Perfil Do Trabalhador

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PERFIL DO HOMEM OFFSHORE: ASPECTOS RELEVANTES NAS RELAÇÕES NO TRABALHO E FAMILIARES CADERNO DE PESQUISAS EM ADMINISTRAÇÃO, SÃO PAULO, V. 1, Nº 3, 2º SEM./1996 Arlindo Antonio de Souza Mestrando do Curso de Pós Graduação I - INTRODUÇÃO A importância do petróleo, como fonte de energia ou como matéria-prima, na atualidade, é incontestável, justificando investimentos vultuosos em pesquisas, exploração, produção e até explicando ações bélicas. No Brasil, o interesse pela pesquisa de petróleo começou no século passado. Em 1897, iniciou-se a perfuração de um poço na localidade de Bofete, São Paulo, que atingiu a profundidade de 488 metros no qual encontrou-se apenas água sulfurosa. Somente em 1993, o engenheiro Manoel Ignácio Bastos localizou o que pode ser considerado o primeiro poço de petróleo no Brasil, em Lobato, Bahia. Quando o petróleo se transformou em recurso de importância fundamental para o desenvolvimento econômico, a Lei 2.004, de 3 de outubro de 1953, instituiu o monopólio estatal do petróleo no Brasil e criou a PETROBRÁS Petróleo Brasileiro S/A. Com uma estrutura adequada, iniciou-se, assim, uma grande indústria petrolífera, sempre voltada para o atendimento dos interesses do país. Surgiram, a partir de então, diversas atividades correlatas para apoiar o desenvolvimento ocorrido, sendo criados equipamentos exigidos pelos numerosos e complexos projetos originários da atuação da empresa. Este processo teve enorme e benéfico impacto nos mais importantes segmentos da economia brasileira. II - EXPLORAÇÃO DE PETRÓLEO NO MAR A PETROBRÁS perfurou o primeiro poço marítimo no Brasil, em 1968, no Espírito Santo. Desde então, já foram descobertos 63 campos, situados ao longo do extenso litoral brasileiro, que possibilitaram atingir em, 1996, a produção no mar de 605.000 bpd, correspondentes a 73% da produção total. No litoral do Rio de Janeiro, a Bacia de Campos transformou-se na mais importante província produtora de petróleo do país. Em 1994, ela respondeu por cerca de 66% da produção média brasileira de petróleo. Foi também na Bacia de Campos que ocorreu a primeira descoberta significativa, no mundo, de petróleo em águas profundas: o Campo de Marlim, descoberto em 1984, em lâmina d'água entre 600 e 1000 metros, com uma reserva estimada, de início, em 1,7 bilhão de barris. Ainda em Marlim, no poço 3-MRL-4, em abril de 1994, a PETROBRÁS bateu seu próprio recorde mundial, ao atingir a marca de produção em águas com profundidade de 1027 metros e acelerou o ritmo de produção na Bacia de Campos. Numa demonstração do reconhecimento internacional do esforço no desenvolvimento de produção em águas profundas, a OTC 92 (Offshore Technology Conference) escolheu a companhia para receber o prêmio Distinguished Achievement Award for Companies, por suas "expressivas realizações em tecnologia avançada de produção em águas profundas". Esse resultado bastante positivo no que tange a produção de petróleo no mar, passados apenas onze anos da descoberta dos campos de Marlim e Albacora, somente foi possível graças aos recursos humanos da empresa, seu patrimônio maior, que, com sua capacitação, esforço e criatividade, alcançaram o aperfeiçoamento tecnológico necessário. Uma perfuração mobiliza numerosos equipamentos e dezenas de profissionais especializadas, entre os quais se incluem eletricistas, mecânicos, sondadores, torristas, plataformistas, soldadores, sem falar na presença obrigatória de geólogos e engenheiros especializadas. A perfuração na plataforma continental, ou seja, no mar, é feita com plataformas fixas ou flutuantes. As fixas são auto-eleváveis e se apóiam no fundo do mar por meio de três ou mais pernas. Estas pernas chegam a ter 100 metros de comprimento e são movimentadas por sistemas hidráulicos ou elétricos. Para o transporte

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    CADERNO DE PESQUISAS EM ADMINISTRAO, SO PAULO, V. 1, N 3, 2 SEM./1996

    Arlindo Antonio de Souza Mestrando do Curso de Ps Graduao

    I - INTRODUO

    A importncia do petrleo, como fonte de energia ou como matria-prima, na atualidade, incontestvel, justificando investimentos vultuosos em pesquisas, explorao, produo e at explicando aes blicas.

    No Brasil, o interesse pela pesquisa de petrleo

    comeou no sculo passado. Em 1897, iniciou-se a perfurao de um poo na localidade de Bofete, So Paulo, que atingiu a profundidade de 488 metros no qual encontrou-se apenas gua sulfurosa. Somente em 1993, o engenheiro Manoel Igncio Bastos localizou o que pode ser considerado o primeiro poo de petrleo no Brasil, em Lobato, Bahia.

    Quando o petrleo se transformou em recurso de importncia fundamental para o desenvolvimento econmico, a Lei 2.004, de 3 de outubro de 1953, instituiu o monoplio estatal do petrleo no Brasil e criou a PETROBRS Petrleo Brasileiro S/A. Com uma estrutura adequada, iniciou-se, assim, uma grande indstria petrolfera, sempre voltada para o atendimento dos interesses do pas. Surgiram, a partir de ento, diversas atividades correlatas para apoiar o desenvolvimento ocorrido, sendo criados equipamentos exigidos pelos numerosos e complexos projetos originrios da atuao da empresa. Este processo teve enorme e benfico impacto nos mais importantes segmentos da economia brasileira.

    II - EXPLORAO DE PETRLEO NO MAR

    A PETROBRS perfurou o primeiro poo martimo no Brasil, em 1968, no Esprito Santo. Desde ento, j foram descobertos 63 campos, situados ao longo do extenso litoral brasileiro, que possibilitaram atingir em, 1996, a produo no mar de 605.000 bpd, correspondentes a 73% da produo total. No litoral do Rio de Janeiro, a Bacia de Campos transformou-se na mais importante provncia produtora de petrleo do pas. Em 1994, ela respondeu por cerca de 66% da produo mdia brasileira de petrleo. Foi tambm na Bacia de Campos que ocorreu a primeira descoberta significativa, no mundo, de petrleo em guas profundas: o Campo de Marlim, descoberto em 1984, em lmina d'gua entre 600 e 1000 metros, com uma reserva estimada, de incio, em 1,7 bilho de barris. Ainda em Marlim, no poo 3-MRL-4, em abril de 1994, a PETROBRS bateu seu prprio recorde mundial, ao atingir a marca de produo em guas com profundidade de 1027 metros e acelerou o ritmo de produo na Bacia de Campos.

    Numa demonstrao do reconhecimento internacional do esforo no desenvolvimento de produo em guas profundas, a OTC 92 (Offshore Technology Conference) escolheu a companhia para receber o prmio Distinguished Achievement Award for Companies, por suas "expressivas realizaes em tecnologia avanada de produo em guas profundas".

    Esse resultado bastante positivo no que tange a produo de petrleo no mar, passados apenas onze anos da descoberta dos campos de Marlim e Albacora, somente foi possvel graas aos recursos humanos da empresa, seu patrimnio maior, que, com sua capacitao, esforo e criatividade, alcanaram o aperfeioamento tecnolgico necessrio.

    Uma perfurao mobiliza numerosos equipamentos e dezenas de profissionais especializadas, entre os quais se incluem eletricistas, mecnicos, sondadores, torristas, plataformistas, soldadores, sem falar na presena obrigatria de gelogos e engenheiros especializadas.

    A perfurao na plataforma continental, ou seja, no mar, feita com plataformas fixas ou flutuantes. As fixas so auto-elevveis e se apiam no fundo do mar por meio de trs ou mais pernas. Estas pernas chegam a ter 100 metros de comprimento e so movimentadas por sistemas hidrulicos ou eltricos. Para o transporte

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    entre locaes, a plataforma auto-elevvel assume a forma de uma balsa, facilitando assim o seu transporte por barcos rebocadores. As plataformas semi-submersveis so sustentadas por uma espcie de submarino, localizado abaixo do movimento das ondas, dando ao equipamento uma grande estabilidade. J os navios-sondas parecem navios convencionais, mas possuem, no centro, uma torre e uma abertura pela qual feita a perfurao.

    Como nas plataformas semi-submersveis, sofisticados sistemas de computao impedem que a embarcao, mesmo sofrendo o movimento das ondas, interfira no posicionamento da coluna de perfurao. Desde o momento em que a perfurao iniciada, o trabalho se processa sem interrupo e s termina quando atinge as metas predeterminadas. O objetivo de um poo, em termos de perfurao, traduzido pela profundidade programada: 800, 2.000, 6.000 metros. Isso requer trabalho rduo e viglia permanente. medida que a broca (instrumento que permite perfurar a rocha) avana, vo sendo acrescentados tubos em segmentos de dez metros. Normalmente, uma broca tem vida til de 50 horas. Para troc-la, tem-se de retirar toda a tubulao em segmentos de trs tubos e recoloc-los. fcil imaginar o trabalho e o tempo que se leva, se a perfurao estiver, por exemplo, a 4.000 metros de profundidade.

    III - O TRABALHO OFF SHORE

    No Brasil, para a execuo do trabalho nas plataformas martimas, atualmente existem dois tipos de escalas:

    a) a de revezamento em turnos de 12 horas, que compreende funes operacionais realizadas por tcnicos de nvel mdio;

    b) a de sobreaviso, exercido por supervisores e profissionais de nvel superior.

    Com a aprovao em 1988, pela Assemblia Nacional Constituinte, do turno de seis horas, e atravs de acordo feito com os Sindicatos, o regime de dias embarcados por dias de folga passou de 14 x 14 para 14 x 21, ou seja, o trabalhador permanece um perodo de 14 dias embarcado na plataforma, trabalhando em regime de revezamento ou sobreaviso, conforme o caso, e, aps o desembarque, goza um perodo de 21 dias de folga.

    O trabalho em regime de confinamento dos

    trabalhadores offshore (plataformas martimas, navios e submarinos), apresenta uma situao peculiar que a de estarem em alto mar, no raro, h centenas de quilmetros da costa, durante um perodo de vrios dias, o que lhes permite deslocarem-se apenas dentro de um espao limitado. Vibraes, rudos, conversas entre pessoas, geralmente esto presentes em seus momentos de repouso, lazer ou refeies. O mesmo no ocorre nas grandes obras pblicas, como o caso da construo de estradas, de barragens, ou, ainda, na perfurao em terra, uma vez que, geralmente, o trabalhador pode deixar o stio onde o servio est sendo realizado, nos perodos de descanso.

    Os esforos da Companhia no sentido de garantir crescente aperfeioamento tecnolgico aliam-se perspectiva de conhecer e superar desafios na rea de recursos humanos. Dentro dessa filosofia aplicada s relaes de trabalho e com o objetivo de: a) avaliar as condies de vida e trabalho e suas repercusses na sade dos empregados em plataformas martimas; b) subsidiar a companhia com dados que lhe permitam tomar medidas necessrias ao aprimoramento das condies relativas ao processo e s relaes de trabalho existentes nas plataformas; foi desenvolvido um projeto de pesquisa denominado "Perfil do Homem OffShore" (5), pela ento Diviso de Relaes Industriais da Regio de Produo do Sudeste - RPSE. Seu objetivo principal foi o de identificar e estudar os fatores que concorrem para a adaptao e satisfao dos empregados no regime de trabalho embarcado, suas interferncias na vida social, familiar e, ainda, na sade.

    A partir de trinta entrevistas e seiscentos questionrios enviados, sendo 456 respondidos pelo pessoal embarcado, fez-se, entre 1989 e 1991, uma investigao procurando retratar as concepes dos empregados sobre o processo do trabalho que executam, das relaes no trabalho, bem como sobre o clima social que vivenciam na plataforma. Tornou-se

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    possvel, ento, conhecer as condies de trabalho offshore, a partir da explanao dos prprios empregados que convivem no dia-a-dia este processo, com o intuito de aprimorar as condies a ele relativas e as relaes de trabalho existentes nas plataformas.

    A construo e execuo do projeto de pesquisa sobre o perfil do Homem Off-shore, seguiu um conjunto de procedimentos elaborados por uma equipe multidisciplinar, formada por profissionais das reas social, mdica e de informtica da empresa, que contaram com o apoio terico-metodolgico de um grupo externo de assessores pertencentes s reas de Ergonomia, Servio Social e Estatstica.

    1 - Dados Pessoais 2 Doenas / Afastamentos 3 Tipos de trabalho / Atividades na plataforma 4 - Queixas de Sade 5 Reconhecimento Elogios Avaliaes 6 Famlia 7 Relacionamento social extra plataforma

    Figura 3 - Roteiro de Entrevista Exploratria com o Pessoal Embarcado

    Os aspectos relevantes no trabalho e familiares,

    abordados neste paper, fundamentam-se, principalmente, em dados obtidos a partir da sntese e recomendaes deste projeto de pesquisa, da bibliografia consultada, bem como da interpretao pessoal do autor.

    IV- TRABALHO DE REVEZEMENTO EM TURNOS: ASPECTOS TERICOS E PRTICOS

    importante advertir que no existe um modelo ideal de escala de turnos. Segundo o professor Dr. Joseph Rutenfranz (9), "aquele que se ocupa com o planejamento de escala de turnos, deve refletir que isto no se presta a disseminao de quaisquer exigncias ideolgicas. A configurao das escalas de turnos sempre um problema matemtico e pressupe conhecimento em mtodos de otimizao da distribuio do tempo. As escalas de turnos devem servir s pessoas que suportam multas outras condies desfavorveis de trabalho, e facilitar sua integrao social Para alcanar tal objetivo, devem ser analisadas todas as variveis fisiolgicas, psicolgicas, sociais e econmicas., antes de se decidir por esta ou aquela escala, o que demanda trabalho multidisciplinar de todos aqueles envolvidos em tal deciso".

    Sob o aspecto psico-fisiolgico, os seguintes critrios devem ser priorizados:

    turnos noturnos, intercalados so melhores que

    consecutivos, pois turnos noturnos consecutivos no levam simples inverso do ritmo biolgico, mas a uma deformao deste. Perodos de turno noturno de uma semana conduzem, em geral, a um acmulo do dficit de sono. Rodzios curtos de, no mximo, trs noites consecutivas, seriam, portanto, mais aconselhveis;

    a durao do turno deve ser dependente da carga de trabalho, ou seja, a determinao da quantidade de horas dirias trabalhadas dever ser fixada pelo grau de dificuldade do trabalho;

    o turno diurno no deve iniciar-se muito cedo. O incio s sete ou oito horas melhor do que s seis ou do que s cinco, pois est provado que quanto mais cedo inicia-se o turno, menor o sono noturno da vspera e maior o cansao, porque as pessoas tendem a dormir no mesmo horrio, mesmo que tenham que acordar mais cedo no dia seguinte;

    nos sistemas de trabalho contnuo, o rodzio para a frente deve ser preferido, isto , a seqncia: turno matutino - vespertino - noturno - folga, deve ser mantida nesta ordem;

    as escalas de turnos devem obedecer a ciclos de tempo facilmente perceptveis. Como tal regime de trabalho altera a vida social do empregado, o conhecimento exato dos dias de trabalho no ms facilita a programao de compromissos pessoais ou scio-familiares e, conseqentemente, diminui as chances de inadaptabilidade;

    a escala de turnos deve prever, pelo menos, um fim de semana livre por ms, pois o valor social do fim de semana significativo para a integrao do trabalhador na sociedade.

    Fatores tais como: circadianos, de sono e sociais/domsticos so de grande relevncia no que se refere adaptao ao trabalho em turnos e devem ser sempre considerados.

    A empresa, na medida do possvel, tem enviado esforos, buscando priorizar as condies psico-

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    fisiolgicas para o trabalho em turno. Rodzio para frente, turnos intercalados, manuteno da previso anual da escala de embarque, melhoria no acompanhamento mdico peridico, ateno aos critrios fisiolgicos, concesso de mais dias de folga aos empregados embarcados, so apenas alguns dos procedimentos adotados.

    V - ASPECTOS RELATIVOS SADE

    Como forma de atenuar os efeitos potencialmente

    prejudiciais sade no que tange ao trabalho em turno, de um modo geral, pesquisas cientficas tm sugerido:

    a limitao do tempo total de trabalho em regime de turnos;

    a diminuio da durao do tempo de trabalho em turnos, atravs da introduo de horas suplementares de folgas e /ou frias;

    a diminuio da carga diria de trabalho noturno, atravs da realizao de pequenas pausas;

    o acompanhamento rigoroso da sade dos empregados, atravs de exames mdicos admissionais e peridicos;

    a previso de intervalos no trabalho em turno, a cada trs ou quatro anos, para tratamentos preventivos;

    a investigao epidemiolgica dos efeitos, a longo prazo, do turno na sade;

    a introduo de pequenos intervalos de tempo durante o trabalho noturno, onde haja a possibilidade de cochilos, na medida em que o andamento da atividade o permita, atravs, por exemplo, de rodzio de operadores. Segundo a experincia de empresas japonesas, onde j existe esta prtica, os curtos perodos de sono durante o turno noturno melhoram mais o nvel de

    vigilncia do que o alcanado pelo uso de estimulantes, como caf e nicotina;

    a diminuio ou, se possvel, supresso das sobrecargas adicionais, tipo rudo, substncias txicas, calor;

    a otimizao escala de turnos, segundo critrios fisiolgicos e psicossociais;

    o emprego de novas tecnologias (robtica, computadorizao etc.), que possibilitem a diminuio da necessidade de trabalho humano noturno;

    a oferta de eventos culturais e de lazer, de igual qualidade para os empregados diurnos ou noturnos;

    Constatou-se que os empregados embarcados consideram o servio de atendimento mdico, efetuado na base de Maca, entre bom e regular, sendo que um percentual significativo deles desconhece o trabalho que desenvolvido e sugere uma maior divulgao das possibilidades e limitaes do servio referentes a profissionais e equipamentos.

    VI - RELAES NO TRABALHO OFFSHORE E SUA ADAPTAO

    As relaes no trabalho dizem respeito s interaes que se estabelecem entre pessoas, numa condio horizontal, de parceria, ou vertical, de subordinao. Tais relaes, consideradas no contexto fsico e na forma de organizao do processo de trabalho, constituem-se condicionantes e resultam no clima social. No caso do ambiente confinado, importante considerar que a conseqente proximidade de atividades diferentes como trabalho, alimentao, lazer, repouso e atendimento sade, no favorece o relaxamento. Alm disso, os turnos fixos definem a compulsoriedade da convivncia e relaes entre componentes, o que pode tanto facilitar quanto dificultar a interao.

    Os fatores que condicionam o clima social ou as relaes no trabalho so, dentre outros, a estrutura de comando ou hierarquia, o controle sobre a produo, a avaliao de desempenho, o controle do comportamento atravs da aplicao de normas disciplinares, os estilos gerncias, as modalidades e qualidades das comunicaes, alm das prprias regras de convivncia, como horrios, procedimentos, utilizao dos recursos disponveis etc.

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    O fortalecimento do lazer, a fim de que se consiga

    facilitar a interao entre os grupos, atravs de programas especficos e que correspondam ao interesse da maioria dos empregados, pode trazer excelente retorno para o clima social.

    A anlise dos fatores que intervm na avaliao da adaptao ao trabalho, parte do princpio de que o seu grau resultante da inter-relao entre as expectativas e necessidades do empregado e as suas condies de trabalho e vida. Sendo assim, a satisfao no trabalho no se deve apenas s caractersticas psicolgicas intrnsecas dos indivduos, mas s condies do meio scio-econmico e cultural e da prpria organizao do trabalho, entre outros fatores.

    As caractersticas bsicas do regime, que so o confinamento e o conseqente afastamento do convvio social e familiar, e, secundariamente, os aspectos relativos periculosidade inerente aos trabalhos de Perfurao e Produo de petrleo no mar, e a poltica vigente na Companhia, no tocante a salrios e vantagens, constituem-se fatores claramente presentes no processo de adaptao ao trabalho.

    Itens como durao do embarque, pausas durante a jornada de trabalho diria, possibilidade de adequao do perodo de frias aos interesses pessoais, so bastante citados pelos empregados como de relevncia na adaptao ao trabalho.

    A empresa, a partir dos dados da pesquisa, bem como de outros estudos efetuados, e visando facilitar a adaptao ao trabalho nas plataformas, tem dado nfase especial s reas:

    das comunicaes (facilitando o trato de assuntos familiares ou pessoais, atravs de sistemas modernos de telefonia);

    do transporte areo e fluvial (melhorando a qualidade, rapidez e segurana);

    da alimentao servida nas plataformas, especialmente nos aspectos de qualidade e paladar;

    dos cuidados de higiene nos camarotes e nas dependncias da plataforma em geral;

    das condies para o lazer. Os fatores que dificultam a adaptao ao trabalho

    nas plataformas, de acordo com os empregados so: 1) problemas no mbito familiar derivados do

    afastamento peridico do empregado e da conseqente dificuldade em atender s demandas de ordem prtica e emocional, alm da impossibilidade de estar presente em datas festivas e/ou importantes para a famlia;

    2) dificuldade de continuidade dos estudos; 3) dificuldade de integrao social; 4) dificuldades de comunicao com o mundo

    exterior (familiares ou pessoais); 5) preocupaes com a segurana do transporte

    para as plataformas (areo e fluvial); 6) adaptao a alimentao nas plataformas (tipo,

    qualidade, sabor); 7) sentimento de "confinamento" (espao

    limitado); 8) dificuldades com a adequao ao revezamento

    diurno/noturno. O salrio, vantagens financeiras e sociais, as folgas

    propiciadas pelo trabalho offshore, segurana no emprego e o grande porte da empresa so os aspectos considerados atrativos e facilitadores para a adaptao.

    O rudo o risco ambiental apontado em maior proporo pelos empregados, seguido da exposio s intempries e da vibrao. Em razo disso, alm do mapeamento das plataformas quanto ao nvel de rudo rotineiramente realizado, procede-se atualmente avaliao da dose a que esto expostos os empregados, com o objetivo de se tomar novas medidas corretivas porventura necessrias. O acompanhamento audiomtrico anual, atravs do exame mdico peridico, e informaes obtidas de 100% da populao embarcada sobre os danos causados pelo rudo, enfatizando as medidas preventivas, so atitudes rotineiras j h tempos adotadas. Outra providncia, recentemente empregada, a de manter os projetistas de novas unidades martimas, informados a respeito dos dados de rudos coletados e do Programa de Controle de Rudo.

    Quanto exposio s intempries, a meta tem sido a identificao e correo de situaes e/ou postos de trabalho em que seja possvel evitar ou atenuar essa exposio, como exemplo, o que j foi alcanado para o cargo de Torrista. Medidas de vibrao, determinando possveis locais mais crticos, pessoas expostas e dose de exposio, tm sido efetuadas, visando a estudos a respeito.

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    Outro dado que, de alguma forma, o prprio tempo ou a realidade do trabalho operam certa seleo, fazendo com que sejam transferidos os empregados com problemas de adaptao, ou que adoeam, ou at se acidentem, necessitando afastamentos e/ou reabilitao para trabalhar em outras funes.

    Na figura 7 apresentado um resumo das principais sugestes obtidas nas entrevistas exploratrias iniciais, feitas com 30 empregados, selecionados atravs de metodologia e critrios estatsticos.

    Quanto aos hbitos alimentares, na pesquisa confirmada a hiptese de uma maior prevalncia de obesidade entre a populao offshore, atravs da constatao de que entre aqueles que apresentam alterao de peso, a grande maioria relata, em mdia, mais de cinco quilos de ganho pondervel, independentemente do tempo de embarque. Contribui para isso, tambm, o sedentarismo. Apesar da afirmao de que os pratos preferidos pela maioria so carnes magras e verduras, os exames mdicos peridicos tm revelado um ndice preocupante de dislipedemia entre a populao.

    * Mdicos / Assistentes sociais / Psiclogos na plataforma * Exame psicolgico rigoroso na plataforma. * Embarque somente aps os cursos de Salvatagem, Primeiros Socorros, Segurana. * Alojamento e rea de lazer longe do local de trabalho *Maior remunerao para quem tem maior responsabilidade * Camarotes com 2 ou 4 pessoas: pessoal do mesmo turno * Aps o embarque ter um dia livre somente para adaptao * Melhores informaes pr-admissionais, superviso e acompanhamento * Mudana das escalas de trabalho 10 X 15 ou 7 X 4 * Melhoria das acomodaes * Banheiro na rea de trabalho * Aumento da idade mnima para embarcar (pessoas mais vividas) * Evitar cursos durante as folgas * Treinamento no trabalho com maior tempo * Freqncia maior de trocas de lenis e toalhas Figura 7 - Resultado da Entrevista Exploratria Sugestes do Pessoal Embarcado

    Como sabemos, o balanceamento diettico

    fundamental para a preveno das doenas metablicas do sistema cardiovascular e osteomuscular. Por conseguinte, a Companhia tem envidado esforos para que haja.

    o controle, por profissional especializado, dos cardpios servidos a bordo;

    o acompanhamento mdico rigoroso da populao embarcada, quanto aos ndices lipmicos e outros fatores de risco coronariano;

    informao contnua aos empregados quanto ao papel da alimentao na sade.

    No que se refere ao transporte areo, convm estabelecer medidas que permitam a melhoria da manuteno das aeronaves, divulgando as medidas tomadas e favorecendo, assim, uma maior confiabilidade por parte do usurio. Os hbitos de lazer mais freqentes na plataforma, durante o tempo livre, so a TV, o vdeo, os jogos de mesa, a leitura de jornais e revistas e o sono, evidentemente. Por conseguinte, a busca de informaes sobre o mundo externo, o repouso e o entretenimento com jogos mais leves so os mais procurados pelos empregados.

    A empresa utiliza os recursos convencionais de comunicao, como boletins informativos, do tipo Informando, Dialogando e, ainda, jornais como o da PETROBRS e da Bacia de Campos, como fonte de notcias sobre a instituio, para seus empregados.

    Quanto a avaliao de desempenho, a poltica vigente nas plataformas orientada de forma a premiar a competncia e incentivar o aperfeioamento.

    Periodicamente so provocadas reunies sistemticas na plataforma, por reas de trabalho e plenrias, com a presena de representantes, a fim de tratar de assuntos que interessem plataforma como um todo, bem como de necessidades setoriais.

    A partir dos dados pesquisados, podemos afirmar que o relacionamento entre os colegas nas plataformas avaliado como bom. Este relacionamento travado numa linha de horizontalidade, no mbito das vrias instncias, cargos e reas de trabalho. A avaliao que a competio entre os pares irrelevante. Na passagem de informaes no h m vontade dos colegas, e, nessa avaliao, no interfere o tempo de embarque dos empregados. Pode-se dizer que os fatores que mais determinam a existncia de boas relaes entre os pares, relacionam-se com a presena do desafio do trabalho e com o risco inerente atividade, o que imprime uma condio cooperativa nas relaes, no raro, evoluindo para o companheirismo e amizade. Este fato ameniza os efeitos da caracterstica bsica do regime que o Isolamento do meio social.

    O bom clima existente nas relaes horizontais contribui, indubitavelmente, para a permanncia dos empregados na plataforma, aparecendo como suporte para a superao de barreiras adaptao, representadas pela condio de trabalho confinado e pelo desgaste provocado por esse tipo de organizao da atividade produtiva.

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    VII - ASPECTOS RELEVANTES DAS RELAES FAMILIARES DOS TRABALHADORES OFFSHORE

    Considerando aspectos de ordem scio-econmica e

    familiares, relevante destacar que os empregados embarcados residem, prioritariamente, fora de Maca, cidade onde se encontra a base da companhia qual esto subordinados, em casa prpria ou em fase de aquisio, via financiamento.

    Aps o desembarque e com o deslocamento at a residncia, cerca de metade dos empregados leva, segundo sua avaliao, dois dias para se sentir bem disposta.

    No que diz respeito composio familiar, os empregados em geral tem vida conjugal, sendo casados ou no, e apenas uma pequena parcela separada ou divorciada.

    O nmero mdio de filhos de trs, com faixa etria de at dez anos, o que sugere a necessidade de acompanhamento mais prximo dos pais, no que tange ao desenvolvimento emocional, fsico e mental, fato que impe demandas prticas e afetivas.

    A renda familiar, de um modo geral, est baseada, fundamentalmente, nos proventos do empregado.

    De modo geral, o tipo do relacionamento familiar vivido pelos empregados harmonioso ou apresenta problemas ocasionais. Ao contrrio do que poderia sugerir, devido ao desgaste, no se verificou a inter-relao entre a qualidade das relaes familiares e o tempo de embarque.

    Na qualificao do relacionamento conjugal, especificamente o sexual, predomina a avaliao entre tima e boa e no se confirma a hiptese de que o tempo de embarque contribuiria para disfunes nessa rea.

    Ainda que as respostas evidenciem a predominncia de relacionamentos familiares slidos e equilibrados, preciso considerar que fatores culturais e psicolgicos podem interferir nas respostas de cunho mais ntimo, podendo mascarar possveis problemas e evitando,

    assim, o estabelecimento de relaes e associaes entre eles.

    Dentre as preocupaes que ocorrem antes do embarque, destacam-se aquelas relativas manuteno da famlia, tais como, contas a pagar, controle das finanas e outras providncias.

    As alteraes, no perodo que antecede o embarque, so indicadores de adaptao, pois os mais tranqilos e que raramente so acometidos de insnia so os trabalhadores adaptados ao trabalho, ao passo que os empregados que relatam maiores dificuldades de se manterem no regime indicam tenso e dificuldades de sono. Contudo, no se verifica a hiptese de que o momento que antecede o embarque comprometeria a qualidade das relaes familiares, apontadas como harmoniosas ou ocasionalmente alteradas.

    A tica do empregado sobre as possveis alteraes na dinmica do grupo familiar, em decorrncia do processo cclico de afastamento e reinsero no meio familiar, aponta para o fato de que a famlia tende a enfrentar de modo autnomo os problemas. Predomina a concepo de que esta entende e colabora, ou entende mas tem dificuldade de colaborar, no sentido de diminuir entraves relao ou equacionar as necessidades ou providncias derivadas da manuteno da famlia.

    O comportamento das famlias diante de situaes que demandem decises e providncias durante o embarque, geralmente de consultar pelo telefone ou dar soluo por conta prpria e, posteriormente, comunicar ao empregado. A atitude predominante de enfrentar com independncia situaes que poderiam comprometer a tranqilidade dos empregados na plataforma ou at gerar interrupo do perodo de trabalho. Este comportamento pouco se altera em relao ao grau de qualidade do relacionamento. Mesmo experimentando relaes conflituosas, os empregados avaliam que a famlia coopera, ainda que em menor grau comparativamente aos que atestam vivenciar relacionamento harmonioso ou apenas ocasionalmente problemtico.

    De modo geral, o relacionamento pouco conflituoso e o enfrentamento com relativa autonomia das situaes que demandem decises e providncias durante o perodo de embarque, por parte da famlia, indicam que as posies assumidas por ela no constituem fator que dificulte a permanncia do empregado no regime.

    Considerando o conjunto de situaes familiares de seus empregados embarcados, a empresa tem procurado desenvolver um trabalho junto s famlias, visando a:

    implantao do projeto "Famlia e Trabalho OffShore", que prev visitas de familiares para conhecimento da realidade de trabalho,

  • Arlindo Antonio de Souza

    CADERNO DE PESQUISAS EM ADMINISTRAO, SO PAULO, V. 1, N 3, 2 SEM./1996 8

    estimulando expresso e avaliao por parte dos visitantes;

    conhecimento das condies de trabalho pelo grupo familiar, atravs de fitas de vdeos sobre o trabalho offshore para serem emprestados aos empregados, em especial aos que residem mais distante da base;

    informativos s famlias, contendo textos selecionados;

    levantamento da viso da famlia sobre o embarque e suas repercusses, atravs de pesquisa e opinies;

    abordagem do tema "Famlia e o Trabalho no Mar nos programas de acompanhamento da adaptao do empregado, levantando as possveis dificuldades e buscando definir estratgias de enfrentamento pelos empregados, atravs de trabalho grupa conduzido por assistente social e psiclogo.

    Como concluso importante citar, ainda, trs aspectos relevantes:

    1) a eliminao ou minimizao dos aspectos negativos do trabalho offshore tem sido um objetivo buscado por todos;

    2) os cursos de desenvolvimento de superviso e os crculos de controle de qualidade, periodicamente realizados nas plataformas, tm-se constitudo em importantes fruns para melhoria contnua e Otmizao do processo de trabalho;

    3) a Otmizao vista como a busca de uma maior eficincia, com o menor custo possvel no apenas Econmico, mas tambm Humano e Ambiental.

    Finalizando, cabe ressaltar que, embora haja um sentimento generalizado, por parte das pessoas, de que o trabalho em plataforma mais perigoso que em outras atividades, na verdade, muito embora esta atividade possua caractersticas muito peculiares, como as .que acabamos de ver, as condies de trabalho so, em geral, muito seguras e a ocorrncia de acidentes rara.

    AGRADECIMENTOS:

    PETROBRS por permitir a divulgao deste trabalho;

    SANDRA MARIN PEREIRA, assessora da Vice- Presidncia da BRASPETRO, pela valiosa colaborao fornecendo subsdios para este trabalho;

    PRAZERES AUGUSTA, pelo apoio, reviso, dedicao e interesse demonstrados.

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS:

    AMARU, A. C., Gerncia de trabalho de equipe, So Paulo: Pioneira, 1987.

    CIGNOLLI, Alberto, Estado e Fora do Trabalho, So

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    DEJOURS, C., A loucura do trabalho, So Paulo,

    1988. DUTRA, J. S., Administrao de carreiras: Uma

    proposta para repensar a gesto de pessoas, tese apresentada na FEA/USP em 1993.

    LAURELL, Ana Cristina e Noriega, Processo de

    produo e sade, So Paulo, 1989. PEREIRA, S. M. & DIAS, S. T. & SOARES, S., Perfil

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    PETROBRS; O petrleo e a PETROBRS em

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    RUTENFRANZ, J. & KNAUTH, P., Schichtarbeit und

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    TONNIES e outros; Dialtica da Famlia, So Paulo:

    Editora Brasiliense, 1982. VERAS, Renato e outros, Sade e trabalho no Brasil,

    Rio de Janeiro: Editora Vozes, 1983.