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Perspectivas do Diálogo em Gadamer: A Questão do Método * Sérgio Ricardo Silva Gacki 1 * Artigo adaptado do 1º capítulo da Dissertação de Mestrado em Filosofia da UNISINOS, defendida em 25/06/2004.

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Perspectivas do Diálogo em Gadamer:A Questão do Método*

Sérgio Ricardo Silva Gacki

1

* Artigo adaptado do 1º capítulo da Dissertação de Mestrado em Filosofia da UNISINOS, defendida em 25/06/2004.

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Numa época em que a ciência penetra sempre mais decisivamente napráxis social, esta mesma ciência só poderá exercer adequadamentesua função social quando não ocultar seus próprios limites e as condi-ções de seu espaço de liberdade. É justamente isso que a filosofia deveesclarecer a uma geração que acredita na ciência até os extremos daidolatria.

Hans-Georg Gadamer

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Sumário

Introdução................................................................................................................................... 7

1 A questão do método.................................................................................................................. 111.1 Ciência e método ............................................................................................................... 12

1.1.1 O que é ciência? ........................................................................................................ 131.1.2 As ciências do espírito e sua autoconsciência metódica ................................................ 141.1.3 Verdade versus método?............................................................................................. 15

1.2 Ciência e conhecimento ..................................................................................................... 161.2.1 Do conceito de preconceito como elemento da reflexão do científico ........................ 171.2.2 A história efeitual e o conhecimento científico .......................................................... 181.2.3 Considerações sobre a aplicação ................................................................................ 191.2.4 A fusão de horizontes e a crítica do método científico ............................................... 201.2.5 A tradição e o conceito de experiência em Gadamer .................................................. 22

Conclusão .................................................................................................................................... 24

Referências bibliográficas .............................................................................................................. 26

No decorrer deste trabalho serão utilizadas siglas e abreviaturas referentes as seguintes obras:

1 Siglas:

VM – Verdade e MétodoVMII – Verdade e Método II (Editora Vozes)EIFO – El inicio de la filosofía ocidentalPCH – O problema da consciência históricaHF – Hermenêutica Filosófica – Nas Tri-

lhas de Hans-Georg GadamerHDFHS – La Dialéctica de Hegel. Cinco ensayos

hermenéuticos

2 Abreviatura:

FEN – Fenomenologia do Espírito

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Em forma de prefácio...

Com prazer aceitei o convite para prefaciar obelo artigo do prof. Sérgio Ricardo Silva Gackiintitulado Perspectivas do diálogo em Gadamer: aquestão do método.

Muitas foram as motivações e as razões que melevaram a responder positivamente ao pedido doRicardo, escrevendo este modesto “prefácio” aoseu texto. Saliento primeiramente seu interessepelo tema do diálogo ao longo de sua formaçãojurídica até seu ingresso no mestrado bem comosua bem sucedida conclusão com a elaboração deuma dissertação sobre perspectivas do diálogo fi-losófico. Em segundo lugar, ressalto o aspectopessoal do autor que, em seu procedimento e pos-tura – pedagógica e política – encontrou no diá-logo uma “metodologia” apropriada para o trata-mento de questões humanas, pautando sempresua conduta pelo “espírito” dialógico. Sua pes-quisa sobre a obra de Gadamer, tendo como fococentral de atenção o diálogo, revela a apreensão,por parte do Ricardo, de um dos temas funda-mentais e estruturantes da hermenêutica filosóficagadameriana. Enfim, enfatizo meu grande apreçoem escrever este prefácio pela atualidade – ética,social, política, pedagógica – que o tema do diálo-go ocupa e deveria ocupar na construção de rela-ções humanas sadias e autênticas. Razões e moti-vações que corroboram a caracterização atribuídaa Gadamer como o “Sócrates contemporâneo”.

O artigo do Prof. Ricardo retrata, de formafiel e coerente, a postura crítica de Gadamer paracom o método unilateral e asséptico das ciênciasda natureza. Contudo, com suas incessantes críti-cas ao “imperialismo cognitivo da metodologiadas ciências da natureza”, não sustentou uma

postura de rechaço ou de abandono tout courtdas metodologias científicas, mas justificou anecessidade de se elaborarem “metodologias”apropriadas aos diferentes objetos. No caso dasquestões humanas, sustentado pelo conceito dephrônesis de Aristóteles, Gadamer retomou a no-ção do diálogo socrático-platônico, mostrandoque, na filosofia, “Verdade e Método” com-põem num certo sentido o que Heráclito desig-nava de “harmonia dos contrários”. Em outraspalavras, a proposta filosófica gadameriana nãoconsistiu em destruir a validade do método cien-tífico, mas em justificar que, ao filosofar é maispróprio a arte de dialogar que a técnica de disse-car temas e problemas.

O conceito de verdade, irredutível à noção decerteza, foi abordado por Gadamer sob diferentesperspectivas – pela noção de jogo, de círculo her-menêutico e pela concepção de diálogo – consti-tui um dos principais fios condutores da herme-nêutica filosófica, que foi muito bem explicitadoneste artigo. Nele aparece muito bem a posturaprópria da hermenêutica em que o conhecimentoé sempre auto-implicativo, ou seja, trata-se de ummodo de conhecer que amplia o saber sobre nósmesmos.

Enfim, trata-se de um texto que espelha muitobem intuições e indicações sobre o modo apro-priado de pensar e de tratar o real, as pessoas. Épela palavra que podemos, conjuntamente, retra-tar um modo de configurar e de reconfigurar nãoapenas nossa forma de pensar como também nos-so modo de agir. Ora, a “metodologia dialógica”proposta por Gadamer, apresentada no artigo doRicardo, contribui para a compreensão e a divul-

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gação de uma proposta filosófica extremamentepertinente e atual. A fim de concluir este prefácioe conduzir o leitor à leitura do artigo, recordoque, para Gadamer, somente pelo diálogo pode-

remos evitar as guerras e a destruição do nossoplaneta.

São Leopoldo aos 15 de setembro de 2005.

Dr. Luiz Rohden1

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1 Dr. Luiz Rohden é professor do PPG em Filosofia da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS.

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Introdução

Gadamer, como Sócrates, assume o ensinocomo missão, proclamando a necessidade de ohomem conhecer a si mesmo, de tomar consciên-cia de seus limites e da consistência verdadeira dopróprio saber. Nesse horizonte socrático, consoli-da-se sua crítica ao espírito instrumental da mo-dernidade, alertando que a sabedoria não se reduzà visão técnico-calculativa. A sabedoria não estáno fato de se saber mais coisas que os outros, masno saber que não se sabe.

Em nosso artigo, partimos da premissa de queestamos envolvidos em debates metodológicosquando enfrentamos questões como estas: É pos-sível conhecer? Como conhecemos? Quando co-nhecemos? Por que conhecemos? Na verdade,sempre temos um proceder que nos orienta nabusca do conhecimento. O método – causal-ex-plicativo – desenvolvido no âmbito das ciênciasnaturais, orientado pelo subjetivismo moderno,ganhou status de caminho único para a verdade.Gadamer era consciente disso e imbuído desta re-ferência; deu sua contribuição para a discussãosobre a questão do método na filosofia, destacan-do ainda as conseqüências desta posição para odesenvolvimento da humanidade.

Desde já, alertamos que a hermenêutica de Ga-damer é muito mais que discussão sobre o método.A questão do método na filosofia de Gadamer,para expor as deficiências do espírito instrumentalreinante na modernidade, é meramente o fio con-dutor escolhido para orientar nossa pesquisa. Apósum breve sobrevôo sobre o conceito de hermenêu-tica e a apresentação das justificativas e relevânciado tema, apresentaremos a delimitação da aborda-gem, juntamente com seus elementos e qual o per-curso escolhido para desenvolvê-lo.

Consideramos fundamental, na produção in-telectual de Hans-Georg Gadamer, o conceito dehermenêutica. Sua reflexão se propõe a funda-mentar e justificar uma perspectiva filosófica quepode ser caracterizada como hermenêutica e quepode orientar-nos na compreensão de fenômenosda vida humana, como ciência, arte, política, reli-gião, sem cair em perspectivas reducionistas.

Concordamos com José María Aguirre Oraá,quando diz que “o propósito explícito de Gada-mer consiste em tentar desenvolver de maneiracontínua e obstinada os fundamentos e as gran-des linhas de uma alternativa filosófica definidacomo hermenêutica”2. Gadamer, em seus livros eartigos, expressa-nos esta intenção, que se apre-senta em seus estudos filológicos hermenêuticossobre a filosofia grega (principalmente sobre Pla-tão e Aristóteles) e sobre a história da hermenêu-tica em seus autores mais significativos, exploran-do os fundamentos, as implicações e as perspecti-vas de um pensamento hermenêutico em varia-dos âmbitos da experiência vital humana.

Neste labor, Gadamer entra no debate sobre aquestão do método na filosofia. Esta é uma preo-cupação central que já aparece no início de Ver-dade e Método, quando seu autor denuncia e fun-damenta a inadequação de o método das ciênciasnaturais ser importado para o âmbito das ciênciasdo espírito. Aqueles que acompanham os tradici-onais debates sobre o método na filosofia, ao lon-go da história, e a dimensão que tal debate tomouna modernidade, sabem que esse assunto é talvezum dos mais importantes e controversos dentroda filosofia. Os estudiosos de Gadamer, apreensi-vos, poderiam se perguntar: Qual o motivo de talproposição (discutir o método) e qual o sentido

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2 ORAÁ, José María Aguirre. Hans-Georg Gadamer: La Alternativa “Ontológica” Hermenêutica. In: Cuadernos de Investi-gación Histórica. Espanha: Universidad de La Rioja, 1997, p. 427.

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do embate gadameriano com o método que pro-põe o presente trabalho? Uma justificativa plausí-vel deve ser apresentada para evitar que tal pro-posta seja ligada de imediato a um debate reduci-onista sobre a hermenêutica, restringindo-a auma discussão metodológica. Como explicitare-mos, falar de método na filosofia de Gadamer en-volve um mergulho na tradição, rompendo como autismo gnosiológico proposto pela visão demétodo da modernidade. A afirmativa de um de-bate de Gadamer com a questão do método soaprovocadora e talvez confusa a princípio, porém,obedece, entre outras coisas, à ironia3 de Gada-mer ao nomear sua obra magna de Verdade eMétodo.

Neste artigo, mantivemos como fio condutorde nossa reflexão o ponto de partida de Gadamer,qual seja, sua crítica ao “imperialismo cognitivoda metodologia das ciências da natureza”4. O mé-todo não é o cânone único e universal, nem doconhecimento, nem da verdade. Convém ressal-tar que tal postura não passou incólume pela crí-tica, principalmente a crítica fácil que qualifica ahermenêutica como relativismo e como um re-chaço da racionalidade metodológica.

Um dos motivos que nos faz situar nosso tra-balho como um contributo à discussão do méto-do no pensamento de Gadamer – pensador queresgatou o valor da tradição e elucidou o signifi-cado de preconceito, sempre presente e atuantenas nossas reflexões e no nosso atuar no mundo –é o fato de que está presente no esforço de suaobra a importância atribuída aos processos episte-mológicos e metodológicos da filosofia. Questio-nado a este respeito, Gadamer diz que acredita tersido “convincente” em Verdade e Método, no quese refere a seu franco respeito à pesquisa científi-ca, bem como à racionalidade metódica que apossibilita. A hermenêutica não é ametódica ouantimetódica. A hermenêutica trabalha em outraperspectiva; poderíamos dizer que trabalha com

outra metodologia que não a científica, como ve-remos no decorrer de nossa reflexão.

O problema da realidade como elemen-to tensional da reflexão hermenêutica

O problema do método na discussão gadame-riana, como já dissemos, tem como mote a postu-lação da inadequação do método da ciência para afilosofia. Salientamos, porém, que a preocupaçãocom as conseqüências dessa inadequação se verifi-ca como problema geral, ou seja, o problema queGadamer está enfrentando ao questionar o méto-do é a realidade que se plasma com base no refe-rencial das ciências causais explicativas. Discor-damos da idéia de tais ciências, em que somenteseu aval permite o nascimento de verdades. Talproblemática alcançou-nos como desafio parareflexão.

Não se trata aqui de considerarmos a ciênciacomo algo maligno, mas de verificar que a repeti-ção acrítica de muitos pressupostos, que devemser localizados em tempo e espaço na história, estálevando a humanidade a um ponto crítico. Queponto crítico é esse? Estamos falando aqui de nos-so destino. A possibilidade da destruição da hu-manidade, tornada consciente por este referencialtecnocientífico, que, conforme Gadamer, “na suaincrível capacidade de instaurar mudanças nosdados naturais em proveito da vida e da sobrevi-vência do homem, tornou-se, nos seus efeitos,um gigantesco problema mundial”5. Nisso reco-nhecemos o esforço de Gadamer, em sua herme-nêutica filosófica, ao reestruturar e repensar o fi-losofar como ato existencial. A filosofia e o filoso-far acontecem no mundo.

Nosso destino se decidirá no como esse mundo marca-do pela ciência e que se formulou filosoficamente nouniverso do conceito, caminha, também, ao mesmotempo junto às profundas visões dos destinos humanos,

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3 Essa expressão restará esclarecida no debate que realizaremos adiante com Carsten Dutt na obra En conversación comHans-Georg Gadamer.

4 ORAÁ, op. cit., p. 427-8.5 ALMEIDA; FLICKINGER; ROHDEN. Hermenêutica Filosófica – Nas Trilhas de Hans-Georg Gadamer. Porto Alegre:

EDIPUCRS, 2000, p. 15. Utilizaremos a sigla HF para esta obra.

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tal como aquela que ganha expressão, aproximadamen-te no diálogo de um mestre chinês com seu discípulo,ou em outro qualquer testemunho de culturas de cunhoreligioso, para nós muito desconhecidas.6

Não é de admirar a acusação de Heidegger aodizer que a “ciência não pensa”. Por que a ciêncianão pensa? Para responder tal questão temos quepensar o homem e sua eterna busca pela verdade.Mas que verdade é esta que se busca? A verdadecomo um conceito estanque ou como um proces-so construído?

O homem, em sua história, colecionou fanta-sias, ambições e insucessos incontáveis. A ciênciaempírica moderna encontrou, no século XVII, namecânica de Galileu e de Huygens, seu primeirofundamento. Continuou a desenvolver-se cadavez mais, incorporou todos os âmbitos do sabernuma nova metodologia e buscou finalmente –este é o momento em que agora nos encontramos– conquistar e submeter ao seu enfoque, também,a realidade social, com a pretensão de conduzi-lacientificamente7. Nesse sujeito historicamenteconstruído, recai a proposta cartesiana e as mara-vilhas anunciadas por Francis Bacon, encontran-do solo fértil, nesse homem desalentado saído daIdade Média, para que se instale um referencialteórico que instaura um paradigma que nos cercae comanda até os dias de hoje.

Que realidade vivemos? A realidade que pen-samos estar vivendo? Platão parece já ter discuti-do semelhante idéia, pois eleva a esfera do pensa-mento ao status de espaço privilegiado para escla-recermos a questão. Hegel nos propõe que “tudoque é real é racional, tudo aquilo que é racional éreal.” Está pavimentada na modernidade a aveni-da por onde ocorrerá a disputa pela “verdade”.Vários arcabouços surgiram para dar conta da ta-refa de compreender a realidade, porém estes não

conseguiram desvincular-se da visão de mundopautada pela racionalidade técnica.

Afinal de contas, o que é racional? Se o racio-nal é reconhecido como um processo construídonum reconhecimento do humano como elemen-to que o funda, fatalmente se plasmará uma reali-dade com base neste referencial. O real estará ali-cerçado, então, em valores, tais como camarada-gem, amizade, amor, solidariedade, respeito àsdiferenças, entre outros.

Na verdade, o desenvolvimento científico temnos franqueado o convívio com contradições quepatrocinam a exclusão de milhões de pessoas dochamado mundo globalizado tecnocientífico. Nodiscurso, tal mundo existe para todos, mas na rea-lidade, o modo de vida baseado na tecnologia eno consumismo exacerbado não comporta a in-clusão total. Denuncia-se a política do estado“mínimo do social” e “estado máximo do capi-tal”. Esta aparente convivência tranqüila entremiséria e tecnologia talvez seja o indicativo de cri-se desta visão de mundo.

O fato é que a ciência ergueu um muro entresujeito e objeto, sentenciando uma total desinte-gração entre o investigador e o objeto investiga-do. Forja-se e faz-se prosperar uma alienação ali-cerçada na visão de um homem-mercadoria, emque este está fadado a render-se às “leis do merca-do”, irrefutáveis, irredutíveis e inevitáveis8, visãocom a qual não concordamos.

Ao longo da história, vemos todo um processode acomodação a esse referencial pragmático-tec-nocientífico. As outras áreas, chamadas “ciênciashumanas”, importaram o método científico parasuas investigações, na tentativa de enquadrar ohumano dentro do referencial da suposta certezae exatidão das ciências causais e explicativas. Ga-damer, nos recorda que:

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6 Id., p. 16.7 GADAMER, H.G. A Razão na época da ciência. In: A filosofia de Hegel e suas influências atuais. Tempo Brasileiro. Rio de

Janeiro: s.n., 1983, p. 28. Para esta obra usaremos a sigla REC.8 “Essa tese está posta, na sua dimensão teórica e nos seus prolegômenos prático-propositivos, pela mídia, pelos ideólogos do

neoliberalismo, pelos pregoeiros do fim da História, pelos sustentáculos da ordem, pela utopia milenarista do capitalimortalizado.” (ROCHA, Ronald. O Mundo do Trabalho e o Trabalho do Luto. In: ARRUDA JUNIOR, Edmundo Limade; RAMOS, Alexandre (org.). Globalização, Neoliberalismo e Mundo do Trabalho. Curitiba: IBEJ. 1998. p. 96.)

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A auto-reflexão lógica das ciências do espírito queacompanha seu efetivo desenvolvimento no século XIX,é inteiramente dominada pelo modelo das ciências danatureza. Mostra-o um simples olhar lançado à expres-são “ciências do espírito”, desde que essa expressão rece-ba o significado que nos é familiar, unicamente atravésde sua forma plural. As ciências do espírito se entendemtão clarividentes, graças à sua analogia com as ciênciasda natureza, tanto que o eco idealístico, que se situa noconceito de espírito e da ciência do espírito, retrocede.9

Ressaltamos, em tempo, que não estamostomando a tarefa da Teoria Crítica10, pois,Horkheimer, Adorno, Erich Fromm, Marcuse eWalter Benjamin levaram a efeito uma preciosareflexão que não será nosso objeto de pesquisa.

Tendo presente as questões até aqui expostas,já temos elementos suficientes para fundamentar-mos os esforços da reflexão de Gadamer em seudiálogo constante com as obras de Platão, Aristó-teles, Hegel, Husserl, Heidegger, Nietszche e ou-tros grandes pensadores, para opor-se radical-mente ao espírito instrumental reinante na mo-dernidade. Interessar-se pela hermenêutica filo-sófica, “coisa de Gadamer”, nas palavras de Hei-degger, é refletir com o interesse pelo ético e hu-mano. É romper com as decisões disfarçadas me-diante índices e estatísticas que se prestam so-mente para criar imagens que não correspondemà realidade.

O fio condutor

No horizonte proposto pelo presente artigo,aprendemos que a leitura do texto gadameriano é

possível quando pautada na proposta da humil-dade socrática e na sua força maiêutica. Note-seque a oposição ao espírito instrumental se estabe-lece como ponto fundamental no horizonte dareflexão. Defendemos que tal oposição, em Ga-damer, está fundamentada e realizada no mundopelo “autêntico diálogo”. Pensamos e sustenta-mos que este fio condutor perpassa tanto as diver-sas críticas de Gadamer às ciências, quanto estápresente no seu debate com Hegel, bem como emsua exposição e fundamentação da universalidadeda linguagem. À guisa de apresentação do autor,entendemos que a abordagem, dentro dos limitesque possibilitassem este artigo, expressa, de formailustrativa, algumas das preocupações com as quaisestivera Gadamer em constante debate duranteseus bem vividos e produtivos 102 anos de vida.

Para não passar in albis o esforço e a trajetóriaque aqui pretendemos realizar, pensamos que elescontribuem também para os debates sobre a ava-liação epistemológica da hermenêutica filosófica.Tais discussões têm perdido de vista que o cerneou motivo originário da hermenêutica filosóficanão era epistemológico, mas ético-político. Se-gundo Flickinger, “é uma afirmação que vale, an-tes de tudo, no caso de H. G. Gadamer, cuja críti-ca do gesto dominador da razão instrumental ar-ticula-se pelo recurso à postura ética que move odiálogo socrático”11.

10

9 GADAMER, H.G. Verdade e Método II. Traduzido por Enio Paulo Giachini. Revisão de tradução de Márcia Sá Cavalcan-te-Schuback. Petrópolis: Vozes, 2002, p. 39. Para esta obra usaremos a sigla VMII.

10 Boa parte dos ensaios e artigos que compõem a Teoria Crítica foram publicados no Zeitschrift für Sozialforshchung (Jor-nal para a Pesquisa Social) no período de 1932 a 1941.

11 FLICKINGER, Hans Georg. Pedagogia e hermenêutica – uma revisão da racionalidade iluminista. In: DALBOSCO, Clau-dio Almir. Filosofia prática e pedagogia. Passo Fundo: UPF, 2003, p. 54.

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1 A questão do método12

[...] nesse conglomerado de conhecimentos, que leva onome de ciência sem merecê-lo, fala-se habitualmentesobre o fim e generalidades semelhantes do mesmomodo histórico e não-conceitual como se fala do pró-prio conteúdo [de tal ciência]. Na filosofia, ao contrá-rio, ressaltaria a inadequação de utilizar tal procedimen-to, quando ela mesma o declara incapaz de apreender overdadeiro.13

Como já anunciamos, pretendemos desenvol-ver neste artigo elementos da crítica de Gadamerà visão unívoca de racionalidade que limitou a fi-losofia à uma discussão metodológica. Prelimi-narmente, privilegiamos o que se evidencia emVerdade e Método como a intenção de ofereceruma contribuição mediadora entre a filosofia e asciências. Gadamer pergunta se “podemos objetarà reflexão filosófica que ela não leva em conside-ração a investigação científica como um fim em sie que, ainda, com seu questionamento filosóficotematiza as condições e limites da ciência no tododa vida humana”14. Parece que Gadamer estáquestionando sobre a responsabilidade e a neces-sidade de uma posição coerente da filosofia dian-te das ciências naturais. Ele nos orienta:

Numa época em que a ciência penetra sempre mais de-cisivamente na práxis social, esta mesma ciência só po-derá exercer adequadamente sua função social quandonão ocultar seus próprios limites e as condições de seuespaço de liberdade. É justamente isso que a filosofiadeve esclarecer a uma geração que acredita na ciênciaaté os extremos da idolatria.15

E é justamente nisso que a tensão de Verdade eMétodo, justifica o autor, possui uma atualidade

inalienável – afirmação com a qual concordamose buscaremos sustentar.

Convém ainda justificar as opções de aborda-gem levadas a efeito no presente artigo, optandoneste por, além de desenvolver elementos que fun-damentam a crítica de Gadamer ao espírito instru-mental, apresentar, sem um aprofundamento maior,uma análise panorâmica de alguns conceitos de-senvolvidos por Gadamer na segunda parte deVM, que consideramos centrais para a sedimenta-ção da proposta da hermenêutica filosófica e quedesemboca na sua paradigmática conclusão do de-bate sem fim proposto pelo diálogo.

Embora o “caminho” hermenêutico-meto-dológico proposto na segunda parte de VM sejao “círculo hermenêutico” – na terceira parte é o“diálogo” –, não é por acaso que Gadamer noscoloca a questão do diálogo ao final da obra,onde a reflexão ocorre alicerçada em sua reflexãoanterior16. A explicitação de Gadamer sobre opreconceito, a tradição, a história efeitual, a apli-cação e a fusão de horizontes são alicerces para oentendimento de sua hermenêutica filosófica e,por conseqüência, fundamentais para a compre-ensão de sua crítica à dominação do espíritoinstrumental.

Quando desenvolvemos a crítica à ciência, fei-ta por Gadamer, verificamos que a suposta hege-monia das ciências passa pela produção de conhe-cimento. O ponto de vista sui generis de Gada-mer, bem como sua reinterpretação de alguns dosconceitos históricos da filosofia, apresentados na

11

12 “Não: Não quero nada. / Já disse que não quero nada. / Não me venham com conclusões! / A única conclusão é morrer. /Não me tragam estéticas! / Não me falem em moral! / Tirem-me daqui a metafísica!

13 HEGEL, G.W.F. Fenomenologia do Espírito. Petrópolis: Vozes, 1992, p. 25. Usaremos para esta obra a abreviatura FEM.14 VMII, p. 509.15 Id., p. 509.16 É claro que a reflexão levada a efeito na segunda parte de VM não é a única base da reflexão da terceira parte. O que quere-

mos salientar é que tal reflexão é basilar – e não exclusiva – tendo em vista que muitos conceitos são retomados, para fun-damentação do fio condutor da linguagem.

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segunda parte de VM, merecem minimamente se-rem reconhecidos e desenvolvidos, para a funda-mentação da crítica da epistemologia moderna le-vada a efeito pelo autor. Faz-se fundamental tra-zer esses elementos ao leitor, sob pena de, não ofazendo, excluí-lo do diálogo proposto pelo pre-sente artigo.

1.1 Ciência e método

A hermenêutica é a arte do entendimento. Parece espe-cialmente difícil entender-se sobre os problemas da her-menêutica, pelo menos enquanto conceitos não clarosde ciência, de crítica e de reflexão dominarem a discus-são. E isso porque vivemos numa era em que a ciênciaexerce um domínio cada vez maior sobre a natureza erege a administração da convivência humana, e esse or-gulho de nossa civilização, que corrige incansavelmenteas faltas de êxito e produz constantemente novas tarefasde investigação científica, onde se fundamentam nova-mente o progresso, o planejamento e a remoção de da-nos, desenvolve o poder de uma verdadeira cegueira.No enrijecimento desse caminho rumo a uma configu-ração progressiva do mundo pela ciência, perpetua-seum sistema no qual a consciência prática do indivíduose submete resignada e cegamente ou então se rebela re-voltosa, e isso significa não menos cega.17

Como superar o enrijecimento desse caminhorumo a uma configuração progressiva do mundopela ciência e libertar a consciência prática do indi-víduo que se submete, resignada e cegamente, aoque vem se anunciando como o fim da história?

O esclarecimento sobre essa cegueira não temnada a ver com aquela crítica cultural românticaque se volta contra a ciência e sua manifestaçãotécnica como tal. Seja que tomemos como objetodo pensamento a “perda da razão” (the eclipse of

reason), o crescente “esquecimento do ser” ou atensão de “verdade e método”, é só uma cons-ciência científica exacerbada até a cegueira quepoderá desconhecer que o debate sobre os verda-deiros fins da sociedade humana, o dar-se contade nossa origem histórica e de nosso futuro, de-pendem de um saber que não é só o da ciência,mas que está encarregado da direção de toda prá-xis18 da vida humana19.

É verdade que a ciência moderna, desde o sé-culo XVII, suscitou um novo mundo, renuncian-do radicalmente ao conhecimento das substânciase limitando-se ao projeto matemático da naturezae ao emprego metodológico da medição e dos ex-perimentos, para assim abrir a via construtivapara o domínio da natureza. Foi isso que impul-sionou a expansão planetária da civilização técni-ca. Só no século XX, porém, foi se acirrando cadavez mais, junto com os crescentes êxitos da tecno-logia, a tensão entre nossa consciência do pro-gresso científico e nossa consciência sociopolítica.Mesmo assim, o conflito entre esses saberes é umproblema muito antigo. Custou a vida a Sócrates,quando pôs em evidência a ignorância do sabertécnico e dos artesãos, com relação ao verdadeirosaber, o bem. Isso se repetiu no portrait socráticoque faz Platão. Platão sustenta a dialética, a artede dialogar, não somente contra o saber limitadoe especializado dos técnicos, mas até contra omais elevado paradigma de toda a ciência, a mate-mática, embora considere esta última como con-dição indispensável para quem quiser dedicar-seàs últimas questões “dialéticas” sobre o verdadei-ro ser e o bem supremo20.

Na verdade, ocorre que o investigador tem di-ficuldades de ver o estreitamento de perspectivas

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17 VMII, p. 292.18 Gadamer nos ensina que, na atualidade, a práxis é definida, em certa medida, por oposição à teoria. Há um certo tom anti-

dogmático na palavra práxis, uma desconfiança ante o mero conhecimento teórico, de quem carece de experiência e, porcerto, uma sempre presente oposição latente que a Antigüidade também conheceu. Entretanto, seu conceito oposto, o deteoria, converteu-se em algo diferente e perdeu alguma coisa de sua dignidade. Neste conceito, já não resta nada daquiloque a theoria significava para quem tinha olhos para ver a estrutura do céu e a ordem do mundo e da sociedade humana. Ateoria se converteu num conceito instrumental, dentro da investigação da verdade e da aquisição de novos conhecimentos.Em Gadamer, teoria possui um sentido positivo.(REC, p. 41.)

19 VMII, p. 292-3.20 Id., p. 293.

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que o pensamento metodológico carrega. “Ele jáestá sempre voltado à justeza metodológica de seuprocedimento, isto é, está afastado da direçãooposta, que supõe a reflexão”21.

Encarar a inexistência de um sujeito em umaposição privilegiada é o que possibilita uma vira-da no significado moderno de método. A palavra“método”, no sentido que lhe foi outorgado porDescartes, pressupõe a convicção de seu caráterúnico como guia da verdade. No Discurso do Mé-todo, e também em outras obras, Descartes insis-tiu no fato de que o método é único e geral paratodos os possíveis objetos de conhecimento, e esteconceito de método terminou por dominar aepistemologia da Idade Moderna. Gadamer colo-ca que sua posição no debate filosófico de nossoséculo tem outro viés, caracterizando-se por reto-mar a bem conhecida oposição entre ciências na-turais e ciências do espírito, “entre a lógica de JohnStuart Mill, de uma parte, e Wilhelm Dilthey, deoutra”22. Porém, acima das diversidades das duasposições, parece que se fundamentam em ummesmo pressuposto, a objetividade do método, eque tudo se reduz a uma diversidade de métodos.“Precisamente isto que me parece desorienta-dor”, diz Gadamer.

Méthodos, no sentido antigo, significa sempre a totali-dade do estudo de um campo de questões e de proble-mas. Neste sentido, o método já não é um instrumentopara objetivar e definir algo, senão que é para participardas coisas de que nos ocupamos. Este significado de“método” pressupõe que nos encontramos já dentro dojogo e não em um ponto de vista neutro23.

Naturalmente, esta afirmação aparece comouma provocação para o ideal da objetividade, tí-pico das ciências naturais. Entretanto, nas ciênciasdo espírito entram em jogo, segundo Gadamer,“valores de outro tipo, mais elevados”. Este hipo-

tético ponto de vista neutro das ciências naturais,diga-se de passagem, seria a eliminação do sujeitodo conhecer e é completamente evidente que ofim último das ciências é o de eliminar todos ospontos de vista subjetivos. Não é possível tal hi-pótese no mundo da vida. Não se confirma navida cultural nem tampouco na vida social.

A filosofia pode ser reduzida ao espírito cientí-fico? A filosofia resignou-se a ser um departamen-to da arqueologia? Gadamer insiste que a exigên-cia de uma unidade sistemática de nosso sabercontinua constituindo o âmbito legítimo da filo-sofia, porém, precisamente, a realização deste tra-balho de ordenação sistemática requerido à filo-sofia tropeça, cada vez mais, com maior desconfi-ança. É como se, atualmente, a humanidade esti-vesse disposta a aceitar sua própria limitação e,apesar da particularidade24 insuperável do saberda ciência, encontrasse satisfação em seu progres-so e no crescente domínio da natureza. Tal alie-nação impõe uma cegueira que esconde o fato deque, com o crescente domínio da natureza, ocrescente domínio do homem sobre o homemnão só não diminui, como também, contra todasas expectativas, é cada vez maior, chegando aameaçar a liberdade. Gadamer diz que “a metafí-sica e a religião parecem haver oferecido melhorespontos de apoio para as tarefas de ordenação dasociedade humana que o poder acumulado pelaciência moderna”25.

1.1.1 O que é ciência?

É verdade que as ciências humanas procuram,permanentemente, apoio na filosofia contempo-rânea, mas não é menos verdade que continuamtendo como base o modelo das ciências da natu-reza quando elaboram seus métodos históri-co-críticos. Por que seria a idéia cartesiana de mé-

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21 Ib., p. 512.22 Ib., p. 292.23 GADAMER, Hans-Georg. El inicio de la filosofía ocidental. Traducido por Ramón Alfonso Díez y Mª del Carmen Blanco.

Barcelona: Paidós, 1995, p. 34.24 Com pretensão de universalidade, conforme discurso da ciência.25 REC, p. 10.

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todo adequada no domínio das ciências huma-nas? Por que não deveria continuar a prevalecer oconceito antigo, grego, de método26?

Explica Gadamer:

Em Aristóteles, por exemplo, a idéia de um métodoúnico, que se possa determinar antes mesmo de investi-gar a coisa, constitui uma perigosa abstração; é o próprioobjeto que deve determinar o método apropriado parainvestigá-lo. Ora, curiosamente, se prestarmos atençãoàs pesquisas levadas a cabo pelas ciências humanas nodecorrer do último século, parece que, no tocante a seusprocedimentos efetivos (refiro-me aos procedimentosque conduzem à evidência e ao conhecimento de novasverdades, e não à reflexão sobre tais procedimentos),impõe-se caracterizá-los pelo conceito aristotélico demétodo e não pelo conceito pseudocartesiano do méto-do histórico-crítico.27

Na verdade, o fundamento sobre o qual se er-gueu a filosofia na Grécia era o irrefreável desejode saber, e não aquilo a que chamamos ciência.

Mesmo quando o primeiro nome da metafísi-ca era “ciência primeira” (prima philosofia), estesaber de deus, do mundo e do homem, que cons-truía o conteúdo da metafísica tradicional, nãopossuía de maneira indiscutível uma prioridadeabsoluta em relação a todos os demais conheci-mentos: ciências matemáticas, teoria dos núme-ros, trigonometria e música.

O que chamamos de ciência não cabia, em suamaior parte, no campo de designação da palavraphilosofia. Diante do uso que a ela davam os gre-gos, a expressão “ciências empíricas” soaria a seusouvidos como algo contraditório. Eles nomea-vam este tipo de conhecimento como história,testemunho. O que nós designamos com o con-ceito usual de ciência foi entendido pelos gregos,sobretudo, como o saber daquilo sobre cuja base épossível fabricar algo: chamavam poietike epistemeou techné. O exemplo mais claro e, ao mesmotempo, o tipo mais importante desta techné, era a

medicina, que não chamamos de ciência, mas dearte de curar, quando queremos honrar sua tarefahumanitária28.

Existem tradições de sabedoria e conheci-mento em outras culturas que não são formula-das na linguagem da ciência e sobre a base daciência, sendo necessária uma tomada de cons-ciência no âmbito social para dissolvermos a co-erção dominadora que prevalece nas ciênciascausais-explicativas.

1.1.2 As ciências do espírito e sua auto-consciência metódica

Verdade e Método apresenta, em sua segundaparte, a discussão da compreensão nas ciências doespírito, anunciando a introdução da obra que ahermenêutica que ali se desenvolveria não seriauma doutrina de métodos da ciência do espírito,“mas a tentativa de um acordo sobre o que são naverdade as ciências do espírito, para além de suaautoconsciência metódica, e o que as vincula aoconjunto da nossa experiência no mundo”29.

Onde está o cerne da mudança de perspectivaque Gadamer propõe? Onde reside a diferençacom a tematização metodológica das ciências doespírito? Ele responde: “Já no conceito de métodoque aparece no título de meu livro [Verdade e Mé-todo] assinalo esta diferença. (...) O que tenhotentado mostrar é que o conceito de métodocomo instância legitimadora das ciências do espíri-to é inadequado”30. As ciências do espírito não sediferenciam das ciências da natureza só por seusmodos de proceder, mas

também por sua relação precedente com as coisas, porsua participação na tradição, que faz com que nos falemsempre renovadamente. Por este motivo, propus-me acompletar o ideal de conhecimento objetivo que domi-na nossos conceitos de saber, ciência e verdade, com ode participação.31

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26 GADAMER, Hans-Georg. O problema da consciência histórica. FRUCHON, Pierre (org.). Traduzido por Paulo CésarDuque Estrada. Fundação Getulio Vargas. Rio de Janeiro: s.n., 1998, p. 21. Para esta obra, utilizaremos a sigla PCH.

27 Id., p. 21-2.28 REC, p. 12-3.29 GADAMER, H.G. Verdade e Método. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 2002. p. 45. Para esta obra, usaremos a sigla VM, p. 34.30 DUTT, op. cit., p. 29.31 Id., p. 29-30.

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A participação nos enunciados essenciais daexperiência humana tal como se tem desenvolvi-do na tradição artística, religiosa e histórica nãosó de nossas culturas senão de todas, é o autênticocritério da riqueza ou da pobreza dos resultadoscientífico-espirituais. Podemos formular de ou-tro modo e dizer: em todas as ciências do espírito seoculta uma filosofia que jamais pode chegar ple-namente ao conceito.

1.1.3 Verdade versus método?

Como verificamos na argumentação do itemanterior, atribui-se a Gadamer um rechaço à me-todologia em geral. Surgiram, inclusive, obje-ções, propondo a interpretação do título de suaobra de maior projeção, como Verdade versusMétodo. Tal interpretação é encarada por Gada-mer como uma percepção unilateral das coisas:“como se não houvesse método algum nas ciên-cias do espírito”32.

Diz Gadamer que existem métodos e que te-mos que aprendê-los e aplicá-los. Devemos salien-tar que isso não deve ser entendido como justifi-cativa do valor do cultivo das ciências do espírito:“não é porque podemos aplicar determinadosmétodos a determinados objetos, que podemosfundamentar por que cultivamos as ciências do es-pírito”33. Cultivamos as ciências da natureza –pelo menos na intenção – para que possamos vi-ver e sobreviver melhor que na natureza. Entre-tanto, as ciências do espírito não têm nada a vercom esse domínio do mundo histórico. “Por seumodo de participar da tradição, as ciências do espí-rito introduzem em nossa vida algo diferente;algo que não é ´saber de domínio’, porém, não

por isso menos importante. A isso chamamos ha-bitualmente ‘cultura’”34. Tal reflexão vai maisalém da autocompreensão metodológica das dis-ciplinas científico-espirituais; ela ocorre sobre seupróprio conteúdo, que relativiza o conceito demétodo, “não que o supera!(...) Os métodos sãosempre bons como instrumentos. Temos, toda-via, que saber onde utilizá-los com proveito. A es-terilidade metodológica é um fenômeno univer-salmente conhecido”35.

Insiste Gadamer, em seu Posfácio referente à3ª edição de VM (1972)36, que foi “certamenteum mal-entendido querer acusar o lema ‘verdadee método’ de estar ignorando o rigor metodológi-co da ciência moderna”.

A reflexão que se levou a cabo em Verdade eMétodo pode ser tudo, menos um simples jogo deconceitos. Em todos os pontos, procede da práxisconcreta das ciências, para as quais a reflexão so-bre o método, isto é, o procedimento controladore a falsificabilidade “é evidente para todos”. Essareflexão hermenêutica não elegeu a ciência comoúnico critério de verdade, mas buscou também oaval da práxis da ciência37. Reitera Gadamer:

Se quisermos caracterizar o lugar de meu trabalho den-tro da filosofia de nosso século, devemos partir direta-mente do fato de que tentei oferecer uma contribuiçãomediadora entre a filosofia e as ciências, e sobretudo de-senvolver de maneira produtiva as questões radicais deMartin Heidegger – às quais agradeço terem proporcio-nado pontos decisivos no tanto que pude compreen-dê-las – dentro do amplo campo da experiência científi-ca. Foi isso que me levou necessariamente a ultrapassaro limitado horizonte de interesses da metodologia dateoria da ciência38.

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32 Ib., p. 30.33 Ib., p. 30.34 Ib., p. 31. Sobre a questão da cultura cito Gadamer: Desde então somos um diálogo e podemos escutar uns aos outros. A con-

versação da humanidade consigo mesma, e o diálogo dos homens com o divino, soam nestes versos de Hölderlin como umdiálogo único. Desde que somos um diálogo, somos uma história da humanidade da qual sabemos cada vez mais, na medi-da em que empreendemos investigações dos recantos da cultura, de culturas prévias, de ruelas antigas da vida humana oude ilhas étnicas, que até agora não têm sido alcançadas pela corrente de transmissão histórica mundial.” (GADAMER,Hans-Georg. Elogia de la Teoría. Traducido por Anna Poca. Ediciones Península. Barcelona: s.n., 1993, p. 10.)

35 DUTT, op. cit., p. 31.36 VMII, p. 508.37 Id., p. 509.38 Ib., p. 509.

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Na nova teoria da ciência – desde ThomasKuhn – se tem falado e questionado a respeito depor que uma aplicação razoável dos resultadoscientíficos naturais à práxis da vida não se conse-gue por métodos científicos naturais. Gadamer,quando questionado sobre a ocultação de uma es-trutura hermenêutica na formação dos camposcientífico-naturais, responde com uma pergunta:“Que é em realidade isso que chamamos o dado,de cujo fundamento seguro parte a investigaçãocientífico-natural? Há algo aí diante de nossosolhos? O que se vê ou o que aparece no microscó-pio como ponto de partida não é o resultado da-quela mediação que chamamos compreensão”39?

1.2 Ciência e conhecimento

A ciência nos permite conhecer? Tem impor-tância, afinal, que a ciência não só não pense – nosentido enfático da palavra, tal como o utilizaHeidegger – como tampouco fale uma lingua-gem própria? Depois dos elementos introdutóriosproporcionados pela discussão sobre ciência emétodo travada até aqui, temos elementos parainiciarmos uma aproximação e um aprofunda-mento em relação ao pensamento de Gadamerquanto ao conhecimento. A pergunta preambu-lar parece que já foi respondida, na medida emque já fora esclarecida minimamente a esquizo-frenia proporcionada pela visão unívoca de méto-do das ciências causais e explicativas, que encer-ram a experiência do conhecimento dentro dos li-mites do “método”. A visão cartesiana consolidaseu ideal teórico-filosófico na sinonímia em que ométodo é equiparado, senão igualado, à verdade.

Parece, então, pertinente verificar que Gada-mer, ab initio, em seu Verdade e Método, passa ajustificar as falhas da filosofia em tomar para si,como ponto de partida, o ideal de método dasciências da natureza. Passando por Hermann

Helmholtz, Droysen e Dilthey – embora salienteos esforços do último em manter a independênciateorético-cognoscitiva das ciências do espírito –Gadamer é enfático em dizer que “o que se deno-mina método na ciência moderna é algo único e omesmo por toda a parte e só especialmente nasciências da natureza cunha-se como modelar”40.

Gadamer afirma que, em nosso século, Hei-degger, seguindo a linha de Dilthey, deu o passodecisivo, limitando o âmbito de validez do con-ceito científico de método, explicitando que, emtoda compreensão, há um terceiro momento deautocompreensão. Não só o compreender e o in-terpretar, mas também o aplicar, como veremosadiante, o compreender a si mesmo, formam par-te do proceder hermenêutico.

Dilthey proporcionou ao jovem Heidegger“estímulos essenciais para a transformação e de-senvolvimento ulterior da fenomenologia husser-liana”41. Afirma Gadamer que, “somente quandoHeidegger desenvolveu em Ser e Tempo a herme-nêutica da facticidade, da existência humana fáti-ca, constatável, interveio a escola diltheyana, gra-ças a Georg Misch, no desenvolvimento da her-menêutica”42.

Gadamer diz que a importância da hermenêu-tica em Heidegger está no fato de que este “foi oprimeiro a abrir nossos olhos para o fato de quenesse assunto estamos às voltas com o conceito deser”43. O objetivo final de Heidegger não era, emabsoluto, desenvolver uma teoria das ciências doespírito ou uma crítica da razão histórica, como sepropôs Dilthey.

Gadamer assume a tarefa de contribuir paradesenvolver esta inovação filosófica de Heideggerpara a compreensão nas ciências do espírito. A Ga-damer importava não confiar a lingüisticidadehumana somente à subjetividade da consciência ea capacidade lingüística que nela reside, como foi,todavia, o caso no idealismo alemão e em Hum-boldt. Nas palavras de Gadamer: “o que fiz foi co-

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39 DUTT, op. cit., p. 32-3.40 VM, p. 45.41 DUTT, op. cit., p. 26.42 Id., p. 26.43 Ib., p. 26.

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locar o diálogo no centro da hermenêutica”44.O giro hermenêutico, que se fundamenta nalingüisticidade do homem, inclui também anós, nesse “uns e outros”; nisso se funda a obri-gação humana de aprender. “O que importanão é somente escutar coisas uns dos outros, se-não escutar uns aos outros. Unicamente isso é‘compreender’”45.

1.2.1 Do conceito de preconceito comoelemento da reflexão do científico

O Iluminismo, diz Gadamer, declarou guerraa todo preconceito e, mediante isso, conseguiuuma espécie de liberação, uma emancipação doespírito. Engana-se, porém, aquele que, com basenisso, conclui que pode fazer-se transparente a simesmo ou soberano em seu pensar e atuar.

Sob qualquer outro ponto de vista, acentuaGadamer, “nenhum de nós conhece realmente asdeterminações que nos levaram a ser quem so-mos. Nossas determinações abrem e delimitamnosso horizonte”46. Tal assertiva não exime o ci-entífico do espírito da obrigação de refletir sobresuas expectativas, ou melhor, da obrigação de te-matizar seus preconceitos. Tal questão – centralpara Gadamer – é rebatida com a afirmação deque, além de encarar a obrigação da tematização,há que se encarar a possibilidade de uma desativa-ção dos preconceitos quando estes não se legiti-mem. “Porém pode ser que os preconceitos se le-gitimem”47.

Falando da inevitabilidade dos preconceitos,Gadamer acaba, por conseqüência, reabilitandosuas fontes: a) a irrenunciabilidade da autoridade;b) e a tradição. Estes são conceitos carregados demal-entendidos.

O que, sob a idéia de uma autoconstrução absoluta darazão, se apresenta como um preconceito limitador, éparte integrante na verdade, da própria realidade histó-

rica. Se se quer fazer justiça ao modo de ser finito e his-tórico do homem, é necessário levar a cabo uma drásticareabilitação do conceito do preconceito e reconhecerque existem preconceitos legítimos. Com isso a questãocentral de uma hermenêutica verdadeiramente históri-ca, a questão epistemológica fundamental, pode ser for-mulada: em que pode basear-se a legitimidade de pre-conceitos? Em que se diferenciam os preconceitos legí-timos de todos os inumeráveis preconceitos cuja supe-ração representa a inquestionável tarefa de toda razãocrítica48?

Gadamer observa também que “a idéia de quea autoridade e a tradição são algo a que podemosnos limitar é um puro mal-entendido. Quemapela à autoridade e à tradição não tem autorida-de nenhuma”49. O mesmo ocorre com os precon-ceitos. Quem se refere aos preconceitos é alguémcom quem não se pode falar. Quem não está dis-posto a questionar seus preconceitos, é alguémcom quem tampouco se pode falar.

A expressão que põe as coisas no seu lugar, dizGadamer, vem de Heidegger: primazia dos pre-conceitos (Vorurteilsüberlegenheit). De uma pri-mazia assim forma parte a capacidade de dar razãoao argumento do outro ou, quando não se sabebastante e se presume no outro um saber maior, ade reconhecer a ele como autoridade. Nisso se ba-seia toda a aprendizagem. Entretanto, o que não sepode aprender é o critério pessoal que se requer,tanto para atuar como para aspirar a saber.

Aquele que se crê seguro na sua falta de preconceitos,porque se apóia na objetividade de seu procedimento enega seu próprio condicionamento histórico, experi-menta o poder dos preconceitos que o dominam incon-troladamente como uma vis a tergo. Aquele que nãoquer conscientizar-se dos preconceitos que o dominamacaba considerando erroneamente o que vem a se mos-trar sob eles50.

Sobre a presente citação, Carsten Dutt esclare-ce que seu verdadeiro destinatário é a consciência

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44 Ib., p. 27.45 Ib., p. 28.46 Ib., p. 34.47 Ib., p. 34.48 VM, p. 416.49 DUTT, op. cit., p. 3550 VM, p. 532.

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histórica, a consciência de fundo das modernasciências do espírito. “Na consciência histórica con-vivem a clarividência com respeito à historicidadede seus objetivos com a cegueira no que diz res-peito à sua própria inclusão na história”51. E Ga-damer continua: “Sim, assim é o objetivismo his-tórico, a ingenuidade da fé no método, em quecai aquele que crê, poder prescindir de si mesmona compreensão”52.

É fundamental assinalar ainda a questão dadistância como elemento que torna possível re-solver a verdadeira questão crítica da hermenêuti-ca, ou seja, distinguir os verdadeiros preconcei-tos, sob os quais compreendemos, dos falsos pre-conceitos, que produzem os mal-entendidos. “Adistância é o fio condutor que liga horizontes dis-tintos e, pelo processo dialógico, torna possível afusão entre eles”53.

Gadamer destaca a necessidade de uma autocrí-tica reflexiva da consciência histórica, dizendo que

uma consciência formada hermeneuticamente terá deincluir também a consciência histórica. Tornará cons-cientes os próprios preconceitos, que a guiam na com-preensão, com o fim de que a tradição se destaque, porsua vez, como opinião diferente, dando-lhe assim o seudireito. É claro que destacar um preconceito implicasuspender sua validez, pois na medida em que um pre-conceito nos determina, não o conhecemos nem o pen-samos como um juízo. Como poderia então ser destaca-do? Conseguir pôr um preconceito diante dos olhos éimpossível enquanto este estiver constante e desaperce-bidademente em obra, porém somente quando, por as-sim dizer, ele é atraído por estímulo. Esse estímulo pro-cede precisamente do encontro com a tradição, pois oque incita à compreensão deve ter-se feito valer já, de al-gum modo, em sua própria alteridade. Já vimos que acompreensão começa aí onde algo nos interpela. Esta éa condição hermenêutica suprema54.

Está feita a exigência de suspensão dos própriospreconceitos. Entretanto, a suspensão de todo ojuízo e de todo o preconceito, vista logicamente,

tem a estrutura de pergunta. O que isso quer di-zer? A essência da pergunta é a de abrir e manterabertas as possibilidades. Quando um preconcei-to se torna questionável – diante do que nos dizoutra pessoa ou um texto – isso não quer dizer,conseqüentemente, que ele seja simplesmente dei-xado de lado e que o outro ou o diferente venhasubstituí-lo imediatamente em sua validez. Essaé, antes, a ingenuidade do objetivismo histórico,a admissão de que nós podemos nos omitir noprocesso do conhecimento. Na verdade, o pre-conceito próprio só entra realmente em jogo namedida em que já está metido nele. Somente namedida em que se exerce, pode experimentar apretensão de verdade do outro e oferecer-lhe apossibilidade de que este se exercite por sua vez55.

1.2.2 A história efeitual e o conhecimentocientífico

Em VM, Gadamer afirma que o interesse his-tórico não se orienta somente pelos fenômenoshistóricos ou pelas obras transmitidas, mas temcomo temática secundária o seu efeito na história.Isso é considerado geralmente como um merocomplemento do questionamento histórico. Ahistória efeitual não representa algo de novo. Oque há de novo é a exigência de precisar, semprede novo, de um tal questionamento da históriaefeitual, quando uma obra ou uma tradição tiverde sair da obscuridade constituída de tradição ede historiografia para o claro e o aberto de seu realsignificado – exigência feita não à investigação,mas à sua consciência metódica. “Essa exigênciadá-se obrigatoriamente com base na reflexão afundo da consciência histórica”56.

A consciência histórica tem que aprender a com-preender melhor a si mesma e a reconhecer que osesforços hermenêuticos sempre estão co-determina-dos por um fator histórico efeitual. “Estamos den-

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51 DUTT, op. cit., p. 36.52 Id., p. 37. Sobre a ingenuidade do historicismo ver VM, p. 448.53 ALMEIDA, Custódio Luís Silva. Hermenêutica e dialética: dos estudos platônicos ao encontro com Hegel. Porto Alegre:

EDIPUCRS, 2002, p. 175.54 VM, p. 447.55 Id., p. 448.56 Ib., p. 449.

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tro de tradições, conhecendo-as ou não, sejamosconscientes delas ou sejamos tão pretensiosos paracrer que começamos sem pressupostos: isso nãomuda nada com respeito à efetividade das tradiçõessobre nós e sobre nossa compreensão”57. Conscien-tes ou não desta realidade, estamos submetidos aesta situação, não suspendendo a negação do real osefeitos do mundo sobre nós.

Entendemos como essenciais os questionamen-tos de Gadamer à consciência histórica, asseverandoa necessidade que esta tem de “conscientizar-se deque, na suposta imediatez com que se orienta para aobra ou para a tradição, está sempre em jogo esseoutro questionamento, ainda que de uma maneiradespercebida e, por conseqüência, incontrolada”58.

Gadamer deixa bem claro em VM, que em suaabordagem a consciência histórica é mais ser queconsciência59. Sempre já nos encontramos emuma situação histórico-efeitual determinada. Opróprio conceito de situação implica que, emtoda reflexão, alguém não pode relacionar-se comela de fora. Todo esforço investigador autênticoexige elaborar uma consciência da situação her-menêutica. Só assim podemos ilustrar isso quefundamenta nosso interesse e responde aos nossosquestionamentos. De qualquer jeito, há que se re-conhecer que esta tarefa é infinita. Não se podealcançar uma clareza total sobre os próprios inte-resses e perguntas. Em qualquer caso, contudo,temos que nos desviar da ingenuidade objetivistae destruir o fantasma de uma verdade desligadada posição de quem compreende60. “O mérito daconsciência histórica que sabe da dimensão outrado passado é não encobrir a tensão entre passadoe presente com assimilações precipitadas”61.

1.2.3 Considerações sobre a aplicação

A escolha do método ou a escolha da melhorforma de aplicá-lo é algo diferente do compreen-der? Ou já estamos compreendendo quando faze-mos nossas escolhas metodológicas? Esta questãonão trata de uma aplicação ulterior de algo jácompreendido em si, a outra coisa distinta, senãoque a própria aplicação é a autêntica compreen-são do assunto para aquele que intenta compre-ender. Em toda compreensão, produz-se umaaplicação, de modo que aquele que compreende,está ele mesmo dentro do sentido do compreen-dido. Ele forma parte da mesma coisa que com-preende62. A interpretação não é um ato posteriore oportunamente complementar à compreensão,porém compreender é sempre interpretar, e, porconseguinte, a interpretação é a forma explícitada compreensão63.

É interessante verificar que Carsten Dutt estápreso ao ponto de vista da consciência históricano seu viés metódico tradicional quando questio-na Gadamer com a seguinte pergunta: “Comoisso ocorre com as ciências do espírito, na ciêncialiterária ou na ciência histórica? A práxis herme-nêutica dessas disciplinas não persegue por regrageral objetivos de aplicação”64? Gadamer esclare-ce-nos que a práxis hermenêutica não é dirigidaem cada caso por um objetivo de aplicação, poisesta é um elemento implícito em toda a compre-ensão e não está em absoluto em conflito com asautênticas obrigações da cientificidade.

Compreender não é compreender melhor, nem sabermais, no sentido objetivo, em virtude de conceitos maisclaros, nem no da superioridade básica que o conscientepossui com respeito ao inconsciente da produção. Bastariadizer que, quando se logra compreender, compreende-se deum modo diferente.65

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57 DUTT, op. cit., p. 37-8.58 VM, p. 449.59 Parece aqui uma referência a Nietzsche, no sentido de evitar um congelamento da dinamicidade hermenêutica.60 DUTT, op. cit., p. 39.61 Id., p. 40.62 Ib., p. 41.63 VM, p. 459.64 DUTT, op. cit., p. 41.65 VM, p. 444.

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Tal dinamicidade da compreensão está ex-pressa também quando Gadamer caracteriza oprocesso compreensivo como fusão de horizon-tes. Onde se fundem os horizontes surge algo queantes não havia. Os horizontes não são fixos, se-não móveis, estão em movimento porque nossospreconceitos se põem à prova constantemente.Isso sucede também em todo encontro com atradição66.

1.2.4 A fusão de horizontes e a crítica dométodo científico

Compreender uma tradição requer, sem dúvi-da, um horizonte histórico, assinala Gadamer.Mas o que não é verdade é que se ganhe esse hori-zonte deslocando-nos para uma situação históri-ca. Pelo contrário, precisamos ter sempre um ho-rizonte para podermos nos deslocar a uma situa-ção qualquer. Então, o que significa deslocar-se?Evidentemente que não será algo tão simplescomo “apartar o olhar de si mesmo”. Evidente-mente que também isso é necessário na medidaem que se procura dirigir a vista realmente a umasituação diferente67. Esse deslocar-se, diz Gada-mer, “não é nem empatia de uma individualidadena outra, nem submissão do outro sob os própriospadrões, mas significa sempre uma ascensão auma universalidade superior, que rebaixa tanto aparticularidade própria como a do outro”68.

O conceito de horizonte expressa essa visão su-perior mais ampla, que aquele que compreendedeve ter. Ganhar um horizonte quer dizer sempreaprender a ver mais além do próximo e do muitopróximo, não para apartá-lo da vista, senão queprecisamente para vê-lo melhor, integrando-o emum todo maior e em padrões mais corretos.

Deve ser uma tarefa constante impedir umaassimilação precipitada do passado com as pró-prias expectativas de sentido. Só se chega a ouvir atradição tal como ela pode fazer-se ouvir em seusentido próprio e diferente. “Um intérprete com

experiência histórica distingue o horizonte da tra-dição do horizonte-tempo pessoal, porém suacompreensão inclui de fato a mediação de ambosos horizontes. O desenho desse horizonte históri-co, distinto do horizonte do presente, se superana compreensão, de modo que esta significa aaquisição de um novo horizonte histórico”69.

Gadamer compara a forma de levar a cabo afusão de horizontes com a forma de levar-se acabo o diálogo. Da mesma forma que dois inter-locutores tentam colocar-se em acordo sobre umtema, também entre o filólogo e seu texto, entre ohistoriador e sua investigação, se produz uma co-municação, um “diálogo hermenêutico”.

Diz que está plenamente justificado falar de um diálogohermenêutico. Segue-se daí, que o diálogo hermenêuti-co tem de elaborar uma linguagem comum, em condi-ção de igualdade com o diálogo real, e que esta elabora-ção de uma linguagem comum tampouco consistirá napreparação de um instrumento com vistas ao acordo,mas que, tal como no diálogo, coincide com a realizaçãomesma do compreender e do chegar a um acordo. Entreas partes desse “diálogo” tem lugar uma comunicação,como se dá entre duas pessoas, e que é mais que meraadaptação. O texto traz um tema à fala, mas quem oconsegue é, em última análise, o desempenho do intér-prete. Nisso os dois tomam parte70.

Tem causado estranheza a descrição feita porGadamer tendo como ponto de partida esse diá-logo. Paira a acusação de que esse diálogo tenhasido colocado ao lado da tradição, o que aparececomo algo conseqüente no marco da história efe-tiva. Todavia, tem-se interpretado como uma es-tilização que fornece à tradição falsos predicadosde ação, elevando-a à posição de sujeito. A respei-to da presente objeção, Gadamer esclarece queum sujeito está sempre ante um objeto ou anteum mundo de objetos. Assim, uma das experiên-cias mais essenciais que uma pessoa pode fazer épossibilitar que outro venha conhecê-lo melhor.Isso significa, todavia, que precisamos levar a sé-rio o encontro com o outro, porque sempre pode

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66 DUTT, op. cit., p. 42.67 VM, p. 455.68 Id., p. 456.69 DUTT, op. cit., p. 43.70 VM, p. 565.

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haver algo sobre o que não tínhamos razão e nema temos agora. No encontro com o outro supera-mos a estreiteza de nosso saber corrente das coi-sas. Abre-se um novo horizonte para o desconhe-cido, e isso sucede em todo o diálogo autêntico.Vamos nos aproximando da verdade porque nãonos aferramos a nós mesmos. Por que é tambémum diálogo o encontro com a tradição no que,efetivamente, algo nos fala? É um diálogo por-que o que nos sai ao encontro traça uma pergun-ta a que temos de responder. Algo da tradição –uma obra de arte, um acontecimento que com-preendemos de repente – nos interpela: ocorreconosco, então, como com o interlocutor em umdiálogo71.

Ora, mas é mesmo a tradição que nos interpe-la? Antes de tudo, devemos lembrar que Gadamernos ensina que o modo de ser da tradição não éalgo imediatamente sensível. Ele é linguagem, e oouvir72 que a compreende, na medida em que in-terpreta os textos, envolve sua verdade num com-portamento para com o mundo, comportamentopróprio e lingüístico. Essa comunicação lingüísti-ca entre presente e tradição é o acontecer que emtoda compreensão abre seu caminho73.

Quando Gadamer fala de um diálogo herme-nêutico com a tradição, “não é simplesmente ummodo de falar metafórico”74, e sim a descrição dacompreensão da tradição, compreensão que se rea-liza no meio da linguagem. A linguagem não éum suplemento da compreensão. Compreensão einterpretação estão entrelaçadas mutuamente naforma de linguagem. A interpretação lingüísticaleva a compreensão a identificar-se expressamen-te, é a concreção de sentido que se compreende

no encontro com a tradição. A tese de que issoocorre sempre em uma determinada situação his-tórico-efetiva, de que a tradição coloca perguntase constata respostas, não quer dizer, em absoluto,que a tradição seja um hipersujeito. O diálogocom a tradição é um diálogo autêntico no qualparticipa ativamente o aludido por sua palavra.Nessa medida, a interpretação da tradição não énunca uma mera repetição lingüística, mas sem-pre algo assim como uma nova criação da com-preensão que advém a sua determinação na pala-vra interpretativa75.

Algo essencialmente novo aqui se evidencia: opapel positivo da determinação pela tradição, queo conhecimento histórico e a epistemologia dasciências humanas compartilham com a naturezafundamental da existência humana. É verdadeque os preconceitos que nos dominam freqüente-mente comprometem o nosso verdadeiro reco-nhecimento do passado histórico. Mas sem umacompreensão prévia de si, que é nesse sentido umpreconceito, e sem uma disposição para uma au-tocrítica, que é igualmente fundada na nossa au-tocompreensão, a compreensão histórica não se-ria possível, nem teria sentido. Por meio dos ou-tros é que adquirimos um verdadeiro conheci-mento de nós mesmos. O que implica que o co-nhecimento histórico não conduz necessaria-mente à dissolução da tradição na qual vivemos;ele pode também enriquecer essa tradição, confir-má-la ou modificá-la, enfim, contribuir para adescoberta de nossa própria identidade. A histo-riografia das diferentes nações constitui uma am-pla prova disso76.

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71 DUTT, op. cit., p. 44.72 É interessante o desenvolvimento de Gadamer das peculiaridades dialéticas contidas no ouvir: “Não se trata somente de

que aquele que ouve é de algum modo interpelado. Antes nisso está o fato de que quem é interpelado tem de ouvir, queiraou não. Não pode apartar seus ouvidos, tal como se aparte a vista de outra coisa, olhando numa determinada direção. Essadiferença entre ver e ouvir é para nós importante, porque ao fenômeno hermenêutico subjaz uma verdadeira primazia doouvir, como Aristóteles já reconhece. (VM, p. 670)

73 VM., p. 671.74 DUTT, op. cit., p. 47.75 Id., p. 47-8.76 PCH, p. 12-3.

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1.2.5 A tradição e o conceito de experiên-cia em Gadamer

Para a compreensão de um texto temos queperguntar pelo seu scopus, por sua intenção fun-damental, por seu ponto de vista central. A capta-ção do scopus constitui a base para o infinito laborda compreensão. Exemplifica Carsten Dutt:

Se eu tivesse que dar conta da segunda parte de Verda-de e Método, diria que sua intenção fundamental é dedescrever as ciências do espírito não tanto como com-ponentes do sistema funcional autônomo da ciência,mas, sobretudo, como componentes de um mundo deexperiência que funde o mundo de especialistas e dosleigos77.

Em Gadamer, o conceito de experiência, sa-lienta Dutt, é a conclusão fundamental de suaanálise da consciência histórico-efetiva. A expli-cação que oferece dela é diferente de outras expli-cações filosóficas do conceito de experiência.Arnold Gehlen, por exemplo, fala do caráter sele-tivo, gestor, criador de disponibilidade e sistemá-tico da experiência. Essa série de característicascai por completo sob o estigma do conceito de ex-periência das chamadas ciências empíricas, eGehlen o remete também expressamente à exem-plar “resistência à crise” das ciências naturais, aoque corresponde admitir só experiências plena-mente determinadas e excluir desde o princípiooutras experiências.

Em sua réplica, no diálogo com Carsten Dutt,Gadamer primeiramente salienta que o conceitode experiência ao final atribuído a “ele”, não é oconceito “dele”: “este não é o meu conceito de ex-periência, mas é realmente assim como se vive aexperiência no mundo da vida”78. O con-tra-exemplo de Gehlen caracteriza o assunto cor-retamente, a experiência produz uma pessoa ex-perimentada. Isso não significa que uma pessoaseja algo de uma vez por todas e se cristalize nesse

saber, senão que está aberta para novas experiências.Quem tem experiência não é dogmático, “o ho-mem experimentado é sempre o mais radicalmen-te não dogmático, pois precisamente por ter feitotantas experiências e aprendido graças a tanta ex-periência, está particularmente capacitado paravoltar a fazer experiências e delas aprender”79.

O conceito de experiência é seguramente pou-co conhecido em toda a nossa filosofia, precisa-mente porque esta eleva a paradigma o experi-mento das chamadas ciências experimentais.Estas só aceitam uma experiência da qual adve-nham respostas metodicamente garantidas. Ga-damer, contudo, salienta:

assim não é nossa vida em sua totalidade. Não vivemosblindados às crises mediante programas, senão que te-mos que fazer sem mais nossas experiências. (...) E, defato, se as ciências do espírito têm uma especial impor-tância se deve a esse não-isolamento [não-acabar] da ex-periência. Diferente das ciências da natureza, não ob-tém resultados garantidos.80

Nas ciências do espírito, aprendemos continua-mente coisas novas da tradição. Para isso, porém,se necessita de uma disposição à experiência, aosaber, à abertura a esse desejo de verdade que vemao nosso encontro na tradição. Assim, consegui-mos algo distinto das meras ordenações históri-cas. E isso significa que saímos de aporias em queestávamos presos.

Parece-nos ainda pertinente destacar comoGadamer se recusa a estabelecer uma tese funcio-nal que atribua às ciências do espírito uma metadeterminada de prestações dentro do pressupostode experiência vigente. “As ciências do espírito, se-gundo Ritter, compensariam o movimento real(...) em que se vai eliminando o velho patrimôniohistórico e preservariam como o histórico o dis-tanciado da realidade presente”81. Para Gadamer,tal restrição não é apropriada ao conceito de ciên-cia e ao conceito de sentido histórico que atua

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77 DUTT, op. cit., p. 49.78 Id., p. 49.79 VM, p. 525.80 DUTT, op. cit., p. 50.81 Die Aufgabe der Geisteswissenschaften in der modernen Gesellschaft, en idem, Subjektivität, Francofort del Meno, 1974,

p. 105-40, 132.

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nela. O sentido histórico em que o século XIXfundou as ciências do espírito não é a última pala-vra, e sim representa unicamente uma caracteri-zação prévia do atual mundo humano de expe-riência e de sua relação com a tradição. EmboraGadamer não tenha acompanhado em detalhesos trabalhos da escola de Ritter, questiona:

Como saber de antemão a que clarividências, a quecompreensão e autcompreensão nos conduz a experiên-cia da tradição: da tradição do mundo, e não só da Eu-ropa? Também nas ciências do espírito ocorre na reali-dade isto: que admitimos a tradição do mundo não sóna sua outreidade, mas também em suas reivindicações.Em suma, pelo fato de que tem todavia algo a nos dizer.Para isso necessita abertura, como acabo de dizer. (...), aposição teórico-compensatória não faz justiça à vida

real em suas relações com a tradição. A experiência vivada tradição é um processo hermenêutico sem fim e maisalém sempre de toda fórmula funcional sociopolítica82.

Gadamer tampouco define as ciências do espí-rito como ciências exclusivamente narrativas,pois a seu ver, não o são. “Nas ciências do espíritose narra; traslada-se continuamente a conceitos ese abrem novos horizontes conceituais. Certa-mente, também se avaliam estatísticas, se estabe-lecem exemplos e interpretam textos83”. Isso, po-rém, é para compreendermos melhor. Em resu-mo, o essencial sempre é isto, ensina Gadamer: “ométodo não define a verdade. Não a esgota. Épreciso levar a sério o porquê do título de meu li-vro Verdade e Método”84.

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82 DUTT, op. cit., p. 52-3.83 Id., p. 54.84 Ib., p. 54.

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Conclusão

O objetivo deste artigo foi apresentar, no de-senvolvimento das perspectivas do diálogo emGadamer, a oposição ao espírito instrumentalpresente na discussão sobre a Questão do Método,fundamentalmente no que concerne à sua críticaà esquizofrenia metodológica das ciências.

No caminho percorrido, verificamos em nossareflexão que o pensamento gadameriano traz devolta à consciência filosófico-científica uma tra-dição que valoriza, enfatizando-os, os processosde instauração de sentido. Isso não ocorre só pelalinguagem, mas também pelo diálogo vivo e pelainterpretação, compreendendo-os como cami-nhos, por excelência, à autocompreensão do serhumano. A dialética de Platão, a retórica aristoté-lica ou a experiência vivida, tal como a Fenomeno-logia do Espírito de Hegel a expõe, representam osexemplos paradigmáticos da oposição ao espíritoinstrumental que predomina nas modernas ciên-cias causal-explicativas. A estas, como vimos nopercurso deste artigo, a hermenêutica filosóficadesafia, aliando-se a uma tradição que se abre aoestranho, ao que está à frente em sua alteridadeprópria. Este é o cerne da proposta temática de-senvolvida neste trabalho.

Concluímos, no decorrer destes estudos, queali onde surge a compreensão, surge uma espéciede caminho, ou experiência do compreender, quepor si já justifica o diálogo como uma experiênciapositiva, que em seu bojo pode ser posta com arealização de um agir virtuoso, em que a solida-riedade, o respeito à alteridade e a camaradagempodem florescer. Tal construção teórica ofereceuuma base para entendimento do significado dodiálogo na filosofia hermenêutica de Gadamer,que nos ensina:

Como aí se pode alcançar o compreender e ao final até oconsenso no plano prático ou também no diálogo pes-soal ou teórico, pode bem ser um símbolo do fato que,também onde parece faltar a linguagem, pode alcançaro entendimento mediante a paciência, a sensibilidade, asimpatia e a tolerância, e mediante a confiança incondi-cional na razão de que todos nós partilhamos.85

Enfim, Gadamer trabalha na perspectiva dadimensão especulativa do lógos. Afirma que quemfala uma linguagem, mas que não entende nadamais além dela, não fala. Falar significa falar a al-guém. A linguagem não é algo relacionado comsujeitos isolados. A linguagem é um nós no qualnos relacionamos e no qual o indivíduo não temfronteiras pré-fixadas. “E isto quer dizer que to-dos nós temos de sobrepujar nossos limites paracompreender. Isso ocorre no intercâmbio vivo dodiálogo. Todas as comunidades de vida são co-munidades de linguagem, e a linguagem existe sóno diálogo”86.

Verificamos, nos ensaios de Gadamer sobre acompreensão no diálogo, indícios de um acolhi-mento positivo da “opinião comum” como umaopinião basicamente fidedigna: “que um abordao outro”, “que os interlocutores tentam fazer va-ler neles mesmos o estranho e antagonista” que ossepara, “que dizem algo a alguém” e essa expe-riência faz que já “não siga sendo o que era”.

Gadamer não tenta criar uma nova consciên-cia do diálogo e uma nova consciência da com-preensão nele, mas explicitar a idéia já existentedo que é um diálogo. Ele incorpora a seu discursoo que em nossos discursos cotidianos dizemos so-bre a compreensão e o diálogo. Ilustra a questãouma réplica de Gadamer à Carta sobre o humanis-mo: “Me segue parecendo verdade que a lingua-gem não é só a casa do ser, mas também a casa do

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85 HF, p. 140.86 DUTT, op. cit., p. 55.

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homem, em que nela vive, se encontra com ou-tros, se encontra no outro”87.

Fortaleceu-se, ao longo de nosso trabalho,nossa convicção da importância da compreensãoda proposta do diálogo gadameriano, quanto àsua fundamental conotação ética. O diálogo nãoé um fim em si mesmo. Dialogamos porque que-remos, porque precisamos, porque somos diálo-go. E dialogamos também porque queremoscompreender. Compreender significa que eu pos-so pensar e ponderar o que o outro pensa. Ele po-deria ter razão com o que diz e com o que pro-priamente quer dizer. Compreender não é domi-nar o que está à nossa frente, o outro e, em geral, omundo objetivo. Muito mais do que isso, é im-portante que o alcance da dominação seja limita-do por meio de outras forças da comunidade, da

família, da camaradagem, na solidariedade, de talmodo que as pessoas se compreendam e enten-dam. “Compreender é sempre, em primeiro lu-gar, ‘Ah! agora compreendi o que tu queres!’.Com isso eu não disse ainda que tu também tensrazão ou a terás”88!

O horizonte ético do diálogo se faz presenteno seu modo-de-ser, que é inclusivo, que pressu-põe o outro. O diálogo propõe o rompimentocom a reificação do saber ético. O saber não é nos-sa propriedade nem tampouco uma coisa de quedispomos e que podemos ou não usar ao nossobel-prazer. O saber na hermenêutica não é um sa-ber de domínio, não é instrumental. Afinal o queé hermenêutica? Gadamer nos responde: “isto éhermenêutica: o saber do quanto fica, sempre denão-dito quando se diz algo89”.

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87 GADAMER apud DUTT, op. cit., p. 58.88 Id., p. 23.89 As conclusões deste estudo impulsionaram as pesquisas que hoje desenvolvemos no doutorado em Educação da Universi-

dade Federal do Rio Grande do Sul no projeto intitulado Possibilidades do Diálogo Hermenêutico para a Educação: Prima-zia da Pergunta e Filosofia Prática. Sentimo-nos estimulados nesse sentido a mostrar a contribuição de Gadamer para o res-gate desse diálogo. “O que perfaz um verdadeiro diálogo não é termos experimentado algo de novo, mas termos encontra-do no outro algo que ainda não havíamos encontrado em nossa própria experiência de mundo”. (GADAMER)

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Cadernos IHU divulga pesquisas, produzidas por professores/pesquisadores, poralunos de pós-graduação e trabalhos de conclusão de alunos de graduação, nas áreasde concentração ética, trabalho e teologia pública. A periodicidade é bimensal.

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Sérgio Ricardo Silva Gacki nasceu em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, em 1966. Doutorando emEducação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Mestre em Filosofia e bacharel emCiências Jurídicas e Sociais pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS. Professor de Filo-sofia da Educação do Complexo de Ensino Superior de Cachoeirinha – Faculdade INEDI. Como pes-quisador, está vinculado à UFRGS na linha de pesquisa Ética, Alteridade e Linguagem na Educação. Ini-ciou em 1999 seus debates e problematizações sobre hermenêutica filosófica, no âmbito das ciências ju-rídicas, mas logo ampliou a discussão para outras áreas do conhecimento. Em 2001, na UNISINOS, noSeminário Linguagem, Fenomenologia e Hermenêutica, recebeu aportes preciosos que permitiram suaaproximação e seu aprofundamento das pesquisas em Hans-Georg Gadamer. Desse momento em dian-te, o diálogo passou a ser o tema que o absorveu e o motivou. Ingressou no Mestrado em Filosofia daUNISINOS em 2002. Em 2003, iniciou um proveitoso diálogo com educadores, que o levou a amadure-cer o projeto de pesquisa que ora desenvolve no Doutorado em Educação da UFRGS. O que a herme-nêutica tem a nos dizer sobre isso? Gadamer nos responde: “Isto é hermenêutica: o saber do quanto fica,sempre de não-dito quando se diz algo”.

Algumas publicações do autorPossibilidades do Diálogo Hermenêutico para a Educação: primazia da pergunta e filosofia prática In: Epistemologia, Ética e Hermenêutica.Passo Fundo: UPF, 2005.

O Ser Docente nos Tempos do Conhecimento/Mercadoria – Uma Visão Hermenêutica. In: COLÓQUIO INTERNACIONAL DACÁTEDRA DA UNESCO, 2 – ENCONTRO DE ESTUDOS SOBRE O MUNDO DO TRABALHO – POLÍTICAS PÚBLICAS E TRABALHO, 5,2005, São Leopoldo. Caderno de Resumo do Evento. São Leopoldo: Unisinos, 2005.

Diálogo na Educação – Uma proposta para o compreender imbricado com o fenômeno da liberdade In: CONGRESSO INTERNACIONALDE EDUCAÇÃO, 3, 2003, São Leopoldo. Revista Educação Unisinos. São Leopoldo: Unisinos, v.7, 2003.

O fim do trabalho? In: COLÓQUIO INTERNACIONAL TRABALHO E SOCIEDADE, 1 - ENCONTRO DE ESTUDOS SOBRE O MUNDODO TRABALHO, 4, 2003, São Leopoldo. Caderno de Resumo do Evento. São Leopoldo: Unisinos, 2003.

Dialética, Realidade e Movimento In: CONGRESSO DIALÉTICA, CAOS E COMPLEXIDADE, 2003, São Leopoldo. Publicação Digital, 2003.