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POLÍTICAS DE REVITALIZAÇÃO DE CENTROS HISTÓRICOS: materialidades e questões pertinentes a programas de habitação no Centro Histórico da cidade de São Luís (MA/Brasil) Aline Batista Cabral 1 Érica Natacha Batista Cabral 2 RESUMO: Reflexões sobre a moradia em centros históricos, enfatizando-se programas de habitação social no contexto das políticas de preservação e revitalização desses espaços. O recorte empírico da pesquisa a capital do estado do Maranhão, São Luís, cujo Centro Histórico é reconhecido como Patrimônio Cultural da Humanidade, e em especial os projetos habitacionais desenvolvidos no âmbito do Programa de Preservação e Revitalização do Centro Histórico de São Luís (PPRCHSL). Reúne indicações para o debate sobre a importância, necessidade e desafios de uma política de moradia para o Centro Histórico de São Luís. Palavras-chave: Centros Históricos. Políticas de preservação e revitalização. Direito à moradia. Programas de habitação. São Luís - MA. ABSTRACT: Reflections on housing in historic centers, emphasizing social housing programs in the context of policies to preserve and revitalize these spaces. The empirical study of the capital of the state of Maranhão, São Luís, whose Historical Center is recognized as a World Cultural Heritage, and especially the housing projects developed under the Preservation and Revitalization Program of the Historic Center of São Luís (PPRCHSL). It brings together indications for the debate on the importance, necessity and challenges of a housing policy for the Historical Center of São Luís. 1 Universidade Federal do Maranhão (UFMA). E-mail: [email protected] 2 Universidade Federal do Maranhão (UFMA). E-mail: [email protected]

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POLÍTICAS DE REVITALIZAÇÃO DE CENTROS HISTÓRICOS: materialidades e

questões pertinentes a programas de habitação no Centro Histórico da cidade de São Luís

(MA/Brasil)

Aline Batista Cabral1

Érica Natacha Batista Cabral2

RESUMO: Reflexões sobre a moradia em centros históricos,

enfatizando-se programas de habitação social no contexto das

políticas de preservação e revitalização desses espaços. O

recorte empírico da pesquisa a capital do estado do Maranhão,

São Luís, cujo Centro Histórico é reconhecido como

Patrimônio Cultural da Humanidade, e em especial os projetos

habitacionais desenvolvidos no âmbito do Programa de

Preservação e Revitalização do Centro Histórico de São Luís

(PPRCHSL). Reúne indicações para o debate sobre a

importância, necessidade e desafios de uma política de

moradia para o Centro Histórico de São Luís.

Palavras-chave: Centros Históricos. Políticas de preservação

e revitalização. Direito à moradia. Programas de habitação.

São Luís - MA.

ABSTRACT: Reflections on housing in historic centers,

emphasizing social housing programs in the context of policies

to preserve and revitalize these spaces. The empirical study of

the capital of the state of Maranhão, São Luís, whose Historical

Center is recognized as a World Cultural Heritage, and

especially the housing projects developed under the

Preservation and Revitalization Program of the Historic Center

of São Luís (PPRCHSL). It brings together indications for the

debate on the importance, necessity and challenges of a

housing policy for the Historical Center of São Luís.

1 Universidade Federal do Maranhão (UFMA). E-mail: [email protected]

2 Universidade Federal do Maranhão (UFMA). E-mail: [email protected]

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Keywords: Historic Centers. Policies for the preservation and

revitalization. The right to housing. Housing programs. Sao

Luis - MA.

1 INTRODUÇÃO

Políticas de revitalização de Centros Históricos não ocorrem somente no Brasil,

mas também em âmbito internacional, tornando-se tendência a partir de meados da década

de 1970. Os primeiros países a realizarem políticas nessa perspectiva foram os europeus,

como a Bélgica, Inglaterra e Espanha. São muitas as características afins que podem ser

visualizadas nos fundamentos e justificativas das propostas de preservação e revitalização

de áreas urbanas centrais e, de modo particular, de centros históricos. No entanto, a

despeito da existência desses traços gerais e comuns, as experiências concretas dessas

políticas assumem perfis particulares, a exemplo daquele que se manifesta na sociedade

brasileira.

Nesse contexto, as áreas urbanas centrais, em geral, passaram por tal processo.

Antes da fase de declínio, em muitas cidades de diversos países, o “centro” foi amplamente

habitado por segmentos sociais abastados que detinham prestígio político e social.

Também parte expressiva dessas áreas abrigou importantes atividades comerciais,

culturais, portuárias ou fabris. Tais condições exigiram e possibilitaram a formação de

grandes conjuntos espacial-arquitetônicos de valor histórico-cultural significativos, que na

atualidade são reconhecidos como patrimônio.

Desse modo, um conjunto amplo e complexo de transformações político-

econômicas, sócioculturais e territorial-urbanas foi determinante para a continuidade da

perda de importância e centralidade dos antigos centros de muitas cidades mundiais, já

consideravelmente modificadas na segunda metade do século XX, em razão dos

desdobramentos da expansão capitalista e da aceleração dos processos de urbanização.

Porém, a partir da década de 1970 do séc. XX, em meio ao ideário modernizador,

surgiu uma espécie de contracultura, que denuncia o abandono das áreas centrais. A partir

desta começa a se disseminar a necessidade de preservação do patrimônio arquitetônico,

paisagístico e cultural herdados de momentos históricos anteriores, dada a sua importância

na constituição da história, memória e identidades de sociedades, cidades, grupos sociais e

comunidades. Nesse âmbito, os centros históricos são valorizados como produtos e

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dimensões de identidade sóciocultural, como suportes de memória e identidade, e, também,

como importantes legados para as próximas gerações. Essa forma particular de pensar e

compreender os núcleos históricos das cidades influenciou e fundamentou um leque amplo

de ações - promulgação de leis relacionada à preservação dos bens considerados

patrimônios, atuação de órgãos fiscalizadores, intervenções concretas mediante obras de

reabilitação, pesquisas, movimentos sociais, etc. – convergentes, gradativamente, a

formulação das chamadas políticas de preservação e revitalização de centros históricos.

Assim, a referida pesquisa expõe o resultado de estudos sobre o lugar do uso

habitacional nas políticas e intervenções públicas do Estado brasileiro em centros

históricos. Tendo referência socioespacial e institucional de análise, projetos realizados na

área da habitação no contexto do Programa de Preservação e Revitalização do Centro

Histórico de São Luís (PPRCHSL), desenvolvido pela esfera estadual. Este Programa se

constituiu como primeira proposta para restauração e revitalização do Centro Histórico de

São Luís. A partir daí sucessivos governos estaduais, mediados por ações federais e

municipais, vêm dando continuidade a tal ação estatal através de diversas ações e

subdivisão em etapas. Dentre os principais objetivos do PPRCHSL figuram: a fixação da

população local no Centro Histórico de São Luís e a promoção social e implantação de

projetos de habitação para vários casarões ocupados em condições irregulares.

A proposição deste estudo tem, portanto, como objetivo central demarcar ações

voltadas para habitação no contexto das políticas de revitalização implantadas no Centro

Histórico de São Luís, e expressas, principalmente, no Projeto de Promoção Social e

Habitação, identificando limites, entraves e perspectivas em face da importância da

funçãomoradia para a preservação e revitalização dos centros históricos e frente à

concretização do direito à moradia. A perspectiva deste estudo é fornecer alguns elementos

analíticos a diferentes atores sociais - principalmente moradores -, com vistas a reivindicar

do Estado medidas que promovam qualidade de vida para quem depende, direta e

indiretamente, da vida nesses espaços, além de projetar ações futuras no que diz respeito à

habitação em centros históricos, especialmente o da cidade de São Luís.

2 PROGRAMA DE PRESERVAÇÃO E REVITALIZAÇÃO DO CENTRO HISTÓRICO DE

SÃO LUÍS (PPRCHSL) E SUAS INCIDÊNCIAS NO DIREITO A MORADIA: materialidades

urbanas e político-institucionais

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Para analisar alguns desdobramentos e impactos no direito à moradia dos

programas habitacionais desenvolvidos a partir de políticas de preservação e revitalização

do Centro Histórico de São Luís, torna-se necessário demarcar certos significados

atribuídos, na atualidade, ao termo Centro Histórico. Do ponto de vista histórico e

socioespacial, a vida urbana sempre esteve a girar em torno dos centros das cidades e

suas múltiplas funções. Nessa perspectiva, Gonçalves (2006, p. 63) aponta três tipos de

centros urbanos:

a) Centro urbano ou centro funcional: é aquele que apresenta inúmeras atividades

funcionais, porém, não contém necessariamente valores históricos e simbólicos.

b) Centro tradicional ou centro principal: é quando se trata do primeiro núcleo de

formação da cidade. “No entanto, devido a fatores como a possibilidade de

descaracterização e a ampliação dos seus limites, estes centros podem ou não

corresponder a um centro histórico.”

c) Centro histórico ou centro antigo: para esta definição, a autora usa como referência

o conceito que a UNESCO atribui a centros históricos.

Considera-se conjuntos históricos ou tradicional todo agrupamento de construções de

espaços, inclusive de sítios arqueológicos e paleontológicos, que constituam um

assentamento humano, tanto no meio urbano quanto no rural e cuja coesão e valor são

reconhecidos do ponto de vista arqueológico, arquitetônico, pré-histórico, histórico, estético

ou sócio-cultural (UNESCO, 1976 apud GONÇALVES, 2006).

As características assinaladas podem ser encontradas no Centro Histórico da

cidade de São Luís, no Maranhão. Atualmente, ele abrange uma área de 220 hectares de

extensão e possui 2.500 imóveis tombados pelo Patrimônio Histórico Estadual, e 1000 pelo

IPHAN. Além disso, é reconhecimento internacionalmente pela UNESCO como o nono

monumento histórico-cultural do país incluído na Lista do Patrimônio Mundial Cultural e

Natural. No mapa abaixo é possível visualizar as áreas de tombamento, protegidas em

âmbito internacional, nacional e estadual. O Plano Diretor de São Luís considera como

Centro Antigo a área circunscrita pelo Anel Viário e Avenida Beira-Mar.

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Figura 1 - Mapa do do Centro Histórico de São Luis.

Fonte: Andrés 1998 apud Gonçalves 2006.

Dessa forma, o Centro Histórico de São Luís tem, no presente, um conjunto de leis

e instituições estatais que orientam, assim como controlam a intervenção, usos e/ou

conservação do seu patrimônio edificado, incluindo-se tanto os bens públicos quanto os

privados. Segundo Carneiro (2010 apud BOGEA, BRITO E PESTANA 2007), atualmente,

os órgãos estatais responsáveis por esse Centro são:

a) IPHAN e o Ministério da Cultura, em nível nacional;

b) Departamento do Patrimônio Histórico Artístico e Paisagístico do Estado do

Maranhão (DPHAP/MA), em nível estadual;

c) Fundação Municipal de Patrimônio Histórico (FUMPH), em nível municipal;

d) Secretaria Municipal de Terras Habitação e Urbanismo (SEMTHURB), órgão

vinculado à Prefeitura de São Luís, é responsável pela Fiscalização Urbanística/Polícia

Administrativa e Aprovação de Projetos e Obras e concessão de alvará de obras e serviços,

e) Núcleo Gestor do Centro Histórico de São Luís, órgão responsável pelo

gerenciamento e articulação entre os órgãos de preservação de todas as esferas e

operacionalização de ações,

f) Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura e Agronomia do Maranhão

(CREA/MA), responsável pela supervisão de obras ou reformas nos prédios.

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g) Ministério Público, denunciante legítimo de crimes contra o ordenamento

urbano e o Patrimônio Cultural.

O atual Plano Diretor de São Luís, Lei nº 4.669 de 11 de outubro de 2006, reserva

um de seus títulos para a Conservação do Patrimônio, descrevendo uso, finalidade ou

qualquer tipo de intervenção no Centro Histórico, estabelecendo, em seu art. 69, que:

A Política de Preservação do Patrimônio Cultural do Município visa assegurar a

proteção, disciplinar a preservação e, resgatar o sentido social do acervo de bens culturais

existentes ao possibilitar sua apropriação e vivência por todas as camadas sociais que a

eles atribuem significados e os compartilham, criando um vínculo efetivo entre os habitantes

e sua herança cultural e garantindo sua permanência e usufruto para as próximas gerações.

(PLANO DIRETOR DE SÃO LUÍS..., 2006)

É nessa perspectiva que busca-se demarcar e analisar as ações desenvolvidas

pelo Estado no campo da habitação no Centro Histórico de São Luís, como estratégia para

alavancar o processo de revitalização urbana dessa área, mediante políticas de

preservação e revitalização. Para isso, é fundamental recuperar algumas particularidades

históricas atinentes à expansão urbana da cidade e do abandono da área central e sua

posterior revalorização, quando passou a ser vista como Centro Histórico.

2.1 São Luís: expansão urbana e abandono do Centro Antigo

A primeira fase diz respeito ao afastamento de famílias integrantes da elite

ludovicense, devido às “misturas” de funções que o núcleo primitivo da cidade passava,

progressivamente, a abrigar: comercial, residencial, portuária, etc.

Incentivado e apoiado pela Prefeitura Municipal, esse movimento inicia-se em

meados dos anos 1920 com a instalação dos serviços de esgotos em novo setor da cidade,

contíguo ao núcleo original (O REGULAMENTO...,1926), e institucionaliza-se em 1930 com

a delimitação, pelo Decreto 330 (São Luiz, 1938), de uma nova zona residencial

compreendida pelas ruas de Santana, Passeio, Ribeirão, São Pantaleão e Direita, onde

medidas legais intentam impedir a presença de construções populares, como cortiços e

casas térreas, e incentivam a renovação arquitetônica. (BURNETT, 2008, p.94)

A segunda etapa da expansão urbana de São Luís acontece com a chegada dos

automóveis e dos novos padrões urbanos residenciais originados nos subúrbios americanos

dos anos 40 e 50, viabilizados pela melhoria do acesso rodoviário para a Cidade Balneária

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do Olho d’Água realizado, mais uma vez, com o decisivo apoio do poder público que investe

em infra-estrutura e moderniza o bulevar da Avenida Getúlio Vargas (UMA VISITA..., 1938

apud BURNETT 2008 p.95).

Processos históricos e urbanos atinentes às décadas de 1960 e 1970, que

influenciaram a expansão e delinearam a São Luís de hoje, são considerados por Burnett

(2008) como o terceiro conjunto de determinantes da decadência do núcleo primitivo da

cidade. Nessa perspectiva, ganham destaque os projetos do engenheiro Ruy Mesquita,

elaborados na década de 1950. Estes possuíam propostas modernizadoras “propondo

cruzar os rios Anil e Bacanga, que restringiam o crescimento urbano ao sentido oeste-leste,

o plano de Mesquita sugere um acesso direto às praias e ao futuro porto do Itaqui.”

(BURNET 2008, p. 96). As décadas de 1960 e 1970 são importantes também em virtude

das grandes indústrias implantadas em São Luís. Mais uma vez, mudanças socioespaciais

definitivas demarcam a nova dinâmica urbanística de São Luís. Segundo Burnet, o tripé

novas terras, verbas federais e investimentos privados (ALCOA e Vale do Rio Doce) é a

base para a configuração sócio-espacial da nova São Luís.

Também o Plano Diretor de 1975 traça a configuração socioespacial da atual São

Luis e reserva as áreas litorâneas para as elites. Toda essa dinâmica urbana contribuiu

para a desvalorização e degradação da área central, pois o Estado, tanto na esfera

estadual quanto municipal, deixava de investir nesse espaço, já considerado obsoleto, na

medida em que este não correspondia aos padrões de modernização e aos interesses

político econômicos e culturais das frações de classe dominantes.

À medida que os segmentos mais abastados abandonaram, cederam ou alugaram

seus imóveis edificados na área central, principalmente àqueles localizados no espaço que

corresponde hoje a Praia Grande, estes passaram a ser ocupados, muitas vezes de forma

irregular, por segmentos pobres da população urbana. Então, no ano de 1970, já se

percebia claramente o descaso dos proprietários privados em relação aos seus imóveis e

do poder público no tocante aos espaços públicos dessa parte da cidade, que não chegou a

ficar completamente abandonada por causa da atividade comercial.

Na perspectiva de reverter o abandono do Centro Antigo, em 1980, foi articulado o

PPRCHSL, influenciado, segundo Botelho (2006), pelo Programa Nacional Integrado de

Reconstrução das Cidades Históricas do Nordeste, da Secretaria de Planejamento da

Presidência da República. O autor destaca a liderança e responsabilização por parte do

governo estadual, apoiado pelo governo federal e, em última instância, pela esfera

municipal.

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Segundo Silva (2010), para a concretização do objetivo geral arrolado no

PPRCHSL foram traçados os seguintes subprogramas:

a) Subprograma de Obras do Largo do Comércio: tinha o objetivo de consolidar

o processo de recuperação social e econômica da área da Praia Grande;

b) Subprograma Social de Habitação no Centro Histórico de São Luís: se

voltava para criar condições, não só para permanência das famílias que habitavam na área,

mas também assegurar o aumento da oferta de unidades habitacionais;

c) Subprograma de Revitalização das Atividades Portuárias: consistia na

revitalização das atividades portuárias como fator de geração de emprego e renda;

d) Subprograma de Pesquisa e Documentação: objetivava identificar, catalogar

e manter um arquivo organizado com as informações e os documentos essenciais para

ajudar na “preservação do Centro Histórico”.

e) Subprograma de Aquisição e Recuperação de Imóveis para implantação de

Projetos de Interesse Social: visava à obtenção de recursos financeiros para a aquisição de

imóveis no Centro Histórico, para a implantação de programas de interesse social;

f) Subprograma de Restauração de Prédios Públicos no Centro Histórico:

destinava-se a fazer cumprir a obrigação do poder público de restaurar seus imóveis

localizados no Centro Histórico;

g) Subprograma de Restauração do Patrimônio Artístico e Arquitetônico: tinha

como objetivo assegurar a restauração e conservação dos monumentos mais inéditos e

outros de caráter religioso.

h) Subprograma de Recuperação da Infra-estrutura Urbana e Serviços Públicos:

preocupava-se com questões referentes a transporte, sinalização e trânsito, saneamento,

limpeza urbana e drenagem, abastecimento d’água, redes de esgoto, redes de energia

elétrica e telefone;

i) Subprograma para a Recuperação da Arquitetura Industrial do Centro

Histórico: almejava recuperar as fábricas e adequar suas instalações e usos mais intensivos

pela comunidade;

j) Subprograma de Recuperação do Patrimônio Ambiental urbano: objetivava

recuperar praças e jardins e integrá-los ao conjunto arquitetônico;

k) Subprograma Editorial e de divulgação: publicaria, periodicamente, as

principais propostas e planos, bem como o resultado dos estudos e pesquisas;

l) Subprograma de Planejamento e Administração: visava suprir as carências

de recursos humanos, através de um Grupo de Trabalho capaz de atuar com regularidade.

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O objetivo geral de “preservação e revitalização do Centro Histórico de São Luís,

através de intervenções de caráter social, físico, econômico e cultural” deveria guiar todas

as etapas do Programa. Porém, de acordo com Silva, (2002) na primeira etapa somente

foram realizadas poucas obras: Albergue do Voluntariado, Beco da Prensa, Feira e Praça

da Praia Grande. Vale destacar que nada foi feito em relação a programas de habitação,

sendo este o subprograma que detinha o menor orçamento, apenas 3,6% dos recursos

disponíveis. Assim, essa etapa se restringiu à melhoria da infra-estrutura da área. Após as

citadas intervenções houve uma estagnação das ações, só retomadas alguns anos depois.

A segunda etapa do PPRCHSL foi denominada de Projeto Reviver. Realizada no

ano de 1988 tinha como objetivo retomar as atividades paralisadas, mantendo-se os

objetivos e as diretrizes gerais traçadas no Projeto Praia Grande. Dessa forma, o Projeto

Reviver deu continuidade ao Projeto Praia Grande. Porém, nessa etapa do Programa

destacou-se o forte marketing em torno das ações do “novo” Projeto. Tal força levou ao fato

de que, até hoje, o bairro da Praia Grande é facilmente conhecido pelos moradores da

cidade como “Reviver”. Assim, o Projeto Reviver aparece, ao mesmo tempo, como

continuidade e ruptura: “[...], não só a preservação está inserida no projeto, mas também o

desenvolvimento de atividades, relacionadas ao comércio varejista, ao turismo, à cultura,

economicamente viáveis.” (MARANHÃO, 1988 apud SILVA, 2002 p.92)

Como principal resultado do Projeto Reviver sobressai-se ações de restauração da

parte infra-estrutural, com obras como galerias subterrâneas, iluminação, rede de telefonia.

Também o controle do trânsito e definição de estacionamentos contribuiram para diminuir o

fluxo de veículos e caminhões, que prejudicava a estrutura das ruas. Foram restaurados

alguns prédios que encontravam-se a ponto de ruírem. Após restauro, edificações situadas

na Praia Grande passaram a abrigar, dentre outras, instituições como o Centro de

Criatividade Odylo Costa Filho, Teatro João do Vale, Sede do Projeto Reviver, Sobrado da

Praça do Comércio e Museu de Artes Visuais.

No entanto, mais uma vez, nada foi feito no sentido de programas de habitação e

de incentivo a moradia na área alvo das ações de preservação e revitalização. Vale notar,

que, apesar da promoção da habitação já existir como objetivo desde o Projeto Praia

Grande, em 1981, a definição de programas de habitação no âmbito do PPRCHSL somente

foi traduzida efetivamente, na terceira etapa desse Programa, no período de 1990 a 1994,

mediante o objetivo de garantir o uso residencial do Centro Histórico destinando prédios

degradados e ocupados irregularmente para a habitação. Assim, concretizou-se a

restauração de um sobrado para a habitação de dez famílias de baixa renda que já

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moravam no Centro e viviam em condições precárias numa das mais antigas modalidades

de moradia dos segmentos empobrecidos da população urbana: os cortiços.

Figura 2- Prédio destinado ao Projeto de Habitação (Praia Grande São Luís, 2011)

Fonte: Acervo da autora.

Compreender a relação entre o morador, o Projeto Piloto de Habitação e o Centro

Histórico de São Luís em termos de vantagens e desvantagens desse modo de morar

contribuiu, de modo significativo, para demarcar alguns impasses e perspectivas atinentes a

moradia nesse Centro. Em relação às vantagens e desvantagens da moradia no Centro

Histórico, todos os moradores entrevistados responderam que a maior vantagem está na

facilidade de acesso a alguns equipamentos e serviços fundamentais à vida na cidade

presentes no conjunto da área central. Segundo o senhor Francisco de Almeida de 67 anos,

“é perto de tudo, tudo o que você quer está perto, não tem precisão de pegar ônibus”. No

campo das vantagens da moradia no Centro Histórico, outro ponto citado diz respeito à

oportunidade de lazer propiciada pelas múltiplas atividades culturais muito freqüentes nessa

área da cidade de São Luís.

Como desvantagem foi ressaltada a dificuldade de acesso a certos serviços,

principalmente na área específica da Praia Grande, na medida em que, na sua maioria, os

negócios comerciais estão voltados, prioritariamente, para turistas.

De acordo com definições atinentes ao Projeto Piloto de Habitação, após a entrega

do imóvel foi realizado o acompanhamento dos moradores. Então, perguntei aos

entrevistados como eles avaliavam esse acompanhamento. Todos responderam que foi

insuficiente, pois não capacitou os moradores a enfrentar e superar duas das grandes

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dificuldades: o convívio com os vizinhos e a resistência às regras existentes em

condomínios. Tal situação prejudica a manutenção do imóvel que apresenta, atualmente,

péssimo estado de conservação externo e interno, como é possível visualizar nas imagens

a seguir apresentadas.

Sucedeu-se outra etapa do PPRCHSL. Desta vez o foco principal voltou-se para o

incremento do turismo tendo como referência o “valor” arquitetônico e cultural do Centro

Antigo de São Luís. A quarta etapa do programa, desenvolvida nos anos 1995 e 1996, tem

importãncia estratégica, na medida em que ela antecedeu ao ano em que a cidade de São

Luís, receberia o título da UNESCO de Patrimônio Cultural da Humanidade. Então,

ocorreram importantes concessões de recursos através do Programa de Desenvolvimento

do Turismo no Nordeste, PRODETUR/NE.

Na quinta etapa do Programa Preservação e Revitalização do Centro Histórico de

São Luís (PPRCHSL), nos anos de 1996/1999, foram retomadas as ações voltadas para a

habitação, sendo então lançado o Projeto de Habitação no Centro Histórico de São Luís

para Funcionários Públicos. Também promovido pelo governo estadual, se constituiu numa

proposta diferenciada do Projeto Piloto de Habitação, .no que diz respeito, principalmente,

ao público alvo. Os prédios restaurados foram destinados à moradia de funcionários

públicos do governo do Estado do Maranhão, objetivando:

a) Ampliação do uso residencial, humanizando o espaço urbano e intensificando

o vínculo e o compromisso do cidadão com a área;

b) Geração de diversidade motivando o surgimento de novos comércios,

restaurantes, bares, hotéis, hospedarias, livrarias, escolas;

c) Intensificação do aproveitamento econômico dos investimentos em infra-

estrutura urbana;

d) Proporcionar aos servidores estaduais a oportunidade de moradia próxima ao

local de trabalho;

e) Incentivar investimentos privados assegurando melhor aproveitamento a

imóveis particulares, (GONÇALVES, 2006 p.54).

A assistente social destacou a importância da moradia para revitalização do Centro

Histórico de São Luís. Segundo ela, a manutenção dos imóveis é melhor quando existem

pessoas morando. Cita o exemplo de goteiras e uma série de outros problemas que

aparecem nos prédios, e que são imediatamente resolvidos quando existem moradores.

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3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Para fins de investigação utilizei a pesquisa teórica e documental, buscando dados

históricos e elementos conceituais referentes a centros históricos, a fim de chegar a

demarcações históricas, socioespaciais e político-institucionais relacionadas às

intervenções realizadas no Centro Histórico de São Luís. Já na pesquisa empírica,

privilegiando a área da Praia Grande - tombada pelo IPHAN - utilizei a observação direta do

cotidiano do lugar e entrevistas com moradores desse singular território. Ainda entrevistei

técnicos responsáveis pela implantação dos projetos de habitação, buscando a

compreensão dos seus desenhos institucionais, impactos na vida de moradores e

trabalhadores e na revitalização desse Centro Histórico. Também, através de entrevistas

com sujeitos estratégicos em relação ao tema, procurei identificar possíveis caminhos para

programas de habitação de maior envergadura. Registros fotográficos quanto ao abandono

desse Centro e de prédios restaurados para fins habitacionais integraram ainda a pesquisa

que subsidia o estudo ora apresentado.

4 CONCLUSÃO

O respectivo estudo possibilitou a apreensão das políticas de revitalização de

áreas urbanas centrais como uma tendência mundial e contemporânea, privilegiei como

referência socioespacial e político-institucional de análise projetos habitacionais pertinentes

ao Programa de Preservação e Revitalização do Centro Histórico de São Luís (PPRCHSL).

Trata-se da primeira proposta estatal ampla e sistemática de revitalização do Centro Antigo

de São Luís, executada pela Superintendência de Patrimônio Histórico e Cultural (SPHC)

de responsabilidade do governo do estado do Maranhão. Dentre os principais objetivos do

PPRCHSL figuravam: a fixação da população local nessa área da cidade e a promoção

social e implantação de projetos de habitação para várias edificações ocupadas em

condições irregulares.

Nesse âmbito, confirmou-se que, a moradia tem importância estratégica, não só

pela possibilidade de reverter o esvaziamento da área em termos demográficos, mas pode

contribuir para a sua revitalização, na medida em que o vínculo morador - local de moradia

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implica na necessidade de manutenção permanente da edificação que abriga as unidades

habitacionais e preocupações com o entorno da moradia.

De fato, o acervo fotográfico produzido, a observação do cotidiano da área da

Praia Grande e as entrevistas com técnicos/profissionais envolvidos diretamente na

formulação e execução desses projetos de habitação permitem confirmar a importância da

moradia nos contextos das políticas de preservação e revitalização de centros históricos

degradados, a exemplo do Centro Antigo de São Luís, e da ampliação do direito à moradia,

conforme definido na norma constitucional vigente, no Estatuto da Cidade e no Plano

Diretor da Cidade de São Luís 2006.

REFERÊNCIAS

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1, abril, 2011, pp. 104-121 Caderno Virtual de Turismo, vol. 11, núm. 1, abril, 2011, p

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