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Rede ferroviária de bitola europeia. Parte I: importância para a competitividade da economia Resumo 1 – Introdução Neste artigo analisa-se a importância das infraestruturas de transporte, em particular as ligações ferroviárias internacionais, para a competitividade da economia portuguesa, O artigo insere-se num conjunto sequencial de três artigos sobre a rede ferroviária de bitola europeia e constitui a Parte I. Na Parte II analisam-se as principais opções de traçado e características nos principais corredores de ligação à Europa, e na Parte III analisa-se o Acordo de Parceria Portugal-UE 2014-2020 e as perspectivas de financiamento, e fazem-se sugestões de alteração das políticas actuais com vista a evitar o isolamento económico e empobrecimento do nosso país, que serão inevitáveis se não houver mudanças. O tema é abordado do ponto de vista da competitividade da economia e do serviço às populações, ou seja, dos utilizadores/clientes dos sistemas de transportes e não do ponto de vista de quem presta o serviço, pois os meios de transporte são necessários porque a economia e as pessoas precisam deles. Caso contrário a sua existência não faria sentido. A análise é feita sob uma perspectiva abrangente tanto do ponto de vista temporal como geográfico. Por isso considera-se explicitamente a inserção internacional de Portugal e a integração nas cadeias logísticas globais, e consideram-se os efeitos de longo prazo das opções que se façam nos próximos tempos. A ênfase é posta no transporte internacional de mercadorias, dada a sua importância para a competitividade da economia. No entanto também se

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Rede ferroviária de bitola europeia.

Parte I: importância para a competitividade da economia

Resumo

1 – Introdução

Neste artigo analisa-se a importância das infraestruturas de transporte, em particular as ligações

ferroviárias internacionais, para a competitividade da economia portuguesa,

O artigo insere-se num conjunto sequencial de três artigos sobre a rede ferroviária de bitola

europeia e constitui a Parte I. Na Parte II analisam-se as principais opções de traçado e

características nos principais corredores de ligação à Europa, e na Parte III analisa-se o Acordo

de Parceria Portugal-UE 2014-2020 e as perspectivas de financiamento, e fazem-se sugestões de

alteração das políticas actuais com vista a evitar o isolamento económico e empobrecimento do

nosso país, que serão inevitáveis se não houver mudanças.

O tema é abordado do ponto de vista da competitividade da economia e do serviço às

populações, ou seja, dos utilizadores/clientes dos sistemas de transportes e não do ponto de vista

de quem presta o serviço, pois os meios de transporte são necessários porque a economia e as

pessoas precisam deles. Caso contrário a sua existência não faria sentido.

A análise é feita sob uma perspectiva abrangente tanto do ponto de vista temporal como

geográfico. Por isso considera-se explicitamente a inserção internacional de Portugal e a

integração nas cadeias logísticas globais, e consideram-se os efeitos de longo prazo das opções

que se façam nos próximos tempos.

A ênfase é posta no transporte internacional de mercadorias, dada a sua importância para a

competitividade da economia. No entanto também se fazem breves referências ao transporte de

médio e longo curso de passageiros, apesar de não ser prioritário na actualidade, porque as

infraestruturas, em grande parte, devem servir tanto o tráfego de passageiros como de

mercadorias.

2 – Importações e exportações de/para a União Europeia

A integração plena de Portugal no mercado da União Europeia (UE) é uma condição

fundamental do desenvolvimento económico do nosso país. Apesar da desejável diversificação

dos mercados externos se ter vindo a traduzir no desenvolvimento das relações comerciais com o

resto do mundo, em particular os destinos mais afastados da Europa, a UE continua a ser o

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principal mercado de origem e destino das nossas importações e exportações. A Tabela 1 ilustra

esta situação, mostrando o valor das trocas comerciais de Portugal com a UE e o “Resto do

mundo” em 2012, obtidas da publicação Estatísticas dos Transportes e Comunicações 2012, do

Instituto Nacional de Estatística (ref. 53, pags 183 e 184)1.

Importações

(106 €)

Exportações

(106 €)

Total

(106 €)

% total

UE 37 611 30 922 68 533 70%

Resto do mundo 15 850 13 107 28 957 30%

Tabela 1 – Valor das importações e exportações portuguesas em 2012

A tabela 2 mostra a distribuição do valor das mercadorias do nosso comércio com a UE

(ref 53, pags 183 e 184). Conforme se constata, os modos de transporte dominantes são a

rodovia e o marítimo, que representam respectivamente 81% e 14% do valor das mercadorias

transportadas.

Total

(106 €)

Rodoviári

o

(106 €)

Marítimo

(106 €)

Aéreo

(106 €)

Outros

(106 €)

Importações 37 611 31 469 4 265 684 1 192

Exportações 30 921 23 850 5 340 1 250 482

Total 68 532 55 319 9 605 1 934 1 674

Tabela 2 – Distribuição do comércio Portugal-UE por modos de transporte (em valor)

Dada a posição periférica de Portugal face aos mercados europeus, os custos de transporte

e logística são um factor de competitividade importante das empresas que operam em Portugal.

Como a grande maioria das nossas trocas comerciais com os nossos parceiros da UE se faz por

via rodoviária, sem a qual Portugal actualmente quase ficaria isolado dos mercados europeus,

percebe-se que a competitividade das ligações internacionais terrestres para mercadorias

influenciam muito fortemente a competitividade da economia portuguesa.

Embora não seja o objecto de análise neste documento deve realçar-se a importância da via

marítima para a economia portuguesa, pois além de representar uma quota parte significativa do

comércio com a UE, é completamente dominante nas nossas relações comerciais com os

mercados não europeus (ref 53). Podemos assim concluir que tanto as vias terrestres como a

marítima são indispensáveis à inserção internacional de Portugal, indispensável para o progresso

1 Para facilitar a consulta, criou-se a ref. 44 que compila as principais informações utilizadas neste documento e obtidas de outras publicações do INE sobre estatísticas dos transportes, disponíveis no site http://www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_pesquisa&frm_accao=PESQUISAR&frm_show_page_num=1&frm_modo_pesquisa=PESQUISA_SIMPLES&frm_texto=estatisticas+dos+transportes&frm_modo_texto=MODO_TEXTO_ALL&frm_data_ini=&frm_data_fim=&frm_tema=QUALQUER_TEMA&frm_area=o_ine_area_Publicacoes

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e competitividade da nossa economia. Basta ver o que são as condições de vida em países

isolados economicamente, como a Coreia do Norte ou a Albânia.

2 - Insustentabilidade do modelo actual de trocas comerciais terrestres

2.1 Condicionantes ambientais e energéticas

As condicionantes ambientais e energéticas que a Humanidade enfrenta tornam insustentável o

actual modelo de trocas comerciais terrestres entre Portugal e a Europa baseado quase

exclusivamente na rodovia. Do ponto de vista ambiental o modelo actual origina níveis excessivos

de poluição do ar e congestionamento de estradas e auto-estradas, bem como poluição sonora e

acidentes. Do ponto de vista energético a actual dependência dos combustíveis fósseis reflecte-

se em:

- custos crescentes, pois o petróleo bom e barato de extrair é cada vez mais escasso

- dependências estratégicas nocivas de mercados voláteis ou hostis, no Médio Oriente e outras

zonas do mundo.

Obviamente neste momento estão em investigação e desenvolvimento diversas alternativas aos

combustíveis fósseis, bem como o desenvolvimento de veículos e motores mais eficientes dos

pontos de vista energético e ambiental. No entanto as incertezas sobre o desenvolvimento futuro

de veículos rodoviários eficientes destes pontos de vista ainda são muito grandes, pois ainda não

existem nem se sabe quando existirão alternativas competitivas aos combustíveis fósseis, para

além de que problemas como o congestionamento, embora possam ser ligeiramente minorados

pela evolução tecnológica, não podem ser resolvidos.

2.2 Políticas da União Europeia

Este tipo de questões já foi objecto de numerosos estudos promovidos pela União Europeia e

vários Estados Membros, que conduziram à definição de políticas para garantir a sustentabilidade

dos sistemas de transportes na União Europeia e nas ligações ao exterior.

Mostram-se de seguida na figura 1 diversos excertos do White Paper: European Transport Policy

for 2010. Time to Decide, emitido em 2001 (ref 2 e ref 57).

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Figura 1 - Excertos do White Paper: European Transport Policy for 2010. Time to Decide

Constata-se que a estratégia de sustentabilidade do sistema europeu de transportes se baseia

em grande parte na transferência modal para os modos mais sustentáveis dos pontos de vista

ambiental e energético, que são os modos marítimo e ferroviário.

Estas políticas têm sido defendidas e reafirmadas de forma continuada, como se pode constatar

no White Paper Roadmap to a Single European Transport Area (ref 59), emitido em 2011, que

inclusive define metas quantitativas para as transferências modais num horizonte temporal

definido, como se mostra no excerto da figura 2:

Figura 2 – Excerto do White Paper Roadmap to a Single European Transport Area

Também é claro que produzir as mudanças propostas passa por internalizar os custos externos

dos diferentes modos, reflectindo-os nos custos pagos pelos utilizadores. Por exemplo,

actualmente no caso dos transportes terrestres entre Portugal e a UE, só os custos de poluição

causados pela rodovia são considerados, de forma ainda bastante tímida, essencialmente nas

políticas fiscais que já têm em conta as emissões de CO2 dos diferentes tipos de motores de

carros e camiões. A generalidade das externalidades não estão internalizadas e é natural que o

ritmo de introdução dessas mudanças seja fortemente influenciada pela existência de alternativas

competitivas, de forma a que o sistema de transportes sirva a economia europeia de forma

competitiva. No entanto os sinais desta tendência são claros e não devem ser ignorados.

Apresentam-se de seguida na figura 3 algumas notícias que atestam esta tendência (ref 62).

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Figura 3 – Notícias sobre medidas para induzir a transferência modal na Europa

Além destas notícias, a mesma tendência é preconizada na Directiva 2011/76/UE do Parlamento

Europeu e do Conselho de 27 de Setembro de 2011 (ref 64), de que se apresenta de seguida um

excerto (ref 57) na figura 4.

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Figura 4 – Excerto da Directiva 2011/76/UE

É assim previsível que a rodovia vá perdendo progressivamente competitividade à medida que se

acentuem as políticas fiscais e aumentem as portagens com vista a internalizar os custos que a

rodovia produz e actualmente são pagos por toda a sociedade e não pelos utilizadores. O ritmo a

que esta tendência se vai desenvolver depende da existência de alternativas competitivas, e da

influência dos lobbies afectados. No entanto como as causas destas políticas, ou seja, os

constrangimentos energéticos e ambientais, são independentes da força dos lobbies, estes

podem causar avanços e recuos no processo, mas não inverter a tendência geral.

Na prática a UE e a maioria dos seus Estados-Membros terão tendência a aplicar estas políticas

à medida que disponham de alternativas competitivas para o transporte rodoviário. Além da via

marítima, que obviamente serve bem as ligações entre origens e destinos próximos da orla

costeira da Europa, a UE identificou o transporte ferroviário como sendo o sector estratégico para

garantir a sustentabilidade do sistema de transportes europeu, como já atrás se ilustrou com um

dos excertos do White Paper: European Transport Policy for 2010. Time to Decide (ref 2 e ref 57).

2.3 Falta de competitividade da ferrovia

A ferrovia europeia é actualmente pouco competitiva, tendo uma quota de transporte terrestre de

mercadorias de 17% na Europa (ref 54, pag 44), devido a um conjunto de factores, dos quais os

principais são:

• Pendentes elevadas

• Linhas de resguardo e cruzamento não permitem comboios de 750 m

• Problemas de interoperabilidade: diferenças de bitola, sistema eléctrico e sistema de

sinalização e controle de velocidade, que constituem obstáculos técnicos à livre circulação

dos comboios

• Gestão e regulação: gestão conjunta da infraestrutura e operação por empresas nacionais

quase monopolistas e consequente falta de concorrência na operação, nomeadamente

criando obstáculos à circulação de comboios de operadores não ligados ao gestor da

infraestrutura, em particular de outros países.

A resolução das questões de gestão e regulação é essencialmente uma questão de vontade

política que não exige investimentos, e não é objecto de análise neste texto. Todos os restantes

problemas dizem respeito à infraestrutura física que suporta a operação ferroviária, e só podem

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ser resolvidos com investimentos na infraestrutura (nova ou existente) de forma a dotá-la das

características técnicas adequadas.

Os problemas referidos existem na generalidade dos países da UE e a Comissão Europeia tem

emitido Directivas com vista à criação de standards europeus com vista a uniformizar

características das redes ferroviárias. A ferrovia portuguesa data quase toda do século XIX e

enferma de todos problemas referidos.

A figura 5 mostra as pendentes (inclinações) em certos troços da rede ferroviária portuguesa e

em zonas vizinhas da rede espanhola, expressas em permilagem (‰), ou seja, metros na

horizontal por quilómetros na vertical, que afectam negativamente a competitividade do transporte

ferroviário de mercadorias. Para ser competitiva as pendentes deveriam estar limitadas a 12,5%,

podendo em alguns casos chegar a 15‰ e em situações muito excepcionais e com comprimentos

curtos chegar a 17,5‰. Valores superiores a estes implicam redução do peso da carga máxima

transportada sem reforço de tracção (= colocar mais locomotivas), o que obviamente aumenta o

custo por tonelada transportada se a dimensão do comboio for condicionada pelo peso. Os

valores das pendentes atrás referidos eram os que estavam a ser aplicados no desenvolvimento

da rede de bitola europeia e Alta Velocidade pela empresa anteriormente encarregue do seu

desenvolvimento, a extinta RAVE, excepto na Linha Lisboa-Porto (ref 65). A seta a vermelho

referencia dois troços de pendentes elevadas e comprimentos longos na Linha Vilar Formoso -

Salamanca com especial importância para a competitividade das nossas exportações.

Figura 5 – Mapa de pendentes críticas em Portugal e zonas vizinhas de Espanha

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Como se pode constatar a rede ferroviária portuguesa está “armadilhada” de pendentes elevadas

que reduzem a competitividade do transporte ferroviário de mercadorias.

Quanto aos problemas de interoperabilidade ferroviária, a situação portuguesa caracteriza-se

sumariamente da seguinte forma:

- sistema eléctrico: corresponde ao standard a adoptar na Europa, ou seja, 25 kV. Assim não

precisamos de alterar nada, excepto na Linha de Cascais que é diferente de toda a restante rede.

É uma situação muito melhor do que na generalidade dos países europeus.

- sistema de sinalização e controle de velocidade: o standard europeu é o European Rail Traffic

Management System (ERTMS) para o qual todas as redes ferroviárias europeias deverão evoluir.

Este sistema só afecta o material de tracção (locomotivas e automotoras) e não o material

rebocado (carruagens de passageiros e vagons de mercadorias).

- bitola (distância entre carris): é o problema principal, porque afecta todo o material circulante,

em geral impedindo a sua passagem entre redes de bitolas diferentes, e porque é o mais difícil de

resolver. A figura 6 mostra as diferentes bitolas ferroviárias existentes na Europa. Como se pode

constatar as redes ferroviárias convencionais de Portugal e Espanha constituem uma ilha

ferroviária.

Figura 6 - Bitolas ferroviárias na Europa

O problema da bitola impede a passagem das carruagens dos comboios de passageiros e dos

vagons de mercadorias entre França e Espanha. Ao nível das carruagens de passageiros a

Espanha desenvolveu há cerca de 4 décadas soluções baseadas em eixos variáveis, permitindo

aos comboios circular em redes de bitolas diferentes. Este sistema, baseia-se em material não

standard, pois os maiores fabricantes mundiais de material ferroviário não fabricam material de

eixos variáveis. Por isso se fosse adoptado como solução permanente, criaria uma dependência

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pouco saudável de um reduzido número de fabricantes, essencialmente espanhóis. Este sistema

não se aplica nos vagons de mercadorias, pois os acréscimos de custos retiram toda a

competitividade ao transporte ferroviário de mercadorias que se baseia em grande parte no baixo

custo do material rebocado (vagons). O sistema de eixos variáveis já existe há décadas e nunca

foi aplicado a vagons de mercadorias. Assim o tráfego ferroviário de mercadorias entre Espanha e

França tem-se baseado ou na troca de rodados aos vagons (ref 67) ou na transferência das

mercadorias entre comboios de bitolas diferentes. Ambos os sistemas fazem o transporte

ferroviário de mercadorias incorrer em acréscimos de tempo e custos, reduzindo a sua

competitividade, fazendo com que o transporte ferroviário de mercadorias entre França e

Espanha seja reduzíssimo (ref 50). Mas o seu principal inconveniente é a sua capacidade

limitada, impossibilitando qualquer transferência modal significativa da rodovia para a ferrovia.

Assim o problema da diferença da bitola não pode ser resolvido de forma eficiente ao nível do

material circulante ou das transferências de cargas, só pode ser resolvido alterando a própria

infraestrutura e eliminando o problema. Por esta esta razão a Espanha, que tem mais de 40 anos

de experiência com comboios de eixos variáveis, mudança de rodados e transferência de cargas,

investe fortemente desde 1988 em novas vias ferroviárias de bitola europeia, totalmente

interoperáveis de acordo com os standards europeus, para se ver livre deste tipo de problemas.

Esta política está explícita seu Plano Estratégico de Infraestrutras de Transporte PEIT 2005-2020

(ref 2), conforme se pode constatar nos excertos que se mostram na figura 7.

Pag 87:

Pag 89

Pag 92:

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Figura 7 – Excertos do Plano Estratégico de Infraestrutras de Transporte (PEIT 2005-2020)

Esta questão também já foi analisada nos estudos promovidos pela Comissão Europeia, que

obviamente chegou à mesma conclusão, como se refere explicitamente na ref 2 (pag 30), e se

transcreve de seguida na figura 8.

Figura 8 – Excerto do “White Paper: European Transport Policy for 2010. Time to Decide” sobre a

importância da interoperabilidade para a competitividade da ferrovia

2.4 Aumentos de custos da rodovia e bloqueio rodoviário dos pirinéus.

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O comércio externo terrestre de Portugal com a Europa trans-pirenaica, por se basear quase

exclusivamente na rodovia tem vindo a perder competitividade devido aos aumentos de preços

dos combustíveis e às políticas de internalização de custos de diversos Estados-Membros da UE.

No entanto como a ferrovia ibérica continua a não ser competitiva, os Governos de Portugal e

Espanha não têm tido interesse em promover a transferência modal da rodovia para a ferrovia

porque isso significaria aumentos de custos de transporte e logística nas suas relações

comerciais com o seu principal parceiro comercial, os restantes Estados Membros da UE, ou seja,

perda de competitividade da economia. No entanto a Espanha está a trabalhar fortemente para

estender a rede de bitola europeia a todos os seus principais portos e plataformas logísticas.

Numa nota de imprensa emitida em Outubro de 2011 (ref 21), o Ministério do Fomento de

Espanha informava que o planeamento dos investimentos em infraestruturas ferroviárias tornaria

esse objectivo numa realidade em 2020. A figura 9 apresenta excertos dessa nota de Imprensa.

Figura 9 – Excertos da nota de imprensa do Ministério do Fomento, 2011

De facto é duvidoso que estas intenções se concretizem no prazo previsto, pois entre 2008 e

2013 o ritmo de investimento em infraestruturas de transporte em Espanha diminuiu devido à

crise económica. No entanto as razões estratégicas que fundamentam esse investimento, em

particular na ferrovia, não se alteraram, pelo que a Espanha continua na direcção traçada, apenas

com um abrandamento do investimento. A quantificação desse abrandamento é explicita no Plan

de Infraestruturas, Transporte e Vivienda, PITVI 2012 – 2024, (ref 47), que refere que após um

mínimo do valor do investimento em 2013 correspondente a uma redução para menos de metade

do valor de 2008, este começará a aumentar mas de forma ligeira até 2024. A figura 10 mostra

excertos do PITVI, com valores concretos dos investimentos previstos.

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Figura 10 – Excertos do PITVI

Ou seja, em 2011 o esforço de investimento era de 1,24% do PIB e prevê-se que entre 2013 e

2024 seja próximo de 2/3 disso. Assim, o tempo necessário para assegurar o financiamento

aumenta em cerca de 50%, pelo que neste pressuposto os investimentos previstos na nota de

imprensa para o período 2011-2020 provavelmente só se concluiriam em 2025. Mesmo que se

admitam alguns imprevistos e atrasos, é previsível que a bitola europeia esteja em todos os

principais portos e plataformas logísticas de Espanha em 2030. Assim próximo desta data,

eventualmente antes, a Espanha disporá de alternativas competitivas à rodovia no seu comércio

terrestre com a UE e terá todo o interesse em adoptar as políticas da UE para promover a

transferência modal da rodovia para a ferrovia.

Esta situação afectará não só o comércio de Portugal com a Europa trans-pirenaica mas também

com a própria Espanha, pois à medida que a bitola europeia se vai implantando em Espanha as

linhas de bitola ibérica irão ser progressivamente descontinuadas. A ref 39 mostra uma notícia

sobre um estudo do Ministério do Fomento de Espanha que preconiza o fecho de diversas Linhas

de bitola ibérica em Espanha, nomeadamente as Linhas da Estremadura espanhola que ligam à

rede portuguesa em Badajoz. Não havendo interesse em pagar a manutenção dessas Linhas se

as mesmas regiões forem servidas por novas Linhas em bitola europeia, em geral mais

competitivas, provavelmente as Linhas em bitola ibérica serão desactivadas assim que as Linhas

de bitola europeia cheguem às mesmas regiões.

Além do aumento geral dos custos do transporte rodoviário na Europa, as trocas comerciais

terrestres de Portugal com a Europa trans-pirenaica serão muito negativamente afectadas pela

vontade dos Governos de Espanha e França de acabar com os engarrafamentos nas auto-

estradas dos Pirinéus, provocados em grande parte pelo elevado número de camiões que por lá

circulam. Esta intenção está explicita em documentos oficiais de ambos os países (ref 41, 42 e

56), de que se mostram de seguida alguns excertos:

Ref 41, pag 28:

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Ref 42:

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Ref 58:

“Une façon, d’une part, d’éviter les risques d’une saturation progressive du réseau (prévue à l’horizon 2030, si rien n’est fait), d’autre part de lutter contre le mur de camions qui chaque jour encombre les routes et pollue l’atmosphère jusqu’à la frontière espagnole. “ (ref 58, pag 3)

Do lado francês prevê-se que em 2017 esteja a funcionar a Linha do TGV Paris-Bordéus,

libertando grande capacidade na linha convencional no mesmo itinerário para comboios de

mercadorias. De Bordéus até à fronteira de Hendaye-Irun no lado Atlântico dos Pirinéus a linha

actual ainda tem excesso de capacidade e prevê-se que quando esta esgotar esteja concluida

uma nova Linha de Alta Velocidade de Bordéus até Espanha aumentando a capacidade da

ferrovia. Assim não haverá problemas em escoar em França as mercadorias com origem/destino

na península Ibérica. Desta forma quando a Espanha extender a bitola europeia a todas as suas

principais infraestruturas logísticas e portuárias, entre 2025 e 2030 aproximadamente, ambos os

países poderão executar as políticas que entenderem convenientes para tirar os camiões das

estradas sem prejudicar a competitividade das suas economias. Nessa altura ambos os países

executarão as políticas já anunciadas, ou seja, aplicarão as medidas fiscais e regulatórias que

entenderem até reduzirem substancialmente o número de camiões nas auto-estradas adjacentes

à fronteira, que aqui se designará por “bloqueio rodoviário dos Pirinéus“. Esta situação, em

conjunto com as restantes medidas para promover a transferência modal da rodovia para a

ferrovia de aplicação generalizada em quase toda a UE, tornarão insustentável o actual modelo

de trocas comerciais entre Portugal e a UE.

3 A competitividade da economia e importância das ligações ferroviárias directas à Europa

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Em consequência, se Portugal não seguir políticas semelhantes às de Espanha no que diz

respeito ao investimento na ferrovia de bitola europeia, em 2030 ou antes, as nossas importações

e exportações para a UE ficarão privadas de vias de transporte terrestre competitivas. Recorde-se

que as vias terrestres representam mais de 80% do valor das trocas comerciais com a UE, o

nosso parceiro comercial mais importante. Nestas condições as empresas a operar em Portugal

serão obrigadas a usar as plataformas logísticas espanholas ligadas à rede de bitola europeia

para exportar grande parte das suas mercadorias para a UE (excepto regiões espanholas

adjacentes a Portugal). Será como pagar uma portagem a Espanha sem acrescentar qualquer

valor às mercadorias. Nestas condições quem é que vai investir em Portugal ? Dada a relevância

que os custos de transporte e logística têm na estrutura de custos das empresas, em particular as

exportadoras, todo os investimentos na península Ibérica, excepto investimentos locais que não

podem ser deslocalizados, tenderão a ser atraídos para Espanha, devido às melhores condições

que aí existirão. É óbvio que para contrariar esta tendência Portugal precisa de dispor de vias

terrestres competitivas para o seu comércio com a UE. Assim a não construção de uma rede ferroviária de bitola europeia competitiva e com capacidade suficiente para as necessidades da economia portuguesa, constituirá um forte desincentivo ao investimento em Portugal e um incentivo à deslocalização de empresas, condenando Portugal a um futuro de pobreza e subdesenvolvimento face à Europa. Como as empresas analisam estas

questões quando fazem as suas opções de investimento este efeito negativo já existe, embora

não se veja.

4 Breves referências aos outros meios de transporte e aos passageiros

4.1 Rodovia

Transporte porta-a-porta, co-modalidade, camiões em cima de comboios

4.2 Portos

4.3 Via aérea

internalização de custos para d<800km

4.4 Breve referência ao transporte de passageiros

Referir Linhas mistas

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Refs

Ref 2 - White Paper. European transport policy for 2010 - Time to Decide, 2001

Ref 21 – Nota de Prensa, Ministerio do Fomento de Espanha, 19 de Outubro de 2011

Ref 41 – Incidencia de la Nueva Red Ferroviaria de ancho internacional en el TRANSPORTE DE MERCANCÍAS por ferrocarril en la CAPV

Ref 42 - http://www.euskalyvasca.com/multi_infog_detalle.html?contentName=cont_multimedia.infografia.Costes_externos

Ref 43 – Inquerito ao Transporte Rodoviario Transfonteiriço 2008

Ref 44 – Resumo de estatísticas dos Transportes 1999-2012, INE

Ref 45 – Evolucao do PIB 1960-2003

http://www.pordata.pt/Portugal/PIB+e+rendimentos-2412

Ref 46 – Variacoes de trafego terrestre e PIB

Ref 47 - Plan de Infraestruturas, Transporte e Vivienda, PITVI (2012 – 2024)

Ref 48 – GT IEVA – relatório final

Ref 49 – Estatisticas do Comercio Internacional 1993-2009

Ref 50 - Observatorio Hispano Frances de Trafico en los Pirineos 2008

Ref 51 – Review on Maritime Transport 2013

Ref 52 -Ministro do Fomento nas Cortes de Espanha, 2011

Ref 53 - Estatisticas dos Transportes 2012, INE

Ref 54 - Estudos do Corredor Ferroviario de Mercadorias 4 (RFC 4)

http://www.corridor4.eu/images/CID/CID2015/CFM4_CID_book_5_V1_190314_EN.pdf

Ref 55 - RFC4 - Corridors Conference 2012

(http://www.rne.eu/tl_files/RNE_Upload/News/052012/Presentations/RFC4%20-

%20Corridors%20Conference%202012.pdf)

Ref 56 – Movimento de contentores no porto de Leixões. Fonte – APDL

Ref 57 - Excertos da ref 2, White Paper. European transport policy for 2010 - Time to Decide,

2001

Ref 58 – LGV – Sud

Page 20: Página Inicial · Departamento de Engenharia Civil ...mlopes/conteudos/Luis Simoes... · Web viewe competitividade da nossa economia. Basta ver o que são as condições de vida

http://www.aquitaine.fr/actions/territoire-durable-et-solidaire/infrastructures-de-transport/

projets-ferroviaires#.VBlu7xZ4CZQ

Ref 59 – White Paper Roadmap to a Single European Transport Area

http://eur-lex.europa.eu/legal-content/EN/ALL/;ELX_SESSIONID=GgJjJWGdLtnclcqbc8x2wcx1fNQ91W1BQn5tvpdHb2K0tgcJR0yg!-1932196562?uri=CELEX:52011DC0144

Ref 60 – Um Risco Histórico

Ref 61 – Rail Market Share in America

Ref 66 – Pendentes máximas na rede de bitola europeia e AV planeada pela RAVE

Ref 67 – Site com vídeo sobre trocas de rodados

www.cerbere.vwm

http://europa.eu/rapid/press-release_STAT-14-147_en.htm