POLÍTICAS PÚBLICAS, CULTURAS POPULARES E PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL: meios e alternativas

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Este trabalho é resultado da pesquisa Cultura Popular e Patrimônio Cultural, o olhar de dentro para fora: uma análise sobre a gestão da cultura popular pelos ‘fazedores’ de cultura1, e tem como objetivo refletir sobre as políticas públicas no Brasil, tendo em vista a organização do Estado e a estrutura que oferece às culturas populares e ao patrimônio cultural imaterial. Vimos que historicamente o desenrolar de legislação desdobramentos políticos entre cultura popular e patrimônio cultural são mais do que parecidos, repetidos. O que podemos perceber, olhando para toda a trajetória de implementações de discursos, leis, decretos, portarias é que o principal motivador das várias gestões seria a preocupação com a construção da identidade nacional, e de que ela poderia representar entre os esforços no desenvolvimento econômico e, sobretudo, social do país. PALAVRAS-CHAVE: cultura popular, patrimônio cultural imaterial, políticas públicas, gestão cultural

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  • POLTICAS PBLICAS, CULTURAS POPULARES E PATRIMNIO CULTURAL IMATERIAL: meios e alternativas

    Alessandra Leal [email protected]

    Mestre em Geografia pela Universidade Federal de Uberlndia e Bolsista de Apoio Tcnico pela FAPEMIG,

    vinculada ao Grupo de Estudos e Pesquisas do Rio So Francisco OPAR.

    Carlos Rodrigues Brando [email protected]

    Educador e Antroplogo, Assessor do Instituto Paulo Freire,

    Professor pesquisador snior com bolsa CAPES no Programa de Ps-Graduao em Geografia da

    Universidade Federal de Uberlndia.

    RESUMO: Este trabalho resultado da pesquisa Cultura Popular e Patrimnio Cultural, o olhar de dentro para fora: uma anlise sobre a gesto da cultura popular pelos fazedores de cultura

    1, e tem como objetivo refletir sobre as polticas pblicas no Brasil, tendo em vista a organizao do Estado e a estrutura que oferece s culturas populares e ao patrimnio cultural imaterial. Vimos que historicamente o desenrolar de legislao desdobramentos polticos entre cultura popular e patrimnio cultural so mais do que parecidos, repetidos. O que podemos perceber, olhando para toda a trajetria de implementaes de discursos, leis, decretos, portarias que o principal motivador das vrias gestes seria a preocupao com a construo da identidade nacional, e de que ela poderia representar entre os esforos no desenvolvimento econmico e, sobretudo, social do pas. PALAVRAS-CHAVE: cultura popular, patrimnio cultural imaterial, polticas pblicas, gesto cultural

    Dizendo Polticas Culturais na Cultura As polticas culturais para a cultura popular no Brasil acompanham de certo modo o mesmo

    movimento de desenvolvimento ocorrido com o patrimnio cultural imaterial. A mesma corrente que mobilizou a Semana de Arte Moderna em 1922 em prol da cultura popular e do patrimnio cultural, norteou tambm outras alternativas de apoio a tais artes e ofcios.

    Essa iniciativa consideravelmente conduzida pelas estruturas polticas organizadas por Getlio Vargas em toda a dcada de 30.

    No contexto que aqui nos interessa, Vargas, nos primeiros anos da dcada de 1930, inicia a poltica de criao de autarquias e conselhos nacionais que cuidariam de setores especficos (como nos casos dos Conselhos Nacionais de Estatstica e Geografia), ou de produtos considerados economicamente importantes [...] (ALMEIDA, 2003. p. 114)

    O enfoque da poltica institucional de Vargas estava longe de se dedicar s artes e cultura.

    Com o cunho desenvolvimentista e preocupado com o crescimento econmico, as polticas culturais eram uma ponta da aresta construda aos tropeos por esforos e iniciativas individuais, como foi o caso de Mrio de Andrade.

    1 A pesquisa foi premiada pela FUNARTE com a Bolsa de Produo Crtica em Conhecimentos Tradicionais e Culturas Populares em 2010/2011 e gerou a dissertao Semear cultura, Cultivar culturas populares, Colher patrimnios: a gesto social da cultura popular s margens do Rio So Francisco no Norte de Minas Gerais.

  • Sensibilizado pelo movimento modernista, entretanto, ainda com o entendimento destorcido do que deveras seria a cultura, criado em 1931, pelo Decreto n 19.850 o Conselho Nacional de Educao do Governo Federal.

    (...) cujos objetivos eram elevar o nvel da cultura brasileira e, entre as atribuies, promover e estimular iniciativas em benefcio da cultura nacional; em outras palavras, acreditava-se que a populao brasileira possua um baixo nvel cultural originado pela falta de acesso e conhecimento da produo artstica e cultural erudita, cabendo ao governo reverter tal situao. (CALABRE, 2009. p. 17)

    O decreto, da mesma forma como ocorreu no campo do patrimnio cultural, no mobilizou

    reais aes que promovessem ou incentivassem o desenvolvimento das artes no pas. A iniciativa retorna a 1935 com a experincia no estado de So Paulo, atravs das medidas de Mrio de Andrade.

    Mrio de Andrade assumiu a direo do Departamento de Cultura do estado de So Paulo, responsvel pela poltica patrimonial, e do Departamento de Expanso Cultural. As atividades das divises desse departamento estavam todas articuladas entre si, buscando potencializar os resultados obtidos por meio da criao de polticas pblicas para a rea da cultural (CALABRE, 2009. p. 19)

    Como resultado, houve a construo de museus, congressos de estudos sobre cultura e cultura popular, implementao de bibliotecas pblicas e municipais. Investimento em projetos de qualificao e profissionalizao de profissionais e tcnicos em biblioteconomia.

    O cinema foi contemplado em 1932 com o Decreto n 21.240, que acentuava a obrigatoriedade da participao da cultura popular e a apresentao de filmes brasileiros de curta-metragem. Apesar de todos os problemas do decreto, como limitaes e coibies da censura, ele estimulava a produo nacional, incluindo a possibilidade de participao de culturas no prestigiadas na poca como a cultura popular.

    A lei do curta-metragem ou lei do short, como se chamou na poca representou para os produtores a possibilidade de manter a continuidade de seu trabalho. Em poucos meses, algumas centenas de curtas estavam sendo distribudos pelo pas, num destemido flagrante argumentao dos exibidores de que uma lei de obrigatoriedade era absurda, pois no havia produo a ser exibida. (CALABRE, 2009. p. 29)

    Claro que em tempos de ditaduras, os problemas no eram poucos e a interveno direta do

    Estado era constante. Assim, o mesmo movimento que incentivava tambm podava e limitava. Com o teatro e o rdio no foi diferente. Ele foi agraciado com a criao da Comisso

    Nacional do Teatro em setembro de 1936, que deveria iniciar programas de estudos e atividades teatrais.

    Em 21 de dezembro de 1937, foi promulgado o Decreto Lei n 92 que criava o Servio Nacional de Teatro (SNT). No texto introdutrio, o decreto considerava o teatro como uma das expresses da cultura nacional, e a sua finalidade , essencialmente, a elevao e a edificao espiritual do povo sendo o SNT destinado a animar o desenvolvimento e o aprimoramento do teatro brasileiro. (CALABRE, 2009. p. 29)

    O rdio recebe em 1934 o Departamento de Propaganda e Difuso Cultural, que teria como

    objetivo o incentivo da divulgao das artes pela radiodifuso e a elevao do esprito das massas. Entretanto, mais que do que teatro e o cinema, o rdio sofreu censuras fortssimas em tempos de ditaduras. Os programas eram fiscalizados e deveriam ter os mesmos horrios e difuso por todo o territrio nacional. Transformando-se em mais do que uma promoo da arte e da cultura uma forma de manipulao e doutrinamento do povo. Ressalvas parte, as emissoras de radio conquistam o territrio nacional.

    Com a demisso de Mrio de Andrade em 1938, j lembrada aqui, o cenrio das polticas culturais perdem espao e permanece em sono dormente at 1945.

    Em 1946, com o fim da Segunda Guerra Mundial e do perodo militar, o pas explode numa busca acelerada pelo desenvolvimento industrial. Livres da censura, rdio, cinema, teatro e literatura promovem juntos um aumento significativo de produes e criaes.

  • At 1960 pouca foi a interveno do Estado para com a promoo da cultura. Sua atuao limitou-se a outorgas de decretos e regulamentaes que fortaleciam o plano de gesto cultural j implementado pelo governo de Getlio Vargas. No entanto, a liberdade de expresso foi suficiente para promover sozinha uma exploso da diversidade de produo cultural no pas. Um crescimento incentivado pelo desenvolvimento industrial e pela dinmica do capitalismo, que agita o mercado de servios e bens e estimula o consumo constante. No caso do rdio, em 1945 foram criadas 111 emissoras; em 1946, foram 136 e em 1950, surgiram 300 novas emissoras, ou seja, a taxa de crescimento aumentou em quase 200% em cinco anos. No cinema no foi diferente, segundo o IBGE, entre 1949 e 1950 a metragem de filmagens nacionais dobrou, passando de 181.218 para 357.565 metros. (CALABRE, 2009. p. 45-46)

    Nota-se, entretanto, que o teatro e a literatura tiveram neste perodo ainda pouco espao, mesmo com todo o incentivo de um mercado capitalista em expanso. Isto forava o governo a conceder espordicos auxlios financeiros para sua viabilizao. O que nos leva a confirmar que no existia um real planejamento que alicerasse base para a promoo das artes e da cultura.

    Sobre a cultura popular, continuavam existindo apenas as iniciativas polticas pensadas e colocadas em prtica por Mrio de Andrade. Nesse perodo, o prprio governo no definia qual o entendimento que teria sobre o tema, que ora pendia para a compreenso do patrimnio como bem cultural, como alicerce da identidade nacional, ora como cultura de um povo colonizado, que deveria ser suplantando, ao mesmo tempo em que a urbanizao e a industrializao deveriam construir um novo povo brasileiro, uma nova cultura popular (CALABRE, 2009. p. 50)

    Em 1955, por meio do Decreto n 37.608, criado o ISEB Instituto Superior de Estudos Brasileiros. Em seu documento de base folclore e cultura tinham significados antagnicos: o primeiro significava tradio e o segundo, transformao. Logo, a finalidade da cultura popular era fornecer conscincia ao povo e ser um elemento transformador. (CALABRE, 2009. p. 53). No ISEB as principais prticas eram estudos e pesquisas, nada havendo de aes destinadas a incentivos ou de atuao conjunta ao povo.

    No entanto, o ISEB juntou-se aos movimentos de cultura popular que surgiram no comeo da dcada de 60, e que trataram de reinventar o prprio significado da cultura popular. Ela deixa de ser algo criado e praticado por um povo subalterno e alienado. E passa a representar a face de conscincia crtica e resistncia do povo. Ao mesmo tempo, cultura popular passa a ser um campo ativo de dilogo entre estudantes, profissionais, militantes polticos revolucionrios e artistas comprometidos com o povo. Estas pessoas e grupos de ao educativa e cultural atuavam atravs de movimentos culturais, de instituies estudantis em que se destaca a Unio Nacional dos Estudantes UNE partidos polticos de esquerda e outras agremiaes.

    Este o tempo do Movimento de Educao de Base - MEB, do teatro do oprimido, de Augusto Boal, do cinema novo e de vrias outras iniciativas culturais que buscavam, para alm das polticas pblicas, realizar um trabalho de mobilizao cultural em todo o Brasil. E, atravs deste movimento, um trabalho de transformao da realidade poltica e social do Brasil. Aqui o nome de Paulo Freire e de tantos outros militantes de cultura popular devem ser lembrados. Lembremos tambm que em Recife, em 1962 realiza-se o primeiro Encontro Nacional de Movimentos de Cultura Popular.

    Fora o que se fez em e entre circuitos militantes e independentes, o que promoveu e possibilitou o desenvolvimento das expresses artsticas e da cultura neste perodo foram os investimentos privados e iniciativas independentes. Ou seja, o mercado e a indstria provocaram o nascimento de uma indstria cultural que viabilizou aes e criaes mltiplas. Indstria que financia a Bossa Nova, o Cinema Novo e a poesia concreta nos fins dos anos 50.

    Em 1991 homologado, pela Lei n 8.313, de 23 de dezembro, o PRONAC Programa Nacional de Apoio Cultura. Popularmente conhecido como Lei Rouanet, em reconhecimento ao criador, o socilogo Srgio Paulo Rouanet. O Programa buscava fomentar alternativas em que se mesclavam a interveno pblica e a privada para o financiamento de projetos que, dentre outros critrios:

  • a. contribuam para facilitar os meios para um livre acesso s fontes da cultura e o pleno exerccio dos direitos culturais;

    b. apoiassem, valorizassem e difundissem o conjunto das manifestaes culturais e seus respectivos criadores;

    c. salvaguardem a sobrevivncia e o florescimento dos modos de criar, lazer e viver da sociedade brasileira;

    d. preservassem os bens materiais e imateriais do patrimnio cultural e histrico brasileiro. Para serem contempladas as propostas deveriam ser previamente aprovadas pela Comisso Nacional de Incentivos Cultura CNIC, do Ministrio da Cultura.

    O Programa possua trs mecanismos de estmulo a projetos culturais: o FNC Fundo Nacional da Cultura, o FICART Fundo de Investimento Cultural e Artstico e o MECENATO Incentivo a projetos culturais. Cada um possua suas formas especficas de seleo e incentivo financeiro. O primeiro (FNC) constitudo principalmente de recursos advindos das loterias federais, do Tesouro Nacional, do Fundos de Desenvolvimento Regional e doaes, alm de saldos ou devolues oriundos de projetos de Mecenato, saldos de exerccios anteriores e resgate de emprstimos. O MECENATO possibilitava o financiamento de projetos por instituies ou pessoas que se interessarem, oferecendo a estas redues no imposto de renda. Normalmente as propostas eram submetidas a editais de empresas patrocinadoras, como o Banco do Brasil, a CEMIG, o Banco do Nordeste, etc. O FICART previa, sem qualquer interveno do Ministrio da Cultura, a composio de fundos por meio da iseno de imposto de renda e de operaes de crdito, cmbio e seguro. A implementao do FICART est em estudos pela Secretria de Apoio Cultura do Ministrio da Cultura.

    A lei Rouanet gerou um novo impulso s produes culturais, ainda que nos primeiros anos tivesse havido diversas dificuldades de implementao. (CALABRE, 2009. p. 111). Ela veio corrigir alguns problemas que as legislaes anteriores possuam desde o entendimento do que vinha a ser culturas, at a forma de viabilizar sua produo.

    Em 1993 acontece em Braslia a I Conferncia Nacional de Cultura, organizada pela Organizao No Governamental Cult. O encontro mobilizou a sociedade civil, profissionais e artistas num debate de permitiu o fomento de novas prticas e atividades mais intensas, junto s polticas culturais.

    Em 1995 o Ministrio da Cultura, j no governo Fernando Henrique Cardoso, promoveu crculos de reunies entre especialistas franceses e brasileiros, denominados Encontros Malrax, sob o tema Cultura, Estado e Sociedade: Frana e Brasil. Neles novamente debatem-se a falta de recursos e os problemas das polticas culturais. Dentre eles a centralizao dos recursos na regio sudeste e obscuridade dos processos de seleo e de concesso dos mesmos.

    As concesses do Governo Federal para com a aprovao dos projetos inscritos restringiam-se mera conferncia de enquadramento do pedido s artes permitidas pela legislao. A escolha definitiva de quem receberia de fato o recurso ficariam cargo das empresas que destinariam a porcentagem de seus impostos devidos. Isto fez com que a escolha dos projetos se baseassem basicamente nos interesses de mercado para ampla divulgao e marketing cultural. O que o governo terminou fazendo foi liberar recursos pblicos para serem aplicados sob a tica do interesse empresarial (CALABRE, 2009. p. 117). Se por um lado isto incentiva a produo, por outro desprestigia as artes, subordinando os critrios de valor artstico e cultural ao interesse de promoo da imagem de empresas comerciais.

    Entre 1995 e 2002 as polticas culturais, apesar de haverem galgado passos significativos para permitir o acesso do povo a ferramentas de produo cultural, ainda no se haviam alicerado numa gesto planejada. Leis e decretos eram promulgados partir da necessidade de soluo imediata de problemas advindos do PRONAC, sem contudo, firmar bases e projees para sadas a dificuldades futuras tanto para o Estado, para empresa quanto para o povo.

    Em 2003, com a gesto de Luiz Incio Lula da Silva e a entrada de Gilberto Gil no Ministrio da Cultura, ocorreram profundas transformaes e rearranjos dentro da lgica de funcionando do Ministrio da Cultura, com o objetivo agilizar o sistema e reformular uma poltica

  • de incentivos, antes, centrada basicamente na Lei Rouanet. Com isso, o ministrio dissolveu e criou novas secretarias, sendo elas: Secretaria de Articulao Institucionais, a Secretaria de Polticas Culturais, a Secretaria de Fomento e Incentivo Cultura, a Secretaria de Programas e Projetos Culturais, a Secretaria do Audiovisual e a Secretaria de Identidade e Diversidade Cultural.

    Com o objetivo de rearranjar internamente os mecanismos de financiamento, promoveu consultas pblicas e seminrios Cultura para todos. Reunies e encontros com secretarias estaduais e municipais. Os participantes receberam duas perguntas para responder, e do dilogo ao redor de suas respostas poderiam sair as reformulaes ministeriais.

    Quais os principais entraves para o acesso ao financiamento pblico federal de cultura (Lei Rouanet e Lei do Audiovisual)? Que mecanismos devem ser adotados para garantir a transparncia, a democratizao e a descentralizao do financiamento pblico da cultura? A avaliao mais geral foi a de que o mecanismo necessitava ser reformulado; porm, havia uma srie de problemas que poderiam ser solucionados por meio de portarias ministeriais, divulgao mais sistemtica da lei e capacitao de produtores e de gestores nas mais diversas regies do pas. Uma outra concluso foi a importncia do mecanismo dentro de determinadas reas da produo cultural, o que apontaria para a necessidade de que o projeto de reformulao fosse realizado de maneira a no paralisar os processos em curso. (CALABRE, 2009. p. 123

    Desde 2003, e a partir dos seminrios e congressos realizados, a Lei Rouanet vem sendo re-

    pensada, tendo em visto os problemas e desencontros em meio aos quais a sociedade civil e o poder de Estado no conseguiam estabelecer dilogo. Como consequncia, em 2010 a Lei reformulada, sendo implementada pela primeira vez em 2010.

    O PRONAC transforma-se em PRCULTURA - Programa Nacional de Fomento e Incentivo Cultura, aprovada pelo Projeto de Lei n 6722/2010, que passa a ter como objetivo central ampliar os recursos da cultura e diversificar os mecanismos de financiamento, de forma a desenvolver uma verdadeira Economia da Cultura no Brasil

    Os mecanismos de financiamento so dinamizados; critrios e objetivos so estabelecidos para que haja avaliao clara e justa dos projetos inscritos; parcerias entre Estado e sociedade civil so aprofundadas; estmulos cooperaes entre federao, estados e municpios so estimulados e estabelecidos. Uma das principais preocupaes de toda esta reformulao foi evitar a intermediao entre recurso e destinatrio, com maior participao da sociedade.

    O PRCULTURA conserva algumas caractersticas do PRONAC, como o FNC e o FICART, e reformular outros, ficando estruturado e divido em quatro fundos:

    O FNC - Fundo Nacional da Cultura passa a ser dividido em oito fundos setoriais. 1. Artes Visuais; 2. das Artes Cnicas; 3. da Msica; 4. do Acesso e Diversidade; 5. do Patrimnio e Memria; 6. do Livro, Leitura, Literatura e Humanidades, 7. de Aes Transversais e Equalizao; e 8. de Incentivo Inovao do Audiovisual.

    Buscou-se, nesse novo modelo, a atenuao da burocracia para a concesso de incentivos, ao

    lado de novas formas de fomento a serem implementadas, como a concesso de bolsas e prmios, em que a prestao de contas simplificada, de modo que haja preocupao com os resultados apresentados ao final dos projetos. O que passa a contar agora a iniciativa e o retorno que o projeto trar para a arte, a cultura e a cultura popular, seja sob a forma de pensamento e pesquisa estruturada, seja como atividades diretas como apresentaes de shows, teatros e simblicas.

  • mantido o Incentivo Fiscal a Projetos Culturais, que se conserva de certa forma parecida com antiga forma de captao do PRONAC por meio de deduo no imposto de renda, de pessoas jurdicas e fsicas. O sistema mantm as caractersticas essenciais do antigo PRONAC.

    relevante tambm a atuao do FICART Fundo de Investimento Cultural e Artstico; atravs do qual os investidores associados tornam-se scios de projetos culturais. Os investimentos podero ser retornveis ou no. No primeiro caso deve ser garantida a participao do Fundo Nacional de Cultura, quando do retorno comercial do projeto cultural. No segundo, o financiamento fica condicionado gratuidade ou comprovada reduo nos valores dos produtos ou servios culturais resultantes do projeto cultural, bem como abrangncia da circulao dos produtos ou servios em pelo menos quatro regies do Pas. (PROJETO DE LEI n 6722/2010).

    criado ainda o Vale-Cultura Programa de Cultura do Trabalhador, oficializado pelo Projeto de Lei 221 de 2009, que oferece ao trabalhador de carteira assinada um vale, concedido por meio de carto magntico, de R$ 50,00 (cinquenta reais) por ms, a ser investido em entretenimentos culturais, como passeio em cinemas, shows, teatros e aquisio de livros. O incentivo viabiliza a abertura de cinemas em bairros populares e a produo cinematogrfica. As empresas que optarem por disponibilizar o vale ao trabalhador ter deduo de 1% (um por cento) no imposto de renda. Mas, independente da empresa, os trabalhadores podero adquirir o carto.

    Em dezembro de 2004 o Ministrio da Cultura assina parceria com o Instituto Brasileiro de Geografia IBGE para que fosse includo um bloco de informaes bsicas sobre cultura na pesquisa de informaes bsicas municipais. As informaes subsidiaram planejamentos na elaborao Plano Nacional de Cultura e de programas e projetos promovidos pelo MinC.

    Em 2005 acontece a I Conferncia Nacional de Cultura, que assim como o Seminrio Cultura para todos, promovia a reflexo nacional sobre o contexto das polticas culturais. As informaes da conferncia, somadas s do seminrio, fundamentaram as aes para programao e implementao do novo Plano Nacional de Cultura, institudo pela Ementa Constitucional n 48 de 1 de agosto de 2005.

    O Plano Nacional de Cultura tinha como diretriz: Defesa e valorizao do patrimnio cultural brasileiro; Produo, promoo e difuso de bens culturais; Formao de pessoal qualificado para gesto da cultura em suas mltiplas

    dimenses; Democratizao do acesso aos bens da cultura; Valorizao da diversidade tnica e regional.

    Ementa Constitucional n 48, 2005 Outra estratgia foi a implementao do Sistema Nacional de Cultura SNC, que facilitou a

    gesto do Plano Nacional de Cultura e permitiu o dilogo interno entre as secretarias. O SNC foi e segue sendo importante no s na gesto do patrimnio cultural. Ele permitiu, ainda, a comunicao entre as polticas, o banco de dados e de informaes que possuam. A poltica de patrimnio cultural encontrava-se de certo modo dissociadas e afastadas das demais atividades das secretarias culturais. Como mediador desse problema foi criado tambm o Conselho Nacional de Poltica Cultural CNPC, em 24 de agosto de 2005.

    Em 2007, vimos que o Ministrio da Cultura implementa o Programa Mais Cultura. Este est divido em trs extenses bsicas, todas com foco sobre a participao da sociedade civil e jurdica: Cultura e Cidadania (que organiza o Cultura Viva); Cultura e Cidades; e a Cultura e Economia.

    As aes e iniciativas do Programa so divulgadas por meio de Editais publicados no Dirio da Unio, e consequentemente no site do MinC. So sempre destinados a projetos e pessoas (fsicas e jurdicas) com natureza e fins culturais.

    A extenso Cultura e Cidadania promove o Programa Cultura Viva, que por sua vez promove os Pontos de Cultura. O Programa Cultura Viva a iniciativa que mais se aproxima das culturas populares. Dele partiram encontros com grupos de cultura popular, promovidas ainda quando da presena de Gilberto Gil no Ministrio da Cultura. Encontros que incutiram nos

  • autores/atores a conscincia da importncia de seus atos para o pas. Veremos isto mais de perto quando estudarmos o caso do Grupo de Folia de Reis Gara Branca Peito de Ao de Pirapora;

    O Cultura Viva tem como objetivos: Ampliar e garantir acesso aos meios de fruio, produo e difuso cultural Identificar parceiros e promover pactos com atores sociais governamentais e no-governamentais, nacionais e estrangeiros, visando um desenvolvimento humano sustentvel, no qual a cultura seja forma de construo e expresso da identidade nacional Incorporar referncias simblicas e linguagens artsticas no processo de construo da cidadania, ampliando a capacidade de apropriao criativa do patrimnio cultural pelas comunidades e pela sociedade brasileira Potencializar energias sociais e culturais, dando vazo dinmica prpria das comunidades e entrelaando aes e suportes dirigidos ao desenvolvimento de uma cultura cooperativa, solidria e transformadora Fomentar uma rede horizontal de transformao, de inveno, de fazer e refazer, no sentido da gerao de uma teia de significaes que envolva a todos Estimular a explorao, o uso e a apropriao dos cdigos de diferentes meios e linguagens artsticas e ldicas nos processos educacionais, bem como a utilizao de museus , centros culturais e espaos pblicos em diferentes situaes de aprendizagem e desenvolvendo uma reflexo crtica sobre a realidade em que os cidados se inserem Promover a cultura enquanto expresso e representao simblica, direito e economia. (MINC, noticirio, 2010).

    Por meio dele, os autores/atores de cultura popular, e mesmo seus intermedirios podem acessar os recursos do PRCULTURA, ora por meio do Fundo Nacional de Cultura, ora meio do Incentivo Fiscal a Projetos Culturais. O edital que determinar a fonte do fundo. O Ponto de Cultura a ao prioritria e o ponto de articulaes das demais atividades do Programa Cultura Viva. Os Pontos de Cultura so espaos permanentes de experimentao, encanto, transformao e magia, segundo Luiz Incio Lula da Silva. O Ponto de Cultura uma espcie de do-in antropolgico, massageando pontos vitais, mas momentaneamente desprezados ou adormecidos, do corpo cultural do Pas, de acordo com Gilberto Gil. (MINC, Noticirio, 2010) Os Pontos de Cultura oferecem um recurso significativo a organizaes da sociedade civil (OSCIPS, Associaes, Instituies de Estudos e Pesquisas), que trabalhem diretamente em prol do resgate e da valorizao da cultura e da cultura popular num local.

    O Ponto de Cultura no tem um modelo nico, nem de instalaes fsicas, nem de programao ou atividade. Um aspecto comum a todos a transversalidade da cultura e a gesto compartilhada entre poder pblico e comunidade. (...) Quando firmado o convnio com o MinC, o Ponto de Cultura recebe a quantia de R$ 185 mil, em cinco parcelas semestrais, para investir conforme projeto apresentado. Parte do incentivo recebido na primeira parcela, no valor mnimo de R$ 20 mil, para aquisio de equipamento multimdia em software livre (os programas sero oferecidos pela coordenao), composto por microcomputador, mini-estdio para gravar CD, cmera digital, ilha de edio e o que mais for importante para o Ponto de Cultura. (MINC, noticirio, 2010).

    A idia que os Pontos de Cultura fortifique as aes que j acontecem nas comunidades, de

    modo a fortalecer tambm a identidade dos que ali esto envolvidos. J foram implementados 1460 pontos de cultura em todo o pas.

    As extenses de Cultura e Cidades e a Cultura e Economia promovem ainda outros programas que se acoplam ou no ao Cultura Viva, de forma a empoderar o programa e as iniciativas do FNC.

    Refletindo sobre as Polticas Culturais no Brasil

    Em 30 de julho de 2008, o ento ministro Gilberto Gil pede demisso do seu cargo e volta a

    dedicar-se sua carreira de cantor. Deixa no ministrio sua marca de transformaes e atualizaes no sistema.

    Para Isaura Botelho (2007), na gesto Gil, depois de muitas idas e vindas do ministrio, teve um processo de discusso e reordenao do papel do Estado na rea cultural com

  • tentativas de recomposio de oramento, melhor distribuio dos poucos recursos. A pesquisadora destaca ainda o investimento na recuperao de um conceito abrangente de cultura, o fato de considerar como fundamental a articulao entre cultura e cidadania e o alerta para o peso da cultura em termos da economia global do pas. (CALABRE, 2009. p. 125)

    difcil tecer comentrios sobre os acontecimentos e as consequncias das polticas

    culturais que vem se processando nos ltimos anos. Os processos e projetos esto em suas primeiras experincias, de modo que no possvel a visualizao e a anlise dos reais resultados dos mesmos. necessrio um distanciamento significativo para que crticas e abordagens possam ser elaboradas de forma impessoal.

    O que podemos perceber, olhando para toda a trajetria de implementao de discursos, leis, decretos, portarias que o principal motivador das vrias gestes seria a preocupao com a construo da identidade nacional, e de que ela poderia representar entre os esforos no desenvolvimento econmico e, sobretudo, social do pas.

    Em todo o processo de desenvolvimento que vivemos a cultura no tomada como algo essencial ou importante em nenhum momento. As poucas aes que acontecem so consequncias de atitudes de interesses pequenos grupos. A preocupao central com a integrao nacional, e so utilizados todos os meios para a manipulao miditica e a subordinao do povo a interesses divididos entre a preservao de hegemonias polticas e os ganhos do capital, inclusive o aplicado sobre a cultura.

    Tanto durante o Governo Militar quanto nos anos que se seguem, de 1970 a 2002, mantm-se, com variantes, uma atitude conservadora e desconexa de iniciativas efetivas de atuao e pensamento cultural. Entre 1960 e 1990, com as trocas de gesto pblicas, algumas transformaes acontecem e provocam atualizaes nas formas de pensamento e ao pblica, sem, contudo, transformarem significativamente a gesto de polticas culturais vigentes. A cultura popular sequer foi lembrada, para alm dos limites da poltica do patrimnio cultural imaterial. O discurso identitrio se perde em meio ao essencialismo autoritrio e conservador dos anos 1930/40 e 1960/70. E toda a gesto da cultura passa a ser pautada pela lgica do mercado globalizado. O retorno democracia nos anos 1990 faz fronteira com o fortalecimento no Brasil do iderio neoliberal, que os governos FHC assumem. A consequncia para o campo cultural a ratificao da poltica de incentivos fiscais iniciadas no governo Sarney. Uma vez posto em xeque o lugar unificador e integrador da identidade nacional, parece prevalecer o discurso liberal da diversidade, onde todos so iguais perante o mercado.

    Com o governo Lula, tem-se uma reavaliao do que seria a identidade nacional brasileira que aponta para o pluralismo e a incorporao de expresses culturais historicamente excludas. A diversidade no resulta mais em uma sntese, pelo contrrio, o plo identitrio que cede diversidade e se multiplica em identidades. H, por sua vez, a crtica concepo mercadolgica da cultura e a cobrana do papel fundamental do Estado como elaborador e executor de polticas culturais. (BARBALHO, 2007.)

    Talvez o mais revolucionrio em todo este acontecer tenha sido as inovaes que vm

    acontecendo desde 2003, quando a prioridade passa a ser o permitir s culturas latentes que falem por si mesmas, em suas diversidades, para, a partir da, se fazerem compreendidas como Patrimnio Cultural e como o patrimnio que a identidade do povo e, atravs dele, do pas.

    Inovaes que, esperamos, desdobrem-se em inovaes que permitam que as culturas, principalmente a culturas populares, sejam compreendidas em conjunto com seus autores/atores, atravs de um respeito e um novo entendimento dos atos de significao intuitivos, tratados agora de forma harmnica e respeitosa.

    Diga-se que mesmo com todos os problemas existentes, o rearranjo exercido na administrao de Gilberto Gil, foi de tal forma significativo que no apenas ampliou debates e discusses, alterando opinies e abordagens polticas e culturais em todo o pas, como logrou incorporar junto aos prprios autores-atores um embrio de um re-significar de suas identidades. Cultura popular e culturas populares, folies, rabequeiros, benzedeiros, no so agora vistos como

  • formas culturais marginais, mas como exemplos de cultura viva. E so eles assim entendidos por eles mesmos.

    A partir da, eles esto reivindicando diretamente os seus direitos e valores. A abertura do MinC permitiu o aflorar e o desenrolar de relaes e rearranjos internos e externos dos atores-autores individuais e coletivos de culturas patrimoniais. Claro, este acontecimento, como tudo que novo, aponta sempre para dois lados. Um positivo, com a chegada do novo, de incorporao do povo numa dinmica multicultural e global. E outro negativo, quando este acontecer ameaa afastar, como j comentamos anteriormente, os criadores/atores de culturas populares de seus sujeitos e contextos sociais e afetivos de origem.

    Vale fazer saber que com a implementao do Plano de Polticas Culturais, do Sistema Nacional de Cultura Popular e do Programa Cultura Viva que folies como Seo Carlos2 conseguem ter acesso ao Ministrio da Cultura diretamente. Mesmo que seja apenas para uma conversa formal e dissociada de recurso financeiro direto.

    Ao mesmo tempo, comeam a ressurgir em todo o Brasil diferentes fruns da sociedade brasileira, como um contraponto s iniciativas governamentais e empresariais. O Frum Social Mundial3, os encontros de movimentos sociais, O Encontro dos Povos do Cerrado, so bons exemplos.

    Mais importante do que o que se passa como iniciativa pblica so os encontros, as oficinas, os festivais etc., promovidos por instituies populares de cultura, ou por instituies da sociedade civil (com ou sem a presena e o patrocnio Estado), por todo o pas, e envolvendo todas as categorias culturais e sociais, desde povos indgenas at operrios.

    Temos o exemplo, em termos de Norte de Minas, do Encontro dos Povos do Cerrado. Ele se realiza atravs do esforo conjugado da UNIMONTES, de prefeituras locais, de ONGS. Mas entende-se que a presena principal a de segmentos das comunidades populares do Cerrado. Temos ainda encontros propriamente populares, como o dos Vazanteiros, dos Povos da Floresta e tantos outros. Tais encontros unem vozes e entendimentos para aprofundamento de suas questes, e para juntos tornarem pblicas, ouvidas e atendidas necessidades e reformulaes. Alguns deles geram importantes documentos e manifestos.

    Dos encontros, grupos ganham fora poltica e institucional. Estruturam-se em organizaes no- governamentais, ou em associaes para mediarem voz e vez junto ao Estado, e para tornarem eficientes em suas utilizaes as ferramentas construdas para eles. Ali eles trocam experincias e compartem descobertas, tanto quanto aos conhecimentos e saberes que geram e socializam, quanto s inovaes provocadas pelos seus rearranjos na gesto de suas criaes e manifestaes.

    Das trocas e das redes sociais e culturais que se originam delas, nasce por todo o Brasil um movimento de ampliao de valores comunitrios, harmnicos e de respeito aos seus prprios saberes e fazeres: seus atos de significao intuitivos e seus conhecimentos tradicionais. Juntos, viabilizam aes, mesmo que pequenas e restritas ao alcance dos grupos locais. Aes de divulgao de seus modos de vida, seus valores e vises de mundo que, no raro opem-se s prticas empresariais, mercantis e francamente capitalistas vigentes no mundo e largamente planejadas pelo governo brasileiro.

    Voltemos ao Frum Social Mundial, pois ele um exemplo significativo. O Frum proporciona o encontro e a mobilizao de redes nas mais diversas reas de atuao social, econmica e cultural, gerando e facilitando articulaes e incentivando e viabilizando aes conjuntas concretas. Uma experincia fecunda e proveitosa de uma comunidade barranqueira do Rio So Francisco, passa a ser conhecida por uma comunidade tradicional amaznica. As trocas se fazem presentes e, nelas, temos o fluir das inovaes, aproveitando arranjos antigos num contexto

    2 Folio de Santos Reis do Terno de Folia Gara Branca Peito de Ao de Pirapora que cedeu informaes e entrevistas esta pesquisa. 3 O Frum Mundial Social um espao de debate democrtico de idias, aprofundamento da reflexo, formulao de propostas, troca de experincias e articulao de movimentos sociais, redes, ONGS e outras organizaes da sociedade civil que se opem ao neoliberalismo e ao domnio do mundo pelo capital e por qualquer forma de imperialismo. (FMS, NOTICIRIO, 2010)

  • que, fundamentado no saber/fazer tradicional, promove tambm inovaes que, inseridas no capitalismo, propem novos caminhos. O acontecer lento, mas efetivo e fecundo.

    Vemos isso claramente nas feiras de artesanato cultural e feiras de produtos naturais artesanalmente trabalhados e de produtos naturais, alm de feiras de produtos orgnicos e outras mais. So comunidades e grupos que resgatam um modo de vida de um ontem nem to distante, mas que, respeita e coerente com os atos intuitivos sobre os quais atuam.

    Com isso so cada vez mais frequentes as iniciativas de comunidades e grupos em suas trocas solidrias e na adoo de prticas solidrias de economia e produo. Novidades e inovaes promovem sempre rearranjos internos e externos. Essas iniciativas de teor interativo e intra-comunidades esto permanentemente se enfrentando com estratgias externas, isto , vinda de poderes e de propagandas de empresas ou do prprio governo. O resultado disto que, no raro, estas presses externas provoquem conflitos e novos arranjos nas relaes tambm internas s comunidades. Elas, lenta, mas efetivamente se reorganizam, transformam e devolvem ao que vem de fora e imposto, criaes que mesmo com a marca do de fora. Reproduzem ainda a sua prpria lgica, que inclui, agora, o de fora e o de dentro. O que chega de fora e vai provocar na cultura popular o que Canclini, uma vez mais, chamar de hibridizao. Culturas populares no sero jamais as mesmas, e para isto basta a chegada da televiso ou de uma iniciativa de poltica pblica na comunidade. Mas atravs do que muda ao se hibridizar que um momento de atos de significao peculiares ao povo preservaro a sua originalidade e a sua identidade.

    E os agentes e agncias externas, por sua vez, recebero de contextos de culturas populares, como em um espelho em que mesmo a contragosto vem a sua face refletida no fazer do outro, influncias vindas de dentro e de baixo e que provocaro revises e re-arranjos nas prprias polticas pblicas. O sempre transformar e criar em meio a alianas e conflitos, a arranjos e re-arranjos, a apropriaes e promoes, a expropriaes e gestos de ajuda de proteo.

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