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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

PROCURADORIA REGIONAL DA REPÚBLICA

EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃOEXMO. SR.JUIZ FEDERAL RELATOR JORGE ANTÔNIO MAURIQUE

Processo n.º 2009.70.01.003025- Ação Civil PúblicaPrevenção gerada pelo Agravo de Instrumento nº0026707-07.2010.404.0000Autor : Ministério Público FederalRéus: União Federal e Estado do Paraná

PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por meio de seu agente infra-assinado, no exercício de suas atribuições constitucionais e legais, vem, perante Vossa Excelência, amparado nos artigos 127, §1º, 129, incisos II e II, da Constituição Federal, e artigos 273 e 800 do Estatuto Processual Civil, requerer a antecipação de tutela com base nos fatos e fundamentos expostos nesse pedido.

1. Dos fatos

A Procuradoria da República no Município de Londrina ajuizou a ação civil pública n.º 2009.70.01.003025-0 (doc.1) para obter a prestação de tutela jurisdicional a todos os portadores de CISTINOSE (doença decorrente do acúmulo de cristais de cistina dentro das células do organismo), residentes nos municípios que integram o âmbito de competência desta Subseção Judiciária de Londrina, a fim de lhes garantir o fornecimento gratuito da Cysteamine, em suas duas vias de administração, interna e tópica, consistentes no colírio de cisteamina e no fármaco Cystagon (bitartrato de cisteamina), pelo Sistema Único de Saúde – SUS –, cujo uso contínuo se mostra urgente e indispensável ao controle de progressão da patologia e manutenção da qualidade de vida dos portadores.

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O parquet federal tomou tal providência após constatar a situação de desamparo dos pacientes no decorrer do trâmite do procedimento administrativo (P.A.) n.º 1.25.005.000071/2009-84, doc.2 (doc.2). Mencionado P.A. foi instaurado a partir de representação formulada pelo Sr. Lucas Antônio da Silva, o qual solicitou adoção de medidas no sentido de garantir o fornecimento do fármaco bitartrato de cisteamina (Cystagon) e do colírio de cisteamina em benefício do seu filho Henrique Antônio da Silva, portador de CISTINOSE NEFROPÁTICA.

Após obter informações de órgãos públicos e obter acesso a estudos científicos, verificou-se que não existe no âmbito do Sistema Público de Saúde um Protocolo Clínico para o Tratamento da Doença de CISTINOSE e, tampouco, há o fornecimento gratuito pela rede pública de saúde da Cysteamine – em suas duas vias de administração, interna e tópica, consistentes no colírio de cisteamina e no fármaco Cystagon (bitartrato de cisteamina) –, a qual consiste na única opção terapêutica para o tratamento da patologia (tema a ser abordado em tópico seguinte).

Em 25-07-2010, o MM. Juiz a quo proferiu sentença (doc.3) de parcial procedência […] para condenar solidariamente União e o Estado do Paraná para o fim de determinar que os réus tomem todas as medidas necessárias e suficientes para que Henrique Antônio da Silva receba em sua residência (Rua Piquiri, 280, Centro em Jataizinho-PR, tel (43)3259-1998, (43)9101-5358) pelo tempo necessário o medicamento denominado Cystagon (bitartrato de cisteamina), nos termos das prescrições médicas acostadas ao procedimento administrativo MPF/PRM/LDA 1.25.005.000071/2009-84, doc.2, cuja cópia seguirá nos mandados de intimação. No caso, o Estado do Paraná deverá adquirir e fornecer a medicação mediante o reembolso dos custos pela União.

No entanto, foi julgado improcedente o pedido de tutela antecipada ampliada quanto ao fornecimento da Cysteamine, em benefício de todos os pacientes portadores de CISTINOSE, vinculados ao Sistema Único de Saúde e residentes nos municípios que integram esta Subseção Judiciária Federal de Londrina.

Inconformado da referida decisão, o Ministério Público Federal interpôs recurso de apelação (doc.4) com o fim de reformar a decisão nesse sentido.

Contudo, o parquet federal recebeu nova representação, formulada pela Sra. Juliana Rufino de Paula, a qual solicita adoção de providências para que seja gratuitamente fornecido o fármaco bitartrato de cisteamina (Cystagon) ao seu filho, Vinicius de Paula Leão da Silva, portador da doença de CISTINOSE NEFROPÁTICA (procedimento administrativo n.º 1.25.005.001398/2010-15) (doc.5). Tal caso é idêntico àquele referente ao paciente beneficiado pela sentença do MM. Juiz a quo.

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Considerando que os autos de ação civil pública permanecem na 2ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Londrina/Pr para oferecimento de contrarrazões de recurso, bem como ante a urgência da ministração do fármaco em questão, o colega Procurador da República João Omoto Akira encaminhou ofício como objetivo de subsidiar a atuação da Procuradoria Regional, com vistas a eventual pleito de antecipação dos efeitos da tutela perante o Tribunal Regional Federal da 4ª Região por meio de petição. Para tanto, junta-se ao presente cópia integral dos autos de ação civil pública, bem como dos P.A.'s n.º 1.25.005.000071/2009-84, doc.2 e n.º 1.25.005.001398/2010-15, doc.5.

A União Federal agravou de instrumento (0026707-07.2010.404.0000, doc.6), requerendo o recebimento da apelação em seu duplo efeito. Dito recurso tramita na colenda 4ªTurma deste e.Tribunal, sendo Relator o eminente Juiz Federal Jorge Antônio Maurique, o que gera a prevenção no pedido ora formulado.

2. FundamentaçãoVisa o presente pedido conceder à Ação Civil Pública nº 2009.70.01.003025 a

ampliação dos efeitos de sua tutela antecipada já deferida, tendo em vista que, conforme mecionado, outros casos estão chegando ao conhecimento do órgão Ministerial. A opção pelo ingresso diretamente nesse egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região se justifica visto que já esgotada a prestação jurisdicional no primeio grau, aguardando o feito o ingresso de contrarrazões (doc.7).

O paciente necessita iniciar o seu tratamento com o aludido fármaco o quanto antes e não pode aguardar o regular trâmite processual para análise do seu pleito.

Ressalte-se que o parquet federal interpôs recurso de apelação com o objetivo de reformar a sentença quanto ao pedido de extensão da tutela antecipada. Eventual ajuizamento de Ação Civil Pública para garantir o fornecimento da Cysteamine ao paciente em questão, poderia configurar a ocorrência de litispendência uma vez que, além das mesmas partes (Ministério Público, União e Estado do Paraná), o pedido e a causa de pedir restariam englobados pelos autos n.º 2009.70.01.003025-0, de teor mais amplo.

De acordo com Fredie Didier jr., Paula Sarno Braga e Rafael Oliveira1, a princípio, a tutela antecipada pode ser requerida e concedida a qualquer tempo dentro do processo: desde o início do processo, com a propositura da ação ('liminarmente') até seus momentos finais. Não há limite temporal.

Basta que, para isso, haja o preenchimento dos requisitos que demonstrem a imprescindibilidade do provimento da tutela de urgência.

A lição de Cássio Scarpinella Bueno também é nesse sentido:

1Curso de Direito Processual Civil. 5° edição. Salvador: JusPodivm. p. 508.

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“Há aqueles que sustentam não ser o juízo prolator da sentença o competente para decidir a respeito da 'tutela antecipada' depois da interposição da apelação. Por causa do parágrafo único do art.800, essa corrente de pensamento afirma ser competente para apreciação do pedido o Tribunal competente para apreciar o recurso.Desde logo, convém destacar que o fato de o parágrafo único do art.800 referir-se somente a 'medida cautelar' não afasta sua aplicação também para a tutela antecipada, mormente depois do advento do §7º do art.273 (v.n.3 do Capítulo 8).O argumento levantado acima é correto, não obstante as Súmulas 634 e 635 do STF não se contentarem com a mera interposição do recurso para a definição de sua competência para os fins do referido dispositivo, mas com sua admissão, pelo menos no que diz respeito ao processamento do recurso extraordinário e, por identidade de motivos, com relação ao recurso especial.”2

Anota o referido autor que o STF já vem flexibilizando as noticiadas Súmulas:E M E N T A: RECURSO EXTRAORDINÁRIO QUE AINDA NÃO SOFREU JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE - ACÓRDÃO DO TRIBUNAL RECORRIDO QUE VERSA MATÉRIA IDÊNTICA À VEICULADA EM CAUSAS JÁ PREPARADAS PARA SEREM JULGADAS PELO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - RETARDAMENTO, PELA PRESIDÊNCIA DO TRIBUNAL RECORRIDO, DA FORMULAÇÃO DO JUÍZO (POSITIVO OU NEGATIVO) DE ADMISSIBILIDADE DO APELO EXTREMO - POTENCIALIDADE DANOSA RESULTANTE DESSA OMISSÃO PROCESSUAL, AGRAVADA PELA INÉRCIA NO EXAME DO PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA - CARACTERIZAÇÃO DE DANO POTENCIAL APTO A COMPROMETER, DE MODO GRAVE, A SITUAÇÃO JURÍDICA DA EMPRESA CONTRIBUINTE - POSSIBILIDADE, AINDA, DE FRUSTRAÇÃO DOS FINS INERENTES AO PROCESSO CAUTELAR - HIPÓTESE EXCEPCIONAL QUE JUSTIFICA, NO CASO, O EXERCÍCIO, PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, DO PODER GERAL DE CAUTELA - SITUAÇÃO EXTRAORDINÁRIA QUE AUTORIZA A NÃO-INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS 634 E 635 DO STF - FUNÇÃO JURÍDICA DA TUTELA CAUTELAR - INSTRUMENTALIDADE DO PROCESSO CAUTELAR (BINÔMIO NECESSIDADE/UTILIDADE) - RELAÇÃO DE COMPLEMENTARIDADE ENTRE O INSTITUTO DA TUTELA CAUTELAR E O PRINCÍPIO DA EFETIVIDADE DO PROCESSO - DOUTRINA - SITUAÇÃO QUE ENSEJA A OUTORGA EXCEPCIONAL DO PROVIMENTO CAUTELAR, CONSIDERADA A SINGULARIDADE DO CASO - SUSPENSÃO DA EFICÁCIA DO ACÓRDÃO OBJETO DO APELO EXTREMO - MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA PELO RELATOR - DECISÃO REFERENDADA.

(AC-QO 1810, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, julgado em 16/10/2007, publicado em 31/10/2007, Segunda Turma)

Deve ser salientado, no entanto, que o caso ora em comento não diz respeito, de modo algum, a retardamento, mas sim da demora natural decorrente da observância dos prazos processuais.

2BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de Direito Processual Civil. Vol.4. São Paulo: Saraiva, 2010. p.85.

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Tal como lecionam Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart3, é preciso dizer, ainda, que é possível o requerimento de tutela antecipatória no tribunal. Deveras, é importante lembrar que o fundado receio de dano pode surgir em segundo grau de jurisdição e, assim, abrir oportunidade para a tutela antecipatória em segundo grau de jurisdição.

É o que ocorreu no caso da Ação Civil Pública supra-algarismada. Recentemente o paciente Vinicius de Paula Leão da Silva foi diagnosticado como portador da doença de CISTINOSE NEFROPÁTICA com a necessidade de ministração da Cysteamine (bitartrato de cistemanina 150 mg) para controle de sua patologia. Igualmente, teve o seu requerimento negado pela rede pública de saúde em 06-09-2010, data posterior à sentença judicial.

Além disso, nos dizeres de Fredie Didier Jr., Paula Sarno Braga e Rafael Oliviera4, como o juiz de primeira instância já encerrou seu ofício na fase de conhecimento (art. 463, CPC), não podendo mais atuar na causa com esse propósito, a competência para apreciar pedido de antecipação da tutela é do tribunal, aplicando-se, por analogia, o disposto no para. ún. do art. 800 do CPC.

Nesse sentido, colaciona-se decisão proferida pela Quarta Turma desse Egrégio Tribunal Regional em 24-05-2010:

AGRAVO REGIMENTAL. ANTECIPAÇÃO DA PRETENSÃO RECURSAL. SENTENÇA DENEGATÓRIA DA SEGURANÇA. PROCESSO AINDA NÃO REMETIDO AO TRIBUNAL. POSSIBILIDADE DE PEDIDO DIRETO AO RELATOR. VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES. IMPOSTO DE RENDA RETIDO NA FONTE. ADIANTAMENTO. DIVIDENDOS. PERÍODOS DE 1994 E 1995. INSTRUÇÃO NORMATIVA SRF Nº 12/99. SUSPENSÃO DOS EFEITOS DA SENTENÇA DENEGATÓRIA DA SEGURANÇA ATÉ JULGAMENTO DA APELAÇÃO. FUNDADO RECEIO DE DANO IRREPARÁVEL E DE DIFÍCIL REPARAÇÃO.1. Cabível o pedido de antecipação de tutela recursal, por petição avulsa, tal como procedido pela parte requerente, uma vez que o Mandado de Segurança nº 2007.71.00.034784-9 já foi sentenciado, estando o feito no aguardo da apresentação de contrarrazões pela parte.2. Embora prolatada a sentença em setembro de 2009, tendo o recurso de apelação manejado pela requerente sido recebido somente em seu efeito devolutivo, a necessidade efetiva de ver afastada qualquer medida tendende à exigibilidade do crédito tributário em referência somente se materizalizou posteriormente, dando ensejo ao surgimento do fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação por ocasião do recebimento de Carta Cobrança. Legítima, portanto, a postulação ao adiantamento da tutela a ser deferida por ocasião do julgamento da apelação que pode ser exercida a qualquer tempo, desde que presentes os requisitos elencados no artigo 273 do CPC.3. Reconhecida a verossimilhança das alegações expendidas no sentido de

3 Manual do Processo de Conhecimento. 5° edição. São Paulo: Revista dos Tribunais. p. 223.4 Op. Cit. p. 511.

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que o exercício do direito à compensação estaria condicionado à "distribuição de dividendos, bonificações em dinheiro, lucros e outros interesses" ou, nos termos da IN nº 12/99, "com o retido sobre os valores pagos ou creditados a títulos de juros remuneratórios do capital próprio", bem como da apresentação, em fevereiro de 2002, de Pedido de Restituição cumulado com Pedido de Compensação, razão pela qual não teria transcorrido, nesse caso, o lapso prescricional conforme sistemática anterior à Lei nº 118/2005.4. O indeferimento do pedido de Certidão Negativa de Débito, bem como a sua inscrição no CADIN, acarretam prejuízos de grande monta à Requerente no exercício de suas atividades empresariais, configurando a possibilidade de lesão grave e de difícil reparação.5. Agravo Regimental improvido.(TRF 4ª Região – Petição n.º 2010.04.00.000419-9/RS – Quarta Turma – Rel: Des. Marga Inge Barth Tessler – D.E. Em 12-05-2010)

A CISTINOSE é uma doença bastante rara. Na América do Norte a incidência da modalidade mais comum e grave da doença, a cistinose nefropática, é de aproximadamente 1 caso por 100.000 a 200.000 nascimentos. Estima-se que 300 a 400 crianças nos Estados Unidos possuam a doença. Não foram, ainda, publicados dados estatísticos da doença no Brasil.5

Contudo, os autos anexos de PA noticiam a existência de, pelo menos, três casos na região abrangida pela Subseção Judiciária Federal de Londrina.

Às fls. 121/217 do PA n.º 1.25.005.000071/2009-84, (doc.2), têm-se documentos relativos ao Mandado de Segurança n.º 128/2007, impetrado pelo Ministério Público do Estado do Paraná perante a 6ª Vara Cível da Comarca de Londrina. Essa ação objetiva beneficiar a paciente Jenifer Modenuti Silva, cuja CISTINOSE, aos onze anos de idade (ano de 2007), já havia evoluído para insuficiência renal crônica em decorrência do depósito de cistina. Desde o ano 2000 o tratamento específico com Cysteamine vinha sendo solicitado pela Dra. Solange Farah R. de Mello, nefrologista pediatra do Hospital Universitário da Universidade Estadual de Londrina (HU/UEL). Na época a criança já havia iniciado tratamento de substituição de função renal mediante diálise peritonial, com programação para transplante renal. A imprescindibilidade da Cysteamine, nesse caso, foi enfatizada pela médica “para evitar depósitos de cistina nos diversos órgãos inclusive no enxerto renal” (fls. 183 do PA).

5Evidência científica disponível sobre o uso da cisteamina no tratamento de cistinose nefropática, Nota Técnica emitida em 07-04-2008 pela Coordenadora Geral de Avaliação de Tecnologias em Saúde do Departamento de Ciência e Tecnologia, órgão vinculado à Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde – DECIT/SCTIE/MS –, Flávia Tavares Silva Elias (fls. 55/57 do PA n.° 1.25.005.000071/2009-84, doc.2).

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O Centro de Medicamentos do Paraná – CEMEPAR (fls. 197/198 do PA n.º 1.25.005.000071/2009-84, doc.2) – e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA (fls. 220 do PA n.º 1.25.005.000071/2009-84, doc.2) – noticiaram o caso do adolescente P.C.R.F., domiciliado em Cambé, outro portador da CISTINOSE que, desde os cinco anos de idade, vem tentando obter gratuitamente a Cysteamine pelo SUS. Também foi preciso, no seu caso, recorrer à Justiça, dando origem à Ação Civil Pública n.º 85/1999, ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Paraná junto à Vara da Infância e Juventude da Comarca de Cambé. Maiores detalhes sobre o caso deste paciente não serão veiculados neste arrazoado, pois o processo corre em segredo de justiça.

O terceiro caso conhecido por este Ministério Público é o do paciente Henrique Antônio da Silva, nascido em 02-08-2007, cuja CISTINOSE já lhe acarreta sérios problemas renais, levando à instalação de Síndrome de Fanconi, com quadro de poliúria, polidipsia, acidose metabólica, hipopotassemia e déficit pondo-estatural. Em outubro de 2008 ocorreu o diagnóstico da CISTINOSE, confirmado por depósitos de cristais de cistina na medula óssea. Apesar do tratamento sintomático que vem recebendo do HU/UEL, “necessita de Cysteamine oral e colírio para impedir depósitos de cistina nos vários órgãos, principalmente rins e olhos” (relatório e prescrições médicas de fls. 06/09 do PA n.º 1.25.005.000071/2009-84, doc.2).

E, recentemente, conheceu-se o caso do paciente Vinicius de Paula Leão da Silva, nascido em 20-05-2009, com quadro de CISTINOSE após confirmação de achado dos cristais de cistina em biópsia de medula óssea (fls. 07/08 e 17 do PA n.º 1.25.005.001398/2010-15, doc.5). Está em tratamento junto ao ambulatório de Nefrologia Pediátrica do Hospital das Clínicas do HU/UEL, com dificuldade nutricional e controle criterioso de eletrólitos, porém com descompensações frequentes e necessidade de internação.

A CISTINOSE é uma doença de origem genética, autossômica recessiva, sistêmica e progressiva, decorrente de acúmulo de cristais de cistina dentro do lisossomo das células de diversos órgãos do corpo humano. O acometimento renal é precoce, manifestando-se por meio de Síndrome de Fanconi, com rápida evolução para insuficiência renal terminal. Entre os órgãos afetados, já na infância, estão a tireoide e os olhos6.

O Instituto da Criança “Professor Pedro de Alcântara”, vinculado ao Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – HCFMUSP –, apresenta o interessante quadro esquemático de progressão da doença:

Sintomas oculares: especialmente a fotofobia que pode se instalar já na 1ª infância e é decorrente da deposição de cristais de cistina na córnea e conjuntiva.

6Dados preliminares do estudo multicêntrico brasileiro de cistinose nefropática, estudo promovido pelo Grupo do Estudo Multicêntrico de Cistinose no Brasil – cópia encaminhada ao MPF pela médica do paciente (fls. 18/24 do PA n.º 1.25.005.000071/2009-84, doc.2).

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Em alguns pacientes este quadro é incapacitante. Sem intervenção, tal depósito pode culminar com a degeneração pigmentar da retina e causar cegueira.Acometimento renal: mesmo que o início do tratamento de reposição dos elementos perdidos seja precoce, progressivamente o rim vai sendo deteriorado com o comprometimento também da função glomerular, sendo que por volta dos 10 anos de idade os pacientes apresentam insuficiência renal crônica com necessidade de diálise e transplante.Acometimento da tireóide: na primeira década da vida também é bastante comum o acometimento da tireóide, que determina um quadro de hipotireoidismo com necessidade de reposição hormonal permanente.Acometimento da musculatura: afeta inicialmente músculos distais como os dedos e evolutivamente, em seguida, acomete a musculatura orofaríngea e do esôfago levando a dificuldades de deglutição e engasgamentos. Acometimento pancreático: também existe acometimento do pâncreas com a evolução para 'diabetes mellitus' dependente de insulina.Acometimento do fígado: evoluindo para insuficiência hepática.Acometimento do baço: pode determinar hiperesplenismo.Acometimento do sistema nervoso central: pode haver deteriorização mental progressiva, existindo relatos de morte por paralisia pseudobulbar.7

Por esses motivos, a CISTINOSE é considerada uma patologia muito grave e progressiva, que exige atendimento especializado constante, mas que, se evoluir com acometimento do sistema nervoso central, pode causar grave incapacidade. Tratamentos paliativos, isto é, que não agem diretamente sobre o mecanismo da doença, restringem-se à reposição dos elementos perdidos na urina, reposição de hormônios e de outras substâncias cuja produção ficou comprometida. Não têm, contudo, o condão de afastar os dramáticos efeitos deletérios citados há pouco.

O tratamento específico da CISTINOSE, segundo especialistas do HCFMUSP, é feito, com exclusividade, por “uma droga órfã, denominada Cysteamine, de alta eficiência que age promovendo depleção em longo prazo do acúmulo de cistina lisossomal.”8

Ao dissertarem sobre os efeitos e mecanismos de atuação da Cysteamine, os estudiosos do HCFMUSP vão mais além, destacando o seguinte:

“O sucesso do tratamento da cistinose depende da introdução precoce da Cysteamine e da utilização diária e ininterrupta deste medicamento, durante toda a vida do paciente. Múltiplos ensaios clínicos comprovam que a introdução precoce e o uso contínuo de Cysteamine retardam a perda funcional renal até

7Dicas para a comunidade – cistinose nefropática, texto informativo disponibilizado no site de internet http://www.icr.hcnet.usp.br/dicas/saude/cistinose.asp (fls. 25 e 26 do PA n.º 1.25.005.000071/2009-84, doc.2).8Instrução Técnica n.º 257/2009 – NUDI, referente à solicitação de informações técnicas sobre o medicamento Cysteamine, formulada pela Procuradoria da República no Município de Londrina/PR em 31 de março de 2009, por intermédio do Ofício MPF/GAB/JML n.º 116/2009 (fls. 94/98 do PA n.º 1.25.005.000071/2009-84, doc.2).

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pelo menos a terceira década de vida e diminuem a necessidade de suplementação dos (órgãos) acometidos pela doença com levotiroxina. (…) A Cysteamine é a única opção de tratamento para esta doença até o momento, não há similares ou outras opções terapêuticas no mercado. (…) Há robusta literatura apontando para a necessidade de uso precoce e contínuo da Cysteamine na terapêutica do paciente com diagnóstico de cistinose” (fls. 97 do PA n.º 1.25.005.000071/2009-84, doc.2,doc.2).

O Departamento de Ciência e Tecnologia – DECIT –, vinculado à Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde – SCTIE/MS –, ao tratar da eficácia da Cysteamine fez expressa referência aos resultados positivos de estudos realizados pelo HCFMUSP, destacando que “o uso do medicamento melhorou imediatamente o conteúdo leucocitário da cistina, melhorou o apetite e a disposição para as atividades sociais e escolares, diminuindo o número de internações, assim como aumento na velocidade de crescimento e ganho de peso” (fls. 56 do PA n.º 1.25.005.000071/2009-84, doc.2, doc.2).

Não bastasse isso, também foi informado pelo Ministério da Saúde que “um estudo de análise de custo-efetividade mostrou que o tratamento com cisteamina retarda a necessidade de transplante renal e reduz o custo total em saúde, em decorrência do adiamento da instalação da insuficiência renal” (fls. 57 do PA n.º 1.25.005.000071/2009-84, doc.2,doc.2).

Descoberta em 1976, a Cysteamine foi aprovada em 1994, para comercialização em sua formulação atual, pela Food and Drug Administration – FDA – dos Estados Unidos. As formulações iniciais da droga (hidrocloreto de cisteamina e fosfocisteamina) apresentavam odor e sabor extremamente desagradáveis, que acarretavam intolerância gástrica relevante, dificultando a aderência dos pacientes ao tratamento. Na nova formulação, o bitartrado de cisteamina, há maior estabilidade e efeitos colaterais reduzidos, podendo ser administrado em cápsulas e com melhor tolerância gástrica, facilitando a adesão ao tratamento (fls. 19 e 25 do PA n.º 1.25.005.000071/2009-84, doc.2).

Conforme relatado tanto pelo HCFMUSP (fls. 25 do PA n.º 1.25.005.000071/2009-84, doc.2), como pelo DECIT/SCTIE do Ministério da Saúde (fls. 56 do PA n.º 1.25.005.000071/2009-84, doc.2), estudos comprovaram que, quando o tratamento é iniciado antes dos 02 (dois) anos de idade, há uma redução marcante na velocidade de instalação da insuficiência renal e do acometimento tireoideano, estimando-se que, nesses pacientes, a insuficiência renal crônica terminal surja por volta dos 74 (setenta e quatro) anos de idade.

Restou demonstrado nos autos de Ação Civil Pública, ainda, a propriedade do tratamento com o aludido fármaco por meio do Relatório Público Europeu de Avaliação (EPAR) produzido pelo Comitê dos Medicamentos para Uso Humano do EMEA – European Medicines Agency –, colacionado às fls. 292/293:

O que é o CYSTAGON?

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O CYSTAGON é um medicamento que contém a substância activa cisteamina. Existe na forma de cápsulas (50 mg e 150 mg).Para que é utilizado o CYSTAGON?O CYSTAGON é utilizado para o tratamento de doentes com cistinose nefropática (rins). A cistinose é uma doença hereditária rara que se caracteriza pela acumulação de cistina no interior das células do organismo, impedindo o seu funcionamento normal. A deposição de cistina provoca danos nos rins e a disseminação para outras partes do organismo, incluindo olhos, glândulas (tiróide, gónadas, pâncreas), sistema nervoso central, músculos e fígado. O atraso de crescimento é um sintoma desta doença. O medicamento só pode ser obtido mediante receita médica.Como se utiliza o CYSTAGON?O tratamento com CYSTAGON deve ser iniciado por um médico com experiência no tratamento da cistinose. Os níveis de cistina nos glóbulos brancos devem ser monitorizados para efeitos de ajustamento da dose. Nas crianças até 12 anos de idade, a dose recomendada é de 1,30 g/m2/dia, dividida em 4 doses diárias. Nos doentes com mais de 12 anos de idade e mais de 50 kg de peso, a dose recomendada é de 2 g/dia, dividida em 4 doses diárias. As doses iniciais devem corresponder a entre 1/4 e 1/6 das doses finais previstas. A dose inicial deve ser gradualmente aumentada ao longo de 4-6 semanas.Como funciona o CYSTAGON?O CYSTAGON reage com a cistina de modo a formar a cisteína e o sal de cisteína-cisteamina (dissulfureto misto). Este sal é, então, eliminado das células através de um sistema que transporta um outro aminoácido (lisina). A quantidade de cistina nos órgãos diminui, limitando, assim, as lesões causadas nestes órgãos. Como foi estudado o CYSTAGON?O CYSTAGON foi investigado em três estudos clínicos que incluíram 234 doentes ao longo de um período de 12 anos. Estes estudos incluíram crianças e doentes recentemente recrutados nos quais foram testadas duas doses diferentes. Na medida em que se trata de uma doença muito grave, não foi possível, por questões éticas, comparar CYSTAGON directamente com um tratamento simulado. Em vez disso, a comparação foi efectuada com um grupo de doentes que tinham sido tratados com um tratamento simulado noutro ensaio não relacionado. Os estudos analisaram a função renal, a sobrevivência e a taxa de crescimento dos doentes.

Qual o benefício demonstrado pelo CYSTAGON durante os estudos? Os três estudos realizados mostraram que CYSTAGON retarda a ocorrência de

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problemas renais e a necessidade de diálise ou transplante renal quando o tratamento é iniciado nos primeiros anos de vida em doentes com boa função renal. Também melhora a taxa de sobrevivência e a taxa de crescimento nas crianças tratadas. Qual é o risco associado ao CYSTAGON?Os efeitos secundários do CYSTAGON estão relacionados principalmente com o sistema digestivo. Os efeitos secundários mais habituais (observados em mais de 1 em cada 10 doentes) são: anorexia (alteração grave do apetite), vómitos, náuseas (enjoos), diarreia, letargia (falta de energia) pirexia (febre). Para a lista completa dos efeitos secundários comunicados relativamente ao CYSTAGON, consulte o Folheto Informativo. O CYSTAGON não deve ser utilizado em pessoas que possam ser hipersensíveis (alérgicas) à cisteamina ou a qualquer um dos outros componentes ou à penicilamina. Não deve ser utilizado em mulheres a amamentar ou que estejam, ou possam estar, grávidas (em especial durante o primeiro trimestre de gravidez), excepto em caso de absoluta necessidade. Por que foi aprovado o CYSTAGON?A cistinose é uma doença rara e mortal e o CYSTAGON é considerado um medicamento útil para o tratamento desta doença, para a qual não existe qualquer outro tratamento. O Comité dos Medicamentos para Uso Humano (CHMP) conclui que os benefícios do CYSTAGON são superiores aos seus riscos e recomendou a concessão de uma Autorização de Introdução no Mercado para o medicamento. O CYSTAGON foi inicialmente autorizado em "Circunstâncias Excepcionais", porque, uma vez que a doença é rara, a informação disponível à data da aprovação era limitada. Tendo a empresa fornecido as informações complementares solicitadas, a situação de “Circunstâncias Excepcionais” terminou em 17 de Abril de 2007. Outras informações sobre o CYSTAGON Em 23 de Junho de 1997, a Comissão Europeia concedeu à Orphan Europe uma Autorização de Introdução no Mercado, válida para toda a União Europeia, para o medicamento CYSTAGON. A autorização foi renovada em 23 de Junho de 2002 e em 23 de Junho de 2007.

Igualmente constatou-se que, até o momento, a Cysteamine não foi objeto de registro no âmbito da ANVISA e, tampouco, foi elaborado Protocolo de Diretrizes Terapêuticas – PCDT – para a CISTINOSE contemplando o citado fármaco (fls. 101/102, 288/296 e 351/353).

Com relação ao custo do tratamento, sabe-se, por intermédio do CEMEPAR (fls. 264/265 e 475/477 da ACP(doc.1), que o Cystagon – fabricado pelo Laboratório Orphan

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Pharmaceutical – foi adquirido, em setembro de 2009 e agosto de 2010, com variação do custo unitário da cápsula entre R$ 8,58 (oito reais e cinquenta e oito centavos) a R$ 10,11 (dez reais e onze centavos).

A partir destes dados e considerando o receituário de fls. 05 do PA n.º 1.25.005.001398/2010-15, doc.5, o custo, a cada mês e meio, de tratamento do paciente Vinicius de Paula Leão da Silva ficará entre R$ 1.716,00 (um mil, setecentos e dezesseis reais) e R$ 2.022,00 (dois mil, vinte e dois reais).

A Secretaria de Estado da Saúde do Paraná – SESA – nega acesso ao fármaco sob a alegação de que a Cysteamine não possui registro na ANVISA e não integra a lista oficial do Ministério da Saúde (fls. 38 do PA n.º 1.25.005.001398/2010-15, doc.5).

Entretanto, a Dra. Thais Pereira Cardoso, nefrologista pediatra do SUS, que vem acompanhando o paciente Vinicius de Paula Leão da Silva no HU/UEL, prescreveu-lhe o medicamento bitartrato de cisteamina (Cystagon) 150mg, apontando-o como o único adequado para tratar a CISTINOSE.

Os já citados pacientes Jenifer Modenuti Silva, P.C.R.F. e Luiz Henrique Antônio da Silva, em idênticas condições e igualmente domiciliados na Subseção Judiciária Federal de Londrina, lograram acesso ao tratamento gratuito com Cysteamine pelo SUS, graças a oportunas e escorreitas intervenções da Justiça Estadual e Federal, a partir de atuação do Ministério Público.

Observa-se, portanto, que a indispensabilidade do uso da Cysteamine, em benefício do paciente Vinicius de Paula Leão da Silva resta cabalmente demonstrada por meio das prescrições e relatórios médicos de fls. 05/08, bem como dos pareceres e estudos de fls. 18/26, 55/57, 96/102, 104/120 do PA n.º 1.25.005.000071/2009-84, doc.2, fls. 18/33 do PA n.º 1.25.005.001398/2010-15, doc.5 e fls. 259/260, 288/293 e 352/353 da Ação Civil Pública n.º 2009.70.01.003025-0.

3. Dos pedidos

Diante do exposto, entendemos que há viabilidade na formulação de pedido antecipação da tutela perante o TRF4, na forma consagrada pelo art. 273 combinado com o artigo 800 parágrafo único, ambos do Código de Processo Civil.

Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:I – haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação;ouII – fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.

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Vale ressaltar a importância do instituto da antecipação de tutela e de seu uso, nas palavras de Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart9:

Não há motivos para timidez no seu uso, pois o remédio surgiu para eliminar um mal que já está instalado, uma vez que o tempo do processo sempre prejudicou o autor que tem razão. É necessário que o juiz compreenda que não pode haver efetividade sem riscos. A tutela antecipatória permite perceber que não é só a ação (o agir, a antecipação) que pode causar prejuízo, mas também a omissão. O juiz que se omite é tão nocivo quanto o juiz que julga mal. Prudência e equilíbrio não se confundem com medo, e a lentidão da justiça exige que o juiz deixe de lado o comodismo do antigo procedimento ordinário - no qual imaginam que ele não erra – para assumir as responsabilidades de um novo juiz, de um juiz que trata dos “novos direitos” e que também tem que entender – para cumprir com sua função sem deixar de lado sua responsabilidade social – que as novas situações carentes de tutela não podem, em casos não raros, suportar o mesmo tempo que era gasto para a realização dos direitos de sessenta anos atrás, época em que foi publicada a célebre obra de CALAMANDREI, sistematizando as providências cautelares.

No caso em comento, estão presentes todos os requisitos exigidos pela lei processual para o deferimento da antecipação de tutela.

(a) Prova inequívoca da verossimilhança da alegação:

De acordo com Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Arenhart10, a verossimilhança a ser exigida pelo juiz, contudo, deve considerar: (i) o valor do bem jurídico ameaçado, (ii) a dificuldade de o autor provar sua alegação, (iii) a credibilidade da alegação, de acordo com as regras da experiência, e (iv) a própria urgência descrita.

Como visto, o diagnóstico e a prescrição médica realizados pela Dra. Thais Pereira Cardoso (fls. 05/08 do PA n.º 1.25.005.001398/2010-15, doc.5), nefrologista pediatra do SUS, vinculada ao Hospital Universitário da Universidade Estadual de Londrina (HU/UEL), corroborados por uma ampla gama de pareceres e estudos científicos, apresentam o medicamento Cysteamine, sob a forma de bitartrato de cisteamina (Cystagon), foi apontado como a única opção de tratamento da CISTINOSE que aflige o paciente Vinicius de Paula Leão da Silva. Isso prova de maneira inequívoca a existência do direito invocado, bem como a necessidade de dispensação do citado fármaco ao paciente.

Há também prova inequívoca do descaso e da omissão do Poder Público em disponibilizar gratuitamente o medicamento postulado, conforme demonstrou-se às fls. 38 do PA

9Ops. Cit. p. 204.10Ops. Cit. p. 216.

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n.º 1.25.005.001398/2010-15, doc.5 (Memo nº 0666/2010/CEMEPAR datado de 06-09-2010) e nos autos de Ação Civil Pública.

Quanto aos bens jurídicos ameaçados no caso em tela, é evidente que possuem um valor incalculável, imensurável. Trata-se do direito à vida e do direito à saúde da criança Vinicius de Paula Leão da Silva, direito esse, frise-se, fundamental e indisponível, consagrado constitucionalmente. Importa destacar a prevalência dos direitos desse cidadão e do respectivo dever de assistência terapêutica integral, inclusive farmacológica – interesse público primário –, àqueles meramente econômicos dos Entes Estatais – interesse público secundário.

(b) Fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. urgência no deferimento da liminar

Conforme exposto e devidamente demonstrado no PA n.º 1.25.005.001398/2010-15, doc.5, a criança Vinicius de Paula Leão da Silva, nascido em 20-05-2009 (atualmente com um ano e cinco meses de idade), padece de CISTINOSE, na modalidade NEFROPÁTICA, a mais comum e grave da doença. Segundo o relatório médico, o paciente Evolui neste ambulatório com dificuldades nutricional, controle criterioso de eletrólitos, porém descompensações frequentes com necessidade de internação. […] Mantém quadro de ajuste hidroeletrolítico instável e desnutrição grave.

Além disso, como já explanado, estudos comprovaram que, quando o tratamento é iniciado antes dos 02 (dois) anos de idade, há uma redução marcante na velocidade de instalação da insuficiência renal e do acometimento tireoideano, estimando-se que, nesses pacientes, a insuficiência renal crônica terminal surja por volta dos 74 (setenta e quatro) anos de idade (fls. 25 e 56 do PA n.º 1.25.005.000071/2009-84, doc.2).

Frise-se que a doença, caso não seja tratada adequadamente desde cedo, tem prognóstico de culminar em insuficiência renal crônica aos 10 anos de idade, com necessidade de diálise e transplante.

Por força dessa grave e delicada situação é que, apesar do tratamento sintomático que o paciente vem recebendo no HU/UEL, necessita de Cysteamine (bitartrato de cisteamina 150 mg) para o controle de sua doença (prescrição médica de fls. 05 do PA n.º 1.25.005.001398/2010-15, doc.5).

Assim, comprovado está o grave e iminente risco de dano irreparável à saúde e à vida do paciente Vinicius de Paula Leão da Silva e de todos os demais pacientes que se encontram na mesma situação, justificando o pedido imediato de liminar antecipatória.

Logo, com fundamento no artigo 273 e seus parágrafos e do artigo 800 parágrafo único, ambos do Código de Processo Civil, e diante das consequências graves e irreversíveis que podem acometer a criança, caso não inicie com urgência seu tratamento com os remédios

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prescritos, é que se pleiteia a antecipação dos efeitos da tutela para o fim de determinar à União e ao Estado do Paraná, solidariamente, a adoção de todas as providências necessárias ao fornecimento da Cysteamine, em suas duas vias de administração, interna e tópica, consistentes no colírio de cisteamina e no fármaco Cystagon (bitartrato de cisteamina), em benefício do paciente Vinicius de Paula Leão da Silva, nos termos das prescrições médicas por ele apresentadas no PA 1.25.005.001398/2010-15, doc.5, ambas devidamente subscritas por médica integrante do SUS, sob pena de aplicação de multa diária no valor de R$1.000,00 (mil reais), ou em montante maior a ser estipulado segundo o prudente arbítrio desse Juízo, de molde a desestimular eventual inadimplemento.

Em face do exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL requer:

1. O recebimento da presente, citando-se a União e o Estado do Paraná para, querendo, apresentarem resposta, sob pena de revelia;

2. A concessão liminar de tutela antecipada, nos termos anteriormente expostos;

3. Após o deferimento da antecipação de tutela, expedição de mandado judicial diretamente à Secretaria de Saúde do Estado do Paraná, determinando-se o fornecimento do fármaco em prazo razoável, com o objetivo de evitar uma possível demora no cumprimento de carta precatória, tendo em vista a urgência de implantação da medida;

4. A dispensa do pagamento das custas, emolumentos e outros encargos, em vista do disposto no artigo 18 da Lei n.° 7.347/85;

5. A produção de prova documental, testemunhal, pericial e demais provas em direito admitidas, caso se façam necessárias ao pleno conhecimento dos fatos;

6. A imposição de multa diária a ser arbitrada pelo Juízo, em montante não inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais), por descumprimento de eventual decisão que venha a ser exarada acolhendo o pleito ministerial.

Porto Alegre/RS, 20 de outubro de 2010.

Marcelo Veiga BeckhausenPROCURADOR REGIONAL DA REPÚBLICA

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