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PLANO ESTRATÉGICO PARA AS RÁDIOS COMUNITÁRIAS DE GUINÉ-BISSAU Programa de Reforço de Capacidades dos Media Rádios Comunitárias

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PLANO ESTRATÉGICO PARA AS

RÁDIOS COMUNITÁRIAS DE

GUINÉ-BISSAU

Programa de Reforço de Capacidades dos Media

Rádios Comunitárias

FICHA TÉCNICA

Texto: Luca Bussotti, Consultor Luca Bussotti é Licenciado em Filosofia, Licenciado em História Cum Laude e possui um doutoramento em Sociologia do Desenvolvimento. Possui uma longa experiência na área das Rádios Comunitárias em Moçambique onde desenvolveu trabalhos como consultor da área. Também possui experiência como docente na área de comunicação em Itália e Moçambique e como pesquisador da CODESRIA, onde foi o coordenador científico da pesquisa sobre “Media e Direitos Humanos nos Países africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP)” Actualmente é Professor convidado na Universidade Eduardo Mondlane em Moçambique, no Mestrado em Comunicação e Cooperação para o Desenvolvimento e Investigador Auxiliar no Centro de Estudos Internacionais do Instituto Universitário de Lisboa – ISCTE.

Revisão: Tony Tcheka, Perito Media da UGP UE-PAANE

Sonia Sánchez Moreno, Coordenação da UGP UE-PAANE

Data: 16/10/2014

O PAANE - Programa de Apoio Aos Actores Não Estatais “Nô Pintcha Pa Dizinvolvimentu” é um programa financiado pela União Europeia no âmbito do 10º FED. Este Programa, sob tutela do Ministério dos Negócios Estrangeiros, da Cooperação Internacional e das Comunidades, é implementado através da assistência técnica de uma Unidade de Gestão de Programa gerida pelo consórcio IMVF / CESO CI.

O PAANE, no âmbito do reforço de capacidades dos Media, desenhou um programa dirigido às rádios comunitárias e um programa de reforço dirigido às rádios de vocação nacional, jornais e TVs Comunitárias. O presente documento faz do programa desenhado para as Rádios Comunitárias.

Nota Prévia

O Plano Estratégico para as Rádios Comunitárias de Guiné-Bissau foi desenvolvido no quadro

do Programa UE-PAANE de Apoio aos Actores Não Estatais, financiado pela União Europeia.

Este Plano é uma contribuição da União Europeia através do seu Programa UE-PAANE no

estrito exercício de reflexão que deve ser realizado para a viabilização e modernização das

rádios comunitárias e como tal, não deve ser entendido como um compromisso para um

futuro financiamento.

O Estudo sobre os Media na Guiné-Bissau levado a cabo pelo UE-PAANE consagrou um espaço

considerável às Rádios Comunitárias em todas as suas valências. O amplo diagnóstico que

passou pela identificação das RC, constatações específicas, análises e recomendações

mereceram a anuência e aprovação de todas as estações radiofónicas e da RENARC inclusive. A

elas se juntaram as vozes das instituições profissionais da área em plena atividade e que se

reviram plenamente nas formulações produzidas.

É neste preciso contexto que o UE-PAANE, por via de uma consultoria externa traduziu essas

constatações num Plano Estratégico que será objeto de amplas jornadas de discussão e de

formação. Este documento de trabalho fornece um conjunto de ideias e de instrumentos que

podem contribuir de forma indefetível na modernização das Rádios Comunitárias, tanto do

ponto de vista administrativo/organizacional como na própria estratégia da sua

implementação e na produção de conteúdos com base numa técnica apurada e sintonizada

com a comunidade e o meio em que se inserem.

Esta publicação foi produzida com o financiamento da União Europeia. O seu conteúdo é da exclusiva

responsabilidade do Programa UE-PAANE e não pode em caso algum ser tomada como expressão da posição da

União Europeia.

PLANO ESTRATÉGICO PARA AS RÁDIOS COMUNITÁRIAS

Plano Estratégico para as Rádios Comunitárias de Guiné-Bissau Programa UE-PAANE de Apoio aos Actores Não Estatais financiado pela União Europeia

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Índice

I. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................ 2

1. Contextualização ............................................................................................................................... 2

2. Objetivos ........................................................................................................................................... 4

3. Período de vigência do Plano ............................................................................................................ 4

II. DIAGNÓSTICO ........................................................................................................................................ 5

1. Condições materiais e logísticas: possíveis propostas ...................................................................... 5

2. Quadro legislativo: possíveis propostas: As Rádios Comunitárias como serviço público .................. 7

3. Sustentabilidade financeira: possíveis propostas para sair da dependência financeira ................... 8

4. Racionalização organizacional: a RC como organização complexa ................................................ 10

5. As relações com a comunidade: propostas para uma sua sistematização e maior

envolvimento .......................................................................................................................................... 12

6. A formação: propostas para uma sua sistematização .................................................................... 13

7. Os recursos humanos: Possíveis meios para uma sua maior “fidelização” às RC ........................... 13

8. A comunicação horizontal: como tornar mais eficaz o papel da RENARC ...................................... 14

9. Conclusões ...................................................................................................................................... 15

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I. INTRODUÇÃO

O presente trabalho surge na sequência do estudo sobre “Os Media na Guiné-Bissau” e resulta

de uma consultoria feita para o Programa UE-PAANE no mês de Julho de 2014 sobre rádios

comunitárias na Guiné-Bissau. Os objetivos fundamentais da consultoria tinham por fito:

1. Delinear um plano estratégico para rádios comunitárias;

2. Elaborar um manual de formação para radialistas e para dois formadores nacionais

que o UE-PAANE pretende contratar com o intuito de orientarem uma formação

contínua e sistemática do pessoal das emissoras comunitárias.

Após um trabalho de campo em que foram visitadas 12 rádios comunitárias, decidiu-se

reformular os objetivos da consultoria, introduzindo uma parte inerente ao diagnóstico como

base para desenhar o plano estratégico, na lógica de termos um “estado da arte” actualizado e

que servisse de partida para delinear o futuro desenvolvimento desse importante tipo de

emissoras.

Assim, o trabalho apresenta-se em duas partes: (1) contextualização, (2) diagnóstico e plano

estratégico, que são complementadas com o manual de formação, que inclui os indicadores a

serem usados pelos formadores nacionais ao longo da sua actividade de formação e avaliação

contínua do desempenho das estações comunitárias.

Atendendo que a RENARC em parceria com a ONG Acção para o Desenvolvimento - AD

publicou em 2009 um manual de boa qualidade que as rádios comunitárias adotaram na sua

autoformação, o UE-PAANE decidiu, com o beneplácito dessas duas organizações, utilizar

aquela publicação como base, introduzindo tão-somente melhorias técnicas nas partes

julgadas passíveis de uma atualização e aprofundamento justificadas.

1. Contextualização

A Guiné-Bissau é um estado da África Ocidental banhado pelo Oceano Atlântico, com uma

extensão de 36.126 Km². Antiga colónia portuguesa obteve a sua independência, declarada de

forma unilateral, em 24 de Setembro de 1973 (Portugal irá reconhecer oficialmente o novo

estado em 10 de Setembro de 1974). Conta com mais de 20 grupos linguísticos e culturais

diferentes e uma populaçãde cerca de 1,5 milhões de habitantes.

Após a abertura ao multipartidarismo em 1991 o país tornou-se recentemente, na opinião de

muitos estudiosos de assuntos africanos, como um dos exemplos mais conhecidos de “Estado

falhado” ou “fragil” ou “narco-Estado”, com uma presença extremamente significativa, em

termos de poder, dos militares (EMBALÓ, 2012; BARROS, RIVERA, 2011; ASHLEY, 2011).

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Neste contexto, a sociedade civil procurou organizar-se, criando espaços autónomos

relativamente ao poder político e militar.

As rádios comunitárias (RC) representam em África, um dos meios mais eficazes e difusor para

que a informação e a comunicação cheguem às comunidades urbanas e rurais, tornando estas

últimas não apenas o alvo, mas o protagonista activo do fluxo comunicacional e informativo ao

nível da comunidade. De acordo com The World Association of Community Radio Broadcasters

(AMARC), criada em 1983, as RC representam um dos melhores meios para difundir a

democratização, preservar a identidade cultural e a auto-estima, servindo de plataforma de

debate e troca de ideias no seio da comunidade, com particular destaque para África Ocidental

(AMARC, 2008).

No caso da Guiné-Bissau, as RC constituem um meio relativamente novo mas eficaz e já

consolidado para que as populações possam receber e partilhar toda uma informação sobre a

realidade nacional e internacional mas sobretudo sobre a própria comunidade o que, por

norma, nenhum outro meio vai veicular. Isto permite, ao mesmo tempo, sentirem-se

protagonistas ativas do processo de intercâmbio de ideias a partir das RC e com elas fazer

passar as suas opiniões. Por isso a capacitação e o fortalecimento dos radialistas apresentam-

se como fundamental no trabalho da conscientização dos cidadãos, ajudando-os a ser mais

conscientes, na prossecução de uma cidadania mais proactiva e positiva.

A Guiné-Bissau, em 1994, foi o primeiro dos PALOPs a implementar o modelo de RC que as

Nações Unidas, mediante várias agências, entre as quais FAO, UNESCO, UNICEF, PNUD, OMS,

tinham recomendado para difusão da informação, democratização e participação activa das

populações locais, mediante a ONG Ação para o Desenvolvimento (MOTA, 2012). A primeira

RC foi aberta num bairro periférico da capital, encerrada pelo poder político pouco antes das

primeiras eleições multipartidárias de 1994. Se trata da Rádio Voz de Quelele (NHAGA, 2010).

A RENARC – Rede Nacional de Rádios Comunitárias - também tem desempenhado um papel

relevante, visando agregar as RC do país, de acordo com as suas necessidades e opções

estratégicas, e impulsionando o grupo das mulheres radialistas em processos de formação,

para encorajar a sua participação (MOREIRA, 2013). Na Guiné-Bissau as RC deram inúmeros

exemplos de coerência no que diz respeito à sua abordagem crítica para com os regimes

políticos que se sucederam depois da independência em 1973. (IDEM). A RENARC tem vindo

publicar os “Cadernos da Rádio”, com ideias bastante claras sobre a situação, problemas,

desafios das emissoras comunitárias na Guiné-Bissau. Foi a partir destas publicações que em

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colaboração com a ONG “AD” editaram o Manual para Radialistas, de 2009 (ver site da

RENARC).

Entretanto, de acordo com Lucia van den Bergh, a situação criada com o golpe de estado de

2012 aumentou os mecanismos de censura e de autocensura, abrangendo obviamente os

produtores das RC (MOREIRA, 2013), com um quadro jurídico ainda por definir, uma vez que a

lei da radiodifusão incluída no pacote de leis gerais da comunicação social aprovadas antes do

último golpe de estado (2012) pela ANP e promulgados pelo Presidente de Transição em 2013

(Boletim Oficialnº25 de 25 de julho de 2013), omite o setor das rádios e televisões

comunitárias.

2. Objetivos

O plano estratégico aqui apresentado tem o objectivo de delinear quais os eixos fundamentais

que as rádios comunitárias da Guiné-Bissau terão que seguir para o seu fortalecimento no

contexto nacional dos Media, na firme convição de que elas continuam a desempenhar, até

hoje, um papel fundamental no que diz respeito à obtenção da informação por parte duma

larga fatia da população, ainda fora dos circuitos modernos da comunicação global. Como se

pode ver no último ponto deste trabalho, os objectivos da reformulação estrutural das

emissoras comunitárias do país prendem-se basicamente com três âmbitos: 1. Questões

logísticas e infraestruturais; 2. Questões relativas à abordagem de tipo mais tipicamente

jornalístico e informativo (tais como programação, formação e relacionamento com a

comunidade); 3. Questões respeitantes à conceção da rádio comunitária como organização

complexa, que exigem uma adequada organização e gestão internamente.

3. Período de vigência do Plano

O plano estratégico aqui apresentado propõe uma vigência de três (3) anos, sendo que

delineia objetivos de médio prazo (no fim do primeiro e do segundo ano), de maneira a poder

medir de forma constante os avanços e os recuos das várias emissoras, intervindo, se

necessário, para corrigir possíveis tendências negativas. O plano representa um documento de

endereço, sendo por isso flexível, uma vez que cada rádio poderá interpretá-lo e readaptá-lo à

sua realidade, de acordo com um contexto determinado e em função do seu nível de

desenvolvimento.

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II. DIAGNÓSTICO

1. Condições materiais e logísticas: possíveis propostas

a. A questão da energia;

b. A ligação telefónica e da Internet;

c. O equipamento.

a. A questão energética constitui uma das principais emergências nacionais. As rádios

comunitárias não podem ser excepção no seio de um contexto tão problemático.

Entretanto, o primeiro ponto da agenda do plano estratégico não pode deixar de

considerar a existência da energia como a chave para garantir a sobrevivência das

emissões de qualquer emissora radiofónica. Das rádios visitadas, existem três grandes

grupos, neste momento, no que diz respeito ao abastecimento energético: 1. As que

funcionam com um gerador autónomo; 2. As que funcionam, total ou parcialmente,

mediante paineis solares; 3. As que estão ligadas à rede da energia de uma operadora

telefónica, tendo esta uma contrapartida em termos de publicidade gratuita.

1. No primeiro caso, o gerador pode pertencer à emissora ou à cooperativa ou associação

que gere a emissora. Em ambos os casos a sobrecarga orçamental é evidente, ao

passo que, no segundo, desenvolve-se uma dependência da rádio em relação à

“boa vontade” da associação que a gere e controla no que diz respeito ao

fornecimento de energia. Se esta decidir que a actividade da rádio não é mais

estratégica para os seus fins, a primeira consequência prende-se com o corte nas

despesas para o combustível, deixando portanto uma elevada margem de

discricionariedade às estratégias globais daquela organização-mãe. Uma tal situação

tem de terminar, impulsionando o rápido afastamento das emissoras comunitárias

deste estado de dependência energética.

2. Os paineis solares podem constituir uma saída viável e para longo prazo. Entretanto, as

emissoras que os possuem são relativamente poucas e, geralmente, o abastecimento

por essa fonte é apenas parcial. Provavelmente precisariam de mais painéis e uma

bateria adequada para alimentar todas as necessidades da rádio e, neste momento,

nenhuma das emissoras tem condições para adquirir novos equipamentos desta

natureza.

3. A permuta “energia versus publicidade comercial” parece constituir uma boa saída

quer para manter um abastecimento razoavelmente certo em termos energéticos,

quer para poupar o dinheiro do combustível para aquisição e funcionamento do

gerador. Entretanto, vários dos radialistas entrevistados destacaram o risco de que as

operadoras telefónicas, de um momento para o outro, percam o interesse nessa

fórmula, deixando consequentemente a emissoras desprovidas de qualquer

possibilidade de emitir. Nesses casos, seria conveniente, acima de tudo, estabelecer

com as operadoras, contratos bem claros e com um prazo temporal definido e, em

segundo lugar, talvez por parte da RENARC, negociar duma forma mais global os

pormenores dessa permuta, tão vital para muitas rádios comunitárias.

Finalmente, a palavra de ordem no que respeita à questão energética inerente às

rádios comunitárias é garantir a autonomia energética.

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A médio e longo prazo, o abastecimento energético terá de ser garantido por meio da

ligação à rede elétrica. Para que este processo decorra sem sobressaltos, vai ser

preciso programar desde já, e de uma forma global, um plano para que as rádios

comunitárias possam beneficiar de isenções ou descontos no pagamento dessa

energia, enquanto entidades sem fins lucrativos e que visam o bem das comunidades.

b. O isolamento das rádios comunitárias representa uma forte limitação para o

desenrolar da sua ação. A falta da ligação telefónica e da Internet obstaculiza

comunicações essenciais. A questão relativa a Internet é, se calhar, ainda mais séria.

Até ao momento, nenhuma das rádios comunitárias visitadas tem Internet via cabo ou

wireless. Poucas já pediram a ligação a uma operadora (geralmente a Orange), mas

esta está demorando a instalação, devido à pouca procura da net em certas regiões.

Podem assim passar meses até que uma emissora obtenha ligação à Internet, mesmo

tendo completado todo o processo e pago os valores necessários para a devida

instalação. Sendo assim, urge desencadear uma campanha de sensibilização, talvez por

parte da RENARC, junto a essas operadoras da telefonia móvel, de maneira a

priorizarem a instalação do sinal da Internet nas rádios comunitárias, cuja importância,

obviamente, não se pode comparar com a ligação em benefício de um particular. A

possibilidade de ter este sinal abriria cenários diferentes mesmo no que toca à

angariação de fundos próprios por parte das várias emissoras, que estariam em

melhores condições para fornecer este serviço à comunidade a um preço convidativo.

A palavra de ordem, nesse caso, podia ser sair do isolamento, privilegiando a ligação

à Internet.

c. A outra grande fraqueza de tipo material de grande parte das emissoras comunitárias

prende-se com o equipamento “técnico”, incluindo, além de emissores, gravadores e

tudo o mais, também meios de transporte, tais como bicicletes e motorizadas. Aqui

também a situação é dispar, entretanto, no geral, a necessidade de novo equipamento

é generalizada. Quase todas as emissoras possuem uma peça de cada aparelho ou

instrumento, sobretudo emissor que, quando avaria, a rádio também deixa de

funcionar.

A carência de outro equipamento menor, tais como gravadores, significa uma enorme

limitação do trabalho dos animadores ou radialistas principalmente nos trabalhos no

exterior. Finalmente, dispor de motorizadas ou bicicletas representa também uma

prioridade para todas as emissoras. Parece inviável o trabalho dos radialistas junto às

comunidades sem estes meios rápidos e práticos de deslocação. Mais uma vez, as

rádios comunitárias poderiam juntar-se, por exemplo utilizando os préstimos da

RENARC, para adquirir este material, por um lado poupando recursos, por outro

garantindo uma qualidade se calhar melhor. A palavra de ordem, nesse caso, poderia

ser, equipar as emissoras de uma forma racional, para as tornar capazes de

desempenhar o seu trabalho junto das comunidades.

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2. Quadro legislativo: possíveis propostas: As Rádios Comunitárias como serviço

público

A Guiné-Bissau tem enveredado esforços notáveis no que diz respeito à actualização da sua

legislação em mérito à comunicação social. Com efeito, em 2013 foram aprovadas, no Boletim

Oficial de 25 de Junho, 8 leis, todas relacionadas diretamente com o sector. Uma vez que elas

são de domínio público, não vai ser preciso resumir os seus principais conteúdos, mas apenas

frisar alguns aspectos relevantes em matéria de radiodifusão comunitária, cruzando os

ditames normativos com a situação que se tem encontrado no terreno ao longo da pesquisa

de diagnóstico.

1. A lei nr. 4/2013, Lei da Radiodifusão, nunca menciona as emissoras comunitárias de

forma explícita, embora, no seu art. 4, faça a distinção entre rádios cujo sinal abranja

todo o território nacional, uma região ou um conjunto de regiões ou um local ou um

conjunto de localidades. Evidentemente são essas últimas a aproximarem-se mais ao

conceito de emissora comunitária, porque tem de haver um sinal limitado em termos

de espaço e circunscrito a poucas localidades. Todavia, mesmo uma rádio comercial

pode ter um sinal limitado, mas ela nunca vai ser uma emissora comunitária. Seria

portanto conveniente se o legislador guineense introduzisse, por exemplo, na própria

lei sobre radiodifusão, a definição e as peculiaridades da rádio comunitária;

2. Ao fazer isso, deveria especificar-se a natureza dessas emissoras como serviço público

dirigido às comunidades, muitas das vezes sem acesso a outras emissoras e, portanto,

capazes de obter informações apenas através da rádio comunitária. Isso poderia

implicar, por exemplo, facilidades com taxas preferenciais no que diz respeito ao

pagamento da energia (se e quando a emissora se ligar à rede nacional de

distribuição), aos procedimentos formais para conseguir as licenças necessárias para

emitir,etc.;

3. A lei nr. 4/2013, enfatiza a necessidade de a radiodifusão valorizar as línguas faladas

no país, nomeadamente português, crioulo e outras nacionais, sem prejuízo para as

línguas estrangeiras. Esta situação reflete-se perfeitamente nas atuais emissoras

comunitárias;

4. No seu art. 7, a lei indica que um dos objectivos prioritários das emissões radiofónicas

tem de ser a promoção de programas educativos e formativos, enfatizando e

encorajando a participação cívica e política do público, mediante programas abertos

aos debates públicos. Nesse caso, notámos – quer através das entrevistas feitas junto

aos fazedores das emissoras, quer mediante uma primeira análise da grelha de

programação de algumas dessas rádios – que, por vezes, essa parte não está

devidamente desenvolvida pelas emissoras comunitárias, que se concentram, pelo

contrário, em programas musicais ou de mero entretenimento, tornando cada vez

mais fraca a componente do comprometimento cívico dos ouvintes;

5. A lei insiste no facto de as emissoras de qualquer nível tiverem que operar após ter

conseguido uma licença, garantindo 90 dias para que as situações de irregularidade se

possam sanar. Na verdade, várias das emissoras comunitárias ainda deparam com

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situações de falta de licença definitiva para emitir. Uma tal falha deveria ser

ultrapassada o mais urgente possível, por ventura mediante a intervenção da RENARC;

6. O ponto mais sensível todavia tem a ver com o estatuto do profissional das RC. No

focus-group feito em Bissau no dia 16 de Julho de 2014, o Presidente do Sindicado dos

Jornalistas realçou em várias ocasiões que mesmo os voluntários das emissoras

comunitárias devem ser considerados de profissionais da comunicação. Entretanto, a

lei 5/2013 se posiciona duma forma diferente. De facto, a lei põe duas condições para

que se possa entrar na carreira jornalistica. A primeira (art. 3) diz respeito ao percurso

formativo, que deve contemplar uma formação “em comunicação social ou

equivalente”, integrada por um período de 18 meses de estágio (12 no caso em que a

formação na área seja de nível académico). A segunda tem a ver com a condição

económica do jornalista: no art. 2 a lei afirma que “consideram-se Jornalistas aqueles

que, como ocupação principal, permanente e remunerada”, exercem uma tal

actividade, concentrada na recolha e tratamento de notícias. Ora, uma tal situação é

bastante incomum entre os voluntários das rádios comunitárias, acima de tudo devido

à natureza do seu trabalho justamente “voluntário” na comunicação social e, em

segundo lugar, ao facto que – como nos foi possível constatar – raramente a redação

consegue levar a cabo uma actividade investigativa contínua de tipo jornalistico,

prevendo reportagens e tudo aquilo que mais caracteriza a rotina dum jornalista

profissional. Neste sentido, seria conveniente esclarecer tais aspectos,

evidentemente sensíveis, do trabalho dos radialistas em comparação com o

dos jornalistas profissionais. A palavra de ordem neste caso deveria ser é urgente

um estatuto próprio para os radialistas das RC.

3. Sustentabilidade financeira: possíveis propostas para sair da dependência

financeira

a. Comunidade: em geral, a rádio comunitária é feita pela comunidade, pensando nos

interesses da comunidade e é sustentada pela e para a comunidade. Na realidade

africana e nomeadamente na Guiné-Bissau, parece impensável ou altamente

improvável que a comunidade possa sustentar financeiramente uma emissora

radiofónica. Com efeito, uma tal situação não foi encontrada nas emissoras visitadas

ao longo do trabalho de campo. Previsivelmente, este estado de coisas irá permanecer

igual durante os próximos anos, motivo pelo qual as rádios comunitárias terão de se

multiplicar em ações concertadas e participativas para obter uma ajuda forte das

comunidades de referência.

b. Fundos públicos: provavelmente continuarão a representar uma das maiores

entradas para as rádios comunitárias da Guiné-Bissau, principalmente por parte de

entidades internacionais, tais como as várias agências das Nações Unidas e a União

Europeia. Se isso poderá oferecer garantias de médio termo, as emissoras terão de

mudar a atitude que tem caracterizado a sua postura, uma vez que o risco que se corre

é muito sério: é de ver a sua linha editorial secundarizada em favor de outros

interesses. Portanto, prevendo um afluxo consistente de recursos financeiros em favor

das rádios comunitárias no futuro próximo, seria conveniente que elas determinassem

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de antemão a sua agenda temática, submetendo-a a potenciais doadores, ao invés de

esperar que aconteça o contrário. Por outra, os próprios doadores deveriam perceber

isso, e procurar dialogar de forma mais profunda com o pessoal das emissoras, de

maneira a determinar directrizes previamente acordadas;

c. Doadores particulares: raras vezes acontecem situações em que doadores

particulares façam doações em dinheiro às rádios comunitárias. Há casos excecionais,

que as emissoras devem tratar, mesmo do ponto de vista contabilístico, como ajudas

esporádicas que podem aparecer de forma repentina e inesperada. Outrossim, essas

doações serão tanto mais frequentes e consistentes na medida em que uma emissora

consiga um reconhecimento público do seu trabalho diário como útil ao

desenvolvimento da comunidade.

d. Fornecimento de serviços: diferentemente do que foi dito no ponto anterior, o

fornecimento de novos serviços em prol da comunidade (actualmente um ponto fraco

da maioria das emissoras) deveria começar a representar um dos aspectos de maior

força e dinamismo. Mas é preciso programar para obter recursos oriundos dessa

atividade. Ter a disponibilidade da energia, da Internet, de uma impressora, duma

fotocopiadora ou de uma câmara de filmagem ou duma biblioteca, essas

infraestruturas e talvez outras tornam-se cada vez mais necessárias para planificar a

angariação de fundos de forma autónoma, garantindo serviços essenciais e muitas das

vezes exclusivos para a comunidade.

e. Publicidade: as emissoras comunitárias não devem viver unicamente de anúncios

comerciais ou de comunicados a pagamento, sobretudo porque pode desvirtuar a

essência própria de qualquer emissora comunitária. A consequência de planificar o

orçamento da emissora em função da publicidade comercial faz com que esta

privilegie programas de mero entretenimento, tais como música, dedicatória e outros.

Entretanto, tais modalidades podem apresentar uma forma tanto eficaz quanto

equilibrada para conseguir fundos. Mais uma vez, a viragem é constituída pela

capacidade da rádio de penetrar na comunidade, despertando o interesse dos

moradores. Se isso acontecer, anúncios comerciais e comunicados surgirão de maneira

quase que espontânea, uma vez que a emissora transformar-se-á num meio

fundamental para a comunicação horizontal entre os residentes das várias tabancas

duma certa vila ou cidade. O importante é delimitar de antemão este espaço,

mediante uma séria programação, quer do ponto de vista de conteúdos, quer do da

procura de recursos financeiros.

f. Gestão do ciclo do projecto: elaboração, gestão, monitoria, prestação de contas.

Qualquer emissora comunitária está envolvida em actividades aparentemente não

ligadas de forma directa com o trabalho radiofónico. Como acabámos de realçar, a

planificação de tipo financeiro, organizacional e programático constitui um importante

aspecto que nenhuma rádio comunitária pode ignorar. Trata-se de passar da fase da

espontaneidade à da organização racionalmente planificada quer dizer dar um salto

relevante a toda a actividade da emissora. E, ao mesmo tempo, isso implica conhecer e

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desfrutar todas as potencialidades do “ciclo de projecto” para conseguir angariar

fundos e direcionar a programação para os interesses da comunidade.

Porque é necessário planificar a actividade da rádio consoante as fases do ciclo de

projecto? Porque obriga a actuar de forma racional, prevendo a inteira vida da

emissora. No âmbito de que estamos aqui a tratar, o de tipo basicamente financeiro,

as consequências de seguir as fases do ciclo de projecto serão as seguintes:

a. Elaboração: com base no orçamento previsional, elabora-se um plano concreto de

procura de fundos, de acordo com a grelha de programação previamente definida;

b. Uma vez conseguidos os fundos programados, é necessário geri-los, direcionando-

os para atividades prioritárias para a vida da emissora;

c. Monitorar o andamento das entradas e sobretudo a gestão que está sendo feita

delas representa um dos aspectos mais relevantes do ciclo do projecto. Para

garantir que isso aconteça, deve haver um responsável, mas também uma equipa

que esteja regularmente a acompanhar este tipo de trabalho. É preciso evitar o

“monopólio” da informação neste sector vital da vida da rádio: qualquer processo,

ainda mais se relacionado com aspectos financeiros, tem de ser partilhado pelo

grupo dirigente de cada emissora, com uma constante actividade de monitoria das

contas, supervisionando ao responsável administrativo, de maneira a limitar as

margens de erros (sempre possíveis) assim como de procedimentos pouco

transparentes (mais fáceis em caso de gestão individual sem nenhuma fiscalização

e acompanhamento);

d. Neste sentido, prestar as contas, primeiro internamente e depois à organização que

controla a emissora, constitui o último passo para que os recursos financeiros sejam

usados de forma saudável e em prol da vida da emissora.

No geral, a palavra de ordem, nesse assunto, tem de ser: Programar e monitorar de

acordo com as necessidades da comunidade, orientando as opções dos doadores”.

4. Racionalização organizacional: a RC como organização complexa

a. O (possível) organograma da RC;

b. Princípio I: divisão de tarefas e rotatividade;

c. Princípio II: circulação da informação e da formação;

d. Princípio III: fiscalização interna.

Qualquer rádio comunitária é uma organização complexa, cujo objectivo fundamental é

produzir informação para a comunidade em que está inserida. Entretanto, como se viu nos

pontos anteriores, conseguir realizar esta tarefa implica ter uma organização apropriada e

racional, nos três âmbitos em que a actividade duma emissora tem de se desenrolar: a de tipo

jornalistico-informativo, a de tipo financeiro e administrativo, a de natureza técnica (que tem a

ver com os equipamentos, o seu manejo e manutenção). É com base nessa subdivisão de tipo

macro que tem de ser orientada a forma organizativa das emissoras comunitárias.

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a. O organograma da rádio comunitária tem de ser simples, procurando responder às

necessidades básicas de cada emissora. Ao longo das visitas feitas, tornou-se claro que

quase todas as emissoras tinham consciência do tipo de organização necessária para

levar a cabo uma actividade de forma racional e sucedida. Os três grandes eixos da

organização, portanto, deverão ser:

1. Parte noticiosa e dos programas, com uma redação (que cuida basicamente das

notícias e do tratamento delas) e uma equipa com um(a) responsável da programação;

2. Parte financeiro-administrativa, que cuida das contas e da gestão delas;

3.Parte técnica, que toma conta dos equipamentos. Todas essas equipas devem

constituir um conjunto orgánico e interligado, com tarefas e competências distintas,

mas informadas constantemente daquilo que cada sector está a fazer. O diretor tem

que constituir o elo de ligação mais natural desses três âmbitos. Os princípios

fundamentais para que essa estrutura possa funcionar devem ser os seguintes:

b. Princípio I: divisão de tarefas e rotatividade. Cada equipa tem que desenvolver

competências específicas e saber programar e executar as tarefas apropriadas. O

trabalho de tipo jornalistico ou técnico é exigente, requerem portanto dedicação e

longo tempo para alcançar os níveis que uma emissora comunitária precisa.

Entretanto, a rotatividade também representa um dos aspetos centrais para o bom

funcionamento duma emissora: isso é válido principalmente no que diz respeito a

tarefas do segundo grande sector, o administrativo. Embora não seja necessário que

um jornalista ou um técnico se tornam especialistas de contabilidade ou prestação de

contas, eles também, periodicamente, devem fazer parte da equipa que lida com tais

assuntos. Assim como, no trabalho da redação, o crescimento das várias unidades

tem de passar por experiêcias diferentes: ora saber fazer uma reportagem, ora a

edição, ora a locução da notícia. É só mediante a união dessas competências

com a rotatividade que os radialistas podem-se transformar em jornalistas no

sentido pleno do termo, capazes de “fazer a notícia” mas também de perceber as

problemáticas organizacionais da estrutura em que actuam;

c. Princípio II: circulação da informação e da formação. O monopólio da informação e da

formação representa, em diversas organizações, uma postura que os “chefes”

adoptam para manter a hegemonia relativamente ao resto do pessoal. Esta atitude é

contrária ao espírito das rádios comunitárias. Aqui, a ideia é de difundir ao maior grau

possível o fluxo informacional, assim como as actividades de formação. No seio da

emissora, qualquer tipo de informação deve circular e ser conhecida por todos os seus

membros. Questões técnicas, noticiosas, administrativas, devem encontrar

periodicamente (no mínimo uma vez por mês) momentos de condivisão e reflexão

comuns. No caso de acontecimentos repentinos, a emissora deve estar nas condições

de convocar reuniões para que os seus voluntários fiquem a saber do problema,

procurando conjuntamente as possíveis saídas. A formação também tem que

constituir um bem comum, partilhado pelo maior número possível de radialistas. Mais

uma vez, o princípio da rotatividade deve ser escrupulosamente respeitado, sob pena

do surgimento de grupos privilegiados dentro da emissora, que, graças à formação

recebida, acabam constituindo as “vanguardas”, deixando por detrás o resto da

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equipa. Uma tal situação de desequilíbrio interno pode determinar problemas

extremamente sérios no bom funcionamento das emissoras, até a saída de muitos dos

seus ativistas;

d. Princípio III: fiscalização interna. Geralmente, as rádios comunitárias da Guiné-Bissau

sofrem de um processo de fiscalização externo por parte da cooperativa, ONG ou

associação que as controlam. Por vezes, este processo é fraco ou, em alguns (poucos)

casos, ele não existe. Por isso, a fiscalização interna tem de constituir um mecanismo

regular e periódico em todas as áreas de qualquer emissora: na área jornalistica, na

técnica e na financeira-administrativa. A Rádio Balafon, por exemplo, tem

desenvolvido um mecanismo de monitoria externa por parte de uma empresa,

finalizada a certificar as suas contas. Este tipo de solução seria a preferível, mas

obviamente implica custos que nem todas as emissoras podem permitir-se. Sendo

assim, uma rigorosa fiscalização interna tem que ser feita e planificada no início do

ano, e implementada com reuniões regulares, em que os responsáveis dos vários

sectores prestam as contas das actividades realizadas no âmbito das suas

competências.

5. As relações com a comunidade: propostas para uma sua sistematização e

maior envolvimento.

No diagnóstico feito, o relacionamento com a comunidade por parte das diferentes

emissoras tem-se revelado como um dos pontos mais fracos. Parece que, no passado,

aproximadamente na altura do seu surgimento, as rádios tenham vivido uma estação de

grande empatia com as respectivas comunidades mas que hoje, na sua maioria, esta

ligação tenha ficado enfraquecida. Não havendo um estudo de audiência, é difícil

confirmar esse dado; entretanto, existem indícios de que a atenção para com a

comunidade tem sofrido uma evidente queda e perda de interesse. E esta opção tem

vindo a transformar a natureza dessas rádios em algo de diferente do serem

“comunitárias”. Para voltar às características de origem, apropriadas a qualquer emissora

comunitária, sugere-se.

1. Reorientar a programação, de acordo com os interesses da comunidade e privilegiando

a função informativa e educacional, em detrimento da de entretenimento e comercial;

2. Ter como base do noticiário principal notícias de primeira mão provenientes das

tabancas: consequentemente, isso implica ter a atividade informativa virada para

reportagens, entrevistas, auscultação de testemunhas chave de tipo local;

3. Aumentar os programas de linha aberta: a referência não é tanto aos programas

musicais (qualquer emissora, mesmo a mais comercial, abre a linha para dedicatórias nos

seus espaços musicais), quanto aos debates sobre assuntos locais, que diariamente

devem caracterizar uma boa parte da programação das rádios comunitárias;

4. Independentemente de quem for o “dono” da emissora, no mínimo uma vez por ano

esta tem de abrir um espaço (físico, virtual – mediante a sua linha – ou as duas coisas)

para fazer o ponto da situação da sua programação junto à comunidade e, daí, repartir

para novas grelhas e novos programas.

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A palavra de ordem deve ser, neste caso: Sistematizar e aprofundar o envolvimento das

comunidades na programação da rádio comunitária.

6. A formação: propostas para uma sua sistematização

Como se viu, a formação representa um dos elementos mais críticos no mundo das rádios

comunitárias. Isso é verdade em dois sentidos: por um lado, porque a formação

proporcionada até hoje aos radialistas tem sido pouco sistemática e ligada basicamente a

eventos e temáticas pontuais, além que ditada por doadores geralmente internacionais,

em relação aos quais a agenda formativa das emissoras tem-se desdobrado. Em segundo

lugar, criando, em muitos casos desequilíbrios internos entre os radialistas no que diz

respeito aos processos formativos, vindo a determinar situações internas desagradáveis.

Tem chegado, portanto, o momento de planificar actividades de formação nas três áreas

fundamentais de cada emissora comunitária: jornalistica, financeiro-administrativa e

técnica. A ideia da UE-PAANE de formar dois formadores nacionais, que terão depois a

tarefa de formar in loco os radialistas afigura-se como resposta a essa exigência, uma vez

que esta modalidade visa envolver todo o pessoal das emissoras de forma igual e não

implica custos por parte das várias rádios. As características desse novo modelo de

formação devem ser as seguintes:

a. Contínua e periódica;

b. Feita in loco;

c. Direcionada claramente pelas três áreras organizacionais das emissoras;

d. Independente de eventos ou acontecimentos pontuais e previamente concordada, na

forma e nos conteúdos, com o corpo dos radialistas ao nível nacional (modelo do

“levantamento das necessidades formativas”).

7. Os recursos humanos: Possíveis meios para uma sua maior “fidelização”

às RC

Um dos problemas mais críticos observados tem a ver com o tempo de permanência do

pessoal na emissora. São extremamente raros os casos em que um núcleo consistente de

radialistas tem acompanhado o trabalho duma certa emissora durante muitos anos. A

tendência, na maioria dos casos, é de entrar, estagiar, ficar alguns meses ou poucos anos,

sair. Os motivos alegados para abandonar o trabalho radiofónico são muitos, desde o

casamento (no caso das mulheres) até a transferência para Bissau por razões de estudo.

Entretanto, outro motivo prende-se com a falta de criatividade do trabalho nas rádios

comunitárias o que desmotiva os jovens recém-chegados. É neste sentido que é preciso

implementar uma estratégia eficaz para que eles possam permanecer por mais tempo na

emissora, desenvolvendo da melhor maneira possível as suas aptidões e capacidades e

dando continuidade ao seu compromisso para com a rádio. Como fazer isso? O princípio a

ser seguido tem de ser o seguinte: fazer com que os radialistas consigam encontrar

interesses fortes para se integrarem no trabalho. Boas práticas não faltam nas emissoras

visitadas. A Rádio Bafatá, por exemplo, foi a única que admitiu que o seu pessoal está

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dividido em funcionários e contratados. E se trata de um corpo estável. Isso significa que

todos, de acordo com o tipo de contrato assinado, têm a garantia de um salário fixo no

fim de cada mês: pode não ser um ordenado muito consistente, mas isso dá uma certeza,

impulsionando o radialista a trabalhar. Segundo quanto foi possível apurar, esses recursos

provém das actividades que esta emissora consegue levar a cabo: sobretudo relacionadas

com comunicados a pagamento, propaganda, participação em concursos de entidades

públicas (por exemplo, o da UE-PAANE). A Rádio Babock, por seu turno, consegiu arranjar

maneira de garantir bolsas de estudo para o seu pessoal nos institutos de contabilidade

ou de administração, circunstância que incentiva e motiva os radialistas a trabalhar pela

rádio. Isso aconteceu mediante uma “troca” com a MTN: esta empresa passa várias

publicidades ao longo do dia na rádio e, em troca, esta solicitou a disponibilização de

bolsas para que os seus voluntários conseguissem estudar nos institutos (de contabilidade

e auditoria e de administração) presentes na cidade. Como de frequente acontece, não

existe uma fórmula fixa, mas sim um princípio geral que deve ser implementado

coerentemente com a realidade específica da cada emissora. Este princípio diz que esta

tem de ser atrativa e estimuladora de novas oportunidades para os jovens que decidem

começar a colaborar com ela. Realçar – como tem acontecido na quase totalidade dos

casos nas visitas feitas – o “voluntarismo puro” dos radialistas significa condenar as

emissoras comunitárias a uma constante incerteza e mudança do próprio pessoal. Essas

emissoras deverão, estrategicamente, planificar uma série de iniciativas finalizadas a criar

os recursos suficientes para garantir ao seu pessoal pelo menos um mínimo fixo para

manter a motivação. Introduzir um certo grau de profissionalização nas rádios

comunitárias significa não apenas não contrariar a sua natureza, mas sim consolidar a sua

presença e acção junto à comunidade.

Como então criar os recursos? Algumas das boas práticas acima citadas constituem

exemplos disso: receber comunicados de ouvintes individuais significa, por exemplo, que

a emissora representa uma referência para toda a comunidade; assim como ter uma boa

quantidade de anúncios de empresas, grandes e pequenas, significa acatar recursos mas

também ter a consideração dos sujeitos mais vivos da comunidade. Outras formas são

possíveis: arrendar os locais, quando existem as condições, para aniversários ou outras

recorrências de cidadãos, oferecer serviços de Internet ou de outra natureza, assim como

espaços para programas geridos por associações, igrejas, etc, de acordo com o contexto

local. Essas práticas representam, elas todas, ao mesmo tempo possíveis entradas “extra”

assim como modos para que a emissora solidifique a sua presença junto à comunidade,

criando mecanismos virtuosos, financeiramente positivos e razoavelmente estáveis. Esta

postura pressupõe uma rádio comunitária pro-activa, que toma a iniciativa e não fica à

espera deste ou daquele evento, deste ou daquele doador, para desencadear acções

concretas, que consigam trazer benefícios imediatos mas também de longo alcance.

8. A comunicação horizontal: como tornar mais eficaz o papel da RENARC

Não resta dúvida que qualquer emissora comunitária, por si só, representa um elemento

fraco, no seio da comunicação social de qualquer país. Vice-versa, uma rede de rádios

comunitárias pode constituir um grupo de interesse forte e consolidado, capaz de

interagir em pé de igualdade com os outros órgãos, tais como emissoras comerciais e

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estatais. Mas para chegar a este resultado vai ser necessário investir mais recursos, tempo

e estratégias na consolidação de uma rede de rádios comunitárias a nível nacional, e em

constante ligação com as redes internacionais, a partir da AMARC.

No caso da Guiné-Bissau, a RENARC foi no passado, um elemento dinâmico e

impulsionador da atividade destas emissoras. Infelizmente, hoje vive uma outra situação:

isso transpareceu de maneira clara das conversas feitas junto aos radialistas das

emissoras comunitárias visitadas. Há unanimidade de opinião de que a RENARC, hoje em

dia, não fornece nenhuma ajuda ao mundo das rádios comunitárias guineenses. Mas a

larga maioria concordou em afirmar que uma RENARC mais forte e presente poderia

ajudar em vários âmbitos: desde a formação à aquisição de equipamento, desde a acção

de lobby junto ao governo e parlamento para aprovar uma lei sobre as rádios e televisões

comunitárias, com particular ênfase na de tipo comunitário que hoje falta, até a

manutenção do equipamento avariado e a implementação duma política de relações

externas com as rádios comunitárias dos países vizinhos e com a AMARC.

A RENARC, todavia, não tem recursos próprios para fazer isso, uma vez que a entidade de

referência, a AD, depois de muitos anos de apoio não conseguiu dar continuidade aos

mesmos, sobretudo do ponto de vista financeiro para o sustento desta organização.

Sendo assim, uma forma para reanimar esta organização poderia ser: que cada emissora

contribua anualmente, nos limites das suas possibilidades, mediante o pagamento de

quotas. Só assim é que ela poderá readquirir legitimidade “política”, dispondo de pelo

menos uma base mínima para desencadear as actividades da sua competência.

Entretanto, se isso acontecer, a própria RENARC deverá elaborar, juntamente com o

pessoal das emissoras, um plano estratégico, elencando as atividades realizáveis a curto,

médio e longo prazo. O isolamento das rádios comunitárias guineenses passa também por

terem uma RENARC mais forte e eficaz.

9. Conclusões

Em jeito de conclusão, apresenta-se uma tabela, que sintetiza hipóteses e prazos que foram

abordados ao longo deste plano estratégico. Obviamente, os prazos são meramente

indicativos, uma vez que cada emissora poderá estar mais adiantada ou mais atrasada

relativamente ao que se pretende alcançar. Outros factores (tais como o de natureza

legislativa ou o relativo ao potenciamento da rede nacional da energia) dependem

indirectamente das rádios comunitárias, uma vez que são da competência das instituições

nacionais.

TABELA DE RESUMO DO PLANO ESTRATÉGICO (DURAÇÃO: 3 ANOS):

ITEM SUB-ITEM OBJECTIVO MEIO PRAZO POSSÍVEL

Condições materiais e logísticas

Energia Autonomia Paineis; “troca” publicidade- energia; Ligação à rede nacional

Máximo 3 anos, dependendo dos recursos disponíveis e das políticas

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energéticas do governo

Telefone/Internet Presença do sinal

Operadoras da telefonia móvel: TMN e Orange

1 ano

Equipamento Aquisição Participação a concursos específicos; recursos próprios

2 anos

Quadro legislativo

Lei das rádios e televisões comunitárias

Aprovação pela Assembleia Nacional Popular

Acção de lobby por parte da Renarc

2 anos

Sustentabilidade financeira

Comunidade Comparticipação financeira

Acção de sensibilização por parte das rádios comunitárias

3 anos

Fundos públicos Obtenção Apresentação de projectos com base nas prioridades das comunidades

Anual

Doadores particulares

Idem Maior penetração da emissora junto às comunidades locais

Ocasional

Serviços à comunidade

Fornecimentos de novos serviços a preços acessíveis

Planificação dessas actividades e disponibilidade de recursos para o efeito

2 anos

Publicidade Obtenção Programação eficaz e atrativa

1 ano

Ciclo do projecto Implementação Formação específica e consequente reorganização com base nisso

2 anos

Racionalização organizacional

Organograma Idem Definição das áreas prioritárias das emissoras

1 ano

Princípio I, II, III Idem Formação e aplicação

1 ano

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Relações com a comunidade

Aprofundar e consolidar

Nova programação; linha aberta; reportagens nas tabancas; assembleias anuais com a comunidade

1 ano

Formação Sistematizar Contínua; feita localmente; direcionada; independente

Anual

Recursos humanos

Fidelização e melhor qualidade

Formação; atratividade das emissoras: salário fixo e/ou planos individuais de formação

2 anos

Comunicação horizontal

Renarc Fortalecimento Pagamento de cotas anuais por parte de cada emissora; procura de meios financeiros de forma autónoma

1 ano

Outros Documentos já

disponíveis:

I. Estudo Os Media na Guiné- Bissau

II. Manual dos Radialistas para Rádios Comunitárias

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Financiamento

Esta publicação foi produzida com o apoio da União Europeia. O seu conteúdo é da exclusiva

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ser tomada como expressão da posição da União Europeia.