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Natal Monico

PERDIDO NA

MULTIDÃO

Primeira Edição

São Paulo 2013

Natal Monico 5

Perdido na Multidão

Romance

Primeira Parte

Luís Antônio acabara de tomar banho e colo-

cara uma bonita roupa esportiva, o perfume que usava era discreto, porém, delicioso, como diriam mais tarde duas das diversas garotas que, com ele, costumavam passar algumas horas nas baladas das noites paulistanas. Deu mais uma olhada no espelho para ter certeza de que tudo estava combinando; sorriu e disse para si mesmo: – Luís Antônio, hoje não tem pra ninguém, e se aquela tal da Amanda vacilar hoje eu traço ela. – Parecia que tudo estava certo, mas, Faltava o principal, dinheiro. Enfiou a mão no bolso e retirou algumas cédulas, achou que era muito pouco para a noitada que o esperava lá fora.

Luís Antônio desceu os degraus da escada de dois em dois certo de que encontraria sua mãe na cozinha verificando se Eunice, a nova empregada, realmente sabia cozinhar. Mas a doméstica estava sozinha e só sabia que dona Laura, a patroa, havia subido e provavelmente estaria em seu quarto ou arrumando o quarto de hóspedes. Ele voltou para a sala e do pé da escada, chamou:

Mãe, mãe, onde foi que a senhora se escondeu?

Estou aqui em cima arrumando o quarto de hóspedes, seu tio Amauri vem passar uns dias aqui com a gente, o que você quer?

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Estou precisando de uma grana para colocar gasolina no carro, há dias que o coitado está andando somente com o cheiro.

O que foi que você fez com o dinheiro que eu lhe dei ontem? Sobe aqui, Luis Antônio, eu não gosto de conversar aos gritos.

Tem dó, né, mãe, esta escada tira o fôlego da gente, joga o dinheiro pelo vão que eu pego aqui.

Nada disso, Luís Antônio, dinheiro não tem asas e nem dá em árvores, eu quero saber o que você fez com o que eu lhe dei ontem. Você está pensando que eu já me esqueci?

Que é isso, mãe? A senhora está regulando uma merreca, carro nenhum anda sem combustível, sabia? Caramba! Como esta escada cansa! Vou ficar todo suado! Por que o papai não compra uma casa térrea, esta escada é de doer!

Eu que sou bem mais velha que você subo e desço essa escada várias vezes ao dia e não reclamo. Você não acha que ainda é muito jovem para ficar sem fôlego desse jeito?

Deixa pra lá mãe, e essa grana vai sair ou não vai? Já estou meio atrasado.

Isso lá é jeito de falar comigo, Luís Antônio? Eu sou sua mãe, não sou nenhuma dessas namoradinhas com quem você anda por aí.

Mãe, a senhora está regulando uma mixaria, depois se a senhora quiser pode até descontar da minha mesada.

Você ainda não me respondeu, eu quero saber o que foi feito do dinheiro que eu lhe dei ontem, você disse que era para colocar gasolina no carro. Não vai querer me dizer que gastou um tanque cheio de ontem para hoje, eu também tenho carro e sei muito bem que isso não seria

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possível, a menos que tivesse feito uma viagem o que não foi o caso, não é, Luís Antônio?

Que marcação, hem, mãe? Está bem, eu nem cheguei a ir ao posto, encontrei com o Wagner ele estava aflito procurando alguém que pudesse inteirar o dinheiro para pagar a mensalidade da faculdade. Não teve jeito mãe, emprestei o dinheiro para ele.

Que história mais esquisita é essa, Luís Antônio? Pelo que você me disse certa vez a família dele está quase tão bem quanto a nossa, essa história está muito mal contada, conta outra porque nessa eu não acreditei.

Mas é a pura verdade mãe, o Wagner tinha o dinheiro, mas ele gastou a metade com umas garotas e aí já viu, faltou para pagar a mensalidade da faculdade.

Mas olha só que sem vergonha! Esse tal de Wagner não tem juízo mesmo! Onde já se viu gastar o dinheiro da mensalidade!? Mas que falta de responsa-bilidade! Você que não me faça isso nunca, ouviu, Luís Antônio?

É que pintou umas garotas novas no pedaço e sabe como é não dá para dar uma de durango, pega mal a gente tem que ter uma grana pra fazer uma presença. Quanto à faculdade pode ficar tranquila, porque o papai sempre paga com cheque nominal e cruzado.

Pintou garota nova no pedaço, durango, grana, é esse o tipo de linguajar que você está aprendendo na faculdade? Parece que o dinheiro que seu pai está investindo em você não está sendo bem aproveitado.

Essa é a linguagem dos jovens, mãe, a senhora é que está ficando desatualizada.

Quando é que esse rapaz vai lhe devolver o dinheiro? Isto é, se é que vai devolver o que eu duvido muito.

Tem dó, né, mãe, amanhã ou depois ele faz uma presença com uma garota legal e aí fica tudo certo.

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Presença? Sei! De presença em presença ele vai tirando o seu dinheiro. Abre esse olho, Luís Antônio!

Mãe, a senhora está fugindo do assun- to, dá logo essa grana porque eu já estou atrasado.

Vê lá o que você vai fazer, Luís Antônio. E não me volte aqui tão cedo pedindo mais dinheiro para abastecer o tanque do carro.

Mãe, gasolina não dura para sempre uma hora ela acaba, a senhora já esqueceu que a faculdade fica lá do outro lado da cidade? Entre ir e voltar dá mais de trinta quilômetros.

Eu sei muito bem disso, mas fique você sabendo que o dinheiro não dá em árvore, e vê se controla esse interesse por essas garotas e pense um pouco mais nos estudos. E por falar em estudo, como é que você está indo na faculdade? O seu irmão me dá notícias quase todos os dias, mas, você!

Está tudo bem, mãe, estou levando numa boa pode crer.

Isso é tudo o que você tem para me dizer? Seu pai paga uma faculdade cara como essa e você diz que está levando numa boa! O que você está querendo dizer com isso?

Que saco, mãe! A senhora tirou o dia para pegar no meu pé? Tem dó, dá licença que eu estou tirando o meu time de campo. A senhora está ficando mão de vaca, isto aqui não dá nem para comer um sanduíche na esquina!

Pois é, meu filho, vai se contentando com isso, fique sabendo que o seu irmão não gasta a metade do que você vem gastando ultimamente.

Ele é mais novo, né, mãe, meu irmãozinho ainda não sabe o que é bom, vai ver até que o menininho ainda é virgem, mas, fica fria um dia ele ainda chega lá.

Eu não sei desses particulares, mas se ele ainda for virgem melhor para ele, hoje em dia não dá para

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confiar nessas menininhas assanhadas com essa maldita AIDS invadindo nossas famílias, e você sabe muito bem que essa doença não escolhe suas vítimas, ela simplesmen- te se instala naqueles que se julgam imunes a ela. Por isso que eu lhe digo, Luís Antônio toma cuidado vê se controla esse fogo. Às vezes, essa doença vem de onde a gente menos espera, um corpo bem feito, um rostinho bonito e muito assanhamento, esse é o caminho mais curto para uma doença incurável. Você já viu algum homem gostar de mulher feia? Tenho certeza que não e é por essa razão que as mulheres bonitas estão mais expostas as doenças ve- néreas, porque são as mais procuradas.

O que é isso, mãe, a senhora está querendo me assustar? Fica fria porque eu sei onde amarro o meu burro.

Não estou querendo lhe assustar, somente estou querendo abrir os seus olhos, bem faz o seu irmão ele sim está cuidando do futuro. É melhor ser virgem do que se arriscar a carregar no sangue essa doença maldita.

Quanto a isso pode ficar tranquila, porque eu sei como me cuidar.

Espero que saiba mesmo. Por falar nisso você está levando preservativos?

Claro, né, mãe, vai ver a quantidade de preservativos que tem lá no porta luvas do carro.

Preservativo se leva no bolso, na carteira, na bolsa, não é para ficar em porta luvas de carro.

Estou indo, mãe, não me espere tão cedo. Você não vai esperar o jantar? Não, mãe, não vou, mas pede para a empre-

gada deixar alguma coisa na geladeira se eu chegar com fome eu como.

“Ah! Esse menino! Preciso ter uma conversa com o pai dele, não sei como vai com os estudos, não sei

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por onde anda, não sei com quem anda e nem o que faz por aí. Eu pensei que a idade o fizesse pensar como adulto, mas continua o mesmo de sempre parece que ainda não cresceu, tem corpo de homem, mas o juízo é de um moleque. Ah, meu Deus! Como eu gostaria que ele fosse como o Luis Fernando, mas fazer o que se nem os dedos das mãos são iguais”.

Segunda Parte

Com licença, dona Laura. Ai que susto, Eunice! Eu estava tão entretida

com os meus pensamentos que nem a percebi. O que você quer?

O Dr. Olegário disse que ia entrar no banho e pediu para a senhora ir falar com ele se possível agora.

Já sei é sempre a mesma coisa, escolher a roupa que ele vai usar, hoje é dia de reunião no clube eu tinha me esquecido disso. Deixa ir logo antes que ele molhe tudo com aquela mania de sair do banho direto para o quarto ainda com água escorrendo pelo corpo.

Alguns minutos depois, dona Laura, já estava no quarto escolhendo a roupa que o marido iria usar aquela noite.

Do banheiro, Olegário perguntou: – É você, Laura?

Claro! Quem mais poderia ser? Sei lá! À Eunice, talvez com algum recado.

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Você sabe muito bem que à Eunice não entra neste quarto quando você está em casa. Ela trás um trauma do último emprego, você já conhece a história.

É eu sei, mas você acredita mesmo que foi do jeito que ela contou?

E por que não acreditaria? Mas... Logo o Osmar!? Não sei, mas tem

qualquer coisa errada nessa história. Não tem nada de errado. Errado estava o

Osmar quando fez aquilo. Laura, eu custo a acreditar que aquilo tenha

realmente acontecido. Pois pode acreditar, meu velho, à Flávia,

filha mais nova dele foi testemunha. Eu não entendo, com tanta mulher no mundo

tinha que ser logo com a empregada? Uma matuta que eles foram buscar lá no interior de Minas Gerais!

É matuta, mas, é mulher na flor da idade e bonita, o que mais precisa para interessar um homem?

Bonitinha, mas não para chamar a atenção de um homem como o Osmar.

Você já ouviu falar que em tempo de seca muita gente bebe água em poça feita por pata de cavalo? Pois é, foi o que ele alegou. Depois que à Lúcia, mulher dele perdeu o pai e a mãe naquele acidente caiu em de- pressão, e com depressão não tem mulher que funciona. Foi lamentável o fato de ter acontecido dentro de casa e a força, segundo as próprias palavras de Eunice. Ela me disse que já não era mais virgem, mas de qualquer maneira foi um estupro. A coitada pensou muito antes de aceitar vir tra- balhar aqui, tanto é que só sobe para arrumar os quartos quando não tem nenhum homem dentro de casa. Com você e com o Luís Fernando estou tranquila, mas você conhece o Luís Antônio, eu preciso estar sempre muito atenta.

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Bem, vamos deixar isso pra lá. Escolhe uma roupa bem leve porque eu estou achando que esta noite vai ser tão quente quanto à de ontem.

Já está tudo separado e não me saia daí pingando água. A toalha está no cabide da porta.

Obrigado, Laura querida, não sei o que seria deste pobre homem sem você!

Fingido! Desculpe, eu me enganei, na verdade eu

queria dizer: – Não sei o que seria desta pobre criatura se não fosse eu.

Palhação! Toma, vê se você se enxuga direito, não me venha fazer molhadeira aqui no quarto.

Brincadeirinha, minha querida, você sabe muito bem que se não fosse você escolher minhas roupas eu sairia por aí mais colorido do que porta-bandeira de escola de samba, combinar roupa não é comigo, eu acho tudo isso um saco.

Nem roupa, nem meias e nem sapatos, ainda bem que você reconhece.

Laura, você está sabendo quem vai ao clube esta noite?

Não tenho a mínima idéia, aquilo mais parece o clube do bolinha.

Nada mais nada menos do que o vice-prefeito acompanhado de dois ou três secretários. Nós pedimos uma melhoria para as imediações do clube, aquilo está uma miséria, a praça virou um depósito de entulho e de lixo, a rua tem mais buracos do que queijo suíço. O homem vem para ver o que pode fazer, nós temos que aproveitar para pedir agora que as eleições estão próximas.

Olegário, por acaso você já viu vice fazer alguma coisa?

Não, mas esse aí vai nos visitar a pedido do prefeito.

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Não seria melhor se o próprio prefeito comparecesse?

Seria, Laura, mas ele foi para Brasília tentar conseguir uma verba para poder pagar uma empreiteira que ganhou uma ação na justiça. Era uma ação que estava rolando há mais de quinze anos e a quantia é muito alta.

Como é que pode! Uma capital como São Paulo ter que mendigar empréstimo ao governo federal?

Fazer o quê, Laura? São coisas da política. Olegário, hoje eu preciso que você me dê um

tempo para conversarmos sobre nosso filho Luís Antônio. Laura vamos deixar essa conversa para

amanhã, eu estou em cima da hora e você sabe que detesto chegar atrasado para um compromisso.

Está bem, amanhã antes de descermos para o café a gente conversa. Você podia comer um pouco antes de sair, à Eunice fez aquela lasanha de berinjela que você tanto gosta.

Agora não, Laura, eu como qualquer coisa lá no clube, mas deixe um pouco na geladeira na volta eu como. Ah! Mas, esconde, antes que aqueles dois comilões não deixem nem o cheiro da lasanha para mim.

Pode deixar, vou reservar um bom prato para você, vá com Deus, querido.

Dona Laura afastou as cortinas de uma ampla janela e ficou observando o carro de Olegário que se afas- tava lentamente. Quando as luzes das lanternas desapare- ceram ela puxou as cortinas e cuidadosamente alinhou-as no centro da janela. Depois se dirigiu à cozinha onde encontrou a empregada separando a louça que seria usada durante o jantar.

– Ponha a mesa somente para dois, o Olegário não vai jantar em casa e o Luís Antônio só deve chegar de madrugada como tem acontecido ultimamente. Somente

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Luís Fernando e eu vamos jantar daqui a pouco e eu ainda vou tomar banho e o Fernando também, mas, ele ainda não chegou, portanto, é melhor você fazer o seu prato e jantar, nós ainda vamos demorar um pouco.

Obrigada, dona Laura, mas eu só vou jantar porque o meu prato está feito desde a hora do almoço. Eu precisava lavar as panelas, por isso, juntei todas as sobras e fiz um belo prato, eu tenho dó de jogar comida fora.

E se não tivesse sobrado comida, o que é que você faria?

Eu esperaria a senhora e o Luís Fernando se servirem primeiro, eu aprendi que as travessas devem ir para a mesa sem que o seu conteúdo esteja mexido.

Você está certa, a comida que vai à mesa não deve parecer sobra, porém, nada impede que antes de colocá-las nas travessas você faça o seu prato. Mas, é claro que as que forem feitas nas próprias travessas não devam ser mexidas.

Obrigada, dona Laura. Eu acho que o Luís Fernando está chegando, ouvi o barulho do carro dele.

Você tem razão eu vou aproveitar e subir com ele, daqui a pouco a gente desce. Pode esquentar sua comida e jantar, você não é obrigada a comer fora de hora só porque nós não temos hora certa para as refeições.

Está certo, dona Laura, obrigada. Eu vim do interior e ainda não estou adaptada aos costumes daqui.

Dona Laura esperou Luís Fernando entrar e

após cumprimentarem-se e abraçados subiram a escada que levava ao andar superior, e cada um seguiu para os seus aposentos. Quarenta minutos depois se sentavam à mesa e durante o jantar dona Laura tentava especular o filho sobre a conduta de Luís Antônio. Porém, não conseguiu quase nada, pois somente o interesse pelas garotas que fre- quentavam as tais baladas era do seu conhecimento. Isso

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Luís Antônio não escondia do irmão talvez com o intuito de provocar inveja em Fernando.

Na verdade Luis Antônio sentia prazer em relatar com minúcias todas as aventuras amorosas que sempre terminavam em algum hotel. O jovem não cansava de se gabar quando falava das inúmeras virgens que já havia deflorado, e maliciosa e maldosamente perguntava ao irmão quantas ele já havia feito. Luís Fernando, impassível, dizia sempre que estava mais interessado em seu futuro e que as mulheres podiam esperar, porque naquela altura de sua vida elas somente iriam atrapalhar. Luís Antônio ria e dizia: – Cuidado maninho já tem menina achando você meio esquisito, só que na verdade elas estão pensando e querendo dizer outra coisa. – Luís Fernando sabia que seu irmão só estava querendo mexer com os seus brios, por isso, não deixava a conversa progredir nesse rumo e contra-atacava com perguntas sobre a faculdade, e qual seria o rumo que ele daria a sua vida depois de formado. Isso punha fim à conversa quase que instantaneamente.

Luís Fernando tinha dúvidas quanto ao interesse do irmão sobre o futuro. Sabia que ele somente queria curtir o presente, e o seu presente era dinheiro no bolso e mulher na cama, mas isso ele não iria falar para a mãe, deixá-la ainda mais preocupada seria a última coisa que ele faria na vida. Na verdade ele não sabia se existia algo mais que pudesse desabonar a conduta do irmão. A conversa continuou e Dona Laura falava de Olegário que andava muito animado com a possibilidade de vir a ser eleito o novo presidente do clube. Falava também da visita do vice-prefeito com vistas à reurbanização da praça, e o recapeamento do asfalto das ruas próximas ao clube. Em certo momento, perguntou: – Você conhece o Wagner?

De que Wagner a senhora está falando? Eu conheço pelo menos uns três.