Perspectivas de professores sobre o ensino experimental das ciências no 1º Ciclo
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8/12/2019 Perspectivas de professores sobre o ensino experimental das cincias no 1 Ciclo
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XIII Encontro Nacional de Educao em Cincias Actas
Perspectivas de professores sobre o ensino experimental das cincias no1 Ciclo
Marisa Correia 1, Ana Freire 2 1Escola Superior de Educao de Santarm;
2Centro de Investigao em Educao da Faculdade de Cincias da Universidade de Lisboa, Lisboa,[email protected] , [email protected]
Resumo
Nos ltimos anos, resultados de investigaes nacionais e internacionais tm apontado quea Educao em Cincias desde os primeiros anos de escolaridade um factorimprescindvel para a melhoria da formao cientfica dos alunos e para o desenvolvimentode competncias necessrias ao exerccio de uma cidadania responsvel. Atendendo a esta
preocupao crescente, o Ministrio da Educao ps em aco um Programa de Formaode professores do 1 Ciclo do Ensino Bsico Ensino Experimental das Cincias, com o
objectivo de promover o ensino experimental das Cincias neste nvel de escolaridade.Considerou-se, deste modo, pertinente conhecer as perspectivas de professores acerca dasfinalidades do ensino experimental das cincias. Utilizou-se uma metodologia deorientao interpretativa. Participaram no estudo dez professoras pertencentes a escolas daregio de Santarm que frequentavam o primeiro ano do programa de formao. Aentrevista constituiu o instrumento de recolha de dados, procedendo-se sua transcrio. Aanlise dos discursos dos professores evidencia diferentes perspectivas acerca do ensinoexperimental das cincias. Os resultados sugerem que os professores valorizam maisfinalidades do ensino experimental centradas no aluno, sobretudo a transversalidade decompetncias e o desenvolvimento de competncias do domnio cognitivo, em detrimentodas competncias do domnio atitudinal e procedimental. As finalidades relacionadas coma construo da Cincia, a preparao dos alunos para a cidadania e a construo deconhecimentos cientficos teis e funcionais em diferentes contextos do quotidiano esto
praticamente ausentes no discurso das participantes.
Palavras-Ch ave: Perspectivas de professores, finalidades do ensino experimental das
cincias no 1 Ciclo.
Introduo
Sendo uma preocupao emergente o baixo nvel de literacia cientfica constatado na
populao em geral, surge a necessidade de atribuir a merecida importncia Educao emCincias logo nos primeiros anos de escolaridade. Tendo em conta que as crianas so
naturalmente curiosas e criativas, estas caractersticas podero ser potencialmente
desenvolvidas pelos professores do 1 ciclo atravs da abordagem das cincias, pois como
destaca S (2002) a educao cientfica precoce promove a capacidade de pensar (p.30).
Tambm Valadares (2006) destaca que os alunos devero desde muito cedo realizar
actividades prticas, manipulando materiais e realizando jogos educativos (Valadares,
2006, p.4) dado que este tipo de estratgias conduz ao desenvolvimento da curiosidade e daexperimentao, assim como de uma conscincia reflexiva resultante da procura de
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solues relativas a questes prticas em que o aluno reflecte acerca dos procedimentos
efectuados por si e pelos seus pares.
O ensino experimental das cincias segundo Matta, Bettencourt, Lino e Paiva (2004), alm
de ser motivador, desenvolver as capacidades manipulativas e de raciocnio e permitir ummelhor conhecimento do mundo que nos rodeia, permite desenvolver competncias noutras
reas curriculares. De facto, promove a leitura aquando da pesquisa, estimula o desenho e a
escrita aquando da realizao de registos e desenvolve o pensamento lgico-matemtico
quando se estabelecem relaes de causa-efeito, condicionais e outras, e se efectuam
classificaes, seriaes, medies e clculos. Estes autores salientam, que igualmente
importante que o ensino da cincia surja contextualizado numa base scio-afectiva,
constituindo, assim, um contributo para o desenvolvimento de atitudes, valores ecomportamentos sociais, ou seja, para promover uma boa educao cvica. Como se trata,
essencialmente, de uma actividade que envolve trabalho em grupo as crianas
desenvolvero atitudes como respeitar a vez, respeitar a opinio dos outros, exprimir a sua
opinio e cooperar com o grupo.
O ensino das Cincias de base experimental um dos factores que melhor potencia uma
educao cientfico-tecnolgica para todos, desde os primeiros anos de escolaridade, pois
permite veicular alguma compreenso, ainda que simplificada, de contedos, do processo eda natureza da Cincia, bem como de uma atitude cientfica perante dos problemas
(DGIDC, 2006). Para que tal acontea deve-se:
(i) fomentar a curiosidade das crianas por actividades em Cincia; (ii)
contribuir para a construo de uma imagem reflectida acerca da Cincia;
(iii) promover capacidades de pensamento (criativo, crtico, metacognitivo)
teis e transferveis para outros contextos; (iv) permitir a construo de
conhecimento cientfico com significado social (DGIDC, 2006, p. 1).
Diversos autores (ex. Afonso, 2002; Butts, 1993, 1994; Harlen, 1989; Johnston, 2004;
Jurd, 2004; Leach, 1999; Metz, 2003; Paixo & Cachapuz 1999; Russell & Harlen, 1990;
S & Carvalho, 1997; S & Valente, 1998) tm apontado que o ensino experimental das
cincias a Educao em Cincias desde os primeiros anos de escolaridade um factor
imprescindvel para a melhoria da formao cientfica dos alunos e para o desenvolvimento
de competncias necessrias ao exerccio de uma cidadania responsvel, no entanto, para
que tal se possa tornar uma realidade fundamental um profundo e extenso trabalho de
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formao de professores, de modo a sensibiliz-los para a importncia e para as
potencialidades desse ensino e para que compreendam a forma de poderem articular a
cincia com as outras actividades curriculares.
Atendendo a esta preocupao crescente, o Ministrio da Educao ps em aco umPrograma de Formao de professores do 1 Ciclo do Ensino Bsico, Ensino
Experimental das Cincias, com o objectivo de promover o ensino experimental das
Cincias neste nvel de escolaridade. Considerou-se, deste modo, pertinente conhecer que
perspectivas manifestam os professores sobre o ensino experimental das cincias no 1
Ciclo.
Metodologia
Neste estudo optou-se por uma metodologia qualitativa de natureza descritiva e
interpretativa. Atendendo ao facto das perspectivas dos professores no serem
directamente observveis, recorreu-se a [] uma metodologia de investigao que
enfatiza a descrio, a induo, a teoria fundamentada e o estudo das percepes pessoais
(p.11) como defendem Bogdan e Biklen (1994). Seguidamente descrevem-se as
participantes, o processo de recolha de dados e de anlise dos dados.
Participaram no estudo dez professoras de diversas escolas do Concelho de Santarm, que
frequentavam o primeiro ano do programa de formao Ensino Experimental das
Cincias. Procurou-se envolver professoras com experincias profissionais e pessoais
diferenciadas, de modo a enriquecer a investigao com diferentes perspectivas sobre o
ensino experimental das cincias. As professoras foram designadas por letras maisculas
para garantir o seu anonimato.
No presente estudo utilizada a entrevista como mtodo de recolha de dados, que
recomendada por Merriam (1988), Yin (1989), Patton (1990) e Bogdan e Biklen (1994), para a implementao de um estudo de natureza qualitativa. A entrevista utilizada como
referem Bogdan e Biklen (1994), para recolher dados descritivos na linguagem do prprio
sujeito, permitindo ao investigador desenvolver intuitivamente uma ideia sobre a maneira
como os sujeitos interpretam aspectos do mundo. Neste estudo foram usadas entrevistas
semiestruturadas, uma vez que a conduo da entrevista seguindo um guio de perguntas
d ao investigador alguma segurana, evitando a omisso de aspectos fundamentais. Tendo
como ponto de partida um conjunto de questes seleccionadas para obter respostas ao
problema em estudo, estas no sero propostas de uma forma rgida, permitindo ao
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investigador fazer adaptaes no decorrer da conversa. As entrevistas foram registadas em
gravador udio e transcritas pela investigadora. Estas entrevistas realizaram-se no incio do
programa de formao e tiveram como objectivo identificar as perspectivas dos professores
acerca das finalidades do ensino experimental das cincias.
A anlise dos dados segue, em traos gerais, o modelo de Miles e Huberman (1994), que
consiste em trs passos fases: a reduo de dados, a sua apresentao e a
interpretao/verificao das concluses. Foi construdo um quadro de categorias de
anlise de acordo com o expresso na formao (Martins et al., 2006), onde as finalidades
do ensino experimental das cincias surgem organizadas em torno de trs eixos - Aluno,
Cincia e Sociedade. As subcategorias emergiram da anlise das transcries atravs de
questionamento constante.Quadro 1. Definio das categorias e subcategorias de anlise.
Categorias Subcategorias Definio
Transversalidade decompetncias
Promover o desenvolvimento de competnciastransversais como a Matemtica e a LnguaPortuguesa enquanto Cincia na Cincia
Domnio Cognitivo Ajudar a compreenso de conceitos Promover o raciocnio
Domnio Atitudinal
Estabelecer relaes/comunicao com os outros Desenvolver atitudes crticas no trabalho de
equipa Motivar os alunosAluno
Domnio Procedimental
Proporcionar o contacto directo com osfenmenos
Desenvolver competncias procedimentais Manipular instrumentos de medida Desenvolver a capacidade de resoluo de
problemas prticos
Cincia Construo da cincia
Fomentar a compreenso de maneiras de pensarcientficas e quadros explicativos da Cincia quetiveram (e tm um grande impacte no ambientematerial e na cultura em geral.
Preparao para acidadania
Contribuir para a formao democrtica de todos,que lhes permita a compreenso da Cincia, daTecnologia e da sua natureza, bem como das suasinter-relaes com a sociedade e queresponsabilize cada indivduo pela sua prpriaconstruo pessoal ao longo da vida.
Sociedade
Conhecimento cientficotil em diferentescontextos do quotidiano
Promover a construo de conhecimentoscientficos e tecnolgicos que resultem teis efuncionais em diferentes contextos do quotidiano.
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Resultados
Os resultados foram organizados de acordo com as categorias de anlise: Aluno, Cincia e
Sociedade. A categoria Aluno inclui as subcategorias transversalidade de competncias,
domnio cognitivo, domnio atitudinal e domnio procedimental. Em relao subcategoriatransversalidade de competncias, os dados evidenciam que todas as professoras
consideram que o ensino experimental das cincias permite o desenvolvimento de
competncias transversais como a Matemtica e a Lngua Portuguesa . Uma professora destaca
que o relatrio da experiencia tem a ver com a Lngua portuguesa e as pesagens com a
Matemtica (Entrevista Professora C, Novembro de 2007).
Relativamente s trs subcategorias, domnio conceptual, atitudinal e procedimental, a
primeira a mais destacada pelas participantes. Todas as professoras encaram o ensinoexperimental das cincias fundamentalmente como um meio de levar os alunos a
compreender um contedo (Entrevista Professora A, Novembro de 2007), ou seja a
partir da experiencia, do mexer, do ver, do observar e depois para a teoria (Entrevista
Professora H, Novembro de 2007), mas de uma forma mais leve ou mais agradvel de
aprender (Entrevista Professora A, Novembro de 2007). A maioria das professoras
considera tambm que o ensino experimental das cincias promove o raciocnio,
nomeadamente ao afirmarem que os alunos desenvolvem o pensamento crtico(Entrevista Professora E, Novembro de 2007), quando tiram as suas prprias
concluses, e comparam aquilo que eles pensavam antes e depois de ver a realidade das
experiencias que realizaram (Entrevista Professora J, Novembro de 2007).
O domnio atitudinal o menos destacado pelas participantes, no entanto a generalidade
das professoras refere-se motivao com uma das principais finalidades do ensino
experimental das cincias. Quanto s relaes e comunicao com os outros, somente as
professoras C, F e I se referiram importncia de saber ouvir e respeitar as opinies doscolegas. A professora C foi ainda, a nica a salientar o desenvolvimento de atitudes crticas
no trabalho de equipa.
No que concerne subcategoria domnio procedimental, verificou-se que proporcionar o
contacto directo com os fenmenos surge como a finalidade neste domnio mais enaltecida
pelas participantes, seguida do desenvolvimento de competncias procedimentais.
Contudo, em relao a esta ltima finalidade duas das professoras, a A e E, demonstraram
valorizar apenas a simples observao dos alunos sem o envolvimento dos mesmos na
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realizao das actividades, como denuncia o discurso da professora A, quando afirma a
competncia experimental no porque sou eu que fao (Entrevista, Novembro de 2007).
Apenas a professora C refere a manipulao de instrumentos de medida, mas nenhuma
menciona o desenvolvimento da capacidade de resoluo de problemas prticos.
Na categoria Cincia, constatou-se que apenas uma das professoras se refere a aspectos da
construo do conhecimento cientfico, quando refere a necessidade dos alunos terem um
conhecimento sobre a Cincia que os obrigue a pensar e a ter mais cultura (Entrevista
Professora E, Novembro de 2007).
A ltima categoria de anlise subdivide-se na preparao para a cidadania e no
conhecimento cientfico til em diferentes contextos do quotidiano. Relativamente ao
primeiro aspecto apenas uma das professoras enaltece que o ensino experimental dascincias contribui para que os alunos tirem dvidas, essencialmente, que aprendam a ter
opinies fundamentadas sobre as coisas. Que no falem s por falar que tenham uma base
experimental, verdadeira para poder falar sobre as coisas que viveram e as dvidas que
tm (Entrevista Professora F, Novembro de 2007). Algumas professoras referem-se ao
desenvolvimento de conhecimentos cientficos teis em diferentes contextos do quotidiano,
mas de uma forma implcita. A professora A quando afirma que habitualmente os alunos
costumam realizar as actividades abordadas na escola em casa e na sequncia dissocostuma fazer comparaes entre as duas situaes. A professora E ao destacar que as
competncias desenvolvidas pelos alunos quando realizam actividades experimentais
para a vida e que estas sero mobilizadas em diferentes situaes da vida corrente, do
dia-a-dia (Entrevista Professora E, Novembro de 2007). E as professoras B, D, F e G ao
enaltecerem que o ensino experimental das cincias proporciona aos alunos oportunidades
de esclarecerem muitas dvidas que tm acerca dos fenmenos do quotidiano.
Em sntese, as finalidades do ensino experimental das cincias relacionadas com a Cinciae a Sociedade so as menos referidas pelas participantes, sendo que apenas a professora E
menciona alguns aspectos de ambas. Nas finalidades respeitantes ao Aluno, algumas so
destacadas por todas as professoras, so elas a transversalidade de competncias, a
compreenso de conceitos, a motivao dos alunos e o proporcionar contacto directo com
os fenmenos. O domnio cognitivo mais relevante para as professoras e apenas a
professora A no refere a promoo do raciocnio. Relativamente ao domnio atitudinal,
menos valorizado, s a professora C demonstra valorizar as relaes e comunicao comos outros, e o desenvolvimento de atitudes crticas no trabalho de equipa. No domnio
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procedimental, novamente se destaca a professora C, que menciona a importncia da
manipulao de instrumentos de medida, um aspecto que assim como o desenvolvimento
da capacidade de resoluo de problemas prticos so negligenciados pelas professoras.
Concluses e Discusso
No discurso das professoras esto presentes algumas das finalidades do ensino
experimental das cincias preconizadas nas orientaes curriculares, sobretudo o
desenvolvimento de competncias transversais como a Matemtica e a Lngua Portuguesa
e o desenvolvimento de competncias nos diferentes domnios. No entanto, as professoras
referem-se essencialmente a competncias do domnio cognitivo, colocando em segundo
plano os domnios atitudinal e procedimental, o que coerente com uma perspectiva de
ensino marcadamente tradicional.
As finalidades do ensino experimental das cincias relacionadas com os aspectos da
construo da Cincia, da construo de uma cidadania responsvel e da construo de
conhecimento cientfico til em contextos diferentes, esto praticamente omissos no
discurso das professoras. A ausncia destas finalidades nos discursos da generalidade das
professoras revela que a sua preocupao, como refere Cachapuz (2000) centra-se somente
na aprendizagem de um corpo de conhecimentos ou de processos de cincia, em vez de
garantir que tais aprendizagens se tornaro teis e utilizveis no dia-a-dia no sentido de
contriburem para o desenvolvimento pessoal e social dos alunos, num contexto de
sociedades tecnologicamente desenvolvidas que se querem abertas e democrticas.
As participantes revelaram no estar ainda sensibilizadas para todas as potencialidades do
ensino experimental das cincias. S (2002) destaca vrios factores que tero conduzido a
esta situao, como no ter sido fornecida aos professores documentao adequada, no
sentido de se minorar a sua tradicional insegurana em relao s Cincias, nem
fornecimento s escolas de materiais bsicos para as actividades de Cincias e nem a
formao e acompanhamento adequado aos professores. Tambm Tenreiro-Vieira (2004)
salienta que necessrio intervir na formao de professores, para que ocorra inovao em
matria de metodologias de ensino e contribuir assim para que, as aulas no sejam apenas
sequncias de factos cientficos e tecnolgicos, mas tambm proponham aplicaes
concretas a problemas da vida normal do cidado comum.
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