saída do status quo seja mais difícil (TSEBELIS, 1995). A Constituição brasileira enquadra-se
em um ponto mais próximo a este segundo tipo de instituição, requerendo um processo
legislativo mais solene e difícil do que o exigido para a edição das demais normas.
As Constituições são as regras do jogo, uma pré-condição para a vida política democrática, que permite economia nos custos de transação, reduz incertezas, assegura a previsibilidade dos atores, alarga o horizonte do cálculo político e, assim, amplia incentivos para que se tomem decisões que trazem benefícios coletivos com retorno a longo prazo (MELO, 2002).
Para Tsebelis, as “Constituições são regras de ordem superior que ordenam como será
a mudança nas outras regras inferiores; são regras que delimitam o quadro em que os atores se
moverão”. A inclusão de normas não constitucionais no texto da Constituição reflete a
importância atribuída a elas pelo poder constituinte. Ao serem constitucionalizadas, essas
normas somente serão alteradas por emendas à Constituição, com procedimento mais solene e
rígido que o ordinário.
Para que a nossa Constituição seja alterada, é necessário que a Proposta de Emenda à
Constituição (PEC) seja aprovada por maioria qualificada de três quintos dos parlamentares
de ambas as Casas do Congresso, em dois turnos de votação. “Esses dois mecanismos, o
bicameralismo e a maioria qualificada, aumentam o número de veto players e,
consequentemente, a estabilidade política.” (TSEBELIS apud ANDRADE, 2006).
A obtenção da maioria qualificada requer a interação dos partidos políticos e o sistema
multipartidário brasileiro leva a governos de coalizão. “A Constituição de 1988 criou
incentivos para que as coalizões de apoio ao presidente se formassem em torno de uma
estrutura partidária consistente, passando o êxito do governo a depender do apoio partidário e
não de alianças ad hoc”. (Santos 2002).
31
Para que uma política pública seja implementada, precisa ser aprovada pela maioria
dos atores relevantes de cada partido que compõe a coalizão do governo antes de ser levada
ao Plenário e, nessa etapa prévia, os partidos membros da coalizão constituem veto players.
ANDRADE (2006), afirma que, para que haja mudanças significativas no status quo,
é necessário o entendimento entre os principais partidos políticos17, que poderiam tentar se
comportar como veto player, quer possuindo votos suficientes para impedir a reforma, quer
coligando-se pontualmente com outros partidos para a impedir.
Os veto players coletivos podem decidir por maioria simples, maioria qualificada ou
por unanimidade. “A estabilidade política, isto é, a dificuldade de se sair do status quo,
aumenta quando a regra de decision-making passa de maioria simples para maioria
qualificada e de maioria qualificada para unanimidade” (TSEBELIS apud ANDRADE, 2006).
Maiorias qualificadas diminuem o winset do status quo por imporem restrições adicionais.
Aqui, cabe-nos diferenciar disciplina partidária e coesão partidária. A coesão refere-se
à concordância de posições políticas dentro de um partido antes que se proceda à discussão e
à votação. “Ela mensura a similaridade de posições políticas dos atores que concorrem para
formar a vontade de um veto player coletivo” (GUEDES, 2007). Já a disciplina partidária
refere-se à capacidade de um partido de controlar os votos de seus membros no Parlamento.
Para implementação de uma política pública, a coesão e a disciplina partidária
reduzem as negociações e limitam o winset do status quo. Isso significa que, enquanto os
partidos tiverem os mesmos pontos ideais, o acordo entre eles não será desfeito. Não havendo,
porém, nenhum compromisso estabelecido previamente, ou não havendo disciplina partidária,
o winset do status quo será maior e possibilitará deslocamentos.
A coesão é influenciada pelo tamanho do veto player, pelo sistema eleitoral e pela
estrutura institucional. Um veto player pode ter alto nível de coesão se contar com um
presidente ou um partido que tenha um líder carismático. Excetuando-se os casos de ator
individual, a coesão cresce proporcionalmente ao número de diferentes atores individuais que
17Argelina Figueiredo e Fernando Limongi, citados por Melo (2002, p. 18; e 2004, p. 193), coletaram evidências que apontaram elevados índices de disciplina partidária e de consistência ideológica entre os partidos políticos. (ANDRADE, 2006).
32
compõem o veto player coletivo. Assim, um veto player coletivo que conta com mais
membros será mais coeso que outro que tenha menos componentes.
O sistema eleitoral é outro fator que pode influenciar a coesão pelo tamanho da
coalizão: o sistema majoritário ajuda a criar amplas coalizões, significando que sua coesão é
reduzida, tendo em vista a possibilidade de ser composta por atores com pontos ideais
diferentes; já o sistema de representação proporcional confere às lideranças controle sobre as
indicações dos candidatos, aumentando a disciplina partidária.
Quanto à estrutura institucional, Mainwaring (citado por Tsebelis 1995) identificou
que o presidencialismo leva à falta de coesão porque o presidente explora as
diferenças entre partidos para construir coalizões que sustentem seu programa.
(GUEDES, 2007)
Nos processos decisórios, para que haja uma mudança no status quo, é necessário que
haja a concordância de determinados veto players, sendo determinantes seu número, sua
congruência (ou seja, a convergência de suas posições políticas) e sua coesão. Assim, num
sistema político, a estabilidade das políticas varia de acordo com o número, a congruência e a
coesão dos veto players.
Havendo mudança na identidade ou na posição de um veto player, isso pode ser
refletido nas políticas públicas. Assim, quanto maior for o número de veto players, menos
significativo será o impacto da modificação marginal de um deles. Essa mudança pode estar
associada ou não às eleições. Pode haver eleições que não mudem os atores no poder; pode
haver mudança de atores por meio de eleições sem que haja mudanças políticas; e pode haver
mudança nas políticas sem a mudança de atores.
A instabilidade das políticas públicas causa a instabilidade dos veto players. O grande
número de parceiros do governo, a falta de congruência e coesão entre eles provocam a
instabilidade. Tsebelis citado por Guedes (2007) considera que um sistema incapaz de
produzir mudanças pode sofrer de instabilidade de governo ou de regime, bem como ver
juízes e burocratas preenchendo o vácuo político deixado pelos legisladores, passando a
exercer a atividade legislativa.
O modelo do veto player pode ser ampliado para incluir as Cortes Supremas, as maiorias qualificadas, os referendos, as estruturas corporativistas do processo
33
decisório, os governos locais e outros mecanismos institucionais. Pode também ser usado para gerar previsões acerca da importância e da independência do judiciário e da administração pública. Se os tribunais e as burocracias quiserem que suas decisões se sustentem e não sejam invalidadas pelos atores políticos, sua posição será mais independente e mais importante nos sistemas que contam com múltiplos veto players incongruentes e coesos. (TSEBELIS, 1995).
3.3 A formação das coalizões partidárias
O presidencialismo de coalizão18, expressão criada por Sérgio Abranches em 1988,
hoje de uso corrente, traduz-se no envolvimento dos membros dos partidos aliados ao
Executivo nas tarefas de governo.
O Brasil é o único país que, além de combinar a proporcionalidade, o multipartidarismo e o “presidencialismo imperial19”, organiza o Executivo com base em grandes coalizões. A esse traço peculiar da institucionalidade concreta brasileira chamarei, à falta de melhor nome, “presidencialismo de coalizão”. (ABRANCHES, 1988, pp. 21-22).
Nas coalizões os partidos aliados participam da condução do governo e,
reciprocamente, o Executivo recebe o devido apoio legislativo. O presidente da República
distribui as pastas ministeriais objetivando a obtenção de apoio no Congresso. Os ministros
controlam recursos financeiros e nomeações de cargos, usando-os para favorecer e controlar
os membros dos partidos que apóiam o Presidente. E partidos que recebem Pastas são
membros do governo e devem comportar-se como tal, votando a favor das iniciativas
promovidas pelo Executivo.
O Executivo controla uma grande variedade de recursos, utilizando-os para a obtenção
de apoio e votos para seus projetos no Legislativo. Com isso, quando há situações de conflito, 18 “O presidencialismo de coalizão seria aquele sistema de governo que combinaria, de maneira única no mundo, a proporcionalidade na distribuição dos assentos parlamentares; o multipartidarismo derivado das diferenças sociais, políticas, econômicas e regionais; e o presidencialismo imperial, daí derivando a necessidade de organizar o Executivo, mais especificamente os Ministérios e os cargos à disposição, em bases de amplas coalizões”. (ABRANCHES apud GROHMAN, 2003).19 No presidencialismo imperial observa-se a predominância do Poder Executivo, ancorado na independência dos Poderes. “(...) Nunca vi na história brasileira, em períodos que não são considerados ditaduras, uma tal concentração de poderes. O presidente concentra poderes do Legislativo, do Executivo e do Judiciário. Quando pressiona o Judiciário, quando impede ações diretas de inconstitucionalidade. Ele exercita o poder por meio de milhares de medidas provisórias. Isso caracteriza o presidencialismo imperial. (...)" (BENEVIDES apud MORAES, 2001).
34
interesses opostos de ambas as partes, abre-se espaço para a negociação acerca dos benefícios
da cooperação. “O Executivo controla recursos que os parlamentares desejam obter com
vistas à sua reeleição.” (FIGUEIREDO e LIMONGI, 1999, p. 32).
Em suma, o Chefe do Executivo controla a produção legislativa, interagindo seu poder
de agenda com o apoio da maioria reunida por uma coalizão partidária, que é obtida através
de negociações dirigidas pelas lideranças partidárias que formam a base do governo.
Tem-se, então, de um lado, um presidente com capacidade de definir sua agenda
política, mas que necessita da aprovação dos legisladores e, de outro, um Legislativo
controlado pelos líderes partidários, que são capazes de disciplinar o comportamento dos
legisladores em plenário, mas que necessitam da disponibilidade de recursos e cargos para
ampliar a influência de seus partidos.
Agindo individualmente, os parlamentares terão pequena capacidade de extrair benefícios do Executivo. Do ponto de vista do Executivo, negociar com partidos é vantajoso porque, desta forma, obtém apoio mais estável e previsível no longo prazo, reduzindo os custos de transação em que poderia incorrer se optasse pela negociação caso a caso. Na verdade, dada a distribuição de direitos legislativos em favor dos líderes partidários, a possibilidade de os partidos serem desconsiderados quer pelos parlamentares quer pelo Executivo é muito pequena. (FIGUEIREDO e LIMONGI, 2002).
A produção legislativa e a implementação de políticas públicas no Brasil dá-se nesse
arranjo político-institucional, onde o Executivo está em vantagem, pois tem a prerrogativa da
iniciativa legislativa em áreas fundamentais e de conduzir o andamento de suas propostas.
Mas, além de usar de modo estratégico todos os recursos à sua disposição, ele também deve
negociar com os parlamentares para a condução satisfatória de suas proposições e para a
preservação de sua base de apoio legislativa.
A frequência de coalizões reflete a fragmentação partidário-eleitoral, por sua vez ancorada nas diferenciações sócio-culturais; é improvável a emergência sistemática de governos sustentados por um só partido majoritário. Essa correlação entre fragmentação partidária, diversidade social e maior probabilidade de grandes coalizões beira o truísmo. É nas sociedades mais divididas e mais conflitivas que a governabilidade e a estabilidade institucional requerem a formação de alianças e maior capacidade de negociação. (ABRANCHES, 1988, p. 21)
Dado que o Executivo e o Legislativo são Poderes equilibrados, e ambos possuem
autonomia e recursos para intervir e influenciar o processo legislativo, entram em jogo os
35
acordos políticos e as estratégias de persuasão, que podem inclusive ocorrer dentro da base
aliada do governo, pois, sendo ela formada por vários partidos, é que se esperar que ocorram
interesses conflitantes entre os membros da coalizão ou entre estes e o Executivo, e há a
tentativa recíproca de extração de concessões com a finalidade de obtenção de apoio.
Dessa forma, há um ambiente de competição entre Executivo e Legislativo dentro do
processo legislativo, onde o Executivo leva vantagem porque atrai o apoio dos legisladores
através de seu poder de agenda, que é acompanhado da “chave do cofre”. Contudo, esse apoio
requer constantes negociações entre os partidos, as lideranças partidárias e o Executivo. Pode-
se inferir, então, que, dos acordos bem-sucedidos, resultam a aprovação dos projetos e a
implementação de políticas públicas. Já das negociações malsucedidas, ou inexistentes,
resultam os vetos por parte do Executivo e a rejeição de projetos, ou a apresentação de
emendas, por parte do Legislativo.
Na ausência de um acordo, pode ocorrer a aprovação de um projeto que não seja
interessante ao governo, ficando a este a tarefa de decidir se todo o texto ou parte dele são
inadequados. Assim, pode ser conveniente aos legisladores ficarem com o status de
defensores dos direitos e dos interesses de seus eleitores, ficando o ônus do veto ao
Executivo, que pode correr o risco de mobilizar a opinião pública, dependendo do teor do
trecho ou projeto vetado.
3.4 A disciplina das coalizões partidárias
Os poderes e atribuições do Chefe do Executivo, que lhe rendem larga vantagem,
ainda assim não são garantias por si só do bom andamento do governo, tendo em vista a força
que é peculiar ao Poder Legislativo. Com isso, é preciso negociar o plano de governo para
angariar apoio dos deputados, servindo-se estrategicamente das regras de funcionamento da
Casa Legislativa, que concentram o poder de decisão nos líderes partidários.
Os líderes partidários aliados ao Executivo buscam organizar e coordenar suas
bancadas para procurar obter resultados favoráveis ao governo. “Disciplina é a norma.
Deputados filiados aos partidos que fazem parte da coalizão de apoio ao presidente seguem a
36
recomendação de voto do líder do governo”. (LIMONGI, 2006). “A disciplina partidária pode
ser definida como o grau de unidade com que os partidos conduzem as votações nominais”.
(AMORIM NETO, 2000).
Dentro do vasto conjunto de instâncias e de órgãos decisórios que abrigam os legisladores e os líderes de coalizões, atenção especial deve ser conferida às lideranças partidárias e ao sistema de comissões. Segundo a maioria dos analistas, partidos e comissões são as duas mais importantes organizações que presidem os trabalhos legislativos. Ademais, tomando-se a democracia como um contexto decisório contínuo, pode-se afirmar serem as comissões e os partidos políticos os principais instrumentos de mediação entre cidadãos, legisladores e governantes, seja no plano da constituição do poder, seja no de seu exercício e de sua fiscalização. (ANASTASIA, MELO e SANTOS, 2004, p. 102).
Aos líderes partidários na Mesa Diretora e no Colégio de Líderes é concedido um papel
primordial na condução do processo legislativo, bem como na formação das comissões
permanentes. Os líderes partidários, dentre outras atribuições, têm a prerrogativa de nomear e
substituir, a seu critério, os membros das comissões. O Executivo, através dos líderes da
coalizão de governo, pode manipular as nomeações para as comissões, de modo a controlar
estrategicamente o resultado das votações, com o apoio dos parlamentares ligados aos seus
interesses.
É de se esperar a presença de comissões mais atuantes onde houver um Legislativo
mais proativo e mais oposicionista, bem como lideranças partidárias mais atuantes onde
houver um Executivo mais proativo e bancada majoritária aliada ao governo. As comissões
atuantes agem como forças centrífugas e descentralizantes, porém, podem ser neutralizadas
pelos líderes partidários, que têm competência para retirar um projeto das comissões e enviá-
lo à apreciação do plenário, através da aprovação de um requerimento de urgência.
No Brasil, identificar as preferências do presidente é muito fácil por causa da regra que autoriza o Chefe do Executivo a nomear um líder do governo na Câmara. O papel deste líder é informar os parlamentares e líderes de partido a posição do presidente a respeito das matérias em discussão, e negociar com esses interlocutores. Antes de se iniciar uma votação nominal, o presidente da Câmara pergunta ao líder do governo qual a posição do Executivo relativa à matéria a ser votada. (AMORIM, 2000)
Quadro 2: Texto integral dos Artigos 10 e 11 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados
Art. 10 - O Líder, além de outras atribuições regimentais, tem as seguintes prerrogativas: I - fazer uso da palavra, nos termos do art. 66, §§ 1º e 3º, combinado com o art. 89; II - inscrever membros da bancada para o horário destinado às Comunicações Parlamentares;
37
III - participar, pessoalmente ou por intermédio dos seus Vice-Líderes, dos trabalhos de qualquer Comissão de que não seja membro, sem direito a voto, mas podendo encaminhar a votação ou requerer verificação desta;
IV - encaminhar a votação de qualquer proposição sujeita à deliberação do Plenário, para orientar sua bancada, por tempo não superior a um minuto;
V - registrar os candidatos do Partido ou Bloco Parlamentar para concorrer aos cargos da Mesa, e atender ao que dispõe o inciso III do art. 8º;
VI - indicar à Mesa os membros da bancada para compor as Comissões, e, a qualquer tempo, substituí-los.
Art. 11 - O Presidente da República poderá indicar Deputados para exercerem a Liderança do Governo, composta de Líder e cinco Vice-Líderes, com as prerrogativas constantes dos incisos I, III e IV do art. 10.
A necessidade da formação de uma coalizão partidária pode ser entendida como a
expressão das dificuldades enfrentadas pelo Executivo para governar. Os obstáculos
enfrentados pelo Executivo na aprovação de suas propostas têm relação direta com a
amplitude dos recursos à sua disposição e com o apoio obtido dentro do Legislativo através da
coalizão partidária, construída e mantida à custa de negociações envolvendo aprovação e
liberação de verbas orçamentárias e de nomeações para cargos públicos permitidas ao
Executivo.
Através das negociações feitas com os líderes partidários, o Executivo consegue impor
suas preferências. Mas os partidos cooperam com o governo quando obtêm vantagens, que
podem ser o acesso de recursos clientelísticos e a implementação de projetos de sua
preferência, bem como a ocupação de cargos no Executivo, que são mantidos com o apoio
dado pelo partido ao governo nas votações.
“Se o partido do presidente (ou a coalizão governista) dispuser de uma maioria na Câmara, o Executivo pode contar com os líderes do partido para requerer urgência para as propostas que mais lhe interessarem ver aprovadas. A combinação de medidas provisórias, vetos e pedidos de urgência fornece ao Executivo um poderoso conjunto de instrumentos para controlar a agenda do Congresso, bloqueando legislação que não lhe interesse e promovendo aquelas consideradas prioritárias”. (PEREIRA e MUELLER, 2000).
“Um fator de grande importância nas relações entre Executivo e Legislativo na
América Latina é a habilidade dos presidentes para forjar maiorias que respaldem suas ações”
(AMORIM NETO, 2000). "[...] os problemas do presidencialismo não se encontram na arena
do Executivo, mas na do Legislativo". (Sartori apud AMORIM NETO, 2000).
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“Por ser um sistema instável, o presidencialismo na América Latina requer um
trabalho constante da presidência no sentido de negociar e recompor o pacto governativo,
além de exigir que seja garantida a implementação de ‘políticas substantivas’”. (GROHMAN,
2003).
... O funcionamento do Poder Legislativo e sua capacidade de tomar decisões estáveis exigem um conjunto de procedimentos e de instâncias decisórias muito mais sofisticadas do que a simples aplicação da regra da maioria. Por consequência, o Poder Legislativo é uma organização complexa, atravessada por um conjunto diversificado de instâncias decisórias dirigidas pelos chamados “líderes de coalizões” (ARNOLD, 1990) que, juntos, constituem uma elite parlamentar composta pelos membros da Mesa, especialmente seu presidente; pelos líderes das bancadas partidárias e dos blocos parlamentares; pelos colegiados que congregam as lideranças partidárias; e pelos presidentes de comissões. (ANASTASIA, MELO E SANTOS, 2004, p. 101).
Entre as atribuições dos líderes está a organização da Ordem do Dia, juntamente com a
Mesa Diretora. Isso equivale a dizer que eles também possuem o poder de agenda e que têm a
capacidade de controlar os trabalhos legislativos.
A tabela abaixo mostra a disciplina legislativa nas votações nominais na Câmara dos
Deputados, no período de 1995-1998.
3.5 A formação dos Gabinetes no Executivo e seu impacto nas votações legislativas
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De acordo com AMORIM NETO (2000), os partidos que compõem a coalizão
governista normalmente recebem recompensas ministeriais20 proporcionais ao seu peso no
Legislativo, mas, como nos sistemas presidencialistas a Constituição dá ao Presidente a
prerrogativa de nomear seus assessores, ele pode nomear um Ministério21 multipartidário, que
não necessariamente recompense os partidos de acordo com o princípio da proporcionalidade.
A combinação de sistema presidencialista, representação proporcional de lista aberta e sistema parlamentar fragmentado leva o Chefe do Executivo, na intenção de implementar sua agenda de políticas públicas, a distribuir pastas ministeriais entre membros dos principais partidos, na esperança de obter em troca o apoio da maioria do Congresso. (SANTOS, 2002).
O Executivo pode firmar acordos diferentes com os partidos que compõem a coalizão
governista, sem que esses acordos comprometam um partido com o outro. AMORIM NETO
(2000) avalia a formação dos Gabinetes de acordo com o seu grau de coalescência: quanto
maior a proporcionalidade entre as cotas ministeriais dos partidos e seus pesos parlamentares,
mais coalescente será o Ministério, e afirma que “uma coisa é formar um Gabinete de
coalizão, outra é administrar um governo de coalizão”.
Quando a taxa de coalescência do Gabinete é alta, o Executivo conta com grande
respaldo partidário e tende a implementar políticas pela via legislativa normal, tendo em vista
que a coalizão partidária assegura-lhe a base de apoio no Legislativo. Porém, quando o
Executivo conta com maior poder de decreto, a taxa de coalescência deixa de ser
imprescindível, pois ele pode recorrer às medidas provisórias, instrumento unilateral de
decisão, para implementar suas políticas.
Assim, para evitar a confusão conceitual entre a formação de uma coalizão e a sua administração, proponho que a definição de Gabinete de coalizão em um sistema presidencialista se baseie simplesmente na existência de um acordo entre o presidente e mais de um partido em torno da nomeação de ministros... se os acordos de coalizão preveem uma distribuição proporcional entre as cotas ministeriais e o peso parlamentar das legendas, os partidos22 coligados provavelmente se
20 Em sistemas multipartidários, além do poder parlamentar, fonte aliás incerta de influência legislativa, é fundamental ter acesso aos cargos governamentais que alocam recursos públicos e regulam as atividades dos agentes econômicos e sociais. Daí a importância, no Brasil, de se ter acesso aos cargos do Executivo (...) A decisão dos deputados em participar de coalizões de apoio presidencial dependerá, portanto, não somente do grau de concordância com o programa de governo, mas também do acesso dado por essa cooperação a cargos políticos (SANTOS, 1997).21 Os termos Gabinete e Ministério são aqui utilizados de maneira indiferente, e podem ser entendidos como o conjunto de assessores do presidente com status ministerial.
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comportarão de modo disciplinado em relação às preferências do Executivo em votações nominais. (AMORIM NETO, 2000)
Um Gabinete composto por políticos de dois ou mais partidos não pressupõe a
constituição de um governo de coalizão, que só pode ser considerado como tal quando o
Gabinete apresenta uma alta correspondência entre o percentual de postos ministeriais e os
pesos dos partidos no Legislativo. “A proporcionalidade das cotas ministeriais é uma solução
de equilíbrio para os problemas de negociação que o presidente e os partidos enfrentam na
partilha do poder Executivo”. (AMORIM NETO, 2000)
3.6 O poder de agenda do Chefe do Executivo
O poder de agenda do Chefe do Executivo constitui-se na sua capacidade de controle
exercido sobre o conteúdo, a forma e a ocasião em que as matérias são apreciadas no
Legislativo. Esse controle é obtido por intermédio de suas atribuições institucionais, bem
como por meio do apoio de sua base partidária, reunida e mantida sob a coordenação dos
líderes, através da distribuição de cargos e de recursos públicos.
No Brasil, atribuiu-se ao Poder Executivo uma série de mecanismos de intervenção no
processo legislativo, o que possibilitou a concentração de poderes em suas mãos, habilitando-
o a um maior controle sobre a produção legislativa e sobre a agenda. A capacidade de propor
legislação, a possibilidade de retirar propostas das comissões através do pedido de urgência e
o poder de vetar projetos aprovados que firam seus interesses asseguram ao Executivo meios
expressivos para impor sua agenda, tornando-o um ator que se move em primeiro lugar,
podendo antecipar e influenciar a decisão de outros atores. “A agenda política atual assume
contornos de uma agenda imposta”. (SANTOS, 1997).
O poder de agenda é obtido através da capacidade de propor legislação garantida ao
Executivo pela Constituição e pela centralização do poder de decisão nas mãos dos líderes no
Legislativo. O processo de tomada de decisão dos legisladores é fortemente controlado pelo
22 Figueiredo e Limongi afirmam que os partidos brasileiros são bastante disciplinados e se comportam de maneira previsível.
41
Executivo, que logra a aprovação da maioria de suas propostas, visto estar amparado por
consistente apoio partidário.
O controle da agenda legislativa consiste na manipulação das propostas que serão
apreciadas e na determinação do rito e do ritmo dessa apreciação em plenário, objetivando a
concretização de políticas públicas, a obtenção de recursos e a conformação e/ou mudança
institucional, com base nos interesses políticos do Chefe do Executivo, fundados a partir do
programa de governo que o elegeu. Portanto, seu poder de agenda permite-lhe manipular
estrategicamente a distribuição das matérias apreciadas pelos legisladores.
Para a aprovação de sua agenda23, o Chefe do Executivo precisa obter votos no
Parlamento, que lhe são concedidos também através dos recursos orçamentários previstos
pelas emendas realizadas após as negociações com os legisladores, intermediadas pelos
líderes partidários. Tem-se, portanto, a existência de uma relação direta entre os votos obtidos
em apoio à sua agenda e a liberação de recursos orçamentários para o atendimento de
interesses dos parlamentares.
O Executivo domina o processo legislativo porque tem poder de agenda e esta agenda é processada e votada por um Poder Legislativo organizado de forma altamente centralizada em torno de regras que distribuem direitos parlamentares de acordo com princípios partidários. No interior deste quadro institucional, o presidente conta com os meios para induzir os parlamentares à cooperação. Da mesma forma, parlamentares não encontram o arcabouço institucional próprio para perseguir interesses particularistas. Ao contrário, a melhor estratégia para a obtenção de recursos visando a retornos eleitorais é votar disciplinadamente. (FIGUEIREDO e LIMONGI, 1999, p. 22-23).
3.7 Poder de agenda versus poder de veto
23 Para SANTOS (1997), “existem dois recursos básicos mediante os quais uma coalizão de apoio pode ser formada ou mantida: utilização estratégica da patronagem e poder de agenda. Em particular, mostro que a patronagem, quando acompanhada de poder de agenda fornece colaboração parlamentar mais segura do que quando lideranças e presidente empregam apenas o primeiro desses recursos”.
42
O veto pode ser considerado um “termômetro” da eficiência da gestão da agenda por
parte do Executivo, tendo em vista ser um controle posterior, que incide no produto final do
processo legislativo, quando o controle da agenda é insuficiente para impedir a aprovação de
um projeto em desacordo com os interesses do Executivo. Diante dos argumentos expostos
até o momento, está claro que, quanto maior a frequência de vetos, menor a eficiência desse
controle.
Levando-se em conta as condições institucionais, políticas, econômicas e sociais do Brasil, são visíveis as dificuldades que qualquer governo pode enfrentar para atender às demandas da sociedade e produzir políticas em benefício da maioria da população. Ou seja, é evidente o risco de ocorrência de crises que impeçam o bom andamento do governo, devido em grande parte ao nível de conflito percebido dentro do Legislativo e entre este e o Executivo. (MOYA, 2005).
Se o controle da agenda fosse perfeito, todos os projetos aprovados pelos legisladores
estariam de acordo com os interesses do Executivo e não existiriam vetos. Se os vetos
ocorrem, é porque esse controle, apesar de predominante, não é total.
Assim, o veto pode passar a ser um instrumento de negociação para a elaboração de
outros projetos, mais próximos dos interesses dos dois Poderes, para substituir os rejeitados.
O veto fortaleceu a atuação do Chefe do Executivo, permitindo que ele atue positivamente no
processo legislativo.
No Brasil, o poder de agenda e o poder de veto estão combinados em um só ramo do governo, o Executivo, algo expressamente condenado nas obras de Montesquieu e dos federalistas norte-americanos. A distribuição de poderes no sistema político brasileiro desequilibra fortemente o mecanismo de freios e contrapesos em favor do Chefe do Executivo, dando a ele amplos recursos para que faça prevalecer a sua vontade. Sua posição em relação ao processo legislativo é extremamente confortável, pois além de ser o primeiro responsável por avaliar se cada projeto aprovado deve ou não entrar em vigor, ele também detém amplos recursos que facilitam a aprovação de suas políticas. (MOYA, 2005).
“A preponderância da vontade do Chefe do Executivo não se dá apenas durante a fase
de apreciação de uma proposta, mas também após sua aprovação, caso ele não seja do seu
interesse”. (MOYA, 2005).
4 FATORES ENDÓGENOS E EXÓGENOS AO PROCESSO LEGISLATIVO
LIGADOS À OCORRÊNCIA DE VETOS
43
Segundo MOYA (2005), sendo o veto parte do processo legislativo, pode-se afirmar
que, em consequência disso, está ele sujeito à influência de diversos fatores relacionados a
esse processo. Tais fatores podem estar estritamente ligados ao processo legislativo (fatores
endógenos), ou podem se sujeitar a fenômenos ligados ao relacionamento entre os Poderes
Executivo e Legislativo (fatores exógenos). Neste tópico apresentaremos as principais
variáveis analisadas pelo pesquisador.
4.1 FATORES ENDÓGENOS
Fatores endógenos são aqueles originados no processo legislativo, ligados às
características do projeto ou de sua tramitação. Os principais fatores aqui analisados são:
A origem do projeto;
O tema do projeto;
A incorporação de emendas aos projetos originais;
A tramitação em regime de urgência;
As votações nominais.
4.1.1 A origem do projeto
GROHMAN (2003), analisando os vetos apresentados pelo Executivo no período de
1990-2000, apontou que a maioria dos vetos totais atingem projetos originados no
Legislativo: 86% do total, com aproximadamente 60% de origem da Câmara dos Deputados.
Já no caso dos vetos parciais, há uma inversão, com 61% dos projetos atingidos com origem
no Executivo e 32,3% no Legislativo.
Segundo MOYA (2005), é evidente que os projetos apresentados pelos parlamentares
sejam alvos preferenciais dos vetos totais do Chefe do Executivo. O autor afirma que “tal
comportamento é compreensível e esperado, uma vez que não se pode achar comum que o
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Executivo impeça a entrada em vigor de propostas apresentadas por ele na mesma proporção
que o faz com as propostas originárias do Legislativo”.
A inserção de emendas pelos legisladores também pode levar o Chefe do Executivo a
vetar, total ou parcialmente, os projetos de sua própria autoria. Tais emendas podem alterar
substancialmente o conteúdo da matéria contida no projeto, desagradando o autor, que pode
optar por suspender temporariamente a implementação da política lá contida para reapresentá-
la num momento adequado, ou então vetar apenas as emendas apresentadas, preservando o
texto apresentado originalmente.
Outra possível explicação é que o projeto introduzido pelo Executivo pode, ainda na sua primeira versão, conter falhas, vícios ou inadequações que só são percebidos mais tarde, quando do exame do projeto já aprovado pelo Legislativo. Isto é particularmente relevante no caso de projetos elaborados por uma Secretaria, sem o conhecimento de outra. Depois de encaminhados ao Legislativo e aprovados, ao serem examinados mais detalhadamente, por outra Secretaria, esses projetos podem ser considerados inadequados e receberem recomendação de veto, total ou parcial. (MOYA, 2005).
Além dos casos em que o Executivo veta projetos de sua autoria, há também os casos
de veto a projetos apresentados pelo Chefe do Executivo do mandato anterior, o que
provavelmente ocorre quando as políticas do governo são divergentes daquelas defendidas
pelo seu antecessor.
Na próxima sessão, observaremos como se dá a ocorrência de vetos totais e parciais na
Assembleia Legislativa de Minas Gerais.
4.1.2 O tema do projeto
Em seus estudos, GROHMAN citado por MOYA (2005) analisou as áreas temáticas
dos projetos vetados e observou que a maioria dos vetos totais recai sobre projetos com tema
social (44%), seguida de tema econômico (16%). Já com relação aos vetos parciais, a situação
é oposta: a maioria incide sobre projetos com tema econômico (31%), seguida de projetos
com tema social (25,5%).
45
Por outro lado, Moya, ao apresentar os resultados de sua pesquisa, fez a seguinte
observação acerca do tema dos projetos:
Apenas os projetos com temas sociais apresentaram efeito consistente sobre a ocorrência dos dois tipos de veto, mas na direção contrária à expectativa: eles tendem a receber menos vetos que projetos econômicos. O tema administrativo tem influência apenas sobre os vetos parciais, mas agora na direção esperada, sendo menos propensos a sofrer vetos que os outros projetos. (MOYA, 2005).
Para GROHMAN (2003), a análise temática deve levar em conta a origem dos
projetos, tendo em vista que os projetos originados do Legislativo são, na sua maioria, de
temática social, e são também os que mais recebem vetos totais. Por outro lado, os projetos
originados do Executivo têm geralmente temática econômica, e são os que mais recebem
vetos parciais. Essa diferença temática já foi observada por FIGUEIREDO e LIMONGI
(1999), que observaram “uma agenda econômico-administrativa do Executivo e uma agenda
social do Congresso”.
Entre os projetos24 aprovados de 1988 a 2000, quase 60% dos que versaram sobre temas administrativos e mais de 75% dos que trataram de temas econômicos foram apresentados pelo Executivo, enquanto no mesmo período cerca de 58% dos projetos com temas sociais aprovados tiveram origem no Legislativo. (...) Os projetos com temas administrativos são os que mais raramente sofrem vetos, tanto parciais quanto totais. (MOYA, 2005).
Na sessão seguinte faremos uma análise temática da ocorrência de vetos na
Assembleia Legislativa de Minas Gerais, a partir do que estaremos aptos a comparar dados
levantados por outros autores e nossos levantamentos.
4.1.3 A incorporação de emendas aos projetos originais
Certamente, a incorporação de emendas é um fator que contribui para a ocorrência de
veto, especialmente quando as emendas recaem em projetos originados no Executivo.
Lamounier, citado por Moya (2005), verificou em seus estudos que as emendas em
projetos de autoria do Executivo são aquelas com mais risco de darem origem a disposições
vetadas. Investigou também a relação entre os vetos parciais e a filiação partidária dos autores
das emendas, e constatou que emendas apresentadas por membros de partidos oposicionistas 24 O autor trata de projetos analisados pelo Congresso Nacional.
46
estão mais sujeitas a veto que aquelas apresentadas por membros de partidos que compõem a
coalizão governista.
A apresentação de projetos e emendas é a principal arma dos parlamentares para fazer
valer seus interesses particulares. Porém, os projetos e as emendas ditados pela lógica eleitoral
individualista raramente atingem o plenário. A maioria deles dorme nas gavetas das
comissões. Analogamente, emendas tendem a ser rejeitadas em votações simbólicas em que
os líderes votam por suas bancadas.
Os parlamentares, individualmente, têm limitada capacidade de participar do processo
de tomada de decisões. A centralização nega-lhes o acesso necessário para influenciar a
legislação.
A inserção de emendas aos projetos originais é, certamente, um fator que propicia a
ocorrência de vetos, notadamente se tais projetos forem de autoria do Executivo. As
alterações feitas através de emendas podem alterar substancialmente o teor da matéria, indo
de encontro aos interesses do autor, que irá rejeitá-las no momento oportuno, ou seja, no
momento da apresentação do veto.
Segundo GROHMAN (2003), o sistema de emendas ao Orçamento é um ponto
sensível na relação Executivo-Legislativo. O projeto de lei orçamentária pode sofrer grandes
modificações no Legislativo. Contudo, o Executivo libera recursos àqueles que demonstram
sua lealdade votando de acordo com a vontade do governo.
No entanto, existem uma série de recursos que vão obstaculizando a vontade do Legislativo, terminando por proporcionar ao Executivo a garantia de fazer passar a sua proposta orçamentária. O veto é um deles. Os autores constroem o jogo do veto até o momento em que o Legislativo, uma vez consciente de que receberia o veto sobre suas emendas, não emendaria. (...) se o Legislativo soubesse que tem a maioria para derrubar o veto, ele emendaria o projeto. (GROHMAN, 2003).
LAMOUNIER, citado por MOYA (2005), verificou que os projetos de lei de autoria
do Executivo sofrem mais emendas que aqueles de autoria do Legislativo. O autor investigou
também a relação entre os vetos parciais e o partido dos autores das emendas. Para ele,
disposições resultantes de emendas apresentadas por legisladores filiados a partidos da
47
oposição devem receber mais vetos que as originadas por emendas de membros da coalizão
governista.
4.1.4 A tramitação em regime de urgência
O pedido de urgência é um recurso que pode ser utilizado pelos legisladores e pelo
Chefe do Executivo, que gera a dispensa de exigências cabíveis no trâmite regimental das
propostas legislativas, como interstícios e certas formalidades regimentais, e que pode retirar
as matérias das comissões e encaminhá-las ao plenário para votação. É também um meio
usado pelos líderes partidários quando outras estratégias regimentais não foram suficientes
para a obtenção de apoio dentro do Legislativo.
A tramitação de projetos de lei em regime de urgência será objeto de análise na
próxima seção desta monografia. De qualquer maneira, podemos inferir que a urgência,
encurtando o prazo para a análise das matérias, reduz as chances de os parlamentares
estudarem mais profundamente o assunto e, assim, diminui também a possibilidade de
ocorrência de vetos.
A urgência pode ser interpretada como uma necessidade aguda e em curto prazo. É plausível supor que alguém que necessite de algo em curto prazo esteja mais propenso a negociar, a fazer concessões para obter o que deseja. Logo, um projeto de lei que é fortemente desejado por um dos atores envolvidos deverá ser menos propenso a sofrer um veto, à medida que o lado mais interessado no projeto, o que solicitou a urgência, deverá ter incentivos para negociar e assim tê-lo de fato aprovado mais rapidamente. Essa negociação poderá ou não envolver apenas o conteúdo do projeto em questão, mas isso é indiferente para o efeito sobre as chances de veto. (MOYA, 2005).
O pedido de urgência é um indicador da importância do projeto para seu autor,
podendo-se inferir que este autor deve demonstrar uma disposição para negociar. “Uma vez
que, em um sistema político, a ideia de negociação é diametralmente oposta à ideia de
ocorrência de vetos, é razoável prever uma relação inversamente proporcional entre a
ocorrência de pedidos de urgência (de qualquer origem) e a de vetos.” (MOYA, 2005).
Contudo, em nosso arranjo institucional, onde é possível a oposição do veto parcial,
pode ocorrer também que, sendo o projeto de relevada importância para tramitar em regime
de urgência, sua análise será mais criteriosa e haverá maior negociação para a sua aprovação,
48
possibilitando, assim, a ocorrência de vetos parciais para adequação do conteúdo da matéria e
eliminação das partes indesejadas, e uma provável redução na ocorrência de vetos totais em
virtude das negociações em torno da aprovação do projeto.
SANTOS citado por MOYA (2005), afirma que “os pedidos de urgência são eficazes
apenas quando existe razoável grau de consenso entre as lideranças partidárias de que o
projeto não criará dificuldades eleitorais ou programáticas para os membros de sua bancada”.
De outra maneira, a solicitação de urgência poderá levar os legisladores a desejarem
apresentar emendas, o que seria um complicador para a aprovação do projeto, ao invés de um
facilitador.
Para MOYA (2005), quanto mais longa for a tramitação de um projeto, mais prováveis
são os vetos, totais e parciais. Os projetos aprovados em regime de urgência, ou seja, em
menos de dois meses, têm chances remotas de sofrerem veto. Por outro lado, projetos que
tramitam por mais de um ano têm a chance de ocorrência de veto aumentada
consideravelmente.
É importante destacar que, quando é feito um pedido de urgência para uma proposta, a
comissão tem somente duas sessões para analisar, emitir seu voto e encaminhar o projeto para
o Plenário. Tendo em vista ser um prazo curto, é possível que a comissão não consiga analisar
a proposta que haja recebido pedido de urgência. “Hoje em dia, observa-se a grande maioria
dos projetos do Executivo ser aprovada em regime de urgência, o que não permite uma
apreciação acurada de seu conteúdo” (FIGUEIREDO e LIMONGI apud SANTOS, 1997).
Além de alterar o ritmo da tramitação da matéria, retirando-a da comissão e forçando a pronta manifestação do plenário, a aprovação do requerimento de urgência limita a capacidade dos próprios parlamentares de apresentar emendas ao projeto. Para ser considerada, a emenda tem que atender a um dos seguintes requisitos: ser apresentada por uma das comissões permanentes, ser subscrita por 20% dos membros da Casa, ou ser subscrita por líder partidário que represente essa percentagem de deputados. A limitação à apresentação de emendas e seu controle pelos líderes partidários tolhem a ação dos deputados, retirando-lhes a possibilidade de defender com sucesso os interesses específicos a seu eleitorado a partir de uma estratégia individual. (FIGUEIREDO e LIMONGI, 1999, p.29).
Quadro 3: Artigo do Regimento Interno da Câmara dos Deputados que trata da tramitação de matéria urgente
Art. 157 - Aprovado o requerimento de urgência, entrará a matéria em discussão na sessão imediata, ocupando o primeiro lugar na Ordem do Dia.
49
§ 1º - Se não houver parecer, e a Comissão ou Comissões que tiverem de opinar sobre a matéria não se julgarem habilitadas a emiti-lo na referida sessão, poderão solicitar, para isso, prazo conjunto não excedente de duas sessões, que lhes será concedido pelo Presidente e comunicado ao Plenário, observando-se o que prescreve o art. 49.
§ 2º - Findo o prazo concedido, a proposição será incluída na Ordem do Dia para imediata discussão e votação, com parecer ou sem ele. Anunciada a discussão, sem parecer de qualquer Comissão, o Presidente designará Relator que o dará verbalmente no decorrer da sessão, ou na sessão seguinte, a seu pedido.
§ 3º - Na discussão e no encaminhamento de votação de proposição em regime de urgência, só o Autor, o Relator e Deputados inscritos poderão usar da palavra, e por metade do prazo previsto para matérias em tramitação normal, alternando-se, quanto possível, os oradores favoráveis e contrários. Após falarem seis Deputados, encerrar-se-ão, a requerimento da maioria absoluta da composição da Câmara, ou de Líderes que representem esse número, a discussão e o encaminhamento da votação.
§ 4º - Encerrada a discussão com emendas, serão elas imediatamente distribuídas às Comissões respectivas e mandadas a publicar. As Comissões têm prazo de uma sessão, a contar do recebimento das emendas, para emitir parecer, o qual pode ser dado verbalmente, por motivo justificado.
§ 5º - A realização de diligência nos projetos em regime de urgência não implica dilação dos prazos para sua apreciação.
O direito de requerer urgência para seus projetos, por sua vez, confere ao presidente recurso de enorme valor em se tratando da atividade parlamentar: tempo. Tramitação em regime de urgência significa que o pronunciamento da Câmara sobre determinada matéria deve ser feito em prazo estipulado legalmente. Isto é, independentemente da complexidade do assunto e dos interesses envolvidos, o projeto chegará ao plenário, tenha ou não a comissão pertinente emitido parecer. Além disso, é evidente que quanto maior o tempo destinado em plenário a matérias enviadas por iniciativa presidencial, fato imposto pela prerrogativa da urgência, menor o tempo livre para considerar matérias originadas na própria Câmara. (SANTOS, 1997).
4.1.5 As votações nominais
As votações nominais, na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, ocorrem na
apreciação de matérias para as quais é exigido quorum especial de votação, tais como projetos
de emenda à Constituição e projetos de Lei Complementar, ressalvadas as hipóteses de
escrutínio secreto.
A votação nominal pode ocorrer também quando surgirem dúvidas sobre o resultado
de uma votação simbólica. Também pode ocorrer votação nominal quando solicitada por
qualquer parlamentar e aprovada pelo plenário, quando sua necessidade e seus motivos são
debatidos pelos parlamentares e os líderes partidários têm a oportunidade de recomendar o
voto à sua bancada.
50
As votações nominais podem ser utilizadas pela oposição para a exposição do voto
dos membros da coalizão governista em decisões impopulares. Podem ser usadas também
pela situação para a verificação do voto dos aliados, como uma forma de controle da coalizão.
Tal como a solicitação de urgência para a apreciação do projeto, a votação nominal
pode ter relação com a ocorrência de vetos no sentido de que revela o caráter de importância
do projeto, colocando-o em evidência e despertando a atenção dos legisladores para sua
responsabilidade acerca da votação, tendo em vista que a revelação do voto aos eleitores
envolve o conhecimento e a apreciação da opinião pública, o que pode tornar os legisladores
mais cautelosos.
Assim, a votação nominal pode, tal qual o regime de urgência, ocasionar o aumento da
ocorrência de vetos parciais e a diminuição dos vetos totais. Segundo MOYA (2005), com a
votação simbólica ocorre o oposto: os projetos aprovados em votação simbólica são os menos
polêmicos e geradores de menor ou nenhum conflito partidário, chamando menos a atenção
do público, por isso mesmo alvos mais frequentes de vetos totais e menos frequentes de vetos
parciais.
Já entre os projetos aprovados nominalmente (...) A proporção de vetos parciais é de exatamente um veto desse tipo para cada três projetos, ao passo que a frequência de vetos totais não chega a 5%, um número próximo ao de vetos totais ocorridos em projetos que tramitaram sob urgência (6%). Esses resultados fornecem mais evidências de que projetos importantes impõem custos maiores para ser vetados totalmente, e que simultaneamente estão mais sujeitos a sofrer vetos parciais, possivelmente porque sofrerão um exame mais meticuloso e menos tolerante por parte do presidente (MOYA, 2005).
4.2 FATORES EXÓGENOS
As origens do veto podem se encontrar além dos limites do processo de tramitação.
Como a atividade legislativa fortemente determinada pela relação entre Executivo e
Legislativo, os principais fatores exógenos aqui analisados ligados à interação desses dois
Poderes que podem ter impacto sobre a ocorrência de vetos são:
O tamanho da coalizão partidária;
A disciplina da coalizão;
51
A aprovação popular do Chefe do Executivo;
O partido do autor do projeto;
O calendário eleitoral.
4.2.1 O tamanho da coalizão partidária
Como já mostramos anteriormente, a formação de uma coalizão, a fim de constituir
uma base de apoio no Legislativo, é essencial para a estabilidade do governo e para a
aprovação de seus projetos. Contudo, “se essa coalizão for de tamanho insuficiente, ou muito
heterogênea ideologicamente, poderão ser encontradas dificuldades para a aprovação de
matérias” (MOYA, 2005). Nessas condições, há a possibilidade de conflitos de interesse entre
Executivo e Legislativo, aumentando a possibilidade de ocorrência de vetos. Ou seja, quanto
menor ou mais heterogênea a coalizão, mais frequentes são os vetos.
GROHMAN e LAMOUNIER citados por MOYA (2005), relacionam a ocorrência de
vetos com o tamanho da coalizão partidária. Os autores mostram evidências de que essas duas
variáveis estão inversamente relacionadas. GROHMAN (2003) afirma que a disciplina
partidária determina o tamanho necessário de uma coalizão vencedora: se os partidos são
disciplinados, o Chefe do Executivo pode confiar em uma maioria restrita, tanto para apoiar
seus projetos quanto para manter seus vetos; já se os partidos são indisciplinados, será
necessária uma coalizão maior, a fim de compensar a insegurança, o que leva o Chefe do
Executivo a emitir menos vetos, temendo suas derrubadas.
MOYA (2005), afirma que o tamanho da coalizão foi a variável exógena que
apresentou maior influência sobre a ocorrência de vetos totais, na direção esperada: maiores
coalizões reduzem o risco de veto. Contudo, esta variável não tem efeito significativo sobre os
vetos parciais. O autor acredita que os vetos tornam-se mais raros com o aumento da coalizão,
mas tal efeito parece ser menor sobre os vetos parciais.Uma coalizão muito numerosa requer grande capacidade de coordenação. E garantir votos para a aprovação de um projeto é diferente de assegurar apoio em questões mais específicas envolvendo alterações no projeto, que podem criar divisões dentro das bancadas. Assim, se por um lado o Presidente conta com uma ampla base na Câmara, raramente precisa usar o veto total, por outro ele pode ter de recorrer a vetos parciais se os membros de sua coalizão, aproveitando-se de sua
52
situação privilegiada dentro daquela Casa ou de alguma falha nas negociações com o Executivo, promoverem alterações indesejadas nas propostas do governo. (MOYA, 2005).
Como é de se esperar, quando as coalizões são menores, são mais comuns os casos de
projetos vetados, tanto total quanto parcialmente. Contudo, quando as coalizões são amplas,
são mais raros os projetos vetados, total ou parcialmente, e mais comuns aqueles sancionados
sem veto.
4.2.2 A disciplina da coalizão partidária
O Legislativo brasileiro funciona de forma “racionalizada”, com forte delegação aos líderes. Os deputados, individualmente, possuem baixo poder de barganha e, ainda que em muitos casos estejam premidos por demandas específicas de suas bases, não conseguem influir de forma significativa na agenda legislativa. Dadas as regras estabelecidas para o processo legislativo, o mais razoável é buscar a cooperação com o líder. O resultado é um comportamento disciplinado das bancadas em plenário e uma taxa de sucesso próximo de 70% na aprovação da agenda presidencial. (MELO, 2007).
GROHMAN (2003) relaciona a disciplina partidária e a frequência de vetos da
seguinte forma: quanto mais disciplinadas as coalizões, com maior frequência o Executivo
fará uso do veto, com a segurança de que eles não serão derrubados; quanto menos
disciplinadas as coalizões, com menor frequência ocorrerá o veto, pois as garantias que o
Executivo tem que eles serão mantidos são pequenas.
Se a coalizão é disciplinada, isto permite um maior controle do Presidente sobre o processo legislativo, o que deveria reduzir a necessidade de vetar projetos. Em outras palavras, assim como uma coalizão disciplinada pode aumentar a frequência de vetos porque garante que eles sejam mantidos, ela também pode dar ao Presidente um maior controle sobre os trabalhos do Poder Legislativo, diminuindo a ocorrência de projetos indesejados e que seriam alvo de vetos. (MOYA, 2005).
Tem-se então que, ao passo que o tamanho da coalizão partidária pode diminuir a
ocorrência de vetos, pois o Executivo conta com parte representativa da Casa Legislativa
votando a favor de projetos do governo e negociando a aprovação de políticas de interesse dos
parlamentares, a disciplina da coalizão aumenta a ocorrência de vetos no sentido de que o
governo tem a certeza de que seu veto será mantido.
53
Para GROHMAN (2003), o nível de eficiência da disciplina da coalizão partidária
pode ter o seguinte significado: quanto maior a disciplina, mais recursos o Executivo investiu
para mantê-la. Isso quer dizer que, quanto mais parlamentares votando da mesma maneira
tiver a coalizão partidária, mais altos os custos de sua formação e manutenção.
4.2.3 A aprovação popular do Chefe do Executivo
A popularidade do Chefe do Executivo é um capital político valioso que pode ter efeitos não apenas sobre o funcionamento do governo, mas também sobre a sociedade como um todo. O carisma do Chefe do Executivo pode afetar o nível de confiança da população na maneira com que o país é governado. De um lado, uma alta popularidade pode permitir ao presidente fazer propostas mais ousadas e buscar soluções para questões mais complexas, devido ao apoio que ele mobiliza entre os cidadãos. De outro, ela pode fazer com que os parlamentares, mesmo aqueles que não compartilham exatamente das preferências do governo, tentem associar-se à imagem do presidente a fim de tentar absorver parte dessa popularidade, e com isso aumentar suas chances eleitorais. Consequentemente, situações de confronto com o presidente são evitadas exatamente para não atrair negativamente a atenção da população. (MOYA, 2005).
Com relação ao processo legislativo, a popularidade do Chefe do Executivo influencia
a forma com que os legisladores apreciam as propostas recebidas daquele Poder. Quando o
Chefe do Executivo é bem avaliado pela população, pode mais facilmente obter o apoio dos
parlamentares, tendo em vista que estes “deverão estar mais interessados em capitalizar o
possível sucesso das iniciativas presidenciais que entrar em conflito com elas e com a opinião
da população. Nesses casos, a quantidade de vetos deverá ser menor que a média.” (MOYA,
2005).
Contudo, o contrário ocorre quando o Chefe do Executivo possui pouca aprovação
popular: “os legisladores terão menos estímulos para colaborar com ele, ou ainda terão
incentivos para não cooperar e sim para criticá-lo com a finalidade de distanciar-se de um
governante malquisto pela população, e possivelmente apresentar-se como alternativa a ele
nas próximas eleições.” (MOYA, 2005). Tal situação pode acarretar ao Chefe do Executivo a
aprovação de projetos que contrariem a sua vontade, forçando-o a recorrer mais
frequentemente ao veto.
54
4.2.4. O partido do autor do projeto
Como é evidente, os projetos apresentados pelos partidos da oposição, não
participantes da bancada governista, tem maiores chances de serem vetados totalmente, uma
vez que suas preferências devem estar distantes das preferências do Executivo e a este não
interessa colaborar com quem não apoia sua coalizão governista. Já os vetos parciais que
possam atingir tais proposições possivelmente poderiam alcançar quaisquer outros projetos.
4.2.5 O calendário eleitoral
Em seus estudos, Moya concluiu não haver grande impacto do calendário eleitoral
sobre a ocorrência de vetos, totais ou parciais. O que o calendário eleitoral notadamente
influencia é o comportamento dos legisladores. O autor cita a obra de David Mayhew (1974),
a partir da qual disseminou-se o princípio de que os políticos têm como objetivo primordial a
sua reeleição.
O modo que o legislador dispõe para levar recursos à sua base eleitoral é através da
obtenção de apoio a projetos que beneficiem essa base, o que pode ser conseguido através de
negociações com outros legisladores, gerando acordos de apoio mútuo a projetos dos
legisladores envolvidos. Assim, podemos supor que os legisladores interessados na sua
reeleição procurarão apresentar mais projetos em períodos próximos à realização de eleições,
com o intuito de angariar mais votos de seu eleitorado, que visualizará, às vésperas do pleito,
algum tipo de resultado positivo de sua atividade parlamentar.
A perspectiva de término do período presidencial torna-se, consequentemente, sério complicador para a manutenção da coalizão de apoio nos últimos anos do mandato do presidente. (...) Vale dizer, à medida que o tempo de mandato passa, do ponto de vista do deputado tomado individualmente, diminui o valor da patronagem corrente e aumenta o valor da patronagem potencial a ser auferida da adesão a coalizões eleitorais alternativas. Nesse momento, tanto os membros de partidos governistas, quanto os de partidos oposicionistas redefinirão seu cálculo de cooperação ou conflito com a agenda presidencial (SANTOS, 1997).
55
Moya observou que, nos últimos seis meses de mandato, a frequência de vetos totais
diminui consideravelmente, demonstrando acomodação de interesses. Não se sabe, porém, se
o fim do mandato torna o governo menos rigoroso ou o Legislativo passa a aprovar projetos
que não contrariam as preferências do Executivo. “Não há evidências para dirimir essa
questão, mas a primeira explicação parece mais provável que a segunda.” (MOYA, 2005).
56
5 ANÁLISE DO PERFIL DO GOVERNADOR MINEIRO E DA OCORRÊNCIA DE
VETOS NA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DE MINAS GERAIS NO PERÍODO
DE 2003 A 2006
5.1 A popularidade do Governador
Aécio Neves da Cunha nasceu em Belo Horizonte, em 1960, em uma família de
tradição política: filho de Aécio Ferreira da Cunha e neto de Tancredo Neves. Iniciou sua
carreira política aos 22 anos, quando foi secretário particular de seu avô, o então governador
Tancredo Neves. Em sua primeira eleição, em 1986, recebeu 236.019 votos para deputado
federal. Em 1998, foi o deputado federal mais votado do PSDB em todo o país e também o
deputado reeleito com o maior número de votos em Minas Gerais, com 185.050 votos.
Foi deputado federal por quatro mandatos consecutivos. Em 1997, foi escolhido líder
do PSDB na Câmara dos Deputados e reconduzido a esse posto por quatro anos consecutivos.
Em 2000 foi eleito presidente da Câmara. Em janeiro de 2003 assumiu pela primeira vez o
governo de Minas Gerais, com 58% dos votos válidos. Nas eleições realizadas em 2006 foi
reeleito para seu segundo mandato, com 77,03% dos votos válidos, a maior votação da
história do Estado.
Em pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha em 26 de março de 2007, logo no
início de seu segundo mandato, o governador mineiro foi aprovado pela maioria dos
moradores do Estado: 71% consideraram seu governo ótimo ou bom; para 19% seu
desempenho foi apontado como regular; e ruim ou péssimo para 6%.
Na capital, Belo Horizonte, a aprovação a Aécio chega a 81%; no interior essa taxa é
de 67%. Em uma escala de zero a dez, o governador fica com nota média 7,6, sendo que, para
23% dos mineiros, ele merece nota dez, e, para 24%, nota oito.
O gráfico a seguir aponta a popularidade do Governador em três períodos: maio e
julho de 2006 e março de 2007.
57
Em pesquisa divulgada em 25 de março de 2009, o instituto de pesquisa Datafolha
avaliou que Aécio Neves é o primeiro colocado no ranking de governadores. Este ranking
leva em consideração, em primeiro lugar, a nota média atribuída aos governadores, em uma
escala de zero a dez, pela população maior de dezesseis anos de idade de nove Estados e do
Distrito Federal. O índice varia de 0 (ruim e péssimo) a 200 (aprovação absoluta). O índice de
popularidade de Aécio Neves é 171, que obteve a nota 7,6. Na opinião de 75% dos moradores
de Minas Gerais, o governador está fazendo um governo ótimo ou bom. Apenas 5% acham
que seu governo é ruim ou péssimo.
O governador é considerado um político jovem, o que é motivo de admiração, mas
também de críticas. Sobre essas críticas que recebe dos adversários políticos, Aécio Neves fez
a seguinte declaração, em 16 de dezembro de 2001, para o Jornal O Estado de São Paulo:
Sou um homem do meu tempo, da minha geração, com minhas angústias, com minhas expectativas. Não vou mudar, até porque não tenho obsessão. Que bom que depois de dezesseis anos de mandato as pessoas me acusam de ser jovem e de ser feliz. Se ser feliz é um defeito, quero tê-lo para o resto da vida. (VASCO, 2005).
Aécio Neves sempre manteve sua vida social, a despeito dos comentários que recebia
de seus oposicionistas, e não tentou esconder da imprensa que saía com amigos, namorava,
praticava esportes e aproveitava as horas de folga para relaxar. Sobre as críticas que recebia
Gráfico 1: Popularidade do Governador Aécio Neves
Fonte: Datafolha
58
durante seu primeiro mandato, fez a seguinte declaração para o Jornal do Brasil, em 5 de abril
de 1987:
(...) se querem me cobrar, me cobrem pelo que fizer como político pela minha região, me cobrem pelo que fizer ou deixar de fazer na Constituinte. Mas não me cobrem por uma fotografia numa escola de samba no carnaval, porque eu não vou me moldar ao papel do político tradicional. Eu não vou entrar nessa camisa de força, e não me cobrem por isso, porque me sentirei no direito de cobrar a coerência do discurso progressista de quem me cobrar... (VASCO, 2005).
Segue abaixo a tabela com o resultado da pesquisa que avaliou a popularidade dos
governadores, realizada entre os dias 16 e 19 de março de 2009, em que a margem de erro é
de dois pontos percentuais para mais ou para menos.
5.2 O tamanho e a disciplina da coalizão governista
A coligação que elegeu Aécio Neves para o seu primeiro mandato, objeto de nossa
análise, era composta dos seguintes partidos: PSDB, PFL, PPB, PAN, PRTB, PHS, PV e
Tabela 3: Ranking de popularidade dos Governadores brasileiros
Fonte: Datafolha
59
PTN. Aécio Neves foi eleito em primeiro turno com 57,68% dos votos, enquanto seu
concorrente mais próximo, Nilmário Miranda, obteve 30,73% dos votos. Os outros quatro
candidatos obtiveram, juntos, 11,6% dos votos válidos.
A tabela abaixo nos permite comparar a dimensão das coligações mais votadas: a
Coligação “Minas Unida”, vencedora das eleições, e sua concorrente, a Coligação “Nilmário
Governador”, a segunda colocada. Nota-se que a coligação que elegeu Aécio Neves era
consideravelmente maior, composta por nove partidos, ao passo que a coligação que apoiou
Nilmário Miranda era formada por cinco partidos. Nota-se ainda que o investimento
financeiro feito na campanha do governador eleito foi três vezes maior que o da campanha
concorrente.
Tabela 5: Coligações mais votadas nas eleições para Governador em Minas Gerais, para o mandato 2003-2006
COLIGAÇÕESColigação “Minas Unida”
Partidos que compõem a coligação:PSDB, PFL, PPB, PSL, PAN, PRTB, PHS, PV e PTN
Candidatos:Governador: Aécio Neves (PSDB) 45Vice: Clésio Andrade (PFL)Valor máximo de gastos: R$15.000.000,00
Coligação “Nilmário Governador”
Partidos que compõem a coligação: PT, PL, PC do B, PCB e PMN
Candidatos:Governador: Nilmário Miranda (PT) 13Vice: Danusa Bias Fortes Carneiro (PL)Valor máximo de gastos:5.000.000,00
Fonte: TRE-MG
Tabela 4: Votação final dos candidatos a Governador em Minas Gerais Data: 09/10/2002
Partido Número Candidato Número de Votos % válidosPSDB 45 Aécio Neves 5.282.043 57,68
PT 13 Nilmário 2.813.857 30,73
PMDB 15 Newton Cardoso 612.732 6,69
PSB 40 Margarida Vieira 418.803 4,57
PSTU 16 Cacau 18.265 0,20
PCO 29 Taquinho Carteiro 10.110 0,11
PSDC 27 Marco Aurélio Carone 2.372 0,03
Total de votos: 10.514.082 Eleitorado: 12.680.584Votos brancos: 546.052 ( 5,19 %) Abstenção: 2.166.502 ( 17,09 %)Votos nulos: 809.848 ( 7,70 %) Comparecimento: 10.514.082 ( 82,91 %)Votos válidos: 9.158.182 ( 87,10 %)Fonte: TRE-MG
60
Diante das informações levantadas, pode-se afirmar que o governador mineiro dispõe
de muitos recursos, tendo em vista sua popularidade e a representatividade da coligação que o
apoia, mas, mesmo assim, precisa do apoio da Assembleia Legislativa para governar.
Visto que o sistema brasileiro de representação reproduz, no Poder Legislativo, a
pluralidade de interesses presentes na sociedade, o governador precisa envidar esforços no
sentido de procurar atender aos anseios dos representantes dessa sociedade e, ao mesmo
tempo, obter apoio para a implementação de seu plano de governo.
Na Assembleia Legislativa, no mandato 2003-2006, o PSDB, partido do Governador,
elegeu 11 deputados. Os partidos que fizeram parte da coligação elegeram 14 deputados,
ficando a bancada partidária do governo com 25 deputados. Vale ressaltar que o partido do
Presidente da Assembleia, Alberto Pinto Coelho, reeleito em 2009 para uma novo mandato,
faz parte da coligação.
Tabela 6: Deputados eleitos pela coligação vencedora para a legislatura 2003-2006
Partido Número Candidato n° de votos
% válidos
PAR
TID
O D
O G
OV
ER
NA
DO
R P60SDB 45155 Toninho Andrada 75.947 0,79PSDB 45789 Ana Maria 73.431 0,77PSDB 45200 Djalma Diniz 72.831 0,76PSDB 45444 Vanessa Lucas 64.601 0,68PSDB 45999 Luiz Humberto 60.019 0,63PSDB 45125 Maria Olívia 57.042 0,60PSDB 45151 Elbe Brandão 54.347 0,57PSDB 45123 Ermano Batista 54.090 0,57PSDB 45220 Fahim Sawan 52.364 0,55PSDB 45240 Mauri Torres 49.987 0,52PSDB 45600 Domingos Sávio 46.056 0,48
PAR
TID
OS
DA
CO
LIG
AÇ
ÃO PPB 11678 Dimas Fabiano 79.47 0,83
PPB 11210 Gil Pereira 74.502 0,78PFL 25120 Alberto Bejani 69.310 0,72PPB 11456 Pinduca 58.954 0,72PPB 11211 Luiz Fernando 65.451 0,68PFL 25115 Olavo Bilac Pinto 61.560 0,64PPB 11111 Alberto Pinto Coelho 58.333 0,61PPB 11222 Dalmo Ribeiro Silva 57.739 0,60PFL 25125 Paulo Piau 52.786 0,55PFL 25250 Reminho Aloise 50.074 0,52PFL 25234 Sebastião Navarro Vieira 50.073 0,52
PRTB 28123 Gustavo Valadares 34.186 0,36PRTB 28000 Paulo César 26.279 0,27
PV 43400 Dr. Ronaldo João 21.350 0,22TOTAL DE CANDIDATOS ELEITOS PELA COLIGAÇÃO: 25TOTAL DE VOTOS OBTIDOS PELOS CANDIDATOS DA COLIGAÇÃO: 1.341.312 Fonte: TRE-MG
61
A seguir relacionamos os candidatos a deputado estadual eleitos pela coligação concorrente, que apoiou o candidato a governador Nilmário Miranda:
Tabela 7: Deputados eleitos pela coligação concorrente para a Legislatura 2003-2006
Partido Número Candidato n° de votos
% válidos
PT 13139 Durval Ângelo 89.326 0,93PT 13450 Roberto Carvalho 75.868 0,79PT 13123 Rogério Correia 75.655 0,79PT 13913 Weliton Prado 69.252 0,72PL 22141 Diniz Pinheiro 67.136 0,70PL 22555 Pastor George 64.512 0,67PC do B 65656 Jô Moraes 58.153 0,61PT 13555 André Quintão 54.972 0,57PT 13106 Cecília Ferramenta 51.715 0,54PT 13220 Adelmo Carneiro Leão 50.695 0,53PT 13579 Padre João Carlos 47.243 0,49PT 13900 Marilia Campos 45.625 0,48PT 13222 Maria José 44.093 0,46PL 22222 Leonardo Moreira 42.726 0,45PL 22456 José Milton 42.337 0,44PT 13213 Biel 42.204 0,44PT 13258 Laudelino dos Santos Azevedo 40.429 0,42PL 22121 Jayro Lessa 38.313 0,40PT 13013 Ricardo Duarte 37.957 0,40PL 22500 Célio Moreira 37.055 0,39PT 13658 Chico Simões 36.554 0,38PT 13151 Maria Tereza Lara 35.647 0,37PL 22200 Sidinho do Ferrotaco 34.962 0,37TOTAL DE CANDIDATOS ELEITOS PELA COLIGAÇÃO: 23TOTAL DE VOTOS OBTIDOS PELOS CANDIDATOS DA COLIGAÇÃO: 1.182.429Fonte: TRE-MG
As duas coligações, juntas, elegeram 48 deputados estaduais. Como a Assembleia
Legislativa de Minas Gerais conta com 77 cadeiras, podemos inferir que os 29 deputados
restantes foram eleitos por partidos que não se coligaram nas eleições ou que fizeram parte de
uma coligação que apoiou outro candidato, e que, possivelmente, foram alvo de alianças
durante a legislatura para a formação de coalizões partidárias, ou então de negociações caso a
caso, através das quais o Governador pudesse obter os votos necessários para a aprovação de
seus projetos.
Durante o mandato em análise, provavelmente o Governador Aécio Neves teve que
dispor de estratégias para formar sua coalizão de governo, tendo em vista que a bancada
partidária da coligação que o apoiou nas eleições não formou maioria na Assembleia e,
sozinha, não conseguiria aprovar os projetos de interesse do Executivo.
62
Em discurso realizado na ocasião da conquista da liderança do PSDB na Câmara dos
Deputados, em 9 de agosto de 2000, Aécio Neves fez a seguinte afirmação, que demonstra
sua disposição para a formação de coalizões partidárias:
Tenho muitos amigos na oposição. Amizade esculpida diariamente no respeito e na compreensão de que a cena política que representa a Nação não pode prescindir de nenhum de seus protagonistas. Mais do que importante, a existência da oposição, sua persistência na luta pelo poder e na crítica ao poder estabelecido são fundamentais para o bom funcionamento da Democracia. (VASCO, 2005).
Numa crítica ao nosso arranjo institucional, o então Governador, em 16 de janeiro de
2005, fez a seguinte declaração ao Jornal O Estado de São Paulo, salientando a importância
das coalizões partidárias para o bom funcionamento do governo, mas destacando também que
tais coalizões, durante as negociações entre os partidos e o Executivo, podem retardar o
programa de governo:
A grande fragilidade do nosso sistema político são os partidos políticos. É preciso que nós tenhamos medidas para fortalecer os partidos, enxugar o quadro partidário, para que eles sejam reflexo de segmentos da sociedade. Hoje, essa pulverização de siglas partidárias não permite isso. Implantar a fidelidade partidária é absolutamente essencial. A cláusula de barreiras – que já estão tentando desfigurar – e o financiamento público das campanhas são outras mudanças essenciais. Desde o governo de Fernando Henrique nós estamos caindo na mesma armadilha de manter a fragilidade dos partidos. E o presidente Lula não tem sido diferente. O que impede hoje o avanço da reforma política é a necessidade que o governo tem de atrair legendas que teriam problemas com esses novos mecanismos, mas são essenciais ao governo. O presidente Fernando Henrique teve de recuar, em alguns momentos, por pressão de alguns partidos da base, e nós estamos assistindo ao mesmo filme novamente. O presidente Lula, que começou com um discurso de reforma política, perdeu muito tempo, não tocou o tema com o vigor e no momento indicados, logo no início do governo, e agora sofre pressões dos partidos aliados para que a reforma política não se consolide. (VASCO, 2005).
Neste trabalho são analisados apenas os projetos originados no Executivo e no
Legislativo, pois os dois Poderes são autores de 96% dos projetos aprovados no período
examinado, sendo o restante de autoria do Tribunal de Justiça e da Procuradoria-Geral de
Justiça. Outro motivo para tal discriminação é que o nosso objeto de análise é a relação
Executivo-Legislativo, o que poderia ter seu foco desviado com a inclusão de projetos de
outro Poder para análise.
63
5.3 A Constituição do Estado de Minas Gerais
5.3.1 O poder de decreto do Governador
O processo legislativo de Minas Gerais compreende a elaboração de emendas à
Constituição, leis complementares, leis ordinárias, leis delegadas e resoluções.
Diferentemente do que ocorre no governo federal, o governador mineiro não dispõe de poder
para a edição de medidas provisórias, mas pode editar leis delegadas. Ainda assim, o
governador possui mecanismos de controle da agenda decisória, como a solicitação de
urgência para análise de projetos de sua iniciativa exclusiva e poder de veto.
5.3.2 A iniciativa privativa do Governador
A iniciativa privativa é outro recurso do Chefe do Executivo para exercer seu poder de
agenda. Seu poder de ação lhe garante a possibilidade de enviar projetos de lei à Assembleia,
participando, dessa forma, do processo legislativo.
A seguir transcrevemos o texto do Artigo 66 da Constituição Estadual, que trata da
iniciativa privativa.
Quadro 4: Trechos dos artigos 66 e 68 da Constituição do Estado de Minas Gerais, que tratam da iniciativa privativa do governador.
Art. 66 - São matérias de iniciativa privativa, além de outras previstas nesta Constituição:I - ...III - do Governador do Estado:a) a fixação e a modificação dos efetivos da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros Militar;b) a criação de cargo e função públicos da administração direta, autárquica e fundacional e a fixação
da respectiva remuneração, observados os parâmetros da Lei de Diretrizes Orçamentárias;c) o regime jurídico único dos servidores públicos dos órgãos da administração direta, autárquica e
fundacional, incluído o provimento de cargo, estabilidade e aposentadoria, reforma e transparência de militar para a inatividade;
d) o quadro de emprego das empresas públicas, sociedades de economia mista e demais entidades sob controle direto ou indireto do Estado;
e) a criação, estruturação e extinção de Secretaria de Estado, órgão autônomo e entidade da administração indireta;
f) a organização da Advocacia do Estado, da Defensoria Pública, da Polícia Civil, da Polícia Militar e dos demais órgãos da Administração Pública, respeitada a competência normativa da União;
64
g) os planos plurianuais;h) as diretrizes orçamentárias;i) os orçamentos anuais.Art. 68 - Não será admitido aumento da despesa prevista:I - nos projetos de iniciativa do Governador do Estado, ressalvada a comprovação da existência de
receita e do disposto no art. 160, III.
5.4 O Regimento Interno da Assembleia Legislativa de Minas Gerais
5.4.1 O Colégio de Líderes
O Art. 73 do Regimento Interno da Assembleia Legislativa de Minas Gerais prevê o
Colégio de Líderes, composto pelos Líderes da Maioria, da Minoria, das Bancadas e dos
Blocos Parlamentares.
Em seu art. 68, o Regimento Interno estabelece que o Chefe do Executivo pode
nomear um líder do governo na Casa Legislativa. O papel desse líder é informar aos
parlamentares e líderes de partido a posição do Governador a respeito das matérias em
discussão, e negociar com esses interlocutores.
Entre outras atribuições regimentais, cabe ao Líder, de acordo com o art. 69 do
Regimento Interno:
I – inscrever membros da Bancada ou do Bloco Parlamentar para discutirem matéria
constante na pauta e falar na terceira parte da reunião;
II – indicar candidatos da Bancada ou do Bloco Parlamentar para concorrerem aos
cargos da Mesa da Assembleia;
III – indicar à Mesa da Assembleia membros da Bancada ou do Bloco Parlamentar
para comporem as comissões e propor substituição;
IV – cientificar a Mesa da Assembleia de qualquer alteração nas Lideranças.
A distribuição de atribuições, de direitos e de recursos parlamentares entre
legisladores individuais (lideranças e bases), grupos de legisladores (Mesa Diretora, Colégio
65
de Líderes, Comissões, Bancadas e Blocos Parlamentares) e o Plenário, causa impacto na
distribuição dos poderes de agenda entre os agentes políticos.
O Poder Legislativo é uma organização complexa, atravessada por um conjunto
diversificado de instâncias decisórias dirigidas pelos chamados “líderes de coalizões”
(ARNOLD, 1990) que, juntos, constituem uma elite parlamentar composta pelos membros da
Mesa, especialmente seu presidente; pelos líderes das bancadas partidárias e dos blocos
parlamentares; pelos colegiados que congregam as lideranças partidárias, e pelos presidentes
de comissões.
5.4.2 As Comissões Permanentes
As comissões parlamentares da Assembleia Legislativa de Minas Gerais são
permanentes, as que subsistem nas legislaturas; e temporárias, as que se extinguem com o
término da legislatura ou antes dele, se atingido o fim para que foram criadas ou findo o prazo
estipulado para seu funcionamento. Os membros das comissões são designados pelo
Presidente da Assembleia, por indicação dos Líderes das Bancadas e dos Blocos
Parlamentares.
Na constituição das comissões é assegurada, tanto quanto possível, a representação
proporcional dos Partidos e dos Blocos Parlamentares que participem da Casa. É verificada
vaga na comissão quando há renúncia, perda do lugar ou desfiliação do partido pelo qual foi
feita a indicação. A renúncia é efetivada após ser formalizada por escrito pelo parlamentar. A
perda do lugar ocorre quando o membro da comissão não comparece a cinco reuniões
ordinárias consecutivas ou dez alternadas durante a sessão legislativa ordinária. Já a
desfiliação ocorre quando o Deputado se desvincula de sua bancada, perdendo
automaticamente o direito à vaga que ocupava em razão dela.
As comissões técnicas permanentes da Assembleia Legislativa de Minas Gerais são
compostas por cinco membros, exceto as de Administração Pública, de Constituição e Justiça
e de Fiscalização Financeira e Orçamentária, que são compostas por sete membros. O
Deputado pode ser indicado para integrar, como membro efetivo, até duas comissões
66
permanentes. O mandato nas comissões tem a duração de duas sessões legislativas, ou seja,
dois anos, desde que não haja alteração da composição partidária.
De acordo com o art. 101 do Regimento Interno, a Assembleia Legislativa de Minas
Gerais conta com 23 comissões técnicas permanentes, assim denominadas:
I - de Administração Pública;
II – de Assuntos Municipais e Regionalização;
III – de Constituição e Justiça;
IV – de Defesa do Consumidor e do Contribuinte;
V – de Direitos Humanos;
VI – de Educação, Ciência, Tecnologia e Informática;
VII – de Fiscalização Financeira e Orçamentária;
VIII – de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável;
IX – de Política Agropecuária e Agroindustrial;
X – de Redação;
XI – de Saúde;
XII – de Transporte, Comunicação e Obras Públicas;
XIII – de Turismo, Indústria, Comércio e Cooperativismo;
XIV – do Trabalho, da Previdência e da Ação Social;
XV – de Segurança Pública;
XVI – de Participação Popular;
XVII – de Cultura;
XVIII – de Minas e Energia.
Segundo a maioria dos analistas políticos, os partidos e as comissões são as duas mais
importantes organizações que presidem os trabalhos legislativos. Pode-se afirmar que são
grandes instrumentos de mediação entre cidadãos, legisladores e governantes, seja no plano
de constituição de poder, seja no de seu exercício e de sua fiscalização.
5.4.3 O regime de urgência
O Governador pode solicitar urgência na análise de projetos de lei de sua iniciativa.
Mediante esse recurso, os líderes cumprem papel preponderante na dinâmica do processo
67
legislativo: encurtam os prazos de tramitação das matérias, de acordo com o previsto no
Regimento Interno da Casa.
De acordo com o art. 272 do Regimento Interno, o regime de urgência é adotado por
solicitação do governador ou a requerimento dos parlamentares. A tramitação em regime de
urgência dispensa a exigência de prévia publicação dos pareceres e reduz pela metade os
prazos regimentais.
Na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, o fato de um projeto tramitar em regime
de urgência não impede a apresentação de emendas. Na prática, a urgência impacta apenas
nos prazos de tramitação, que são reduzidos pela metade.
Quadro 5:Texto dos artigos 272 a 274 do Regimento Interno da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, que tratam da tramitação em regime de urgência
Art. 272 - Adotar-se-á regime de urgência para que determinada proposição tenha tramitação abreviada:
I - por solicitação do Governador do Estado, para projeto de sua autoria, nos termos dos arts. 208 e 209;
II - a requerimento.§ 1º - Só poderão tramitar simultaneamente, em regime de urgência, 4 (quatro) proposições, sendo 2
(duas) por solicitação do Governador do Estado e 2 (duas) a requerimento de Deputado.§ 2º - Por deliberação de 2/3 (dois terços) dos membros do Colégio de Líderes, admitir-se-á a
tramitação de mais 1 (um) projeto, por solicitação do Governador do Estado, e de mais 1 (uma) proposição, a requerimento de Deputado, além do limite estabelecido no parágrafo anterior.
§ 3º - O disposto no inciso II não se aplica a projeto que dependa de “quorum” especial, de lei orgânica, estatutária ou equivalente a código e aos projetos de que trata o art. 204.
Art. 273 - Na tramitação sob regime de urgência, serão observadas as exigências regimentais, com as seguintes ressalvas:
I - dispensa da exigência de prévia publicação dos pareceres e demais proposições acessórias;II - redução à metade dos prazos regimentais, ressalvado o disposto no § 3º do art. 287.Art. 274 - A discussão de proposição em regime de urgência não ultrapassará 4 (quatro) reuniões
consecutivas contadas da data de sua inclusão em ordem do dia, observado o disposto nos §§ 1º e 2º do art. 244.
5.4.4 A inserção de emendas
A emenda pode ser considerada uma proposição, por extensão do conceito. É uma
proposição apresentada como acessória de outra, classificada em:
I – aditiva, a que se acrescenta a outra proposição;
68
II – modificativa, a que altera dispositivo sem modificá-lo substancialmente;
III – substitutiva, a apresentada como sucedânea:
a) de dispositivo;
b) integral de proposição, caso em que passa a denominar-se substitutivo;
IV – supressiva, a destinada a excluir dispositivo.
A emenda apresentada a outra se denomina subemenda. Sua iniciativa pode ser:
I – de Deputado, podendo ser individual ou coletiva;
II – de representação partidária, devendo ser assinada pela totalidade de seus
membros;
III – de comissão, quando incorporada a parecer;
IV – do Governador do Estado, formulada por meio de mensagem, a proposição de
sua autoria.
Lamounier citado por Moya (2005), analisando ocorrência de vetos parciais em
emendas feitas por parlamentares, observa que ela é indiferente à autoria da oposição ou da
situação, mas varia de acordo com a origem e o tipo da proposta: emendas em projetos do
Executivo sofrem mais vetos que em projetos do Legislativo.
Neste trabalho, analisaremos se a incorporação de emendas aos projetos originais foi
motivo de impacto na ocorrência de vetos durante o período em análise (mandato 2003-2006).
5.4.5 O processo de votação
A votação na Assembleia Legislativa de Minas Gerais ocorre por processo simbólico,
nominal ou por escrutínio secreto.
A maioria das votações é realizada por processo simbólico, no qual não se registra
número de votos favoráveis e contrários. O Presidente solicita que os deputados ocupem seus
69
lugares e solicita que permaneçam sentados aqueles favoráveis à matéria. Não havendo,
imediatamente, requerimento de verificação de votação, o resultado torna-se definitivo.
A votação nominal se dá nos casos em que é exigido quorum de maioria absoluta, dois
terços ou três quintos, salvo as hipóteses de escrutínio secreto. Pode ocorrer também por
deliberação do Plenário. Nesse processo, o deputado manifesta sua posição favorável ou
contrária à matéria, ou pode votar “em branco”. O nome dos deputados votantes e seu voto
são discriminados em ata.
O voto secreto é adotado em casos que envolvam eleições, escolhas da Assembleia
Legislativa previstas na Constituição do Estado, bem como em decisões que importem perda
de mandato de deputado ou outras que autorizem instauração de processos de caráter
investigativo.
Dos três processos de votação, o que ocorre nominalmente expõe o voto dos
parlamentares, podendo ser usado pela situação para controlar a coalizão e verificar o voto
dos parlamentares aliados, ou ser também solicitado pela oposição para expor o voto dos
governistas em decisões impopulares.
No caso da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, o que nos impossibilitou a
análise de projetos que tiveram requerimento de votação nominal foi o fato de que tal registro
encontra-se apenas nas atas das reuniões e não em outra base de informação disponível no site
da Casa Legislativa, o que exigiria um tempo muito maior para levantamento dos dados, o
qual não dispomos.
5.5 O poder de veto do Governador
A questão do veto está estabelecida no art. 70 da Constituição do Estado.
Quadro 6: Texto integral do Art. 70 da Constituição do Estado de Minas Gerais, que disciplina o uso do veto
Art. 70 - A proposição de lei, resultante de projeto aprovado pela Assembleia Legislativa, será enviada ao Governador do Estado, que, no prazo de quinze dias úteis, contados da data de seu recebimento:
70
I - se aquiescer, sancioná-la-á; ouII - se a considerar, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrária ao interesse público, vetá-la-á total ou parcialmente.§ 1° - O silêncio do Governador do Estado, decorrido o prazo, importa sanção.§ 2° - A sanção expressa ou tácita supre a iniciativa do Poder Executivo no processo legislativo.
§ 3° - O governador do Estado publicará o veto e, dentro de quarenta e oito horas, comunicará seus motivos ao Presidente da Assembleia Legislativa.§ 4° - O veto parcial abrangerá texto integral de artigo, de parágrafo, de inciso ou de alínea.§ 5° - A Assembleia Legislativa, dentro de trinta dias contados do recebimento da comunicação do veto, sobre ele decidirá, em escrutínio secreto, e sua rejeição só ocorrerá pelo voto da maioria de seus membros.§ 6° - Se o veto não for mantido, será a proposição de lei enviada ao Governador do Estado para promulgação.§ 7° - Esgotado o prazo estabelecido no § 5° sem deliberação, o veto será incluído na ordem do dia da reunião imediata, sobrestadas as demais proposições, até votação final, ressalvada a matéria de que trata o § 1° do artigo anterior. § 8° - Se, nos casos previstos nos §§ 1° e 6°, a lei não for, dentro de quarenta e oito horas, promulgada pelo Governador do Estado, o Presidente da Assembleia Legislativa a promulgará, e, se este não o fizer em igual prazo, caberá ao Vice-Presidente fazê-lo.
De acordo com informação obtida através da Gerência-Geral de Documentação e
Informação da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, no período 2003-2006, foram
apresentados 3.541 projetos pelo Poder Legislativo, dos quais 20 tiveram tramitação em
regime de urgência; e 440 projetos apresentados pelo Poder Executivo, dos quais 21 tiveram
tramitação em regime de urgência. Os números informados incluem projetos de lei, projetos
de lei complementar, projetos de emenda à Constituição e projetos de resolução.
Durante o mandato 2003-2006, o Governador Aécio Neves apresentou veto a 118
projetos de lei apreciados na Assembleia Legislativa. Faremos a análise de diversas variáveis
referentes à ocorrência de vetos durante esse mandato.
Tabela 8: Quantidade de vetos por Poder de origemPODER DE ORIGEM Nº DE VETOS
Executivo 30Legislativo 83Tribunal de Justiça 03Procuradoria-Geral de Justiça 02TOTAL DE VETOS 118
Podemos observar que 70,5% dos projetos que sofreram vetos no período tiveram
origem no Legislativo. Dos 30 projetos originados no Executivo que foram vetados (que
representam 25,5% do total de vetos apresentados no mandato), 5 tiveram origem no mandato
anterior, do governador Itamar Augusto Cautiero Franco25, o que nos leva a inferir que as
25 Em 1998, Itamar elegeu-se governador de Minas pelo PMDB. Governo bastante turbulento, logo no primeiro dia, Itamar decreta a moratória do Estado. Essa atitude polêmica levou Itamar a ser acusado pelo presidente do
71
políticas públicas dos governadores em questão não eram coincidentes, pelo menos em
algumas matérias. O partido de Itamar Franco, PMDB, foi concorrente de Aécio Neves pelo
governo de Minas Gerais nas eleições realizadas em 2002, tendo como candidato Newton
Cardoso, que obteve o terceiro lugar na disputa, com 6,69% dos votos.
Os projetos apresentados pelo Tribunal de Justiça e pela Procuradoria-Geral de Justiça
que sofreram veto representam 4% do total de projetos vetados no período. Contudo, como já
enfatizado anteriormente, tais vetos não serão objeto de nossa pesquisa devido ao fato de
serem oriundos de outro Poder.
Tabela 9: Situação do veto por Poder de origem
Origem de Veto
SITUAÇÃO DO VETOAPROVADO REJEITADO APROVADO PARCIALMENTE TOTAL
Executivo 25 3 2 30Legislativo 47 28 8 83Soma 72 (63,7%) 31 (27,4%) 10 (8,9%) 113 (100%)
Um fator que serve também como indicador da condição de sucesso de um governo,
sob o aspecto do presidencialismo de coalizão, é que, quanto maior a coalizão governista,
menor a chance da ocorrência de vetos e de sua rejeição, quando ocorridos.
Observamos que dentre os 30 vetos apresentados a projetos originados no Executivo,
apenas 3 foram rejeitados, o que evidencia a disposição dos parlamentares a negociar para
possibilitar ao governo o cumprimento de sua agenda. Já dentre os 83 vetos apresentados a
projetos oriundos do Legislativo, 31 deles, ou seja, 27,4%, foram rejeitados e promulgados, o
que pode ter ocorrido em duas situações: ou houve negociação entre os Poderes, ou o
Legislativo tentou impor uma política pública com seu poder de derrubar o veto do Executivo.
Além da hipótese da disponibilidade de negociação dos legisladores para a
manutenção do veto do Executivo, existe outra explicação plausível, aventada por Grohman:
(...) se os representantes aprovam massivamente o projeto e depois o rejeitam, mantendo o veto, é porque, apesar do mesmo não ser de sua preferência, sabem que o Executivo vai vetá-lo. Ao mesmo tempo em que permitem ao colega representante auferir um ganho (e eles próprios acumularem pontos para futuras
Banco Central, Armínio Fraga, de agir contra a estabilidade de regras necessária à atração de investimentos estrangeiros. Outro episódio marcante foi sua reação contra a privatização de Furnas, quando a Polícia Militar foi mobilizada para intervir no caso. (FONTE: www.mg.gov.br).
72
trocas), também ganham pontos, seja observando a preferência do Executivo (ganhando pontos junto a esse), seja deixando o Executivo em uma situação difícil por vetar um “bom” projeto ou, ainda, simplesmente recebendo um ganho final pela manutenção do status quo. (GROHMAN, 2003, p. 220).
Tabela 10: Vetos totais e parciais por Poder de origem da proposta
Poder de origem VETO TOTAL VETO PARCIAL% %
Legislativo 54 47,8% 29 25,6%Executivo 2 1,8% 28 24,8%Total 56 (49,6%) 57 (50,4%)
Podemos constatar que o Legislativo é o Poder que mais sofre vetos totais, ainda que
sinta também o impacto de vetos parciais às suas propostas. Já o Executivo sofre
predominantemente o impacto de vetos parciais. O veto total, logicamente, deve atingir
projetos que estão distantes das preferências do Executivo.
É compreensível que os projetos originados no Legislativo sejam os principais alvos
de vetos totais do governador, uma vez que poderia ser até um contrassenso vetar totalmente
projetos de sua autoria. Porém, como destacou Moya (2005), há casos em que sua ocorrência
é possível: quando o projeto é apresentado pelo governador anterior ao que veta; quando o
projeto contém falhas ou vícios só percebidos posteriormente; e quando o projeto é elaborado
e encaminhado por uma Secretaria sem o conhecimento de outra, passando despercebido e,
quando votado e encaminhado para sanção, constata-se a inadequação.
Enquanto os projetos originados no Legislativo são os alvos preferenciais de veto total
do governador, a aplicação de vetos parciais atinge projetos oriundos de ambos os Poderes.
Do total de 83 vetos apresentados a projetos oriundos do Legislativo, 54 (66%) sofreram veto
total e 29 (24%) receberam veto parcial. Entre os projetos apresentados pelo Executivo, 28
entre os 30 que foram vetados (93%) receberam veto parcial e apenas 2 (7%) sentiram o
impacto do veto total.
Tabela 11: Tipo de veto por situação
Tipo de Veto
SITUAÇÃO DO VETOAPROVADO REJEITADO APROVADO PARCIALMENTE TOTAL
Parcial 46 5 5 56Total 26 26 5 57Soma 72 31 10 113
73
Para Grohman, quando muitos vetos são mantidos e poucos rejeitados, isso pode
significar que o Executivo preservou suas preferências e bloqueou parcelas da agenda do
Legislativo. Contudo, é preciso lembrar que a maioria que aprova o projeto nem sempre é
idêntica àquela que analisa o veto. Então, o menor número de vetos rejeitados não indica
necessariamente a predominância do Executivo; pode apenas representar a cooperação ou a
semelhança de preferências. Ressalte-se que o veto parcial pode indicar a adaptação de um
projeto originado no Legislativo às preferências do Executivo.
Dos 113 projetos originados nos dois Poderes em análise, 36 sofreram emendas e 77
tramitaram com texto original, sem a inserção de emendas. A tabela abaixo discrimina a
incorporação de emendas em tais projetos.
Tabela 12: A ocorrência de emendas em projetos vetados
PODER DE ORIGEMEXECUTIVO LEGISLATIVO
VETOPARCIAL
VETOTOTAL
VETOPARCIAL
VETOTOTAL
SOMA
PROJETOCOM EMENDA
16 - 14 06 36
PROJETOSEM EMENDA
12 02 15 48 77
Como indicado por outros autores citados anteriormente nesta monografia, os vetos
parciais a projetos iniciados no Legislativo seriam uma indicação de que tais projetos teriam
sido emendados no Legislativo e estas emendas foram vetadas pelo Executivo. Grohman
(2003) afirmou que “um projeto do Executivo que é vetado sempre é um projeto emendado”.
Verificamos, contudo, que tal fato não ocorre na Assembleia Legislativa de Minas
Gerais. Dos 30 projetos vetados originados no Legislativo, 2 sofreram veto total, não
receberam emendas e foram apresentados no mandato anterior. Dos 28 que sofreram veto
parcial, 16 receberam a incorporação de emendas e 12 tramitaram sem alteração do texto
original, o que nos leva a constatar que a inserção de emendas aos projetos originais parece
ser um fator influente, porém não decisivo para a ocorrência de vetos no processo legislativo
mineiro.
Tabela 13: Os vetos rejeitados
ORIGEM
74
EXECUTIVO LEGISLATIVOVETO PARCIAL 02 03VETO TOTAL 01 25SOMA 03 28
A tabela 13 nos mostra que, dos 31 vetos rejeitados no período em análise, apenas 3
tiveram origem no Executivo, o que nos levou a verificar o conteúdo das propostas e dos
vetos:
1º - Veto parcial à proposição de lei 15.921/2003 que dispõe sobre as custas devidas ao
Estado no âmbito da Justiça Estadual de Primeiro e Segundo Graus e dá outras providências:
O projeto reajusta as taxas fixadas nas tabelas de custas judiciais. O Legislativo
apresentou várias emendas, dentre elas: a garantia ao cidadão do direito de interposição de
recurso contra decisão que indeferiu pedido de justiça gratuita, a redução do valor de algumas
taxas, a supressão de algumas taxas fixadas nas tabelas e a fixação de prazo para pagamento
das custas judiciais. Outra emenda assegurava ao Ministério Público a participação no produto
da arrecadação das custas relativas aos processos em que atuar.
As disposições resultantes de emendas foram vetadas por inconstitucionalidade. O
veto parcial foi rejeitado e o projeto promulgado pela Mesa da Assembleia e transformado na
Lei 14.939/2003.
2º - Veto total à Proposição de Lei 15.452/2002, que assegura benefícios aos servidores que
menciona:
O projeto de lei, que assegurava pensão mensal vitalícia aos bolsistas de atividades
especiais da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais – FHEMIG, de autoria do
governador Itamar Franco, foi publicado em 7 de novembro de 2002. A requerimento de
deputado, o projeto tramitou em regime de urgência e foi aprovado. No dia 23 de dezembro
de 2002 a Secretaria-Geral da Mesa enviou ofício ao governador, encaminhando o projeto
para sanção.
Em 2003, agora no mandato de Aécio Neves, o projeto foi vetado totalmente por
inconstitucionalidade. O veto foi rejeitado e o projeto promulgado pela Mesa da Assembleia.
O projeto transformou-se na Lei 14.619/2003, hoje revogada pela Lei 15.790/2005.
75
3º - Veto parcial à Proposição de Lei 16.374/2004, que “Estima as receitas e fixa as despesas
do Orçamento Fiscal de Minas Gerais e do Orçamento de Investimento das Empresas
controladas pelo Estado para o exercício de 2005”.
A Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária emitiu parecer favorável ao
projeto, com emendas. As disposições resultantes de emendas foram vetadas e o motivo
alegado pelo governador foi a contrariedade ao interesse público. O veto parcial foi rejeitado e
o projeto promulgado pela Mesa da Assembleia e transformado na Lei 15.460/2005.
Concluímos então que, dentre os 3 projetos originados no Executivo que tiveram veto
rejeitado, 1 foi iniciado no mandato anterior e 2 sofreram emendas que alteraram o conteúdo
das propostas, distanciando assim o projeto das preferências do Executivo, que, nestes casos,
não logrou sucesso tendo em vista que o Legislativo se articulou para a rejeição do veto e a
manutenção das preferências dos parlamentares.
Partindo para a análise dos vetos rejeitados a projetos originados no Legislativo, do
total de 28 projetos vetados, 25 receberam veto total e 3 sofreram veto parcial. Tal dado nos
leva a acreditar que os projetos do Legislativo vetados totalmente estão completamente fora
das preferências do governador, e os 3 projetos vetados parcialmente teriam uma parte
“tolerada” pelo Executivo.
Porém, tais projetos foram mantidos e promulgados, tendo em vista a derrubada dos
vetos na Casa Legislativa. Certamente os parlamentares autores dos projetos obtiveram a
colaboração de seus pares para a rejeição do veto.
Assim, a manutenção do veto pode ser a manifestação da preferência dos legisladores,
estabelecendo um equilíbrio entre os Poderes: o Executivo tem o poder de vetar e o
Legislativo tem o poder de rejeitar o veto.
Vamos à análise do partido dos parlamentares autores das propostas com veto
rejeitado, para verificar o tamanho da influência do partido nas votações.
Tabela 14: O partido dos parlamentares autores de projetos com veto rejeitado
PARTIDO TIPO DE VETO
76
PARCIAL TOTALPMDB 01 06PT - 06PL - 04PDT - 02PTB - 02PFL - 01PSB 01 -PSDB 01 01PP - 01Comissão Especial deAcidentes Ambientais
- 01
Dalmo Ribeiro Silva(sem partido na época)
- 01
Soma 03 25
A tabela 14 aponta o PMDB, o PT e o PL como autores da maioria dos projetos que
tiveram o veto derrubado na Assembleia Legislativa, o que mostra que tais partidos, mesmo
na condição de oposicionistas, são influentes na Casa e conseguem se articular para obter
apoio do parlamento para a aprovação de seus projetos.
Tabela 15: O partido dos autores de projetos vetados iniciados no legislativo
PARTIDO NÚMERO DE VETOSPT 22PL 17PMDB 09PFL 09PSDB 06PDT 05PTB 04PSB 03PP 03PC do B 01PRTB 01Comissão Especial de Acidentes Ambientais 01Comissão Especial de Cafeicultura Mineira 01Deputado Dalmo Ribeiro Silva(sem partido na época)
01
SOMA 83
Vê-se claramente, como já era esperado, que os projetos apresentados por partidos que
não fazem parte da base de apoio governista têm maiores chances de serem vetados. O PT é o
partido com o maior número de projetos vetados no período (26,5% do total), seguido do PL,
com 20,5%, e do PMDB e PFL, ambos representando 10,8% dos autores dos projetos vetados.
A ocorrência de projetos de iniciativa de partidos da base governista vetados pode indicar que
existe uma área de negociação não necessariamente ligada ao continuum situação-oposição,
77
mas sim aos acordos de apoio mútuo26, onde os parlamentares votam em favor de projetos de
seus pares, mesmo sabendo que o conteúdo da proposta não é interessante, conveniente ou
oportuna e que poderá ser vetado, contando com o voto desses parlamentares em um outro
projeto seu.
A solicitação de análise em regime de urgência, no universo de 113 projetos vetados
no período originados no Executivo e no Legislativo, ocorreu em 4 projetos por solicitação do
governador e em 5 projetos por solicitação de deputado, indicando que o requerimento de
urgência não foi um fator impactante para a ocorrência do veto na Assembleia Legislativa de
Minas Gerais, no período analisado.
Quanto ao tema dos projetos, nesta pesquisa, procuramos fazer a análise da ocorrência
de vetos de acordo com o teor da proposta. Para tanto, fizemos a seguinte classificação dos
principais temas abordados:
Social: abrange disposições sobre meio ambiente, educação, cultura, turismo,
esporte, lazer e outros temas sociais;
Patrimonial: referente à doação, alienação e reversão de imóveis pelo poder
público;
Econômico: relativo à regulamentação da atividade econômica, à criação ou
regulação de tributos e incentivos fiscais, e à fiscalização financeira e
orçamentária;
Administrativo: relacionado à criação e regulamentação de cargos e órgãos
públicos, regulamentação de serviços públicos, e vencimentos e gratificações
de servidores públicos.
Tabela 16: Vetos apresentados por tema e origem da proposta
TEMA ORIGEMEXECUTIVO LEGISLATIVO
Social - 28Patrimonial 02 22Econômico 21 02Administrativo 07 05
26 Entenda-se por apoio mútuo a troca de votos entre os legisladores para garantir que os projetos de sua preferência sejam aprovados na Casa Legislativa. Nessa perspectiva, a primeira votação do projeto no Legislativo não reflete, necessariamente, a preferência da maioria, dependendo da dimensão do apoio mútuo. Essa real preferência poderá ser observada com mais nitidez na votação do veto apresentado pelo Executivo, oportunidade em que os legisladores que, na realidade, não concordam com o projeto, podem votar pela manutenção do veto.
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Saúde 02 07Defesa do Consumidor - 07Segurança Pública e trânsito - 06Agropecuário - 03Denominações - 01TOTAL DE VETOS 32 81
Verifica-se que os projetos originados no Legislativo que sofreram veto são,
predominantemente, de temática social e patrimonial, enquanto o Executivo parece deter-se
na elaboração de propostas com temas econômicos, visto contar com o poder de dispor do
orçamento de acordo com sua agenda política.
Tabela 17: Vetos parciais e totais por tema da propostaTEMA TIPO DE VETO
PARCIAL TOTALSocial 14 14Patrimonial 01 23Econômico 21 02Administrativo 09 03Saúde 02 07Defesa do Consumidor 02 05Segurança Pública e trânsito 05 01Agropecuário 03 -Denominações - 01TOTAL DE VETOS 57 56
Os projetos com temas sociais apresentaram efeito consistente sobre a ocorrência dos
dois tipos de veto, enquanto os projetos com temas econômicos sofrem predominantemente a
ocorrência de vetos parciais. Os projetos com tema patrimonial tiveram origem, em sua
maioria, no Legislativo e sofreram mais fortemente o impacto de vetos totais. O tema
administrativo tem maior influência sobre os vetos parciais, sendo o tema menos propenso a
sofrer vetos dentre aqueles considerados principais: social, patrimonial, econômico e
administrativo.
Na tabela 17, podemos observar que todos os projetos vetados com tema econômico
originados no Executivo sofreram vetos parciais. Os únicos 2 projetos com tema econômico
originados no Legislativo sofreram vetos totais.
Tabela 18: Vetos parciais e totais apresentados por ano no mandato 2003-2006ANO VETO TOTAL VETO PARCIAL TOTAL DE VETOS2003 26 16 422004 15 15 302005 8 14 222006 7 12 19
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Em 2003, primeiro ano do mandato, foi o período que apresentou o maior número de
vetos, sendo o indicador de um período de maior conflito entre os Poderes. Há também a
hipótese de que o governador tende a vetar mais no primeiro ano do mandato, talvez porque
seja o período em que os agentes políticos estão em fase de reconhecimento.
No início do mandato, há um desconhecimento mútuo entre os legisladores, dentro do
Poder Legislativo, e entre estes e o Executivo, e a consequência disso é a elevação do número
de vetos. À medida em que o mandato transcorre, os agentes políticos vão se conhecendo e
alinhando suas preferências, ocasionando a diminuição crescente do número de projetos
vetados.
GROHMAN (2003) avalia o funcionamento do mecanismo de reconhecimento dos
atores da seguinte forma:
(...) primeiro, o Legislativo aprova o projeto de sua preferência; a seguir, há a demonstração da preferência do Executivo; e, então, o acomodamento. O importante é que, no caso brasileiro, o acomodamento não se dá apenas porque o Legislativo, reconhecendo a preferência do Executivo, deixa de apresentar projetos que serão vetados. Ele também ocorre por meio da simples aprovação dos vetos, permitindo ao Executivo afirmar suas preferências. (GROHMAN, 2003, p. 106).
Tabela 19: Vetos ocorridos em 2003 a projetos apresentados no mandato anterior
2003ORIGEM N° DE VETOSExecutivo (mandato 2003-2006) 8Executivo (mandato anterior) 5LEGISLATIVO (MANDATO 2003-2006)PSB 1PT 1LEGISLATIVO (MANDATO ANTERIOR)PT 8PMDB 6PFL 4PL 4PTB 3PDT 1PSB 1TOTAL 42
Os projetos apresentados na legislatura anterior que sofreram veto no período em
análise provavelmente continuaram em estudo, mesmo com o encerramento da Legislatura, ou
foram aprovados e enviados à sanção nos últimos dias de seu encerramento, ficando a ação do
Executivo para o ano seguinte, a mercê de um novo Chefe do Executivo e, no caso do veto,
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do reexame de um novo corpo legislativo. Ocorre que os novos legisladores que apreciarão a
matéria poderão ter interesses distintos daqueles que a propuseram, aumentando assim as
chances da ocorrência de veto.
O grande número de projetos vetados apresentados na legislatura anterior indica que o
interesse pela matéria se extinguiu com o mandato do parlamentar, provavelmente também
porque eram, na maioria, oposicionistas. O PT e o PMDB são os partidos autores de mais da
metade dos projetos vetados iniciados no Legislativo, na legislatura anterior (51,86% do
total). Apenas o PFL, com 4 projetos da legislatura anterior vetados, todos eles com tema
social, apoiou a coligação que elegeu Aécio Neves.
81
6 CONCLUSÃO
No “jogo político”, cada agente, membro do Poder Executivo ou Legislativo, com
seus recursos e interesses próprios, procura implementar suas políticas, mas, para isso, precisa
enfrentar e conquistar seus pares, possuidores de outros recursos e interesses. Nesse ambiente,
surgem os veto players e os agentes políticos precisam negociar e permutar seus recursos para
atingir seus objetivos.
Nesta pesquisa, verificamos que o Executivo é o agente político mais bem equipado
para a definição da agenda, bem como para a produção legislativa, visto possuir instrumentos
importantes à sua disposição, como a iniciativa legislativa, o apoio da coalizão partidária e o
poder de veto. Ainda assim, o Legislativo atua e interfere constantemente no processo
decisório, tornando o relacionamento entre os Poderes marcado pela reciprocidade estratégica.
Poderíamos inferir que, quanto maior o apoio ao governo dentro da Casa Legislativa,
menor seria a quantidade de vetos emitidos, porque não haveria projetos aprovados
distanciados das preferências do Executivo. Mas, na prática, a lógica do veto é mais complexa
e envolve diversos fatores endógenos e exógenos ao processo legislativo.
No caso da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, no período analisado,
correspondente ao mandato 2003-2006, do Governador Aécio Neves, se tomássemos os
números como absolutos, verificaríamos que o Executivo não bloqueou a agenda do
Legislativo, que somou 3.541 projetos apresentados, entre eles 83 (2,3%) vetados. O
Executivo apresentou 440 projetos, dos quais 30 (6,8%) foram vetados. Vendo dessa forma, o
Executivo vetou proporcionalmente mais os projetos de sua iniciativa. Entretanto, partimos do
pressuposto de que os projetos mais importantes e polêmicos é que foram alvos de vetos. É
importante ressaltar que, no universo de projetos apresentados pelo Legislativo, encontram-se
as denominações, as declarações de utilidade pública e outros temas não impactantes nas
políticas públicas.
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Aécio Neves é o governador mais popular do Brasil. Seus grandes recursos de poder,
aliados ao alto índice de popularidade, promovem a cooperação dos legisladores e criam
incentivos para que se juntem ao governo, em apoio à sua agenda.
No caso mineiro, observamos que o veto total atinge predominantemente os projetos
com origem no Legislativo, notadamente quando os autores são membros de partidos da
oposição, indicando que tais projetos devem estar distantes das preferências do Executivo e a
este não interessa a cooperação com aqueles parlamentares que não apoiam sua bancada
governista e, por isso mesmo, podem votar contra seus projetos e tentar bloquear sua agenda
política.
Analisando as variáveis exógenas ao processo legislativo que influem na ocorrência de
vetos, chegamos à conclusão de que as mais impactantes são o tamanho da coalizão
partidária, a disciplina dessa coalizão e o partido do autor do projeto com origem no
Legislativo, no sentido de que maiores coalizões, bem como a disciplina legislativa nas
votações, reduzem o risco do veto. Já os partidos oposicionistas têm aumentadas as chances
de verem seus projetos vetados pelo Executivo.
Quanto às variáveis endógenas ao processo legislativo, percebemos que as principais
características dos projetos que mais correm o risco de incidência de vetos são: origem no
Legislativo, tema social, autoria de partido da oposição e tramitação no primeiro ano do
mandato. Verificamos que a origem no Legislativo é a característica que mais amplia a
probabilidade de ocorrência do veto total.
É interessante perceber que, ao contrário da ocorrência de vetos totais, que atinge
majoritariamente projetos iniciados no Legislativo, os vetos parciais parecem não estar
associados ao poder de origem e são menos previsíveis, visto que podem atingir projetos de
ambos os Poderes, bem como projetos de quaisquer partidos, tanto de situação quanto de
oposição. O que fica claro é que os projetos que recebem vetos parciais são considerados
importantes, visto que podem ter sofrido emendas no Legislativo e, quando voltam ao
plenário para a análise do veto, são novamente alvo da atenção dos parlamentares.
83
Outro indicador da importância do projeto é a solicitação de sua análise em regime de
urgência27, que faz com que o risco de que ele seja emendado ou rejeitado caia pela metade,
visto que a urgência encurta exatamente nessa proporção os prazos de tramitação, diminuindo
o tempo disponível aos legisladores para análise do conteúdo da proposta. Se tais projetos são
oriundos do Executivo, evidentemente estão dentro de suas preferências e não serão vetados.
Já, se tiveram origem no Legislativo, correm o risco de sofrer a ocorrência de vetos, totais ou
parciais, sendo, no momento da análise do veto, mantido ou rejeitado pelos parlamentares de
acordo com a importância do conteúdo da proposta e com o nível de negociação entre eles.
A explicação para o grande número de vetos mantidos a projetos apresentados pelo
Legislativo é que tais projetos são aprovados pelos legisladores porque são realizados acordos
de apoio mútuo. Porém, os legisladores já esperam ou mesmo contam com o veto do
governador e, no exame do veto, seguem a preferência do Executivo, mantendo o veto.
A mudança de posição dos deputados, aprovando inicialmente o projeto e depois
mantendo o veto do Executivo, quando o mais coerente seria votar pela sua rejeição, pode
dar-se porque a votação do projeto é sempre aberta, seja simbólica28 ou nominal, enquanto a
votação do veto é secreta, ocultando a preferência pessoal do deputado, que pode, assim, votar
mais livremente.
Nesse contexto, o veto poder ser entendido como um conjunto articulado de
procedimentos que beneficia os agentes políticos envolvidos, em especial os membros do
Legislativo, que votam as propostas de acordo com as negociações feitas em troca de apoio
mútuo, não contrariando, dessa forma, seus pares, mesmo sabendo que, por vezes, tais
propostas não são interessantes ou oportunas, e, por isso mesmo, serão vetadas pelo
Executivo, oportunidade em que os deputados poderão manifestar verdadeiramente sua
posição, mantendo o veto, já que a votação secreta assegura o anonimato de seu voto.
Por vezes, a ocorrência de vetos pode representar também o confronto de preferências
entre o Executivo e o Legislativo. Existe, então, uma ambiguidade de caráter do veto, que
27 Apesar de termos verificado que a solicitação de análise em regime de urgência é um indicador da importância do projeto, tal recurso foi pouco utilizado na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, no universo de projetos analisados (os projetos que sofreram veto no mandato 2003-2006).28 Ainda que a votação simbólica impeça o conhecimento das opções dos deputados, visto que os votos não são contabilizados e nem registrados em ata, no momento da votação os parlamentares presentes podem visualizar as opções de seus colegas.
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pode exprimir o conflito de preferências entre os Poderes ou pode ser resultado da cooperação
entre os agentes políticos, nos acordos de apoio mútuo.
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