PIERCINGS E TATUAGENS NA ADOLESCÊNCIA
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PIERCINGS E TATUAGENS NA ADOLESCÊNCIA
Maria das Graças Teles Martins
O uso de piercings e tatuagens está se tornando cada vez mais popular entre os
jovens de diversos países e em todas as camadas sócio-econômicas. Vários podem
ser os motivos que levam o adolescente a fazer uso dessa prática, além do simples
“modismo na adolescência”. As características inerentes dessa faixa etária, como a
procura pela novidade, e o estímulo provocado pela mídia, provavelmente são as
causas mais freqüentes. O pediatra deve abordar esses assuntos com o
adolescente e seus familiares, numa postura ética e sensata, dispondo de corretas
informações e orientações.
TATUAGEM E PIERCING
Tatuagem é a inserção na derme de pigmentos insolúveis, que podem permanecer
indefinidamente na pele. O pigmento mais freqüentemente utilizado é a tinta da
China. A expressão piercing tem sido usada para designar um tipo de adorno (body
piercing), jóia ou peça decorativa, inserida por perfuração, em certas partes do
corpo. Sua aplicação pode ser realizada em uma ou várias regiões do corpo como,
por exemplo, orelha, região superciliar, nariz, umbigo, boca (lábio, bochecha e
língua), mamilo e genitais. Depois de colocado, dependendo do local de perfuração,
existe um tempo variável para sua cicatrização. É importante que o médico conheça
esse tempo, pois representa um período de vulnerabilidade, necessitando de intensa
vigilância para possíveis complicações infecciosas. Os locais habitualmente
utilizados têm os seguintes tempos de reepitelização: lóbulo da orelha – 1 a 2
meses; sobrancelha – 2 meses; asa do nariz, língua e lábios – 2 a 4 meses; área
cartilaginosa da orelha – 4 a 6 meses; cicatriz umbilical – 6 a 12 meses.
CONTRA-INDICAÇÕES
Piercings e tatuagens são contra indicados em grávidas, imunodeprimidos,
indivíduos com tendência para formação de quelóides, com dermatites infecciosas,
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dermatites atópicas ou que tenham dermografismo. Também não são
recomendados em jovens com discrasias sanguíneas ou em uso de anticoagulantes
e naqueles com doenças cardíacas congênitas.
COMPLICAÇÕES
Tanto a colocação de piercing como a aplicação de tatuagem podem causar
complicações. Piercings: são descritos, em cerca de 10 a 30% dos casos, infecção
ou sangramento no local de sua inserção. Na pele, a maior parte das complicações
ocorre em região umbilical, seguida da orelha e nariz. Infecção é a complicação mais
comum (mais de 75% das procuras por serviços de saúde), cujas manifestações
típicas são dor e sinais fl ogísticos locais. A disseminação infecciosa subjacente, em
particular as condrites em orelhas e nariz, é temerária, pelas implicações estéticas
futuras. O risco de complicações infecciosas é bastante reduzido se forem tomados
os cuidados com assepsia na colocação e na manutenção do piercing. Existe
também, o risco de transmissão de hepatite B, hepatite C e tétano no procedimento
de inserção por material inapropriado. O HIV pode ser transmitido por utilização de
material contaminado não esterilizado. Outras complicações descritas são as
cicatrizes quelóides e as reações eczematosas (dermatites de contato pelo material
do dispositivo). Linfadenopatia pode ocorrer em qualquer indivíduo que tem um
piercing.
As complicações do adorno oral são: dor, edema, obstrução das vias aéreas,
ranhura ou fratura de dentes, trauma gengival ou em mucosa, interferência na
mastigação, difi culdade de fonação, hipersalivação, halitose, periodontite e
aspiração. Tatuagens: os riscos de transmissão de infecções também existem com
este procedimento, principalmente com equipamentos não esterilizados. A
complicação mais descrita é a dermatite de contato pelos pigmentos injetados na
derme. Vale ressaltar que mesmo as tatuagens ditas “temporárias”, realizadas com
henna, podem determinar complicações alérgicas. É interessante salientar que
durante a adolescência, devido ao crescimento, a tatuagem sofre deformidade e
distorção. Além disto, os pigmentos tatuados, com o decorrer dos anos, tendem a fi
car turvos e se localizarem em regiões mais profundas da derme.
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LEGISLAÇÃO
Não existe regulamentação sobre formação e certifi cação dos profi ssionais
que inserem piercings e tatuagens. Comumente, os piercers (pessoas que inserem
os dispositivos) não têm formação específica e aprendem a técnica simplesmente
por observação. Além disso, sabe-se que os estabelecimentos que se destinam a tal
fi nalidade apresentam freqüentemente absoluta precariedade. Os profi ssionais que
atendem adolescentes no estado de São Paulo devem estar cientes da lei estadual
n.º 9828 que proíbe, desde 1997, a aplicação de piercings e tatuagens em menores
de idade, mesmo sob consentimento dos pais. Desta lei, fi ca excluído apenas o furo
no lóbulo da orelha. Se por um lado a lei se tornou um obstáculo maior para os
adolescentes que desejam colocar esses adornos, por outro, tornou-se um
problema, já que vários jovens resolvem fazer a perfuração de modo caseiro, fi
cando mais predispostos às complicações. Os adolescentes costumam, com
freqüência, examinar as regras para quebrá-las. Apesar das leis e proibições terem
o seu papel, elas não garantem a inexistência dos riscos e complicações. É
importante que o médico oriente os adolescentes de forma adequada e trate,
quando necessário, pacientes que se encontrem nessas situações.
CONSIDERAÇÕES PRÁTICAS PARA O PROFISSIONAL DE SAÚDE
Sugere-se que a abordagem do assunto com o paciente deva estar dissociada de
visão discriminatória, privilegiando a reflexão e a crítica em relação aos aspectos
particulares do tema na adolescência.
-Pode haver arrependimento ou mudança de idéia?
A adolescência é marcada pela procura de identidade e independência. A
necessidade de experimentação e o processo de formação de sua identidade, com
oscilações e mudanças podem constituir-se em elementos a serem considerados na
tomada de decisão para a aderência a um movimento, tipo de grupo ou vestuário.
São comuns na prática clínica as fl utuações nos referenciais trazidos por
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adolescentes durante o de tatuagens, embora desenvolvidas, ainda estão distantes
de grande parte da população. Inúmeras vezes uma “obra de arte” pode se
transformar em uma cicatriz inestética.
Para a remoção das tatuagens podem ser utilizados métodos mecânicos, químicos,
térmicos, cirúrgicos e lasers. São tratamentos difíceis, muitas vezes provocam
hemorragias e cicatrizes hipertrófi cas ou atrófi cas e hipocrômicas, com seqüelas
piores que a própria tatuagem. A remoção das tatuagens através dos raios laser é o
método mais efi caz, embora caro, atuando sem prejudicar as estruturas de pele ao
redor. O pigmento absorve a luz e a tinta é fragmentada pelo laser em
micropartículas que são removidas pelo próprio organismo. Em geral são
necessários de quatro a seis sessões para a remoção, dependendo do tamanho,
profundidade e das cores utilizadas na tatuagem. As cores escuras como o azul e
preto são as mais fáceis enquanto as mais claras, como o amarelo e o verde, as
mais difíceis. Após a remoção podem ocorrer: manchas escuras ou claras que em
geral são transitórias, reações alérgicas no local da remoção e casos raros de
choque anafi lático. As cicatrizes são complicações raras. seu acompanhamento.
A experiência demonstra que, com a mesma intensidade com que um adolescente
deseja, por exemplo, tatuar-se ou aplicar uma tintura em seu cabelo, ele procura, no
futuro, retirá-la. É interessante que o adolescente perceba-se num momento de
experimentações, identifi cando suas oscilações de gostos e envolvimentos,
postergando eventualmente atitudes intempestivas e, por vezes, irreversíveis.
Nomes de namoradas, escudos de time de futebol, sinais cabalísticos ou uma
simples menção ao surf pode virar algo indesejado. O crescimento e o
desenvolvimento conduzem o adolescente a novas posições sociais. Algumas
“marcas” podem tornar-se inadequadas nesse “novo” momento e, por vezes,
indeléveis. As técnicas de remoção.
- E se houver complicações?
O uso de tatuagens e piercings pode envolver o adolescente em determinadas
situações de risco, sem que ele, muitas vezes, tenha capacidade de percebê-las ou
de se preocupar com conseqüências futuras. Deve ser clara e explícita a orientação
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ao adolescente sobre todas as potenciais complicações descritas para o
procedimento desejado e suas conseqüências a curto e a longo prazo. Estratégias
de redução dos riscos, como as orientações de perfurações em partes menos
sujeitas a complicações, podem ser úteis. Deve haver sensibilização do adolescente
aos cuidados específi cos de manutenção. O tema, na adolescência, exige de pais,
educadores e profi ssionais de saúde percepção e postura adequadas. Dessa forma,
independentemente da existência de leis, o fortalecimento do diálogo com os
adolescentes constitui aspecto fundamental, podendo funcionar como fator de
prevenção e proteção de riscos para estes indivíduos.
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