Pedido Administrativo de Indenização Por Morte Pela Policia

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DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO NÚCLEO ESPECIALIZADO DE CIDADANIA E DIREITOS HUMANOS EXCELENTÍSSIMO SENHOR PROCURADOR GERAL DO ESTADO DE SÃO PAULO XXXXXX , brasileira, casada, cozinheira, portadora do RG nº XXXXXX, inscrita no CPF nºXXXXXX, residente na Rua XXXXXX, Jd. Mabel, São Paulo/SP, CEP XXXXXX e XXXXXX , brasileiro, casado, garçom, portador do RG nº XXXXXX, inscrito no CPF/MF XXXXXX, residente e domiciliado na Rua XXXXXX, nº 447, Jardim Mabel, São Paulo/SP, CEP XXXXXX, por meio da Defensora Pública infra-assinada e com fundamento na Constituição da República de 1988, artigo 5º, XXXIV, dispositivo este que assegura a todo cidadão o direito de petição aos órgãos da administração pública , vem com o devido Rua Boa Vista nº 103, 11º andar. Centro, São Paulo/SP. CEP 01014-001 Tel. 11-3101-0155 – ramal 135 1

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR PROCURADOR GERAL DO ESTADO DE SÃO

PAULO

XXXXXX, brasileira, casada, cozinheira, portadora do RG nº

XXXXXX, inscrita no CPF nºXXXXXX, residente na Rua XXXXXX, Jd. Mabel, São

Paulo/SP, CEP XXXXXX e XXXXXX, brasileiro, casado, garçom, portador do RG nº

XXXXXX, inscrito no CPF/MF XXXXXX, residente e domiciliado na Rua XXXXXX, nº

447, Jardim Mabel, São Paulo/SP, CEP XXXXXX, por meio da Defensora Pública

infra-assinada e com fundamento na Constituição da República de 1988, artigo

5º, XXXIV, dispositivo este que assegura a todo cidadão o direito de petição aos

órgãos da administração pública, vem com o devido respeito, à presença de

Vossa Excelência, expor, ponderar e ao final requerer o quanto segue a respeito

da morte de seu filho XXXXXX, brasileiro, solteiro, vendedor autônomo, nascido

em 27 de abril de 1983, portador do RG XXXXXX, ocorrida em 12 de março do

corrente ano e perpetrada por agentes públicos:

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LISTA DE DOCUMENTOS QUE ACOMPANHAM ESTE PEDIDO

1. Cédulas de Identidade

2. Comprovante de endereço

3. Declarações de hipossuficiência

4. Declarações de inexistência de ação judicial em curso (cf.

Decreto 44.422/99

5. Declarações conforme o disposto nos artigos 65 e 66 da Lei

Estadual 10.177/1998

6. Declaração dos pais relatando o ocorrido e o sofrimento

7. Declaração de renda da vítima

8. Declaração e certidão de óbito

9. Comprovantes de despesa com o velório, transporte e

sepultamento

10. Matéria do sítio eletrônico G1, da Globo, em que o

Governador do Estado lamenta e repudia os fatos.

11. Demais matérias veiculadas na imprensa

12. Boletim de Ocorrência

13. Cópias do inquérito/processo criminal

14. Decretos 55.754/2010 Decreto nº 52.521/2007 e

Decreto nº 55.812/2010, do Governo do Estado, através dos

quais houve pagamento administrativo de ofício para casos

em que a vítima foi morta por agentes do Estado.

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1- ESCLARECIMENTOS INICIAIS:

A) DO DIREITO DE PETIÇÃO:

Este requerimento tem por base o artigo 5º, inciso XXXIV da

Constituição Federal de 1988, que assegura, independentemente do pagamento

de taxas “o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou

contra ilegalidade ou abuso de poder”.

Desta forma, facultou a Constituição Federal de 1988 a

qualquer pessoa o direito de relatar ao Poder Público um fato ou situação que se

apresente e deva ser prontamente apurado e solucionado.

É por intermédio desse instituto que o particular invoca a

manifestação do órgão gestor do interesse público sobre determinado fato.

A Constituição Federal de 1988, porém, não só assegurou o

direito de peticionar perante qualquer órgão público independentemente de taxa,

como também exige deste órgão público uma resposta a tal petição, pois, se

assim não o fosse, tal instituto seria uma mera apresentação de papéis.

Em específico, neste Estado de São Paulo, o direito de

petição contra ilegalidade ou abuso de poder está plasmado na Lei 10.177 de 30

de dezembro de 1998, que em seu artigo 23 preceitua que:

Artigo 23 - É assegurado a qualquer pessoa, física ou jurídica, independentemente de pagamento, o direito de petição contra ilegalidade ou abuso de poder e para a defesa de direitos.

É por isso que José Afonso da Silva, ao definir o direito de

petição o aponta como sendo “o direito que pertence a uma pessoa de invocar a

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atenção dos poderes públicos sobre uma questão ou situação” (Curso de direito

constitucional positivo, 23 ed., p.441).

Observe-se que o conceito trazido engloba necessária

atenção do poder público invocado sobre relatos feitos, o que induz a crer ser

indispensável uma resposta à petição apresentada.

Pelo exposto, requer-se seja o presente pedido recebido e

provido, aguardando-se um pronunciamento oficial sobre os fatos e pedidos aqui

trazidos, conforme trâmites previstos na já citada Lei Estadual que regra os

procedimentos administrativos.

B) DA ATUAÇÃO DA DEFENSORIA PÚBLICA in casu

A Defensoria é instituição essencial à função jurisdicional do

Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos

necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV, conforme o que dispõe o artigo 134 da

Constituição Federal.

Nesse sentido, cumpre esclarecer que os peticionários são

necessitados, situação que foi constatada através de triagem sócio-econômica, e

se declararam formalmente pobres na acepção jurídica, conforme termos

firmados e neste momento acostados.

Também, a título de esclarecimento, importante pontuar que

é prerrogativa do Defensor Público a atuação sem procuração, razão pela qual

deixa de juntá-la, ex vi do abaixo disposto:

Lei Complementar Estadual 988/2006, artigo 162 - São prerrogativas dos membros da Defensoria Pública do Estado, além daquelas definidas na legislação federal:

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(...)VI - atuar na defesa de interesses ou direitos individuais, difusos, coletivos ou individuais homogêneos, em processo administrativo, independentemente de mandato, ressalvados os casos para os quais a lei exija poderes especiais;

Quanto à realização deste pedido administrativo, ao invés de

propositura de ação judicial neste momento, três foram os motivos ensejadores.

Primeiro, a atenção aos princípios da eficiência e do

interesse público que permeiam a administração pública, com vistas a dar uma

resposta célere, efetiva e tempestiva a uma ilegalidade patente envolvendo

agentes do Estado amplamente divulgada e que a todos chocou, bem como com

vistas a reduzir gastos estatais com a movimentação do Poder Judiciário,

honorários advocatícios e eventuais custas judicias etc.

Segundo, porque é missão institucional da Defensoria

Pública deste Estado de buscar a composição extra-judicial dos conflitos,

conforme dispositivo da Lei Complementar Federal 80/94:

Art. 1º  A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, assim considerados na forma do inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal.

Art. 4º São funções institucionais da Defensoria Pública, dentre outras:II – promover, prioritariamente, a solução extrajudicial dos litígios, visando à composição entre as pessoas em conflito de interesses, por meio de mediação, conciliação, arbitragem e demais técnicas de composição e administração de conflitos;

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Terceiro, porque o reconhecimento do ato ilícito a seguir

narrado foi feito de forma pública, honrosa e veemente pelo Excelentíssimo

Governador do Estado de São Paulo.

Em matéria publicada no G1, sítio eletrônico da Globo, em

05/04/2011, o Excentíssimo Governador do Estado declarou que os policiais

envolvidos na execução de XXXXXXX serã punidos. A declaração consistiu na

seguinte frase:

“Os dois policiais já estão presos. Nós não passamos a mão na cabeça de bandido. Eles serão expulsos da polícia e responderão a processo criminal”

E consectário lógico do ilícito penal é a assunção pública por

via indireta da responsabilidade objetiva do Estado e, por via de consequência, a

reparação pelos danos materiais e morais às vítimas do fato.

O atendimento do presente pedido demonstrará a coerência

do Governo, que tão lúcida e prontamente repudiou em rede nacional os

lamentáveis fatos que resultaram na morte de XXXXXXX.

2 - DOS FATOS:

Trata-se de pedido de indenização em decorrência de

homicídio consumado praticado por policiais militares do Estado de São Paulo,

ocorrido na tarde do dia 12 de março do ano de 2011, na cidade de Ferraz de

Vasconcelos, neste Estado.

A pessoa vitimada foi XXXXXX, cabelo “carapinha” e cútis

“parda”, segundo o Boletim do Ocorrência, que contava com apenas 27 anos de

idade.

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A morte foi causada por choque hemorrágico com ferimento

penetrante toraco-abdominal por agente perfuro-contundente (tiro), conforme

atestado de óbito.

Inúmeros relatos já levados a juízo, na seara criminal, dão

conta do seguinte relato fático, os quais apontam para a existência clara de um

nexo de causalidade. Vejamos.

A vítima foi perseguida pelos policiais militares XXXXXX, filho

de XXXXXX e de XXXXXX, nascido aos 20/08/1973, natural de Campo Alegre de

Lordes/BA e XXXXXX, RG XXXXXX /SP, filho de XXXXXX e de XXXXXX, nascido aos

15/04/1982, natural de São Paulo/SP.

A vítima, segundo consta, dirigia em alta velocidade uma

Van da marca Renault, subtraída de outrem, ocasião em que, perseguido por

Policiais Militares, veio a colidir contra o portão de um condomínio residencial na

Zona Leste de São Paulo.

Após a colisão, a vítima abandonou o veículo sem que

portasse qualquer arma de fogo (fls. 45); a então perseguição continuou a pé e

XXXXXX foi atingido na perna por um projétil de arma de fogo e logo após

algemado.

Em específico, a testemunha protegida sob número 428

informou que ocorreu de sete a oito disparos realizados pelos policiais dentro do

condomínio e presenciou o momento que XXXXXX, baleado, foi arrastado e

algemado e na sequencia “jogado” dentro da viatura com vida. (fls. 44) e que os

reclamos de dor da vítima eram respondidos com um “Cala a boca ladrão!”.

A vítima detida e ferida foi então levada da Zona Leste de

São Paulo para a cidade contígua de Ferraz de Vasconcelos, onde no Cemitério

Parque das Palmeiras, foi retirado COM VIDA e executado na frente de

testemunhas pelos próprios Policiais que o haviam prendido.

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Em específico, a testemunha protegida sob o número 431

informou que estava com sua família no cemitério Parque das Palmeiras no

município de Ferraz de Vasconcelos/SP visitando o túmulo de seu genitor e

observou que uma viatura da Polícia Militar adentrou em alta velocidade.

Insta ressaltar, que avistaram o momento que dois policiais

militares retiraram da viatura uma pessoa e em seguida escutaram um disparo

de arma de fogo e viram que XXXXXX, antes vivo, estava morto. Informou que

ficou desesperada e pediu o telefone da testemunha protegida sob o número 430

e ligou para o número 190 e denunciou o ocorrido.

Em suma, há provas mais do que suficientes de

materialidade e de autoria do ilícito perpetrada por agentes do Estado, sendo

certo que a sequência fática pode ser resumida na seqüência: PERSEGUIÇÃO-

FUGA SEM ARMA- DISPARO POR POLICIAIS QUE ATINGE A PERNA DA VÍTIMA-

RENDIÇÃO- PRISÃO- COLOCAÇÃO DO PRESO NA VIATURA FERIDO E COM VIDA-

CIRCULAÇÃO DA VIATURA POR CERCA DE UMA HORA E MEIA- PARADA NO

CEMITÉRIO DAS PALMEIRAS EM FERRAZ DE VASCONCELOS- RETIRADA DO PRESO

DA VIATURA COM VIDA- SÚPLICAS DO PRESO- ASSASSINATO DO PRESO,

PRESENCIADO POR TESTEMUNHAS.

O material em anexo é COMPROVA À EXAUSTÃO o

lamentável fato ocorrido.

3- DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO:

A dignidade humana, a vida e sua preservação são valores

fundantes de todo Estado e de toda comunidade internacional.

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Tanto é assim que os documentos internacionais de direitos

humanos reconhecem em primeiro lugar a dignidade inerente a toda pessoa, e

elegem o direito à vida como um dos primeiros direitos protegidos.

Nesse sentido está a Declaração Universal dos Direitos

Humanos da Organização das Nações Unidas – ONU, a Convenção Americana de

Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica)1 o Pacto Internacional de

Direitos Civis e Políticos de 19762, que logo no seu artigo 6 dispõe:

Artigo 6º, I: O direito à vida é inerente à pessoa humana. Este direito deverá ser protegido pela lei. Ninguém poderá ser arbitrariamente privado de sua vida.

Na mesma toada, a dignidade da pessoa humana foi alçada

a um dos cinco fundamentos da República Federativa do Brasil (CF, art. 1º, III) a

qual visa “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo,

cor, idade ou qualquer outras formas de discriminação” (CF, art. 3º, IV).

Assim, é que, quando o próprio Estado, contrariando seus

fundamentos e sua própria razão de ser, age no sentido de ceifar uma vida,

deparamo-nos talvez com a maior das injustiças, a qual tem o poder de instalar

medo nos cidadãos e uma descrença generalizada nas funções estatais. Daí a

importância do pronto repúdio a este tipo de ato, da contenção e da pronta

reparação por parte dos Governantes, o que ora aqui se pretende.

E para instrumentalizar tal repúdio, nosso arcabouço

legislativo desenhou o instituto da responsabilidade objetiva do Estado,

como se verá a seguir.

In casu, o filho da Sra. XXXXXX e do Sr. XXXXXX, ora

peticionários, foi assassinado brutalmente por policiais militares do Estado de

1 Promulgada pelo Decreto nº 678/922 Promulgada pelo Decreto nº 592/92

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São Paulo, os quais agiam no exercício de suas funções, investidos portanto do

braço armado do Estado.

Este fato acarretou evidentemente gravíssimos danos

materiais e morais aos requerentes conforme se extrai das declarações em

anexo que formam parte integrante desta petição.

Portanto, deve incidir neste caso o dispositivo no artigo 37,

§ 6º, da Constituição Federal, segundo o qual:

Art. 37 (...)§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. (grifou-se)

Assim, por imperativo de ordem constitucional, o Estado

deve responder pelos atos praticados por seus agentes, no exercício de função

pública, que causarem quaisquer prejuízos a terceiros. Essa responsabilidade,

segundo entendimento doutrinário e jurisdicional pacífico, é objetiva, de forma

que o ente público não se exime do dever de indenizar caso o agente causador

não tenha agido com dolo ou culpa, daí porque não há necessidade de se

aguardar o deslinde do feito criminal em curso que já resultou na prisão

processual dos policiais.

Existe a certeza de que o Governo do Estado igualmente

lamenta os fatos e repudia a atitude de agentes públicos que agem no sentido

oposto ao seu dever, travestindo-se de vingadores privados ao arrepio da lei que

deveriam cumprir. Está fora de questão, portanto, o questionamento sobre

“intenções” do Estado, e a Constituição Federal é clara ao plasmar a

responsabilização estatal objetiva, sem perquirições sobre o animus estatal ou de

seus agentes.

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No caso em tela, de qualquer forma, é inquestionável que os

Policiais Militares agiram dolosamente, eis que provocaram a morte de XXXXXX

por livre e espontânea vontade, julgando-o e executando-o sumariamente, a

olhos vistos.

Frise-se, mais um vez, ser irrelevante no âmbito civil a

perquirição do elemento subjetivo do agente.

Assim, bastam a existência de um ato praticado por um

preposto do Estado, o dano causado ao particular e o nexo de causalidade entre

um e outro para que surja o dever de indenizar por parte do Estado, conforme

expressa disposição constitucional.

E o nexo causal é extraído à exaustão tanto do relato acima

quanto dos inúmeros documentos que acompanham este pleito.

Numa digressão mais ampla, uma das justificativas para a

previsão de responsabilidade objetiva do Estado no texto constitucional reside no

fato de que o ente público deve assegurar aos particulares a garantia de que os

riscos advindos do exercício de serviços públicos ou do poder de polícia sejam

imputados ao próprio Estado, e não aos cidadãos.

Em outras palavras, se ao exercer as atribuições que lhe

incumbem , o Estado oferece risco aos particulares, também deve aquele

garantir a estes que os prejuízos desses risco serão sempre ressarcidos. É esse o

fundamento da denominada Teoria do Risco Administrativo.

Transportando essas premissas para o presente caso;

conclui-se que o poder de polícia exercido por agentes do Estado, que agiram em

nome deste, culminou com a morte de XXXXXX, é dever do ente público

indenizar os danos materiais e morais sofridos pelos requerentes como

decorrência deste fato.

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Está evidenciado, portanto, que é dever do Estado indenizar

os requerentes pelos prejuízos de ordem material e moral a eles causados pelos

Policiais Militares que agiram em seu nome.

4 - PRECEDENTES

Em casos análogos o Governo deste Estado de São Paulo,

acertada e louvavelmente, já deferiu indenização administrativas a vítimas de

violência policial em casos muito similares ao corrente, o que se consubstanciou

através do, Decreto nº 52.521 de 21 de dezembro de 2007 e Decreto nº 55.754

de 30 de abril de 2010 e do Decreto nº 55.812 de 13 de maio de 2010.

Espera-se assim que este pleito se junte ao grupo das

louváveis indenizações já concedidas, as quais demonstram a honradez e

coerência do Governo no respeito aos princípios e direitos fundamentais que

embasam nosso ordenamento jurídico e os sistemas internacionais de proteção

dos direitos humanos.

5 - DO QUANTUM DA INDENIZAÇÃO:

A perda absurda inflingida aos peticionários, já que não pôde

ser evitada, merece no mínimo reparo pelo dano material e pelo dano material

sofridos, ex vi do disposto no artigo 5º da Constituição Federal:

Artigo 5º, X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

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Para a aferição do quantum a título de dano material, a

legislação ordinária estipula que deva ser composto daquilo que foi perdido bem

como daquilo que se deixou de ganhar.

O que foi materialmente perdido compõe dos gastos com o

velório, transporte e sepultamento, R$2.349,33 (dois mil, trezentos e quarenta e

nove reais e trinta e três centavos).

O que se deixou de ganhar consiste no ordenado que XXXXXX

traria para casa para ajudar no sustento familiar.

Nesse sentido, esclareça-se que XXXXXX ganhava pouco mais

de um salário mínimo por mês, trabalhando autonomamente como vendedor na

feira, conforme comprova declaração anexa.

É certo que pretendia montar um “comércio” para auxiliar

seus genitores na velhice, conforme se extrai do relato dos genitores. Tratava-se

de uma expectativa, um desejo que traria a possibilidade de um ganho maior, daí

porque somada à constatação anterior, tem-se que o quantum relativo ao que

deixou de ganhar deve ser composto no mínimo de dois salários mínimos

mensais, um para cada genitor.

No tocante à quantificação do dano moral, em que pese a

dificuldade de aferir-se e paremetrizar o valor de uma dor, a doutrina e a

jurisprudência têm apontado para balizas, tais como capacidade econômica das

partes, e a necessidade de que o valor valha como um “valor de desestímulo”, de

forma a ser “sentida” pelo reparador de forma a que envide esforços para que

fatos semelhantes não mais sucedam.

Quanto à capacidade econômica, em que pese de um lado

tratar-se de requerentes com renda familiar em torno de três salários mínimos,

de outro lado havemos de convir que o Estado de São Paulo é o Estado mais rico

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da federação e o 2º orçamento brasileiro, só ficando atrás da União Federal, com

orçamento para 2011 no valor de R$ 132.345.329.729, dos quais R$

11.953.203.031 estão destinados para segurança pública e especificamente R$

7.944.333.120 para a polícia militar3

In casu também devem ser levado em conta alguns cenários

agravantes.

Primeiro, em específico, o fato de um dos policiais envolvidos

já apresentar envolvimentos em crimes contra a vida no exercício de suas

funções e mesmo assim continuar trabalhando em atividade direta de repressão

nas ruas.

Segundo, mais amplamente, note-se que a letalidade policial

tem crescido nos últimos tempos, sendo certo que em São Paulo, no primeiro

trimestre de 2010, as mortes aumentaram 40% em relação ao mesmo período do

ano anterior 4 .

O Brasil tem índices alarmantes de letalidade policial, tendo

sido exposto à comunidade internacional como país marcado por esse tipo de

violência. A cobrança da comunidade internacional para que o Brasil conjugue

segurança pública com direitos humanos é reiterada e não é de hoje, cabendo

notar que em junho de 2010 a ONU lançou relatório sobre execuções sumárias

chamando atenção para as taxas ainda “alarmantes” de violência policial, em

que pese a existência de 33 Recomendações lançadas pelo Relator Especial da

ONU sobre Execuções Sumárias, Arbitrárias e Extrajudiciais Dr. Philip Alston após

visita ao país em 20075.

Posto isso, se fosse possível mensurar o sofrimento, é certo

que a dor de ter o filho assassinado e previamente torturado por agentes do

Estado remunerados pelos próprios pais, vizinhos e demais contribuintes

encabeçaria a lista como a mais lancinante de todas haja vista que: a vida foi

3 http://www.planejamento.sp.gov.br/modulos/orcamento/orcamentos.aspx#

4 http://noticias.terra.com.br/brasil/noticias/0,,OI4415089-EI5030,00-Mortes+em+confrontos+com+a+PM+de+SP+crescem+em.html5 http://global.org.br/programas/onu-execucoes-sumarias-continuam-em-grande-escala-no-brasil/

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retirada pelo braço armado daquele que tem como fundamento a proteção e

libertação dos homens (o Estado), o fato surrupiou de forma irreversível o bem

maior de nosso ordenamento jurídico e inverteu o curso natural da vida, trazendo

a morte para quem é jovem e o calvário da vida para os pais que continuam

vivos, marcados para sempre pelo sofrimento e pela impossibilidade de vivenciar

seu filho se desenvolver e lhes dar netos, tendo retirado a possibilidade de

amparo material e afetivo dos pais na velhice, pelo filho morto.

Importante mencionar que há julgados nacionais

exatamente no sentido de que a indenização aos pais por morte de filho deve ser

a mais ampla possível6, uma vez que se trata de dor das mais lancinantes.

Para casos de “dores menores”, no sentido de que não

envolveu perda de vida, o Superior Tribunal de Justiça concedeu ou chancelou os

seguintes montantes para dano moral:

-1.000 (mil salários mínimos) pelo fato de adolescente ter

sobrevivido mas ficado em estato vegetativo (REsp 1148514/SP, Rel. Ministro

CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/02/2010, DJe 24/02/2010)

-R$1.140.000 (um milhão, cento e quarenta mil reais) para

policial baleado em serviço, com danos permantes (REsp 797.989/SC, Rel.

Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/04/2008, DJe

15/05/2008)

E especificamente, o mesmo Superior Tribunal, em casos

semelhantes ao presente, concedeu ou chancelou:

- R$ 500.000 (quinhentos mil reais) pela tortura e morte de

cidadão, ocorrida durante a 2ª Guerra Mundial (REsp 797.989/SC, Rel. Ministro

6 STJ, REsp 43.488/SP, Rel. Ministro GARCIA VIEIRA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 09/03/1994, DJ 11/04/1994, p. 7618

Rua Boa Vista nº 103, 11º andar. Centro, São Paulo/SP. CEP 01014-001

Tel. 11-3101-0155 – ramal 135

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HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/04/2008, DJe

15/05/2008).

- 2.000 (dois mil) salários mínimos pela morte de filho

perpetrada por agentes do Estado incumbidos de zelar pela Segurança Pública.

Quanto a este último julgado, vale a pena a transcrição de

sua ementa:

ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. QUANTUM INDENIZATÓRIO.- Quando o quantum fixado a título de indenização por danos morais se mostrar irrisório ou exorbitante, incumbe ao Superior Tribunal de Justiça aumentar ou reduzir o seu valor, não implicando em exame de matéria fática. Precedentes deste Sodalício.- A perda precoce de um filho é de valor inestimável, e portanto a indenização pelo dano moral deva ser estabelecida de forma eqüânime, apta a ensejar indenização exemplar.- Ilícito praticado pelos agentes do Estado incumbidos da Segurança Pública. Exacerbação da condenação.- Recurso desprovido.Indenização por dano moral mantida em R$ 486.000,00 (quatrocentos e oitenta e seis mil reais), 2.000 (dois mil) salários mínimos.(REsp 331.279/CE, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 23/04/2002, DJ 03/06/2002, p. 150)

Posto isso, nesta via administrativa, é a presente para

requerer sejam pagos, no mínimo, R$500.000,00 (quinhentos mil reais) de

indenização para danos morais para cada um dos genitores, valores que

correspondem, somados, a simbólicos 0,00083% do valor destinado para

Segurança Pública no orçamento estadual de 2011.

6 - DOS PEDIDOS

Por todo o exposto, é a presente para requerer V. Exa. digne-

se:

Rua Boa Vista nº 103, 11º andar. Centro, São Paulo/SP. CEP 01014-001

Tel. 11-3101-0155 – ramal 135

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a) Receber este requerimento em atendimento ao Direito

Constitucionalde Petição, bem como dar-lhe a devida

atenção com os encaminhamentos necessários;

b) Reconhecer a responsabilidade objetiva estatal no caso

ora narrado;

c) Conceder indenização aos genitores do morto, ora

peticionários, no importe de R$500.000,00 (quinhentos

mil reais) para cada um, valor correspondente a cerca de

820 salários minímos estaduais;

d) Conceder, a título de indenização por danos materiais,

uma pensão vitalícia a cada um dos genitores no valor de

um salário mínimo paulista;

e) Conceder, a título de indenização por danos materiais, o

ressarcimento dos valores gastos com o velório,

transporte e sepultamento da vítima, no valor de

R$2.349,33 (dois mil, trezentos e quarenta e nove reais e

trinta e três centavos);

f) Isenção de eventuais custas;

g) a intimação pessoal da Defensoria Pública, na pessoa da

Defensora que esta subscreve, das decisões aqui

emanadas, conforme prerrogativa legal contida no artigo

128, I da Lei Complementar Federal 80/94.

Acreditando no senso de Justiça deste Digníssimo

Governador do Estado de São Paulo, esperam os requerentes que seus pedidos

sejam atendidos na íntegra.

Termos em que, pedem deferimento.

São Paulo, 12 de maio de 2011.

DANIELA SKROMOV DE ALBUQUERQUE

Defensora Pública

Rua Boa Vista nº 103, 11º andar. Centro, São Paulo/SP. CEP 01014-001

Tel. 11-3101-0155 – ramal 135

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XXXXXX XXXXXX

Mãe de XXXXXX Pai de XXXXXX

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