Pedagogia Hospitalar

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Pedagogia Hospitalar na Pedagogia Social.

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    Pedagogia hospitalar na Pedagogia Social: reflexes tericas Erclia Maria Angeli Teixeira de Paula1

    RESUMO: Neste artigo discute-se a insero da Pedagogia Hospitalar na Pedagogia Social. O objetivo deste artigo analisar questes conceituais e reflexes sobre a Pedagogia Hospitalar e Pedagogia Social. A metodologia utilizada no artigo foi reviso de literatura. A concluso aponta aspectos que necessitam ser investigados com maior profundidade para uma compreenso mais crtica das reas. Palavras-Chave: Pedagogia Hospitalar, Pedagogia Social, Crianas, Adolescentes ABSTRACT: This paper presents a discussion about the insert Education in Hospital in Social Pedagogy. The main of this article is to analyses questions and conceptions about Education in Hospital in Social Pedagogy. The methodology in this article was a review of the literature. The conclusion presents aspects that deserve to be studied in greater depth to bring more critical understanding of these areas. KEY WORDS: Education in Hospital, Social Pedagogy, Children, Teenager

    INTRODUO

    As preocupaes da educao para segmentos historicamente excludos

    tm sido discutidas h vrias dcadas por pesquisadores da Educao Popular,

    Educao No Formal e mais recentemente por estudiosos da Pedagogia Social.

    Todavia, embora existam vrias produes acadmicas sobre estas temticas,

    nos cursos de Pedagogia e licenciaturas no Brasil, essas discusses ainda so

    incipientes.

    Este artigo tem como objetivo refletir teoricamente a respeito da insero

    da Pedagogia Hospitalar na Pedagogia Social. Essas reas apresentam

    especificidades, todavia, existem elementos comuns que agregam conceitos e

    idias.

    A justificativa pela opo deste tema est voltada pelo fato de que venho

    pesquisando, h alguns anos, a forma como est sendo organizada a Pedagogia

    Hospitalar no Brasil. Algumas reflexes j foram expressas nas seguintes

    1 Docente do Departamento de Educao e Mestrado em Educao da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), Paran. E-mail: [email protected].

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    publicaes: Paula (2005), Paula (2007), Paula (2008). Tambm tenho buscado

    compreender a constituio da Pedagogia Social e suas nuances. Alguns

    apontamentos foram realizados nos seguintes trabalhos: Paula e Machado

    (2007,2009).

    No que se refere Pedagogia Hospitalar, durante muitos anos, as crianas

    e adolescentes hospitalizados foram marginalizados pelo sistema educacional.

    Por estarem internados, eles foram considerados incapazes de dar

    prosseguimento a seus estudos. Essas concepes fizeram com que muitas

    crianas e adolescentes tivessem uma dupla excluso social, pois alm de serem

    penalizados por suas doenas, tambm no tinham acesso educao. Essas

    concepes de crianas e adolescentes esto sendo modificadas em tempos

    modernos em funo dos avanos nas leis e garantias de proteo social a esta

    populao, todavia durante vrios anos, a invisibilidade destas crianas e

    adolescentes foram predominantes.

    Arroyo (2008) considera que pro vrias dcadas a Pedagogia construiu seu

    pensar e fazer educativos atravs de imagens e verdades lineares e abstratas

    sobre infncia e juventude. Estas categorias eram concebidas como dados

    naturalizados, tempo biolgicos com etapas universais e pr-fixadas. Para ele:

    As crianas concretas no foram nem so sujeitos da gestao de seus lugares, de suas imagens e de suas verdades. Com esta viso da infncia foram construdas verdades histricas e imaginrios sociais sobre elas. Foram construdos saberes, instituies, pedagogias, pedagogos e estratgias de gesto da infncia. (ARROYO, 2008,p.125).

    Desta maneira, Arroyo defende a necessidade do dilogo dos estudos da

    infncia com vrias cincias que contribuam para desnudar o pensar e fazer

    educativos. Para Arroyo (2008) no possvel entender o ofcio da docncia e da

    educao, suas identidades, pensamento, descolados das verdades histricas:

    Entretanto, os estudos no deixam de mostrar-nos que h infncias que ao longo da histria no couberam, nem na atualidade cabem, nesse estatuto e perfil universais de infncia; que h outras infncias que no foram atingidas pelas estratgias e instituies civilizatrias e pedaggicas. Infncias que no foram objeto dos mesmos saberes legitimados. Para essas outras infncias foram pensados outros estatutos e outros saberes pedaggicos. Os estudos mostram que outros coletivos de adultos e crianas nem sequer foram imaginados como civilizveis nem como educveis. Se os estudos nos revelam que h outros adultos e outras crianas, como esses outros interrogam o pensar e fazer educativos? Como interrogam os estatutos e iderios, as

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    instituies, estratgias e verdades e os saberes tidos como universais? A pedagogia que por oficio convive com esses outros adultos e jovens e com essas outras crianas sair enriquecida se prestar ateno diversidade de estudos que se voltam para a reconstruo histrica, sociolgica e antropolgica das outras infncias (ARROYO, 2008, p. 130)

    Portanto, como possvel observar, vrios estudiosos no Brasil tm

    procurado defender os direitos das crianas e adolescentes a uma educao de

    qualidade e com dignidade a todas as pessoas, indistintamente.

    Nesse sentido, a Pedagogia Social est sendo discutida no Brasil como

    uma maneira de repensar caminhos, prticas e teoria.

    As aproximaes entre a Pedagogia Hospitalar e a Pedagogia Social no

    Brasil, esto relacionadas ao fato de serem reas que buscam garantir os direitos

    educacionais aos segmentos historicamente excludos.

    Nesse sentido, a problemtica principal que norteou este estudo foi: Como

    a Pedagogia Hospitalar tem institudo seu corpus de conhecimento no Brasil e

    quais as relaes com a Pedagogia Social?

    Esta pesquisa qualitativa e de cunho terico. Os procedimentos

    metodolgicos foram pautados na reviso de literatura fundamentada e crtica das

    produes de Pedagogia Hospitalar e Pedagogia Social.

    De acordo com Alves-Mazzotti (2006) a reviso de literatura exige uma

    postura do pesquisador comprometida e engajada com a crtica sobre o estado

    atual do conhecimento de sua rea de interesse. Para isso, faz-se necessria a

    comparao e contraste de abordagens terico-metodolgicas utilizadas,

    avaliao da confiabilidade dos resultados de maneira que sejam identificados os

    pontos de consenso, controvrsias, regies e lacunas que precisam ser

    esclarecidos. Em funo da necessidade de compreenso destas reas, a seguir,

    sero analisadas suas especificidades.

    1. A Pedagogia Hospitalar e suas relaes com a Pedagogia Social

    A Pedagogia, diante das transformaes da realidade econmica,

    poltica e cultural que o Brasil enfrenta, tem feito com que cada vez mais novas

    tarefas sejam atribudas para o educador e para a populao a quem atende.

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    Para Libneo (1991), a Pedagogia tradicional caracteriza-se por

    enfatizar a tradio constituda e unilateral entre educadores e alunos. J a

    Pedagogia Nova, privilegia o trabalho conjunto de descobertas educadores-

    educandos e busca abarcar vrias dimenses do desenvolvimento humano.

    Desde o incio da dcada de 90, Libneo (1991) em um dos seus

    artigos publicado em uma coletnea sobre Psicologia Social, j fazia alguns

    apontamentos e reflexes sobre a constituio da Pedagogia Social no Brasil.

    Para ele, naquela poca, nas discusses sobre a escola, os

    pesquisadores, ora privilegiavam as crticas a escola como reprodutora das

    relaes sociais vigentes e ora se restringiam a discutir as experincias das

    classes populares para possibilitar adquirir conscincia crtica. A partir dessas

    questes, Libneo fazia a proposio de uma Pedagogia diferenciada na seguinte

    afirmativa:

    Uma Pedagogia social voltada para os contedos culturais entende que h saberes universais que se constituram em domnios de conhecimento relativamente autnomos incorporados pela humanidade e que devem ser permanentemente reavaliados em face s realidades sociais, atravs de um processo de transmisso-assimilao-reavalidao crtica. O objetivo da escola, assim, ser garantir todos,o saber e as capacidades necessrias a um domnio de todos os campos da atividade humana, como condio para reduo das desigualdades de origem social. (LIBNEO, 1991,p.166)

    Portanto, percebe-se que Libneo j chamava a ateno para a

    necessidade de uma Pedagogia voltada para o social nas escolas.

    Posteriormente, Libneo (1999) vai analisar as relaes da Pedagogia

    na modernidade e a ampliao da educao e suas reas de atuao. Para ele, a

    educao est presente nos meios de comunicao, nos movimentos ecolgicos,

    nas Organizaes No Governamentais (ONGs), em meios profissionais,

    sindicais, polticos, nos quais, assiste-se a uma redescoberta do pedaggico, a

    ponto de se falar em uma sociedade pedaggica. Ele considerava tambm que

    nesta extenso, a ao pedaggica extrapolava a sua atuao para outros

    mbitos alm da escola: como a pedagogia familiar, a pedagogia profissional,

    social, sendo que as aes pedaggicas realizadas nos servios de sade eram

    denominadas prticas educativas extra-escolares. Neste sentido, os profissionais

    que trabalhavam nestas modalidades de ensino distinguiam-se em dois aspectos:

    1) aqueles que exerciam de forma sistemtica essas atividades e 2) aqueles que

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    ocupavam parte de seu tempo nas mesmas e eram classificados como

    formadores, animadores, instrutores, organizadores, tcnicos, consultores,

    orientadores, que desenvolviam atividades pedaggicas (no escolares) em

    rgos pblicos, privados e pblicos no estatais, ligadas s empresas, cultura,

    aos servios de sade, promoo social, etc.

    A educao, portanto, j no estava mais circunscrita aos muros da

    escola. Ela acontecia atravs da mdia, em diferentes locais como hospitais,

    presdios, na rua. H de se considerar que, quando os educadores comeam a

    educar em ambientes diversificados, a educao assume caractersticas bem

    peculiares, que se diferem um pouco das instituies educacionais formais, mas

    tambm conservam elementos comuns. necessrio lembrar que essas formas

    de educar assumem compromissos significativos com a formao de quem se

    educa e quem educado.

    Luckesi (2000), ao analisar as implicaes da educao na vida dos

    educandos, considera que:

    A educao, nos seus diversos , familiar, religiosa, no formal, formal, tem a possibilidade de mediar uma construo sadia da vida. Na medida em que grande parte da populao mundial passa por ela, imenso o poder que tem a educao de interferir numa direo sadia a ser dada vida. (LUCKESI, 2000, p. 10).

    Portanto, esses diferentes cenrios educativos esto constituindo a

    cultura da educao escolar atual que vem sendo alterada em funo das

    transformaes sociais.

    Nvoa (2002) considera que a escola atualmente est enfrentando uma

    crise devido ao fim do Estado educador e est em um momento de transio,

    uma zona intermediria, que atende, tanto aos interesses do Estado, como do

    setor privado, que esto oportunizando novos espaos pblicos de educao. Ele

    prope um novo espao pblico da educao, que no se limite a pequenos

    retoques na escola pblica estatal. Desta maneira, defende a idia de que

    preciso renovar a escola como espao pblico a partir do enfrentamento de trs

    dilemas que influenciam na profisso docente: a necessidade do professor saber

    se relacionar com a comunidade; saber se organizar para ter autonomia em seu

    trabalho e saber analisar os fenmenos educativos atravs do conhecimento.

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    Esses trs aspectos redefinem a presena dos professores no espao pblico da

    educao.

    Nvoa cita o livro Sociedades sem Escolas do pesquisador Illich, que

    na dcada de 70, apregoava a idia de que a escola no resistiria as crises que

    enfrentava. No entanto, ressalta o fato que, apesar das crticas que foram

    realizadas: Nos ltimos trinta anos assistiu-se a um crescimento dos sistemas

    escolares, que foram invadindo todos os espaos e tempos da vida. O apelo

    recente educao e formao ao longo da vida o episdio mais recente de um

    longo processo de escolarizao da sociedade. (Nvoa, 2002, p. 13).

    Para Nvoa, a crise da escola em tempos modernos, tem criado

    espaos alternativos para proteger as crianas como: escolas comunitrias,

    escolas em ambientes religiosos, ensino domstico (aulas em casa), os cheques

    ensino (modalidade portuguesa para atender as populaes desfavorecidas) e

    prticas de voluntariado. Ele considera que, como no se tem uma unicidade nas

    aes, pois existe uma multiplicidade de solues e polticas, ainda no se tem

    elementos que permitam avaliar rigorosamente o impacto acadmico e social

    destas polticas. Todavia, est ocorrendo uma renovao da educao como

    espao pblico. Para ele, repensar a educao como espao pblico, implica em

    compreender as razes que impediram a escola de cumprir muitas de suas

    promessas histricas. Estas reflexes possibilitam reconciliar a escola com a

    sociedade e chamar a sociedade para dentro das escolas.

    Na realidade brasileira preciso discutir o papel e a necessidade do

    Estado em relao s Polticas Pblicas para educao e para o cuidado integral

    com as crianas e adolescentes, entretanto, preciso considerar tambm que os

    movimentos de expanso da educao no formal2 que vem expandido no Brasil,

    tm-se inserido nas brechas das funes que a escola, o Estado e a educao

    formal, tm deixado de cumprir, assim como tambm representa a elaborao de

    uma outra ordem no sistema escolar. Nas escolas formais, em sua grande

    maioria, por ainda predominar, um modelo excludente, uniformizador e

    segregacionista, esse modelo de educao tem tido dificuldades de cumprir o

    2 O termo educao no formal foi utilizado por ser convencionalmente conhecido. Todavia, existem diferentes definies do conceito que no sero analisadas neste artigo.

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    seu papel em relao s minorias, nas quais se inserem as crianas e os

    adolescentes hospitalizados.

    Quando uma criana ou adolescente esto sendo escolarizados e so

    internados em hospitais, muitas vezes, muitos professores das escolas de origem

    no se preocupam com o que est ocorrendo com eles. Para muitos desses

    professores, as condies precrias de trabalho associados ao desinteresse pela

    realidade dos alunos faz com que essas crianas e adolescentes sejam

    esquecidas. Os movimentos de setores da sociedade civil em prol da educao

    para essas minorias tm procurado atender a essas demandas, possibilitando

    outras formas de educao na sociedade brasileira, no somente as

    tradicionalmente existentes.

    Na dcada de 90 no Brasil, por fora dos movimentos sociais e aes

    do poder pblico, foram criadas leis como o Estatuto da Criana e do Adolescente

    ECA (BRASIL, 1990). Ceccim e Carvalho (1997) tambm descrevem a lei dos

    Direitos das Crianas e dos Adolescente Hospitalizados elaborada pela

    Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e pelo Conselho Nacional dos Direitos da

    Criana e do Adolescente (CONANDA). Essas leis visam a proteger a infncia e

    juventude e servir como instrumento para garantia de uma sociedade mais justa.

    De acordo com Ceccim e Carvalho, na Resoluo n.41, de 13 de

    Outubro de 1995 da lei dos Direitos das Crianas e dos Adolescentes

    Hospitalizados, chancelada pelo Ministrio da Justia, existem vinte itens em

    defesa da criana e jovens hospitalizados.

    Dentre os artigos apresentados est previsto o direito educao:

    Artigo 9. Direito de desfrutar de alguma forma de recreao, programa de

    educao para a sade, acompanhamento do currculo escolar durante sua

    permanncia hospitalar. (CECCIM e CARVALHO, 1997, p. 188)

    Embora esteja previsto por lei que as crianas tenham

    acompanhamento pedaggico no hospital e que existam professores para realiz-

    lo, os hospitais, de modo geral, quer sejam pblicos ou privados, tm feito muito

    pouco para possibilitarem criana hospitalizada dar continuidade aos seus

    estudos; salvo raras excees que tm se preocupado em atender as

    necessidades biopsicosociais dessa populao. Tambm os rgos pblicos, os

    educadores e a sociedade em geral, pouco reconhecem esses espaos

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    educativos como uma modalidade oficial de ensino em nosso pas, pois so raras

    as Secretarias de Educao que implantam essas prticas educativas nos

    hospitais, garantindo-lhes apoio e assistncia.

    Todavia, cabe destacar as aes da Associao das Pioneiras Sociais

    que responsvel pelo Hospital Sarah que realiza concursos pblicos para

    professores hospitalares e oferece condies de trabalho expressivas. O

    Programa Sareh no Estado do Paran da Secretaria Estadual da Educao

    tambm tem se destacado como poltica pblica significativa na implantao do

    trabalho do professor nos hospitais do seu Estado.

    O pesquisador Aquino (2000), ao discutir a questo da escolarizao

    das crianas e adolescentes hospitalizados, considera que ainda h muito por se

    fazer nessa rea devido ao descaso com que a prpria sociedade trata essa

    questo. Ao discutir o papel do professor no hospital, as condies dos alunos, a

    diferena e da hospitalizao, considera que existem um distanciamento muito

    grande entre o que denominamos de democracia poltica e democracia social.

    Para ele:

    [...]no basta democratizar o pas na esfera poltica se no houver democracia tambm nas instituies que regem o dia a dia. E essa a tarefa principal de nossa gerao. [..] Por que, por um lado, excedemos em compaixo quando s crianas diferentes do padro (e a includa a criana hospitalizada) e, por outro lado, proporcionamos sua invisibilidade e seu silenciamento civil? Em termos mais concretos, por que temos tido tanta dificuldade de garantir espaos sociais de fato inclusivos, e, para todos?(AQUINO, 2000, P. 25).

    Segundo dados de Fonseca (1999), a educao nos hospitais

    brasileiros iniciou-se desde 1950, com a primeira Classe Hospitalar no Hospital

    Jesus no Rio de Janeiro. Mas, essa modalidade de ensino s foi reconhecida em

    1994 pelo Ministrio da Educao - MEC (BRASIL, 1994)

    A expanso das escolas nos hospitais no Brasil vem ocorrendo com

    muitas indefinies sobre sua identidade, principalmente no que se refere ao seu

    carter de pertencimento, pois no se tem muito claro se essa modalidade de

    ensino faz parte da Educao Especial ou da Educao Geral. Existe uma

    polaridade e dicotomia nas denominadas classes hospitalares3 implementadas

    3 Classe Hospitalar o termo utilizado pelo Ministrio da Educao. Todavia, para muitos estudiosos da Pedagogia Hospitalar no Brasil, este conceito poderia ser ampliado para escola nos hospitais pela abrangncia do trabalho.

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    pois ora pertencem a educao regular, ora a educao especial. Tambm no

    h identidade na formao do professor, se pedagogo ou formado nas

    licenciaturas.

    Entretanto, embora as escolas nos hospitais ainda no tenham uma

    clareza na sua identidade, esto em fase de expanso em nosso pas, em vias do

    seu reconhecimento, assim como em vrios pases do mundo e comeam a surgir

    as produes acadmicas a respeito deste assunto.

    Na Frana, de acordo com Rosenberg-Reiner (2003, p.16) a primeira

    escola no hospital foi implantada em 1929 por Marie- Luoise Imbert. Na dcada

    de 40, foi criada a associao Animation, Loisirs l Hpital (Animao, Lazer no

    Hospital) e na dcada de 80 foi fundada a Associao para a melhoria das

    condies de hospitalizao das crianas (APACHE), vinculada a European

    Association for Children in Hospital (Associao Europia para Criana em

    Hospital - EACH) que rene vrias entidades no pas em defesa dos direitos das

    crianas e adolescentes hospitalizados. Existem Associaes especficas com

    objetivo de dar continuidade a escolarizao da criana hospitalizada e so

    constitudas por professores aposentados, professores da Educao Nacional e

    voluntrios que acompanham as crianas nos hospitais e tambm na alta, antes

    do retorno a escola regular. Segundo Rosenberg-Reiner, na Frana, essa

    associao conta com 3.600 professores e similar a associao que organiza as

    bibliotecas nos hospitais.

    Em Portugal, a Carta da Criana Hospitalizada (2000), inspirada nos

    princpios da Carta Europia da Criana Hospitalizada, aprovada pelo Parlamento

    Europeu em 1986, tambm reflete as preocupaes com projetos de

    humanizao nos hospitais, com o bem estar da criana hospitalizada e os

    aspectos educativos. O princpio 7 da Carta de Portugal prope que: O Hospital

    deve oferecer s crianas um ambiente que corresponda s suas necessidades

    fsicas, afectivas e educativas, quer no aspecto do equipamento, quer no de

    pessoal e da segurana. (Mota, 2000, p. 58).

    Na Espanha, a escola no hospital vem sendo cientificamente estudada

    desde a dcada de 80. A Pedagogia Hospitalar considerada como um novo

    ramo tanto de investigao, de ampliao da atividade profissional do pedagogo e

    de educao permanente da pessoa:

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    A Pedagogia Hospitalar se trata, de um trabalho de equipe, tanto no terreno prtico como no terico. No fundo se pretende atender as necessidades fundamentais da pessoa enferma, as necessidades humanas que perpassam a ao comum do pessoal sanitrio, muitos centros hospitalares j tem uma pessoa especializada (assistente social, servio pastoral...) para tais funes; mas estas devem ampliar-se, e j chegado o momento de programar especificamente todo um servio educativo no hospital. Com isto o campo educativo se amplia, a Pedagogia Social cresce e os pedagogos se tornam mais necessrios. (GONZLES-SIMANCAS; POLAINO-LORENTE 1990, p. 11)

    possvel verificar, que assim como na Espanha, Frana e Portugal, j

    existe no Brasil esse movimento de extenso da prtica pedaggica para

    diferentes ambientes e de preparao de profissionais de educao para atuarem

    nesses espaos. Alguns esforos tm sido realizados a fim de divulgar essas

    prticas para superar os desafios desta obscuridade. Vrios congressos j foram

    realizados no Brasil e no exterior e tem contribudo de forma muito significativa

    para a troca de experincias entre os profissionais e a organizao dos saberes,

    mas so necessrios mais eventos, para que haja uma maior integrao entre os

    professores que atuam nos hospitais e os professores da rede pblica e privada

    que tambm atendem a crianas que sofrem constantes internaes.

    No Primeiro Congresso Internacional de Pedagogia Social no Brasil cabe

    destacar o trabalho de Vasconcelos (2006) o qual recebeu meno honrosa no

    evento apresentando a reconstruo da identidade de crianas e adolescentes

    atravs do trabalho dos professores no hospital.

    Em termos tericos, a forma como vem se estruturando as prticas e os

    saberes da Pedagogia Hospitalar no Brasil, em sua maioria, esto associadas a

    vertente espanhola da Pedagogia Hospitalar defendida por Gonsles Simancas y

    Polaino Lorente (1990) e Quintana Cabanas (1997).

    Quintana Cabanas (1997) descreve que a Pedagogia a cincia da

    educao e a Pedagogia Social a cincia da educao social. Para ele, existem

    trs concepes paralelas e distintas de Pedagogia Social:

    1) para o ponto de vista sociolgico a Pedagogia Social a cincia da educao como fenmeno essencial e exclusivamente social (a Pedagogia Social toda a Pedagogia); 2) para a concepo pedaggica tradicional, a Pedagogia Social parte da Pedagogia que se ocupa da educao social (a socializao geral) de indivduos e grupos, 3) para quem se interessam pelo trabalho social em sua vertente educativa se chama educao social. A Pedagogia

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    Social a teoria desse enfoque pedaggico do trabalho social. (Quintana Cabanas ,1997,p. 68)

    Percebe-se nestas definies que os conceitos so bem demarcados e

    definidos de acordo com as concepes de Pedagogia Social dos seus

    idealizadores.

    Quintana Cabanas tambm descreve o conceito de Pedagogia Hospitalar

    na apresentao do livro de Gonsles Simancas y Polaino Lorente (1990) sobre

    Pedagogia Hospitalar na Espanha. Quintana Cabanas considera a Pedagogia

    Hospitalar, assim como a Penitenciria, a Ambiental, dentre outras, como ramos

    da Pedagogia Social. Para ele:

    A Educao Hospitalar recente e conta com experincias suficientes para suscitar a reflexo analtica em profundidade para permitir uma sistematizao conceitual. Isto o que realiza o presente livro: no inventa a educao hospitalar, mas sim explica o que , o que faz, o que pretende e as condies nas quais se inscreve o processo educativo, dentro do que chamamos de Educao Permanente da pessoa. Porque quando a educao hospitalar for ampliada, e este o momento atual, no mbito infantil, pode e deve ser tambm ampliada para os adultos hospitalizados: pois desde o momento em que se fala de Educao de Adultos cabe tambm pensar nas pessoas que esto internadas em instituies sanitrias. (Quintana Cabanas, 1990, p. 11)

    Gonsles Simancas y Polaino Lorente (1990,p. 18) tambm consideram a

    Pedagogia Hospitalar como derivada da Pedagogia Social:

    Uma vez que verificada a existncia de uma prxis e uma tcnica pedaggica nos hospitais, possvel afirmar a existncia de um saber, de um corpus cientfico prprio que se fundamenta e justifica no que chamamos de Pedagogia Hospitalar? possvel incluir esses saberes na especializao da Pedagogia Social? Uma coisa incluir esses novos saberes e comear a dar os primeiros passos nessa nova modalidade de educao e outra coisa, muito distinta perceber que esses campos esto construindo uma pedagogia no sentido de uma cincia prtico- normativa. O desafio mais importante que a Educao Hospitalar enfrenta constituir-se como cincia no mbito da Pedagogia e no ser entendida superficialmente, mas como uma parte da Pedagogia. O desafio consiste em elaborar com eficcia uma Pedagogia Hospitalar bem fundamentada cientificamente.

    Para Gonsles Simancas y Polaino Lorente (1990) a educao nos

    hospitais vai alm da mera aprendizagem e implica incidir sobre a pessoa que

    est enferma para melhorar. Por isso, o educador no pode se limitar a ser um

    mero explicador de coisas e a educao no pode identificar-se como uma mera

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    instruo, transmisso de conhecimentos formalizados, nem como adestramento

    de alunos para aprender habilidades.

    Para Gonsles Simancas y Polaino Lorente (1990), a Pedagogia Hospitalar

    no deve renunciar aos contedos especficos do ensino formalizado, mas ela vai

    alm destas questes, pois, trata de flexibilizar e agilizar os contedos para se

    acomodar ao estado biopsicolgico e social nos quais as crianas e adolescentes

    se encontram.

    Quanto aos espaos de atuao, Oa (2005), descreve que a atuao dos

    educadores sociais inclui os hospitais como uma destas instituies. Portanto, os

    espaos so:

    (...) centros, entidades e instituies de regime fechado: centros de

    acolhida, abrigos para crianas e adolescentes, hospitais, asilos, etc.; regime semiaberto: educadores de rua, realizao de medidas judiciais, desenvolvimento comunitrio, servios sociais, etc.; drogadependncias; equipes sociopedaggicas municipais, Conselhos Tutelares, programas de ajuda tcnica ao voluntariado, colnias de frias, albergues, museus, brinquedotecas, servios de bairro, programas socioculturais (OA, 2005).

    A Pedagogia Social no Brasil ocorre em diferentes espaos educacionais

    atravs de diversas prticas educativas de educadores sociais. Todavia, s

    recentemente que as universidades esto se preocupando em sistematizar e

    estudar teoricamente essas prticas e saberes. A publicao do livro de Souza

    Neto, Silva e Moura (2009) resultado desses esforos. Muito embora, na

    coletnea, no tenham contemplado a Pedagogia Hospitalar, o livro representa

    grandes avanos e discusses para a rea.

    A educao social necessita uma dupla perspectiva: por um lado, serve

    como estratgia para inserir o cidado na sociedade, e, por outro, como um

    programa poltico capaz de transformar a sociedade. Estes conceitos esto

    fundamentados nas idias de Freire (2005) que afirmava que o educador

    necessita aprender com o educando as caractersticas, histria e processos

    psicossociais.

    O que possvel perceber, tanto na Pedagogia Hospitalar como na

    Pedagogia Social que so necessrios avanos e discusses a respeito da

    formao de educadores no Brasil e fundamentao das prticas existentes.

    Essas discusses envolvem a re-discusso dos cursos de Pedagogia em nosso

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    pas, a necessidade de formao e capacitao constante para os educadores

    nestes diferentes contextos, discusses sobre a construo dos currculos e

    condio de trabalho dos educadores.

    Concluses

    As relaes da Pedagogia Hospitalar com a Pedagogia Social so

    complementares. Ambas esto voltadas para interveno em espaos sociais e

    comunitrios e so reas nas quais existem reflexes contnuas entre teoria e

    prtica, pois, a teoria nasce da prtica e se retro-alimenta. Elas no so lineares e

    no se estruturam de forma homognea como a Educao Formal.

    Essas reas nasceram em funo de contextos sociais excludentes e de

    uma conscincia de responsabilidade social com as populaes marginalizadas.

    Tambm tm sido pedagogias pensadas para serem permanentes, para serem

    abertas aos segmentos historicamente excludos e tratadas como direito

    constitucional. Portanto, so necessrios debates e encontros constantes para

    que se fortaleam as identidades e marcos tericos.

    Referncias

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