Pensando a sustentabilidade: A economia colaborativa como...
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Pensando a sustentabilidade: A economia colaborativa como inovação no pensamento
socioeconômico
ROBSON PARENTE RIBEIRO1
1. Introdução
Este trabalho tem como foco o debate sobre a sustentabilidade. Todavia, seu
principal objetivo é sair da viseira em que se encontra nosso modelo atual de sustentabilidade
(baseado na valoração econômica) e passa a adotar um posicionamento novo, a partir do qual
podemos pensar em um modelo econômico diferenciado e que possa se adequar as exigências
do planeta, que agoniza pela preservação de seus recursos naturais.
Iniciamos nossa pesquisa na constatação de que o câncer da nossa sociedade é o
consumo irresponsável e a noção de propriedade privada nos moldes da nossa sciedade
capitalista. Entendendo que o conceito de propriedade possui uma conotação negativa apenas
quando colocado ao lado da palavra indivíduo (vide casos recentes da corte interamericana
onde se assume a existência da propriedade comunal dos povos tradicionais2), é possível
observar que não é a noção de propriedade a causadora dos males, mas sim o traço
individualista de nosso sistema. Deste modo, busca-se no compartilhamento a solução para
nossa crise econômica/sustentável mundial. O grande exemplo concreto a ser tratado aqui será
o Uber (juntamente com aplicativos como Airbnb, netflix e iTunes) que representam não
apenas uma mudança na gestão de negócios com o uso de novas tecnologias, mas em verdade,
uma mudança no nosso modo individualista de observar a propriedade, como nossos Carros
(Uber), Casas (Airbnb) e até mesmo entretenimento (Netflix, iTunes). Buscamos refúgio em
nomes como Fritjof Capra3 para embasar a necessidade de um novo pensar sobre a resolução
de nossos problemas atuais, bem como na legislação pátria acerca da matéria ambiental,
ferramentas internacionais que visam a adequação econômica de recursos ambientais como
1 Advogado, Mestrando em Direito Ambiental na Universidade do Estado do Amazonas – UEA, Pesquisador
bolsista pela Comissão de Aperfeiçoamento de Pessoal do Nível Superior – CAPES. 2 2 No caso Comunidade Mayagna (SUMO) Awas Tingni vs Nicaragua, a corte interamericana de Direitos
Humanos, no dia 31 de agosto de 2001, reconheceu de forma brilhante o dispositivo da Propriedade comunal, alargando assim o conceito deste dispositivo tradicionalmente individualista e econômico, atrelando ao conceito de ancestralidade dos povos tradicionais, remontando assim a noção de propriedade para a coletividade. 3 Físico teórico e escritor, que desenvolve trabalhos na promoção da educação ecológica, escreveu o livro
Ponto de Mutação, aonde ele compara o pensamento cartesiano ao paradigma emergente no século XX, o qual é reducionista e modelo para o método científico desenvolvido nos últimos séculos, frente ao modelo holístico ou sistêmico, o qual vê o todo como indissociável, portanto o estudo das partes não permite conhecer o funcionamento do organismo como uma complexidade plena. As comparações são feitas em vários campos da cultura ocidental atual, como a medicina, a biologia, a psicologia e a economia.
ferramenta de proteção e mitigação de poluição para fins de sustentabilidade, bem como uma
breve pesquisa na área do direito digital, onde se aprofunda parte do trabalho em questão.
Desta forma, concluímos que a sociedade da informação4, na qual vivemos hoje,
buscou em si mesma, com o auxílio da tecnologia atual, fomentar as ferramentas necessárias
para resolver a questão da sustentabilidade, enunciando a mudança na filosofia mundial,
iniciando um processo que parece não ter mais volta, felizmente rumo à sustentabilidade.
2. Sustentabilidade e uma breve introdução à Valoração Econômica do Recurso
Ambiental - VERA.
Sustentabilidade é um termo usado para definir ações e atividades humanas que
visam suprir as necessidades atuais dos seres humanos, sem comprometer o futuro das
próximas gerações. Ou seja, a sustentabilidade está diretamente relacionada ao
desenvolvimento social, econômico e material sem agredir o meio ambiente, usando os
recursos naturais de forma inteligente para que eles se mantenham no futuro, visando a saúde
e como reflexo da preocupação com as gerações futuras.
A Valorização Econômica do Recurso Ambiental (VERA) é, como o próprio nome
sugere, a monetização dos recursos ambientais. Mais do que valorar um bem específico e
incitar uma regulação de mercado específica (como no caso do carbono), a VERA busca a
adequação da gestão empresarial à realidade socioambiental de hoje, na qual o gestor deve
buscar mensurar o valor econômico de ativos ambientais que devem ser levados em
consideração ao final do balanço orçamentário, viabilizando futuros investimentos sem
prejudicar o setor financeiro, o que em tese procura criar uma abordagem técnica para o
discurso, muitas vezes apenas no campo das paixões, de forma a fomentar dentro da própria
gestão financeira o conceito de sustentabilidade como uma ideia economicamente promissora.
A análise surge, portanto, da necessidade de adequação do bem ambiental à realidade
do sistema financeiro e de custas, em especial no que tange à compensação econômica pela
degradação de bens ambientais, o que por óbvio leva à dificuldade de acesso a tal recurso a
longo prazo (os recursos naturais são limitados). Portanto, isto gera uma “externalização de
custos”, isto é: quando os custos da degradação ecológica não são pagos por aqueles que a
geram, estes custos são externalidades para o sistema econômico, ou seja, custos que afetam
4 Termo criado por Fritz Machlup em 1933, poe meio de seu lviro “The production and distribution of
knowledge in the United States”. Atualmente considera o dinamismo da comunicação atual, em rede, incluindo aí o meio ambiente cibernético, e como este meio transforma nossa sociedade culminando no boom dos aplicativos e da tecnologia atual.
terceiros sem a devida compensação. Atividades econômicas são, desse modo, planejadas sem
levar em conta essas externalidades ambientais e, consequentemente, os padrões de consumo
das pessoas são forjados sem nenhuma internalização dos custos ambientais. O resultado é um
padrão de apropriação do capital natural onde os benefícios são providos para alguns usuários
dos recursos ambientais sem que estes compensem os custos incorridos por usuários
excluídos. Além disso, as gerações futuras serão deixadas com um estoque de capital natural
resultante das decisões das gerações atuais, arcando os custos que estas decisões podem
implicar.
A VERA é avaliada a partir de uma equação simples: VERA = Valor de uso (VU) +
Valor de não-uso (VNU). Todavia, o valor de uso é ainda subdividido em Valor de Uso
Direto (VUD), Valor de Uso Indireto (VUI) e Valor de Opção (VO), o que resulta na seguinte
equação: VERA= (VUD+VUI+VO) + VE. Existem ainda modelos que visam a adequação da
gestão e da atividade econômica à valoração do Recurso Ambiental que se organizam em
função de produção e demanda.
Claramente, a VERA é um método que busca adequar a diminuição dos recursos
ambientais e sua consequente “raridade” à realidade econômica. Trata-se de inserção de uma
nova modalidade de mercado, que seria receptível aos bens ambientais. A teoria é linda, cheia
de detalhes e complexidades extremamente charmosas, mas a prática já ocorreu no passado.
Embora seja muito fácil deixar passar batido, a primeira grande commoditie foi o ouro, e os
minerais possuem hoje o mercado de pedras preciosas para regulamentar seu preço,
facilitando a gestão de valores. Em nada ajudou a sustentabilidade, em nada ajudou a
preservação de minérios, pelo contrário: Estimulou nosso expansionismo para procurar
riquezas e recursos no subsolo, ou até mesmo entre as estrelas. Não há motivos para acreditar
que será diferente após a monetização dos recursos ambientais, o próprio cerne da questão
gira m torno da dificuldade da gestão administrativa e da economia em perceber estes
recursos. Todas as fontes de referência citavam a adequação do bem ambiental à economia, e
deveria ser o contrário: O cerne de aplicar a sustentabilidade é adequar a economia ao planeta.
Devemos sair da zona de conforto e atacar diretamente a causa do problema, modificando
nosso modelo econômico.
Para entender melhor como a inserção e um bem ambiental pode ser prejudicial para
a preservação, ao invés de cooperar com a sustentabilidade, olhamos para o direito
internacional ambiental e observamos a dinâmica dos Créditos de Carbono, os quais se
iniciam com uma sofisticada adaptação do bem difuso para uma mensuração e criação de
títulos de crédito, negociáveis entre estados, criando uma política de amortecimento de
emissão de gases, que visava a redução das emissões. Vamos entender como esta iniciativa
falhou miseravelmente e como é possível observar que toda e qualquer forma de valoração
econômica tende a falhar, unicamente por atacar o sintoma ao invés da doença: Nosso modelo
econômico e a sociedade de consumo.
3. O Protocolo de Quioto: O controle da emissão de gases e o surgimento do Mercado de
Carbono (decreto 5.445 de 12 de maio de 2005)
A eterna disputa entre o desenvolvimento vs a preservação ambiental é antiga. Na
metade do século passado, quando o Clube de Roma se reuniu pela primeira vez em 1966 (6
anos antes da lendária Conferência de Estocolmo), seus objetivos não eram exatamente
ambientalistas ou sustentáveis (a própria noção de sustentabilidade era precária na época). O
que realmente motivava a máquina industrial a discutir a questão ambiental era a
possibilidade de ver extintas suas matérias primas, e isso precisava ser debatido e acordado
para evitar maiores danos futuros. Já naquela época, no nascedouro dos debates ambientais,
surgia a preocupação econômica em paralelo com a preservação ambiental, de forma que
nossas noções de preservação e sustentabilidade sempre guardaram uma relação de
incompatibilidade entre si.
Com a evolução dos debates ambientais, chegamos em 1992 e o evento sediado no
Rio de janeiro que ficou conhecido como ECO-92. Da ECO-92 ficou consagrado o princípio
do poluidor-pagador, o qual consistia no ônus, por parte do poluidor, de arcar com a reparação
de eventuais danos ao meio ambiente, efetivando a compensação econômica do bem
ambiental. Mais recentemente, podemos citar o princípio do preservador-recebedor, o qual
consagra que aquele que preserva e mantem intacto o meio ambiente, deve receber por este
serviço. De igual forma em 1997 o Protocolo de Kyoto criou o que ficou conhecido como
“Mercado de Carbono”, consistindo na criação de um teto de emissões de carbono, o qual
deveria ser respeitado pelos países signatários. O interessante ali era a possibilidade de
permuta do “excedente de ar puro” entre os países signatários (normalmente entre o excedente
dos subdesenvolvidos para os desenvolvidos, que não podem parar sua indústria), o que
possibilitaria, sem entrar em detalhes técnicos os quais não são o objetivo deste texto,
negociar direitos de emissão de gases em troca de um pagamento equivalente, dando razão à
frase “Se vocês querem que sejamos limpos, nos paguem o sabão”, mantra dos países
subdesenvolvidos dos anos 90. Usaremos estes dois exemplos como base para explicar a
razão da abordagem negociada desde a ECO-92 não culminar em resultados promissores no
que diz respeito à conciliar a valoração econômica do bem ambiental com a preservação e
manutenção da qualidade ambiental.
Para cuidar de um dos temas específicos abordados na UNFCCC, foi formalizado em
1997 o Protocolo de Quioto à Convenção-Quadro das Naçoes Unidas sobre Mudança do
clima. Posterior, o protocolo visava ser o instrumento jurídico apto à regular a emissão de
gases poluentes na atmosfera, em especial os provenientes da queima de combustíveis fósseis.
O Protocolo de Quioto foi inserido no ordenamento jurídico brasileiro através do decreto
5.445/2005.
O protocolo de Quioto possui políticas de redução de emissões dos principais gases
poluentes, quais sejam: Dióxido de Carbono (CO2), Metano (CH4), Óxido Nitroso (N2O),
Hidrofluorocarboneto (HFCS), Compostos Perfluorados (PFCS) e Hexafluoreto de Enxofre
(SF6). Desta forma, os países que ratificarem o protocolo de quioto devem combater a
emissão destes gases em específico a partir da entrada em vigor deste protocolo. Todas estas
substancias estão listadas no Anexo A do Protocolo de Quioto5.
Para entrar em vigor, este protocolo deveria reunir 55 países, que representassem
55% das emissões globais de gases de efeito estufa, o que só aconteceu depois que a Rússia o
ratificou em Novembro de 2004. Portanto, entrou em vigor no dia 16 de fevereiro de 2005,
sendo incorporado no ordenamento jurídico brasileiro em 12/05/2005, através do Decreto nº
5.445.
Todavia, todas as negociações para a redução das emissões de gases ainda estavam
viciadas pelo mesmo pensamento que norteou a declaração de Estocolmo em 1972, qual seja:
Mercado. Economia. Desenvolvimento. Este pensamento se reflete também nas políticas que
seriam adotadas pelos países signatários do protocolo de Quioto. Surge o “Mecanismo de
Desenvolvimento Limpo – MDL”, codificado no art. 12 do decreto 5445/05. Em verdade,
cumpre destacar que O Mecanismo de Desenvolvimento Limpo – MDL teve origem na
proposta brasileira apresentada em maior de 1997 ao Secretariado da Convenção em Bonn, na
Alemanha6.
5 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2005/Decreto/D5445.htm, acesso em 29 de
setembro de 2014. 6 MARCHEZI, Roberta da Silva Monteiro; AMARAL, Sérgio Pinto. O Protocolo de Quioto e o Mecanismo de
Desenvolvimento Limpo – MDL conceito e uso do MDL no mundo e no Brasil, p.14, disponível em http://www.unisantos.br/mestrado/gestao/egesta/artigos/140.pdf, acesso em 02 de outubro de 2014.
O MDL consiste em estabelecer metas de redução de emissões de gases poluentes
para os países listados do anexo I da UNFCCC7. O Anexo I, é formado por 2 subgrupos
diferentes, quais sejam: Os países membros da Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Económico (OCDE) e os países considerados “Em Transição Econômica”
(Antigo Bloco Soviético). Estes países estão listados no anexo pois, devido ao seu
crescimento e poder industrial, são responsáveis pela maior parte das emissões de gases
poluentes, e tem o compromisso de reduzir tais niveis de emissão.
Desta forma, os países não listados do anexo I (Países em desenvolvimento) podem,
na forma do disposto no protocolo, se beneficiar de suas politicas de desenvolvimento
sustentável, como forma de incentiva os países em desenvolvimento. Vejamos o que diz o art.
12 do decreto 5.445/05:
ARTIGO 12
1. Fica definido um mecanismo de desenvolvimento limpo.
2. O objetivo do mecanismo de desenvolvimento limpo deve ser assistir
às Partes não incluídas no Anexo I para que atinjam o desenvolvimento
sustentável e contribuam para o objetivo final da Convenção, e assistir às
Partes incluídas no Anexo I para que cumpram seus compromissos
quantificados de limitação e redução de emissões, assumidos no Artigo 3.
3. Sob o mecanismo de desenvolvimento limpo:
(a) As Partes não incluídas no Anexo I beneficiar-se-ão de atividades
de projetos que resultem em reduções certificadas de emissões; e
(b) As Partes incluídas no Anexo I podem utilizar as reduções
certificadas de emissões, resultantes de tais atividades de projetos,
para contribuir com o cumprimento de parte de seus compromissos
quantificados de limitação e redução de emissões, assumidos no Artigo
3, como determinado pela Conferência das Partes na qualidade de
reunião das Partes deste Protocolo.
4. O mecanismo de desenvolvimento limpo deve sujeitar-se à
autoridade e orientação da Conferência das Partes na qualidade de
reunião das Partes deste Protocolo e à supervisão de um conselho
executivo do mecanismo de desenvolvimento limpo.
5. As reduções de emissões resultantes de cada atividade de projeto
devem ser certificadas por entidades operacionais a serem designadas
pela Conferência das Partes na qualidade de reunião das Partes deste
Protocolo, com base em:
(a) Participação voluntária aprovada por cada Parte envolvida;
(b) Benefícios reais, mensuráveis e de longo prazo relacionados com
a mitigação da mudança do clima, e
7 Países constantes no anexo I da Convenção: Alemanha, Austrália, Áustria, Belarus, Bélgica, Bulgária, Canadá,
Comunidade Européia, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos, Estônia, Federação Russa, Finlândia, França, Grécia, Hungria, Irlanda, Islândia, Itália, Japão, Letônia, Lituânia, Luxemburgo, Noruega, Nova Zelândia, Países Baixos, Polônia, Portugal, Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, República Tcheco-Eslovaca, Romênia, Suécia, Turquia, Ucrânia.
(c) Reduções de emissões que sejam adicionais às que ocorreriam na
ausência da atividade certificada de projeto.(Grifos nossos)
Surgem os chamados créditos de carbono, que podem ser definidos como o
excedente de ar puro produzido pelos países em desenvolvimento, que pode ser
comercializado com os países desenvolvidos e listados no Anexo I do Protocolo de Quioto.
Este procedimento é o que denominamos Mercado Regulado de Carbono.
Neste diapasão, cumpre destacar que o Brasil não faz parte do anexo 1 do protocolo
de Quioto. Portanto, pode negociar seus excedentes de ar puro com os países desenvolvidos,
inseridos no anexo I. Todavia, para que as transações do mercado de carbono sejam validas e
aproveitadas dentro do MDL, devem ser certificadas por entidades operacionais designadas
pelo Protocolo.
O Crédito de Carbono tem como unidade de medida a Redução Certificada da
Emissão - RCE (Certified Emission Reductions - CER). 1 RCE corresponde a 1 Tonelada de
Dióxido de Carbono Equivalente8. O processo de criação de créditos de carbono deve ser feito
por uma instituição elegível, conforme o inciso 5 do art.12 do protocolo, já supracitado.
Conhecida como designated national authority – DNA. No Brasil, a entidade responsável é a
Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima - CIMGC, ativa desde 2006.
Deste modo, o Brasil possui um mercado extremamente abrangente para o comércio
de carbono, por meio de projetos regularizados em território nacional. De acordo com o
relatório de 31 de dezembro de 2012 do CIMGC, “o Brasil possuía um total de 373 atividades
de projeto aprovadas pela comissão, sendo 272 já registradas pelo Conselho Executivo do
MDL, quantidade equivalente a 4,9% do total global, ocupando a 3º posição no ranking
mundial em número de atividades de projeto registrada”
Todavia, o Protocolo de Quioto nos apresenta o que temos como Mercado Regulado,
existindo ainda o Mercado Voluntario. O Mercado voluntário diz respeito á iniciativa privada,
proveniente de ONGs ou grandes corporações, que, usando como base as políticas do MDL e
o Protocolo de Quioto, investem em iniciativas que diminuem o impacto ambiental da
8 A unidade dos créditos de carbono nos “Certificados de Emissões Reduzidas” (CER’s) é padronizada em
toneladas de carbono equivalente. Isso vale porque os CER’s não levam em conta só a redução das emissões de dióxido de carbono (CO2), mas também das emissões dos outros gases do efeito estufa: metano (CH4), óxido nitroso (N2O), perfluorcarbonetos (PFCs), hidrofluorcarbonetos (HFCs) e hexafluoreto de enxofre (SF6). É essencial para a mitigação sabermos se é melhor prevenir a emissão de 1Kg de CO2 ou de 1Kg de CH4, por exemplo. Disponível em http://www.ipcc.ch/, acesso em 14 de outubro de 2014.
emissão de gases poluentes, sem estarem vinculadas a metas pré-estabelecidas pelo Protocolo
de Quioto.
São constituídos de forma a seguir os padrões do protocolo, e são convertidos em
instrumentos financeiros negociáveis, chamados Reduções Verificadas de Emissão (RVE). Os
RVE’s podem ser comercializados entre empresas e entidades, de forma que constituem um
valor específico, capaz de ser comercializado, inclusive, em bolsas de valores pelo mundo
todo, tornando-se commodities.
Portanto, em que pese ser uma ideia teoricamente boa, fornecendo a devida
compensação aos países subdesenvolvidos pela preservação e mantendo a produção dos
países desenvolvidos, criando uma balança estável de emissão de gases que visa uma redução
progressiva ao longo dos anos, o programa falha miseravelmente em não prever a intervenção
de um agente bem peculiar que sempre está entre o desenvolvimento e a sustentabilidade: O
Mercado.
Ao notar a criação de uma nova commoditie, os comerciantes, negociadores e
investidores de bolsas de valores no mundo todo passaram a criar um mercado paralelo para a
emissão de créditos de medição de carbono, o que criou o que se convencionou chamar de
mercado voluntário de carbono. Foram criadas empresas privadas de medição de sequestro de
carbono, em paralelo com a criação de bolsas de ações específicos para o trato com esta
commoditie.
A consequência foi a ausência de controle sobre esta nova modalidade de comércio,
resultando na geração de créditos de carbono, no bônus para empresas do setor privado, e na
comunidade local (responsável pela preservação ambiental de fato) sendo largada às traças,
sem o repasse devido da verba prometida. Temos a total desconfiguração de um instituto
ambiental para se tornar apenas um produto a ser negociado na bolsa de valores.
4. O verdadeiro alvo da sustentabilidade: O Atual Modelo Econômico.
Vivemos em uma sociedade que se concentra no consumo, no capital, no lucro.
Nosso modelo econômico atual é o capitalismo, e insistimos em nos comportar como um
relógio quebrado que vê apenas dois lados eternos da mesma moeda: Capital e Social. O
capitalismo é focado na capacidade irrestrita de comércio, e a capacidade de agir em liberdade
para gerar lucro. Muitas pessoas interpretam o capitalismo como uma forma de mercado livre,
sem intervenção estatal, que tem como objetivo o crescimento econômico e social por meio da
livre iniciativa e a meritocracia. Aqui, adotaremos um posicionamento mais incisivo quando
se trata da prática do capitalismo do nosso globo: Seu foco é o CAPITAL. O LUCRO. O
PATRIMÔNIO LIQUIDO. Desta forma, um modelo econômico que segue a livre iniciativa
em prol do lucro, vai se aproveitar de todas as brechas possíveis para agregar capital, sempre
em uma unidade. Seja esta unidade o indivíduo ou uma corporação, a tendência é sempre
alimentar o capital egoísta do indivíduo. O capitalismo talvez não seja a razão de todos os
males da sociedade, e essa pode ser uma visão exageradamente apocalíptica do cenário
econômico, mas certamente ele é culpado por centralizar toda a atividade econômica no
capital do indivíduo. Esta característica é capaz de, unicamente, criar as condições necessárias
para as mais diversas praticas que estimulam a ilegalidade: O estímulo excessivo ao sucesso
individual fecha nossos olhos para questões Socioeconômico-Ambientais. Portanto, para
resolver a balança, de forma a trabalhar a valoração do recurso ambiental em prol da
qualidade ambiental, é preciso mudar nosso modelo econômico. No capitalismo, fatalmente
iremos apenas fomentar o capital individual, e nunca atingiremos nosso objetivo coletivo.
É neste cenário que surge a Economia Colaborativa. A economia colaborativa traz
uma proposta bem simples: Compartilhar os custos e os lucros da atividade econômica. Em
um mundo que congelou no tempo e se encontra preso no conflito entre capitalismo vs
socialismo, a Economia Colaborativa surge como um meio termo para ambos, valorizando a
distribuição do capital, através de todos os pontos da relação mercantil, razão pela qual é
conhecida como peer-to-peer, traduzindo livremente, ponto-a-ponto. Segundo matéria na
revista Forbes: “Consumers are able to get what they need from each other instead of always
going to large organizations.”.
A Economia Colaborativa elimina o primeiro aspecto negativo que nosso modelo
econômico nos empurra: O consumismo. Ao eliminarmos o caráter individualista, e
fomentarmos o caráter de compartilhamento nos indivíduos, estes passam a perceber uma
realidade coletiva, que acaba por combater a massificação da produção e do consumo. Este
exemplo fica mais fácil de se visualizar em uma simples observação de atividade agrícola no
ambiente urbano: As Hortas.
Se cada bairro possuísse seu conjunto de hortas, esta atividade poderia em uma só
frente, gerar renda para a comunidade local, desestimular a massificação do consumo (os
moradores deixariam de procurar as grandes redes de supermercado, o que iria fortalecer a
economia local), e ainda fortaleceria o comércio local. Ao invés de brincar com a balança
comercial para tentar criar lucro na atividade de exportação, o comércio local seria
fortalecido. Mas como isso iria ser aplicado na valoração do bem ambiental, e como isso
melhoraria a qualidade ambiental? O instituto, que evolui informalmente pelo mundo desde o
século passado, já nos oferece uma resposta, em um dos avanços tecnológicos mais polêmicos
da última década: O Uber.
6. O UBER como aplicação massiva da economia colaborativa, e como ele já está
modificando nosso modelo atual.
Apesar de ser considerado o inimigo número 1 dos taxistas nos dias atuais, o Uber é
um aplicativo de carona. Sua principal vantagem, para o bem de nossa análise, não é a melhor
qualidade na oferta ou o preço mais em conta da corrida, mas sim o seu efeito indireto de
redução da frota de veículos no ambiente urbano. O maior inimigo do ar das metrópoles, e
maior causador de poluição atmosférica em nossa era é o veículo automóvel. Em que pese a
preocupação ambiental acerca da matéria, não é difícil vermos residências com 2, 3 ou até 4
veículos, um para cada membro da família. A cultura da “Autonomia e liberdade” está
intimamente ligada ao fato de possuir veículo automóvel próprio. O Uber muda este
paradigma nos dias atuais.
Vivemos uma época de caos urbano no trânsito. Métodos alternativos de locomoção,
como bicicletas são hoje uma realidade, e o Uber coopera de forma caprichosa nesse sistema:
Ao estimular a cultura da carona, com preços e qualidades acessíveis para o consumidor final,
é possível diminuir o número de carros na frota urbana, diminuindo assim o impacto
ambiental nos grandes centros urbanos. O Fenômeno vem mudando a cara do capitalismo
atual ao primar pelo compartilhamento de bens em detrimento da propriedade.
O grande erro que nós, brasileiros, temos cometido ao tentarmos entender empresas
como Uber é aplicarmos réguas do passado para medirmos os novos serviços oferecidos. Os
serviços oferecidos por estas empresas são, definitivamente, a ponta de um enorme iceberg
que é a economia do compartilhamento/sharing economy.
Esta nova economia tem alterado o eixo principal do capitalismo mundial como o
conhecemos há séculos. A base fundamental do capitalismo tem sido possuir e acumular a
maior quantidade possível de bens. No capitalismo tradicional cada venda representa a saída
de um produto e a obtenção de propriedade por parte do comprador.
A estratégia central da economia compartilhada é vender o mesmo produto por
diversas vezes, sem que o comprador obtenha a propriedade do bem usufruído.
Existem três características básicas e peculiares na sharing economy:
compartilhamento, por óbvio; uso avançado da Internet e de redes móveis e;
comprometimento com os clientes através das redes sociais e "rankeamento" dos
serviços. Sem o entendimento desta grande revolução econômica que vem alterando os rumos
dos mercados, tendemos a enxergar as empresas oriundas da Economia Compartilhada com
um olhar único e ultrapassado.
Cabe à academia, por meio da difusão de informações, trazer um óculos para o olhar
embaçado para que possamos enxergar de forma completa a economia compartilhada.
A opção simples e distorcida de jogar um novo serviço tecnológico na ilegalidade
mostrou-se, no passado, ineficaz. A guerra travada pela indústria da música contra o Napster,
programa de compartilhamento de músicas, provou que uma aparente vitória legal foi, na
verdade, uma derrota na prática, pois o compartilhamento de músicas aumentou de forma
alarmante.
O livro digital não matou o livro físico, pelo contrário, as vendas dos últimos
aumentaram. O Facebook não eliminou as amizades no mundo real, de forma oposta,
incrementou-as. Graças aos serviços de streaming de música, um número imenso de pessoas
está pagando para ouvir música, turbinando o mercado fonográfico e deixando de
compartilhar músicas de forma gratuita. Pergunte à Apple a renda mensal do iTunes. O
mesmo paralelo pode ser traçado até mesmo à evolução dos meios de comunicação, como
jornal e rádio, os quais continuam circulando nos dias de hoje.
Claro, não podemos deixar de levar em consideração os imensos ganhos que práticas
de economia colaborativa podem cooperar com o meio ambiente, além o meio social. Em
texto publicado na Havard Bussines Review, Lawrence H. Summers fala sobre os impactos
ambientais positivos do UBER e outras modalidades de sharing economy:
“These firms bring significant economic, environmental, and
entrepreneurial benefits including an increase in employment and a
reduction in carbon dioxide emissions (in the case of car sharing
services). Shervin Pishevar, a venture capitalist and an investor in
Couchsurfing, Getaround, Uber and other startups in this space,
believes these services will have a major impact on the economics of
cities; This is a movement as important as when the web browser came
out.”
Cumpre ressaltar que o UBER é apenas um dos novos aventureiros nessa nova forma
de ver a economia, Netflix, Spotfy e Airbnb, para citar alguns, também já aplicam a idéia do
compartilhamento de bens, e é possível ver ao longo do globo o capitalismo se debater, por
meio de seus entes políticos, para evitar a evolução de nosso modelo econômico, e tentar
manter a unidade sobre a Propriedade.
Mas o que é o Airbnb? Inicialmente, cumpre ressaltar que a sigla BnB significa Bed
and Breakfast, em uma tradução livre (e esdruxula) seria “pernoitar”. O site Airbnb iniciou
como um site no qual as pessoas poderiam alugar seus quartos desocupados de suas casas para
pessoas que passariam apenas uma noite na cidade, geralmente a trabalho ou de passagem
pela cidade. A ideia acabou dando tão certo, que assim como o Uber, passou a se tornar uma
das maiores imobiliárias do planeta, competindo diretamente com o setor de corretagem.
Somando a serviços de streaming como o Netflix, que estimulam o compartilhamento de
conteúdo, é visível como a internet modificou a cara do nosso século, e da nossa economia
atual.
Mas, nem tudo são rosas. O que era para ser uma ideia sustentável e fugindo do
modelo capitalista, começa a ser tragada por ele. O UBER chegou no brasil sendo comparado
com serviços de taxi, e está hoje sendo regulamentado como se um serviço de transporte
PARTICULAR fosse. Uma importante nota que cerca o UBER nesta nova tentativa de
evolução do transporte público, veio recentemente do Prefeito Fernando Haddad na cidade de
São Paulo, que regulamentou o uso do aplicativo na cidade por meio de Decreto, alguns
trechos interessantes são observáveis:
“CAPÍTULO I DO CREDENCIAMENTO
Art. 2º Poderão se habilitar ao credenciamento pessoas jurídicas que
sejam titulares do direito de uso de programa, aplicativo ou base
tecnológica de comunicação em rede destinado à prestação dos serviços
definidos pelo Decreto Municipal nº 56.981 de 10 de maio de 2016.
Art. 3º O credenciamento dar-se-á mediante a apresenta- ção de
requerimento e sua respectiva aprovação junto à Secretaria Municipal de
Transportes (SMT), nos termos do Anexo I desta Resolução.
§1º O requerimento devidamente assinado solicitando credenciamento
deverá ser encaminhado à São Paulo Negócios eletronicamente através
do endereço de e-mail: [email protected] instruído com
a documentação exigida.
§2º Caberá à São Paulo Negócios e ao Laboratório de Mobilidade
Urbana – Mobilab da Secretaria Municipal de Transportes a análise do
cumprimento dos requisitos para o credenciamento.
§3º Cumpridos os requisitos desta resolução, a Secretaria Municipal de
Transportes emitirá, por intermédio do Laboratório de Mobilidade
Urbana – Mobilab, o correspondente Termo Eletrônico de
Credenciamento de Operadora de Tecnologia de Transporte
Credenciada – OTTC. Art.
4º São condições para o credenciamento:
I – formular requerimento com concordância irrevogável e irretratável
do regime previsto nesta Resolução, conforme modelo apresentado no
Anexo I;
II – comprovar o cumprimento dos seguintes requisitos, quando
couber:
a) ser pessoa jurídica com objeto social compatíveis com as atividades
previstas no Decreto Municipal nº 56.981 de 10 de maio de 2016;
b) possuir constituição perante os órgãos de registro competentes;
c) possuir matriz ou filial no Município de São Paulo;
d) possuir inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas –
CNPJ;
e) apresentar Certidão Negativa de Débitos da Previdência Social;
f) apresentar Certidão Negativa de Débitos das Fazendas Federal e
Distrital;
g) apresentar Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas;
h) apresentar Certidão Negativa de Débitos Tributários Mobiliários;
i) apresentar Certidão Negativa da Justiça Estadual e Federal dos
representantes legais da empresa detentora dos direitos sobre a
plataforma tecnológica. §1º As condições exigidas devem ser mantidas ao
longo da prestação do serviço, sob pena de descredenciamento. §2º O
credenciamento terá validade até o dia 31 de dezembro do exercício em
que for deferido”
Um aspecto que merece destaque é o credenciamento por parte do motorista.
Apesar de parecer querer resolver a questão da mobilidade urbana, o projeto insiste em
comparar a movimentação automobilística privada com os atuais serviços de táxi, o que
acaba por não fazer jus à ideia por trás do aplicativo para celulares. Ademais, podem
operar apenas as empresas regulamentadas junto ao estado de São Paulo.
Neste sentido, voltamos a atenção para o iTunes. A Apple, visionária, não se
entregou à batalha que envolvia as gravadoras e os serviços de compartilhamento de
músicas pela internet. Pelo contrário, se atualizou para atender a demanda de seu público
ao criar o iTunes. O mesmo infelizmente não pode ser dito sobre o netflix, que parece
caminhar para bater de frente com a grande indústria do cinema, ao criar séries e filmes de
autoria própria, ao invés de permanecer como serviço de streaming, portanto passaria a
competir com as distribuidoras de mídia cinematográfica, como cinema e canais de TV por
assinatura, diferente do YouTube, que já declarou se tratar apenas de um canal livre para
difusão de vídeo em tecnologia de streaming, não sendo o detentor dos direitos sobre os
conteúdos de seus usuários, de caracterizando como um ambiente virtual e não um meio de
propagação de suas próprias mídias, mas sim dos outros.
7. Conclusão.
Diante do exposto, cumpre ressaltar que a sharing economy/economia colaborativa
não é a resposta universal para o problema da sustentabilidade. Em verdade, existe uma
discussão válida quanto à falta de regulamentação direta no serviço, uma vez que estes
operam à margem da fiscalização estatal (tal como o UBER não presta contas como um
taxista, o Netflix também não como uma emissora de Televisão), e esta é uma discussão que
deve ganhar força nos próximos anos.
O principal objetivo deste trabalho é, em verdade, fomentar o debate acerca de uma
opção que, ao invés de escolher entre anjos e demônios da atualidade, optou por queimar o
livro. Fugindo à regra da dualidade que assola nosso modelo político e econômico, a
economia colaborativa busca uma novidade, um novo modo de pensar a relação entre
economia e sustentabilidade, e fomentar o debate em uma nova direção pode ser a mais
saudável das opções, e certamente mostra que estamos no caminho certo quando pensamos na
academia: Inovação!
Portanto, trilhar o caminho em busca da sustentabilidade passa por uma análise
econômica, que visa adequar a realidade do mercado ao nosso sistema econômico,
preservando a ideia de bem-estar social e preservação ambiental. O equilíbrio aqui parece
estar no caminho certo, e podemos pensar em enxergar uma luz no fim deste túnel do
dualismo entre o capital vs social.
8. Bibliografia
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