Periodização Tática - Morfociclo padrão: pelas entranhas do processo

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Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo 1 Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo Periodização Táctica e as Periodizações Convencionais Quando nos reportamos à Periodização Táctica, um conceito operativo fundamental a ter em conta é o de Morfociclo Padrão. A designação Periodização Táctica justifica-se por se tratar efectivamente de uma periodização, ou seja, da necessidade de se estabelecerem marcos temporais (ainda que não estanques) que vão permitindo a aquisição e o emergir de uma determinada Intencionalidade Colectiva, isto é, de um jogar, ou seja, uma determinada Táctica ao longo da época. Nesta forma de entender o treino e a periodização no futebol, é a um nível mais micro que encontramos a unidade basilar de todo o processo de operacionalização. Trata-se do Morfociclo Padrão, o qual permite com base numa periodização jogo a jogo fazer emergir e dar vida ao jogar a que se aspira. O Morfociclo Padrão, deverá ser entendido como um fractal de um nível mais macro de uma determinada Periodização Táctica, uma vez que sendo uma periodização a mais curto prazo (ciclo entre dois jogos) também ela deverá ter como matriz configuradora a presença constante de uma Intencionalidade Colectiva, um jogar, que se deseja assumir e fazer expressar como identidade para a equipa. As periodizações convencionais, baseiam os seus fundamentos no carácter ondulatório das “cargas” e são norteadas pelo princípio das grandes ondas e pelo desejo e necessidade de se estabelecerem “picos de forma” ao longo da época, seguindo uma lógica de progressão (quantitativa) caracterizada por um desempenho oscilatório. Podendo ser válida para determinadas modalidades, entendo não se ajustar ao futebol, onde a realidade competitiva, sobretudo a TOP, não se compadece com desempenhos tipo montanha russa. No futebol a competição é permanente ao longo da época, por vezes com uma densidade tremenda, nenhum jogo vale mais que o outro, e todas as competições, quando o nível de aspiração é de facto de TOP são de igual importância e todas para vencer. Face ás limitações, aos desfasamentos e total desajuste que as periodizações convencionais apresentam relativamente à realidade imposta pelo futebol, a Periodização Táctica, transgredindo com o que está normalizado, apresenta-se como a única alternativa viável para aqueles que aspiram a estar e a não sucumbirem às exigências de tal nível. A Periodização Táctica rompe metodologicamente com o que se faz, o foco centra-se desde o primeiro dia na Intensidade (de qualidade, ou seja, no desempenho manifesto na vivenciação e aquisição de um jogar) e não no volume (enquanto capacidade condicional). Na Periodização Táctica o Volume só faz sentido se for um volume de qualidade, um Volume de Intensidades, ou melhor ainda um Volume de Intencionalidades (diferentes níveis de determinada Intencionalidade), que deve contudo desde o início do processo assumir uma pesagem relativa, semanalmente ou nos ciclos entre jogos, e próxima daquela que deverá estar presente ao longo de toda a época. Este facto torna a existência e o cumprimento do Morfociclo Padrão uma premissa fundamental. Nesta forma de

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Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

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Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

Periodização Táctica e as Periodizações Convencionais Quando nos reportamos à Periodização Táctica, um conceito operativo fundamental a ter em

conta é o de Morfociclo Padrão. A designação Periodização Táctica justifica-se por se tratar

efectivamente de uma periodização, ou seja, da necessidade de se estabelecerem marcos temporais

(ainda que não estanques) que vão permitindo a aquisição e o emergir de uma determinada

Intencionalidade Colectiva, isto é, de um jogar, ou seja, uma determinada Táctica ao longo da época.

Nesta forma de entender o treino e a periodização no futebol, é a um nível mais micro que

encontramos a unidade basilar de todo o processo de operacionalização. Trata-se do Morfociclo

Padrão, o qual permite com base numa periodização jogo a jogo fazer emergir e dar vida ao jogar a

que se aspira. O Morfociclo Padrão, deverá ser entendido como um fractal de um nível mais macro

de uma determinada Periodização Táctica, uma vez que sendo uma periodização a mais curto prazo

(ciclo entre dois jogos) também ela deverá ter como matriz configuradora a presença constante de

uma Intencionalidade Colectiva, um jogar, que se deseja assumir e fazer expressar como identidade

para a equipa.

As periodizações convencionais, baseiam os seus fundamentos no carácter ondulatório das

“cargas” e são norteadas pelo princípio das grandes ondas e pelo desejo e necessidade de se

estabelecerem “picos de forma” ao longo da época, seguindo uma lógica de progressão

(quantitativa) caracterizada por um desempenho oscilatório. Podendo ser válida para determinadas

modalidades, entendo não se ajustar ao futebol, onde a realidade competitiva, sobretudo a TOP, não

se compadece com desempenhos tipo montanha russa. No futebol a competição é permanente ao

longo da época, por vezes com uma densidade tremenda, nenhum jogo vale mais que o outro, e

todas as competições, quando o nível de aspiração é de facto de TOP são de igual importância e

todas para vencer. Face ás limitações, aos desfasamentos e total desajuste que as periodizações

convencionais apresentam relativamente à realidade imposta pelo futebol, a Periodização Táctica,

transgredindo com o que está normalizado, apresenta-se como a única alternativa viável para

aqueles que aspiram a estar e a não sucumbirem às exigências de tal nível.

A Periodização Táctica rompe metodologicamente com o que se faz, o foco centra-se desde o

primeiro dia na Intensidade (de qualidade, ou seja, no desempenho manifesto na vivenciação e

aquisição de um jogar) e não no volume (enquanto capacidade condicional). Na Periodização Táctica

o Volume só faz sentido se for um volume de qualidade, um Volume de Intensidades, ou melhor

ainda um Volume de Intencionalidades (diferentes níveis de determinada Intencionalidade), que deve

contudo desde o início do processo assumir uma pesagem relativa, semanalmente ou nos ciclos

entre jogos, e próxima daquela que deverá estar presente ao longo de toda a época. Este facto torna

a existência e o cumprimento do Morfociclo Padrão uma premissa fundamental. Nesta forma de

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entender o treino procura-se não os ditos “picos de forma”, mas antes níveis de desempenho

elevados, ou seja, patamares de rendibilidade que permitam que a equipa mantenha um nível de

funcionalidade, de adaptabilidade e de interacção eficaz e eficiente, isto é, sem que hipoteque a

manifestação da matriz que a identifica como equipa, fazendo-o com sucesso. Deseja-se deste

modo, que uma determinada Intencionalidade que se quer regular, estabilize, e não que oscile ao

longo da época.

A Importância do Morfociclo para a Estabilização sem Cristalização O cumprimento do Princípio da Estabilização só se pode fazer tendo por base a existência, ao

longo de todo o processo de uma determinada matriz (Morfociclo Padrão) que se perpetua ao longo

da época. É essa matriz que permite e que deverá estar subjacente à lógica semanal da vivenciação

de uma outra matriz ou padrão, o jogar da equipa. Uma outra premissa fundamental para que tal se

verifique relaciona-se com a necessidade desse padrão de desempenho semanal vigorar, tal como já

sugeri, desde a primeira semana de treinos. Para que tal suceda é fundamental que o treinador

estabeleça previamente qual o caminho que pretende percorrer, ou seja, qual a concepção de jogo

ou qual a matriz do jogar que pretende operacionalizar no seu processo. O futuro assume-se aqui

como elemento causal do processo obrigando por isso o treinador a fazer uma conveniente

Quantificação à Priori. Importa neste ponto fazer uma ressalva importante. Foi salientado em cima, que contrariamente ao

que sucede nas periodizações convencionais, na Periodização Táctica o que se procura é a

manutenção e estabilização dos desempenhos ao longo da época, respeitando desse modo, o

Princípio da Estabilização. Note-se contudo, que esta estabilização carece de um conveniente

entendimento. Não se trata de uma estabilização no sentido da cristalização, mas antes de uma

estabilização dinâmica, com as evoluções e involuções que caracterizam um sistema dinâmico,

como o processo de treino, que interage não somente com os elementos constituintes do seu

sistema (jogadores, treinadores, funcionários e dirigentes do clube…), mas também com um

contexto bem mais abrangente, e que implica da parte dos treinadores a necessidade de reconhecer

que o Modelo de Jogo é tudo. Depreende-se daqui que não se trata de uma progressão no sentido

das periodizações convencionais, que a entendem como sinónimo de incrementos quantitativos, mas

antes do respeito pelo Princípio da Estabilização de uma matriz ou padrão de jogo, evitando a

tendência para a sua cristalização ou ossificação. Visa-se com este princípio assegurar a

exequibilidade do Princípio da Progressão Complexa. Trata-se de um conceito que rompe e que é

claramente distinto do princípio da progressão convencional (quantitativo), uma vez que se reporta à

necessidade de fazer evoluir paulatinamente um determinado jogar, daí Progressão Complexa. O

que evolui é uma variável qualitativa, uma determinada complexidade, Intencionalidade, um jogar,

um Táctico.

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Em suma, é neste aparente paradoxo, fazer evoluir uma realidade que se quer estável, que o

Morfociclo Padrão assume um papel determinante, visto que permite por um lado a estabilização de

um jogar e por outro a progressão do mesmo, inclusive em diferentes escalas temporais. A

operacionalização de um jogar tendo em conta a padronização semanal da sua vivenciação

possibilita, a manutenção da integridade de uma identidade (um Táctico) sem bloqueio evolutivo, isto

é, sem fecho. Possibilitando desse modo uma evolução espiralada, marcada pelo emergir de várias

dimensões à partida desconhecidas, sem que haja perda de identidade pelo facto desse processo

evoluir alicerçado numa matriz (a conceptual – o jogar, a Intencionalidade Colectiva, o Táctico) que é

sustentada pelos Grandes Princípios de Jogo, e pelo facto desse processo ser operacionalizado

tendo por base uma outra matriz (a metodológica – Periodização Táctica) que é suportada pelos

Princípios Metodológicos e pela sua aplicação no respeito por um Morfociclo Padrão.

Tal como a concepção de jogo, também o Morfociclo Padrão que lhe permitirá dar vida deverá ter

por referência a realidade vigente a TOP. Torna-se pertinente neste ponto salientar que aquilo que

caracteriza o TOP são fundamentalmente 3 aspectos, densidade competitiva elevada e níveis de

aspiração e de exigência igualmente elevados. Outra premissa igualmente importante, e que

relembro neste texto, passa por reconhecer que quando falamos de treino, treino de qualidade,

aquisitivo, o que se pretende é que uma determinada matriz, uma determinada Intencionalidade se

manifeste no concreto pela generalidade dos jogadores, ou seja, deseja-se que a intenção prévia

vá paulatinamente sendo partilhada, graças à sua vivenciação em Especificidade, por um número

cada vez maior de jogadores, de modo a que esta se torne comum à generalidade, e como tal se

constitua como cultura Especifica da equipa. Esta aculturação que se faz pela identificação e

sobretudo pela vivenciação dessa Intencionalidade, apenas se expressa como cultura efectivamente

se houver ressonância empática e sincronismo coordenado manifestos na funcionalidade da equipa,

o que se verifica quando a generalidade dos jogadores pensam em função da mesma coisa ao

mesmo tempo, ou seja, quando se instaura em Especificidade uma eficaz e eficiente relação mente-

hábito. Em suma, quando há congruência (espontânea), harmonia e fluidez manifesta no concreto,

no aqui e agora, entre aquela que é a intenção prévia e a intenção em acto. Para que a aculturação

a um jogar se verifique, isto é, para que haja efectivamente a InCoporAcção de uma

Intencionalidade é necessária a criação de hábitos Específicos desse jogar. Importa contudo

salientar, que defendo que a aquisição destes hábitos que devem caracterizar o processo não se

devem circunscrever exclusivamente à dimensão do jogar propriamente dita. Entendo que é

importante a manifestação e vivenciação regular de uma matriz de jogo, isto é, dos seus Princípios de Jogo e dos seus diferentes níveis de organização, mas não menos importante para mim é, a

necessidade de se criarem hábitos relativos à operacionalização do processo, ou se quisermos, é

importante que se criem regularidades a nível metodológico, daí a necessidade do Morfociclo vigorar

desde a primeira semana da época. A vivenciação de um jogar deverá caracterizar-se pela

habituação não somente a uma forma de jogar (plano conceptual), como também ao processo que

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permite fazer emergir esse jogar (plano metodológico). A evolução do processo faz-se com base em

regularidades, que não sendo cristalizadas nem cristalizadoras permitem levar a efeito o Princípio da

Progressão Complexa, conforme já salientado anteriormente.

Morfociclo Padrão - AlgoquedáRitmo ao Inter Uma vez mais neste texto e em complemento de um anterior, “O Paradoxo da Sabedoria e a

Burrice dos Velhacos”, volto a reflectir sobre o processo de treino e as suas implicações

metodológicas. Tendo por base o referido acima relativamente à necessidade de existirem

regularidades metodológicas a caracterizar o processo de treino, entendo ser fundamental que se

estabeleça, que haja identificação e habituação por parte dos intervenientes do processo a um

padrão de semanal que sendo representativo da Especificidade de determinada equipa, consiga dar

respostas às necessidades inculcadas a TOP. Por esse motivo, sugiro o Morfociclo Padrão como a

única alternativa capaz de o fazer, visto ser aquele que permite a habituação um padrão semanal

que contemplando de forma conveniente a dialéctica EsforçoDesempenho não hipoteca a evolução

qualitativa de um jogar (por respeito permanente pela sua matriz), e que para além disso, possibilita

a habituação desde o início do processo a uma elevada densidade competitiva por vivenciação de

uma lógica de treino e de alternância que mesmo na ausência de tal densidade a contempla como

necessidade.

A vivenciação e consequente habituação por parte dos intervenientes do processo, de modo mais

evidente por parte dos jogadores, a um determinado padrão semanal, Morfociclo Padrão, capaz de

atender aos aspectos referidos acima é determinante para que a equipa se habitue à fadiga relativa

que se verifica nos momentos de elevada densidade competitiva. A existência desta matriz

processual ou metodológica (Morfociclo Padrão), que por sua vez tem subjacente uma determinada

matriz conceptual (concepção de jogo – Especificidade) torna possível que as equipas, mesmo em

períodos da época altamente exigentes e em regime de fadiga relativa continuem a expressar

desempenhos de qualidade sem perda de identidade e funcionalidade fluida. E não menos

importante, sem que se verifique apesar do aumento das exigências um acréscimo de lesões. A

prova do que acabo de dizer é o Inter de José Mourinho e Rui Faria. É a equipa que mais me fascina

neste domínio. Pode haver equipas, e há, com jogares muito mais atractivos e com maiores

complexidades, mas nenhuma ao nível do Inter, isto é, a TOP consegue evidenciar a regularidade da

equipa de José Mourinho. É admirável ver como uma equipa jogando quase toda a época pelos

menos duas vezes por semana, consegue em competição evidenciar um desempenho qualitativo

sempre muito constante e eficaz. Poderia levantar-se a seguinte especulação, será que se o jogar do

Inter fosse mais entusiasta, com maior complexidade e variabilidade a possibilidade da equipa se

apresentar fresca apesar da fadiga relativa se continuaria a verificar? É pertinente a questão. Mas,

quanto a mim continuaria a fazê-lo, pois já vi o Inter jogar com qualidade (mantendo a sua eficiência

e eficácia) após jogos na Champions e noutras provas a eliminar cuja exigência é máxima,

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independentemente do jogar que temos em consideração, visto que há muito em disputa, há

prestigio em jogo, há carga emocional ao limite, há implicações a nível físico impares, há viagens, há

contactos, há alternâncias de resultados… há um sem fim de variáveis que tornam estes jogos

extenuantes a todos os níveis. Por outro lado, sendo José Mourinho o treinador questiono-me até

que ponto a opção conceptual (por um jogar de aparente menor complexidade, com menos graus de

liberdade, mais previsibilidade…) não será deliberada, tendo em vista a existência de um menor

desgaste na manifestação desse jogar e consequentemente a possibilidade de manter mais

facilmente a integridade e Intencionalidade Colectiva mesmo em fadiga relativa. A ser uma opção

deliberada, que não obstante tem também em conta a cultura do país e do clube, não deixam de ser

indícios de Inteligência por parte do treinador português. Prova que conhece não somente a

realidade que envolve o seu clube, mas também a realidade competitiva (que na verdade são

realidades) a que tem de dar resposta, pois como o próprio diz “se não fosse para ganhar, eu não

estaria aqui”.

Estéticas de Jogo (do jogo todo) Advirto aqui para um aspecto que me parece pertinente, embora sejam unânimes as referências

depreciativas ao jogar do Inter, eu não partilho totalmente desta posição. Penso que considerar-se

que o Inter joga mal ou que o Inter tem um jogar fraco é errado. Feio é diferente de fraco. O jogar do

Inter é dentro daquela concepção, na minha opinião, de muita qualidade, vê-se que a equipa

funciona como tal, há um jogar que tem em consideração a Inteireza Inquebrantável do jogo e que

como tal se caracteriza por uma conveniente Articulação de Sentido entre os diferentes Momentos de Jogo e entre os diferentes Princípios de Jogo que compõem esses momentos, e não menos

importante verifica-se congruência entre aquelas que são as potencialidades dos jogadores e o jogar

manifesto pela equipa, e ainda que entre os diferentes níveis de organização que constituem a

equipa existe uma articulação intencionalizada, ou seja, existe no jogar do Inter uma Articulação com

Sentido. O sentido poderá não ser para a generalidade das pessoas, e também em alguns

momentos para mim, o mais atractivo, sobretudo com bola. Contudo, o que penso que se verifica e

que nos leva a ter tais apreciações se relaciona com o facto da nossa apreciação estética dos

jogares se centrar nos momentos em que as equipas se encontram com bola. Para mim sem bola e

na forma como passa do ter para o não ter bola, a equipa do Inter é das que mais me fascina, os

movimentos de ajustamento, de antecipação dos seus jogadores são fantásticos, de grande

complexidade e denunciadores de um nível de Intencionalidade e de Inteligência de Jogo muito

grande. O grande problema é que a noção estética do jogo, não raras vezes se circunscreve à

estética do ataque. Ignoramos a estética da defesa, só vemos meio jogo, ou nem isso, pois não

reconhecemos a natureza inteira do fenómeno.

Claramente se tivermos em consideração o jogo todo, isto é, se a nossa apreciação estética do

jogo tiver em consideração que o jogo é Inteireza Inquebrantável o jogar do Inter é classificado como

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menos estético que o do Barcelona, o expoente máximo da estética de jogo (do jogo todo) e que o

de outras equipas que se encontram igualmente a TOP, mas pelos vistos com menos sucesso.

Inter: Diferenças Estéticas, Mas Fundamentalmente, Não Só… Estará esta diferença relacionada com a abordagem metodológica subjacente ao processo de

treino do Inter? Eu penso que sim, e com este texto procurarei evidenciar alguns dos alicerces

metodológicos (Morfociclo Padrão, Princípios Metodológicos) que permitem fazer a diferença a TOP,

tal como sucede com o Inter.

Curiosamente os dois jogos que colocaram nas meias finais da Liga dos Campeões em confronto o

Inter com o Barça permitiram-me reforçar uma convicção minha, que sendo válida para as diferentes

realidades existentes no futebol é ainda mais notória a TOP, onde a sensibilidade às condições

iniciais se agudizam: ter uma concepção de jogo de qualidade é importante (e embora claramente

diferentes tanto a do Inter como a do Barcelona, ambas o são), mas não menos importante é ter uma

metodologia de treino (Periodização Táctica) que permita que ela se manifeste regularmente. E se

isso foi o que sucedeu com o Inter, foi claramente o que não se verificou no Barça.

Penso que o que esteve subjacente, ainda que não de forma exclusiva (poderíamos falar de

múltiplas variáveis – dimensão estratégica, gestão por parte dos treinadores do aqui e agora em

competição, as consequências anímicas de vencer e de perder … - sem contudo as esgotarmos) à

passagem do Inter e consequente eliminação do Barça são diferenças a nível do entendimento

metodológico do treino. O Barcelona muito provavelmente optou entre os períodos que

intermediaram os jogos (sendo que estes foram intercalados por competição a nível nacional) por

uma abordagem convencional, enquanto que o Inter efectuou uma abordagem que transgride com o

que se faz por norma no treino de futebol. Na equipa de Mourinho houve o reconhecimento da

necessidade de recuperar, fazendo-o de modo a que o processo mantivesse a sua matriz conceptual

(jogar do Inter) e a matriz processual (Morfociclo Padrão), as quais prevalecem desde o início da

época ainda que a última adaptada às circunstâncias de ter jogos com distâncias temporais distintas

e de ter por exemplo de fazer deslocações entre jogos. Tudo isto reforça outra minha convicção, a de

que somente o Morfociclo Padrão preconizado pela Periodização Táctica, e claro está a conveniente

operacionalização do mesmo permite dar respostas efectivas às exigências vigentes a TOP.

Morfociclo Padrão o que o Nutre este Núcleo Duro? A conveniente operacionalização do Morfociclo Padrão, ou seja, aquela que em Especificidade

permite a vivenciação e consequente aquisição de um jogar, verifica-se somente através da

adequada contemplação e incorporação dos Princípios Metodológicos (Alternância Horizontal em Especificidade, Progressão Complexa, Propensões) no Morfociclo Padrão. A

operacionalização do Morfociclo Padrão deverá reger-se pelos Princípios Metodológicos, também

eles regularidades metodológicas, e ter implicada a Especificidade de um jogar, a qual se manifesta

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pelas regularidades que nos conferem identidade, os Princípios de Jogo. Relembro neste texto, que

à semelhança dos Princípios de Jogo, também os Princípios Metodológicos, carecem de uma

ajustada e coerente Articulação de Sentido, pois encontram-se imbricados e implicados de forma

interactiva e interdependente no mesmo processo, motivo pelo qual, per si nada valem. Outra

ressalva importante resulta do facto desta Articulação de Sentido, para efectivamente nos dar

Sentido ter de respeitar o SupraPrincípio da Especificidade. Podendo deste modo referir-se que

cada processo, para ter qualidade deverá ser caracterizado por uma Articulação de Sentido com

Sentido. Um sentido que indica e nos guia pelo caminho que nos leva ao futuro a que aspiramos,

que conduz os intervenientes do processo para um percurso convergente no qual todos pensam em

função de uma determinada Intencionalidade Colectiva em simultâneo.

A existência e operacionalização do Morfociclo Padrão deverá ainda ter subjacente dois

pressupostos. Um passa pela necessidade desta rotina, que é Especifica, se manifestar sem cair na

rotina e sem perda de Especificidade. Reitero, à semelhança do que fiz no texto anterior e para o

qual remeto, que há necessidade de nuanciar a vivenciação de um jogar ao longo do vários

Morfociclos da época mantendo o respeito pelo cumprimento da nossa matriz processual. Este é

também um aspecto fundamental para que a progressão do jogar, daí Progressão Complexa, se

verifique. A rotina não rotineira, sem perda de relação com o essencial a nível conceptual e

metodológico possibilita que o processo à medida que vai passando, não seja mais do mesmo, mas

antes um processo entusiasta de descoberta e de exploração no qual o jogar se vai construindo e

emergindo, e em que apesar dos pilares estarem à partida definidos (Grandes Princípios) o

desenlace do processo vai permanecendo em aberto e a sua configuração (num nível Micro)

desconhecida. Facto que cria nos diversos intervenientes do processo a sensação de atracção pelo

aparentemente desconhecido, a atracção natural que se sente quando se vê algo a crescer e não

menos importante a necessidade de continuar a sustentar esse crescimento qualitativo.

Para que as rotinas, ainda que disfarçadas ou nuanciadas ao longo dos vários Morfociclos não se

tornem fastidiosas é igualmente fundamental reconhecer que a necessidade de competição no

treino. A presença de competição alimenta a motivação dos jogadores, e consequentemente

alimenta a evolução da equipa.

Para a Periodização Táctica a existência de competição (no treino ou formal) é uma premissa

basilar. A competição e o treino são nesta forma de entender o treino de futebol, duas dimensões da

mesma face da moeda. Relembro as palavras de Maurício Pellegrino “se competes o treino tem de

ser competição”. Relembro também, que não se trata de uma competição qualquer, nem todo o tipo

de competição deverá servir ao nosso processo. Trata-se de uma competição em Especificidade, ou

seja, que tem subjacente uma determinada matriz configuradora que é a Intencionalidade da equipa.

Importa também salientar que para a Periodização Táctica, não obstante a necessidade de

Quantificação à priori e de Vivenciação Hierarquizada dos Princípios de Jogo , a unidade base de

planificação se assim lhe quisermos chamar é o Morfociclo Padrão, este é núcleo duro do processo.

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Por esse motivo, é o ciclo entre jogos, a sua configuração, a maior ou menor qualidade (na gestão

do aqui e agora, na planificação prévia, no cumprimento dos Princípios Metodológicos) da sua

operacionalização e o Sentido da Divina Proporção com que esse ciclo é gerido, que determinam a

evolução do processo, por acumulação de Morfociclos ao longo da época. Uma acumulação

qualitativa, daí ter referido tratar-se de um Volume de Qualidade, de um Volume de Intensidades, um

Volume de Intencionalidades.

O reconhecimento do facto de ser o ciclo entre jogos (a sua qualidade) a direccionar o processo,

reforça ainda mais a intima relação existente entre treino e competição. Desde logo, os momentos

formais de competição são os testes cruciais que melhor permitem ao treinador aferir a congruência

ou não daquilo que a equipa manifesta efectivamente e aqueles que são os seus intentos. É em

função dessa avaliação qualitativa do processo, que o treinador vai configurar semana a semana a

operacionalização do seu jogar, nunaciando-o consoante as necessidades circunstanciais, as quais

se detectam tendo por base aquilo que se verificou no jogo anterior e aquelas que se perspectivam

vir a ser o jogo as exigências do jogo seguinte. E claro está, tendo sempre como suporte não

somente o nosso jogar, mas também o padrão semanal adoptado para o fazer emergir. Depreende-

se daqui, que é a competição que determina a configuração dos Morfociclos. Uma configuração que

mantendo a sua matriz, varia a nível da sua essência, isto é, a nível do conteúdo experienciado nas

diferentes sessões de treino, ainda que tal se verifique apenas num plano Micro e sem perda de

referência relativamente ao plano Macro do jogar. Trata-se de uma Redução Sem Empobrecimento, em que a nuanciação ao longo dos vários dias vai conferir à operacionalização

do processo uma maior incidência sobre níveis de organização diferentes do nosso jogar (conforme

salientarei mais adiante). Ainda a este respeito, importa ressalvar, que mesmo no dia em que estão

mais presentes fracções maiores do nosso jogar (Grandes Princípios), se verifica a necessidade de

Reduzir Sem Empobrecer em função das prioridades estabelecidas para aquele Morfociclo e de

modo particular para aquela sessão de treino. Na Periodização Táctica não há lugar às tradicionais

“peladas”. Por isso, mesmo a vivenciação dos Grandes Princípios assume, pela configuração do

exercício e pela intervenção do treinador, uma determinada dominância a qual permite que a

vivenciação do jogar nesse dia se centre predominantemente nos aspectos que o treinador entende

mais relevantes naquele ciclo entre jogos, moldando deste modo aquela unidade de treino com o

intuito de registar maior propensão de ocorrência de interacções relativas a determinadas dimensões

do nosso jogar, sem que contudo se perca as ligações ao todo. Uma fractalidade que sendo maior,

também não leva à fatalidade.

Alternância Horizontal Em Especificidade Alguns, Mas Necessários Esclarecimentos Não menos importante é o facto da competição determinar também a configuração do Morfociclo a

nível da sua alternância ao longo dos dias que compõem o Morfociclo. A distância compreendida

entre dois jogos é determinante para a configuração do padrão semanal e para a selecção do que se

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faz em cada um dos vários dias que compõem determinado ciclo entre jogos. Torna-se neste ponto

pertinente uma abordagem pormenorizada ao Princípio Metodológico da Alternância Horizontal em Especificidade. A necessidade do seu cumprimento resulta da necessidade de se estabelecer a

habituação, conforme já frisei, a um padrão semanal de treino, que contemplando as diferentes

dimensões que compõem o jogar da equipa lhe permitam nos momentos de competição formal

(testes cruciais) dar respostas efectivas, com sucesso, de forma regular e coerentes com aquela que

desejamos ser a nossa identidade enquanto equipa. Trata-se de uma alternância horizontal por se

reportar à necessidade de nuanciação do jogar e de gestão dos binómios EsforçoDesempenho e

EsforçoRecuperação, que se devem verificar ao longo dos vários dias que compõem o Morfociclo. A

existência de uma alternância horizontal, visa evitar que nos diferentes dias que compõem o

Morfociclo se verifique uma amalgama de várias coisas, sem que haja dominâncias nem prioridades

muito evidentes e muito menos padronizadas, o que consequentemente pode conduzir as equipas a

estados de fadiga incapacitantes. Um estado que resulta do modo como é conduzido o processo e

que leva a equipa a estar cansada por um de dois motivos, ou porque treinou demais, ou porque

treinou a menos. Ambos os motivos com causa comum, desajustes no processo de treino.

Procura-se com o cumprimento deste Princípio Metodológico evitar a existência de alternâncias

verticais, isto é, alternância de dominâncias a nível do padrão de esforço e dos propósitos

vivenciados, numa mesma sessão de treino. O que aliás vai contra tudo o que foi até aqui referido, a

necessidade de estabilização de uma determinada matriz coerente com o jogar a que se aspira e

que permita uma gestão de desempenhos ajustada ao longo da semana. Agora que me debruço um

pouco mais sobre este assunto, começo a especular até que ponto a alternância vertical não é mais

um indício da presença da vertigem da pressa no futebol! A amalgama verificada na alternância

vertical, parece querer acelerar o tempo, deseja-se que um dia seja composto por mais que um dia.

Aspira a vivenciar um jogar, algo que se faz em diferentes dias e com critério metodológico,

condensando-o num só dia ou em pouco mais. O Professor Vítor Frade costuma dizer que “a

natureza não aceita processos rapidíssimos”. Contudo no futebol tenta-se cada vez mais cozinhar

jogares em panelas de pressão e recorrendo à lógica Knorr. O jogar como a natureza, não aceita

processos rapidíssimos, quando tal sucede emergem as aberrações.

Esta alternância respeita, à semelhança de todos os Princípios Metodológicos da Periodização

Táctica o SupraPrincípio da Especificidade. Deste modo, por ser relativa a um jogar, por ser

vivenciada ao longo dos diferentes dias que compõem o Morfociclo tendo subjacente uma

determinada Intencionalidade Colectiva, faz sentido o acrescento, em Especificidade. Este facto

motiva que ao longo da vivenciação de um determinado jogar estejam presentes nos diferentes dias,

ainda que com configurações diferenciadas consoante os dias, os padrões (em diferentes escalas)

caracterizadores dessa Intencionalidade Colectiva, desse Táctico. Esta vivenciação para que seja

efectivamente aquisitiva e sem perda de Especificidade deverá obedecer a uma lógica de Redução

Sem Empobrecimento. O que implica reconhecer que as idiossincrasias de um jogar se expressam

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nas múltiplas dimensões que o compõem e que se manifestam de forma interdependente. Por este

motivo, o Morfociclo Padrão tem necessariamente que atender às necessidades e exigências

interactivas que permitem a manifestação regular de um jogar. Para tal importa reconhecer que essa

Redução Sem Empobrecimento tem de atender aos níveis de complexidade do jogar pretendido, isto

é, à dimensão relativa à Organização Colectiva da equipa (Princípios de Jogo) nos seus diferentes

níveis de organização (Individual, Sectorial, Intersectorial e Colectiva) assim como na articulação

entre esses diferentes níveis. E não menos importante, importa reconhecer a necessidade de

Reduzir Sem Empobrecer, e de o fazer distribuindo de forma conveniente, a dimensão física que

suporta e que permite que um determinado jogar se manifeste. Não raras vezes, quando nos

referimos ao Morfociclo Padrão, ignoramos a importância da dimensão física que permite que os

Princípios de Jogo se manifestem de forma efectiva, fluida e harmoniosa sem perda de

entrosamento e de dinâmica colectiva. O respeito por um determinado padrão de esforço e de

desempenho resultante do desgaste (físico e mental) implicado na vivenciação de um jogar ao longo

dos diferentes dias obriga a um conveniente doseamento da complexidade do jogar a vivenciar em

cada dia, mas obriga também, a um conveniente dosear e sequenciar das exigências físicas que

lhes estão subjacentes. Somente deste modo, sobretudo a TOP, se torna possível a manifestação

efectiva de uma Intencionalidade partilhada, mesmo em regimes de fadiga relativa. A contemplação

da dimensão física, não uma qualquer, mas aquela que se reporta a um jogar é fundamental para a

qualidade do processo, uma vez que, somente não hipotecando a manifestação de uma determinada

expressividade ou gestualidade colectiva (com particularidades individuais) se torna possível a

manifestação de uma Intencionalidade. O jogar expressa-se com o Corpo todo, por isso, sendo

importante a aquisição e processamento de uma determinada Intencionalidade, esta de pouco serve

se não for efectivada, isto é, se a resposta motora não for congruente ou não permitir que ela se

manifeste nos timings ajustados. O que só é possível através da conveniente operacionalização do

Morfociclo Padrão.

Aspectos a Ponderar no Cumprimento da Alternância Horizontal em Especificidade Face ao exposto, a fractalização do jogar e a sua vivenciação deverá verificar-se ao nível das

diferentes dimensões que compõem o jogar, inclusive a dimensão estratégica. Esta, à semelhança

das demais deverá estar presente ao longo de todo o padrão semanal, ainda que com pesagens

diferentes nos diferentes dias que compõem o Morfociclo.

A diferenciação dos regimes de desempenho implicados nos diferentes dias faz-se tendo em conta

a fractalização das várias dimensões que compõem o jogar. Como principais referenciais para a

operacionalização do Morfociclo devemos ter em consideração: 1 - nível de complexidade (Grandes

Princípios, SubPrincípios, SubPrincípios dos SubPrincípios) subjacente à porção do jogar que é

vivenciada em determinada unidade de treino (que deve ser entendida como parte de um todo maior,

o Morfociclo); 2 – o regime de contracção muscular implicada dominantemente na vivenciação do

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

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jogar nos diferentes dias que compõem o Morfociclo. O regime de contracção é caracterizado e deve

ter em consideração 3 variáveis, tensão, duração e velocidade. 3 – a dimensão estratégica e a sua

distribuição pelos dias que compõem o ciclo entre dois jogos é outra dimensão a ter em

consideração. Devendo contudo, respeitar as advertências por mim efectuadas no texto anterior

relativamente à necessidade de não confundir, neste domínio, o acessório com o essencial.

Igualmente importante é reconhecer que a lógica subjacente à distribuição dos padrões de

desempenho dominantes nos diferentes dias contempla, o desgaste (físico e emocional) e ainda a

maior continuidade ou descontinuidade da unidade de treino. Dois aspectos que dependem da

configuração que as unidades de treino assumem em cada dia, do que foi feito nos dias anteriores e

do que perspectiva vir a fazer-se nos dias que seguem. Mais adiante será com base nas variáveis

acima referidas (complexidade, regime de contracção, dimensão estratégica, desgaste implicado,

tipo de continuidade) que abordarei os diferentes dias que compõem o Morfociclo Padrão.

Voltando a referir-me à necessidade dos Princípios Metodológicos se manifestarem de forma

interdependente, não deve ser descurado o facto de ao longo da alternância horizontal o Princípio da

Progressão Complexa (que aliás, a longo prazo é nutrido por esta alternância), se fazer cumprir. Já

me pronunciei suficientemente acerca da Progressão Complexa, digamos à la long, aquela que se

verifica ao longo da época. Contudo a Progressão Complexa deverá igualmente registar-se em

escalas temporais mais reduzidas, isto é, semanalmente e em cada unidade de treino. O Princípio Metodológico das Propensões cujo propósito é o de criar contextos de vivenciação ricos, que

permitam que os desempenhos dos jogadores verifiquem uma elevada ocorrência de InterAcções

relativas ao nosso jogar, e de modo particular às nuances que o jogar vai verificando aos longo dos

vários dias do Morfociclo. A Repetição Sistemática (determinante para a aquisição de uma

Intencionalidade Colectiva) das porções de jogar que desejamos vivenciar nos diferentes dias,

assim como os respectivos padrões de desempenho e configurações dos exercícios, verificam-se

pela conveniente contemplação deste Princípio Metodológico. O propósito não passa por quantificar

acções, mas antes o de criar contextos de exercitação que conduzam a uma determinada

dominância de InterAcções relativas ao nosso jogar isto, sem deixar de ter em conta o padrão de

desempenho e de desgaste que caracterizam aquele dia do Morfociclo. É graças à Redução Sem

Empobrecimento que se asseguram as dominâncias desejadas para cada uma das unidades de

treino. Uma redução que sendo qualitativa, uma vez que se reporta à complexidade de um jogar,

também é quantitativa. Trata-se igualmente de uma redução quantitativa, visto que a configuração

dos exercícios de treino e o modo como o jogar é vivenciado (sem perda de Especificidade), requer

que o treinador manipule e articule com parcimónia as seguintes variáveis: espaço, número e tempo.

As quais ainda que quantificáveis, não deverão ser encaradas como universais nem para diferentes

equipas, nem para diferentes jogares. Além disso, também elas deverão atender ao Princípio da

Progressão Complexa. Não tanto ao nível da variável número e tempo (mas ainda assim deverá

verificar-se, sobretudo nos primeiros tempos, e após a equipa estar mais identificada com o

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

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processo), mas sobretudo a nível da manipulação da variável espaço. Com o tempo e com a maior

identificação e efectiva manifestação do jogar, o encurtamento de espaços para os mesmos

propósitos (Progressão Complexa por encurtamento de espaço) constitui-se como um desafio

adicional necessário à evolução e à motivação da equipa e que consequentemente acarreta um

desgaste acrescido, que entendo como natural e como necessário para contrariar a possível

tendência para o jogar cristalizar. A rotina sem cair na rotina também passa pela adopção deste tipo

de estratégias de treino.

Salientados os vários aspectos a ter em consideração na operacionalização do Morfociclo Padrão,

passarei seguidamente a debruçar-me com mais pormenor sobre esta matriz processual, e à

configuração que assume cada um dos dias que a compõem.

Morfociclo – Simbologia das Cores Desde logo, importa explicar o simbolismo subjacente à coloração do Morfociclo Padrão, para que

até daltónicos como eu, o percebam. A coloração verde corresponde à complexidade inerente ao

Jogo (competição). Para um conveniente entendimento do significado do algoritmo subjacente à

simbologia das cores, que na verdade se constitui como «algo que dá ritmo» à construção de um

jogar, deve entender-se que o emergir do verde, resulta do que esta dimensão comporta, o azul e o

amarelo, que devidamente conjugados e nuanciados permitem a expressão qualitativa de um jogar,

verde. “Assim, fracciona-se o «jogar» (todo = verde) em níveis de organização que se constituem

nas partes representadas por: branco + verde claro + azul + verde escuro + amarelo + amarelo claro

= verde.” (M. Silva, 2008, pp. 94/95). Importa ainda salientar que o branco, “cada um pinta como

quiser” (sem entrar em desvarios) e que o amarelo claro resulta da junção do branco com o amarelo,

e se reporta à necessidade de treinar e recuperar, de forma mais recreativa, mas sempre em

Especificidade, daí que não deixe de ser amarelo, ou seja, não deixa de representar um determinado

nível de organização do jogar. Atente-se ainda, que é da correcta calibragem das cores sugeridas,

que resulta a devida operacionalização do Princípio Metodológico da Alternância Horizontal em

Especificidade.

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

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Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

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Tendo como referência um Morfociclo com dois momentos de competição formal agendados para

o domingo pode fazer-se as seguintes referências a cada um dos dias:

Domingo (Verde - Dia de Competição – A que já foi e a que vem) Já foi por mim suficientemente salientado, tanto neste texto como no anterior, a necessidade de

entender o treino e competição como duas realidades indissociáveis pelos diversos motivos

referidos. Foi igualmente por mim sugerido que sendo importante a dinâmica

do treinar esta tem implicada a dinâmica do competir, fazendo-o de acordo

com um determinado jogar. Duas dinâmicas do mesmo processo que se rege

pela Especificidade.

O dia de competição constitui-se como um dia determinante para o

processo. Deve ser encarado como mais um treino, mas não um treino

qualquer. Um treino de grandes exigências, o teste crucial que permite aferir e

avaliar qualitativamente a evolução da equipa. Os momentos de competição

jogam, como já referi, um papel central na estruturação do Morfociclo, visto

que este é estruturado tendo por base a competição anterior (exigências

vivenciadas, necessidade de recuperar, corrigir e reavivar InterAcções

intencionalizadas …) e a competição que se segue (tipo de exigências que se

perspectivam, a nível Macro, vir a verificar-se). Face ao exposto, a competição deve ser um

momento em que o treinador tem de reconhecer a necessidade de lidar permanentemente com dois

imperativos: gerir e preparar.

No que se reporta às exigências propriamente ditas dos momentos de competição, o que se

verifica, por norma, sobretudo a TOP (e este é o referencial da Periodização Táctica) é que o jogo é

um momento de exigência muito grande. Isto devido ao facto do nosso jogar está todo implicado e se

ter que se expressar não somente de forma fluida e harmoniosa, mas também com adaptabilidade

para dar respostas efectivas à imprevisibilidade que o Jogo comporta, e às exigências colocadas

pelos adversários. Tudo isto, num contexto emocional muito intenso e sem que o treinador possa

controlar muitas variáveis (impossibilidade de dosear ou de fraccionar tempos de exercitação, como

poderá ser feito no treino, por exemplo), e muito menos o desenlace que cada jogo vai tendo. Em

competição a extrema sensibilidade às condições iniciais está mais presente, e a TOP então são

agudizadas, o que leva a que imprevisibilidade potencial e a dimensão emotiva (por lidar com algo

com final aberto e por estar prestígio e pontos em disputa) aumentem consideravelmente, e

consequentemente o desgaste subjacente a essa vivenciação.

Ainda relativamente aos dias de competição, e voltando a salientar a necessidade de gerir e

preparar, importa salientar que nesta gestão, neste FenomenoTécnica, que requer muito de ciência

(suporte Metodológico), mas também muito de Intuição (Sentido da Divina Proporção), lidamos

permanentemente com algo que efectivamente conhecemos (desempenho manifesto no momento

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

15

de competição anterior) e com algo (exigências do jogo que se segue) que perspectivando vir a ter

determinada configuração e ir de encontro à nossa matriz de jogo não conseguimos, ao pormenor,

saber concretamente o que vai ser. Pode deste modo dizer-se relativamente ao jogo anterior, com

maior ou menor rigor, que conseguimos decifrar em que tonalidade este foi pintado, se mais escuro

ou mais claro. O mesmo não sucede relativamente ao jogo que se segue. Por isso há quem diga que

“não há dois jogos iguais” ou que os “jogos são como os melões”, só depois de abertos e

saboreados se sabe como são. De facto são frases feitas, que tendo alguma verdade importa

esclarecer e desmistificar. Conforme refere o Professor Vítor Frade “todas as generalizações são

perigosas, inclusive esta(s)”. Não ignoro que os jogos são como os melões, porque o Jogo tem essa

dimensão imprevisível, contudo, sabemos que quando abrimos um melão ele mais ou menos vai se

parecer e vai saber a melão (nível mais Macro), e não a melancia. Mais ainda se, se tratar de um

melão de Almeirim (nível mais Micro), seguramente vai ter uma configuração e essência diferente da

que tem um melão do tipo Casca de Carvalho. Quero com esta analogia salientar que

independentemente da imprevisibilidade ser uma dimensão presente nos momentos de competição,

há aspectos (no caso de um Táctico, são o Princípios de Jogo) identificadores e diferenciadores de

determinadas realidades qualitativas (não híbridas ou indefinidas), como por exemplo um

determinado jogar. Ou seja, nunca sabemos efectivamente como vai ser o sabor do melão, como vai

ser o jogo, antes de ambos serem “desembrulhados”, mas prevemos que potencialmente terão uma

determinada configuração e obedecerão a uma matriz, com articulações e expressividades distintas

nas várias dimensões que os compõem (Grandes Princípios, SubPrincípios, SubPrincípios dos

SubPrincípios). É isto que lhes confere uma essência própria, um cunho identitário e que os

diferencia, e permite distinguir um melão de uma melancia, e mais que isso um melão de Almeirim

de um de Casca de Carvalho, ou seja, é o que permite distinguir o futebol do futsal, e mais que isso

os diferentes futebóis, os diferentes jogares que compõem o Jogo de letra grande.

Em suma, não sabemos com rigor como vai ser pintado o jogo que se segue, contudo esperamos

que seja sempre em tons de verde, do nosso verde, podendo face às circunstâncias vir a manifestar-

se mais carregado ou escuro, ou menos saturado ou mais claro. O processo deverá por isso

necessariamente ter de reconhecer a dialéctica permanente existente entre estas duas dimensões,

motivo pelo qual deverá apresentar uma configuração determinística (Intencionalidade Colectiva, o

verde, o nosso verde), cuja ordem (a dimensão cientificável) é suportada pela manifestação dos

Princípios de Jogo e que nos permite lidar com o inopinado com o imprevisto (dimensão não

cientificável) que o Jogo apresenta. É esta engendração que permite que o emergir de um jogar de

qualidade, que desse modo torna a “previsibilidade calculável dos acontecimentos numa

imprevisibilidade potencial”.

A impossibilidade de em rigor saber quais as exigências efectivas do jogo seguinte, reforça a

necessidade do processo e a configuração do mesmo, no ciclo compreendido entre os dois

momentos de competição, requisitar de forma ainda mais premente que o cumprimento do Princípio

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

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da Alternância Horizontal em Especificidade se faça criteriosa e parcimoniosamente, para que

mesmo em fadiga relativa a equipa esteja fresca e capaz de manter a integridade e fluidez da sua

identidade, da sua Intencionalidade Colectiva. Ou seja, para que não se deixe de expressar em tons

verdes, do nosso verde.

Segunda – Feira (Branco - Dia de Folga – Pinta-o como quiseres) No dia seguinte ao jogo é concedida folga aos jogadores, motivo pelo qual este dia se apresenta

em tons de branco, sendo concedida aos jogadores a responsabilidade de o preencherem ou

colocarem como entenderem. Trata-se do dia em que os jogadores têm

autonomia e liberdade, sem entrar em desvarios, para fazerem o que

pretendem. Compete aos jogadores a responsabilidade de salvaguardar que

essa liberdade, e o uso que dela se faz, não cause estorvo à vivenciação e

manifestação do jogar nos dias seguintes.

O facto de se conceder um dia de folga aos jogadores, no qual eles o

podem colorir do modo que desejarem, leva-nos para a necessidade de

termos em consideração aquilo que é representativo, ou não, num processo

semanal. Motivo pelo qual se entende que independentemente do tipo de

actividade, dentro de determinados limites, realizada pelos jogadores neste

dia, tal tem pouca significância ou impacto naquilo que vai ser dado a

vivenciar pelos jogadores nos dias que seguem ao longo do Morfociclo. Este

dia é abordado pelos jogadores de múltiplas formas, alguns ocupam-nos com rotinas diversas que

podem passar por actividades de lazer e de confraternização com a família, outros preferem cumprir

rituais de prática desportiva, que passam por uma simples corrida, um passeio, ou até mesmo uma

ida à piscina ou ao ginásio, outros optam por actividades de relaxamento, outros ainda deixam que

sejam as suas superstições e crenças a ditar o que fazer neste dia, e outros simplesmente nada

fazem, ou nada têm como regularidade para este dia. Entendo tudo isto, como não muito

preocupante ou significativo ao nível da dinâmica do processo, uma vez que se trata de um dia em

seis, e como tal tais actividades diluem-se no todo que dá significado e sentido ao Morfociclo. Além

disso, e à semelhança do que sugeri no outro texto relativamente às rotinas enraizadas nos

jogadores mais velhos, entendo que também neste domínio o treinador deverá ser sensato, ter bom

senso, ainda que possa sugerir ligeiras e paulatinas alterações, mas não colidir com os hábitos que

cada jogador tem para este dia. Se assim não for, o dia deixa de ser branco, e como tal não se

desligam verdadeiramente da sua actividade profissional, e não é isso que se pretende com o dia de

folga. Folga é folga.

Convencionalmente sugere-se que o dia de folga, por motivos estritamente fisiológicos centrados

exclusivamente na dimensão energética, e como tal não atendendo à inteireza e a toda a

complexidade subjacente à dimensão biológica, seja dois dias após os momentos de competição.

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

17

No entanto, embora de acordo com essa perspectiva faça mais sentido que a folga seja concedida à

terça-feira, no concreto e tendo em consideração uma perspectiva não reducionista e redutora, faz

mais sentido que o dia de folga seja de facto no dia imediatamente após ao dia de competição. Do

ponto de vista mental é facilmente compreensível que treinar no dia após o jogo é, saturante e

desmotivante (Marcadores Somáticos Negativos, desprazer + mal pensar» mau treinar» mau jogar).

Outro motivo que justifica a folga ser na segunda feira e não na terça, resulta do facto de após os

jogos os jogadores, muito fatigados e excitados, terem dificuldades em adormecer. Por este motivo,

e também devido à existência de deslocações relativamente longas e em condições não

absolutamente cómodas, adormecem mais tarde que o habitual e a qualidade do sono não é a

melhor, tendo por isso necessidade de no dia seguinte prolongarem os seus momentos de repouso,

se possível num contexto de maior afectividade e tranquilidade como aquele que deverão encontrar

nas suas próprias casas, e sem a preocupação de terem que sair para treinar. O que a suceder seria

sinónimo de trabalhar.

Terça-Feira (Verde Claro – Recuperar a Treinar, ou seja, a Jogar) A coloração concedida a este dia, o verde claro, advém da presença do verde relativo, ao nosso

jogar e às exigências do jogo

anterior e do que se segue,

conjugado com o branco relativo

à necessidade de recuperar do

desgaste resultante da

competição anterior.

Trata-se de um treino

dominantemente de recuperação

levado a efeito sem perda de

Especificidade, daí a coloração

verde. Esta unidade de treino, e

de encontro ao que referi,

deverá ter não somente o verde

do nosso jogar (Táctico –

Especificidade), mas também o

verde relativo ao momento de

competição que se segue

(dimensão estratégica), o que motiva que desde o primeiro dia sejam abordadas nuances

estratégicas que tendo como suporte o nosso jogar perspectivamos poderem vir a ser importantes no

jogo seguinte. Há ainda que ter em consideração a tonalidade do verde que caracterizou o jogo

anterior, para que a recuperação atenda às particularidades do desempenho expresso (congruências

Descontínuo +

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

18

e incongruências com o que se deseja ser o nosso jogar, e os ajustes a ter em consideração na

operacionalização ao longos dos vários dias) e ao tipo de desgaste implicado (a configuração que a

competição teve a nível físico e emocional, poderá ser importante para o tipo de configuração que

esta unidade de treino terá). Este último aspecto poderá ter implicações diversas no modo como se

planeia a unidade de treino de terça feira. Por exemplo, a necessidade de “afinar porcas e parafusos”

poderá ter uma configuração diferente em função do jogo, independentemente de essa não ser

nosso intenção, ter sido mais transitado do que jogado, ou ter tido uma dominância de contracções

excêntricas maior que o que por norma sucede. Ou pelo contrário, pelo facto da equipa ter podido

gerir com relativa facilidade os ritmos de jogo e inclusive ter sido possível recuperar jogando. Além

disso, a configuração desta sessão de treino deverá igualmente ter em consideração o estado

anímico da equipa, treinar depois de uma derrota é diferente de o fazer depois de uma vitória, assim

como poderá ser diferente o facto do treino de recuperação se fazer num período de grande

densidade competitiva ou se fazer num ciclo de baixa densidade. Estes são aspectos a ponderar e

para os quais o treinador tem de ter sensibilidade, Sentido da Divina Proporção, de modo a perceber

a cada momento até onde pode ir num determinado contexto. Trata-se de uma gestão dinâmica, que

se faz na fronteira do caos, e que como tal tem de admitir a existência de franjas de flexibilidade sem

perda de integridade e funcionalidade para que o processo e o jogar que dele emerge revelem

adaptabilidade. Essas franjas contudo, são balizadas por determinadas directrizes, as quais devem

ser tidas em consideração para que se cumpram os propósitos das diferentes unidades de treino e

consequentemente se torne possível o cumprimento conveniente da Alternância Horizontal em

Especificidade. Seguidamente referir-me-ei as essas directrizes processuais e ao modo como devem

ser contempladas neste dia do Morfociclo.

No que diz respeito à dimensão do jogar contemplada neste dia, isto é, à complexidade que é dada

a vivenciar aos jogadores, ela centra-se em níveis de Organização Colectiva de menor

complexidade, incidindo fundamentalmente sobre SubPrincípios e SubPrincípios dos SubPrincípios,

e através de exercícios de menor complexidade interactiva, ou seja, com carácter Individual,

Sectorial e Intersectorial. O enfoque dado à unidade de treino dependente da Quantificação à Posteriori efectuada pelo treinador, da apreciação que este fez após o jogo anterior (gerir e

aperfeiçoar) e daquilo que espera vir a ser o jogo seguinte (preparar). Sendo isto obviamente válido

para os restantes dias. O facto de se perspectivar o momento de competição seguinte realça a

importância, de atendendo-se à dimensão estratégica, esta ser abordada desde o primeiro dia do

Morfociclo, e não na véspera como habitualmente sucede. A dimensão estratégica é abordada neste

dia, com níveis de complexidade igualmente reduzidos. E não menos importante, só faz sentido se

não subverter o nosso jogar, ou seja, deverá ter sempre como suporte a nossa Intencionalidade

Colectiva. A TOP ter identidade passa por efectivamente ter uma identidade, uma regularidade

identificadora e não pelo facto da nossa identidade ser não ter identidade, isto é, um jogar

camaliónico. A Especificidade é uma necessidade para a regularidade e a expressão regular do

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

19

conjunto de regularidades que queremos que nos identifiquem. A recuperação tem de fazer-se com

mais ou menos Especificidade, em função do que adverti anteriormente, mas sempre em

Especificidade.

Pela proximidade existente relativamente ao jogo anterior, também o desgaste emocional

implicado nesta sessão de treino deverá ser reduzido, de modo a atender também à necessidade de

recuperar mentalmente os jogadores e consequentemente a equipa. Facto que justifica também a

abordagem de menor complexidade ao jogar que se faz neste dia.

Relativamente ao padrão de contracção muscular implicado na unidade de treino deste dia, ele é

caracterizado por tensão, duração e velocidade de contracção baixos.

A configuração dos exercícios deste dia deve caracterizar-se pela envolvência de um reduzido

número de jogadores, em espaços igualmente reduzidos, de modo a fazer cumprir o regime de

contracção pretendido. Com espaços mais pequenos os jogadores não necessitam de

deslocamentos muito acentuados, evitando-se deste modo contracções com maior duração,

velocidade e tensão como tendencialmente acontece em espaços de maiores dimensões.

A dinâmica dos exercícios deverá ser muito próxima da que se observa em competição. Por este

motivo, o desempenho nos exercícios desta sessão deve caracterizar-se por Intensidades elevadas,

semelhantes às da competição. Este é uma aspecto que transgride com o que convencionalmente

se faz e com o modo como tradicionalmente se concebe a recuperação no futebol. Para a

Periodização Táctica, recuperar implica incidir sobre a mesma matriz que se encontra implicada

quando se compete. Somente deste modo se poderá actuar e activar, para consequentemente

recuperar, as mesmas estruturas que estiveram envolvidas na competição. Agora, para que tal se

verifique de forma conveniente importa saber gerir convenientemente a dinâmica necessária entre os

tempos de exercitação e os tempos de recuperação. Neste dia, o dosear e o fraccionar dos tempos

de exercitação e de recuperação são aspectos fundamentais. Nesta unidade de treino, os exercícios

deverão ser realizados em elevada Intensidade, mas deverão ter tempos de exercitação curtos

intercalados com períodos de recuperação substancialmente mais longos, aproveitados para “afinar

porcas e parafusos”, e sobre os quais, dominantemente, o metabolismo aeróbio vai actuar

significativamente, com o intuito de remover os metabolitos produzidos no jogo (entretanto

“armazenados”) e que foram “libertados” pela estimulação requerida, neste dia, nos períodos de

exercitação de elevada Intensidade.

Convencionalmente, a recuperação não é assim entendida porque se parte do pressuposto que as

diferentes vias metabólicas actuam separadamente e de modo concorrente. É um erro, visto que

está mais que demonstrado, que elas ainda que em função do tipo de esforço se manifestem com

diferentes dominâncias, actuam de forma interligada e se influenciam reciprocamente. Só tendo isto

em consideração se percebe que um treino de maior intensidade, isto é, que incide no imediato mais

sobre os metabolismos anaeróbios, pode ter implicações não imediatas mais significativas a nível

aeróbia do que as que se verificam com um treino aeróbio, típico de recuperação. Para aqueles que

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

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permanecem agarrados à norma do treinar, e à obsessão pela dimensão física, sugiro que se

socorram dos aparelhometros que têm, e que deles fazem uso para os seus testes físicos, e

verifiquem como se manifesta o registo do consumo calórico pós treino, após um treino intenso e um

treino de baixa intensidade. Terão seguramente a prova que aquilo que referi em cima bate certo. Lá

está é o problema de ter os meios mas não os saber usar, e o modo como o excesso de informação

nos pode bloquear se não a soubermos filtrar em função do que desejamos.

Quarta-Feira (Azul – o jogar numa prova de obstáculos ou num circuito todo-o-terreno?!) Este dia assume a cor azul, visto

que fazendo-se uma análise

cromatológica (ver imagem ao lado com

cronograma das cores) o verde (uma cor

secundária) resulta da conjugação de

duas cores primárias, o azul com o

amarelo. Assim, subentende-se que o

azul é uma dimensão constituinte do

verde (o nosso jogar). O azul é uma

fracção do verde, é um fractal que

conjugado criteriosamente com as outras

cores que compõem o Morfociclo Padrão

permite o emergir do verde, do nosso

Táctico.

O facto da equipa neste dia poder

ainda não estar totalmente recuperada,

implica e reforça necessidade de se reconhecer a importância de o equacionar convenientemente,

para que seja possível fazer face à necessidade de dar respostas à elevada densidade competitiva

que verifica a TOP.

Parece ser consensual que 3 dias após o jogo a generalidade dos jogadores ainda não se encontra

recuperada. Segundo o Professor Vítor Frade “o jogo de forte intensidade, só quatro dias depois é

que me garante disputar outro. No entanto, é mais fácil não ser quatro, mas ser três se eu logo de

início perspectivar a programação da época a contemplar o hábito de treinar, por exemplo, na

quarta-feira de uma forma mais intensa e Específica.” Esta afirmação reforça a importância do

Morfociclo Padrão se aplicar desde o início da época, de modo a criar na equipa uma adaptabilidade

às essas exigências que se colocam a TOP.

A dominância observada neste treino tem portanto em consideração que neste dia, três dias após

a competição, a generalidade dos jogadores ainda não se encontra completamente recuperada.

Trata-se contudo, do primeiro treino dominantemente aquisitivo do Morfociclo, no entanto, com o

Tensão +++ Duração - - Velocidade +

Descontinuidade ++ Desgaste Emocional +

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

21

intuito de possibilitar uma conveniente alternância horizontal, o jogar vivenciado neste dia

caracteriza-se por níveis de complexidade intermédios, não muito grandes, os quais incidem ao nível

dos SubPrincípios e dos SubPrincípios dos SubPrincípios, ou seja, a aspectos que se reportam às

subdinâmicas que compõem o nosso jogar. A vivenciação desses pressupostos, contempla a

dimensão estratégica e faz-se ainda não numa dimensão Colectiva, mas fundamentalmente a nível

Sectorial e Intersectorial.

O regime de contracção dominante neste dia caracteriza-se por contracções musculares de muita

tensão, de elevada velocidade e de curta duração. Neste dia os exercícios deverão contemplar uma

elevada densidade de acções como saltar, mudar de direcção, acelerar, travar… ou seja, deverá

registar-se uma elevada ocorrência de contracções excêntricas.

Para se fazer cumprir o Princípio Metodológico das Propensões, respeitando o regime requerido

neste dia, deverão ser criados contextos de exercitação com estorvo significativo, com interferência

contextual (porque não recriar o jogo e colocar obstáculos no espaço de exercitação?!), que

impliquem adaptabilidade e reajustes permanente (ao nível do deslocamento, e da InterAcção entre

os jogadores). A configuração dos exercícios, de modo a apresentar uma grande propensão e de

modo a permitir uma elevada densidade deste tipo de acções e InterAcções, deverá apresentar um

reduzido número de jogadores envolvidos em Interacção e em confronto num espaço de exercitação

reduzido, que permita uma intensidade de exercitação muito elevada. Motivo pelo qual os tempos de

exercitação deverão ser também eles reduzidos.

Neste dia o músculo e toda a estrutura locomotora são estimulados em toda a sua dimensão, não

exclusivamente como produtores de força ou efectores do movimento, como convencionalmente são

concebidos. Na Periodização Táctica estas são estruturas Inteligentes e sensíveis, que devemos

marcar com a sentimentalidade e emotividade do nosso jogar. Ás quartas-feiras a proprioceptividade,

a plasticidade e a adaptabilidade destes tecidos são levadas ao extremos, pela necessidade de

permanentes ajustes e reajustes. É uma sessão que tem todo o corpo implicado, como as demais,

mas neste dia forma muito efectiva e intensa. Motivo pelo qual importa dosear muito bem esta

sessão, gerir e intervir condizentemente sobre possíveis desafinações que se verifiquem nas

diferentes estruturas implicadas. Este acentuado desgaste sobretudo a nível da dimensão física

(visto que a dimensão do jogar vivenciada não é muito complexa), e também a necessidade de

continuar a estimular o processo de recuperação decorrente do desgaste implicado no jogo anterior,

assim como a necessidade de assegurar qualidade de desempenhos e permitir fazer cumprir os

regimes de pretendidos para esta unidade de treino, motivam que este treino seja o mais

descontínuo dos que compõem o Morfociclo. Nesta sessão os exercícios realizados devem atender a

uma relação desempenho-recuperação que permita períodos de recuperação significativos e

sucessivos, uma vez que se registam acções e Interacções de “intensidade instantânea significativa”.

Também por isto, por esta necessidade de contemplar no próprio treino a recuperação a extensão do

treino poderá ir para além do habitual, mas nunca com o intuito de “treinar” mais. Pelo contrário, o

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

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objectivo será fraccionar mais os tempos de exercitação para que a qualidade dos desempenhos, ou

se quisermos para que a Intensidade do exercício seja elevada e para que possam ser concedidos

mais momentos para recuperar, para “afinar porcas e parafusos”. Pela mesma razão, se assim o

pretender o treinador poderá realizar duas sessões neste dia, claro está com durações

significativamente menores do que as que se verificariam se fizesse apenas um treino. Isto também

já poderá depender do contexto que está à volta do treino e da equipa, por exemplo, por imposição

directiva de ter que treinar duas vezes, por habituação cultural a um dia de treinos em que há sessão

dupla, por necessidade quando os resultados não ajudam de mostrar que se faz como os outros…

Pode muito bem ser uma das estratégias a usar para os levar a tomar algum “café com leite”.

Quinta-Feira (Verde Escuro – Treinar em grande o jogar para se fazerem grandes jogas) Este é o dia em que o jogar, na sua dimensão maior se encontra presente de forma dominante,

motivo pelo qual se pinta este dia de

verde (o nosso jogar). Trata-se do dia

em que maior complexidade é dada a

vivenciar aos jogadores. O treino incide

fundamentalmente sobre os Grandes

Princípios de Jogo e sobre os

SubPrincipios que os suportam, sendo

para tal levadas a efeito situações de

exercitação que envolvem a globalidade

da equipa, procurando desse modo

exercitar aspectos relacionados com a

dimensão Colectiva do jogar (Dinâmica

e a Organização Colectiva da equipa) e

ainda aspectos relacionados com a

dimensão estratégica, também esta com

uma configuração mais complexa e tendo

implicada uma dimensão mais Colectiva.

Atente-se que este dia sendo verde, assume tonalidades de verde escuro, facto resultante, do

direccionamento dado àquela unidade de treino. Neste dia, cujo padrão de desempenho e de esforço

mais se aproxima do que se verifica em competição, a dimensão do jogar está presente de forma

mais direccionada que no jogo, daí a tonalidade mais escura que caracteriza este dia. Este verde é

mais escuro uma vez que consoante as prioridades estabelecidas pelo treinador para determinado

Morfociclo, a incidência sobre determinados Princípios de Jogo, vai ser acentuada. Além disso, a

configuração dada aos exercícios deste dia deverão contemplar a vivenciação de porções grandes

do jogar em espaços mais reduzidos que aquele que é o espaço efectivo de jogo verificado nos

Tensão ++ Duração + - Velocidade -

Descontínuo +

Desgaste Emocional ++

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

23

momentos de competição. Este facto permite que respeitando-se um regime de contracção muscular

semelhante ao experienciado em competição, caracterizado por tensões e velocidades de

contracção mais reduzidas que as verificadas na unidade de treino anterior, sendo a duração das

mesmas maior, devido à necessidade de maior abrangência de espaços resultante das maiores

dimensões dos espaços em que decorrem o exercícios. Desta configuração resulta um padrão de

desempenho e de esforço muito semelhante ao do que se deseja vir a verificar em competição.

Contudo, pelo direccionamento do exercício, possibilitado pela intervenção do treinador e pelos

propósitos do próprio exercício, verifica-se, comparativamente aos momentos de competição uma

maior densidade e propensão para a ocorrência dos propósitos que dominantemente pretendemos

para aquela sessão (daí verde escuro). Por este motivo, os exercícios deste dia, mesmo contendo a

InterAcção de todos os jogadores, nunca vão de encontro àquilo que se verifica nas habituais

peladas. Nestas sessões, independentemente de estarem contempladas porções grandes do jogar,

o enfoque não é generalista, mas sim de encontro às prioridades estabelecidas para aquele

Morfociclo, e mais concretamente para aquela sessão e para os vários exercícios que a compõem.

Pelo tipo de exercitação dominante neste dia, com maior complexidade (resultante dos propósitos

treinados, mas também e de forma consequente do maior número de jogadores envolvidos na

vivenciação do jogar e das maiores exigências decisionais verificadas), com um padrão de

desempenho muito semelhante ao do jogo, com tempos mais alargados de exercitação e com

espaços de exercitação mais reduzidos, percebe-se que se trata do dia em que se verifica maior

desgaste nos jogadores. Trata-se do treino em que a dimensão aquisitiva estando mais presente,

exige maior Intensidade nos desempenhos, uma Intensidade que resulta da maior complexidade do

jogar que é vivenciada, a qual tem também subjacente o maior número de conexões, ou InterAcções

Intencionalizadas que potencialmente se estabelecem entre os jogadores. É igualmente importante

reconhecer, que no que se reporta à dimensão física do jogar, também tem implicações muito

evidentes. Também neste domínio o desgaste é grande, uma vez que o regime de contracção

dominante, requer a solicitação em elevada densidade de maiores percentagens de massa

muscular, sobresolicitando deste modo a dita estrutura orgânica. Tudo isto concorre para que neste

dia haja um grande desgaste subjacente, aumentando deste modo os índices de fadiga, facto que

terá de ser contemplado na própria sessão de treino, mas também nos dias que se seguem. É por

este motivo, que se enquadra este tipo de treino no dia, que num Morfociclo de domingo a domingo

permite a exercitação dos propósitos que são as grandes referências do jogar de cada equipa, já

com equipa recuperada do jogo anterior, e o mais afastado temporalmente possível do jogo que se

segue, mantendo a possibilidade de recuperação total da equipa até ao dia do jogo seguinte. Já

anteriormente foi salientada a necessidade de se verificarem 4 dias de recuperação entre jogos, o

que se aplica a este dia pela configuração que assumem os desempenhos nesta unidade de treino.

Uma sessão de treino cujo desgaste se assemelha ou até poderá mesmo exceder (devido à

incidência mais marcada e maior propensão para a ocorrência de determinados propósitos) aquele

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

24

que se verifica nos dias de competição. Esta regra dos 4 dias é determinante para se poder

operacionalizar convenientemente a alternância horizontal, sobretudo nos momentos de maior

densidade competitiva, como mais adiante evidenciarei. Só respeitando convenientemente 4 dias de

recuperação, isto é, ponderando qual o dia no Morfociclo em que a dimensão aquisitiva deverá estar

mais presente e equacionando ajuizadamente o que se faz nos dias que se seguem, se torna

possível dar resposta satisfatória, mesmo em regimes de fadiga relativa, às exigências colocadas

pelo jogo que se segue, sem que se observe perda de entrosamento, de Organização e de fluidez

Colectiva.

Apesar deste ser o treino mais contínuo dos que compõem o Morfociclo, importa salientar que

também neste treino é importante fraccionar os tempos de exercitação. Este é um aspecto de grande

importância para se salvaguardar a qualidade dos desempenhos expressos pelos jogadores, uma

vez que permite que mais facilmente estes vivenciem grandes porções do jogar sem fadiga muito

acentuada, possibilitando assim estes que mais facilmente e melhor assimilem os propósitos

treinados. Quando a fadiga é mais acentuada, a tendência para treinar erros aumenta. Este treino

sendo mais contínuo deverá ainda assim ser descontínuo, e o mais possível, sem perda do padrão

de desempenho e de esforço desejados. Contrariamente ao que sucede nos momentos de

competição o controlo do treinador nesta unidade de treino é claramente maior, uma vez que pode

orientar a sessão de acordo com o que deseja, intervir em conformidade, gerir a qualidade dos

desempenhos e fraccionar os tempos de vivenciação. Entendo que será muito mais rico, o mesmo

exercício fraccionado em 5 repetições de 6 minutos do que se o mesmo for feito em 2 repetições de

15 minutos. Além disso, os momentos de pausa poderão ser de grande importância, não somente

para assegurar a qualidade dos desempenhos, mas também para recuperar no próprio treino

“afinando porcas e parafusos”, para conversar com os jogadores acerca dos sentimentos e emoções

vivenciados aquando da exercitação, reflectir sobre o que está a ser feito e questioná-los e ouvir as

suas sugestões. Não nos podemos esquecer que os jogadores são uma importante fonte de

informação.

Sexta-Feira (Amarelo - Pensar fazendo, Jogar com o “Córtex do dedos do Pés”) Este dia assume a cor amarela, pelo que já referi relativamente ao azul de quarta-feira.

Depreende-se deste modo que o amarelo é também uma dimensão constituinte do verde (o nosso

jogar). Assumindo-se também ele como uma fracção do verde, isto é, como um fractal que

conjugado criteriosamente com as outras cores que compõem o Morfociclo Padrão permite o emergir

do verde, do nosso Táctico. Trata-se de um treino que sendo aquisitivo, deverá ter em consideração,

o desgaste verificado na sessão anterior e ainda a proximidade relativamente ao jogo que se segue.

Por este motivo, deverá haver a preocupação de evitar que a equipa entre em regimes de fadiga

elevados. Este facto justifica que neste dia sejam vivenciadas pequenas fracções do jogar, ou seja,

SubPrincípios e SubPrincípios dos SubPrincípios e ainda aspectos de reduzida complexidade

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

25

relativos à dimensão estratégica. A exercitação destes propósitos faz-se tendo em consideração os

níveis mais Micro da equipa (Individual,

Sectorial e Intersectorial).

O regime de contracção dominante

neste dia caracteriza-se pela presença de

elevada velocidade de contracção, curta

duração e tensão não máxima. Neste dia

procura-se que os exercícios apresentem

uma elevada propensão para a

ocorrência de acções e InterAcções que

permitam uma velocidade contráctil das

fibras musculares máxima, procurando-se

simultaneamente, uma reduzida

densidade de contracções excêntricas.

Para que tal seja possível, os exercícios

são realizados em espaços reduzidos,

com poucos jogadores implicados e

durante períodos de exercitação

igualmente reduzidos. Outro aspecto

importante a ter em consideração neste dia, e em contraste com o que se deve verificar às quartas-

feiras, é que os contextos de exercitação não deverão conter tudo o que implicar estorvo. Os

exercícios nesta unidade de treino devem conter pouco ruído, pouca interferência contextual, pouco

imprevisibilidade, motivo pelo qual a oposição não deverá ser muito significativa. Se a quarta-feira

pode ser uma prova de obstáculos ou de todo o terreno, a quinta-feira tem de ser uma “prova em

linha recta”, sem saltos, mudanças de direcção, acelerações, travagens… os exercícios devem ser o

mais “limpos” possível, isto é, sem estorvos uma vez que é isso que aumenta a tensão das

contracções musculares, hipotecando deste modo a possibilidade de manifestação de tensões

máximas iniciais e consequentemente velocidades de contracção máximas, conforme se deseja para

este dia. Relativamente a este dia o Professor Vítor Frade costuma referir que “devemos chutar para

sexta-feira todas as acções (InterAcções) que tenham pouco estorvo.” A alusão ao “chutar” não é

despropositada, uma vez que neste dia se deverão verificar, comparativamente aos demais, um

maior número de situações de finalização.

Tendo em consideração o regime de contracção dominante neste dia e sua manutenção ao longo

da sessão, esta unidade de treino assume um carácter descontínuo, embora, menos que a de

quarta-feira. O tipo de acções solicitadas é, do ponto de vista locomotor bastante intenso, o que

implica que sejam concedidos períodos de descanso significativos. Além do desgaste motivado por

Tensão + Duração - - Velocidade ++ Descontínuo +

Desgaste Emocional -

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

26

esta unidade de treino, o treinador deverá ainda ter em consideração a necessidade de recuperar do

treino anterior e ter em conta a proximidade do jogo que se segue, motivo pelo qual a complexidade

de jogo vivenciada é menor, assim como a densidade de acções relativamente ao treino de quarta-

feira, “a densidade deste padrão do esforçar tem de ser menor!”

Um aspecto muito importante a salientar relativamente ao padrão de desempenho requerido neste

dia, reporta-se à necessidade de dominantemente as execuções verificadas neste dia dependerem

do córtex motor, procurando-se deste modo reduzir consideravelmente o desgaste emocional. Com

isto, apela-se á manifestação de um determinada Cultura de Jogo, que se deseja encontrar

enraizada no subconsciente, e que se manifesta sob a forma de um saber-fazer Específico, sendo

os desempenhos dos exercícios deste dia suportados pelos hábitos e por acções e InterAcções

automatizadas relativas a uma Intencionalidade Colectiva. Dos dias de maior pendor aquisitivo este é

aquele em que o desgaste deve ser menor, procurando-se nesta sessão vivenciar Subprincípios e

Subprincípios dos Subprincípios, incidindo simultaneamente sobre aspectos relativos à velocidade

de execução, ou seja, sem grande carga cognitiva associada. As propensões neste dia devem levar

à ocorrência de acções que impliquem dominantemente a solicitação do 1\3 do tempo dispendido em

cada acção destinado à execução propriamente dita (dimensão efectora do movimento), evitando

incidir sobre os restantes 2\3 destinados à tomada de consciência e à decisão (dimensão cognitiva

do movimento). Uma vez que os 2\3 relativos à tomada de consciência, isto é, uma vez que a

aspiração a um saber sobre um saber fazer se encontrou marcadamente presente nos dois dias

anteriores, importa nesta sessão de treino não voltar a massificar a estruturas que permitem a sua

manifestação, a qual vai necessariamente estar implicada no momento de competição que se segue.

E deverá manifestar-se sem fadiga, para que dentro de um jogar a criatividade possa emergir e

possa se manifestar. É também por este motivo, por não cumprimento dos 4 dias de recuperação

que entendo ser um erro, o que por norma se faz nas sessões de treino de sexta-feira. Tenho me

apercebido que têm demasiado jogo, em complexidade (embora a intervenção nem sempre leve a

Intensidades máximas), mas sobretudo em aleatoriedade. São treinos com demasiado ruído,

demasiada necessidade de ajustamento, ou seja, com demasiada estimulação da aldrabice e da

criatividade, o que apela muito mais à manifestação de um saber sobre um saber fazer, ou seja,

implica as vias cognitivas superiores, o neocortex e de modo particular o córtex pré-frontal, e a essa

faculdade magnifica que emerge da mente humana, a consciência, que no caso se quer de encontro

a uma Intencionalidade Colectiva, daí Consciência Táctica. Este é um dos motivos pelos quais, muita

das vezes as equipa entram em campo pouco frescas, saturadas mentalmente, facto que não é

notório pela menor disponibilidade física, mas fundamentalmente pelo menor disponibilidade mental,

a qual se repercute na pouca fluidez das acções de jogo, no retardamento dos timings de decisão e

na falta de criatividade e adaptabilidade. O jogo fica emperrado, não porque estão fisicamente

cansados, pois caso contrário não correriam tanto com a bola, como por norma sucede, mas porque

estão saturados ou cansados de pensar. Este facto só não é mais evidente, por me parecer ser uma

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

27

pratica generalizada e como tal a generalidade das equipas que se confrontam estão em pé de

igualdade.

É por tudo isto que na sexta-feira o importante é fazer, é apelar ao que está Incorporado, devendo

por isso o treino incidir sobre a percentagem mais reduzida do tempo de reacção, ou seja, na

execução propriamente dita. As preocupações centradas na velocidade de execução, sendo contudo

importante a este respeito advertir, que esta não deve ser entendida como capacidade condicional,

como sucede com a norma do treinar, mas antes como uma manifestação qualitativa, que como tal

deverá ser contextualizada, expressar nos timings acertados, em função de estímulos relevantes e

tendo subjacente a Especificidade de determinado jogar.

Sábado (Amarelo Claro – Bem-vindos à selva) Este dia é colorido em tons de amarelo claro, o qual resulta da conjugação do branco com o

amarelo, e subentende a necessidade de treinar e de recuperar de forma mais recreativa, mas

sempre em Especificidade, daí que não deixe de ser amarelo, ou seja, não deixa de representar um

determinado nível, ainda que Micro,

de determinado jogar.

O conveniente enquadramento

deste treino implica que tenhamos

que reconhecer a necessidade de

recuperar do desgaste verificado na

sessão de quinta-feira e ainda a do

facto do jogo que se segue ser no

dia imediatamente a seguir. Por

este motivo, trata-se de uma sessão

que deve causar pouco desgaste na

equipa, sendo por isso abordadas

dimensões muito reduzidas do

jogar. São abordados SubPrincípios

e SubPrincípios dos SubPrincípios,

sem que contudo o lado aquisitivo esteja muito implicado. Pretende-se o reavivar do que foi

vivenciado ao longo da semana, inclusive ao nível da dimensão estratégica, com pouco exigência a

nível físico e mental. A sessão de treino, de modo a evitar estados de fadiga consideráveis é

bastante descontinua. Relativamente ao regime de contracção dominante a registar-se neste dia, ele

deve caracterizar-se tensões e velocidade elevadas, mas de reduzida densidade e de curta duração.

Os exercícios têm duração reduzida e podem variar no número de jogadores implicados e nas

dimensões dos espaços de exercitação, consoante a escala da Organização Colectiva (Individual,

Sectorial, Intersectorial, Colectiva) sobre a qual o treinador deseja incidir em determinado exercício.

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

28

Os exercícios assumem um carácter mais informal neste dia pela menor exigência aquisitiva que

os caracteriza, pela necessidade de recuperar e pela necessidade de predispor os jogadores para a

competição sem contudo os fatigar. Os contextos de exercitação neste dia devem apresentar

situações que tenham um pouco de tudo o que o jogo tem, ainda que numa escala menor e com o

mínimo de fadiga implicada. São exercícios em que se recria o jogo, tendo como pano de fundo um

jogar e a possibilidade dele se manifestar no dia seguinte. O objectivo central deste dia é actuar

sobre os jogadores no sentido de activar e deixar latentes alguns dos automatismos dinâmicos da

equipa, e de lhes relembrar o que foi trabalhado ao longo da semana. É como refere o Professor

Vítor Frade, “lança-los na selva”, para os despertar, deixar sobreaviso e os enquadrar e predispor

convenientemente para as exigências a que vão ter de dar resposta no dia seguinte.

Dias (dominantemente) de Recuperação e Dias (dominantemente) de Aquisição No Morfociclo Padrão, conforme se depreende da abordagem feita anteriormente, existem dias que

são dominantemente vocacionados para a recuperação e outros dominantemente vocacionados para

a aquisição de um jogar. Poderá parecer um preciosismo, a aplicação do termo, dominantemente,

mas não é, visto que em todos os treinos, com maior ou menor ênfase, em maior ou menor escala a

aquisição do jogar tem de estar presente para que a operacionalização, inclusive da recuperação, se

faça em Especificidade. É isso que garante a perpetuação de uma matriz conceptual sem perda de

integridade da mesma ao longo da época. Não obstante este facto, há efectivamente três dias no

Morfociclo (quarta-feira; quinta-feira, sexta-feira), que na verdade são cinco (se contarmos com os

momentos de competição, nos quais também pode ser contemplada a recuperação – descansar com

bola) em que a dimensão aquisitiva do jogar está mais presente. A dimensão aquisitiva implica que

se dê ênfase à vivenciação de determinados Princípios de Jogo, criando para isso contextos que

atendendo aos padrões caracterizadores de cada um dos dias, permitam uma elevada propensão

para a ocorrência do tipo de Interacções Intencionalizadas desejadas, de modo a que através da sua

vivenciação em regimes de Repetição Sistemática, esses Princípios de Jogo sejam assimilados e se

manifestem consequentemente como cultura. Os restantes dias do Morfociclo (terça-feira e sábado),

são dominantemente de recuperação. A recuperação é algo de que muito se fala, mas nem sempre

se perspectiva da melhor forma. Culturalmente parece que a norma do treinar, tem receio em treinar

menos. Não entendem que em determinados momentos menos é mais. Por considerar haver um

conjunto de equívocos associados ao processo de recuperação, sobretudo, se desejarmos que tal se

verifique em Especificidade, atentar-me-ei com mais pormenor sobre esta problemática de seguida.

Recuperar a Treinar e Treinar a Recuperar Uma premissa fundamental para se entender e operacionalizar convenientemente a recuperação

no futebol, passa por reconhecer a necessidade de dispor de 4 dias para recuperar a equipa após

um momento competitivo de grande exigência. Esta distância temporal parece ser minimamente

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

29

consensual entre os treinadores, e foi também ela sugerida por Maurício Pellegrino na conversa que

tive com ele e para a qual aludi no texto anterior. De facto quatro dias deverá ser suficiente para

recuperar a equipa, mas isso depende muito do que é feito durante esses dias, ou seja, da qualidade

do processo e do modo como é levada a efeito a alternância horizontal. Infelizmente, o modo como

por norma se perspectiva e operacionaliza a recuperação nada tem a ver com o que se preconiza na

Periodização Táctica. A generalidade dos treinadores para recuperarem os seus jogadores

incompreensivelmente sujeitam-nos a esforços abstractos, com um padrão de solicitação

completamente distinto daquele que se observa em competição, fazendo-o um propósito único, a

dita recuperação física, ignorando assim o desgaste global (Fadiga Táctica) que se instala nos

jogadores. Apesar de quase todos os treinadores entenderem ser fundamental a recuperação no

futebol, e de haver uma preocupação crescente em equacionar esta problemática, como ela merece,

ou seja, ponderando a fadiga “física” e a fadiga “mental-emocional” implicadas na manifestação de

um jogar, a verdade é que não raras vezes o discurso não condiz com percurso. Importa a este

respeito salientar que a infelizmente, muitas da vezes o discurso em torno deste tema é superficial,

de circunstância, adoptando slogans nos quais se fala de “recuperar mentalmente a equipa”,

fazendo-o contudo porque é giro, fica bem, está na moda, sem que no entanto se perceba a

verdadeira importância que esta assume.

O que também se ouve com muita frequência é os treinadores reiterarem a necessidade de tempo

para recuperarem, ou justificarem desempenhos pouco conseguidos com a falta de tempo para

recuperar. Por este motivo, e com todo o sentido, fazem múltiplas tentativas para adiar os jogos para

datas mais afastadas, com o intuito de ampliar o máximo possível o tempo para recuperar. Contudo

o grande problema é que depois submetem os jogadores a desgastes suplementares, realizando

duas sessões de treino por dia (com configurações e durações que nada têm que ver com as que

salientei aquando da análise do Morfociclo Padrão) com objectivos de incrementos exclusivamente

quantitativos de aspectos descontextualizados. Por norma, por não se reconhecer a necessidade de

recuperar, treina-se em demasia. Os treinadores recorrem além de lógicas de alternância

desajustadas, a situações de exercitação em dias próximos da competição com demasiado contexto

de jogo, não respeitando deste modo, a necessidade 4 dias para recuperar. Por isso pergunto, para

que adiam os jogos, se depois o que fazem nos dias que pediram a mais é submeter os jogadores a

um desgaste semelhante ao da competição?! A equipa não se desgasta?! Volto a referir que há dois

motivos para as equipas se apresentarem cansadas em competição, por treinarem em demasia ou

por treinarem pouco. Em Portugal, por razões culturais vigora um conjunto de bloqueios

epistemológicos em torno do treino de futebol, um dos quais é pensar-se que ao treinar mais se está

a treinar melhor. O que é um erro. Mas na verdade é algo que está institucionalizado, havendo

inclusive necessidade da parte dos treinadores de mostrarem a dirigentes e adeptos que “trabalham”

muito, sentido além disso necessidade de justificarem os seus vencimentos com o tempo que

dedicam ao clube, por isso quando as bancadas estão cheias, ou quando o presidente vai ao

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

30

relvado, o treina o dura e dura e dura… É um absurdo, “trabalha-se” muito, mas treina-se pouco, e

como diz o Professor Vítor Frade, “quando trabalhas muito durante a semana, depois vai se

descansar para o jogo” ou “anda-se com o travão de mão puxado”.

Outro absurdo passa pelo que normalmente se faz sempre que os períodos competitivos o

permitem que haja grande distância entre dois momentos de competição. Quando tal sucede,

aproveita-se para recuperar, de que modo?! “Recarregando baterias”. Isto é, submetendo os

jogadores a esforços contínuos de baixa intensidade, de modo a solicitar dominantemente o

metabolismo aeróbio. É o período da dita oxigenação. Mais um indício demonstrativo de que na

norma do treinar as fontes energéticas são concebidas, erradamente, de forma dissociada,

sequencial ou faseada e desconexa. A solicitação dominante do metabolismo aeróbio, de modo

convencional, implica a realização de actividades de baixa intensidade, durante períodos de tempo

alargados e tendo associadas uma grande quantidade de massa muscular mobilizada. Uma

gestualidade cujo padrão contrasta com o que se verifica em competição, onde as solicitações

requerem não somente intensidades diversas, mas também uma grande variabilidade. Contudo,

verificando-se este “recarregar de baterias” durante um período significativo de tempo, o que se

verifica é a habituação do organismos àquele padrão de funcionalidade, que por ser contrário ao que

se deseja manifestar em competição se torna parasita, e hipoteca a possibilidade da equipa

manifestar com fluidez a sua identidade. Os jogadores ficam adormecidos, parecem anestesiados,

querem mas não podem, isto já para não falar da perda de entrosamento colectivo decorrente do

facto da equipa não ter treinado a sua Organização Colectiva. Não foi isto, o que se passou com o

FC porto esta época?! Como reagiu a equipa no jogo frente ao Sporting CP, após um período de

paragem nas várias competições?! Mas além desta manifestação perniciosa do “recarregar baterias”,

que se verifica a nível da dinâmica colectiva, não devemos ignorar os efeitos que esta habituação

poder ter a nível Individual, e consequentes repercussões negativas para a equipa. Se repararmos

após este período de menor densidade competitiva, aproveitado de forma assumida para recuperar a

equipa do FC Porto, o que se verificou foi um aumento muito significativo do número de lesões. Na

sua maioria por fadiga e sobrecarga sobre as estruturas locomotoras. O padrão de esforço implicado

na corrida continua, actividade dominante quando se trata de “recarregar baterias”, cria um desgaste

muito grande, pela repetição gestual e pelo impacto sucessivo sobre as diferentes estruturas

responsáveis pelo movimento. Esta massificação conduz as estruturas músculo-esqueléticas a um

stress de repetição, que por sua vez conduz à saturação dos mecanismos inteligentes responsáveis

pelo movimento. A fadiga muscular acentuada induz perda de refinamento motriz e descoordenação

devido à diminuição ou falência do controlo neuromuscular, o que influência negativamente a

manifestação da proprioceptividade e da cinestesia, instalando-se assim uma maior vulnerabilidade

articular e consequentemente uma maior propensão para a ocorrência de lesões. Tal como se

verificou no FC Porto.

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

31

Cruyff tem várias feito alusões ao facto de não haver propensão para lesões quando se treina com

qualidade, com intensidades elevadas, quando a carga emocional implicada é grande, ou seja,

quando o treino recria mais aproximadamente os momentos de competição. Treinar com Intensidade

elevada, como se preconiza na Periodização Táctica, obrigo as estruturas locomotoras a estarem

implicadas de forma inteligente, a terem de antecipar. O que não acontece quando se treina em

ponto morto. As referências de Cruyff a este respeito são mais uma prova de que muitas vezes a

“Arte antecipa a Ciência”, visto que recentes estudos suportam o sugerido pelo holandês. Foram

publicados há pouco tempo estudos realizados na Universidade de Copenhaga, por Peter Krustrup,

curiosamente coadjuvado pelo guru da norma do treinar Jens Bangsbo, que sugerem que a prática

regular de futebol, mesmo de carácter informal, permite incrementos significativos ao nível do

aumento da massa muscular, da densidade mineral óssea, força muscular, equilíbrio postural,

melhorias que no seu conjunto reduzem os riscos de queda e de fracturas ósseas. Mais curioso

ainda é o facto deste incrementos, segundo os autores serem mais evidentes com a prática de

futebol do que com corrida continua. Pertinente parece-me!!!

Para que o treino se manifeste efectivamente com qualidade e seja aquisitivo, mesmo nos dias em

que tal não é dominante, os jogadores deverão vivenciar o jogar em condições que lhes permitam

expressar nos seus desempenhos, níveis de concentração elevados (mais ou menos, consoante o

dia) para que possam verificar-se Intensidades Máximas Relativas aquando da vivenciação do jogar

de modo a que mais facilmente se dê a IncorporAcção dessa Intencionalidade Colectiva. Uma

InCorporAcção da esfera da dimensão emocional que por levar a uma habituação em Especificidade,

terá por consequência o entranhar (Somatizar) do que inicialmente era estranho e por conseguinte

também inicialmente mais exigente e desgastante. Este saber fazer, depois de assimilado permite

que a sua vivenciação se faça com maior economia do sistema nervoso central, o que favorece

igualmente a recuperação, sendo por isso mais um motivo para se treinar em Especificidade. Além

disso, permite que o jogar aspire a dimensões de maior complexidade, assim como permite o

emergir de uma sentimentalidade relativa a esse jogar, Consciência Táctica.

Na Periodização Táctica a qualidade de desempenho manifesto em treino é um aspecto

fundamental para a progressão qualitativa do jogar. Para que tal suceda é fundamental que estes

aspectos sejam salvaguardados, e só é possível fazê-lo se entender a recuperação como uma

necessidade intrínseca do treino de qualidade. Face ao exposto torna-se determinante que a

recuperação além de ser equacionada ao longo do Morfociclo Padrão, seja igualmente equacionada

e contemplado em conformidade cada unidade de treino. É também por esta razão, que quando

observamos o Morfociclo Padrão, verificamos que não existem sessões contínuas, mas sim, sessões

mais ou menos descontinuas, consoante a dominância da sessão de treino e o seu enquadramento

na lógica de alternância horizontal. A gestão da recuperação durante a diferentes sessões de treino,

deve ter em consideração o tipo de desempenhos e de desgastes implicados nas mesma, sendo em

conformidade com esses aspectos que se estabelecem os doseamentos e as calibragens

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

32

necessárias entre os tempos de exercitação e os tempos de recuperação. Para a gestão destes

aspectos, o treinador não terá necessariamente que utilizar cronómetro, mas deverá saber em que

franjas de exercitação determinado padrão de desempenho e de esforço se deve enquadrar. Ou

seja, o mais relevante é dominar com critério as dinâmicas de esforço e o tipo de metabolismo

dominante implicados (e as necessidade condizentes de recuperação), e ainda uma capacidade para

gerir a qualidade dos desempenhos manifestos no aqui e agora, com o intuito de detectar não

somente erros, mas também sintomas de fadiga. Neste domínio da FenomenoTécnica do treinar, o

Sentido da Divina Proporção joga igualmente um papel determinante, podemos mesmo dizer-se que,

se não andares de cronómetro na mão tens de dominar o Sentido da Divina Proporção.

A contemplação da recuperação ao longo de todas as sessões do Morfociclo, marca mais uma

transgressão da Periodização Táctica relativamente à norma do treinar. O reconhecimento e

conveniente contemplação desta necessidade contrasta com o que convencionalmente se faz. Por

norma a recuperação é equacionada apenas num dos treino, geralmente no de segunda-feira, sendo

negligenciada, a fadiga acumulada ao longo de todo o Morfociclo, ou no caso como vulgarmente o

designam microciclo. Ignorando-se igualmente a necessidade, de quando se treina com qualidade,

isto é, na fronteira do caos, se estar permanente de ter de “afinar porca e parafusos”. Conforme

refere o Professor Vítor Frade “a recuperação não é sequer uma face da moeda, é uma dimensão

das duas faces que a moeda tem.” Motivo pelo qual, a recuperação tem necessariamente de fazer

parte do processo, sendo por isso, necessariamente contemplada em todas as sessões de treino,

mas não de uma forma abstracta, sendo levada a efeito também em Especificidade. É esta não

perda de ligação à matriz de um jogar que permite que não haja perda de referências relativamente

àquele que é o futuro a que aspiramos. Perante tudo o que foi referido percebe-se que

ponderabilidade do binómio DesempenhoRecuperação é um aspecto crucial, que tem de ser

contemplado ao longo do Morfociclo, e em cada unidade de treino que o compõem, de modo a

garantir o cumprimento do Princípio da Alternância Horizontal em Especificidade, e a possibilidade

da manifestação qualitativa do jogar, ainda que em regimes de fadiga relativa, nos momentos que

mais importa, isto é, nos momentos de competição (nos testes cruciais).

A TOP Competes e Recuperas

Conforme já foi referido, o que se verifica a TOP é uma densidade competitiva muito elevada,

caracterizada por um elevado nível de exigência e pelo desejo de ser bem sucedido

independentemente das dificuldades que nos são colocadas. Quando nesta realidade, os treinadores

em determinados momentos e de forma contínua vêem-se obrigados a dar respostas mais do que

um momento de competição por semana. A realidade a TOP passa por jogar duas vezes por

semana, isto é, por ter de competir com períodos de tempo entre jogos muito curtos. Torna-se deste

modo pertinente questionar, se também nestes períodos de elevada densidade competitiva fará

sentido a aplicação do Morfociclo Padrão?! Entendo que sim, aliás ele foi criado precisamente para

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

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contemplar essa necessidade mesmo quando tal densidade não se verifica, por isso a quinta-feira

tem a configuração que tem. Não se aplicará como é óbvio o Morfociclo tal e qual, mas sim a lógica

que tem subjacente, jogando assim com a dinâmica das cores.

Um dos aspectos fundamentais na contemplação deste Morfociclos em momentos de elevada

densidade competitiva passa pela necessidade de dispor de 4 dias para recuperar a equipa, mesmo

que alguns jogadores o possam fazer em 3 dias, isso não representa o estado de recuperação da

equipa. E esta distância temporal tem de contar nos dois sentidos, ou seja, vai desde o último

momento de competição até ao dia em que a equipa está recuperada (por exemplo, jogando ao

domingo, estará recuperada na quinta-feira), mas tem também de ter em conta o primeiro dia em que

a equipa está totalmente recuperada e a distância que o separam relativamente à competição que se

segue para verificar se dispomos de 4 dias para recuperar do treino, mais desgastante que

hipoteticamente poderá ser feito nesse dia (por exemplo, equipa é recuperada na quinta-feira e joga

domingo, cumpre a regra dos 4 dias, o que não sucede se jogar no sábado ou na sexta). Quando a

regra dos quatro dias (a contar para a frente e para trás) não pode ser cumprida 2 vezes por

semana, como sucede com 2 momentos de competição por semana, o que o treinador deverá fazer

é suprir a, ou as unidades (consoante as distâncias temporais) de treino que impliquem maior

desgaste, isto é, aquelas que são dominantemente aquisitivas e gerir em conformidade os restantes

dias.

Quando a densidade competitiva é elevada é fundamental que os treinadores reconheçam a

necessidade de recuperar, sobretudo a TOP, onde as exigências são máxima os jogadores anda na

fronteira do caos, e como tal as necessidade de “afinar porcas e parafusos” são mais acentuadas.

Por outro lado por terem de andar a TOP, onde a sensibilidade às condições iniciais é extremada,

por o fazerem de forma permanente, os jogadores e consequentemente as equipas, têm de estar

devidamente afinadas, de modo a poderem dar respostas a tais necessidade e exigências. Isso não

é possível com o futuning, mas com treino de qualidade. Treino que contemple a necessidade de

recuperar, fazendo-o em Especificidade. A TOP em muitos momentos não treinas, recuperas, e se o

fizeres em Especificidade não deixas de treinar, pois estas são duas dimensões da mesma face da

moeda que é o nosso jogar. Além disso, permite que dominantemente a recuperar não se perca a

identidade e a expressão da Intencionalidade Colectiva que nos caracteriza e diferencia, porque o

núcleo duro conceptual está sempre presente ao longo do processo, ainda que com níveis de

complexidade mais reduzidos. Para a recuperar em Especificidade e de encontro ao que já salientei

é fundamental que a matriz do processo se mantenha, e que a actividade a levar a efeito seja

análoga aquela que nos induziu fadiga, mas fazendo-o com tempos de exercitação muito curtos,

alternados com momentos de recuperação consideravelmente alargados.

Se pela necessidade da densidade competitiva com que nos deparamos, não podemos fazer

cumprir com a regra dos 4 dias, então é porque já estamos a vivenciar suficientemente o jogar em

quantidades de qualidade consideráveis, o que torna nesses momentos imperativo saber dosear,

Pelas Entranhas do Núcleo Duro do Processo

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tendo em mente que menos nestes casos é mais. O treinador não tem de ter medo de treinar menos,

não deve ter medo inclusive de dar folgas adicionais nestes momentos de elevada densidade, se

assim o entender. Deve ter medo é de perder o lugar por falta de resultados, e isso, é mais provável

a este nível se treinar de mais do que se treinar menos, entenda-se com qualidade (Especificidade),

mas com exigências menores (o jogar, mais Micro, vivenciado em regimes de menor dominância

aquisitiva). Só deste modo equipas e treinadores poderão andar a TOP sem STOP, fazendo-o a

vencer.

Jorge Maciel 15 de Maio